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Sistema linfático —
revisão crítica de sua
anatomia e fisiologia *
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HIRAM SILVEIRA LUCAS»*
«
• Parte do trabalho ‘Revisão no Estudo do Sistema Linfático. — Algumas Aplicações na
Cancerologla”.
**
Cirurgião do Instituto Nacional de Câncer — Rio de Janeiro — Brasil.
8 OUTUBRO, 1968 REVISTA BRASILEIRA DE CANCEROLOGIA
SUMARIO
SUMMARY
homem. Daí oferecerem falsas imagens. nografias), fazem com que restrinjamos
Mais tarde, a esta crítica viria se juntar nossas citações.
outra, muito mais séria: havendo retençãc SHEEHAN em Nova York e Wallace
do tório, o resultado de sua ação radioativa em Filadélfia ,em 1961, introduziram impor
foi lastimável, registrando-se inclusive ca
tantes modificações na técnica de KINMON-
sos de degeneração neoplásica. PINTO COE TH, substituindo os contrastes hidrossolü-
LHO (18) descreve um dêstes “torotrastomas”.
veis por uma substância lopossolúvel. Êstes
A técnica das radiografias do sistema fornecem imagens mais detalhadas e com
linfático sofreu espetacular evolução após a certa precisão. Além de possibilitarem a re
divulgação dos trabalhos realizados em petição dos exames radiográficos por um
Londres, em 1951, por J. B. KINMONTH. tempo mais longo, já que tais substâncias
Assim é que, baseado nos estudos de HU- são retidas pelos linfonodos. Por outro lado,
DACK e MCMASTER, KINMONTH injetava obtemos imagens dos nódulos retroperito-
uca substância corante (solução de “patent niais e do canal torácico.
blue violefs), nos espaços interpododáticos
A prova do interêsse no método é com
fazendo visualizar os troncos linfáticos no
dorso do pé. Assim descoberto, introduzia provada pela realização em 1961. do Pri
num vaso, solução aquosa de diodone a meiro Congresso Internacional de Linfade-
70%. nografia na cidade italiana de Turim.
Durante muito tempo foi aceito que o sistema linfático era desenvol
vido a partir do endotélio venoso, primàriamente surgindo como expansões
ou divertículos das veias jugular e ilíaca comum.
Atualmente, considera-se que se forme a partir de fendas do mesên-
quima, por transfarmações que sofrem suas células de revestimento ad
quirindo caráter endotelial.
Figura 2 Figura 3
Fig. 2 Embrião de gato. Em mesclado está o sistema venoso; em negro, o sistema linfático.
1) saco linfático jugular; 2) saco linfático subclávio; 3) sacos Unfáticos precursores do canal
toráclco; 4) saco linfático mesentérlco; 5) saco linfático íl-eo-inguinal.
Figura 4
Figura 5
Figura 7
habitualmente são mais calibrosos que êstes conceitos precisos. Os anatomistas clássicos
e, por outro lado, sofrem menores altera (Rouviére, Cray, entre outros) descreveram
ções de diâmetro em seu trajeto. Dispondo- uma união entre os vasos em seu trajeto
se como ramos de árvore, reunem-se dan proximal, diminuindo seu número. Os exa
do origem a condutos mais calibrosos, os mes radiográficos mostram, ao contrário,
vasos linfáticos (vasas lymphaticas). Ao ad que o calibre dos vasos linfáticos sofre pe
quirirem diâmetro de 0,2 a 0,5 mm., surge quena alteração à medida que se aproxi
uma esquematização, se bem que pouco de mam dos linfonodos. Entretanto, se anas-
finida, de três camadas em sua parede. É tomosam com maior liberdade, podemdo se
um indício de túnica fibrosa ,adventícia), ramificarem logo a seguir, permanecendo
camada média (elástico-músculo-fibrosa) e numerosos.
