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o impacto nas politicas educacionais

Sérgio Haddad (org .)


Akanksha A. Marphatia
Anne - Marie Ainger
Camilla Croso Silva
David Archer
Diego Azzi
~C.ORTEZ Marina Gonzalez
EDITORA Rachel Moussié
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ISBN 978-85-249-1354-9

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1~ educativa act!onaid
Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais
Sumário
Organização
Sérgio Haddad
Autoria Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
Camilla Croso Silva (org), Diego Azzi e Renato Bock (Banco Mundial em Foco); Camilla Croso Silva,
Marina Gonzalez e Yana Brugier (OMC em Foco); Akanksha A. Marphatia, Rachel Moussié, Anne-
Marie Ainger e David Archer (O FMI e o investimento no professorado) Introdução ............................................................ 7

Coordenação editorial
Denise Carreira (Programa Pesquisa em Políticas Educacionais da Ação Educativa) 1. Banco Mundial em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos
Assistente editorial países que integram a Iniciativa Via Rápida na América Latina . . . . 15
Fernanda Campagnucci
Tradução para o português
1. A concepção do Banco Mundial sobre Desenvolvimento e Educação ........... 1 tl ,;,-
~·.J

Augusto Calíl (texto FMI) 2. A atuação do Banco Mundial na Educação Básica do Brasil . . . . . . . . . . . . • . . . . . 29
Revisão 3. A Iniciativa Via Rápida na América Latina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... 54
Carmen Cacciacarro, Marina Gonzalez e Jandira Albuquerque de Queiroz Anexo 1 - Iniciativa Via Rápida na Guiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
Projeto gráfico Anexo 2 - Situação dos países que integram a Iniciativa Via Rápida na
SMM Design
América Latina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
Foto da capa
Marcello Vitorino/ Ação Educativa
Janeiro de 2008 li. OMC em foco: a comercialização da educação na
América Latina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
1. A educação no marco da OMC e do GATS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • . . . . . 89
2. Privatização e internacionalização do ensino superior na América Latina .•..... 106
3. Estudos de Caso ....................................................... 124
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Cãmara Brasileira do Livro, SP. Brasil)
Ili. Confrontando as contradições:
Banco Mundial, OMC e FMI : o impacto nas políticas educacionais. ·· São
Paulo : Cortez, 2008. o FMI e o investimento no professorado ......................... 145
Vários autores. 1. A importância da educação e do investimento nos professores ............... 147~. :..-··
Sérgio Haddad (org.)
2. Acertando o gasto com salários: necessidades de professores
Bibliografia.
ISBN 978-B5-249-1354-9 versus macroeconomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . • . ... . . 161
1.Banco Mundial 2. Educação e Estado 3. Fundo Monetário Internacional 4. 3. O impacto das politicas do FMI na educação ............................. 178
Organização Mundial do Comércio 5. Política e educação 1. Haddad, Sérgio.
4. O que precisa mudar? ................................................. 188
08-00012 CDD-379
· 5. Recomendações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201
Índices para catálogo sistemático:
1. Banco Mundial, OMC e FMI : Políticas educacionais: Educação 379
Abreviaturas e Siglas .............................................. 212
~-;ação
t~ educativa Gt§3J.J;M1SI Autores ............................................................. 214
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www.acaoeducativa.org.br www.actionaid.org.br
Apresentação

A Ação Educativa e a ActionAid têm a grande satisfação de apre-


sentar mais um fruto da parceria entre as duas organizações. Trabalho
sintonizado com nosso compromisso de contribuir para a ampliação,
a qualificação e a politização do debate sobre o papel dos organismos
financeiros multilaterais e de outras instituições internacionais nas po-
líticas educacionais.
O livro reúne estudos sobre o impacto da atuação do Banco Mundial,
da Organização Mundial do Comércio (OMC) e do Fundo Monetário In-
ternacional (FMI) nas políticas educacionais. Os dois primeiros, produ-
zidos respectivamente em 2005 e 2006 pela Ação Educativa, abordam as
realidades brasileira e latino-americana. O terceiro texto, desenvolvido
em 2007 pela ActionAid Internacional, discute o papel do FMI em três
países africanos: Malavi, Moçambique e Serra Leoa.
Entendemos que o conjunto dos três textos permite traçar um pa-
norama das principais características, problemas e desafios da atuação
dessas instituições nos países do Hemisfério Sul.
O primeiro ensaio, sobre o Banco Mundial, retoma a principal cons-
tatação do estudo realizado pela Ação Educativa em 1996: a grande in-
fluência da instituição no Brasil decorre menos do volume de recur-
sos financeiros mobilizados pelos projetos e mais pela influência junto
aos governos por meio da imposição de tc~máticas prioritárias e de uma
abordagem economicista das políticas educacionais.
A priorização do ensino fundamental, a desvalorização dos e das pro-
fissionais da educação, a responsabilizaç<io da comunidade escolar pela
captação de recursos e a apropriação do discurso da qualidade, da des-
centralização e da participação com conteúdos próprios e conflitantes são
algumas das questões abordadas no estudo. O trabalho também analisa a
Iniciativa Via Rápida (Fast Track) na América Latina e as condicionalida-
des impostas a três países do continente: Nicarágua, Honduras e Guiana.
O segundo texto foca atenção nas negociações do Acordo Geral de
Comércio de Serviços (GATS) da OMC. O GATS regulamenta a libera-
lização dos serviços internacionais, e a educação é um dos seus doze
setores em negociação. O estudo realiza dois movimentos: explica os

Apresentaçao 1 5
marcos de negociação do GATS no que se referem à educação, às ofertas
e aos interesses em disputa e busca contribuir para o monitoramento
da comercialização e da internacionalização da educação na América
Introdução
Latina e no Brasil. A última parte do ensaio traz uma série de estudos
de caso com informações e análises recentes sobre a presença do capital
estrangeiro no ensino superior privado no Brasil .e no continente.
A atuação do FMI em relação à limitação de gastos orçamentários
com o professorado é o tema central do terceiro estudo. Em 2oo5, a Ac-
tionAid internacional publicou dois relatórios sobre o papel do Fundo Depois da Segunda Guerra Mundial, as principais nações do mundo
no investimento de governos nacionais na educação, inclusive na con- decidiram organizar instituições internacionais que pudessem reger e dis-
tratação de professores.' A pesquisa destacou a contradição evidente en- ciplinar a atuação dos países por meio de acordos, tratados e políticas de
tre as restrições orçamentárias impostas pelo Fundo e a necessidade regulação e intervenção em diversos campos, como o econômico, o social,
urgente de mais professores colocada aos governos para que estes atin- o cultural e o ambiental.
jam as Metas de Desenvolvimento do Milênio (MDM) e os objetivos da No campo econômico, pela primeira vez, um sistema de regras públicas
Educação Para Todos (EPT). foi adotado para disciplinar as relações financeiras entre os diversos países
O terceiro estudo aqui publicado analisa de perto os gastos com do- por meio da atuação de instituições internacionais. Com esse propósito,
centes em três países: Malavi, Moçambique e Serra Leoa. Buscou-se em 1944, em Bretton Woods, Estados Unidos, foram criadas duas organiza-
compreender o papel do FMI na determinação direta (ou influência in- ções, o Banco Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI). O
direta por meio de medidas macroeconômicas mais amplas) do patamar primeiro com a finalidade de auxiliar na reconstrução e desenvolvimento
dos tetos salariais. A principal contribuição do trabalho é demonstrar dos países membros no período pós-guerra, o segundo, destinado a super-
com clareza a correlação existl'nte entre as políticas macroeconômicas visionar o sistema monetário internacional e garantir uma estabilidade do
e suas inevitáveis conseqüências sobre as políticas educacionais. sistema cambial. Tais instituições financeiras multilaterais (IFMs) passa-
Território "árido" mesmo para a maior parte da sociedade civil or- ram a operar de forma articulada no contexto da globalização econômica
ganizada, a atuação das instituições internacionais e seus impactos pre- internacional para o aprofundamento e a implementação de políticas que
cisam urgentemente ser mais bem compreendidos, debatidos e ques- favoreçam a reprodução do capital global.
tionados. Nesse sentido, com este livro, a Ação Educativa e a ActionAid A atuação nos primeiros anos do BM e do FMI foi complementada por
esperam contribuir para que mais movimentos sociais, organizações, uma série de negociações no campo do comércio internacional, voltadas
grupos de pesquisas, educadores, cidadãos e cidadãs se apropriem dessa prioritariamente para combater o protecionismo estabelecido pelas altas ta-
temática. Questão que exige novos e mais aprofundados estudos, além rifas por parte dos governos nacionais. Essas negociações foram conduzidas
do monitoramento .e do controle social permanentes. No cerne de toda por rodadas periódicas de acordos, tendo como base uma série de regras
a discussão, está a luta para fazer valer a concepção de educação como estabelecidas pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) em 1947.
bem público, como direito humano a ser garantido a todas e a todos. A última rodada de negociação (a rodada do Uruguai, de 1995) criou a Orga-
nização Mundial do Comércio (OMC), mais uma organização supranacional
cuja missão principal é dar continuidade aos acordos de comércio.
Segundo Farias, Quaresma e Miragaya, o FMI:

deixou de ser um organismo multilateral voltado para a defe-·


'MARPHATIA, A.; ARCHER, D. Contradizendo os compromissos: como a realização da educação para
sa da paridade cambial, o socorro aos paises com graves dese-
todos é posta em risco pelo Fundo Monetário Internacional. ActionAid Internacional, 2005 (disponí-
vel em www.actionaid.org/assets/pdf/contr;idicting_commitments4.pdf). ROWDEN, R. Mudando de quilíbrios externos e para a questão da liquidez internacional
rumo: propostas alternativas para atingir as metas de desenvolvimento do milênio e lutar contra e tornou-se uma agência do capital.financeiro, dos credores in-
o HIV/aids. ActionAid Internacional, 2005 (disponível em www.actionaidusa.org/pdf/changing0/o20 ternacionais e do tesouro norte-americano. Dedica-se a propor
course0/o20report.pdf).

6 J Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas pol1ticas educacionais Introdução 1 7


programas de ajuste estrutural aos países periféricos que com nas suas áreas de expertise, tais como gerenciamento da dívida,
ele jazem acordo e a recomendar políticas macroeconómicas seguridade social, reformas em outras áreas de despesas estru-
de inspiração invariavelmente recessivas, direcionadas para o turais e de gerenciamento de gastos públicos. Na austncia de
atendimento dos interesses estritamente corporativos dos ban- um tal programa, o Banco poderia desenvolver o seu próprio
cos e trustes e absolutamente incompatível com as necessidades trabalho macroeconómico (apud CASTRO, 2005).
de crescimento económico, a geração de emprego e a distribui-
ção de renda (FARIAS; QUARESMA; MIRAGAYA, 2003). Esta é a lógica que predomina: condicionalidades cruzadas entre as
diversas agências multilaterais de maneira que as ações de todas es-
Hoje, o FMI é o pilar do sistema financeiro internacional, atuando em tejam comprometidas com a mesma lógica de governança econômica
conjunto com o Banco Mundial e outras instituições congêneres, como o global, que, em geral, são coordenadas e dominadas pelos interesses dos
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O FMI é o grande mol- países mais fortes.
dador das políticas econômicas, enquanto as outras organizações se en- Desde sua criação até meados dos anos 1990, as IFMs ganharam em
carregam de pautar outras políticas públicas, de forma complementar e presença global e influíram de maneira significativa no contexto da eco-
coerente (CASTRO, 2005). nomia mundial. Há de se reconhecer, no entanto, que, nos últimos quin-
As ações coordenadas entre as diversas ações das IFMs e da OMC são ze anos, vozes de dentro dessas organizaçües, e principalmente de fora
conhecidas. Ao fechar um acordo com o FMI, os países tomadores de em- delas, no âmbito da sociedade civil mundial, passaram a exercer forte
préstimos são obrigados a assumir· uma série de responsabilidades, quase crítica à sua atuação e a denunciar os desastres de natureza econômica,
sempre por meio de acordos estabelecidos com pouca participação do par- social e ambiental produzidos por suas políticas. '
lamento de cada país e sem a presença de entidades da sociedade civil. Há Divididos entre a reforma dessas organizações e o encerramento das
pouca transparência e baixíssimo nível de informação. Uma vez realizado mesmas; tais movimentos acabaram por provocar mudanças internas
o acordo, os empréstimos advindos dos bancos de desenvolvimento para as em função da pressão e da exigência por maior transparência e controle
diversas áreas (educação, saúde, transporte, infraestrutura etc) seguem as social, ainda que bastante insuficientes. Também provocou atenção re-
linhas principais das condicionalidades estabelecidas em termos de refor- dobrada por parte dos governos e principalmente da sociedade de cada
mas econômicas, e quase sempre seus conteúdos são preponderantemente país, sobre os empréstimos e os acordos realizados junto a tais IFMs,
definidos pela lógica econômica. provocando tensões e debates sobre o sentido e os efeitos destes. 2
O artigo de David Archer e de outros pesquisadores da ActionAid In-
ternacional apresentado nesta coletânea é o exemplo típico do que aqui se As IFMs e a educação
afirma ao demonstrar como os acordos estabelecidos entre o FMI e os paí-
ses africanos estudados condicionam o desenvolvimento do sistema educa- O tema da relação dos organismos multilaterais com a educação não
tivo desses países, em particular pela limitação dos gastos com os salários é novo para a sociedade brasileira, para o mundo acadêmico, para as
dos professores. organizações da sociedade civil e para os movimentos sociais. Ele ganha
Para o caso brasileiro, por exemplo, quando da divulgação da estratégia relevância no contexto das análises sobre os efeitos dos processos de
para o Brasil do Banco Mundial para 2004-2007, conhecido como Country globalização econômica recentes e as conseqüentes políticas nacionais
Assistance Strategy (CAS), o parágrafo 139 grafava: de ajustes a esse contexto global, particularmente nos países mais po-
bres, onde os organismos multilaterais têm um papel fundamental.
O principal objetivo do apoio do Banco para assegurar a esta- No caso do Banco Mundial, a cooperaçiio técnica e financeira com o
bilidade macroeconómica é a redução de vulnerabilidade por Brasil teve seu início na primeira metade da década de 1970, e sua presença
meio de gerenciamento eficaz da dívida e de uma estrutura mais
robusta para a políticafzscal, orientada para obter a maior ren-
tabilidade dos investidores. Enquanto o Brasilfor apoiado por 'Sobre a temática, ver Leite, 2003
um programa do FMI, o banco complementará este programa 2 Para o caso brasileiro, ver a atuação da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Internacionais
www.rbrasil.org.br e Rede Brasileira de Integração dos Povos www.rebrip.org.br.

R1 R::inrn Mnnrli~l nMr P FMI· n imn;:irtn n;:i~ nnlítir;p;, Pri11r;:irinn;:ii<; Introdução 19


foi marcada pelas diversas dinâmicas produzidas por seus empréstimos e O Banco Mundial estdfortemente comprometido em sustentar
sua influência política. Em 19D6, já se discutia o papel estratégico do Banco o apoio à educação. Entretanto, embora .financie na atuali-
Mundial ao influenciar as políticas educacionais naquele momento con- dade aproximadamente uma quarta parte da ajuda para a
juntural em que as políticas neoliberais no Brasil ganhavam fólego 3• educação, seus eeforços representam somente cerca de 0,5% do
Dois aspectos mereceram destaque: "A prevalência da lógica financeira total das despesas com educação nos palses em desenvolvimen-
sobre a lógica social e educadonal e a falácia de políticas que declaram to. Por isso, a contribuição mais importante do Banco Mun-
o objetivo de elevação da qualidade de ensino enquanto implementam a dial deve ser seu trabalho de assessoria, concebido para ajudar
redução dos gastos públicos para a educação e se mantêm indiferentes à os governos ·a desenvolver políticas educativas adequadas às
carreira e ao salário do magislério" (Tomassi, Warde e Haddad, 2007). Pas- especificidades de seus palses. O financiamento do Banco, em
sados mais de dez anos, essas mesmas questões se colocam nos artigos des- geral, serd delineado com vistas a influir sobre as mudanças
ta coletânea ao identificar como instituições de natureza econômica, como nas despesas e nas políticas das autoridades nacionais (Banco
as IFMs e a OMC, ao influírem sobre aspectos sociais, o fazem sob o olhar Mundial, 1995).
da sua própria lógica econômica e a partir dos interesses de reprodução do
grande capital internacional. Os mecanismos de influência do BM chegavam às orientações das políti-
Os países do sul foram pressionados, por meio dos acordos de emprés- cas educacionais sempre em complementaridade às orientações macroeco-
timos, para reformas orientadas pelas IFMs que produziram mais desem- nômicas estabelecidas pelo Brasil nos seus acordos com o FMI. Assim, por
prego, menos direitos sociais, maior desregulamentação das economias, exemplo, enquanto as orientações macroeconômicas determinavam os cor-
ações voltadas ao incremento dos processos de globalização financeira e o tes de despesas e os ajustes estruturais, as orientações do BM na educação,
crescimento do comércio internacional. Coraggio nos alertava para o do- para ser coerentes, focalizavam os recursos no ensino fundamental, preocu-
mínio do pensamento econômico no campo das políticas sociais e de como pavam-se mais com a eficácia do sistema do que com o aumento dos gastos,
o tema do desenvolvimento l'oi gradativamente limitado ao ponto de vista operando sob a lógica do custo-beneficio. Apostaram na idéia de ampliar o
do crescimento econômico e não do desenvolvimento humano. Assim, os atendimento com o mesmo volume de recursos. O resultado, anos depois, foi
direitos universais, aqueles rt,conhecidos como direitos humanos, são re- a terrível queda na qualidade do ensino oferecido pelo setor público.
duzidos aos direitos possíveis numa sociedade marcada pelo ajuste fiscal e Desse modo, ficava claro o interesse em fazer da reforma educacional
por sua lógica de alinhamenlo econômico (Coraggio, 2007). um braço das reformas mais gerais do Estado na lógica neoliberal. O que
Os intelectuais também prestaram e prestam um papel relevante ao pode ser verificado nas orientações da reforma educativa ocorrida nos anos
BM. O banco mantém um quadro de pesquisadores para as diversas áre- 1990 no Brasil, não só pela focalização dos gastos sociais, mas também
as do conhecimento, na sua p.rande maioria economistas. Tais intelectuais pela descentralização (municipalização) e pela privatização, que no caso
cumprem o papel de tornar universais orientações e resultados produzidos brasileiro se traduzia na criação de um mercado de consumo de serviços
por suas investigações locais. independente das suas condições históricas, educacionais, particularmente no ensino superior. Apoiava-se ainda em
do nível de desenvolvimento adquirido e dos recursos disponíveis para tal. sistemas de avaliação centralizados, assim como em propostas curricula-
Conforme Rosa Maria Torres. essas orientações vão sendo universalizadas res nacionais que deveriam orientar a atuação de todo o sistema. Com esses
como receituário único, e assistimos à naturalização dos significados des- dois instrumentos (avaliação e currículo), o governo central apostava que
sas reformas para vários países do Terceiro Mundo: descentralização da a lógica do jogo de mercado poderia fazer com que a população buscasse
capacitação dos professores em serviço, livros didáticos, guias curriculares, as escolas mais bem avaliadas para os seus filhos, pressionando todo o sis-
educação a distància, prioridade ao ensino primário, assistencialismo ou tema para uma melhoria da qualidade. No entanto, essa hipótese também
privatização dos demais níveis de ensino (Torres, 2007). não se confirmou.
O esforço de influência dos bancos ia além do financiamento de projetos Não podemos negar, de outro lado, que os empréstimos, apesar do pe-
(cujo valor era pequeno frenle aos dispêndios realizados) mas se concen- queno valor diante do volume de despesas, eram recebidos de muito bom
travam principalmente nas orientações de políticas. grado, mesmo com as condicionalidades impostas, uma vez que os orça-
mentos públicos estavam quase todos voltados ao pagamento de pessoal.
'ver TOMMASI, WARDE, HADDAD, 5' ed, 2007

1O1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto r as políticas educacionais Introdução 1 11


Os recursos das IFMs chegavam para as despesas de gestão, a construção e possibilidade da participação de estrangeiros nesse setor (Dallari, 2003),
os livros didáticos, permitindo ao gestor público a manutenção dos recur- confrontando com o espírito da OMC, em que os serviços são considerados
sos de investimento, daí sua importância. uma mercadoria.
A forma como a relação entre as orientações dos organismos interna- Até o momento, o governo brasileiro vem mantendo a educação fora
cionais e o governo brasileiro vem se dando, não é isenta de contradições. das suas ofertas de produtos a serem comercializados na OMC. Em estudo
Parece evidente, no entanto, que quanto mais próximos são os governantes ~xploratório anterior, a Ação Educativa discutiu o estado da privatização
das políticas gerais que conformam o atual contexto de desenvolvimento da educação no Brasil, bem como as políticas e regras criadas pelo governo
do capitalismo internacional, mais facilmente os acordos são concretizados brasileiro referentes às negociações comerciais internacionais e à partici-
e os portifólios cumpridos. pação do capital estrangeiro neste setor5• Nesse sentido, o estudo "A OMC
Vale a pena verificar o quanto das matrizes utilizadas pelo modelo BM, em foco" publicado neste livro atualiza o debate sobre a temática.
por exemplo, no caso do Fundescola,4 tem sido inspirador das reformas
educacionais no atual governo Lula, em especial no caso do Plano de De- Sérgio Haddad
senvolvimento da Educação (PDE), e qual o seu impacto na garantia do
direito humano à educação.

Educação e OMC

O BM, o FMI e a OMC têm procurado desenvolver políticas mutuamente


complementares, nas quais o impacto da liberação comercial é fator impor-
tante na estratégia global do capital internacional. As formas de cooperação
são objeto do documento "Coerência nas políticas econômicas globais e
a cooperação entre a OMC, o FMI e o BM", publicado pela OMC em 2004
( apud Castro, 2005).
O setor de serviços é um dos setores de interesse da Organização Mun-
dial do Comércio; nele, a educação é um dos serviços disponibilizados para
fins de comercialização internacional e diminuição de barreiras.
O ensino privado é um mercado crescente no setor de serviços, crescen-
te e rentável. No mundo inteiro, os interesses privados sobre esse bem pú-
blico vêm ocupando espaço, pressionando legislações nacionais e interna-
cionais, ampliando o mercado em cada país e no contexto internacional.
O domínio do conhecimento nos novos processos produtivos e nas ocu-
pações do mercado de trabalho é um valor crescente. A produção e a circu-
lação de conhecimentos se multiplicam de maneira assustadora. Tudo isso
promove o maior interesse nos sistemas educativos formais e não formais,
bem como na sua comercialização.
A educação escolar é um bem público e um direito humano. É fatores-
sencial para a constituição e o desenvolvimento de uma sociedade e para a
constituição de uma nação. No caso brasileiro, a educação, mesmo quando
ofertada pela iniciativa privada, é considerada uma atividade de natureza
pública, portanto, delegada pelo Estado, o que, em principio, eliminaria a

•ver estudo sobre o Fundescola em artigo neste volume. •ver HADDAD e GRACIANO, 2004.

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Bibliografia:

CASTRO, M. C. (org.). A sociedade civil e o monitoramento das institui-


çõesjinanceiras multilaterais. Brasília: Rede Brasil, 2005
CORAGGIO, J. L. Propostas elo Banco Mundial para a educação: sentido
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DALLARI, D. de A. A Alca 1· o comércio de serviços. São Paulo, janeiro
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TOMAS!, L.;WARDE, M. .J.; 1!ADDAD, S. (orgs.). O Banco Mundial e as
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TORRES, R. M. Melhorar a qualidade da Educação Básica? As estraté-
gias do Banco Mundial. ln: O !Junco Mundial e as Política Educacionais. 5.
ed. São Paulo: Cortez, 2007.

14 \ Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais


1. A concepção do
Banco Mundial sobre
desenvolvimento e educação 1

A evolução das políticas do Banco Mundial

undado na conferência de Bretton Woods em 1944, após o término da

·F Segunda Guerra Mundial, o Grupo Banco Mundial é hoje composto por


um conjunto de organismos, dentre os quais o principal é o BIRD (Ban-
co Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento), que abrange cinco
outras agências: a IDA (Associação Internacional de Desenvolvimento), a IFC
(Cooperação Financeira Internacional), o ICSIIJ (Centro Internacional para
Resolução de Disputas sobre Investimentos), a MIGA (Agência de Garantia de
Investimentos Multilaterais) e o GEF (Fundo Mundial para o Meio Ambiente).
A influência nas decisões e votações do Banco segue o modelo do "um
dólar, um voto", ou seja, o peso de cada um dos seus cerca de 190 países-
membros é proporcional à sua contribuição orçamentária ao Banco.
Na sua origem, o Banco exerceu um papel de reconstrutor das econo-
mias devastadas pela guerra e de credor para empresas do setor privado.
Contudo, essa foi a sua função central apenas por um breve período. Com a
emergência das tensões com a União Soviética c a escalada da Guerra Fria,
a década de 1950 marcou uma reorientação das políticas do Banco na dire-
ção da incorporação dos países de Terceiro Mundo ao bloco ocidental não
comunista, por meio da criação de programas de assistência econômica e
de empréstimos crescentes.
De meados da década de 1950 até o inicio dos anos 1970, o perfil de 70%
dos programas de empréstimo do Banco era voltado às políticas de indus-
trialização dos países do Terceiro Mundo, visando sua inserção, ainda que
subordinada, no sistema comercial internacional. A tese central que regia
essa orientação era a de que a pobreza desapareceria como conseqüência
do crescimento econômico desses países.
Diante do fato de que, mesmo apesar de duas décadas de crescimento
econômico continuado, a pobreza não apenas persistiu, como também se

'A elaboração deste texto foi coordenada por Camilla Croso; edição de Camila Croso e Vera Masagão;
apoio à pesquisa de Carolina Gil e revisão de Carmem Cacciacarro. Os autores agradecem a colabo-
ração de Marina Gonzalez.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na Amêrica latina 1 17
aprofundaram as desigualdades enlre países ricos e pobres, o Banco se viu gramas de reformas das pollticas públicas, como também im-
obrigado a ampliar o leque de setores nos quais deveria investir, incluin- plementa esses programas usando redes de gerenciamento de
do aí principalmente invcslinwnlos na agricultura e nos setores sociais, projetos que funcionam de forma mais ou menos paralela à
para além dos projetos de infraestrutura e industrialização já existentes. administração pública oficial do Estado brasileiro. Trata-se
É a partir do decênio 1970-80 que se acentua, no discurso do Banco, uma da chamada "assistt!ncia técnica".5
preocupação mais recorrente <·nm a questão da pobreza. 2
A década de 1980 consistiu l'IIl um período importante de reorientação O período posterior à segunda metade dos anos 1990 constitui uma se-
do papel e das políticas tanto do Banco Mundial quanto dos demais organis- gunda fase de reformas, que envolve essencialmente o aprofundamento
mos multilaterais de financiam\'nlo, como o Fundo Monetário Internacional das políticas de abertura comercial, desregulamentação e privatização ini-
(FMI). A crise de endividamento dos países do Terceiro Mundo - principal- ciadas nos anos 1980. Aí estão as recomendações de flexibilização do mer-
mente com credores privados-. na qual a América Latina esteve no centro, cado de trabalho e alteração da legislação trabalhista e previdenciária (no
propiciou o contexto político f'm orável para que o Banco assumisse um pa- caso brasileiro, executada pelo governo Lula no ano de 2004), bem como de
pel central na renegociação e garantia dos pagamentos das dívidas externas, reforma do sistema educacional.
na reestruturação e abertura das economias dos devedores e na instituição Em 16 de março de 2005, a indicação, pelo presidente dos Estados Uni-
de condicionalidades para a oblt~nção de novos financiamentos. dos George Bush, do conservador Paul Wolfowitz para a presidência do
É claro que o processo de implantação dessa nova orientação políti- Banco Mundial encerra a era James Wolfensohn, um ex-banqueiro que
ca não se consolidou simultaneamente cm lodos os países, estendendo-se, esteve à frente desse órgão financeiro durante dez anos, com um discurso
como no caso brasileiro, alé l9!l5. Tal orientação corresponde ao conjunto de combate à pobreza e ganho na eficiência dos empréstimos. Em nota de
ele reformas consensuais entre os principais organismos multilaterais se- repúdio a essa nomeação, a Rede Brasil afirma que a nova direção prova-
diados em Washington, a partir do final dos anos 1980, conhecido como velmente fortalecerá ainda mais o caráter não-democrático e não-transpa-
Consenso de Washington. rente de operacionalização do Banco Mundial, sua resistência ao multilate-
O importante a se ressaltar!- o papel central elas condicionalidades cru- ralismo e à participação da sociedade civil. Ainda segundo essa fonte, sob
zadas como ferramentas para a consecução do ajuste estrutural às econo- a administração Wolfowitz, um dos principais estrategistas da guerra do
mias endividadas do Terceiro l\ l undo. Tais condicionalidades entrecruzam Iraque, é bem possível que haja uma maior integração entre as políticas de
exigências vinculadas aos proj<'los específicos em negociação com o Banco empréstimo do Banco e as prioridades bélicas e militares dos Estados Uni-
a outras referentes aos programas de ajuste estrutural, que podem até mes- dos; a tónica do discurso de Wolfowitz deve ser a construção de políticas
mo atingir as políticas internas dos países e provocar mudanças na sua que vinculem democracia e segurança." O Banco passa a ser, de maneira
legislação'. Como destaca Man·11s Faro, secretário executivo ela Rede Brasil sem precedentes, um braço da política externa norte-americana, mais do
sobre Instituições Financeiras i\l ultilaterais 4 : que um organismo pluralista. 7
No que concerne às políticas educacionais do Banco, está atualmente
O impacto do Banco Mundial sobre as políticas públicas é em curso um processo rigoroso de avaliação da eficácia de seus inves-
imenso. É espantoso qu1· a maior parte da opinião pública timentos em educação primária desde 1990. Um comitê, supostamente
no Brasil não tenha claffza a esse respeito. O Banco não so- autónomo, constituído pelo Banco, do qual faz parte o ex-ministro da
mente formula condicionalidades que são verdadeiros pro- educação do Brasil, Paulo Renato Souza, está encarregado de analisar
'SOARES, Maria Clara. Banco Mundial: políticas e reformas. ln:TOMMASI, L De; WARDE,J. M.; HADDAD, a eficácia dos projetos em educação financiados por essa instituição,
S. (Orgs.). O Banco Mundial e as Politicas Educacionais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP, que somam mais de dez bilhões de dólares. Pára David Archer, diretor
1996. pp. 15-40. internacional para educação da ActionAid e também membro do comitê,
' SOARES, Maria Clara. op. cit.. 1996.
' Este estudo utilizará o nome Rede Brasil para referir-se à Rede Brasil sobre Instituições Financeiras 5
Entrevista da Ação Educativa com Marcus Faro. Por Diego Azzi, março de 2005.
Multilaterais.ARedeBrasilreúne64organiz;1çõesfiliadas,comoobjetivocomumdeacompanhareintervir
• Nota de repúdio da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais à indicação de Wolfowitz
em questões relativas às ações de instituições financeiras multilaterais - IFMs- no Brasil, como o Grupo
para presidir o Banco Mundial. Brasília, 17 de março de 2005. Disponível em www.rbrasil.org.br.
Banco Mundia l,o Banco 1nteramericanodeDesenvolvimento-BIDeoFundo Monetáriolnternacional-FMI. 7 Para uma visão européia da indicação de Wolfowitz, ver: The Economist. The World Bank:Wolfatthedoor.
(Fonte: www.rbrasil.org.br - Histórico).
19 a 25 de março de 2005.

18 J Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto na•, politicas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina J 19
a avaliação do impacto do.Banco Mundial sobre a educação não pode se acordo, tanto pelo Banco quanto pelo FMI. [Isto é],( ... ) apesar de o Banco e
ater apenas aos projetos educacionais isoladamente: o Fundo desempenharem papéis diferentes, não se pode ter um sem ter o
outro. ( ... ) Estudos já estipularam que os projetos financiados pelo Banco
Para avaliar o impacto do Banco Mundial sobre a educação Mundial trazem uma média de 114 condicionalidades, se forem computa-
não se pode olhar apenas para o quanto o Banco tem gasto das as do FMI que são automaticamente vinculadas a eles". 12
(. ..), pois o Banco financia pequenos projetos aqui e al~ mas o As formas de cooperação envolvem o desenvolvimento de programas
grande impacto sobre a educação se dá a partir das políticas e modalidades de articulação entre esses orµ;anismos, bem como critérios
macroeconómicas que ele tem apoiado junto ao FMI 8 e atividades que promovam o apoio das políticas "financeiras" do FMI e
do Banco às políticas "comerciais" da OMC, visando sempre à liberaliza-
A integração das políticas do Banco com a de outros ção' do comércio de bens e serviços, dentre os quais está a educação. Ain-
da a esse respeito, merece consideração o fato de que os três organismos
organismos multilaterais
apóiam as "Metas de Desenvolvimento do Milênio" (MDM) adotadas pela
Organização das Nações Unidas (ONU) em Junho de 2000, através de reco-
A integração das políticas do Banco Mundial com as do FMI - in-
mendações e condicionalidades afinadas com as mesmas 13 • No que tange
clusive consolidada pela obrigatoriedade de que os países-membros do
à educação, estas metas são bastante reducionistas quando comparadas às
Banco sejam também membros do FMI - já vem sendo problematizada
metas estabelecidas pela Cúpula Mundial de Educação para Todos, ocorri-
por alguns atores da sociedade civil. No entanto, merece atenção um
da meses antes em Dacar, no Senegal, como se verá mais adiante.
processo mais recente em curso: a aproximação de ambos os organis-
A convergência de iniciativas e orientações desses três organismos não
mos à Organização Mundial do Comércio (OMC). Países como o Brasil,
resultam, entretanto, numa articulação efetiva, chegando até a produzir
que têm se esforçado para endurecer as negociações no âmbito da OMC,
incoerências que, no limite, inviabilizam o cumprimento de metas e con-
passarão a receber cada vez mais pressões do FMI e do Banco para que
dicionalidades. Um bom exemplo a esse respeito é apontado por David Ar-
aprofundem a liberalização comercial, à medida que esta se imponha
cher ao comentar que as metas de inflação exigidas em acordos com o FMI
como condição para se receber novos empréstimos. 9 Já há recomenda-
inviabilizam o aumento dos investimentos públicos em educação uma vez
ções explicitas do Banco nessa direção:
que estes, supostamente, elevariam os índices inflacionários. Pondera, no
entanto, que os Ministros da Fazenda de cada país são também co-respon-
Garantir um resultado preciso, bem-sucedido e pró-desenvolvi-
sáveis por essa situação:
mento da Rodada Doha é critico para o crescimento mundial e
para as perspectivas económicas dos países em desenvolvimen-
Algumas vezes é uma política explícita do FMI, mas em outras é
to. (. ..) Enfatizamos a importdncia dos eeforços de liberaliza-
o Ministro da Fazenda que acredita tanto nos mandamentos do
ção efacilitação comercial nos países em desenvolvimento. 1º
FMI que realmente bloqueia, de umaforrna ou de outra, o aumen-
to no gasto com educação, saúde e outri is gastos sociais (..). 14
Essa cooperação crescente amplia a abrangência das políticas do Ban-
co, gerando condicionalidades cruzadas que subjugam ainda mais os pa-
Certamente, as incoerências entre condicionalidades e metas impostas
íses que têm relações com esses organismos. 11 Segundo a Oxfam, "todos
pelo Banco Mundial e o FMI resultam de uma contradição central entre o
os países que assinam empréstimos do Banco automaticamente recebem
discurso que prioriza o combate à pobreza e o alinhamento efetivo às polí-
um requerimento de que aceitem cada condicionalidade vinculada àquele
ticas de ajuste estrutural, que têm um carátl'r essencialmente excludente.' 5
• Entrevista da Ação Educativa com David Archer. Por Carolina Gil, fevereiro de 2005. Em 1999, o então economista-chefe do Banco, Joseph Stiglitz, foi afastado
• Informe Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, nº 21. op. cit., 2004.
'ºBanco Mundial. Deve/opment Committee Communique. Washington: abril de 2004. 12 MCCALLION, John. Overview of World Bank. ln: Comunidad E-Ducativa, http://www.fronesis.org/
"Informe Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, n' 21. FMI eBanco Mundial promovem prolat.htm. Glasgow: Oxfam.
alibera/izaçãoComercia/.AnálisedodocumentoWT[TF/COH/S/9-CoherenceinGlobalPolicyMakingand "Informe Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, n' 21. op. cit., 2004.
Cooperation between theWTO, the IMFand the World Bank. Brasília, 23 de outubro de 2004. Disponível em 14
Entrevista da Ação Educativa com David Archer. op. cit., 2005.
www.rbrasil.org.br. " SOARES, Maria Clara. op. cit., 1996.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paiscs que integram a IVR na Amêrica Latina 1 21
de seu cargo em conseqüência das críticas incisivas que fez durante a se- Quadro 1
gunda metade dos anos 1990 contra as políticas de ajuste recomendadas Comparação das metas do milênio relalivas à educação e as melas
para os países em desenvolviml'nto, sob o argumento de que elas pressupu- de Dacar
nham que a simples ação das empresas privadas e das forças do mercado
seria capaz de solucionar os problemas sociais. 16 '. Metas de Dacar
Metas do Milênio
Expandir e melhorar o cuidado e a educação
O Banco Mundial e as reformas educacionais: da criança pequena, especialmente para as
crianças mais vulnerâveis e em maior
a mercantilização de um direito
desvantagem.

A educação foi reafirmada t·omo direito pela Conferência Mundial de


Educação para Todos (ocorrida na Tailândia, em Jomtien, em 1990) e pela
Cúpula Mundial de Educação para Todos (ocorrida no Senegal, em Dacar, Garantir que até 2015 todas as crianças, de Assegurar que todas as crianças, com ênfase
em 2000), ambas promovidas por Unesco, Unicef, PNUD e Banco Mundial. ambos os sexos, terminem um ciclo completo especial nas meninas e nas crianças em
de ensino primário. circunstâncias difíceis e pertencentes a
As metas de Jomtien e de Dacar são abrangentes, abordando o conjunto da
minorias étnicas, tenham acesso à educação
educação básica, incluindo a educação de jovens e adultos, a questão de primária, obrigatória, gratuita e de boa
gênero e a dimens<io da qualidade. qualidade até o ano de 2015
Apesar de a Unesco (Organiwção das Nações Unidas para a Educação,
a Ciência e a Cultura) ser por excelência a principal instituição multilateral Assegurar que as necessidades de
responsável pela implementaçüo da estralégia de Educação para Todos, o aprendizagem de todos os jovens e <ldultos
sejam atendidas pelo acesso equitativo à
Banco Mundial vem tendo um papel mais determinante, trazendo refle-
educação básica e continuada para todos os
xos consideráveis para o modo como a cooperação internacional concebe adultos.
a educação e nos projelos apoiados.17 Mesmo sendo signatário de ambas
conferências, o Banco Mundial vem insistindo na priorização do ensino
primário - correspondente às st'·l'ies iniciais do ensino fundamental - e im- Alcançar uma melhoria de 50% nos níveis de
alfabetização de adultos até 2015,
plementando estratégias de açüo com um marco de referência alternativo
especialmente para as mulheres, e acesso
ao das duas cúpulas internacionais de educação, noladamente as Metas de equitativo à educação básica e continuada
Desenvolvimento do Milênio, muito mais restritivas. Das 18 MDMs, apenas para todos os adultos.
duas se referem à educação, focadas na universalização da educação pri-
mária - restrito ao primeiro cido do ensino fundamental - e na eqüidade
Eliminar a disparidade entre os sexos no Eliminar disparidades de gênero na educação
de gênero, como demonstrado 110 quadro ao lado:
ensino primário e secundário, se possível até primária e secundária até 2005 e alcançar a
2005, e em todos os níveis de ensino, a mais igualdade de gênero na educação até 2015,
tardar até 2015 com enfoque na garantia ao acesso e ao
desempenho pleno e equitativo de meninas
na educação básica de boa qualidade.

Melhorar todos os aspectos da qualidade da


educação e assegurar excelência para todos,
de forma a garantir resultados reconhecidos e
mensuráveis, especialmente na alfabetização.
matemática e habilidades essenciais à vida.
" FIORI, José Luis. O 'pós-consenso de Washington'. ln: 60 lições dos 90: uma década de
neoliberalismo. São Paulo: Record, 2001, pp. 89-90.
18
La Jornada. México, 23/11/2002, p. 24.

22 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas uoliticas educacionais SM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 23
Foram as MDM e não as metas de Dacar a referência adotada pela Ini- Coraggio, além do cálculo das relações financeiras de custo-benefício, o
ciativa Via Rápida (IVR), mecanismo de financiamento da cooperação inter- instrumental economicista de abordagem dn educação implica, em última
nacional para a área educacional, encabeçada pelo Banco Mundial, que se análise, a gradual introjeção e institucionalização de valores da esfera do
constituiu como a principal ação concreta efetivada no contexto pós-Dacar. mercado no âmbito da educação e da cultura educacional.2 2 Isso se pode
A IVR - como veremos de forma aprofundada na última parte deste ensaio observar como diretriz em documentos do próprio Banco:
- está focada na educação primária e contém uma série de parâmetros
bastante polêmicos, como a recomendação de um teto para o salário de O Banco fortalecerá o apoio a reformas multissetoriais, espe-
professores. No documento de avaliação da Educação para Todos, Plano cialmente aquelas relativas à entrega de serviços (service de-
de ação para acelerar o progresso rumo à educação para todos, o Banco livery). O Banco desenvolve estratégius de assistência na im-
Mundial recomenda a IVR para "superar as dificuldades apresentadas até plementação de reformas relativas à l"ducação e às ta::i·as dos
o momento", sendo necessário "que seja implementado pelos países um usuários (education and userfees). 2 ;
quadro de ações orientadas por resultados", 18 analisados a partir de uma
visão econômica. Oficialmente, o Banco se posiciona contra a cobrança de taxas de ma-
Na mesma perspectiva, durante as últimas décadas o Banco Mundial vem trícula e mensalidades nas escolas de nível prinuírio, particularmente para
recomendando um pacote de reformas educativas para os mais variados alunos pobres, sob o argumento de que reconhece que essas taxas são um
países, 19 que contém, dentre outros, os seguintes elementos centrais:2º impeditivo à malTícula de muitos alunos, especialmente nos países em de-
senvolvimento e naqueles considerados Países Pobres Allamcnte Endivi-
a) Prioridade na educação primária. dados (HIPC, no inglês, critério cunhado pelo FMI e pelo BM). Mas salienta
b) Melhoria da eficácia da educação. que, a fim de zelar pela qualidade no ensino primário, elas não devem ser
c) Ênfase nos aspectos administrativos. retiradas sem que se vislumbre uma l"onle allernaliva que as substitua. Cita,
d) Descentralização e autonomia das instituições escolares, entendida como exemplo de possível saída, que os inY<'Stimentos no ensino superior
como transferência de responsabilidades de gestão e de captação de possam ser transferidos à educação primúria, bem como a porcentagem
financiamento, enquanto ao Estado caberia manter centralizadas as gasta com salários de professores possa ser definida a partir de um teto. 2·1
funções de fixar padrões, facilitar os insumos que influenciam o ren- Similarmente, o Tendências do setor privado em desenvolvimento nos
dimento escolar, adotar estratégias flexíveis para a aquisição e uso de projetos de educação do Banco Mundial foz 11 ma análise das oportunidades
tais insumos e monitorar o desempenho escolar. do mercado educacional para investidores privados e explicita:"( ... ) forta-
e) A análise econômica como critério dominante na definição das es- lecer o papel do setor privado ao longo do l<~mpo nos níveis não obrigató-
tratégias. rios da educação liberará recursos públicos para serem utilizados no nível
compulsório, primário". 25 Em outro docmrn~nto salienta que este nível da
A análise econômica mencionada no último item constitui, segundo educação deve ser destinado aos cuidados do setor público, mesmo que
o Banco Mundial, a metodologia principal para a definição das políticas através do incentivo aos programas de educação a distància/" enquanto os
educacionais, sendo portanto "(...) um instrumento de diagnóstico para demais devem ser gradualmente transferidos à iniciativa privada, 27 uma
começar o processo de estabelecer prioridades (...)". 21 Segundo José Luís vez que são voltados para atender apenas ú.s elites. 28

18
Banco Mundial. Education for Dynamic Economies: Action Plan to Accelerote Progress Towards
Education For AI/ (EFAt Prepared by the Word Bank Staff for the Spring Development Committee
22 CORAGIO, José Luis. op. cit., 1996.
Meeting. 2002.
19
KRUPPA, Sonia Maria Portella. O Banco Mundial e os Políticas Públicas de Educação nos anos 90. " Banco Mundial. Education for Dynomic Economies. op. cit.. 2002. pp. 21.
São Paulo: FEUSP, s.d., mimeo. 15 p. "Banco Mundial. User Fees in Primory Educotion. p. 23, julho 2004.
'º ALTMAN, Helena. lnfluences of the World Bank on the Brazilian education project. Educ. Pesqui.,
25 Banco Mundial. Trends in Private Sector Developmrnt. ln: World Bank Education Projects.

26 Banco Mundial. Education for Dynamic Economies. op. c1t .. p. 22. 2002.
Jan./June 2002, v. 28, n· 1, pp. 77-89.
27 KRUPPA, Sonia Maria Portella. op. cit., s. d.
"Banco Mundial, 1995. ln: CORRAGIO, José Luis. Propostas do Banco Mundial para a educação: sentido
oculto ou problemas de concepção? ln: TOMMASI, L De; WARDE, J. M.; HADDAD, S. (Orgs.). O Banco "Banco Mundial. Informe sobre el Desarrollo Mundial. Servi<'ios para los Pobres. Servicios de Educación
Mundial e as Políticos Educacionais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP, 1996. pp. 75-124. Básica. pp. 113-134. Bogotá, Novembro 2003.

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BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paisr; que integram a IVR na America Latina 1 25
Em outro documento do Bani ·o Mundial, este afirma que o custo por aluno Além dos recursos financeiros, a assistência técnica oferecida pelo Ban-
na educação primária é bastante menor do que na educaç~'io secundária ou su- co é outro pilar de sua estratégia de implementação das reformas na edu-
perior e recomenda reformas e privatizações nesses níveis mais custosos como cação, assim corno em outras áreas. Diversos especialistas a seu serviço
alternativa para alocar mais recursos do governo para o nível primário.29 constituem urna verdadeira "rede gerencial" no interior da máquina admi-
O Banco ainda desenvolve p1·squisas para verificar se a cobrança de livros nistrativa de cada país para verificar a execução dos projetos. 34
escolares, merenda e uniforme reduz ou não o número de crianças freqüen- As políticas do Banco Mundial têm impacto direto no nível salarial dos
tando as escolas. 30 Os programas de incentivo à freqüência escolar por meio professores. O Banco questiona o pressuposto de que o aumento no salário
de ajuda de custo aos pais dos alunos, como o Bolsa-Escola no Brasil, o Edu- dos professores bem corno do número de alunos por professor se traduzem
que a la Niiia na Guatemala e " Oportunidades no México representam um em melhora da qualidade do ensino. Em seus documentos, argumenta que,
tipo de política atualmente bastante elogiada e financiada pelo Banco, tendo segundo suas pesquisas, a qualidade das instalações escolares ou do material
em vista a meta do milênio relaliva à universalização do ensino primário. didático tem um impacto cerca de dez vezes maior sobre a qualidade do en-
Sob o argumento de envoh 1~r a comunidade, maximizar a eficiência e sino do que o aumento salarial aos professores. No que se refere ao tamanho
obter resultados palpáveis, o Bn 11co propõe que a administração dos recursos das classes, 40-50 alunos por professor é urna média satisfatória.35 Amparado
da educação seja dcscentralizacla, isto é, que os fundos sejam administrados nessas pesquisas, o Banco recomenda que se estabeleça um teto salarial para
o mais diretamente possível pehs instituições escolares, ao invés do controle professores de 3,6 vezes o PIB per capita do país. Existem, entretanto, pesqui-
pelo governo. Mais do que isso, sugere que a responsabilidade por arrecadar sas internacionais auspiciadas pela Unesco que indicam o contrário, valori-
recursos deve ser compartilhada com a comunidade local, relativizando a zando a centralidade do professor para a garantia da qualidade educacional.
responsabilidade do estado em .~arantir o financiamento à educação. A educação é encarada pelo Banco corno a prestação (pública ou priva-
Apesar de o Documento de estratégia para a redução da pobreza, publica- da) de um serviço, e não corno um direito de todos à transmissão e troca de
do em 2001, indicar que não dl'veria haver mais cobrança de taxas em ope- saberes, culturas e valores. Nessa perspectiva, a educação deve ser avaliada
rações escolares primárias, em Taxas dos usuários da educação primária, de com base no desempenho dos professores em fornecer o mais eficiente ser-
2004, o Banco sugere que"( ... ) as comunidades podem levantar recursos em viço aos seus "clientes", os pais. O fortalecimento dos clientes, que deverão
dinheiro ou espécie para linandar projetos"," sobretudo para construção e avaliar a escola pela utilidade mercadológica do produto que o aluno de-
custos de manutenção. Sónia Kruppa destaca que "a educação està entre as monstrar ter adquirido, é apresentado pelo Banco corno um dos pilares para
políticas públicas em processo acelerado de mercantilização",'2 e nos parece a melhoria da educação, seja pública, seja privada. 36
que os pais e as comunidades locais estão sendo cada vez mais envolvidos Segundo José Luís Coraggio, há na perspectiva educacional do Banco,
nessa relação mercantil. A apropriação, por parte do Banco Mundial, da con- "(...) urna correlação entre sistema educativo e sistema de mercado, entre
cepção de descentralização e dl' aproximação da comunidade no âmbito .da escola e empresa, entre pais e consumidores de serviços, entre relações
escola devi~ ser problematizada, já que coloca em risco a própria noção de pedagógicas e relações de insumo-produto, entre aprendizagem e produto,
educaç<io como direito a ser garantido por meio de políticas públicas. esquecendo aspectos essenciais próprios da realidade educativa". 37 Conso-
ante com essa análise, David Archer destaca o seu significado em termos
Ao mesmo tempo em que incentiva a descentralização, no sentido de negação da educação corno um direito: "O Banco Mundial ( ...) só está
da tran.'iferéncia de responsabilidades, o Banco Mundial acena com
interessado no retorno económico, não tem interesse em outros retornos e
apoio até mesmojfnanceim à constituição de sistemas de avaliação
não tem interesse na educação corno um direito". 38
fortemente centralizados,'' incumbindo o governo central de fis-
calizar e propor aprirnommentos tanto de caráter administrativo
quanto curricular - .flmç1lcs, estas sim, que deveriam contar com o
envolvimento das instdncias locais.
34
lnformeda Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais. SoibacomooBancoMundialopera
29
Banco Mundial. Poverty Reduction Strotegy Poper. Cap. 19, p. 235. na implementação de reformas. 2004. Disponível em www.rbrasil.org.br.
30
Banco Mundial. User Fees in Primory Ecfucation. op. cit., pp. 29, July 2004. 35
Banco Mundial. Informe sobre el Desarrollo Mundial. Servicios para los Pobres. op. cit., 2003.
31
Banco Mundial. User Fees in Primary Education. op. cit., p. 28, July 2004. 36
Banco Mundial. Informe sobre el Desarrol/o Mundial. Servicios para los Pobres. op. cit., 2003.
32
KRUPPA, Sonia Maria Portella. op. cit., p. 5, s. d. "CORRAGIO, José Luís. op. cit., pp. 102, 1996.
33
KRUPPA, Sonia Maria Portel la. op. cit.. s. d. 38
Entrevista da Ação Educativa com David Archer. op. cit., 2005.

26 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto n.1s políticas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 27
Conclui-se portanto que, no âmbito das políticas preconizadas pelo Ban-
co Mundial, a afirmação da educação como um direito universal é subsumi- 2. A atuação do Banco
da ante a perspectiva economicista em mais de um sentido. Primeiramente
porque, visando a restrição do gasto público e a geração de superávit por Mundial na educação
parte dos países pobres e endividados, limitam-se as metas educacionais -
com focalização no ensino primário - e o investimento em insumos essen-
ciais como os professores. Além disso, incentiva a lógica de mercado como
básica do Brasi 1
fator de eficiência dos sistemas de ensino, tanto pelo posicionamento das
familias como consumidoras de um serviço - chamando-as até mesmo a se
co-responsabilizarem por sua manutenção - quanto franqueando os níveis Brasil tem uma população de 186,7 milhões de pessoas e um Pro-
educativos mais elevados à atividade capitalista por meio da privatização.
O duto Interno Bruto (PIB) que em 2006 chegou a R$ 2,3 trilhões,
R$ 12.436,75 per capita. Em 2002 existiam no pais 52,3 milhões
de pobres (pessoas com renda familiar mensal menor que meio salário
mínimo per capita), o equivalente a 30,6% da população, tendo diminuído
desde 1992 nove pontos percentuais. Já a pobreza extrema (renda familiar
mensal menor que um quarto de salário mínimo per capita) atingia em
2002 11,6% dos brasileiros, ou 20 milhões de pessoas. 39 Conforme os cri-
térios da metodologia de cálculo do Banco Mundial, o Brasil se apresenta
bastante próximo de cumprir o primeiro objetivo das Metas do Milênio da
ONU, firmadas em 2000, isto é, reduzir pela metade o número de pessoas
que ganham menos de um dólar PPC 40 por dia até 2015.
Apesar de os números indicarem uma gradual melhora na renda dos
mais pobres de 1992 a 2002, com especial intensidade nos anos 1994 e 1995,
o índice de pobreza ainda é.alarmante, e a extrema (e crescente) concentra-
ção de renda aponta o Brasil como o segundo país mais desigual do planeta,
atrás apenas de Serra Leoa na África. Em 1992, os 20% mais ricos se apro-
priaram de 55,7% da riqueza nacional; em 1996, de 55,8%; e em 2002, de
56,8%. Na região Nordeste os 20% mais riens se apropriam mais da renda
regional do que os 20% mais ricos do Sudeste - 62,6% contra 53,9%. 41
Em termos de estratificação social, a desigualdade económica no Bra-
sil continua a manter a histórica e forte correlação com as diferenças
étnico-raciais da população, sobretudo no que tange aos negros e pardos.

