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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO PARÁ

CAMPUS BELÉM
PLANO NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA
CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA

LETÍCIA NEVES DE OLIVEIRA

CONSTRUÇÃO E (RE)PRODUÇÃO DE IDENTIDADES DE GÊNERO NA


EDUCAÇÃO INFANTIL.

BELÉM
2019
LETÍCIA NEVES DE OLIVEIRA

CONSTRUÇÃO E (RE)PRODUÇÃO DE IDENTIDADES DE GÊNERO NA


EDUCAÇÃO INFANTIL.

Projeto de Conclusão de curso apresentado


ao Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Pará – IFPA – Campus Belém
como requisito para obtenção de Grau em
Licenciatura Plena em Pedagogia.

Orientadora: Profa. Dra. Natalia Conceição


Silva Barros Cavalcante.

BELÉM
2019
SUMÁRIO

1. Introdução 1

2. Justificativa 2

3. Problema 4

4. Objetivos 6

4.1 Objetivo Geral 6

4.2 Objetivo Específico 6

5. Referencial Teórico 7

5.1. Histórico da Educação Infantil 7

5.2. Gênero Como Categoria Analítica 13

5.3. Identidade de Gênero 18

6. Metodologia 22

7. Cronograma 27

8. Calendário de Coleta 28

9. Referências 29

10. Apêndice 32
1

TEMA
Identidade de Gênero na educação infantil

1. INTRODUÇÃO

Através de experiências vividas desde a primeira infância construímos a noção


de um mundo dividido em dois lados: feminino e masculino; no qual ambos exigem
de seus indivíduos comportamentos, interesses e habilidades opostas. Aprendemos
desde cedo que meninas gostam de brincar de afazeres domésticos e bonecas,
enquanto os meninos, por sua vez, gostam de futebol e jogos que envolvam força e
aventura. Os arranjos de gênero são aprendidos desde a socialização primária
quando na escola somos orientados a brincar somente com crianças do mesmo
gênero que o nosso, fazer “fila de menino” e “fila de menina” etc.

Percebemos assim, que a escola nos ensina logo cedo à forma como o mundo
está organizado a partir das relações de gênero e nos indica caminhos pelos quais
nossa identidade deverá ser construída para nos tornar “autênticos” homens e
mulheres. Não difícil escutar nas escolas frases relacionadas ao que se entende por
identidade e papéis de gênero como “meninas são organizadas”, “menina é
vaidosa”, “meninos são desordeiros”. O Gênero na escola é, pois, um demarcador
de espaços e regras estabelecidas em razão das normas de gênero, isto é, do que
se entende por feminino e masculino (LOURO, 2000).

Na educação infantil sutis práticas naturalizadas vêm transmitindo e


reproduzindo aspectos físicos e condutas esperadas para meninos e meninas
(FINCO, 2003). Os adjetivos valorizados para um gênero são repudiados se
relacionado ao gênero oposto. Essa diferenciação se estende para forma de
interagir com meninos e meninas no ambiente escolar. Professores ao conversarem
com meninas exaltam sua doçura e feminilidade, em contrapartida, ao se
direcionarem a meninos recorrem a frases como “menino não faz isso”, “homem não
chora”, reforçando a ideia de que meninas devem ser doces e frágeis enquanto
meninos fortes e viris.
2

A educação esteve historicamente centrada nos corpos, justificando práticas


pedagógicas voltadas para a subordinação, condicionamento de corpos e mentes
(LOURO, 2007). A escola assume a primazia de reproduzir e imprimir nos indivíduos
característica da identidade considerada aceitável e normal, afastando a
possibilidade do comportamento desviante (LOURO, 2000; SILVA, 2010). É
relevante, pois, a aproximação com o ambiente escolar para compreensão desse
processo de construção indenitária de alunos da educação infantil através das
práticas escolares.

Considerando isso, a presente pesquisa tem por objetivo analisar em campo a


influência da escola na construção de identidade e (re)produção de identidades de
gênero em relação a crianças da educação infantil. Para tanto, pretende-se se
utilizar como participantes desta pesquisa duas professoras do Jardim I e II da
Cooperativa Educacional Nossa Escola .

Escola foi escolhida como locus da pesquisa em razão da minha aproximação


e atuação como estagiária na escola durante o período de estágio obrigatório na
coordenação pedagógica.

2. JUSTIFICATIVA

A escola é um lugar privilegiado para observação das transformações e


conjuntura contemporânea, sua característica formadora do ser social é o lugar
atraente para implementação de mudanças na perspectiva social (VEIGA-NETO,
2001) com vistas a promover resultado seja no âmbito político, cultural ou
econômico. No cenário da construção de identidades no que tange a representação
de gênero, é importante identificar e compreender as narrativas que fortalecem a
exclusão e perpetuação de desigualdades entre homens e mulheres no meio social
e cultural e que são fortalecidos ou ressignificados pela escola.

É possível identificar nos documentos oficiais que norteiam a Educação básica,


diretrizes que orientam a discussão das questões de gênero nas escolas. Os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) publicado em 1997 apresenta no seu
volume 8 o tema “Relações de Gênero” orientando sua abordagem transversal na
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escola, no sentido de combater relações autoritárias e questionar as rígidas normas


de gênero, tendo por finalidade possibilitar a potencialidade criativa de cada
indivíduo.

Vale ressaltar também as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a


Educação Básica (DCN/2010), que além de incentivar a autonomia das escolas
quanto à construção dos seus currículos recomendam a inserção da discussão das
diferenças sociais, culturais, raciais, sexuais e de gênero, tendo em vista a
pluralidade de sujeitos presentes na escola.

No âmbito da educação Infantil o Referencial Curricular Nacional para a


Educação Infantil (RCNEI) publicado em 1998, aborda no seu volume 2 referente à
Formação Pessoal e Social da criança, o desenvolvimento da “Identidade de
Gênero” como parte das ações e encaminhamentos que devem ter atenção do
professor. De acordo com o documento, o objetivo da escola nesse segmento diz
respeito à transmissão de “valores de igualdade e respeito entre as pessoas de
sexos diferentes e permitir que a criança brinque com as possibilidades relacionadas
tanto ao papel de homem como ao da mulher” (p. 41-42).

A proposição dessa temática nos documentos oficiais da educação é uma


importante colaboração para a desconstrução dos estereótipos de gênero
alicerçados no sexismo e no androcentrismo, pois reconhece que a construção da
identidade ocorre desde a primeira infância e as ações e encaminhamentos que
serão aplicados na educação irá colaborar para a construção das identidades dos
educandos. No entanto, de acordo com o levantamento bibliográfico das produções
acadêmicas sobre a introdução do gênero e da sexualidade nas políticas públicas de
educação no Brasil entre 1990 e 2009, Vianna (2012) verificou que grande parte dos
trabalhos realça a subordinação das temáticas de gênero e sexualidade ao trinômio
corpo/saúde/doença, destacando ainda a falta de formação docente inicial e
continuada.

De acordo com Guacira (2014) é para o cotidiano, para as práticas comuns e


naturalizadas que nossas atenções devem estar voltadas, pois estão nos currículos,
linguagem, procedimentos de ensino, materiais didáticos, teorias etc; os centros das
diferenças de gênero. Nesse sentido, é importante educadores e profissionais da
educação básica conhecerem como tais abordagens se escrevem no campo prático
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da escola voltando atenção para as práticas e concepções que fazem a manutenção


do sexismo, do androcentrismo, machismo e outras formas de discriminação e
desigualdades.

