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INTRODUÇÃO

Vivemos em uma sociedade bastante cética sobre determinados


temas e isto, em parte, é fruto de obstáculos epistemológicos1 que
resultam em posturas de crenças sem o devido conhecimento das
evidências que podem nortear um verdadeiro senso de juízo. Quando
nos referimos por exemplo ao Êxodo Bíblico, lidamos com obstáculos
epistemológicos que vão desde o preconceito ao tema até uma
aceitação sem a busca das evidências que permitem dar à razão uma
resposta aceitável. Quanto a este tema em específico, por mais
incrível que possa parecer em um mundo tão cético, existe da parte
de acadêmicos estudiosos da arqueologia egípcia uma certa crença
na passagem dos hebreus no Egito e na ocorrência do Êxodo. O que
os leva a esta crença? E, se existe uma crença científica positiva
quanto ao tema, pode-se tomar a história bíblica do Êxodo buscando
um paralelo junto a história egípcia de modo a conciliá-las? Haverá
então harmonia entre os fatos e a cronologia a eles ligados de modo
tal que este método, somado a evidências arqueológicas, traga uma
sinergia à história do Êxodo, permitindo torná-la historicamente
incontestável?
Neste livro, a linha de pesquisa histórica tão adotada em filmes e
em grande parte da literatura colocando o Êxodo em uma data mais
tardia2, junto a 19ª dinastia egípcia, no governo de Ramsés, perde
todo significado frente a vasta pesquisa, cedendo lugar definitivo à
teoria moderna que arroja o Êxodo em um período mais recente
junto à 18ª dinastia egípcia.
Com base em extenso trabalho de pesquisa, se descortinam fatos
desde a chegada de Jacó e sua família no Egito, sua permanência, o
desenvolvimento de uma nação a partir do nomo familiar de Jacó, o
início da opressão, o surgimento de Moisés como o grande líder
libertador dos hebreus, o Êxodo e indo além, harmoniza-os no plano
histórico-cronológico egípcio, trazendo um excepcional resultado e
propondo dentro da moderna teoria do Êxodo mais recente, como
mãe egípcia adotiva de Moisés, não mais a Rainha Hatshepsut, mas a
Rainha Ahmose (Ahmés), filha do Faraó Ahmose e Ahmose-
Nefertari. Um livro técnico, mais envolvente, levará sem dúvida o
leitor a fazer descobertas e um novo juízo dos fatos e evidências do
Êxodo Bíblico.
Quero ainda destacar que escrever um livro técnico é uma missão
desafiadora, pois entendo que o público alvo pode ser um
pesquisador, mas também podem ser mentes diversas desejosas de
obter este tão valioso conhecimento. Como autor, preciso organizar
as informações de maneira clara, usar linguagem técnica, mas ao
mesmo tempo tornar esta escrita teórica atrativa a você leitor. Isto
implica que tenho de tratar de maneira adequada as referências
bibliográficas, notas de rodapé e citações de autores, mas, ao mesmo
tempo, tenho de amenizar a “linguagem acadêmica”. As tratativas
impessoais na linguagem, visto o método científico da pesquisa, são
necessárias, porém, ao intercalar onde possível com a linguagem
mais pessoal, espero tornar a leitura agradável de maneira que você
possa da primeira à última página ler e absorver este conhecimento.

1. Os obstáculos epistemológicos são entraves existentes para a construção do


conhecimento científico.
2. No inglês, “Early Date Exodus” é o termo para “Êxodo de data recente”, em torno de 1446
a.C., e o “Late Date Exodus” é a referência para o “Êxodo de data tardia”, em torno de 1270
a.C.
1
MÉTODO APLICADO À PESQUISA
BIBLIOGRÁFICA

A Bíblia é sem dúvida um livro universal com textos de valor


sagrado em todo ou em parte para religiões como o cristianismo,
judaísmo e outras, mas é o caráter histórico de seu texto que gera
interesse à ciência. Seus mais antigos escritos remontam a 1.500 anos
antes de Cristo e são reconhecidamente de valor histórico, sendo
desde remotos tempos usados como fontes para pesquisa
arqueológica e histórica propriamente dita. A arqueologia Bíblica, por
exemplo, empreende em seus estudos períodos que vão desde o
Neolítico (8.500 a.C. – 4.300 a.C.), passando pela Idade dos Metais
(3.300 a.C. – 1.200 a.C.) e avançando por períodos Babilônico, Persa,
Helenístico, e chegando ao período Romano (63 a.C. – 324 d.C.). Este
processo histórico está perfeitamente incluído dentro do contexto
científico da “História da Humanidade”. Desta maneira, o Êxodo
Bíblico pode ser visto como um fato histórico passivo de prova pela
ciência histórica e arqueológica, isto, feito com ética científica,
permite remover o véu dos obstáculos epistemológicos, seja a
aceitação plena do tema sem a busca de evidências, seja o preconceito
ao tema. As evidências podem assim serem verificadas e um método
investigativo científico pode ser traçado através da harmonização do
registro cronológico histórico dos acontecimentos registrados na
história Bíblica do Êxodo, fazendo-se um confronto adequado com os
acontecimentos registrados na história do Egito Antigo.
É certo que existe uma fonte inesgotável de conhecimento
histórico e arqueológico respeitável, baseado em registros, livros,
artigos científicos e outros, que é, claro, produto de anos de pesquisa
de renomados pesquisadores e acadêmicos. É este material científico
que deve ser utilizado dentro de um estudo histórico aplicado ao
Êxodo Bíblico como matéria-prima. Este trabalho denominado de
pesquisa bibliográfica ocorre de maneira sistemática de forma a
construir um novo conhecimento ou atualizando o existente. A
análise científica desta fonte histórica deve computar os registros
históricos de tempo admitidos e comprovados como sistemas
confiáveis, verificando, analisando e ajustando os fatos históricos de
modo a reduzi-los em um sistema consistente no qual a história
Bíblica do Êxodo e a história do Egito antigo venham a se harmonizar
e corresponder entre si.
Joseph Ki-Zerbo, político e historiador, em seu livro “História
Geral da África”, faz o chamado uso lógico de dados narrativos para
determinar se um indivíduo viveu em determinada época pela lógica
do encontro temporal de outros indivíduos e o conhecimento que um
possui do outro. O uso da lógica em tempos e dados narrativos
históricos é viável e pode permitir também pontuar um fato histórico
“X” na narrativa histórica “A”, e encontrar na narrativa “B” fatos
histórico-arqueológicos “Y”, “Z” e outros, que se harmonizem dentro
de um tempo. Pode-se então formular uma lógica e declarar que o fato
“X” de “A” está em harmonia com os fatos “Y, Z e outros” de “B”,
fazendo assim com que parte da narrativa histórica de “A” seja
verdadeira em relação à narrativa histórica de “B”.
FIGURA 1: Interseção de Fatos Históricos I / Fonte: autor

Tomando-se a narrativa histórica “B” como uma referência de


prova e evidência para a narrativa histórica “A”, descobre-se dentro
deste processo lógico que, quanto mais evidência “X = Y/ Z”, “X1 =
Y1/Z1”, “X2 = Y2/Z2” é encontrada, mais “A” entra em “B”, permitindo
inclusive que a narrativa histórica “A” possa ser comprovada e
evidenciada pela narrativa histórica “B”, é claro, dentro de limites
estabelecidos.

FIGURA 2: Interseção de Fatos Históricos II/ Fonte: autor

No que diz respeito à narrativa histórica do Êxodo Bíblico, busca-


se no trabalho de pesquisa bibliográfica a aplicabilidade desta lógica
a partir de macroeventos, pois são estes acontecimentos, como Hales
(1830) bem declarou, importantes na construção das evidências
necessárias ao método de harmonização histórico-cronológica. Cinco
macroeventos serão verificados na pesquisa metodológica, como
mostrado abaixo.

FIGURA 3: Macroeventos Estabelecidos / Fonte: Autor

Estes cinco macroeventos devidamente designados da história


Bíblica do Êxodo por sua importância e ocorrência devem ser
analisados com os eventos da história do Antigo Egito, tendo-se esta
como o padrão de averiguação.

FIGURA 4: Harmonização Histórica e Cronológica dos Eventos / Fonte: autor

Um plano de ajuste e harmonização histórico-cronológico da


história do Êxodo com a história do Egito Antigo deve então permitir
encontrarmos as evidências históricas e arqueológicas bem definidas
e estáveis, não se aceitando em hipótese alguma as acomodações de
datas sem base cronológica científica e, desta maneira, atestar a
história do Êxodo na história do Antigo Egito. Para tornar mais claro
o método, sabe-se que a história do Egito se inicia em
aproximadamente 3.000 a.C., o que, se considerar até o ano “zero” da
era cristã, tem-se exatamente 3.000 anos de história. De maneira
semelhante, a história do Êxodo Hebreu, desde a chegada de Jacó e
sua família ao Egito até a saída por mão de Moisés, ocorre em um
período de 430 anos. Suponha-se hipoteticamente que toda a história
do Egito Antigo seja compactada em uma régua de 3 metros ou 3.000
mm, onde cada milímetro represente um ano de história. Agora
também de forma hipotética toma-se uma régua com 43 cm ou 430
mm e denomina-se como história do Êxodo Hebreu, ora, é claro que
cada milímetro representando um ano histórico tenha eventos e fatos
que não podem ser alterados ou retirados de sua sequência de
ocorrência. Agora, então, é tarefa do pesquisador tomar esta régua
menor e ajustar seu frame histórico à régua maior de maneira que haja
perfeita harmonização dos fatos. Isto significa que não se pode criar
estiramentos, supressões ou intercalação de tempos ou narrativas
históricas, ao contrário, a interposição deve se adequar
harmoniosamente ao frame da história do Egito antigo, de maneira
bem definida, estável e sem causar problemas históricos.

FIGURA 5: Régua de tempo/ Fonte: autor

Conclui-se que este confronto histórico é pela harmonização


histórico-cronológica em si um método científico eficaz e capaz de
apresentar o Êxodo Bíblico como um fato histórico comprovado
dentro da narrativa histórica egípcia, a adequada “framerização”
permite inclusive estabelecer novos parâmetros interpretativos para
tal, como: o “Êxodo Bíblico em uma época mais recente”, a mãe
egípcia adotiva de Moisés não mais ser a Rainha Hatshepsut, mas a
Rainha Ahmose, como hipótese mais aceitável dentro do método
aplicado e outros.
2
TIRANDO O VÉU DE SOBRE O ÊXODO
BÍBLICO

Para desvendar junto a história, arqueologia e mesmo na geografia


antiga, a verdade sobre o Êxodo Bíblico, é necessário perguntar o
porquê, apesar de evidências do Êxodo, tanto em terras egípcias
quanto em Israel, imperar obstáculos epistemológicos no que tange à
confirmação deste fato. Devemos ir além e averiguar se é possível por
meio do método de harmonização histórico-cronológico, confirmar a
história bíblica do Êxodo no contexto da história egípcia antiga.
Hoffmeier (2015), em seu artigo acadêmico, desenvolveu brilhante
trabalho para mostrar a integração entre egiptologistas e as
narrativas do Êxodo. Introduz dizendo que os egiptólogos tiveram
inicialmente rico interesse na história bíblica do Êxodo, sendo que
Edouard Naville e Willian Mathew Flinders Petrie estavam entre os
pioneiros, havendo grande interesse na geografia e rota do Êxodo,
porém, em meados do século XX, mais precisamente em 1922, Sir
Alan Gardiner, renomado egiptólogo de Oxford, escreveu uma crítica
a Naville e outros que faziam uso dos relatos históricos bíblicos para
achar os sites associados a história do Êxodo. Naville faz réplica a
Gardiner, mas os questionamentos de Gardiner fizeram com que o
trabalho dos pioneiros egiptólogos na busca por cidades bíblicas
associadas ao Êxodo fosse bastante prejudicado.
Infelizmente, a forte condenação de Gardiner àqueles a quem podemos chamar
de “Egiptólogos Bíblicos”, eu creio, lançou uma mortalha por décadas sobre
sérias investigações de histórias bíblicas por egiptólogos. (Hoffmeier, 2015, pág.
200)

Hoffmeier (2015) continua dizendo que o lado positivo deste


debate na década de 1920 foi que a egiptologia se tornou capaz de
emergir como uma disciplina própria, independente dos interesses
limitados do historiador bíblico. Em certo sentido, Gardiner e Peet
fizeram pela egiptologia o que Willian Dever fez para a arqueologia
Siro-Palestina na década de 1970 e 1980, estabelecendo-a como uma
disciplina em seu próprio direito, porém afirma haver um silêncio
causado pela virada de 1920-1930 quanto às pesquisas referentes aos
sites bíblicos e, em especial, aos ligados ao Êxodo. Ocasionalmente, a
partir da década de 1930, houve egiptólogos escrevendo sobre o
problema da permanência israelita e o Êxodo, Alfred Lucas,
Wolfgang Helck, Manfred Gorg, Bernard Couroyer e outros.
Hoffmeier (2015), em vista deste pouco interesse por parte dos
egiptólogos em pesquisas com o tema do Êxodo, foi levado a
desenvolver uma pesquisa com estudiosos da egiptologia para
entender este fenômeno e foi surpreendido ao verificar a firme
crença por grande maioria dos estudiosos pesquisados quanto à
veracidade do Êxodo Bíblico.

Você acha que os primeiros israelitas viveram no Egito e que havia algum tipo
de êxodo? Dezenove responderam SIM. Nenhum disse NÃO, mas quatro
indicaram que possivelmente aconteceu ou que eles não tinham certeza. Apenas
um que se descreveu como inseguro, tinha cerca de 30 anos antes, escrito
positivamente sobre o êxodo, mas tinha seguido cético nos anos seguintes. A
declaração negativa mais forte é que era “improvável”. Curiosamente, essa
opinião veio de Oxford, antigo reduto de Gardiner. E um optou por não
responder à pergunta. Alguns que afirmaram a historicidade de um êxodo do
Egito adicionaram a sua resposta comentários interessantes, como: “Eu não
acho que haja qualquer dúvida sobre isso.” ou “Eu não vejo nenhuma razão para
que a permanência israelita no Egito tenha sido fabricada (...).” Devo admitir ter
sido surpreendido pela resposta amplamente positiva à questão da historicidade
da permanência (israelita no Egito) e do êxodo (...) (Hoffmeier, 2015, pág. 200)
Hoffmeier (2015) verificou que, apesar do fato da maioria dos
egiptólogos crer que o Êxodo foi um evento histórico, havia a
sensação de que este debate tem implicações religiosas muito
pesadas. Este fator é facilmente entendido quando analisado em
Duzilek (1989)3, os obstáculos epistemológicos à pesquisa científica,
como o preconceito que impede o investigador de ver além da
chamada “implicação religiosa”, o tradicionalismo imputado na
virada de 1920 por Gardiner e os “Ídolos do Teatro”, representados
pela atual vinculação política. Qualquer trabalho arqueológico
contemporâneo que venha confirmar as evidências de Israel no Egito
certamente é influenciado pelas tensões políticas ou ideológicas,
sejam elas, Egípcia-Israelense, Árabe-Israelense, Marxista-
capitalista, que tendem a criar representações, fábulas ou teatros
para explicar a realidade. Veja que o próprio problema da existência
histórica de Israel, o que é requerido pelos Israelenses para sua
existência atual como nação frente aos problemas de questionamento
territorial por parte dos Palestinos, é um exemplo, pois se por um
lado vem a favorecer a prova da antiguidade do povo judeu e seu
direito à terra, esta narrativa pode não ser interessante aos interesses
dos palestinos que também pleiteiam sua antiguidade e direito à
terra na Palestina.

Como em muitas regiões contestadas, o passado está sempre presente (...) aqui,
no entanto, o passado tem um peso muito maior do que qualquer outra região, e
os arqueólogos são aqueles que dão ao passado distante uma expressão física
palpável. Nesse sentido, arqueologia e política sempre foram interligados. Se a
arqueologia judaica e israelense tem sido caracterizada, por vezes, pela sua
missão histórico-nacional, o mesmo é verdade para o seu homólogo palestino.
Assim, a arqueologia foi mobilizada seja para fortalecer o vínculo entre o povo
judeu e a terra de Israel ou negar e ignorar tal relacionamento. Sem prejudicar
seu valor científico objetivo, a arqueologia contribui para a elaboração de novas
identidades coletivas baseadas em novas narrativas do passado. Dentro do
contexto do conflito Israel-Palestino, toda e qualquer escavação tem o potencial
para adquirir conotações políticas e semear a semente da controvérsia (...)
(Greenberg e Keinan, 2007, pág. 7)
Outro exemplo pertinente a estes obstáculos epistemológicos está
presente nas chamadas tensões ideológicas marxismo-capitalismo.
Arlegue (2014) declara que o maior desafio do proletariado
internacional e regionalmente é encontrar uma maneira de entender
o conflito Palestino e Israelense de maneira a elaborar a melhor
estratégia para levar a cabo a luta de solidariedade contra o processo
de ocupação e o imperialismo.

Os marxistas de todo o mundo podem servir à luta dos palestinos não apenas
participando de atividades que são diretamente solidárias com o povo palestino,
mas também fortalecendo os movimentos anti-imperialistas e anticapitalistas
em nossos próprios países. A campanha e a luta por uma Palestina livre devem
se tornar uma parte importante das lutas pelos refugiados indígenas e direitos
das mulheres, bem como as lutas contra o racismo, pelos direitos civis e direitos
humanos e pelos direitos dos trabalhadores. Isto significa tornar a luta palestina
uma parte real dessas campanhas, e não apenas uma reflexão tardia (Arlegue,
2014, pág. 18)

Fica assim evidente que no método de pesquisa científica, a


pesquisa pode, sim, sofrer as interferências da cosmovisão do
momento e do ambiente onde é produzida. Ao responder o porquê,
apesar de evidências do Êxodo tanto em terras egípcias quanto em
Israel, ainda imperarem obstáculos epistemológicos no que tange à
confirmação deste fato, a resposta é clara. Hoffmeier (2015) declara,
ao verificar o dano causado na “virada de 1920” pelas objeções de
Gardner à pesquisa histórica bíblica do Êxodo, que estas trouxeram
preconceito e tradicionalismo quanto à pesquisa, mas a resposta
deve ir além ao verificar-se que as questões político-ideológicas, sem
dúvida, tem também tido influência quanto a esta questão e, por fim,
estes obstáculos epistemológicos geram certamente respostas
evasivas quanto ao tema, mesmo apesar de existirem evidências tão
conclusivas quanto ao Êxodo.
Quando se entende a problemática dos obstáculos
epistemológicos quanto ao tema do Êxodo, tira-se dos “olhos da
ciência”, se assim pode-se falar, o véu que cobre evidências, e passa-
se a ver de maneira isenta os fatos claros e tangíveis que tornam o
Êxodo um fato histórico, passivo de pesquisa, de ser verificado e
inclusive de ser considerado historicamente incontestável. Nesta
linha é possível, sim, por método de harmonização histórico-
cronológico, confirmar a história bíblica do Êxodo no contexto da
história egípcia antiga. É observável que já em 1830, Dr. Willian
Hales4, em seu livro “Nova Análise da Cronologia e Geografia”, fazia
excelente debate sobre o processo científico de harmonização entre o
que ele chamou de “história sacra e profana”. Hales (1830)5 declara
que a técnica cronológica é uma arte que computa as mais diversas
medidas de tempo, sejam elas naturais ou instituídas, usadas pela
história para o registro de fatos, calendários ou crônicas, e que estas
medidas de tempo são fundamentadas pela astronomia e pelo
próprio curso da natureza, o que, uma vez admitidas como provas,
geram derivadas de leis, sistemas, doutrinas e probabilidades.
A cronologia histórica é então a arte de computar, ajustar e
verificar os espaços de datas fornecidas pela história de acordo com
certas épocas importantes, reduzindo-as a um sistema consistente no
qual a história bíblica e a história geral possam ser harmonizadas e
gerarem assim a devida correspondência de uma com a outra. Hales
já sintetizava em 1830, no campo da pesquisa histórica, o que hoje é
bem conhecido, pois é possível com base em dados cronológicos e
históricos harmonizar duas narrativas históricas. Ki-Zerbo (2010)6, ao
falar sobre a possibilidade de se converter uma cronologia relativa de
gerações em cronologia absoluta, no que tange a procedimentos para
determinar duração média de um reinado, declarou que é possível
coordenar diferentes sequências vizinhas, separadas e relacionadas
pelo estudo dos sincronismos dos eventos e harmonizar as duas
cronologias em questão, combinando-as em uma. Ele afirma que se
pode mostrar por exemplo que indivíduos A e B viveram na mesma
época (pelo fato de terem se conhecido), ou que indivíduos A e C
viveram na mesma época (apesar de não se conhecerem), porque
ambos conheceram B (em algum momento) e que, portanto, pode-se
deduzir que A=B=C (A, B e C viveram na mesma época), sendo o
limite demarcado por A=B (tempo limite de vida de A e B). Vimos no
capítulo anterior que a aplicabilidade de lógica no método de
harmonização histórico-cronológico é simples e eficaz, tem-se
evidências na narrativa da História “A” e tem-se evidências na
narrativa da História “B”, portanto, se existe harmonia da narrativa
de “A” em “B”, conclui-se que a narrativa histórica de “A” é
verdadeira em relação à narrativa histórica de “B”, e vice-versa. De
maneira análoga, a história bíblica do Êxodo possui evidências e
narrativas históricas que podem ser analisadas quanto de sua
harmonização com a história do Egito antigo. Para isto não se faz
necessário construir provas a partir de pequenos eventos, achados,
descobertas, mas a partir de macroeventos, de eventos importantes,
conforme Hales (1830) bem delineou. Detalhes como nomes e peças
arqueológicas são fantásticos do ponto de vista da experiência,
publicidade e da somatória para compor-se o evento maior, mas não
para comporem uma prova final e eficiente quanto à narrativa
histórica final. São os macroeventos, os eventos importantes e
marcantes para a composição final de um método eficiente e eficaz.
No que tange à busca da harmonização histórico-cronológica da
história do Êxodo Bíblico com a história do Egito antigo, são
delineados cinco macroeventos a serem verificados na pesquisa
metodológica:
– A chegada de Jacó e sua família no Egito;
– O estabelecimento da família de Jacó no Egito;
– O início da opressão;
– Eventos até Moisés e, finalmente;
– O retorno de Moisés ao Egito e a saída dos israelitas.
A pergunta que se faz à ciência histórica e arqueológica é se estes
importantes e cruciais eventos da história bíblica do Êxodo Hebreu
encontram respaldo na história do Egito antigo, pelo que, se existe
harmonização histórico-cronológica, é implícito e incontestável a
narrativa bíblica do Êxodo. Iniciamos, assim, a partir deste capítulo,
a navegar pelos macroeventos assinalados e fazer a construção das
evidências arqueológicas e históricas do Egito antigo de maneira a
demonstrar a historicidade do Êxodo Bíblico e apresentar o mesmo
como fato histórico e incontestável neste plano metodológico.

3. Duzilek, 1989, pg. 40,41


4. Hales, 1830, Prefácio
5. Hales, 1830, pág. 3
6. Ki-Zerbo, 2010, pág. 159,160.
3
A CHEGADA DE JACÓ E SUA FAMÍLIA NO
EGITO 1876 a.C.

“Estes, pois, são os nomes dos filhos de Israel, que entraram no Egito com
Jacó; cada um entrou com sua casa: Ruben, Simeão, Levi e Judá; Issacar,
Zebulom e Benjamim; Dã, Na ali, Gade e Aser. Todas as almas, pois, que
descenderam de Jacó foram setenta almas; José, porém, estava no Egito.”
(Êxodo, 1.1-5)

Esta é a saga da família de Jacó em sua jornada da terra de Canaã


para o Egito narrada na Bíblia Sagrada e também o primeiro
macroevento a ser estudado. A terra de Canaã estava sendo assolada
por terrível seca que poria em risco a sobrevivência da família de Jacó,
havendo ainda o fato de Canaã ser uma terra habitada por povos
altamente pagãos, envolvidos em conflitos e guerras intermináveis, o
que toda esta problemática poderia ser nefasta para o futuro da nova
nação. José estava no Egito e, por mão de Deus, após anos de
sofrimento e prova, havia se tornado Vizir e Primeiro Ministro de
Faraó, o que, por esta ocasião, após encontros com seus irmãos e a
revelação de sua identidade, pede para seu pai vir com toda a família
morar no Egito, e assim Jacó, sob a direção de Deus, parte de Canaã
para a terra dos faraós. Todo este fato ocorreu em aproximadamente
1.876 a.C., no tempo em que governavam os Faraós Senuseret II e
Senuseret III, durante a 12ª dinastia no Reino Médio Egípcio.
FIGURA 6: File:Beni Hassan (Lepsius, BH 3). Disponível em
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Beni_Hassan_(Lepsius,_BH_3)_03.jpg. Acesso em
07/03/2018.

“E tomaram o seu gado e a sua fazenda que tinham adquirido na terra de Canaã e vieram ao Egito,
Jacó e toda a sua semente com ele. Os seus filhos, e os filhos de seus filhos com ele, as suas filhas, e as
filhas de seus filhos, e toda a sua semente levou consigo ao Egito.” (Gên. 46.6,7)

Gênesis 46.6,7 aponta que Jacó levou consigo para o Egito seus
filhos, seus netos, suas filhas e suas netas, isto é, todos seus
descendentes. Ao final do texto, é contado setenta almas,
compreendendo 12 filhos, 50 netos, 4 bisnetos, José e seus dois filhos
no Egito e o próprio Jacó. Deve-se observar que as noras, apesar de
pertencerem ao clã, não foram contadas em virtude do costume
antigo de se contar os descendentes diretos. A família de Jacó foi
assim morar no melhor da terra do Egito, em uma região chamada de
Gósen.
“E José fez habitar a seu pai e seus irmãos e deu-lhes possessão na terra do Egito, no melhor da terra,
na terra de Ramsés, como Faraó ordenara.” (Gên. 47.11)
“Assim, habitou Israel na terra do Egito, na terra de Gósen, e nela tomaram possessão, e frutificaram,
e multiplicaram-se muito.” (Gên. 47.27)

Quanto à chegada de Jacó e sua família ao Egito, pode-se iniciar,


fazendo-se recorrer à pesquisa do egiptólogo britânico e catedrático
de arqueologia egípcia Ian Shaw, escritor de vários livros, dentre eles
“The Oxford History of Ancient Egypt”, que concentrou seus
trabalhos principalmente em Amarna (antiga Avaris). Declara neste
livro que existem numerosas referências arqueológicas da chegada de
diversos povos asiáticos em período anterior ao segundo período
intermediário, já na 12ª dinastia entre os anos de 1985-1773 a.C.

As referências aos asiáticos são numerosas no Médio Reino: eles trabalhavam em


uma variedade de ocupações, às vezes adotando nomes egípcios, mantendo a
designação “asiática”(aamu). Esses imigrantes foram considerados migrantes
econômicos (...) (Shaw, 2003, P. 157)

Shaw (2003)7 cita o empreendedorismo de Amenemhat III, filho


único de Senusret (1831 - 1786 a.C.), que se aproveitando de um longo
período de paz em seu reinado, fortaleceu a fronteira de Semma,
ampliou fortalezas, construiu numerosos santuários e templos e uma
enorme estrutura em Biahmu. Numerosas inscrições registram
atividade de mineração na região do Sinai onde oficiais do rei
trabalhavam na extração de turquesa e cobre. Esta próspera fonte de
trabalho e renda, subsidiada pela extensiva construção de edifícios,
atraiu a chegada de grandes contingentes de povos asiáticos (aamu,
setjetiu, mentijiu ou tetjenu), o que pode ter sido um fator de
encorajamento da chegada dos hicsos e sua posterior ascensão como
senhores do baixo Egito.

