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A relação entre as

alterações climáticas e a
segurança humana
UC
Seminário de Questões de Segurança
2021
Plano da apresentação
ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS E SEGURANÇA
HUMANA

Questão de partida, conceitos e


I considerações gerais

II A relação «inevitável»
II
Remate crítico

I
Questão de partida, conceitos e
considerações gerais
I. Questão de partida

Existe uma relação entre o fenómeno das alterações climáticas e o


conceito de segurança humana?
I. Alterações climáticas

• São uma realidade na história evolutiva do planeta


• Durante milénios, a «pegada» humana no ambiente foi
absolutamente irrelevante, produzindo, no pior dos cenários,
impactos de escala meramente local ou regional

A Revolução Industrial do séc. XVIII marcou um


novo ciclo na relação Homem-Natureza
I. Alterações climáticas

O Homem, através da utilização massiva de sistemas de energia assentes em


combustíveis fósseis, tornou-se capaz de afetar expressivamente o equilíbrio do
ecossistema planetário

O desenvolvimento que adveio da «nova» capacidade humana de exploração dos


recursos materializou-se:
 num progresso industrial e tecnológico sem precedentes, que se traduziu
 num aumento populacional, também ele, sem precedentes
I. Alterações climáticas
Tudo isto desencadeou um ímpeto na procura e extração de recursos, o qual se
intensificou com o dealbar da era da globalização, e que – para além da alteração dos
ecossistemas, ciclos do clima ou aquecimento médio da temperatura global - surte
também efeitos na:
• Destruição de habitações, infraestruturas (hospitais, escolas, redes de distribuição
elétrica ou saneamento básico) e colheitas
• Rutura na produção alimentar
• Redução do acesso a fontes de água potável
• Afetação das populações mais vulneráveis, que se encontrem particularmente em
contextos de desigualdade ou exclusão social, económica, cultural política e institucional
ou cuja subsistência depende fortemente dos recursos naturais.
I. Segurança humana
Até aos anos 80, a segurança assentava na conceção restrita de capacidade de defesa
de um Estado face a possíveis ameaças à sua soberania política e integridade
territorial.

Esta ideia emergiu de um ambiente anárquico e competitivo, que


resumia o estudo da segurança às dinâmicas bélicas.

No seio da complexidade de ameaças que envolvem o atual sistema


internacional, levantam-se novos ditames do paradigma securitário e o
Estado-nação é obrigado a reequacionar o seu papel.
I. Segurança humana
Ainda que a segurança se mantenha como uma função prime do Estado, o paradigma
atual da segurança abandonou a conceção estatocêntrica e deslocou o objeto da
segurança para o cidadão e para a sociedade

Graças à multiplicação de conflitos intraestatais e o ecoar de expressões como “Estado


falhado” (usada para identificar Estados cujas tensões políticas, sociais e económicas
internas comprometem não só a sua responsabilidade na proteção dos seus cidadãos,
como constituem uma possível ameaça à paz e à segurança internacional)

Emerge um novo entendimento que coloca o seu âmago nos conflitos internos e na
questão do desenvolvimento sustentável do indivíduo
I. Segurança humana
Redefinida a noção de segurança nacional, novos e correspondentes desafios se
levantam, como ilustra o Relatório do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) de 1994, passando a integrar a agenda da segurança:

terrorismo
violação dos direitos humanos migrações

alterações climáticas e degradação ambiental

injustiça social pressão demográfica


I. Segurança humana
Sistematização da evolução do conceito através de dois processos distintos:

Vertical
A nova agenda de segurança permeabiliza as fronteiras do Estado, enquanto objeto exclusivo do
estudo securitário, passando o indivíduo, a comunidade localizada no seu interior, a ser
determinante para a manutenção da segurança internacional

Horizontal
Há um processo de ampliação do «catálogo» de ameaças em consideração, reconhecendo a
respetiva multidimensionalidade, complexidade e interligação
I. Segurança humana
A figura da soberania

Sofreu uma reversão no âmbito do sistema internacional, que passa a considerá-la na


medida da garantia ou capacidade de um Estado em assegurar a segurança
humana das suas populações

Demarcando-se assim da conceção tradicional de segurança (estatocêntrica), o que


adquire maior sentido perante a hipótese de um Estado se tornar na própria origem do
perigo que ameaça a sua população
A relação inevitável
II. A relação inevitável

As novas conceções de segurança enredam-se agora num universo de


numerosas ameaças, complexas e interdependentes

Para lá dos Estados, atingem as


pessoas e as comunidades, por
sua vez, mais vulneráveis
II. A relação inevitável

Há um paralelismo existente entre a noção de segurança e de desenvolvimento


(sustentável)

Não será possível garantir o conjunto de condições mínimas de vida das


populações – adequadas ao desenvolvimento - num cenário em que casos de
devastação, vulnerabilidade e violência se repetem e prolongam
II. A relação inevitável