Antes do meu ingresso no curso de Licenciatura em Pedagogia, as relações de


gênero eram por mim consideradas um dado natural onde homens e mulheres
encenam performances de masculinidades e feminilidades imutáveis e inatas, ainda
que, durante minha infância e adolescência em alguns momentos tenha atravessado
as fronteiras das normas de gênero, seja por ter demonstrado interesse em
brincadeiras e brinquedos rigidamente limitado ao “masculino”, seja por me perceber
e identificar LGBT.

O gênero como forma de dar significado às relações de poder ganhou sentido


em mim durante a escrita do meu memorial, atividade proposta na disciplina
concepções de currículo, onde me permiti resgatar o caminho percorrido durante
todo meu processo de escolarização analisando-o com base nas teorias do
currículo. Escrevendo minha história, percebi o quanto a escola, ainda que de forma
tácita, me apontava um “certo” e “errado”, “normal” e “anormal”, principalmente em
relação a minha sexualidade. O resultado dessa retrospectiva me trouxe a
inquietação que agora me impulsiona a dar pequenos passos em direção a essa
pesquisa.

3. PROBLEMA

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 define a educação infantil


como primeira etapa da educação básica devendo ser assegurada a crianças de 0 a
6 anos em creches e pré-escolas. Afirmado no art. 29 tem por finalidade “o
desenvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, em seus aspectos
físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da
comunidade.”

Como primeira experiência na educação básica, a criança na educação infantil


tem a oportunidade de vivenciar e experimentar a convivência com outros grupos
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sociais diferentes do familiar. Na escola serão transmitidos e reproduzidos as


práticas, normas e condutas sociais consideradas adequadas para meninos e
meninas. Nesse processo a escola (re)produz através de suas práticas pedagógicas
as identidades de gênero socialmente aceitas (SAYÃO, 2002) bem como as
representações e manifestações de ser homem e mulher compreendidas nas
normativas de gênero.

Sabe-se, contudo, que escola não é o único meio que incide na construção de
identidades sociais. Vivenciamos as chamadas Pedagogias Culturais que
constantemente estão sendo acionados no sentido de inferir algo sobre a formação
dessas identidades e de tal forma regular e “fabricar” sujeitos de determinado “tipo”.
São inúmeros os espaços de circulação de informação e concepções de gênero. A
mídia em geral pode ser compreendida como uma dessas instâncias educadoras.
Novelas, séries, desenhos, propagandas, publicidades, etc.; também são núcleos de
saberes e conhecimento, pois transmitem mensagens e códigos culturais que
sugerem comportamentos e ensinam o que é ser “homem” e “mulher” e mais ainda
com o desenvolvimento de veículos de massa ao passo em que a criança passa a
ser vista como potencial consumidor.

Para Louro (2008), as identidades de gênero e sexualidade são construções de


aprendizagens adquiridas através de instâncias sociais e culturais que ditam e
influenciam os cânones da sociedade. Essas construções ocorrem durante toda a
vida num processo mutável e infindável. Instituições promovidas como a família,
escola, igreja, instituições legais e médicas assumem a primazia desse processo
construtivo, tornando-se canais para a escrita de significados e escolha de normas
sobre as quais corpos devem se adequar e orientar-se (LOURO, 2008). A escola
não somente “produz” os sujeitos de determinado “tipo” como também é produzida
pelas representações de gênero.

De acordo com Silva (2010) a definição de identidade perpassa por aspectos


da identificação do diferente, isto é, ela se estabelece em relação ao outro, ao que
“eu não sou”. Nesse cenário há identidades que estão social e historicamente
legitimadas, representadas como normal e assumindo o centro de referência para
outras (LOURO, 2000). Em comparação a ela se estabelecem os parâmetros da
normalidade e se descrimina as anormais, desviantes, impróprias e subversivas.
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Os documentos oficiais que norteiam a prática pedagógica na educação básica


acionam as discussões do desenvolvimento das identidades e identidades de
gênero para o contexto da escolarização.

Nesse sentido cabe-nos pensar:

Quais representações de gênero a Cooperativa Educacional Nossa Escola


legitima na educação infantil?

A escola reforça os estereótipos de gênero reproduzindo e fortalecendo o


sexismo através de suas práticas cotidianas demarcando brinquedos, brincadeiras,
cores etc.?

Como se estabelece a prática pedagógica das professoras frente às questões


de gênero?

Como as identidades de gênero se expressam nas relações e interações entre


meninos e meninas da educação infantil?

4. OBJETIVOS

4.1 OBJETIVO GERAL

Analisar a influência da escola na construção e (re)produção das identidades


de gênero em relação a crianças da educação infantil.

4.2 OBJETIVO ESPECÍFICO

1. Investigar as interações existentes entre professoras e crianças na educação


infantil a partir da (re)produção das identidades de gênero

2. Perceber as conceituações de gênero pela professora da educação infantil

3. Identificar as relações de gênero estabelecidas entre as crianças da


educação infantil a partir dos papéis de gênero
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5. REFERENCIAL TEÓRICO

5.1 Histórico da Educação Infantil

Ao falarmos da educação infantil no Brasil e seu histórico, não podemos ignorar


a concepção de infância vivida e aprendida em diferentes séculos numa dimensão
global, até chegarmos ao conceito e ideia que se tem de criança e infância na
atualidade. Embora com suas especificidades, o histórico da educação infantil no
Brasil acompanha os passos europeus nesse sentido à medida que se constituíam
perspectivas e pressupostos em relação à infância ao longo dos períodos históricos
nos permitindo perceber a construção e diacronia da educação infantil no nosso
país. Cabe, pois sinalizar o histórico da infância contada a partir da relação entre
adultos e crianças e as progressivas ações pedagógicas voltadas para elas.

Philippe Ariès, considerado o precursor dos estudos sobre a história da


infância, em sua obra História Social da Criança e da Família publicada em 1960,
nos ajuda a compreender o processo de construção do sentimento de infância e as
diferentes concepções de infância concebidas entre os séculos XII ao XVII. Para o
autor a compreensão de infância como um período de desenvolvimento singular
diferente da fase adulta tal qual é defendido hoje, é uma invenção da modernidade
reflexo das relações sociais, políticas, econômicas e culturais que se deram ao longo
de um processo histórico.

No seu estudo, Ariès defende que durante a idade média não havia
diferenciação por faixa etária tal qual conhecemos hoje. Nesse período as crianças
eram vistas como adultos em miniaturas, sem diferenciação quanto a roupas,
espaços ou atividade laboral. Nessa sociedade “não existem crianças caracterizadas
por uma expressão particular, e sim homens de tamanho reduzido” (ARIÈS, 1981, p.
51). Sua educação nesse contexto dava-se a partir da convivência direta com os
adultos, dos quais observavam e internalizavam os comportamentos e atividades
necessárias para suprir as exigências da vida em sociedade.

Dessa forma, no modelo de sociedade da época as fases da vida não


demarcavam diferenciações e especificidade na vida coletiva. No entanto, Ariés
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destaca que a fase da infância concebida na época até os sete anos de idade, era
caracterizada pela inexistência da fala, tal qual remete o próprio termo enfant “que
quer dizer não falante, pois nessa idade a pessoa não pode falar bem nem formar
perfeitamente suas palavras [...]” (ARIÈS, 1981, p. 36). A partir dos sete anos, a
criança se tornava adulta e era considerada pronta para desempenhar na sociedade
as funções equivalentes a sua fase madura.

De acordo o autor, a família nesse período não se caracteriza pelo vínculo


sentimental ou afetivo, sendo, pois, uma organização social inclinada para a
premissa de utilidade da criança, e, por conseguinte, mantidas junto ao grupo
somente aquelas saudáveis e fortes das quais poderiam gerar benefícios. Nessa
relação não se expressava sentimentos entendidos na dimensão do amor materno
ou cuidados e tratamentos especiais.

