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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ – UNESA

CURSO SUPERIOR TECNÓLOGICO EM SEGURANÇA PÚBLICA – CSTSP

REINALDO DIAS COSTA

A SEGURANÇA PÚBLICA E O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO: A


RELAÇÃO ENTRE OS INSTITUTOS E OS EFEITOS NA SOCIEDADE BRASILEIRA

Artigo a ser apresentado à Banca do Exame do


Curso Superior de Tecnólogo em Segurança Pública
da Universidade Estácio de Sá – CSTSP/UNESA,
como requisito para aprovação na disciplina de TCC
em Segurança Pública.

ORIENTADOR

Professor George Wilton Toledo

Macapá – AP

Novembro de 2021
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A SEGURANÇA PÚBLICA E O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO: A


RELAÇÃO ENTRE OS INSTITUTOS E OS EFEITOS NA SOCIEDADE
BRASILEIRA

PUBLIC SECURITY AND THE BRAZILIAN PRISON SYSTEMPUBLIC SECURITY


AND THE BRAZILIAN PRISON SYSTEM: THE RELATIONSHIP BETWEEN THE
INSTITUTES AND THE EFFECTS ON BRAZILIAN SOCIETY
Reinaldo Dias Costa1
George Wilton Toledo2

RESUMO

O Sistema prisional está sobrecarregado e a condição da Segurança Pública há tempos


encontra-se em crise. Esse quadro é de ciência pública e notória da população comum.
Porém, quando são analisados de forma distinta, não permitem a visualização da
problemática integral. A relação entre a crise da segurança pública com o sistema carcerário
brasileiro forma um ciclo no qual um perdura o outro, formando um ciclo balanceado de caos
social. Este artigo tem por objetivo principal fazer uma analogia entre as problemáticas
trazidas pelo sistema carcerário junto a segurança pública, o impacto causado na sociedade,
bem como possíveis instrumentos de pacificação social. Esta é uma pesquisa bibliográfica,
do tipo descritivo e exploratório. A conclusão mostra que, o crime é um problema complexo e
abrangente, a modo que a formulação de políticas públicas em nível nacional é uma tarefa
complexa, além das questões de gerenciamento de segurança pública, a pesquisa também
mostra que a resistência policial, social e política são os fatores que mais impedem a inovação
dos métodos de políticas de segurança pública bem como os meios de pacificação social
aplicados.
PALAVRAS-CHAVE: Sistema Carcerário. Segurança Pública. Criminalidade. Violência.

ABSTRACT
The prison system is overloaded and the condition of public security has long been in crisis.
This picture is public knowledge and notorious to the common population. However, when they
are analyzed separately, they do not allow us to see the whole problem. The relationship
between the public security crisis and the Brazilian prison system forms a cycle in which one
endures the other, forming a balanced cycle of social chaos. This article has as main objective
to make an analogy between the problems brought by the prison system to public security, the
impact caused to society, as well as possible instruments of social pacification. This is a
bibliographical research, of the descriptive and exploratory type. The conclusion shows that,
crime is a complex and comprehensive problem, so that the formulation of public policies at
the national level is a complex task, besides the issues of public security management, the
research also shows that police, social and political resistance are the factors that most hinder
the innovation of the methods of public security policies as well as the means of social
pacification applied.
KEY WORDS: Prison system. Public Security. Criminality. Violence.

1 Graduando em Tecnólogo em Segurança Pública pela UNESA – Universidade Estácio de Sá. E-


mail: rei.diascosta@gmail.com
2 Professor orientador – Universidade Estácio de Sá. E-mail: edercastro2014@hotmail.com
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1. INTRODUÇÃO

As pautas relacionadas à segurança pública podem ser consideradas uma das


questões mais importantes na administração pública brasileira. Isso se deve ao fato
de que as taxas de violência e criminalidade permanecem a aumentar continuamente.
Nesse sentido, considera-se necessário realizar um estudo que possa analisar o
estado da segurança pública nacional no contexto brasileiro.

A segurança é direito social, fundamental e inviolável de todo cidadão brasileiro.


A Carta Magna equipara esse direito aos demais direitos fundamentais - direito à vida,
à liberdade e à igualdade - assim, condição basilar para o exercício da cidadania. O
Estado, através dos órgãos elencados no artigo 144 da Constituição Federal, é o
principal responsável em buscar medidas para que seja concretizado o direito à
segurança.

