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SINOPSE

Antes mesmo de conhecer Donovan Decker, eu sabia o


tamanho de seu sapato.

Sabe, viajei por alguns dias, e na pressa de sair do


aeroporto, peguei a mala errada.

Depois de checar os calçados caros e as roupas sob


medida, disquei o número na etiqueta da bagagem, esperando
que talvez o Sr. Big Spender1 pudesse estar com minha mala.
Uma voz profunda e atraente respondeu e, por sorte, também
estava com a minha bagagem.

Donovan e eu nos encontramos em uma cafeteria para


fazer a troca. Acontece que não era só a sua voz que era sexy.
O homem que segurava minha bagagem era absolutamente
lindo, e tivemos uma faísca imediata.

Ele me fez admitir que tinha bisbilhotado em sua mala e


depois me convenceu a compensá-lo, deixando-o me pagar
um café. O café levou ao jantar, o jantar levou à sobremesa, e
a sobremesa levou a passar um fim de semana inteiro juntos.
Donovan não era apenas bonitão com uma voz de derrubar as
calcinhas. Era também engraçado, esperto e
surpreendentemente pé no chão para um homem que usava
sapatos de setecentos dólares.

Mencionei que também lavou a minha roupa enquanto eu


dormia?
Definitivamente, bom demais para ser verdade.

O que fiz então para retribuir sua gentileza?

Esperei até que estivesse no chuveiro, e fugi.

A minha vida era complicada demais para um cara tão


fantástico.

Os meses passaram, e eu pensava em Donovan com


frequência. New York contudo tinha oito milhões de pessoas,
então quais eram as chances de encontrá-lo? Por outro lado,
quais eram as chances de encontrá-lo um ano depois...
quando acabara de iniciar um namoro com o seu chefe?
CAPÍTULO 1

Autumn

Definitivamente estou ficando velha demais para isto.

Joguei uma pilha de correspondência no sofá e me sentei


ao lado. Era quase seis horas e não me importaria em ir para
a cama e encerrar o dia. Eu precisava de férias das minhas
miniférias de quatro dias. Graças a Deus tinha programado
um fim de semana para me recuperar. A minha viagem de
garotas/festa de despedida antecipada em Las Vegas para
minha amiga Anna – aquela em que todas nós íamos relaxar
na piscina e fazer tratamentos de spa – se transformou em
uma boate a noite toda e quase perdi meu voo para casa hoje
porque dormi demais. Definitivamente, fazia um tempo que
não bebia mais de duas taças de vinho no espaço de uma
semana, e estava sentindo minha idade avançada de vinte e
oito anos antes que o sol se pusesse nesta sexta-feira à noite.
Graças a Deus eu não precisava trabalhar amanhã.

Pensei brevemente em curar a ressaca com uma garrafa


de vodca enquanto zoneava na Netflix, mas então meu
telefone tocou, me fazendo voltar à realidade.

Ugh...
Papai apareceu na tela. Deveria ter acabado com isso e
falado com ele, mas não tinha energia. Permitir-me, no
entanto, evitar o estresse de falar com meu pai,
inevitavelmente me lembrou da outra coisa que precisava
fazer e que estive evitando a tarde toda. Lavar roupa. Uma das
minhas tarefas menos favoritas – principalmente porque
exigia que me sentasse no andar de baixo, na lavanderia suja
do porão do meu prédio. Até alguns meses atrás, colocava
minha roupa para lavar e voltava quarenta e cinco minutos
depois para fazer a troca para a secadora, mas essa prática foi
interrompida depois que uma das minhas remessas
desapareceu – uma carga inteira de sutiãs e roupas íntimas
molhadas. Quem diabos roubava roupas molhadas? Pelo
menos pegue algumas secas. Foi, no entanto, uma lição que
custou caro, e agora não saio do porão até que minhas roupas
tenham sido lavadas e secas.

Suspirando, relutantemente fui para o quarto, onde


minha mala ainda estava na cama, e abri o zíper. Tinha
embalado uma saia de linho por cima que acabei não usando,
e pensei em pendurá-la no banheiro e esperar que as rugas
saíssem por conta própria durante alguns banhos a vapor.
Odiava passar a ferro quase tanto quanto odiava lavar a
roupa lá embaixo, mas quando abri a mala, minha saia de
linho não estava por cima. A princípio achei que minha mala
devia ter sido selecionada para revista, e as coisas não tinham
sido colocadas em ordem... Embora o sapato ponta de asa2
que retirei da mala definitivamente não fosse meu.
Merda.

Vasculhei a mala em pânico.

Calça, roupas de corrida, camisa social masculina... Uma


sensação nauseante tomou conta de mim, e me esforcei para
olhar a etiqueta de bagagem. Eu nunca havia preenchido o
cartão de identificação por dentro, mas o couro tinha minhas
iniciais estampadas por fora.

Esta... não tinha iniciais.

Porcaria. Merda. Droga.

Peguei a bolsa errada da esteira de bagagem. Comecei a


suar. Toda a minha maquiagem estava naquela mala! Sem
mencionar o equivalente a uma semana de minhas melhores
roupas e sapatos. Eu precisava recuperá-la. Correndo para a
cozinha, peguei meu celular do carregador no balcão e
pesquisei no Google o número da companhia aérea. Após
passar por uma meia dúzia de avisos, cheguei a uma
gravação.

— Obrigado por ligar para a American Airlines. Devido ao


volume de chamadas sem precedentes, o tempo de espera
estimado é de aproximadamente quarenta e um minutos.

Quarenta e um minutos! Soltei uma lufada de ar. Ótimo.


Simplesmente ótimo.

Nesse ínterim, enquanto esperava em espera no viva-voz,


ouvindo música estática, percebi que, de quem quer que fosse
a bagagem, poderia muito bem estar com a minha. Ainda nem
havia verificado a etiqueta da mala para confirmar se, ao
contrário da minha, as informações de identificação estavam
preenchidas.

Corri de volta pelo corredor para o meu quarto.

Bingo!

Donovan Decker – um nome meio legal. Ele mora aqui na


cidade! Felizmente, Donovan também tinha seu número de
telefone listado. Não poderia ser tão fácil, não é mesmo? Tinha
minhas dúvidas, mas considerando que ainda tinha quarenta
minutos antes de poder falar com alguém da companhia
aérea, não perderia muito por tentar. Deslizei, então, para
encerrar minha ligação. Comecei a digitar os números na
etiqueta e então decidi colocar primeiro, *67 para tornar meu
número privado. Com a minha sorte, o cara não teria minha
bagagem, mas seria um completo esquisito.

Fui apanhada desprevenida quando a voz profunda de


um homem respondeu no primeiro toque. Eu ainda não tinha
pensado no que diria.

— Ohhh. Oi. Meu nome é Autumn, e acho que posso


estar com sua bagagem.

— Isso foi rápido. Desliguei com vocês há dois minutos.

Ele deve estar achando que estou ligando da companhia


aérea. — Oh, não. Eu não trabalho para a companhia aérea.
Viajei para casa esta manhã e devo ter pegado a mala errada
no JFK3.

— Quais são suas iniciais?

— Minhas iniciais?

— Sim, sabe, a primeira letra do seu primeiro nome e a


primeira letra do seu sobrenome.

Revirei meus olhos. — Eu sei o que são iniciais. Só não


entendo por que você perguntaria... Oh! Isso significa que está
com a minha mala? Tenho minhas iniciais gravadas na
etiqueta de bagagem.

— Isso depende de quais são suas iniciais, Autumn. A


primeira letra corresponde.

— Minhas iniciais são AW.

— Bem, então parece que você é de fato a ladra que


pegou minha bagagem.

Claro, eu não tinha conferido minha etiqueta de


bagagem, mas me ofendeu que ele me chamasse de ladra. —
Não seríamos ambos ladrões? Já que você está de posse da
minha mala?

— Só peguei a sua porque foi a última que sobrou


girando na esteira. Veja, ao contrário de você, eu verifiquei a
etiqueta de bagagem a primeira vez que passou, e quando vi
que não era minha, deixei para o legítimo proprietário a
reivindicação, mas a fila no atendimento ao cliente de
bagagens era de vinte e cinco metros e eu tinha uma reunião
para a qual já estava atrasado. Então peguei a que tinha
como refém até que a companhia aérea pudesse resolver isso.

Os meus ombros caíram. — Oh. Desculpe.

— Está bem. Você está aqui na cidade?

— Estou. Poderíamos nos encontrar para trocar as


malas?

— Certo. Quando e onde? Estou fora agora, mas estarei


de volta em uma ou duas horas.

A etiqueta tinha um endereço no Upper East Side, mas


eu morava no West Side, bem no centro da cidade. —
Podemos nos encontrar no Starbucks na 80th com a Lex? —
Era mais próximo dele, mas pelo menos, eu só teria que
arrastar a mala em um metrô.

— Não consigo pensar em nenhuma desculpa para não


fazê-lo. Que horas?

Essa era uma maneira estranha de dizer sim, e a


maneira como enfatizou a palavra desculpa parecia estranha,
mas ei, eu pegaria minha mala de volta. E daí se ele se
tornasse um pouco estranho? Pelo menos tinha escondido
meu número de telefone e estávamos nos encontrando em um
lugar público.

— Que tal oito?


— Vejo você então.

Parecia que ele estava prestes a desligar. — Espere... —


disse. — Como saberei que é você?

— Serei o único a segurar a sua mala, Autumn W.

Rio. — Oh, sim. Desculpe... longa semana em Vegas.

Abaixei-me e levantei o sapato de cima da bolsa.


Ferragamo4. Caro, e grande também. Uma olhada rápida
revelou que era um tamanho quarenta e cinco. A adolescente
interior em mim não podia deixar de pensar em pés grandes,
grande... Além disso, o cara tinha uma voz profunda e sexy.
Definitivamente exploraria mais a bagagem do cara depois
que desligássemos.

— Encontramo-nos às oito — disse.

— Vejo você então. — Estava prestes a desligar meu


telefone quando algo me atingiu. Oh Deus! — Alô? Espere...
ainda está aí?

Demorou um ou dois batimentos cardíacos, mas a voz


sexy voltou à linha. — O que está acontecendo?

— Ummm... Você... abriu minha mala?

— Abri o zíper no aeroporto para ter certeza de que não


era minha quando notei as iniciais das etiquetas de bagagem.

— Você... viu alguma coisa?


— Havia um fio dental rosa em cima, então isso
praticamente selou o acordo de que não me pertencia, mas
não vasculhei, se é isso que está perguntando.

Esqueci que enfiei aquele fio dental no último minuto.


Estava no fundo de uma gaveta quando verifiquei o quarto do
hotel uma última vez ao sair, mas o preferia vendo minha
calcinha em vez das outras coisas dentro da minha mala.
Soltei um suspiro de alívio. — Ok, isso é ótimo. Obrigada.
Vejo você às oito no Starbucks.

— Uau. Espere um segundo – não tão rápido. Você


parecia muito nervosa por eu talvez ter mexido na sua mala.
Está escondendo algo sinistro lá dentro? Não andarei por aí
com uma mala cheia de drogas ou algo assim, vou?

Abri um sorriso. — Não, definitivamente não. Eu só...


preferia que não mexesse nela.

— Você vasculhou a minha?

Olhei para o sapato em minha mão. Tirar um mísero


pedaço de sapato não seria considerado vasculhar, certo?
Nah. — Não, não vasculhei.

— Está planejando fazê-lo? — Perguntou.

Eu não tinha ideia de como o homem era, mas podia


dizer por sua voz que estava sorrindo agora.

— Não — menti.
— Bem. Então temos um acordo. Não mexerei na sua
mala e você não mexerá na minha.

— OK. Obrigada.

— Tenho sua palavra, Autumn W? Posso ter algumas


coisas que prefiro que não veja aí.

— Como o quê?

Ele deu uma risadinha. — Vejo você às oito.

Depois que desligamos, joguei o sapato de volta na mala


e me curvei para fechá-la, mas quando alcancei o zíper,
minha curiosidade levou a melhor de mim. Ele estava apenas
brincando comigo, ou realmente tinha algo aqui que não
queria que eu visse? Claro, eu sabia o que tinha na minha, o
que me deixou ainda mais curiosa.