A partir do século XVII o cenário em relação à criança na Europa começa a se


modificar impulsionado pelo sentimento de “infância inocente” e pelas convicções
cristãs encabeçadas desde século o XV que colocou a criança nos moldes da
representação de Jesus e Virgem Maria. Ela se transforma então no objeto de
preocupação com a higiene e condutas adequadas para a sociedade, sendo ainda
seus cuidados associados à mulher (ROCHA, 2002).

Com o advento da Idade Moderna novas visões e perspectivas acerca da


criança e sua educação se constitui no imaginário adulto principalmente por efeito
das transformações na sociedade europeia. A revolução industrial com seu sistema
fabril de produção desencadeou novas formas de educação para criança fora do
âmbito familiar ao passo em que as mulheres passaram a ocupar os postos de
trabalho nas fábricas. Para suprir os cuidados com a prole, se recorreu então ao
serviço das chamadas “mães mercenárias”, que eram mulheres que se
encarregaram de “tomar conta” dos filhos das operárias durante o trabalho fora do
lar. (PASCHOAL, MACHADO, 2009)

Criou-se uma nova oferta de emprego para as mulheres, mas aumentaram


os riscos de maus tratos às crianças, reunidas em maior número, aos
cuidados de uma única, pobre e despreparada mulher. Tudo isso, aliado a
pouca comida e higiene, gerou um quadro caótico de confusão, que
terminou no aumento de castigos e muita pancadaria, a fim de tornar as
crianças mais sossegadas e passivas. Mais violência e mortalidade infantil.
(RIZZO, 2003, p. 31).
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Por muito tempo para suprir a necessidade de zelo aos filhos, foram surgindo
iniciativas informais de guarda a crianças, contudo, sem oferecer condições
favoráveis ao desenvolvimento infantil. Mais tarde iniciativas filantrópicas passaram
a olhar as crianças desvalidas sob a ótica da caridade onde o préstimo nos espaços
dava-se em relação à faixa etária da criança. No que diz Oliveira (2011):

Crianças pobres de 2 ou 3 anos eram incluídas nas charity schools ou dame


schools ou écoles petites então criadas na Inglaterra, França e outros
países europeus, segundo os ideários dos movimentos religiosos da época.
Não tinha nenhuma proposta instrucional formal, embora logo passassem a
adotar atividades de canto, memorização de rezas ou passagem bíblicas e
alguns exercícios do que poderia ser uma pré-escrita ou pré-leitura. Tais
atividades voltava-se para o desenvolvimento de bons hábitos de
comportamento, a internalização de regras morais e de valores religiosos,
além de promoção de rudimentos de instrução. (OLIVEIRA, 2011, p. 60)

Outras iniciativas surgiram nos países da Europa para atender a primeira


infância, contudo, a luz assistencialista, visto que o enfoque para a prole das
trabalhadoras operárias era “o ensino da obediência, da moralidade, da devoção e
do valor do trabalho [...]” (OLIVEIRA, 2011, p. 61). Entre as instituições para atender
crianças desvalidas acima de 3 anos se destacam as infant schools, nursery schools
e knitting schools. Essa última idealizada pelo pastor Oberlin em meados do século
XVIII, onde as crianças eram ensinadas a ler a bíblia e a tricotar, por isso o nome
“escola de tricô” (OLIVEIRA, 2011; PASCHOAL, MACHADO, 2009).

De acordo com Oliveira (2011) o crescimento da urbanização e transformação


no modelo de família patriarcal para nuclear aliado a economia e conhecimento
científico emergente, foram às bases para estruturar a concepção de
desenvolvimento social em função da escolaridade dos indivíduos. Pensamento que
impulsionou o olhar para a criança pertencente à elite, sob a ótica de preparação
para a vida adulta na escola, o que não se sustentava quando relacionado às
crianças das camadas mais pobres, visto que o objetivo de sua educação gerava
anuências. Se, por um lado à elite sustentava o modelo de educação tecnicista para
elas, por outro reformadores protestantes defendiam a educação como um direito
universal (OLIVEIRA, 2011).

O ensino centrado na criança e desvinculado de normas disciplinares com


castigos físico e psicológico ganhou arcabouço à medida que as idéias dos pioneiros
da educação dentre eles Comênio, Rousseau, Pestalozzi, Decroly, Froebel e
Montessori tomavam proporções. “Embora com ênfase diferentes entre si, as
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propostas de ensino desses autores reconheciam que as crianças tinham


necessidades próprias e características diversas das dos adultos.” (OLIVEIRA, 2011,
p. 63).

É importante destacar que o primeiro jardim de infância (Kindergarten) de


caráter pedagógico foi fundado em Blankenburg pelo alemão Friedrich Froebel em
meados do século XIX. Por crescer entre a flora e bosques, Froebel concebeu a
criança como uma planta que deve receber cuidados e atenção. O jardim então é o
lugar onde a criança é posta em condições para o seu desenvolvimento, recebendo
atenção do jardineiro ou jardineira (professor/professora) que tem a função de zelar
por elas. No entanto, Froebel destaca que assim como as plantas elas possuem seu
processo natural de crescimento e desenvolvimento, cabendo ao adulto jardineiro
observar e compreender suas necessidades e particularidades (ARCE, 2002).

Os modelos de creches e jardins de infância da Europa se expandiram sendo


adotados posteriormente como referência em outros países. No Brasil, as primeiras
iniciativas de creches e jardins de infância surgem no final do século XIX e início do
século XX em um momento posterior à criação dessas instituições na Europa. No
país, similar a Europa, elas assumem atribuição custodio-assistencialista tendo por
função alimentar, ensinar hábitos de higiene e zelar pela saúde das crianças
enquanto as mães detinham-se nos trabalhos fora de casa (DIDONET, 2001;
PASCHOAL, MACHADO, 2009).

Todavia, antes do surgimento das creches e jardins de infância no país, por


muito tempo a “roda dos expostos” existente no Brasil desde o século XVIII foi a
principal instituição de acolhimento de crianças. A instituição de caridade servia de
abrigo para crianças abandonadas principalmente por moças da alta classe que
buscavam se desfazer dos filhos indesejados. O sistema de roda foi mantido até o
século XX quando em 1950 foi abolido (PASCHOAL, MACHADO, 2009; OLIVEIRA,
2011).

Esse nome provém do dispositivo onde se colocavam os bebês


abandonados e era composto por uma forma cilíndrica, dividida ao meio por
uma divisória e fixado na janela da instituição ou das casas de misericórdia.
Assim, a criança era colocada no tabuleiro pela mãe ou qualquer outra
pessoa da família; essa, ao girar a roda, puxava uma corda para avisar a
rodeira que um bebê acabava de ser abandonado, retirando-se do local e
preservando sua identidade. (PASCHOAL, MACHADO, 2009, p. 82).
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No final do século XIX notam-se crescentes iniciativas de proteção à criança


pequena influenciada pelos novos olhares em relação à infância que chegava ao
mundo ocidental culminando na criação de creches, asilos e internatos sob o viés de
combate às taxas de mortalidade infantil e o progressista abandono de crianças
(OLIVEIRA 2011; KUHLMANN JR, 2011). Para Oliveira (2011) tais entidades, no
entanto, apenas camuflavam os problemas relacionados à infância pobre e
desvalida vista como um obstáculo para o projeto de nação moderna alicerçado no
ideário liberal.

Dos anos 1874 a 1899 foram criados vários projetos e instituições de


assistência à infância, dentre elas os primeiros jardins de infância em São Paulo e
Rio de Janeiro, o projeto de reforma proposto por Rui Barbosa do qual distinguia as
salas de asilos, jardins de infância e escolas infantis e a fundação do Instituto de
Proteção e Assistência a Infância, o qual delineou o processo de assistência à
infância no Brasil. (KRAMER, 1984; OLIVEIRA, 2011).