Ironicamente, a grande entrada de asiáticos, o que parece ter ocorrido em parte


para subsidiar o extenso trabalho de construção pode ter encorajado os
chamados hicsos a se instalarem no Delta (...) (Shaw, 2003, P. 157)

Shaw (2003)8 revela que aamu foi um termo contemporâneo (do


Segundo Período Intermediário) para distinguir os egípcios dos
asiáticos que habitavam em Avaris, porém este termo já era usado
muito antes deste período. Os egípcios chamaram estes povos
asiáticos de aamu, o que denotava, em um senso geral, vários povos
habitantes da Síria e da palestina e que os atuais egiptólogos os
denominam de “povos asiáticos”. O termo “hicsos” chegou no Egito
derivado do grego e se “generalizou” como “epithet hekau khasut” ou
“governantes de países estrangeiros”, sendo aplicado apenas aos
governantes asiáticos. Ao citar a história bíblica dos irmãos de José
vendendo-o como escravo (Gen. 37. 28-36), Shaw a entende como uma
fonte que sugere outra maneira pela qual alguns destes imigrantes
chegaram neste período pelo comércio de escravos.

Parece ter havido um grande número de asiáticos no Egito até essa data; alguns
deles foram presos anteriormente, mas o relato bíblico dos irmãos de José
vendendo-o como escravo de um egípcio mestre (Gênesis 37: 28-36) pode sugerir
outra maneira em que alguns desses imigrantes chegaram. (Shaw, 2003, P. 175).

Shaw (2003)9 deixa claro que estes imigrantes asiáticos às vezes


adotavam nomes egípcios, porém mantendo a designação “asiática”10.
Grimal (2005)11,12, egiptólogo francês, também confirma que antes
mesmo da ascensão plena dos hicsos ao poder, houve uma infiltração
gradual de imigrantes asiáticos distintos, como os: aamu, setjetiu e os
mentijiu ou tetjenu. O papiro do Brooklin, quanto a este fato, é um
documento extraordinário que corrobora a presença de povos
asiáticos de diferentes etnias durante a 12ª e 13ª dinastia egípcia.
Posener (1957) informa que o material fora adquirido por um
egiptólogo amador, Charles Edwin Wilbour, em suas viagens ao Egito.
Em 1986, após sua morte, sua família doou o material ao “Brooklin
Museum”13. O rolo é provavelmente proveniente de Tebas, de um lado
tem inscrições que o datam do reinado de Amenemhat III (1831-1786
a.C.) da 12ª dinastia e, do outro lado, inscrições que o datam de um
período mais recente, da 13ª dinastia. O papiro apresenta, em parte
do texto, uma lista nominativa de 95 pessoas, organizando cada
indivíduo por seu título, nome e, se aplicável, apelido e ocupação.
Destes, destacam-se 29 indivíduos egípcios e 48 asiáticos, sendo que
há um indicativo de serem escravos, não como pessoas sem nenhum
direito, pois muitos são registrados por suas ocupações, mas como
imigrantes que se submeteram a determinada situação serviçal em
troca de uma recompensa econômica. Posener (1957, pág. 161), acerca
deste fato, declara que: “Se a origem desses escravos precisa ser mais
bem determinada, permanece o próprio fato de sua presença”.
William Foxwell Albright14, ao examinar o material, percebeu sinais
na escrita, característicos de povos semíticos do norte, e ele descreve
que, o nome de número 1115 por exemplo, feminino “Mnkml”,
corresponde ao hebraico Menahhen, no número 2716, masculino,
“Tsbtw” é comparado por Albrigth à palavra “herbage”, hebraico
“oseb”, no número 37, (fem.), “‘lbi”, bem como no número 87 (fem.)
“libtw”, derivam da raiz “ikb”, popularizado pelo nome bíblico Jacob,
sendo que os outros diversos nomes e expressões demonstram
claramente este modelo. Albrigth deixou claro que o estudo do papiro
não permitia especificar qual o grupo de asiáticos (aamu, setjetiu,
mentijiu/tetjenu ou hicsos17), que está ali representado, mas estava
satisfeito da comprovação que se tratava de um grupo semítico do
Noroeste. Certamente Albrigth, apesar de não especificar “qual era o
grupo de asiáticos” ao pontuar estes hebraísmos nos nomes, deu à
ciência o indicativo que entre os listados no papiro do Brooklin, havia
também pessoas de um grupo particular de imigrantes asiáticos
ligados a uma etnia específica e com esta característica linguística
ligada a estes hebraísmos.
Outro ponto claro no papiro é que muitos dos estrangeiros foram
trazidos para atividades em um campo de trabalho asiático e existem
testemunhos que mostram uma certa promoção destes estrangeiros
em suas diversas atividades e até uma miscigenação étnica. Posener
(1957, p.155) afirma que “As mulheres entram nas famílias egípcias
pelo casamento (...)”. Seguindo esta linha de pensamento, Posener
observa que o papiro do Brooklin possui o mais completo silêncio em
assunto do comércio internacional de escravos (não que não houvesse)
e cita o caso de José, vendido pelos Midianitas a Potifar, como um
caso especial.

Mas os textos observam o mais completo silêncio em assunto do comércio


internacional de escravos, e somos reduzidos, como é o caso W. C. Hayes (p. 99),
para citar como exemplo José, vendido pelos midianitas a Potifar (Posener, 1957,
P. 158).
Com esta citação, Posener não faz qualquer alusão que algum dos
nomes citados no documento esteja relacionado ao José bíblico, mas
coloca a história bíblica de José no mesmo momento histórico do
documento e demonstra que este período apresenta mudanças sociais
como a crescente imigração de asiáticos e a miscigenação étnica,
permitindo até mesmo a José, vendido a Potifar, tornar-se um serviçal
com certos privilégios, alcançando, apesar das vicissitudes, promoção,
e, mais tarde, o cargo de Vizir (Primeiro Ministro) do Egito dado pelo
próprio faraó. Uhlemann (1856), egiptólogo alemão, também confirma
a plausibilidade do relato bíblico de José no Egito com base nas
similaridades dos costumes, forma de vida e o caráter narrativo.

(...) os escravos da casa se tornaram membros considerados pela família e, mesmo


como comprados, crianças nascidas de escravos eram consideradas como iguais.
Os escravos do Estado (...), especialmente prisioneiros de guerra e criminosos,
eram empregados em edifícios públicos e nas minas. Que houve escravos
comprados no Egito há provas finalmente, comunicados por Diodoro (I, 70) (...).
Até agora, como vemos, a narrativa mosaica é perfeita com esta época, seja nos
costumes, forma análoga da vida egípcia e seu caráter de alta ordem. (Uhlemann,
1856, p. 21)

O papiro do Brooklin, como afirma Shaw (2003), faz parte das


numerosas evidências de asiáticos chegando no Egito entre a 12ª e
13ª dinastia do Reino Médio, confirmando inclusive a chegada de
estrangeiros com nomes caracteristicamente “hebraicos”18, o que
contextualiza-se harmoniosamente com a narrativa bíblica da
imigração de Jacó e sua família para o Egito no mesmo período.
Corroborando ainda com este fato, importantes evidências da
presença de “asiáticos” no Egito foram descobertas em Beni Hassan,
sítio arqueológico do Reino Médio, que foi encontrado na margem
oriental do Nilo, cerca de 160 km do Cairo. Este site possui 39
tumbas, onde se destaca para o entendimento da migração de
asiáticos, a tumba de Khnumhotep II, a qual apresenta eventos
ligados a este período dos aamu. Janice Kamrin, Ph.D. em
Arqueologia Egípcia, escrevendo para o Jornal de Antiguidades do
Centro de Investigação Americano no Egito, faz notável descrição da
mesma.

FIGURA 7: Cena dos aamu de Shu – Imagem png renderizada pelo autor. Disponível em: By
NebMaatRa - Own work, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?
curid=4390535File:Beni Hassan (Lepsius, BH 3). Acesso em 19/11/19.

A tumba de Khnumhotep II19 é uma das trinta e nove tumbas escavadas em rocha
do período do reino médio nas encostas em Beni Hassan. 13 das tumbas onde há
capelas tumulares decoradas. As inscrições em suas paredes, que em vários casos
incluem extensivas biografias, identificando dez dos seus proprietários como os
mais altos oficiais. O túmulo BH³ foi concluído durante o reinado de Senusret II,
e é o último da série (...) Khnumhotep II não era um governador, mas um
administrador do lado oriental. Alguns estudiosos consideram que ele teria sido
encarregado da parte marginal do deserto, no lado leste do vale do Nilo,
esticando-se o caminho até o Mar Vermelho. (...) A tumba de Khnumhotep II é
uma obra prima artística e arquitetônica. A capela superior possui uma fachada
com pátio, o qual possui um pórtico de entrada adornado com duas colunas
multifacetadas. A principal câmara da capela é uma grande sala quadrada em que
quatro colunas de pedra apoiam um triplo teto abobadado. Para o leste existe um
nicho de culto que, uma vez, continha uma estátua esculpida em pedra. As
paredes da capela foram rebocadas e, em seguida, pintadas com cenas e textos
muito bem executados, criando o efeito de uma rica tapeçaria (...). No lado oeste,
ou na parede de entrada, há uma variedade de cenas (...) A parede norte é
dominada por duas figuras de grande escala do dono do túmulo (...) abaixo e à
direita (leste), ele se levanta e recebe procissões dos oficiais, peticionários, e
escribas, bem como o grupo de estrangeiros que forma o foco deste artigo. A
procissão de estrangeiros ocupa o terceiro registo da parede do Norte (...) A
cena é única no repertório da arte funerária egípcia. Sua natureza incomum, e
a aparente precisão de seus detalhes, torna muito provável que seja uma
representação, ou pelo menos uma alusão, a um evento especial. (Kamrin, 2009,
p. 1,2).

Esta descoberta trouxe particular interesse para a arqueologia


mundial em virtude das pinturas representando “pessoas asiáticas” ou
a “cena dos aamu de Shut” apontarem para a possibilidade de se
referir a chegada de Jacó e sua família ao Egito. As pinturas foram
publicadas pela primeira vez em 1845 pelo cientista Frances François
Champollion. Um exame das figuras dos “asiáticos” mostra
claramente pessoas com pele e olhos mais claros, penteado diferente,
vestes muito coloridas, o que é contrário à vestimenta que os egípcios
usavam (predominantemente o branco), demonstrando claramente
tratarem-se de imigrantes asiáticos. Kamrin (2009, p. 24) descreve uma
inscrição e um documento real em especial: “A cena é captada por
uma linha horizontal de hieróglifos que se iniciam acima da cabeça
do primeiro oficial egípcio e corre para o ponto sobre o segundo
estrangeiro da procissão (figura 7)”. Percy E. Newberry20 trabalhou
nas escavações de Beni Hassan e fez anotações valiosas, traduzindo os
hieróglifos representados nas paredes das tumbas, inclusive esta
inscrição em especial, denominada de cena 1, linha 3 dos aamu.
FIGURA 8: Transcrição e tradução por Percy E. Newberry da cena 1, fila 3. (Newberry, 2009.
p. 69). Disponível em: https://digi.ub.uni-heidelberg.de/diglit/newberry1893bd1/0087/image.
Acesso em: 19/11/2019

A tradução para o português da linha 3, transcrita por Newberry e


apresentada na figura 8, fica assim:

A Linha 3. Mostra uma procissão de estrangeiros, que é liderado pelo escriba real
Neferhotep, o qual é representado segurando na mão um rolo de papiro (...), sobre
o qual segue a seguinte inscrição: (...) “O ano VI, sob a majestade de Horus, o
guia das duas terras, o rei do Alto e do Baixo Egito, Usertsen II21. O número de
aamu trazidos pelo filho do prefeito, Chnemhotep, por conta do mesdemt
(pintura de olho, stibium ou kohl), aamu de Shu, número que equivale a 37”.
Imediatamente seguindo o escrivão real Cheti, “o superintendente dos
caçadores”, e atrás dele a parte dos estrangeiros liderados por hk st’Ibshl,
“príncipe do deserto, Abesha” (...). Acima está uma linha com a inscrição, a qual
se lê: “it hr int msdmt in (...)”, “chegaram trazendo Kohl com 37 aamu junto dele.”
(Newberry, 1893, p. 69)

As inscrições na parede chamam os membros do grupo de aamu


de Shu, qualificando-os e designando de qual região vieram. Kamrin,
ao discutir as diversas possibilidades, afirma que a grande maioria da
opinião acadêmica coloca este grupo como vindo “do sul da Palestina,
canto sudeste do mar Vermelho, leste do rio Jordão, região bíblica de
Gileade, Transjordânia”, o que é a mesma localidade das
peregrinações de Jacó.

Helck sugere, com base em considerações geográficas e um paralelo bíblico, que


Shu deve ser comparado com Moab, no sul da Palestina no canto sudeste do Mar
Vermelho, e conclui que se refere às tribos nômades desta área. Ahituv
concorda com a equação de que Shutu é uma área a leste do rio Jordão, mais
possivelmente Moab. Aharoni também coloca Shutu a leste do Jordão, mas mais
ao norte, na região Bíblica de Gileade. Redford coloca Shutu de maneira mais
geral na Transjordânia. Baseado principalmente no aparecimento do termo em
Speos Artemidos22, Goedicke conclui que Shu refere-se ao norte do Sinai. A
maioria da opinião acadêmica coloca a terra de origem dos aamu de Shu no
levante do Sul, mais especificamente em algum lugar na área a leste do rio Jordão
e do Mar Morto. (Kamrin, 2009, p. 25)

Devemos lembrar que Jacó, após retornar de sua longa estada em


Harã, terra de Labão seu tio e sogro, passa por Galeede, Mizpa,
Manaim, atravessa o vau de Jaboque e estabelece sua primeira
residência em Siquém (Gên. 31-33), onde compra uma propriedade e
erigi um altar a Deus (Gên. 33.18-20). Por ordem de Deus, ele vai a
Betel edifica um altar e lá recebe novas bênçãos (Gên. 35.1-15). Perto
de Efrata, em Belém, morre sua esposa Raquel, e, neste lugar, edifica
uma coluna (Gen. 35. 16-20). Jacó vai, então, residir para além da torre
de Eder (Gen. 35.21), depois vai até a Isaque, seu pai, na região de
Hebron (Gen. 35.27) e, conforme a narrativa de Gênesis 37.1,
permaneceu habitando na terra das peregrinações de seu pai, na terra
de Canaã. Toda esta peregrinação até sua ida para o Egito acontece
exatamente na chamada região de “Shu ou Shutu”, a qual pode ser
visualizada na figura 9.
FIGURA 9: As jornadas de Jacó – Mapa original com anotações do autor. Mapa disponível
em: http://www.seektheoldpaths.com/Maps/018a.jpg e
http://www.seektheoldpaths.com/Maps/025.jpg. Acesso em 19/11/19.

As inscrições na tumba BH3, cena dos aamu, apresenta ainda como


fato bastante discutido entre os especialistas o nome do chefe do
grupo como “príncipe do deserto, Ab’esha”. Kamrin, ao abordar esta
calorosa discussão, escreve sobre este fato.
“´É acordado entre todos os acadêmicos que o nome do chefe do grupo é semita
na origem (...) Albright’s faz a leitura deste nome com uma “escrita defeituosa”,
por Abi-shar, significando “meu pai é rei”, mas conclui que o Abi-shai Bíblico
torna isto desnecessário23. Sareta também conclui que melhor leitura é Abishai,
que se traduz como “meu pai é um nobre homem. ” (Kamrin, 2009, p. 25)

Grimal (2005)24 também faz referência ao caso do governador do


nomo Oryx, que recebe Abisha e seu tributo, e o que chama a atenção
dos pesquisadores é que este chefe do grupo era um patriarca
destacado, assim como Jacó também o era. Kamrin destaca que
Albrigth’s concluiu que o “príncipe do deserto, Ab’esha” tem no nome
o mesmo hebraísmo bíblico, indicativo de um grupo peculiar de
migrantes com etnia ligada a este hebraísmo.
Outro fato histórico o qual deve ser referenciado é fornecido pelo
historiador judeu Flavio Josefo (2004), em sua resposta a Ápio, o qual
descreve, no capítulo 5, referindo-se ao testemunho dos historiadores
egípcios e fenícios acerca da nação dos judeus, que vários reis
(asiáticos) lutaram contra os egípcios e foram chamados de hicsos,
dando a informação histórica que em seus estudos entendeu que o
termo hicso significava “reis pastores”, e mais tarde, em pesquisa a
livros, entendeu significar “pastores escravos ou cativos”. Josefo
esclarece que Jacó e seu grupo familiar quando imigraram para o
Egito foram também chamados de “pastores cativos”.

O mesmo Manetom, em outro livro, onde trata do que se refere ao Egito, disse
que encontrou nos livros que são tidos por sagrados, entre os de sua nação, que
chamavam a esse povo de pastores cativos e nisso ele diz a verdade, porque
nossos antepassados ocupavam-se da criação de gado e eram chamados de
pastores; não há, pois, motivo de admiração de que os egípcios tenham
acrescentado a palavra “cativos”, pois que José disse ao rei do Egito que ele era
escravo e obteve desse soberano a permissão de mandar buscar seus irmãos.
(Josefo, 2004, p. 1486)

Não se deve aqui tentar qualquer inferência e dizer que os


descendentes de Jacó têm ligação com os hicsos em origem, o que
seria errado. Josefo confirma primeiro que José já estava no Egito,
havendo em algum momento sido escravo e gozava naquele presente
momento de proeminência com o rei, e, segundo, que Jacó e sua
família migram também para o Egito com permissão de Faraó, sendo
chamados de “pastores cativos”. Devemos, aqui, recorrer ao texto
bíblico que descreve o patriarca Jacó e sua família como “pastores”.

“Então Faraó perguntou aos irmãos de José: — Qual é o trabalho de vocês? Eles responderam: —
Nós, seus servos, somos pastores de rebanho, como já foram os nossos pais. ” (Gên. 47.3)

Ao lembrar que o termo “pastores cativos”, conforme descreve


Josefo, está ligado ao termo hicsos, “reis pastores”, ao qual Shaw,
como vimos, descreve como sendo “governantes de países
estrangeiros”, é neste sentido terminológico que Josefo, ao identificar
os hebreus como “pastores cativos” ou “reis pastores”, os conecta com
os aamu, evidenciando sua procedência, proeminência e destaque
como grupo social. Rudge (1902) afirma que “nesta cena aamu de Shu,
alguns têm identificado a representação como a chegada de Jacó e
seus filhos ao Egito para comprar cereais, mas não existem evidências
para suportar esta teoria (...)”. Certamente existem muitos elementos
que permitem enxergar um grande paralelo entre os aamu,
estrangeiros que chegam da região de Shu ou Shutu (região das
peregrinações de Jacó), precedidos pelo seu “Abesha - príncipe do
deserto” ou “rei pastor” ou “governante”, com a caravana do patriarca
e chefe de clã, Jacó e sua família, chegando ao Egito. Kamrin, ao
abordar sobre o caso do “aamu de Shu”, foi muito enfática ao escrever
sobre a grande discussão acadêmica em torno do assunto.

Muitos acadêmicos têm estudado esta cena e chegaram a uma variedade de


conclusões sobre a terra de origem dos estrangeiros representados e o motivo
específico de sua aparente visita ao Egito. (Kamrin, 2009, p. 22)

Toda esta discussão acadêmica, conforme fala Kamrin, é, na


verdade, justo pelo fato de a descoberta ter aludido à grande
possibilidade de a cena dos aamu de Shu apontar para a chegada de
Jacó e sua família ao Egito. Deve-se ainda pensar nos obstáculos
epistemológicos no que tange à possibilidade de uma descoberta
como esta apontar para a cena bíblica. Sobre esta descoberta
específica, fica claro, visto as discussões dos acadêmicos em
egiptologia, que não se pode confirmar o fato em sua totalidade e
também não se pode negar o fato, deve-se também, como
Thompson,25 declarar que “ (...) Há muitas linhas de evidência para
sugerir que os acontecimentos de Gênesis, capítulos de 40 a 50,
tiveram lugar durante o período dos hicsos (...)” (Thompson, 2009, P.
62). Sem querer entrar no mérito do contexto de datação dos eventos
tratados por Thompson, sua fala como arqueólogo bíblico é um fato:
“Há muitas linhas de evidência...” e todas colocam Jacó e sua família
no Egito.
O período qualificado como da chegada de Jacó e sua família ao
Egito, 1876 a.C., está devidamente entrelaçado em tempo com o
governo dos Faraós Senuseret II e Senuseret III, considerando-se para
a cronologia egípcia a observação do levante de Sotis em Menfis (veja
capítulo 6). A harmonia de tempo e período com os eventos até aqui
apontados na história do Egito antigo é por demais interessante, além
deste ser o período no qual a narrativa bíblica coloca José como Vizir
ou Primeiro Ministro de Faraó em aproximadamente 1885 a.C., como
apresentado abaixo.

“Tu estarás sobre a minha casa, e por tua boca se governará todo o meu povo, somente no trono eu
serei maior que tu. Disse mais Faraó a José: Vês aqui te tenho posto sobre toda a terra do Egito. E
tirou Faraó o anel da sua mão, e o pôs na mão de José, e o fez vestir de roupas de linho fino, e pôs um
colar de ouro no seu pescoço. ” (Gênesis 41:40-42)

Joh F. Walvoord (Ph.D.) e Roy B. Zuck (Ph.D.) foram editores


responsáveis do “The Bible Knowledge Commentary: Old Testament”
(Comentário Bíblico do Conhecimento do Antigo Testamento), com
primeira edição em 1983, e, nele, fazem um diligente comentário
sobre esta narrativa.

(...) Faraó também vestiu José com roupas de linho e corrente de ouro em seu
pescoço, fez dele o segundo no comando e fez com que ele andasse na segunda
carruagem para que todo o povo pudesse fazer homenagem a ele. Como sinal do
novo status de José, o Faraó deu-lhe uma esposa de nome Asenat, da família
sacerdotal de On (...). Ele também deu a José um nome egípcio, Zafenat Panea
(cujo significado é desconhecido). José tinha 30 anos nesta época (...) (Walvoord e
Zuck, 1983, p. 91,92)

A narrativa histórica contida no texto bíblico ainda informa que


José, na condição de Vizir ou Primeiro Ministro, comprou toda a terra
do Egito para Faraó, trazendo uma concentração de poder para as
mãos do mesmo.

“Por que morreremos diante dos teus olhos, tanto nós como a nossa terra? Compra-nos a nós e a
nossa terra por pão, e nós e a nossa terra seremos servos de Faraó; e dá-nos semente, para que
vivamos, e não morramos, e a terra não se desole. Assim José comprou toda a terra do Egito para
Faraó, porque os egípcios venderam cada um o seu campo, porquanto a fome prevaleceu sobre eles; e
a terra ficou sendo de Faraó. ” (Gênesis 47:19-20)

Charles F. Aling (Ph. D), professor de história e presidente do


“Institute Biblical Archeology”, desenvolve uma discussão sobre a
historicidade da história de José, material que foi disponibilizado na
revista Bible and Spade de 1996 da “Associates for Biblical Research”.
Aling (1996) declara que os eventos narrados na história de José são
tópico de investigação para acadêmicos da história bíblica e para
egiptólogos interessados no Antigo Testamento, porém nenhuma
referência a José apareceu em fontes egípcias. Segue apresentando
que se há credibilidade na história de José, deve-se buscar resposta
pelo método de data e eventos, procurando na história egípcia quais
eventos, melhor se encaixam. Shaw (2003), ao falar do grande número
de asiáticos no Egito no Reino Médio, diz que alguns eram
prisioneiros e cita José, vendido por seus irmãos como escravo. A
citação de Shaw vem na mesma linha de Aling, creditando possíveis
respostas pelo método data e evento. É nesta linha metodológica que
se pode tomar o texto bíblico, o qual narra o fato de José ter comprado
toda a terra do Egito para Faraó, trazendo uma concentração de poder
nas mãos do mesmo e assim averiguar a harmonia com o fato
histórico egípcio da extinção do poder dos “nomarcas” ou
governantes de nomos no Egito, ocorrido no reinado do Faraó
Senuseret III.
O aparecimento de assentamentos ou nomos é verificado no Egito
antigo principalmente a partir do Período Neolítico, quando as
condições ambientais e climáticas do Saara se alteraram, tornando os
locais antes utilizados pelos grupos nômades de caçadores e coletores
muito secos e áridos, obrigando-os, assim, a fazer o uso das margens
do rio Nilo. Estes grupos desenvolveram novas técnicas como a
agricultura, criação de animais, a substituição das ferramentas de
pedra por metais, desenvolvimento da escrita e uma unificação
cultural e política destes nomos ocorre naturalmente com a
centralização de poder na figura de um monarca, o faraó. Mesmo com
a figura do faraó, estes assentamentos ou nomos cresceram em forma
de cidades e a figura dos nomarcas ou governantes dos nomos ganhou
força e proeminência em todo o período desde as primeiras dinastias
até o início da 12ª dinastia dos reis egípcios, quando então este poder
é eclipsado. Shaw (2003) informa que Amenenhat I, faraó da 12ª
dinastia, apresenta um novo rumo na administração de seu reino,
dando destaque a cidades principais dentre as várias cidades ou
nomos e efetiva a nomeação de um chefe principal ligado a ela,
fazendo assim declinar o poder político dos demais e numerosos
nomarcas ou governadores. Senuseret II aprofunda esta política de
centralização do poder e leva ardilosamente para a capital os filhos
dos nomarcas para educação, o que, com o tempo, por meio de
compromissos e nomeações destes na capital, eclipsou e enfraqueceu
o ofício dos nomarcas. O fato é que durante o reinado de Senuseret III
o cargo de nomarca foi encerrado e o Faraó Senuseret III passa a
governar toda a larga extensão do país a partir da corte real. Grimal
(2005)26 informa que quando Sesostris III (Senuseret III) subiu ao
trono, teve de lidar com um problema político que seu avô Sesostris I
(Senuseret I) já havia tentado resolver. O problema básico era que as
famílias dos nomos tinham se tornado quase tão poderosas quanto o
próprio rei e então Sesostris III reduziu a autoridade dos nomarcas.
Shaw (2003) afirma ser pouco provável que Senuseret III tenha sido o
instrumento final da extinção dos nomarcas e declara que os registros
mostram um processo contínuo de declínio, porém Grimal (2005)
afirma que diante do problema do crescente aumento de poder dos
nomarcas enfrentado por seu avô, Senuseret III, se torna o
instrumento que reduz a autoridade dos mesmos.