Balancei minha cabeça e comecei a fechar o zíper; na


metade do caminho, rio alto. Quem estava enganando? Agora
que não tinha roupa para lavar, tinha quase duas horas
inteiras para matar antes de conhecer o Sr. Pé Grande. Esta
mala me provocaria o tempo todo. Eu certamente cederia
eventualmente, então por que não me livrar dessa miséria e
dar uma pequena olhada no conteúdo agora? Eu seria então
capaz de relaxar. Ele nunca saberia que não cumpri minha
parte no trato. Sem mencionar que, pelo que eu sabia, estava
até o cotovelo enfiado em minha mala agora. Nesse caso, seria
justo que remexesse na dele, certo?
Mordisquei meu lábio por alguns segundos quando uma
onda de culpa tomou conta de mim, mas rapidamente forcei
isso para fora da minha mente. Claro que estou certa.

Sentindo-me justificada agora, abri o zíper da mala e


levei um minuto para notar mentalmente como tudo estava
arrumado: uma camisa branca estava dobrada em cima e dois
sapatos foram colocados de ambos os lados, as solas voltadas
para cima. Eu os tirei da mala cuidadosamente e os coloquei
na cama na mesma ordem. A próxima camada tinha mais
roupas dobradas: duas camisas sociais caras, um par de
moletom, cuecas boxer e algumas camisetas, uma das quais
tinha algo estampado na frente – letras familiares que
começavam HA – então desdobrei para ver o que dizia.
Harvard Law5.

Eca. Um desses. Não me admira que pudesse comprar


sapatos Ferragamo.

Embaixo da pilha de roupas havia um saco de roupa


branca – o tipo que um lhe hotel oferece para colocar a sua
roupa lavada a seco, mas a maioria das pessoas o usa para
separar as roupas sujas. Sem nenhum desejo de separar as
meias fedorentas, comecei a dobrar as roupas de volta na
mala, sentindo uma pontada de decepção, mas quando alisei
as camadas da pilha, senti algo irregular e duro por baixo do
saco plástico de roupa suja. Tirei então as roupas e olhei
dentro, na esperança de encontrar... Não tenho certeza do
quê. Embora o que encontrei definitivamente não fosse o que
eu esperava.
A sacola estava cheia com pelo menos vinte ou trinta
daqueles frascos de xampu que os hotéis distribuem. A
verdade, uma inspeção mais detalhada revelou que alguns
eram condicionadores e outros hidratantes. Enterrados bem
no fundo também estavam três pequenos kits de costura e
meia dúzia de escovas de dente embrulhadas em plástico – o
tipo que se consegue na recepção de um hotel quando
esquece a sua.

O que diabos o Sr. Pé Grande fez? Roubou um carrinho


de limpeza? Este tipo de coisa, embora em menor quantidade,
é o que se normalmente encontra na minha mala, já que
estava falida o tempo todo, mas não era o tipo de coisa que se
esperaria na mala de um homem que tinha ido para Harvard
e calçava sapatos sociais de setecentos dólares.

Estava agora ainda mais curiosa para conhecer Donovan


Decker.

♥♥♥

Cheguei ao Starbucks quase vinte minutos mais cedo,


então entrei na internet enquanto aguardava para me
presentear com um leite de amêndoa com mel. Até mesmo o
pedi-lo me deixou salivando, pensando na bebida doce e
cremosa. Café caro era minha indulgência, mas não acontecia
com muita frequência com o preço de cinco dólares e meu
orçamento reduzido.

Fiquei parada no final do balcão, esperando minha


bebida e rolando no meu telefone sem pensar, quando um
homem entrando pela porta da frente chamou minha atenção.

Oh, uau.

Bem, aquele era um homem bonito. Descrevê-lo apenas


como alto, moreno e bonito não funcionava, nem por um
centímetro. O cabelo preto emoldurava um rosto magnífico
com uma estrutura óssea esculpida e masculina, e nariz
romano6. Não fui a única a notar. Observei quando o Adônis7
deu um passo para trás para manter a porta aberta para uma
mulher sair da loja, e a pobre senhora teve um vislumbre dele
e literalmente tropeçou nos próprios pés.

Aparentemente alheio ao fato de ter causado o incidente,


estendeu a mão para ajudá-la a se levantar, deu um sorriso
matador e entrou. Os seus olhos azuis brilhantes
examinaram o ambiente, parando bem nos meus olhos
cobiçosos. Constrangida por ter sido pega, rapidamente
desviei minha atenção de volta para o meu telefone. Alguns
segundos depois, ainda fingia estar encantada com a minha
tela quando passos pararam a minha frente. Olhei para cima
e pisquei algumas vezes. O cara da porta deu um sorriso
torto.

— Você foi capaz de se controlar?


A minha testa enrugou. — Desculpe?

Os seus olhos dançaram de alegria e sua voz baixou. —


Aposto que não conseguiu.

Encarei-o por um momento estranho antes de finalmente


balançar minha cabeça. — Do que diabos está falando?

As sobrancelhas do homem franziram. — Fizemos um


acordo, lembra? Eu não mexeria na sua, se você não tocasse
na minha?

Tinha visto o homem entrando, fiquei bem a sua frente,


olhando fixamente por pelo menos um minuto, e demorei até
agora para perceber que ele tinha algo em sua mão.

— Oh, meu Deus. Você tem minha mala!

Ele riu, mas ainda parecia perplexo. — Pensou que


estava falando do quê?

— Eu... não sei. Estava completamente confusa.

— Achei que tivesse me visto entrar.

E vi, mas não tinha conseguido superar seu rosto. — Não,


não tinha notado. Desculpe. Acho que estava apenas voando.

O barista atrás do balcão gritou meu nome. Fiquei feliz


por ter uma desculpa para colocar alguma distância entre
esse cara e eu. Precisava de um momento para me recompor.
Embora quando voltei, ainda me sentia um pouco
desorientada.
— Obrigada por me encontrar para trocar as malas —
disse. — Sinto muito por ter pegado a errada.

— Sem problemas.

Empurrei sua mala para frente e soltei a alça, mas o


Adônis não fez o mesmo. A verdade, puxou a minha para
mais perto de si.

— Antes de trocarmos... — inclinou a cabeça e estudou


meu rosto. — Estou curioso para saber se você manteve sua
palavra.

Imitei sua pose e inclinei minha cabeça. — E se eu disser


que não?

— Bem, então teria que pagar uma multa por violar os


termos do nosso acordo.

Levantei uma sobrancelha, intrigada. — Uma multa?

Ele assentiu. — Isso mesmo. Há uma multa.

Rio enquanto levanto o meu café para um gole. — Acabei


de voltar de uma semana de garotas em Las Vegas. Tenho
certeza de que esta bebida superfaturada acabou de esgotar
os últimos cinco dólares em minha conta bancária.

— Eu não estava me referindo a uma penalidade


monetária.

— Que tipo de penalidade, então?


Ele acariciou a barba por fazer no queixo por um
momento. — Você teria que tomar um café comigo.

Será que este cara realmente achava que isso seria uma
penalidade? Debati como responder. Se dissesse a verdade,
seria embaraçoso. Quero dizer, verifiquei os pertences
pessoais do homem. Por outro lado, poderia conhecê-lo mais
durante o café. Então, novamente, concordaria em passar um
tempo com um completo estranho. Embora... sempre que
encontrava um cara on-line, geralmente o encontrava em uma
cafeteria, e provavelmente sabia mais sobre esse cara depois
de mexer em sua mala do que em um bate-papo on-line. Sem
mencionar que nenhum dos meus encontros on-line se
parecia com Donovan Decker ultimamente. A verdade, há
algum tempo ninguém foi além do que o café.

Adônis estava observando meu rosto enquanto eu


debatia minha resposta. O seu sorriso me fez pensar que ele
já sabia que eu tinha verificado sua mala. Então, que diabos?

Levantei-me e encontrei seu olhar. — A senhora da


limpeza foi ferida no roubo?

Os seus olhos se estreitaram por um segundo, mas então


um sorriso gigante se espalhou por seu rosto. Estendeu a
mão em direção à área de estar. — Depois de você, Autumn
W.
CAPÍTULO 2

Donovan

Quase 10 meses depois

— Isto é ridículo. Eles revistaram minha casa – viraram


de cabeça para baixo e nem mesmo limparam antes de sair, e
levaram meus pertences com eles. O que está fazendo a
respeito?

— Eu avisei que achava que isso era iminente — disse.


— Você fez o que eu instruí na semana passada?

— Sim.

A pálpebra direita do meu cliente estremeceu. Este filho


da puta nunca seria capaz de testemunhar. Eu o tinha
encontrado três vezes antes de hoje, pela soma total de talvez
seis horas, e já sabia que sua pálpebra direita tinha um tique
quando mentia. Sem mencionar que estava a cerca de trinta
segundos de tirar um lenço sujo do bolso e enxugar o suor
que escorria de sua testa vermelha.

Suspirei e olhei para a mulher sentada ao seu lado. Ela


sorriu com um brilho nos olhos. Que piada. Aposto que
poderia dizer à noiva de vinte e cinco anos de Warren Alfred
Bentley que precisava discutir minha estratégia com ela em
particular e dobrá-la sobre minha mesa. Não que tivesse
interesse nessa merda. As garimpeiras definitivamente não
eram minha praia.

— Warren... — Olhei para o gerente financeiro mimado


de sessenta anos de idade e sua princesa de cabelo platinado
mais uma vez e acenei com a cabeça em direção à porta. —
Talvez você e eu devêssemos conversar em particular.

— Qualquer coisa que você tenha a me dizer, pode dizê-


lo na frente de Ginger.

— A verdade, não é exatamente assim que funciona.


Ginger não é sua esposa, e...

Ele me interrompeu. — Ela é minha noiva. Qual é a


diferença?

Ele, pelo menos assistia Law & Order8, pelo amor de


Deus? — Uma noiva pode ser obrigada a testemunhar; uma
esposa não pode.

Ele balançou sua cabeça. — Ginger nunca faria isso.

Claro que ela não faria. O promotor levaria dez minutos


ameaçando acusá-la como cúmplice antes que passasse por
sua velha bunda flácida, mas eu tinha que jogar junto com o
jogo – pelo menos na frente dessa mulher.

— Tenho certeza que ela não faria, mas o privilégio


advogado-cliente não apenas protege você, mas também
Ginger. Quer ter a certeza de que o promotor não poderá
farejar a futura Sra. Bentley, não é?

— Claro.

— Então por que não peço à minha assistente que faça


um cappuccino para a Ginger da nova máquina que acabamos
de colocar na sala de espera. Todo mundo está delirando
sobre isso. — Pelo preço idiota de 20 mil dólares que ouvi dizer
que pagaram por uma máquina que faz café com um pouco de
leite com espuma, é melhor que dê uma xícara decente de Joe9.

Warren olhou para Ginger, que assentiu, e resmungou —


Tudo bem.

— Só vou demorar um minuto. — Levantei-me e


caminhei ao redor da minha mesa, estendendo minha mão
para Ginger ir à minha frente. — Por aqui.

A minha assistente não estava em sua mesa, então


mostrei para a noiva troféu a sala e prometi enviar Amelia
assim que voltasse. Quando me virei, Ginger agarrou meu
cotovelo. Ela colocou os braços em volta do meu pescoço e se
moveu para um abraço antes que eu pudesse impedi-la.

— Muito obrigada, Sr. Decker. Estou tão preocupada


com Warren.

Os seus seios duros pressionados contra meu peito.


Devem ser uma nova compra e não tiveram tempo de
amolecer.
Educadamente me desvencilhei e recuei. — Não precisa
agradecer. Só estou fazendo o que me pagam para fazer.

De volta ao meu escritório, achei que era hora de cair na


real com meu cliente. Tirei meu paletó e o joguei na cadeira
de convidados ao lado de Warren antes de me sentar
novamente a minha mesa e arregaçar as mangas da camisa –
algo que raramente fazia porque expunha mais tatuagem em
meus antebraços do que a maioria dos meus clientes ricos e
populares se sentiam à vontade.

— Então... Sr. Bentley. Ainda não nos conhecemos muito


bem, mas há duas coisas que deve saber sobre mim. Primeiro,
quando me pede conselhos, vai tê-los. Frequentemente, isso
significa que você não gostará do que tenho a dizer, mas não
sou pago para dizer o que quer ouvir. Não sou seu amigo nem
seu lacaio. Sou seu advogado – e o melhor que encontrará. Já
que está sentado do outro lado da minha mesa e não em
outro lugar, presumo que já saiba disso porque perguntou por
aí. Portanto, não me faça perguntas e espere uma resposta
amigável. Você me paga por hora. Logo, não perderei o seu
tempo inflando seu ego. Receberá a resposta que precisa –
mas, como disse, nem sempre será a resposta que deseja.