Com propósito de oferecer assistência às mães trabalhadoras, creches foram


sendo criadas dentro das próprias fábricas como medida frente a crescente força de
trabalho feminina nas indústrias. Dessa forma prevalecia nas creches, sobretudo a
concepção médico-higienista, visto que eram projetadas como uma forma de tornar
viável a relação trabalhista e enfraquecer o trabalho informal de mulheres que
ofereciam serviços clandestinos de guarda e consequentemente reduzir as taxas de
mortalidade infantil, mal que assolou o século XX.

A criação de creches e jardins de infância ao longo da primeira metade do


século XX no Brasil passou por outras influências ideológica além da medico-
higienista, podendo citar também a jurídico-policial que via necessidade de
recolhimento de crianças pobres como uma forma de remediar a criminalidade e
evitar infortúnios a elite e a influência ideológica religiosa, que entendia esses
espaços como uma dádiva aos menos favorecidos. Sobre essas instituições
Kuhlmann Jr. (2011) destaca:

A pedagogia das instituições educacionais para os pobres é uma pedagogia


da submissão, uma educação assistencialista marcada pela arrogância que
humilha para depois oferecer o atendimento como dádiva, como favor aos
poucos selecionados para o receber. Uma educação preconceituosa da
pobreza e que, por meio de um atendimento de baixa qualidade, pretende
preparar os atendidos para permanecer no lugar social a que estariam
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destinados. Uma educação bem diferente daquela ligada aos ideais de


cidadania, de liberdade, igualdade e fraternidade. (KUHLMANN JR. 2011, p.
166-167)

Outras medidas acerca da assistência e educação a crianças pequenas foram


assumidas nos próximos anos, no entanto somente a partir de 1988 com a
promulgação da Constituição Federal considerada o marco da educação infantil no
país, ela é legitimada e reconhecida como dever do estado e parte do sistema
educacional (BRASIL, 1988).

Outra importante conquista histórica se deu com a aprovação da Lei de


Diretrizes e Bases da Educação (LDB) 9394/96 que define a educação infantil como
primeira etapa da educação básica e sua oferta em creches e pré-escolas de
maneira a contemplar “o desenvolvimento integral da criança até os seis anos de
idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
ação da família e da comunidade.” (BRASIL, 1996). Esses foram importantes passos
para o delineamento da educação infantil fora dos moldes da assistência social.

A LDB impulsiona novos olhares acerca do desenvolvimento infantil e amplia o


conceito de educação tornando as relações sociais parte do processo formativo
(OLIVEIRA, 2011). Essa nova proposta de desenvolvimento integral da criança é
reforçado posteriormente com a aprovação das diretrizes curriculares nacionais para
a educação infantil que tem como perspectivas defendidas a educação inclusiva e
comprometida com a nova função social, política e pedagógica dessa etapa.
Destaca-se aqui um dos pontos de acordo com o artigo 7° da CNE/CEB n° 05/09
que devem ter observância das instituições de educação infantil em suas propostas
pedagógicas no sentido de garantir a função social, política e pedagógica na
construção de:

[...] novas formas de sociabilidade e de subjetividade comprometidas com a


ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com o rompimento
de relações de dominação etária, socioeconômica, étnico-racial, de gênero,
regional, linguística e religiosa. (CNE/CEB, n°05/09)

Nesse sentido percebe-se a atenção dada nos documentos oficiais às


relações sociais contemporâneas e a concepção de educação para o desenlace das
desigualdades sociais oriundas das relações de dominação. É importante, pois,
destacar o quanto a educação infantil é importante nesse intento, visto que o
desenvolvimento humano parte de um processo de construção, “[...] ao construir o
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seu meio, atribuindo-lhe a cada momento determinado significado, a criança é por


ele construída; adota formas culturais, de ação que transformam sua maneira de
expressar-se, pensar, agir e sentir.” (OLIVEIRA, 2011, p. 130).

Essas construções, no entanto não ocorrem somente no campo prático da


escola, é por sua vez multifacetada prevista em várias outras instâncias como a
família, os sistemas de leis, as normas, a igreja (MEYER, 2013). A criança torna-se,
portanto, o construto do seu meio. Vale destacar nesse sentido que “o processo de
fabricação de sujeitos é continuado e geralmente muito sutil quase imperceptível”
(LOURO, 2014, p. 67) e os pressupostos que se adota para essa estrutura são
fatores que incidem nas formas de ser, pensar, expressar e sentir das crianças.

A constituição de identidade, portanto é atravessada por diversos marcadores


sociais (de gênero, raça, classe, sexualidade) sobre os quais a cultura opera,
incidindo sentido, significado, noções de normalidade. Gênero como um desses
marcadores “é uma categoria usada para pensar as relações sociais que envolvem
homens e mulheres, relações historicamente determinadas e expressas pelos
diferentes discursos sociais sobre a diferença sexual” (GROSSI, 1998, p. 5). A partir
de pressupostos e representações de feminino e masculino a escola produz e/ou
ressignifica regras de comportamentos para meninos e meninas.

5.2 Gênero Como Categoria Analítica

Se formos nos utilizar da linguística para buscar o significado do termo gênero,


encontraremos no dicionário da Língua Portuguesa diversos sentidos atribuídos à
mesma palavra a depender da interpretação que se busca. É possível encontrar
sentido transitando por ramos como a Biologia, gramática e expressões artísticas,
como por exemplo, os gêneros literários. Guedes (1995) ao percorrer esse caminho,
sublinha significados encontrados no Aurélio que vão desde o agrupamento com
base em caracteres comuns entre objetos, indivíduos etc., até o caminhar em
sentido de “uma divisão dos nomes baseada em critérios tais como sexo e
associações psicológicas” (FERREIRA, 1986, p.844).
14

Nesse segmento o gênero nas suas mais diversas significações pode ainda
agregar a si convenções sociais imbricadas em costumes e ideia à medida que
depende de “caracteres convencionalmente estabelecidos”, e “atividades habituais
decorrentes da tradição” como no gênero de vida, por exemplo. (FERREIRA, 1986,
p. 844; GUEDES, 1995)

Joan Scott (1995) já denota a tarefa árdua e em vão de quem tenta


sistematizar os termos a uma significação singular e quem sabe restrita, pois “as
palavras, como as ideias e as coisas que elas pretendem significar, têm uma
história” (p. 72). “Gênero”, pois, tem sua história e dinamismo no tempo histórico que
muito se entrelaça a trajetória multifacetada dos movimentos pelos direitos das
mulheres, o feminismo. Nesse meio, o termo adquire conceito e desdobramentos
político e teórico próprio. Antes de ser usado para sinalizar no campo social as
relações de poder que envolvem homens e mulheres, “gênero” é encontrado outrora
empregado no sentido figurado para marcar “traços de caráter” e distinguir as
diferenças sexuais percebidas entre indivíduos tal como espelha Scott (1995)
citando Gladstone: “Atenas não tinha nada do sexo além do gênero, nada da mulher
além da forma” (p. 72).

Seguindo o sentido de “gênero” dado em inferência à oposição ao


determinismo biológico nas relações sociais de homens e mulheres “em múltiplos
terrenos de luta” (HARAWAY, 1995, p. 211) é vital destacar a trajetória dos
movimentos feministas, comumente contadas a partir de três ondas. Esta divisão, no
entanto, é utilizada apenas como uma forma simbólica de pensar e organizar os
momentos históricos em função das demandas, atuação e conquistas dos
movimentos coletivos de mulheres nos Estados Unidos e na Europa (MEYER, 2013;
LINS; MACHADO; ESCOURA, 2016).