É importante ressaltar que o papel de promover o equilíbrio, de modo a evitar


atitudes ameaçadoras e violentas, não compete somente ao Estado, visto que cada
um deve ter consciência de suas escolhas e consequências. Compreende-se neste
ponto a relevância da aplicabilidade de políticas públicas de segurança duradouras e
eficazes.

A Segurança Pública no Brasil apresenta lacunas e estas se relacionam


diretamente o estado do sistema carcerário. É importante buscar compreender a
ineficácia do sistema prisional brasileiro. Em oposição à segurança, a violência urbana
tem tomado proporções drásticas nos estados e municípios brasileiros, com enfoque
nas regiões Norte e Nordeste.

Nesse contexto, este artigo objetiva fazer uma análise geral acerca da crise da
Segurança Pública e relacioná-la à realidade do sistema carcerário brasileiro. Tanto
a Segurança Pública como o sistema carcerário devem ser analisados de forma
conjunta, a fim de se buscar respostas e alternativas para que dirimir os problemas
encontrados.
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2. A FUNÇÃO SOCIAL DA SEGURANÇA PÚBLICA BRASILEIRA

Para melhor contextualização, faz-se uma análise histórica e evolutiva da


segurança no país brasileiro. A partir do ponto da criação da Intendência Geral da
Polícia da Corte e do Estado do Brasil até as Policias Militares comandadas por oficiais
do Exército com a consolidação da Constituição da República de 1967 nota-se
diversos momentos de conflitos políticos e sociais. À exemplo da década de 1960,
quando começou o regime ditatorial no país, a centralização da segurança estava com
o poder do exército brasileiro, que tomava ações repressivas num período marcado
pela censura, falta de liberdade e democracia.

Segundo Cruz (2013), a inserção do autoritarismo social imposto pelas Forças


Armadas assolou na população um efeito negativo perante o objetivo “principal” de
segurança social.

“Nesse período, as Polícias Militares passaram a ser comandadas por oficiais


do Exército, que imprimiram à corporação valores das Forças Armadas.
Portanto, o Brasil adquiriu, nesse momento, um colaborador do período
ditatorial, ou seja, uma polícia repressora que priorizava a segurança
nacional, desfavorecendo a segurança pública e se inserindo num contexto
negativo diante da sociedade brasileira. ” (CRUZ, 2013, p. 3).

Anteriormente à Constituição Federal de 1988, não há registro de uma


concepção de segurança pública e desta forma de uma aplicabilidade desta.
Entretanto, a atual Constituição trouxe em seu artigo 144 algo inovador, porém
sucinto.

“A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos,


é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I – polícia federal;
II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal;
IV – polícias civis;
V – polícias militares e corpos de bombeiros militares”. (BRASIL, 1988).”

Ainda, na concepção de Cruz, o texto destaca uma autonomia para os estados


em conduzir a política de segurança gerando uma descentralização. O resguardo à
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ordem pública e a prevenção da violência se tornaram atribuições das instituições


policiais”. (CRUZ, 2013, p. 4). Após 1988, as polícias que antes atuavam apenas de
modo reativo ao problema da violência, passariam tomar a postura preventiva. Outro
avanço trazido pela Carta Magna foi o desfazimento do mito de que o assunto em
pauta era competência apenas da Justiça Criminal.

Ao citar ordem pública, a Constituição aborda as políticas de segurança,


educação, saúde, moradia, entre outras. Ou seja, é responsabilidade do Estado, por
meio da Segurança Pública, assegurar e garantir efetivamente o bem-estar social. A
segurança pública precisa ser articulada junto aos demais serviços públicos, em
sentido contrário alcançar a ordem social torna-se mais difícil.

Na prática, a desordem social se visualiza nos jovens moradores de uma área


com forte tráfico de drogas, na periferia do Rio de Janeiro, por exemplo. Se esses
jovens não tiverem acesso à segurança, habitação, saúde e educação de qualidade,
como terão uma vida digna e protegida do crime? A segurança não consiste apenas
em uma ronda policial na periferia, mas em uma proteção policial aliada a todas as
outras garantias sociais.

O perfil de quem mata e morre, segundo o Atlas da Violência de 2018 é de


homens negros, moradores de periferia, com idade de até 29 anos, que possuem
baixa escolaridade e baixa renda. Com esta analise o crime cresce na medida da
desigualdade social e racial e na desproporção da aplicabilidade de políticas de
segurança pública.

