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Escola Superior de Relações Internacionais

Curso de Mestrado em Relações Internacionais e Desenvolvimento

Cadeira: Conflito, Segurança Colectiva e Desenvolvimento

TEMA:
ESTRATÉGIA E SEGURANÇA, INTELIGÊNCIA E SEGURANÇA

Mestrandos:
Morílio Nério Urgente

Docente:
Prof. Dr. Aly Jamal

Maputo, Novembro de 2022


ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 1

2. SEGURANÇA .......................................................................................................... 2

2.1. Tipos de Segurança ............................................................................................ 3

2.1.1. Segurança Individual .................................................................................. 4

2.1.2. Segurança Pública....................................................................................... 4

2.1.3. Segurança Nacional .................................................................................... 5

1.1.1. Segurança Colectiva ................................................................................... 5

1.1.2. Segurança Internacional ............................................................................. 6

2. ESTRATÉGIA E SEGURANÇA ............................................................................. 6

3. INTELIGÊNCIA ....................................................................................................... 9

4.1. Inteligência e Segurança .................................................................................. 12

5. CONCLUSÃO ........................................................................................................ 13

REFERENCIAS ............................................................................................................. 14
1. INTRODUÇÃO

A segurança tem sido a preocupação central dos Estados desde a sua formação na era
moderna. Existem suportes teóricos que dão primazia a questão da Segurança Nacional
dos Estados, como por exemplo, o realismo onde a segurança dos Estados é traduzida a
partir dos níveis de Poder, com isso, o Sistema Internacional é caracterizado pela luta de
Poder, o que garante a sua sobrevivência. Posto a isto, existem outros campos de estudo
nas Relações Internacionais que demostram uma interligação com a segurança dos
Estados, trata-se dos Estudos Estratégicos e de Inteligência.

Estudos estratégicos surgem como um novo campo de estudo das Relações Internacionais
que situam entre os estudos de segurança e estudos militares. Ao passo que os estudos de
inteligência são os mais antigos e vem evoluindo em simultâneo com os estudos de
segurança. Nesse sentido, esse trabalho procura compreender numa primeira fase a
definição do conceito de segurança; segundo demostrar a ligação entre Estratégia e
Segurança; por fim, demostrar a ligação entre a Inteligência e a Segurança. Contudo, para
o alcance dos objectivos acima mencionados, recorreu-se ao método histórico que
segundo Marconi e Lakatos (1992:81-82) consiste em investigar acontecimentos,
processos e instituições do passado para verificar sua influência na sociedade hoje, pois
as instituições alcançaram sua forma actual por meio de alterações de suas partes
componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto de cada época.

Também se recorre ao método comparativo, que de acordo com Gil (1999:34) procede
pela investigação de indivíduos, classes, fenómenos ou factos, com vistas a ressaltar as
diferenças e similaridades entre eles. Sua ampla utilização nas ciências sociais deve-se ao
facto de possibilitar o estudo comparativo de grandes grupamentos sociais, separados pelo
espaço e pelo tempo. Portanto, esse método possibilitou fazer uma comparação evolutiva
dos três conceitos em apresso, que são: Segurança, Estratégia e Inteligência.

Conceitos Chave: Segurança, Estratégia e Inteligência.

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2. SEGURANÇA

Existem várias posições em torno da definição do conceito de segurança, como por


exemplo, Hobbes refere que a segurança está para o indivíduo, apesar de o Estado ter de
garantir ao mesmo o direito de autopreservação. Montesquieu, por sua vez, entendia que
a segurança se associava à liberdade política. Enquanto que Adam Smith compreendia
segurança na perspectiva de um ataque violento à pessoa ou sua propriedade. Entretanto,
depreende-se que aos poucos a segurança emergiu à uma noção comum e social, mas o
que o Estado deve fazer para garantir tal liberdade para o indivíduo não é a segurança,
mas a defesa: o primeiro dever do soberano, o de proteger a sociedade da violência e
invasão de outras sociedades independentes (Silva et al, S/D: 3).