A primeira onda feminista empreendida entre a transição do século XIX para o


século XX ficou marcada pela reivindicação e luta, sobretudo pelo direito ao voto, à
propriedade, à educação e liberdade profissional. A requisição pelo direito ao voto se
popularizou e marcou o período conhecido como “sufrágio feminino” em razão do
ativismo de mulheres que entre protestos, greves de fome e diversas mobilizações
em Londres, ficaram conhecidas como as “suffragettes” (LOURO, 2014; MEYER,
2013; LINS; MACHADO; ESCOURA, 2016). A Nova Zelândia foi o primeiro país a
15

reconhecer o direito das mulheres ao voto em 1893, enquanto o Reino Unido


somente em 1918.

O Brasil também surfou na primeira onda do feminismo com Bertha Lutz,


ativista feminista, bióloga, mentora da Fundação Brasileira para o Progresso
Feminino e um dos nomes mais significativos do sufragismo brasileiro, também
impulsionado pelo direito ao voto. A conquista política das mulheres brasileiras se
deu em 1932 através do Novo Código Eleitoral brasileiro (PINTO, 2010; LINS;
MACHADO; ESCOURA, 2016).

A segunda onda iniciada a partir de 1960 desdobrou um amplo debate sobre


condições de vida e trabalho das mulheres alicerçado na ideologia de liberação
feminina. Foi a primeira a empreender e problematizar conceito para o termo
“gênero” se destacando pela preocupação com as produções teóricas. A célebre
formulação de Simone de Beauvoir “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”
contida na obra “Le Deuxième Sexe” publicada originalmente em 1949, pressuporia,
pois, a desnaturalização da constituição do feminino e masculino, o que inspirou as
formulações que se seguiria a partir dessa segunda onda (LOURO, 2007; LINS;
MACHADO; ESCOURA, 2016).

Para além de protestos e greves, as feministas agora engendravam em


espaços acadêmicos debates e estudos sobre a condição da mulher, efervescendo
a contestação dos arranjos sociais dos quais mantinha a mulher obscurecida do
fazer político e social na condição secundária aos homens (LOURO, 2014). Os
primeiros estudos então se ativeram em denunciar as desigualdades e subordinação
da mulher nos espaços de trabalho, na qual elas, comumente desempenhavam
funções, sobretudo ligadas à assistência e educação, e sua atuação rigorosamente
controlada e subjugada ao homem (MEYER, 2013; LOURO, 2014). Esses estudos
serviram de impulso para um grande passo: “transformar as até então esparsas
referências às mulheres [...] em tema central.” (LOURO, 2014, p. 22-23).

Fizeram mais ainda: levantaram informações, constituíram estatísticas,


apontaram lacunas em registros oficiais, vieses nos livros escolares, deram
voz aquelas que eram silenciosas e silenciadas, focalizaram áreas, temas e
problemas que não habitavam o espaço acadêmico, falaram do cotidiano,
da família, da sexualidade, do doméstico, dos sentimentos. (LOURO, 2014,
p. 23)
16

Costumes e ideais tradicionalmente relacionadas à mulher como “destino


natural” e “mãe dona de casa”, forjado sobre matriz religiosa, científica, do senso
comum ou da biologia passam a ser contestadas sobre o viés da construção social
dos papéis sociais (LINS, MACHADO; ESCOURA, 2016). O que é posto em cena e
passa a ser argumentado pelo movimento é que tudo o que é permitido pensar e
dizer acerca de homens e mulheres são “[...] o que passa a ser definido e vivido
como masculinidade e feminilidade, em uma dada cultura em um determinado
momento histórico.” (MEYER, 2013, p. 16).

A tomada do termo “gênero” nos estudos das mulheres foi alçado inicialmente
por historiadoras anglo-saxãs, que se apropriaram do termo gender para antagonizar
a ideia de determinismo biológico tácito no uso dos termos sexo ou diferença sexual
(SCOTT, 1995). O termo embora projetado a luz de conceitos nem sempre
unânimes, foi agregado a diversas correntes feministas caminhando para o mesmo
propósito: “[...] argumentar que diferenças entre homens e mulheres eram social e
culturalmente construídas e não biologicamente determinadas” (MEYER, 2013, p.
17).

Scott (1995) nos aponta pelo menos dois vieses pelos quais a utilização do
termo “gênero” inicialmente caminhou nos estudos feministas: se por um lado
pesquisadoras utilizaram-no para defender a abordagem relacional da história de
homens e mulheres, sob a ideia de que “[...] nenhuma compreensão de qualquer um
poderia existir através de estudo inteiramente separado”, por outro historiadoras
propuseram inscrever a mulher na história prescrevendo simultaneamente a
reformulação das metodologias do trabalho científico ao passo que se buscava
sublinhar na história os interesses e vivências da mulher no âmbito subjetivo e
político.

Essa última vertente pressuporia o desenvolvimento do gênero como uma


categoria de análise elaborado não somente para explicar a experiência entre
homens e mulheres no passado, mas dar sentido e significado às relações sociais
sobre o gênero no presente (SCOTT, 1995). Corroborando com isso, embora se
identificasse a mulher na história e apontasse sua participação nos movimentos
sociais, ainda não era o suficiente para assinalar a relevância teórica dos estudos
das mulheres entre os historiadores não feministas, que apesar de reconhecerem a
17

historia da mulher, levantaram dicotomias em relação a história dos homens e


esferas de abordagem, como frisado nas falas:

“As mulheres tiveram uma história separada da dos homens, em


consequência deixemos as feministas fazer a história das mulheres que não
nos diz respeito”; ou “a história das mulheres diz respeito ao sexo e à família
e deve ser feita separadamente da história política e econômica”. (SCOTT,
1995, p. 74)

Com efeito, tornar “Gênero” uma categoria de análise passa a ser uma tarefa
urgente à medida que a premissa dos estudos deveria não só buscar evidenciar a
mulher e as experiências entre homens e mulheres na história como também
identificar as formas de intervenção sobre as desigualdades. É necessário trazer
para o campo das discussões as relações sociais que envolvem as representações
de feminino e masculino (SCOTT, 1995).

Nesse segmento, Scott (1995) denota duas vias dos estudos que permearam
as teorizações de gênero. Uma, em busca de uma “legitimidade acadêmica”
transcende o termo “gênero” em substituição a “mulher” numa análise neutra onde
“nessa utilização, o termo “gênero” não implica necessariamente uma tomada de
posição sobre a desigualdade ou o poder, nem tampouco designa a parte lesada” (p.
75). Outra, explica o gênero como uma construção social que agrega a um corpo
sexuado papéis sociais diferenciados para homens e mulheres, sendo este, pois,
considerado o núcleo produtor e reprodutor das desigualdades de gênero.

Embora se tenha dado vazão a uma noção de construção social da mulher,


essa perspectiva foi amplamente contestada tendo em vista que “não pontualiza
aquilo que especifica essa construção social do gênero, já que todas as condutas
humanas e quase todas as relações sociais são construções sociais” (TOURAINE,
2017, p.58). Nicholson (2000) aponta nessa abordagem o que chama de
“fundacionalismo biológico”, posto que de acordo com ela a “constante social”, ainda
que de forma tácita, está colocada em função da “constante da natureza”. Com
efeito, as justificativas para as desigualdades continuavam implicitamente apoiadas
no determinismo biológico, em corpos sexuados.

De acordo com Scott (1995) as abordagens de gênero durante a segunda onda


do feminismo se entrelaçou com pautas de classe e raça. É possível identificar três
perspectivas analíticas relacionadas ao gênero: estudos que tentam dar conta das
18

origens do patriarcado, estudos dentro do marxismo e estudos pautados na


produção e reprodução de identidade de gênero caminhando pelas veredas da
psicanálise. No decorrer da história do movimento feminista e dos estudos de
gênero foram apresentadas diversas bases teóricas que orientam/ram os estudos e
tentam/ram explicar as relações de gênero. Suas abordagens por sua vez
apresentam tão quantas ramificações a depender do prisma que as aproximam/vam.