A ampliação do conceito de segurança é a via adequada a responder aos


desafios trazidos, neste domínio, pelas alterações climáticas

O relatório do PNUD 1994, ao assumir a necessidade de remoção dos obstáculos e


ameaças que comprometam o bem-estar de indivíduos e comunidades em várias
dimensões, entre as quais a ambiental, evidencia um novo ciclo na conceção da
agenda da segurança
II. A relação inevitável

“A maioria das pessoas entende instintivamente o que significa segurança. Significa


segurança face às constantes ameaças de fome, doenças, crime e repressão. Também
significa proteção perante transformações repentinas e dolorosas no padrão das
nossas vidas diárias - seja nas nossas casas, nos nossos empregos, nas nossas
comunidades ou no nosso ambiente”
PNUD 1994

O elementos presentes neste excerto permitem entender a crise climática, mais


do que uma ameaça por si, como uma séria potenciadora das restantes
II. A relação inevitável

A segurança humana - que tanto sentido faz na tutela contras as ameaças


quotidianas e persistentes, comprometedoras do desenvolvimento, como são a fome
ou doenças – encontra no ambiente, e particularmente nas ameaças advenientes das
alterações climáticas, um elemento inevitavelmente securitizável

“A mudança climática é a maior ameaça à segurança humana e ao


desenvolvimento sustentável”
António Guterres (2018), SG ONU
II. A relação inevitável

E a soberania?

“A garantia da segurança e saúde para os cidadãos na fase avançada do industrialismo dos


perigos, deixou de ser uma tarefa que pode ser resolvido ao nível dos Estados-nação”
Ulrich Beck (2015)

A segurança dos Estados deixou de ser um fim em si mesmo,


colocando-os antes como servidores ativos de uma
responsabilidade de proteger os próprios povos
II. A relação inevitável

Em nome da segurança humana, permeabilizam-se as fronteiras estatais e a própria


soberania.

Vista da perspetiva contrária, uma conceção


intransigível de soberania seria tida como uma barreira
à garantia de segurança humana da população de um o qual, como já
determinado Estado dissemos…

foi preterido enquanto referencial do conceito de segurança


II. A relação inevitável

Ora, as alterações climáticas consubstanciam um fenómeno, pela


própria natureza dos seus efeitos, transnacional e apátrida.

A soberania, «a meio caminho» entre as ameaças ambientais e a


necessidade de proteção das populações no interior dos Estados, não pode
representar um obstáculo à segurança de indivíduos e comunidades e
tornar o Estado, que deveria ser o principal provedor de segurança, a
fonte de ameaça do seu próprio povo
II. A relação inevitável

A segurança humana tem um potencial emancipatório

Pois existe uma tentativa de mitigar ou eliminar os constrangimentos resultantes das


ameaças que obstam à realização humana e capacidade de autonomia

As alterações climáticas implicam um amplo potencial de danos e, no caso dos países em


desenvolvimento, estes verão a sua emancipação muito mais dificultada, sofrendo, de
forma severa e mais pronunciada – face a Estados onde existam já estratégias de resiliência
climática - os efeitos multiplicadores de danos resultantes das transformações ambientais
Remate crítico
III. Remate crítico

Longe vai o tempo em que o conceito de segurança se encerrava na dimensão nacional

O potencial devastador que ameaça as condições de vida das sociedades - e do tecido


humano existente para lá da cortina estadual - impõe a inevitável inclusão das mutações do
clima na agenda da segurança humana

O ADN construtivista do conceito de segurança humana veio romper os ditames


tradicionais e paradigmáticos da segurança e, bem assim, com a conceção estatocêntrica da
ordem internacional
III. Remate crítico

Desenvolvimento sustentável Segurança humana

Num cenário de destruição, falência de recursos e até violência associada, dilatado


por longos períodos de tempo, que ideia de sustentabilidade ou segurança pode
daí ser extraída, por menor que seja?

Também a soberania, não poderá ser nunca um entrave à segurança


humana, ou não estivéssemos a falar de riscos que não
conhecem nem se detêm em fronteiras
III. Remate crítico

É por esse motivo que, quando um Estado é incapaz de garantir a proteção dos
seus próprios cidadãos, impõe-se um dever internacional de proteger as
comunidades e indivíduos em risco, contando com a necessária elasticidade da
soberania nacional em causa

Os países em desenvolvimento são, neste ponto, os principais visados

Menos resilientes à severidade da mudança e mais dependentes dos recursos naturais


fornecidos pela natureza, posicionam-se como os principais focos de instabilidade
III. Remate crítico

As alterações climáticas não são mais do que um fator


exacerbador de vulnerabilidades pré-existentes, o qual,

dependendo do maior ou menor grau destas, tem a capacidade de


ameaçar comunidades e indivíduos, razão pela qual encontra

espaço na atual noção e agenda de segurança humana.


Obrigado

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