Respirei fundo. Pude ver que ele estava prestes a me


interromper, então levantei minha mão. — Por favor, com
licença, mas continuarei aqui, para que possamos entrar na
mesma página. A segunda coisa que precisa saber sobre mim
é que sou muito bom em ler as pessoas. A verdade, esse é o
maior motivo pelo qual consigo cobrar mil e duzentos dólares
por hora. Frequentemente, esta habilidade que tenho
funciona a seu favor. Sei quando um promotor está blefando e
quando um júri está ou não trabalhando a meu favor e se
está na hora de fazer um acordo, Mas muitas vezes, essa
mesma habilidade pode ser uma desvantagem para você –
porque eu também normalmente saberei quando está
mentindo, e não trabalharei com um cliente que não me diga
a verdade. Se não posso confiar em você, como espera que eu
faça um júri confiar? Então se eu pegá-lo mentindo para mim
com frequência, vou demiti-lo como cliente.

O rosto de Warren ficou vermelho. — Agora espere um


minuto. Quero que você saiba...

Eu o cortei. — Sei que você é membro do mesmo country


club de um dos sócios seniores. Esta não é a primeira vez que
tenho um cliente que pertence ao mesmo círculo social que os
membros desta empresa, e também não seria a primeira vez
que despedi um cliente que tem esse tipo de conexão. Sim,
Dale ou Rupert ficarão descontentes comigo, mas no final do
dia, ganho milhões por ano, e você não. Então eles superarão
isso. Você, por outro lado, não vai. Porque o caso do governo
contra você é quase hermético, e quando tiver que ir para a
rua para outra firma e outro advogado, estará cumprindo
vinte e cinco anos, porque eu sou a única chance que tem de
vencer isto, Sr. Bentley. Alguns podem me chamar de
arrogante por dizer isto, mas realmente não dou a mínima.
Porque embora eu possa ser... também é a mais pura
verdade.
Recostei-me a cadeira e tive uma pequena competição de
encarar com o Sr. Bentley. Estava puto – tenho certeza de que
já faz décadas que alguém falou com ele dessa maneira. E,
neste momento, estava atualmente pensando em me despedir,
mas no final, as pessoas que se encontram sentadas do outro
lado da minha mesa, as pessoas que se envolvem em
esquemas complicados e tortuosos que os colocam em maus
lençóis? Eles não são burros. São inteligentes. Muito mesmo,
e amam sua liberdade. Portanto, a maioria já fez o dever de
casa antes de colocar um pé a minha porta, e sabem que sou
sua melhor chance de manter essa liberdade.

A partir daqui, agora que fiz meu pequeno discurso,


jogaríamos um jogo de galinha. O primeiro homem a falar
perderia.

Três ou quatro minutos se passaram – o que é um longo


tempo para sentar e olhar para um homem em silêncio – mas,
eventualmente Warren cedeu.

Ele se inclinou para frente e apoiou as mãos nos joelhos.


— Tudo bem. Qual é o nosso próximo passo?

Passei os próximos quarenta e cinco minutos repassando


a estratégia. Ele não ficou feliz quando disse que
provavelmente não seria capaz de pagar a fiança depois que
os federais congelassem seus bens, mas ainda estávamos no
início do jogo, por isso estava, pelo menos parcialmente, em
negação – pensando que seus amigos e sócios de negócios
viriam em seu socorro.
Talvez aparecessem para pagar a fiança de cinquenta
mil, mas a sua custaria sete dígitos.

Quando terminamos e tínhamos um plano de ação, meu


cliente respirou fundo.

— Quanto tempo tenho antes de me prenderem?

— Um dia – dois, no máximo.

— O que faço até lá?

Segurei seus olhos. — Tem certeza que quer meu


conselho sobre isso?

Ele franziu a testa, mas acenou com a cabeça.

— Vá para casa, Sr. Bentley. Chame um chef particular


para fazer sua refeição favorita e depois foda sua noiva
gostosa. Porque seus bens estarão congelados pela manhã, e
quando acontecer? Ela usará aquela pedra no dedo para
pagar uma passagem de primeira classe de volta para o lugar
de onde veio.

♥♥♥

— Posso ver sua identificação, por favor?

Inclinei-me a minha cadeira e sorri para meu amigo do


outro lado da mesa.
— Foda-se — Trent resmungou enquanto tirava a licença
da carteira. Ele nem mesmo olhou para cima para ver meu
rosto, mas sabia que eu estava curtindo o momento.

A garçonete leu sua identidade e a devolveu. Esta rotina


era uma ocorrência bastante frequente. Trent Fuller tinha
trinta anos, mas não parecia ter mais de dezoito. Eu nunca o
tinha visto com pelos faciais, e nós tínhamos ido a festas de
despedida de solteiro que duraram quatro dias em New
Orleans.

Sorrio para a nossa garçonete. — Ele está chegando


tarde à puberdade. Quer ver a minha?

— Tudo bem. Você parece ter mais de vinte e um.

— Você tem certeza? Nem mesmo para dar uma olhada


no meu endereço, caso esteja na vizinhança?

A garçonete corou. Estava brincando, apesar de ela ser


bonita, embora um pouco jovem para mim.

— Volto com suas bebidas em um minuto.

Trent pegou um breadstick10 do meio da mesa e o


mastigou.

— Quem era a loira gostosa que vi sair com o pai na


recepção esta tarde?

— O velho é seu noivo, não seu pai. Se contudo você


estiver interessado, tenho certeza que ela estará no mercado
para outro otário em breve. O meu cliente está prestes a
perder um monte de bens que o tornam tão bonito.

— Droga. Nunca pegamos mulheres com essa aparência


no setor de propriedade intelectual11.

— Se quiser correr com cachorros grandes, precisa


aprender a fazer xixi na grama alta.

O rosto de Trent se enrugou. — O que diabos isso


significa?

Rio. — Não faço ideia. Como foram as coisas com a


mulher que você não conseguiu assustar algumas semanas
atrás?

O meu amigo e eu saíamos para um happy hour ou


jantar uma ou duas vezes por mês. Nós dois trabalhamos
oitenta horas por semana na empresa, então o tempo livre
não era algo que tínhamos aos montes.

Trent franziu a testa. — Eu a levei para jantar em um


restaurante muito bom. Deixei-lhe uma mensagem no dia
seguinte para dizer que me diverti e ela não responde às
minhas ligações.

— Você a entreteve durante a refeição com sua conversa


fascinante de sempre sobre direitos autorais e patentes?

— Vá se foder.
Rio. Estava brincando, é claro. Trent era realmente um
cara muito engraçado. Ele era espirituoso e inteligente. Foi
totalmente perda dela, mas nunca admitiria isso para ele.

— Você? — Disse. — Como foram as coisas com a


morena que conheceu? Ela parecia muito legal.

— Era. Falhou no teste dois.

Ele balançou sua cabeça. — Você e seus testes ridículos.


Quando foi a última vez que alguém passou do dois?

A garçonete veio e entregou o vinho de Trent e minha


cerveja antes de desaparecer novamente. Eu sabia
exatamente a última vez que uma mulher havia passado pelos
meus chamados testes ridículos. Embora não precisasse
mencionar que já fazia um tempo, apenas para ajudar a
provar o ponto de vista do meu amigo.

Ele cutucou. — Sério, quanto tempo?

— Não sei...

— Você sabe muito bem. Se lembra de coisas que ouviu


no útero, Decker. — Ele balançou sua cabeça. — Foi a mulher
da bagagem, não foi? A ruiva com quem passou o fim de
semana que fez o ato de desaparecer na segunda-feira de
manhã. Qual era mesmo o nome dela? Summer?

Eu dei um longo gole na minha cerveja. — Autumn.

Fazia dez meses desde que entrei naquele café para


trocar as bagagens, e três dias menos que isso desde a última
vez que a vi. Tínhamos nos encontrado para trocar bagagens e
acabamos sentados no Starbucks até fechar. Depois, saímos
para jantar e voltamos para minha casa mais tarde, quando
fechamos o restaurante. Autumn W. Eu até perdi um dia de
trabalho depois que ela me largou, a primeira vez que fiz isso
desde que comecei em Kravitz, Polk e Hastings, sete anos
atrás.

Nós mal dormimos o fim de semana inteiro, embora não


tivéssemos feito sexo de verdade. Outra novidade para mim –
passar três noites com uma mulher com quem não estava
transando. Nunca, no entanto, em minha vida havia me
sentido tão ansioso por conhecer alguém, e pensei que o
sentimento era mútuo. Razão pela qual fiquei chocado como a
merda quando saí do chuveiro na segunda de manhã e
encontrei um apartamento vazio. Sem bilhete. Nenhum
número. Nem tinha conseguido seu sobrenome. A única coisa
que eu tinha era um pedaço de papel dobrado, uma lista
estranha que me esqueci de colocar na sua bagagem quando
a vasculhei. Ainda o tinha dobrado na minha carteira neste
exato momento. Mais uma coisa que não mencionaria a Trent.

— Você sabe por que não conseguiu encontrar nada de


errado com aquela, certo? — Trent deu um gole em seu vinho.
— Porque ela te dispensou. Se não tivesse feito isso, você teria
encontrado algum teste para ela falhar. Talvez o que precise
fazer seja adicionar não me ignorar à sua lista de testes.
Dessa forma, não estará ansiando por uma mulher que fugiu
de você. O que aconteceu com aquela que conheceu no
McGuire's na semana passada, afinal?

— Saímos para jantar na noite seguinte... sem bandeiras


vermelhas. Então perguntei se gostava de hóquei. Ela disse
que era uma grande fã e veio assistir ao jogo no dia seguinte.
Brincou com o seu telefone durante todo o primeiro período.
Ela nem sabia quantos quarters12 havia no jogo.

— Sabe, acha que é um problema que ela tenha


distorcido um pouco a verdade, mas acho que lhe dizer que
gostava de hóquei foi uma coisa boa. Mostra que está
disposta a se comprometer e ficar sentada enquanto você
assiste a um jogo só para passar algum tempo contigo. Ela
tem que adorar esportes e assistir a cada minuto?

— Não, de forma alguma, mas quando lhe perguntei se


gostava de hóquei, sua resposta foi: "Eu amo. Assisto o tempo
todo". Isso é um problema de coerência. Se o que diz e o que
ela faz são inconsistentes desde o começo, isso é uma
bandeira vermelha. — Engoli minha cerveja. — Além disso, no
dia seguinte, me enviou uma foto de seus seios.

Trent balançou a cabeça. — Só você contaria isso como


um golpe contra uma mulher.

Nada de selfies nudes por pelo menos um mês. Mesmo se


eu pedir por elas. Agora, percebo que pedir algo e depois
acusar uma mulher que me dá pode me tornar um idiota,
mas é o que é.
Balancei minha cabeça. — Gosto de selfies nuas tanto
quanto qualquer cara, mas se uma mulher está lhe enviando
uma quando a conhece há menos de uma semana, isso é uma
grande bandeira vermelha.

— Tanto faz. Aceitarei uma selfie nua sempre que uma


mulher quiser mandá-la.

Sorrio. — O problema com isso é que as únicas mulheres


que você atrai são aquelas que parecem da sua idade, então é
considerado pornografia infantil.

— Idiota.

Como de costume, nossa conversa mudou de nossa


patética vida social para o esporte antes de eventualmente
pousar de volta a firma. Poderíamos falar merda sobre esse
lugar por dias, mas ultimamente nosso foco tinha se
concentrado em saber se eu me tornaria sócio.

— Então, como vai a contagem dos votos? — Perguntou


Trent.

Eu estava enfrentando uma concorrência acirrada. Uma


vez a cada cinco anos, nossa firma abria as portas da
sociedade para dois de seus colaboradores com melhor
desempenho. O tempo médio no caminho da parceria era de
dez a doze anos. Estava com Kravitz, Polk e Hastings há
quase sete anos, quando o velho Kravitz me disse que eu
estava pronto para ser cogitado há alguns meses. Se eu
ganhasse a disputa neste ano, seria a pessoa mais jovem a
ser sócio na história da firma – algo que realmente queria. Ser
o primeiro a quebrar esse recorde significava mais para mim
do que o dinheiro extra que estaria ganhando. Já não tinha
tempo suficiente para gastar todo o dinheiro que ganhei.

— Acho que só preciso de Rotterdam e Dickson para


obter os dois terços de que preciso.

— O Dick deve ser fácil de ensacar. Ele está no seu setor.