Donna Haraway (2004) ao buscar uma compreensão de gênero para ser


inserido a um novo dicionário marxista frisa que “apesar de importantes diferenças,
todos os significados modernos de gênero se enraízam na observação de Simone
de Beauvoir de que ‘não se nasce mulher’” (p. 211). Sua colocação nos ajuda a
compreender as diversas perspectivas teóricas, embora divergentes, alicerçadas
sob um mesmo prisma: a construção da mulher como um ser social (LOURO, 2007).

No feminismo pós-estruturalista o construtivismo do gênero passa a ser


repensado. Diferentemente da segunda onda feminista, as teorizações se abrangem
para além das justificativas com base nos papéis sociais, destacando agora noções
de sexualidade, corpo e sexo. As abordagens feministas pós-estruturalista então se
afasta da ideia de corpo como dado biológico sobre o qual a partir das diferenças
anatômicas se produz as desigualdades sociais percebidas, para em contrapartida,
aponta-lo como um “construto social e linguístico” (MEYER, 2013, p. 18) oriundo das
relações de poder.

Essa abordagem toma em análise às normas, instituições, leis, símbolos como


produtores e atravessados por representações e pressupostos de gênero. As
teorizações pós estruturalista de gênero defender então que durante toda a vida
num processo infindável recebemos investimentos constantes através de instituições
e praticas sociais, nos construímos e instituímos como seres masculinos e
femininos.

5.3 Identidades e Identidades de Gênero


19

As concepções de identidade são múltiplas e assume em diferentes terrenos


significados próprios e por vezes conflitantes. Stuart Hall (2006) nos apresenta três
diferentes concepções de identidade que acionam sujeitos tão quão divergentes em
si. São estes: o sujeito do iluminismo, que remete a um indivíduo centrado e
unificado no qual seu centro sempre permanece imutável e contínuo; o sujeito
sociológico que tem suas principais bases de formação na interação com seu meio e
com outras pessoas, sendo estas a vertente transmissora de valores, sentidos e
símbolos; e o sujeito pós-moderno que seria a representação de nuances, da
identidade mutável, fragmentada e até mesmo contraditória. Este último, produto da
desestabilização de certezas e “verdades”, sugere que se pense novos estilos de
vida, novas formas de sentir, pensar, e novas configurações de identidades (HALL,
2006).

Tal como o sujeito pós-moderno, nos estudos Feministas e Estudos Culturais


observamos a interpretação de identidade como plural, não unitária e inconstante,
caminhando em diferentes direções à medida que é atravessada por inúmeros
marcadores sociais de gênero, raça, classe, nacionalidade, sexualidade, etc.; (HALL,
2006; LOURO, 2014; BRITZMAN, 1996). Quando se coloca as identidades como
uma construção infindável e incompleta, se pressupõem, portanto, a sua propensão
à transformação.

A identidade para Hall (2006), Silva (2010) e Louro (2000) é relacional, pois se
estabelece a partir de algo externo a ela. Ao buscar conhecer a si o sujeito moderno
também é conhecido, se identifica e é identificado e definido. Woodward (2012)
aponta o binarismo presente nessa articulação relacional que está constantemente
classificando o “bom” e o “ruim”, “normal” e “anormal”, “eu” e o “outro”.

Ao focarmos nas identidades de gênero, entendemos nessa perspectiva que


elas também são inacabadas, cambiantes e de estreita relação com “os sistemas de
significação e representação cultural” (HALL, 2006, p. 13) que por sua vez nos
apresentam formas de sentir e viver o gênero. Portanto, pensar identidade de
gênero pressupõe pensar o gênero como parte integrante de um indivíduo bem
como as formas de viver e representar o feminino e masculino em uma dada
sociedade em um determinado tempo histórico e a articulação relacional entre as
performances de “masculino” e “feminino” (LOURO, 2014).
20

Embora seja comum principalmente na cultura ocidental, associar identidades


de gênero e identidades sexuais, ambas não é unitário. Esse tipo de pensamento se
apoia principalmente numa noção equivocada de obrigatória correspondência entre
corpo, identidade de gênero e desejo sexual, vistos como coerentes componentes
naturais (LINS; MACHADO; ESCOURA, 2016). Nesse sentido é interessante
ressaltar que mesmo na ideia de “natural” existe um caráter construído que se serve
dos processos culturais e define o que é “natural” ou não. (LOURO, 2000).

Temos então, o corpo como tela sobre a qual a cultura desenha sentido social
e inscreve parâmetros de “normalidade” e universalidade (BRITZMAN, 1996;
LOURO, 2000). Nesse sentido, a confusão entre as duas identidades (de gênero e
de sexualidade) se dá através do conceito de natural construído sobre o corpo, que
por sua vez é arcabouço do pressuposto de que “‘todo mundo’ é, ou deveria ser,
heterossexual e que a heterossexualidade é marcada através de rígidos binários de
gênero.” (BRITZMAN, 1996, p. 76). Considerando essa costumeira articulação de
identidades como um dado natural, cabe, pois, destacar suas alteridades tendo em
vista seu caráter construído.

A começar pela Identidade sexual, esta se constitui pelas formas de viver a


sexualidade tal como experimentamos “nossos desejos e prazeres corporais”
(WEEKS, 1986, p. 45 apud BRITZMAN, 1996, p. 76). Os arranjos possíveis –
embora, alguns contrários a normativa – nos apresentam um leque de possibilidades
de como e com quem vivê-los: com parceiros do mesmo sexo, com parceiros do
sexo oposto, com parceiros de ambos os sexos, sem nenhum parceiro.

Estes arranjos – os mais populares – dizem respeito às orientações sexuais de


se relacionar afetivo e/ou sexualmente, respectivamente definidos como
homossexualidade, heterossexualidade, bissexualidade e assexualidade (LINS;
MACHADO; ESCOURA, 2016). As identidades sexuais por sua vez não são fixas,
pré-definidas ou automáticas, nem mesmo as identidades mais normativas, isto
porque elas estão imbricadas em constantes negociações e construções. No que diz
Britzman (1996, p. 74):

Não existe, de um lado, uma identidade heterossexual lá fora, pronta, acabada, esperando para ser
assumida e, de outro, uma identidade homossexual instável, que deve se
virar sozinha. Em vez disso, toda identidade sexual é um constructo
instável, mutável e volátil, uma relação social contraditória e não finalizada.
21

Ainda de acordo com a autora, a relação com o “outro” na construção da


identidade é constante e implica em reajustamento, reconfiguração e
desestabilidade tendo em vistas os mais diversos conhecimentos produzidos,
vivências, experiências e culturas. Identificar o que é parte de um indivíduo,
pressupõem a priori identificar o que não o constitui. A identidade, portanto,
inscreve-se sobre a diferença (LOURO, 2000; SILVA 2010).

Embora a sociedade se defronte com os mais diversos marcadores – de


classe, gênero, sexualidade, aparência física, interesses etc. – cotidianamente em
diferentes contextos – nas escolas, nas igrejas, na família, nos vínculos de amizade
– a visão de mundo construída por muitos é de que determinada existência é mais
“certa” que outras. Isso porque embora a constituição de uma identidade esteja
pautada no caráter relacional, algumas identidades carregadas de valores culturais,
assumem o centro de referência para todas as outras (LOURO, 2000; SILVA, 2010).