Nos membros, um conduto linfático mais linfonodos inguinais superficiais (n. 1. in-
calibroso terá diâmetro entre 0,5 a 1 mm. quinales superficiales). Os laterais podem
Vários estudos experimentais provaram a podem fazer um estágio no linfonodo po-
grande capacidade de regeneração dos va pliteo (N. 1. poplitei).
sos linfáticos. Quando incisados, se recana- Os feixes linfáticos profundos, acompa
lizam através uma ponte, recuperando sua nhando os troncos artério-venosos, termi
função integral ao fim de oito dias. nam no linfonodo poplíteo. Daqui partem
Os canais linfáticos superficiais nos canais eferentes que buscam a cadeia ín-
membros reunem-se em verdadeiros feixes guino-crural. As obstruções cirúrgicas, da
que acompanham as veias num sentido pro- circulação superficial não acarretarão pro
ximal. blemas devido ao desvio da corrente linfá-
Assim, no membro torácico encontra tica, principalmente através conexões ao
mos os troncos: radial, médio e cubital, con nível da articulação do joelho buscando os
forme corram junto às veis cefálicas, (v. vasos profundos.
cephalica), mediana (v. mediana cubiti) e Os vasos linfáticos glúteos buscam dire
basílica (v. basílica) respectivamente. tamente, os linfonodos pélvicos (n. 1. iliaci).
Alguns coletores do grupo cubital são Os tratados de Anatomia descrevem mi
interrompidos pela presença de linfonodos nuciosamente os linfonodos ínguino-crurais,
epitrocleares (nodi lymphatici cubitales), procurando determinar seus vasos aferentes
ao nível de articulação do cotovêlo (arti- e suas relações. Na prática, temos visto far
culatio cubiti). Seus canais eferentes (vasas tamente que a circulação linfática procura
eferentias) perfuram a aponevrose braquial sempre o caminho “mais fácil”. Não quere
(aponeurosis m. bicipitis brachii), fazendo mos afirmar que não há sentido de siste-
anastomose com os vasos linfáticos profun matização, porém, é ponto pacífico que as
dos que acompanham o tronco vascular dificuldades circulatórias ou de desague,
umeral. provocam um desvio da corrente em procura
Os vasos do membro torácico terminam de linfonodo mais acessível.
na cadeia de linfonodos axilares (n. 1. axi- Assim, após estágio na cadeia ínguino-
lares). Daqui partem canais para a cadeia crural, os troncos linfáticos seguindo a di
infra-clavicular (n. 1. subscapulares). Os reção dos vasos ilíacos externos, atingem o
■*.
condutos eferentes desta cadeia, reunidos, tronco ilíaco primitivo. Múltiplas são as in
formam o tronco sub-clavio, que desagua no terrupções que se processam devido à pre
canal torácio (ductus thoracicus) ou nos sença dos linfonodos aí encontrados. Por
vasos linfáticos à direita. Os vasos que outro lado, temos visto vasos linfáticos que
acompanham o trajeto da veia-cefálica (v. emergem na cadeia ilíaca — externa sem
cephalica) constituem exceção, já que bus fazerem estágio em linfonodo inguinal. Êste
cam diretamente as cadeias claviculares, sem fato é muito importante na práitca.
o estágio axilar.
Ao nível da bifurcação da artéria ilíaca
Qualquer dificuldade circulatória no ca primitiva (a. ilíaca communis) os vasos ilia-
nal torácico pode determinar, por contra- cos externos se reúnem aos linfáticos pro
corrente, o desvio circulatório para o tron venientes da cadeia hipogástrica e seguem,
co sub-clávio e o aumento de volume dos fazendo vários estágios ,e sempre acompa
linfonodos infraclaviculares. nhando 0 tronco vascular, em busca do pro
É muito importante, nos membros torá- montório. A cadeia iliaca primitiva de um
cicos, a presença de circulação linfática ad- lado mantém vasos linfáticos comunicando-a
cional que, acompanhando os vasos circun- com a heterolateral. Êste detalhe também
flexos posteriores, atinge os linfonodos su- tem muita importância na prática médica.