Portanto, é improvável que o Senusret III tenha sido o instrumento da extinção


dos nomarcas, pois o registro mostra que, embora o cargo tenha eventualmente
expirado sob Senusret III, estava em declínio desde tempo de Amenemhat II. No
entanto, Senusret III instalou outros funcionários (baseados no corte real) como
governadores de seções muito grandes do país, e desta forma, rompeu com as
práticas do passado. (Shaw, 2003, P. 163, 164)

Sesostris III reduziu a autoridade dos governantes locais que foram


gradualmente transformando-se em dinastias locais (...) (Grimal, 2005, P. 167)

Conclui-se diante do trabalho de Iam Shaw e Nicolas Grimal que o


aumento do poder dos nomarcas era um problema para a casa real.
Desde Amenenhat I, ações para a centralização do poder nas mãos de
Faraó foram tomadas e a extinção final do poder dos nomarcas ocorre
sem dúvida no governo de Senuseret III, porém não existe registro de
decretos destes atos, apenas o evento em si, e é isto que deixa lacunas,
conforme deduzido por Iam Shaw. Estas lacunas permitem a Charles
F. Aling também fazer notável dedução acerca dos eventos.

(...) Em conclusão, tentamos argumentar que a carreira de José se encaixa muito


bem na 12ª dinastia, tanto biblicamente quanto historicamente, e que não há
uma boa razão para tentar colocá-lo no segundo Período Intermediário. Acredito
que ele fez um impacto significativo na história egípcia, um impacto que se reflete
em eventos como o rompimento do poder dos nomarcas e a combinação dos cargos
de vizir e comandante-chefe do rei. À medida que o nosso conhecimento do Reino
Médio aumenta, e como novas informações arqueológicas do delta são
descobertas e publicadas, podemos esperar entender melhor o Reino Médio e o
Segundo Período Intermediário, e podemos esperar expandir nosso
conhecimento do passado egípcio e da história de José. (Alling, 1996. BSP 9.1, P.
27)
Certamente a narrativa histórica de José na condição de Vizir ou
Primeiro Ministro, comprando toda a terra do Egito para Faraó e
trazendo uma concentração de poder para as mãos do mesmo, é
harmoniosa em tempo com governo de Senuseret III, e com o evento
da extinção da autoridade dos nomarcas, podendo ser uma possível
explicação para a lacuna de decretos ou atos, referente a este fato,
conforme deduzido por Iam Shaw.
O “Canal de José” ou Bahr Yussef, canal que liga o rio Nilo com o
oásis Faium27 no Egito, é também um tipo de possível evidência deste
período o qual não se pode deixar de mencionar. Chanson (2008),
renomado professor de engenharia hidráulica e escritor com diversos
prêmios por seus trabalhos acadêmicos, em “A Hidráulica do Fluxo de
Canal Aberto”, fez um estudo do reservatório de Moeris e descreveu
no ítem I.1 e I.2 que um dos esforços mais notáveis dos reis egípcios
foi a criação do lago Moeris na depressão Faium e a construção de um
canal de 16 km de extensão que liga o lago ao Nilo, afirmando que o
lago existia no momento do rei Menes28, fundador da 1 ª dinastia
egípcia e que o rei Amenemhat ampliou e aprofundou o canal entre o
Nilo e a depressão de Faium. Shaw também cita o canal Barh Yussef.

(...) sua maior conquista aparece ter sido a inauguração do esquema de irrigação
de Faium. Um dique foi construído e os canais foram cavados para conectar o
Faium com a via fluvial que agora é conhecida como o Bahr Yussef (...). (SHAW,
2003, P. 152).
FIGURA 10: Mapa do Baixo Egito com anotação do autor. Mapa original disponível em https:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Lower_Egypt-en.png#/media/File:Lower_Egypt-
en.png. Acesso em 18/03/2018.

Shaw (2003)29 também confirma que o reinado de Senusret II,foi


um tempo de paz e prosperidade e que uma das maiores conquistas de
Senusret II foi a inauguração do sistema de irrigação Faium e da
escavação de canais para conectar o Faium com a via fluvial
conhecida como Bar Yussef. Poderia se perguntar se todo este
trabalho para melhor irrigar a região do Faium, tornando-o menos
sensível a variações nos níveis do Nilo e melhor agriculturável e fértil
em períodos de seca e alterações climáticas, pudesse ter ligação com o
alerta emitido por José sobre os anos de seca. O egiptólogo Richard
H. Vise, em seu trabalho arqueológico no Egito, faz uma
impressionante argumentação sobre o canal:

O Faium, a partir da abundância de pastagens, está mais bem adaptado para a


alimentação do gado do que qualquer outra parte do Egito, e, por sua isolação e
posição, é peculiar para a recepção de estrangeiros. Nesses aspectos, responderia
à descrição da terra de Gósen; e se o canal Bahr Yussef, poderia ter sido o
trabalho do grande patriarca, pode ser um argumento adicional. (Vise, 1840, p.
133,134; nota de rodapé nº 8)

É claro que existem alguns historiadores como Cardoso30,31 (1982)


que fazem uma crítica ao fato do lago Moeris ter sido construído
artificialmente por algum rei da 12ª dinastia, referindo que a
afirmação se sustenta em pequenas passagens de historiadores greco-
romanos. Fazendo uma análise crítica do trabalho de Cardoso, como
historiador, em seu processo de pesquisa bibliográfica em 1982,
verificam-se falhas, pois não “ouviu” a maioria dos egiptólogos32 e
não poderia ter acesso a renomados e atuais trabalhos acadêmicos
como o de Chanson, em “A Hidráulica do Fluxo de Canal Aberto”, o
que se tivesse acesso e oportunidade, possivelmente revisaria e
reescreveria suas afirmações. Tem-se por certo que a ciência
arqueológica não nega mais a existência do lago e destes antigos
canais artificiais e o que se coloca no âmbito das indagações e
investigações é se o Bahr Yussef ou “o canal de José” tem algo a haver
com o José da Bíblia. É certo que nenhum egiptologista pode
categoricamente afirmar ou negar ser o canal um empreendimento do
José citado na Bíblia, mas, com toda certeza, a confirmação da
construção deste canal com o nome de Bahr Yussef ou “o canal de
José”, ocorrido no mesmo período de José, permite certamente forte
discussão em direção a esta hipótese.
Deve a pesquisa sobre este tema ter a sensatez e o discernimento
de Aling (1996) em declarar que apesar de não haver referências
diretas a José em fontes egípcias, é perfeitamente correto fazer as
correlações de evento e tempo. É justo nesta percepção dos eventos e
sua harmonização histórico-cronológica que se permita a sinergia
necessária para corroborar na apresentação do primeiro macroevento
o qual é “A chegada de Jacó e sua família ao Egito”. A chegada de Jacó
e sua família ao Egito é causada por fatores universais na época já
apresentados, mas também promovida certamente pela presença de
José no Egito. Deve-se verificar ainda que na ciência forense não é
preciso ter a pessoa na cena de investigação para comprovar um fato,
pois se o investigador dispõe dos elementos vitais como amostra de
DNA, impressões digitais, a ciência por si, confirma o fato. De
maneira semelhante, na ciência arqueológica e histórica, os
elementos achados em diversos sítios arqueológicos em conjunto com
textos e narrativas históricas formam linhas de evidência que têm o
poder de confirmar evento ou eventos. Eventos da história do Egito
antigo permitem comprovar a veracidade da narrativa histórica do
Êxodo Bíblico ao permitir a perfeita harmonização das narrativas no
tempo e espaço em que ocorrem e com a devida interpretação.

Há muitas peças de coloração egípcia nas narrativas de José que foram


esplendidamente ilustradas por descobertas egípcias do tipo a que nos referimos
nesta seção. W. F. Albright escreveu o seguinte sobre este tópico: “A
permanência de Israel no Egito é uma parte vital da primitiva tradição histórica
Israelita e não pode ser eliminada sem deixar uma lacuna inexplicável”. Além
disso, sabemos, pelos nomes egípcios de Moisés e de vários Aronidas33, que parte
de Israel deve ter vivido no Egito durante longo tempo. Há também muitos
detalhes locais e arqueológicos corretos que seriam inexplicáveis como uma
invenção posterior. O mais surpreendente é a relação óbvia entre a história de
José, a história posterior de Israel no Egito e o movimento dos hicsos. O “rei que
não conhecera José” e que oprimiu os israelitas devia ser o faraó do Novo
Império, depois da expulsão dos odiados asiáticos do Egito. (Thompson, 2006, P.
68, 69)

No método de harmonização histórico-cronológico, não é preciso


forçar ligações da narrativa bíblica da chegada de Jacó e sua família
no Egito com os diversos achados arqueológicos e suas interpretações
para comprovar o fato. Este evento ocorrido aproximadamente em
1876 a.C., entre o reinado de Senusret II (1870-1831 a.C.) e Senusret III
(1870-1831 a.C.), durante a 12ª dinastia no Reino Médio Egípcio, é um
fato harmonioso com todo o contexto arqueológico e histórico egípcio
ligado à chegada de grupos de asiáticos, indo além, pois existe
extrema peculiaridade de uma parte destes migrantes com
características culturais, étnicas, linguísticas, inclusive com nomes
ligados a hebraísmos. Ocorrem ainda muitos distintivos e linhas de
evidências, inclusive aquelas ligadas à região do qual são nativos,
além de acontecimentos narrativos similares. O que falar então dos
eventos ligados às dinastias dos Faraós Senusret II e Senusret III,
como o rompimento do poder dos nomarcas e a construção do canal
Bahr Yussef, que se harmonizam perfeitamente em tempo e narrativa
com a história de José. Thompson (2009), em sua fala como
arqueólogo bíblico, declara o fato de que “(...) há muitas linhas de
evidência...” e todas colocam Jacó e sua família no Egito. Abaixo, na
tabela cronológica de datação deste período com acréscimo da linha
representando a chegada de Jacó e sua família ao Egito, verifica-se
nítida e claramente a justaposição temporal da narrativa histórica.
FIGURA 11: Tabela cronológica da 12ª dinastia (Shaw, 2003. P. 483), mais acréscimo do autor
referente à cronologia bíblica.

7. Shaw, 2003, P. 156,157


8. Shaw, 2003, P. 174
9. Shaw, 2003, P. 175
10. Esses imigrantes “asiáticos” mantinham muitas vezes seu nome de origem, como
identificado por Posener no Papiro do Brooklin
11. Nicolas Grimal (Libourne, 13 de novembro de 1948) é um egiptólogo francês. (Grimal.
Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolas_Grimal. Acesso em: 07/03/18).
12. Grimal, 2005, P. 186
13. Posener 1957, P. 145
14. William Foxwell Albright (24 de maio de 1891 a 20 de setembro de 1971) foi um destacado
orientador americano, pioneiro da arqueologia, linguista e especialista em cerâmica. (W. F.
Albrigth. Wikipédia. Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/William_Foxwell_Albright.
Acesso em: 06/03/18).
15. Posener 1957, P. 149
16. Posener 1957, P. 150
17. Informação do autor
18. Apesar do hebraico como língua semítica ser oficialmente considerada como língua
nacional do povo hebreu no período Mosaico, sua história formativa é muito mais antiga,
recebendo influência de línguas ancestrais como o aramaico e o ugarítico.
19. Foi um grande chefe egípcio do nomo Oryx (o 16º nome do Alto Egito) durante o reinado
dos faraós Amenemhat II e Senusret II da 12ª dinastia, Reino Médio. Wikipédia. Disponível
em: https://en.wikipedia.org/wiki/Khnumhotep_II. Acesso em: 22/05/18).
20. Egiptólogo britânico (23 de abril de 1869 – 7 de agosto de 1949)
21. Usertsen II é o mesmo que Senusret II.
22. Speos Artemidos (Gruta de Artêmis) é um sítio arqueológico no Egito. Está localizado a
cerca de 2 km ao sul dos túmulos do Reino do Médio em Beni Hasan (...) (Speos Artemidos.
Wikipédia. Disponível em https://en.wikipedia.org/wiki/Speos_Artemidos. Acesso em: 06/03/18).
23. A palavra “ab”, em hebraico ‫ אב‬/ ‫אָב‬, tem o significado de “pai, chefe, principal”.
(STRONG, 2002. Palavra nº 01)
24. (Grimal, 2005. P. 165)
25. John Arthur Thompson (1913-2002), foi um australiano, estudioso do antigo testamento, e
arqueólogo bíblico. (John Arthur Thompson. Wikipédia. Disponível em
https://en.wikipedia.org/wiki/J._A._Thompson. Acesso em: 07/03/18).
26. (Grimal, 2005. P. 167)
27. O oásis Faium (em árabe: Fayyum, Faiyum, Fayum) é uma região do Egito, na província de
Faium, que inclui a cidade de Madinatt al-Fayyum (Faium) e nessa região fica um lago ou
depressão de área estimada entre 1270 e 1700 km². O lago de Faium é hoje chamado Birket
Qarun, antigamente Lago de Fayum. Nesse lago o faraó Amenemés III executou obras
importantes (...) (Oásis de Faium . Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/O%C3%A1sis_de_Faium. Acesso em: 13/03/18)
28. Chanson (2008) faz uma citação de Schnitter (1994), para referir que existem algumas
poucas discussões sobre se o lago Moeris existia ou não, porém deixa claro que o lago era
formado por um corte natural nas montanhas, isto desde a época do rei Menes, e nesta época
o lago era cheio durante as grandes inundações do Nilo.
29. Shaw, 2003, p. 152
30. Ciro Flamarion Santana Cardoso (Goiânia, 20 de agosto de 1942 — Rio de Janeiro, 29 de
junho de 2013) foi um renomado historiador brasileiro. (Ciro Flamarion Cardoso, Wikipédia.
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ciro_Flamarion_Cardoso. Acesso em: 15/03/18)
31. Cardoso, 1982, p. 7
32. A obra de Cardoso é falha em referenciar as fontes as quais o autor teve acesso para
chegar na sua conclusão, visto que é contraria à maioria dos acadêmicos em arqueologia
egípcia.
33. Aronidas: referente aos filhos de Arão (I Crônicas 6.54,61).
4
O ESTABELECIMENTO DA FAMÍLIA DE
JACÓ NO EGITO

“O senhor habitará na terra de Gósen e estará perto de mim — o senhor, os seus filhos, os filhos de
seus filhos, os seus rebanhos, o seu gado e tudo o que lhe pertence.” (Gên. 45.10)

“E José fez habitar a seu pai e seus irmãos e deu-lhes possessão na terra do Egito, no melhor da
terra, na terra de Ramsés, como Faraó ordenara.” (Gên. 47.11)

“Assim, habitou Israel na terra do Egito, na terra de Gósen, e nela tomaram possessão, e
frutificaram, e multiplicaram-se muito.” (Gên. 47.27)

“Estes, pois, são os nomes dos filhos de Israel, que entraram no Egito com Jacó; cada um entrou com
sua casa (...) Todas as almas, pois, que descenderam de Jacó foram setenta almas; José, porém, estava
no Egito. Sendo, pois, José falecido, e todos os seus irmãos, e toda aquela geração, os filhos de Israel
frutificaram, e aumentaram muito, e multiplicaram-se, e foram fortalecidos grandemente; de
maneira que a terra se encheu deles.” (Êx. 1.1-7)

A narrativa histórica contida nestes textos é impressionante, faz


parte do segundo macroevento a ser estudado e traz uma rica
informação de como foi o estabelecimento de Jacó e sua família no
período de 430 anos em que residiram no Egito, estabelecendo
habitação na chamada terra de Gósen. A terra de Gósen está
localizada na região nordeste do delta do rio Nilo e é, desde os mais
remotos tempos, reconhecida como uma das regiões mais férteis do
mundo antigo, pertencente à chamada “Crescente Fértil”34. Nas
primeiras pesquisas arqueológicas, apesar de haver uma certeza do
local, não havia como ligar a região com a “Terra Bíblica de Gósen”,
por falta de referências em manuscritos egípcios.

Faraó deu a Jacó e sua família a melhor parte da terra, chamada Gósen (Gen.
45.10), tendo dado ele mesmo aos irmãos de José a supervisão de sua própria
possessão (Gen. 47.6). Gósen não é referenciada nos escritos do antigo Egito,
mas o nome aparece em tempos mais tarde como o distrito de Ramsés.
(Walvoord e Zuck, 1983, P. 96)

Deixa-se claro que esta incerteza científica quanto à “Terra de


Gosén” deixou de existir com o avanço das pesquisas arqueológicas.
Easton (1897) identificou a terra de Gósen no Egito como a região da
moderna Wadi Tumilat, deitada entre a parte oriental do Delta e a
fronteira ocidental da Palestina. O Papiro Anastasi VI (British
Museum 10245), linha 51-61, da 19ª dinastia, fim do 13º século a.C., é
presumivelmente de Menfis e trata de uma comunicação feita por um
oficial de fronteira onde ele relata a passagem de tribos asiáticas
para pastarem no delta do rio Nilo.

O Chefe de arqueiros Tjeku, Ka-Kem-Wer, ao Chefe de arqueiros Ani e ao Chefe


de arqueiros Baken-Ptah: Em vida, prosperidade, saúde! A favor de Amon-Re,
Rei dos Deuses e do Rei do Alto e Baixo Egito: User-kheperu-Re e Setep-en-
Re, vida, prosperidade, saúde! Ao nosso bom senhor (...) (Pritchard, 1969, P. 159).

Pritchard (1969) fez citação sobre o local “User-kheperu-Re e


Setep-en-Re” informando que a localização é o extremo leste do
Wadi Tumilat, a “terra de Gósen”. Ele traz uma importante
informação da existência da “Fortaleza de Mer-ne-Ptah” que teria
sido uma fortaleza de fronteira. Tjeku - ou provavelmente Teku –
poderia com dificuldade ser Sucote, o que parece ser uma designação
mais ampla para a região. Escavações modernas em Tell el-Maskhuta
foram realizadas pelo “Projeto Wadi Tumilat da Universidade de
Toronto”, sob a direção de Jon Holladay35, e estas escavações
confirmaram os estudos acadêmicos, pois foram identificadas
estruturas, “armazéns”, que pertenceram aos israelitas ali residentes.
Foi por longo tempo suposto que Tell el-Maskuta deveria ser a cidade de Pitom
mencionada em Êxodo, ou Sucote, uma das cidades ao longo da rota do Êxodo.
A partir de 1978, uma expedição da Universidade de Toronto examinou a área
com resultados revolucionários. Estruturas identificadas nas escavações do
século XIX como “armazéns dos filhos de Israel”, e datadas por ele até o século
XIII a.C., foram encontradas até muito mais tarde - o segundo e terceiro séculos
a.C. (...) (Holladay, 1982)

Holladay (1982) identificou que os achados são do 13º século antes


de Cristo, e isto é um fato impressionante, pois coloca os achados em
data muito próxima do Êxodo ocorrido aproximadamente em 1448
a.C. No mapa pode-se identificar a localização da terra de Gósen.

FIGURA 12: As Jornadas de José com marcação pelo autor. Mapa original disponível em:
http://www.seektheoldpaths.com/Maps/023.jpg. Acesso em: 09/04/18

A certeza científica sobre a existência da chamada terra de Gosén


permite avançar no texto bíblico e verificar em sua narrativa que no
período em que os israelitas estiveram na “Terra de Gósen”, eles
frutificaram, aumentaram muito e se multiplicaram, demonstrando
que o grupo familiar crescia e que a capacidade produtiva da região
onde se estabeleceram suportava a demanda do crescimento
populacional. Shaw (2003)36 faz uma análise histórica-geográfica
bastante precisa de que no término do Médio Paleolítico, a evolução
do clima mudou as condições de vida completamente e que os
recursos alimentares foram escassos, sendo que estas condições
obrigaram as pessoas a se estabelecerem no vale do rio Nilo. Ao
longo do 4º milênio, os agricultores que viviam em pequenas aldeias
tornaram-se economicamente cada vez mais dependentes da
agricultura de cereais (trigo e cevada), o que foi bem-sucedido nas
planícies de inundação do Nilo37. Ao decorrer dos tempos, se
observa, nos períodos dinásticos mais recentes, o Egito como um
estado bem sucedido, em decorrência do enorme potencial da
agricultura de cereais na planície de inundações do Nilo e das
habilidades técnicas e de engenharia para dominar este potencial38,
permitindo o florescimento de um estado forte com um grande grupo
populacional. Amenemhat I e Sesostri I (ou Senuseret I) são reis da
12ª dinastia, período um pouco anterior à chegada de Jacó e sua
família ao Egito, e um escrito de Amenemhat I para seu filho e
corregente Sesostri I39 descreve a prosperidade encontrada em sua
regência em decorrência do potencial da agricultura de cereais na
planície de inundações do Nilo.

Eu fui um dos que cultivou grãos e amava o deus da colheita; o Nilo


cumprimentou-me em todos os vales; ninguém estava com fome nos meus anos,
nem sede (...) (Breasted, 1906, P. 232).

Ernest King III Batey, em seu trabalho acadêmico de doutorado,


descreve a dinâmica populacional no período pré-dinástico (3900-
3200 a.C.) do Egito com base em escavações efetuadas no cemitério
HK 4340 em Hieracômpolis, no alto Egito (bem ao sul do delta do
Nilo). Os resultados da análise de três segmentos de idade sugeriram
que a mortalidade juvenil poderia ter melhorado, que a taxa de
natalidade e taxas de crescimento populacional aumentaram neste
período. Os estudos acadêmicos mostram claramente que conforme
as populações se dirigiram ao vale do Nilo e foram se especializando
no domínio da agricultura de grãos, a capacidade produtiva foi
suficiente e crescente para suprir a demanda populacional que
aumentava e ainda esta fértil região viu na diminuição da
mortalidade juvenil e no aumento da taxa de natalidade fatores que
propiciavam e atraíam a chegada de povos asiáticos, fato este
corroborado no capítulo anterior, onde apresentou-se que no Reino
Médio do Egito, durante a 12ª a 13ª dinastia, houve uma forte
imigração de povos asiáticos, inclusive de Jacó e sua família, o que
por fim leva à migração e estabelecimento dos hicsos na região do
Delta do Nilo.
Acerca da evidência de asiáticos no Egito durante o Segundo
Período Intermediário, Shaw (2003)41 cita notáveis pesquisadores
como Georges Posener, em “Os Asiáticos no Egito”, D. Arnold, F.
Arnold e S. Allen, em “Importações Cananitas em List, capital do
Reino Médio, Kenneth Kitchen, em “Não egípcios Registrados em
Estelas do Reino Médio”, Stephen Quirk, em “Estudos do Reino
Médio” e outros diversos acadêmicos que apontam para este
fenômeno migratório histórico que tem implicação direta com o
estabelecimento da família de Jacó no Egito.
Grimal (2005)42 escreve que no Segundo Período Intermediário, a
Núbia havia sido conquistada e os egípcios alcançavam uma posição
de supremacia no Oriente próximo. O influxo de trabalhadores da
Ásia atingiu seu pico durante o reinado de Amenemhat III,
desenvolvido como uma pacífica e persistente migração do Leste.
Esta pressão migratória no Reino Médio era motivada pela
prosperidade do Egito e por condições adversas em outras regiões
como a fome gravíssima na Palestina relatada em Gênesis 43.1. Shaw
declara que os hicsos podem ter sido encorajados a migrarem para o
Delta do Nilo em virtude destes fatores.
Toda esta atividade industrial e construtiva simboliza a prosperidade que o
Egito desfrutava durante o reinado, mas também pode ter esgotado a economia
e combinado com uma série de inundações baixas do Nilo, no final de seu
reinado, o que resultou em declínio político e econômico. Ironicamente, a
grande migração de asiáticos, o que parece ter ocorrido em parte para subsidiar
o extenso trabalho de construção, pode ter encorajado os chamados hicsos a se
instalarem no Delta, levando finalmente ao colapso do governo egípcio-nativo.
(Shaw, 2003, P. 157).

O segundo período intermediário43 foi então definido pela divisão


do Egito e sua fragmentação em duas terras, indicando claramente o
reino de Avaris como capital dos hicsos.

(...) “Por que contemplo minha força enquanto existe um Grande Homem em
Avaris e outro em Cuxe, sentado unido com um asiático e um nubiano enquanto
cada homem possui sua fatia do Egito”. Esta foi a queixa do rei Tebano Kamose
(1555-1550 a.C.) no final da 17ª dinastia. O início do Segundo Período
Intermediário é marcado pelo abandono da residência em List, 32 km ao sul de
Menfis e o estabelecimento da corte real e sede do governo em Tebas, ao sul da
cidade. (Shaw, 2003, P. 172).

Avaris, no baixo Egito, foi, então, construída pelos invasores


hicsos para servir-lhes de capital, fundada exatamente na região
denominada de “Terra de Gósen”. Foi destruída posteriormente,
quando da derrota dos hicsos, na 17ª dinastia, por Kamose, e
reconstruída mais tarde por Ramsés II. O controle do norte do Egito
pelos hicsos envolveu vários estágios. Grimal (2005)44 declara que
inicialmente tomaram Avaris e depois foram em direção a Menfis,
seguindo depois para a borda leste do Delta do Nilo, sendo que o
estágio final da tomada de poder pelos hicsos pode ter sido violenta.
Josefo (2004), no capítulo 5 de Antiguidades, ao falar do testemunho
dos historiadores egípcios e fenícios com relação à antiguidade dos
judeus, também faz referência aos reis hicsos que buscaram
exterminar a raça dos egípcios. Porém Grimal (2005)45 infere a
observação que a infiltração gradual dos hicsos parece ter sido muito
mais amplamente aceita pela população egípcia.
Os hicsos, povos também de origem asiática e de língua semítica,
após se firmarem politicamente no Egito, decidem fixar a capital do
Baixo Egito na cidade de Avaris, a qual fica na mesma região
conhecida como “Terra de Gósen”. A dinastia dos faraós nativos do
Egito mudou sua capital para Tebas, no Alto Egito, para garantir
assim o controle da região sul. Essa divisão política permaneceu por
quase um século estável, graças ao bom convívio entre os dois
governos no Vale do Rio Nilo. Os hicsos governaram e se
aproveitaram do conhecimento e da estrutura política dos egípcios,
sendo que no campo tecnológico suas inovações foram inúmeras,
particularmente no campo da guerra, com a introdução do carro de
guerra com cavalos.

FIGURA 13: Pintura está na tumba de Menna, na época de Tutmés IV (1420-1411 A.C).
Carro de guerra com cavalo. Disponível em:
http://www.museudantu.org.br/Antiguidade/hics.jpg. Acesso em 12/03/2018

Grimal (2005, p. 186) declara que “os hicsos parecem ter se


aproximado dos povos “asiáticos” que os egípcios haviam lutado
anteriormente: os aamu, setjetiu, mentjiu da Ásia ou retjenu (...)”, e
este é um fator muito importante, porque temos, durante o Segundo
Período Intermediário, uma estabilidade política, uma verdadeira
aliança entre estes povos de origem semítica, que permite o
desenvolvimento social das populações estabelecidas no Delta do
Nilo, inclusive os israelitas descendentes de Jacó.