Numa perspectiva etimológica, o termo «segurança» provém do latim “securus”, que


significa “sem medo” ou “sem preocupações”. Portanto, na definição mais comum,
segurança é a ausência de risco, a previsibilidade, a certeza quanto ao futuro. Desta feita,
faz sentido a ideia de que a segurança é um dos objectivos últimos de qualquer Estado,
tal como o progresso e bem-estar ou desenvolvimento, sendo considerados as duas faces
da mesma moeda. Não há desenvolvimento sem segurança, nem esta pode ser alcançada
sem um esforço sustentado no sentido do desenvolvimento social, político e económico
da sociedade (Fonseca, 2010: 18).

Ademais, o conceito de segurança é amplo e sem significado único. O seu significado


depende do contexto político em que é concebido, onde as práticas são o reflexo das
teorias de pensamento. Dai que a concetualização de segurança é produto de diferentes
entendimentos sobre o que a política é, ou deve ser (Santos, 2016: 109). Dai que o
conceito de segurança se torna multidimensional, tanto em termos de atores assim como
assuntos, ou seja, a noção de segurança é abrangente. Tomé (2010: 34) refere que, parte
significativa das discussões sobre segurança envolve a sua referência e abrangência: Qual
o objecto da segurança ou que entidade deve ser segura (segurança de quem)? Qual a
natureza ou o tipo de ameaças, riscos e desafios (segurança face a quê ou a quem)? Qual
o agente de segurança (segurança por quem) e com que meios (instrumentos de
segurança)? Das respostas a estas questões dependem das respectivas conceptualizações
de segurança.

Entretanto, classicamente nas relações internacionais a questão da segurança era vista


somente nos moldes do realismo como sendo a teoria dominante nesse campo. Tomé

2
(2010: 34) refere que na perspectiva realista o sistema internacional é anárquico e
permanentemente competitivo-conflitual, o Estado é não só o principal actor com
referência quase exclusiva de segurança, ou seja, segurança do Estado e pelo Estado.
Portanto, para Wirtz (2007: 338) a segurança nos termos do realismo centra-se que
questões retratadas como high politics: guerra e paz, cimeiras diplomáticas, dissuasão
nuclear, controlo de armamentos, alianças militares, defesa de “interesses nacionais” e
integridade estatal, ou seja, “segurança nacional” e “segurança internacional” vistas
sempre em função do primado exclusivo do Estado. Em contraste, as dimensões da low
politics ambiente, energia, fluxos migratórios, sobrepopulação, saúde,
subdesenvolvimento, etc, embora encaradas como fonte de problemas, raramente eram
entendidas como ameaças ou riscos para a segurança nacional ou internacional.

Entretanto, o problema da segurança entendido como a manutenção da independência, a


identidade, a integridade e o bem-estar das sociedades e dos indivíduos, tem sido um dos
elementos centrais a que têm respondido os Estados. O caráter descentralizado do poder
e a não integração da sociedade internacional, em que cada Estado tem de velar pela sua
própria segurança, explica a sua importância no âmbito da política externa. Porém, o
conceito de segurança é difícil de compreender em virtude do seu próprio caráter e das
alterações do ambiente em que é alcançada. Não sendo um conceito unívoco tem muitas
aproximações, significados e alcances distintos. O conceito e a problemática da segurança
têm evoluído ao mesmo tempo que a sociedade é afetada pelas revoluções técnico-
científicas e das dinâmicas resultantes da crescente interdependência,
transnacionalização, globalização é que mudaram os desafios e as ameaças que os Estados
têm de enfrentar (Barroso, 2014: 156).

2.1.Tipos de Segurança

Segundo Fonseca (2010: 4) a segurança assume diversas dimensões, consoante o critério


de classificação. Em primeiro lugar, distingue-se segurança nacional e internacional,
sendo esta última a que resulta do relacionamento entre os Estados. Para uma grande parte
dos analistas, no entanto, toda a segurança é simultaneamente nacional e internacional,
não só devido às fronteiras não físicas (e mesmo à inexistência de fronteiras), mas
sobretudo porque qualquer Estado detém uma quota-parte de responsabilidade para a
estabilidade da ordem internacional. Entretanto, é de suma importância abordar-se sobre

3
a segurança na perspectivas individual, colectiva, publica, nacional assim como
internacional.