39 BRASIL, Presidência da República. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - Relatório nacional


de acompanhamento- O que são as linhas de pobreza e indigência? Brasilia: lpea, 2004. pp. 15. Ver
também: PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento http://www.pnud.org.br/
odm/reportagens/index.php ?id01=725Etlay=odm
40
Para mais detalhes sobre metodologias de calculo da pobreza, ver Objetivos de Desenvolvimento
do Milênio - Relatório nacional de acompanhamento - O que são as linhas de pobreza e indigência?
Brasília: lpea, 2004. p. 18. A expressão dólar PPC corresponde a um critério adotado em algumas
analises econômicas comparativas que elimina as diferenças de poder de compra entre os países e
considera uma taxa de câmbio de "paridade do poder de compra" IPPC).
41
BRASIL, Presidência da República. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - Relatório nacional de
acompanhamento- O que são as linhas de pobreza e indigência? Brasília: lpea, 2004. pp. 16.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos pai'.es que integram a IVR na América latina 1 29
_ _2_fl.Lêa.~c:_Q_tvl_un_dial. OMC e FMI: o imoacto nas políticas educacionais
Segundo dados de 2002 do IBGIUPNAD, dentre os 10% mais pobres da so- Gráfico 1
ciedade brasileira, 35% são brancos e 65% são negros ou pardos e, dentre
o 1% mais rico, 86% são brancos e 14% são negros ou pardos. 42 A taxa de 7,000.0
desemprego no Brasil saltou de 7,1% em 2001para10,5% em 2002 e para
12,5% em 2003.
O Brasil é um dos maiores clientes do Banco Mundial, tendo contraído
desde 1949 empréstimos que chegam a US$ 30 bilhões. Como ilustra o grá-
fico 1, o montante dos empréstimos vem crescendo, e no período 1999-2002
houve privilégio aos setores de proteção social, finanças e leis, justiça e
administração pública. Já o investimento em políticas setoriais, tais como
saúde, agricultura e meio ambiente, diminuiu, exceto no caso da educação,
no qual se verifica ampliação em relação ao período 1995-1998.43
Existiam, em 2005, 53 projC'tos em execução no País, totalizando quase
US$ 5 bilhões em recursos provenientes do Banco.•• Apesar de os investi-
mentos anuais do Banco no país serem de apenas 0,4% do PIB, como parce-
la dos investimentos públicos eles representam significativos 12%.45

o.o
1995 l 1998 1999 1 2002

o Água, saneamento, proteção contra enchentes ~. Lei, justiça e administração pública

• Desenvolvimento urbano
• Saúde, nutrição e população

• Transporte ~ Finanças

•• Proteção social

Desenvolvimento do setor privado




Meio ambiente

Energia eletrica e outras formas de energia

• Petróleo e gás
• Educação

• Agricultura, pesca e silvicultura

42
BRASIL, Presidência da República do. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - Relatório nacional
de acompanhamento. op. cit., 2004. p. 16 e 19.
"Banco Mundial. Uma parceria de resultados: o Banco Mundial no Brasil. op.cit., 1 de fevereiro de
2005. p. 7.
" Banco Mundial. Grupo Banco Mundial divulga estratégia de assistência ao Brasil para 2004-2007.
News Release No: 2004/173/LAC. Disponível em www.worldbank.org.
45
Banco Mundial. Uma parceria de resultados: O Banco Mundial no Brasil. fevereiro de 2005. p. 5.
Disponível em www.obancomundial.org/index.php/content/view_folder/1259.html.

30 J Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paises que integram a IVR na América Latina J 31
O alinhamento do Brasil Sauer, então presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação (UNDIME), muitos municípios n;io estavam preparados para
à concepção educacional do Banco esse processo de municipalização:

O plano de governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) em 1994, se-


Hd uma sobrecarga de matriculas desproporcional a seu po-
gundo Helena Altman, já apresentava propostas de reformas educacionais
tencial arrecadador, uma lentidão e precarização do atendi-
alinhadas com as diretrizes do Banco Mundial, tais como "a redução das
mento da educação infantil, principalmente nafaixa etdria de
taxas de responsabilidade do Ministério da Educação como instância exe-
até trl!s anos de idade, hoje com a sua matrícula praticamente
cutora; o estabelecimento de conteúdos curriculares básicos e padrões de
restrita aos maiores municípios. 50
aprendizagem; a implementação de um sistema nacional de avaliação do
desempenho das escolas e dos sistemas educacionais para acompanhar a
Ainda segundo Sauer, o Banco sempre apr1~senta uma receita educacio-
consecução das metas de melhoria da qualidade do ensino".46
nal, na qual se pode ler a descentralização administrativa (que, no Brasil,
Também para Haddad e Graciano a gestão FHC buscou adequar o sis-
influenciou o processo de municipalização do ensino), a concentração de
tema de ensino à reforma do Estado brasileiro, em consonância com as
recursos no ensino fundamental (limitando o financiamento para outros
orientações das instituições financeiras multilaterais. Esses autores ressal-
níveis) e a avaliação dos estabelecimentos de ensino pelos resultados da
tam que se a participação do ensino privado é minoritária nos níveis focali-
aprendizagem (dando origem aos Saeb, Enem e Provão) 51 • A ênfase exage-
zados pela atuação do governo e recomendados pelo Banco, não passando
rada na gestão, propagada pelo Banco e absorvida pelos governos, reduziu
de 10% em média, é no nível superior que ela ganha uma escala bem maior,
muito o espectro de variáveis no diagnóstico cios problemas educacionais
recebendo até 70% das matriculasY
considerado na formulação das políticas públicas. 52 Ainda segundo Sauer:
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
O Banco Mundial teve forte influência na definição das políticas educa-
de Valorização do Magistério (FUNDEF), aprovado em 1996 durante ages-
cionais brasileiras nas últimas décadas, nem lanto pelo volume de recur-
tão FHC e substituído pelo Fundeb em 2007, contemplou outro importante
sos que injetou no setor, mas pelo que consel!uiu influenciar nas políticas
componente do receituário do Banco Mundial, qual seja, a focalização no
sociais, principalmente porque seu aval abria portas para a liberação de
ensino fundamental.4R A intenção de focalizar esforços e recursos no ensino
empréstimos destinados a programas de ajusl!• [estrutural]. 53
fundamental regular foi criticada por alguns setores por deixar desassisti-
A partir de 2003, com o início da gestão Lula, ocorre uma ruptura com
das as etapas da educação infantil e do ensino médio, além da educação de
essa orientação dominante, e o Ministério da Educação elege como uma
jovens e adultos. Além disso, na perspectiva da Confederação Nacional dos
de suas prioridades a implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvi-
Trabalhadores em Educação (CNTE), a focalização do Fundef"ajudou a de-
mento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
sestabilizar um pouco mais as carreiras nos estados e municípios ao criar,
(FUNDEB), que abarca todos os níveis e modalidades da educação básica.
dentro de uma mesma rede de ensino, servidores de duas categorias" 49 : os
Por outro lado, houve continuidade no que refere à política restritiva de
vinculados ao ensino fundamental e os das outras etapas.
gasto público, que limita os investimentos em educação. A Desvinculação
É importante ressaltar que o incentivo à focalização no ensino funda-
de Recursos da União (DRU), política herdada da gestão FHC e mantida no
mental veio acompanhado do incentivo à municipalização deste nível de
governo Lula, retira anualmente R$ 4 bilhões do montante de verbas vin-
ensino, outra clara recomendação do Banco Mundial. Como aponta Adeum
culadas à educação. Em relatório recente, o Bnnco Mundial elogia esse me-
"ALTMAN, Helena. Influências do Banco Mundial no projeto educacional brasileiro. ln: Educ. Pesqui. canismo e critica a vinculação de verbas, recomendando a flexibilização. 54
v. 28 n• 1. São Paulo: Jan/Junho, 2002.
47 HADDAD, Sérgio e GRACIANO, Mariângela. Educação: direito universal ou mercado em expansão - 50
Entrevista da Ação Educativa com Adeurn Sauer. op. cit., 2005.
51
Documento para debate. 1' versão, março 2004. p. 5. Saeb: Sistema de Avaliação da Educação Básica, implantado em 1990; Enern: Exame Nacional do
" A Constituição de 1988 vincula 250/o das receitas dos estados e municípios à Educação. Com a Ensino Médio, criado em 1998 e Provão, Exame Nacional de Cursos, de 1995, substituído pelo ENADE
Emenda Constitucional nº 14/96, 60º/o desses recursos (o que representa 150/o da arrecadação global (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes), em 2004.
52
de estados e municípios) ficam reservados ao Ensino Fundamental. Ministério da Educação do Brasil. Entrevista da Ação Educativa com Adeurn Sauer. Por Diego Azzi, março 2005.
O que é o FUNDEF. Secretaria de Educação Básica -Departamento de Financiamento da Educação " Entrevista da Ação Educativa com Adeurn Sauer. op. cit., 2005.
Básica/ Fundef. Disponível em www.mec.gov.br/sef/fundef/funf.shtrn. "Banco Mundial. Urna parceria de resultados: o Banco Mundial no Brasil. op.cit., 01 de fevereiro
" Entrevista da Ação Educativa com Juçara Outra. Por Diego Azzi, abril 2005. de 2005.

~ 21 Ranro Munrtial. OMC r FMI: o imoacto nas ooliticas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paises q .e integram a IVR na América Latina 1 33
A atuação direta do Banco Mundial na
Quadro 2
educação básica
Projetos atualmente financiados pelo Banco Mundial (BM)
em educação5 7

--
Para além de um alinhaml'nto de visões e políticas educacionais entre
o Banco e o Ministério da Educação, particularmente durante o governo
FHC, há também a ação direta do Banco Mundial na educação brasileira
por meio dos projetos por ele Jinanciados.
Nome ....., Objetivos anunciados
Fundo de Fortalecimento Etapa A: U$160 Melhoria do desempenho, redução das
Segundo o Banco, a instituição é "o maior financiador externo de pro- da Escola til - 05/2002- milhões desigualdades e aumento da eficácia escolar.
FUNDESCOLA Ili BR 12/2006
gramas de educação. Desde 1963, quando começou a financiar atividades 71220 Etapa B: U$ 226,5
nesse setor, concedeu mais d!' US$ 30 bilhões em empréstimos e créditos, 07/2006- milhões
12/2010
e, atualmente, financia 162 projetos em 82 países". O Banco relata que até
2005 foram investidos mais de US$ 2,1 bilhões no Brasil. 55 Na sua ava- Programa de Educação
da Bahia {Fase 2)
04/2001 - U$ 60 Melhoria da qualidade do ensino
07/2006 milhões fundamental e médio; maior acesso ao
liação, a principal problemática da educação básica pública no Brasil diz P070827 ensino médio; melhoria do gerenciamento
respeito ao abandono e à repetência. do sistema.

O quadro a seguir apresenta os projetos atualmente apoiados pelo Ban-


co no Brasil, na área da educação, incluindo um macroprojeto que abarca Projeto para a Melhoria 11/2000- U$90 Melhoria da qualidade e eficiência nos
as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste (Fundescola), além de projetos da Educação Básica do 06/2006 milhões serviços educacionais públicos; aumento do
Ceará - Projeto Escola desempenho acadêmico; fomentei de um
negociados diretamente com os estados do Ceará, Bahia e Pernambuco. Novo· Milênio BR 4591 ambiente propicio ao aprendizado.
Todos eles têm sua gestão centralizada no Fi.indo Nacional para o Desen-
volvimento da Educação (FNDE).
Projeto Integrado de 04/2005- U$31,5 Aumentar a inclusão, a eficiência e a
A relação do Banco é prioritariamente com o governo federal e com al- Desenvolvimento e 12/2009 milhões qualidade do sistema de ensino publico;
guns estados, como visto em i\linas Gerais, Paraná e São Paulo em períodos Melhoria na Qualidade da fortalecer e modernizar a Secretaria de
Educação de Pernambuco Educação; modernizar o Estado, com
anteriores (TOMMASI, 1996) e atualmente em Pernambuco, Ceará e Bahia. EDUQ P069934 intervenções executadas pela Sec. de
Porém, apesar de não participarem da formulação dos projetos, os muni- Educação e replicadas por outras instituições.
cípios são os que mais sentem o impacto dessas políticas. 56
Segundo Juçara Dutra, presidente da CNTE, é possível citar ao menos
dois exemplos que expressam a interferência do Banco nas políticas e prá- medida colide com a capacidade gestora dos agentes escolares,
ticas educacionais, ambos no âmbito do projeto Fundescola: em especial dos Conselhos das escolas, bem como agride a au-
tonomia da gestão pública dentro de um recinto de natureza
O primeiro, que interjire na organização e na gestão escolar, essencialmente pública. Além disso, o Fundescola, dispõe de
refere-se às Unidades fl'xecutoras (UEx), entidades de caráter normas que permitem ao Banco intervir nas políticas públi-
jurídico privado, em âmbito de cada escola pública vinculada cas educacionais das 2. 700 cidades atendidas pelo projeto, as
ao Fundescola, que têm a finalidade de receber e executar os quais vão desde a concepção de projetos especificas da escola à
recursos.financeiros traneferidos pelo governo.federal. [. ..]Esta decisão do ente público em contratar profissionais.'8

Em recente documento, o próprio Banco admite que há problemas com


ss Banco Mundial. Uma parceria de resultados: o Banco Mundial no Brasil. op.cit., 01 de fevereiro
de 2005.p. 35. as Unidades Executoras: "os Conselhos Escolares coexistem com as Uni-
s• Entrevista da Ação Educativa com Adeum Sauer. op. cit., 2005. Sobre a relação entre técnicos das
secretarias estaduais de educação de SP e MG com o Banco Mundial, ver TOMMASI, Lívia De. Finan-
ciamentos do Banco Mundial no setor educacional brasileiro: os projeto em fase de implementação. 57
Banco Mundial. Operações no Brasil - Projetos Aprovados e em Atividade - Educação, Saúde
ln: TOMMASI, L De; WARDE, J. M.; HADDAD, S. (Orgs.). O Banco Mundial e as Políticas Educacio-
e Proteção Social. Disponível em www.bancomundial.org.br/index.php/content/view_folder/1259.
nais. São Paulo: Cortez/Ação Educativa/PUC-SP, 1996. pp. 195-229. html. ·
58
Entrevista da Ação Educativa com Juçara Outra. Por Diego Azzi, abril 2005.

34\ Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais


BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina \ 35
dades de Implementação (Unidades Executoras - UEx) e isso gerou sinais Isso não coincide com o discurso do Banco nem do próprio governo,
de conflito quanto às reais funções dos Conselhos Escolares na comuni- que alegam realizar consultas amplas aos vários setores da sociedade ao
dade escolar". 50 formularem e negociarem os empréstimos." 3 Para Marcus Faro, secretá-
Para o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CE- rio executivo da Rede Brasil, "[... ] antes de meados dos anos 1990, as dis-
DECA): cussões da sociedade civil sobre os bancos multilaterais eram dispersas.
Houve avanços com a articulação de um debate mais organizado, mas há
[. ..] em tennos de irifra-estrutura, o que se pode dizer é que progressos ainda a serem feitos nesse campo".º'
a crise fiscal do estado toma-o extremamente dependente dos
aportes do Banco para a manutenção e construção de escolas. Fundescola: um macro projeto para a
(. ..) Estes investimentos possibilitaram a construção de algu- educação básica no Brasil
mas escolas na capital e no interior do estado, e também es-
colas indtgenas, além da manutenção e ampliação de outras. Segundo o Banco Mundial, o Fundescola tem sido uma importante es-
Contudo, sem o aporte de um programa próprio de manuten- tratégia na universalização do ensino fundamental. O programa é finan-
ção, os recursos não Um sido szificientes e hd uma vistvel de- ciado com recursos nacionais do FNDE somados a empréstimos do Banco
gradação do parque escolar. 60 Mundial, que, via de regra, representam cerca de 50% do total. Em 1999,
o Banco Mundial afirmava que "o Fundescola. agora mais do que nunca,
O Senador João Capiberibe (PSB-AP), ex-governador do Amapá no perí- representa a viga de sustentação dos esforços f<·derais em educação", 65 dei-
odo de implantação do Fundescola, afirma ainda, sobre a reforma das esco- xando claro o grau de ambição de tal projeto e a centralidade por ele ocupa-
las, que o modo padronizado de execução das polfticas se reflete: da na estratégia de reformas educacionais do Banco para o Brasil.
O Fundescola está em andamento desde junho de 1998 (FUNDESCOLA I),
[. ..] nos projetos arquitetônicos para as escolas .financiadas, os atualmente está em sua terceira fase (FUNDESCOLA III A e B), cuja conclu-
quais, por tomarem como modelo outras regiões brasileiras, são são está prevista para o ano de 2010, e é um prof!:rama bastante abrangente:
inadequados para o clima das regiões quentes como o clima
equatorial do Amapá. Enquanto os programas nacionais persis- Mais de 4,5 milhões de estudantes de 14 mil escolas públicas
tirem no tratamento igual para regiões com características com- localizadas nas regiões Norte, Nordeste c Centro-Oeste são be-
pletamente diferentes entre s~ não se obterão nem o resultado neficiados pelo Fundo de Fortalecimento da Escola, programa
padronizado nem o atendimento às peculiaridades regionais. 61 do Ministério da Educação desenvolvido em parceria com 19
secretarias estaduais de educação e 384 munictpios das regiões
Os programas e ações do governo federal, e também dos estaduais, Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Os munidpios atendidos estão
que contam com financiamento do Banco Mundial têm sido formulados e localizados nas duas microrregiões mais populosas dos esta-
negociados com pouca participação, supervisão e interferência das diver- dos do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, denominadas pelo Fun-
sas organizações da. sociedade civil brasileira. Luiz Dourado, ex-diretor descola de "Zonas de Atendimento Prioritdrio"'.""
do Fundescola e professor da Universidade Federal de Goiás, salienta que
há uma participação um pouco maior da sociedade civil no que se refere
ao acompanhamento da implementação dos programas e das políticas,
mas que no momento da negociação a participação é quase inexistente. 62 63
BRASIL, Presidência da República. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio- Relatório nacional de
acompanhamento. op. cit., 2004. pp. 7, 9, 11 e 20.
64
Entrevista da Ação Educativa com Marcus Faro. Por Diego Azzi, março 2005.
65 Banco Mundial. Project Appraisal Document. Second School lmprovement Project - FUNDESCOLA
59 Banco Mundial. Project Appra isa 1Doeu ment. Pernambuco 1ntegrated Deve lopment: Education Qua 1ity
li. Report n•: 19228-BR. 1999. p. 3.
lmprovement Project. Report n· 29935-BR. 2004. pp. 5-6 e 2?-21. . . 66 FNDE - Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação. Fundo de Fortalecimento da Escola
60 Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. Por Diego Azz1, maio ~005. . .
61 Entrevista da Ação Educativa com o Senador João Capiberibe (PSB-AP). Por Diego Azz1, maio 2005. - FUNDESCOLA - Balanço das Ações de 1998 a 2003. Disponível em www.fnde.gov.br/home/fundes-
62 Entrevista da Ação Educativa com Luiz Dourado. cola/balanco 1988a2003.doc.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que inteqram a IVR na América latina 1 37
".>CI -
a - Planejamento Eslratégico da Secretaria (PES)
O Fundescola desenvolve uma série de iniciativas que têm como objetivo
Processo gerencial desenvolvido pela secretaria de Educação para o al-
manter as crianças na escol11 até que concluam os oito anos de estudo do en-
cance de uma situação desejada, de maneira efetiva, com a melhor concen-
sino fundamental. São reformas que"[ ...] focalizam o ensino-aprendizagem e
tração de esforços e recursos.
as práticas gerenciais das escolas e secretarias de educação". 67
O quadro 3 sintetiza as três etapas no desenvolvimento do Programa,
b - Sistema de apoio à elaboração do plano de carreira do magistério público
de 1998 a 2010.
Sistema composto por um software, distribuído junto com o livro Pla-
no de carreira e remuneração do magistério e o caderno Plano de carreira
Quadro 3
e remuneração do magistério - estudo dirigido, destinado a fornecer aos
Evolução do Fundescola 68
municípios condições de elaborar o Plano de Carreira e Remuneração do
magistério público.
No FUNDESCOLA 1, implantado de junho de 1998 a junho de 2001, com U$ 62,5 milhões
financiados pelo Banco, a prioridade das reformas foi (a} adequar as escolas a padrões e - Sistema Integrado de lnformaçües Gerenciais (SllG)
mínimos de funcionamento, nos critérios definidos no Programa; (b} auxiliar no Programa composto por 27 sistemas informatizados e interligados, que
planejamento e na provisão de vagas; gestão e desenvolvimento de sistemas educacionais apóia o processo de gestão das secretarias estaduais de educação do Norte,
e (d} 'desenvolvimento" da escola. Nordeste e Centro-Oeste e promove a melhoria de suas condições de ge-
renciamento.

d - Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE)


Durante o FUNDESCOLA li, implantado de junho de 1999 a junho de 2004, com U$ 202 milhões
Ao elaborar o PDE, a escola realiza um diagnóstico de sua situação,
financiados pelo Banco, deu-se a incorporação da região Nordeste ao Programa, totalizando 384
municlpios e 19 estados das três regiões atendidas. Éna Segunda etapa que se inicia um trabalho identificando seus valores, definindo sua visão de futuro e sua missão, bem
mais direto junto às secretarias de educação estaduais e municipais. como traçando objetivos, estratégias, metas e planos de ação a serem al-
cançados a longo, médio e curto prazos. Recebem recursos financeiros e
apoio técnico para elaborar o PDE as escolas que tenham a partir de cem
alunos, organizem unidades executoras, disponham de condições mínimas
Na primeira etapa do FUNDESCOLA Ili, a etapa A, que vai de maio de 2002 a dezembro de 2006, com de funcionamento e possuam liderança forte.
valor financiado pelo Banco de U$ 160 milhões, o governo deverá finalizar o desenvolvimento de
todos os instrumentos para escolas e secretarias e conduzir avaliações profundas sobre a aplicação de
e - Projeto de Melhoria da Escola (PME)
tais instrumentos. A etapa 8, que vai de junho de 2006a dezembro de 2010, tem um custo total
previsto de U$450 milhões e está voltada, sobretudo, a projetos de massificação cm escala nacional
Depois de elaborarem o PDE, as escolas selecionam metas e ações que
dos resultados e instrumentos bem-sucedidos no Fundescola. consideram essenciais para a melhoria da aprendizagem dos alunos e que
poderão ser financiadas pelo Fundescola, as quais deverão ser descritas no
Projeto de Melhoria da Escola.
O Fundescola contempla 15 subprogramas, apresentados a seguir, os
quais, segundo Luiz Dourado, devem ser observados em detalhes.69
f - Escola Ativa
Nas escolas rurais com classes multisseriadas (de 1ª a 4ª série), o Fun-
descola apóia a implantação de uma estratégia de ensino para combater a
67
reprovação e o abandono: a Escola Ativa. A experiência reúne auto-apren-
FNDE - Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação. Fundescola. op. cit.
68
Banco Mundial. Project Appraisal Document. FUNDESCOLA Ili A. Report n•: 23297-BR. 2002. pp.
dizagem, trabalho em grupo, ensino por meio de módulos, livros didáticos
3 ess. especiais, participação da comunidade, capacitação e reciclagem perma-
" Entrevista da Ação Educativa com Luiz D'ourado. op. cit., 2005. Para ínformações detalhadas nente dos professores e acompanhamento constante de alunos e docentes.
sobre cada uma destas ações e programas, ver Fundo de Fortalecimento da Escola - FUNDES-
COLA - Balanço das Ações de 1998 a 2003. Disponivel em www.fnde.gov.br/home/fundescola/
balanco 198Ba2003.doc.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paises que integram a IVR na America Latina 1 39
38 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais
g - Programa de gestão e aprendizagem escolar (Gestar) l·- Padrões Mínimos de Fnncionamcnlo das Escolas (PMFE)
É um programa de gestão pedagógica da escola, orientado para a forma- São as condições básicas e o conjunto de insumos necessários para a
ção continuada de professores do ensino fundamental, avaliação diagnósti- realização dos serviços escolares essenciais e para que o processo de en-
ca e reforço da aprendizagem dos estudantes. Tem como objetivo principal sino-aprendizagem ocorra de forma adequada. Para atingir esse padrão, o
elevar o desempenho escolar dos alunos nas disciplinas de Matemática e Fundescola considerou os seguintes insumos: Pspaço educativo, mobiliário
Língua Portuguesa. O programa utiliza recursos de educação a distância e e equipamento escolar, material didático e escolar e recursos humanos. As
atende professores de 1ª a 4ª séries de escolas públicas. A partir de 2004, diretrizes deverão contribuir para a definição dos padrões mínimos nacio-
também passa a atender professores de Matemática e Língua Portuguesa nais, auxiliando estados e municipios no desenvolvimento e alcance dos pa-
de 5ª a 8ª séries. drões mínimos e na redução das desigualdades existentes entre as escolas.

h - Programa de apoio à leitura e à escrita (Praler) m - Levantamento da Situação Escolar (LSE)


É um programa iniciado em 2005 que atua na formação de professores, É um instrumento de coleta de informações sobre a situação das escolas
principalmente os de 1ª e 2ª séries, para que possam, com base nos conhe- de ensino fundamental regular, objetivando o planejamento da educação nos
cimentos adquiridos, alfabetizar seus alunos no tempo pedagógico do ano estados e municípios atendidos pelo Fundescola. O sistema informatizado do
letivo. É destinado aos professores que concluíram ou estão participando LSE, desenvolvido em 2002, permite que os estados e municípios atualizem
do Gestar de 1ª a 4ª séries e que ainda não adotaram outros programas de os dados levantados anteriormente e emitam relatórios gerenciais que auxi-
alfabetização. liarão os gestores na tomada de decisão para o alcance dos padrões mínimos
de funcionamento e para a melhoria das condi~·ões dos prédios escolares.
i - Programa melhoria do rendimento escolar
O programa Melhoria do Rendimento Escolar busca incentivar a for- n - Projeto de Adequação do Prédio Escolar (l';ipe)
mação continuada dos profissionais de 1ª e 2ª séries da rede municipal e Visa estabelecer, nas edificações escolares, condições de segurança, sa-
de 5ª série da rede estadual em funções docentes no ensino fundamental, lubridade, estabilidade e funcionalidade. No n~passe de recursos direto às
com a finalidade de minimizar os índices de fracasso escolar e aumentar escolas, são priorizados os ambientes das salas de aula, para que alcancem
os de inclusão de alunos no processo de ensino com qualidade social. Para os padrões construtivos mínimos, disponham de condições para a utilização
receber o financiamento, o município deve estar localizado em zona de adequada do mobiliário e do equipamento escolar fornecido.
atendimento prioritário do Programa e ter mais de cem mil habitantes.
o - Mobiliário e equipamento escolar
j - Microplanejamento As salas de aula das novas escolas construídas e das escolas beneficia-
Nos municípios atendidos pelo Programa, são realizados estudos de mi- das pelo projeto de Adequação do Prédio Escolar recebem armários, car-
croplanejamento educacional que visam a organização da rede física es- teiras e mesas para professores e alunos, além de ventiladores. A escolha e
colar urbana de ensino fundamental e que, entre outras funções, definem aquisição do mobiliário e equipamento pelo Fundescola levam em conside-
e localizam a necessidade de novas vagas no ensino fundamental e fazem ração a saúde dos usuários, o desempenho e a vida útil dos produtos.
simulações para identificar a situação das escolas em relação aos padrões
mínimos de funcionamento. Esse conjunto abarca aspectos tão variados que poderia ser considerado
como uma reforma educacional local, correndo o risco de sobreposição - e,
k - Espaço educativo no limite, uma contradição - com outras iniciativas e políticas das secre-
O Fundescola orienta e financia a construção de novas escolas, utilizan- tarias ou até mesmo do Ministério da Educação. Isso ocorre, por exemplo,
do projetos arquitetónicos desenvolvidos pelas secretarias de educação dos com o PDE (Plano de Desenvolvimento da Escola), que prevê a instituição
estados e das capitais que participaram do Projeto Espaço Educativo - Ar- de Unidades Executoras, atravessando outras instâncias de gestão previs-
quitetando uma Escola para o Futuro. tas pelo sistema de ensino. O mesmo pode ser dito em relação às iniciativas

.d.()I o- .. -- t.A, .... ..f:,.,1 nf.Af""' E;kAI· "';....,,..,..,.. ..... "'""<" nnlitir':lc ,.~11r:)rinn:::aic BM em foco: sua atuacão na educacão brasileira e na dos oaises oue intearam a IVR na América Latina 1 41
lações físicas, como superlotação e necessidade de reformas e
de formação de professores, que correm em paralelo aos diversos progra- equipamentos (atuando na ampliação de escolas, reformas e
mas que o Ministério instituiu. aquisição de equipamentos, com os recursos repassados direta-
É importante ressaltar que, em 2005, havia dificuldades técnico-buro- mente ao caixa-escolar). 73
cráticas de implementação do Fundescola. Segundo publicação da Undime,
era expressivo o número de municípios não habilitados para celebrar con- "As normas do Programa não eram discutidas com o Estado, mas sim
vênios com a administração federal. Por esse motivo, técnicos do Fundes- exigido o seu cumprimento", recorda o senador Capiberibe.
cola e do FNDE visitaram HJ estados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-
Oeste, para orientar prefeitos e secretários estaduais de educação a adotar Por exemplo, para o mobiliário escolar, era obrigatória a
providências urgentes para que seus sistemas de ensino tenham condições aquisição de conjuntos com estrutura de ferro e cadeiras com
jurídicas de receber os recu!'sos, da ordem de R$ 62 milhões. Aqueles que assento e encosto em compensado efórmica, o que contrariava
não conseguirem regulariza 1· suas situações serão retirados da lista de be- 0 Programa de Mobiliário Escolar adotado pelo Estado do
neficiários, e a quota a eles destinada será redistribuída aos que estiverem Amapá. (. ..) Em relação ao currlculo, enfrentamos barreiras
legalmente habilitados. 70 de concepção, principalmente dentro do Projeto Escola Ativa,
Os recursos podem ser investidos na construção, reforma e equipamen- (. .. ) destinado às escolas multisseriadas, que traz uma concep-
to de escolas, formação continuada de professores, apoio didático e peda- ção de currlculo que prima pelo domlnio dos conteúdos cienti-
gógico às escolas do meio !'lira! e no fortalecimento institucional visando ficamente construidos e pelo resultado alcançado pelos alunos,
dotar escolas, órgãos estad11ais e municipais de instrumentos teóricos e em detrimento do saber prévio dos alunos e de suas respectivas
práticos para a formulação de seus planos de desenvolvimento e gestão comunidades.
educacional. 71
Algumas situações que caracterizam a inabilitação são: certidão nega- A experiência do senador Capiberibe como Governador do Amapá o
tiva de débitos de tributos e contribuições federais vencida ou não apre- leva a apontar como principal debilidade:
sentada; balanço contábil rl'l'erente ao exercício anterior ao convênio não
apresentado; certidão negativa de débito emitida pelo INSS vencida ou não [. ..} a padronização das ações que são financiadas sem o ne-
apresentada; comprovante de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas cessário e importante ajuste do Projeto à política educacional
Jurídicas (CNPJ) vencido ou não apresentado; certidão de regularidade jun- desenvolvida por estados e municlpios, posto que naqueles em
to ao FGTS vencida ou não apresentada; documentação apresentada não que a politica educacional se assemelha à política do Fundes-
autenticada em cartório. Os l'ecursos do projeto foram obtidos por emprésti- cola não existirão dificuldades. O ideal seria que o Programa
mo junto ao Banco Mundial e igual contrapartida do governo federal. 72 tivesse abertura para contemplar os estados e municípios que
Por ocupar o cargo de Governador do Estado do Amapá quando o pro- possuam políticas educacionais diferenciadas.
jeto Fundescola começou a ser implantado, o senador Capiberibe (PSB-AP)
1 acompanhou de perto o seu desenvolvimento:
Experiências estaduais
O Amapá estava classificado em duas Zonas Prioritárias: Zona
Os estados do Ceará, Bahia e Pernambuco eram, em 2005, os únicos do
I e II, tendo sido atendidos os oito municípios da primeira,
País a terem um empréstimo para educação básica firmado com o Banco
onde se concentravam áreas com estrangulamento pedagógi-
Mundial simultaneamente ao Fundescola. Eram, portanto, prioridades do
co; estrangulamento de gestão (proporcionando a capacitação
Banco no Brasil, no que se refere à educação. Este estudo se aprofundará
para diretores e demais gestores); estrangulamento nas insta-
no caso do Ceará, após algumas considerações sobre o embrionário pro-
cesso pernambucano.
'ºUNDIME - União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação. O Fundescola e a cooperação
regional. Boletim 61, 2003.
71
op.cit. 73 Entrevista da Ação Educativa com o senador João Capiberibe (PSB-AP). op. cit., 2005.
72
op. cit.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 43
42 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacld nas políticas educacionais
A experiência de Pernambuco - EOUQ os padrões operacionais mínimos em termos de infra-estrutura. O modelo
consiste em uma série predeterminada de elementos essenciais, tais como
Segundo dados do Banco Mundial, o estado de Pernambuco é o segundo livros literários e material didático, mobiliário escolar, como mesas, cadei-
mais pobre da região Nordeste, com 2,6 milhões de pessoas vivendo na po- ras e prateleiras, e infra-estrutura física, garantindo acesso a alunos com
breza. Apesar de ter melhorado seus índices de analfabetismo e de acesso à necessidades especiais, solidez estrutural, falores de segurança e instala-
escola, há uma grande parcela dos pobres que nunca chega a entrar no ní- ções sanitárias. Deve-se notar, entretanto, qtw o projeto financiará apenas
vel fundamental do sistema de ensino, correspondendo a 29% das crianças a reabilitação das escolas existentes e que novas construções serão finan-
das famílias indigentes e a 19% das crianças das famílias muito pobres 74• ciadas apenas pelo projeto Fundescola.
O Projeto Integrado de Desenvolvimento e Melhoria na Qualidade da Os objetivos de reforma do estado também estão explicitados nos docu-
Educação de Pernambuco, conhecido como EDUQ, objetiva financiar po- mentos do Banco, quando afirma que:
líticas educacionais do ensino fundamental ao ensino médio, e acaba de
entrar em "igor com uma duração prevista de quatro anos, de abril de 2005 No sewr de educação, a pesada estrutura administrativa da SE-
a dezembro de 2009, dentre os quais 2006, 2007 e 2008 concentram o maior DUC impede o fornecimento efi,ciente e ç/'etivo de uma educação
volume de investimentos. É um projeto orçado em US$ 52,5 milhões, sendo de qualidade. (. ..) Os professores na sala de aula representam
US$ 21 milhões provenientes do Governo do Estado de Pernambuco. Há apenas 40% do pessoal da SEDUC, sendo que um terço destes
quatro componentes do EDUQ: melhoria da qualidade e da eficiência das têm contrato temporário. (. ..) Portanto, um dos importantes de-
escolas estaduais; melhoria da eficiência, eficácia e inclusão da educação sqfios atuais da SEDUC é caminhar rumo a um modelo admi-
de Pernambuco; apoio à reforma do estado; gerenciamento do projeto 75 • nistrativo que seja mais alinhado e mais consistente com a mo-
A Secretaria de Educação do Estado (SEDUC) manifesta uma expectativa dernização, descentralização e desconcentração do Estado. 77
otimista no Programa, que deve, segundo este órgão, ser entendido como um
conjunto de ações e reformas que extrapolam a esfera da educação: Segundo a SEDUC, aproximadamente 300;., dos recursos totais do proje-
to serão destinados às políticas educacionais e ao apoio a programas volta-
O Eduq é pioneiro ainda por permitir a experiéncia de no- dos para o desempenho insatisfatório de professores, para as altas taxas de
vas práticas de gestão, previstas na Lei Complementar nº 49: repetência, para as grandes distorções idade-série e para a necessidade de
o aperfeiçoamento da Gestão Educacional e a Reforma do Es- consolidar uma cultura de avaliação e exclusão de crianças com necessida-
tado, traneformando a SEDUC em piloto para outras áreas e des especiais do sistema educacional.
secretarias do Governo. Sobre a relação entre a qualificação dos professores e a qualidade da
educação, o Banco é bastante claro na sua concepção:
Dai decorre o fato de que o Eduq não será gerido apenas pela SEDUC,
mas também "(...) será executado por várias unidades administrativas, Enquanto parece haver diversas razões por traz da diferen-
chamadas de Coordenações Executivas (CEx), das Secretarias de Educa- ça de desempenho das escolas públicas e privadas, os dados
ção (SEDUC), Administração e Reforma do Estado (SARE) e Planejamento claramente mostram que ter professores com diploma de nível
(SEPLAN) 75 • superior por si só não levará necessariamente a melhoras na
Ainda segundo a SEDUC, o projeto investirá em garantir que as esco- qualidade do ensino. Pesquisa recente no Brasil confirma que,
las estaduais, incluindo as que atendem comunidades indígenas, possuam no nível secundário, a educação, o salário e as práticas pe-
dagógicas dos professores não têm um significativo impacto
74
Banco Mund ia 1. ProjectAppraisa 1Document. Pernambuco 1ntegrated Development:Ed ucation Qua lity sobre o aprendizado dos alunos.
lmprovement Project. Report n•: 29935-BR. 2004. pp. 8-9. A metodologia do Banco Mundial considera
"famílias indigentes" aquelas com renda insuficiente para comprar uma cesta básica-R$ 73,36em 1999
- e "famílias muito pobres" aquelas com renda insuficiente para comprar comida e satisfazer outras
necessidades básicas - R$ 149,00 em 1999.
75
PERNAMBUCO, Conselho Estadual de Educação. Ata da reunião do dia 5 de abril de 2005. pp. 2.
76 77
SEDUC-PE. Fonte: www.eduq.pe.gov.br/ Idem. pp. 10-11.

441 R•nro M11nrlial OMr r FMI: n imnartn na< nnlitira< tdurarinnai< BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América latina 1 45
O Banco aponta como principais benefícios do projeto aspectos rela-
cionados à concepção estritamente económica, tais como: os estudantes apresentação, saltaram aos olhos dos conselheiros ao menos duas preocu-
entrarem mais bem preparados no mercado de trabalho, terem a possibili- pações fundamentais. A primeira quando a Gerente afirmou que o EDUQ
dade de incremento na sua renda, custando menos aos cofres públicos para não poderia abordar a questão da melhoria salarial dos professores porque
serem educados 78 • o Projeto tem um tempo determinado; e a segunda quando Notaro afirmou
O projeto apresenta os seguintes indicadores de sucesso: que, nos termos do contrato com o Banco Mundial, ao final do Projeto, se-
rão gradualmente pagos pelo governo do estado 53,6 milhões de dólares
':.. ~ -... '
pelo empréstimo equivalente a 31,5 milhões de dólares.
;.,, -.: ~::· ·::f<;~i~1\il;·:\.~·~<:'-"'. ; ~:
l

.·*.~.u~~I1t~.·~·?·,~~r9entu~f;~~;B~;.~i~~i~~.fi~:1~.~~~~':,4~~~~Í~~,:;.
Não apenas com relação à dívida contraída por Pernambuco junto ao
.· Banco, mas também com relação à participação do CEE e da sociedade
fuIJ.dam~ntalde 81% para 86%•. •.... :. . · .. .:·:: ,,.., civil pernambucana na elaboração do projeto, fica evidente o modo pouco
. :
5401
.
:l~:~i!i~:·da, ~~ª··••.de .·P2~:b)J!~~?,;~9.(·.~~sJn~··~Il.4~~~~~t:4~·.·.··.: democrático e pouco participativo por meio do qual o EDUQ foi formulado
e negociado.
*: Melporl1;1. .<l~ ·t;µ:a de aprovação. rio ensin~ fünd~iti~~i'·ae A ata da reunião de apresentação do EDUQ aos conselheiros não deixa
69% p~a.78%.: ·· "' ··· · · • ·· · · · · · ·: dúvidas:
* ~elhoriaAo~lesémperihi> .d()s a..lunos .tlas. escola&. e~~d~~is
nos. testes <Ie avaliação de aprendiza<l~ sist~ma N~cio.r{a1 ci~ Âya,- A Conselheira Edla de Araújo Lira Soares colocou para refle-
liaçfocta. Educação Básica (SAEJ3),d~ for~~ a 'aic~nç~·~.~é.~a xão que, quando o Estado assina um contrato ou um convénio
· nacional. · de receber 31 milhões e pagar 51 milhões, quem se endivida
* ReduÇão da per~entagem de alunos com distorção idade~sé- . não é o Estado, nem a Secretaria de Educação e sim todos os
rie no ensino {und<1mental de 55% pa,ra 4,6º/o:. . . .· . . . · . pernambucanos e pernambucanas, e isso terd grandes impactos
. ·• ~edu_ção d.a .perpentage01 cte a,hm.~s ~om distorção id~de~s~;. cóm relação às políticas públicas que posteriormente o Estado
r.ie no en~~~~ 111Mi~ d~. 68% parfl 60?/o. . . . . . ·. . · de Pernambuco tenha que .financiar. Uma decisão dessa não
~ ~edu,ç~o da, repe~éncia <los alunos das escolas estaduais no pode passar por um estreito grupo, ela tem que ter a participa-
ensin() fun<lanJ,el1Wld~ 31% pata ~30/o. . . .. . . .. . ·. • . ção maior possível de Pernambuco, porque o pagamento [da
*Aumento da taxa de aprovaçãq ~as:.esco}as i~dígénas de60% dívida} vai repercutir na qualidade de vida de todos/as. Para
pai:a 7!)%. · · um projeto desse ter legitimidade social, ele tem que ser discuti-
* Redução da e:va~íio no qiplp fy.ndanJ:ental d~s ~scol11~ in~ge- · do com quem vai pagar o empréstimo. Como o Conselho Esta-
nas de 15% para 10%. . .. . · dual de Educação representa o Estado como um todo, a mesma
* Conclusão do censo do pessoal da educação.. Conselheira falou que um projeto desse tem que deixar claro
* Formulação de estratéglas de médi~ prazo para gestão de quem consentiu com ele. A.firmou ainda que o Conselho poderia
recursos human()s. ter sido chamado no momento em que ele pudesse opinar sobre
* Cumprimento pela SEDUC do teto anual de gastos por pes" a estrutura do projeto, não apenas ser comunicado. 19
soal. ··
Ademais das preocupações expressas pelo CEE de Pernambuco, é im-
No dia 5 de abril de 2005, o EDUQ foi apresentado ao Conselho Estadual portante observar que além de explicitar que o projeto não deve abordar a
de Educação de Pernambuco (CEE) pela professora Teresa Notaro, Gerente questão salarial de professores, o Banco Mundial afirma que não há relação
da Unidade de Coordenação do Programa de Melhoria da Qualidade da entre investimento no profissional de educação e melhoria de desempenho
Educação Básica do Estado de Pernambuco, da SEDUC-PE. A partir da sua dos alunos, e coloca como indicador de sucesso do Programa a consolidação
de um teto para pagamento de pessoal, o que demonstra o baixo valor que
78
Idem, pp. 7-8 e 27.
79
PERNAMBUCO, Conselho Estadual de Educação. Ata da reunião do dia 5 de abril de 2005. p. 5.

46 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas DOliticas educacionais


BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América latina 1 47
o Banco dá a esse elemento essencial e estratégico da política educacional. mover eqüidade na provisão de serviços educacionais nos mu-
É também importante acompanhar quais serão as diretrizes da reforma do nicípios mais pobres; e (d) fortalecer a capacidade gerencial e
estado a serem implementadas pelo projeto, particularmente em virtude dos administrativa nos níveis central, regional e municipal, para
precedentes que incentivam a privatização e a responsabilização das escolas, tornar a prestação de serviços educacionais mais eficientes.M
acompanhada da desresponsabilização das demais instâncias de governo.
Algumas das medidas propostas para atingir tais objetivos consistem
A experiência do Ceará - Escola Novo Milênio em "fornecer Padrões Básicos de Operacionalização;( ...) fortalecer o Apoio
ao Sistema Pedagógico; e( ... ) criar mais oportunidades para jovens traba-
O estado do Ceará está atualmente na fase final de seu programa "Pro- lhadores, pais e alunos evadidos para que se matriculem, fiquem na escola
jeto para a melhoria da educação básica do Ceará" (Projeto Escola Novo e completem sua educação básica - através do uso de metodologias não
Milênio), no qual o empréstimo junto ao Banco Mundial corresponde a US$ tradicionais, incluindo a educação a distância". 85 Com relação à educação
90 milhões, num total de US$ 150 milhões. Coordenado pela Secretaria de a distância, o Banco afirma:
Educação Básica do Estado do Ceará (SEDUC-CE), o projeto está previsto
para o período de 29 de novembro de 2000 a 50 de junho de 2006, sendo O projeto também financiará a educaçrlo complementar à dis-
os anos de 2001 a 2005 prioritários para a avaliação da sua efetividade.80 O tdncia através de programas televisivos para jovens que deixa-
Banco deixa claro que o Projeto Escola Novo Milênio visa complementar ram a escola, pais e jovens trabalhadores (Programas Tempo
projetos federais em andamento no estado, tais como o Fundescola e o Pro- de Avançar e Educação Contextuali:::.nda). Nos municípios
med (Projeto de Expansão e Melhoria da Educação Secundária, financiado mais pobres, o projeto financiará uma l'ompleta reformulação
pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento).81 da educação, através de programas inovadores de primeira
Apesar de o nome se referir à educação básica, os documentos do Banco educação e de novas práticas nas atividades fundamentais li-
revelam que o seu foco é o ensino primário82 e que deve ser dada ênfase na gadas ao setor, visando a'aumentar o desempenho escolar. 86
intervenção educacional visando o combate à pobreza, baseando-se para
isso em estudos do próprio Banco, que afirmam: "a educação é o mais im- Além de ser questionável um projeto do Banco Mundial propor uma
portante determinante para a pobreza no Ceará, [onde] 84% dos pobres "completa reformulação da educação", o que deveria caber às instituições do
vive em residências em que o/a chefe-de-familia cursou menos de quatro sistema educacional com a participação da sociedade civil, para o CEDECA o
anos na escola". 83 significado dessa reformulação foi, na prática, hastante distinto. Segundo Sa-
Segundo o Banco, os objetivos do Projeto Escola Novo Milênio consis- lomão Ximenes, integrante e advogado do CEDECA, no ano de 2004 o estado
tem em promover maior qualidade, eficiência e eqüidade na prestação de colocou em prática, seguindo as recomendações do Banco, um denominado
serviços educacionais: "(...) 'reordenamento da rede de ensino', que consistiu no fechamento de es-
colas 'ociosas' e na readequação de outras, por exemplo, a transformação de
(a) melhora na qualidade da educação tanto em termos de parte delas em Centros de Educação de Jovens e Adultos".
resultados acadêmicos (output) quanto do ambiente educacio-
nal (inputs); (b) expandir o acesso para a juventude evadida e Cerca de 25 escolas foram fechadas 110 estado e aproxima-
excluída através do uso de metodologias alternativas; (c) pro- damente 100 foram readequadas ou municipalizadas. O
princípio orientador deste processo foi fundamentalmente
so Banco Mundial. Project Appraisal Document. Ceará Basic Education Quality lmprovement Project.
o enxugamento da máquina para a rtdução de gastos, não
Report n• 21428 BR. 2000.
81 Banco Mundial. Project lnformation Document. 8razil - Ceará Basic Education Ouality lmprove- 84
Banco Mundial. Project lnformation Document. Brazil - Ceará Basic Education Quality lmprove-
ment Project. Report n• PIO 7925. 2000. ment Project. op. cit., 2000.
82 85
Banco Mundial. Project Appraisal Document. Ceará Basic Education Quality lmprovement Project. Banco Mundial. Project lnformation Document. Brazil - Ceará Basic Education Quality lmprove-
op. cit., 2000. ment Project. op. cit.. 2000.
83 86
Banco Mundial. Brazil - Growth, Poverty Reduction and Fsical Stability in the State of Ceará. Banco Mundial. Ceará Basic Education Project - BR 4591. Disponível em www.obancomundial.
Report n• 19217 BR, draft, abril 1999. org/index.php/content/view_projeto/514.html

BM em foco: sua atuacão na educacão braliileira e na cio'\ nílic-.r" m1r intrnrnm a IVR n~ AmPrir~ 1;1tin;t 1 4~
responsdveis pelo trabalho de todos os conteúdos. Este método
havendo qualquer /!reocupação quanto à opinião das comu- pode ser considerado um dos grandes responsdveis pelo fracas-
nidades envolvidas no processo. Escolas com décadas defun- so quase absoluto de nossos estudantes, tendo sido abolido em
cionamentojoramji:chadas e alunos traneferidos para outras praticamente todos os municípios que o aplicavam Contudo,
instituições. 87 embora em menor número, no estado permanece. 90

Ximenes recorda: Em sua pesquisa, Telensino: que diddtica é essa?, 91 Idevaldo Bodião, pro-
fessor da Universidade Federal do Ceará e atual Secretário de Educação
O Ceará destacou-se na década de 90 como um dos labora- de Fortaleza, apresenta um estudo de caso sobre o telensino no Ceará, dei-
tórios das reformas educacionais posteriormente implantadas xando evidentes as contradições entre o discurso oficial dos formuladores
no País. As conseqüéncias destas reformas são duradouras e do telensino e o cotidiano dos alunos, professores e funcionários nas esco-
de difícil reversão. /A intenção das reformas em execução é] las. São freqüentes as situações em que: a) os alunos estão completamente
de dar maior eficácia ao sistema de ensino após a propagada dispersos em sala de aula, sem o menor envolvimento com a videoaula
universalização do ensino fundamental. Trata-se de preparar que está sendo apresentada; b) os alunos apresentam sérias deficiências de
económica e estruturalmente a rede de ensino para o atendi- leitura, mesmo na conclusão da 8ª série; c) os orientadores de aprendiza-
mento da demando crescente deste nível.68 gem (OA - educadores contratados, com baixa exigência de formação, para
serem animadores e dinamizadores das discussões em aula para múltiplas
Consoante com as re('omendações do Banco de se investir no ensino disciplinas) sentem que não dominam os conteúdos das videoaulas e ficam
a distància, a Secretaria de Educação do Estado do Ceará divulga: inseguros diante dos alunos; d) o tempo das videoaulas é em geral maior
do que o tempo das aulas definidas na grade horária da escola, remetendo
O Telensino foi criado em 1974 e ocupa hoje uma faixa bas- o conteúdo não trabalhado em sala para a tarefa de casa sem retomá-lo na
tante significativa tia oferta de Ensino Fundamental no Estado aula seguinte, uma vez que uma nova videoaula deve ser trabalhada. Basi-
do Ceará. Abrangi· 2.455 escolas da Rede Pública de Ensino camente, a grade curricular não estava sendo cumprida em conseqüência
em 172 municípios cearenses, atendendo a mais de 420.000 da adoção do sistema de telensino.
alunos. (.. .) O te/ensino tem uma proposta comprometida com Para Bodião, "o que ajuda a explicar os altos índices de aprovação é um
o humanismo pedagógico e com aformação de alunos solidd- conjunto de avaliações extremamente condescendentes, principalmente
rios, participativo.~. críticos, criativos, autónomos e reflexivos, nos momentos de reforços bimestrais e, mais ainda, nas recuperações dos
[que] utilizem outros recursos tecnológicos, compatibilizando finais dos períodos letivos".
melhor o tempo, ritmo, níveis de ensino e de aprendizagem da
turma. (. ..) O orientador de aprendizagem atua com dinami- Alguns orientadores de aprendizagem admitiam adotar proce-
zador e mediador rio processo ensino-aprendizagem, aplican- dimentos quefacilitavam as aprovações, em outros momentos,
do dinâmicas quefavorecem a auto-aprendizagem. 69 no entanto, atribulam essas intenções às medidas determinadas
pela administração central(. ..), cujo objetivo era "maquiar". os
A esse respeito, Ximl'nes afirma: resultados escolares. (...) O que se percebe é que, no dmbito
do Telensino, as escolas tem problemas porque devem se en-
É preciso destacar o papel desempenhado pelo Telensino - um quadrar nas cronometragens televisivas, não podem defi,nir os
método baseado 1w transmissão televisiva em que não hd pro- temas curriculares a serem trabalhados, e os seus professores
fessores em sala dl' aula e sim 'orientadores de aprendizagem' não podem, igualmente, escolher as abordagens pedagógicas

87
Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. op. cit., 2005. "' Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. op. cit., 2005.
"Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. op. cit., 2005. "BODIÃO, ldevaldo da Silva. Telensino: que didática é essa? Faculdade de Educação da Universidade
89
CEARÁ, Secretaria de Educação do Estado do. Telensino: Veículo para formação cidadã. Disponível Federal do Ceará. ANPED. Disponível em www.anped.org.br/23/textos/0406t.PDF.
em www.seduc.ce.gov.br/telensino.asp

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na Amêrica Latina 1 51
para os conteúdos disciplinares, tendo de se restringir a uma Não há por parte da sociedade civil organizada, dos sindicatos
pouco atraente rotina diária. ( ..) O fracasso da escola certa- docentes e da opinião pública uma estruturação da análise e
mente é maior do que mostram os números o.ficiais.02 da critica desta polltica a partir dos tjdtos da intervenção do
Banco Mundial. Este é uma espécie de sujeito oculto, com pa-
A avaliação do Programa Escola Novo Milênio no Ceará estava prevista pel central, mas pouco focalizado pelos movimentos sociais. O
para dezembro de 2005 e deveria observar se o governo atingiu o princi- aprofundamento desta análise é fundamental até para que se
pal índice indicador de sucesso, "um aumento de 15% na porcentagem de possa avaliar quais ações podem ser consideradas positivas e
alunos de 4ª e 8ª série que têm um desempenho satisfatório em português e quais poderiam ser reorientadas, com o advento de uma nova
em matemática, conforme os critérios do Sistema Nacional de Avaliação da proposta de polltica educacional pública" 95 •
Educação Básica (Saeb)". 91 "Com este novo programa Escola Novo Milênio,
tentou-se até a re-ampliação do Telensino como forma de potencializar os Magnolia Said, do ESPLAR - Centro de Assessoria e Pesquisa, destaca
custos, mas esta proposta sofre grande oposição dos docentes, discentes e também o desconhecimento do poder Legislativo sobre essa problemá-
até de funcionários da administração", recorda Ximenes, do CEDECA. tica: "a Comissão de Educação da Assemblóia Legislativa também não
Outro principio da atuação do Banco que é ressaltado por Ximenes é o se preocupa, nem consegue entender a questão.ºª
da descentralização do sistema:

( ..) através da qual a escola passou a ter um papel central na


gestão e na resposta a problemas que não lhe diziam respeito
plenamente. Esta descentralização contou com o suportefun-
damental do Fundescola, com o envio de recursos diretamente
para as unidades escolares, desonerando-se assim a respon-
sabilidade da administração central. É muito característica
deste pertodo a frase 'O diretor faz a diferença', amplamente
reproduzida pelo ex-secretario de educação Antenor Naspolini.
( ..) Um dos aspectos positivos deste processo de descentraliza-
ção foi a implantação de eleição direta para direção em toda a
rede. Mas mesmo fortalecendo a democracia escolar, este pro-
cesso veio como justificativa para a des-responsabilização gra-
dativa do estado com a manutenção do parque escolar: uma
vez que seria mais fácil direcionar as cobranças ao represen-
tante eleito. Ademais o processo democrático não ultrapassou
o limite da execução da poUtica, pois permaneceu centralizado
o seu planejamento. 94

Ximenes aponta ainda que há mobilizações localizadas, por parte da


sociedade civil cearense, como no que se refere à resistência contra o fe-
chame~to de escolas, mas que, de modo geral, a mobilização não é forte.