Os hicsos introduziram um método de governo que provou ser bem-sucedido e


igualmente aplicado por todos os invasores posteriores no Egito; em vez de
tentarem impor suas próprias estruturas governamentais no país, eles se
imergiram no sistema político egípcio existente. (Grimal, 2005, p. 186)

Josefo (2004) declara que os hebreus eram chamados também


como os hicsos de “Reis Pastores” e, conforme a narrativa bíblica,
sabe-se que José tornou-se um Vizir46 de Faraó no Egito na 12ª
dinastia. Observa-se que um século e meio após a chegada de Jacó e
sua família no Egito, os hicsos tomam o poder, o que, ao imergirem
no sistema político existente, como asiáticos de origem, buscam
forjar alianças com outros líderes dos povos asiáticos ali presentes,
inclusive em grande possibilidade com os “Reis Pastores”,
descendentes de Jacó e, ainda mais, é óbvio o fato do Vizir José,
mesmo após sua morte, ter deixado um legado político que elevou em
muito o status dos asiáticos hebreus habitantes de Gósen dentre os
outros grupos de asiáticos lá existentes.
Conclui-se, assim, que desde a chegada de Jacó e sua família ao
Egito, até o fim do Segundo Período Intermediário, o que são
aproximadamente 326 anos, houve um período de intensas mudanças
políticas no Egito, as quais todas favoreceram os israelitas. O
fenômeno relatado na Bíblia de que os filhos de Israel frutificaram,
aumentaram muito, multiplicaram-se e foram fortalecidos é
compatível e harmonioso com este momento histórico. As
numerosas descobertas arqueológicas comprovam sites bíblicos
como a “Terra de Gosén” e a presença de asiáticos no Egito aponta
também para a presença dos hebreus, inclusive com a descoberta de
assentamentos israelitas na atual Wadi Tumilat (Terra de Gósen), o
que, somando-se a estes fatos, temos os abundantes recursos
econômicos capazes de atender à crescente demanda populacional da
região. Não é de menor importância para o estabelecimento da
família de Jacó no Egito o momento político favorável com o governo
Hicso aos povos asiáticos que se estabeleceram na região,
principalmente para um povo com um legado político tão forte e
positivo advindo do status de “Reis Pastores” e da figura de José, o
Vizir.

34. O Crescente Fértil é uma região compreendendo os atuais estados da Palestina, Israel,
Jordânia, Kuwait, Líbano e Chipre, bem como partes da Síria, do Iraque, do Egito, do
sudeste da Turquia e sudoeste do Irã. A expressão «Crescente Fértil» foi criada por James
Henry Breasted, arqueólogo da Universidade de Chicago, em referência ao fato de o arco
formado pelas diferentes zonas assemelhar-se a uma Lua crescente. Irrigada pelo Jordão,
pelo Eufrates, pelo Tigre e o Nilo. (Crescente Fértil. Wikipédia. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Crescente_F%C3%A9rtil. Acesso em: 07/03/18).
35. John S. Holladay Jr, diretor das escavações da Universidade de Toronto em Tell el-
Maskhuta, é professor emérito no Departamento de Civilizações do Oriente Médio. (TELL
EL-MASKHUTA: PRELIMINARY REPORT ON THE WADI TUMILAT PROJECT, 1978-1979.
Disponível em: http://archive.arce.org/publications/books/u6. Acesso em: 12/03/18).
36. Shaw, 2003, p. 20
37. Shaw, 2003, P. 65
38. Shaw, 2003, P. 82
39. Amenemhat I e Sesostri I (ou Senuseret I) são reis da 12ª dinastia, período um pouco
anterior a chegada de Jacó e sua família ao Egito.
40. O cemitério chamado HK43, pertencente ao segmento não-elite (ou trabalhadores) da
população pré-dinástica, está localizado no lado sul do site ao lado do Wadi Khamsini.
Trabalhos ocorrem desde 1996, quando um esquema de recuperação de terras ameaçou sua
preservação e as escavações continuaram até 2004, resultando na descoberta de um mínimo
de 452 túmulos que ocupam mais de 500 indivíduos da data Naqada IIB-IIC
(aproximadamente 3650-3500BC). (O cemitério dos trabalhadores - HK43. Disponível em:
http://www.hierakonpolis-online.org/index.php/explore-the-predynastic-cemeteries/hk43-
workers-cemetery. Acesso em: 12/03/18).
41. Shaw, 2003, P. 457
42. Grimal, 2005. P. 182
43. O Segundo Período Intermediário marca o fim do Médio Reino (2055-1650 a.C.). O Reino
Médio inicia com a 11ª dinastia e termina com a 14ª dinastia. A 12ª dinastia é importante e
marcada por 2 (dois) séculos) de pungente prosperidade (período da chegada de Jacó e sua
família ao Egito).
44. Grimal, 2005, P. 185
45. Grimal, 2005, P. 186
46. Os vizires foram nomeados pelos faraós, mas muitas vezes pertenciam à família de um
faraó. O dever supremo do vizir era supervisionar o funcionamento do país, bem como um
primeiro ministro. (Vizir – Egito Antigo. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Vizier_(Ancient_Egypt). Acesso em: 13/03/18).
5
OPRESSÃO E ESCRAVIDÃO DOS HEBREUS
NO EGITO 1560 – 1448 A.C

“Sendo, pois, José falecido, e todos os seus irmãos, e toda aquela geração, os filhos de Israel
frutificaram, e aumentaram muito, e multiplicaram-se, e foram fortalecidos grandemente; de
maneira que a terra se encheu deles. Depois, levantou-se um novo rei sobre o Egito, que não
conhecera a José, o qual disse ao seu povo: Eis que o povo dos filhos de Israel é muito e mais
poderoso do que nós. Eia, usemos sabiamente para com ele, para que não se multiplique, e aconteça
que, vindo guerra, ele também se ajunte com os nossos inimigos, e peleje contra nós, e suba da terra.
E os egípcios puseram sobre eles maiorais de tributos, para os afligirem com suas cargas. E
edificaram a Faraó cidades armazéns, Pitom e Ramsés. Mas, quanto mais os afligiam, tanto mais se
multiplicavam e tanto mais cresciam; de maneira que se enfadavam por causa dos filhos de Israel. E
os egípcios faziam servir os filhos de Israel com dureza; assim, lhes fizeram amargar a vida com dura
servidão, em barro e em tijolos, e com todo o trabalho no campo, com todo o seu serviço, em que os
serviam com dureza. ” (Êxodo 1.6-14)

É verificável que desde os reinos de Senuseret II e Senuseret III, os


hebreus gozaram de um próspero período de paz onde frutificaram,
multiplicaram-se e se fortaleceram, passando de um nomo familiar
para um povo numeroso e grande. Este próspero período de paz é
historicamente alinhado na egiptologia desde a chegada de asiáticos
ao Egito até a ascensão dos hicsos, os quais tornaram-se governantes
do Baixo Egito, tendo por capital a cidade de Avaris e com uma
posição política de amistosidade, tomada por eles em relação a
outros povos asiáticos, inclusive os hebreus. De aproximadamente
1885 a.C., quando José torna-se Vizir no Egito a 1550 a.C. com a
derrota de Apepi, último grande governante hicso da 15ª dinastia,
passam-se 3 séculos. Este período será drasticamente encerrado com
a ascensão de novos monarcas “nativamente egípcios” os quais tem o
desejo de expulsar os hicsos e unificar mais uma vez o Egito. É esta
sequência de fatos da história egípcia que demonstrará de maneira
muito clara o processo de opressão e escravidão dos hebreus no
Egito e, para isto, será analisada a sequência histórica e cronológica
dos reis sucessores e a harmonização dos fatos em tempo com o
terceiro macroevento, a “opressão e escravidão dos hebreus neste
período”.

Taa Seqenenre
Após 150 anos de domínio dos hicsos sobre o Egito (1650-1550 a.C.),
Taa Seqenenre (Senakhtenra) se rebelou (aprox. 1560 a.C.). Ele era
príncipe egípcio de uma jurisdição no alto Egito e vassalo dos hicsos
a quem deveria pagar tributos. Neste período, nasceu uma
hostilidade entre os egípcios nativos de Tebas e os hicsos. David
(2003, p88) declara que “No final deste período, alguma hostilidade
parece ter se desenvolvido entre os hicsos e a população nativa.
Estrangeiros foram usados cada vez mais para administrar o Egito e
isso pode ter levado ao ressentimento.” O registro da rebelião de
Seqenenre aparece num relato lendário de uma data posterior e não
revela o sucesso ou o fracasso da tentativa dele em restaurar a
independência do Egito, fato é que sua múmia mostra terríveis
feridas na cabeça, possivelmente recebidas no campo de batalha
enquanto lutava contra os hicsos.

Um papiro escrito no reinado do governante da 19ª dinastia Merenptah (1213-


1203 a.C.), cerca de 350 anos depois, preserva fragmentos da história de uma
discussão entre Seqenenre e Apepi. Seqenenre é descrito como o “Príncipe da
Cidade do Sul”, enquanto Apepi é rei (nesu), a quem todo o Egito rende tributo
(...) (Shaw, 2003, P. 198).

A múmia de Seqenenre Ta’a II foi salva de pilhagem no tempo de Ramsés IX e


foi colocada juntamente com outras relíquias reais ameaçadas, no esconderijo
descoberto em 1881 por Gaston Maspero, o corpo tem as marcas de uma morte
violenta, provando evidências da hostilidade entre o norte e o sul. Existem dois
registros sobreviventes sobre o conflito (Grimal, 2005, p. 190,191).

FIGURA 14: Múmia de Seqenenre com detalhe da face. Disponível em:


https://imgur.com/gallery/xskswhV. Acesso em 19/11/2019.

Kamose
Shaw (2003) mostra que a verdadeira luta pela independência egípcia
do governo hicso começou com Kamose (Wadjkheperra) – (1555-1550
a.C.), o filho e sucessor de Taa Seqenenre. Kamose era um guerreiro e
“Kamose o Bravo” era um dos epítetos mais frequentes. Seu
oponente era Aauserra Apepi, o mais poderoso dos reis hicsos47.
Shaw (2003, p. 180) descreve que “o zênite do período Hicso é o
reinado de Aauserra Apepi (aprox. 1555 a.C.), apesar do fato de que
dois reis tebanos lideraram campanhas contra ele.” Não se pode
mensurar pelos registros quanta destruição foi infligida aos hicsos
por Kamose, porém textos mencionam cavalos e carruagens inimigas
tomadas como parte do saque em suas batalhas diretas com o reino
do baixo Egito. Apesar de ter êxito em expulsar os hicsos do alto e
médio Egito e limitar o poder deles à região leste do Delta, Kamose
não viveu para ver sua expulsão definitiva e temos em seu reinado o
fim da 17ª dinastia de reis do Segundo Período Intermediário.

Ahmose48
É o filho de Seqenenre e irmão mais novo de Kamose, estabelece o
início do Novo reino e da 18ª dinastia dos reis egípcios (David,
2003)49. Ahmose põe fim ao governo dos reis hicsos, com a tomada de
sua capital, Avaris, e sua expulsão total do Egito, chegando até o
aniquilamento de Sharuhen, posto avançado dos hicsos na Palestina.

A guerra deve ter durado pelo menos trinta anos, já que sabemos que Seqenenre
Taa, o pai de Ahmose, lutou contra os hicsos, mas que Avaris não foi tomada até
entre os anos 18º e 22º do reinado de Ahmose (Shaw, 2003, P. 197)

Três governantes tebanos foram especialmente envolvidos com a expulsão dos


hicsos: Seqenenre Ta’o II, Kamose da 17ª dinastia, e Ahmose, que fundou a 18ª
dinastia. Várias fontes (o Carnarvon Tablet, uma estela e fragmentos de uma
inscrição histórica descoberta em Karnak) fornecem detalhes das campanhas de
Kamose contra o governante hicso Auserre Apophis I. Eles indicam que Kamose
foi assistido por soldados nubianos do Sul e chegou a Avaris, onde atacou o
hicsos antes de voltar para Tebas. Seu irmão, Ahmose, finalmente tirou os
hicsos do Egito e provocou a queda de Avaris. (David, 2003, p. 89)
Com a queda de Avaris por Ahmose, os hicsos foram para Sharuhen, no sul da
Palestina, perto de Gaza. Ahmose levou seu exército para a Palestina em uma
campanha que culminou em um cerco de três anos a Sharuhen e a conquista da
mesma, forçando a fuga dos hicsos para o norte e marcaram o fim de seu
domínio, bem como seu desaparecimento da história. “Um relatório detalhado
sobre estas campanhas é deixado por um funcionário em Elkab, Ahmose, filho
de Ibana, na autobiografia decorando seu túmulo”. (Grimal, 2005, p. 193)

A reunificação do Alto e do Baixo Egito com capital em Tebas faz


o Egito imergir para um novo período imperial e como uma grande
potência internacional. Este novo reino determina a criação e
manutenção de um poderio militar para fazer frente a algum futuro
ataque de grupos estrangeiros ao Egito (David, 2003)50. Uma nova
onda de nacionalismo renasce e a tolerância com os estrangeiros
acaba (povos asiáticos).

FIGURA 16: Múmia de Ahmose. Disponível em:


https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ahmose-mummy-head.png. Acesso em: 09/4/2018

Apesar dos “egípcios nativos” não exterminarem os povos


asiáticos restantes no Egito, ao embarcarem na construção de um
grande império, fizeram das populações asiáticas remanescentes
“prisioneiros de guerra” e as obrigaram a trabalhar como escravos
nas construções de seus projetos de defesa e palácios reais, inclusive
os hebreus.

(...) temos razões para acreditar que houve um significativo número de


elementos estrangeiros no Delta do Nilo, especialmente os das classes mais
baixas que permaneceram no Egito após a expulsão dos hicsos, bem como
milhares de prisioneiros de guerra levados para o Egito como consequência das
campanhas militares dos faraós da Décima Oitava dinastia (Arnold e Hess, 204,
pg. 55,56)

Sob Ahmose I de Tebas, o período do Novo Império (1567 a. C.-1220 a.C.,


dinastias: 18ª-19ª) começou resultando em um dos períodos mais brilhantes da
história egípcia. O Egito emergiu como um poder internacional e ampliou sua
influência até o rio Eufrates. Durante a 18ª dinastia, ocorreram os eventos do
Livro do Êxodo. Este foi um tempo em que uma nova onda de nacionalismo
egípcio havia suplantado a antiga tolerância aos estrangeiros. Os egípcios
embarcaram na construção de um império como um meio de defesa, puxando
suas fronteiras para a Palestina. Aparentemente, não quiseram erradicar a
população semítica já estabelecida no Egito, então os faraós egípcios os usavam
como trabalho escravo para a construção de projetos de defesa e palácios reais.
(Walvoord e Zuck, 1983, p. 106)
(...) quando os governantes hicsos e a elite militar recuaram para Canaã depois
de ser atacado pelo rei Tebano Ahmose por volta de 1525 a.C., acredita-se de
comum acordo que a maioria dos povos de língua semítica permaneceu no
Egito. Os hebreus provavelmente foram incluídos entre estes “asiáticos” no
delta do Nilo, que levou o paranoico faraó do livro de Êxodo (1. 8-10) a iniciar a
subjugação dos israelitas. (Arnold, Bill T. e Hess, Richard, 2014, pg. 55)
O novo rei ... que não conhecia sobre José. A identidade deste faraó é incerta,
mas possivelmente ele era Ahmose I, fundador da 18ª dinastia, ou mais
provavelmente, Amenhotep I (1545-1526) ou Tutmés I (1526-1512) (...) (Walvoord
e Zuck, 1983, pg. 108)

Este processo de militarização, ampliação das fronteiras com a


construção de projetos de defesa e reconstrução de cidades, foi
necessário e intenso a fim de que esta nova ordem internacional
renascida da reunificação do Alto e Baixo Egito pudesse sobreviver.
Shaw (2003) descreve que o projeto de construção mais imediato de
Ahmose foi na capital de Avaris, a qual ele planejou para ser um
grande centro comercial para o novo governo utilizar51. A capital
Menfis foi reconstruída e seu programa de edificação honrou aos
deuses cujos templos floresceram no Reino Médio: Ptah, Amon,
Montu e Osíris, constituindo as bases de um programa tradicional de
construções faraônicas.52 Grimal (2005) confirma que Ahmose fez
ampliações no templo de Amon-Ra em Karnak, no templo de Montu
em Armant, e construiu dois cenotáfios53 em Abidos54,
demonstrando esta tendência de empreendimentos faraônicos.

Amenhotep I
Também conhecido como Djeserkara (1525 a 1504 a.C), conforme
Shaw (2003) relata, ainda não era um homem adulto quando chegou
ao poder e pode ter havido uma breve corregência com seu pai
Ahmose para assegurar a transição pacífica e continuidade da
dinastia recentemente estabelecida, sendo certo que sua mãe
Ahmose-Nefertari figurava proeminente em seu reinado. Associado
com sua mãe, ele fundou a comunidade de trabalhadores da
necrópole real de Deir El-Medina e compartilhou com ela um túmulo
em Dra’Abu el-Naga,55 em Tebas (David, 2003)56. Apesar deste
governo de continuidade aos empreendimentos de seu pai (edifícios
que podem ter sido concebidos por Ahmose e expedições militares
no sul, completando campanhas anteriores), é notório o sucesso de
Amenhotep I como governante, pois, logo após sua morte, tanto ele
como sua mãe foram “deusificados” e adorados em Tebas (Shaw,
2003)57.
FIGURA 17: Cabeça de Amenhotep. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Amenhotep_I#/media/File:AmenhotepI-
StatueHead_MuseumOfFineArtsBoston.png. Acesso em 14/03/2018.

Estudar a governança de Taa Seqenenre até Amenhotep I é


importante para se entender o processo de opressão e escravidão dos
povos asiáticos, porém antes de fazer-se a harmonização deste
processo com o relato bíblico, deve ser compreendido o contexto de
escravidão no Egito Antigo. Deve-se entender que a terminologia
usada para se referir à classes de pessoas com “liberdade limitada”,
ou a definição de escravo no contexto egípcio, difere do mundo
moderno. David (2003)58 descreve que no Egito Antigo não havia uma
classe de pessoas totalmente desprovida de direitos legais, embora
tenham havido casos de pessoas que tenham sido aprisionadas,
vendidas ou alugadas. Ela declara que havia inúmeros escravos que
trabalhavam para particulares, para o templo e para o rei e eram
divididos em categorias que iam desde camponeses, criminosos
condenados e prisioneiros de guerra trazidos de campanhas
estrangeiras. Uma parte da população poderia tornar-se “escravo” ou
“servo”, no sentido de um trabalhador recrutado e pago pelo estado
para executar trabalhos de construção de pirâmides, deveres
militares ou extração de minério59, sendo que este “trabalho”, seria
proveitoso para muitos camponeses que durante o período de
inundação do Nilo ficavam privados de sua atividade econômica.
David (2003, p. 79) é clara ao afirmar que neste caso “Eles não eram
escravos no sentido moderno, porque eles não eram “de
propriedade”, mas suas vidas e as oportunidades foram muito
limitadas. ” Ainda neste contexto, Posener (1957), como já vimos no
capítulo I, ao referir-se à lista de escravos estrangeiros citados no
Papiro do Brooklyn, com inscrições datadas da 12ª dinastia, faz
menção que muitos deles estavam classificados por nome e ofício e
confirma um novo fato de que, em determinado período, o Egito
recebeu estrangeiros que vieram para trabalharem como “escravo-
servo”, ou seja, pessoas estrangeiras que se submeteram a uma
limitação de direitos em troca de uma recompensa econômica. David
(2003) informa ainda da existência de prisioneiros de guerra e
condenados criminosos que trabalhavam realmente como escravos
(pessoas com mínimos direitos legais).

(...) os egípcios tinham explorado amplamente a região para o ouro. Isso veio
principalmente de minas em Wawat que foram trabalhadas por escravos,
prisioneiros de guerra e condenados criminosos. (David, 2003, p. 126)

De maneira semelhante, Shaw (2003)60 descreve caso de asiáticos


que foram capturados, feitos prisioneiros e passaram a executar
trabalho escravo. Observa-se que o termo escravo, segundo Rosalie
David e Shaw, inclui basicamente a ideia do “escravo como servo”, no
sentido de um trabalhador recrutado e pago e o “escravo”, no sentido
do condenado criminoso ou prisioneiro de guerra executando
trabalhos com mínimos direitos. Blake, ao tratar sobre a história da
escravidão no mundo, enumera duas classes de escravos, os
voluntários e os involuntários.
As duas classes agora enumeradas compreendem aqueles que podem ser
chamados de “escravos voluntários”, e eles se distinguem dos denominados
“escravos involuntários”, que eram forçados, sem qualquer condição ou escolha
prévia, a uma situação que, como tende a degradar uma parte da espécie
humana, e classificá-la com a brutalidade, deve ter sido, de todas as situações, a
mais miserável e insuportável. (Blake, 1861, p. 18)

Shaw (2003)61 diz que a economia do Egito não foi baseada em


trabalho escravo e isto vai de encontro a David (2003) quando fala dos
trabalhadores recrutados. Porém vimos que a relação de escravo
como servo (trabalhadores recrutados) e de escravo (condenado
criminoso ou prisioneiro de guerra) se estabeleceu no Egito e pode
ser melhor entendida à luz da declaração de Blake, o que podemos
concluir que no Egito havia escravos voluntários e involuntários.
Ao examinar o contexto histórico de eventos desde o levante do
rei tebano Taa Seqenenre, observa-se um processo traumático, que
levou mais de 20 anos até a plena derrota e expulsão dos hicsos no
governo de Ahmose. Esta vitória trouxe a reunificação do Alto e
Baixo Egito e o estabelecimento do Egito como uma nova potência
mundial. Este processo trouxe uma onda de nacionalismo e um
extremismo que pôs fim à tolerância para com os estrangeiros (povos
asiáticos) e o embarque dos egípcios em um faraônico programa de
construções que os faz tornar as populações asiáticas remanescentes
como “prisioneiras de guerra” e as obriga a trabalhar como escravos
nas construções de projetos de defesa e palácios reais.
A narrativa bíblica de Êxodo 1.8-14, ao declarar o fato histórico do
aparecimento de um novo rei, o qual não conhecerá a José, e a
maneira como o povo foi obrigado a trabalhar como “escravos
involuntários” na edificação de cidades como Pitom e Ramsés, é por
demais harmoniosa com o registro histórico-arqueológico. O
historiador e apologista Flávio Josefo em a História dos Hebreus,
capítulo 5, ao falar do tratamento cruel que os egípcios deram aos
israelitas, escreve:
Tendo o tempo apagado a memória das obrigações que todo o Egito devia a José
e tendo o reino passado a outra família, eles começaram a maltratar os israelitas
e a oprimi-los com trabalhos. Empregaram-nos em cavar vários diques para
deter as águas do Nilo e diversos canais para conduzi-las. Faziam-nos trabalhar
na construção de muralhas para cercar as cidades e levantar pirâmides de altura
prodigiosa, obrigando-os até mesmo a aprender, com dificuldade, artes e
diversos ofícios. (Josefo, 2004, p. 89)

Walvoord e Zuck (1983) e Josefo (2003) nos dão grandes evidências


que os faraós egípcios tornaram os hebreus como prisioneiros de
guerra e escravos com mínimos direitos legais passando de maneira
obrigatória e opressa a trabalharem nas construções dos projetos de
defesa e palácios. Podemos tomar as palavras de Blake (1861, p. 18) e
dizer que os hebreus, na condição de “escravos involuntários” e
forçados de maneira opressa a trabalhar, a condição “deve ter sido,
de todas as situações, a mais miserável e insuportável” e esta
miserável e insuportável condição de trabalho era afligida na dura
servidão de trabalhar na fabricação de tijolos de barro, no campo e
com todo tipo de serviço (Êxodo 1.13,14) e no que tange à utilização
pelos egípcios de tijolos de barro em suas construções, é um fato
ocorrido em vários locais e períodos de sua história. É claro que os
blocos de pedra utilizados nos projetos de construções egípcias, pela
sobrevivência dos monumentos, torna mais aparente estas
construções, mas não oblitera a evidência de construções feitas com
os tijolos de barro, inclusive na ascensão dos reis da 18ª dinastia.

Thutmose I e seu vice-rei Turi deixaram monumentos e inscrições em um


número de sites na Nubia superior e inferior. Várias instalações de tijolos
podem datar de seu reinado na região de Kenisa (na quarta catarata) e em
Napata. (...) Thutmose III e Hatshepsut pode muito bem ter reconstruído
edifícios de tijolos deste tipo em arenito, particularmente no Semna e Buhen.
(Shaw, 2003, P. 222)

David (2003) faz uma explicação detalhada do processo de


introdução e fabricação de tijolos no Egito ao descrever que, no
início, as edificações eram feitas com junco, o que mais tarde
passaram a ser rebocadas com argila, que lhes deu estabilidade e
proteção adicional ao calor e frio, porém a invenção do molde de
tijolo em aproximadamente 3.400 a.C., trouxe uma revolução ao
processo industrial e construtivo. A fabricação de tijolos era uma
prática no Egito mais que em qualquer outro lugar, pois possuía
matéria-prima (barro do Nilo e calor da luz solar) em abundância. No
entanto, o aprimoramento tecnológico com a demanda cada vez
maior de grandes monumentos os fez substituir, em determinadas
edificações, os tijolos de barro por blocos de pedra.

(...) O assentamento planejado do início da 12 ª dinastia. Este assentamento, na


área F/I, dois ou três estratos dos quais foram parcialmente descobertos, foi
construído de tijolos de barro inicialmente dispostos ao longo de um plano
ortogonal muito regular. As unidades de vida, cada uma cobrindo apenas 10 por
10 côvados (25 m²), foram construídos juntos em longos blocos retangulares. As
ruas entre os blocos eram apenas 10 côvados de largura. Ao Norte, uma parede
do recinto foi encontrada. (Bietak, 1996, pág. 9)

David (2003) ainda descreve que a fabricação de tijolos de barro é


ilustrada em tumbas do Reino Médio, na 18ª dinastia (cena do
tumulo do Vizir Rekhmire em Tebas) e 25ª dinastia (cena no templo
de Medinet Habu onde o rei Taharka é representado fazendo este
procedimento) e que basicamente os tijolos egípcios eram fabricados
com o aluvião ou lama do rio Nilo cujas proporções de argila
variavam dependendo da região, fazendo com que fosse necessário
em muitos casos a adição de palha picada para ligar a mistura, o que
é citado em vários papiros e no livro de Êxodo, o que corrobora em
muito a narrativa bíblica.

“(...) assim, lhes fizeram amargar a vida com dura servidão, em barro e em tijolos (...)” Êxodo 1.14

“Portanto, deu ordem Faraó naquele mesmo dia aos exatores do povo e aos seus oficiais, dizendo:
Daqui em diante não torneis a dar palha ao povo, para fazer tijolos, como fizestes ontem e
anteontem; vão eles mesmos e colham palha para si. ” Êxodo 5.6,7
Observando o cenário geral apresentado até aqui e confrontando
com a narrativa de Êxodo 1.8, podemos ver na morte de Aauserra
Apepi , último rei dos hicsos, o fim de um governo regido pelas
alianças com outros povos asiáticos, inclusive com os hebreus, e o
início do governo de faraós nativos que não tinham quaisquer
amistosidades com os asiáticos, ao contrário, um espírito de
ressentimento e nacionalismo que levou ao processo de escravidão
destes povos, trazendo enorme evidência que o faraó da opressão é
Ahmose. Outro fato concomitante e não menos importante é a
construção das cidades celeiros de Pitom e Ramsés como evidências
deste processo.