Durante a maior parte da Guerra Fria, os estudos de segurança estavam basicamente


focados em questões que giravam em torno do controle, ameaça ou uso da força.
Consequentemente, o sistema internacional foi considerado inerentemente centrado no
Estado, uma vez que os Estados eram vistos como os principais usuários da força e os
principais alvos do uso da força (Degaut, 2015: 3). Desta feita, se o sistema internacional
se centra no interior do Estado (nos termos low politics), é importante compreender em
primeiro lugar a segurança individual, publica e nacional.

2.1.1. Segurança Individual

De acordo com Gierszewski (2018: 54) a segurança individual visa proteger os seres
humanos da violência física do Estado e de outras entidades. Para muitos, o maior medo
é ser vítima do crime. Entretanto, este tipo de segurança é relativo a segurança humana
que nos termos de Rocha (2017: 106) é descrita como liberdade do medo (freedom from
fear) e liberdade de necessidades (freedom from want). Entretanto, a segurança individual
separa-se da segurança humana na medida de em estes assumem caminhos diferentes
inerentes a proteção do homem.

De um lado encontramos um tipo de segurança preocupado com a proteção física do


homem (segurança individual), por outro, encontramos uma segurança dedicada na
segurança do homem não exatamente em termos físicos, mas em termos do acesso deste
a certos itens que lhe conferem uma vida digna, como é o caso da social, económica, entre
outros, que garantem o desenvolvimento e sobrevivência desde.

2.1.2. Segurança Pública

A segurança pública está mais ligada ao valor social básico, que é proteger a vida, a saúde
e a propriedade da população (Gierszewski e Pieczywok, 2021: 4). Entretanto, Czapska
(2004: 14) refere que a segurança pública é um elemento do conceito mais amplo de
segurança, entendida como um determinado estado ou processo. Como determinado
estado, pode ser entendido objetivamente no sentido negativo, como um estado sem
ameaças. No sentido positivo, como um estado de inviolabilidade de bens. Ou
subjetivamente, como um estado que consiste em um sentimento psicológico de não ser
ameaçado.

4
2.1.3. Segurança Nacional

Entretanto, é importante referir que a segurança nacional não se confunde com segurança
pública, nem tampouco com doutrina ou ideologia de segurança nacional (Costa, 2010:
124-125). Ademais, para o mesmo autor, estamos perante a segurança nacional de um
Estado quando se percebe, materialmente: a) a estabilidade e inviolabilidade dos limites
fronteiriços do Estado; b) a capacidade de se traduzir a soberania nacional, bem como a
capacidade nacional de projetar poder no exterior, em um conjunto de medidas que
proporcione ganhos sociais e econômicos para a população nacional; c) a solidez e
impessoalidade do sistema constitucional, assim como sua impermeabilidade em relação
a pressões externas; e d) a garantia da previsibilidade legal das relações político-eleitorais
e econômicas.

Dai que a segurança é percebida nos termos de Barroso (2014: 157) onde a mesma pode
ser definida como objetivo teleológico do Estado, entendida como condição para que a
unidade política possa sobreviver, livre de perigos ou das suas causas. Assim, a segurança
pode ser considerada como um valor a atingir, de cariz necessariamente relativo, tal como
a garantia da independência ou integridade territorial de um Estado, necessário para que
os cidadãos vivam em paz, em democracia e em liberdade.