— Eu sei, mas ele não apresentou sua bunda nua para


eu beijar recentemente. Também acabei de descobrir que se
ele votar em mim e eu me tornar sócio, quebrarei o seu
recorde. Ele se tornou sócio em oito anos.

— Merda. Bem, é melhor você torcer para que o ego dele


seja menor do que o seu, então.

— Não me lembre.

Eram quase onze horas quando saímos do restaurante.


O meu telefone tocou, na saída. Olhei para o identificador de
chamadas e balancei a cabeça. — Falando no diabo.

— Quem é?

— O Dick.

— É muito tarde para ele ligar, não é?

— Sim, sem brincadeira. Acho que a bajulação não dá


um tempo. — Deslizei a tela para responder. — Donovan
Decker.
— Decker. Preciso de um favor.

— Claro. O que foi, chefe? — Bombeei meu punho


fechado para cima e para baixo no movimento universal de
“bater uma” enquanto Trent olhava em minha direção.

— Preciso que pegue outro caso pro Bono13.

Foda-se. Eu já tinha feito minha cota anual. O que eu


precisava era cobrar cada última hora que pudesse antes da
votação dos sócios, não gastar horas em um caso não
faturável. Ainda assim... precisava de Dickson, então engoli.
— Sem problemas. Envie-me o arquivo e darei uma olhada
nele manhã cedo.

— Preciso que você entre nisso agora.

— Agora?

— Você pode ir à septuagésima quinta delegacia?

Este era o último lugar que eu queria ir a qualquer hora


do dia. Fiz uma careta, mas respondi: — Sim, claro.

— O nome do garoto é Storm. Ele é menor de idade.

— Primeiro ou último nome?

— Certeza que é o seu sobrenome. Ele atende por Storm,


então não tenho certeza de qual é seu primeiro nome. A
assistente social está a caminho e encontrará você lá.

— Ok. Sem problemas.


— Obrigado, Decker. Eu lhe devo uma.

Desliguei meu telefone. É melhor o filho da puta se


lembrar disso em dois meses.

♥♥♥

Eu não colocava os pés neste lugar há mais de treze


anos, mas no minuto em que entrei, reconheci o cheiro
familiar. Tentando ignorar a memória, fui direto para o
sargento da recepção.

— Como vai? Você tem um garoto chamado Storm aqui?


Não tenho certeza se é seu sobrenome ou primeiro nome.

— Quem está perguntando?

— Sou o seu advogado.

O velhote me olhou de cima a baixo. — Acho que isto é


pro Bono de alguma firma chique.

— Bom palpite. Presumo que ele esteja aqui?

O policial pegou o telefone e discou alguns números. —


Tenho aqui um menino bonito para Storm. Parece mais caro
por hora do que o idiota do advogado de divórcio da minha ex-
mulher, por isso...sem pressa.
A polícia não era exatamente fã de advogados de defesa.
Balancei minha cabeça. — Você deveria tentar um hobby
mais original. Ser miserável com todos os advogados é muito
clichê, mas independentemente disso, não precisaria lembrá-
lo de que todos os interrogatórios param agora. E suponho
que tenha feito a tentativa de boa-fé necessária para contatar
os pais ou responsáveis do garoto antes de lhe perguntar
qualquer coisa.

— Tem certeza de que não é parente do garoto? Você tem


a mesma disposição para vencer. — Ele apontou para o outro
lado da sala e voltou a olhar para o computador. — Fique à
vontade no belo banco de madeira. Eu o chamarei assim que
ele chegar.

Suspirei, mas sabia que discutir em uma delegacia de


polícia geralmente era inútil. Então, fiz o que mandou e
preguei a minha bunda no banco. Estava concentrado em
responder e-mails, meia hora depois, quando ouço a porta da
estação abrir e fechar. Não me preocupei em erguer os olhos
até ouvir o sargento dizer Augustus Storm. Ele estava falando
ao telefone novamente, enquanto uma mulher estava à sua
frente na mesa.

Augustus, hein? Sorrio. Não admira que o garoto tenha


ficado com Storm. Já era difícil ganhar respeito neste bairro
sem estar sobrecarregado com um nome como Augustus.
Endireitei minha gravata e me levantei, com a intenção de me
aproximar da mulher que presumi ser a assistente social do
garoto, mas uma olhada em seu perfil e meu passo vacilou.
Eu congelei. O lado de seu rosto parecia terrivelmente
familiar...

Enquanto olhava, ela falou novamente com o sargento da


recepção, então me inclinei e prestei muita atenção.

Aquela voz.

Eu conhecia aquele som doce e suave – o tipo que


poderia dizer a uma pessoa para se foder sem ela nem mesmo
saber disso.

Só quando o sargento apontou em minha direção porém,


e a mulher se virou, que eu percebi que esta mulher me disse
para ir me foder, não com palavras, mas com suas ações. Os
nossos olhos se encontraram e sorrio, embora o sentimento
não fosse correspondido; em vez disso, os olhos da mulher se
arregalaram quando me aproximei.

— Olá, Autumn.
CAPÍTULO 3

Autumn

Oh, droga.

O sargento da recepção, completamente alheio às nossas


reações, acenou com a mão na direção de Donovan. — O
advogado do garoto está ali.

— Umm... sim. Obrigada.

Dei alguns passos hesitantes. Senhor, ele era ainda mais


bonito do que me lembrava. Uau. Apenas... Uau.

Os seus olhos eram de uma cor cinza-azulada única para


começar, mas o brilho que emanava deles tornava quase
impossível desviar o olhar.

Limpei minha garganta. — Olá.

Ele estendeu a mão. — Pela expressão em seu rosto,


presumo que também não esperava me ver.

Balancei minha cabeça. — Definitivamente não.

A sua mão ainda estava estendida e apontou os olhos


para baixo. — Está limpa, juro. Lavei-as no banheiro
masculino há pouco tempo.
Senti-me uma tola evitando contato, então coloquei
minha mão na dele. Como da primeira vez, acendeu uma
faísca. A minha pulsação disparou e arrepios subiram pelo
meu braço, por cima do ombro e direto para a nuca, fazendo
todos os cabelinhos se arrepiarem. Exceto que agora era
ainda pior do que da primeira vez, porque eu sabia o que era
ter aquelas mãos por todo o meu corpo – a melhor química
sexual da minha vida, de lavada, e nunca fizemos sexo de
verdade.

Era quase meia-noite e Donovan parecia que ainda não


tinha trocado de roupa após um longo dia de trabalho, o que
significava que provavelmente não tinha borrifado colônia
desde esta manhã, mas ainda cheirava pecaminosamente
bem. Ele segurou minha mão por mais tempo do que um
aperto de mão de mão aceitável, e seus olhos permaneceram
fixos no meu rosto. O ar ao nosso redor parecia estalar com a
mesma eletricidade da primeira vez que nos encontramos, e
eu tive que desviar o olhar para me refrescar, mas desviar
meus olhos para nossas mãos unidas só me fez notar as
iniciais bordadas em sua camisa preta e o relógio de
aparência cara enrolado em um pulso muito masculino. Esta
era definitivamente uma situação sem saída.

Retirei minha mão e a coloquei em segurança no bolso.


— Você está aqui por causa do Storm?

Ele assentiu. — Estou, na verdade.


— Então isso significa que trabalha para Kravitz, Polk e
Hastings?

— Correto novamente.

Murmurei baixinho, pelo menos pretendia mantê-lo


baixinho. — Eu não fazia ideia.

Ele inclinou a cabeça. — Como poderia? Não é como se


tivesse me deixado um número para que pudéssemos nos
conhecer melhor.

Eu normalmente não era uma pessoa que ficava


vermelha, mas senti o calor subir pelo meu rosto. Desviei o
olhar, precisando me desvencilhar da teia que me sentia
presa. — Umm... você já conseguiu falar com Storm?

— Não. Eles nem me disseram porque ele foi trazido.

Suspirei. — Brigando, de novo.

— Acho que este não seja o seu primeiro cerco?

Balancei minha cabeça. — Definitivamente não. Ele se


envolveu em algumas brigas, e depois, uma vez foi pego por
furto.

Algo mudou no homem parado diante de mim. Ele ainda


tinha a luz em seus olhos, apenas não parecia mais focado
em mim da mesma forma. Donovan colocou as mãos nos
quadris ao entrar no modo advogado. — Quantos anos ele
tem?
— Ele tem doze anos, ou terá em menos de uma semana.

— Isso é bom. Treze é um número mágico aqui na


cidade. Estou feliz por ele ainda não ter chegado.

Eu concordei. — O juiz porém ameaçou movê-lo da


última vez. Ele mora em Park House, um dos melhores lares
para grupos de jovens. O juiz disse que se o visse novamente
na sua frente, o transferiria para um centro de detenção
juvenil. Isso não pode acontecer. Só pioraria as coisas para
ele.

A porta que dava para a área onde todos os policiais se


sentaram ao fundo se abriu. — Storm! — Alguém gritou.

Donovan estendeu a mão para que eu andasse a sua


frente.

O policial, na porta, levantou uma prancheta. — Nome?

— Autumn Wilde, assistente social de Storm.

Donovan falou atrás de mim. — Donovan Decker,


advogado.

Fomos conduzidos pelo cubículo e por um longo


corredor. O oficial abriu a última porta à direita. Encontramos
Storm lá dentro, algemado a um banco contra a parede.

— As algemas são realmente necessárias? O meu cliente


não tem nem doze anos — disse Donovan.
O oficial encolheu os ombros. — Quebrou o nariz de um
adulto. É considerado perigoso.

— Vou correr o risco. Solte-o.

O oficial balançou a cabeça, mas fez o que Donovan


pediu. Storm esfregou seus pulsos assim que as algemas
foram retiradas.

— Obrigado, porco — Storm cuspiu.

Donovan passou por mim e ficou na frente de seu


cliente, olhando para baixo. Ele apontou para o oficial e falou
com um tom severo e firme. — Augustus, peça desculpas ao
bom oficial.

— Mas ele...

— Agora.

Storm revirou os olhos. — Tudo bem. Tanto faz. Lamento


que seja um porco.

— Não desse jeito, Augustus — Donovan avisou.

— Tudo bem. Desculpe.

O oficial olhou para nós ao sair. — Boa sorte com isso.

Assim que a porta se fechou, Storm se levantou e


começou a dizer que não era sua culpa. Donovan
simplesmente ergueu a mão e lhe lançou um olhar de
advertência. Surpreendentemente, Storm fechou a boca.
— Sente-se e responda apenas às perguntas que eu e
Autumn fizermos.

Storm ficou de mau humor, mas também se calou e se


sentou à mesa. Donovan puxou uma cadeira e acenou para
que eu me sentasse nela.

— Obrigada.

Falei com Storm enquanto Donovan vasculhava sua


bolsa e desempacotava suas coisas de advogado. — Você sabe
o que o juiz disse da última vez, Storm.

— Não foi minha culpa. O cara começou.

Donovan clicou em sua caneta e preparou um bloco de


notas amarelo. — Vamos começar por aí. O cara tem nome?

— Sugar14.

— Que tal um nome real?

Storm encolheu os ombros. — Não sei. Todos na


vizinhança o chamam de Sugar.

— Tudo bem. Diga-me o que precipitou você e Sugar


nisso.

Storm contou, ao longo dos próximos vinte minutos, uma


história elaborada que começou com o roubo da sua bicicleta
e terminando com ele entrando em uma briga com um garoto
de dezoito anos. Eu o conhecia há três anos, por isso sabia
que era melhor não acreditar em sua palavra quando estava
com medo, e ele estava com medo de estar na delegacia, quer
admitisse ou me deixasse ver um vislumbre dessa
vulnerabilidade ou não.

Donovan fez algumas ligações perguntando, não tenho


ideia a quem, à meia-noite, sobre um cara chamado Sugar, e
então saiu da sala para falar com a polícia.

Quando voltou, disse — Tenho boas e más notícias. A


boa notícia é que pedi para mantê-lo aqui durante a noite, em
vez de enviá-lo para a penitenciária central. Como é menor de
idade, ficará sozinho em uma cela. Eles então, pela manhã, o
levarão ao tribunal para a acusação. A má notícia contudo é
que estão lhe acusando de agressão criminosa. Você fraturou
o nariz do cara e desviou o septo. Ele vai precisar de cirurgia.

Balancei minha cabeça. — Droga. Tudo bem, bem, acho


que não temos escolha a não ser viver um dia de cada vez. —
Olhei para Storm. — Estou feliz que você ficará aqui esta
noite, pelo menos.