92
BODIÃO, ldevaldo da Silva. op. cit., pp. 6-9 e 13.
93
Banco Mundial. ProjectAppraisal Document. Ceará Basic Education Quality lmprovement Project. op.
95
cit., 2000. Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. op. cit., 2005.
94 96
Entrevista da Ação Educativa com Salomão Ximenes. op. cit., 2005. Entrevista da Ação Educativa com Magnólia Said. Por Diego Azzi, março 2005.

t:;,') 1 n---- ........ .1: .. 1 nlAr'>,. Cli.U•,.. :....,,...,,..,.. ... ., .. nnlít:,..,c- .. ,.i,,,..,,..;,...,...,;C: BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 53
3. A Iniciativa Via Rápida na Espanha, Suécia, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos. Além disso, conta
com doadores multilaterais, dentre os quais o Banco de Desenvolvimento

América Latina Asiático (ADB), o Banco de Desenvolvimento Africano (AFDB), o Banco


Interamericano de Desenvolvimento (BID), agências do sistema ONU, tais
como UNAIDS, UNICEF, PNUD, UNESCO, e o Banco Mundial.
Dos 18 países que foram convidados a se beneficiar inicialmente da IVR,
sete iniciaram formalmente em novembro de 2002 (Burquina Faso, Guiné
Iniciativa Via Rápida - IVR (conhecida no âmbito internacional Bissau, Guiana, Honduras, Mauritânia, Nicarágua e Nigéria) e depois mais

A como Fast-Track Iniciative) foi lançada em abril de 2002 durante


reunião do FMI e do Banco Mundial, pelos Ministros de Desen-
volvimento e Finanças, com o objetivo de acelerar o alcance das Metas
oito países juntaram-se à iniciativa (Etiópia, Gâmbia, Gana, Madagascar,
Moldova, Moçambique, Vietnam, Iêmen), de modo que atualmente são 15
os países selecionados.
de Desenvolvimento do Milênio a partir de uma ação mais coordenada e Conforme documento de referência do Banco Mundial datado de março
eficaz de cooperação internacional. Especificamente, a IVR busca atingir de 2004, a IVR "trata de um novo contrato para o setor da educação que
três resultados: (1) a conclusão universal do ensino primário até 2015; (2) explicitamente estabelece uma ligação entre o aumento de apoio ao ensino
o acesso universal ao ensino primário até 2010 e (5) melhores resultados de primário por parte de doadores e o desempenho das políticas dos países
aprendizagem. A IVR é liderada pelo Banco Mundial, com o apoio da maior beneficiários".97 É importante relembrar que no contexto do IVR, das Metas
parte dos doadores bilaterais bem como das instituições do sistema ONU, do Milênio e de outros projetos do Banco Mundial, o ensino primário equi-
tais como Uncsco e Unicef. vale às séries iniciais do ensino fundamental brasileiro.
O Marco de Ação de Dacar. fruto da Cúpula Mundial de Educação para Para que se tornem aptos a solicitar recursos pela IVR, os países de
Todos, apresentava uma proposta para lograr uma mobilização de recursos baixo rendimento passam por um processo de análise rigoroso, condicio-
mais eficaz e coordenada: a chamada Iniciativa Global. Esta se propunha nado a processos relacionados ao FMI e ao Banco Mundial. Para obter o
a mobilizar os recursos financeiros necessários para atingir o conjunto de endosso da IVR, o pais deve antes receber aprovação de um documento
metas do Marco, uma vez que os signatários da Declaração de Dacar corro- que apresenta sua estratégia de redução da pobreza (conhecido no âmbito
boraram formalmente o comp1·omisso de que "nenhum país poderá deixar internacional como Poverty Reduction Strategy Paper - PRSP) e um Plano
de atingir as Metas de Educaç<io para Todos por falta de recursos financei- Setorial de Educação que tenha o aval de doadores nacionais e inclua
ros". No entanto, a iniciativa que de fato se concretizou após Dacar foi a estratégias para o combate ao HIV/AIDS, bem como em prol da promo-
IVR, mais restrita e focalizada que a Iniciativa Global, referenciando-se nas ção da igualdade de gênero. A IVR possui ainda um marco de referência,
Metas de Desenvolvimento do Milênio, também significativamente mais que apresenta os padrões almejados pela iniciativa no que diz respeito ao
reduzidas que as de Dacar. l\ lesmo com seu enfoque bastante reduzido, financiamento e à prestação de serviço do setor educacional, conforme
acabou recebendo aval e apoio das demais organizações que promoveram apresenta o quadro 4 a seguir. 98
a Cúpula Mundial de Educação para Todos, tais como Unesco e Unicef.
A IVR é gerenciada por uma co-presidência que funciona em regime ro-
tativo e é composta por um doador do G-8 (grupo dos oito países mais ricos
do mundo) e por outro doador de fora do G-8. Estaco-presidência é apoiada
por um comitê diretivo e por um secretariado localizado nas instalações do
Banco Mundial.
A princípio 22 doadores bilaterais (hoje são 23) foram convidados a
tomar parte na iniciativa, além de bancos de desenvolvimento e organis-
mos internacionais. Os doadores bilaterais são: Austrália, Áustria, Bélgica,
Canadá, Dinamarca, Comunidade Européia, Finlândia, Alemanha, Grécia,
Irlanda, Itália, Japão, Holanda. Nova Zelândia, Noruega, Portugal, Rússia, 97
Education For Ali Fast Track lnitiative - Framework Oocument. 2004. p. 1.
98
ldem, Anexo 1.

54 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto n.. s politicas educacionais


BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a JVR na Amêrica Latina 1 55
Quadro 4 - O marco de referência da iniciativa via rápida ternacionais dos doadores, uma vez que eles serão os maiores responsáveis
pela mobilização de recursos.
Indicadores
No entanto, não é isso o que tem ocorrido nas formulações dos projetos.
Mobilização de Recursos
Segundo relatório da ActionAid de 2005 99 , um dos principais problemas da
, .
---------·-··· ·--------···-·--·--·-----------------------
. ' '
------·----- IVR é a insuficiente comunicação no interior dos governos e das agências
---·--------------· --------·- ....·-····------·-----·--------··- --------------- doadoras, bem como entre estes, havendo também uma grande confusão no
. . '
. ' , que tange à divisão de responsabilidades entre governos e organismos inter-
Fluxo de alunos nacionais. Outra crítica é a falta de transpan\ncia do processo decisório.

---------· ---·-···-----·----·--·---·---·-···--------- --------------


, . O processo de diálogo com atores da sociedade civil também inexiste,
como afirma o mesmo relatório. O convite para a participação desses atores
-----------------------------·-- ------,-·--------------- --·-·· ·---·----------
nas negociações sobre a IVR visa mais a legitimação da proposta do que um
Prestação de serviços verdadeiro debate em torno do tema. Esse processo de afastamento da so-
-----------· --·-- - ------·----·---
--·---·----·······-----····~--·····-··--·-·-·-··----··--·
ciedade civil é um passo atrás em relação às decisões tomadas na reunião
-·-·--· ---------·--··---·-·-------------------·· -·------~··--·-·-- de Dacar.
Segundo o relatório da ActionAid Fightit1g Poverty together existia, em
----------------·--·-·-··-------- ------------
---·--·--··-·· ...-----·-·-·---·--···--·.....-·---·····--------- ··---------·-·----- 2005, uma lacuna de US$ 10 a 15 bilhões ao ano para que os países pobres
• 1 ' ' '•
pudessem atingir as Metas de Desenvolvimento do Milênio para educação
em 2015. O Banco Mundial havia estimado que seriam necessários US$ 1,8
Segundo Anne Jellema, coordenadora da Campanha Mundial pela Edu- bilhões para dar início à IVR para o primeiro grupo de 18 países, e mais
cação, durante o primeiro ano e meio da IVR havia muita hostilidade por US$ 5 bilhões anualmente assim que a iniciativa tivesse se expandido. No
parte dos doadores bilaterais. Estes se tornaram mais favoráveis após o entanto, segundo Anne Jellema, o conjunto dos atuais 15 países que par-
encontro que ocorreu em Oslo em novembro de 2005, quando foi acordado ticipam da IVR recebeu apenas um adicional de US$ 50 milhões, o que é
um modelo de funcionamento para a Iniciativa. Esse modelo determinava absolutamente insuficiente para implemenlar os planos aprovados pelos
que o Plano Setorial de Educação seria inicialmente submetido aos doa- doadores. Desse total, US$ 45 milhões vêm do Fundo Catalítico e, destes,
dores que já apoiavam o pais em questão e apenas se estes não conseguis- US$ 59 milhões são recursos da Holanda - que sequer faz parte do G-8.
sem aportar os recursos necessários seria submetido a outros doadores por Jellema ressalta que "os doadores que possuem uma visão mais holística
meio da IVR. Também foi acordado, logo após o encontro de Oslo, que seria de Educação para Todos são aqueles que colocam menos recursos na IVR.
instituído um Fundo Catalítico para garantir recursos temporários aos paí- Poucos doadores estão contribuindo significativamente, particularmente
ses que não conseguissem apoio dos doadores bilaterais que atuam no âm- Holanda, França e Reino Unido". Ainda com relação à problemática dos
bito daquele país. Este é de fato o único fundo da IVR e permite apoiar um recursos, um relatório da Campanha Mundial afirma que os doadores fize-
pais por um prazo máximo de três anos, de modo que este consiga alavan- ram ajustes a fim de reduzir os valores orçados nos planos. "O pior é que os
car seu desempenho no âmbito educacional e então lograr apoio de longo doadores deixaram de honrar até mesmo estes orçamentos reduzidos." 100
prazo. O Fundo Catalítico é administrado pelo Banco Mundial e conta com A Campanha Mundial pela Educação considera, segundo Anne Jellema,
recursos da Holanda, Noruega, Itália, Bélgica, Suécia e Reino Unido. que há outros dois graves problemas com a IVR, além dos recursos limi-
O processo de avaliação e endosso é conduzido no país e liderado pelos tados investidos até o momento. Em primeiro lugar, a Campanha acredita
representantes locais dos doadores bilaterais. Conforme as diretrizes do que o Poverty Reduction Strategy Paper não deveria fazer parte das condi-
Banco, durante a análise os doadores locais fazem uma avaliação crítica da cionalidades para que um país receba apoio financeiro, uma vez que esse
viabilidade e sustentabilidade do Plano Setorial e concluem se ele fornece
ou não uma "base sólida para um processo acelerado com vista ao ensino
99
primário universal". Essa análise deve incluir um exame de custos, finan- ACTION AIO. Fast Track or Back Track. The Education Fast Track lnitiative: Make break for Mon-
terrey Consensus. Abril 2003.
ciamento e execução do plano. Esse processo, embora realizado em nível 100
Global Campaign for Education Briefing Paper. Disponível em www.oxfam.org/eng/pdfs/
local, deve estar em permanente contato com as sedes dos organismos in- gce_030911 _no_O/oprog ress.pdf

C::~ 1 n ... - ..... &• .. -..1: .. 1 n&•r,., Cl•I.,.. :_..,. .... +... ..,,.,. ....... 11+:.,,.,,. .. ,.i,,., .. .,;..., .. ,.; .. BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paise· que integram a IVR na América Latina 1 57
documento incentiva particularmente a focalização no ensino primário.
com menos de US$ 1 por dia (2001) e 79,9% com menos de US$ 2 (2002). 104
Além disso, a Campanha estú em pleno desacordo com o indicador de refe-
Não têm acesso a água potável, 25% da população nicaragücnse, 75% não
rência, que estabelece um tl'lo salarial para professores. Segundo Jellema,
habita áreas com saneamento básico e a mortalidade infantil ronda as 55
esses indicadores foram elaborados por pesquisadores do Banco Mundial
mortes por 1.000 nascimentos. 105 Esses índices colocam a Nicarágua tam-
que estudaram países que tiveram bom desempenho nas metas de Edu-
bém no grupo dos países com menor desenvolvimento social do mundo.
cação para Todos nos últimos dez anos. No entanto, a Campanha acredita
O país ainda detém o mais alto nível de dívida externa per capita do
que se outro conjunto de países tivesse sido utilizado, outro conjunto de
mundo - US$ 1.500 por habitante - e a maior proporção dívida-PIB. A si-
indicadores teria sido desenvolvido.
tuação vem melhorando anualmente após a entrada do país no programa
Atualmente, os países da América Latina e Caribe que participam da
HIPC (Heavly Indebted Poor Countries), mas os gastos com serviços da
IVR são Honduras, Guiana 1· Nicarágua. A situação de cada um deles será
dívida ainda estão em níveis excessivamente altos. A dívida externa nica-
exposta nos tópicos seguintes. Também a Bolívia havia iniciado o processo
ragüense, que soma US$ 6,5 bilhões (2004), 106 poderá ser aliviada em 80%,
para ingressar, mas este não foi levado adiante quando houve mudança de
segundo o FMI, após a adesão do país ao programa HIPC em 2004. 107
governo, em novembro de Q002. No entanto, na reunião da IVR que ocor-
A Nicarágua, como muitos outros países da América Latina, passou por
reu em Brasília em novembro de 2004, a Bolívia foi apresentada como um
reformas no sistema educacional nos anos 1990. A tônica era a modificação
país pronto para ingressar na Iniciativa já em 2005. Veja na Tabela e nos
curricular e a reorganização da gerência educativa, incluindo descentrali-
Gráficos do Anexo 2 a evolução de alguns indicadores educacionais desses
zação do sistema educacional e autonomia das escolas. 108 O país apresen-
três países.
ta indicadores educacionais muito aquém do razoável: 24% da população
adulta é analfabeta (2002), e o tempo de permanência na escola é de somen-
te 4,6 anos, para uma média de 6 anos em países em desenvolvimento. 109
Nicarágua No nível primário se matriculam 108,5% (2002), o que indica distor-
ção série-idade. Além disso, o país detém uma das mais baixas taxas de
Cenário conclusão do curso primário da América Latina - somente 58,5% dos que
se matriculam. No nível médio o índice de matrícula é de somente 60,7%
A Nicarágua é um país localizado a oeste da América Central, tendo (2002). Aos que se matriculam, a qualidade do ensino é baixa. Em 2002,
Honduras ao norte e a Costa Rica ao sul. A população atinge os 5,1 mi- 70% dos alunos da 6ª série atingiram somente o nível básico em língua e
lhões de pessoas (2000), sendo eurameríndios 69%, europeus ibéricos 17%, 80% obtiveram a mesma avaliação em matemática.1 1º No nível superior a
afro-americanos 9% e ameríndios 5% (1996). A Nicarágua é um dos quatro taxa de matrícula cai para 18,5% (2002). Pesa ainda, para a construção do
países latino-americanos que ainda sustentam crescimento populacional cenário educacional nicaragüense, o fato de os altos gastos com serviços da
superior a 2% ao ano. 1º1 Sua economia tem como base a agricultura, que dívida externa impedirem o país de investir mais do que 5,1% do seu PIB
produz 55% do PIB, a indústria, que gera 25%, e o setor de serviços, que no setor educacional.1 11
gera 44% (2000), 1º2 tornando-se a principal atividade econômica do país. Um estudo da Organização Internacional do Trabalho constatou que a
A população economicame11te ativa do país chega a 1,7 milhão e cerca de Nicarágua é o segundo pais onde os professores mais trabalham. O salário
25% encontra-se desempregada (2001).1°'
Além dos níveis de desemprego alarmantes, os piores indicadores so-
,.. Fonte: UN - Human Development Reports- http://hdr.undp.org/statistics/data/indic/indic_24_2_ 1.
ciais da América Latina são os da Nicarágua: 45,12% da população vive html.
5
" Fonte: Idem.
• Fonte: www.nicanet.org/global/hipc.php.
10

107
'º'Os outros três países são: Guatemala. Honduras e Bolívia. Fonte: ARANCIBIA, Juan. Informe preli- Fonte: Idem.
1
minar sobre la situación de la Educación en América Latina. Elaborado para la IEAL (Marzo de 2003), º' Fonte: Unesco.
V conferencia de la Internacional de la Educación para América Latina, realizada em San Jose, Costa 'º' Fonte: Banco Mundial http://devdata.worldbank.org/edstats/SummaryEducationProfiles/Coun-
Rica, 01-04 de Abril de 2003. tryData/GetShowData.asp?sCtry=NIC Nicarágua.
102
Fonte: www.faqs.org/docs/factbook/geos/nu.html. "º Fonte: http://portal.unesco.org/education/en/ev.php-URUD=35963EtURL_DO=DO_TOPICEtURL_
103
Fonte: Idem. SECTION=201.html.
111
Fonte: W\'JW.oxfam.org.uk/what:..we_do/issues/debt_aid/debt_nicaragua.htm.

58 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 59
médio de um professor primário nicaragüense variava entre US$ 40 e US$ 1. Alta qualidade dos docentes;
60 mensais em 1998. 112 Salários baixos e jornadas exaustivas levam a gran- 2. Reformulação de currículo escolar;
des taxas de absenteísmo e à conseqüente queda na qualidade do ensino. 3. Promover educação participativa;
4. Garantir o envolvimento da comunidade nos programas educacio-
A Iniciativa Via Rápida nais do governo nicaragüense. 116

A Nicarágua faz parte do grupo inicial de sete países que foram apro- Além dos recursos da IVR, em setembro de 2004 o Banco Mundial apro-
vados para ingressar na Iniciativa Via Rápida. Após ajustes feitos pelos do- vou outros US$ 15 milhões para a implementa~·ão do plano de política edu-
adores, a soma de recursos aprovados foi de US$ 65 milhões, distribuídos cacional. Esses recursos, diferentemente dos US$ 7 milhões da IVR, não
conforme o quadro a seguir. entraram nos cofres nicaragüenses como doa~'iio, mas sim como emprés-
timo a juros zero que deve ser pago em até 40 anos. 117 O acordo estabelece
Quadro 5 - Negociação Orçamentária da IVR na Nicarágua 113 quatro objetivos centrais.

1. Fortalecer a administração do Ministério da Educação;


2. Melhorar a geração de dados estatísticos sobre educação no nível central,
municipal e nas escolas, assim como prover subsídios para que os muni-
cípios forneçam suporte administrativo e pedagógico para as escolas;
3. Implementar um sistema de avaliação dl' desempenho escolar para
alunos e professores, a fim de assegurar a qualidade da educação
além de auditar sistematicamente as matrículas nas escolas para ga-
rantir melhor alocação de recursos de acordo com a demanda;
4. Auxiliar na implementação do programa dt~ autonomia escolar que pro-
vém fundos para escolas administradas por conselhos de pais. 118
(Em milhóõ dt dóJ~rttl
Similarmente a outros países que fazem parte do programa IVR, os prin-
No entanto, o país recebeu o primeiro lote de recursos no total de ape- cipais objetivos na Nicarágua visam o cumprimento da meta do milênio
nas US$ 7 milhões, do Fundo Catalítico, COJll o objetivo de garantir o cres- que concerne à educação primária universal até 2015:
cimento da taxa de conclusão do curso primário de 38,5% para 42% até
2006. 114 Como nos outros contratos de assinatura da IVR, os doadores exi- 1. Prover fundos para aumentar a cobertura da escola pré-primária e para
gem relatórios periódicos sobre os avanços das políticas e um exame deta- um projeto piloto de incorporar estudantes pobres de 4° a 6° séries;
lhado sobre a aplicação dos recursos. 115 2. Incentivar o treinamento de professores e prover condições de traba-
Os Estados Unidos assinaram um acordo bilateral com a Nicarágua lho, incluindo moradia, bem como garantir material didático, classes
para ajudar a implementar a IVR. Nesse sentido, o USAID investiu US$ 4 e bibliotecas nas escolas e reabilitar a infra-estrutura escolar já exis-
milhões em 2004, para assegurar assistência técnica para a implementação tente. Além disso, implementar um sistema de incentivos salariais
dos recursos provindos da IVR no que tange a: por desempenho de professores e diretorl's.

112
Fonte: Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina e Caribe - PREAL http://
www.cpdoc.fgv.br/projetos/a rq/Prea l_Doc2 l .pdf 116
Fonte: www.usaid.gov/policy/budget/cbj2005/lac/pdf/524-023.pdf
113
Fonte: Global Campaign for Education Briefing Paper. Education for All Fast Track: The No- 117
Fonte: Banco Mundial http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/COUNTRIES/LACEXT/NICARA
Progress Report, 11 de Setembro de 2003. www.oxfam.org.uk/what_we_do/issues/education/down- GUAEXTN/O.,contentMDK:20249 472-menuPK:258694-pagePK :141137-piPK:l 41127-theSitePK:25
loads/gce_noprogress.pdf. Tradução Livre: Renato Bock 8689,00.html.
114 118
Fonte: Banco Mundial - www.worldbank.org/education. Fonte: Banco Mundial http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/NEWS/O.. contentMDK:20249
115
Fonte: Dutch Grant for Education For Ali - Fast Track lnitiative. Gran Number TF053991, 2004. p. 4. 472-menuPK:34465-pagePK:64 003015-piPK:64003012-theSitePK:4607,00.htm.

601 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais


metas de inflação e de compromisso fiscal estabelecidas pelo FMI. Não se
3. Financiar a modernização do sistema educacional criando conse- pode investir em políticas educacionais e em incentivos salariais a professo-
lhos escolares e formando diretores. 119 res se o FMI exige que o orçamento fique engessado pelas metas de controle
de gastos. Assim sendo, há uma nítida contradição entre a IVR - que visa
Segundo o Banco Mundial, os resultados em nível local já podem ser atingir metas educacionais - e as exigências impostas pelo FMI para lograr
sentidos. Conscientizando-se de que a educação é fundamental ao desen- o alívio da dívida - as quais impõem restrições a investimentos sociais para
volvimento, sua previsão é de que a Nicarágua será o pais da IVR cujo go- que metas de inflação sejam mantidas baixas. Dessa forma, a difícil missão
verno aumentará o orçamento da educação de forma mais contundente. dos dirigentes nicaragüenses é lutar para que um dos dois lados ceda: que o
O Banco também afirma que os fundos iniciais da IVR ajudaram o país a FMI flexibilize suas metas ou que o seu cumprimento não seja exigência para
colocar 70 mil crianças dt· 6 anos na escola, a expandir e atualizar a estru- continuar recebendo recursos para a educação e alívio na dívida externa.
tura de qualificação dos professores, além de ter conseguido aumentar o Outro aspecto que merece reflexão diz respeito aos financiamentos comple-
número de crianças que recebem uma refeição diária na escola de 200 mil mentares à IVR, sendo um deles um empréstimo do Banco, com suas respecti-
em 2004 para 800 mil em 2005. 12º vas condicionalidades. Ainda que este seja um empréstimo sem juros, está longe
No entanto, uma primdra questão a destacar é que, do total de US$ 65 de compor o cenário de incremento da cooperação internacional tão almejado e
milhões, apenas US$ 7 milhões foram recebidos, o que certamente vem com- prometido durante a Cúpula Mundial de Educação para Todos em Dacar.
prometer a execução das metas acordadas na IVR. Além disso, como vere-
mos nos outros países lati no-americanos integrantes do Programa, dedicar
esforços e recursos somente à educação primária é uma grave limitação.
Ademais, receber o alívio em 80% da sua dívida, como prometido quan- HONDURAS
do da adesão ao programa HIPC, se faz necessário para que efetivamente
sejam colocados em prática programas e políticas que qualifiquem a edu- Cenário
cação no pais e que poderiam ser um mecanismo mais eficaz que a própria
IVR. Nesse sentido, a Oxfam redigiu uma proposta para acelerar o alívio Honduras é um país da América Central, com cerca de 6,2 milhões de
da divida externa nicaragüense, calculando-se que se o país recebesse um habitantes, situado entre El Salvador, Nicarágua e Guatemala. Juntamente
alívio de US$ 500 milhões poderia: com Bolívia, Guatemala, Nicarágua e Paraguai, apresenta uma das mais
altas taxas de crescimento populacional da América Latina, acima de 2% ao
1. Prover educação primária para todos; ano, o que significa uma população jovem, em idade escolar, muito gran-
2. Construir 1.500 classes de pré-escola; de. 121 Dois terços da população economicamente ativa se dedica à agricul-
3. Reabilitar 500 escolas; tura, sendo essa a principal atividade econômica do país. 122
4. Aumentar o nível de conclusão no nível primário de 34% para 70%; O pais enfrenta problemas comuns a países da América Latina: gtande
5. Promover acesso à saúde primária para 1,2 milhões de pessoas; crescimento populacional, inflação, falta de serviços básicos, setor público
6. Levar água para 600 mil pessoas nas áreas rurais; pouco eficiente, alta dependência das exportações, especialmente de bana-
7. Prover saneamento básico para a totalidade da população. na e café, assim como índices de desenvolvimento social alarmantes. Os
desempregados somam 28% da população economicamente ativa, e 53%
Ao mesmo tempo, é necessário que o FMI flexibilize suas exigências da população vive abaixo da linha de pobreza, o que o torna um dos países
quanto aos ajustes fiscais. Reclama o governo que o pacote de medidas im- mais pobres da América Latina. 125
posto pelo FMI para sanear as contas nicaragüenses deveria ser flexibilizado. 121
ARANCIBIA, Juan. Informe preliminar sobre la situoción de lo Educoción en Américo Latino, Elabo-
De nada adiantaria mobilizar recursos e não poder investi-los em programas rado poro la IEAL (Marzo de 2003), V conferencia de la Internacional de la Educación para América
sociais (como a partir da própria IVR) se isso fizer a Nicarágua extrapolar as latina, realizada em San Jose, Costa Rica, 01-04 de Abril de 2003.
122
Fonte:www.guiadelmundo.com/paises/honduras/economia.html http://portal.unesco.org/educa-
tion/en/ev.php-URL_ID=21912EtURL_DO=DO_TOPICEtURL_SECTION=201.html
123
'" Fonte: Banco Mundial http ://web. worldba nk.org/externa l/projects/ma in ?pagePK= 10423 lapiPK= 7 Fonte: www.guiadelmundo.com/paises/honduras/economia.html e www.indexmundi.com/pt/
3230EttheSitePK=40941 Etmen uP K,,228424EtProjectid=P050613. fatos/2003/honduras/taxa_de_desemprego.html
120
Fonte: http://www1.worldbank.org/education/efafti/faq.asp.

BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 63
62 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais
Um dos grandes entraves ao desenvolvimento hondurenho, assim como blema de suma importância para a educação hondurenha é o absenteísmo
em outros países da América Latina, é a dívida externa. São US$ 4,3 bilhões, dos professores, que ronda os 50%. 132
que representam 61% do PIB ou ainda 122% da receita fiscal do pais, ou Em 1998 o furacão Mitch assolou o pais, contribuindo diretamente para
seja, 22% a mais do que o país arrecada anualmente com impostos. Em a piora do problema educacional. Foram 250 mil alunos da escola primária
2002, o país foi aceito pelo FMI como membro do HIPC - Heavly Indebted e 30 mil do ensino médio que ficaram sem acesso ao ensino, enquanto a
Poor Countries, 124 acenando com a promessa de aliviar a dívida externa em maior parte dos arquivos do Ministério da Educação foi destruída. 133
US$ 556 milhões. Já tendo elaborado um programa de alívio à pobreza, o
PRSP (Poverty Reduction Strategy Paper125), condição para que um país seja A Iniciativa Via Rápida
membro do Programa HIPC, Honduras também se tornou elegível a aderir
à IVR e, de fato, foi o primeiro país latino-americano a ser aprovado pelo O plano chamado "Todos con Educación dP Calidad" foi elaborado para
Banco para receber os recursos do Programa. viabilizar o ingresso de Honduras na Iniciativa Via Rápida - o que veio a
Em relação à situação educacional, a IVR chega ao país num momento em se concretizar em novembro de 2002, ainda que o memorando oficial tenha
que, com 4% do PIB destinado para educação (2000), 126 somente dois terços das sido firmado apenas em outubro de 2003. O objetivo principal deste plano
crianças completam a escola primária, mais de 130 mil, entre 6 e 12 anos, estão é reduzir o déficit educacional e acelerar o caminho em direção ao cumpri-
fora da escola, 20% não possuem dinheiro sequer para comprar caderno, lápis, mento da Meta do Milênio, que trata de assegurar educação primária para
roupas e sapatos para ir à escola e 25% das mulheres são analfabetas. 127 todos até 2015. O montante de recursos total acordado pelos doadores, já
A taxa de alfabetização atingia 80% da população acima de 15 anos em após terem feito ajustes, foi de US$ 78 milhões. conforme mostra o quadro
2001, sendo um marco na história do pais, que em 1985 possuía somente abaixo. Vale ressaltar que, diferentemente da Guiana e da Nicarágua, os
64,2% da população alfabetizada. Os anos de escolaridade subiram de 4,1 recursos para Honduras não estão previstos para sair do Fundo Catalítico e
em 1985 para 4,8 em 2001, mas ainda há muito a ser feito. 128 As matrículas sim de acordos com Alemanha, Suécia, EUA, Canadá e Japão. 131
na escola primária atingiram em 2001 o índice de 105,8%, Já as taxas de No entanto, segundo relatório do Fórum Social da Divida Externa e Desen-
matrícula no nível médio reduzem-se a 32,1% da população da faixa etária volvimento de Honduras, dos US$ 44 milhões prometidos para os 18 primeiros
escolar em 1995 enquanto em 1985 eram de 37,2% 129• Além disso, o desem- meses de implementação do projeto, apenas 500/o foram recebidos. 135
penho dos alunos da 6ª série em matemática e línguas foi baixíssimo em O presidente hondurenho Ricardo Maduro se pronunciou quando da
90% dos casos, mostrando que o objetivo fixado em Jomtiem 150 em 1990, assinatura do acordo, afirmando a prioridade que deveria receber a educa-
de que ao menos 800/o dos alunos alcançassem o ano 2000 com um nível ção na agenda política de seu governo. m O governo hondurenho se com-
mínimo de resultados em leitura, não foi cumprido em absoluto. 131 Um pro- promete a utilizar os recursos da IVR para cumprir os seguintes objetivos
do Memorandum firmado em 14 de outubro de 2003:
'" Fonte: www-ni.laprensa.com.ni/archivo/2005/abril/06/elmundo/elmundo-20050406-01.html
125 Um PRSP - Poverty Reduction Strategy Paper descreve as políticas e programas do governo de um
132
país no que tange a macroeconomia, infra-estrutura e social para promover o crescimento e reduzir Fonte: UNESCO http://portal.unesco.org/education/en/cv.php-URL_I D= 10075EtU RL_DO=DO _
a pobreza. Também faz parte de um PRSP um relatório sobre as necessidades de financiamento ex- TOPICEtURL_SECTION=201.htm 1
terno. Os PRSPs são preparados por governos de forma participativa, envolvendo na sua confecção, m Fonte: UNICEF, 1999 in http://portal.unesco.org/educa tion/fr/ev.php-URL_ID= 15621 EtURL_
a sociedade civil, e parceiros financiadores de desenvolvimento, incluindo o Banco Mundial e o FMI. DO=D0_TOPICEtURL_SECTION=201.html
134
(Fonte: Banco Mundial http://web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/NEWS/O.. contentMDK:2007808 No Encontro de Oslo, em novembro de 2003, foi lançado pelo Banco Mundial e pelos paises
90/o7EmenuPK:344630/o7EpagePK:34370º/o7EpiPK:344240/o7EtheSitePK:4607,00.html doadores do FTI o Fundo Catalitico. Foram depositados inicialmente no fundo US$ 235 milhões,
12 6 Fonte: Banco Mundial http://devdata.worldbank.org/edstats/SummaryEducationProfiles/Coun- provindos da Holanda, Noruega, Itália e Bélgica, para serem sacados pelos países beneficiados entre
tryData/GetShowData.asp?sCtry=HN D.Honduras 2004 e 2007. Os recursos devem ser entregues a países do FTI que não lograrem acordos bilaterais de
127 Fonte: Oxfam - www.oxfam.org/eng/programs_camp_education_honduras_casestudy.htm financiamento educacional, para que eles possam iniciar a implementação de seus programas de re-
12• Fonte: Banco Mundial http://devdata.worldbank.org/edstats/SummaryEducationProfiles/Coun- forma educacional. Seis países do FTI receberam em 2004 um total de US$ 35 milhões. O lêmen US$
tryData/GetShowData.asp?sCtry=HN D.Honduras) 10 milhões, Niger US$ 8 milhões, Nicarágua US$ 7 milhões, Guiana US$ 4 milhões, Gâmbia US$ 4
129 Fonte: Banco Mundial http://devdata.worldbank.org/edstats/SummaryEducationProfiles/Coun- milhões e Mauritânia US$ 2 milhões. Fonte: Banco Mundial http://wwwl.worldbank.org/hdnetwork/
tryData/GetShowData.asp?sCtry=HN D.Honduras efa/DONORSO/o20MEETING/Novº/o2020/Press0/o20release0/o2024%20 november.pdf
135
''°Cidade na Tailândia onde se realizou a Conferência Mundial sobre Educação Para Todos (EFA) no ano de 1990. Fonte: Foro Social de deuda externa y desarollo de Honduras, 2004, p. 6
136
131 Fonte: UNESCO http://portal.unesco.org/education/fr/ev.php-URL_ID=38271 EtURL_DO=DO_ Fonte: Secretaria de Educación de Honduras www.se.qob.hn/html/index.php?a=NewsEtid_
TOPICEtURL_SECTION=201.html news= 17Etid_cate= 10

641 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que •nteqram a IVR na América Latina 1 65
1. Modernização da estrntura do sistema educacional; Além do requisito de desenvolver políticas contra a pobreza, outra exi-
2. Aumento da cobertura, relevância e qualidade da educação; gência do Banco Mundial para a concessão da IVR foi o investimento em
3. Reforço da particip<H,,ão da comunidade e descentralização da edu- estatística e informação, principalmente sobre educação. Para cumprir a
cação, exigência, a Secretaria de Educação de Honduras, apoiada pela UNESCO,
4. Promoção de uma maior eficácia na educação superior; criou um sistema de estatísticas educativas incluindo um registro nacional
5. Apoio a processos de inovação no setor de educação não-formal. de estudantes e um sistema de Planificação Educativa Georreferenciado,
conhecido como mapa educativo. 159
QUADRO 6: Negociação orçamentária da IVR em Honduras 137 Vale notar que, similarmente ao que foi descrito para a Nicarágua, para
o cumprimento das metas da IVR em Honduras é critico o fato de que so-
mente 50% dos US$ 44 milhões iniciais do acordo tenham sido entregues ao
Necessidades financeiras especificadas', 21,5 34,4 30,.1 . 86,1 pais, bem como o fato de o alivio na divida externa ter sido suspenso. 140
na proposta do IVR Outra questão grave envolve os salários dos professores. Para voltar a
Necessidades financeiras ajust<Jdas pelos doadores 12 34 32 78
receber alivio na divida externa, Honduras terá que implementar a con-
Comprometimento dos doadores doadores: tento outro programa de um ano junto ao FMI. Ironicamente, além de ter
Suécia 3,0 3,0 2,Q 8,0
Alemanha o 2,5 2,5 5,Ó
que cumprir as metas de ajuste fiscal e de inflação preceituadas, no caso
Eua 2,0 o o 2,0 de Honduras a instituição exige especificamente que se congele o salário
Canada o 3,0 35,0 6,0
Japão 5,0 5,0 5,ci 15,0 dos professores, os quais considera excessivamente elevados. 141 Segundo
IDA 10,0 14,5 12,5 '37,0 o relatório do Fórum da Dívida Externa e Desenvolvimento de Honduras,
Total
'Diferença financeira em relação à proposta à IVR 11,5 19,9 17,6 49,i tanto o FMI quanto o Banco Mundial têm repetido inúmeras vezes que os
professores têm remuneração excessiva.
Necessidades financeiras ajustadas pelos doadores 2,0 19,5 19,5 41,0 Ainda segundo esse relatório, um professor primário recebe por volta
(Emmi!hõesdedõlar~J de US$ 250 por mês. Tendo em conta a desvalorização da moeda local - a
lempira - frente o dólar, um professor primário ganha hoje menos do que
O Memorando foi assinado pelo Canadá, Alemanha, Japão, Suécia e ganhava em 1989. Naquela época o salário médio era de US$ 286. A cesta
Estados Unidos, bem corno pela Organização Educacional, Científica e básica no país custa em torno de US$ 200, o que demonstra a precariedade
Cultural lberoamericana, o llnicef, o Banco Mundial e o Programa Mun- da vida do professor primário num pais onde se exige o congelamento dos
dial para Alimentação. salários da classe.
Sobre ele o secretário da educação hondurenho, Roberto Martinez Lo- Dessa forma, a situação real do pais encontra um impasse arranjado
zano, declarou em 11 ele março de 2004: pelos órgãos multilaterais. Se o governo implementar o arrocho fiscal e
as medidas recessivas, deixa de investir em políticas sociais bem como no
O Plano Todos com Educação de Qualidade (EFA) pretende salário dos professores, dificultando o cumprimento das metas contidas no
desenvolver até 2015 um ensino e uma aprendizagem de me- memorando da IVR. Por outro lado, se promover políticas sociais efetivas,
lhor qualidade no sistema educacional, universalizar um ano programas de capacitação e valorização do professor, certamente não cum-
do nível pré-básico; rnmbater a deserção, a repetência, a distor- prirá as metas do FMI e perderá o alívio na dívida externa, tão necessário
ção série-idade e tomar mais efetica a obrigatoriedade da Edu- para tecer essas mesmas políticas.
cação Básica bem cumo melhorar o rendimento escolar.138 Vale ressaltar que os gastos com serviços da dívida retiram de circu-
lação fundos que poderiam ser aplicados em políticas sociais efetivas: fo-
137
Fonte: Global Campaign for EducJtion Briefing Paper. Education for Ali Fast Track: The No-
Progress Report, 11 de Setembro de 2003. ns Fonte: Idem
www.oxfam.org.uk/what_we_do/issttes/education/downloads/gce_noprogress.pdf. "ºFonte: Foro Social de deuda externa y desarollo de Honduras. 2004.
Tradução Livre: Renato Bock 141
Fonte: Oxfam - www.oxfaminternational.org/eng/campaigns_camp_education_honduras_cases-
na Fonte: Idem tudy.htm

66 I Banco Mundial, OMC e FMI: o impa··to nas políticas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos paises que integram a IVR na América Latina 1 67
ram US$ 247,9 milhões entre 2002 e 2005, enquanto o gasto estimado com 55% dele conseguido com a agricultura. A indústria se ocupa de 52% e os
políticas sociais estava em torno de US$ 400 milhões anuais. Além disso, serviços de 55% da economia (1998). 146 O Produto Interno Bruto vem enco-
o Furacão Mitch, ocorrido em 1998, gerou perdas materiais da ordem de lhendo a taxas de 2% ao ano. Com isso, é tarefa cada ve:i; mais difícil gerar
US$ 5,0 bilhões, aproximadamente 70% do PIB, o que agravou ainda mais a empregos para os 560 mil trabalhadores que formam a população econo-
situação econômica e social de Honduras. 142 micamente ativa do país e que desde 1994 lidam com uma taxa de 9,1% de
Representantes da sociedade civil elaboraram um documento ao final desemprego ao ano (2000). 147
do Fórum Social da Dívida Externa e Desenvolvimento de Honduras em Guiana foi o quarto país aceito no programa H IPC (Heavly Indebted Poor
2004, com cinco recomendações para a superação do atual impasse: Countries) do Banco Mundial e do FMI. No Programa, credores concorda-
ram em reduzir a dívida externa do país a um quarto, ou algo em torno de
1. Honduras perdeu dois anos na implementação de seu PRSP em razão US$ 255 milhões. Cerca de 45% do PIB anual é gasto com serviços dessa
da falta de aprovação da redução da dívida externa pelo FMI. dívida. Com essa iniciativa os recursos economizados devem ser transferi-
2. Dados os choques externos que a economia hondurenha enfrentou, e dos para políticas de redução da pobreza. Para fazer parte do Programa, o
objetivando a implementação das PRSPs, o país deve receber o alívio governo guianense teve que elaborar o Guyana l'overty Reduction Strategy
na dívida assim que possível. Dessa forma, serão assegurados recur- Paper (GPRSP), e parte desse documento traz mt~didas para o aumento na
sos novos para a sua economia. qualidade da educação no país. O escopo da educação no GPRSP é signifi-
5. Honduras não deve ser condenada por não ter cumprido as metas fis- cativamente mais amplo que na IVR. 148
cais do FMI. Ao contrário, recomenda-se que o órgão assegure metas No que diz respeito à educação, alguns indicadores nos conduzem a um
mais flexíveis e realistas. panorama geral da educação na Guiana. No ano de 2002, 8,4% do PIB foi
4. O FMI não deve, nem indiretamente, se envolver em questões civis. gasto na área educacional. 14" Os adultos têm em média 6,2 anos de estudo,
Deve, sim, aplicar-se na reforma das políticas fiscais para que elas e a taxa de matrícula no nível primário foi de 124,8% em 2002. Esses dados
sejam menos recessivas. nos mostram que, além dos estudantes em idade de freqüentar a escola pri-
5. Doadores bilaterais que se comprometeram a enviar fundos para finan- mária, estão se matriculando pessoas fora da faixa et.1.ria e/ou que as taxas
ciar a educação devem efetivamente disponibilizá-los imediatamente. 143 de repetência são altas. A taxa de matrícula no nh el médio cai para 92,4% e
no nível superior atinge somente 6,1% dos habitantes dentro da faixa etária
para este nível de ensino. 150 Em termos da proporção quantidade de alunos
Guiana por professor, o ensino primário na Guiana conta com um docente para cada
26 alunos. No nível médio o número cai para 19,4 alunos por professor. 151
Cenário Segundo o Ministério da Educação, o desenvolvimento educacional
passou por quatro fases distintas:
A Guiana é um país situado ao norte da América do Sul que faz fronteira
com o Suriname, a Venezuela e o Brasil. A população guianense não ultrapassa
os 760 mil habitantes (2004), sendo constituída em sua maioria de indianos
(49%) e negros (52%). Mestiços formam 12%, e os ameríndios, 6%. Descenden-
146
tes de europeus e chineses compreendem 1% da população (2000). 144 147
Fonte: Banco Mundial - www.worldbank.org/data/countrydata/:iag/guy_aag.pdf
Em torno de 55% da população vive abaixo da linha de pobreza, segun- Fontes: Agência Central de Inteligência - CIA (www.cia.gov/cia/publications/factbook/geos/
gy.html#Econ), Organização Internacional do Trabalho - Caribe lwww.ilocarib.org.tt/system_links/
do o Banco Mundial. 145 A economia produz um PIB de US$ 740 milhões, link_databases.html) e Ministério das Relações Exteriores do Brasil (www.mre.gov.br/portugues/poli-
tica_externa/temas_agenda/narco_trafico/guiana.asp).
142 148
Fonte: Foro Social de deuda externa y desarollo de Honduras. 2004, p. 5. Banco Mundial web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/COUNTRIES/LACEXT/GUYANAEXTN/O.. cont
143
Fonte: Foro Social de deuda externa y desarollo de Honduras. 2004, p. 8. entMDK:20018704~menu PK:328296~pagePK:l 41137~piPK: 14112 7~theSitePK:328274,00.html
149
144 Fonte: Banco Mundial http://devdata.worldbank.org/edstats/SummaryEducationProfiles/Coun-
Fonte: Central lntelligence Agency (CIA). Disponível em www.cia.gov/cia/publications/factbook/
geos/gy.html#Econ tryData/GetShowData.asp?sCtry=GU Y,Guyana
145
Fonte: Banco Mundial. Disponível em www.worldbank.org/cgibin/sendoff.cgi?page=O/o2Fdata0/o2F ''ºIdem
countrydata0/o2Faag0/o2Fguy_aag.pdf 151
Idem

fiR 1 R~nrn M11nrfü~I nMr,. FMI· n imn:lrtn n::ric nnlitir::ric Prhrr::ririnn:lÍC BM em foco: sua atuac-An n;a Prl11r;ar::in hr::icilPir-::J,. n'3 ~l'\t " ... ;,..,. ......... ; ..... - .... - - nm -- "-· :.• .. ' .. 1 c:o
1966 - 1976: Desenvolvimento de um currículo para indígenas e expan- Para enfrentar os desafios colocados, o governo da Guiana desenvolveu
são das oportunidades educacionais. um Plano Estratégico Educacional (Education Strategic Plan - ESP) 2003-
1976 - 1990: Educação µ:ratuita e extensão da oportunidade de acesso. 2007 com o objetivo principal de, até 2015, garantir 11 anos de educação bá-
1990 - 1995: Eqüidade no acesso à educação e aumento da capacidade sica a toda a população guianense - o que inclui um ciclo de cinco anos de
de produzir mão-de-obra qualificada para o futuro econô- ensino secundário. Além desse plano abrangente, existem outros dois, que
mico da nação. abordam a questão da educação: a Iniciativa Via Rápida, focada no ensino
1995 - 2000: Educação µ:ratuita do berçário aos 16anos. 152 primário e aprofundada a seguir, e o já mencionado GPRSP.
O GPRSP aponta a educação como um dos principais componentes da
Apesar de o panorama 1~ntre os anos 1966 e 2000 demonstrar uma me- redução da pobreza e por isso a indica como prioridade nacional. O Progra-
lhora significativa no cenário educacional do país, a presente situação não ma apresenta a educação não só como meio de aumentar o capital humano
está consolidada e pode comprometer a taxa de analfabetismo de 2% alcan- guianense, mas como parte da própria definição de pobreza, e afirma que
çada durante esse período.' ' 3 "se os guianenses desejam vencer a pobreza precisam aumentar o nível de
Segundo o Ministério da Educação, uma questão crítica na Guiana é a educação formal e informal". 156
relativa aos professores. Salários baixos e precárias condições de trabalho Um dos desafios para o Ministério da Educação é integrar melhor essas três
fazem que estes optem por uma aposentadoria precoce, havendo conse- iniciativas. A necessidade de revisar o GPRSP em 2005 e de iniciar um processo
. - 157
qüentemente escassez de professores bem qualificados, os quais acabam para elaborar um novo ESP pós-2007 po de favorecer essa mtegraçao.
por procurar melhores oportunidades em outras regiões do Caribe.
O Ministério reconhece ainda o diagnóstico feito por representantes da A Iniciativa Via Rápida
sociedade civil, que constatam um cenário bastante desfavorável no que
diz respeito à qualidade: "as taxas de aprendizagem nas escolas são extre- A Guiana submeteu o documento intitulado Educationfor Ali: Fast Tra-
mamente baixas; uma grande quantidade de professores é mal qualificada; ck Jnitiative Country Proposal ao Secretariado do EFA em setembro de 2002.
há uma taxa alarmante de absenteísmo de professores e de alunos; e a taxa O Plano foi aceito e endossado pelos doadores que provêm assistência edu-
de analfabetismo funcional ó alarmante". Segundo esses representantes, "o cacional à Guiana juntamente como o secretariado do EFA. Ele contempla
sucesso da Guiana em atinµ;ir acesso universal ao ensino primário erodiu e o ensino primário, buscando suprir o hiato financeiro que existe para o
foi substituído por crescentt~s taxas de repetição e evasão". 154 cumprimento da meta de conclusão universal desse nível de ensino até
Ainda segundo o Ministério, as razões de uma qualidade educacional 2015. O Plano prevê o envio de US$ 45 milhões entre 2003 e 2015, conforme
ínfima no país são muitas. Um período prolongado de restrições financei- apresentado no Anexo 2. 158 Para os anos 2004 e 2005, os fundos deverão sair
ras e cortes no orçamento geraram resultados adversos. Um desestimulo do Fundo Catalítico da IVR.
generalizado e uma crescente cultura de aceitação das condições do sis- Os ministros das finanças e da educação da Guiana assinaram um acordo
tema educacional contribuíram para o desenvolvimento de um cenário para o recebimento de fundos provindos do Fundo Catalítico da lVR em setem-
insatisfatório nas s;ilas de aulas e escolas. Muito precisa ser analisado para bro de 2004. No acordo, os associados (países e órgãos multilaterais) e o Banco
ajudar a compreender como a Guiana deixou de ser considerada um país Mundial se comprometeram a garantir os primeiros US$ 4 milhões até 2007.
modelo no desenvolvimento educacional, com a inclusão de indígenas du- A justificativa central da concessão dessa doação para o país é o cum-
rante os anos 1960, para s1· tornar hoje um dos países mais carentes de primento das Metas do Milênio até 2015. Por isso, o foco principal dos in-
toda América Latina. 155 vestimentos provindos da IVR é o ensino primário. O primeiro parágrafo do

156Fonte: Ministério da Educação de Guiana - www.sdnp.org.gy/minedu/research/library/library.htm


157Fonte: Latham, Michael; Ndaruhuste, Susy e Denham, Ed; UNIVERSAL BASIC EDUCATION FOR
152
Fonte: Ministério da Educação da Guiana - www.sdnp.org.gy/minedu/about/news-220103-01.htm ALL BY 2015: A Criticai Anatysis of Strategy, Finance and Planning lssues and Chaltenges; Phase 111
153
Fonte: Banco Mundial web.worldbank.org/WBSITE/EXTERNAL/COUNTRIES/LACEXT/GUYANAEXTN/o.. Report, Ministério da Educação da Guiana. 2005, p.14.
contentMDK:20018704-menu PK :328196-pagePK :141137-piPK :141127-theSitePK :32827 4,00.html 15ª Fonte: Latham, Michael; Ndaruhuste, Susy e Denham, Ed. Universal Basic Education For Ali By2015:
154
Fonte: www.sdnp.org.gy/minedu/al>out/s-partl .htm#b A Criticai Anatysis of Strategy. Finance and Ptanning tssues and Chatlenges; Phase Ili Report,
155
Fonte: Ministério da Educação da Guiana - www.sdnp.org.gy/minedu/about/news-220103-01.htm Ministério da Educação da Guiana. 20Q5, p.33.

701 Banco Mundial, OMC e FMI: o impactu nas politicas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 71
Memorandum assinado pelo país deixa claro qual a função dos recursos: pios, contemplam questões como reforma curricular, acesso e freqüência
"0 objetivo da doação é apoiar o receptor a atingir a meta de conclusão do no ensino médio, qualificação e remuneração <le professores, entre outros.
ensino primário para meninos e meninas até 2015, através da Iniciativa Via No prefácio do ESP 2003-2007, o Ministro tia Educação, Henry Jeffrey,
Rápida da Educação para Todos". 15" afirma julgar insuficiente e restrito o foco da IVR, que se fixa no ensino pri-
Para garantir que os recursos sejam aplicados segundo o estipulado no mário, e garante que o ESP será voltado para o sistema educacional como
acordo, o contrato pede reuniões regulares com representantes da associa- um todo. O reconhecimento dessa limitação e o esforço que o Ministério pa-
ção que forneceu os fundos, a realização de controles estatísticos periódi- rece fazer no sentido de integrar a IVR e o GPRSP à ESP são pontos bastante
cos, a prestação de contas com relação aos objetivos da IVR bem como o favoráveis. Um outro é o destaque dado aos indígenas - parcela importante
envio de relatórios de participação da comunidade e outros procedimentos da população, que vem ganhado força política, como demonstra a criação
operacionais. Além disso, deve ser produzido um relatório anual, para o do Ministério de Assuntos Ameríndios em 1992. 164
Banco e os associados, mostrando o destino dos fundos e os efeitos das É interessante destacar que, no sentido de contribuir para além da IVR,
politicas educacionais desenvolvidas com eles, assim como o projeto para o governo brasileiro firmou em fevereiro de 2005 quatro acordos com a
destinação dos fundos no ano seguinte. 160 Guiana no que concerne à educação. Os acordos atingirão bolsas de estu-
Uma das cláusulas importantes do contrato diz respeito à educação de do, programas supletivos, cooperação e planejamento de administração na
indígenas, na qual se pede a garantia do país de que os recursos chegarão educação, além de educação profissional tecnológica. O ltamaraty divul-
também às comunidades indígenas. 161 gou a assinatura de um programa executivo na área de educação que vai
Como na Guatemala e em Honduras, preocupa o fato de que na Guiana vigorar entre 2005 e 2008. O Ministro da Educação brasileiro Tarso Genro
apenas 4 milhões dos 45 milhões de dólares serão liberados até 2007, repre- afirmou que "São acordos importantes que vão possibilitar ao Brasil repas-
sentando apenas 8% do total aprovado no plano apresentado à IVR. 162 Como sar um pouco do planejamento e da administração educacional brasileira
apontou a coordenadora da Campanha Mundial, esse é um cenário que para este país" .165
vem se repetindo em outras partes do mundo, para além da América Lati-
na. Apesar de os doadores exigirem metas claras, é difícil imaginar como
os países lograrão cumpri-las com uma parcela extremamente reduzida do
financiamento aprovado.
No caso de Guiana, é interessante notar que a restrição do foco da IVR
nas metas do milênio, e em particular na universalização do ensino primá-
rio, é reconhecida pelo próprio Ministério da Educação. Um relatório de
janeiro de 2005 161 afirma que "se o financiamento relativo à IVR foca em
apoiar a Meta do Milênio de universalização do ensino primário, os objeti-
vos para educação contidos no PRSP da Guiana e no ESP têm um espectro
mais amplo, qual seja, o de melhorar a qualidade educacional em todos os
níveis de ensino e ampliar o acesso das camadas mais pobres e vulneráveis
da população". Ressaltamos que esses outros dois documentos, mais am-

159
Fonte: The Education for All Fast Track lnitiative Catalytic Trust Fund ("EFA-FTI Catalytic Trust
Fund") Grant for the Guyana Education for All Fast Track lnitiative (Grant No. 053679), 2004, p. 3).
160
Fonte: The Education for All Fast Track lnitiative Catalytic Trust Fund ("EFA-FTI Catalytic Trust
Fund") Grant for the Guyana Education for All Fast Track lnitiative (Grant No. 053679), 2004, p. 4.
16
' Fonte: Idem
'"Fonte: www.guyanaundersiege.com/Cultural/Amerindian0/o20Heritage0/o20Month.htm.
165
162 Fonte: The Education for All Fast Track lnitiative Catalytic Trust Fund ("EFA-FTI Catalytic Trust Fontes: Jornal Hora do Povo (www.horadopovo.eom.br/2005/fevereiro/18-02-05/pag3d.htm);
Fund") Grant for the Guyana Education for All Fast Track lnitiative (Grant No. 053679), 2004, p. 1. Ministério das Relações exteriores do Brasil (www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/temas_
163 Fonte: Latham, Michael; Ndaruhuste, Susye Denham, Ed. Universal Basic Education For All by 2005: agenda/narco_trafico/guiana.asp);jornal Folha de 5. Paulo (www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/
A Criticai Analysis of Strategy, Finance and Planning lssues and Challenges; Phase Ili Report, ult96u67226.shtml, 15/02/2005) e Ministério da educação do Brasil (http://portal.mec.gov.br/ai/
Ministério da Educação da Guiana. 2005. index.php?option=contentatask=view&id= 714&Flag Noticias= 1&ltemid=830).