1.1.1. Segurança Colectiva

Segundo Evans (1993: 15-16), a segurança colectiva esta nos assuntos militares,
envolvendo a ideia de que todos os membros do grupo renunciam o uso da força entre
eles e que se comprometem a auxiliar prontamente qualquer membro se este for atacado.
A segurança colectiva é, nesta linha, o coloraria da segurança comum. Ademais, Wet e
Wood (2013: 2) afirmam que a segurança coletiva tem sido referida como um sistema,
regional ou global, no qual cada estado no sistema aceita que a segurança de um é a
preocupação de todos e concorda em participar de uma resposta coletiva às ameaças e
violações de paz.

Entretanto, no âmbito das Nações Unidas o conceito de segurança colectiva é pragmático


na sua aplicação, por conta de sua acão burocrática. Tal como pode se compreender no
raciocínio de Koskenniemi (1996: 457) que advoga que, a segurança coletiva, muitas
vezes distinguida academicamente da política de equilíbrio de poder, é vista como
invocando uma reação automática contra qualquer potencial agressor. A segurança
coletiva sob o sistema da Carta da ONU, no entanto, envolve pouca automação. De acordo
5
com a Carta, a decisão sobre se e como reagir cabe ao Conselho, que tem amplo poder
discricionário. Se isso torna o sistema da Carta algo diferente de segurança coletiva sob
alguma definição é desinteressante. Entretanto, fica destorcido o sentido clássico de
segurança colectiva por conta de ação da burocracia da ONU.

1.1.2. Segurança Internacional

No que tange a segurança internacional, o grupo assumiu o objetivo de influenciar o


mainstream das RI, analisando o conceito de segurança, desenvolvendo-o e reinserindo o
nas análises atuais. Também rompeu com a lógica objetivista de segurança ao mesmo
tempo que evitou reduzir o conceito a uma lógica subjetiva arbitrária. A segurança passou
a ser disseminada como um fenômeno intersubjetivo, cujo objeto de referência não se
concentra mais exclusivamente no Estado, mas também na sociedade que representa a
sustentação da soberania e identidade estatal (Silva et al, S/D: 12).

2. ESTRATÉGIA E SEGURANÇA

Em termos históricos, o estudo da estratégia é percebido em todos os continentes e nos


mais longínquos tempos da história da humanidade. Seja com Sun Tzu e a sua
interpretação estratégica da China antiga ou com Tucídides e a sua explicação sobre as
causas da Guerra do Peloponeso, a estratégia tem sido uma preocupação de acadêmicos,
políticos e militares. Academicamente, a preocupação com o conceito em apreço deu
origem ao surgimento da disciplina de Estudos Estratégicos. Apesar de sua matriz
predominantemente anglo-saxã, os Estudos Estratégicos enquanto disciplina se
estruturaram sob as contribuições basilares de autores como Maquiavel, Jomini e em
especial, Clausewitz (Teixeira Jr e Ferreira, 2019: 7).

O século XX viu o estabelecimento não apenas da disciplina de Estudos Estratégicos


como também de um edifício teórico robusto. No decorrer da Guerra Fria, esse campo
acadêmico viveu a sua época de ouro. Questões como o surgimento do terrorismo
internacional e a guerra irregular tornaram-se importantes objetos de investigação, porém
ofuscados pelo advento e a proliferação das armas nucleares. Com o colapso da União
Soviética, questões de segurança não necessariamente ligadas à rivalidade intraestatal ou
a sistemas de armas sofisticadas ganharam lugar nos Estudos Estratégicos. As guerras
civis na ex-Jugoslávia trouxeram uma literatura que questionou o primado da teoria da
guerra clausewitziana e colocou em questão, inclusive, a mudança da natureza da guerra.

6
Entre os anos de 1990 e 2000 deu-se o reavivamento do debate sobre Estudos
Estratégicos, tal como uma conexão e diálogo robusto junto aos estudos de Segurança
Internacional nos departamentos de Relações Internacionais. O panorama da Guerra
Global Contra o Terror em 2001 e o advento das guerras do Afeganistão (2001) e Iraque
(2003) fizeram necessário um novo impulso para os estudos em questão (Ibid:8).