Um pouco depois, Donovan e eu dissemos boa noite a


Storm. Eu odiava deixá-lo sozinho, mas esta não era a nossa
primeira vez fazendo isso, e não era como se eu tivesse
escolha. Prometemos encontrá-lo no tribunal e dissemos para
tentar dormir um pouco.

Soltei um suspiro profundo, lá fora, nos degraus da


delegacia. — Obrigada por ter vindo. Não sei mais o que fazer
com ele.
— Ele tem família?

— A mãe dele é uma viciada. Quando o encontraram, ele


morava sozinho em um prédio abandonado. Estava morando
em um carro com ela e seu namorado mais novo até que o
namorado deu um ultimato à mãe – a criança ia embora, ou
ele. Storm foi embora no dia seguinte porque o carro era
aquecido e não queria que sua mãe ficasse lá fora no frio. Ele
não conhece nenhuma outra família, e a mãe diz que são
apenas eles.

Donovan passou a mão pelo cabelo. — Isso é difícil.

— Ele também é um garoto inteligente. Não faz lição de


casa nem faz nenhum esforço e ainda tira boas notas em
todas as provas; também fala espanhol e russo com bastante
fluência e sabe um pouco de polonês.

— Três línguas? A mãe dele é bilíngue?

— Não. A mãe é alemã, acho, mas não fala nada além de


inglês. Quando lhe perguntei sobre isso, ela disse que eles
circulavam muito pelo Brooklyn. Quando moravam em
Brighton Beach, ele foi para a escola com vários garotos
russos e simplesmente aprendeu, e aprendeu polonês quando
moravam perto de Greenpoint, e o espanhol, aprendeu com os
vários amigos ao longo dos anos.

— Garoto inteligente. O seu cérebro parece uma esponja.

— Isto é, no entanto, não consigo me aproximar dele.


— As crianças sozinhas não aceitam facilmente ajuda ou
escutam as pessoas, mas acho que não preciso lhe dizer isso.

Balancei a cabeça — Eu só espero que ele não seja


enviado para um centro de detenção juvenil. Alguns deles são
tão duros com as crianças quanto uma prisão.

Donovan acenou com a cabeça. — Eu sei. Vou fazer o


meu melhor.

Percebi, de repente, como estava silencioso do lado de


fora da delegacia. Éramos apenas nós dois, e isso me deu
vontade de fugir o mais rápido possível. — Existe alguma
coisa que você precisa de mim para a acusação?

— Não, é apenas uma formalidade.

— Oh. Ok. Bem, obrigada novamente. Vejo você de


manhã, então. — Acenei sem jeito e comecei a me afastar.

Donovan contudo pegou a minha mão.

— Não tão rápido...

Merda.

Arrisquei um olhar para ele, e ele silenciosamente ergueu


as sobrancelhas como se esperasse que eu falasse.

— O que? — Disse.

— Vamos apenas fingir que o fim de semana nunca


aconteceu?
Mordi meu lábio inferior, rezando para que fosse uma
pergunta retórica. Quando o silêncio se estendeu, consegui
dizer — Isso seria ótimo. Obrigada.

Donovan sorriu. — Boa tentativa, mas sem chance.

Suspirei.

— Voltei àquele Starbucks, todos os dias durante duas


semanas, na esperança de encontrar você. — Ele fez uma
pausa e procurou meus olhos. — Já que escapuliu da minha
casa e não me deixou nenhum meio de entrar em contato com
você, eu nem sabia seu sobrenome até que disse ao policial lá
dentro. Wilde... — Ele sorriu. — Combina com você.

O meu coração apertou um pouco. Quase um ano havia


se passado e, no entanto, ainda pensava nele toda vez que
passava por qualquer Starbucks. Só que, ao contrário dele,
evitei ir naquele em que nos conhecemos após o nosso fim de
semana juntos.

— Desculpe... eu, uh...

As suas sobrancelhas se juntaram. — Você é casada?

— Deus, não.

— Você... não se divertiu? Porque eu pensei que tivesse.


— Ele deu um sorriso torto e com covinhas, o que fez meus
joelhos ficarem um pouco fracos. — Achei que tivesse se
divertido em vários momentos.

Eu não pude deixar de rir. — Sim, eu me diverti.


— Então, por que a rejeição?

— Eu só... estava procurando pelo o que tivemos. Nada


mais.

Ele pareceu digerir isso por um minuto antes de assentir.


— Poderia apenas ter dito isso. Eu sou um menino crescido.
Eu gostaria de ter me despedido. Talvez até lhe fazer um café
da manhã – um pouco de café, pelo menos.

Fiquei envergonhada e me senti feliz por estar tão escuro


aqui fora. — Desculpe. Eu, não sou boa nessas coisas.

Donovan esfregou o lábio inferior com o polegar. Esta foi


uma das coisas que me senti atraída quando nos
conhecemos. Ele tomava seu tempo e escolhia suas palavras,
em vez de fazer o que a maioria das pessoas fazia – vomitava
todos os pensamentos que imediatamente vinham à mente.
Bem, isso e seus ombros largos, olhos hipnotizantes e
estrutura óssea que deveria ter feito dele um candidato para
ser uma quinta cabeça esculpida no Monte Rushmore. Que se
danem os presidentes. Isso eu iria ver.

— Você sente muito? Então isso significa que se sente


mal com a forma como as coisas terminaram?

O meu rosto se enrugou. — Sim. É por isso que me


desculpei.

— Bem, já que se sente mal, eu deveria deixá-la me


compensar, para que estejamos quites.
Rio. — Como exatamente eu faria isso?

— Tome o café que pulou comigo... agora. — Ele acenou


com a cabeça do outro lado da rua. — Há uma lanchonete
vinte e quatro horas a um quarteirão de distância.

Era tentador, mas sabia que não era uma boa ideia.
Ofereci um sorriso conciliador. — É muito tarde. Eu deveria ir
para casa.

Donovan forçou um sorriso, embora pudesse ver que ele


estava desapontado. Honestamente, eu também estava. Ele
enfiou as mãos nos bolsos. — Vejo você amanhã, então?

Concordei com a cabeça. — Boa noite, Donovan.

Pensei que era o fim de tudo, e ambos começamos a nos


afastar, mas depois de alguns passos, ele gritou. — Ei, Red!

Parei e me virei. Mesmo eu tendo cabelo ruivo, ele era a


única pessoa que me chamava assim.

— O tribunal levará apenas cerca de uma hora. Então


não será tarde demais para o café depois.

Rio. — Boa noite, Sr. Decker.

— Oh, foi uma boa noite. — Sorriu. — Estou ansioso


para amanhã.
CAPÍTULO 4

Donovan

— Você não fala a menos que o juiz lhe faça uma


pergunta e eu dê permissão para responder. Entendido?

— Tanto faz.

Passar a noite trancado em uma cela de prisão não tinha


feito muito para a disposição alegre do meu cliente. Embora a
atitude de um cliente normalmente me pegasse de surpresa,
foi um esforço fingir estar chateado com esse garoto. Ele me
lembrava tanto de mim naquela idade que achei engraçado.

Limpei minha garganta. — Sem tanto faz. Diga-me que


entendeu o que disse e que seguirá minhas regras.

Storm revirou os olhos. — Tudo bem. Falar quando for


dito. Entendi, certo?

— Melhorou.

Levantei a manga da camisa para verificar a hora no meu


relógio. Tínhamos ainda alguns minutos antes que o guarda o
chamasse para a formação obrigatória e a marcha dos
criminosos escada acima para o tribunal. Apenas os
advogados tinham permissão para visitar os clientes antes da
acusação, então esta foi a primeira vez que estive a sós com
ele. Achei melhor aproveitar a oportunidade.

— Sua assistente social, há quanto tempo trabalha com


ela?

Ele encolheu os ombros. — Não sei. Alguns anos, acho.

— Tudo bem com ela?

Outro encolher de ombros. — A sua bunda parece boa.

Apontei-lhe um dedo. — Ei, não seja desrespeitoso, seu


merdinha.

— O quê, você não gosta da bunda dela? É bonita e


redonda.

— Ela é uma dama, em primeiro lugar, e por isso não


fale assim; em segundo lugar, acho que ela é provavelmente a
única coisa boa que tem na vida na maior parte do tempo,
então não morda a mão que o alimenta. Por último, você tem
doze anos. — Deixei de fora em quarto lugar, não é bonita e
redonda; é mais como um coração de cabeça para baixo.

— Tanto faz. Ela é legal. Ela pode dirigir um caminhão.

As minhas sobrancelhas franziram. — Autumn pode


dirigir um caminhão? Quer dizer uma caminhonete?

Storm balançou a cabeça. — Não. Um grande caminhão


de dezoito rodas.
— Como você sabe disso?

— Porque uma vez estávamos em um daqueles retiros


idiotas que o Park House nos faz ir para o interior. Um cara
estacionou seu caminhão bloqueando a entrada do local; ele e
outro cara estavam conversando. Ela saiu do nosso carro e
lhe pediu que o movesse, e ele disse que estava ocupado e que
cuidaria disso. Isso a irritou, então ela lhe perguntou se as
chaves estavam lá dentro. O cara riu e lhe disse para ir em
frente se pensasse que poderia dirigir um caminhão com
dezoito marchas. Ela nos disse para ficar no carro, e então
dirigiu o caminhão um quarteirão de distância, estacionou e
voltou.

Não sei que tipo de informação estava procurando, mas


não era isso. Mesmo assim guardaria a informação. — O que
mais sabe sobre a Sra. Wilde?

Ele encolheu os ombros. — Ela odeia brigas. Algumas


vezes estava por perto quando as crianças começaram
algumas. Estas foram as únicas vezes em que a vi ficar
realmente brava. Também não atende o telefone quando o pai
liga na maior parte das vezes, e tem péssimo gosto para
música.

— Que tipo de música ela ouve?

O garoto fez uma careta. — O que, está escrevendo um


livro?
Felizmente, o guarda salvou o pequeno pé no saco de
mais interrogatórios. Abriu a porta, dizendo — Vamos, Storm.
Hora do show.

Dobrei o livro de couro onde havia anotado algumas


coisas que queria lembrar e fiquei com meu cliente. — Não se
esqueça, não me importo com o que o juiz lhe diz ou sobre
você, você não diz uma palavra sem minha permissão.

Ele franziu a testa, mas acenou com a cabeça ao sair.

Fiz uma parada no banheiro masculino, no andar de


cima, antes de ir para a sala 219, onde a acusação de Storm
seria realizada em cerca de quinze minutos. Eu me animei ao
encontrar uma certa assistente social ruiva sentada em um
banco fora da sala. Autumn estava rabiscando em um bloco
em seu colo, por isso não me viu aproximando.

— Bom dia.

Ela piscou seus grandes olhos verdes para mim. — Oh,


olá. Estou feliz por termos nos visto antes da audiência.

— Você sentiu minha falta, hein? — Sorrio.

Ela riu. — A verdade, depois que cheguei em casa ontem


à noite, pensei em algumas coisas que você talvez quisesse
dizer ao juiz sobre Storm. Estava apenas anotando-as.

— Vamos ver o que você tem. — Sentei-me ao seu lado e


estendi a mão para que me passasse a lista.
Lendo as notas, já sabia a maior parte do que ela havia
escrito depois de falar com meu cliente e puxar sua ficha
criminal. Autumn listou suas prisões anteriores, o nome de
sua mãe e o nome do psiquiatra que era obrigado a ver
mensalmente como parte de seu último acordo judicial. Ela
também listou suas notas. Levantei o papel mais perto para
ter certeza de ter lido a última parte corretamente.

— Isto está certo? Sua média geral é de noventa e nove?

Autumn acenou com a cabeça. — Ele está cursando


todas as aulas avançadas também. A única razão pela qual
não tem cem é porque tirou noventa em educação física.

As minhas sobrancelhas se ergueram. — Educação


física? Sério? É isso que o está pesando? — Ontem à noite ela
mencionou que o garoto era um bom aluno, e quando lhe
perguntei como iam as coisas na escola hoje, ele resmungou
bem. Presumi que isso significava que não estava reprovando
em nada, e suas notas provavelmente eram setenta e poucos.

— Ele teve problemas duas vezes na educação física por


atropelar crianças com uma bola de futebol, então o professor
baixou a sua nota. Caso contrário, teria cem.

Balancei minha cabeça. — As suas notas são, na


verdade, uma boa informação para mencionar a este juiz. A
sua esposa é professora, então ele dá muito peso ao
desempenho das crianças na escola. Vou usá-la. Obrigado.
Quando fui devolver o papel à Autumn, algo clicou e, em
vez disso, puxei-o para uma inspeção mais detalhada. Sim,
era a sua lista.