Segundo o Ministro Luís Roberto Barroso (2018), “Segurança Pública inclui


prevenção, inteligência e investigação”. O ministro avalia que uma “polícia bem-
equipada, bem-treinada e bem-remunerada faz a diferença”, porém deixa claro o
entendimento de que a Segurança Pública não se restringe apenas à ideia da atuação
policial.

“Os caminhos para uma política antiviolência devem abranger atenção à


primeira infância; prevenção e redução do abuso infantil; diminuição da
evasão escolar; criação de condições de trabalho mais favoráveis para mãe
e pais de crianças pequenas; proteção da integridade física das mulheres;
combate à violência doméstica; revisão da fracassada política de guerra às
drogas; e regulamentação do porte e da posse de armas”. Barroso (2018).

Os entes federativos são submetidos as condições nacionais da Carta Magna,


e conjuntamente devem buscar a efetivação de ações preventivas contra a violência.
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Da igual maneita, o setor privado e a sociedade têm papel fundamental nessas ações,
de modo que, com a contribuição de todos é possível deixar de ser utópica a ideia de
paz social.

3. CRIMINALIDADE NO BRASIL

A realidade que se encontra de muitos jovens brasileiros acabam por se ade


adentrar no meio criminoso ao acreditarem ser a única alternativa válida para fugir dos
problemas e conseguir seu sustento. Por derradeiro, se aliam a facções do crime
organizado, que a propósito, têm ganhado cada vez mais força. Muitos desses jovens,
com faixa etária de 15 a 29 anos, tem perdido suas vidas, sendo este um fenômeno
recorrente, denunciado ao longo das últimas décadas, mas que não se vê ações
consistentes o suficiente para combater esse mal (Atlas da Violência. 2018).

Os crimes de homicídio doloso, latrocínio, mortes em decorrência de


intervenção policial e mortes violentas intencionais de policiais em serviço e fora de
serviço são classificados pela Secretária Nacional de Segurança Pública como Crimes
Violentos Letais Intencionais (CVLI). Esses crimes têm maior relevância social e
impacto na sociedade. Pode-se dizer, até, que as mortes violentas, especialmente o
crime de homicídio doloso, é problema principal no cenário da Segurança Pública.

O Atlas da Violência, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica


Aplicada (Ipea) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), registrou um
número de 62.517 mil homicídios no Brasil em 2016. Como principal indicador de
violência, esse dado demonstra o nível preocupante da situação da criminalidade no
país.

O número de assassinatos registrados no Atlas de mulheres no ano de 2016


foi de 4.645, “o que representa uma taxa de 4,5% homicídios para cada 100 mil
brasileiras”. (Atlas da Violência. 2018, p. 44). Diante de dados que mostram que a
violência de gênero, assim como, a violência motivada pela cor, raça e classe social,
ainda estão bem presentes neste século, podemos concluir que vivemos um
retrocesso, presos a questões arcaicas que, como visto no histórico do direito penal,
existem desde as primeiras civilizações.
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“A taxa de homicídios de mulheres negras é 71% maior que a de não negras,


e com um lapso de tempo de 10 anos (2006 a 2016), a taxa de homicídios para cada
100 mil mulheres negras aumentou 15,4%, enquanto que entre as não negras houve
queda de 8%” (ATLAS da Violência. 2018, p. 44). Percebe-se que em 10 anos, em
vez de diminuir o número de mortes, o que identificamos foi o aumento. Tais dados
parecem ilógicos diante da premissa de que a sociedade evolui com o passar do
tempo.

Outrossim, os grupos policias estão com elevados índices de autoria de


crimes de homicídio. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2017) registrou o
número de 4.222 mortes no ano de 2016 em decorrência de intervenções de policiais
Civis e Militares. Por outro lado, nesse mesmo ano, 453 policiais Civis e Militares foram
vítimas de homicídio. Os crimes contra o patrimônio que nos aflige diariamente é outra
demonstração de tamanha insegurança que vivemos.

Tendo em vista esses dados que apontam a criminalidade no Brasil, um fator


assustador é que “boa parte da violência que temos na nossa sociedade é comandada
de dentro do presídio”, disse o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (2015).
Ainda segundo o Ministro, dentro das penitenciárias atuam organizações criminosas
que lideram a violência aqui fora e que são de conhecimento comum da população.