Para Graça (2009: 19) a impossibilidade epistemológica de delinear fronteiras precisas


ou nítidas entre estas áreas é um facto, sendo ademais evidente que o conceito de
segurança se situa num patamar transdisciplinar ou mesmo supradisciplinar. Entretanto,
Graça (2013: 47-48) refere que o problema é, aliás, genético e tem sido abordado pelos
principais autores da área e das outras áreas afins. Bernard Brodie1, o iniciador da área
após a 2ª Guerra Mundial, não deixou no seu artigo fundador de enquadrar a Estratégia,
enquanto ciência, na “security policy”. Mas a verdade é que é praticamente impossível
encontrar na literatura científica uma explicação fundamentada sobre a existência de uma
diferença clara entre Estudos Estratégicos e Estudos de Segurança. O debate se mantém,
portanto, em aberto e a generalidade dos autores e textos de referência não deixam de
abordar obrigatoriamente essa relação.

Ademais Betts (1997: 8-9) esclarece que dentro do campo de relações internacionais
constantemente caracterizado por debates sectários sobre estruturas abrangentes como
realismo, liberalismo e suas variantes “neo”, os limites obscuros da estratégia alimentam
a controvérsia. Para esclarecer onde os estudos estratégicos devem se encaixar, pense em
um subcampo de três círculos concêntricos: no centro está a ciência militar (como
tecnologia, organização e táticas se combinam para vencer batalhas); o anel externo e
mais inclusivo são os estudos de segurança (tudo o que diz respeito à segurança de uma
política); e no meio estão os estudos estratégicos (como fins políticos e meios militares
interagem sob restrições sociais, econômicas e outras). Contudo, Graça (2013: 49) esboça
uma figura sobre a relação acima referida sobre estudos de segurança, estudos militares e
estudos estratégicos.

1
Foi um estrategista militar americano conhecido por estabelecer os fundamentos da estratégia nuclear.

7
Figura 1: Gráfico do Esquema do Betts

Fonte: Graça (2013: 49).

Com base nas ideias supracitadas denota-se que a estratégia leva em conta a questão do
uso da forca, assim como lida com a sobrevivência dos Estados. Tal como pode se
acompanhar no raciocínio de Freedman (2008: 22), que a abordagem estratégica é aquela
que leva em conta o papel desempenhado pela força, ou a ameaça da força no sistema
internacional. Tal como advoga Snyder (2011: 4) que a visão tradicional é que a estratégia
envolve o uso ou a ameaça do uso da força nas relações internacionais. Portanto, os
estudos estratégicos tratam de como os instrumentos de força influenciam as relações
entre os Estados.

Dai que a estratégia é descritiva na medida em que analisa até que ponto as unidades
políticas têm a capacidade de usar ou ameaçar o uso da força armada para impor sua
vontade a outras unidades; seja para obrigá-los a fazer algumas coisas, para impedi-los
de fazer outras ou, se necessário, destruí-los completamente como comunidades
independentes. É prescritiva na medida em que recomenda políticas que permitirão que
tais unidades operem em um sistema internacional sujeito a tais condições e restrições
(Freedman, 2008: 22).

No concernente a relação entre a estratégia e segurança, percebe-se que que esses


conceitos são muito próximos, porem, diferentes. Tal como pode se perceber nos
dispostos de Boutin e Snyder (2008: 17) que os estudos estratégicos se baseiam na
interpretação realista de Relações Internacionais. Na verdade, eles são muitas vezes
tratados como sinônimos. Ambos apresentam uma visão de mundo distinta baseada em
suposições sobre a natureza do ambiente político, os atores significativos no ambiente

8
político e a maneira característica pela qual os atores políticos interagem uns com os
outros. Dai que Snyder (2011: 4) conclui que os estudos estratégicos se concentram muito
mais nas ameaças militares aos estados, enquanto os estudos de segurança ampliam a
definição para incluir ameaças não militares não apenas aos estados, mas também aos
atores não estatais e grupos subestatais.