721 Banco Mundial. OMC e FMI: o imoacto nas ooliticas educacionais BM em foco: sua atuação na educação brasileira e na dos países que integram a IVR na América Latina 1 73
Anexo 1 Anexo 2
Iniciativa Via Rápida na Guiana 166 Evolução da situação educacional em países da
Iniciativa Via Rápida na América Latina 167
Iniciativas ' Resultados Indicador

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Guiana 2,4 6,8 9,7 6,1 6,1
166
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· Gastos Com Material de Ensino ·
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Nicarágua 128,8 · 130,2 131,8 i 139,7 1 17,8


-------------~:- - ! - - - - - - - - - -
Honduras 144,8 ' 138,9 128,6 i 138,1 ! 138,7
-----r------- - + - - - --- - ·----------T------.-+--------:---
Guiana 96,7 90,8 1 94,4 ' 155,5 ! 154,5

39,7
1
38,1
48,6 "
-- ·--:-----------··- ·----·I ... - -~- ·-
1
64,7 Honduras 35 .34,8 34, l 34,l
i 1
89,7 99,2 99,2 Guiana 29,4 29,7 .300 ! 26 i 25,9

.29 45,5 .50,5 54,2 .64,8 J2, l 33, l


-·------+----------·--· ---------·---- --------·
j-----

Honduras .59,8 Honduras


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Guiana .91.4 Guiana 19,8 19,4
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1
{ ,

12,1 '12 105,4 104


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99 7 996
10,l 10,5 Participação do Setor Privado _,
=r::! _ : :___________.: :_:_ __
1

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!• .~ < ;'' ,, ( !{ '•'' 3 ·~ 'V 1 , • ,

9,9 12,3 12,3 --~~rágua ___ ,_______l_'.3:3. 12,6 .... , 14,7 _ .+ 17,1 15,5
Honduras ! 5, l 5,8 ; 5,5 1
- Guiana --i--.:--1--~:::-·---r-~:~.:--- ---i- - 0,9

---··-··-·1-··· ~·::· . . -..... l.


Honduras Nicarágua 19,7 24,3
Guiana
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1
--·r----·-----· 1

Honduras .... -----_··_,l,. __


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. Guiana ___ ~ __ _: _____ , ________ -----~--------·-·--
Nicarág".!__ 6,2
Honduras

OBSERVAÇÕES:
Gasto Por estudante (O/o do PIB per capita)
- GPI - Índice utilizado pela UNESCO. Um GPI igual a 1 indica paridade entre os sexos. Menor que 1
em favor dos meninos e maior que 1 em favor nas meninas. Nos 3 países pesquisados a paridade beira
10 9,6 17,4 8,9
·---------------+---------+------ a totalidade. Fonte: UNESCO - http://www.unicef.org/progressfo1children/2005n2/PFC2WorkingPa-
Honduras per.pdf- Fonte: UNICEF- http://www.unicef.org/infobycountry/guyana_statistics.html -Fonte: UN
--t-·---------------+------------·---t-~-------
Guiana 14,2 24,7 24,7 Development Repor! - http://www.undp.org/hdr2002/indicator/cty_f_GUY.html - Fonte: http://
Taxa de Ingresso na 1' Série (O/o) www.tulane.edu/~internut/Countries/Guyana/guyanarxx.html
Os números em Vermelho se referem aos dados mais recentes fornecidos dentro do horizonte de dois
anos da data requerida
Nicarágua_ ---~28,~-- L ___ 130,2 __ _
__i_::~ _j_ 139,7 17,8
Fonte: Summary Education Profile do Banco Mundial
Honduras ~l_ __ _138,9 __ 128,6 ' 138, 1 138,7 http ://d evdata. wori dba n k.org/ edsta ts/Su mma ryEd uca ti o nPro 1i1 es/Cou n tryDa ta/GetShowDa ta.
Guiana
--+------+--------
96,7 ' 90,8 94,4 155,5 154,5 asp?sCtry=GUY,Guya na
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Evolução da taxa de alfabetização de adultos Taxa Bruta de Matrículas no Nível Primário

105 130%

,-
124,8

----------
100
121,6 .,,,,,,., .,,,,-

96 97 97 98 120%
95
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110,3 I 108,5

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1985 1990 1995 2000 2002
ANOS
Guiana
1985 l~J90 1995 2000 2002 Honduras
ANOS Nicarâgua

Gastos Públicos com Educação (O/o do PIB)


Taxas de Conclusão do Nível Primário
110<\'o

99,2
, 8,5 100%
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I 64,7 •• ••••••
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3.4
.....

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43,9 ••••••••••••••••••••••••••

2.2 ..- .....

1990 1995 2002


ANOS
Guiana
1990 1995 2000 Honduras
Nicarágua
ANOS

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86 J Banco Mundial, OMC e FMI: o i~pact<• nas políticas educacionais


1. A educação no marco da
OMC e do GATS
O GATS é o acordo da Organização Mundial do Comércio
que regulamenta a liberalização dos serviços interna-
cionalmente. EUA, Austrália e União Européia lideram
as iniciativas para pressionar os países a abrirem seus
"mercados" educacionais.

Organização Mundial do Comércio (OMC) foi criada em 1995. Até

A então, as regras internacionais de comél"cio eram discutidas den-


tro do Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (em inglês,
GATT), assinado em 1947, após a Segunda Guerra Mundial. Um primeiro
texto, que previa a criação de uma Organização Internacional do Comér-
cio (OIC), foi recusado pelos EUA, que apenas a('eitaram assinar o GATT.
O objetivo era criar regras para melhorar as condi<;ões do comércio interna-
cional e diminuir as tarifas aduaneiras, permitindo preços mais acessíveis
aos consumidores e criando as condições económicas para a reconstrução
dos países destruídos pela guerra. A análise das condições da crise de 1929,
atribuída por alguns economistas ao alto nível de protecionismo dos países
nesse período, explica em parte a importância atribuída ao GATT e o con-
teúdo do texto extremamente favorável ao livre comércio.'
No início, esse acordo incluía 23 países, mas ao cabo de oito rodadas de
negociação até 1994, 125 países eram membros do GATT. Nas suas cinco
primeiras rodadas, que duraram até 1962, obtev<·-se uma redução impor-
tante das tarifas aduaneiras, principalmente na área industrial. Nos três
últimos ciclos, de 1964 a 1994, houve um aumento considerável do número
de países signatários e uma ampliação do escopo do acordo para a área da

1
O texto que foi recusado pelos EUA, e que previa a criação da OIC, continha as duas visões econô-
micas que se opunham na época, uma visão mais liberal, e uma visão keynesiana, obtendo, portanto,
um equilíbrio entre as diferentes tendências econômicas do momento. Os capitules que continham a
visão keynesiana foram eliminados do texto final do GATT.

OMC em foco: a comercializaçã(' da educação na América latina 1 89


agricultura, dos serviços e da propriedade intelectual. A última rodada de Regras para a liberalização
negociações, a Rodada do Ur11guai, durou de 1986 a 1994 e culminou com
a criação da OMC. Ainda qu<' o GATT já exercesse, de forma não oficial, a O acordo da OMC de interesse para este estudo é o Acordo Geral de
função de uma organização internacional, os países signatários do acordo Comércio de Serviços - GATS, resultado da Rodada do Uruguai. Esse acor-
sentiram a necessidade de tuna organização, que tivesse algumas funções do entrou em vigor em de janeiro 1995, mas as negociações começaram
judiciárias, de assessoria téc11 ica e de administração. apenas em janeiro de 2002. Ele representa a primeira tentativa de elaborar
Assim como o GATT, a 01\IC funciona a partir de rodadas de negociação. regras internacionais para a liberalização do comércio de serviço. Nas úl-
Possui, no entanto, caractcrí:--ticas que lhe conferem maior poder, como a timas décadas houve um aumento dos fluxos no comércio de serviços, que
existência do Órgão de Solu~·üo de Controvérsias (em inglês, Dispute Set- chegaram a representar 25% do valor do comércio mundial de bens (WTO,
tlcment Uderstanding - DSU). ao qual qualquer país membro pode recorrer 1999). Como explica SIQUEIRA (2004), "nessa Rodada houve a rejeição do
caso se sinta lesado pelas prúticas comerciais de outro membro. As regras princípio de tratamento especial e diferenciado aos países menos desen-
internacionais do comércio rq;idas pela OMC não contribuem apenas para volvidos, e sua substituição pelas regras do 'livre' comércio, como desejado
a liberalização, mas também para regular o comércio no mundo. No en- pelas grandes corporações, que contaram com o suporte de seus governos
tanto, a interpretação dos acordos pelo Órgão de Solução de Controvérsias para abrir mercados e estabelecer normas comuns".
desfavoreceu constantemcntl' as regulações nacionais, que foram interpre- O GATS divide os serviços em doze setores: Comércio; Comunicação;
tadas como formas indiretas de protecionismo. Um bom exemplo disso foi Construção e Engenharia; Distribuição; Educação; Meio Ambiente; Ser-
a deliberação da OMC em HJ98 contra a restrição da União Européia (EU) viços Financeiros; Saúde; Turismo e Viagens; Lazer, Cultura e Esporte;
à importação de carne bovina dos EUA em razão da utilização de hormô- Transporte; "Outros". A divisão aplica-se a todas as medidas relativas ao
nios pelos produtores ameril'anos, que é regulamentada na UE. comércio de serviços, ou seja, todas as leis, regulamentações e práticas na-
Se a existência do Órgão de Solução de Controvérsias foi uma novidade cionais, regionais ou locais. Além dessa divisão por setores comerciais, o
com relação ao GATT, o l\mdonamento por rodadas permaneceu. A cada GATS estabelece e classifica a natureza das atividades comerciais, chama-
rodada é estabelecido um objetivo e, apesar das negociações serem feitas das modos de fornecimento. Veja a Tabela 1:
de forma permanente, os gr;1ndes momentos das negociações são as con-
ferências ministeriais, que Ol'orrem a cada dois anos. A última ocorreu em Tabela 1 - Modos de fornecimento das atividades comerciais no
Hong-Kong, entre 13 e 18 de dezembro de 2005. GATS
Dentrn da OMC existem vários acordos, que têm como alvo diferen- Natureza
tes áreas comerciais: o GATT, que ainda existe, mas é chamado agora de
"GATT 1994"; o Acordo Gemi de Comércio de Serviços (em inglês, GATS);
o Acordo de Agricultura; o Acordo sobre os aspectos dos Direitos de Pro-
priedade Intelectual ligados ao Comércio; o Acordo sobre as medidas que
dizem respeito ao lnvestiml·nto ligadas ao comércio; o Acordo sobre os
Obstáculos Técnicos ligados ao Comércio; e o Acordo sobre as medidas
Sanitárias e Fitossanitárias.
A OMC possui membros,. observadores: os membros podem ser Esta-
dos e Organizações de Estado (como a União Européia), e os observadores
podem ser Estados (aqueles que não são membros ainda e que talvez ve-
nham a integrar a OMC) e Organizações Internacionais (como a OCDE, a
Organização das Nações Unidas - ONU e o Banco Mundial). Atualmente, As negociações do GATS seguem um quadro jurídico comum a todas as
151 países participam da OMC e os países não membros se situam na Áfri- negociações da OMC, em particular a cláusula da Nação Mais Favorecida e
ca do Norte, Oriente Médio, Hússia e Europa do Leste. o Trato Nacional, mas também algumas disciplinas particulares adaptadas
ao setor de serviços, como a mudança das regras de aduana para regras

90 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacl< nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na America Latina 1 91
de acesso ao mercado.2 A cláusula da Nação mais Favorecida estabelece (como a ausência de limitações e exceções em cada modo). 3 Se forem esta-
que um pais que abrir seu mercado para outro em determinado setor deve belecidos parâmetros quantitativos, todos os países seriam obrigados a fa-
estender esse privilégio a todos os países participantes do acordo. O Trato zer oferta em uma determinada porcentagem do total de setores presentes
Nacional proíbe a concessão de privilégios a empresas nacionais, discrimi- no GATS. Essa questão ainda não está decidida e muitos países recusaram
nando as estrangeiras, por meio, por exemplo, de incentivos fiscais. Além o que consideraram ser uma modificação injusta dos termos de negociação
das regras que se aplicam a todos os serviços há regras setoriais, que estão e um aumento da pressão sobre os países que não querem liberalizar al-
expostas nos "anexos setoriais" do GATS. Esse sistema de anexos setoriais guns de seus setores.
cria uma certa flexibilidade nas negociações de serviços, pois autoriza a O Brasil adotou uma posição contrária aos benchmarks com o argu-
existência de negociações especificas que se atrelam ao acordo geral do mento de que "não parecem levar devidamenlc em conta a necessidade
GATS. Isso permitiu a conclusão de dois grandes acordos, sobre Telecomu- de respeitar a arquitetura e as flexibilidades construídas no GATS". (WTO,
nicações de Base e Serviços Financeiros, ambos em 1997. set 2005) Na declaração que encaminhou à OMC, o Brasil ressalta que as
O texto do GATS possui sete partes, três delas essenciais para a com- propostas de benchmarks desrespeitam o artigo XIX do GATS, que estipula
preensão das negociações. O segundo capítulo expõe as disciplinas e obri- que "o processo de liberalização deve respeitar devidamente os objetivos
gações gerais, o terceiro capítulo explicita os compromissos específicos em de política nacional e o nível de desenvolvimento de cada membro", e o
termos de acesso ao mercado e trato nacional e, por fim, os anexos espe- artigo IV, que determina que "as negociações devem seguir e respeitar a
cificam as exceções em cada setor. Em princípio, o GATS apenas fornece estrutura vigente e os princípios do GATS, incluindo o direito de especifi-
um parâmetro de negociação e cada país é livre para propor o grau de car em quais setores e em quais dos quatro modos de fornecimento haverá
liberalização que aceita dentro de cada setor, no que diz respeito ao acesso comprometimentos".
ao mercado e ao trato nacional. Segundo a declaração brasileira, as propostas que foram feitas levariam
As negociações do GATS funcionam com um sistema de pedidos e ofer- a uma "rodada de graça" para os países desenYolvidos. Os países em de-
tas. Cada membro da OMC pode pedir a um ou mais membros que se com- senvolvimento seriam os principais, e talvez únicos, contribuintes das ne-
prometam a liberalizar o comércio em determinados serviços. Cada pais gociações de serviço, o que contradiz os artigos IV e XIX, que prevêem uma
que recebe os pedidos tem um prazo para fazer uma oferta inicial, que será maior flexibilidade para os países em desenvolvimento.
comentada e criticada pelos outros membros. Depois de receber essas criti- Outro elemento que gera controvérsias é a questão da regulação do-
cas e propostas, é possível apresentar uma "oferta melhorada". méstica e da obrigatoriedade de um "teste de 1wcessidade" para autorizar
Apenas os setores ou sub-setores ofertados pelos países estão sujeitos às as regulamentações domésticas. O artigo VI-4 do GATS estipula que o Con-
regras do GATS e, dentro de cada setor, apenas os modos que o pais deci- selho de Comércio em Serviços poderá, por meio dos órgãos apropriados,
diu liberalizar. Por exemplo, é possível liberalizar a educação somente nos avaliar se uma regulação doméstica é realmente necessária ou se constitui
Modos 1, 2 e 3, sem liberalizar o Modo 4 - que é a posição de países como apenas uma forma de protecionismo, desobede<'cndo, portanto, ao princí-
a Austrália ou Nova Zelândia. É também possível se engajar em termos de pio do Trato Nacional. Esse artigo abre um espaço sem limites para a inter-
acesso ao mercado sem, no entanto, garantir trato nacional. venção da OMC nas questões de regulamentação doméstica, pois qualquer
Essa flexibilidade da negociação vem sendo, no entanto, questionada país poderá questionar a necessidade de regulamentações alegando que o
pelos países favoráveis a uma maior liberalização dos serviços, pois con- verdadeiro objetivo é favorecer as empresas nacionais.
sideram que as negociações estão lentas e as ofertas são poucas e de baixa
qualidade. Surge a proposta, então, de criar benchmarks, ou seja, parâme-
tros de negociação que obrigariam o conjunto de países da OMC a se en-
quadrar num nível mínimo de liberalização. Esses parâmetros podem ser
quantitativos (número de setores ofertados, por exemplo) ou qualitativos 3
Em uma comunicação sobre as possibilidades de abordagens complementares na negociação do
GATS, a União Européia propôs, como "objetivos quantitativos", que os países desenvolvidos façam
propostas novas ou melhoradas em pelo menos 850/o dos setores presentes do GATS, e os países em
'O setor de serviços não pode comportar regras de aduana, já que não é possível impor taxas de adu- desenvolvimento em pelo menos 660/o dos setores do GATS. Como proposta de objetivos qualitativos
ana a mercadorias que não são físicas. Por isso se fala em regras de "acesso ao mercado" aplicáveis propõe, por exemplo, que nos Modos 1, 2 e 3 os compromissos sejam feitos sem limitações, quando
aos provedores externos. possível e em setores significativos comercialmente (WTO, out. 2005).

92 1 Banro Mundial. OMC e FMI: o ímoacto nas ooliticas educacionais OMC em foco: a comercializaç;,-1 da educação na AmCrica Latina 1 93
Rodada Doha Em setembro, a OMC fixou março de 2007 como a data limite para a
retomada da Rodada. A data leva em conta a possibilidade de postergação
As negociações em torno do GATS passaram por diversas fases. Após o do prazo do mandato que os EUA têm para seu Congresso negociar acordos
começo da chamada Rodada Doha, em 2001, na capital do Qatar, e das di- comerciais ( Trade Promotion Authority oufast track), e a divulgação da Lei
versas propostas feitas pelos países membros, o dito fracasso da Conferên- Agrícola americana, que define o pacote de subvenções para 2007'(MARIN
cia Ministerial da OMC de Cancun, em setembro de 2003, colocou de lado e DANTAS, 2006). Em 2007 5, as negociações não avançaram e novo prazo
a questão do GATS e as neµ;ociações agrícolas foram priorizadas. O conflito foi fixado para o final de 2008.
na área da agricultura entre o G-20 4, de um lado, e os EUA e a União Eu-
ropéia de outro, fez do Acordo um elemento de pressão dos países do G-20, A concepção de educação na OMC
que congelaram as negociações de serviços enquanto as negociações agrí-
colas não avançavam. O dcstravamento nas negociações sobre agricultura, Uma das grandes questões que surge nos debates sobre GATS e educação é
obtido em junho de 2004, recoloca o GATS na ordem do dia. a própria concepção de educação. Nas negociações do GATS, a educação, assim
Em dezembro de 2005, ocorreu a 6ª Conferência Ministerial da OMC, em como a saúde ou os transportes, é reduzida a um mero "serviço", perdendo sua
Hong Kong, que tratou de alguns pontos da Rodada Doha. As questões agrí- dimensão de direito humano. Assumir a educação como direito humano sig-
colas continuaram em destaque e os países concordaram em eliminar pro- nifica afirmá-la como uma necessidade intrínseca ao ser humano e como um
gressivamente os subsídios à exportação até 2013. Para a organização não direito universal (para todos e com igual qualidade), indivisível e interdepen-
governamental Oxfam International, "os pequenos avanços conseguidos na dente com relação aos outros direitos humanos destinados a garantir a digni-
agricultura foram anulados por propostas absolutamente contrárias ao de- dade para todas as pessoas. Cabe ao Estado a responsabilidade pela efetivação
senvolvimento no setor de serviços e nas tarifas industriais". Com relação deste direito (HADDAD, 2003).
aos serviços, o documento afirma que "os países em desenvolvimento encon- A Constituição Federal brasileira de 1988 estipula em seu artigo 205 que
tram uma pressão crescente para participar de negociações plurilaterais" e a "educação [é um] direito de todos e dever do Estado e da familia", ou seja,
que também se insiste que <~sses países "estabeleçam novas 'referências qua- um direito público subjetivo. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
litativas', tais como níveis maiores de participação estrangeira, desenhadas nal, de 1996, retoma essa definição, listando de forma específica quais são os
para impulsionar a liberalização de novos setores de serviços, seja ou não deveres do Estado em relação à educação. Da mesma forma, diversos acor-
benéfico para seu próprio desenvolvimento" (Oxfam International, 2005). dos internacionais, tais como o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Em julho de 2006, a OMC suspendeu as negociações da Rodada Doha, Sociais e Culturais, e várias outras constituições nacionais6 fazem referência
inicialmente previstas para durar até o final de 2006, por falta de acordo en- ao direito à educação como um direito fundamental de cada cidadão.
tre os ministros de Austrália, Brasil, EUA, Índia, Japão e União Européia, A educação como direito humano coloca aos poderes públicos quatro
principalmente no que se rdere aos subsídios agrícolas. Segundo aponta Da- tipos de obrigações, segundo Tomasevski (2001): disponibilidade, ou seja,
vid Robinson, consultor da Internacional da Educação (IE) - organização educação gratuita à disposição de todos; acessibilidade, que é a garantia
que reúne sindicatos de educação de todo o mundo-, delegações de diversos de acesso à educação pública, sem discriminações; aceitabilidade, que diz
países que participaram de Doha indicaram que a suspensão da Rodada sig- respeito à qualidade da educação; e por fim adaptabilidade, ou seja, corres-
nifica que os prazos do GATS já não valem mais e que conversas informais pondência entre a educação e a realidade imediata das pessoas.
poderão substituir as negociações formais. Essa situação deixará ainda mais Vale ressaltar que o direito à educação é também fundamental para o
difícil o monitoramento da sociedade civil, que precisará ter como foco os acesso a outros direitos. O diretor-geral da Unesco Koi:chiro Matsuura reco-
acordos bilaterais e regiorniis até que Doha seja retomada (EDUCATION IN- nhece que "apenas a pessoa que tem consciência que ele ou ela tem direitos
TERNATIONAL, ago. 2006).
5 Em junho de 2007, Brasil, União Européia, EUA e Índia se reuniram na cidade de Potsdam (Alema-
'O G-20 é um grupo de paises em desenvolvimento em 2003, o Grupo concentra sua atuação em nha) para retomar as discussões e destravar a Rodada Doha. Mas impasses sobre a questão agrícola
agricultura. Atualmente é composto por 21 membros: África do Sul, Egito, Nigéria, Tanzânia, Zim- levaram a nova interrupção, quando Brasil e Índia decidiram se retirar das negociações.
6 0 programa Ação na Justiça disponibiliza na página da Ação Educativa (www.acaoeducativa.org)
bábue, China, Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão, Tailândia, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba,
Guatemala, México, Paraguai, Uruguai e Venezuela. Informações retiradas da página do Ministério normas nacionais e internacionais que abordam o direito à educação. Sobre as constituições de cada
das Relações Exteriores (www.g-20.rnre.gov.br). Acesso em: 1° nov. 2006. pais em relação a esse tema, consultar o site http://www.right-to-education.org/

94 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o imp.rcto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na América latina 1 95
pode lutar por esses direitos, o direito ao trabalho, o direito de obter comida to de qualidade que sustenta a concepção da educação como serviço é o de
adequada, um teto ou cuidados médicos, o direito de participar ativamente "qualidade total", com foco na eficiência. Os últimos anos viram a emer-
da vida política, ou de beneficiar do progresso da ciência e da tecnologia". 7 gência da avaliação dos professores e alunos por critérios de produtividade,
O bom funcionamento da democracia tem profunda relação com a educação oferecendo, inclusive, bônus e prêmios aos considerados mais produtivos
nacional. O desenvolvimento social e a diminuição das desigualdades pas- (INSTITUTO MONITOR, 2003).
sam por uma educação pública de qualidade, que permita aos mais desfavo- A abordagem de educação como serviço tem impacto também na dis-
recidos lutarem pelos seus direitos e melhorarem sua qualidade de vida. cussão sobre soberania nacional e autonomia dos Estados para definirem
Entretanto, no âmbito da OMC, os serviços são considerados uma mer- a política educacional mais adequada. A capacidade do setor público de
cadoria que deve obedecer ao critério da máxima liberalização e abertura elaborar políticas públicas de educação é, portanto, inseparável da liberda-
ao capital estrangeiro, de forma a maximizar os lucros das empresas que de que cada país tem de elaborar um projeto de desenvolvimento humano,
investem nesses setores, particularmente as transnacionais (HADDAD e social e econômico, ou seja, da soberania nacional.
GRACIANO, 2004).
GATS e educação: os marcos da negociação
Competição e "qualidade total"
O texto do GATS prevê a exclusão de alguns serviços da negociação, sob
A concepção da educação como um direito conflita com aquela que a condição que esses sejam serviços prestados exclusivamente pelo poder
apresenta a educação como serviço e defende a idéia de que as necessi- governamental, de forma não comercial e, portanto, que não exista con-
dades básicas dos cidadãos seriam supridas de forma mais eficiente pe- corrência entre diferentes provedores. Isso se aplica a serviços de policia,
las instituições privadas, em razão dos mecanismos de mercado. O setor bombeiros, seguro social obrigatório, etc. A educação não poderia ser in-
privado incentivaria a competição e diminuiria a burocracia e a inércia cluída nessa categoria já que em praticamente lodos os sistemas educativos
supostamente inerentes ao sistema público. do mundo coexistem escolas públicas e privadas.
Entender a educação como serviço comercializável reduz o aluno cida- A OMC (WTO, 1998) divide a educação em cinco categorias, todas in-
dão a cliente, o que tem profundas conseqüências na qualidade educacional. clusas na negociação, sendo elas:
No Brasil, essa concepção reflete-se no crescente e visível investimento em
marketing educacional, que invade propagandas de TV, outdoors, jornais e 1. Educação primária: corresponde, no Brasil, à pré-escola e ao pri-
rádios e na profusão de eventos sobre a temática. Durante o 9° Seminário de meiro ciclo do ensino fundamental; não inclui, no entanto, creches
Marketing Escolar, realizado em 2003, em São Paulo, Ryon Braga, consultor e alfabetização de adultos.
em marketing educacional, atribuiu o sucesso do grupo Objetivo/UNIP à sua 2. Educação secundária: segundo ciclo do ensino fundamental, ensi-
postura comercial: "aqueles que entraram na educação com uma visão mais no médio, ensino técnico e vocacional, e serviços de tipo educacio-
. empresarial e profissional desde o início, como o caso do Di Gênio [um dos nal para estudantes com deficiência .
proprietários do grupo], obtiveram resultados melhores do que aqueles que 3. Educação superior: serviços educacionais providos por universi-
entraram com visão muito acadêmica, pouco profissional". dades e escolas profissionalizantes especializadas e ensino técnico
Os investimentos em marketing das empresas educacionais cresceram e vocacional de nível pós-secundário.
constantemente nos últimos anos, mostrando a importância atribuída à 4. Educação de adultos: serviços educacionais para jovens e adultos, não
imagem, em detrimento da qualidade do ensino. Um estudo feito pela Ho- ministrados em universidades e escolas normais, incluindo progra-
per Consultoria & Pesquisa junto a 78 instituições de ensino superior das mas de educação geral e vocacional, programas de alfabetização etc.
regiões Sul e Sudeste do país em 2003 mostra que, entre 1990 e 2000, os 5. Outros setores: qualquer serviço educacional não mencionado,
gastos com propaganda no ensino superior aumentaram 105,6%. O concei- com exceção de lazer.

Segundo a OMC (lbid.), existem barreiras q11e limitam o livre comércio


'Mensagem do diretor-geral da Unesco na ocasião do Dia Internacional dos Direitos Humanos (10 de
dezembro de 2003). Disponível: http://portal.unesco.org/education/en/ev.php-URL_ID=27259EtURL_ de serviços educacionais. Veja na Tabela 2 algumas das barreiras, segundo
DO=DO_TOPICEtURL_SECTION=201.html cada Modo de Fornecimento.

96 1Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais OMC em foco: a comercializo.:áo da educação na América Latina 1 97
Tabela 2 - Barreiras ao livre-comércio Dessa forma, a capacidade de regulação e fisca)ização do Estado na área
l Exemplos de barreiras educacional, bem como a sua liberdade de decidir qual a melhor política
para a sua realidade, diminuiria consideravelmente. O fornecimento trans-
fronteiriço (Modo 1) totalmente liberado, por exemplo, traz à tona a questão
do controle dos conteúdos dos livros didáticos. No que diz respeito ao con-
sumo no exterior (Modo 2), a concessão de subsídios a estudantes nacio-
nais seria considerada uma barreira ao livre comércio caso o beneficio não
fosse estendido aos estudantes estrangeiros. Isso poderia tornar inviável
uma política de ajuda financeira aos estudantes nacionais. No que se refere
à presença comercial (Modo 3), exigências curriculares, tais como cursos
na língua nacional, história e geografia do país, poderiam ser consideradas
barreiras ao livre-comércio, pois poderiam impedir que instituições es-
trangeiras contratassem unicamente professores estrangeiros. No que diz
respeito à presença de pessoas fisicas (Modo 4), exames nacionais - insti-
tuídos para controlar a qualidade da formação dos profissionais e regular a
quantidade de profissionais presentes no mercado, que existem em deter-
minadas carreiras como medicina e advocacia - poderiam ser eliminados.
Outro problema que pode surgir no Modo 3 é a demanda das instituições
estrangeiras receberem dos governos nacionais tratamento semelhante às ins-
tituições nacionais "do mesmo tipo". Por um lado, isso pode significar apenas as
instituições privadas, pois somente elas são de natureza comercial. No entanto,
com a tendência cada vez mais marcada de comercialização das instituições de
ensino públicas (cobrança de taxas ou busca de outros financiamentos que não
públicos), essa diferença entre instituições privadas e públicas ficará cada vez
menos evidente. Pode-se, assim, sofrer uma contestação judicial9 ou o questio-
Capacidade regulatória namento da legitimidade do financiamento público ao ensino superior.
O GATS é, portanto, uma ameaça ao caráter público da educação e à
Vários trabalhos (ROBERTSON, BONAL e DALE, 2002; COHEN, 2000; compreensão da educação como direito humano. A posição dos jogadores
EDUCATlON INTERNATIONAL, 1999) mostram que a eliminação das bar- nesse tabuleiro de negociações pode ajudar a compreender os interesses
reiras ao livre comércio identificadas acima provocaria uma falência dos comerciais em jogo por trás do discurso oficial sobre os beneficios da libe-
sistemas públicos de ensin". A concorrência que surgiria entre os provedo- ralização para os países em desenvolvimento.
res de educação estrangeiros (que teriam pleno acesso ao mercado nacio-
nal) e o sistema público de l·ducação poderia criar uma pressão para deixar Os jogadores e seus interesses
o setor público mais "produtivo", menos oneroso, colocando em risco, por-
tanto, a natureza pública do ensino. Além disso, a intervenção do governo Na área da educação, os pedidos foram feitos majoritariamente para
no suposto "mercado educacional" seria identificada como barreira à cria- os sub-setores 3 e 5, ou seja "ensino superior" e "outros serviços educa-
ção de um mercado privad", já que alteraria a livre competição. cionais" (por exemplo, serviços de exames). O ensino superior é o setor
sobre o qual há mais discussão e interesse dos participantes e para o qual
ªTrata-se nesse caso de pessoas físicas, diferentemente do Modo 3, no qual são consideradas as provavelmente são feitas novas ofertas ou consolidações.
instituições/entidades comerciais. O texto da OMC faz referências à Grécia, que impõe condições de
nacionalidade aos seus professores, e à França que tem vários processos regulatórios para controlar '0 Órgão de Solução de Controvérsias da OMC é um tribunal ,internacional que impõe os seus julga-
o fluxo de professores estrangeiros. mentos aos países membros.

98 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o imp;,cto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na América Latina 1 99
As ofertas feitas não satisfizeram aqueles que são favoráveis a uma maior Tabela 3 - Propostas de liberalização nos setores educacionais dos
liberalização, por isso houve pressão sobre os países em desenvolvimento países da América Latina*
para apresentarem ofertas melhoradas. Alguns países já foram até penaliza-
dos e não podem participar de reuniões informais nas quais as decisões são , Modo 3
realmente tomadas (EDUCATION INTERNATIONAL, mai. 2005).
Podemos dividir os principais jogadores em dois grandes grupos.
(IDEM, set 2005) O primeiro deles é composto por países que não fizeram
propostas, como África do Sul, Brasil, Chile, Indonésia, Malásia, Venezuela
e Índia, que, no entanto, consideram a possibilidade de fazer uma oferta
em educação. O outro grupo é composto por aqueles que já se comprome-
teram em diversos sub-setores: Austrália (educação secundária, superior e
outros serviços educacionais), EUA (educação superior, de adultos e outros
serviços educacionais), México (educação primária, secundária, superior e
outros serviços educacionais). Nova Zelândia (primária, secundária e su-
perior em instituições privadas), Tailândia (educação primária, secundária
e de adultos), União Européia (educação primária, secundária, superior e
de adultos), entre outros. No total, 33 países se comprometeram em algum
setor da educação. Outros, como Tailândia e Ruanda, vão melhorar suas
propostas já existentes.
Como mostra a Tabela 3, na América Latina poucos países se compro- Fonte:OMC
meteram na área de educação. Apenas Costa Rica, México e Panamá fize-
AM: Acesso ao Mercado TN: Trato Nacional SC: Sem Comprometimentos
ram ofertas. Costa Rica apresentou o menor nível de liberalização, somente
no Modo 2 (consumo no exterior) da educação primária e secundária e, no • Não fizeram proposta no setor educacional: Argentina, Bolivia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, EI
que diz respeito à educação superior, autoriza a presença de universidades Salvador, Equador, Guatemala, Guiana, Honduras, Jamaica, Nicar;igua, Paraguai, Peru, Suriname, Uru-
guai e Venezuela.
estrangeiras (desde que autorizadas pelo Conselho Nacional de Educação
Superior) e garante acesso ao mercado (mas não se compromete a garantir
Os interesses dos países em desenvolvimento
tratamento igual aos nacionais). O México fez uma proposta de liberali-
zação bem elevad~: comprometeu-se nos setores da educação primária,
A maioria dos países em desenvolvimento não pensa cm fazer ofertas
secundária, superior e em outros serviços educacionais nos Modos 1, 2 e
em educação porque em geral não possui interesses ofensivos na área de
3 (comércio transfronteiriço, consumo no exterior e presença comercial),
serviços educativos, ou seja, não é exportador d('sses serviços, com exceção
sendo que no caso da presença comercial, o investimento estrangeiro é li-
das potências regionais, como Brasil ou Índia (Ii>id.). Como explicar, então,
mitado a 49% do capital das empresas existentes, sem limitações de trato
que dos 33 países que fizeram ofertas, 23 são países em desenvolvimento?
nacional. Já o Panamá comprometeu-se nos setores da educação primária,
Um levantamento feito pela IE traz as justilicalivas desses países para
secundária e superior nos Modos 1 e 2 (comércio transfronteiriço, consumo
liberalizar a área da educação - ou para não excluírem essa possibilidade. O
no exterior). Para o Modo 3 (presença comercial), condicionou a presença
levantamento foi realizado em 2005 junto às delegações comerciais de países
comercial à autorização do Ministério da Educação e, para a educação su-
em desenvolvimento e países menos desenvolvidos (Less Developed Coun-
perior, à supervisão da Universidade do Panamá.
tries - LDCs). Os argumentos mais utilizados foram: a liberalização permi-
tiria atrair investimentos e perícia, possibilitando uma maior qualidade da
educação superior, e contribuiria para estabelecer parcerias com universi-
dades estrangeiras e criar competição no setor, "brigando as universidades
privadas nacionais a melhorar a qualidade do ensino oferecido (Ihid.).

100 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercializaça da educação na América Latina J 1O1
Esse argumento é particularmente importante para países que consideram mente importantes, pois incluem, além das taxas de matrícula, as despesas
enfrentar uma crise na educação superior, onde as universidades privadas, para se manter no país e os custos de viagem (VINCENT-LANCRIN, 2004).
pouco numerosas e de bai rn nível, monopolizam o mercado e escapam a qual- Alguns países cobram taxas de matrícula mais altas para os estudantes es-
quer tentativa de regularização pelo Estado. O conselheiro do governo das Fili- trangeiros, o que lhes permite gerar um lucro ainda maior (ver Tabela 4). Nesse
pinas nas negociações do (}ATS, Johannes Bernabe, afirmou que seu país não grupo, encontram-se os maiores "exportadores" de serviços educacionais de
exclui a possibilidade de colocar a educação nas negociações, pois o ensino consumo no exterior, ou seja, aqueles que mais recebem alunos do exterior:
superior é de baixa qualidade, as universidades recebem reduções de imposto EUA e, em seguida, Reino Unido, Austrália, e Canadá. Outros países, apesar de
e não há regulação das taxas de matrícula. As Filipinas não colocaram a edu- não representarem uma parte significativa do comércio de serviços educacio-
cação nas negociações da OMC, apesar de ser, como o Brasil, um país onde o nais no mundo, atribuem muita importância a esse tipo de serviço educacional,
setor da educação já foi fortemente privatizado. "É um mercado de vendedores que representa uma porcentagem importante de suas exportações. EUA, Reino
e as elites locais aproveitaram a oportunidade de negócio. Às vezes o GATS Unido e Austrália também são os maiores exportadores de serviços educacio-
pode prover uma alavanca para superar interesses domésticos (...]"(Ibid.). nais no Modo 3 (presença no exterior). Para a Nova Zelândia, os serviços edu-
Esse mesmo argumento - de que, uma vez que a liberalização já existe de cacionais estão em quarto lugar no total de suas exportações de serviço.
fato no país, a melhor op~·iio é qualificar esse ensino por meio da abertura ao
comércio exterior - é tam hém freqüentemente utilizado no Brasil. Tabela 4 - Taxas de matrícula em universidades públicas para estran-
Os países em desenvolvimento que não fizeram ofertas em educação geiros em comparação com alunos nacionais
adotaram essa posição seguindo princípios de não privatização do setor
público ou alegando incapacidade técnica para aplicar a liberalização, ou
seja, insuficiente capacidade regulatória.

Jogadores ofensivos
• Para estudantes não europeus
Apesar de as estatísticas serem incompletas, 10 quando se analisa os da-
Fonte: VINCENHANCRIN, 2004.
dos existentes sobre o mercado de serviços educacionais atual e as oportu-
nidades de crescimento desse mercado, vê-se a importância dos interesses As comunicações públicas
financeiros presentes nos discursos favoráveis aos países em desenvolvi-
mento na Rodada Doha de negociação. É difícil avaliar como cada país se posiciona em relação à questão da
Ao contrário dos países em desenvolvimento, muitos países desenvolvi- educação nas negociações, pois faltam dados sobre o mercado e os docu-
dos, tais como os membros da União Européia, têm interesses ofensivos no mentos apresentados nas negociações são, em grande parte, mantidos em
setor da educação. Muitos deles vêem grandes oportunidades comerciais segredo pelos governos dos respectivos países. Alguns, no entanto, divulga-
no ensino a distância (Modo 1), no estabelecimento de campus no exte- ram publicamente comunicações que constituem um elemento interessante
rior (Modo 3) ou na "importação" de professores e pesquisadores (Modo 4). para a compreensão dos interesses em jogo na área da educação. Os países
Cabe lembrar que, apesar disso, a União Européia fez pedidos na área da que fizeram comunicações específicas sobre educação - Austrália, Nova
educação apenas para os EUA, que possui a estratégia mais ofensiva. Zelândia, EUA, Japão e Suíça - são aqueles que possuem maiores interes-
Dados da OCDE mostram que, em 2002, considerando apenas o Modo 2 ses pelas questões educacionais, que representam uma parte importante de
(consumo no exterior), o comércio de serviços educacionais representava 40 suas exportações de serviço ou então porque a questão educacional é tradi-
bilhões de dólares, ou seja, pouco menos do que o mercado de serviços fi- cionalmente muito importante dentro do país. Este é o caso do Japão que,
nanceiros. Os lucros gerados pelos estudantes estrangeiros nos países que os apesar de defender uma maior liberalização dos serviços educacionais,
recebem - os países "exportadores" de serviços educacionais - são extrema- concentrou os seus comentários em volta da questão da qualidade e das
possibilidades de manter a capacidade de regulamentação dos Estados.
'°Isso se explica em parte pela dificuldade de medir corretamente o comércio de serviços, em razão Os EUA, assim como Austrália e Nova Zelândia, se comprometeram a
da imaterialidade dos bens comercializados. (LINDNER e outros, 2001) um nível bem elevado de liberalização e querem, por meio de suas propos-

102 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na América latina 1 103
tas, fazer avançar as negociações em educação no sentido de ocorrer urna
tivas podem interferir na liberdade do comércio, o que deixa urna margem
maior liberalização. Os três países são grandes exportadores de serviços
muito grande para interpretação desfavorável aos países que querem um
educacionais. No entanto, isso não aparece em suas comunicações, nas
maior controle sobre a área da educação.
quais a justificativa para urna maior liberalização é centrada nas eventuais
De fato, corno o tribunal que julga os conflitos de comércio entre países
oportunidades trazidas a todos os países.
é o da OMC, a tendência, em praticamente todos os conflitos até agora, foi
Austrália, por exemplo, dá dois grandes argumentos a favor da liberaliza-
a de favorecer o livre-comércio e diminuir a capacidade regulatória dos
ção. Em primeiro lugar, a liberalização do comércio de serviços educacionais
países membros. É muito provável, portanto, que uma formulação pouco
aumentaria a variedade das ofertas de ensino, o que seria benéfico de duas
explícita como essa favoreça urna maior liberalização na área da educação.
formas: "facilitando o acesso à educação e aos cursos de treinamentos que
Isso é verdade, sobretudo, para os países em desenvolvimento, que já têm
em termos quantitativos e qualitativos não estão disponíveis de outras formas
uma capacidade regulatória limitada e dificilmente sobreviveriam a pres-
no pais de origem e dando um estimulo competitivo para as instituições, o
sões internacionais ou lobbies nacionais.
que traria benefícios de fluxo para todos os alunos". (WTO, 2001) Além disso,
Qua~to aos interesses em jogo nessas comunicações, pode-se notar
Austrália argumenta que a liberalização do comércio de serviços educacio-
que as formulações e os exemplos não são nada fortuitos (EDUCATION
nais é o modo mais efetivo de incentivar a internacionalização da educação e
INTERNATIONAL, 2001). A Austrália tem muitas universidades que lide-
de aumentar o fluxo de estudantes no mundo. Isso levaria a um maior conhe-
ram consórcios mundiais de universidades, criados para oferecer, junto
cimento de línguas, culturas e sociedades estrangeiras; facilitaria a troca de
com empresas multinacionais de mídia, educação on-line para estudantes
pessoas, idéias e experiências, o que aumentaria a diversidade cultural =no
e empresas que buscam currículos padronizados e pacotes de treinamen-
nível nacional e internacional e contribuiria para o aprimoramento do conhe-
to. Muitas universidades australianas também tc'm campus no exterior e
cimento acadêmico; e, por fim, criaria redes de pessoas, grupos e instituições,
a Austrália é um país que recebe muitos estudantes estrangeiros. Por isso,
facilitando futuras alianças econômicas, políticas e culturais.
há urna ênfase sobre as barreiras de vistos e outras barreiras que limitam
O discurso da Austrália ilustra a preocupação em justificar interesses co-
a circulação de estudantes e acadêmicos, as regras de parcerias entre uni-
merciais particulares por meio de urna argumentação centrada nos interesses
versidades nacionais e internacionais, as restrições ao uso da Internet e à
comuns. A terminologia progressista mostra mais a necessidade de convencer
importação de materiais educativos. 11
os atores da sociedade civil, principalmente sindicatos nacionais e internacio-
Em Hong Kong, os EUA identificaram a liberalização da educação supe-
nais, do que urna verdadeira preocupação com o aumento da oferta, melhoria
rior e de adultos corno urna das prioridades a serem negociadas (EDUCA-
da qualidade e internacionalização da educação. Os argumentos são facilmente
TION INTERNATIONAL, fev. 2006). Na reunião seguinte, em abril de 2006,
contestáveis, em particular os que dizem respeito à internacionalização.
em Genebra, ocorreu um fato importante no que se refere à educação: Nova
A diversidade cultural e lingüística será dificilmente mantida se os pro-
Zelândia liderou o esforço de pressionar pela abertura do mercado da edu-
vedores de educação forem anglo-saxões, que compõem de fato a maioria do
cação superior privada. O pedido coletivo - estratégia "plurilateral" definida
mercado atual de serviços educacionais: EUA, Reino Unido, Austrália, Cana-
em Hong Kong por meio da qual um grupo de países solicita conjuntamente
dá e Nova Zelândia. De modo mais geral, podemos afirmar que os diferentes
a liberalização de um setor - de Nova Zelândia, Austrália, EUA, Malásia, Tai-
processos de liberalização que compuseram a globalização levaram a urna
pei e Japão tinha corno alvo os seguintes países: Arábia Saudita, Argentina,
redução da diversidade cultural pela assimilação do modelo dominante. Após
Brasil, Chile, China, Coréia do Sul, Emirados Árabes, Filipinas, Hong Kong,
urna introdução justificativa e uma lista das barreiras ao livre-comércio que
Índia, Indonésia, Malásia, México, Omã, Paquistão, Singapura, Sri Lanka, Su-
devem ser eliminadas, Austrália faz algumas propostas para as negociações.
íça, Tailândia, Turquia e União Européia (IDEM, abr. 2006).
O discurso deve ser interpretado com cautela, pois as declarações de
Nos meses seguintes, as negociações "plurilaterais" avançaram muito pouco
intenção podem contradizer as medidas tornadas. A comunicação austra-
e, segundo representantes de Brasil e México, os países que apresentaram a de-
liana afirma que "as negociações de serviço não devem impedir os países
manda coletiva já planejavam voltar às negociações bilaterais (IDEM, jul. 2006).
membros de prover fundos públicos para a educação para poder cumprir
os objetivos de política interna e regulatórios" (lbid.). A formulação é pouco
"A maior universidade australiana, Monash, conseguiu uma licença para instalar um campus na
explícita: não especifica se esses fundos públicos são atribuídos a entidades
Malásia, em parceria com universidades nacionais. Outras não obtiveram esse privilégio. Além disso,
de ensino públicas ou privadas e não determina até que ponto esses obje- a parceria com Monash era limitada a uma participação de 240/o.

104 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercializacão d" educação na América Latina 1 105
te na educação desses países. No Brasil, as instituições públicas representam
2. Privatização e apenas 10,65% do total das instituições de ensino superior e recebem 28,29%
do total dos alunos no ensino superior no pais em 2004 (INEP, 2004). Esses

internacionalização do dados colocam o Brasil entre os países com maior porcentagem de alunos no

. . ensino superior privado. Em 1997, as instituições públicas ainda representa-


vam 26,4% das instituições de ensino superior brasileiras e 59% do total dos
ensino superior na alunos matriculados no ensino superior (IDEM, 1997). Se observarmos os
números relativos aos outros níveis de ensino, notamos que essa diminuição
América Latina da participação do público é considerável, sobretudo no ensino superior. O
ensino fundamental registrou um pequeno aumento do número de matrícu-
las públicas, que passou de 89% a 90%, entre 1997 e 2005. Já no ensino médio
o aumento no número de matriculas nas redes públicas foi maior, passando
É cada vez maior a presença dos investidores estrangei- de 80,2% a 88%. (IDEM, 1997; IDEM, 2005)
Isso vai ao encontro da estratégia defendida pelas organizações interna-
ros na educação latino-americana: grupos empresariais
cionais comerciais e financeiras de concentrar os investimentos públicos
compram universidades particulares e oferecem cursos a no ensino básico e diminuir o financiamento do ensino superior público,
que é uma área com grandes possibilidades de lucro para o setor privado.
distância sem garantir qualidade de ensino ou a valida- A evolução foi semelhante em outros países da América Latina. Se con-
siderarmos todos os níveis de educação na América Latina, a educação
ção do diploma no país. privada representa apenas 250/o do total de matrículas (WOLF, GONZÁLEZ
e NAVARRO, 2002). É na educação superior que os níveis de privatização
ampliação do acesso às universidades, iniciada na década de 60, são os mais elevados, como mostra a Tabela 5.

A é um dos fenóme11os essenciais da atual era do conhecimento. Se-


gundo a Unesco (1998), entre 1960 e 1995, o número de estudantes
matriculados no ensino s11perior no mundo todo foi multiplicado por mais
Tabela 5 - Instituições e matrículas públicas e privadas na América
Latina
de seis, passando de 15 a 82 milhões. Essa expansão levantou a questão do Instituições privadas no total de
acesso às universidades públicas e da democratização do ensino superior. Instituições de Ensino Superior
As porcentagens de alunos matriculados no ensino superior aumentaram
consideravelmente nos países desenvolvidos: na Europa, este número pas-
sou de 2,20/o a 400/o nos anos noventa; nos EUA e Canadá, de 7,20/o a 800/o
(GARCIA GAUDILHA, 2005). Nos países em desenvolvimento essa taxa,
apesar de ter crescido, não atingiu os níveis dos países desenvolvidos: na
América Latina, por exem pio, essa taxa passou de 1,60/o a 17, 7%, o que, ape-
sar de ser bem superior aos 7,8% da média dos países em desenvolvimento,
ainda está muito abaixo dos níveis dos países desenvolvidos. O setor pri-
vado teve uma grande participação nesse processo de expansão do acesso
ao ensino superior na Amfrica Latina, do qual participam cada vez mais os
provedores estrangeiros de educação superior. Fontes: INEP, 2004 (Brasil); DIDOU-AUPETIT, 2005 (outros países).
Como já foi dito, na América Latina houve poucas propostas de liberaliza-
ção da educação. Não se pode esquecer, no entanto, que a educação privada, Em todos os países citados, com exceção da Argentina, a porcentagem de
principalmente no nível superior, ocupa um espaço cada vez mais importan- estabelecimentos privados varia entre 60 e 90% do total das instituições supe-

OMC em foco: a comercialização da educação na América latina 1 107


106 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o unpacto nas politicas educacionais
riores de ensino. Aqueles que têm o maior índice de privatização na América 40% de suas verbas por meio desses subsídios. (lbid.) Apesar de não termos
Latina são Brasil e Chile, que seguem, desde a década de 90, políticas de liberali- dados sobre o aumento do ensino privado no Panamá, as ofertas de libera-
zação da economia e privatização do setor público. (REUNA, 2003) O Paraguai, lização da educação feitas pelo Panamá nas negociações do GATS indicam
que desejava ampliar o número de matrículas na educação superior também o objetivo de privatização do setor.
teve uma estratégia de privatização do ensino superior. Em 1985, contava com Assim como o Panamá, o México, apesar de ser um dos países que ofe-
25 mil estudantes no ensino superior, em 2005 são 100 mil matriculados em 23 receu a educação nas negociações do GATS, não tem uma porcentagem de
universidades, sendo 18 privadas (ROJAS, GAONA e AGUILERA, 2005). estudantes tão significativa na educação superior privada. Vale ressaltar
que os dois países que fizeram propostas de abertura comercial do setor
Subsídios ao setor privado educativo estão entre os que têm o menor número de estudantes do ensino
superior em instituições privadas. A estratégia de abertura corresponde,
As estratégias de privatização são visíveis na estrutura da educação supe- nesse caso, a um desejo de expansão do setor privado.
rior latino-americana. Na Colômbia, que está entre os países com maior índi- Já países como Brasil e Chile, que não ofertaram a área da educação nas
ce de privatização do ensino superior, pode-se observar que hoje, ao contrá- negociações do GATS, têm de fato estratégias indiretas de abertura comer-
rio do que existia no passado, não há equilíbrio entre as áreas de ensino, pois cial. Os baixos investimentos públicos em educação superior e as deficiên-
houve um aumento na proporção dos cursos relacionados com o setor de cias dos sistemas de regulamentação nacional do ensino superior abriram
serviços, uma característica do ensino privado voltado ao mercado de traba- espaço para investimentos estrangeiros, especialmente por meio do ensino
lho. (Ibid.) Nos outros níveis de educação, as matrículas no setor privado são a distância e das parcerias entre universidades nacionais e internacionais.
menos numerosas, tendo diminuído por causa da crise econômica enfrenta-
da pelo pais. No ensino infantil, elas representam 29% do total da matrícula; Internacionalização do ensino superior
no ensino primário, 150/o; e no ensino secundário, 23%. (WOLF, GONZÁLEZ
e NAVARRO, 2002) A Colômbia teve diferentes políticas de subsídio parcial A aceleração da globalização econômica e financeira, que ocorreu na
ao ensino privado, incluindo um sistema de vouchers12 que foi abandonado, década de 90, provocou um movimento paralelo de internacionalização da
e continua subsidiando fortemente o ensino privado no pais. educação superior, com um importante crescimento das associações en-
As políticas de subsídios ao sistema privado de ensino superior, muitas tre universidades e a aparição de novos provedores de educação superior,
vezes recomendadas pelo Banco Mundial, repetem-se em países que têm como as universidades corporativas. Essa internacionalização manifesta-
um alto índice de privatização do ensino. No Chile, também foi aplicado o se de diferentes formas e é promovida por distintos atores, corno governos,
sistema de vouchers e, mais recentemente, no Brasil, o programa ProUni blocos geopolíticos, provedores privados de ed11cação e universidades. A
utiliza subsídios indiretos ao ensino superior privado, para financiar total lógica da mercantilização da educação e da busca do lucro atravessa todas
ou parcialmente as mensalidades de estudantes de baixa renda em cursos as atuações. Processos geopolíticos são promovidos por organismos públi-
superiores na rede particular em troca da isenção de impostos e contribui- cos de integração regional, nacionais ou multinacionais.
ções. Esse programa obedece ao modelo de parcerias público-privado, que A regionalização das economias nacionais i>xige a padronização dos
constitui um modelo de gestão eficiente segundo o Banco Mundial. sistemas de educação e o reconhecimento mútuo dos diplomas, que pro-
Outros países, apesar de ainda não terem um número muito alto de movem uma maior circulação de profissionais, acadêmicos e estudantes,
matriculas privadas, mostram uma tendência crescente à privatização, criando redes de atores intra-regionais essenciais para a integração eco-
como Argentina e Panamá. Na Argentina, a educação privada aumentou nômica e a consolidação dos blocos regionais. O exemplo mais candente
consideravelmente nos últimos dez anos e representa atualmente 290/o das é o processo de padronização do ensino superior no continente europeu,
matriculas em educação infantil, 21% das matrículas em ensino primário, resultante da Declaração de Bolonha, de junho de 1999.
28% das matriculas em ensino secundário, e 39% em ensino superior não Esse documento, assinado inicialmente por zn ministros da educação -
universitário. O governo subsidia 73,5% das escolas privadas, que obtêm não só da União Européia, mas também de outros países europeus-, definiu
três objetivos a serem alcançados até 2010: o aumento da competitividade e
"Voucher, que em português significa 'vale', é um subsídio oferecido pelo Estado às famílias para que atratividade em nível internacional da educação superior européia, a melhora
elas paguem a escola em que desejam que seus filhos estudem.