Com efeito, “algumas identidades são tão ‘normais’ que não precisam dizer de
si; enquanto outras se tomam ‘marcadas’ e, geralmente, não podem falar por si.”
(LOURO, 2000, p.64). Na nossa sociedade, temos, pois a heterossexualidade como
parâmetro para discriminar as identidades “desviantes”, ou seja, aquelas que não se
adequam nos rígidos binários de gênero. O pressuposto da “normalidade” diz que
uma pessoa que nasceu com um pênis (corpo) irá obrigatoriamente se sentir atraída
efetivo e/ou sexualmente por alguém do sexo oposto (identidade sexual) e
concomitantemente se comportar como homem (identidade de gênero) a partir do
que é definido por masculinidade.

No entanto as identidades de gênero independem dos cromossomos X e Y,


isto é, do sexo biológico. Parte, pois, de uma questão de auto percepção, de
construção e negociação. Grossi (1998) em “Identidade de Gênero e Sexualidade”
focaliza as pesquisas realizadas pelo psicólogo Robert Stoller (1978) com pessoas
que por imprecisão foram consideradas do gênero oposto ao sexo biológico,
destacando que “para ele, uma criança aprende a ser menino ou menina até os três
anos, momento de passagem pelo complexo de Édipo e pela aquisição da
linguagem” (GROSSI, 1998, p. 8). Nesse segmento, compreende-se que a
identidade de gênero de um indivíduo se constrói nas relações com “outro”, através
dos processos de aprendizagens que ocorrem desde a primeira infância se
22

constituindo como um núcleo de convicções em relação ao que se entende por


masculino e feminino (GROSSI, 1998).

As identidades de gênero servem-se, portanto, de relações socioculturais e


características construídas acerca do ser “masculino” e “feminino”. No que diz
Carvalho, Andrade e Junqueira (2009, p. 27) as identidades de gênero “dizem
respeito à identificação dos sujeitos com configurações de masculinidade ou de
feminilidade”. “masculinidades e feminidades como identidades performativas” (p.
24). Isso significa que são continuamente encenadas e ensaiadas nos contextos do
desenvolvimento infantil.”

Para o RCNEI (1998) o desenvolvimento da identidade da criança está


intrinsecamente relacionada a aquisição de confiança em si e o sentimento de
aceitação. Para o documento, o desenvolvimento da identidade e autonomia da
criança está estritamente relacionada a socialização e o contato com o “outro” pois
os processos de construções de identidades “dependem das interações
socioculturais e de outras experiências essenciais” (p. 15).

6. METODOLOGIA

A presente pesquisa tem por objetivo compreender como a escola, influencia


na construção de identidades e (re)produção de identidades de gênero em relação a
crianças da educação infantil. Para Louro (1997, p. 77) gênero refere-se “ao modo
como as diferenças sexuais são compreendidas numa dada sociedade, num
determinado grupo, em determinado contexto”, é por sua vez, um dispositivo cultural
constituído historicamente e articulado com que se entende por masculino e
feminino. Seu caráter construído pressupõe, portanto, aprendizagens que ocorrem
através de práticas e situações fornecidas por relações e instâncias sociais
(MEYER, 2013).

A escola como uma dessas instâncias, realiza constantes investimentos sobre


seus indivíduos a fim de imprimi-los a “normalidade”, visando garantir que estes
23

caibam nas “formas” de ser feminino e masculino através de seus corpos,


comportamentos, interesses, preferências, desejos (LOURO, 2008). É proposto, com
esta pesquisa, compreender como ocorre essa “produção” de sujeitos femininos e
masculinos no campo prático da escola, e de que forma as questões de gênero
atravessam o pedagógico da Cooperativa Educacional Nossa Escola.

Para tanto, pretende-se utilizar a abordagem qualitativa visto que a proposta


deste trabalho é compreender e explicar uma dinâmica das relações sociais
utilizando para tanto uma amostra pequena sem quantificar valores ou
representações simbólicas (GERHARDT, SILVEIRA, 2009). De acordo com Gerhardt
e Silveira (2009, p. 31) “a pesquisa qualitativa não se preocupa com
representatividade numérica, mas, sim, com o aprofundamento da compreensão de
um grupo social, de uma organização” por isso a escolha desta abordagem.

Para Minayo (2001) a pesquisa qualitativa se preocupa com o campo subjetivo


e simbólico dos fenômenos sociais trabalhando com o universo de significados que
não podem ser submetidos a quantificações. Essa abordagem nasce a partir dos
estudos na área da Antropologia e Sociologia sendo fortemente defendida na
década de 1970 em contraposição a concepção positivista que por sua vez se
baseia em dados quantitativos ignorando a relevância dos estados subjetivos
individuais (AUGUSTO et. al. 2013).

Ao discutir as características da pesquisa qualitativa Creswel (2007) aponta


para a relação estreita estabelecida entre pesquisador e objeto de estudo
destacando que na coleta de dados o ambiente natural é o campo de atuação do
pesquisador, pois assim este absorve mais detalhes e informações acerca do objeto
de investigação. Justificando, dessa forma, o locus desta pesquisa que se dará
propriamente no seu cenário natural, isto é, no campo prático da escola, buscando a
interação e envolvimento dos participantes na coleta de dados. Acerca disso,
Creswel (2007, p. 186) acrescenta que na pesquisa qualitativa “Os métodos de
coleta de dados estão crescendo e cada vez mais envolvem participação ativa dos
participantes e sensibilidade aos participantes do estudo”. No que diz Gerhardt e
Silveira (2009):

As características da pesquisa qualitativa são: objetivação do fenômeno;


hierarquização das ações de descrever, compreender, explicar, precisão
das relações entre o global e o local em determinado fenômeno;
24

observância das diferenças entre o mundo social e o mundo natural;


respeito ao caráter interativo entre os objetivos buscados pelos
investigadores, suas orientações teóricas e seus dados empíricos; busca de
resultados os mais fidedignos possíveis; oposição ao pressuposto que
defende um modelo único de pesquisa para todas as ciências.”
(GERHARDT, SILVEIRA, 2009, p.32)

Outro aspecto referente ao design desta pesquisa qualitativa e que se relaciona


diretamente com o objetivo proposto, refere-se à classificação da abordagem
descritiva na qual este trabalho se baseia por abordar um assunto já conhecido. De
acordo com Gil (2008 p. 28) “As pesquisas deste tipo têm como objetivo primordial a
descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o
estabelecimento de relações entre variáveis.” Essa abordagem é utilizada no sentido
de levantar informações e características acerca do problema definido e contribuir
para a percepção de novas perspectivas acerca dele (TRIVIÑOS, 2008; GIL, 2008)
estando, portanto, em consonância com a proposta desta pesquisa.

Além de observar e descrever as características das interações que se dão no


espaço escolar no que tange às relações de gênero, é proposto identificar e explicar
os fatores que determinam e influenciam na “fabricação” de sujeitos femininos e
masculinos bem as aprendizagens das normas de gênero. Nesse segmento, a
abordagem caminha também para a linha de pesquisa explicativa que de acordo
com Gil (2008) “[...] é o tipo de pesquisa que mais aprofunda o conhecimento da
realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas.” (p. 28).

Quanto ao procedimento de condução da pesquisa, esta será delineada na


perspectiva do método de estudo de caso que segundo Godoy (1995) é um dos
caminhos possíveis no estudo qualitativo, bastante utilizado e conhecido nessa
abordagem. Para Gil (2008, p. 57-58) “o estudo de caso é caracterizado pelo estudo
profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu
conhecimento amplo e detalhado”.