“E puseram sobre eles maiorais de tributos, para os afligirem com suas cargas. Porque edificaram a
Faraó cidades-armazéns, Pitom e Ramessés.” Êxodo 1.11

Henri Edouard Naville62 (1844-1926) foi arqueólogo suíço,


egiptólogo, estudioso da Bíblia. Seu trabalho de exploração é vasto,
além de se destacar como escritor. Ele escavou vários locais no Delta
do Nilo, incluindo Tell el-Maskhuta (1982), Wadi Tumilat (1885-86) e
outros. Naville63 (1885) faz uma preciosa descrição sobre a cidade de
Pitom ao dizer que no lado sul do canal de água doce que vai do
Cairo a Suez, através do Wadi Tumilat, a cerca de dezenove
quilômetros do canal Ismaihah, havia ruínas de casas europeias
abandonadas, as quais pertenceram a engenheiros e trabalhadores
que escavaram o canal Ismaihah. O nome árabe do local diz ele é Tell
el-Maskhuta, “O Monte da Estátua” e os franceses o chamaram de
Ramsés. Ele declara, a partir do trabalho do engenheiro Le Pere, que
as ruínas tinham todas as características de uma cidade egípcia.
Monólitos de granito em forma de poltrona com figuras egípcias,
hieróglifos, mostravam a existência de um templo. Naville diz que
estes achados tinham levado o Sr. Lepsius a considerar o monumento
como do deus local da cidade a qual foi consagrada e, portanto,
identificar Tell el-Maskhuta como a cidade de Ramsés, construída
pelos israelitas durante a opressão. Este nome acabou sendo adotado
para o site. M. Paponot fez escavações no local e descobriu duas
esfinges em granito preto e mais um santuário, além de uma grande
estela em granito vermelho. A descoberta desses monumentos
pertencentes ao reinado de Ramsés II, diz Naville, levou a uma
evidência adicional a favor de M. Lepsius de que o site era a cidade
de Ramsés, porém estudos mais acurados nas descobertas realizadas,
como em outros monumentos e no papiro do Museu Britânico,
resultaram em uma nova evidência, de que Tell el-Maskhuta não era
a cidade de Ramsés, mas Pitom, a cidade ou a morada de Aton.
Naville declara que passou a escavar o local e lista os principais
monumentos achados, inclusive uma estátua de um homem
agachado, em granito vermelho, um comandante do rei Osorkon II,
“Ankh Renp Nefer”, “O bom Gravador de Pitom”. Após minucioso
trabalho, Naville (1885, pág. 5) declara que “Tell el-Maskhuta” não foi
Ramsés, como M. Lepsius tentou provar, mas a cidade ou morada de
Aton, uma das cidades o qual o Êxodo conta que foi construída pelos
israelitas sob o comando do opressor. ” Manfred Bietak64, arqueólogo
austríaco e egiptólogo, é reconhecido como diretor das escavações no
Delta do Nilo, onde foram confirmados os sites da antiga cidade de
Avaris e Pi-Ramsés e, acerca do site Tell el-Maskhuta, ou “cidade de
Pitom”, escreve:

Sabemos que o assentamento agora chamado Avaris (Hwt-wrt), é “a (real)


fundação do distrito “. Durante o reinado do Rei Nehesy (1710 a.C.), tornou-se a
capital de um pequeno reino que deve ser considerado como parte da 14ª
dinastia. A dinastia obviamente dependia fortemente dos colonos asiáticos na
região. Tell el-Daba, no entanto, não é o único site da Idade do Bronze Médio no
Delta Oriental. Durante a 13ª dinastia, sabemos que pelo menos Tell el-Farasha
e Tell el-Maskhuta também haviam sido ocasionalmente estabelecidas por
cananeus. (Bietak, 1996, pág. 40)

O posicionamento de Bietak referente ao site Tell el-Maskhuta ou


cidade de Pitom ter sido estabelecida por povos asiáticos durante a
13ª dinastia é muito harmonioso como todo o contexto histórico
desta época e seu relacionamento com o relato bíblico. David (2003,
pg132) descreve que Tell el-Maskhuta é possivelmente a antiga
cidade de Pitom mencionada no livro de Êxodo na Bíblia. A análise
do site Tell el-Maskhuta demonstrou ter tido traços culturais “siro-
palestinos” ou como já vimos de povos asiáticos.

Como um fenômeno cultural, os hicsos foram descritos como “peculiarmente


egípcios”. A mistura de traços culturais egípcios e sírio-palestinos - expressos
em objetos dos estratos D / 3 e D / 2 (= reinado de Apepi) no Tell el-Daba - pode
ser reconhecida em uma ampla área do Delta, de oeste para leste: Tell Fauziya e
Tell Geziret el-Faras, a oeste do o ramo navegável do Nilo e incluindo Farasha,
Tell el-Yahudiya, Tell el-Maskhuta e Tell el-Habua a leste. Esses sites são todos
muito, muito menores que Tell el-Daba e o principal período de ocupação
coincide em cada caso com os últimos estratos de hicsos, mas dois deles, Tell
El-Maskhuta e Tell el-Yahudiya, chegaram ao fim antes do período
representado pelo último estrato hicsos (D/2) no Tell el-Dabea. El-Maskhuta e
seus sites satélites estão localizados no Wadi Tumilat, que levou a uma das
principais rotas do norte do Sinai para a Palestina. (Shaw, 2003, pág. 182)

Bietak, através de esmagadoras evidências obtidas de suas muitas


escavações, conseguiu mudar a opinião dos egiptologistas sobre a
localização da cidade de Avaris e de Pi-Ramsés, determinando que o
local respectivo destas cidades é: Tell el-Dab’a e Qantir.

A maioria dos egiptologistas, no entanto, seguiu a teoria de Pierre Montet e


outros que Avaris e Pi-Ramsés estavam localizados em Tanis. E foi a
esmagadora evidência de nossas muitas estações de escavações que finalmente
mudou a opinião geral dos estudiosos. Hoje Avaris e Pi-Ramsés são
identificados com Tell el-Dab’a e Qantir, respectivamente. Juntos eles cobrem
uma área de aproximadamente 12 quilômetros quadrados de Qantir no Norte
para Ezbet Gayel e Ezbet Gezira el-Baghl no sul. (Bietak, 1996, pág. 1)

A pesquisa de Bietak65 (1996) revelou ambas as cidades em área


estratégica, com localização no ramo navegável do Nilo, dando a
estas cidades acesso ao mar Mediterrâneo. O trabalho de
estratificação revelou uma ocupação datada desde a 12ª dinastia até o
período “Ramessídico”, ou seja, mais de um milênio de atividades
poderiam ser estudadas nestas localidades. Evidências arqueológicas
confirmam que no final da 12ª dinastia, a cidade de Avaris se
expandiu e que seus moradores não eram egípcios, mas sim pessoas
de Canaã (os asiáticos). Petrie (1906)66,67 foi diretor de um grupo de
estudos da escola britânica de arqueologia no Egito, suas escavações
realizadas no “Templo de Onias”, “Cemitério e forte Hicso”,
“Cemitério de Gósen” e “Torre de Ramsés e Sucote”, foram reunidas
em precioso trabalho. A primeira parte da história encontrada foi o
assentamento da Wadi Tumilat na 12ª dinastia e provavelmente já na
9ª dinastia. Alguns objetos em Tell el Yehudiyeh, mostraram que este
campo estava também ocupado na 12ª dinastia. O site mostra a
rápida mudança do uso de trabalho em barro e depois trabalho em
pedra em grande escala mostrando que as ideias iniciais dos
bárbaros invasores (os diversos povos asiáticos) foram alteradas pelo
contato com os egípcios. A equipe fez trabalhos de levantamento em
sítios arqueológicos “cemitérios”, que forneceram, através do
levantamento das sepulturas, os significativos traços de mudança
entre 12ª e a 18ª dinastias, seja nos estilos dos escaravelhos, da
cerâmica estrangeira negra e da cerâmica egípcia. O próximo
período, a 18ª dinastia, mostrou em Tell el Yehudiyeh os últimos
estágios dos enterros seguindo os do cemitério anterior. E em Sa , a
antiga cidade de Gósen, um grande cemitério iniciado nesta época
forneceu quantidade considerável de colares e amuletos. Sobre estes
sites escavados, Petrie (1906, pág. 2) afirma que: “O local assim
ocupado por ele agora é visto para cumprir, em todas as maneiras, os
acontecimentos da cidade de Ramsés, com a cidade irmã de Pitom,
onde os israelitas são declarados trabalhando”. A importância
científica dos sites de Tell el-Dab’a, a “cidade de Avaris”, Tell el-
Maskhuta, a “cidade de Pitom”, e Qantir, “A cidade de Ramsés ou Pi-
Ramsés”, para a arqueologia, é valiosíssima. São cidades localizadas
na região do Wadi Tumilat, a “Terra Bíblica de Gósen”, conhecida
como local da moradia dos hebreus. Estas cidades fazem aflorar um
cenário arqueológico de ocupações dos povos asiáticos desde a 12ª
até a 18ª dinastia aproximadamente, exatamente o período de
chegada e estabelecimento dos hebreus no Egito. Ramsés e Pitom
são apontadas por renomados egiptologistas, sem dúvidas, como
sendo as cidades citadas no texto bíblico de Êxodo 1.11 e são
indelével evidência de terem sido ocupadas por asiáticos, evidências
estas que apontam firmemente para os hebreus, aliás, podemos,
como Thompson (2006, pg.68), fazer a nobre citação de W. F.
Albright: “A permanência de Israel no Egito é uma parte vital da
primitiva tradição histórica israelita e não pode ser eliminada sem
deixar uma lacuna inexplicável”. Antes de avançar, importante fato
concernente à cidade de Pi-Ramsés deve ser compreendido para a
presente harmonização temporal dos eventos. É evidente para a
arqueologia egípcia que o atual site Qantir foi uma das cidades de
ocupação dos povos asiáticos desde a 12ª até a 18ª dinastia
aproximadamente e na 19ª dinastia, durante o reinado de Seti I, um
templo é erigido em Avaris, seu filho Ramsés II então, expande a
cidade e constrói uma grande residência real chamada de Pi-Ramsés.

Ele (Seti I) também embarcou em um ambicioso programa de construção.


Praticamente em todos os lugares do país e particularmente nos grandes
centros religiosos de Tebas, Abidos, Memphis e Heliópolis, novos templos
foram erigidos ou os existentes expandidos. Entre estes últimos estava o templo
de Seth em Avaris, a cidade que logo se tornaria a nova residência dos
governantes dos Ramessidas no Delta do Nilo. (Shaw, 2003, pág. 286)
Ramsés II foi o rei que expandiu a cidade de Avaris e fez dela no Delta do Nilo
uma grande residência chamada Pi-Ramsés (casa de Ramsés) (Shaw, 2003, pág.
292)

Seti I construiu um palácio em Avaris, do qual alguns fragmentos sobreviveram,


mas foi Ramsés II que transformou em sua capital e comprometeu-se na
construção da cidade real de Pi-Ramsés (Grimal, 2003, pág. 261)

Pi-Ramsés ou “A cidade de Ramsés”, como ficou conhecida, toma


lugar de proeminência na história principalmente por ser citada na
Bíblia, e estudiosos, então, por inferência, passaram inicialmente a
datar o Êxodo, considerando uma data mais tardia, em torno de 1270
a.C e colocando Ramsés II no cenário de embate com Moisés. Esta
datação traz diversos problemas cronológicos e então uma data mais
recente para o Êxodo tem sido ventilada em torno de 1446 a.C.
Sabendo-se que o livro do Êxodo foi escrito por Moisés depois de
1440 a.C., durante os quarenta anos no deserto, e que compilações do
original foram efetuadas principalmente durante o período do Exílio
Judaico, é passível, no processo historiográfico, de haver tal
anacronismo68.
A conclusão que fazemos dentro do processo de opressão e
escravidão dos hebreus no Egito narrado no texto bíblico é, diante da
análise dos eventos egípcios, impressionantemente harmoniosa com
as evidências arqueológicas e históricas egípcias ocorridos no
período. A forma drástica como é encerrado o poder dos reis hicsos e
a ascensão de novos monarcas “nativamente egípcios” marca o fim
da tolerância aos estrangeiros, novos sentimentos nascem como o
nacionalismo, um certo estado odioso em relação aos “povos
asiáticos” e, por fim, a escravidão destinada a estes com o objetivo
único dos egípcios alcançarem a construção de um grande império. É
esta sequência de fatos da história egípcia que demonstra claramente
como os hebreus foram opressos e escravizados, passando a construir
as cidades celeiros de Piton e Pi-Ramesés e forjando no método
apresentado de eventos a perfeita sincronização temporal e de
narrativa histórica.

47. Shaw, 2003, p. 199.


48. Ahmose (1550-1525): também conhecido como Amósis ou Ahmés
49. David, 2003, p. 105
50. David, 2003, p. 271
51. Shaw, 2003, p. 208
52. Shaw, 2003, p. 209
53. Cenotáfio (do latim tardio cenotaphium, do grego κενοτάϕιον, composto de κενός “vazio”
e ταϕός “tumba”) é um memorial fúnebre erguido para homenagear alguma pessoa ou grupo
de pessoas cujos restos mortais estão em outro local ou estão em local desconhecido.
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Cenot%C3%A1fio. Acesso em: 10/04/18.
54. Grimal, 2005, p. 200
55. A necrópole de Dra ‘Abu el-Naga’ está localizada na margem oeste do Nilo, em Tebas, no
Egito, perto da entrada da baía seca que leva até Deir el-Bahri e ao norte da necrópole de El-
Assasif. A necrópole está localizada perto do Vale dos Reis. Foi provavelmente usado como
uma necrópole real para os reis da Décima Sétima dinastia, e contém o possível túmulo de
Amenhotep I, Tumba ANB. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Dra%27_Abu_el-
Naga%27. Acesso em: 10/04/18.
56. David, 2003, p. 105
57. Shaw, 2003, p. 213
58. David, 2003, p. 362
59. David, 2003, p. 79
60. Shaw, 2003, p. 152
61. Shaw, 2003, p. 94
62. (Édouard Naville, Wikipédia . Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/%C3%89douard_Naville . Acesso em: 19/03/18)
63. Naville, 1885, pág. 1-4
64. Manfred Bietake, Wikipédia . Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Manfred_Bietak. Acesso em: 19/03/18)
65. Bietak, 1996, pg. 3-5
66. . Sir William Matthew Flinders Petrie (Charlton, 3 de junho de 1853 — Jerusalém,
Mandato Britânico da Palestina, 28 de julho de 1942) foi um arqueólogo e egiptólogo
britânico nascido em Charlton, próximo a Greenwich, Londres, um pioneiro de metodologia
sistemática em arqueologia que inventou um método para reconstituir a sequência de
acontecimentos históricos em culturas antigas. (Flinders Petrie, Wikipédia . Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Flinders_Petrie. Acesso em: 19/03/18).
67. Petrie, 1906, pág. 1,2
68. Anacronismo consiste em atribuir a uma época ou a um personagem da história,
sentimentos, costumes que são de outra época. No anacronismo podemos ter uma
localidade nomeada pelo seu nome mais recente o que facilitaria o entendimento do leitor.
6
HARMONIZAÇÃO DOS EVENTOS
CRONOLÓGICOS ATÉ MOISÉS

“Achar uma agulha no palheiro” é uma figura de linguagem que


expressa alguma coisa difícil de ser encontrada em um grande espaço.
Importante dizer que a frase não diz ser impossível achar a agulha,
mas, sim, uma tarefa muito difícil. De forma análoga, pode-se dizer
que encontrar eventos sequenciais que, somados, formem um frame
histórico e cronológico específico e harmonioso em um espaço de
tempo tão grande como a história do Egito Antigo é uma tarefa
difícil, quanto mais ligar este frame temporal e histórico a um outro
frame menor em tempo, como a história bíblica do Êxodo e não forçar
datações, causalidades temporais e narrativas, pode-se também dizer
ser difícil, mas não impossível para a pesquisa científica e isto seria
certamente a “agulha achada no palheiro”. Mark (2016) escreve que
Moisés é considerado um dos líderes religiosos mais importantes da
história do mundo e reivindicado como profeta de Deus por grandes
religiões como: cristianismo, judaísmo e islamismo. Há um elo
cronológico muito harmonioso entre os eventos relacionados a
Moisés no Êxodo com os eventos da história egípcia e entender este
harmonioso elo é entender, conforme Mark (2016), a história de um
dos mais destacados líderes de todos os tempos, mais que isto, a
história de um povo, os hebreus, narrada no livro de Êxodo.
O quarto macroevento passa então a ser descortinado, contudo,
antes de se dar continuidade a harmonização proposta, é necessário
compreender um pouco da “cronologia da antiguidade”. O atual
calendário civil, conhecido como “Era Cristã” ou “Era Comum”,
globalmente adotado, nasceu conforme Tarsia (1995), em 1582 a partir
de uma Bula Papal “Inter Gravíssima”, como uma reforma do
calendário juliano. A origem de contagem dos anos no calendário
gregoriano é o ano do nascimento de Jesus Cristo, estabelecido como
a origem da era cristã e o ano 1 do calendário, onde temos assim uma
ordenação do tempo “antes de Cristo” ou “a.C.” e “depois de Cristo”
ou “d.C.”. A maioria dos povos antigos datavam eventos importantes
com o número de anos a partir da ascensão de cada rei, e, no caso do
Egito, o reinado de cada novo rei representou um novo começo não
filosoficamente, mas em termos de datas.

Como a maioria dos outros povos antigos, os antigos egípcios datavam


importantes eventos políticos e religiosos não de acordo com o número de anos
que tinha decorrido desde um ponto único fixado na história (como o nascimento
de Cristo no calendário ocidental moderno), mas em termos dos anos desde a
ascensão de cada rei atual (anos de reinado). Datas foram, desta maneira,
registradas no seguinte formato típico: “dia 2 do primeiro mês da estação peret69,
no quinto ano de Nebmaatra (Amenhotep III).” É importante estar ciente do fato
de que, para os egípcios, o reinado de cada novo rei representou um novo
começo, não apenas filosoficamente, mas na prática, dado o fato de que as datas
foram expressas em tais termos. Isso significa que provavelmente teria havido
uma tendência psicológica a considerar cada novo reino como um novo ponto de
origem (...) (Shaw, 2003, p. 6)

Ao tratar da história e da arqueologia bíblica e dos eventos muito


antigos que remontam em época, a história dos caldeus, dos povos
mesopotâmicos, dos egípcios, observa-se que cada povo desenvolveu
uma maneira de datar ou contar seu tempo. A ciência precisa então
partir de um método cronológico (como, por exemplo, as datações
egípcias) e estabelecer uma aderência cronológica ao atual método.

Os registros sobreviventes de observações da ascensão heliacal da “estrela cão”


Sirius servem tanto como base da reconstrução do calendário egípcio quanto de
seu elo essencial com a cronologia como um todo. (Shaw, 2003, P. 8,9)
Estas aderências históricas foram importantes por exemplo para a
formulação de uma “cronologia egípcia” eficiente, mas ainda,
conforme Shaw (2003)70, um número de diferentes critérios e até a
datação em rádio carbono foram utilizadas. No apêndice deste livro
são apresentadas as tabelas cronológicas do Reino Médio até a 19ª
dinastia do Período “Ramessidico”, compiladas de Shaw (2003, p. 483-
485), e cujas datas são utilizadas nesta laboriosa pesquisa. De maneira
semelhante, os fatos bíblicos também são datados e uma cronologia
dos eventos é então apresentada. Unger71 (1988) explica que de grande
importância para a cronologia do Antigo Testamento é a locação dos
eventos registrados tendo o quadro cronológico dos eventos extra
bíblicos e embora existam muitos problemas nesta correlação,
avanços substanciais na pesquisa arqueológica têm definido eventos
do Antigo Testamento com bastante precisão em relação aos eventos
históricos do mundo em geral. Para chegar a uma provável data para o
Êxodo, o evento de aderência histórica bastante reconhecido é o
citado em I Reis 6.1, do período do reinado de Salomão.

“E sucedeu que, no ano quatrocentos e oitenta, depois de saírem os filhos de Israel do Egito, no ano
quarto do reinado de Salomão sobre Israel, no mês de Zive (este é o mês segundo), Salomão começou a
edificar a Casa do Senhor. ”

Urger (1988, p. 525) apresenta datas muito próximas calculadas por


cronologistas modernos: “958 a.C. (Albrigth72), 967 a.C. (Thiele73), 962
a.C. (Begrich74). A Bíblia (1995) traz em suas anotações que Salomão
começou a edificar a casa do Senhor cerca de 966 a.C. e Walvoord e
Zuck (1983) também coloca a data em 966 a.C., o que é a mais
aceitável. Deve-se observar que a maior diferença entre as datas é de
apenas 9 anos e na construção do cenário histórico-cronológico de
eventos tão antigos e milenares, não traz suficiente distorção para
afetar a harmonização dos eventos.
Seguindo a descrição de I Reis 6.1, tendo o ano de 966 d.C. como o
mais provável do início da edificação do templo, somando-se os 480
anos citados como o da saída dos filhos de Israel da terra do Egito,
chega-se a uma data provável do Êxodo para 1446 a.C. No livro de
Êxodo 7.7, é descrito que Moisés tinha a idade de 80 anos pouco
tempo antes do Êxodo, então somando 80 anos à provável data do
Êxodo, chega-se à data de 1526 a.C. para o nascimento de Moisés.
Pode esta data se harmonizar com os fatos históricos e cronológicos
egípcios, é uma pergunta a ser respondida. Deve-se então avançar em
termos de entendimento da cronologia egípcia antiga e compreender
um fato importantíssimo na mesma, o “Levante de Sotis (Sopdet)” ou
a “ascensão heliacal da estrela Sirius”. Conforme Shaw (2003)75, no
calendário egípcio, Sotis ou Sopdet era a mais importante das estrelas
ou constelações e o “Levante de Sotis” foi um evento que coincidiu
com o início do ano solar uma vez a cada 1456 anos. Esta rara
sincronização da ascensão heliacal de Sopdet é descrita como
ocorrida em 139 d.C., durante o reinado do imperador romano
Antonino Pio, pois o evento foi comemorado com a emissão de uma
moeda. Outros dois registros são textuais datando dos reinos de
Senusret III; uma carta da 12ª dinastia do site de Lahun, escrita no dia
16, mês 4, da segunda temporada no ano 7, do reinado de Senusret III,
e do reino de Amenhotep I, denominado de “Papiro Ebers”, da 18ª
dinastia, escrito no dia 9, mês 3, da terceira temporada do ano 9 no
reinado de Amenhotep I. Observa-se que a “carta de Lahum” e o
“papiro de Ebers”, datados respectivamente do reino de Senusret III e
Amenhotep I, propiciam uma datação precisa e absoluta, justo na
disposição de dois importantes eventos relacionados ao Êxodo
Bíblico: a chegada de Jacó e sua família ao Egito e o período relativo a
Moisés, permitindo no processo de sincronização cronológica uma
melhor eficácia no método aqui aplicado.

• Carta de Lahum, 12ª dinastia, reinado de Senusret III = período


da chegada de Jacó e sua família ao Egito.
• Papiro de Ebers, 18ª dinastia = período relativo a Moisés

Nono ano do reinado desta majestade o rei do Egito superior e inferior,


Djeserkara (Amenhotep I) - que ele possa viver para sempre. Festival do ano
novo: terceiro mês do verão, dia nascente - Sirius em ascensão (Urk. IV, 5-6).
(Grimal, 2005, p. 202)

A carta de Lahum e o papiro de Ebers76 permitiram aos


egiptólogos atribuir datas absolutas para cada um destes documentos
e extrapolar um conjunto de datas para todo o período faraônico, não
sendo possível, no entanto, estar totalmente confiante destas datas,
visto que a datação precisa depende de um entendimento final sobre a
localização de onde foram feitas as observações, se em Menfis, Tebas
ou outras localidades como Elefantina. Quando se fala na ciência da
datação de precisão, é necessário entender qual é esta variação para
dentro da tolerância consensual aplicar-se possíveis correções e se
esta afeta ou não o entendimento de determinado período.
Grimal (2005)77 informa que por causa de problemas com a
cronologia do tempo do reinado de Ahmose, as estimativas da data de
adesão de Amenhotep I variam por quase um quarto de século, o que
é tratado, considerando a evidência documental do levante heliacal de
Sirius, pois o cálculo astronômico permite datar em 1537 a.C. para a
ascensão heliacal e , portanto, 1546 a.C. para o início do reinado de
Amenhotep I, mas somente se a observação foi feita em Menfis, pois
se a mesma foi feita em Tebas, que logicamente teria sido o ponto de
referência se era a capital, em torno de vinte anos têm que ser
deduzidos, dando a data de 1517 a.C. para o evento astronômico e
1526 a.C. para a coroação de Amenhotep I. Shaw e Grimal seguem, em
sua cronologia, a datação deste evento considerando a observação do
levante de Sirius citado no papiro de Ebers a partir de Tebas e,
portanto, datam o início do reinado de Amenhotep I,
respectivamente, como 1525 e 1526 a.C., uma diferença muito
pequena e mostrando a precisão cronológica.
Fazer a adoção de um ponto de observação, seja Menfis ou Tebas,
para a datação é importante, principalmente no caso de eventos que
tratam da ascensão de governantes em curtos períodos de tempo,
como, por exemplo, os eventos do início da 18ª dinastia. Schaefer
(2000)78 escreve para a SAO/NASA79, artigo científico com o título “O
levante heliacal de Sirius e a cronologia do antigo Egito”, e, ao fazer a
introdução, descreve ser este um importante marco para o antigo
calendário egípcio e que diversos estudos têm derivado para uma
cronologia astronômica absoluta. Em 1999, descreve Schaefer, a data
exata da ascensão heliacal tornou-se um ponto crítico em diversas
áreas da investigação, levando a conferência de Oxford VI em La
Laguna a refutar teses de Gurshtein o qual afirmava erros nas datas
de ascensão heliacal de Sirius e outras discussões que demonstraram
que os últimos trabalhos acadêmicos não melhoraram as pesquisas
anteriores, pois a astronomia fez grandes avanços, mas ainda
permaneciam as incertezas já levantadas sobre o assunto. Schaefer,
em seu artigo, fez um chamado de precaução aos cronologistas em
vista às dificuldades correntes e não apreciadas em se estabelecer
uma cronologia absoluta. Falando sobre o método cientifico de
cálculo astronômico, diz que as incertezas no modelo de previsão são
sempre dominadas pelas incertezas no componente de aerossol do
coeficiente de extinção e que o coeficiente de extinção para o antigo
Egito pode ser estabelecido por três métodos, o que ao descrever o
segundo método diz que é executado um estabelecimento empírico de
correlações com: altitude, umidade relativa, mês, temperatura,
latitude derivada do ano todo das medidas de extinção em mais de 300
sites em todo o mundo e depois aplicado ao vale do Nilo (Wadi
Medani e Bahir Dar) para a condição em Menfis. Schaefer, em seu
estudo científico, usou em seu método medições para condições em
Menfis, porém deixa claro a dúvida persistente entre qual o local a se
adotar. Tetley (2014),80 em seu trabalho acadêmico, por várias vezes
faz atribuição e o uso de Menfis para suas tabelas de datação (pág.
165, 175, 418, 556, 559, 596), e no capítulo 10, finalmente oferece uma
explicação na qual ela explora a evidência documental para a “Era dos
Menofres”, na qual em 1314 a.C. os calendários do Alto e Baixo Egito
se fundiram em um único com a inauguração do ciclo de Sotis em
Menfis. Porém alerta para o fato que em cada período é necessário
entender qual a real posição de observação. Temos então uma
evidência documental da unificação dos calendários em 1314 a.C.
(posterior a data do papiro de Ebers) que aponta para Menfis e uma
linha de pensamento de vários egiptólogos com respeito a Tebas (em
virtude de ser a capital do reino na época). Na cronologia egípcia, o
“Papiro Ebers”, da 18ª dinastia, permite datar com muita precisão o
início do reinado de Amenhotep I em 1525 a.C. (para observação em
Tebas) e 1545 a.C. (para observação em Menfis) e na cronologia
bíblica, a datação do nascimento de Moisés em 1526 a.C., como uma
data muito provável do nascimento de Moisés o libertador dos
hebreus.
Dado o ponto de observação para o levante de Sotis ser um fator
indeterminado entre duas constantes Tebas-Menfis, pode-se, pela
harmonização histórico-cronológica egípcia e bíblica, analisar as
diversas hipóteses e concluir com a escolha do ponto de observação
Tebas ou Menfis, o que seja mais expressivo com os dados finais.
Entender os fatos históricos dos eventos posteriores a Ahmose, o
faraó da opressão, indo de Thutmose I até Amenhotep II, deve
também ser primordial para a conclusão da harmonização dos
eventos, o que será feito então.