A tarde do dia em que nos encontramos para trocar a


bagagem, revirei sua mala. Ela foi tão inflexível sobre eu não
olhar; como não poderia? Havia lá dentro, algumas merdas
muito intrigantes – vibradores enormes e outros enfeites, que
descobri mais tarde terem sido adereços para a festa de
despedida de solteira da qual tinha acabado de voltar, mas
também encontrei algum tipo de lista – uma lista de
desculpas, com algumas riscadas. Eu tinha me esquecido
completamente até encontrá-la embaixo da minha cama na
semana seguinte. Deve ter escorregado lá quando estava
reembalando sua mala. Não tinha ideia se havia escrito a lista
ou qual era seu significado, mas ver sua caligrafia me fez
lembrar. Ela tinha letras cursivas bem distintas e oblíquas.

— Você é canhota? — Perguntei.

Ela acenou com a cabeça e ergueu a mão para me


mostrar a parte de trás do pulso. — Foi a tinta que sempre
tenho nas costas da minha mão ou a minha caligrafia terrível
que me denunciou?

— A inclinação. A minha assistente também tem.

Fazia muito tempo desde que li a lista que ela havia


escrito, então não conseguia me lembrar da maior parte do
que estava nela. Eu sabia que havia algumas desculpas
básicas, coisas como: Meu telefone está prestes a morrer. O
trabalho está chamando na outra linha. Estou prestes a
entrar em um prédio onde o sinal é péssimo. Havia também
contudo algumas muito estranhas, como meu peixe está se
afogando.

Autumn colocou as informações sobre Storm de volta em


uma pasta em seu colo e começou a dizer algo quando seu
telefone tocou. Papai apareceu na tela. Lembrando o que
Storm tinha me dito – que raramente atendia o telefone
quando seu pai ligava – a carranca em seu rosto enquanto lia
o nome fazia sentido. Enquanto pensava em atender, um
oficial do tribunal abriu a porta ao nosso lado.

Ele olhou para sua prancheta e gritou para ninguém em


particular — Caso 5487723-B, Storm!

Autumn olhou para mim e respirou fundo. — Somos nós.

Ficamos em pé. O seu telefone ainda estava em sua mão


e papai começou a piscar novamente. Eu não tinha certeza se
ela notou, então apontei meus olhos para ele. — Você precisa
atender isso primeiro?

— Não, está bem. Ligo para ele mais tarde.

A acusação correu bem. Entrei com uma petição em


nome do meu cliente, e Storm foi liberado sob a custódia do
estado representado pelos serviços sociais. Ele também teria
que se reportar a um OLCJ – oficial de liberdade condicional
juvenil, mas teríamos alguns meses antes de precisarmos
construir um caso. Ainda assim, o garoto precisava se manter
longe de problemas.

Perguntei à Autumn, depois de recolhermos as suas


coisas na sala de propriedade, se poderia ficar alguns
minutos a sós com meu cliente.

— Certo. Claro.

Balancei a cabeça em direção ao banheiro masculino


algumas portas abaixo. — Entre no meu escritório,
homenzinho.

— Posso mijar enquanto mastiga minha orelha?

— Pode esperar até que eu termine. Vamos.

Esperei, dentro do banheiro masculino, até que o cara


lavasse as mãos e saísse. Inclinei-me então contra uma pia e
cruzei os braços sobre o peito.

— Conversei com algumas pessoas. Sugar não apenas


roubou a sua bicicleta. — Nivelei meu cliente com um olhar
feroz.

Ele desviou o olhar. — Sim, roubou. Ele roubou a minha


bicicleta.

— Roubar implica que ele a pegou sem compensar


apropriadamente, mas não foi isso que aconteceu, foi, Storm?

Esta manhã, falei com um amigo que ainda morava na


vizinhança de Storm e lhe pedi para fazer uma pequena
pesquisa. Aparentemente, Sugar era um negociante local. Eu
não tinha certeza do que tinha acontecido, mas tinha um
palpite muito bom.

— O cara é um idiota.

Storm era uma criança grande com apenas doze anos,


mas eu tinha pouco mais de um metro e noventa. Inclinei-me
com as mãos nas coxas e falei com ele na altura dos olhos. —
Já tenho a verdade, então, se tentar mentir para mim, eu
saberei — blefei. — Não posso te defender a menos que seja
honesto comigo. Pode ser capaz de cuidar de si mesmo na
rua, mas, acredite em mim, terá problemas se o transferirem
para um lugar como o Centro de Detenção Juvenil de
Wheatley. Ouvi dizer que é um garoto inteligente. Você sabe o
que é reincidência?

Storm balançou a cabeça.

— É quando alguém repete um comportamento –


geralmente é algo que lhe foi feito. Oitenta por cento das
crianças em Wheatley foram abusadas fisicamente ou
sexualmente quando crianças. Pode somar dois mais dois e
descobrir o que estou dizendo que acontece em Wheatley?

O músculo da mandíbula de Storm flexionou, mas se


manteve firme.

— Por que não começamos do começo? Quanto você


devia a Sugar?
Ele refletiu sobre sua resposta por um minuto antes de
olhar para baixo. — Quarenta.

Eu sabia. — Ele pegou sua bicicleta porque não o pagou


e você tentou recuperá-la.

— Eu não pensei que estivesse em casa. Só queria a


minha bicicleta de volta.

— Você só fuma maconha ou usa outras drogas?

— Apenas fumo maconha.

Encarei seus olhos por sólidos trinta segundos. Crianças


de rua eram muito mais difíceis de ler do que idiotas de terno
que roubavam milhões, mas tinha certeza de que ele estava
falando a verdade.

Levantei-me e balancei a cabeça. — Bem. Verei o que


posso fazer com essa informação, mas está no gelo fino,
garoto. Você não pode fazer nada de errado – sem comprar
maconha, entrar em outra briga, nada. Inferno, nem jogue
lixo no chão.

Ele franziu a testa. — Tudo bem.

Inclinei minha cabeça em direção à porta. — Vamos. A


Sra. Wilde está esperando.

Quando chegamos à porta do banheiro masculino, Storm


parou e olhou para mim. — Se é meu advogado, temos o
privilégio de advogado-cliente, certo?
O canto da minha boca se contraiu. A criança já era mais
esperta do que o Sr. Bentley. — Isso mesmo.

— Então não pode dizer à Sra. Wilde que comprei


maconha, certo?

Basicamente, havia lhe dito que o lugar que poderia ser


enviado estava cheio de pedófilos, e ele estava mais
preocupado em decepcionar Autumn. Este foi o meu primeiro
vislumbre da criança ainda dentro de seu corpo em
crescimento.

Coloquei minha mão em seu ombro. — Você tem minha


palavra.

Autumn olhou entre nós, lá fora, no corredor. — Tudo


certo?

Concordei. — Tudo bem.

— O escrivão disse que tem vinte e quatro horas para se


registrar no departamento de liberdade condicional juvenil,
mas o prédio fica bem ao lado. Você acha que está tudo bem
se fizermos isso agora?

— Acho que é uma boa ideia.

Autumn olhou para Storm, depois para mim. — Ok,


bem... agradeça ao Sr. Decker.

A última coisa que eu precisava era ficar fora do


escritório a manhã toda, mas não estava pronto para deixar
Autumn ir embora de novo tão rápido. Não seria a primeira
vez que trabalhei durante a noite para compensar as horas
faturáveis perdidas. — Vou com vocês. Eu conheço alguns
dos JPOs. Talvez possa fazer você entrar mais rápido.

— Oh, isso seria ótimo, se não se importa.

♥♥♥

— Não sabia que fazia esse tipo de advocacia — disse


Autumn. — Pensei que lidava mais crimes de colarinho
branco.

Autumn e eu estávamos sentados no corredor do


Departamento de Condicional enquanto o novo OLCJ de
Storm falava com ele sozinho. Eu não tinha mais nenhuma
razão para estar aqui, agora que ele entrou – bem, nenhuma
razão profissional.

— Eu lido — disse. — Há pelo menos seis anos, não


toquei em nada além de lavagem de dinheiro, negociação com
informações privilegiadas e apropriação indébita. Fui ADA15
por um ano logo depois de terminar a faculdade de direito,
processando crimes de Classe B. Mudei para o outro lado e,
um ano depois, troquei os crimes de rua pelos crimes de Wall
Street16, mas um dos sócios da minha empresa me pediu
para considerar o caso de Storm como parte de nosso
programa pro Bono. A verdade, ele é quem faz o trabalho
regular de criminosos de rua, mas sou candidato a sócio e
sabe que preciso do seu voto, então jogou em cima de mim. —
Chamei a atenção de Autumn. — Pensei que o cara estava
agindo como um idiota de sempre, mas acho que devo a ele
agora.

Ela tentou esconder o sorriso olhando para baixo. —


Qual é o nome do parceiro que o designou?

— Blake Dickson. Nós o chamamos de Dick17, porque


ele é

Autumn acenou com a cabeça.

— Como foi o casamento da sua amiga? Já deve ter


acontecido, certo? A noiva foi dançando até o altar?

O queixo de Autumn caiu. — Ela foi, e o casamento foi o


máximo, mas não posso acreditar que se lembra disso.

— É muito difícil esquecer a história de uma noiva


planejando dançar pelo corredor ao som de “Crazy Bitch” de
Buckcherry.

Ela riu. — Acho que sim.

— Além disso... — chamei a sua atenção. — Lembro-me


de tudo sobre o nosso fim de semana juntos.

Pensei em dizer qualquer outra coisa, mas ela realmente


me abalou quando fez seu ato de desaparecimento, e senti a
necessidade de deixá-la saber disso. Ignorei então, o fato de
que provavelmente parecia um covarde desesperado e limpei a
garganta. — Eu me lembro que só usa um fone de ouvido por
vez, nunca dois, então pode estar ciente do que está ao seu
redor, mas alterna o direito e o esquerdo todos os domingos –
para que o outro não se sinta negligenciado. Também acelera
quando passa por cima de pontes, para o caso de elas
desabarem. Conhece um monte de fatos aleatórios porque
tem uma necessidade incessante de mergulhar fundo em
qualquer coisa que escute falar e acha que não tem
conhecimento suficiente, o que faz com que se perca nas
pesquisas do Google por horas. Se não me engano, foram os
vencedores da loteria depois de assistirmos aquele filme sobre
um cara que ganhou na loteria e perdeu todo o seu dinheiro.
Você passou uma hora me contando sobre coisas aleatórias
que têm melhores chances do que ganhar na loteria enquanto
eu preparava o jantar. Além disso, dorme com as cobertas
sobre a cabeça e é tão pequena que é difícil dizer se está na
cama ou se é apenas um amontoado de cobertas.

Autumn piscou algumas vezes. — Como você sabe como


durmo? Nunca dormimos no mesmo quarto, exceto por
alguns cochilos curtos. Dormi na sua cama e você no sofá.

Sorrio. — Eu verifiquei você. Devo ter puxado as cobertas


e a observado dormir por um minuto ou dois uma vez.

— Isso é meio assustador...

— Queria ter certeza de que estava bem, e então não


conseguia tirar meus olhos de você. Você é linda, mesmo
quando dorme.

Ela desviou o olhar e, quando se voltou, evitou o contato


visual. — Estou nervosa com o que acontecerá com o
Augustus dessa vez. A sua última prisão foi há apenas alguns
meses.

Achei que fosse o fim de nossa viagem pela estrada da


memória... — Posso ter algo que possa usar para fazer isto
desaparecer.

— O que quer dizer?

— Os promotores não gostam de punir crianças de doze


anos, especialmente aquelas que tem potencial, como Storm.
Por isso, se puder trazer-lhes algo que gostam de processar, e
ajudá-los a ver que há também um bom caminho para o seu
cliente sem o colocar num centro de detenção juvenil ou
enviá-lo para um lugar onde só acabará pior, então
geralmente resolverão achar uma solução.

O seu nariz enrugou. — Não estou seguindo-o. Quem


eles gostariam de processar?

Mesmo sem o privilégio de advogado-cliente, não


quebraria minha palavra para Storm. Crianças como ele não
confiam facilmente, então se eles sentem que não honrou sua
palavra, os perde para sempre.

— Deixe comigo, ok?

Ela parecia desconfiada. — Ok...


Desta vez, quando tentou desviar o olhar, fiz questão de
chegar até ela. — Autumn?