Nesse intento se pretende observar in loco como a escola Nossa Escola


influencia na construção da identidade de gênero e papéis de gênero de crianças na
idade pré-escolar a partir das relações pedagógicas entre professor-aluno e aluno-
aluno em seu contexto real utilizando para tanto uma amostra pequena de
participantes, sendo duas professoras da educação infantil e os alunos das suas
respectivas turmas. Yin (2001) destaca o uso da estratégia de estudo de caso
25

quando se pauta em questões referente à “como” e “por que” tal como o problema
desta pesquisa.

Portanto, a coleta de dados se dará no próprio contexto dos observados, isto é,


no cotidiano da escola durante a carga horária das turmas selecionadas, utilizando-
se para tanto o procedimento de observação participante. O registro dos dados de
observação se dará pelo uso de um protocolo observacional, com notas descritivas:
descrição do espaço físico, data, descrição dos participantes (professoras e alunos e
alunas), atividades dos participantes, relatos de eventos relacionados ao campo; e
notas reflexivas acerca de “especulação, sentimentos, problemas, ideias,
pressentimentos, impressões e preconceitos” (Bogdan e Biklen, 1992, p. 121, apud
Creswel, 2007, p. 194) articulados por mim enquanto pesquisadora.
Essa técnica inserida nas ciências sociais a partir dos estudos na área da
Antropologia “consiste na participação real do conhecimento na vida da comunidade,
do grupo ou de uma situação determinada” (GIL, 2008, p. 103). Malinowski imprimiu
seu nome na pesquisa participante por ser o precursor a imergir em vivência
contínua junto ao grupo étnico das ilhas Trobriand (SERVA, JAIME, 1995;
GERHARDT, SILVEIRA, 2009).
Dessa forma, pretende-se observar no cenário natural a relação estabelecida
entre professoras e alunos e alunas dentro da perspectiva das relações de poder
engendradas as questões de gênero em aspectos como linguagem, formas de
tratamento, brincadeiras, brinquedo e cotidiano de sala de aula, possibilitando
através dessa técnica “captar as palavras de esclarecimento que acompanham o
comportamento dos observados.” (FLORENCE KLUCKHON, 1946, p. 103-18, apud
GIL 2008, p. 104). Com efeito, assumir a posição dos observados visa adquirir
condições de observar e compreender seu comportamento, atitudes, falas, escolhas,
etc. Vale ressaltar que por não haver pertencimento a escola e/ou ao grupo
participante a observação proposta para esta pesquisa é de caráter natural (GIL,
2008).
O locus então será a Cooperativa Educacional Nossa Escola, um
estabelecimento de ensino da rede privada mantido pela Cooperativa Educacional
Nossa Escola Ltda fundada em 11 de agosto de 1992 com sede em Belém – Pará. A
instituição está situada na Trav. Castelo Branco nº 1758 bairro do Guamá. A Escola
oferta a Educação Infantil, Ensino Fundamental e médio nos turnos matutino e
26

vespertino. De acordo com o Projeto Político Pedagógico (PPP) de 2012, sua


finalidade centraliza-se na formação necessária para o exercício da cidadania a
partir do processo ensino-aprendizagem adequado a faixa etária dos educandos e
pautado nos princípios de igualdade, solidariedade, democracia, participação e
honestidade.

Os participantes serão duas professoras com atuação regular na educação


Infantil por mais de dois anos com formação em Pedagogia, bem como meninos e
meninas pertencentes às turmas das respectivas docentes. Para tanto, adota-se o
instrumento de entrevista semiestruturada voltada para as docentes a fim de se
coletar dados referentes às suas conceituações de gênero e sua prática pedagógica
no que tange às construções de feminino e masculino. O registro de dados da
entrevista se dará através de um protocolo de entrevista contendo instruções para o
aprofundamento das questões norteadoras e espaço para notas reflexivas bem
como por gravação em áudio (CRESWEL, 2007).
Das vantagens da entrevista pode-se argumentar a possibilidade de “captar a
expressão corporal do entrevistado, bem como a tonalidade de voz e ênfase nas
respostas” (GIL, 2008, p. 110) aspectos relevantes considerando que o tema desta
pesquisa discute questões que se relacionam ao corpo, gênero e identidade de
crianças pequenas, problematizando concepções social e historicamente
construídas acerca do “normal” e “natural”. Vale destacar ainda que esse
instrumento foi escolhido por considerar as docentes uma das fontes de informações
visando dessa forma diálogo assimétrico com elas acerca do que pensam,
acreditam, fazem/fizeram (GIL, 2008).
Após a coleta de dados através das técnicas e instrumentos já citados,
procede-se naturalmente na pesquisa qualitativa, a análise e interpretação do
material coletado. Sabe-se que a análise “[...] tem como objetivo organizar e
sumariar os dados de tal forma que possibilitem o fornecimento de respostas ao
problema proposto para investigação.” (GIL, 2008, p. 156). Nesse sentido visando
extrair sentido da coleta, recorre-se a técnica de Análise de Conteúdo por voltar-se
para “materiais textuais escritos” (BAUER, 2002, p. 195) obtidos nesta pesquisa pela
transcrição das entrevistas com as professoras da educação infantil bem como pelos
protocolos de observação do cotidiano do fazer pedagógico (Bauer 2002). Bardin
(1979) define a AC como:
27

Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por


procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas
mensagens (BARDIN, 1979, p. 42).

Com efeito, pretende-se organizar os dados em dimensões de categorias


através da redução, organização e contar a frequência dos fenômenos e procurando
estabelecer relações e identificá-los a modelos conceituais definidos a priori em
conceituação de gênero, questões de gênero engendradas a prática docente,
relação aluno-aluno a partir do gênero.

7. CRONOGRAMA

Atividades Dez. Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set Out Nov. Dez.
.

Reformulaçã X X
o do Projeto

Leitura da X X
bibliografia

Coleta de X X X X
dados no
campo

Análise dos X X X
dados

Elaboração X
do sumário
provisório

Revisão do X
texto

Revisão X X X
definitiva

Defesa X X X

8. CALENDÁRIO DE COLETA DE DADOS 2019


28

FEVEREIRO MARÇO

D S T Q Q S S D S T Q Q S S

1 2 1 2

3 4 5 6 7 8 9 3 4 5 6 7 8 9

10 11 12 13 14 15 16 10 11 12 13 14 15 16

17 18 19 20 21 22 23 17 18 19 20 21 22 23

24 25 26 27 28 24 25 26 27 28 29 30

31

Coleta de dados na escola Coleta de dados na escola

Feriados/Pontos facultativos

6 dias de coleta

4 dias de coleta

ABRIL MAIO

D S T Q Q S S D S T Q Q S S

1 2 3 4 5 6 1 2 3 4

7 8 9 10 11 12 13 5 6 7 8 9 10 11

14 15 16 17 18 19 20 12 13 14 15 16 17 18

21 22 23 24 25 26 27 19 20 21 22 23 24 25
29

28 29 30 26 27 28 29 30 31

Coleta de dados na escola Coleta de dados na escola

Feriados/Pontos facultativos Feriados/Pontos facultativos

Final de semestre IFPA

12 dias de coleta 12 dias de coleta

9. REFERÊNCIAS

AUGUSTO, Cleiciele Albuquerque et al. Pesquisa Qualitativa: rigor metodológico no


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10. APÊNDICE

TCC: CONSTRUÇÃO E (RE)PRODUÇÃO DE IDENTIDADES DE GÊNERO NA


EDUCAÇÃO INFANTIL.

1. ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PROFESSORA DO JARDIM I E II


33

2. Você acha que os professores devem tratar de forma diferente meninos e


meninas em sala de aula? Por quê?

3. É feita alguma separação dos objetos/brinquedos pelos meninos e meninas


na sua sala? Como?

4. O que é gênero para você?

5. Você acha que suas práticas influenciam na construção das identidades de


gênero das crianças?

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