OMC em foro: a romrrri<lli7ar;ln r:.1 Pr111r;lr~n n~ AmP.rir:::i 1:::itin:::i 1 1nq


da adaptação da formação dos graduados europeus às demandas do mercado superior e países exportadores de serviços educacionais - mas também pela
de trabalho e o desenvolvimento da mobilidade interna e externa dos estu- OMC, por meio do GATS, e outros organismos internacionais, como Banco
dantes e graduados. A primt·ira meta está relacionada à "perda de relativa de Mundial ou OCDE. Alega-se que o crescimento da educação privada transna-
atratividade da educação superior européia para estudantes e pesquisadores cional é um meio de ampliar o acesso ao ensino superior no mundo e quali-
de outros países, especialmente quando comparada com os EUA" (HORTALE ficar a educação superior nos países onde seu nível ainda é muito fraco. Um
e MORA, 2004). Para os autores, seria preciso "melhorar a posição estratégica dos grandes atores do lobby da educação privada transnacional é a GATE
da educação superior europda em nível mundial, de forma que ela seja atra- (sigla em inglês para Aliança Global para a Educação Transnacional), as-
tiva para os próprios europeus e para a comunidade internacional". sociação fundada em 1995, pela Jones International que, por sua vez, é uma
O segundo objetivo é (•ntendido como "uma exigência de ensinar e corporação internacional que presta serviços educativos (por meio de empre-
aprender o que é relevantl' para o mercado de trabalho" e a necessidade sas como Jones International University, Jones International Academy, Jones
de qualificar os estudantes ·'para as necessidades da nova sociedade". Por e-education), serviços de lazer (Jones Banana Networ, Jones Entertainment
fim, os autores apontam qtw a terceira grande meta - desenvolvimento da Group, Jones American Comedy Network) e outros tipos de serviços.
mobilidade interna e externa de estudantes, docentes e pessoal adminis- A GATE é oficialmente uma aliança de corporações, educadores, agências
trativo - parte do pressuposto que "um amplo mercado competitivo para a de padrão de qualidade, agências inter-governamentais ou governamentais
educação superior servirá para melhorar a qualidade das instituições eu- que tem como objetivo atribuir certificações de qualidade a fornecedores
ropéias" e que "é necessário desenvolver a cidadania européia por meio do transnacionais de educação, de forma a permitir uma expansão desta ofer-
profundo conhecimento de outros países e culturas". ta. A legitimidade da GA TE para emitir certificações confiáveis vem sendo
O chamado "processo l~olonha" criou um sistema de transferência cada vez mais questionada, pois recebe apoio financeiro de empresas como
de créditos de cursos de educação superior (em inglês, European Credit Coca Cola, IBM e Sun-Microsystems. (Mandard, 2001) As corporações mul-
Transfert System ECTS), padronizou os diplomas, definindo o número de tinacionais possuem grandes interesses financeiros na área, já que além de
créditos necessários para a µ;raduação e a pós-graduação, e criou um fundo fazerem P':lrte dos novos provedores de educação internacional, por meio de
de mobilidade estudantil, /!:l~renciado pela agência Erasmus e destinado a suas universidades corporativas, fornecem, no caso das empresas de tecno-
promover a mobilidade dos estudantes de ensino superior dentro da União logia de informação, diversos serviços aos provedores transnacionais, como
Européia, por meio de bolsas de estudos. softwares educativos e sistemas de comunicação e rede. A força do GATE
Propostas semelhantes são os acordos de educação superior bilaterais se reflete na sua capacidade de inserção no sistema internacional: em 1999
ou multilaterais, que estabelecem correspondência entre os diplomas e a Unesco e a OCDE co-organizaram a conferência anual do GATE sobre o
os currículos de diferentes países, e os projetos destinados a promover as tema do "Comércio Transnacional de Serviços Educativos".
cooperações entre universidades e pesquisadores de diferentes países. O Outros atores que promovem a internacionalização e a mercantilização
projeto 6 por 4 UEALC (União Européia, América Latina, e Caribe), por da educação claramente visando lucro são os chamados "novos provedores
exemplo, tem como objeth o promover uma aproximação das universida- de educação superior":
des, focalizando seis carreiras universitárias (História, Química, Matemáti-
ca, Medicina, Engenharia Eletrónica ou similar, Administração) em quatro • as "universidades corporativas'', 13 pertencentes a grandes corpora-
eixos de análise (Competê11cia Profissional, Créditos Acadêmicos, Avalia- ções internacionais, que têm como objetivo fornecer formação con-
ção e Acreditação, Formaç;lo para a Pesquisa e a Inovação). As agências tínua aos trabalhadores da própria corporação;
governamentais de captaçtio de estudantes estrangeiros, como a agência
francesa Edufrance, entram também nessa categoria.
13"A definição proposta para as universidades corporativas por ALPERSTEDT (2001) privilegia não ape-
Quem promove o livre-comércio nas a formação estratégica de desenvolvimento de competências essenciais ao negócio da empresa,
mas também, paralelamente, a detenção de duas caracteristicas fundamentais. Uma dessas caracte-
rísticas refere-se a não restrição dos serviços educacionais aos empregados, com destaque para aber-
A promoção do livre-comércio na educação superior é feita pelos prin- tura ao público externo em geral. A outra se refere ao estabelecimento de parcerias com instituições
cipais beneficiários deste nwrcado - provedores internacionais de educação de ensino superior, com destaque para a validação dos créditos cursados e a possibilidade de outorga
de diplomas, ou ainda, a outorga de diplomas de forma independente." (ALPERSTEDT, 2003)

11 Ü 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na América latina 1 111
• novos provedores privados de educação superior, que se diferenciam Tabel.a 6 - Instituições de educação estrangeiras em países latino
dos antigos provedores privados constituídos por meio de fundações americanos, segundo região de origem e modalidade de internacio-
por assumir plenamente a finalidade de lucro do serviço prestado e nalização
possuir franquias ou campi no exterior;
Modalidades de
•as universidades virtuais com fins lucrativos, que já eram 1.180 no
internacionalização
mundo em 2001, entre as quais se destaca a Universidade de Phoe-
nix, a maior universidade privada dos EUA, com mais de cem sedes
no mundo inteiro; (GARCÍA GAUDILLA, 2005)
• as agências privadas de intercâmbio e estudos no exterior e as insti-
tuições internacionais privadas de acreditação, que representam um
mercado crescente.

Provedores Externos na América Latina ~aises contemplados nesta Tabela: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Cos-
ta Rica, Equador, El Salvador, Honduras, México Nicarágua, Panam<\, Paraguai,
Peru, República Dominicana, Uruguai, Venezuela.
A América Latina 14 não foi exceção no movimento global de internacio-
nalização do ensino superior. As dinâmicas de integração regional e a com-
Fonte: GARCÍA GAUDILLA, 2005.
petição entre as universidades, privadas ou públicas, geraram políticas de
internacionalização da educação no âmbito intra-regional. (Didou-Aupetit, A internacionalização da educação na América Latina é um objeto de
2005) No entanto, a maior parte dos processos de internacionalização na
estudo particularmente difícil em razão da escassez de informações nos
América Latina se inscreve em relações desiguais com países desenvolvi- diversos países da região. Em geral, os governos nacionais não fizeram 0
dos. Os processos de internacionalização são, portanto, na maioria dos casos registro sistemático dos provedores externos rn·m monitoraram suas atu-
direcionados à América Latina e têm sua origem nos países desenvolvidos ações. Não é possível avaliar de forma precisa a natureza desses investi-
da América do Norte e da Europa (ver Tabela 6). Recentemente, algumas mentos e os seus efeitos na educação nacional, o que limita a capacidade de
instituições latino-americanas desenvolveram ofertas internacionais, por regulação do governo e a possibilidade da socil'dade civil de acompanhar
meio de escritórios destinados a captar estudantes estrangeiros e de campi ativamente esses processos.
no exterior que atraem uma clientela nacional em situação de imigração. É Apesar da falta de informações, é possível rei ratar algumas característi-
o caso, por exemplo, da Universidade Nacional Autônoma do México, que cas gerais dos investimentos estrangeiros na educação superior na Améri-
tem um campus em Hule, no Canadá, e outro em San Antonio, Texas, EUA. ca Latina. A ocupação dos mercados nacionais não aconteceu em todos os
Porém, a oferta bastante limitada contrasta com a multiplicação das países na mesma época. Na América Central, o movimento começou cedo,
agências estrangeiras de promoção de serviços educativos na América La- na maioria dos países, em 1987. A exceção é o Panamá, onde a Florida State
tina. Como ressalta ALTBACH (2004a), "as iniciativas transnacionais fa- University abriu um campus em 1957. Na América do Sul o movimento foi
zem parte da dinâmica norte-sul. Elas são quase sem exceção dominadas mais tardio. No Chile, por exemplo, o primeirP campus estrangeiro foi o
pela instituição parceira do norte - em termos de currículo, orientação e, do Institute for Executive Development - IEDE. em Santiago, em 1995. No
algumas vezes, corpo docente. Freqüentemente, a língua de ensino é a do México, o primeiro campus estrangeiro, o Endicott College, foi instalado
parceiro dominante, muitas vezes o inglês, mesmo se a língua oficial do em 1996, no Distrito Federal. Na Argentina, o primeiro campus estrangeiro
país é outra. Há poucos esforços de adaptar os programas às necessidades e foi aberto em 1998; no Peru, em 1999; e, no Uruguai, em 2005.
tradições do país onde os programas são oferecidos - eles são simplesmen-
te exportados sem modificações".

"Países contemplados neste parágrafo: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, EI
Salvador, Honduras, México Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e
Venezuela.

OMC em foco: a comercializaçà· da educação na América Latina 1 113


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Origens dos investidores Porto Rico tem 43 universidades corporativas (centros de aprendizagem
ou learning centers, em inglês) situados em empresas locais ou multinacio-
Os investidores estrangeiros presentes na América Latina são, sobre- nais, que operam em aliança com provedores públicos ou privados, com
tudo, europeus e americanos. De modo geral, a presença da Espanha é fins de lucro. Há poucos exemplos de franquia e essas são mais comuns em
bastante forte nos países de língua hispânica. 15 Já no Caribe anglófono e educação virtual do que em educação presencial.
nos países da América Central, mais próximos dos EUA, os provedores Quanto às multinacionais da educação, elas ainda não são muito co-
americanos são dominantes. 16 Outros países também investem de forma muns na América Latina, ainda que seu número venha crescendo, parti-
pontual na educação dos países latino-americanos, como Austrália, Nova cularmente com os investimentos do grupo Sylvan-Laureate, que comprou
Zelândia, Canadá, Françu. Alemanha, entre outros. Como qualquer tipo de recentemente a Universidade Anhembi-Morumbi no Brasil e também está
investimento, a origem geográfica dos investimentos em ensino superior presente no Chile, Equador, Peru, Costa Rica, Panamá, México e Honduras.
sofre influência da história dos países de destino e das relações mantidas Esses grupos multinacionais de serviços educacionais têm os mesmos cri-
com os países desenvolvidos. Por exemplo, países como México e Colômbia térios que outros investidores estrangeiros para fazer seus negócios: estabi-
possuem uma forte prese11ça americana, que contrasta com a presença eu- lidade econômica do país, transparência das legislações, igualdade de tra-
ropéia dominante na Argentina e no Uruguai. Há atualmente uma tendên- tamento para os investidores privados e públicos, normas de investimento
cia à latino-americaniza~·;1o dos provedores externos, com uma presença favoráveis aos estrangeiros, em particular no que diz respeito à facilidade
dominante de Cuba, seguida por Chile e Argentina, o que condiz com as de retirar os capitais do mercado nacional e ao acesso aos financiamentos
dinâmicas das relações ck influência entre os países latino-americanos. O de pesquisa do Estado.
Brasil, talvez por causu da diferença de língua com relação à maioria dos Ao ser perguntado sobre as razões do investimento na Anhembi-Morum-
países da região, não aparece ainda como um provedor externo de educa- bi, o diretor de relações com investidores da Laureate, Chris Symanoskie,
ção superior significativo na América Latina. respondeu que há anos o grupo observa o mercado brasileiro, mas antes
Por outro lado, a presl·nça dos provedores latino-americanos não é pre- julgava não haver estabilidade econômica e política suficiente. (MANDL,
ponderante. Os convênios, modalidade de internacionalização mais ligada aos 2005) Como mostra o quadro abaixo sobre a evolução do Sylvan-Laureate
interesses estratégicos de rnda país e aos interesses institucionais das univer- no mundo nos últimos anos, o grupo investe de forma estratégica em uma
sidades, é a única modalidade em que os latino-americanos são mais numero- universidade nacional que já com certo renome, ampliando-a em seguida,
sos. Trata-se de um rellex1' do processo de regionalização ocorrido durante os até atingir uma posição dominante no mercado. No México, por exemplo, a
anos 90. No que diz respeito aos investimentos em compra de universidades Universidad dei Valle de México abriu seis novos campi depois de ter sido
locais ou instalações de universidades estrangeiras em países latino-america- comprada pela Laureate. Na América Latina, já possui as duas maiores uni-
nos, a presença americnna l~ dominante, até porque as universidades america- versidades privadas do Chile e a segunda maior universidade do México.
nas privadas são as principais investidoras nessa área no mundo.
No que diz respeito às formas adotadas pelos novos provedores externos
na América Latina, DIDOU-AUPETI (2005), que fez uma síntese de diver-
sas pesquisas nacionais sobre internacionalização da educação superior na
América Latina e no Caribe, destaca que esse processo surge na América
Latina em programas de aliança, seguidos pela educação virtual a distância,
os campi locais de universidades estrangeiras, as franquias e, por fim, as uni-
versidades corporativas. Essa ordem, entretanto, varia de país para país.

"Os provedores espanhôis presentes na América Latina são: as universidades Autônoma, Complu-
tense de Madrid, de Sevilla, de Deusta, de Corufla, Nacional de Educação a Distancia - UNED, Oberta
de Catalunha - UOC e San Estanislao de Kostka - SEK, o Instituto de Empresa e a Escuela de Alta
Direcciôn.
"Os principais investidores americanos são: os grupos Sylvan-Laureate e Apollo (Phoenix Uni~ersity)
e as universidades Florida lnternational e Georgetown.

114 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o .mpacto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na America Latina j 115
Dada a dificuldade em conseguir informaçôt·s sobre quem são esses novos
provedores externos de educação, vale trazer as contribuições de MCCOW AN
(2004) a um debate promovido pelo Observatório Latino-americano de Políticas
Educativas e Laboratório de Políticas Públicas, ligado à Universidade do Estado
do Rio de Janeiro sobre a mercantilização do ensino superior. Ele traçou o perfil
de seis empresas líderes em educação superior, mire elas o Grupo Apollo.
Segundo ele, o fundador, John Sperling, e o presidente, Robert Tucker, do
Grupo Apollo, lideram a batalha para pressionar os governos federal e esta-
duais dos EUA no sentido de relaxarem os regulamentos voltados às institui-
ções com fins lucrativos. O objetivo é tanto competir por concessões em pé de
igualdade com as instituições sem fins lucrativos. quanto operar livremente por
todo o pais. A companhia mantém seus custos baixos reduzindo gastos com
aparatos, tais como bibliotecas, e empregando e11uipes menos qualificadas em
tempo parcial. A Universidade Phoenix, que pertence ao Grupo Apollo, man-
tém somente 140 de seus 7 mil professores em l'Onlrato de tempo integral. Há
indícios que, paralelamente ao acréscimo a sua atual base de estudantes em
idade madura, ela vem se voltando no mercado para jovens graduandos. O
interesse em investimentos no exterior aumentou, e a companhia entrou no
mercado brasileiro [em 2001) com uma parceria com o Grupo Pitágoras. Além
disso, vendeu seu modelo curricular e organizacional da Phoenix University a
24 outras universidades em troca de uma porcentagem de seus rendimentos.
A maioria dos investimentos estrangeiros fl'itos até agora foi direcionado
aos setores nos quais o investimento é baixo e a demanda alta. Isso mostra
que os investimentos estrangeiros em educa~·<io estão seguindo o mesmo
Essa diversidade de natureza e nacionalidade dos provedores externos modelo de expansão que o dos setores privados nacionais. Essa forma de ex-
de educação superior mostra o quanto o mercado da educação superior é pansão institucional seguida pelos provedores privados gerou distorções nos
atrativo na América Latina devido, sobretudo, à ausência do Estado nessa sistemas de ensino nacionais em termos de disciplinas e tipos de investimen-
área. APONTE, em sua pesquisa sobre a internacionalização nos EUA e em to. É, portanto, de se esperar que as distorções criadas pelas universidades
Porto Rico, destaca que a "falta de oferta de programas nas instituições tra- privadas sejam acentuadas pela introdução no cenário da educação superior
dicionais e de outros provedores locais unida à inexistência de normativa de provedores estrangeiros. Esse é apenas uma entre as múltiplas questões
do Estado em grande número de países em via de desenvolvimento repre- colocadas pela aparição dos novos provedores de educação superior.
senta um 'mercado' para a expansão da indústria da educação superior dos
EUA e de outros países avançados. As políticas neoliberais [...] promovem Algumas questões críticas
o cenário tendencial da internacionalização e da aceleração paralela da
comercialização da educação superior transnacional" (2004). Os efeitos da presença dos investidores estrangeiros no ensino superior
Pode-se observar ainda uma evolução favorável aos investidores estran- são objeto de debate entre os especialistas em educação na América Lati-
geiros nas legislações nacionais. Reportagem sobre a compra da Universida- na. Aqueles que são favoráveis aos investimentos estrangeiros argumentam
de Anhembi Morumbi ressalta que uma das razões que explica a decisão da que os recursos proporcionariam novas possibilidades ao ensino superior
Sylvan-Laureate em investir no Brasil é o fato de o governo ter ampliado, a privado latino-americano, em particular o aumento dos recursos destina-
partir do ProUni - programa de bolsas a pessoas de baixa renda -, a conces- dos à pesquisa, promovendo também maior qualidade na oferta, em razão
são de isenções tributárias a escolas com fins lucrativos (MANDL, 2005). do aumento da competição entre as instituições, segundo matéria publicada

OMC em foco: a comercializa, ão da educação na América Latina 1 117


s..

no jornal Folha de S. Paulo, em 2005. Essa visão ignora algumas situações Outro problema que pode surgir com os novos provedores externos de
que podem surgir em decorrência desses investimentos, relacionadas, em educação superior é a volatilidade dos investimentos. O exemplo da Syl-
particular, à vulnerabilidade dos países em desenvolvimento. Como nota van-Làureate, que comprou uma universidade na Índia e a vendeu poucos
ALTBACH (2004b), "o mundo do ensino superior é um mundo extremamen- meses depois, nos remete ao tipo de circulação do capital no mundo que
te desigual. Quando focamos nos países em desenvolvimento e nos pequenos obedece à lógica de rendimento máximo. A dependência dos países em
sistemas acadêmicos, imediatamente surge o espectro da desigualdade". relação a esses investimentos em educação coloca-se de forma aguda. Afi-
Uma outra questão é a l'standardização e uniformização dos estudos no nal, como é possível garantir o desenvolvimento do sistema educacional a
mundo. Nos últimos anos, alguns governos adotaram a estratégia, como já foi longo prazo se qualquer instabilidade política e económica pode provocar
assinalado acima, de padro11ização dos diplomas no nível macro-regional, o uma retirada maciça dos capitais investidos na educação?
que inclui uma estandardização dos diferentes níveis de educação, da carga A questão agrava-se com a estratégia de expansão institucional dessas
horária e do tempo de estudo associado com esses diferentes níveis. No entan- empresas, que buscam a aquisição de partes cada vez maiores dos merca-
to, os conteúdos ficaram at(· agora fora desse processo inter-governamental. dos nacionais e do mercado mundial. Apresentação disponível na página
As estratégias comerciais das multinacionais reforçam essa estandardização na Internet da Sylvan-Laureate explicita que os objetivos de crescimento
de modo preocupante. A mobilidade acadêmica entra na estratégia de expan- da empresa devem acontecer por meio do aumento mundial da demanda
são institucional de ernpres<1s corno Sylvan-Laureate ou Apollo Group. por educação superior e pela habilidade da companhia em capturar ma-
Da mesma forma que os l~stados vêm tentando padronizar os currículos, rket-share, ou seja, aumentar sua participação nos mercados (LAUREATE
os grupos empresariais fazl'm com o conteúdo dos cursos por eles adminis- EDUCATION, 2004).
trados. O objetivo é facilitar a circulação dos estudantes pelas universida- No Brasil, a estratégia é favorecida pela tendência de concentração das
des desses grupos, o que constitui um atrativo publicitário para conseguir universidades privadas. Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo,
mais matrículas. Eles tambi"rn impõem o que chamam de "assinatura", ou no Brasil "consultores especializados em ensino superior [prevêem] que
seja, a especificidade de sua marca de diploma (BUSINESS WIRE, 2001). No entre 400 e 500 instituições consideradas pequenas (com menos de 500
caso da Sylvan-Laureatc, a assinatura é a proficiência em inglês e o uso de alunos) 'desapareçam' nos próximos três a quatro anos". (Universidades
tecnologias de informação, qualificações que todos os seus alunos devem nanicas podem desaparecer, 2006) E.ntre 1994 e 2004, o ensino superior
possuir para não prejudicar a imagem de marca e, portanto, a atratividade privado cresceu 208% no país. Como a demanda por educação superior
do diploma. Essas cstratt'gi;1s institucionais colocam em risco a diversidade privada não aumentou da mesma forma que a oferta, limitada pelos cus-
acadêmica, impõe conteúdos e formas de pensar pré-definidas, distantes tos de mensalidade e pelo reduzido número de pessoas que concluíram a
das realidades nacionais dos países cm desenvolvimento. educação básica, há um grande número de vagas ociosas nas instituições
Essa estandardização (~ visível também na educação virtual. Em 2001, particulares: 40% delas não foram preenchidas em 2004 (lbid.)
80% dos conteúdos de cduca\~ão on-line vinham dos EUA, o que é bastante Isso pode favorecer um processo de aquisições e fusões fortalecendo os
preocupante se levarmos c111 conta a expansão da educação virtual nos últi- grandes grupos estrangeiros que compram instituições menores para ex-
mos anos (MANDARD, 2001 ). No ano de 2002, o setor recebeu cerca de US$ pandir suas matrículas. É provável que, nos próximos anos, se não houver
6,6 bilhões cm investimentos no mundo, número que deve crescer para US$ iniciativas para reverter a situação, as multinacionais da educação domi-
23,7 milhões cm 2006 (POHTAL E-LEARNING). A parcela do mercado dos nem o ensino superior na América Latina. Além de fragilizar os sistemas
EUA em 2002 era de US$ 5,2 bilhões. A América Latina constitui um merca- nacionais de ensino, que ficam dependentes de investimentos internacio-
do bastante atrativo: só no l\rasil, os investimentos acumulados em ensino nais voláteis, abre-se a possibilidade para a distorção cultural nos países
a distància no mundo corporativo chegaram a US$ 80 milhões em 2003. O ditos "menos desenvolvidos". Nessa perspectiva, da mesma forma que os
número de cursos supcrion"' a distància credenciados teve uma expansão governos americanos e russos tentavam impor sua influência durante a
gigantesca: passaram de 11 t~m 2001 para 77 cm 2004, o que representa um Guerra Fria por meio da "cooperação" entre os países, "as corporações
aumento de 600%. (Instituto Vlonitor, 2005) Se a expansão do setor continuar multinacionais, os conglomerados de mídias e até mesmo algumas uni-
neste ritmo, o mercado da l'ducação on-line no Brasil gerará, em 2010, R$ versidades líderes podem ser vistos como novos neocolonialistas - que de-
2,7 bilhões (PORTAL E-LEJ\ llNING AMÉRICA LATINA, 2005). sejam dominar não por razões ideológicas ou políticas, mas pelo ganho

118 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o imp.1cto nas políticas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na America Latina 1 119
comercial. [...) O resultado é o mesmo - perda de autonomia intelectual e Apesar de serem apenas três os países latino-americanos que fizeram
cultural por aqueles que tem menos poder" (ALTBACH, 2004). propostas de liberalização da educação, a maioria dos países da região não
É preciso destacar ainda a pouca capacidade de fiscalização dos Estados tem leis que regulam os investimentos estrangeiros, o que promove uma
diante de empresas estrangeiras. No Brasil, o caso da American World Uni- liberalização de fato. No Brasil, a proposta de Reforma Universitária que
versity (AWU) - universidade virtual norte-americana que oferece cursos atualmente tramita no Congresso Nacional limita a 30% os investimentos
de graduação e pós-graduação pela Internet, mas não é reconhecida pelas estrangeiros em instituições particulares. Enquanto a lei não for aprovada,
autoridades americanas de educação - ilustra os problemas acarretados pe- não há teto para os investimentos estrangeiros. Ao mesmo tempo, qualquer
los novos provedores externos. O governo brasileiro diz que a instituição legislação que verse sobre o capital estrangeiro no ensino superior, mes-
praticamente não exige qualificação alguma do aluno. A AWU alega que não mo que numa tentativa de limitá-lo, oferec1Tá a segurança jurídica que os
precisa de autorização do governo brasileiro, já que não oferece diplomas investidores estrangeiros buscam (RUIC e BREDA, 2006). Esse tema será
brasileiros e sim diplomas norte-americanos validados pela embaixada bra- tratado de modo mais detalhado no próximo capítulo.
sileira nos EUA. A validação pelas 1mtoridades competentes no Brasil está a No México, país cujos aspectos do ensino superior também serão apre-
cargo dos estudantes. Fica evidente a vulnerabilidade dos "consumidores'', sentados mais à frente, o marco legal vigente permite investimentos em
particularmente no caso das ofertas de ensino à distância. No Brasil, em todos os níveis da educação, não apenas na educação superior. A Lei de
2003, cerca de 9 mil brasileiros formados por universidades estrangeiras a Investimentos Estrangeiros de 1993 estipula que é preciso uma resolução
favorável da Comissão de Investimentos Estrangeiros para que o investi-
. distância em programas de mestrado e doutorado esperavam há pelo menos
mento estrangeiro participe em uma porcentagem maior do que 49% nas
dois anos a validação de seus títulos no Brasil (SOUZA, 2003).
Por um lado, a não validação dos diplomas emitidos por universidades atividades econômicas e sociedades de educação pré-escolar, primária, se-
cundária, média superior, superior e combinados (RODRIGUEZ GÓMEZ,
estrangeiras a distância de baixa qualidade evita a proliferação de diplomas
2004). A Lei Geral de Educação estabelece a obrigatoriedade de reconhecer
emitidos pelas fábricas de diploma. Entretanto, mesmo assim permanece
sem solução o problema dos estudantes que se inscrevem nessas universi- a validade dos cursos. Apesar dessas condições permitirem um controle
mais efetivo dos investimentos estrangeiros, isso não aconteceu até agora,
dades e que continuam a ser lesados.
pois o setor ainda não foi regulamentado. A República Dominicana é o úni-
Uma outra questão refere-se à qualidade dos serviços ministrados pe-
co país da América Latina que proibiu os ('ampi de universidades estran-
las universidades estrangeiras. O controle de qualidade é extremamente
geiras em seu território.
complexo, já que não é possível para o Estado verificar se as exigências
No que diz respeito ao controle da qualidade das ofertas e, portanto,
curriculares estão sendo cumpridas e se o aluno realmente é submetido a
das validações dos cursos, as leis que se aplicam aos provedores externos
avaliações de conhecimento.
são as mesmas que servem para regular o setor educacional nacional. É 0
caso de Bolívia, Chile, Colômbia, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Na
A legislação nos países da América Latina 11
Colômbia, os provedores privados estrangeiros que desejam se instalar no
país devem se constituir como entidades sem fins lucrativos, da mesma
De modo geral, os documentos sobre educação superior e internacio-
forma que as universidades privadas nacionais, o que limitou o interesse de
nalização denunciam as lacunas e deficiências das legislações latino-ame-
investidores estrangeiros. Outros países aprovaram leis que contemplam
ricanas no que diz respeito à capacidade do Estado de controlar e regular
os provedores externos, mas não levam em conta sua especificidade, como
os novos provedores externos. Na realidade, os mecanismos de controle de
é o caso da Argentina: a lei apenas submete os provedores externos à mes-
qualidade e credenciamento das instituições de ensino superior na Amé-
mas regras das universidades privadas nadonais. No Brasil, a validação
rica Latina desenvolveram-se durante os anos 90, ignorando as ainda in-
dos diplomas de pós-graduação stricto sensu é condicionada ao credencia-
cipientes ofertas dos novos provedores de educação superior. Quando os
mento da instituição de ensino em seu respectivo país de origem.
problemas foram identificados, as reações foram variadas.
A maioria das leis de controle de qualidade submete, portanto, as insti-
tuições estrangeiras à obrigação de validar os seus cursos nos órgãos res-
ponsáveis do país de recepção do investimento. Essa poderia ser uma forma
"Os países contemplados nesse parágrafo são: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Chile, Equador,
México, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela

OMC em foco: a comercioi,zaçào da educação na America Latina 1 121


eficaz de controle se, no entanto, os mecanismos de controle de qualida- pouca qualidade ou quantidade da oferta pública: países com acesso uni-
de do ensino não fossem folhos em muitos dos países latino-americanos. versal ao ensino superior18 público de qualidade não enfrentam tantos pro-
Desse modo, os provedores externos não encontram muitas dificuldades blemas com os provedores externos de educação superior. As políticas de
para validar os seus cursos. As questões legais colocados pelos provedo- redução dos gastos públicos com ensino superior, defendidas pelo Banco
res externos não dizem respeito somente às capacidades de fiscalização e Mundial, para priorizar os gastos com educação básica, só devem acentuar
controle de qualidade do Estado e sim ao problema da transnacionalidade o problema. Se o controle de qualidade e a defesa dos consumidores são
dos provedores cm um mundo onde as regulações são somente nacionais. elementos que devem ser contemplados de imediato para evitar as fraudes
Daí, surge a questão de como regulamentar serviços transnacionais, dificil- educativas e a multiplicação de profissionais diplomados desqualificados,
mente controlúvcis pelos Estados nacionais: um controle transnacional é em uma perspectiva de longo termo, é fundamental ampliar e a qualificar a
possível? Que organismos poderiam fiscalizar esse tipo de ofertas? oferta pública de ensino superior.
Na modalidade de cduca<;ão virtual, o problema fica ainda mais grave,
já que o Estado não tem poder sobre uma universidade que oferta cursos
por Internet, mas não cstú localizada no país. A Argentina, por exemplo,
tem uma regulamentação ela educação virtual que não se aplica aos pro-
vedores externos de educaçiio virtual, já que estes não se instalam no país
para fazer a sua oferta via Internet (MARQUIS, 2002).
No que diz respeito il prntcção dos consumidores, as legislações são
absolutamente inexistentes. Como a revalidação dos diplomas fica muitas
vezes a cargo dos interessados, não hú meios de impedir os cursos de baixa
qualidade de vender seus produtos aos que estão interessados.
Frente a essa nova oferta de educação internacional é preciso pensar
como os governos nacionais devem agir. A capacidade de regulação é limi-
tada quando se tratam de enl idades que não têm sede no país e que ofertam
ensino a clistúncia, mas la111hém {~ problemútica quando as entidades se
instalam no país e represen Iam interesses econômicos poderosos, como é
o caso das multinacionais da educação. É por isso que surgiram propostas
de regulação dos provcdorcs cxtcmos por organismos internacionais, tais
como a Unesco, que jú declarnu não possuir vocação para controlar o mer-
cado de serviços educacionais.
De qualquer forma, como declarou o ex-diretor da Divisão de Ensino
Superior da Unesco, Marco Antonio R. Dias, "não é possível alcançar um
conjunto de normas de qualidade aplicáveis a todos os países e em fun-
ção das quais se possa fazl'r uma apreciação sobre os estabelecimentos"
(UNESCO, 1998). A fnlta de 11111a regulação eficaz desenvolve um mercado
de produtores de legitimidade, como os organismos de certificação, acre-
ditação, elaboração de exames de seleção, ou então de benchmarking, que
produzem normas estandardizadas como ISO, o que corresponde a uma
visão da educação como fonte de lucro e objeto de uma gestão de tipo em- "A separação entre modelos de ensino superior de acesso universal (mais de 350/o da população com
presarial. Se essas normas podem servir para informar o consumidor, sua ensino superior), acesso de massa (entre 15 e 35 º/o) e acesso de elite (menos de 150/o) foi feita por
legitimidade social e pedagógica é questionável (DIDOU-AUPETIT, 2005). Marti Trow em 1974 (Problems in the Transition from Elite to Mass Higher Education, ln: OECD,
"Policies for Higher Education''. Paris) As porcentagens de matricula já atingiram, no entanto, pata-
A atratividade das ofertas de novos provedores extemos explica-se pela mares bem mais elevados. No Japão, para as pessoas que se situam na faixa etária de 25 a 34 anos, a
taxa da população que atingiu a educação superior é de 520/o, na Suécia 400/o e nos EUA 390/o.

122 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o imµc;cto nas politicas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na America Latina 1 123
ser classificada pelas regras do GATS. Isto poderia incluir todos os serviços
3. Estudos de caso educacionais, desde o ensino em sala de aula e o transporte, e até mesmo
os serviços de vigilância" (RED SEPA, 2004).
SIQUEIRA (2004) detalha como a terceiriza~·ão de atividades e a ven-
da de serviços pelas universidades públicas colaboram para a inclusão da
O Brasil, que não ofertou a educação no GATS, vive in- educação no GATS. "Quanto mais este [setor público] terceiriza atividades
tensamente a privatização e a comercialização do ensino (por exemplo, alimentação, treinamento de professores, avaliação, etc.),
vende serviços (cursos e tratamentos pagos, desenvolvimento de pesquisas
superior. Já o México apresentou propostas de liberaliza- remuneradas ou que beneficiem empresas), faz marketing comercial para
atrair interessados, o mesmo torna-se extremamente vulnerável à regula-
ção da educação e assegura em sua legislação o inves- mentação da educação como um serviço comercial via OMC/GATS, saindo
do frágil escudo do 'exercício da autoridade gO\ crnamental', pois passa a
timento estrangeiro no ensino superior. Também merece estar oferecendo educação em base comercial e 1•m competição com outros
provedores. Assim sendo, os grupos empresariais poderão vir a processar
atenção a entrada de instituições bancárias no ensino
os países por práticas prejudiciais à livre oferta de serviços educacionais,
superior latino-americano. em vista do oferecimento de tratamento diferenciado, caracterizado por
subsídios às entidades públicas, exigindo tratanwnto igual: recursos públi-
cos para todos ou nenhuma instituição" [grifos ela autora].
Brasil: enquanto o GATS não vem
Vejamos assim três importantes aspectos da privatização e comercia-
Brasil, como foi apontado anteriormente, não apresentou propos- lização do ensino superior no país: a atuação cl<1s fundações privadas nas

O tas de liberalização nos setores educacionais no GATS. Entretanto,


isso não quer dizer que não existam importantes processos de pri-
vatização e comercialização da educação em curso no país. Também já
universidades públicas, o reconhecimento de diplomas estrangeiros por
universidades particulares e a presença do capitnl estrangeiro.

foi explicado que o texto do GATS prevê a exclusão de alguns serviços da Fundações privadas nas universidades públicas
negociação, sob a condição que esses sejam prestados exclusivamente pelo Nas universidades públicas brasileiras, sejam estaduais ou federais, gran-
poder governamental, de forma não comercial. Ou seja, segundo as regras de parte dos cursos pagos e dos serviços prestados a empresas acontece por
do Acordo, para que um país exclua a educação dos serviços que podem meio das fundações ditas de apoio às universidades. Como lembra Roberto
ser negociados, seu sistema educativo deve ser exclusivamente público e Leher, ex-presidente do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior
gratuito, em todos os níveis e modalidades. (Andes-SN) e professor da Universidade Federal cio Rio de Janeiro, em entre-
"Sob a tutela do GATS, a educação pública poderia ser vista como uma vista à Ação Educativa, "o fato de um curso estar estruturado cm uma uni-
barreira ao comércio de serviços. Sobre esta questão, algumas autorida- versidade pública não garante que a educação n<io seja objeto de negócios.
des declaram que a educação pública estaria protegida sob a exceção às Quando isso ocorre é sempre através das fundaçiies de direito privado".
regras do GATS, concedida aos serviços oferecidos sob 'autoridade gover- Nos últimos anos, algumas associações de docentes das universidades
namental'. Entretanto, se os serviços do governo forem oferecidos a partir públicas vêm realizando um trabalho de investignção e denúncia a respeito
de uma 'base comercial' ou 'em concorrência com fornecedores de servi- da ação das fundações, 19 considerada uma "privntização por dentro".
ços privados' estarão igualmente enquadrados nas regras de cobertura do
GATS. O fato é que não há nenhum sistema educacional público que não
ofereça alguns serviços baseados em pagamentos ou em concorrência com
um fornecedor de educação privada. A opinião jurídica de uma respeitada "A revista da Associação dos Docentes da USP publica, desde 2001, reportagens sobre a atuação
firma canadense que trabalha com leis de comércio conclui que um tribu- das fundações de direito privado na Universidade. Os textos estão disponíveis em www.adusp.org.br/
revista/Default.htm (destaquem-se as edições 22, de março de 2001; 23, de setembro de 2001; 24. de
nal de comércio poderia determinar que a educação pública também pode
dezembro de 2001; 27, de outubro de 2002; 31, de novembro de 2003; 36, de janeiro de 2006).

12 4 1 Banro Mundial. OMC e FMI: o imoacto nas ooliticas educacionais OMC em foco: a comercialização· 1.1 cducaç5o na Amcrica Lalina 1 12 5
Privatização regulamentada

A primeira versão do Anteprojeto de Reforma Universitária20 , de 6 de


dezembro de 2004, defendia o "deseredenciamento automático" de todas as
fundações de apoio ligadas às universidades públicas federais. Já a segun-
da proposta apresentada pelo governo federal em 30 de maio de 2005 co-
locava novas condições para o credcnciamenlo e sua renovação: "estatuto
referendado pelo conselho superior da instituição apoiada; órgão delibera-
tivo superior da fundação integrado por no mínimo um terço de membros
designados pelo conselho superior da insliluiçiio apoiada; e demonstrações
contábeis do exercício social, acompanhadas de parecer de auditoria inde-
pendente, bem como relatório anual de geslão, encaminhado ao conselho
superior da instituição apoiada para apreciação, cm até sessenla dias após
a devida aprovação pelo órgiio deliberativo superior da fundaçiio".
O tema das Fundações, entretanto, sai da discussão sobre a Reforma Uni-
versitária e Lorna-se objeto do decrelo presidencial nº 5.205, de 14 de setem-
bro de 2004, que regulamenta a atuação nas universidades tederais tratada
Em 2005, a Procuradoria Geral de Justiça de São Paulo pediu abertura de na Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994. Na mesma data do decreto, é pu-
investigação sobre os cursos pagos de especialização realizados no interior blicada a Portaria lnterministerial nº 3.185, que delermina que as fündações
de universidades públicas pm1listas por meio de fundações privadas. O pedi- devam ser registradas e credenciadas pela Secrelaria de Educaçiio Superior
do baseou-se cm uma rcprcst•ntaçiio de um membro do Conselho Estadual de do Ministério da Educação e pela Secretaria de Políticas e Programa de Pes-
Educaçiio, que questiona a legalidade do uso do espaço público nessas situações quisa e Desenvolvimento do Ministfrio da Ciência e Tecnologia.
(COLLUCCI, 2005). Em jnnlio do mesmo ano, o Ministério Público Estadual Para Leher, as publicações dos citados decreto e portaria dão mais um pas-
entrou na .lusliça contra a Universidade de Siio Paulo por entender que uma uni- so na instilucionalização de um aparato que transforma a educação em servi-
versidade pública niio pode, por meio de funda~·ões privadas, cobrar mensalida- ço. "Se por um lado, exige uma demonslração contábil mais clara por parle das
des cm cursos de pós-gradn<wüo. (T AKAHASHl, 2005) A ação, que atende a uma fundações, o governo niio atua para retirar a existência das fltndações, como
rcprescntaçiio da Associaçfüi dos Docentes da lJSP, pede que a Universidade estava previsto na primeira proposta de reforma universit.íria apresentado
seja proibida de "emprestar. 1·cder, dar ou fornecer a qualquer título seu nome pelo governo, que dizia que essas instituições deveriam ser extintas".
para emissiio de certificados t ·111 cursos de pós-graduação (especialização, aper- Vale regislrar que o Ministério da Educação reconhece que as funda-
!Ciçoamcnto, mestrado ou d()t1torado) realizados por entidades de direito priva- ções de direito privado que atuam nas universidades federais muitas vezes
do, mediante cobran~·a de valores monetários, conveniadas com ela ou não". contribuem para o seu processo de privatizaçiio. Diz o tcxlo que apresenta
Também cm outros Rstrnlos brasileiros, os ctu·sos pagos em universidades o anteprojeto de Reforma Universilária: "esse processo de privatização in-
públicas tt'!m sido contestados judicialmente. Em Goiás, por exemplo, o Ministério terno se faz muitas vezes via fundações de direito privado que nem sempre
Público Federal e o Ministério Público Estadual ingressaram em 2003 e 2004 com se submetem aos controles das inslâncias superiores de deliberação acadê-
ações civis püblicas na .Justi~·" Federal com o objetivo de obrigar a Universidade mica. Esse processo, embora contraditório corno espaço público, avançou
Estadual de Goiás (lmG) a inlcrromper a cobrança de mensalidades em cursos
'ºTramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 7200, apresentado pelo Poder Executivo ao
seqüenciais oforecidos por mt ·io da FundaÇ<io Universitária do Cerrado (Funcer).
Congresso Nacional em junho de 2006, que trata da Reforma Universitária e "estabelece normas ge-
Em dezembro de 2005, a UI~(;, a Funcer e a Fundação Universidade Estadual de rais da educação superior, regula a educação superior no sistema federal de ensino, altera as Leis nºs
Goiás, entidade mantenedora da Universidade, foram condenadas a restituir os 9.394, de 20 de dezembro de 1996; B.958, de 20 de dezembro de 1994; 9.504, de 30 de setembro de
1997; 9.532, de 10 de dezembro de 1997; 9.870, de 23 de novembro de 1999; e dá outras providên-
valores já pagos pelos cerea de 6 mil alunos inscritos nos cursos. Além disso, a
cias". Depois de apelos do Ministério da Educação pela agilização da tramitação do PL ao longo de
.Justiça Fcdernl determinou q11t• ambas as fi.mdações se abstenham de indeferir a 2007, foi criada uma Comissão Especial para apreciação da matéria. Em dezembro de 2007, estavam
renovação de matrículas dos iilunos 'inadimplentes' (ANDES, mai. 2006). sendo aguardadas as indicações de lideres partidários para sua composição e início dos trabalhos.

12 6 \ Banco Mundial, OMC t FMI: o irnc>;icto nas politicas educacionais OMC em foco: a comercialização da educação na América latina \ 12 7
também nas instituições federais de ensino superior em conseqüência das deverão ser submetidos à revalidação em universidade pública.
politicas restritivas de financiamento da pesquisa, do engessamento da ad- Vê-se, portanto, que a legislação colocou, no máximo, condições para a
ministração pública e da redução dos salários dos docentes" (MEC, 2005). validação dos diplomas stricto sensu oferecidos por instituições estrangei-
Assim, fica evidente que o governo brasileiro reconhece nas fundações ras no Brasil, sem especificar se são cursos presenciais ou a distância (o
um instrumento de privatização do ensino público, mas optou por mantê- credenciamento no respectivo país). Entretanto, <'ncontra dificuldades para
las e regulamentar suas atividades. controlar a qualidade e a oferta de cursos lato smsu e já o reconhecimen-
to de diplomas de cursos a distância ficará a cargo de cada universidade,
Regulamentação e validação de diplomas desde que possua curso ou programa reconhecido pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
No Brasil, uma resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE), já O professor Roberto Leher lembra que até a publicação desse decreto.
revogada, chegou a proibir a revalidação e o reconhecimento de diplomas na historia da educação brasileira, os diplomas estrangeiros de graduação e
obtidos em cursos ministrados no Brasil oferecidos por instituições estrangei- de pós, sempre haviam sido reconhecidos pelas i11stiluições públicas. "Isso é
ras. Diz a resolução nº 1 da Câmara de Educação Superior do CNE, de 26 de um precedente gravíssimo. Permite o funcionamento do comércio transfron-
fevereiro de 1997: "não serão revalidados nem reconhecidos, para quaisquer teiriço completamente fora do Acordo Geral de Comercio e Serviços, sem
fins legais, diplomas de graduação e de pós-graduação em níveis de mestrado qualquer contrapartida ou regras de equivalência. l~m suma, tudo é resolvido
e doutorado, obtidos através de cursos ministrados no Brasil, oferecidos por dentro do mercado e não passa por nenhuma insli\ncia pública. É resolvido
instituições estrangeiras, especialmente nas modalidades semi-presencial ou entre o comprador de um diploma estrangeiro eu ma instituição privada".
a distância, diretamente ou mediante qualquer forma de associação com ins-
tituições brasileiras, sem a devida autorização do Poder Público". Capital estrangeiro no ensino superior
Essa decisão tornou-se nula em 3 de abril de 2001, quando o CNE orde-
nou a suspensão dos cursos de pós-graduação stricto sensu oferecidos por O capital estrangeiro em instituições de ensino brasileiras não é tema da
instituições estrangeiras através de convênios com instituições nacionais ou legislação atualmente em vigor. A LDB diz apenas que "o ensino é livre a ini-
diretamente. Apesar de mais rígida no que se refere aos cursos stricto sensu, ciativa privada, atendidas as seguintes condições: cumprimento das normas
a nova resolução não trata dos cursos de graduação e das modalidades semi- gerais da educação nacional e do respectivo sistema de ensino; autorização
presencial ou a distância. Quatro anos mais tarde, o CNE, por meio da Resolu- de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público; capacida-
ção nº 2, de 9 de junho de 2005, determinou as condições para a validação dos de de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da Constituição
diplomas de pós-graduação stricto sensu obtidos em cursos oferecidos de ma- Federal." Apesar de não existir regulamentação Pspecífica, já há empresas
neira irregular por instituições estrangeiras no Brasil até abril de 2001. Assim, estrangeiras que atuam no ensino superior brasileiro, o que corresponde ao
atualmente, a validação desses diplomas é condicionada ao credenciamento Modo 3 de fornecimento da atividade comercial 110 GATS (aquele em que o
em seu respectivo país de origem e à análise da dissertação ou tese. fornecedor cruza as fronteiras e investe em um país estrangeiro).
Nesse mesmo ano, o Ministério da Educação editou o decreto 5.622, que A proposta de Reforma Universitária encaminhada pelo poder Executivo
regulamenta o Art. 80 da LDB sobre a oferta da educação a distância em ao Congresso Nacional em junho de 2006 limita l~m 30% a participação de
todos os níveis e modalidades de ensino. No que se refere à validação de di- capital estrangeiro em instituições privadas de ensino superior (Arl. 7", §4").
plomas expedidos por instituições estrangeiras, diz o Art. 28: "os diplomas de A primeira proposta apresentada ao Congresso Nacional sobre essa
especialização, mestrado e doutorado realizados na modalidade a distância questão foi feita pelo deputa.do federal Ivan Valente (PSOL-SP) em 2003.
em instituições estrangeiras deverão ser submetidos para reconhecimento por meio do Projeto de Lei 2.138, que propõe a proibição do "ingresso do
em universidade que possua curso ou programa reconhecido pela CAPES, capital estrangeiro nas instituições educacionais brasileiras com fins lu-
em mesmo nível ou em nível superior e na mesma área ou equivalente, pre- crativos. A proposta não se aplicaria a "recursos para pesquisa e cxlensfio
ferencialmente com a oferta correspondente em educação a distância". Ou ou a verbas destinadas ao apoio a instituições denominadas educacionais,
seja, os diplomas de pós-graduação emitidos por essas instituições poderão comunitárias ou filantrópicas".
ser reconhecidos por instituições brasileiras públicas ou privadas, ao contrá- O PL foi apresentado à Comissão de Educaç.ão (~ Cultura da C<1111ara dos
rio do reconhecimento dos diplomas de cursos de graduação (Art. 27), que Deputados, recebeu, em 18 de novembro de 2004. pan•n•r nc~alivo do relator

12 8 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais


OMC em foco: a comerciallzaçjo o;, '.·dut"<1r;·10 11;1 .L\'lll''·CJ Law1;:i 1 129
d('putado Severiano Alves (l'I lT-BA) e fiJi retirado da pauta da Comissão para
que o tema f'osse discutido 1111 bojo da lkli:mna Universitúria. O relator argu-
mentou que "a eventualidadl' tia presença de capital estrnngeiro no conjunto
dos recursos financeiros que rnantt~m ou viabilizam o füncionamento das ins-
tituições educacionais guard;1 papd secundário" uma vez que a garantia da
qualidade da educa~:üo olh'l'<'ida l: primordialmente da responsabilidade do
l'odcr Público que tem as atrilluiçües de autorizar a instala\:ão das instituições
educacionais, avaliar-lhes as condições de runcionamento, de seus cursos e
programas, conf'crir-lhes credenciamento ou r('conhecimento e estabelecer as
diret.l'izes curriculares. "Ade111ais - continua o relator - não seria o fato de a ins-
tituiçüo nüo ser lucrnl.iva, pod1•ndo, nesse caso, receber recursos externos, que
evitaria - admitida a hipútes1· ele existcncia desse risco - uma eventual atuação
distanciada dos valores e das aspirações da cidadania brasileira".
Das 368 emendas aprcs1·111aclas ao texto da Reforma Universitúria (Pro-
jeto de Lei 7.200), doze re1"1·1·1:111-se ao parúgrafo cio artigo que trata do ca-
pital estrangeiro nas unive1·sidades privadas brasileiras. Uma não altera
a limitaçüo do capital estrn 11gciro, oito delas suprimem a limitação, uma
estende o \)('nl'ikio ús 11w111i·11cdoras declaradas sem fins lucrativos e uma
proíbe o seu i11grcsso. Veja 11a Tabela 7 quais parlamentares apresentaram
emendas t' quais !"oram su;1·; justilil'ativas.