Nesta ocasião, presos de menor potencial ofensivo, quando saem são muito
mais perigosos e habilidosos para o crime. Em muitos casos, saem aliados a facções
que os vincula a continuar a praticar o ilícito nas ruas. O sistema carcerário nem de
longe tem cumprido sua função de diminuir a criminalidade e reintegrar o infrator à
sociedade. Pelo contrário, os presídios no Brasil têm fomentado o crime.

Nesse sentindo, Jungmann, Ministro da Segurança Pública, afirmou:

“Temos que rever a cultura que vige na sociedade de prender, prender,


prender, sem entender que a prisão em larga escala ou em massa não é
sustentável. Nós prendemos muito e prendemos mal. Boa parte desse
pessoal faz um juramento para sobreviver e se incorpora às grandes
gangues. Então o sistema penitenciário hoje é um sistema que recruta
soldados para o crime organizado”. (JUNGMANN, 2018).

O Ministro afirmou ainda, logo após a criação do Ministério da Segurança


Pública, que técnicos do ministério estudariam propostas para separar os presos pelo
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grau de periculosidade e pelo tipo de crime que cometeram; ampliariam as unidades


do regime semiaberto; adotariam medidas punitivas alternativas.

Assim como os novos valores e diretrizes que vemos na estratégia de


segurança pública, ela precisa ser implementada. Obviamente, esse é um processo
complicado, assim como o problema do crime no Brasil, mas, obviamente, o foco
central é conscientizar toda a sociedade sobre a importância e a urgência de
inovações relacionadas à segurança pública.

4. O SISTEMA CARCERÁRIO E O ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL

Desde que há registro na história do surgimento da civilização e da organização


social, há conflitos nas relações sociais e com eles a indispensabilidade de se existir
normas e regras. De acordo com (CAMARA, 2009, p. 65), “o crescimento desenfreado
das cidades nas últimas décadas aumentou a carga de conflito entre as pessoas,
grupos e entre estes com o Estado, que, por sua vez, não foi competente para preveni-
los e menos ainda para administrá-los”.

O ritmo das mudanças nas cidades, principalmente nas grandes metrópoles,


acontece acelerada ao passo que os institutos de controle social avançam a passos
lentos. As polícias, o sistema judiciário e o penal não têm conseguido acompanhar as
transformações e evitar a expansão do crime, deste modo acarreta-se um verdadeiro
caos no sistema penitenciário.

De acordo com Dostoiévski em sua obra “Crime e Castigo” de 1866, “é possível


julgar o grau de civilização de uma sociedade visitando suas prisões”. Visto isso,
depreende-se a situação crítica em que se encontra a civilização brasileira. O relatório
levantado pelo Departamento Penitenciário Nacional (2017), trouxe o dado de 726.712
mil presos no Brasil e um déficit de 358.663 vagas. Em outras palavras, nos nossos
presídios a quantidade de vagas existentes, suportaria apenas metade dos
presidiários que estão em cárcere.
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Nesse segmento, o STF reconheceu o quadro do sistema penitenciário no


Brasil como “Estado de Coisas Inconstitucional”, fato que comprova que já se passou
muito dos limites as irregularidades nesse sistema.

“Em julgamento dos pedidos de medida cautelar formulados na inicial,


ocorrido em 9.9.2015, o Pleno do STF, por maioria, deferiu a cautelar em
relação à alínea b, para determinar aos juízes e tribunais que, observados os
artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção
Interamericana sobre Direitos Humanos, realizassem, em até noventa dias,
audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a
autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da
prisão. E, em relação à alínea h, por maioria, deferiu a cautelar para
determinar à União que liberasse o saldo acumulado do Fundo Penitenciário
Nacional para utilização com a finalidade para a qual foi criado, abstendo-se
de realizar novos contingenciamentos. E, ainda, o Tribunal, por maioria,
deferiu a proposta do ministro Roberto Barroso de concessão de cautelar de
ofício para que se determinasse à União e aos estados, especificamente ao
Estado São Paulo, que encaminhassem ao Supremo Tribunal Federal
informações sobre a situação prisional”. (GUIMARAES, M, 2017, p. 95-96).

