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Resumo
O presente trabalho é resultado de uma trajetória de pesquisa empreendida desde os estudos de
mestrado, ao tratar do lugar do ouvinte nos estudos saussurianos (STAWINSKI, 2016), ao
doutorado, em busca de um conceito de escuta a partir de Saussure (STAWINSKI, 2020). Tais
pesquisas foram promovidas no âmbito do projeto de pesquisa O rastro do som em
Saussure (PPG-Let UFRGS). Ao longo dos últimos anos, particularmente a partir de 2013, a
investigação acerca do termo “ouvido” tem colaborado para o questionamento sobre o lugar que
o outro ocupa na reflexão linguística de Saussure. A presença do ouvinte passou a desempenhar
um papel importante em nossas considerações teóricas: percebemos que pouco se fala sobre
este outro, encarnado pelo Monsieur B do circuito da parole, e que o ouvido parece agir
centralmente em direção à definição do que pode ser compreendido como langue. Pesquisas
empreendidas por Jacques Coursil (2000), Giuseppe D’Ottavi (2010), Herman Parret (2014) e
Giuseppe Cosenza (2016) demonstram que é possível aprofundarmos a nossa compreensão
acerca da função operada pelo ouvido (oreille). É a partir desses autores e do corpus de textos
saussurianos (do CLG a edições de manuscritos como o Phonétique) (SAUSSURE, 1972
[1916]; 1995) que nos apoiaremos para delimitar o lugar do ouvido como um termo proveniente
dos escritos de Saussure. A consideração do ouvido nos levará a implicações terminológicas
que servirão de aporte para sustentar uma noção de escuta linguística.
Palavras-chave: falante; langue; ouvido; ouvinte.
1
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – aline.stawinski@gmail.com
fundamental encarar a recepção como uma função ativa, visto que “sua atividade
auditiva, atividade inteligente por excelência, é uma experiência de língua” (COURSIL,
2000, p.13, tradução minha).
Tendo isso em vista, o circuito saussuriano é posto em evidência a partir do
lugar de interlocução ou da alteridade. Ao invés de “opor”, de certa forma, falante e
ouvinte, Coursil defende que a função muda da linguagem é uma constante: como
encontramos no CLG, é senso comum que “é ouvindo os outros que aprendemos a
língua materna” (SAUSSURE, 2006 [1916], p.27); Coursil radicaliza o olhar para essa
interação entre A e B e afirma: “falar é um acontecimento, e ouvir é uma constante”
(COURSIL, 2000, p.13, tradução minha). Se a escuta da chaîne parlée é uma constante,
Coursil passa a falar em um “ouvinte que fala” e em um “ouvinte que escuta”. A função
muda, e não a falada, torna-se o centro da reflexão. O propósito de sublinhar os
apontamentos de Coursil não é a de fazer uma inversão entre fala/falante –
escuta/ouvinte. Para evitarmos uma possível leitura dicotômica, penso no lugar do
“ouvinte que fala” e no “falante que escuta” (STAWINSKI, 2016, p.102). Nesse
sentido, falante e ouvinte encontram-se sob efeito da cadeia ouvida – eis a função muda
da linguagem.
Giuseppe D’Ottavi vai ao encontro das ideias de Coursil. Pra DOttavi, o
esquema de Saussure que representa, de forma simplificada, o circuito da parole, tem o
mérito de representar claramente o imperativo de duas funções ou posições: a do falante
e a do ouvinte. Nesse sentido, o circuito não é representado por um sentido unilateral
(que vai do falante ao ouvinte simplesmente), e tal detalhe confere um valor teórico
fundamental à alternância dialógica, sugerindo uma imagem pendular: conforme as
palavras do pesquisador, “o arranjo simétrico apresenta Monsieur B como o reflexo
especular de Monsieur A e uma substancial homologia operativa liga os momentos
produtivo e receptivo” (D’OTTAVI, 2010, p.77, tradução minha).
Uma vez mais, a “função” de delimitação dos sons próprios de uma língua é
atribuída ao o ouvido.
Quanto à entrada terminológica referente ao primeiro curso, Cosenza destaca o
seguinte excerto:
REFERÊNCIAS