praclaviculares, por via dorsal. Os troncos eferentes ilíaco-primitivos se
Nos membros pélvicos a organização dos reunem terminando em linfonodos dispos
coletores linfáticos é também feito sob for tos ao redor da artéria Aorta (Aorta Abdo
ma de feixes superficiais e profundos. minal) e da Veia Cava Caudal (v. cava
Os superficiais acompanham a veia sa- inferior). Esta é a cadeia abdomino-aórtica
fena interna (v. saphena magna) ou a safe- que recebe, em têrmos finais, tôda a circula
na externa (v. safena parva), conforme es ção linfática dos membros e do abdome
tejam no grupo mediai ou lateral, respecti lançando-a no canal torácico (DUCTUS
vamente. Os troncos mediais terminam em THORACICUS).
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Já vimos que o líquido transuda devido à No entanto, através dos capilares lin-
pressão hidrostática da extremidade arterial fáticos, permeáveis às moléculas proteicas,
dos capilares, se bem que se admita a exis os colóides podem retornar à circulação.
tência de uma pequena pressão no capilar Não há dúvidas também que as subs
venoso, vemos, pelo . contrário, que neste tâncias estranhas que atingem os espaços
ponto ocorre a absorção líquida. Êste equilí interceluiares, pela maior permeabilidade da
brio, que impede o entumescimento progres parede capilar linfática, incorporam-se à
sivo dos tecidos orgânicos, é devido ao anta linfa que as lança no interior dos linfo-
gonismo entre a pressão hidrostática e a nodos.
pressão osmótica nos espaços intercelulares. A quantidade de linfa formada é des-
A concentração de substâncias crista- continua, variando conforme o momento e
lóides no sangue e no líquido intersticial é a região observada. Sabe-se que, em situa
pràticamente idêntica; já o mesmo não ções normais, o líquido intersticial pode ser
ocorre com os colóides. Dado o bloqueio que removido, satisfatoriamente, apenas pelo
a parede capilar oferece à saída dêstes sistema venoso.
elementos, o maior conteúdo coloidal do Havendo excesso de transudação dos
sangue é suficiente para tornar mais alta capilares sanguíneos, com o conseqüente
sua pressão osmótica em relação à do liquido aumento dos espaços intercelulares, um sis
intersticial. Assim, embora haja isotonia tema de traves fibrosas microscópicas que
cristalóide, a pressão osmótica marginal ligam a membrana endotelial dos linfáticos
produzida pelos colóides, ainda que pequena, às substâncias intercelulares, faz com que
atrai o líquido para o interior dos capilares. haja uma dilatação da luz dos capilares
linfáticos.
Êste equilíbrio entre a pressão hidros
tática e a diferença de pressões osmóticas Um fato de grande importância na
do sangue e do líquido intersticial, deter histologia do capilar linfático é a ausência
mina a entrada ou saída de líquidos através de membrana basal, que envolve sempre os
a parede capilar. capilares sanguineos. Por êste motivo tem-se
procurado explicar a maior permeabilidade
Um terceiro fator intervém para esta
da parede linfática, bem como sua pouca
regulação de trocas; á integridade da mem
seletividade, permitindo a fácil absorção de
brana capilar.
macromoléculas protêicas e de exsudatos
CAPILAR LINFÁTICO — Outro meca inflamatórios.
nismo que participa da absorção do líquido Assim sendo, o aumento dos espaços
intersticial é constituído pelos capilares lin- interceluiares (com imediata dilatação do
fáticos, que se ramificam formando malhas, capilar linfático), o aparecimento no líquido
extremamente complexas, em quase tôda intersticial de moléculas de proteína ou de
extensão do corpo. A parte do líquido in substâncias estranhas (como bactérias, pro
tersticial que pentra por difusão através da dutos de exsudação de processos inflamató
parede endotelial do capiiar linfático re rios, corantes vitais, entre outros) determi
cebe o nome de “iinfa” e, já se sabe, será narão um maior fiuxo linfático.
lançada na circulação venosa. Compreendi Em princípio, algumas células neoplá-
do melhor em suas funções, reconhece-se sicas se difundem também através da pa
atualmente o grande papel desempenhado rede capilar linfática.
por êste sistema no organismo.