Tabela 7 - Emendas parl;1 11entares apresrntadas à Reforma Universi-


t<iria com rciaçiio élO cap1 ai estrangeiro L't11 instituições particulares
l§u@H.Mijllf.iifl,U§hffimli- ilt!Gi!U!J·l.IM .i · Justificativa . ·
50 Manato (PDTCES) l· 1sere o §60 'A~ducàção Apérfeiço~r.ccintrole sobre limitê de~apital.
· ·1perior não pode, dire-
. 1ou indiretamente, ser
' IJjeto de monopólià ou·
•·ligopólio" e propõe li-
: 1ite mlnimo de dez arios
'""ª que seja considera-
, ·:i válida a naturalização
·los votantes estrangei-
."s de mantenedoras.
72, 116, 170, Walter feldman (PS- olJprimem o §4o do Art. ·contém notória carga de xenofobia. Constitui
296, 352 DB-SP), Josc Carlos 'o, que limita a 30'\'o a equivoco reprimir investimentos estrangeiros em
Aleluia (PFL-BA), Julio iarticipação do capital educação superior, no Brasil. Restrição desse por-
Lopes (PP-RJ), Gastão ·strangeiro nas institui- te exige emenda constitucional, .não podendo ser O argumento de que a restrição ao capital estrangeiro configura xenofobia
Vieira (PMDB-MA) e óes particulares introduzida por lei oroinária. Uma coisa é o debate
fleury (PTB-SP) que se faz sobre as tentativas da Organização Mun-
é exatamente o mesmo encontrado em texto elaborado pelo Fórum da Livre
dial. do Comércio de con~derar a educação serviço Iniciativa na Educaç.'io, organizaçüo que reúne as entidades que representam
comercializável. Outra coisa é fazer restrição a que
instituições de qualidade venham atuar no Bra~I.
as universidades privadas e centros universitários criada com a finalidade de
Ainda que de capital majoritariamente es\rangeiro, elaborar uma proposta do setor para a reforma do ensino superior (ABMES,
essas instituições terãó que ·atuar sob o comando
das 'normas gerais' da educação brasileira .e sob os 2006). De modo parecido, pensa o ex-ministro da Edt1cação Paulo Renato Sou-
crivos da autorização e da avaliação de qualidade, za, que abriu uma empresa de consultoria chamada Paulo Renato Consultores
processos conduzidos pelo Ministério da Educação e
que são comuns a todas as instituições integrantes cujo "foco é o posicionamento estratégico da instituição [particular de ensino]
do Sistema Federal de Ensino'. no sistema educacional e a busca de recursos" (Diversilicação gera espaço para
rnntmua

130 \ Banco Mundial, OMC e FMI: o 1·· pJcto nJs políticas educacionais OMC em foco: a comerciJlização da educação na America Latina 1 131
consultores, 2004). Para ele, "não há razão para limitar a entrada de instituições · As movimentações llo capital estrangei · o Brasil
estrangeiras no pais, uma vez que elas só viriam estimular o desenvolvimen-
to do Ensino Superior por aqui". Este seria um comportamento nacionalista
antiquado e xenófobo. "A entrada de instituições estrangeiras não só promove-
ria uma movimentação para a melhoria do ensino das instituições brasileiras,
como, também, em seus métodos de gestão", declara (BURGARDT, 2006).

Reforma Universitária x OMC?

Ao mesmo tempo, o Ministério da Educação insiste que o projeto de Reforma


Universitária está ancorado em uma concepção de educação oposta à defendi-
da pelo Banco Mundial e pela Organização Mundial do Comércio, ainda que a
abertura ao capital estrangeiro esteja na pauta das negociações do GATS.
Segundo o documento "Exposição de motivos - Anteprojeto do ensino su-
perior", assinado pelo então ministro da Educação Tarso Genro, "a concepção
de educação superior como um berri público que cumpre a sua função social
por meio do ensino, da pesquisa e da extensão tem referência republicana e
nacional. Essa é a alternativa ao conceito de 'bem público global' (Banco
Mundial), o qual conflita com um projeto de educação superior de inserção
nacional soberana no processo de mundialização, diluindo-o na confluência Capital estrangeiro no México
entre a governança e as estratégias de expansão dos provedores educacionais
transnacionais". Segue o texto: "da mesma forma, a visão de educação como Como já foi destacado no capítulo anterior, JVl<'-.xico l'oi um dos trcs paí-
uma 'mercadoria' sujeita às mesmas regras que regulam trocas comerciais, tal ses latino-americanos a apresentar ofertas de liberalização da educação no
como defendida pela Organização Mundial do Comércio, restringe a viabilida- GATS. A mesma postura liberalizante do país co111 relação ao tema havia
de das imprescinqíveis e estratégicas políticas nacionais autônomas no campo sido expressa anteriormente no Acordo de Livre < :om(~rcio da América do
da educação superior. O teor do Anteprojeto, atento a essas questões candentes, Norte - NAFTA com EUA e Canadá. Além disso. o marco legal nacional
contemplando e incentivando as importantes interações acadêmicas interna- mexicano assegura a possibilidade de investimento estrangeiro cm toda a
cionais do mundo contemporâneo, sem deixar de preservar a autonomia do educação privada, ainda que a Lei Geral de Educ:i<;ão estabeleça a obriga-
país no delineamento de sua educação superior, estabelece as formas possíveis ção de se obter junto à autoridade governa menta 1 a validaçfio oficial para
de associação com investimentos estrangeiros". cada plano de estudos nas instituições que recebelll capital estrangeiro.
Em entrevista à Ação Educativa, o professor Roberto Leher discorda e acre- Roberto Rodriguez Gómcz, pesquisador da Universidade Autônoma do
dita que abrir a possibilidade para o capital estrangeiro, mesmo que limitado México (UNAM), destaca que "a postura do Méxil'o no contexto das nerro- b

a 300/o, vai ao encontro do que os grupos estrangeiros defendem no GATS. "0 ciações multilaterais (GATS e ALCA) tem sido a de apresentar o setor de
que interessa aos reitores e representantes das instituições estrangeiras é o que educação superior privada como aberto a investinl<'nto estrangeiro( ... ). Nfio
eles chamam de uma estabilidade jurídica. Mesmo que for 300/o, admitindo a obstante, as principais representações universitárias no México, tanto do se-
hipótese improvável que o Parlamento mantenha os 300/o, dá a garantia jurídica tor público (ANUIES) [Associação Nacional de Uni1crsidades e Instituições
necessária para essa associaÇ<'io não tenha questionamento legal", diz. do Ensino Superior] como do privado (F!MPES) Wt•deração de Instituições
Caso seja aprovada a proposta de limitaçüo do capital estrangeiro em 30% de- Mexicanas Privadas de Edueaçüo Superior] !'oram <'xplícitas sobre a neces-
fendida pelo governo federal, será preciso acompanhar o que acontecerá com a Uni- sidade de rever a aplicações dos acordos, estahelt'<'t'r normas opt•racionais,
versidade Anhembi-Morumbi, que em 2005 teve 510/o do seu capital adquirido pelo principalmente em matéria de reconhecimento d<' validade d!' estudos e
grupo Sylvan-Lm1reate. O secretário executivo do Ministério da Educação, Jairo Jorge participar nas negociações que silo levadas a cabo 110 caso clt' aprovar ache-
afirmou que "o MEC vai exigir o cmnprimento da lei" (RUIC e BREDA, 2006). gada de investimentos estrnnµ;eiros" (HODHl()l/E~ <;(JiVIEZ. 20(H).

132 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais OMC' em tnco: a coml'rciahza~·tlo ci.i .;ucaçào na Arntrica Latina J 13 3
O ensino superior mexicano sofreu profundas mudanças ao longo dos sa, para não dizer nula, supervisão sobre os conteúdos educativos das
anos 90, com a consolida~·iio de um novo projeto que "concebe a educação instituições privadas. O enfoque da supervisão se baseia, mais precisa-
como parle central das necessidades empresariais em um marco de um mente, no cumprimento das obrigações de tipo contratual (número de
projeto de inserção na economia globalizada". (ABOITES, 2003) Diz o mes- professores de tempo completo, nível acadêmico dos professores, etc.),
mo autor que esse processo ocorre em três frentes. Na primeira delas, "o administrativo e de natureza jurídica".
Estado estabelece um acordo com os grandes dirigentes do setor educativo Na mesma entrevista, afirma que a presença do capital estrangeiro não
privado e empresários nacionais e estrangeiros para, em primeiro, lugar, necessariamente implica em deterioração da qualidade educacional do en-
reduzir a participação do setor público na educação e redefinir seu papel sino superior. Para ele, "os riscos são outros, derivam da forma de atuação
para dedicar-se primordialmente a funções e áreas estratégicas". Além dis- do capital estrangeiro em países como México. Quando uma organização
so, continua, "o Estado admite a participação direta do setor educativo pri- privada de um grupo corporativo estrangeiro tem problemas, simplesmen-
vado e dos empresários nacionais e estrangeiros na condução da educação te é vendida. Assim fez, convém recordar, o grupo Sylvan com algumas de
superior pública. Esta forma de co-condução empresarial-governamental suas divisões, por exemplo, os institutos Wall Street (de ensino de idiomas)
está posta em todos os níveis da educação superior, como ocorre no Con- que foram vendidos à corporação Carlyle há alguns anos".
selho Diretivo das Universidades Tecnológicas e na Coordenação Nacional
para o Planejamento da Educação Superior, CONPES, e passa pelo impulso Os bancos no meio universitário latino-americano
às vinculações universidade-empresa nacional e estrangeira". Por último,
há "uma completa reorientação 'empresarial' do processo educativo supe- Para finalizar este estudo, trazemos algumas reflexões sobre um pro-
rior nas universidades públicas". cesso ligado à comercialização da educação ainda pouco discutido: a en-
Diante desse quadro, é preciso destacar como os investidores estrangei- trada das instituições bancárias no ensino superior latino-americano, es-
ros têm atuado no ensino superior daquele país. Entre 1994 e 2003, o total pecialment~ a iniciativa do grupo espanhol Santander chamada Santander
de investimentos estrangeiros diretos em serviços educativos foi de US$ 40 Universidades, presente em 11 países da América Latina (Argentina, Bolí-
milhões, sendo que US$ 3·1· milhões correspondem a uma única operação via, Brasil, Chile, Colômbia, México, Paraguai, Peru, Porto Rico, Uruguai e
realizada em 2000: a compra da Universidade dei Valle de México, pelo Venezuela), além de Espanha e Portugal.
grupo norte-americano Sylvan Learning Systems. Em dez anos, 113 empre- O folheto de divulgação da iniciativa afirma que o banco oferece seu
sas mexicanas que prestam serviços educativos receberam investimentos "apoio institucional e económico para desenvolver os programas docen-
estrangeiros, sendo 61 delas relacionadas ao ensino de idiomas.e apenas tes e de pesquisa que cada universidade considera prioritários", tais como
sete à educação superior ( lbid.). criação de cátedras especializadas, intercâmbio de estudantes e professo-
Rodrigues Gómez estudou o caso da compra da Universidade dei Valle res, bolsas de graduação e pós-graduação, projetos de pesquisa, especiali-
de México (UVM) e aponta que a atuação do grupo norte-americano no zações e estudos de pós-graduação, programas de extensão universitária e
México recebeu diversas críticas acadêmicas, políticas e financeiras. Em atividades culturais e sociais.
entrevista à Ação Educativa, em outubro de 2006, ele explica que "quando O pesquisador venezuelano Jorge Dávila, que em artigo aborda a entrada
se soube do investimento de Sylvan na UVM surgiram várias críticas, uma do citado grupo na sua própria universidade - a Universidad de los Andes,
delas referente às possíveis distorções culturais. Depois de vários anos de que é pública e fica na cidade de Mérida-, afirma que o programa Santander
operação da UVM sob o 'selo Sylvan', essa vertente crítica perdeu espaço. Universidades tem, de fato, três funções: "a penetração da educação supe-
De um lado o currículo dos programas que a UVM oferece não sofreu gran- rior como mercados financeiros; a consolidação da ideologia gerencialista
des alterações (exceto pela implantação de algumas novas opções, como a própria do capitalismo financeiro contemporâneo nos centros de produção
opção de dupla titulação ou a possibilidade de estadas fora do país). Por ou- acadêmica; e o controle privado (ou 'privatização') da educação pública".
tro, o corpo docente da UVVI continua sendo basicamente o mesmo, exceto Essas funções seriam cumpridas por meio de duas grandes estratégias:
que, por razões de expans;io, a Universidade contratou novos professores, "convênios de colaboração" e portal llniversia. Segundo informações da
a maioria deles provenientes de universidades públicas". página na Internet do Santander Universidades, até junho de 2004, 346 ins-
Mas ele reconhece que as autoridades mexicanas "têm uma escas- tituições de ensino superior haviam celebrado convênios com o banco e

13 4 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o i111pacto nas politicas educacionais


OMC em foco: a comercialização da educação na Amcrica Latina 1 135
845 universidades estavam "conectadas em rede" por meio dos portais Uni- o portal Universia, administrado como uma empresa na qual entram como
versia de seus respectivos países (GRUPO SANTANDER, 2004). sócias as universidades, com investimento de 54,8 milhões de euros, e o de-
A primeira dessas estratégias abrange um conjunto bastante grande de senvolvimento da ponta de lança do programa de penetração na vida acadê-
ações, por exemplo, a renovação dos sistemas de gestão interna das uni- mica: o 'cartão universitário inteligente', com investimentos de 44 milhões de
versidades, de modo a integrar a informação acadêmica e financeira. "A euros".
estratégia não poderia ser mais direta: o banco, por meio de uma empresa Por meio deste último, até 2003, o Grupo Santander teria conseguido
pretende ter acesso a toda informação acadêmica e financeira da univer- transformar em seus clientes 2,5 milhões de esludantes e professores dos 5
sidade. No caso do convênio com a Universidad de los Andes, este meca- milhões de pessoas que são atingidas diretamenle pelos "convênios de cola-
nismo de penetração está estabelecido na cláusula quinta, com o agravante boração". O cartão, segundo o banco, foi desenhado para "prestar os serviços
(uma verdadeira humilhação) de que a Universidade teria que pagar pelo mais freqüentes e de maior interesse solicitados pelos universitários e pelas
software do sistema de gestão. Certamente é uma humilhação para uma universidades". Para que sua estratégia seja mais eficiente, o "Grupo Santan-
Universidade que conta com muitas unidades docentes de pesquisa, de pós- der exige que as universidades [participantes dos convênios] deixem instalar
graduação e administrativas dedicadas há muitos anos ao campo da infor- em seus campi agências bancárias. Nas 346 universidades que tinham con-
mática" (DÁVILA, 2005). vênios ao final de 2003, existiam 291 agências hancárias do Santander; ou
A segunda estratégia "de penetração do capitalismo financeiro santan- seja, 8 em cada 10 universidades. O negócio, alé'm disso, é verdadeiramente
deriano nas universidades" é o portal Universia, que funciona como socie- latino-americano, pois enquanto na Espanha passou-se de 553.000 cartões
dade anônima independente da qual, segundo informa material publicitário em 2001 a 740.000 em 2004, na América Latina o crescimento é muito maior:
do Santander Universidades, a maioria das universidades iberoamericanas de 997.000 cartões a 2.270.000 no mesmo período". (IDEM)
se converteram em acionistas. "Universia configura-se assim como um dos Por fim, vale destacar o uso que o banco faz da imagem das universida-
maiores meios de expressão da comunidade global universitária de fala des com as quais se associa. "O Grupo Santander exige, segundo cláusula
hispano-portuguesa", destaca o banco. do convênio, que o tal cartão inteligente seja <'Xpressamente um produto
Em maio de 2005, em Sevilha, na Espanha, o Grupo Santander organi- que identifica o pessoal universitário com o Ba11co. De fato, reza a cláusu-
zou o Primeiro Encontro Internacional de Reitores Universia, com a pre- la 4.3 do convênio que assinou o reitor da Universidad de Los Andes: 'A
sença de mais de 550 dirigentes universitários. Na ocasião, Emilia Botín, Universidade expressamente autoriza o Banco <1 utilizar sua denominação,
presidente do Grupo, disse que o portal pode ajudar que as universidades suas marcas e seus logotipos na emissão do carlüo inteligente, assim como
se integrem em espaços de educação superior que "implica, entre outros em todos os impressos relativos a esse instrunwuto. Igualmente, a Univer-
fatores, em facilitar a mobilidade acadêmica, tanto real como virtual ( ... ). sidade aceita que no dito instrumento se eneonlre impressa a denominação
Universia deve desenvolver o e-learning, ou ensino virtual, em todas suas Banco de Venezuela/Grupo Santander e seu logotipo"'.
possibilidades". O encontro também estabeleceu que "o fomento a uma
maior e mais profunda cooperação entre universidades e empresas" é ou-
tra linha essencial de atuação do portal. 21

Comércio ou mecenato?

DÁVILA (2005) analisa o investimento financeiro realizado pelo banco,


argumentando que sua ação é mercantil e não mecênica, ao contrário do que
procura destacar as peças de comunicação do banco e os dirigentes universi-
tários que assinam os acordos. "O investimento total em sete anos é de 183,5
milhões de euros. Deste valor, o Grupo Santander investiu mais de 75% nas
estratégias que são rentáveis para o banco de maneira mais direta, a saber:

"Informações retiradas da pagina: http://encuentro2005.universia.net/. Acesso: 15 nov. 2006.

136 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o imoacto nas ooliticas educacionais OMC ,,m foco: a comercializaç5<• da rducação na América Latina 1 13 7
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OMC em foco: a comercialização da educação na América Latina 1 143


142 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais
1. A importância da
educação e do investimento
nos professores 1
1.1. Introdução

m 2005 a ActionAid internacional publicou dois relatórios sobre

E o impacto das políticas do Fundo Monetário Internacional (FMI)


no investimento do governo em educação, inclusive na contrata-
ção de profissionais da educação 2 • Nossa pesquisa destacou a contradição
evidente entre a limitação de gastos com salários e a necessidade urgen-
te de contratação de professoras e professores para que sejam alcançadas
as Metas de Desenvolvimento do Milênio (MDM) e os objetivos da Edu-
cação para Todos (EPT) possibilitando, assim, atingir a universalização
da educação primária até 2015.
Em 2006, o FMI publicou um relatório reconhecendo a inclusão deres-
trições de gastos com salários como critério de desempenho ou como meta
indicativa em 21 países (Fedelino et al 2006). O relatório confirmava que,
apesar de não intencionalmente, as restrições poderiam ter um efeito ne-
gativo sobre a contratação de professores e trabalhadores da área de saúde,
considerando que esses dois grupos representam a maior parte da folha de
pagamento dos governos. O FMI afirma agora ser mais flexível e seletivo no
emprego das restrições com gastos salariais em países de baixa renda.
Este estudo analisa de perto as limitações impostas aos gastos com salá-
rios em três países: Malavi, Moçambique e Serra Leoa. Os três foram cita-

' Este estudo foi realizado com a colaboração de pessoas que nos ajudaram no trabalho de cam-
po, orientaram nossa análise ou comentaram nossos rascunhos, em Malavi: Julita Nsanjama, Chris
Kinyanjui; em Moçambique: Paula Mendonça, Alberto Silva, Eduardo Costa e em Serra Leoa: Tenny-
son Williams, Samuel Bangura, Thomas Johnny, Samuel Braima, Osman Gbla. Agradecemos também a
Rick Rowden, Eric Gutierrez, Peter Chowla, Romilly Greenhill, Victorine Kemonou Djitrinou, Amy Gray,
Anne Jellema, Specioza Kiwanuka, Jackson Karugu, Francis Vernyuy, Mohammad Muntasim Tanvir,
Aqsa Khan, Hammad Ahmad, llene Grable, Nancy Alexander, Natasha Munshi e Wendy Johnson. A
versão original, em inglês, está disponivel em http://www.actionaidusa.org/pdf/AAConf_Contradic-
tions_Final.pdf
'MARPHATIA, A.; ARCHER, D. Contradizendo os compromissos: como a realização da educação para
todos é posta em risco pelo Fundo Monetário Internacional. ActionAid Internacional, 2005 (disponí-
vel em www.actionaid.org/assets/pdf/contradicting_commitments4.pdf).
ROWDEN, R Mudando de rumo: propostas alternativas para atingir as metas de desenvolvimento do
milênio e lutar contra o HIV/Aids. ActionAid Internacional, 2005 (disponível em www.actionaidusa.
org/pdf/changing0/o20course0/o20report,pdf).

Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 147


dos no relatório de Fedelino por apresentarem restrições explícitas aos gas- para ajustar os gastos até a metade do ano. Em Serra Leoa, o FMI permitiu
tos com a folha de pagamento como critério de desempenho ou como meta "exc~ssos" anuais na folha de pagamento para acomodar a contratação de
indicativa em seus acordos de empréstimo. 3 Depois de longas entrevistas mais professores.
com oficiais do governo no Ministério das Finanças (MF), no Banco Cen- ci que questionamos aqui é se tal flexibilidade é suficiente para permi-
tral, no Ministério da Educação, com o FMI e com as organizações da socie- tir aos países a contratação do número necessário de professores a fim de
dade civil (OSC), tentamos compreender o papel do FMI na determinação oferecer uma educação primária de qualidade. Caso não seja, há outras
direta (ou na influência indireta por meio de medidas macroeconômicas políticas que os governos devem considerar para aumentar o investimento
mais amplas) do patamar dos gastos salariais. De todo modo, descobrimos em educação, especialmente quanto à contrata~·<lo de professores?
que o baixo gasto com a folha de pagamentos tem impacto significativo na
contratação dos professores de cada pais. Gráfico 1:
A principal contribuição deste estudo é demonstrar com clareza a A relação entre a educação feminina e a pobreza
correlação existente entre as políticas macroeconômicas e suas inevitá-
veis conseqüências no setor da educação.
Escolhemos deliberadamente três países em condições aparente- Proporção de lares chefiados por mulheres com:
mente diferentes em relação aos limites salariais e à influência do FMI.
Em Serra Leoa, o FMI mantém sua influência direta na determinação Nenhuma educação formal
do patamar do gasto com salários. Nas Consultas ao Artigo IV de 2007,
o FMI enfatiza que "medidas para a redução da folha salarial e o maior
controle sobre os gastos com salários precisam ser tomadas com urgên-
cia" (FMI, 2007, p. 15). Entretanto, os oficiais do governo ressaltaram
que o gerenciamento da folha de pagamento no cenário pós-guerra era
uma tarefa árdua. Eles se sentiam obrigados a aceitar de volta os servi-
dores públicos que retornavam para o trabalho após terem sido afasta-
dos pelo conflito (FMI, 2007). Apesar dessa preocupação, a restrição do
gasto salarial levou o governo a estabelecer um limite específico sobre
o número de professores a ser contratado. Em Malavi, ainda há uma
restrição salarial e conseqüente interrupção na contratação para setores Educação primária Educação secundária
não prioritários. Oficialmente, setores como a educação e a saúde estão
fora dessas restrições. Entretanto, o Ministério da Educação não promo-
veu nenhum programa de formação inicial, e como resultado não houve
grande número de novos professores para contratar. 4 Em Moçambique,
a restrição de gastos com salários não é mais uma meta explicita do pro-
grama de redução da pobreza e crescimento (PRPC).
O FMI já demonstrou ser flexível em cada um desses países. Em Mo-
çambique, o gasto salarial foi elevado para permitir a contratação de novos
professores. Em Malavi, o FMI está respondendo aos pedidos do governo
~ Na pobreza • Fora da pobreza
3 Critérios de desempenho são atividades ou metas macroeconômicas que devem ser respeitadas
para que a quantidade combinada de crédito seja disponibilizada. Metas indicativas são atividades
ou metas macroeconômicas que, caso não sejam cumpridas, alertam ao FMI para a necessidade de fonte: Pesquisa integrada de lares de Serra Leoa, 2003/2004 em Estudo sobre a estratégia de
medidas adicionais para assegurar que o governo atinja essas metas no futuro. Entretanto, o não- redução da pobreza, 2005, p.24 (conforme citado na Avaliação do Banco Mundial sobre o Setor
cumprimento desses objetivos não influencia empréstimos futuros. da Educação). A linha da pobreza é estimada em SLL 770.648 por ano ou 328 dólares (o que cor-
• Em 2000 o governo contratou 4.000 professores; nenhum deles recebeu formação. responde a 1 dólar por dia).

1 "º 1~ Confrontilnrlo ;ic; rontr~rlicflpc;· n FMJ f' n 1nvN.timP.ntn nn nrnfro;,<nr:uin 1 14q


.... 'ii,>.'·'
fantil e da desnutrição. É um custo econômico que aumentará com o tempo.
1.2 A relação entre educação, pobreza e crescimen-
Por exemplo, dois terços dos países da África subsaariana não estão man-
to econômico tendo o cronograma para atingir as MDMs de educação, o que põe em risco
o seu crescimento. Hill e King (1995) estimam que o Produto Nacional Bruto
A importância da educação vai além das metas nacionais e compro- (PNB) de países em que a proporção entre meninos e meninas matriculadas
missos globais. A educação é ao mesmo tempo um direito fundamental e na educação primária e secundária se encontra abaixo de 0,75% pode ser
aquele que "cria a 'voz' pela qual os direitos podem ser reivindicados e pro- 25% menor do que em países com menor disparidade entre os sexos. Eles
tegidos" (Watkins, 2000). Entretanto, o simples fato de haver mais crianças estimam que os países teriam crescido de 0,1% a 0,5% mais rápido a cada
nas escolas não significa automaticamente que elas estão aprendendo. Os ano entre 1995 e 2005 se tivessem participado de programas educacionais
professores e as professoras devem estar presentes, ser bem capacitados e para atingir a meta de paridade de gêneros na educação primária até 2005.
hábeis para oferecer oportunidades igualitárias de aprendizado para meni- Ao contrário, Abu-Ghaida (2004) estimou que a falta de investimento em
nos e meninas: caso contrário, é pouco provável que as crianças (especial- educação levará a uma perda acumulada de crescimento de 0,4% entre 2005
mente as meninas) obtenham resultados satisfatórios de aprendizado. Sem e 2015, e que o investimento correspondente na educação leria aumentado a
professores qualificados, as crianças não dominam a alfabetização básica, renda per capita em cerca de 140/o no período entre 1985 e 2015.
que lhes permitirá acessar as informações e os serviços de que necessitam Entretanto, investir na construção de escolas, na compra de bons ma-
para levar uma vida saudável e digna, livre da pobreza. teriais pedagógicos e na promoção de programas para aumentar as taxas
Isso é válido especialmcntc para os três países nos quais o nosso estudo de matrícula entre as meninas não leva automaticamente ao maior cresci-
foca: Malavi, Moçambique e Serra Leoa. O gráfico 1 mostra como o povo de mento econômico. É o processo de aprendizado, a qualidade do trabalho
Serra Leoa (onde 82% sobrevive com menos de dois dólares por dia) tem mais do professor e o quanto este ou esta profissional domina as técnicas e as
chance de se erguer da pobreza se tiver acesso a mais educação. 5 O que se habilidades básicas do processo de ensino-aprendizagem que permitem
mostra particularmente verdadeiro nos lares mantidos pelas mulheres, que a uma participação igualitária e o sucesso na sala de aula. Apenas professo-
pesquisa demonstra estarem mais inclinados a gastar sua renda em educação, res com formação adequada podem oferecer uma educação de qualidade,
saúde e alimentação. Situação semelhante é observada em todo o mundo. necessária para atingir maior crescimento econômico. O quadro "Por que
De acordo com Malhotm et ai (2005), uma força de trabalho educada, investir em professores" mostra as razões pelas quais investir nos profes-
húbil e sábia (especialmente se as mulheres tiverem condições iguais de sores e oferecer formação e apoio não é apenas necessário, mas também
contribuir) é uma das fundações cio crescimento sustentável. O governo de importante do ponto de vista do desenvolvimento econômico.
Malavi (2006) afirma: "A educação é a chave para se atingir a prosperida- Adquirir habilidades e conhecimentos é o primeiro passo. Os efeitos
de. É um catalisador do desenvolvimento socioeconómico, do crescimento da educação podem ser sentidos principalmente quando as pessoas têm
industrial e um instrumento para dar mais poder aos pobres, aos fracos e a chance de acessar oportunidades e aplicar suas habilidades nos setores
aos sem voz." Até mesmo a pesquisa do próprio FMI mostra o impacto posi- produtivos, fazendo a economia crescer. Os benefícios da educação para
tivo da educação no crescimento económico: "Um aumento nos gastos com o desenvolvimento agrícola são particularmente significativos porque este
educação de 1O/o do PIB estú associado ao acréscimo de três anos na escola- setor emprega a maioria da população (principalmente as mulheres) nas
ridade geral e ao aumento total no crescimento de 1,4 pontos percentuais economias pobres da África subsaariana. O setor da agricultura contribui
em quinze anos" (Baldacci ct ai 2004). Da mesma maneira, o aumento de enormemente para o crescimento do PIB dos três países estudados aqui,
1O/o nas taxas de matrícula resulta numa elevação de O, 1O/o no crescimento chegando a 40% em Serra Leoa (FMI, 2007a). Investir em educação aumen-
do Produto Interno Bruto (PIB) per capita. ta a produção agrícola e conseqüentemente promove maior crescimento
Hoje, sabemos que os países que deixam de investir na educação de me- econômico. Novamente, é o investimento na educação das mulheres que
ninas e mulheres enfrentam custos consideráveis tanto no crescimento eco- traz a maior contribuição para o aumento da produtividade agrícola. Um
nómico comprometido quanto na redução da fertilidade, da mortalidade in- estudo que observou a renda dos lares de Gana revelou que um ano adicio-
nal de escolaridade aumenta a produtividade nas fazendas entre 6% e 11%,
5
O Índice de Desenvolvimento Humano de 2007 do UNDP coloca Serra Leoa como o penúltimo entre dependendo das especificidades de cada realidade (Jolliffe, 2004).
177 paises.

Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 151


150 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais
Todos estes aspectos são particularmente significativos nos países em que planos decenais de educação. Ainda assim, o potencial da educação para
o desenvolvimento agrícola é uma estratégia central. As descobertas sugerem reduzir a pobreza e propiciar maior crescim('nto é limitado pelo estado
que a educação (especialmente para as meninas na educação primária) é um lastimável em que se encontra a educação oferecida; pelas disparidades
pré-requisito para maximizar as oportunidades apresentadas pelo desenvolvi- entre meninos e meninas nas matrículas e na realização dos cursos; pela
mento agrícola e pode gerar uma contribuição significativa para o crescimento falta crônica de professores capacitados; pelas dificuldades sociais e econó-
econômico. E, é claro, um maior crescimento econômico possibilita que os go- micas. Aqui, resumimos a situação do sistema educacional em Malavi, Mo-
vernos tenham mais recursos domésticos a serem canalizados para a educa- çambique e Serra Leoa a fim de identificar as mudanças que precisam ser
ção, a saúde e o combate ao HIV/Aids. Em Malavi espera-se que a agricultura feitas e verificar como as políticas macroeconômicas podem desempenhar
forneça o impulso central para o crescimento econômico. O diretor de plane- um papel decisivo para a obtenção de mudanças positivas.
jamento do Ministério da Agricultura afirmou que a modernização da agricul- Em Serra Leoa, a privação de direitos eleitorais imposta aos jovens
tura depende fundamentalmente da educação: "Estamos preocupados com a (principalmente devido à falta de educação) foi uma das principais causas
adoção limitada de técnicas de modernização. Somente as pessoas que têm ao da guerra civil. Depois que a paz foi estabelecida em 2002, o governo se
menos a educação primária estão adotando tais técnicas." preparou para reestabelecer a educação como um direito e aboliu as ta-
xas escolares. Entretanto, com o aumento na demanda, o governo enfrenta
. :Pcif,ique·ínvestk em professores é uma boa medida econômica o duplo desafio de reconstruir escolas (a maioria foi destruída durante a
p.;~'cpn~gúir ~c!u~ação de alta qualidade, aumentar p poder d~s mulher~s e ~ce1$!rar o guerra civil) e oferecer estímulos de qualidade no nível escolar (núme-
ciesciillel'lto:ecofiõmico; é necessário investir no "pacote coi'TIP.leto~ Isso.significa um nµmero
. iél~ijt~éí&~·Prt>féssores e protes5oiaúa1ários dignos, au~íiià'paiá'moradiae tránsjiort~; · ro adequado de professores capacitados, materiais pedagógicos para pro-
· •opoliünl~acies·qeformação, infraestrútura escolar (ind uindd bantieiro~l e materiàis' pedagógicos fessores e alunos). Também é necessário encontrar um meio de oferecer
·aprppr\à~oSi ,O ~e~.ultado ·ela. educaçãçi. p~o podé ser med idp .ape~a~ ~m; ter.mos de. a1\9s.,de. -_.. · educação às milhares de crianças e jovens que não receberam ensino por
·es<:Qlárid~d~; rrias principalmentepelas.capaclÇades·e hab~Hgadescognitivas;a.clqu_iridaS:,G)éwe .
(2b<füi~~efàíji.ie ,a aquisiçao de ti~biiíil~_aes étjg~itivas é ~mtoíte Çàm~o'ne~te.nà ~~terminação causa da guerra e àqueles que foram mutilados e desabrigados. Para lidar
dbs'.!jallhéls:Jáo ICRW (2005) derifonstra•queumacómbinação·entreanos·de~olàrtdi!dee boa . com o grande número de matrículas, o governo se viu obrigado a contratar
q~~lida~ ria'licfoça~ão_ conduz ~o aurn~i\tP. dó)qder das_rriµth~res ~-P:(~pid~· l)Íàior~,garí_h~s professores não-qualificados e sem formação adequada. É difícil encontrar
no seto,r da ,educaçãp; Eritr.e(9ntQi (!St~1ta,iwes)nã. , ...
é(laifdrtri,àÇãd,ea motivação dosp(ofé$o'r~fafél~líl· . ' ' .... ·.: . *' . ' :e dados precisos, pois os sistemas de bancos de dados foram destruídos du-
.. sei'fisuc-ê5So,ria.l!Séo1a•(lee e Barro, 2001;Hpez•Acevedo,20Q4). A{émdeoftl ecer• armação rante a guerra, o que dificulta uma visão precisa e completa da educação e
. lil!é!~l $"érn·~is,&.:e~.~~~iàl·r~m'ó'i~r:o,utros'ii~~taF~!~~,.~~~ pr~fll9i~~~-~ 5~P,~C,ii!~.1~:_d,os· das diferentes experiências de meninos e meninas nesse país .
. p~ofésS(iteS'i(eomtibàil!ossalâtios,'.taltiH,l,e:mot;ldta•.eitranspor.te1 e•apo1~r,ó·~rogre,sso'~~s ,···.
._ pÍ'ÓftSso~~.Da rilesmâ mànêira;'éir'iipórtàri~e'.ófere<:er um ambíent(q~ésej~ éá~isadOf. qo Embora o governo de Moçambique tenha estabelecido como prioridade
•:• .· apre'ildli!àcfcf ctfi:reeendà ma teriaJs, prófesS-O re5:a uxiliares e menor,núinér0.dÇiàJ~no5'por,1sála nacional a educação desde que obteve a independência em 1975, a guerra
'~?é'.~~1~,;~.m:Hªrtlf~l~r~ ~~m-~ntar qn~m~tó ~~;~Jun;o~p,~r PXQfe~sôf!.~_P{\~:'".P.f~fiÇlt~~,~~llret;é~Prf .. civil que se seguiu (1977-1992) prejudicou esse investimento. Desde o fim
:, àluno)iê Urt1â medida qúe parece ter efeito. s19ntfiCat1vament~.nega,t\VO .na.CQ~dl,l5ã,o ~p;çu_rso,
( 'nã!lí~lf<i\jf11çM1(~iif~·,ewipregÔ.é ~ófo~nlilÍs. d~s esfod~ntes cop; éilúcaÇ~6;'.lJ~'~\~'dõr:aJJ~do · · da guerra, as taxas de matrícula têm aumentado constantemente, mas a
~.Lnii:4fü~;ílR'.S.iJl,V'.é'riPceÚ~ire-µrii_'a,úiri~1Jtô:de'dnêoiàluti~~)lfiPA,.·çáu$;1va.;l111u!~c,r~~p:q~e· . contratação de professores e a construção de escolas não foram capazes
.;j~· ·' íÍPt~n!!í~l:~lar.la.l\lós ;il\i~c)$(Cíis(!~ .'(qgo,, ~ 9~~).~"'.i_de\'j~e,tjj~i.l~~ ª'-~~f\-~:p~~~~l,lll~~-g~ .-,
1>"· ''"' ........... · :' ....., •.::.;::• · ,,.., • .. ·..1 ·a"'·''.A"t~idos olristihltd'd~ rst"tr!ltícá• M-Unesécf!IEül · de acompanhar esse ritmo, resultando em salas de aula superlotadas e na
>lle•p, pfÇ11e""!'r~em.pr~!l-ª,ºs. ,_ ..... •,: ...__ .. ,,,,e,.-.~·-:·. ;, ..':>:·· <•.-.· ._ ..
r•· 5füíi _. .__. idáde:datóhl:ratàÇão âe' !Smílttões. dé professores·~11,rtoao•o muntla-p_àra que contratação de professores sem formação adequada. As recentes enchentes
;.~#~ri~ltlln~ad,~Í?PÀsacei~~eis:(Uri~scó,2Qp6;i); .. "·' ·, .'. · ::;: · ... : :< · · e ciclones no início de 2007 danificaram cerca de mil salas de aula nas
; '. i:- •' '· ~ .
províncias de Tete, Zambézia, Manica e Inhambane. O governo precisa
1.3. O estado da educação e do professorado em reconstruir estas salas de aula e ao mesmo tempo satisfazer a crescente
Malavi, Moçambique e Serra Leoa demanda por novas escolas e por universidades que garantam a formação
inicial em serviço para os professores. Adicionalmente, conforme as taxas
de matrícula e de conclusão do curso aumentam. cresce a pressão para que
O vínculo entre educação, redução da pobreza, desenvolvimento agrí-
o governo expanda o sistema educacional. Isto exigiria mio apenas a cons-
cola e crescimento económico é muito forte nos três países abordados nes-
trução de mais escolas de educação primária, como também a contratação
te estudo. Reconhecendo esse fato, os governos atualmente desenvolvem
de mais professores.

OMr r FMI· n imn•rtn no~ nnlltiras educacionais Confrontando as contradições· o FMI e, 1nveo;timento rio prot~~sorado 1 153
Em Malavi, o IVlinislfrio da l•~ducaçüo ainda está se recuperando após Tabela 1. Educação primária em Malavi, Moçambique e Serra Leoa
um litse marcada por desvio.'-' ele verba e corrupção da administração an-
País
terior. Al(,m disso, h{t o cenú1·io gerado pelo lançamento do programa de
Proporção bruta de
educaçüo universal grnluila 1·111 1994, quando as matrículas aumentaram matrículas (PBM)
mui lo e as escolas públicas lh l'ram cliliculdadc de acompanhar esse ritmo..
Atual proporção
!louve algum progresso na l'1rnslru~:iio de salas de aula e na distribuição professor-alunos
ele livros escolares, e o governo leve de contratar 22 mil professores sem
l"ormaçiio para responder a l'ssa nova demanda. Entretanto, os professores
nüo receberam a capacilaçiio 1·m serviço adequada, e a qualidade das esco-
las continua ruim. As taxas d1· abandono siio altas e as de conclusão do cur-
Proporção de abandono
so, baixas. Um rcpresenlanll' de um país doador chegou a definir os últimos do curso na 1a série*
dez anos como uma " ... cifrada perdida para a educação em Malavi". Um Taxa de conclusão
integrante de uma organiza~·:-10 local de saúde, a Rede de Saúde Igualitária
de Malavi, perguntou: "l'arn onde estamos indo'? Perdemos a direçiio como
Transição para a
país no que diz respeito ú educação". educação secundária
Apesar do aumento no 11i"1rncro de matrículas na cducaçiio primária, os
resultados com rela~'.iio its c011quislas de aprendizado foram variados. A ta- Fonte:
bela 1 moslrn que, mesmo co111 a disparidade existente entre as taxas de ma- Fontes diferentes foram utilizadas para descobrir esses dados. A maioria provém de documentos
governamentais mas alguns são de outras fontes internacionais.
trícula entre os ln\s países (('111 Malavi chega a att' 95%," enquanto em Serra
Leoa o número mio passa de (i)'Yti), todos eles apresentam altas taxas de aban-
• taxas de abandono do curso na 1' série de acordo com o Relatório Global de Monitoramento da
dono, baixas taxas de conclus:io, fazendo com que poucos consigam chegar à Educação 2007.
cducaçiio secundúria, indica11do que as crianças nüo permanecem na escola ··calculado como total número de matriculas para a 1' série de 2006 como percentual de 8 estudan-
por tempo sulidcnte para adquirir habilidades básicas de alfabetização. Isto tes de nivel básico que fizeram os primeiros exames de transferência em 2005.

lica ainda mais darn quando se observa a l'PA (proporçiio professor aluno),
Outros dados são provenientes de:
que est{t sempre hem acima do tamanho recomendado de sala de aula de 40
Moçambique: Ministério da Educação e da Cultura, Banco de Dados da Educação; números de 2005.
alunos ou menos para um prnl'cssor, critério adotado pelo Banco Mundial e Serra Leoa: Proporção bruta de matriculas oferecida pela Pesquisa de Lares 2003/2004.
pela comunidade doadorn como padriio para os países cm desenvolvimento. Dados quanto à conclusão para 2004, do Relatório do Banco Mundial para o Setor da Educação 2006;
Pesquisa Integrada de Ocupações e Lares de Serra Leoa 2003/2004. Dados de transição do Ministério
Tal padriio foi assumido cm resposta a pesquisas que demonstram de for-
da Educação e Treinamento Vocacional, Estatísticas do Educação 2006; outros dados provenientes
ma inconlcslc que h<I delcriornçüo na qualidade cio ensino e do aprendizado do Relatório PRSP 2007.
quando a quanliclaclc de alunos por sala excede esse número.
Alfan disso, hú a prcocupaçiio ele que alguns dos dados ocultem pro-
Um motivo central para os baixos níveis de aprendizado é a falta de
blemas mais profundos, co1110 o uso da progressão automática em vez da
professores qualificados. O vaslo número de prol"essores sem formação que
prática anterior ele avaliar ;1s crianças no lim ele cada ano letivo e fazê-las
trabalham nas escolas est<í gerando impacto na qualidade da educação não
repelir o ano caso nüo l(>ss1·111 aprovadas. Em Moçambique, por exemplo,
apenas em Malavi, Moçambique e Serra Leoa, mas em um número cada
a progrcssiio automúlica nas séries 1, 3, 4 e () reduziu consideravelmente
vez maior de países de baixa renda por todo o mundo. Para colocar todas
a proporçiio de rcpclt~ncia l' aumentou o número de promoções (Repúbli-
as crianças na escola em salas de aula com menos de 40 alunos, a Áfri-
ca de Moçambique, 2005a). mascarando o problema !alente das irrisórias
ca subsaariana (que tem atualmente 2,4 milhões de professores) precisará
conquistas letivas. aumentar esse número em 68%, para 4 milhões de professores (Unesco,
i;Esses dados são do Relatório de Monitoramento Global da EFA 2007. Nota-se que esse número é 2006a). Entretanto, colocar mais professores nas escolas é mais complicado
diferente dos dados oferecidos pelo qoverno de Malavi, os dados do EMIS de 2006 revelam que a do que simplesmente encontrar os recurso~ para contralá-los. Há muitos
PBM é superior a 1000/o. Considerando que isso é por definição impossivel, esse número alternativo
outros obstáculos na educação que precisam ser enfrentados:
é usado para fins de comparação.

1 S4 \ Banco Mundial. OMC e FMI: o irn ..1cto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 155
Altas taxas de abandono - O abandono de docentes da educação primá- mulheres (República de Serra Leoa 2007a; BanC"o Mundial 2005a; Governo de
ria é muito alto em Malavi e Serra Leoa, muitos deixam o emprego após Malavi 2006). Em Moçambique, a presença d(' prnli~ssoras {~um lhtor signifi-
cinco e quatro anos de serviço, respectivamente. Nos últimos três anos, o cativo para determinar as demandas da eduea~·(10 b1ísica (1 landa 2002).
número total de professores diminuiu em Malavi: entre 2000 e 2004, cerca
de mil professores por ano deixaram a profissão ou morreram (muitos de Distribuição desigual de professores - Em princípio, isso é verdade nos
males relacionados ao HIV/ Aids). Um número adicional de 2.071 saiu das três países, onde as PP As variam bastante. Por t•xcmplo, a PI' A da regiüo sul
escolas em 2006 (Governo de Malavi, 2006) - ao menos 25% por causa de de Serra Leoa é de 1:56, na regiiio leste é de 1:74 (Hepüblica de Serra Leoa
doenças relacionadas ao HIV/ Aids. Baixos salários são outro fator chave 2007a). Entretanto, a redistribuição dos professores nas úreas rnrais (onde
para o abandono: enquanto o governo considera a proporção dos salários a PPA é mais alta e as professoras são em me1w1· número) custa caro. Incen-
razoável, uma análise contábil independente de 2005 revelou que o salário tivos e bolsas corno o auxílio moradia, auxílio ele sobrevivt~ncia e custos de
básico de um professor capacitado era de 7.700 kwachas malawis (55 dóla- transporte são necessários para atrair professores capacitados alô úreas cm
res), enquanto o salário mínimo necessário para comprar uma cesta básica condições mais precárias. A soluçiio mais utiliwda pelos países, inclusive
era de 15.000 kwachas malawis (107 dólares).7 por Serra Leoa, é a contrataçiio de pessoas d11 comunidade para dar aula.
Entretanto, a maioria das pessoas nas áreas r·urais mal completou dois-três
Baixa capacidade de formação - O governo de Moçambique niio possui anos de escolaridade e niio estú preparada ou t•quipada para ensinar.
a capacidade de formar adequadamente todos os professores, deixando 38%
deles sem capacitação profissional. Em resposta, o Ministério da Educação Falta de uma base de dados confiável sobre os professores - Serrn Leoa
implementou um novo programa de formaçiio ele professores que requer não dispõe de uma base de dados centralizada para acompanhar adequa-
apenas um ano de curso (em vez ele dois) após a 10" série. Essa medida damente o número ele professores em serviço,. suas qualilicaçües. Moçam-
quase dobrou a capacidade de forrnaçiio de professores. Anteriormente, bique tem três diferentes bases de dados de S('rvidorcs públicos, todas com
apenas 3.500 professores concluíam a capacitação a cada ano. Agora são informações diferentes quanto ao mhnero n1•,·cssário de prnfcssores. Isso
quase 6 mil os professores concluindo a formaçiio inicial. Há grande pre- causa muitos problemas, não somente para o l'idculo da quantidade neces-
ocupação, no entanto, da sociedade civil e até no Ministério ela Educação sária de professores e onde, mas também par;i a avalia~~ão do cMculo do
quanto à qualidade desta formação. Caso ela não seja aprimorada, acaba- custo de contrataçiio destes. Há muitas queixas quanto ú !'olha de pagamen-
rá prejudicando os esforços de melhorar a qualidade do ensino por meio tos, inchada com salários de professores fantasnrn, que ainda aparecem no
da contratação de mais professores. São necessários mais recursos para sistema. Em Serra Leoa, os professores fantas111a siio uma conscqüéncia da
apoiar uma política de formação de professores que garanta a qualidade. guerra, sendo freqüentemente citados como nwtivo para manter a rcstri-
"Atalhos" nos programas ele formação não siio a resposta. çiio aos gastos com salários dos professores. l•:ntretanto, pouco se fala da
existência de um número quase igual de proli·sson•s ativos forn da folha
Falta de professoras - Niio hú número suficiente ele professoras, o que afe- de pagamento.
ta diretamente o já baixo número de meninas matriculadas que freqüentam,
concluem e têm sucesso na escola (Handa 2002; República de Serra Leoa Essas são limitações que restringem a eapill'idadc do governo de contra-
2007a; República de Moçambique 2005 e 2005a). Adicionalmente, Unterhal- tar e empregar com maior eficiência os profl•ssorcs. Entretanto, todas elas
ter (2007) observou que a baixa proporção de professoras está relacionada a podem ser encaradas como resultado de um;i l'alla acumulada dt• inves-
outros aspectos da desigualdade entre os sexos na educação (baixos níveis timento no sistema educacional ao longo de 111uitos anos. Nos trôs países
de matrícula na educaçiio primária e secundária, baixa reprovação e falta de estudados, há provas da seriedade cios governos para solucionar estas limi-
mulheres envolvidas nas decisões públicas) tanto em Malavi quanto em Mo- tações de capacidade, mas para fazt~-lo adequ;idamentc é necessário mais
çambique. Em Serra Leoa e Malavi, aproximadamente 50% da equipe ela edu- dinheiro. Seria errado utilizar dessas dcficit\1wias como motivo para niio
cação primária e 20% da equipe ela educação secundária siio compostos por aumentar o investimento: isto acabaria pcqwt11a11do o problema. Falando
de Moçambique, .leffrey Sachs reconheceu qu1· o país st\ poderia atingir as
7 Estes números são do Centro de Preocupação Social (2005) e nos foram relatados pelo coordenador
MDM se houvesse maior disponibilidade dt• n·cursos. Ele li~z críticas aos
da coalizão da sociedade civil pela educação primária de qualidade em Malavi.

156 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais


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~~----~·~,~-,,,~~"'H~~,····~-·----·-"<-,,C~H''"~,_w,-,_ ~,,"""""-•'•, '
Confrontnndo as rontradiçõrs: n FM: o invrstimf'nto no profrS'>orado 1 157
doadores e ao FMI alir111a11do que ·'o PARPA 11 8 não é ambicioso o bastan- famílias financiam 44°% dos custos apesar de a cducaçüo ser supostamente
te, e sabemos o porqul\ l\;lo hú apoio da comunidade internacional. Eles gratuita desde 2003. A lacuna de linanciamento estimada para que se atinja
dizem 'Niio andem rúpido demais. Vocês niio dispõem da capacidade de ab- a conclusão do ensino búsico (CUEB) até 2015 é de 28,4 milhões de dólares
sor\·ão."' Como resultado, diz, eles relutam em aumentar os investimentos por ano. A lacuna total recorrente para se atingir a PPA de 1:45 entre 2007 e
nos setores sociais (llanlo11, 2005). 2015 é de 254 milhões de dólares. Para que Serra Leoa atinja esta projeção
Nossas descobertas suµ:crem que países que enli·enlam restrições or- de PPA de 1:45 (que é mais alta do que aquela recomendada pela Iniciativa
çamentnrias fazem escolhas dilieeis e lançam miio de soluções aquém do Via Rúpida, de 1:40) até 2015, 5,5% do PIB devcrft ser gastos em educação,
ideal. Com o aumento do número de matrículas e a falta de professores, os isso significa que 47,7% dos custos lixos seriam gastos apenas com a educa-
governos contratam cada 'cz mais professores sem formação. Quase 40% ção primária (República de Serra Leoa, 2007a).
dos professores da cduca\,'iio prim{1ria cm Serra Leoa e Moçarnbique não Considerando-se essas lacunas de linanciamento, é essencial criar um
receberam formação (l\cp1'1blica de Serra Leoa 2007a; República de Mo- ambiente que propicie um maior investimento em cducaçüo tanto dos do-
çambique 2006). Em Mala\ i, como na maioria dos países, professores sem adores quanto dos governos. Mas isso exige atenção continua para uma
formação foram contratados para responder com rapidez à grande deman- série de limitações, algumas das quais vüo muito além da educação. O nível
da de matrículas rcsullanlc da isenção das taxas escolares cobradas dos de investimento em educação e o potencial para aumentú-lo dependerão
usuúrios. Assim, conlrutar prol'cssores sem formaçüo se tornou a política da capacidade dos países de gerar mais recursos domésticos e do volume,
oficial em Serra Leoa, ondt• a proporção dos salúrios dos professores é di- previsibilidade e regularidade dos recursos externos a serem gastos com
vidida entre onze calcgori;1s, baseadas no nível de formaçüo (República de edueaçüo. Ambas as variáveis seio determinadas em parte por políticas fis-
Serra Leoa, 200Cill). Da nwsrna maneira, cm Moçambique, o governo está cais e monetúrias. Essas políticas süo projetadas para apoiar o crescimento,
implementando um novo programa de f'ormaçüo de um ano de duração. gerar renda e absorver a ajuda inlcmacional?
O Ministério da Educaçfio paga a esses professores menos do que àqueles
com dois anos de l(u·nrnç<io. De modo geral, a lhlta de capacitação tem ge-
1.4. O contexto macroeconômico de Malavi,
rado um impacto ncgath" na qualidade do ensino e, conseqüentemente,
do aprendizado (Grupo d1· ·\ valiaçüo Independente, 2006). Infelizmente, os Moçambique e Serra Leoa
tr!~S países não ll\111 capal'idadc de ol'crecer formação cm serviço adequada
para o grande nlinwr·o de prof(~ssores sem qualilicaçiio e nem condições de O contexto macroeconômico destes países e da maioria dos países de
formar novos prnl'cssorcs. baixa-renda é fortemente in11ucnciado pelo FMI. Os três países buscam
l~m resumo, os gov1~1·1111s de Malavi, Moçambique e Sei-ra Leoa terão
metas in11acionárias de um único dígito e baixos níveis ele déficit fiscal. Em
de superar imensos dcsalios para que todas as crianças recebam educa- Malavi, essas políticas macroeconómicas restritivas !'oram inicialmente ne-
ç<io de qualidade. Adotar 11111 plano educativo de longo prazo é um passo cessárias para conter os gastos excessivos e irrcsponsúveis do governo. Em
importante nessa direção. l•:ntrctanto, obter o investimento adequado para 1987 Moçambique assinou o seu primeiro acordo de empréstimo com o
financiar este plano jú cnYolvc outras questões. Embora Moçambique gaste FMI em um momento cm que o país atravessava a transiçüo de uma econo-
20% do seu Ol\'.amento tot;d ({i% do PIB) com cducaçiio, ainda há uma la- mia planejada para a de mercado. As medidas econômicas implementadas
cuna no linanciamento da ordem de 26 milhões de dólares em 2007: cerca durante este período ainda esliio em vigor até hoje. Em 2001, logo após
de 30% do Ol\'.amcnlo da nlucaçfio é financiado por fontes exlcrnas.'1 Tanto guerra civil, o governo de Serra Leoa passou a seguir os conselhos do FMI,
Malavi como Serra Leoa gastam menos que os valores recomendados. Em reduzindo os gastos governamentais para garantir a estabilidade macroe-
Malavi, a educação rcspo11dia por 11% do orçamento nacional (3,5% do conómica, levando a inl1a1,'.ão de 12,1 1\!o em 2005 para 5% em 2008.
PIB) cm 200Ci-2007 (Governo de Malavi, 2006a). Em Serra Leoa, a educação Entretanto, os três países atingiram um grau razoúvcl de estabilidade,
demanda HJ!l.'o do orçamento total (4,9°/ci do PIB). O gasto interno público re- com crescimento de 5% a 6% ao ano e uma inl1açüo anual de 9% a 12%. As-
presenta 35 1\io do gasto tot;1 I, os doadores contribuem com cerca de 22%, e as sim, esses países deveriam agora voltar suas atenções para metas sociais e
econômicas mais amplas, incluindo as MDM. Um economista entrevistado
"PARPA li é o plano nacional de Morambique para a redução da pobreza absoluta entre 2006-2009. em Serra Leoa observa que: "Um grande desalio enfrentado por Serra Leoa
"Apesar de 500/o do orçamento nacional ser mantido através de auxilio direto ao orçamento. agora é como garantir a estabilidade macroeconômica, gcmr empregos, re-

158 \ Banco Mundial, OMC e FMI: o t"1p~cto nas politiCéJS educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado j 159
cuperar o crescimento e aumentar o investimento em educação e saúde.
Uma economia que saiu de um conflito, como a de Serra Leoa, enfrenta 2. Acertando o gasto
decisões muito difíceis. A necessidade de controlar a inflação e os déficits
pode ditar medidas austeras que, por sua vez, podem contrariar as priori-
dades sociais e a expectativa popular pela paz. Além disso, um orçamen-
com salários: nece:~sidades de
to muito apertado pode levar à deflação e ao desemprego, especialmente
quando o investimento privado é muito baixo." professores versus
Entretanto, quando questionados sobre a possibilidade de aumentar os
gastos em educação para atingir essas metas, os ministros das finanças e do macroeconomia
planejamento dos três países respondem: "Não se pode sacrificar a macro-
estabilidade". Assim, fica claro que poucos governantes tinham noção do
2.1 Acertando os tetos salariais s.ibre a folha
que significava a macroestabilidade, além de cumprir as metas das MRPC.
Muitos governantes mostraram-se confusos diante da tentativa de justificar
de pagamentos
os números previstos em seus programas. Parece perfeitamente claro que
"Hd uma necessidade de maior coerênd11 entre o que muitos
os números estabelecidos nos programas das MRPC ajudam a definir o es-
governos, inclusive o de f!Vashington, rli.'fi'ndem junto aos go-
paço fiscal disponível para a consideração de gastos adicionais com educa-
vernos qfricanos com relação à necessidade de gastar mais em
ção, e esses indicadores constituem um determinante primário das despe-
saúde e em educação primária e o que as instituiç6es interna-
sas planejadas para educação. É essencial, portanto, compreender a lógica
cionais, controladas em boa medida pl'los mesmos governos
e as implicações dessas metas macroeconômicas e as teorias nas quais elas
ocidentais, jazem ao prl'ssionarem os paiscs q[ricanos a rulu-
se baseiam quando consideramos a necessidade de um aumento do gasto
zir afolha de pagamentos desses governos, o que inclui prq{es-
com educação no sentido de permitir a contratação de novos professores.
sores e trabalhadores da saúde."
(A África no Encontro elas Nações, cclitol'ial do New York Ti-
mes, 417/2005)

e ontratar e pagar professores é uma obriµ:açiio dos governos. Os sa-


lários dos professores (assim como dos tl'Hbalhadorcs da saúde, dos
gabinetes dos ministérios e de Lodos qtu· trabalham cm outros ser-
viços controlados pelo governo) estão garantidos por um item-padrão no
orçamento nacional chamado de folha de pagamentos cio selor público.
Essa folha de pagamentos é responsável por urna considerável parcela dos
gastos fixos - 50% em Moçambique, 25% cm Malavi e 43,80/o cm Serra Leoa
(Ministério das Finanças, 2006) do orçamento Lotai. Professores e traba-
lhado.res da saúde costumam ser o custo mais alto na folha de pagamento
simplesmente por causa do seu número. O tola! da folha de pagamento
destinado aos salários de professores representava: 37% em Malavi, 35%
em Moçambique e 35% em Serra Leoa (Minislfrio das Finanças, 2006). Da
mesma maneira, o custo com pessoal representa uma importante fatia cio
PIB: 2,7% em Malavi e Moçambique e 4,5°/ti em Serra Leoa (l\epública de
Serra Leoa, 2007a).
Controlar a folha de salários é uma maneira conveniente de contro-
lar o tamanho do orçamento total. Tendo ern vista que a folha salarial

160 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educaciorais Confrontando as contradições: o FMI e n investimento no professorado 1 161
t'..