Ao tomar essa decisão, o Supremo voltou seus olhares à problemática deveras


grande em que se vive no Brasil há tempos com relação à Segurança Pública e ao
sistema prisional. No entanto, segundo Porpino (2017), cerceia uma polêmica acerca
da autonomia da Suprema Corte quanto a formulação de políticas públicas. O Plenário
entendeu que a decisão do STF violava o Princípio da Separação e Harmonia dos
Poderes, bem como a cláusula do financeiramente possível.

Por outro lado, aponta-se a importância do ativismo judicial, já que os órgãos


estatais são inertes e a violação aos direitos humanos desenvolve de forma
desenfreada. Ora, é certo pensar que não existe coerência no fato de se ignorar a não
concretização dos direitos fundamentais da população. A atuação do Supremo ao
reconhecer a existência do ECI foi uma medida extrema para uma situação igualmente
séria e relevante.

4. JUSTIÇA RESTAURATIVA COMO POSSÍVEL SOLUÇÃO PARA O CAOS


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Observa-se que no país é intrínseca a ideia de que o mal instaurado deve ser,
acima de tudo, punido por quem o praticou independente da forma. Com isso,
percebe-se a prática de uma cultura punitiva, em que a sociedade fomenta castigar o
possível transgressor, para que gere, então, a sensação de alívio e justiça. Isso
acontece, porque, com base nessa cultura, a concepção de justiça está intimamente
ligada ao ato de punir ou devolver a punição e equilibrar a balança de igualdade.

Entretanto, frente a realidade da segurança pública e do sistema carcerário


brasileiro, se faz conveniente a reflexão acerca da cultura punitiva. As prisões estão
superlotadas e as penas aplicadas não têm cumprido seu papel restaurador para
inserir o individuo na sociedade. Falta, pois, a conscientização de que ao punir
deliberadamente o infrator, a punição também recai sobre a sociedade, que vai
reencontrar esse infrator em potencial habilidade criminosa de forma mais aprimorada
e motivada.

A Justiça Restaurativa não é uma prática recente no Brasil e tem se expandido


com o passar dos anos. Segundo o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a Justiça
Restaurativa “se trata de um processo colaborativo voltado para resolução de um
conflito caracterizado como crime, que envolve a participação maior do infrator e da
vítima. ”

“Na prática existem algumas metodologias voltadas para esse processo. A


mediação vítima-ofensor consiste basicamente em colocá-los em um mesmo
ambiente guardado de segurança jurídica e física, com o objetivo de que se
busque ali acordo que implique a resolução de outras dimensões do problema
que não apenas a punição, como, por exemplo, a reparação de danos
emocionais. ” (CARVALHO, 2014).

Esse instituto, como o próprio nome diz, busca restaurar os danos sofridos pela
vítima. O cerne está na reparação, em atuar na consequência do delito. O viés
restaurativo possui um foco na cura da ferida do que na reclusão. É uma ideia que
tem sido discutida e que pode ser um importante instrumento de pacificação social,
de política de desencarceramento e evolução do próprio Direito Penal.
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A segurança pública, como fator determinante para a promoção e manutenção


da paz social, garante os direitos individuais e assegura o exercício da cidadania e
dos direitos constitucionais. Nessa perspectiva, é possível afirmar que a qualidade de
vida de um cidadão está intimamente ligada à qualidade do exercício da segurança
pública. A situação atual do sistema carcerário brasileiro, funciona como um medidor
social, ao lanço que mais caótico for o sistema penitenciário, maior será a
complexidade da segurança pública.

O direito penal tem vivido um processo longo e antigo de ineficiência no que


tange ao combate à criminalidade. Não se vê evolução, mas sim retrocesso. O
aumento de penalidades previstas a condutas criminosas e o encarceramento em
massa, visivelmente, não tem resolvido os problemas sociais, longe disso, tem
expandido em potencial. Todavia, para que se aplique substitutos penais é preciso,
primordialmente, haver um reconhecimento geral da falência do modelo punitivo atual.
A justiça meramente retributiva, comprovadamente, não tem gerado bons efeitos.

O sistema prisional é o maior problema da segurança pública, e o sucesso


desta, transpassa pelo enfrentamento e solução do caos carcerário. Com o presente
artigo, pôde-se constatar que é crucial buscar e aplicar medidas que visem o
desencarceramento e medidas alternativas ao sistema punitivo. Ademais, precisa-se
voltar a atenção primordialmente aos direitos basilares e com qualidade - à primeira
infância, ao acesso a educação, saúde e moradia de qualidade - a fim de se evitar o
mal “pela raiz”.

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