Ela ergueu os olhos para encontrar os meus. — Confie


em mim, ok? Farei tudo o que puder por ele.

Com um suspiro, ela assentiu. — OK. Obrigada.

O meu celular vibrou no meu bolso. Desenterrando, vi


que era o escritório. Olhei para Autumn. — Com licença um
minuto.

Ela acenou com a cabeça, então tentei responder e me


levantei, dando alguns passos para longe. — Donovan
Decker...

— Decker, como foi a audiência?

Sim, olá para você também, Sr. Dick.

— Ei, Blake. A audiência correu bem. Bastante padrão.

— Você será capaz de tirar a criança?

— Farei o meu melhor. Posso ter um pouco de vantagem


para trabalhar.

— É melhor. Há muita coisa em jogo para você.

Sério? Sete malditos anos atraindo dezenas de milhões


em casos de alto perfil, e meu destino se resume a um caso
pro Bono para um garoto de doze anos que nem deveria ter
enquanto está decidindo se me tornaria sócio ou não? Queria
lhe dizer para comer merda, mas em vez disso, comi merda –
embora tivesse que engolir fisicamente para forçar meus
pensamentos e abrir espaço para minha bajulação.

— Com certeza, não decepcionarei você.

Clique. O idiota desligou na minha cara.

Balancei minha cabeça e resmunguei baixinho. Tenha


um bom dia também, Dick.

Por mais irritado que a curta conversa tenha me deixado,


minha raiva rapidamente se dissipou quando me virei.
Autumn tinha seu cabelo castanho-avermelhado espesso na
mão e estava amarrando-o em um daqueles coques que as
garotas fazem mais rápido que um ninja. Ela ficava linda com
ele para baixo ou para cima, mas vê-lo empilhado no topo de
sua cabeça me lembrou da manhã em que acordei e a
encontrei parada na frente do meu fogão, cozinhando
enquanto usava uma das minhas camisetas. Estava
cantarolando “Little Boxes”, uma velha canção que tinha
voltado como tema do show Weeds, e secretamente tirei uma
foto dela. Trent ainda estourava minhas bolas sobre aquela
foto. Mostrei a ele uma vez, ampliando-a para que não
pudesse ver suas pernas nuas, mas estava na minha pasta de
favoritos – a única foto que sinalizei com o símbolo do coração
e coloquei lá no meu iPhone.

Não tinha percebido que estava olhando até Autumn me


pegar. Os cantos de seus lábios se ergueram levemente e sua
cabeça se inclinou para um lado. Aproximei-me, me sentindo
bem por ela parecer gostar que eu a observasse.

— Desculpe. Era meu escritório. Você deve ter amigos em


cargos importantes para que Dick ligue e verifique como as
coisas estão indo. Acho que é a terceira vez que o cara me liga
em sete anos, e esta é a segunda vez em vinte e quatro horas
sobre o seu caso.

— Hmm... sim, acho que sim.

— Você disse que seu pai era advogado, certo? Foi assim
que conseguiu que minha firma aceitasse este caso? Ele
conhece alguém? Estávamos fechados para aceitar novos
casos pro Bono este ano.

— A verdade, não foi por meio do meu pai. Eu meio que


conheço alguém da sua empresa.

— Meio que conhece?

Ela olhou para baixo. — Estou namorando um dos


advogados.

O meu estômago afundou. Estava envolvida com outro


homem? Alguém que eu conhecia? Se eu achava porém que a
notícia era um chute no estômago, tinha outra coisa vindo
quando soltou a próxima bomba.

— Qual advogado? — Perguntei.

Ela estremeceu com um sorriso forçado. — Acredito que


o chamam de Dick.
CAPÍTULO 5

Donovan

Sentei-me à minha mesa com um cartão de visita entre


os dedos, virando-o sem parar, perdido em pensamentos. Eu
nem percebi que Juliette tinha entrado até que ela plantou
sua bunda em uma das minhas cadeiras.

— Tu en fais une tête18 — disse.

— Nah. Não estou com vontade de uma punheta.


Obrigado de qualquer maneira.

Ela riu. — Por que a cara amarrada, meu amigo?

— Só estou pensando em um caso.

Juliette era originalmente da França, mas tínhamos


começado como estagiários de verão na empresa juntos, com
Trent e outros doze. Nós três fomos os únicos contratados
naquele outono, e estávamos juntos desde então. Ela e Trent
passaram muito tempo conversando sobre suas vidas
amorosas, ou a falta de, normalmente – analisando por que
seus relacionamentos nunca pareciam dar certo. Eu
comentava e dava minhas opiniões, mas não era sempre que
examinávamos minha vida amorosa, porque na maior parte,
estava relativamente feliz com a forma como meus não
relacionamentos funcionavam. Hoje, porém, pensei que
poderia usar a opinião de uma mulher...

— Deixe-me perguntar uma coisa – você tem um tipo?

— De homens?

Concordei. — Tanto na aparência quanto na


personalidade?

— Tenho. Tenho tendência a me sentir atraída por


perdedores.

Sorrio. — Não, sério.

— Infelizmente, não estou brincando. Sinto-me atraída


pelo tipo artístico – pintores, escultores, escritores – a maioria
dos quais está desempregada metade do tempo.

— O que te atrai neles?

Ela encolheu os ombros. — Não sei. Acho que amo que


usem o seu coração em suas mangas. Os tipos de artistas
tendem a estar em contato com suas emoções e se preocupam
com coisas que me importam, como meio ambiente e justiça
social. Encontro um homem que é apaixonado por coisas que
não necessariamente tornam seu dinheiro muito sexy.

— Fisicamente?

— Já conheceu caras com quem namorei. Eles


geralmente são magros com uma aparência meio hippie –
como se não tivesse a certeza se podem ser sem-teto ou não.
— Ela me olhou de cima a baixo. — Basicamente o oposto de
você, menino bonito. Por que está me perguntando isso
contudo?

— Estou tentando descobrir como uma mulher pode


namorar comigo e depois um completo idiota.

Ela sorriu. — Não é a mesma coisa?

Amassei um pedaço de papel da minha mesa e joguei


nela.

Ela riu e percebeu. — O que está acontecendo com você?


Desembucha, Decker.

Suspirei. — Você se lembra de eu te contando sobre a


Autumn?

— Certo. A mulher com quem passou um fim de semana


inteiro celibatário e pela qual se apaixonou porque ela não
desistiu e te largou antes que pudesse terminar com ela?

Revirei meus olhos. Ela parecia o Trent. — Não é por isso


que gosto dela, mas tanto faz – não tenho tempo para debatê-
lo. Preciso ainda faturar mais doze horas hoje, e só faltam
seis. Seja como for, encontrei-a.

— Oh, uau. Como foi?

Fiz uma careta. — Ela me disse que não me deixou seu


número porque não estava procurando mais do que tivemos.

— Ai.
Balancei minha cabeça. — A nossa química ainda está lá
porém.

— Parece que ela simplesmente não está afim um


relacionamento, então.

— Essa é a coisa. Ela está saindo com alguém agora.

— Talvez você a pegou quando estava passando por


alguma coisa.

— Não sei. — Dei de ombros. — Pode ser.

— Você conseguiu o seu número mesmo assim?

Segurei o cartão de visita ainda na minha mão. — Ela é a


assistente social em um caso pro Bono por um menor que foi
preso. Ela então me deu para negócios, não exatamente
porque queria que eu a leve para sair.

— Ok... ainda estou perdida em onde começamos esta


conversa. Autumn é a mulher que está namorando o idiota?

Eu concordei.

— Você o conheceu? Estava com ela?

— Não, ele não estava com ela, mas definitivamente o


conheço. — Eu a olhei diretamente nos olhos. — Ela está
namorando Blake Dickson.

Os olhos de Juliette se estreitaram. — O Blake Dickson?


Tipo, como um dos sócios cujo voto você precisa para se
tornar sócio?

Soltei um suspiro profundo. — O único.

♥♥♥

Decidi, naquela noite, fazer um desvio no caminho do


trabalho para casa. Estava um pouco vestido demais para o
bairro para onde iria, por isso tirei minha gravata e a enfiei no
bolso – não que isso fosse me destacar menos enquanto
vagava pelas ruas depois de sair do metrô.

Os olhares que recebi enquanto caminhava pela calçada


eram muito engraçados – metade das pessoas me olharam
como se estivessem pensando em roubar minha carteira, e a
outra metade espalhada como baratas, presumindo que o
cara de terno escuro provavelmente fosse um narc19.

Encontrei Dario exatamente onde o havia deixado onze


anos atrás: sentado em sua varanda, quatro portas abaixo de
onde eu havia morado. Eram quase onze horas da noite, mas
não saberia disso por causa de todas as pessoas por perto.

— Ah, merda. — Ele se levantou e sorriu. — O que


diabos está vestindo? Você perdeu uma aposta?

Apertamos as mãos de uma maneira que ninguém no


escritório jamais fazia – uma série de sacudidelas e
solavancos que terminaram em um abraço de um ombro só.
— É assim que os homens que não moram no mesmo
prédio que suas mães se vestem, cabeça de merda.

Ele balançou sua cabeça. Eu estava apenas brincando e


ele sabia disso. Dario nunca foi embora porque sua mãe se
recusava a deixar o apartamento em que estava há mais de
quarenta anos. Ela estava confinada a uma cadeira de rodas,
e ele sempre ficava por perto para cuidar dela.

Ele olhou para seus amigos, a maioria dos quais nunca


tinha visto antes. — Alguém tem um lenço? O meu garoto
aqui provavelmente não quer sentar em uma varanda suja.

Rio. — Não quero. O que acha de darmos uma volta no


quarteirão, então?

Ele acenou com a cabeça e disse a seus amigos que


voltaria, que precisava me acompanhar de volta ao trem para
que não fosse assaltado.

Quando estávamos fora do alcance da voz, disse — Como


está Rosanne?

— Mamãe está bem. Você se lembra do velho Stimpson?

— Claro. Ele decapitou aquele grande boneco de neve


que passamos horas construindo depois daquela tempestade
de neve louca que tivemos quando tínhamos sete ou oito
anos.

Dario sorriu. — Isso mesmo. Fingi que minha mãe me


mandou pegar açúcar emprestado ou algo assim e roubei seu
cachimbo de espiga de milho. Como se pode fazer um boneco
de neve sem um cachimbo?

Rio. — Quanto a Stimpson? Algo lhe aconteceu?

— Nah. Ele ainda está andando por aí, mas vem e passa
um tempo com minha mãe algumas vezes por semana. A sua
velha morreu há alguns anos. Mamãe diz que ele é seu amigo
especial.

— Não brinca? Sua mãe está abatendo Stimpson?

Dario me deu um soco. — Não quer que eu bagunce esse


terno, quer?

Rio. — Bom para Rosanne. Estou feliz que ela esteja feliz,
mas escute, vim buscar algumas informações que podem
ajudar um cliente meu. Ele tem doze anos e me lembra muito
nós dois na sua idade.

— Pobre desgraçado...

— Sim, sério. — Sorrio. — Alguma chance de conhecer


um cara a quem chamam de Sugar?

— Certo. Ele é um farma na Lyme Street.

Pharma era a abreviação de farmacêutico, o que


significava que era um traficante de drogas local. Eu já sabia
disso desde que Storm admitiu a verdade sobre sua briga.

— Sabe mais alguma coisa sobre ele?


— Eu sei que ele costumava ser rude com sua mulher.
Ela tem três irmãos mais velhos, e eles o visitaram. No dia
seguinte, ambos os seus braços estavam engessados do
ombro ao pulso.

Fiquei feliz por ele ser um idiota e não amigo de Dario. —


Para quem ele trabalha?

— Estou assumindo que o que estamos falando aqui é


entre nós? Não me importo se o prenderem, mas não quero
que meu nome seja divulgado como um delator.

— Claro que não. Posso me vestir como um, mas não sou
um completo idiota.

Dario deu uma risadinha. — Sugar trabalha para Eddie


D., que trabalha para o Big Man.

Excelente – uma linha de idiotas. Concordei. — Obrigado


pela informação.

O meu amigo mais antigo e eu demos a volta no


quarteirão mais algumas vezes. Ele me deu as novidades
sobre a vizinhança. Antigamente, mal podia esperar para sair
deste lugar, mas havia algo reconfortante em estar de volta.
Talvez fosse a confiança que tinha em alguns dos meus velhos
amigos, e eles tinham em mim. Anos poderiam passar, mas
tínhamos passado por muita merda juntos para que esse
vínculo se quebrasse.