é financiada primariamc111c por recursos públicos, se o PIB não crescer


conforme o planejado, ou até mesmo for reduzido, resta menos a ser • Em Moçambique, a MRPC não inclui mais um limite sobre os sa-
gasto com salários. Qualquer meta de restrição orçamentária repercu- lários. Entretanto, as restrições orçamentárias fizeram com que o
tirá, inevitavelmente, em um limite sobre a folha de pagamento. Se os governo mantivesse um teto salarial muito baixo e metas fiscais e
professores e os trabalhadores da saúde representam a maior parte da monetárias ainda mais austeras.
folha de pagamento, qualquer alteração no gasto com pessoal do total do
orçamento certamente acarretará um impacto sobre eles. Fórmula misteriosa: nenhuma contabilidade
Estabelecer um teto para os gastos com a folha de pagamento é normal,
representando uma boa medida econômica; mas também é importante. para Então, quais são as informações utilizadas para determinar os tetos?
garantir que o gasto com pessoal não fuja do controle. Em Malavi, o governo Para esta definição, é levada em consideração a falta de professores e de
havia tido dificuldade de controlar os aumentos de salário e as contratações, trabalhadores do setor de saúde? Entrevistas com membros dos gabinetes
considerando o limite de gastos uma medida saudável para garantir a disci- dos ministérios da educação e de finanças dos três países revelaram que
plina orçamentária. O FMI sustenta que um teto flutuante para gastos pode o patamar do teto salarial diretamente aplicado à folha de pagamento não
levar à instabilidade macroeconômica a curto prazo, seja pela sobrecarga que é baseado em estimativas de necessidade, mas em médias internacionais
impede outros gastos govemamentais, seja pelo aumento geral nos gastos do arbitrárias. 10 Esse valor varia de país para país: 6,1% do PIB de Serra Leoa,
governo, ou por levar a um aumento crescente dos salários e dos preços por 7,5% em Moçambique e 7,2% em Malavi. Em Serra Leoa, o valor decai
toda a economia, o que poderia levar a uma inflação maior (Fedelino et ai discretamente durante um período (de 6,1% em 2005 para 5,9% em 2008).
2006). Assim, um teto para gastos com a folha de pagamento é freqüentemen- Qual poderia ser a lógica por trás desses números, quando o planejamento
te assumido como critério de desempenho ou meta indicativa nas MRPC. setorial desses países exigiria um aumento dramático no número de pro-
Entretanto, apesar da lúgica aparentemente sólida para limitar o cres- fessores, apenas para acompanhar o ritmo crescente das matrículas? Ne-
cimento do serviço público, é importante observar com atenção a maneira nhum dos entrevistados soube apontar a origem dos tetos salariais que eles
como esse teto é calculado. quais informações são utilizadas nesses cálcu- próprios empregavam, e o FMI não ofereceu qualquer justificativa sobre o
los e em qual patamar esse teto é estabelecido, lembrando que também há cálculo desse valor ou sobre a comparação utilizada para tal.
uma forma indireta ele limitar o gasto com a folha salarial. O FMI afirma O teto sobre o orçamento total é calculado por meio de um modelo ma-
que os governos determinam o limite com gastos salariais, e não o próprio croeconômico de projeções. Entretanto, nos três países havia considerável
Fundo. Isso não é verdadeiro para os países estudados já que um teto ex- ambigüidade na fórmula de cálculo utilizada. Por exemplo, em Malavi os
cessivamente restritivo ao gasto total do governo irá limitar, por definição, chefes de gabinete do Ministério das Finanças sugeriram que procurásse-
a folha salarial. mos o Ministério do Planejamento Econômico e Desenvolvimento para ob-
ter uma cópia do modelo macroeconômico. Ao fazermos o mesmo pedido a
• Em Malavi, o limite para gasto com a folha salarial (atualmente esse novo ministério, seus assessores indicaram que procurássemos o Mi-
definido em 7,2% do PIB) é um critério de desempenho: ultrapassar nistério das Finanças para a mesma finalidade. Igualmente, encontramos
esse teto faria o país se atrasar no cronograma da MRPC; ambigüidade sobre as fórmulas empregadas nos outros dois países. Desse
modo, descobrimos que a documentação programática do FMI não expõe
• O teto salarial sobre a folha de pagamentos de Serra Leoa é defini- claramente a lógica ou a justificativa para uma medida específica, o que
do como meta indicativa mas, por ser tão limitante, o governo foi torna dificil questioná-la e comentá-la (IEO, 2003), e o que também compli-
forçado a restringir a contratação de novos professores. Nesse caso, ca uma eventual correção posterior (Goldsbrough, 2006). Em Moçambique,
foi o governo quem decidiu limitar o número de professores, mes- um oficial do governo declarou que:
mo sendo o resultado de uma recomendação do FMI. Para permitir
maior controle da folha de pagamento, em 2006 foi acrescentado
um critério estrutura 1 de desempenho para um banco de dados dos 'º Em Serra Leoa, o FMI considera a folha de pagamento "alta", absorvendo 550/o do produto interno
servidores públicos, incluindo professores; bruto. Esse valor é considerado acima da média da Comunidade Econômica dos Estados do Oeste
Africano (ECOWAS).

162 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o ir11pacto nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 163
res e trabalhadores do setor da saúde que o governo pode contratar. Isso
"O processo de estabelecimento das medidas macroeconómi- cria vantagens e desvantagens que têm impaclo direto na vida das pessoas
cas consiste fundamentalmente em 'reconciliar os dados' do e influenciam o rumo do desenvolvimento li11uro do país como um todo.
governo com os do FMI. Quando a missão do FMI chega na Portanto, é essencial que os governos lenham um amplo leque de opções
cidade, eles comparam os seus dados com os dados do governo a considerar, e que as escolhas finais estejam nas mãos de governos res-
e ajustam os seus próprios dados para que cheguem em acordo ponsáveis perante o povo que os elegeram, e nfio leais a instituições finan-
quanto às metas macroeconómicas. É somente no final que as ceiras internacionais. EnlJ·etanto, a abordagem do FMI encoraja as nações
medidas são debatidas e a economia real é considerada." a acreditar que existe apenas uma verdade, um único conceito de estabi-
lidade macroeconômica e que se trata de uma posição unilateral, estável
Falta de consulta ou instável, de acordo com o plano ou não. As considerações de um relató-
rio recente do Escritório de Avaliação Independente (EAI) mostram que a
O que fica claro é o não-envolvimento do Ministério da Educação no mesma abordagem binária compromete a absorção da ajuda dos doadores
estabelecimento do limite de gasto com contratações. As necessidades da (Quadro "Não gastar as doações: descobertas do relatório do EAI").
área não são consideradas para a determinação desses tetos sobre a folha Ainda assim, um número cada vez maior de economistas questiona a
de pagamento ou orçamento total. Em vez disso, esses ministérios têm de natureza restritiva das medidas fiscais e mon<'l{trias propostas pelo FMI e
lidar com as conseqüências, distribuindo os professores pelo país depois se pergunta se níveis muito baixos ele inflaçiio e déficit fiscal seriam rele-
da restrição ter sido estabelecia. Em Serra Leoa, por exemplo, muito rara- vantes e apropriados para países de baixa renda. Isso Leve efeito direto na
mente o Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia informa a respeito validade dos limites impostos ao gasto orçamentário e à folha de pagamen-
de suas necessidades: a falta de professores, as demandas de formação ou to e, portanto, à contratação de novos professores.
os níveis salariais antes de ser calculado o limite para o gasto salarial. Além A questão a seguir não pretende ser uma i nlerpretação abrangente ela
disso, poucos funcionários dos Ministérios da Educação têm confiança, ca- teoria macroeconômica. Nosso objetivo é chamar alençfio para a diversi-
pacidade ou oportunidade de questionar essa situação e propor alternati- dade ele opiniões sobre alguns dos fatores m<HTocconômicos aos quais os
vas: espera-se deles que aceitem as decisões tomadas pelo Ministério das países são incentivados a aderir. Fazemos isso com a esperança ele que os
Finanças quanto ao número de professores a ser contratado. Em Malavi, os países possam questionar, desafiar e chegar ao seu próprio ponto de vista
esforços para negociar um gasto maior com educação não sensibilizaram quanto ao melhor caminho a ser seguido.
ninguém (motivo de muita frustração para os parlamentares). Com maior
confiança (possibilitada pelo maior conhecimento econômico), eles come- 2.2.1 Taxas de inflação de um único algarismo são a melhor opção
çaram a desafiar a opinião do Ministério das Finanças. Mesmo assim, até para países de baixa renda?
hoje, o contexto macroeconômico não dá espaço para negociação. E não há
uma perspectiva otimista de que isso mude. "A regra dos 7% é uma regra para tempos normais, ma.~ estes
não são tempos normais."
2.2 Justificativas macroeconômicas para o gasto sa- (Oficial chefe do Ministério das Finanças de Malavi).
larial
A missão principal do FMI é manter a "estabilidade macroeconômica",
"Tetos sobre afolha de pagamento resolvem o problema a cur- o que, segundo a definição do Fundo, implica q11e os países têm de "manter
to prazo. Mas são, qfinal, incapazes de resolver as pressões a balança fiscal e a conta-corrente consistentes com níveis cada vez mais
baixos de endividamento, inflação na casa de um dígito, o mais baixo possí-
macroeconómicas a que se propuseram"
(Fedelino et al, 2006) vel, e o PIB per capita em crescimento" (FMI, 2001). De acordo com o FMI,
níveis de inflação acima de 10% podem afetar negativamente as pessoas
pobres, porque os preços de bens de consumo básicos se tornam muito ca-
Um contexto macroeconômico focado na inflação, nos níveis de déficit
ros, afastando os investidores internacionais e prejudicando a perspectiva
fiscal e nos tetos sobre os gastos públicos limitará o número de professo-

164 1 Banro Munrtial. OMC: r FMI: o imoarto nas ooliticas educaciooais Confrontando as contradicões: o FMI• n irwe~timrnto no nrofr')i;nr.ido 1 1fiS
de boas taxas de crcscimc11to no futuro (FMI, 1997). A principal forma de estabilidade baseada em resultados. Outros buscaram a macro-
atingir essa meta inllacionúria tem sido empurrar rapidamente a inllação estabilidade ao custo de medidas que incentivaram o crescimen-
de níveis médios até níveis muito baixo, freqüentemente por meio de cortes to, como a provisão adequada de bens públicos, bem como de
nos gastos públicos e do aumento dos juros a curto prazo. Uma vez que essa investimentos sociais, que aumentaram o ritmo de crescimento e
meta de baixa inllação é atingida, os países têm de fazer todo o possível fizeram a estabilidade mais durável (Banco Mundial 2005).
para mantê-la como está. As metas inllacionárias atuais estão estabelecidas
em 6% para Moçambique, 7,4% para Malavi e 9,5% para Serra Leoa, e nos Em países como Malavi e Moçambique, que obtiveram a estabilidade
três países espera-se que a inllação caia para 5% até 2009-2010 (FMI, 2006). e agora procuram obter maior crescimento econômico, a busca pela baixa
Da mesma maneira, conforme demonstrado na tabela 5 deste relatório, to- inflação de um só dígito pode ser especialmente prejudicial. Moçambique,
dos os 25 países analisados tinham taxas de inllação bem abaixo dos 10%; por exemplo, apresentou taxas de inflação moderadas entre 10% e 12% nos
20 deles, abaixo de 5%. Co11f'orme mostra o quadro "Não gastar as doações: últimos cinco anos. Ainda assim, o governo acha que deve reduzi-la ainda
descobertas do relatório do EAI", em muitos países de baixa renda, um pa- mais até 6% por medo de que a manutenção dos níveis atuais possa amea-
drão de inllação em 5%, que há muito se caracteriza como a principal meta çar a estabilidade macroeconômica. O FMI afirma que uma taxa moderada
dos programas de estabilizaçiio do FMI, continua a determinar os níveis de de inflação apresenta maior risco de rapidamente fugir ao controle (Roger
doação e o volume dos gastos públicos (EAl, 2007). e Stone 2005). O histórico recente de Moçambique demonstra não ser o
Entretanto, os economistas discordam quanto ao fato de uma infla- caso. Se taxas moderadas de inflação entre 10-20% fossem aceitáveis na
ção alta ter maior impacto negativo sobre a pobreza e o crescimento. En- constituição de uma economia "estável", como argumentam muitos eco-
quanto alguns argumentam que países de inllação de um dígito só cres- nomistas, isso permitiria a Moçambique maior llexibilidade e espaço fiscal
cem mais rápido do que países com inflação moderadamente mais alta, nos próximos anos, possibilitando ao país aumentar os gastos públicos.
há provas contrárias de que o crescimento a longo prazo não é afetado O FMI preocupa-se que o aumento da folha de pagamento por meio
por uma inllação moderada de dois dígitos (Chang e Grabel, 2004). da contratação de mais professores possa levar à inllação (Fedelino et al,
De fato, muitos estudos afirmam que reduzir a economia por meio da 2006). Quando o governo aumenta a folha de pagamento (seja pela contra-
baixa inflação de um único dígito para diminuir a demanda e os gastos do tação de novos empregados ou pelo aumento dos salários), ele está de fato
governo tem resultado num crescimento mais lento para os países pobres colocando mais dinheiro no bolso das pessoas, provocando um aumento
(Spiegcl, 2006; Wcisbrol et ai, 2005; Banco Mundial, 2005; GAO, 2001; Barro, na demanda por bens. Entretanto, em curto prazo a quantidade de bens
1996). Pollin e Zhu concluem que "não há justificativa para medidas contra a permanece a mesma. Até que os fornecedores produzam maior quantidade
inllação da maneira como s;1o atualmente aplicadas entre os países de média para satisfazer a maior demanda, os preços aumentam, causando a infla-
e baixa renda, ou seja, mantendo-a entre 5% e 5%" (Pollin e Zhu, 2005). ção. Portanto, se o governo está tentando atingir uma meta inflacionária
Até o Banco Mundial (a agência irmã do FMI em Washington) identifi- de um único dígito, é necessário gerenciar rigorosamente os gastos com
cou que uma inllaçiio inferior a 20% não traria impacto negativo óbvio para a folha de pagamento para atingir tais metas e não pode correr o risco de
taxas de crescimento eco111\rnico a longo prazo em 127 países entre 1960 e contratar novos professores.
1992 (apud Bruno, 1995). Essa pesquisa indica que manter taxas modera- Entretanto, nos três países, descobrimos que os salários não eram os cul-
das de inllação não colocaria necessariamente em risco a estabilidade ma- pados pelo aumento da inllação. Todos afirmaram (tanto o FMI quanto o go-
croeconômica, ao passo que conseguiria acomodar um maior gasto público verno) que os principais fatores responsáveis pela inllação são os choques cli-
em setores prioritários eo1110 a educação. Da mesma maneira, um estudo máticos, como as secas, que danificam a produção agrícola, ou o aumento no
do Banco Mundial descobriu que: preço do petróleo. Em Moçambique, com o aumento da folha de pagamento
em 2005, percebeu-se que a principal razão para o país não ter atingido a meta
a busca pela macro<'stabilidade, defüiida estritamente, em al- inflacionária de 10,8% foi a alta no preço dos alimentos causada pela seca do
guns casos pode ter prejudicado o crescimento. A preocupação ano anterior (República de Moçambique 2004). Assim como o aumento do
com a rápida redu(·rio da inflação induziu alguns países a preço do petróleo, esse fator não podia ser controlado pelo governo.
adotar regimes de câmbio que estavam em contradição com a A questão central é que as escolhas quanto às medidas econômicas (como,

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por exemplo, o nível de inflação aceitável) sempre envolvem perdas e ganhos. O lucro disponível para o governo determina o seu espaço !iscai, idéia for-
Permitir o aumento da inflação pode prejudicar o poder aquisitivo dos assala- temente ligada ao conceito de sustentabilidack !iscai. O FMI define a sus-
riados enquanto beneficia inesperadamente os ricos proprietários. Mantê-la tentabilidade fiscal como sendo "a capacidad<' de um governo, ainda que
baixa por meio do aumento da taxa de câmbio acarreta desemprego, o que futura, de financiar os gastos dos seus progra111as planejados e atender às
penaliza os pobres sem escolaridade, especialmente as mulheres; 11 enquanto obrigações devidas" (Heller 2005). Em outras palavras, qualquer gasto go-
a redução da inflação por meio do encolhimento dos gastos governamentais vernamental acima ou além do seu próprio prnduto (chamado de déficit
freqüentemente requer cortes nos serviços dos quais os pobres dependem, fiscal) requer o aumento do espaço fiscal no fuluro.
como a educação e a saúde pública. O preço alto dos alimentos pode ser bom O gasto do governo com salários tem implicações graves para a sus-
para os pequenos proprietários agrícolas, mas ruim para os moradores das fa- tentabilidade fiscal, pois os salários do governo são considerados um custo
velas nas cidades. Seja qual for o resultado, o custo político e social será muito permanente ou recorrente. Ao contratar mais prnfcssorcs, o governo está se
significativo para alguns segmentos da população. A adequação ao FMI nega comprometendo a continuar pagando esses salúrios. Da mesma maneira, o
efetivamente aos governos o direto e a responsabilidade de fazer estas duras governo precisa garantir uma receita suficiente no futuro para financiares-
escolhas, privando-os de uma das mais importantes ferramentas de que eles ses custos. Num esforço para manter a sustenJ;ibilidadc fiscal, o FMI advo-
dispõem para equilibrar os interesses e as necessidades de diferentes setores ga em prol de déficits fiscais baixos, de um úni<'o dígito e, cm alguns casos,
da sociedade e dessa forma minando a própria estrutura da democracia. Em defende orçamentos equilibrados (nível zero d<' délicil) ou at(~ lucros orça-
razão dessa escolha, os pobres (principalmente as mulheres pobres) devem mentários.13 Estabelecer um teto sobre a folha clt' pagamento ajuda o gover-
de fato preferir uma inflação mais alta se isso for compatível com serviços pú- no a atingir sua meta fiscal. O medo é de que, s1·m um teto suficientemente
blicos melhores e mais oportunidades de emprego. No entanto, a adequação baixo, o governo contrate mais empregados do que será capa;r, de manter
ao FMI deixa pouco espaço para medidas do governo no sentido de amenizar no futuro. Como resultado, o governo scr{1 fon:ado a dirigir mais recursos
essas desvantagens e poucas oportunidades para que os cidadãos ou seus re- para cobrir os salários, e terá de gastar mais cio que dispõe, entrando em
presentantes eleitos possam dar voz à sua opinião. déficit para custear outros gastos. As metas parn as balanças fiscais (após as
doações) para os três países de nosso estudo s;io: Malavi 0,4°/ii do PIB (FMI,
2.2.2 Expandido o espaço fiscal: como um país pode aumentar os 2006b), Moçambique 4,5% e Serra Leoa 2,7% (l•'Ml, 2006). 1·1
gastos para atingir as metas dos setores sociais? 12 Se o governo deseja contratar mais professores, é necessário estudar
maneiras de ampliar o espaço fiscal sem ameaçar a sustentabilidade fis-
O volume de recursos que um governo pode gastar se baseia na sua cal. O governo pode aumentar o espaço fiscal para financiar investimen-
capacidade de financiar os gastos da atividade económica atual e futura. tos maiores de quatro maneiras. Iremos disculi-las a seguir, questionan-
do se elas serão capazes de garantir o espat:o !iscai necessário para a
11 Um estudo entre diferentes países demonstrou que "a classe trabalhadora amplamente definida, e contratação de mais professores e se isso seria apropriado ou não.
aqueles de habilidade ocupacional e status mais baixos têm maior probabilidade de priorizar o combate
ao desemprego em vez de à inflação" (Jayadev, 2006). As mulheres são freqüentemente as primeiras a
serem demitidas (Elson e Cagatay, 2000), parcialmente porque seus niveis de alfabetização são muito
mais baixos do que entre os homens. Em Moçambique, o analfabetismo ainda é muito maior entre as
mulheres (68,80/o) do que entre os homens (36,70/o) (República de Moçambique, 2005b). 13
Há um número de definições empregadas para descrever o deficit fiscal. O "déficit fiscal geral" é a
"Ao propor o aumento do espaço fiscal, não estamos ignorando o tema da doença holandesa (con- diferença entre a receita e os gastos. Se for medido excluindo as doações, a única receita incluida é a
ceito econômico que explica a aparente relação entre a exploração de recursos naturais e o declínio doméstica. Se for medido incluindo as doações, a ajuda doada é calculada como parte da receita, e o
do setor manufatureiro). A ocorrência e a extensão da doença holandesa são determinadas por um déficit fiscal resultante é menor. Em geral utilizamos esta última definição, pois os governos tendem a
grande número de fatores, como a capacidade de absorção da economia para acomodar influxos aumentar os gastos de acordo éom o influxo de doações. Portanto, excluir as doações da medida total
financeiros adicionais e a maneira com que os influxos são empregados. O relatório do EAI de 2007 de receitas provocaria uma representação equivocada dos excessos nos gastos governamentais com-
diz que o FMI não interpreta consistentemente a capacidade de absorção dos paises de baixa renda. parados à receita. O "equilíbrio fiscal primário" refere-se à diferença entre a receita doméstica total e o
Além disso, como foi discutido no capitulo 1, a educação é um insumo necessário para o setor pro- gasto total, excluindo o pagamento de juros e o gasto externo corn capital financeiro. Isso proporciona
dutivo. Portanto, gastos adicionais com educação deveriam estimular a atividade produtiva a médio uma medida de quanto do gasto programado pelo governo é coberto pela receita doméstica.
prazo, ao menos entre sete e dez anos, se a influência na modernização agrícola (discutida no item 14
Uma pesquisa dos empréstimos do FMI em 20 países feita pela Oxfam Internacional mostra que
1.2) for considerada. Assim, é razoável esperar que haja espaço para aumentar os gastos sem disparar 15 entre os 20 países tinham metas de déficit fiscal cada vez menores ao longo dos três anos de
a doença holandesa. Isto é algo que precisa ser calculado em cada pais. implementação do programa do FMI. A redução média foi de cerca de 20/o do PIB.

fMI: o impacto nas ooliticas educacionais


A. ll<'d1:f'i11ir as priorid11d1·s 1/1· /!,'as/os nos orç1111wntos c.i'istcn/cs Com base em experiências anteriores, tanto o FMI quanto o governo
É claro que há ganhos no corte de gastos dos setores não prioritários, como acreditam que a ajuda dos doadores é imprevisível. Se o governo utilizar
a Defesa, para financiar a educação. Por exemplo, reduzir o tamanho das for- fundos de doadores para pagar os salários dos servidores públicos durante
ças militares criaria espaço 11a folha de pagamento para que o governo con- um ano, e a ajuda não vier no ano seguinte, a sustentabilidade fiscal ficará
tratasse mais professores. Ao apoiar as MDM, o FMI encorajou tal redefinição ameaçada. Como resposta, o governo será obrigado a reduzir salários ou
de prioridades orçamentárias visando à educação e à saúde. Mas é ai que demitir servidores públicos. Como resultado, os governos são cautelosos
mora o perigo: remanejar fundos de um setor não prioritário no orçamento ao utilizar a ajuda de doadores para pagar despesas permamentes. Em Mo-
ou obter maior economia gra(,~as a um ganho de eficiência pode gerar apenas çambique, por exemplo, apesar das doações cobrirem 54% do orçamen-
uma liberação pequena e insuficiente de recursos. Os governos também têm to nacional por meio do apoio direto ao orçamento, o governo não quer
uma vasta gama de comprolllissos (alguns relacionados a razões sociais ou encorajar o uso dessa ajuda para cobrir salários do setor público. 16 Essa
económicas, outros a razões políticas). Inevitavelmente, o chamado ao re- hesitação, entretanto, depende totalmente da falta de confiabilidade sobre
manejamento de recursos e111 países com orçamentos reduzidos e restritos é a disponibilidade da ajuda dos doadores. No capítulo 4, exploramos como
contraproducente e prejudica o desenvolvimento a longo prazo. Por exemplo, a provisão de ajuda oferecida a longo prazo (dez anos) poderia contribuir
um oficial chel'e do govemo de Moçambique confirmou que "o gasto com para apoiar o crescimento do PIB e garantir aos países mais recursos do-
educaçiio e saúde não diminuirá. Na verdade, pode aumentar, mesmo que mésticos para se custear os salários sem criar uma dependência desneces-
isso signifique retirar fundos da agricullura". Cortar gastos com a agricultura sária a longo prazo em relação às doações.
ou com a indústria para financiar o investimento no setor social pode reduzir A garantia de ajuda dos doadores, entretanto, não significa que ela possa
os ganhos füturos a serem obiidos com a educação, o que pode comprometer ser gasta. O contexto macroeconómico dita o quanto dos recursos adicionais
o estimulo à agricultura ou às novas oportunidades de emprego para homens recebidos pode ser gasto. O FMI desempenha um papel soberano na deter-
e mulheres. Assim, apesar da educação ser prioritária, sacrificar o investi- minação de projeções de ajuda de doadores e financiadores. O relatório do
mento em outros setores priol'itários não é uma boa base de troca. EAI de 2007 critica o FMI pelo seu constante pessimismo quanto à previsão
do fluxo de doações. A análise empírica feita para o referido relatório sugere
B. Pr111·111·ar ///ais 1111.rilio tf1·, !1111do1·t'S que as projeções de ajuda feitas pelas MRPC para a África subsaariana foram
Nos Lrês países estudados t•nconlramos grande expectativa de que a ajuda muito otimistas para o ano do programa e significativamente pessimistas
dos doadores internacionais preencheria a lacuna de financiamento, propor- nos outros anos. Em particular, as projeções de ajuda do FMI para a região
cionando o espaço fiscal adil'ional necessário para pagar mais professores. não mudaram muito na era pós-Gleneagles, quando, nos encontros do G8
Falando sobre Moçambique, 11111 oficial do FMI afirmou: "Se não houver um em 2005, os doadores "concordaram em dobrar a ajuda destinada à África
aumento jna quantidade ele ajudaj não acredito que Moçambique consiga até 2010, ao menos mais 25 bilhões de dólares por ano para a África." A aná-
aUngir as MDM. De nossa parte podemos aplicar a IPMD [iniciativa de per- lise de trinta programas do FMI e de relatórios sobre a África subsaariana
dão multilateral da dívida], podemos aplicar mais recursos e até mesmo can- concluída no período pós-Gleneagles mostrou que apenas quatro eram mais
celar dívidas. 15 Podemos enrnrajar o governo a cobrar mais impostos dos otimistas quanto à previsão de ajuda (Goldsbrough e Elberger 2007). Essas
grandes programas para qul' haja mais recursos disponíveis para as MDM, projeções conservadoras encorajam os países a fazer planos menos ambicio-
mas tudo isso _precisa ser feilu respeitando a estabilidade macroeconómica". sos para o orçamento porque contam com menos dinheiro. Isso pode levar a
uma dinâmica destrutiva e retroalimentada: se o FMI prevê uma receita me-
15 nor, os planos governamentais são menos ambiciosos e, conseqüentemente,
O perdão das dividas mostrou-se desapontadoramente pequeno. O governo de Moçambique reconhe-
ce que "do ponto de vista orçamentário, programas de perdão de dívidas não terão impacto considerá- os doadores vêem pouca necessidade de aumentar as doações. Assim, o FMI
vel nem a curto nem a médio prazo" (República de Moçambique 2006a, p 42). Em 2006/7os recursos está criando uma situação impossível de resolver, contrária ao compromisso
destinados a Malavi vindos das iniciativ;is de perdão multilateral das dívidas e para países pobres alta-
de aumentar a ajuda para cumprir as MDM.
men.te endividados (PPAE) totalizaram KM (Kwachas Malavis) 8,6 bilhões - o que equivale a 6,5% da
receita e 6,30/o dos gastos. Entretanto, Malavi continua atolado nos pagamentos da divida interna, que
são da ordem de MK 13,8 bilhões, comp;irados aos MK 1,9 bilhões destinados ao pagamento de dividas 16
Entretanto, a ajuda oferecida a programas ou a projetos específicos do governo freqüentemente
externas. Em Serra Leoa, os recursos dl'cisivos do PPAE foram de fato destinados à educação, mas 0
incluem despesas salariais para os oficiais envolvidos. Como resultado, a ajuda dos doadores cobre
perdão de dividas mais recente está sendo alocado no setor energético e de infraestrutura.
de fato ao menos parte do salário dos oficiais do governo.

170 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o 1mpa1 to nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 171
Nesse sentido, manter a estabilidade macroeconômica definida pelo FMI re-
sulta no uso de medidas fiscais e monetárias restritivas que limitam o gasto total
do governo. A tentativa de atingir uma inflação de um único dígito significa que
o governo não pode gastar boa parle da ajuda que recebe por medo de que isso
acarrete uma inflação mais alta. Países classificados como de baixo desempenho
econômico são obrigados a trasnferir a maior parte da ajuda para suas reservas.
As provas apresentadas pelo relatório do EAI de 2007 (Quadro "Não gastar as
doações: descobertas do relatório do EAI") demonstram um ponto perturbador,
um limiar que polariza os países entre o grupo dos que são autorizados a gastar
e o grupo dos que estão proibidos de fazê-lo. Dos 29 países subsaarianos presen-
tes no estudo, aqueles cuja inflação estava acima do limiar dos 5% eram autori-
zados a gastar apenas 15% do aumento na ajuda (EAI 2007). Os 85% restantes da
ajuda deveriam ser colocados no tesouro ou utilizados para pagar a dívida inter-
na. Isso seria aceitável se houvesse uma boa justificativa para manter a inflação
abaixo dos 5%. Entretanto, como demonstrado anteriormente, não é o caso. Em
2006, o Departamento de Desenvolvimento Interno da Inglaterra (DDI) firmou
um compromisso de dez anos com a educação em Moçambique. Se os países
do nosso estudo não forem capazes de cumprir as metas inflacionárias, esses
fundos serão conduzidos ao tesouro em vez de serem gastos na finalidade a que
foram destinados? Será que a falta de professores em Moçambique vai piorar
porque o pafs é obrigado a manter uma política monetária altamente discutível?
Resultados como este em nada contribuem para que se cumpram as metas de-
claradas de aumentar os gastos para atingir as MDM.

Essas críticas surgem numa época em qut· FMI enfrenta uma crise de
legitimidade, já que seus clientes de média n·nda se alitstam e que alguns
países da África subsaariana não necessitam n1ais de empréstimos. Nigéria,
Cabo Verde, Uganda, Gana e Tanzi\nia substil 11 íram seu antigo acordo com
as MRPCs por um novo instrumento ele suporlt' ús medidas (ISM), que nfio
inclui acordos de empréstimo. Moçambique l;1mbém espera mudar para o
ISM até o final de 2007. Contudo, o FMI ma11t{•111 /!:i"nnde influência sobre as
medidas monetárias e fiscais do ISM.
As descobertas do relatório do EAI expüe!ll o poder do FMI de recondu-
zir a ajuda dos doadores destinada a setores snciais na dire~·<io de medidas
de manutenção ela estabilidade maeroeconôn1i1·a. O FMI pode ser respon-
sabilizado pela incapacidade da comunidaci<' internacional de prover os
recursos necessários à educação e à saúde. i\ pesar de o FMI afirmar que
apóia as MDM, essas descobertas indicam que· o Fundo nfio está convenci-
continua•
do quanto à importância do investimento na 1·d11eaç;io e em sat'ldc para o
crescimento econômico e a erradicaç<io da pol11·1·z11.

172 1 Banco l.'undial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais


C. Aumentar a receita doméstica o volume de recursos disponível para o empréstimo a investidores do setor
privado. Por outro lado, para atrair mais poupança e compensar as perdas
"Para criar o espaço fiscal necessário à redução da pobreza, causadas pelo empréstimo ao governo, a taxa de juros sobre a poupança au-
as autoridades de Serra Leoa serão obrigadas a aumentar a menta, o que torna o investimento mais caro para o setor privado, desencora-
proporção entre a receita e o PIB e racionalizar os gastos pú- jando o investimento que é necessário para estimular o crescimento econô-
blicos." (FMI 2007a)1 7 mico. Isso é chamado de "esvaziamento" do investimento do setor privado.
Entretanto, há um argumento igualmente convincente garantindo que os
Há duas maneiras pelas quais o governo pode esperar um aumento na gastos do governo podem ter o efeito de "potencializar'' o investimento. O gasto
receita interna: uma é acelerar o ritmo de crescimento, a outra é aumentar do governo é um sinal para o setor privado, indicando que vale a pena investir
a arrecadação de impostos, já que o crescimento eleva o nível de emprego e numa determinada área, especialmente onde o governo provê bens e servi-
amplia os lucros do setor privado. Entretanto, uma maior receita de impostos ços considerados insumos necessários à produção do setor privado (Cardim de
advinda do crescimento do setor privado não é algo garantido, e os países po- Carvalho, 1994). Por exemplo, o investimento público na educação e na saú-
dem não conseguir o aumento automático nas receitas dos impostos confor- de contribui para a criação de uma força de trabalho mais bem capacitada e
me o esperado. A base inicial de impostos em Malavi, Moçambique e Serra saudável. O acesso a trabalhos especializados é um incentivo para os investi-
Leoa, como a da maioria dos países de baixa renda, é muito pequena e estão mentos doméstico e estrangeiro. Dessa forma, o gasto do governo com saúde e
aquém das necessidades de gastos do governo (McKinley, 2005). Um oficial educação poderia assim ser classificado como "investimento" (McKinley, 2004;
do Ministério das Finanças de Malavi afirmou que "O setor privado é tão Pasha e Palanivel, 2004). Ainda assim, atualmente, o gasto com salários de pro-
subdesenvolvido aqui, que ele simplesmente não é capaz de crescer no ritmo fessores, médicos e enfermeiros é classificado como "custeio"·, as macropro-
que se espera a médio prazo." O alto grau de informalidade torna ainda mais jeções das MRPCs não consideraram os gastos com educação ou saúde como
dificil a arrecadação de impostos e prejudica a efetividade de instrumentos "investimento" do governo em nenhum dos três países estudados.
fiscais para aumentar a receita do governo (Stiglitz e Emran, 2004). O FMI reconhece que a educação pode contribuir com o crescimento
Assim, é ingênuo encorajar esses países a confiar na base doméstica econômico e concordou que "o investimento público pode atrair o investi-
de impostos, reduzir a dependência em relação às doações e (no caso de mento privado aos países da África subsaariana, refletindo a complemen-
Serra Leoa e Malavi) buscar economia orçamentária (Governo de Malavi, taridade entre o investimento privado e alguns tipos de investimento públi-
2005). Sem uma análise cuidadosa do impacto diferencial das estruturas de co" (Gupta et al, 2006, p. 26).
impostos e da capacidade real de crescimento do setor privado, esses países Entretanto, a atitude do FMI diante dos empréstimos não mudou muito
ficarão presos em um impasse quanto aos gastos com educação. como resultado dessas novas interpretações. Em Moçambique, o FMI con-
tinua a desencorajar o governo a receber empréstimos para financiar um
D. Aumentar os empréstimos: é apropriado ao governo recorrer a em- maior investimento público. O crédito disponível ao governo aguarda uma
préstimos para atingir suas metas de desenvolvimento? redução de 2,4% do PIB para 0,6% do PIB até o fim de 2007 (FMI, 2006a). 18
O governo de Malavi acredita que o FMI é muito mais flexível nessa in-
"Não é possível viver com os nossos próprios recursos. O go- terpretação. Um oficial do Ministério das Finanças afirmou que, "se o FMI
verno não deve ter medo de recorrer a empréstimos se controla aprendeu alguma coisa nos últimos anos, foi a aprender a ouvir!". O fato
para onde vai o dinheiro e se presta contas dele." de o FMI ter aceitado uma mudança nas alocações orçamentárias em ple-
(Membro do parlamento do governo de Malavi) no ano para acomodar um maior subsidio à agricultura (2,4% do PIB) em
2005/2006 é visto pelo governo como prova dessa mudança. Contudo, a
O FMI assumiu como prioridade limitar o empréstimo concedido aos go- base da política econômica continua sendo uma redução no déficit fiscal
vernos para reduzir o pagamento de dívidas e prevenir o "esvaziamento" do
18 O crédito bruto disponível para as medidas do governo avalia a quantidade que um governo pode
setor privado. Quando um ~overno toma um empréstimo, isso pode reduzir
tomar emprestada para cobrir a lacuna no investimento que permanece mesmo após toda a ajuda
oferecida ao governo ter sido utilizada. Em Moçambique, o FMI mudou sua forma de cálculo, utili-
17
Esse texto aparece na primeira página do press release número 06/285 do FMI, datado de dezembro zando, em vez de uma meta para o déficit fiscal primário, uma meta de crédito bruto disponível ao
de 2006, anexo à consulta ao artigo IV. pais para determinar o nível de empréstimo que o governo pode receber.

17 4 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 17 5
para 0% do PIB até 2008-2009 (FMI, 2006b). Como registrado na segunda ponsáveis é tão problemático quanto promover o <~mpréstimo irresponsável.
avaliação feita pelo FMI sobre a MRPC de Malavi (FMI, 2006b): "Reduzir Alguns dos conselhos do FMI são bons, pois promovem a reavaliação
o peso do endividamento interno continuará sendo o fundamento da estra- das prioridades orçamentárias, enfatizando a educação e o aumento da re-
tégia fiscal. Isso será obtido por meio da restrição aos gastos." Essa política ceita doméstica por meio da maior arrecadação de impostos. Entretanto, é
fiscal restritiva continua mesmo após a pesquisa do FMI ter indicado que importante reconhecer que essas medidas, isoladamente, não oferecerão
não há relação entre os baixos níveis de déficit fiscal e o crescimento em a condição fiscal necessária para mais investimentos em educação e para
um pais de baixa renda que já tenha alcançado a estabilidade macroeconô- atingir as MDM de maneira geral. Desse modo, o Fundo pede uma maior
mica (Baldacci et al2004). Malavi, Serra Leoa e Moçambique já atingiram provisão de ajuda de doadores para financiar estes gastos.
a estabilidade macroeconômica. Mesmo assim, o FMI continua a encorajar Então, o FMI prejudica tais esforços ao insistir em taxas de inflação de
as mesmas medidas fiscais que eram utilizadas quando havia o medo de o um único digito ou em déficits iguais a zero, que impedem os governos de
pais perder o controle sobre os gastos do governo. expandir os gastos gerais do setor público, seja por meio da utilização de
É evidente que há temores legítimos que levam o FMI a coagir os gover- ajuda ou por empréstimos responsáveis do gov<'rno.
nos a evitar déficits excessivos. Se os governos tomam emprestado dinheiro O FMI deveria desistir de estabelecer as condições das medidas eco-
para financiar os principais gastos públicos, é provável que o empréstimo nômicas, deixando a critério dos governos a <ffaliação dos dados sobre a
seja renovado ano após ano, e o custo do pagamento de juros prejudicará inflação e ..a decisão sobre o patamar ideal para cada caso, permitindo a
~ (
os futuros gastos governamentais. Por exemplo, em meados da década de expansão das condições fiscais por meio do aumento das doações e de em-
1990, Malavi utilizava 40% do orçamento para financiar o pagamento de préstimos responsáveis que não ameacem a sustentabilidade fiscal.
dividas. Sem a garantia do crescimento do PIB no futuro, essa dívida pode No momento, apesar da disponibilidade de provas e da experiência de
se tornar impossível de pagar para o governo. Isso explica o foco do FMI outros países, os governos dos três países estudados não têm muita escolha
sobre a redução do déficit Entretanto, nem todo empréstimo tomado pelo além de seguir as definições do FMI acerca da sustentabilidade e da redu-
governo leva necessariamente a uma dívida pública cada vez maior. ção dos níveis de inflação e de déficit até nívl'is arbitrariamente baixos.
Um dos principais motivos desse ceticismo em relação aos empréstimos Igualmente os pobres não podem opinar em qualquer um desses países
do governo é a falta de capacidade do FMI para fazer projeções de longo aqui estudados, nem os parlamentares, nem a sociedade civil estão envol-
prazo, o que o impede de compreender as recompensas positivas do inves- vidos nas negociações entre o Ministério das Fi1ianças e o FMI nas quais as
timento em educação após um período de 10 a 15 anos (Roy et al, 2006). O metas macroeconômicas são definidas. Os países têm o direito de explorar
modelo macroeconômico do FMI é de curto prazo, compreendendo períodos outros rumos de desenvolvimento, e receber conselhos confiáveis quanto
de 5 a 5 anos para a solução de problemas relativos à sustentabilidade fiscal. às diversas medidas alternativas.
Entretanto, o retorno econômico do investimento em educação, que permiti-
ria uma maior taxa de crescimento do PIB e a expansão do espaço fiscal, só
se tornaria evidente ao longo de um período de 7 a 15 anos. Como resultado,
o modelo atual do FMI não consegue analisar o retorno econômico que po-
deria ser gerado por investimentos no presente e que requerem maior gasto e
déficit a curto e médio prazo. Sem a capacidade de projetar o retorno a longo
prazo do investimento, o Fundo não interpreta corretamente a sustentabi-
lidade fiscal. Por causa da relutância ou da incapacidade de fazer esse tipo
de análise, o Fundo mantém a declaração de que o gasto deficitário nunca
é apropriado: afirma que o investimento em educação ajudará a estimular
o crescimento econômico a longo prazo, mas não consegue calcular essas
variáveis quando elas são as mais relevantes para esse raciocínio.
O empréstimo irresponsável não deve ser encorajado. Todavia, remover
completamente o empréstimo do leque de medidas disponíveis a governos res-

176 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e,, investimento no professorado 1 177
naidusa.org/pdf/AAConf_Contradictions_Final.pdf; Malavi: Ministerio da Educação e do Treinamento
3. O impacto das políticas Vocacional, Plano Estrategico Nacional de Educação (rascunho de novembro de 2006); Moçambique:
Ministério da Educação e Cultura, Banco de Dados da Educação 2007; Serra Leoa: todos os dados vêm
dos relatórios de 2007 e 2006c da República de Serra Leoa.
do FMI na educação
Restrições na folha de pagamento que impedem os governos de contra-
3.1 O impacto sobre Malavi, Moçambique e Serra Leoa tar mais professores, incluindo professoras, ocasionam superlotação nas
salas de aula, com altas PP As, o que, por sua vez acarreta baixo rendimento
"É o limite de gasto que dita quantos professores adicionais no aprendizado. O Banco Mundial recentemente reconheceu a necessidade
podem ser contratados, e ruia a necessidade. As escolas nos di- urgente de focar em melhorias no rendimento do aprendizado, mas isso é
zem quantos prqfessorcs são necessários, mas raramente somos impossível sem um número suficiente de professores capacitados e com
capazes de contcmp/11r esse pedido." salas de aula com muitos alunos para se administrar (Grupo de Avaliação
(Oficial clu;fc do Ministério da Educação, Serra Leoa) Independente 2006). Apesar de o resultado final ser o abandono do curso
por meninos e meninas, os preconceitos contra a educação das meninas
ob os atuais tetos da folha de pagamento, será impossível para Malavi, fazem com que elas tenham menor probabilidade de concluir a educação

S Moçambique ou Serra Leoa contratar o número de professores neces-


sário para garantir a l ducaçiio primária em salas com menos de 40
0

alunos. A tabela 2 mostra o impacto da restrição de gastos com a folha sa-


básica do que os meninos (ver tabela 1). Assim, estabelecer um teto sobre
a folha de pagamento sem considerar o número de professores necessários
tem impactos diferentes em meninos e meninas. Isso é particularmente
larial em Malavi, Moçambique e Serra Leoa, correlacionando as restrições verdadeiro na ausência de professoras, criando um círculo vicioso no qual
com o atual número de prol'essores e o número necessário para atingir, até as meninas são excluídas da educação, a única coisa possibilidade para que
2015, a meta de conclusão universal da educação primária (CUEP). elas melhorem de vida e contribuam para o desenvolvimento econômico.
Todos os três países tornaram prioridade nacional a permanência de um
Tabela 2. O impacto dos i ctos salariais sobre Malavi, Moçambique e maior número de meninas na escola, reconhecendo que a falta de condições
Serra Leoa, 2007 do ambiente de aprendizado é um fator que leva as meninas a ter desempe-
nho pior do que os meninos. A presença de professoras nas escolas poderia
encorajar a matrícula e a conclusão da educação primária pelas meninas.
Alguns países estão empregando medidas para aumentar a contratação de
professoras: Moçambique, por exemplo, promove políticas de discriminação
positiva para candidatas às instituições de formação de professores. Mas tais
intervenções pontuais não causam muito impacto no quadro mais amplo
da limitação ao número de professores. Isso cria um círculo vicioso: a falta
de professoras implica menor número de meninas freqüentando e obtendo
bons resultados na escola, e, por causa do pequeno número de meninas que
chega aos últimos estágios da escolaridade, o número de mulheres que se
inscreve na formação de professores é ainda menor. Conforme explicou um
oficial chefe do Ministério da Educação de Serra Leoa:

O pequeno número de professores é problemático e contra-


ditório com relação aos e.~forços para oferecer incentivos às
meninas em transição para a educação secundária, porque as
pesquisas mostram a imporUlncia da presença de professoras
Fonte: •cálculos detalhados estão disponíveis no anexo 2 do documento "Confronting the contradic- para manter a freqüencia e as notas sat4fatórias na escola.
tions: the IMF, wage bili caps and the case for teachers", em inglês, disponível em http://www.actio-

17 8 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 179
Há uma correlação entre a pequena inscrição de meninas es- a superlotação do já restrito número de salas de aula, o MECT determinou
tudantes na educação secundária e nas universidades de mate- um limite de matrículas para cada escola, o que significa que muitas crian-
mática, ciência e politécnica, e o baixo número de professoras ças não são admitidas. Ainda assim, a necessidade de mais escolas e profes-
nestes níveis. sores continua a crescer, assim como a populaçiio excluída da escola.
As conseqüências do teto para gastos com pessoal são tão terríveis em
Quebrar esse círculo requer o investimento não apenas nos professo- Serra Leoa que o novo Plano para o Setor da Educação de dez anos apresenta
res como também na promoção da educação das meninas: por exemplo, diversas observações sobre o impacto de medidas macroeconômicas restriti-
em processos de capacitação em gênero que possibilitem aos professores vas à educação, especialmente quanto ao aumento da já elevada PPA:
a promoção de valores e princípios igualitários, estimulando a justiça e as
oportunidades igualitárias na sala de aula. Tudo isso exige investimentos A média do pais é de 66 alunos por professor e de 112 alunos
de longo prazo: restrições de gasto com pessoal representam um obstáculo por professor especializado. Há uma necessidade óbvia de se
para a superação das diferenças entre os sexos na educação. contratar mais professores qualificados, mas o limite imposto
O impacto desastroso das restrições orçamentárias sobre o número de na contratação de professores pelos requisitos do MFIFMI tor-
professores, a qualidade e os processos de planejamento são analisados a nou impossível responder a essa cart!ncia. Além disso, manter
seguir nos três países em questão. o nosso compromisso com a educação gratuita e de qualidade
conforme firmado no Ato pela Educação de 2004 e atingir as
Serra Leoa metas de qualidade estabelecidas pela EPT-IVR, ao mesmo tem-
po respeitando os limites na contratação de professores, coloca
Os pressupostos que orientam a definição de tetos para gastos com pes- Serra Leoa numa posição muito difícil. Ao definir o patamar
soal e os decorrentes limites impostos ao número de professores criam dos limites e das restrições aos gastos com pessoal, é preciso fa-
obstáculos para o planejamento de longo prazo e para o acúmulo de capa- zer refert!ncia aos valores necessários para se atingir as metas
cidade humana. Tendo em vista que o limite é estabelecido pelo Ministério MDM e EPT para garantir que as medidas macroeconómicas
das Finanças, o Ministério da Educação tem que - a partir do teto defi- não sejam contraproducentes em relação à realização dessas
nido - determinar quantos professores serão disponibilizados para cada metas. (República de Serra Leoa, 2007 a, p. 23).
estabelecimento de ensino. Estes números se baseiam na meta de PPA, no
número de matrículas, no número de salas de aula por escolas e no núme- Previsivelmente, as restrições ao gasto com pessoal prejudicam os esfor-
ro de professores afastados da sala de aula enquanto preparam projetos de ços atuais para reformar o serviço público e o planejamento anual adequado,
pesquisa. Por causa do teto baixo para gastos com pessoal e do número li- sem falar no longo prazo. Por exemplo, o Ministério da Educação de Serra
mitado de professores que podem ser contratados, o Ministério estabeleceu Leoa é informado quanto ao limite de professores no início do ano fiscal, em
como meta uma PPA de 1:50, muito acima da proporção recomendada pela janeiro. Então, o Ministério tem de projetar e distJ"ibuir os professores entre
EFA-FTI de 1:40. Definir uma PPA genérica significa que as necessidades as escolas com base nesses limites. Entretanto, como o ano letivo começa
específicas de cada escola não serão consideradas: por exemplo, na edu- em setembro, o Ministério tem de estimar quantos professores poderão ser
cação primária, um professor ensina todas as matérias, mas, na educação contratados para suprir as necessidades atuais e ainda manter algumas va-
secundária, é necessário um professor diferente para cada matéria especia- gas abertas até setembro, o inicio do ano letivo. As escolas que não recebem
lizada, o que implica maior número de professores. o número total de professores de que necessitam têm de esperar cinco meses
Ao impor um limite para a contratação de novos professores, também até o início do novo ano fiscal, em janeiro, para receber mais professores.
se limita o número total de matrículas e o número de escolas que podem
ser construidas em cada região. O maior projeto educacional de Serra Leoa, Malavi
Sababu, tem como objetivo a construção de mais escolas. Em 2007, o go-
verno decidiu diminuir o ritmo de construção porque as novas escolas não Em 1998, o governo de Malavi começou a restringir o gasto com pessoal
tinham condições de ter um número adequado de professores. Para evitar como forma de conter o orçamento, primeiro limitando os aumentos desa-

180 1 Banco Mundial. OMC e FMI: o imoacto nas ooliticas eduracionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no orofr«nrorln J 1A1
lário e depois impondo um congelamento nas contratações, que teve inicio Moçambique
em 2003. A partir de 2004, o novo governo determinou um novo patamar de
restrição no planejamento macroeconômico e usou a folha salarial como Em 2005, o governo estabeleceu o limite para gasto com pessoal em
forma de absorver outros excessos orçamentários. Por exemplo, o aumento 6,5% do PIB (República de Moçambique 2005b). No fim daquele ano, o
salarial anual planejado foi reduzido e depois adiado, em 2005 e 2006, para governo relatou não ser capaz de se ater a essa meta indicativa porque
compensar excessos orçamentários ocorridos em outras áreas. continuou a contratar professores para responder à demanda por educa-
Continua a haver um teto na folha de pagamento: uma nova MRPC foi ção primária. Ao mesmo tempo, indicou que poderia não atingir a meta
iniciada em 2005, comprometendo o governo com um teto inferior a 8% indicativa determinada pelo acordo com a MRPC nem manter a promes-
(Governo de Malavi 2005a). Entretanto, o teto foi muito inferior a esse pa- sa de oferecer educação primária gratuita e de qualidade para todos. Em
tamar: 7,4% em 2005-2006 (FMI, 2006b), 7,2% em 2006-2007, devendo per- 2005, o governo finalmente conseguiu cumprir a meta indicativa. A folha
manecer no mesmo nível a médio prazo. Um oficial do MF afirmou que "a de pagamento caiu para 6,7% do PIB (República de Moçambique 2005).
regra dos 7% é uma regra para tempos normais, mas estes não são tempos Apesar da expansão na educação primária, o Ministério da Educação só
normais". Nenhum novo professor foi formado nos últimos dez anos, 19 o foi autorizado a contratar 4.715 professores dos 11.500 necessários em
que limitou a demanda por contratação. E apesar de haver agora um pla- 2005, e a PPA aumentou para 1:74 (PAP, 2006).
no para expandir a capacidade de formação inicial, o teto sobre a folha Alarmados pelo aumento na PP A, os doadores reconheceram que "a
de pagamento provavelmente limitará a capacidade do setor de contratar qualidade da educação está sendo afetada porque os fundos não são sufi-
professores para receber essa formação. Parte da regra que limita as folhas cientes para contratar professores na quantidade exigida e com formação
de pagamento é a idéia de que os Ministérios só podem fazer orçamentos adequada" (PAP, 2006). A ênfase dada pelos doadores quanto à necessidade
contando com os empregos efetivos. Como resultado, 2.500 professores se- de educação de qualidade aumentou a pressão sobre o governo e o FMI
rão formados em outubro sem previsão para o pagamento dos seus salários para que reconsiderassem o limite de gastos com pessoal como meta indi-
no próximo ano fiscal. Apesar das PP As extremamente altas, o governo não cativa. Em 2006, trabalhando juntos, os doadores e o Ministério da Educa-
pode incluir em seu orçamento a contratação de novos professores. ção conseguiram obter um aumento no teto da folha de pagamento de 6,5%
Mesmo com o otimismo do governo quanto à remoção do teto sobre a para 7,5% do PIB, o que permitiu ao Ministério da Educação contratar mais
folha de pagamento, isso não parece ter sido debatido formalmente com o 10.137 empregados adicionais, dos quais 9.000 são novos professores da
FMI. Contudo, o orçamento total está limitado em 39,5% do PIB e, portanto, educação secundária.educação secundária. Isto é um exemplo aos outros
só pode aumentar 6% ao ano, o ritmo previsto para o crescimento econô- países: mostra que os esforços coordenados para questionar o teto sobre a
mico. As prioridades nacionais mudaram recentemente, e a Estratégia de folha salarial podem promover um avanço significativo.
Crescimento e Desenvolvimento de Malavi enfatiza cada vez mais projetos O limite nada realista imposto à contratação de professores em Serra
de desenvolvimento da infraestrutura, enquanto o orçamento em desenvol- Leoa e o baixo teto para gasto com pessoal em Malavi e Moçambique fazem
vimento aumenta conforme o custo do orçamento recorrente. Assim, não uma pressão cada vez maior sobre o sistema educacional. Ainda assim, o
há motivo para acreditar que o gasto com pessoal cresça em termos reais impacto das medidas do FMI ao sufocar o setor público pela falta de traba-
nos próximos anos: mesmo que o teto seja removido, os limites sobre o lhadores não se restringe a esses três países. Todos os países que recebe-
orçamento total implicam uma contínua restrição na folha de pagamento. ram empréstimo do FMI implementam medidas fiscais e monetárias pare-
Todos os 43 mil professores de Malavi são considerados oficialmente qua- cidas com as descritas anteriormente. Seis deles têm incluído como critério
lificados, mas 51% deles receberam apenas seis semanas de formação em de desempenho tetos salariais específicos acordados com as suas MRPCs.
tempo de serviço como parte de um programa de formação que foi reduzido A legitimidade desses limites raramente é questionada pelos trabalhadores
a um ano. A qualidade desse programa foi questionada, o que gerou gran- do setor da educação, mas o exemplo de Moçambique poderia ser seguido
des mudanças no programa de formação proposto para os anos seguintes. em muitos outros contextos.