Acrescenta ainda referindo que, embora os estudos de segurança adotem uma definição
ampla de segurança e, como resultado, estejam muito mais próximos das RI do que dos
estudos estratégicos, há uma diferença importante: trata não apenas das causas e
consequências da guerra, que é a principal área de interesse para muitos estudiosos de RI,
mas também a condução da guerra. A condução da guerra é uma área de estudo tão
importante quanto a decisão de ir à guerra, e o resultado da guerra tende a se basear na
dimensão militar e não na política (Ibid: 5).

3. INTELIGÊNCIA

Etimologicamente, a inteligência está relacionada com a capacidade de aprender e


raciocinar bem. O dicionário Oxford descreve-a como a capacidade de aprender,
compreender e pensar de forma lógica sobre as coisas; capacidade de fazer isso bem
(Afolabi, 2018: 1). Tal como pode se constatar da definição de Oliveira (2012: 2) que a
Inteligência de Estado, entendida como a atividade burocrática regular e sigilosa de
obtenção, processamento e difusão de informações de interesse estratégico protegidas por
indivíduos, grupos, organizações ou estados estrangeiros, realizada por um órgão público
vinculado à Chefia de Estado e dedicado exclusivamente a essa atividade.

Portanto, a inteligência tem sido conceituada como pré-conhecimento que confere uma
vantagem a quem a possui e, quando utilizada com prudência, equipa quem a possui para
antecipar a ação dos outros. Do exposto, pode-se deduzir que inteligência é qualquer
informação processada cuja substância seja importante para os órgãos de governo
competentes na formulação e execução de políticas de segurança. No entanto, o processo
interminável de criação de inteligência confiável, precisa e utilizável é chamado de
processo ou ciclo de inteligência (Ibid, 1-2).

No que concerne ao ciclo de inteligência, Johnson (2009: 34) esclarece que qualquer
teoria de inteligência estratégica deve levar em conta o chamado ciclo de inteligência, um
modelo que descreve a sequência de atividades que transporta a inteligência desde os
estágios iniciais de planejamento até um produto acabado pronto para a consideração dos

9
tomadores de decisão no mais alto nível, conselhos de governo. O ciclo consiste em cinco
fases: planejamento e direção, coleta, processamento, produção e análise e disseminação.
Cada fase envolve um comportamento que deve ser levado em conta pelos teóricos da
inteligência.

Entretanto, Alofabi (2018: 2) simplifica referindo que o processo de inteligência começa


quando o governo, os formuladores de políticas e outros consumidores expressam a
necessidade de inteligência para atingir um objetivo ou missão específica. O ciclo tem
quatro (4) etapas e são elas:

1. Direção
2. Coleção
3. Processamento
4. Disseminação

Figura 2: Ciclo da Inteligência

A fase da direção, envolve a direção do Diretor (Chefe das Agências) e a autodireção. Por
exemplo, espera-se que o Diretor do DSS determine as informações críticas e gerais
necessárias e dirija seus homens sob seu comando para obtê-las adequadamente.

A fase da Coleção, é a segunda etapa em que o plano de coleta para orientar a etapa é
elaborado enquanto as fontes e os agentes são encarregados. As atividades de coleta nesta
etapa são baseadas na prioridade, fator tempo, relevância e tipo de informação necessária.
O último processo nesta etapa é a entrega das informações coletadas. Alguns dos meios
de coleta de informações incluem espionagem, operações clandestinas, vigilância, Raid,
criptografia, esteganografia, wail-ins, pseudo-operações, estações numéricas,

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dispositivos de ocultação, link de voz unidirecional, espionagem, desvio seguro, sexo e
potes de mel e assim por diante (Alofabi, 2018: 4).

A fase do processamento, envolve a conversão das informações coletadas em inteligência.


O processo abrange a compilação, avaliação, análise e interpretação.