Tutmose I
Shaw (2003)81 descreve que o pai de Thutmose I (1504-1492 a.C.) é
desconhecido e que sua mãe era chamada de Seniseneb, um nome
bastante comum. O parentesco de sua mãe também é desconhecido e
ela não possuía títulos que indicassem uma ascendência real, apenas
chamada de “mãe do rei”. David (2003)82 traz uma certa luz a esta
questão, informando que Thutmose I era um filho de Amenhotep I
com sua esposa (concubina) não real, Seniseneb, porém as incertezas
permanecem. Shaw (2003) nos diz que a principal esposa de Thutmose
I era Ahmes ou Ahmose, que tinha os títulos de “Irmã do Rei” e
“Grande Esposa Real”, e especula que ela poderia ser irmã de
Thutmose I, o que seria uma tentativa do rei de tentar recriar a
situação de reinos anteriores onde reis casavam com suas irmãs, o que
facilitaria sua ascensão ao trono. Grimal (2005)83 demonstra em tabela
a árvore genealógica de parte da 18ª dinastia e apresenta Ahmes com
provável parentesco com Amenhotep I ou com o Faraó Ahmose e a
Rainha Nefertari.

FIGURA 18: Cabeça de Thutmose I - Museu Britânico. Disponível em:


https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/ea/ColossalSandstoneHeadOfThutmoseI-
BritishMuseum-August19-08.jpg. Acesso em: 09/04/2018

Budge (1902)84 informa que a Rainha Ahmose (Ahmes) teve duas


filhas; uma, a famosa Rainha Hatshepsut, e outra chamada de Neferu-
Khebit, além de mais dois filhos, Uatchmes e Amenmes. David (2003)
declara que Thutmose I teve de reivindicar seu trono através do
casamento com a Princesa Ahmose (Ahmes), irmã de Amenhotep I. A
mais provável conclusão é que Thutmose I era filho de Seniseheb,
provável concubina de Amenhotep I, e casa com Ahmose (Ahmes),
membra da família real e princesa, podendo ser com grande
probabilidade irmã de Amenhotep I e uma meia irmã de Thutmose I.
Shaw (2003) revela que Thutmose I demonstrou interesse na
exploração militar e econômica da Núbia, obtendo grandes vitórias e
depois levando seus exércitos para a Síria, abrindo novos horizontes
que mais tarde levaram o Egito ao importante papel no comércio e
diplomacia no Oriente Próximo.
Em seu governo, uma série de projetos de construção aconteceram,
deixando monumentos e inscrições em vários sites; Núbia superior e
inferior, instalações de tijolos na região do Kenisa e em Napata,
edifícios na ilha de Sai, Semma, Buhen, Aniba, Quban, Qasr Ibrim e
dentro das fronteiras do Egito, construções em Elefantina, Armant,
Tebas, Ombos, Abidos, el-Hiba, Menfis e Giza. David (2003) refere-se
a Thutmose I como um grande guerreiro e faz menção que sua tumba
é a primeira no Vale dos Reis, em Tebas. Existe uma grande
probabilidade de Thutmose I ser o autor do decreto que ordenou o
infanticídio narrado em Êxodo 1.22.

A escravização foi apenas parcialmente eficaz, então faraó decidiu decretar uma
política mais agressiva, a saber, o infanticídio. Não deve ser considerado que os
israelitas tinham apenas duas parteiras (literalmente: aquelas que ajudam a
suportar). Muito provavelmente, por causa do número de israelitas, essas duas
mulheres eram as principais administradoras de uma organização de parteiras. A
instrução real foi explicita; (...). No entanto, as parteiras que temiam a Deus mais
do que as leis terrenas, apesar de ser um monarca, não obedeceram a sua ordem.
Então elas (Sifrá e Puá, Ex. 1.15) foram chamadas para responder por sua má
conduta. Essas parteiras responderam que as esposas hebraicas tinham o parto
tão rapidamente que, antes das parteiras chegarem, os bebês já tinham nascido.
(...) Faraó não as puniu por sua incapacidade de efetuar sua política. (...) O Faraó
então promulgou uma política aberta e mais agressiva para conter o aumento
numérico dos israelitas. Não conseguindo limitar o crescimento do povo
secretamente através das parteiras hebraicas, Faraó ordenou ao seu próprio povo
que policiasse o decreto. Então a opressão contra os israelitas se aprofundou (...)
(Walvoord, 1983, p. 109)

Josefo (2004, pág. 90) também corrobora com o fato do infanticídio,


sem, é claro, determinar o governante, quando diz que, “O rei,
assustado com a predição e seguindo o conselho daquele que lhe fazia
essa advertência, publicou um edito pelo qual ordenava que se
deveriam afogar todas as crianças hebreias do sexo masculino e
ordenou às parteiras do Egito que observassem exatamente quando as
mulheres fossem dar à luz, porque não confiava nas parteiras de sua
nação. Esse edito ordenava também que aqueles que se atrevessem a
salvar ou criar alguma dessas crianças seriam castigados com a pena
de morte, juntamente com toda a família”.

Tutmose II.
Grimal (2005)85 informa que Tutmose II (1492-1479 a.C.) é filho de
Tutmose I com a concubina chamada Mutnofret. Shaw (2003)86
descreve que seu reinado foi breve e não durou mais que treze anos87,
pois teve morte prematura, o que nos informa Grimal (2007) ter sido
provavelmente através de alguma doença. Shaw (2003) traz a
informação que foi casado com sua meia irmã Hatshepsut, que lhe
serviu como a “Grande esposa Real”, e também como a “Esposa do
Deus Amom”, o que Grimal (2007) acrescenta o fato que o casamento
de Thutmose II e Hatshepsut falhou na produção de um herdeiro
homem para ascensão ao trono, nascendo depois uma filha, Neferure.
Thutmose II teve apenas um filho homem, Thutmose III, nascido de
seu relacionamento com uma concubina real chamada Isis. Visto a
morte prematura de Thutmose II, seu único filho homem, ainda era
muito jovem para governar e, desta maneira, sua madrasta
Hatshepsut tornou-se a regente do trono.
FIGURA 19: Cabeça da múmia de Thutmose II - Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Thutmose_II#/media/File:Thutmose_II_mummy_head.png.
Acesso em: 18/05/2018

Hatshepsut
Hatshepsut (1473-1458 a.C.) foi uma mulher particular na história do
Egito antigo porque foi das poucas mulheres que reinaram como
faraó. Shaw (2003) descreve que o reinado de cinquenta e quatro anos
de Thutmose III começou em sua primeira infância tendo sua
madrasta atuando como regente por quase 20 anos. Hatshepsut
capitalizou para si o papel de “esposa do Deus Amom” e usou sua
conexão genealógica com a família de Ahmose-Nefertari a fim de
apoiar sua regência em uma maneira similar a suas antecessoras
femininas. Hatshepsut se transforma publicamente em um faraó.
Obeliscos comemorativos nomeiam ela de “Filha do Rei, Irmã do Rei,
Esposa de Deus, Grande Esposa Real Hatshepsut”. Como governante,
Hatshepsut inaugurou projetos de construção que ultrapassaram os
de seus predecessores. A lista de projetos executados por Thutmose I
e II foi expandida no Alto Egito e incluiu lugares que Ahmose tinha
favorecido: Kom Ombo, Nekhen (Hieracômpolis) e Elkab em
particular, além de Armant e Elefantine. Suas edificações se
espalharam na Nubia: Qasr, Ibrim, Sai (uma estátua da rainha
sentada), Semma, Faras, Quban e especialmente Buhen, onde a rainha
construiu para Horus um templo.
Menfis recebeu sua especial atenção e ela afirma em inscrições ter
reconstruído templos em Hebenu (a capital do nomo Oryx) em
Hermópolis. Em Tebas, o templo de Karnak foi ampliado sob sua
supervisão. Shaw (2003)88 descreve o templo em Deir el-Bahri como o
mais duradouro monumento, sendo construído em calcário e
projetado em uma série de terraços contra a parede de um penhasco.
O templo chamado “santo dos santos” (djeser djeseru) era da parte de
Hatshepsut a mais completa declaração de seu reinado em forma
material. Durante seu governo, houve evidente paz e Hatshepsut foi
capaz de explorar as riquezas do Egito, seus recursos naturais, bem
como os da Núbia. De sua vida pessoal deve-se destacar que de seu
casamento com Thutmose II ela não gerou um herdeiro homem,
apenas uma filha chamada de Neferure (Shaw, 2003)89.
FIGURA 20: Escultura em calcário - Museu Metropolitano de Artes. Disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Hatshepsut.jpg. Acesso em: 09/04/2018

Tutmose III
Tutmose III (1479-1425 a.C.) era filho de Tutmose II com uma
concubina real chamada Isis e ficou, mais tarde, quando da morte de
seu pai, pois ainda era uma criança, sob a tutela de sua madrasta
Hatshepsut, que assumiu a regência do Egito por aproximadamente
20 anos.
FIGURA 21: Estátua de Thutmose III no Museu Luxor. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/File:TuthmosisIII-2.JPG. Acesso em: 09/04/2018

Shaw (2003)90 fala que Neferure ou Nefrura, filha de Hatshepsut,


pode ter sido esposa de Thutmose III, o que pode ter ocorrido o
término de seu real casamento com a morte de Hatshepsut. Thutmose
III assumiu a governança do Egito em algum momento do vigésimo
ou vigésimo primeiro ano de Hatshepsut e não perdeu tempo
tentando formar uma boa reputação, porém, avaliando
cuidadosamente a situação e seguindo conselho de seus sábios,
identificou potencial de conquistas para o nordeste, visto as
conquistas da Núbia já terem sido bem estabelecidas por Hatshepsut.
Ele seguiu caminho para o “Levante”, onde pode tomar o controle das
rotas comerciais até então dominadas por sírios, cipriotas, palestinos
e governantes egeus. Sua reputação foi assegurada e os lucros
extravagantes vindos de suas vitórias foram gastos em nome dos
templos de Amom e outros deuses. Em seus 32 anos de governo, se
tornou proeminente em todo o Egito e Núbia. Em Elefantina,
construiu um templo para a deusa Satet e seu local preferido de
edificações foi Karnac onde restaurou áreas centrais do templo. No
final de seu reinado, ele converteu um santuário elevado em Deir el-
Bahri em seu próprio templo, chamando-o de “sagrado Horizonte”.
David (2003)91 afirma que Thutmose III se tornou um grande
governante no Egito, estabelecendo o país como um grande poder
militar, além de realizar grandes programas de construção. Shaw
(2003) declara que após a morte de Hatshepsut, Thutmose III buscou
apagar muitos dos registros de sua madrasta, o que Grimal apresenta
como um ato altamente odioso, visto a tentativa de colocar seu nome
no esquecimento era um destino pior que a morte.

Ele (Thutmose III) tentou apagar o nome de Hatshepsut de todos os seus


monumentos, condenando-a ao esquecimento - um destino pior do que a morte
para um egípcio. Mas seu nome ainda é encontrado em Armant, no templo de
Monthu, que foi ampliado por Thutmose III, e na área de Beni Hassan, onde ela
dedicou um templo de pedra à deusa Pakhet (...) (Grimal, 2005, pág. 216, 217)

Amenhotep II
Shaw (2003) descreve que Thutmose III já estava idoso quando levou
seu filho Amenhotep (1427-1400 a.C.) a compartilhar a monarquia
com ele por pouco mais de dois anos como corregente. Amenhotep II
seguiu no mesmo sentimento de seu pai, completando a profanação
dos monumentos da Rainha Hatshepsut e assim eliminar as alegações
dela e sua linhagem real.
FIGURA 22: Cabeça da grande estátua de Amenhotep II em exposição no Museu de
Brooklyn. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:AmenhotepII-
StatueHead_BrooklynMuseum.png. Acesso em: 09/04/2018

Monumentos foram sistematicamente modificados: alguns foram


obscurecidos por novos trabalhos, outros mutilados para remover
qualquer evidência de seu nome, e muitos foram alterados de tal
forma que os nomes de Thutmose III ou Thutmose passaram a
substituir os de Hatshepsut. Parece que Amenhotep II gostava de ser
reconhecido por sua capacidade atlética, como o tiro de flechas
através de alvos de cobre enquanto dirigia uma carruagem com rédeas
amarradas na cintura. O reinado de Amenhotep II foi crucial no
início do Novo Reino, embora seja frequentemente ofuscado pela
sombra de seus dois predecessores e seus sucessores. Durante um
reinado de quase trinta anos o rei teve sucessos militares no Levante e
trouxe a paz para o Egito juntamente com suas recompensas
econômicas. Amenhotep II deixou edifícios ou adições a monumentos
em pé em quase todos os principais locais onde seu pai havia
trabalhado.
Devemos fazer reverberar todas estas informações históricas
egípcias para compreender o contexto do nascimento de um dos
líderes religiosos mais importantes da história do mundo, Moisés.

“E a filha de Faraó desceu a lavar-se no rio, e as suas donzelas passeavam pela borda do rio; e ela viu
a arca no meio dos juncos, e enviou a sua criada, e a tomou. E, abrindo-a, viu o menino, e eis que o
menino chorava; e moveu-se de compaixão dele e disse: Dos meninos dos hebreus é este. Então, disse
sua irmã à filha de Faraó: Irei eu a chamar uma ama das hebreias, que crie este menino para ti? E a
filha de Faraó disse-lhe: Vai. E foi-se a moça e chamou a mãe do menino. Então, lhe disse a filha de
Faraó: Leva este menino e cria para mim que eu te darei teu salário. E a mulher tomou o menino e
criou-o. E, sendo o menino já grande, ela o trouxe à filha de Faraó, a qual o adotou; e chamou o seu
nome Moisés e disse: Porque das águas o tenho tirado. ” (Êxodo 2.5-10)

O texto bíblico descreve que Moisés foi adotado pela filha de


Faraó, o que, se considerar-se o nascimento de Moisés em 1526 a.C.,
temos três mulheres que se destacam como possível mãe adotiva:

• Ahmose-Nefertari (1582-1515 a.C.);


• Rainha Ahmose ou Ahmes, cuja data é incerta, possivelmente
entre 1540 a 1512 a.C., considerando dados históricos como o período
de casamento de seus pais Ahmose e Ahmose-Nefertari (aprox. 1560
a.C.), sua data de casamento com Thutmose I (aprox. 1525 a.C.) e
conforme Breasted (1906)92 ela ainda era viva quando do casamento de
sua filha Hatshepsut, e, ao que indica, morre algum tempo
posteriormente;
• Rainha Hatshepsut com uma data aproximada entre 1493 a 1478
a.C., considerando para seu nascimento, data provável do casamento
real de seus pais Thutmose I e Rainha Ahmose e a datação do início
de seu governo até sua morte, datas bem conhecidas.
FIGURA 23: Cronologia Egípcia x Bíblica / Fonte: autor

Para o levante de Sotis observado de Tebas (figura 23, cronologia


“T”), temos, para mãe adotiva de Moisés, incompatibilidade
cronológica com Rainha Hatshepsut que não teria nascido e com a
Rainha Ahmose-Nefertari que seria já idosa, restando uma
compatibilidade cronológica com a Rainha Ahmose (Ahmes). Para o
levante de Sotis observado de Menfis (figura 23, cronologia M), a
Rainha Hatshepsut, teria entre 1 a 10 anos, o que, se considerarmos as
diferenças já apontadas nas cronologias de Urger (1988), a Bíblia
(1995) e Walvoord e Zuck (1983), colocaria, na melhor das hipóteses, a
Rainha Hatshepsut com 10 anos, o que gera dificuldades para explicar
a “adoção precoce” de Moises por parte de Hatshepsut, levando assim
para uma harmoniosa compatibilidade cronológica com a Rainha
Ahmose (Ahmes). A Rainha Ahmose (Ahmes), esposa de Thutmose I,
é, sem dúvida, cronologicamente, (tendo por base o levante de Sotis
em Menfis) entre as três mulheres destacadas para o período, a que
melhor se enquadra, restando checar se os eventos históricos se
encaixam adequadamente.

Rainha Ahmose
A Rainha Ahmose era filha do Faraó Ahmose e Ahmose-Nefertari
(Grimal, 2005). Shaw (2003)93 informa que foi do casamento com a
Rainha Ahmose que Thutmose I foi pai da futura Rainha Hatshepsut
e da Princesa Nefrubity. Grimal (2005)94 confirma Hatshepsut como
filha de Thutmose I com a Rainha Ahmose e informa que Amenemes
foi um filho que morreu muito cedo. Já Budge (1902)95 confirma que
do casamento com Thutmose I, Ahmose, que possuía os títulos de
“esposa divina”, “senhora das duas terras”, “a grande dama”, “irmã e
esposa real Ahmes”, teve duas filhas, Hatshepsut e Nefrubity e dois
filhos, Amenemes e Uatchmes, os quais nenhum viveu muito tempo.
David (2003)96 chama Ahmose de princesa. O Faraó Ahmose, pai da
Rainha Ahmose, foi o provável “faraó da opressão”, e Thutmose II,
seu esposo, em grande probabilidade, o autor do decreto que ordenou
o infanticídio (Êxodo 1.22). A contextualização dos fatos históricos da
vida da Rainha Ahmose permite, sem dúvidas, uma perfeita
harmonização com os fatos bíblico-históricos.
Moisés nasceu em pleno período de opressão da dinastia faraônica
que vai do início da opressão (Faraó Ahmose) até a ordem de matar
todos meninos hebreus lançando-os no rio Nilo, ordem proferida
provavelmente por Thutmose I (Êxodo 1.22). O fato do livro de Êxodo,
capítulo primeiro, não ser claro quanto à sucessão faraônica que há
no período histórico relatado, em nada invalida a possibilidade da
ocorrência da sucessão e muito menos impõe erro à narrativa no caso
da ocorrência da sucessão, pois faraó é um título e não um nome
específico. Quando Moisés nasce, a Princesa Ahmose, filha do Faraó
Ahmose, já estava casada com Thutmose I, e angariava para si
diversos títulos reais e divinos, porém, possivelmente já amargava a
morte de dois filhos homens, um trauma profundo e um stress de luto
e perda que poderia muito bem ser amenizado com o encontro da
criança Moisés em um cesto nas águas do rio Nilo.

A morte de uma criança de qualquer idade é uma experiência profunda, difícil e


dolorosa. Enquanto o luto é estressante sempre que ocorre, os estudos continuam
a fornecer evidências de que o maior estresse, e frequentemente o mais
duradouro, ocorre para os pais que experimentam a morte de uma criança.
(Christ, Grace H.; Bonanno, George; Malkinson; Ruth e Rubin, Simon, 2018, pg.
Introdução)

Sua descendência real como princesa, sua titularidade e poder


aliados a tão provincial encontro são fortes evidências para apontar a
Rainha Ahmose como a complacente filha de Faraó que, contrário às
ordens de seu marido, tira o menino hebreu das águas do Nilo e
resolve adotá-lo e criá-lo, dando-lhe o nome de Moisés. Quanto ao
nome Moisés, interessantes discussões históricas são levantadas, o
que dentro de um plano temporal-histórico tão harmonioso quanto o
que se delineia, seria muito provável que a Rainha Ahmose tivesse
concedido um nome peculiar de sua família real à criança salva das
águas do rio Nilo. John Huddlestun, professor associado da Faculdade
de Charleston (Carolina do Sul), em sua publicação “Era Moisés nome
Egípcio”, declara:

O verbo “ms” é incorporado nos nomes de nascimento reais do Novo Reino a


faraós como Ahmose (“o deus da lua nasce”) e Tutmés (“Thoth nasce”) com o
sufixo – “Mose”. (Huddlestun, 2019)

(…) alguns dizem que o nome Moisés (moseh) era uma palavra hebraica e que esta
forma hebraica não foi conhecida pelos egípcios. Outros dizem que “Moisés” era
um nome egípcio, como “Mose” em Tutmose (Tutmés) ou Ahmose. Casuto (…)
sugere que o termo é egípcio, significando “filho” ou “é nascido” em som
“moseh” era um trocadilho com o verbo hebraico “masah”, “tirar”, significando
“puxou-o para fora da água”. (Walvoord e Zuck, 1983. Pág. 110)
É fato que o sufixo “Mose”, associado a “Lah ou Aah”, deusa
egípcia da lua ou Thoth, deus egípcio da escrita e da sabedoria,
nomeou importantes faraós como Ahmose, Tutmose e a própria
Rainha Ahmés. Também a adoção para o hebraico do sufixo egípcio,
Mose, concebendo-o como um nome próprio e com significado de
“aquele que é nascido ou tirado da água”, coloca um ponto de
inferência ao admitir estas ocorrências históricas, em mesmo período,
sendo que, diante de tal processo de harmonização temporal, é
inadmissível casualidade. A Rainha Ahmose, tendo descendência e
ligação com dois grandes nomes da história egípcia no Novo Reino,
Ahmose, o seu pai e Tutmose, seu esposo é na harmonização
histórico-cronológica, sem igual quando da admissão como
verdadeiro, de Moisés no cenário histórico-cronológico como seu
filho adotivo. A figura 24, “Árvore genealógica - família Tutmose I –
18ª dinastia” em conjunto e analisada com a figura 23, “Cronologia
Egípcia x Bíblica”, permite indubitavelmente ao leitor chegar de
maneira conclusiva aos fatos identificados.
FIGURA 24: Árvore genealógica - família Thutmose I – 18ª dinastia / Fonte: autor

Não se deve deixar de citar Flavio Josefo quanto a este fato, o que,
apesar de nomear a filha de Faraó por Termutis, um nome que não é
encontrado nas listas das famílias reais egípcias, a sua narrativa ajuda
a confirmar o contexto histórico bíblico e egípcio.

Como o berço flutuasse ao sabor das águas, Termutis, filha do rei, que passeava
pela margem do rio, avistou-o e ordenou a alguns dos que a acompanhavam que a
nado fossem buscá-lo. Trouxeram-no, e ela ficou tão encantada com a beleza da
criança que não se cansava de contemplá-la. Resolveu então tomar o menino aos
seus cuidados e mandar educá-lo. De sorte que, por um favor de Deus assaz
extraordinário, ele foi criado no mesmo lugar onde queriam a sua morte e a ruína
de sua nação. (Josefo, 2004, pág. 90)97

Outro fato que concorre para a harmonização histórica e


cronológica é a provável data da fuga de Moisés do Egito em 1486
a.C98., o que é necessário antes entender o contexto dos fatos. A
história bíblica narrada em Êxodo informa que Moisés foi descoberto
em um caso de homicídio.
“Ouvindo, pois, Faraó este caso, procurou matar a Moisés; mas Moisés fugiu de diante da face de
Faraó, e habitou na terra de Midiã, e assentou-se junto a um poço. ” (Êxodo 2:15)

Walvoord e Zuck também comentam sobre este fato.

Moisés protegeu um de seus irmãos oprimidos matando um egípcio e


escondendo seu corpo na areia. Moisés pensou que, ao proteger seu companheiro
israelita, seu povo perceberia que ele era seu libertador (...), mas aparentemente o
israelita que Moisés protegera havia dito o que ele fez. No dia seguinte, quando
Moisés interveio na discussão de dois hebreus, um deles disse que Moisés havia
matado o egípcio (...). Moisés, então, temia que a notícia desse assassinato já
fosse generalizada e chegasse ao Faraó. (Walvoord e Zuck, 1983. Pág. 110).

Este fato de homicídio, certamente, conforme Walvoord e Zuck


(1983), e em consonância com o texto bíblico de Êxodo 2.11-15,
tipifica-se nos atuais dias como culposo, pois não houve a real
intenção de matar o egípcio, antes, diante do estado de necessidade
visando salvar um hebreu do inevitável perigo, a ação terminou na
grave e fatídica morte do egípcio, o que, para chegar a esta afirmativa
contemporizada, é preciso entender o funcionamento das leis
egípcias. Loon (2018)99, em sua dissertação de mestrado sobre “Lei e
Ordem no Egito Antigo”, diz que o crime de homicídio ou sua
tentativa possui poucas fontes de registro, como o caso de duas
conspirações para matar Faraó ( a primeira com registro da 6ª
dinastia e a segunda sob o reinado de Ramsés III), porém o homicídio
de cidadãos particulares ou comuns dificilmente aparece em fontes
do Novo Reino. A “Estela de Banimento” da 21ª dinastia declara que
um assassino deve ser morto, implicando que a morte de outro
homem era considerada pena capital, porém o critério moderno para
tipos de homicídio como a premeditação não parecia ser o fator
decisivo, sendo o termo no Reino Médio usual para homicídio ser
“matar erroneamente”. Assim, o fato de que uma morte tinha sido
injustificável, considerava-se o crime passível das penas segundo a lei
egípcia. Deve-se considerar, conforme David (2003)100, que, de
maneira geral, a lei no antigo Egito era claramente regida por
princípios religiosos, assim os deuses foram considerados
responsáveis por estabelecer e perpetuar a lei, que foi personificada
pela deusa Ma’at, figura da verdade, justiça, ordem e equilíbrio do
universo. O faraó era o chefe oficial do judiciário, como um sacerdote
de Ma’at, e, o Vizir, como um delegado do rei, se tornando chefe dos
tribunais. Com estas informações, podemos resumir que o homicídio
era um crime a ser punido com a pena capital, porém somente em
caso de morte injustificável. Parecido como ocorre no caso do
homicídio doloso (com intenção de matar) ou homicídio culposo (sem
a intensão de matar), deve-se entender que ao final a decisão seria um
ato pessoal do faraó ou de seu representante.
A história de Moisés é por demais intrigante neste aspecto, pois
Faraó, ouvindo sobre o caso, decreta automaticamente a morte de
Moisés, o que naturalmente não teria ocorrido, seja pela morte não
ser injustificável (havia precedente de legítima defesa de terceiro),
seja por Moisés ter sido criado junto à família real, o que sendo Faraó
o sumo legislador, penderia atuar para uma “justiça diferenciada” e
branda para com os seus parentes. Seguindo a linha de investigação,
tendo sido Moisés criado na corte como um “filho adotivo” da Rainha
Ahmose, teria como sua “irmã adotiva” e protetora a grande Rainha
Faraó Hatshepsut, uma das mais brilhantes e magníficas rainhas
egípcias, podendo ter ofuscado até sua própria avó Ahmose-Nefertari.
A grande Rainha Faraó Hatshepsut possuía títulos como “Filha do
Rei, Irmã do Rei, Esposa de Deus, Grande Esposa Real Hatshepsut”,
os quais apontam seu poder e influência que foram potencializados
após a morte prematura de Tutmose II. Tutmose III deveria seguir em
sequência ao trono, porém Grimal (2005)101 informa que Tutmose III
era filho de Tutmose II com uma concubina real chamada Isis e, deste
modo, Thutmose III não era filho de Hatshepsut com Tutmose II.
Quando da morte do pai, Tutmose III era muito jovem e Hatshepsut,
sua madrasta, tornou-se a regente do trono por aproximadamente 20
anos, deixando Thutmose III, o verdadeiro herdeiro ao trono, como
um mero coadjuvante.