A atividade tecidual aumentada, as
Aceita-se hoje que uma pequena parte massagens, o aquecimento, são ainda causas
de proteínas sanguíneas possa escapar, sen de maior circulação linfática. Em órgãos
do lançada nos espaços intercelulares. Sa sujeitos a ininterrupta atividade metabó-
be-se ainda que esta parte não poderá lica (como o coração, fígado e o trato in
retornar aos capilares sanguíneos. Ora, testinal) a formação de linfa é constante.
acumulados em grande concentração nestes É evidente que a composição da linfa
espaços, as macromoléculas elevariam a varia conforme a zona em que ela se origina.
pressão osmótica do líquido intersticial a Os cristalóides. em solução aquosa, são en
níveis superiores à do sangue. Evidente contrados em proporção e concentração se
mente, a absorção líquida do capilar seria melhantes à do plasma sangúíneo. Já suas
prejudicada. proteínas, ainda que procedam do capilar
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vasos
artéria
veia
capsula fibrosa
seio subcapsular
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Figura 10
Figura 11 Figura 12
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tical e a medular (Figs. 11 e 12). Na cortical tência destas zonas mais densas é porque
os espaços, intratrabeculares são ocupados tendo o reticulo mais apertado, retém me
por uma trama reticular onde vêm se agre lhor os linfócitos, preparando de forma mais
gar células retículo-endoteliais. Dilstinguem- eficiente o mecanismo de defesa contra os
se zonas mais densas, arredondadas, onde a antígenos. É importante frisar que a linfa
trama possui malhas mais apertadas: são os ao percorrer as rêdes de malhas largas, entra
“nódulos primários”. em contato íntimo com as referidas áreas de
A parte central de um nódulo primário malhas justas.
possui um aspecto distinto da periferia, pois WINTROBE (21) realça ainda que as cé
contém células dotadas de maior quantidade lulas retículo-endoteliais contidas no in
de citoplasma, o que lhe dá um tom mais terior dos linfonodos podem reverter às fun
pálido. É o “centro germinativo”, local onde ções de formar hemácias; êste fenômeno,
são formados os linfócitos e os plasmócitos. conseqüência do potencial embrionário he-
Os nódulos linfáticos corticais são se matopoiético, é chamado “metaplasia mie-
parados entre si pelas traves fibrosas. São lóide”.
isolados da cápsula conjuntiva por meio de Resumindo: são duas as funções princi
trabeculações reticulares de malhas largas pais dos linfonodos — 1) filtração da linfa
que constituem os “seios subcapsulares ou (o que possibilita que a ação fagocitária das
periféricos”. células retículo-endometeliais retenham as
Na zona medular existe também uma partículas estranhas); 2) produção celular
formação caracterizada por maior densidade (os linfócitos e os plasmócitos formados aí
de trama reticular, com malhas apertadas. e incorporados à linfa, possibilitam a fabri
São os “seios medulares”, que por serem li cação dos vários anticorpos).
neares e irregulares são também chamados Já se falou que pelo hilo penetram ar
de “cordões medulares”. térias que nutrem os linfonodos. Em seu
A linfa, lançada pelos vasos aferentes interior elas se ramificam formando rêdes
nos seios subcapsulares, é filtrada pelas tra capilares envoltas em bainhas de células re
mas reticulares de malhas largas, dispostas ticulares. Êstes capilares são especialmente
entre os nódulos primários e entre os cor numerosos na periferia dos nódulos linfá
dões medulares, atingindo por fim os lin ticos, facilitando a penetração dos linfócitos
fáticos eferentes. diretamente na corrente sanguínea. Os ca
Os cordões medulares ramifica-se de pilares são reorganizados em vênulas e estas,
maneira irregular e fazem várias conexões sob forma de vasos mais calibrosos, abando
com os nódulos primários. A razão da exis nam 0 linfonodo também pelo hilo.
BIBLIOGRAFIA