Figura 3: Etapas da Fase de Processamento

E por fim, a fase da disseminação, que é considerada a verdadeira fase, em que a


inteligência produzida é entregue ao consumidor e a quem dela necessita. ou seja, é dado
ao usuário final ou agências que o requeiram. A divulgação pode ser vertical ou
horizontal, o produto final aqui deve ser pontual, preciso, breve, padronizado, regular e
distribuído adequadamente. Assim, a disseminação é simplesmente a convergência
oportuna da inteligência de forma adequada a quem dela necessita.

Ademais, trazendo uma abordagem histórica percebe-se a inteligência como um Poder


estatal. Segundo Hernan (2006:2), nos últimos cem anos, a Inteligência de Estado evoluiu
para uma atividade burocrática regular, destacada em períodos de guerra, demandada em
tempos de instabilidade política interna e, em geral, pouco compreendida em tempos de
paz. A Inteligência é hoje fator de influência no sucesso ou fracasso das decisões
governamentais e configura para alguns autores um tipo particular de poder estatal.

Kent (1949)2 Citado por Oliveira (2012: 48) advoga que a Inteligência na verdade
representa três coisas: um tipo de informação, um tipo de atividade e um tipo de
organização. No primeiro caso, Inteligência refere-se a informações de interesse
estratégico para um país e protegidas por outro, obtidas, analisadas e disseminadas por
uma estrutura governamental especializada, para subsidiar o processo decisório com o
intuito de compreender ameaças externas presentes ou potenciais. Como atividade, a
Inteligência compreende a obtenção e análise de dados de interesse estratégico, bem como

2
KENT, Sherman (1949) Strategic intelligence for american world policy. Princeton: Princeton University.

11
a adoção de medidas de proteção às informações consideradas sigilosas pelo Estado
(Contrainteligência).

Por fim, o termo Inteligência é também usado para descrever as organizações que
conduzem as atividades supracitadas. Por produzirem informações de interesse
estratégico, esses órgãos empregam elevado grau de sigilo a fim de proteger os métodos
utilizados para obtenção e análise dessas informações. Essa última característica favorece,
inclusive, a incorporação por algumas agências de Inteligência de atividades voltadas não
para a obtenção ou proteção de dados privilegiados, mas sim para a atuação pró-ativa5 na
consecução de objetivos de política externa (Kent, 1949: 2-3 citado por Ibid).

4.1.Inteligência e Segurança

As primeiras organizações permanentes e profissionais de Inteligência e de Segurança


surgiram na Europa moderna a partir do seculo XVI. Tais organizações surgiram no
contexto da afirmação dos Estados nacionais como forma predominante de estruturação
da autoridade política moderna (Capic, 2001: 85-86). Ademais, a inteligência em estudos
de segurança gira em torno da coleta, comparação e análise de informações. Existem
diferentes definições de diferentes autores, mas todas centradas na coleta e avaliação de
informações (Afolabi, 2018: 1).

Entretanto, o surgimento dos serviços de inteligência modernos foi predominantemente


um fenómeno causado por atos intencionais. Onde os Reis e Ministros Europeus
modernos, em seu processo de competição com os outros governantes e no esforço de
implementar sua dominação sobre territórios e populações cada vez mais amplos,
mobilizaram recursos e criaram organizações especializadas na obtenção de informações.
A criação dos serviços secretos foi uma das respostas às necessidades gerais dos
governantes em termos de redução dos custos de transação associados a obtenção de
informações (Capic, 2001: 89).

Dai que avança afirmando que os governantes tendem a justificar institucionalmente e a


delimitar os serviços de inteligência em termos de sua necessidade para a segurança
nacional. As propriedades, recursos, estruturas organizacionais, missões e alvos das
operações de inteligência e de contrainteligência são definidos e hierarquizados na melhor
das hipóteses, segundo na escala de preferências dos responsáveis pela segurança
nacional (Ibid: 138).