Hatshepsut, madrasta da jovem Tutmose III, tornou-se regente. A evidência para


esta regência assume a forma de uma inscrição em uma estela no túmulo rochoso
de Ineme (mordomo dos celeiros de Amom desde o reinado de Amenofis I até
Tutmose III) em Sheikh Abd el-Qurna (TT 81), no lado oeste em Tebas: “O rei
subiu ao céu e se uniu aos deuses. Seu filho tomou o seu lugar como rei das duas
terras e ele era o soberano no trono de seu pai. Sua irmã, a esposa de Deus
Hatshepsut, lidava com os assuntos do estado: as duas terras estavam sob seu
governo e os impostos eram pagos a ela. ” (Grimal, 2005, pág. 207)

Thutmose III, ao assumir a governança do Egito, tomou uma


postura “mais tarde”, conforme informa Grimal, de apagar muitos dos
registros de sua madrasta.

(...) parece que durante sua vida ela (Hatshepsut) enfrentou menos oposição do
que se poderia esperar, considerando a fúria com a qual seu enteado (Tutmose
III) mais tarde partiu para apagar sua memória após sua morte. (Grimal, 2005,
pág. 209)

David (2003)102 informa que Tutmose III, ao assumir o trono,


destrói monumentos de Hatshepsut, mas não diz em que momento de
seu governo isto ocorre. Grimal fala da fúria com a qual este ato é
executado e Iam Shaw explica que a ação foi conhecida como a
“desonra de Hatshepsut”, o que ocorre mais para o fim do governo de
Tutmose III, tempo em que Hatshepsut já havia falecido. Esta
profanação dos monumentos da rainha tinha o objetivo de eliminar
alegações e colocar seu nome no esquecimento.

O rei idoso (Tutmose III), no entanto, levou seu filho Amenhotep como
corregente no quinquagésimo primeiro ano de seu reinado, e então compartilhou
a monarquia com ele por pouco mais de dois anos. A ação conhecida como
“desonra de Hatshepsut”, que havia começado por volta do ano 46 ou 47, pode ter
pavimentado o caminho para o governo conjunto, de forma que Amenhotep II,
ele mesmo, completou a profanação dos monumentos do Rainha Hatshepsut. A
fim de eliminar as alegações de Hatshepsut e sua linhagem familiar, os
monumentos dela foram sistematicamente ajustados: alguns foram obscurecidos
por trabalhos; alguns foram mutilados para remover qualquer evidência de seu
nome; e muitos foram alterados de tal forma que os nomes de Tutmose III ou
Tutmose II substituiu os de Hatshepsut. (Shaw, 2003, pág. 241)

Existe, é claro, divergências entre os egiptólogos quanto aos


motivos reais desta profanação e que talvez não teriam sido por ódio
ou raiva. Uma certeza é clara, a atitude de colocar um nome no
esquecimento era um destino pior que a morte no contexto do antigo
Egito, e esta atitude aponta, sim. para a possibilidade de que
Thutmose III apresentou fortes ressentimentos para com sua
madrasta.
Como governante, Hatshepsut inaugurou projetos de grandeza
faraônica na Nubia103: Qasr, Ibrim, Sai, Semma, Faras, Quban e,
especialmente, Buhen, onde a rainha construiu para Horus um
templo. Shaw (2003)104 informa que o governo de Hatshepsut não foi
um período prolongado de guerra, havendo em especial expedições
militares à Núbia que parecem ter lidado com insurreições locais e ao
que tudo indica houve pouca ação militar direta. Na região de Punt105
informa que houve uma missão comercial promovida por meio de um
grande acordo ou “com um grande golpe diplomático”. Josefo (2004)106
também faz a descrição de que Moisés era homem proeminente e de
grande bravura no Egito, que em face ao avanço Etíope pelas
fronteiras egípcias chegando próximo a Menfis, aparece como grande
general a serviço da filha de Faraó, o que tirando-se as hipérboles e
fábulas da narrativa, empreende combate aos Etíopes, dispersando-os
e impelindo-os até Sabá, capital da Etiópia, sitiando a cidade e
travando um acordo com a princesa da cidade, o que põe fim à guerra,
dando vitória ao egípcios. Não se deve forçar a narrativa histórica,
senão na perspectiva de que Josefo, também considerando uma
harmonização de tempo, tirando-se a epopeia narrada, descreve
conflitos com os etíopes que foram vencidos por um grande acordo
firmado por Moisés. A considerar que a região do Punt e Etiópia são
entrelaçadas na história antiga e lembrando que o nome de Moisés
não aparece na literatura egípcia quanto a este fato, podemos no
tempo e na história ver similaridade narrativa apenas neste contexto e
por inferência do próprio Josefo, aí sim, trazer Moisés para o foco
narrativo.
Ainda sobre este período de administração sob o governo de
Hatshepsut, Shaw (2003) descreve o nome de administradores locais
como o Vice-rei Seni que deu lugar a Amennakht e depois cedeu
lugar a Nehy e também um outro governante que esteve a serviço de
Hatshepsut, mas de nome incerto.

O vice-rei Seni deu lugar a Amennakht durante o reinado de Hatshepsut, e este


último cedeu a Nehy sob o governo de Thutmose III. Pelo menos um outro vice-
rei estava em serviço no final do mandato de Hatshepsut, mas seu nome é
incerto. Cada um desses homens não apenas governou a Núbia, mas também
supervisionou projetos de construção. (Shaw, 2003, pág. 234)

A confirmação histórica que Josefo faz acerca de incursões de


Moisés na região do Punt ou Etiópia pode levar a muitas conjecturas
históricas de Moisés ter sido um dos administradores locais de
Hatshepsut, porém não há evidências na egiptologia que ligue o nome
de Moisés a quaisquer um destes nomes citados. Também deve-se
descartar ligar o nome de Moisés com Senenmut, mordomo de
Hatshepsut, responsável por diversas obras em seu governo como
reformas no templo de Karnak, pois sua história está bem delineada
pelos egiptólogos, o que o exclui da possível lista de nomes.

Senenmut foi uma figura onipresente ao longo dos três quartos de ano (aprox. 15
anos) do reinado de Hatshepsut, mas ele posteriormente parece ter caído em
desgraça por razões que não são precisamente conhecidas. (Grimal, 2005, pág.
211)

O trabalho naquele templo (Karnak) foi conduzido para Hatshepsut por


Senenmut, cujo nome ocorre em um portão escavado lá, mas Hapuseneb também
deixou uma estátua no recinto. (Shaw, 2003, pág. 231)

Mesmo no tempo de Senenmut houve rancorosa fofoca sugerindo que ele devia
sua boa sorte por manter relações íntimas com a rainha. De fato, parece que suas
estreitas conexões surgiram do papel que desempenhou na educação de sua
única filha Neferure, para quem um de seus irmãos, Senimen, atuava como
enfermeiro e mordomo. Muitas estátuas associam a princesa a Senenmut, que era
um homem culto. (Grimal, 2005, pág. 211)

Outros nomes aparecem no contexto de governança de Hatshepsut


como o tesoureiro Nehesy, Djehuty, Hapuseneb, agraciado com o
ofício de sumo sacerdote de Amom (Grimal, 2003)107 e Puyemra.

Claramente Hatshepsut estava satisfeita com a quantidade e variedade de bens


de luxo que ela poderia adquirir e doar em honra de Amon, tanto que ela teve
uma cena esculpida em Deir el-Bahri para mostrar a quantidade de mercadorias
exóticas trazidas de Punt. Da mesma forma, Djehuty detalhou as recompensas de
Punt que Hatshepsut doou para Amon, e ele também descreveu o trabalho das
minas no deserto oriental, com o qual ele foi confiado para embelezar Karnak.
Djehuty, Hapuseneb e Puyemra todos descreveram participar na confecção do
santuário de ébano doado no templo de Isheru em Mut Karnak. (Shaw, 2003, pág.
231)

Funcionários associados ao trabalho foram mencionados pelo nome nas


inscrições, incluindo o tesoureiro Nehesy e Senenmut. As inscrições funerárias
de Djehuty e Senenmut sugerem que ambas estavam ativas na construção e
embelezamento do “Santo dos Santos” do Templo em Deir el-Bahri, (Shaw, 2003,
pág. 233)

Qualquer tentativa de fazer associação de nomes com o fim de


encontrar um parentesco com Moisés para este período não seria
metodologicamente científica, isto por falta de informações históricas
dos nomes citados e até porque é possível que também o nome de
Moisés possa ter sido apagado da história egípcia da mesma maneira
que o nome da grande Rainha Hatshepsut, sua irmã, foi apagado.
Charles F. Aling, já citado, demonstrou cuidado ao fazer notável
dedução acerca dos eventos sobre a carreira de José e, ao mesmo
tempo, demonstrou ter o bom senso de aguardar o que a ciência da
arqueologia tem ainda a revelar. Esta é a atitude que se deve também
ter em relação a estes fatos.
O intrigante após a narrativa de tantos aspectos históricos e,
retomando a narrativa histórica do Êxodo Bíblico, no qual Faraó
ouvindo sobre o caso do homicídio do egípcio por Moisés, decreta
automaticamente sua morte, pergunta-se o porquê deste decreto. Vê-
se claramente que não era para ter ocorrido, pois era um ato
totalmente contrário ao que se esperaria do processo de justiça no
antigo Egito e da justiça de Faraó, principalmente frente a um
parente seu. Este fato é pela linha de investigação plenamente
explicado quando da harmonização dos eventos históricos e
cronológicos que nomeiam Thutmose III como o faraó que mandou
matar Moisés, este fato inclusive considerado por Walvoord e Zuck.

Quando Faraó soube do assassinato, ele se enfureceu (Hebreus 11.27) e tentou


matar Moisés. Talvez esse faraó fosse Thutmose III que estava reinando com
Hatshepsut. (Walvoord e Zuck, 1983. Pág. 110).

Na Cronologia Egípcia x Bíblica apresentada na figura 22,


considerando o levante de Sotis observado de Menfis, verifica-se que
a data de 1486 a.C. está a 8 anos do fim do reinado da Rainha
Hatshepsut, o que se considerar as diferenças já apontadas nas
cronologias de Urger (1988), a Bíblia (1995) e Walvoord e Zuck (1983),
pode-se dizer com muita precisão que sua força política está
chegando ao fim ou havia se encerrado com sua morte. Em virtude
deste fato, Moisés perde a proteção política de sua “irmã adotiva”, a
grande Rainha Hatshepsut, o que, aliado à política rancorosa de
Thutmose III e ao assassinato do egípcio, é esclarecedor de como
alguém tão proeminente como Moisés foi perseguido de morte.
Thutmose III é o agente que vê a oportunidade e ocasião de impor sua
política rancorosa também àquele que possivelmente angariou por
quase um quarto de século a confiança da Rainha Hatshepsut e que
era de uma linhagem estrangeira e perniciosa aos interesses egípcios.
A harmonização dos eventos cronológicos até Moisés, quando
colocada dentro do método aplicado, considerando-se para sua data
de nascimento com base nos principais cronologistas para
aproximadamente 1526 a.C., efetiva dentro do range de tempo
proposto para a história do Êxodo Bíblico um fato incontestável.
Adotando-se para a cronologia egípcia o levante de Sótis observado
de Menfis, o que é aplicável e suportável no método de harmonização
com diferenças muito pequenas de datas, permite sequenciar os fatos
históricos dos governos de Tutmose I a Amenhotep II com incrível
harmonia do macroevento ligado ao nascimento e vida de Moisés.
Todas as narrativas históricas egípcias e do Êxodo Bíblico colidem, se
interceptam e permitem colocar a Rainha Ahmose como a mãe
adotiva de Moisés e Hatshepsut como sua irmã e protetora, o que é
então um fato inédito para o processo historiográfico do Êxodo
Bíblico no contexto do antigo Egito. A fuga de Moisés, ocorrida no
ano de 1486 a.C, acontece exatamente quando da perda de poder e
posterior morte de sua irmã Hatshepsut e a ascensão ao poder de
Tutmose III, que promove uma política no mínimo de rancor contra
sua madrasta e certamente aproveitando-se e oportunidade e ocasião
contra o próprio Moisés. A ciência da arqueologia está a avançar e
detalhes pertinentes à presença de Moisés neste período histórico no
Egito antigo podem ainda vir a se revelar, o importante é que dentro
do método e da dedução dos fatos, a harmonização histórico-
cronológica é plena e aceitável.

69. Peret: é a estação quando a terra emergiu da inundação. (Peret, Enciclopédia Britânica.
Disponível em:
https://www.britannica.com/science/perehttps://www.britannica.com/science/peret. Acesso
em: 22/03/18)
70. Shaw, 2003, P. 480-489.
71. Unger, 1988, P.334,335.
72. William Foxwell Albright (24 de maio de 1891 - 19 de setembro de 1971) 1 foi um
arqueólogo americano, um estudioso da Bíblia, um filólogo das línguas semíticas e um
especialista em cerâmica. (William Foxwell Albright. Wikipédia. Disponível em:
https://fr.wikipedia.org/wiki/William_Foxwell_Albright. Acesso em: 22/03/18).
73. Edwin R. Thiele (10 de setembro de 1895 - 15 de abril de 1986) foi um missionário
Adventista do Sétimo Dia Americano na China, um editor, arqueólogo, escritor e professor
do Antigo Testamento. Ele é mais conhecido por seus estudos cronológicos dos reinos de
Judá e Israel. (Edwin R. Thiele. Wikipédia. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Edwin_R._Thiele. Acesso em: 22/03/18).
74. Joachim Begrich (13 de junho de 1900 - 26 de abril de 1945) foi um estudioso bíblico
alemão e teólogo nascido em Predel. Ele estudou filologia, assiriologia e teologia na
Universidade de Leipzig, em seguida, transferido para Halle, onde concentrou seus estudos
em teologia. Begrich o que o autor de um trabalho acadêmico sobre a cronologia dos reis de
Israel e Judá chamado A cronologia dos reis de Israel e Judá. (Joachim Begrich. Wikipédia.
Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Joachim_Begrich. Acesso em: 22/03/18)
75. Shaw, 2003, pág. 9,10
76. Estes dois documentos tornaram-se de suma importância para a egiptologia no
concernente à atribuição de datas absolutas à cronologia da história do antigo Egito, mas
também são importantíssimos e providenciais para a confirmação cronológica do Êxodo
Bíblico, pois o relato astronômico ocorre conforme a “Carta de Lahum na 12ª dinastia no
período da chegada de Jacó e sua família ao Egito e conforme o Papiro Ebers no reino de
Amenhotep I em período do Êxodo.
77. Grimal, 2005, pág. 202
78. Schaefer, 2000, pág. 149-155
79. Sistema de Dados Astrofísicos da SAO / NASA (ADS) é um portal da Biblioteca Digital
para pesquisadores em Astronomia e Física, operado pelo Smithsonian Astrophysical
Observatory (SAO) sob uma concessão da NASA. Acesso: http://adsabs.harvard.edu/
80. Tetley, 2014, pgs. 153, 165, 170, 175, 418, 556, 559, 596
81. Shaw, 2003, pg. 220, 221
82. David, 2003, pg. 65,66
83. Grimal, 2005, pg. 190
84. Budge, 1902, pg. 209
85. Grimal, 2005, pg. 207
86. Shaw, 2003, pág. 220, 221
87. Grimal, 2005, pág. 220, 221 informa uma data máxima de 14 anos, muito próxima a Shaw.
88. Shaw, 2003, pg. 232
89. Shaw, 2003, pg. 207
90. Shaw, 2003, pg. 229
91. David, 2003, pg. 105
92. Breasted, 1906, pg. 58
93. Shaw, 2003, pg. 221
94. Grimal, 2005, pg. 190 e 207
95. Budge, 1906, pg. 209
96. David, 2003, pág. 105
97. Josefo, 2004, pág. 90: Livro Segundo, capítulo 5.
98. Para chegar nesta data a cronologia bíblica, considera o modelo cronológico já descrito
neste livro, adotando para o nascimento de Moisés o ano de 1526 a.C., e a informação
histórica contida no livro de Atos dos Apóstolos 7.23-25, o qual informa que Moisés tinha 40
anos quando foi visitar seus irmãos, o que infere o ano de 1486 a.C para este fato.
99. Loon, 2018, pág. 12.
100. David, 2003, pág. 143-145
101. Grimal, 2005, pág. 207
102. David, 2003, pág. 105
103. Nubia: Ao longo da história, várias partes da Núbia eram conhecidas por diferentes
nomes, incluindo Ta-Seti, Kush, Meroe e a Etiópia bíblica. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Nubians. Acesso em: 09/04/2018.
104. Shaw, 2003, pg. 234
105. A localização exata de Punt ainda é debatida pelos historiadores. Hoje, a maioria dos
estudiosos acredita que Punt estava situado no sudeste do Egito, provavelmente na região
costeira do moderno Djibuti, Somália, nordeste da Etiópia, Eritreia e litoral do Sudão no Mar
Vermelho. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Land_of_Punt. Acesso em:
21/11/2019.
106. Josefo, 2004, pg. 91-93
107. Grimal, 2003, pg. 212
7
O RETORNO DE MOISÉS AO EGITO E O
ÊXODO

Todos os macroeventos relativos à história bíblica do Êxodo até o


presente momento: a chegada de Jacó e sua família no Egito, o
estabelecimento da família de Jacó no Egito, o início da opressão e os
eventos até Moisés estão perfeitamente harmonizados dentro da
história e da cronologia do antigo Egito, mais que isto, são
potencializados dentro do método, quando inserido o retorno de
Moisés de seu exílio em Midiã no ano de 1446 a.C. Observa-se que a
fonte histórica narrativa do Êxodo na Bíblia relata a morte do faraó
que mandou matar Moisés como motivo de seu retorno.

“E aconteceu, depois de muitos destes dias, morrendo o rei do Egito, que os filhos de Israel
suspiraram por causa da servidão e clamaram; e o seu clamor subiu a Deus por causa de sua
servidão. E ouviu Deus o seu gemido e lembrou-se Deus do seu concerto com Abraão, com Isaque e
com Jacó; e atentou Deus para os filhos de Israel e conheceu-os Deus. ” (Êxodo 2.23-25)

“Disse também o SENHOR a Moisés em Midiã: Vai, volta para o Egito; porque todos os que
buscavam a tua alma morreram. ” (Êxodo 4.19)

O ano de 1446 a.C., observando-se a tabela cronológica da figura


23 e considerando o levante de Sotis observado de Menfis, é perfeito
e coincidente com as datas referente ao fim do reinado do Faraó
Tutmose III (1445 a.C.) e sua posterior morte, quando se dá então o
início do reinado do Faraó Amenhotep II (1447 a.C.).
O rei idoso (Tutmose III), no entanto, levou seu filho Amenhotep como
corregente no quinquagésimo primeiro ano de seu reinado, e então
compartilhou a monarquia com ele por pouco mais de dois anos. (Shaw, 2003,
pág. 241)

O perfeito ajuste histórico é impressionante, pois, nesta situação,


também Bless (2011)108 declara que o reinado de Thutmose III se
encaixa bem com a aproximação de 1445 a.C., para data do Êxodo e
que Amenhotep II foi provavelmente o faraó do Êxodo. A data de
1445 a.C. de Bless é muito próxima com a data de 1446 a.C. apontada
neste livro, lembrando que há um frame de ajuste em torno de 9 anos
conforme já observado. Moisés teria então retornado ao Egito já no
governo de Amenhotep II, logo após a morte de Tutmose III.
Vê-se que o exílio de Moisés na terra de Mídia dura 40 anos e foi o
tempo, local e ambiente necessário para forjar o caráter de um
libertador, além disto, conforme Easton (1897, pág. 379), “durante os
quarenta anos da permanência de Moisés na terra de Midiã, os
hebreus no Egito estavam sendo gradualmente preparados para a
grande crise nacional que se aproximava. ” Esta crise era sem dúvida
a consciência coletiva de uma nação, de um povo clamando por
liberdade.

“E disse o SENHOR: Tenho visto atentamente a aflição do meu povo, que está no Egito, e tenho
ouvido o seu clamor por causa dos seus exatores, porque conheci as suas dores. Portanto, desci para
livrá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e larga, a uma terra
que mana leite e mel; ao lugar do cananeu, e do heteu, e do amorreu, e do ferezeu, e do heveu, e do
jebuseu. ” (Êxodo 3.7,8)

A resposta a este clamor coletivo é o start de um processo


histórico que trará a liberdade ao povo hebreu. Moisés retorna ao
Egito juntamente com seu irmão Arão e se encontra primeiro com
pessoas de seu povo de origem, depois vai até faraó com uma pesada
mensagem: “Deixa ir o meu povo...” (Êxodo 5.1). Seria inconcebível
entender este acesso direto e irrestrito de Moisés ao faraó e toda sua
corte, caso não houvesse sido desenhada neste livro a linha que liga
Moisés a Amenhotep II. A reconstrução da árvore genealógica dos
descendentes de Tutmose I, constante na figura 23, permite
identificá-lo como seu “meio-tio-avô”. Moisés, tendo sido criado na
corte pela Rainha Ahmose, teria convivido com diversos personagens
desta, inclusive com sua “meia irmã” Hatshepsut, e é certo que
Amenhotep II, seu “meio-sobrinho”, teria conhecido sua fama por
parte de todos aqueles que compartilharam de sua presença em
áureos tempos passados e neste ponto está a aceitabilidade da
presença de Moisés na corte de faraó a lhe ordenar a saída do povo
hebreu, sem receber uma fatal retaliação o que seria natural.
A narrativa bíblica do Êxodo se desenvolve passando a apresentar
uma série de eventos miraculosos denominados de “dez pragas”, que
trouxeram espanto, pavor, destruição e, por fim, obrigou faraó a se
dobrar, permitindo o povo hebreu sair do Egito. Existem várias
linhas de pesquisa buscando provas das chamadas “dez pragas do
Egito”, uns utilizam bases científicas, outras descobertas
arqueológicas e outras as evidências históricas. Trevisanato (2005),109
por exemplo, declara que as pragas do Egito registradas nos textos
bíblicos constituem um evento histórico e que elas não são fruto de
ficção, mas uma série de eventos que em período curto atingiu o
Egito com extraordinário poder. Gray (2010), correspondente
científico do jornal “The Telegraph”, diz que pesquisadores
acreditam ter encontrado evidências de desastres naturais reais em
que se basearam as dez pragas do Egito, e que as pragas podem ser
atribuídas a uma cadeia de fenômenos naturais desencadeada por
mudança no clima e desastres ambientais a centenas de quilômetros
de distância como a erupção do vulcão Thera110 nas ilhas
mediterrâneas de Santorini ao norte de Creta. Ele cita pesquisas do
Dr. Stephan Pflugmacher, biólogo do instituto Leibniz de Ecologia,
Água e Pesca Interior em Berlim, o qual disse que a bactéria,
conhecida como Algas do Sangue da Borgonha ou Oscillatoria
Rubescens, é conhecida por existir há mais de 3000 anos e pode ter
sido a responsável pelo fenômeno da água transformada em sangue.
Ehrenkranz e Sampson (2008), em artigo acadêmico postado no
“Jornal Yale de Biologia e Medicina”, em seu resumo, inicia dizendo
que as análises de desastres naturais passados podem oferecer
insights para abrandar impacto de novas ocorrências, e passa a
oferecer uma teoria tendo por base o contexto das pragas bíblicas e
de sua ocorrência para explicitar estrutura tal que considere uma
possibilidade de recorrência atual de catástrofes similares e seu
impacto sobre serviços públicos essenciais. Ao fazer uma breve
revisão da literatura existente sobre o assunto, repassam autores
como Marr e Malloy, Hort, Hoyte, Schoental, que oferecem
explicações progressivamente racionais para as pragas,
sugestionando conexões ou fontes comuns para algumas pragas. As
águas transformadas em sangue são, por exemplo, explicadas pelo
flagelo de água doce (Euglenia sanguínea, Haematococcus pluvialis),
maré vermelha, etc... Uma conexão sequencial é sugerida por alguns
pesquisadores como, por exemplo, o flagelo da água doce pode ter
causado a mortandade dos peixes, as moscas podem ter sido o vetor
da transmissão de um agente infeccioso que causou a peste e apesar
de diferirem em detalhes, todos estudiosos concordaram que os
agentes vivos e as condições climáticas anormais (como granizo e
outras) são responsáveis pelas nove pragas, ficando aparentemente
inexplicável a décima praga por seu padrão seletivo. É sugerido por
Ehrenkranz e Sampson (2008), com base no atual conhecimento da
interação das condições climáticas, ecológicas e doenças causadas
por artrópodes, que a causa imediata de todas as pragas na sequência
bíblica foi o aquecimento climático imprevisível e progressivo ao
longo da costa do Mediterrâneo. No campo da pesquisa histórica-
literária, devemos ainda destacar Antiguidades, de Flavio Josefo, que
argui a favor da ocorrência das dez pragas.

A água do Nilo foi mudada em sangue, e, como o Egito não possui fontes, o
povo descobriu que a sede é o maior de todos os males. A água do rio não
somente adquirira a cor do sangue, mas o povo não conseguia bebê-la sem
sentir dores violentas (...). Um número incalculável de rãs cobriu a terra, e
comiam tudo o que ela produzia. O Nilo ficou também cheio delas (...) enviou
sobre o Egito uma imensa multidão de diversas espécies de pequenos animais,
até então desconhecidos. A terra ficou totalmente coberta deles, e era
impossível cultivá-la. (Josefo, 2004, pág. 98,99)

Já no campo arqueológico, o “Papiro Ipuwer” ou “As


admoestações de um sábio egípcio”, achado arqueológico disponível
no Museu de Leiden111 e datado do Novo Império, 19ª dinastia (entre
1307-1196 a.C.) tem trazido bastante discussão ao assunto. Gardiner
(1969), proeminente egiptólogo que traduziu o papiro para o inglês,
declara que quando o Dr. Lange fez o surpreendente anúncio de que
o papiro continha as declarações proféticas de um vidente egípcio,
esta foi baseada em uma investigação longa e meticulosa do papiro,
acompanhada de uma análise cuidadosa do todo. Ele explica que o
papiro fora descoberto em Menfis e fazia parte da coleção de
Anastasi, sendo posteriormente comprado pelo Museu de Leiden.
Fazendo inicialmente uma descrição técnica das condições e
preservação do documento, ele passa para a avaliação de seu
conteúdo, o qual apresenta além de versos com hinos para uma
divindade solar, o discurso entre Ipuwer e o Rei. Várias são as
hipóteses ventiladas para sua aparição na corte real, mas há um
grande questionamento se Ipuwer era vidente ou um expectador
cujos olhos viam compassivamente a miséria de seu país. Gardner
acredita que Ipuwer está relatando as misérias ocorridas.

O Dr. Lange, como vimos, sustentou fortemente a hipótese de ser um profeta.