19 O motivo para tanto é que a maioria dos fundos reservados para o treinamento foi realocada para

oferecer treinamento básico aos professores recrutados após a isenção das taxas cobradas ao usuário
em 1994.

182 j Banco Mundial. OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado j 183
3.2. Impacto global tando menos do que deveria com educação, alocando menos de 6% do PIB
para o setor, contrariando a recomendação do relatório Delors da Unes-
"O desenvolvimento de programas do FMI parece não levar em co (1996). Certamente eles não estão gastando em excesso ou despropor-
conta sistematicamente o cumprimento das metas [de desenvol- cionalmente. Mas não podem aumentar os gastos de maneira realista até
vimento do milénio] quando aborda o orçamento e o contexto os níveis recomendados sem contratar mais professores (que compõem a
macroeconômico de um pais. No vasto número de programas maior parte de qualquer orçamento educativo). Com esses tetos impostos
nacionais apoiados pelo FMI desde a adoção das metas, quase sobre a folha de pagamento, será difícil aumentar os gastos para contratar
não houve debate quanto à consisttncia das estratégias empre- o número de professores necessário para atingir as metas de 2015.
gadas para atingi-las. " No Quênia, por exemplo, o governo implementou a educação primária
(Projeto das Nações Unidas para o MiMnio, 2005, p. 93) gratuita em 2003. O número de matrículas aumentou muito, de 5,8 milhões
em 2002 para 7,1 milhões em 2004 (República do Quênia, 2005). Entretan-
Um recente estudo conduzido pelo FMI (Fedelino et al 2006) reco- to, o limite sobre os professores acordado entre o FMI e o Ministério das
nhece que entre 2003 e 2005 o FMI impôs algum tipo de condicionalida- Finanças em 1997 impede que o Ministério da Educação contrate mais que
de sobre o gasto orçamentário com pessoal do setor público em metade 235 mil professores. Como resultado, a PPA, que em 2002 era de 1:34, subiu
dos 42 países que apresentam acordos apoiados pelas MRPCs. Destes, 17 para 1:41 em 2004. Espera-se que continue aumentando conforme a popu-
enfrentaram restrições quantitativas ao gasto, e para 8, o teto era uma lação cresce (República do Quênia, 2005). Nas escolas rurais, a PP A chega
condição "indiscutível", um critério de desempenho que, caso não cum- a níveis altos. Ainda assim, é importante reconhecer que os professores já
prido, poderia levar ao término do programa com o FMI. Em maio de empregados, os policiais e outros servidores públicos receberam significa-
2006, eram seis países com tetos para gastos com pessoal como critério tivos prêmios salariais durante esse período.
de desempenho. A condicionalidade estava concentrada na África sub- Em Uganda o Ministério das Finanças limitou o número total de profes-
saariana e na América Central: Benin, Burkina Fasso, Burundi, Chade, sores em 127 mil (República de Uganda, 2006). Diferentemente do Quênia,
República Democrática do Congo (RDC), Gana, Quênia, Malavi, Mali, o teto sobre a folha de pagamento não foi incluído no novo instrumento de
Moçambique, Niger, Senegal, Serra Leoa, Zâmbia, Nepal, Azerbaijão, Ta- apoio à medida (IAM) de Uganda, seja como meta indicativa ou critério de
jiquistão, Dominica, Guiana, Honduras e Nicarágua. Na verdade, muitos desempenho. Entretanto, uma meta inflacion<iria de 4% tem implicações
outros países enfrentam um limite sobre o número de professores que na quantidade a ser gasta pelo governo com salários (FMI, 2007b). Como
pode ser contratado como resultado de medidas macroeconômicas mais resultado, não é possível ao governo contratar os 176 mil professores ne-
amplas negociadas com o FMI. cessários para atingir a educação primária universal, e espera-se que a PPA
A busca por taxas de inflação de um único dígito e com baixos níveis de permaneça alta, na casa de 1:50 (República de Uganda, 2005).
déficit fiscal em todos os países com acordos no modelo das MRPCs signifi- O corte nos gastos com educação também tem implicações na contra-
ca que muitos outros países enfrentam limites de gasto com pessoal, como tação de professores e na sua formação a médio prazo. Em Camarões, me-
resultado de tetos impostos ao orçamento como um todo. A tabela 3 inclui didas para reduzir o investimento na educação em 1990 levaram ao fecha-
todos os 17 países, bem como alguns outros que não têm condicionalidades mento das faculdades responsáveis pela formação dos professores (Banco
explícitas vinculadas à folha de pagamento, mas nos quais o limite geral Mundial, 1997). Estima-se que, quando essas faculdades foram reabertas
ao orçamento como um todo obrigou os governos a limitar a contratação em 1996, mais de 15 mil professores precisavam ser formados para acom-
de professores. Nenhum dos países incluídos na tabela atingiu a educação panhar o aumento nas matrículas. Atualmente, estima-se que Camarões
primária universal. A maioria deles tem PP A acima da marca recomendada tenha de contratar 69.100 professores até 2015 para atingir as metas MDM
de 1:40 e mais meninas fora da escola do que meninos. e EPT. Em razão da história e da necessidade urgente de aumentar os gas-
O fato de essas metas serem tão parecidas, apesar dos diferentes contex- tos com educação, manter uma arrecadação fiscal positiva é uma restrição
tos nacionais, serve para mostrar o quão pouco os problemas e a realidade desnecessária.
social e econômica de cada país são considerados na definição de medidas
macroeconômicas. A maioria dos países nesta tabela está atualmente gas-

Confrontando as contradições: o FMI ··o investimento no professorado 1 18 5


Tabela 3. Impacto das medidas macroeconômicas sobre os professo-

1i~~~~~1~1~;{~;~'~:~:1;~~~1~,~~~··· . ·A,~
res no mundo

.·+~ágffieWd'âáâ'5:(nãoYestHn'91ssem ess~~··m~smos'govéf6'M'ern:tf~lá'ç~'ó1(:
'tét8~H~;0"'ástós~'cb'm .·. êssoli I' 'em séüS: trç~rN~htógf·sgrn~Jtlfp!ê'ehife'f;(
·Msfàt~t9rn'iN1iesmo ~árado~o 111 lógicá e~úivb~ãéí~ a&rK;fi)~(óJM'ír:ãt
g'ast& sala(fà'l,devesercortado p;.ra gerar ret~isó'si&iptegâq?si,,r{occ'fü) .... , .~·"'
Er)f(etanfo;utiía das, formas ma1. eficazes de éombateéMi)otír~za é,p;ernri/e.~ô~11.
rnai<li:Rúíherócie funcionários da saúde.:m~~·éíê~'.nãô pb'aeíli'.s2rcü'iíi/~fâ:at1~r'.~t1
tefof2ôM'gá~tà de pessoar'élo F~ 'I restrliige'm'a coA'trat?~ão'!á~'profiWfótj~ls:'.i:fã1i~~a
Weli)'85''r~)êi.f?~ d àrguilleilto d1 · FMl'de·qUe'.91n~,:~a1ôf;J~~s~~~tb[it~ã~.•
inflaçãoe•acabaria .prejudicando .is me.tas. (Tiacro~t9'nôT11i.C:aS;;\i);;;,;!;~ l,j :,.,'.
. ··. . ·íJt··,:··i{%" .·.. ·· . · . ·.· . . • i •. . < ,::1··;ú ).·g ''.2:.~:f·:..jM~i~früY·'.;ti'::;.?;
Em Gâíiâ~'pófexemplo.'~a ·restrii: 'º mais frn~(írfâ'nW àô.·setor!;~a· sa'ú'éf~~e
núnietós.:piesisos sobregual o ~ ·1nciónár)o .ríecess~ri9(.~rn,.g~J.is)ug:~ç
. tipo d~}~rmaç~o; A.proporção c1 •tre médicos,e P9,8~.1a,~~?;t,S~',h17.i6l .
·de.i'eílfer'rr:í'eira'.$•;e:de;l!1.513. Rt luzir a mqrtalidaçle ned!'f~táLW
~níifíí~~l:in'té~~& ~~iáJ;4'â'êáda 100 m11rlasciméh1~s at~:;2-0í'?f~' ....
;~@~rWt~iW~{;~;~f~f,~~~'.~n~~~ht, ·"d~mp~~~~ãe~:~;~~ ·~:~~~~~~/of~~~~
1

<l\JQ'll.~s1'êi'/1Pfég~dos'.'da sàúde mi• 1 po?er1ar(l'~?ec\s9ntra1~~ô .•P,~;'.


·• ,. .. ·:;~,;iP{Q~~iç~o ~~ ·~~i~~~gi~i•~-h~~%f1R[1d~,~f1\J,r' Af

Fontes: Unesco (2006 e 2006a); sobre os limites impostos pelo FMI: Fedelino et ai (2006); emprésti-
mos mais recentes do FMI (disponível em www.imf.org/external/country/index.htm)
#países que não têm mais um teto nos programas do FMI
"há certa discrepância quanto a este valor: o Projeto do Milênio da ONU previu a falta die" professores
em Gana na ordem de 134.694
-balanço total excluindo doações.
-dados do Plano para o Setor da Educação 2007 mostram que 300/o das crianças em idade de fre-
qüentar a educação primária estão fora da escola.
Não há dados disponíveis para a RDC: e outros campos nos quais o valor não está disponível.

186 \ Banco Mundial, OMC e FMI: o im1 .. 1cto nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado \ 187
A flexibilidade do FMI poderia ser extendida aos setores da educação e
4. O que precisa mudar? da agricultura logo que estes demonstrassem interesse em trilhar o mesmo
caminho da saúde. Se esses Ministérios aprcsl'ntassem planos enxutos em
4.1. Maior flexibilidade do FMI? favor da ampliação do investimento e obtivessem os recursos para imple-
mentá-los, não seria razoável reproduzir a mesma flexibilidade demons-

e orno mencionado na introdução, elegemos Moçambique, Malavi e


Serra Leoa como estudos de caso porque o FMI afirmou ter demons-
trado certa flexibilidade com esses países. Em Moçambique, o teto
sobre a folha de pagamento foi acrescido em 1% do PIB especificamente
para que o governo pudesse contratar mais professores. O governo de Ser-
trada com a saúde e incluir mecanismos de ajuste tanlo para a educação
quanto para a agricultura?
Tudo isso acaba levantando a quesL:'io da permanência da restrição ao
gasto com pessoal. O FMI percebeu que o fato de certos setores prioritários
não participarem da restrição pode prejudicar· o controle de uma folha de
ra Leoa recebeu uma autorização extra para ampliar o limite anual para a pagamento em processo de inchaço (Fedelino 1·1 al, 2006). Entretanto, como
contratação de mais professores. Em Malavi, o setor da educação foi isen- observaram os chefes no governo de Malavi, a folha de pagamento pare-
tado do congelamento nas contratações, sendo incluído um mecanismo de ce estar sob controle. Há urna expectativa generalizada no Ministério das
ajuste automático ao teto para permitir o pagamento de aumentos salariais Finanças de que o teto para o gasto com pessoal imposto como critério de
para os trabalhadores do setor da saúde e para contratar mais trabalhado- desempenho tenha curta duração. De fato, foi o representante oficial do FMI
res caso se torne disponível uma maior ajuda dos doadores. que ofereceu a informação de que o limite ao gaslo com pessoal não estaria
Sem dúvida, esses passos foram tomadas na direção certa e permitiram mais presente em questão de um ou dois anos.
aos governos progredir na contratação de mais professores. Entretanto, A situação em Malavi parece estar muda11do em razão da capacidade
nossa pesquisa também mostrou que o FMI precisa agir mais e mais rápido do Ministério da Saúde de desenvolver um plano sólido e de longo prazo
para permitir aos governos que retomem o controle sobre as contratações. de investimentos em trabalhadores da saúde. mas também por causa do
aumento no volume de doações destinadas a financiar os salários. Outro
Malavi motivo citado por diversos oficiais dos minist<'~rios da saúde, das finanças
e da educação foi que o Ministério das Finanças, agora comandado pelo
Em Malavi, o FMI está demonstrando sua flexibilidade de duas maneiras. ex-chefe da divisão africana do FMI, tem urna nova e crescente confiança
Primeiro, quando o Ministério da Saúde obteve sucesso ao explicar a necessi- e habilidade técnica, sendo capaz de apresentar informações ao FMI de
dade de aumentar o gasto com pessoal para possibilitar a contratação de mais maneira convincente.
trabalhadores, o FMI propôs um mecanismo de ajuste do gasto permitindo a
acomodação dos salários e os aumentos oferecidos pelo DDI de acordo com Serra Leoa
o teto da folha de pagamento. Esse mecanismo implica que o teto planejado
para o gasto com pessoal de um determinado ano possa ser ajustado (em ou- O FMI demonstrou certa disposição para conceder perdão quando o li-
tras palavras, pode aumentar ou diminuir) de acordo com a variação no vo- mite para gasto com pessoal foi desrepeitado cm Serra Leoa. Apesar do nú-
lume de doações recebido. O representante oficial do FMI em Malavi afirmou mero de professores que podem ser contratados ser definido formalmente
que o FMI propôs esse mecanismo de ajuste convencido da necessidade de pelo Ministério das Finanças, depois de muitas entrevistas, verificamos que
criar incentivos para atrair os trabalhadores da saúde, que safam do país em é o FMI que determina se o Ministério da Educação poderá exceder o núme-
busca de oportunidades. O Ministério da Saúde desenvolveu um plano sólido ro estabelecido. Por exemplo, em 2007, o Ministério da Educação contratou
e de longo prazo para o financiamento da saúde e inspirou grande confiança 2 mil professores além dos 33.122 permitidos. Ent.relanlo, um oficial che-
na sua capacidade de colocá-lo em prática. Assim, impulsionado pela intro- fe do Ministério da Educação revelou que esse acordo nfio era adequado,
dução de um plano abrangente para todo o setor de saúde, o apoio dos doado- chamando-o de "um constrangimento para o 1\ 1inistério" que nfio conduz a
res veio substancialmente, aumentando bastante os recursos alocados para o um planejamento racional de longo prazo e, dl' maneira geral, prejudica os
setor, atingindo a marca de 6,85 bilhões de kwachas malawis em 2005-2006 e esforços do governo para oferecer educação biisica gratuita. Essas preocu-
6,1 bilhões kwachas malawis em 2006-2007 (Governo de Malavi, 2006a). pações ecoam no novo Planejamento para o Sl'tor da Educação:

188 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas pollticas educacionais Confrontando a5 contradiçôe~: o fMl o invc~timcnto no profe'>50rado 1 189
..
t'
O limite imposto paro gasto com pessoal tem de ser expandi- A flexibilidade requer que o governo e o FMI pensem em alternativas e
do para rç/7etir a vcrd11deira situaç<io e a necessidade de um optem por soluções diferentes. Entretanto, verificamos que não há diálogo
maior número de prq/i·ssor-cs capacitados e para garantir que entre 0 FMI e o Ministério das Finanças quanto às possíveis maneiras de
os docentes scmj(1rmuçâo adequada lenham acesso àforma- aumentar o espaço fiscal ou permitir uma inflação um pouco maior. Um
çâo cm serviço dcslin([da a aprimorar suas habilidades. A estudo do EAI do FMI em Moçambique concluiu que há pouca ou nenhuma
menos que afolha sa/11rial seja aumentada para incluir um discussão de medidas macroeconômicas alternativas junto ao governo, e
número maior e mais adequado de prqfessores (e ruio apenas nenhum debate significativo sobre tais medidas com a sociedade civil (EAI,
um aumento nominal 11or ano) até 2015, as metas MDMIEPT 2004).20 Apesar de o FMI ter demonstrado certa flexibilidade na reavaliação
de ensino primário wli1•crsal nâo se tornarâo uma realidade" do teto para o gasto com pessoal de Moçambique, a pressão para reduzir
(República de Serra /,cna, 2007a, p.23). ainda mais o déficit provocado pelos gastos significa que 'a restrição atual
provavelmente será mantida.
Apesar de o FMI ter reco11 llecido que Serra Leoa necessita de mais pro-
fessores e ter oferecido um limilc anual extra para a contratação de vários 4.2. O que mais precisa mudar?
docentes novos, essa prútica continua a depositar o poder de decisão mais
nas mãos do FIVU cio que no µ:overno. Se a contratação ele mais professores "Apesar de as considerações quanto a medidas rnacroeconô-
é ou não motivo suficiente p;1rn justificar um aumento no limite de gasto micas comprometidas em manter uma irlflação de um único
eom pessoal é uma decisão q11e não deveria ser tomada pelo FMI, mas pe- dígito e baixas metas de dlfficitfiscal serem importantes, deter-
los governos eleitos. Além disso, o FMI admite que "uma vez introduzidos, minando a quantidade defundos disponível para a educaç<io,
os tetos para gasto com pessoal vêm para ficar" (Fedelino et al2006, p.12). é necessário que se crie um contexto favorável ao cumprimento
Essas descobertas do próprio l~Ml indicam que não há muito espaço para das importantes metas educacionais, auxiliando a longo pra-
flexibilidade nos tetos depois lle eles terem sido incluídos na MRPC de um zo a nossa luta contra a pobreza"
país. Se Serra Leoa continuai' a exceder o limite, será que isso se deve ao (República de Serra Leoa, 2007a, p. 23).
fato de o teto ter sido estabeh'cido num patamar baixo demais, não consi-
derando a verdadeira necessidade de mais professores? É positivo que, nos três paises, os doadores tenham demonstrado sua
disposição em aumentar os fundos acordados, o apoio orçamentário e ou-
Moçambique tros mecanismos que podem linanciar o custo dos salários, e que, reco-
nhecendo finalmente a necessidade de contratar novos professores e mais
Sob pressão da comunidade doadora, o teto para o gasto com pessoal foi profissionais da saúde, o FMI tenha permitido alguns ajustes no gasto com
aumentado e não é 111ais uma meta indicativa no acordo entre Moçambique e pessoal para acomodar mais investimentos. Entretanto, essa tão falada "fle-
o FMI. Como resultado, seria de se esperar que o governo fosse capaz de con- xibilidade" só é possível nos estritos parâmetros que o FMI determina para
tratar o número de professores necessário para garantir o ensino primário de a inflação e os déficits, e não garante às crianças o direito de estudar com
qualidade. Entretanto, !'uncio11úrios do Ministério das Finanças afirmam que um professor capacitado numa sala de aula com até 40 alunos. Antes que os
a pressão pela redução do or~·amento total como forma de atingir a inflação países possam utilizar aumentos projetados no volume da ajuda para con-
de um único dígito e baixos níveis de déficit fiscal continua a limitar o núme- tratar mais professores, são necessárias algumas mudanças fundamentais
ro de contratações do governo. Assim, o Ministério das Finan~as Gontinua a no modelo macroeconômico do FMI e mudanças muito mais rápidas no
implementar a restrição ele gasto com pessl!lal' mesmo semi necessidade· de· sentido de tornar toda a ajuda dos doadores mais constante e adequada.
fazê-lo. Como declarou um !ilncfonário do governo: "O governo removeu o
limite como meta indicativa. l\las, na verdade, a política salarial não mudou
'º A comparação histórica mostra que o espaço dado aos países em desenvolvimento para a for-
consideravelmente. De fato, a política inflacionária se tornou ainda mais rígi- mulação de medidas não é o menor de todos os tempos. No entanto, o espaço para a form.ulação
da". Em razão dessas medidas e da falta de provisão de ajuda no longo prazo, de medidas nos países em desenvolvimento diminuiu muito nos últimos 25 anos e corre o risco de
o Ministério da Educação espl'ra atingir uma PPA de apenas 1:54 até 2015. encolher ainda mais, ao ponto de tornar impossível o emprego de qualquer medida significativa para
o desenvolvimento econômico (Chang .. 2005).

190 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impac:o nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 191
Há três áreas principais nas quais a mudança se faz necessária. Por bilidade macroeconômica. Um vasto número de lideranças deveria
estarem interligadas, o avanço em uma área exige reformas na outra. estar envolvido nesses debates, incluindo parlamentares, doadores,
ministros e organizações da sociedade civil.
1. Macro-planejamento baseado em necessidades - De maneira geral,
as medidas macroeconômicas deveriam ser uma ferramenta, não 4.2.1. Desenvolvendo modelos macroeconômicos baseados em neces-
apenas para garantir a estabilidade, mas para permitir a realização sidades
do desenvolvimento nacional e das metas sociais. Atualmente, o pa-
tamar do total de gastos permitido áo governo é definido a partir de Metas de desenvolvimento nacional orientam o investimento público
metas macroeconômicas. Os governos são então obrigados a "nego- Os ministérios da educação e das finanças precisam se esforçar para
ciar" com o FMI para acomodar pequenas mudanças ou programas atingir metas sociais mais ambiciosas baseadas em necessidades em vez de
adicionais junto ao teto sobre os gastos totais. Propusemos que os go- se restringir aos "pacotes". Nesse sentido desenvolvemos cenários alterna-
vernos considerem inverter esse processo, começando por uma inter- tivos sugerindo a quantidade de professores necessária nos próximos anos
pretação dos requerimentos de gastos a longo prazo baseada nas ne- para se atingir a PPA ideal. Nossas projeções são as seguintes:
cessidades, em conformidade com os direitos básicos, as obrigações e
as metas nacionais para a erradicação da pobreza. Isso permitiria aos •Serra Leoa: 28.895 professores são necessários para garantir educa-
governos identificar metas macroeconômicas adequadas para garan- ção de qualidade na educação primária (cerca de 10 mil a mais do
tir a estabilidade, baseando-se nas necessidades individuais dos seus que o número atual)
países em vez de metas arbitrárias baseadas em médias mundiais.
O retorno a longo prazo do investimento em educação e em saúde ·•Malavi: 90.477 professores da educação primária precisarão ser
também deve ser calculado neste macro-planejamento, bem como as contratados até 2015 para atingir a PPA de 1:40 (quase o dobro do
disparidades entre homens e mulheres. número atual)

2. Ajuda internacional de longo prazo - A próxima mudança tem de par- • Moçambique: 109.172 professores da educação primária são neces-
tir dos doadores: eles precisam manter um fluxo de ajuda previsível, sários (mais que o dobro do número atual).
sustentável e de longo prazo que permita aos países atingir as MDM.
Já vimos o sucesso do aumento da ajuda para a saúde de Malavi. Medidas inflacionárias e de déficit fiscal seriam determinadas a partirdes-
O mesmo princípio deveria ser aplicado a todos as áreas sociais. A sas ou de outras projeções de professores. Essa abordagem não precisa acar-
seguir, demonstramos como a ajuda de longo prazo pode se tornar retar uma inflação exagerada ou um alto nível ele déficit: quando os números
compatível com o crescimento nos recursos nacionais sem tornar os ultrapassarem aquilo que pode ser considerado como razoável, seriam feitos
governos mais dependentes da ajuda. ajustes à meta de gastos até encontrar uma situaç.'io equilibrada. Essa aborda-
gem se baseia na premissa de que a identificação das necessidades e das dispa-
5. Metas especificas para cada país - Finalmente, os governos deveriam ridades entre os sexos (em vez de taxas médias macroeconômicas arbitrárias)
ter a liberdade de escolher a combinação certa de medidas monetá- deveria ser assumida como ponto de partida. O Programa das Nações Unidas
rias e fiscais para acomodar uma elevação nos gastos como resultado para o Desenvolvimento (PNUD), trabalhando com um modelo macroeconô-
do aumento da ajuda, havendo capacidade de absorção dela. Isso im- mico baseado nas MDM, propõe que as medidas sejam ent.'io definidas com
plica que a mentalidade binária das metas macroeconômicas deveria o objetivo de cumprir essas metas, que precisam de investimento sustentável
ser descartada, permitindo que o governo recorra a um vasto leque de longo prazo, porque as mudanças na educação, na saúde e as relativas às
de fontes e experiências, explorando a "área cinza" da política fiscal desigualdades entre os sexos exigem tempo (MeKinley, 2005, Roy et aJ, 2006).
e monetária. Essa flexibilidade permitiria aos governos considerar Uma perspectiva de longo prazo também é valiosa, pois permite que o retorno
novas possibilidades e encontrar uma posição que equilibre a neces- econômico para o investimento em educação seja calculado nas projeções.
sidade de aumentar o gasto nos setores sociais e a garantia da esta-

192 1 Banco ~undial. OMC e FMI: o imoacto nas ooliticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 193
Planos nacionais sólidos e de longo prazo têm de ser a pedra fundamental preparar o plano de desenvolvimento a longo prazo, Visão 2020, e deu base
dessa abordagem. Os lrês países do nosso estudo já procuraram desenvolver ao EERP. Em Moçambique, representantes do governo e da sociedade civil
planos nacionais e educacionais de longo prazo por meio de processos par- se reuniram para debater e adaptar o T21 ao contexto nacional. O modelo in-
ticipativos, aproximando funcionários do governo, intelectuais e a sociedade fluenciou a escolha de objetivos sociais priorizados no EERP. Entretanto, até
civil. A educação é reconheci<la como um investimento fundamental para hoje o uso desse modelo parece limitado, sendo empregado principalmente
garantir o desenvolvimento econômico e social a longo prazo. Entretanto, para determinar o impacto de medidas específicas da agricultura e do com-
em todos os três casos, esses planos de desenvolvimento de longo prazo não bate à aids no crescimento, e não para explorar modelos macroeconômicos
dispõem de credibilidade e não debatem as medidas macroeconômicas. Em alternativos nem para calcular com precisão a disparidade entre os sexos. Há
Moçambique, o estudo estratégico para a redução da pobreza (EERP) guia as uma necessidade clara de aumentar a capacidade do governo e da sociedade
prioridades orçamentárias do governo e a MRPC determina as medidas ma- civil para a escolha e utilização de medidas macroeconômicas alternativas.
croeconômicas (Derenzio e Hanlon, 2007). Ainda assim, o EERP e a MRPC No entanto, para conduzir projeções diferentes, os países necessitam de
são planos de apenas três anos, e as metas sociais que o governo estabele- um banco de dados extenso, sólido e confiável de variáveis macroeconômi-
ceu se baseiam em recursos pré-definidos em vez de necessidades. Como o cas, uma noção precisa do número de professores e funcionários da saú-
modelo macroeconômico explicitado na MRPC permeia o EERP, as medidas de que necessita ser contratado e o custo a longo prazo do pagamento de
monetárias e fiscais têm prioridade diante de metas de desenvolvimento eco- professores e funcionários da saúde, lacunas de financiamento etc. Contudo,
nômico e social, e o volume de recursos é limitado (Norton 2004). em razão do alto nível de informalidade existente nos países em desenvol-
Em suma, o FMI e o governo não deveriam mais discutir o tipo de restrição vimento, a coleta de dados estatísticos precisos é difícil, o que também pode
imposta sobre os gastos públicos para manter a inflação no patamar de um úni- significar uma nova maneira de calcular essas variáveis. Por exemplo, mes-
co dígito ou impedir que o governo necessite de empréstimos. Ao contrário, o mo os indicadores econômicos utilizados pelo FMI (como o PIB ou a taxa de
FMI deveria renunciar sua influência decisiva sobre as medidas de governo por inflação nacional) oferecem apenas uma imagem parcial da economia. Em
meio da imposição de condiçõl's especificas relacionadas aos seus programas Malavi, o governo mudou a sua forma de calcular o PIB, em razão do fato de
de empréstimo e controle. Os parlamentos, a sociedade civil, os ministérios da a antiga medida não considerar as pequenas e médias empresas. Espera-se
educação e das finanças deveriam trabalhar juntos para alinhar e transformar que essa nova forma de calcular mude dramaticamente o volume estimado
as medidas macroeconômicas no sentido de contemplar os direitos básicos do PIB, como foi o caso da Tanzânia, onde uma atitude parecida verificou que
bem como as metas de crescimento. O FMI, junto com outras agências, como o PIB era 40% superior à estimativa anterior, o que representou um aumento
o PNUD, poderia ser uma fonte valiosa de conselhos técnicos, oferecendo uma significativo no orçamento do governo em relação aos níveis anteriores, sem
gama de possibilidades que permitam aos governos e a outras lideranças (in- alterar a proporção entre os gastos públicos e o PIB.
cluindo os parlamentos e a sociedade civil) escolhas conscientes quanto a me- Atualmente, os governos não podem participar igualitariamente de um
didas macroeconômicas, folhas de pagamento e nível do gasto social. diálogo com o FMI, porque o modelo macroeconômico que permeia o deba-
te não é somente uma condição para continuar acessando o financiamento
Modelos de projeção acomodam fatores de longo prazo do FMI como também para continuar recebendo a aprovação do FMI. "Sair
Há modelos existentes que projetam o retorno econômico da educação da linha" em relação ao FMI é um sinal aos doadores e mesmo aos investi-
no longo prazo. O modelo do limiar 21 (Threshold 21, T21) desenvolvido dores para que retirem seu apoio. Os governos têm pouco acesso a modelos
pelo Instituto Milênio foi usado tanto em Malavi como em Moçambique. 21 macroeconômicos ou assistência técnica em medidas macroeconômicas
O modelo integra objetivos econômicos, sociais e ambientais num plano de de outras fontes, o FMI não oferece medidas alternativas, e os doadores
dez a trinta anos e tenta solucionar o retorno econômico e o impacto do in- freqüentemente apóiam a vantagem comparativa do FMI na definição das
vestimento público. Uma abordagem multissetorial permite aos diferentes medidas macroeconômicas. Os que expõem soluções alternativas repre-
responsáveis negociar e debater as vantagens e as desvantagens entre a prio- sentam a minoria e não têm voz (Sogge, 2006). Entretanto, com o desenvol-
rização de certas medidas em detrimento de outras, podendo, portanto, ser vimento de modelos diferentes, como o modelo de necessidades baseadas
uma eficaz ferramenta de planejamento. Em Malavi, o T21 foi utilizado para em MDM do PNUD e o modelo T21 do Projeto Milênio, os governos deve-
riam ao menos ter a oportunidade de testar diferentes cenários na tentativa
" Mais informações, disponíveis em www.millenium-institute.org/index.html
de satisfazer suas necessidades sociais e de desenvolvimento.

194 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 19 5
4.2.2. Ajuda previsível a longo prazo promessa inglesa de oferecer ajuda a longo prazo para a educação em
abril de 2006, os ministros africanos das finanças, doadores e represen-
Dado que os três países são muito dependentes de ajuda, os doadores tantes de instituições financeiras internacionais concordaram durante
desempenham um papel significativo em tornar realidade esses planos de um encontro em Abuja, capital da Nigéria, que o FMI precisa detalhar
desenvolvimento. A ajuda oferecida de maneira assistemática e imprevisí- maneiras por meio das quais seus modelos possam ser flexibilizados e
vel ao logo de um período de 3 a 5 anos acaba prejudicando os planos de os tetos sobre os orçamentos sejam expandidos. O FMI concordou em
desenvolvimento nacional que exigem um período maior, de 10 a 15 anos. "ajudar individualmente os países a reavaliar seus modelos macroeco-
Para que esses planos tenham o máximo efeito possível, eles têm de ser nómicos visando fortalecê-los e alinhá-los de modo a propiciar um au-
acompanhados pelo financiamento a longo prazo. Sem uma maior ajuda mento até atingir as metas MDM".
previsível a longo prazo oferecida por outros parceiros no desenvolvimen- Ainda assim, com razão, os governos temem a utilização dos recursos
to, tais planos jamais se tornarão realidade. Esse é um desafio para a co- doados para financiar o orçamento de contratações por medo da instabi-
munidade doadora, ao qual ela começou a responder no grande encontro lidade caso os fundos doados sejam interrompidos. Há, entretanto, abor-
sobre "A manutenção das promessas relativas à educação" que ocorreu em dagens alternativas que poderiam ser utilizadas para acompanhar o fi-
2 de maio de 2007, em Bruxelas, Bélgica. nanciamento doado a fim de que ele contribua para a sustentabilidade do
Estima-se que sejam necessários 15 bilhões de dólares a cada ano para orçamento governamental. Consideremos o seguinte exemplo: o governo
garantir que toda criança possa concluir uma educação primária de qua- de Malavi espera que o PIB cresça 6% ao ano, bem acima da inflação. Da
lidade até 2015 e para dar novas oportunidades a jovens e adultos que não mesma maneira, o orçamento do governo, estabelecido num percentual do
tiveram a chance de estudar. Há uma necessidade urgente de aumentar a PIB, também pode crescer 6% ao ano. Se uma determinada constante do
quantia adiantada de ajuda oferecida à educação e também de aumentar o orçamento for destinada à educação, ela também crescerá à razão de 6% ao
número de países beneficiados pela Iniciativa Via Rápida. A lacuna atual no ano, acima da inflação. O gráfico 1 demonstra que, ao longo de um período
financiamento da ordem de 750 milhões de dólares para países patrocina- de dez anos, o orçamento recorrente do setor da educação cresceria 70%,
dos pela Iniciativa tem de ser preenchida imediatamente. saltando de 11,0 bilhões de kwachas malavvis no ano 1 (baseado no orça-
Os doadores também precisam confrontar as contradições entre as me- mento de 2006-2007) para 18,6 bilhões de kwachas malawis. Esse cálculo
tas previstas nos seus portfólios de ajuda e o apoio a medidas macroeco- se baseia nos valores de 2006-2007. Portanto, o aumento é real.
nómicas restritivas, trabalhando junto com o FMI e com os governos no Se todos esses recursos adicionais fossem alocados para os salários
sentido de afastar as condições que impedem que a ajuda seja gasta para dos professores, seria possível incluir na folha de pagamento 82.150 pro-
concretizar o seu propósito original e na garantia que as medidas macro- fessores adicionais com salário mensal médio de 7.700 kwachas malavvis
económicas forneçam o espaço fiscal necessário para absorção e adminis- (ajustado pela inflação) até o ano 10. Isso abaixaria a PPA de 1:72 no ano
tração da ajuda recebida. 1 para 1:27 no ano 10. Outra possibilidade seria a contratação de 45.268
Seguindo o exemplo de Moçambique, doadores para a educação tam- professores para reduzir a PPA até 1:40, o que deixaria livres 3,8 bilhões
bém podem desempenhar um papel crucial ajudando os ministérios da de kwachas malawis (27 milhões de dólares) para o investimento em au-
educação a desafiar e a remover os tetos atuais sobre o gasto com pessoal mentos salariais, moradia dos professores ou outros incentivos. Isso seria
quando estes bloquearem a contratação e a formação dos novos professo- o bastante para dar aos professores um salário anual de aproximadamente
res urgentemente necessários. Os doadores também precisam exigir que se 44.000 kwachas malawis em média, o equivalente ao aumento de 47% so-
considerem as perspectivas de longo prazo, permitindo aos planejadores bre o salário médio. ·
que observem as recompensas a longo prazo dos aumentos estratégicos
nos gastos público a curto e a médio prazos.
Não há dúvida de que as promessas de ajuda a longo prazo podem ter
um impacto positivo ao empurrar os países na direção do desenvolvi-
mento de planos nacionais mais estratégicos, e isso que pode incentivá-
los a exigir medidas macroeconómicas mais flexíveis. Um mês após a

1~f) 1 R~nrn M11ntfo1I nMr,. FMI· n imn~rtn n!)c nnlitit-::ic. ,.tiur::u·•inn!)ic Confrontando as contradicões: o FMI e o investimento no orofessorado 1 19 7
Gráfico 1. Financiamento susi l'.ntável dos doadores a médio prazo Todavia, para colocá-la em prática, seria necessária maior flexibilidade
quanto às metas macroeconômicas. O aumento no orçamento da educação
representaria um aumento de 3,5% sobre a parcela do PIB destinada ao go-
verno no ano 1, caindo para 1,9% até o ano 10. Assim, o limite sobre a par-
cela do PIB destinada aos gastos governamentais teria de ser aumentado.
Para que as lacunas sejam preenchidas, essa abordagem depende dos
doadores. De maneira alternativa, e até mesmo controversa, os governos
poderiam considerar aumentos de curto prazo nos empréstimos, respeitan-
do os mesmos princípios descritos anteriormente.
Um modelo mais complexo também poderia ser desenvolvido de acor-
do com esses princípios calcular o retorno econômico do investimento
em educação, o que seria observado após os primeiros anos. Pedimos ao
FMI, ao Banco Mundial e ao PNUD que desempenhem um papel ativo no
ano 1 ano 2 ano 3 ilfl04 ano 5 ano G ano 7 ano 8 ano 9 ano 10 desenvolvimento desse tipo de modelo, tendo em vista o auxílio para que os
• aumento do PIB no orçamento fundos doados no orçamento
governos atinjam suas metas de desenvolvimento e educação .

Esse crescimento seria ati11gido de forma lenta e gradativamente ao 4.2.3. O debate específico de cada país quanto à combinação certa de
longo de um período de dez a11os. Mas não é necessário esperar dez anos medidas macroeconômicas
para que isso se torne realidade. O linanciamento dos doadores, indicado
pela linha mais clarn no gn'tl'ico, poderia ser introduzido no ano 1, com Nos três países, observamos a ausência de diálogo quanto às medidas
base num acordo de dez anos. para exceder o orçamento do governo no macroeconômicas fora do círculo de representantes nomeados pelo Minis-
ano 1 até o nível esperado no ano 1O. O financiamento poderia ser gra- tério das Finanças e pelo Banco Central para negociar com o FMI. Esses
dualmente reduzido ú razão (k 6% ao ano, substituído pelo crescimento agentes nem sempre consideram as necessidades de outros setores, como
natural do orçamento. Até o ano 10, o financiamento dos doadores já a educação e a saúde, quando aprovam metas monetárias e fiscais, nem
teria sido totalmente subsliluíclo conl'orme o financiamento do gover- avaliam as escolhas entre os sacrifícios gerados nesses setores. Por exem-
no assumisse as responsabilidades. Como resultado, o financiamento plo, verificamos a falta de diálogo no estágio de planejamento das medidas
dos doadores oferece um adiantamento ao orçamento governamental, macroeconômicas quanto ao número de professores necessários e como o
proporcionando um efeito a\('lluante sobre as receitas e permitindo ao limite de gasto com pessoal teria de re11etir essa necessidade.
governo gastar hoje aquilo qt1t~ espera arrecadar daqui a dez anos. As equipes governamentais encarregadas das medidas fiscais (MF) e
Essa abordagem permiliri;1 um aumento dramático nos gastos com a monetárias (Banco Central) também precisam consultar os ministérios da
educação a curto prazo, mas com uma dependência limitada e controlada educação, da saúde e dos direitos das mulheres para determinar as dispa-
sobre as doações. Isso cerlamc11le exigiria uma previsão razoável de receitas ridades no acesso aos serviços entre homens e mulheres. Parlamentares, a
para o governo, um compromisso de dez anos por parte dos doadores e um mídia e as organizações da sociedade civil também deveriam ser ouvidos.
compromisso claro do governo cm relação aos recursos destinados à edu- Mas a realidade não é essa. Mesmo que o espaço das medidas fosse ex-
cação, ano após ano. Considcl'ando cuidadosamente as previsões e os pla- pandido e tais debates ocorressem, poucas organizações da sociedade civil
nos quanto ao retorno econômico a médio prazo, um nível razoável poderia teriam esse nível de participação. Elas precisam aumentar seu repertório
ser estabelecido para as doações excedentes ao orçamento, permitindo uma econômico para que possam participar ativamente da discussão de medi-
explosão no financiamento da t•ducaç<io a curto prazo sem sobrecarregar o das macroeconômicas e alternativas.
governo a médio prazo. Essa 111cdicla oferece uma alternativa realista para Ao menos que haja de fato engajamento e crítica interna em cada pais,
superar o impasse de linanciamcnlo que a área da educação enfrenta atual- o FMI continuará a ser a voz dominante, trazendo sérias implicações para
mente e, portanto, deveria ser ('Onsideracla uma opção de financiamento. a democracia, o bom governo e a soberania. É fundamental que os cidadãos

Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 199


198 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impactll nas politicas educacionais
e cidadãs sejam capazes de responsabilizar seus próprios ministérios das
finanças pelas medidas macroeconômicas por eles assumidas e estejam 5. Recomendações
cientes das opções alternativas disponíveis ao governo.
Nesse sentido, atingir as metas educativas depende da contratação de mi- Para atingir a meta de oferecer a cada criança uma
lhões de professores formados ao longo dos próximos anos. Assim, é hora de
educação decente:
enquadrar as medidas macroeconômicas de modo a facilitar o cumprimento
destas e de outras metas fundamentais. Apesar de este estudo 21 não visar à
1. O FMI deve parar de vincular condições especificas e medidas aos
apresentação de um modelo macroeconômico holístico e alternativo, nossa
seus programas de empréstimo e controle, inclusive quanto à inflação,
intenção é demonstrar que os processos atuais não são as únicas possibili-
ao déficit fiscal e à folha de pagamento.
dades dos governos. As propostas apresentadas neste capítulo deveriam ser
consideradas opções viáveis para uma nova maneira de satisfazer as neces-
sidades de desenvolvimento da educação e o cumprimento das MDM. • Qualquer conselho relativo às medidas deve oferecer opções que per-
mitam aos governos e outros responsáveis, incluindo os parlamentos e
a sociedade civil, fazer escolhas conscientes quanto a medidas macro-
econômicas, folhas de pagamento e nível do gasto social.

•Os conselhos do FMI quanto às medidas deveriam abandonar a prio-


rização absoluta da estabilidade a curto prazo e ajudar os países a fa-
zer a transição para o planejamento de longo prazo para que possam
ser avaliados os ganhos de investimentos maiores como os destinados
à educação. Eles precisam reconhecer a educação como um investi-
mento produtivo e não apenas como gasto de governo.

• O FMI deveria participar de fóruns internacionais sobre medidas edu-


cacionais (junto com os parceiros da EPT e a sociedade civil) e enten-
der como as suas intervenções apóiam ou prejudicam a realização das
metas educacionais.

• O FMI precisa fazer mudanças consistentes quanto ao direito a voto e


à voz em seu Conselho Executivo para que os países que tomam em-
préstimos possam opinar quanto às medidas que os afetam.

2. Os governos devem determinar, como parte do seu planejamento


de longo prazo, os níveis funcionais e salariais coerentes com suas me-
tas educacionais, permitindo a operação de uma força de ensino motiva-
da e profissional numa base sustentável.

• Os governos deveriam desenvolver planos de longo prazo detalhando


os custos e as necessidades de professores e recursos para formação
21Em 17/05/2007, O FMI publicou em seu site uma resposta a este estudo (disponível, em inglês, em de maneira a oferecer resultados de ensino de qualidade para todos
http:l/www.imf.org/external/np/vc/2007/051707.htm). A tréplica da ActionAid ao Fundo, divulgada
os meninos e meninas. Esses planos educacionais, juntamente com
em 14/06/2007, pode ser lida, também em inglês, no endereço http://www.actionaid.org/assets/pdf/
AAIO/o20response0fo20to0/o201MFO/o20140/o20June0/o2020070/o20(3).pdf os planos que visam ao cumprimento de outras metas de desenvolvi-

200 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas politicas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 201
mento (por exemplo, a saúde, o combate à aids e as diferenças entre os 4. As organizações da sociedade civil precisam desenvolver sua própria
sexos), deveriam conduzir o planejamento macroeconômico futuro. alfabetização em economia para que possam avaliar os orçamentos gover-
namentais, aumentar a sensibilidade no processo de definição orçamentária
• Esses planos de longo prazo precisam ser apoiados por um debate (quanto às necessidades das meninas, dos pobres e de outros grupos excluí-
aberto conduzido pelo governo e pela sociedade civil de cada país dos) e participar de debates sobre medidas macroeconômicas alternativas.
(com conselhos do FMI, Banco Mundial, PNUD e doadores) quanto à
melhor combinação entre as medidas fiscais e monetárias que cum- • Elas precisam desenvolver sua habilidade de negociar aumentos no
pram as prioridades nacionais e garantam a estabilidade econômica. orçamento para a educação e no orçamento nacional como um todo.

• Os ministérios das finan~'as precisam ampliar sua compreensão e utili- • Precisam estabelecer laços mais fortes com os parlamentares e com a
zar modelos macroeconômicos alternativos, fazendo uso desse conheci- mídia para garantir maior transparência em todas as decisões macro-
mento para considerar todo o leque de medidas disponíveis a eles. econômicas, possibilitando que o que é atualmente decidido a portas
fechadas seja agora decidido diante de todos, com total consciência
• Os ministérios das finarn,,as também precisam exigir uma justificativa das alternativas existentes em relação ao modelo atual do FMI. Tam-
detalhada quanto às melas e medidas recomendadas pelo FMI, sendo bém precisam exigir justificativas com relação às metas macroeconó-
transparentes quanto às discussões com o Fundo. Todo acordo de em- micas, determinadas de acordo com padrões internacionais em vez da
préstimo com o FMI deveria ser submetido à votação e à avaliação dos interpretação da realidade local, e que acabam obstruindo o desenvol-
parlamentos. vimento social.

• Os governos devem exigir a provisão de mais ajuda dos doadores para


preencher a lacuna de rt'cursos. E, se isso não for possível, devem ficar
livres para optar por outras medidas no sentido de garantir o financia-
mento adequado c sustentável.

3. Os doadores precisam manter suas promessas ao se comprometer


com o fechamento da lacuna de financiamento anual de 15 milhões de
dólares necessários para se atingir a Educaç<io para Todos com provisão
de ajuda em maior volume 110 longo prazo. Há uma necessidade urgente
de aumentar os adiantamentos na ajuda à educação e tornar disponível
um maior volume para os custos gerais, inclusive com salários.

• O processo intermediário de avaliação da EPT e o relatório de monito-


ramento global da EPT de 2008 precisam avaliar as contradições entre
os tetos para gastos com pessoal, os problemas persistentes quanto à
disponibilidade de ajuda elos doadores e o cumprimento das metas
educacionais.

• Os doadores podem ajudar a negociar maior investimento nos profes-


sores como grandes contribuintes para o crescimento econômico, de-
safiando a visão do FMI que assume o gasto com salário de professores
apenas como uma despPsa do governo quando deveria ser visto como
investimento produtivo.

202 J Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento .no professorado J 203
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21 Ü J Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Confrontando as contradições: o FMI e o investimento no professorado 1 211
Abreviaturas e Siglas PNB - Produto Nacional Bruto
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
ABED - Associação Brasileira de Educação a Distância PPA - proporção entre professores e alunos
Andes-SN - Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior RDC - República Democrática do Congo
AOA - Acordo de Agricultura SPS - Acordo sobre as medidas Sanitárias e Fitossanitárias
AWU -American World University TBT - Acordo sobre os Obstáculos Técnicos ligados ao Comércio
CAPES - Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível TLC - Tratado de Livre Comércio
Superior TRJMS - Acordo sobre as medidas que dizem respeito ao Investimento li-
CIPM - Centro Internacional de Pesquisa da Mulher gadas ao comércio
CNE - Conselho Nacional de Educação TRIPS - Acordo sobre os aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual
CUEP - Conclusão Universal da Educação Primária ligados ao Comércio
DDI - Departamento de Desenvolvimento Interno da Inglaterra UAB - Universidade Aberta do Brasil
EAI - Escritório de Avaliação Independente (do FMI) UE - União Européia
EERP - estudo estratégico para a redução da pobreza Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
EPT - Educação para Todos Cultura
FMI - Fundo Monetário Internacional VAT- imposto sobre valor agregado
GATE - Aliança Global para a Educação Transnacional, em inglês
GATS - Acordo Geral de Comércio em Serviços
GATT - Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio
G-20 - Grupo de países em desenvolvimento: África do Sul, Egito, Nigéria,
Tanzânia, Zimbábue, China, Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão, Tailân-
dia, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Cuba, Guatemala, México, Paraguai,
Uruguai e Venezuela.
IAM - Instrumento de Apoio à Medida
IE - Internacional da Educação
IES - Instituição de Ensino Superior
IEU - Instituto de Estatística da Unesco
IISP - Imposto de Impacto Social contra a Pobreza
IVR - Iniciativa Via Rápida
LDC- Less Developed Countries (Países Menos Desenvolvidos)
MDM - Metas de Desenvolvimento para o Milênio
MECT - Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia (Serra Leoa)
MF - Ministério das Finanças
MRPC - Medidas para a redução da pobreza e o crescimento
NAFTA - Acordo de Livre Comércio da América do Norte, em inglês
OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
OIC - Organização Internacional do Comércio
OMC - Organização Mundial do Comércio
ONU - Organização das Nações Unidas
OSC - organizações da sociedade civil
PBAE - países pobres altamente endividados
PIB - Produto Interno Bruto

212 1 Banco Mundial, OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais Siglas 1 213
Autores

Sérgio Haddad é educador, economista e doutor em Sociologia da Educa-


ção. É coordenador geral da Ação Educativa e atual presidente do Fundo
Brasil de Direitos Humanos.

AkankshaA. Marphatia é consultora da ActionAid Internacional e diploma-


da pela Universidade de l larvard em Políticas Educacionais Internacionais
com ênfase cm educação de mulheres e meninas.

Anne-Marie Ainger é economista e consultora da ActionAid Internacional.

Camilla Croso Silva é coordenadora da Campanha Latino-Americana pelo


Direito à Educação e mestre em Política e Planejamento Social pela London
SchoolofEconomics.

David Archer é diretor de Educação da ActionAid Internacional e membro


da coordenação da Campanha Global pela Educação.

Diego Azzi é mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo.

Marina Gonzalez é jornalista e assessora da Ação Educativa.

Rachel Moussié é consullora da ActionAid África do Sul e integrante da


equipe de Educação da ActionAid Internacional.

Renato Bock é economista e pós-graduado em Economia Social e Desen-


volvimento na América Latina.

Yana Scavone-Brugier é consultora em políticas públicas e desenvolvimen-


to, diplomada pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris.

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