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De acordo com Lange (2007: 127), a pior guerra esconde-se sob a paz. Na conjuntura
internacional atual, a iminência de um conflito armado em larga escala dissipou-se. As
ameaças que agora pairam sobre os Estados são mais dissimuladas e, consequentemente,
mais imprevisíveis. Portanto, com o intuito de preservar seus interesses, evitar ou
minimizar o efeito de elementos nocivos e alcançar os objetivos estabelecidos por suas
políticas, é imprescindível que os países contem com serviços de Inteligência, pois, como
bem disse Vladimir Yefimovich Semichastny, diretor do serviço de Inteligência soviético,
o Komitat Gosudarstvennoy Bezopasnostii (KGB), de 1961 a 1967, “you cannot protect
a State with smiles and handshakes”3.

Avanca ainda afirmando que, Sherman Kent explica que as informações da grande
estratégia e da Segurança Nacional não são produzidas espontaneamente em função do
processo normal de governo; são elaboradas por meio de um mecanismo complexo e de
um intenso esforço dirigido nesse sentido. Por isso, é imprescindível a existência de um
órgão voltado para a atividade de Inteligência na estrutura de um Estado (Ibid). Dai que
os desafios da atividade de Inteligência crescem exponencialmente em variedade, volume
e velocidade. Ameaças transnacionais como terrorismo, crime organizado e apropriação
indevida de conhecimento, dentre vários outros, passaram a fazer parte da agenda de todos
os órgãos de Inteligência.

Nesta senda, invoca-se o argumento de Kent (1967) citado por Brito (2011: 94) que
advoga que, embora esse emprego tático do suporte informacional de inteligência sofra
críticas, como será analisado no decorrer deste trabalho, aparentemente o uso de
informações para subsidiar a tomada de decisões no campo de batalha tornou-se uma
realidade das modernas forças armadas. O enfoque realista também concede certa
relevância aos serviços secretos quanto à obtenção dos conhecimentos necessários à
gestão estratégica do Estado. Informações estratégicas sobre a evolução das forças
adversárias, de sua economia, do crescimento de sua população, dentre outros aspectos,
estiveram na agenda das agências como a CIA, desde a sua fundação. Contudo,
compreende-se que a inteligência vem atendendo as necessidades da segurança dos
Estados, entretanto, nota-se a ligação ou casamento entre a inteligência e a segurança.

3
Não se pode proteger um Estado apenas com sorrisos e apertos de mão.

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5. CONCLUSÃO

A segurança é a questão base dos Estados enquanto membros da sociedade internacional,


como bem disse um dos líderes Russos no âmbito dos serviços secretos, que “não se
promove a segurança através de sorrisos e apertos de mão”, ou seja, a diplomacia não
garante a segurança. Essa frase revela-nos que existe uma relação de interdependência
entre a Segurança, Estratégia e Inteligência. No sentido de que a insegurança dos Estados
promove a necessidade do uso da estratégia com o objectivo de o Estado saber se
posicionar perante a ameaça que lhe põe inseguro. Desta feita, há uma necessidade de
obter informações concretas sobre o objecto da ameaça, dai que surge a necessidade do
uso dos serviços de inteligência, que é para buscar informações, avalia-las assim como
analisar ou classificar com o objectivo final de partilhar com os decisores máximos da
segurança nacional para que lhes permita tomar decisões inequívocas sobre como abordar
certa ameaça.

Por outro lado, o Estado pode usar a inteligência para coletar informações sensíveis de
outro Estado com objectivo de o enfraquecer e ameaçar a segurança do mesmo. Dai que
os Estados optam pela estratégia da contra-inteligência. Contudo, denota-se que a
estratégia esta no espaço medio entre a Segurança e a Inteligência, por vezes a tem
trabalhado diretamente com assuntos militares, dais que a partir a estratégia se toma a
medida do uso da força. De modo geral, a segurança chama os serviços de estratégia, a
inteligência é a materialização e continuação da Estratégia.

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REFERENCIAS

Afolabi, Muyiwa (2018), Introduction to Intelligence and Security Studies; A Manual for
the Beginners. Published by Admoft Mega Ventures. Ikorodu-Nigeria.

Gierszewski, Janusz (2018), Personal security within The Human Security Paradigm.
Akademia Pomorska w Slupsku. Polonia.

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