Pela minha parte, estou convencido de que a outra visão é a correta. Seria estar
errado em insistir em demasia na nota pessoal soada no discurso de Ipuwer e
sobre a ocorrência da palavra ‘hoje’ (3, 6, 5, 2) e do correlato ‘ontem’ (2, 2, 4, 5);
para profecia em todas as eras são capazes de representar suas previsões como
realizadas, e quando ele descreve o dia da retribuição, sua imaginação a pinta
como não apenas iminente, mas como presente ali. (Gardiner,1969, pág. 7)

Gardner (1969)112 diz que para entender a natureza dos desastres


descritos por Ipuwer é necessário agrupar seus enunciados de
maneira sistemática, o que ele o faz descrevendo a natureza dos
desastres.

Os egípcios estão engajados na guerra e todo o país está em pé de guerra. O


rosto está pálido O arqueiro está pronto. O malfeitor está em todo lugar. Não
existe homem de ontem (...) cheio de confederados. Um homem sai para arar
com seu escudo. Os porteiros dizem: vamos e saqueamos. (...). Os corações dos
homens são violentos. A peste está em toda a terra. Há sangue em toda a parte.
Morte não falta (...) O rio é sangue. Homens bebem disso, e diminui o gosto das
pessoas. Homens têm sede depois da água. Várias dessas frases indicam que os
egípcios não estão apenas lutando contra estrangeiros, mas contra seus próprios
concidadãos também. (Gardiner,1969, pág. 9)

Em sua conclusão, Gardner (1969) diz que referente à data que a


composição se refere e em vista dos fatos narrativos, dado o texto
falar tanto de uma guerra civil quanto de uma guerra ligada aos
invasores asiáticos, existem dois períodos que possivelmente podem
responder a estes requisitos: o primeiro é um período entre a 6ª e a
11ª dinastia e o outro é o período dos hicsos. Gardner (1969) continua
dizendo que certas considerações podem ser feitas a favor de uma
data mais recente, pois o texto possui um grupo de composições
associadas com o Reino Médio; em particular, há pontos de contato
curiosos tanto com inscrições deste período. Todas as considerações
de Gardner demonstram ser improvável que os eventos do Papiro de
Ipuwer sejam os mesmos eventos históricos do Êxodo, mas
confirmam, sem dúvida, a visão de que eventos catastróficos
ocorreram no Egito.
Diante do avolumado trabalho de pesquisa e das diversas linhas
tentando dar uma explicação às “dez pragas” ocorridas no Egito,
deve-se ter cautela e profundo senso de análise crítica dos estudos,
pois nenhuma pesquisa é conclusiva e por vez apresentam inúmeros
problemas críticos, o que torna difícil a interpretação final dos
dados. O grande fato a ser destacado é que as discussões acadêmicas
demonstram, sem quaisquer dúvidas, que o registro histórico bíblico
das dez pragas é consistente com os modelos catastróficos naturais e
que eventos catastróficos semelhantes realmente aconteceram no
Egito, como, por exemplo os eventos narrados no Papiro de Ipuwer
por Gardner (1969) o que, as “dez pragas”, conforme Ehrenkranz e
Sampson (2008), formam um modelo tão consistente que serve
inclusive para oferecer insights para abrandar impacto de novas
ocorrências. Verifica-se, ainda, na conclusão de Hoffmeier (2015), que
o Êxodo é para muitos acadêmicos fato histórico, o que permite a
pesquisadores como Ehrenkranz e Sampson (2008) e tantos outros
entrar na seara dos eventos catastróficos das “dez pragas” como fato
plausível, histórico e trabalhá-lo em suas pesquisas.
Na linha de harmonização histórica e cronológica proposta, deve-
se perguntar a parte das discussões muito pertinentes sobre os
eventos catastróficos das dez pragas, se há algum fato que permita
criar uma forte adesão do período histórico-narrativo bíblico em
questão com o momento histórico egípcio caracterizado pelo
governo do Faraó Amenhotep II. A sequência histórico-bíblica dos
eventos que permite fazer tal análise é a seguinte:
Na primeira praga: as águas tornam-se em sangue:
“Disse mais o SENHOR a Moisés: Dize a Arão: Toma tua vara e estende a mão sobre as águas do
Egito, sobre as suas correntes, sobre os seus rios, sobre os seus tanques e sobre todo o ajuntamento
das suas águas, para que se tornem em sangue; e haja sangue em toda a terra do Egito, assim nos
vasos de madeira como nos de pedra. ” (Êxodo 7.19)

Na segunda praga: o aparecimento das rãs.

“Depois, disse o SENHOR a Moisés: Entra a Faraó e dize-lhe: Assim diz o SENHOR: Deixa ir o meu
povo, para que me sirva. E, se recusares deixá-lo ir, eis que ferirei com rãs todos os teus termos. E o
rio criará rãs, que subirão e virão à tua casa, e ao teu dormitório, e sobre a tua cama, e às casas dos
teus servos, e sobre o teu povo, e aos teus fornos, e às tuas amassadeiras. E as rãs subirão sobre ti, e
sobre o teu povo, e sobre todos os teus servos. ” (Êxodo 8.1-4)

Na terceira praga: a proliferação dos piolhos.

“Disse mais o SENHOR a Moisés: Dize a Arão: Estende a tua vara e fere o pó da terra, para que se
torne em piolhos por toda a terra do Egito. ” (Êxodo 8.16)
Na quarta praga: a proliferação das moscas.

“Disse mais o SENHOR a Moisés: Levanta-te pela manhã cedo, e põe-te diante de Faraó; eis que ele
sairá às águas, e dize-lhe: Assim diz o SENHOR: Deixa ir o meu povo, para que me sirva. ” (Êxodo
8.20)

Na quinta praga: a peste nos animais.

“Depois, o SENHOR disse a Moisés: Entra a Faraó e dize-lhe: Assim diz o SENHOR, o Deus dos
hebreus: Deixa ir o meu povo, para que me sirva. Porque, se recusares deixá-los ir e ainda por força
os detiveres, eis que a mão do SENHOR será sobre teu gado, que está no campo, sobre os cavalos,
sobre os jumentos, sobre os camelos, sobre os bois e sobre as ovelhas, com pestilência gravíssima. ”
(Êxodo 9.1-3)

Na sexta praga aparecem úlceras nos homens e animais.

“Então, disse o SENHOR a Moisés e a Arão: Tomai os punhos cheios da cinza do forno, e Moisés a
espalhe para o céu diante dos olhos de Faraó; e tornar-se-á em pó miúdo sobre toda a terra do Egito,
e se tornará em sarna, que arrebente em úlceras nos homens e no gado, por toda a terra do Egito. ”
(Êxodo 9.8,9)

Na sétima praga ocorre chuva de saraiva.

“Então, disse o SENHOR a Moisés: Estende a mão para o céu, e haverá saraiva em toda a terra do
Egito, sobre os homens, e sobre o gado, e sobre toda a erva do campo na terra do Egito. ” (Êxodo
9.22)

Na oitava praga aparecem gafanhotos.

“Porque, se ainda recusares deixar ir o meu povo, eis que trarei amanhã gafanhotos aos teus
termos...” (Êxodo 10.4)

Na nona praga ocorre trevas.

“Então, disse o SENHOR a Moisés: Estende a tua mão para o céu, e virão trevas sobre a terra do
Egito, trevas que se apalpem. ” (Êxodo 10.21)

E, finalmente, na décima praga: a morte de todos os primogênitos.


“Disse mais Moisés: Assim o SENHOR tem dito: À meia-noite eu sairei pelo meio do Egito; e todo
primogênito na terra do Egito morrerá, desde o primogênito de Faraó, que se assenta com ele sobre o
seu trono, até ao primogênito da serva que está detrás da mó, e todo primogênito dos animais. E
haverá grande clamor em toda a terra do Egito, qual nunca houve semelhante e nunca haverá; mas
contra todos os filhos de Israel nem ainda um cão moverá a sua língua, desde os homens até aos
animais, para que saibais que o SENHOR fez diferença entre os egípcios e os israelitas.” (Êxodo
11.4-7)

Neste capítulo discutiu-se, até o presente, o essencial e necessário


sobre as pragas, porém a décima praga, “a morte de todos os
primogênitos na terra do Egito”, incluindo o primogênito de Faraó,
deve ser investigada com fim de verificar se Amenhotep II teve seu
filho primogênito morto, o que seria um fato e evidência poderosa na
montagem deste método histórico e cronológico. Bless (2011) declara
que uma inscrição contida na Stela dos Sonhos113 sugere que o filho
primogênito de Amenhotep II morreu antes de ascender ao trono.
Charles F. Aling também apresenta esta sugestão.

Nesta famosa estela, montada entre as patas dianteiras da grande esfinge de


Gizé, no primeiro ano do reinado de Tutmose IV, o jovem rei relata um
incidente que ocorreu alguns anos antes, durante o reinado de seu pai,
Amenhotep II. Tutmose descansou depois de caçar na área de Gizé, o deus
Harmakhis Kheper-Re-Atum apareceu para ele em um sonho e prometeu-lhe o
trono se ele limpasse a areia que cobria parcialmente a esfinge. A implicação
óbvia é que Tutmose IV não esperava herdar a coroa do Egito e que ele tinha um
ou mais irmãos mais velhos com pretensão anterior ao trono de Egito. (Aling,
1979, pág. 97)

Aling (1979)114, porém, ao fazer esta conjectura, apresenta duas


questões a serem respondidas, o quão confiável é a própria Estela e
se Tutmose IV já tinha idade suficiente antes do êxodo para caçar e
ter sonhos como contado na mesma? Ele responde a primeira
pergunta informando, a partir de dados históricos, que a Stela dos
Sonhos de Tutmose IV é aceita como autêntica, e para a segunda
pergunta faz várias incursões históricas e investigativas sobre a idade
do príncipe no tempo do Êxodo e da cronologia do reino de
Thutmose IV. Nesta informa que o príncipe teria nascido em 1450
a.C. e teria a idade entre três a cinco anos durante o êxodo. Seguindo
em sua pesquisa e especulando sobre o assunto, explica que a Estela
assume que Thutmose tinha outros irmãos, fato de conhecimento
dos egiptologistas, e que na 18ª dinastia prevalecia ao trono o filho
mais velho sobrevivente. Ele cita pesquisa de Brunton e Engelbach
sobre os filhos de Amenhotep II e, após numerá-los, destaca três
filhos homens: Tutmose o futuro rei, Khaemwaset e Webensenu.
Sobre Khaemwaset, informa que não é provável ter estado vivo
durante o reinado de Tutmose IV e sobre Webensenu informa que o
mesmo morreu antes da morte de seu pai. Aling declara ainda que
Webensenu pode ter sido o filho primogênito de Amenhotep II.
Shaw (2003)115 informa que um número de príncipes pode ser
documentado para o reinado de Amenhotep II: Amenhotep,
Thutmose, Khaemwaset, Amenemopet, Ahmose, Webensenu e
Nedjem, bem como os príncipes A e B não identificados conhecido
das estelas deixadas em Gizé. Talvez outro, chamado Aakheperura,
nasceu tarde no reinado de Amenhotep, ou em Thutmose IV, e a
sucessão deste príncipe parece não ter tido reconhecimento em tudo
por Amenhotep II, seja por corregência ou intenção anunciada. Shaw
informa que a história da elevação de Thutmose IV ao reinado é
relatada pela inscrição da “Estela da Esfinge de Gizé” que foi
interpretada no passado como sugestionando sua não legitimidade
ao poder. Dodson, Aidan e Histon, Dyan (2004)116 desenham a árvore
genealógica de Amenhotep II, apresentando a lista de diversos
príncipes nomeados como Amenhotep C, Ahmose B, Akheperkare,
Akheperure, Amenemotep A, Khaemwaset A, Nedjem, Webensenu,
além de Thutmose IV e descrevem a família como que apresentando
certos problemas para se entender esta árvore genealógica,
possivelmente decorrentes de conflitos que houve no final do
reinado. Uma representação na tumba TT 226 descreve várias cenas,
dentre as quais a de duas crianças cujos nomes foram perdidos e
podem muito bem incluir Khaemwaset A, Webensenu ou Nedjem; a
primeira é mencionada no grafite ao lado do grupo de Amenhotep II,
enquanto Webensenu foi enterrado na tumba (KV 35) de Amenhotep
II. Dodson, Aidan e Histon, Dyan (2004)117 descrevem que
Webensenu, filho de Amenhotep II, morreu quando ainda era
criança o que confirma a declaração de Aling.

Webensenu pode ter sido o filho primogênito de Amenhotep II, desde que a ele
foi concedido enterro no túmulo real, uma honra não dada a qualquer um de
seus irmãos. (Aling,1979, pág. 100)

É fato histórico que Webensenu, provável filho primogênito de


Amenhotep II, morre quando ainda era criança. Pode-se assim
afirmar que “a morte de todos os primogênitos na terra do Egito”, e
em específico o primogênito de Faraó ao ser investigada no plano
histórico egípcio, torna-se um fato e evidência poderosa na
montagem deste método histórico e cronológico.
Tratamos até aqui um frame de 430 anos da história do Êxodo
Bíblico, dentro de um frame de 3.000 anos de história do Egito antigo
de maneira totalmente harmoniosa. Ao encontrar-se o período
histórico, tendo cada macroevento sido tratado sistematicamente
sem maximizações, minimizações, estiramentos ou subtrações
temporais ou narrativas, o que se obteve foi dentro do método, de
maneira fantástica, a plena confirmação do evento do Êxodo com sua
ocorrência efetiva dentro da história do Egito antigo. Poderia ainda
aqui se observar Bless (2011), quando ventila em suas pesquisas que a
falta de atividade militar de Amenhotep II durante a última parte de
seu reinado vem da catástrofe militar de ter perdido seu exército na
travessia do mar Vermelho, porém não faz parte ou intenção neste
livro de se fazer a rota do Êxodo ou discutir as diversas
possibilidades de onde seria mais provável ter ocorrido, o que cabe
perguntar no fechamento desta extensa pesquisa é se há evidência
arqueológica egípcia que prove o aparecimento dos hebreus na terra
de Canaã, após 1446 a.C., não mais como um nomo familiar, mas
como uma nação. A verificação deste fato e sua comprovação em
período posterior ao evento do Êxodo, (Êxodo mais recente), ocorrido
na 18ª dinastia, aproximadamente em 1446 a.C, é dentro desta
extensa pesquisa bibliográfica, um marco de evidência expressiva no
método aplicado, permitindo no contexto da harmonização
histórico-cronológica do Êxodo Bíblico e do Egito antigo um
fechamento memorável ao afirmar-se consoante a toda a pesquisa e
método aplicado que o Êxodo Bíblico é um fato incontestável.
Para verificar-se esta questão, deve-se buscar respostas nas
pesquisas científicas pertinentes às origens de Israel, o que
Hoffmeier (2015)118 declara que na década de 1980 surgiu um
ceticismo em relação à historicidade da conquista israelita de Canaã,
levando as origens de Israel para um desenvolvimento indígena na
própria terra, o qual ele destaca alguns como Niels Peter, Gosta
Ahlstrom como defensores dessa opinião o qual ele mostra ser
“minimalista”119, pois em seu trabalho acadêmico demonstra
claramente os obstáculos epistemológicos ocorridos após a virada de
1920-1930 e que, apesar da maioria acadêmica oferecer crédito ao
Êxodo, colocou dificuldades em novas pesquisas. O viés desta
postura epistemológica negativa e “minimalista”, a pesquisa
arqueológica e histórica acontece e interpõe problemas muito
críticos a esta visão, como é o caso da descoberta da Estela
Merneptah.

A Estela Merneptah é um monumento egípcio que descreve a nação de Israel


como um povo derrotado por Merneptah. Merneptah foi o sucessor de Ramsés
II e, embora Israel pudesse ter sido uma nação bem estabelecida na terra de
Israel depois de escapar de Ramsés II, a plausibilidade de Israel ser bem
desenvolvida nesse curto período de tempo não é tão grande quanto se eles
tivessem sido oprimidos. (Bless, 2005, pág. 4,5)

Clarke (2003), em artigo para o jornal Academia Edu com o título


de “A Estela de Mernepta”, descreve que o granito negro conhecido
como “Estela de Mernepta” foi descoberto por Willian Mathew
Flinders Petrie em 1896, sendo o único documento egípcio conhecido
e aceito em geral com a menção do nome da nação de “Israel”. O
texto é datado pela maioria dos analistas como de 1209/1208 a.C., na
convencional cronologia egípcia. Verifica-se que apesar de debates
quanto a propostas de revisão cronológica, realinhamento histórico,
como fala, Clarke (2003) é firme em dizer que os vários fatores
políticos, econômicos e militares detalhados na “Estela” coincidem
com as condições em Israel no período. A Estela, documento
amplamente aceito, confirma a existência de uma nação com o nome
de Israel em aproximadamente 1200 a.C., período aproximado dos
Juízes de Israel e cria um problema seríssimo aos céticos, como Niels
Peter e Gosta Ahlstrom, em relação à conquista israelita de Canaã e a
sua visão minimalista de que Israel surgiu tribalmente, pois não há
esta informação histórica ou arqueológica. A vasta fonte de
evidências da passagem dos hebreus pelo Egito e a existência de um
documento egípcio de tamanha grandeza para a arqueologia como a
“Estela de Merneptah”, confirmando a existência dos hebreus na
terra de Canaã em 1200 a.C., como uma nação, a nação de Israel, é
perfeita e plenamente aceitável no método aplicado, pois temos um
espaço temporal de 246 anos, do Êxodo até a descoberta da Estela, o
que é compatível com o tempo e cenário delineados na história pós-
Êxodo.

108. Bless, 2011, pág. 6 (The israelites in Egypt: An archaeological outlook on the biblical
exodus tradition by Jonathon D. Bless, Submitted to the Faculty of The Archaeological
Studies Program Department of Sociology and Archaeology, University of Wisconsin La
Crosse – 2011)
109. Trevisanato, 2005, Pág. introdução,
110. Erupção minoica de Santorini: também referida como a erupção do Tera ou erupção de
Santorini, foi uma catastrófica erupção vulcânica pliniana com um Índice de Explosividade
Vulcânica (IEV) de 6 ou 7 e uma Densidade Lítica Equivalente (DLE) de 60 km³, que se
estima ter ocorrido em meados do segundo milênio a.C., entre o período de 1 650–1 450 a.C.
A erupção foi um dos maiores eventos vulcânicos na Terra registrados na história. A
erupção devastou a ilha de Santorini, incluindo o assentamento minoico de Acrotíri, bem
como as comunidades agrícolas e áreas em ilhas próximas e na costa da ilha de Creta.
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Erup%C3%A7%C3%A3o_minoica. Acesso em:
09/04/2018.
111. Admonitions; zonnehymne. Disponível em: http://www.rmo.nl/collectie/zoeken?
object=AMS+27+vel+1. Acesso em: 02/04/16.
112. Gardiner, 1969, pg. 8,9
113. Descrição parcial contida em Shaw, 2003, pg. 247: “Agora a estátua do grande Khepri [a
Grande Esfinge] descansava neste lugar, grande da fama, sagrada, de respeito, a sombra de
Ra repousando sobre ele. Memphis e todas as cidades em seus dois lados veio para ele, seus
braços em adoração ao seu rosto, tendo grandes ofertas para o seu ka. Um dia desses
aconteceu que o príncipe Thutmose veio viajando na hora do meio dia. Ele descansou na
sombra deste grande deus. [dormiu e] sonhou [tomou posse dele] no momento em que o sol
estava no zênite. Depois ele encontrou a majestade deste nobre deus falando de sua própria
boca como um pai fala com seu filho e dizendo: ‘Olhe para mim, observe-me, meu filho
Tutmés, eu sou seu pai Harmakhis Kheper-Re-Atum. Eu te darei a realeza [sobre a terra
antes dos vivos] [eis que minha condição é como uma em doença], todos [meus membros
arruinados]. A areia do deserto, na qual eu costumava estar, (agora) me confronta; e isso é
para fazer com que você faça o que está no meu coração que eu esperei.
114. Aling, 1979, pág. 97,98
115. Shaw, 2003, pg. 246,247
116. Dodson, Aidan e Histon, Dyan, 2004, pg. 132
117. Dodson, Aidan e Histon, Dyan, 2004, pg. 141
118. Hoffmeier, 2015, pág. 198
119. A postura minimalista defende que tudo que não é corroborado por evidências
contemporâneas aos eventos a serem reconstruídos deve ser descartado.
CONCLUSÃO

Até o presente capítulo é permitido sem dúvida e de maneira


bastante equilibrada, com metodologia científica de pesquisa
bibliográfica e com base em dados cronológicos dos mais aceitáveis,
afirmar que a história bíblica do Êxodo é muito harmoniosa com a
história egípcia. Indeléveis são as evidências apresentadas e sua
realidade histórica no plano cronológico, o que torna incontestável o
fato final construído como realidade e parte da história universal e da
antiga história de Israel. No que tange à história bíblica do Êxodo,
verificam-se muitos pontos congruentes entre a história e a
arqueologia já bem definidos e tido como certo e incontestável e
outros pontos que ainda são passivos de conhecimento e provas. Os
pontos ainda duvidosos não significam na ciência uma negativa em
relação ao fato, mas o contínuo estudo do fato em si, permitindo
paulatinamente dentro de uma ciência que avança em pesquisa e
conhecimento torná-lo claro. Neste contexto, o Êxodo em si é um
fato incontestável, mas deve o pesquisador entender que nem todos
os fatos poderão ser talvez compreendidos e outros fatos serão talvez
assuntos da fé e da teologia. É na harmonização e contextualização
histórica e cronológica dos fatos em si pelo método proposto que a
parte de pontos ainda duvidosos, o argumento científico final é
poderoso na confirmação histórica do Êxodo. Da chegada de Jacó e
sua família no Egito, seu estabelecimento e crescimento como uma
nação, a opressão sofrida pelos hebreus no Egito por parte de Faraó,
até o nascimento de Moisés, seu exílio e retorno ao Egito como
grande libertador do povo hebreu, e, por fim, a comprovação
histórica da existência de uma nação com o nome de Israel na
Palestina, permite por meio da soma dos macroeventos a construção
de um evento final harmonizado cronologicamente de maneira plena
com a parte da história do Egito pertinente ao fato. Isto, sem dúvida,
permite ao pesquisador declarar, em consonância com muitas vozes
acadêmicas, que o Êxodo hebreu narrado na Bíblia é uma história
verídica e incontestável. Lembremos, para tanto, a nobre citação120
de W. F. Albright: “A permanência de Israel no Egito é uma parte
vital da primitiva tradição histórica israelita e não pode ser
eliminada sem deixar uma lacuna inexplicável”. A mim cabe, como
teólogo e pesquisador, torcer para que este livro de abertura a novos
debates e pesquisas e coloque este e outros temas
epistemologicamente sensíveis na seara dos estudos acadêmicos.
Vou além, desejo de todo coração que este tema envolva
positivamente a todas as pessoas que o apreciam e traga uma nova
visão do Êxodo Bíblico, visto também pela perspectiva do método
apresentado e pela historicidade dos eventos do antigo Egito.
Obrigado aos leitores e bons debates sobre o assunto.

120. Thompson, 2006, pg.68


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APÊNDICE
FIGURA 25: Cronologia Egito - Reino Médio
FIGURA 26: Cronologia Egito – Segundo Período Intermediário
FIGURA 27: Cronologia Egito – Novo Reino

FIGURA 28: Cronologia Egito - Período Ramessidico


LISTA DE FIGURAS & TABELAS

FIGURA 1: Interseção de Fatos Históricos I / Fonte: autor


FIGURA 2: Interseção de Fatos Históricos II/ Fonte: autor
FIGURA 3: Macroeventos Estabelecidos / Fonte: Autor
FIGURA 4: Harmonização Histórica e Cronológica dos Eventos / Fonte: autor
FIGURA 5: Régua de tempo / Fonte: autor
FIGURA 6: File:Beni Hassan (Lepsius, BH 3). Disponível em
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Beni_Hassan_(Lepsius,_BH_3)_03.jpg. Acesso
em 07/03/2018.
FIGURA 7: Cena dos Aamu de Shu – Imagem png renderizada pelo autor. Disponível em: By
NebMaatRa - Own work, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?
curid=4390535File:Beni Hassan (Lepsius, BH 3). Acesso em 19/11/19.
FIGURA 8: Transcrição e tradução por Percy E. Newberry da cena 1, fila 3. (Newberry, 2009.
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heidelberg.de/diglit/newberry1893bd1/0087/image. Acesso em: 19/11/2019
FIGURA 9: As Jornadas de Jacó – Mapa original com anotações do Autor. Mapa disponível
em: http://www.seektheoldpaths.com/Maps/018a.jpg e
http://www.seektheoldpaths.com/Maps/025.jpg. Acesso em 19/11/19.
FIGURA 10: Mapa do Baixo Egito com anotação do autor. Mapa original disponível em
https: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Lower_Egypt-
en.png#/media/File:Lower_Egypt-en.png. Acesso em 18/03/2018.
FIGURA 11: Tabela cronológica da 12ª dinastia (Shaw, 2003. P. 483), mais acréscimo do autor
referente à cronologia Bíblica.
FIGURA 12: As Jornadas de José com marcação pelo autor. Mapa original disponível em:
http://www.seektheoldpaths.com/Maps/023.jpg. Acesso em: 09/04/18
FIGURA 13: Pintura está na tumba de Menna, na época de Tutmés IV (1420-1411 A.C).
Carro de guerra com cavalo. Disponível em:
http://www.museudantu.org.br/Antiguidade/hics.jpg. Acesso em 12/03/2018
FIGURA 14: Múmia de Seqenenre com detalhe da face. Disponível em:
https://imgur.com/gallery/xskswhV. Acesso em 19/11/2019.
FIGURA 15: Sarcófago de Kamose. Disponível em:
https://www.pinterest.co.uk/pin/409264684880513206/. Acesso em 14/03/2018.
FIGURA 16: Múmia de Ahmose. Disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ahmose-mummy-head.png. Acesso em:
09/4/2018
FIGURA 17: Cabeça de Amenhotep. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Amenhotep_I#/media/File:AmenhotepI-
StatueHead_MuseumOfFineArtsBoston.png. Acesso em 14/03/2018.
FIGURA 18: Cabeça de Thutmose I - Museu Britânico. Disponível em:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/ea/ColossalSandstoneHeadOfThutmo
seI-BritishMuseum-August19-08.jpg. Acesso em: 09/04/2018
FIGURA 19: Cabeça da múmia de Thutmose II - Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/Thutmose_II#/media/File:Thutmose_II_mummy_head.png.
Acesso em: 18/05/2018
FIGURA 20: Escultura em calcário - Museu Metropolitano de Artes. Disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Hatshepsut.jpg. Acesso em: 09/04/2018
FIGURA 21: Estátua de Thutmose III no Museu Luxor. Disponível em:
https://en.wikipedia.org/wiki/File:TuthmosisIII-2.JPG. Acesso em: 09/04/2018
FIGURA 22: Cabeça da grande estátua de Amenhotep II em exposição no Museu de
Brooklyn. Disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:AmenhotepII-
StatueHead_BrooklynMuseum.png. Acesso em: 09/04/2018
FIGURA 23: Cronologia Egípcia x Bíblica / Fonte: autor
FIGURA 24: Arvore genealógica - família Thutmose I – 18ª Dinastia / Fonte: autor
FIGURA 25: Cronologia Egito - Reino Médio
FIGURA 26: Cronologia Egito – Segundo Período Intermediário
FIGURA 27: Cronologia Egito – Novo Reino
FIGURA 28: Cronologia Egito - Período Ramessidico

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