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Universidade Estadual de Campinas

Maio de 2001
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ENSINO
ENSINO

Inteligência Fotos: Antoninho Perri

artificial
Alunos fazem exercícios com
brinquedos Lego para aplicar
conceitos sofisticados de Robótica
PAULO C. NASCIMENTO
pcnpress@uol.com.br

P
equenos veículos construídos com peças
Os estudantes e seus
do jogo Lego, de dimensões próximas à
veículos montados
de uma caixa de sapatos, movem-se sozi-
com peças do jogo
nhos em diferentes direções no chão de Lego: parece
uma sala de aula na Unicamp. Dotados de brincadeira, mas é um
rodas, garras e guindastes, desviam-se de paredes e exercício sério
de outros obstáculos, e executam tarefas como pe-
gar cubos de isopor e transportá-los de um local para
outro.
O que parece brincadeira de criança é, de fato,
o exercício acadêmico da aplicação de sofistica-
dos conceitos de inteligência artificial para a ope-
ração de robôs autônomos, executado por alunos A relação homem-máquina
da disciplina eletiva de Robótica: Sistemas Senso-
rial e Motor, oferecida desde o ano passado pelo A Robótica é uma área multidisciplinar que se vale dos co- mento do cérebro. Capazes de tomar decisões cada vez mais
Instituto de Computação (IC) para graduandos dos nhecimentos de outras ciências, como Engenharia Mecânica, complexas, poderão até demonstrar emoções e sentimentos na
Engenharia Elétrica e Inteligência Artificial, para a criação de interação com os humanos, em uma relação homem-máquina
cursos de Ciência da Computação e Engenharia
robôs. A maioria dessas máquinas é utilizada em linhas de freqüentemente explorada pelas artes.
de Computação, e para pós-graduandos em Ciên-
produção industrial, onde repetem infinitamente e com milimétrica A literatura de ficção científica e o cinema já produziram inú-
cia da Computação. precisão uma série de operações previamente programadas. meras obras sobre o tema, como o clássico O Homem
A montagem dos robôs, a partir de conjuntos Entretanto, cientistas em diferentes centros de pesquisa dedi- Bicentenário, de Isaac Asimov (1920-1992), autor de antologias
fabricados pela empresa Lego, constitui a parte prá- cam grandes esforços ao desenvolvimento de uma geração sobre os robôs. O “cult movie” Blade Runner, do diretor Ridley
tica da disciplina, concebida com a proposta de mais avançada de autômatos, os robôs “inteligentes”. São exem- Scott, abordou nos anos 80 a conflituosa relação entre humanos
introduzir nos princípios básicos da Robótica os plos de iniciativas concretas nesse fascinante campo científico: e replicantes – robôs avançadíssimos desenvolvidos com re-
alunos interessados no tema. o robô-cobra projetado por engenheiros da Nasa (a agência cursos de biotecnologia, que desejam ter sentimentos e ser
Controladas por computador, as engenhocas espacial norte-americana) para trabalhar em situações de au- como os seus criadores. Mais recentemente, Inteligência Artifi-
montadas pelos estudantes têm “inteligência” para sência de gravidade; o cão robótico Aibo lançado pela Sony; ou cial, filme de Steven Spielberg, tratou das aventuras de um
tomar decisões e solucionar situações a que são o robô doméstico criado pela NEC para servir de companhia garoto-robô construído com a capacidade de amar seus donos a
principalmente a pessoas ponto de considerá-los seus
submetidas. Algumas são de natureza simples – vi-
de terceira idade que vi- pais.
rar à direita ou à esquerda para prosseguir em seu
vem sozinhas, com Respeitadas as devidas
deslocamento após detectar um obstáculo à fren- sensores que lhe permitem proporções, o que os alu-
te –, outras um pouco mais complexas, como se desempenhar diversas ta- nos da Unicamp fazem nada
deslocar sobre uma mesa e parar próximo da bor- refas, como reconhecer mais é que montar suas cria-
da sem cair no chão. Podem ainda protagonizar mais de uma centena de turas cibernéticas com os
uma proeza heróica: identificar e resgatar “huma- comandos de voz e frases mesmos conceitos básicos
nos amigos” (na verdade blocos de isopor, colori- de seus donos. da inteligência artificial que
dos para auxiliar o robô na identificação) do inte- Os robôs “inteligentes” governa todos esses enge-
rior de uma arena, onde se misturam “humanos do futuro, contudo, serão nhos robóticos, os já materia-
inimigos” e outros robôs que precisam enfrentar. controlados por redes lizados pela ciência e aque-
neurais artificiais – conjun- les que, por enquanto, po-
“Embora os sistemas montados pelos alunos se-
tos de microchips de silí- voam o imaginário de escri-
jam, de certa forma, simples, possibilitam traba-
cio que procuram imitar a tores e roteiristas de cine-
lhar os princípios fundamentais da Robótica de organização e o funciona- Gonçalves, do IC: “Alunos trabalham princípios fundamentais” ma. Apenas por enquanto.
maneira concreta, ou seja, a lógica de programa-
ção envolvida no funcionamento do robozinho é
a mesma aplicada em um aparato que execute ope- transpor um obstáculo, seja simplesmente des- sunto que o apaixona – mais cedo do que pensava
rações mais complexas”, esclarece o professor Luiz viando dele ou providenciando a remoção por na Universidade. Segundo ele, a ênfase na prática
Marcos Garcia Gonçalves, responsável pela disci- meio de alguma ferramenta que transportem. colaborou para que assimilasse rapidamente o con-
plina, ministrada ao longo do segundo semestre. Submetidos a testes de desempenho durante o teúdo teórico, apesar de sua complexidade.
semestre, os veículos devem ser capazes de executar Sheila Moraes de Almeida, terceiranista de Ciên-
Cérebro – Depois de prontos, os robôs movem- com sucesso tarefas previamente especificadas e com cia da Computação, conta que a disciplina ampliou
se sozinhos por meio de rodas ou esteiras iguais diferentes graus de dificuldade. O nível de exigên- suas oportunidades de desenvolver experimentos
às de um trator, acionadas por motores alimenta- cia dessas provas (que incluem uma competição de em inteligência artificial, área em que já atua com
dos por baterias. Um pequeno computador robôs no encerramento do curso) acompanha a evo- projetos de iniciação científica e na qual pretende
acoplado a sua estrutura processa o programa lução das aulas e permite avaliar a compreensão e a permanecer como pesquisadora após a graduação.
operacional elaborado pelos alunos e, como um correta aplicação dos conteúdos teóricos de Com- “A atividade prática torna os conceitos de
“cérebro”, controla seus movimentos a partir de putação, Mecânica e Eletrônica proporcionados pela Robótica bastante palpáveis para os alunos, e enri-
informações fornecidas por sensores de toque e disciplina, conforme Luiz Gonçalves. quece a aprendizagem e construção do conheci-
de luz. mento”, argumenta João Vilhete Viegas d´Abreu,
Esses dispositivos – equivalentes à visão ou às Empolgação – A novidade oferecida pelo IC em- professor-assistente da disciplina. “É muito dife-
sensações táteis humanas – permitem aos autôma- polgou veteranos e calouros. Para Raphael Marcos rente do que apenas assistir ao funcionamento do
tos reconhecer o ambiente em que se encontram, Menderico, primeiranista de Engenharia de Com- robô em uma simulação abstrata na tela do com-
deslocar-se em diferentes direções e, com a ajuda putação, a disciplina lhe permitiu aprofundar seus putador”, observa.
do programa, decidir qual a melhor maneira de conhecimentos em programação de robôs – um as-

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