Quando voltamos para a varanda de Dario pela quarta


vez, paramos. — Você ouviu falar da Linda? — Perguntou.
A minha mandíbula ficou tensa com a menção da minha
mãe. — Faz um tempo. Ela deve ter encontrado algum outro
otário para lhe dar dinheiro.

Dario acenou com a cabeça. — Entendo. Vai subir e


curtir um pouco?

— Nah. Outra hora. Tenho que estar de volta ao


escritório ao amanhecer.

Nós nos cumprimentamos e meu amigo me deu um soco


de leve no braço. — Não demore três anos para passar por
aqui de novo.

— Eu não vou. Tome cuidado, Dario, e diga a sua mãe


que mandei um olá.

♥♥♥

No dia seguinte, liguei para o ADA designado para o caso


de Storm. Soube ficaria fora pelo resto da semana, então
demoraria um pouco, antes que pudesse falar com ele e ter
uma desculpa para ligar para Autumn. Continuei mesmo
assim, olhando seu cartão de visita em minha mesa. Pouco
antes de sair para almoçar, peguei o cartão e joguei em minha
gaveta. Talvez remover o seu nome de plena vista me ajudasse
a parar de pensar tanto nela.
Encontrei Trent e Juliette em uma sala de conferências
para almoçar. Tínhamos pedido comida chinesa no mesmo
quarteirão.

— Então, tenho fofocas — disse Juliette enquanto


comíamos.

— Se vai nos forçar a ouvir histórias idiotas de novo,


desta vez é melhor que sejam sobre pessoas reais — disse,
abrindo minha caixa de comida.

A última vez que almoçamos, Juliette nos contou uma


história elaborada sobre uma mulher que namorava uma
dúzia de caras. Estava entrando nisso até perceber que as
pessoas de quem estava falando não eram realmente suas
amigas. Ela estava recitando merdas dos últimos episódios de
The Bachelor20.

— Oh, isso é sobre pessoas reais. Porém, sei que você


secretamente quer saber o que aconteceu com Kayla quando
levou Jeff para casa para uma visita à sua cidade natal e teve
que lhe dizer que tem um filho. Guardarei isto para depois
porém.

— Puxa, obrigado — resmunguei.

— Seja legal, ou não te direi que encontrei a minha


amiga Trina hoje cedo no banheiro feminino.

— Quem é Trina mesmo? — Perguntou Trent.


Juliette sorriu e olhou em minha direção, embora não
tivesse feito a pergunta. — Ela é a assistente de Blake
Dickson.

Agora isso chamou minha atenção. — O que ela tinha a


dizer?

— Perguntei-lhe como seu chefe mal-humorado estava.


Ela disse que ele tem sido mais tolerável ultimamente.

O meu garfo congelou com um camarão a meio caminho


da minha boca. — Não quero saber o que o torna mais
tolerável.

Ela franziu o rosto. — Ewww. Não entrei nesse tipo de


detalhe, mas ela disse que ele está saindo com alguém novo.
Achei que gostaria de saber qual é o negócio entre eles.

— O negócio entre quem? — Perguntou Trent.

Esqueci que ainda não tinha lhe contado sobre meu


encontro com Autumn. — Eu te atualizo em um minuto —
disse. Levantei meu queixo para Juliette. — Continue.

— Bem, estão namorando há apenas um mês e meio, e


só se veem uma vez por semana, pelo que ela sabe. Não é de
surpreender que Dick faça sua assistente fazer as reservas
para o jantar. — Juliette balançou a cabeça. — Disse que
Autumn só ligou para o escritório uma vez, quando estava
retornando a ligação de Dickson. Portanto, as coisas não
parecem muito sérias.
A testa de Trent se enrugou. — Autumn? A mulher que
se transformou em um fantasma?

Contei-lhe o que havia acontecido desde a ligação que


recebi quando saímos para jantar. Ele se recostou a cadeira.

— Merda. O que fará então?

— Considerando que preciso do voto de Dickson? — Dei


de ombros. — Nada.

Trent e Juliette se entreolharam. Alguma comunicação


silenciosa passou entre eles, e os dois riram.

— O que diabos é tão engraçado?

— Você — Juliette bufou. — Diz como se realmente


acreditasse.

— Acreditasse no quê?

— Que consegue controlar ir atrás de algo que deseja.


CAPÍTULO 6

Donovan

Quando a noite de sábado chegou, estava ansioso por


fazer absolutamente nada – talvez assistir a qualquer novo
filme de ação que estivesse passando, regar minhas plantas,
chutar meus pés na mesa de centro e tomar uma ou duas
cervejas geladas. Eu merecia uma recompensa. Consegui
recuperar minhas horas faturáveis, e não desabei e liguei
para uma certa mulher cujo nome não pensaria esta noite –
especialmente quando subi na cama mais tarde. Os últimos
dias, me convenci a descer do penhasco em que estava
pisando. Trabalhei sete longos anos para chegar onde estou
hoje, e não deixaria uma mulher foder com isso,
especialmente uma que não tivesse interesse em mim.

Não. Eu não estava interessado em Autumn Wilde. Nem


um pouco.

Peguei o borrifador no balcão da cozinha e caminhei até


a primeira de mais de uma dúzia de plantas espalhadas pelo
meu apartamento.

— Ela não é meu tipo de qualquer maneira.

Spray. Spray.
Como se para desafiar essa afirmação, meu cérebro
evocou uma memória de Autumn do nosso fim de semana
juntos – pernas longas, pele cremosa, linda, cabelo ruivo
escuro, cintura fina e uma bunda bonita para uma coisinha...

— Tudo bem — resmunguei. — Então talvez seja mais ou


menos o meu tipo – fisicamente, de qualquer maneira. Ela é
porém definitivamente mais trabalho do que eu poderia
suportar.

Spray. Spray.

Embora... quando olhei para trás, para o fim de semana


que passamos juntos, o que definitivamente fiz em algumas
centenas de ocasiões, trabalho não era exatamente como o
descreveria. Exatamente o oposto. Autumn e eu tínhamos
ficado escondidos aqui no meu apartamento por três dias
inteiros, e foi provavelmente o momento mais divertido que
tive... talvez para sempre. Conversamos até o sol nascer e
passamos os dias assistindo filmes alugados, brincando um
pouco, rindo e adormecendo aconchegados no sofá. Eu até
lavei sua maldita roupa enquanto dormia.

Balancei minha cabeça e passei para a próxima planta.

— Tudo bem.

Spray. Spray.

— O que diabos espera que eu faça contudo? Ela não


está interessada. Além disso, está namorando o meu chefe.
Importa ainda que ela seja um sonho molhado ambulante que
poderia me fazer sorrir pôr um fim de semana inteiro sem
fazer sexo? Ou que ainda posso sentir o cheiro do seu
perfume agora, embora não esteja perto dela há dois dias? Ou
que posso me lembrar do seu gosto em cada beijo que
compartilhamos?

Spray. Spray.

— Eu lhe direi a resposta. Não. Não importa, porra.

Mesmo que houvesse centenas de razões para não


conseguir tirá-la da cabeça, ela estava namorando meu chefe.
Isso por si só tinha que inclinar a balança para o lado fique-
longe-pra-caralho, superando claramente todas as razões
para ligar para ela. Eu só precisava tirar minha mente dela
por um tempo. Isso é tudo.

Terminei então de regar minhas plantas em silêncio,


peguei uma cerveja gelada na geladeira e me sentei no sofá
para ver as opções de filmes na Netflix, mas enquanto assistia
a prévia de algum filme que parecia que deveria se chamar
Ocean's Nine Hundred and Ninety or Anywhere, meu celular
vibrou no meu bolso. Brevemente considerei ignorá-lo, mas o
workaholic21 em mim não poderia deixar ir para o correio de
voz. Por isso, o tirei e passei a mão para responder a um
número que não reconheci enquanto levava minha cerveja aos
lábios. — Donovan Decker.

— Oi, ummm... É Autumn. Desculpe incomodá-lo.


Imediatamente me sentei e plantei a cerveja sobre a
mesa de centro. Algo estava errado. Podia ouvir o estresse em
sua voz. — O que aconteceu?

— É Storm. Ele fugiu.

Passei a mão pelo cabelo. Merda. Um dos termos de sua


libertação era que deveria permanecer sob orientação e
controle dos Serviços Sociais. — Há quanto tempo ele se foi?

— Desde cerca de quatro horas desta tarde. Hoje é o seu


aniversário. A última vez que falou com sua mãe, ela
prometeu que iria visitá-lo em seu aniversário. Ela nunca
apareceu. O horário de visitas terminou às 15: 30, e quando o
gerente da residência foi ver como ele estava, encontrou uma
janela quebrada e Augustus tinha fugido. Eles sabem que
precisam ligar para o Departamento de Condicional se algo
assim acontecer, mas sou amiga de Lita, a gerente de lá,
então me ligou primeiro. Perguntei-lhe se eu poderia
reportar... mas isso foi há cinco horas, e nunca liguei. Eu não
sabia para quem mais ligar. Posso colocá-lo em mais
problemas se continuar a adiar a ligação?

— Você pode se meter em problemas. Como sua


assistente social, tem o dever legal de agir.

— Eu não me importo com isso, mas... — fez uma pausa,


e ouvi uma batida ao fundo. — Eu sinto muito. Pode esperar
um segundo?

— Sim.
Escutei vozes abafadas. A voz do homem ficou alta, e
achei que disse — São apenas cinco dólares. — Os cabelos da
minha nuca se arrepiaram.

— Autumn? — Gritei ao telefone.

Ela voltou depois de alguns segundos. — Desculpe –


onde estava?

— Esqueça onde estava com sua história. Onde você está


agora?

— Estou em um estacionamento. Acho que estou na


Delaney Street ou talvez fosse Delancey. Não me lembro onde
virei.

Fui até o armário para pegar meus sapatos. — Está na


vizinhança de Storm?

— Sim. Tenho procurado por ele nas últimas horas.

— Você está de carro?

— Sim.

— Alguém acabou de bater na sua janela e pedir


dinheiro?

— Sim. Parei em um estacionamento vazio para ligar


para você e não notei ninguém. Acho que talvez alguns sem-
teto possam estar morando aqui.
Balancei minha cabeça enquanto pegava minhas chaves
e carteira do balcão. — Se está em Delaney, você está a cerca
de oito quarteirões da septuagésima quinta delegacia, onde
ele foi detido na outra noite. Fica na esquina da Sutter com a
Essex. Insira isso em seu GPS e vá. Eu te encontro no
estacionamento da estação. Não baixe a janela para responder
a ninguém e mantenha as portas trancadas.

— Vamos pedir ajuda à polícia para encontrar Storm?

— Algo parecido. Estarei aí assim que puder. Assim que


chegar à delegacia, fique no carro. Não entre sem mim.

— Ok.

♥♥♥

Autumn deu um pulo quando bati em sua janela. Ela


pareceu aliviada quando percebeu que era eu e apertou o
botão para abri-la.

— Importa-se de pegarmos seu carro? — Disse.

— Não, está bem, mas para onde vamos?

— Encontrar Storm.

— Pensei que pediríamos ajuda à polícia?


— Não, este era apenas o lugar mais seguro que conhecia
para colocá-la até que eu pudesse chegar aqui.

— Oh...

Dei a volta no carro e sentei no banco do passageiro.


Autumn olhou ao redor do estacionamento. — Este é o seu
carro ali? — Apontou.

— Sim.

— Legal. Tem certeza que não quer levar o seu?

Coloquei o cinto. — Definitivamente não. Isto se


encaixará melhor. As pessoas neste bairro não confiam em
dois tipos de pessoas – policiais e possuidores.

— Possuidores?

— Sim. Eles se consideram não possuidores e os que têm


são estranhos. Se formos dirigir por aí, seu Hyundai será
menos visível do que meu Mercedes caro.

— Ok.

Apontei para a rua. — Dirija e vire à esquerda, depois


siga em frente por cerca de oitocentos metros. Começaremos
no parque mais próximo.

Autumn fez o que pedi. Enquanto esperávamos no sinal


vermelho, ela disse — Por que você comprou?

— O quê?
— O Mercedes. Disse que era caro. Por que comprou
então?

— Não comprei. A empresa aluga. Eles nos dão três


opções de carros para que tenhamos uma aparência
adequada quando formos ver um cliente. Não dirijo com tanta
frequência, pois moro e trabalho na cidade e prefiro trens.

— Oh.

Um minuto depois, ela disse — Que tipo de carro


compraria se o estivesse comprando?

— Se estivesse comprando e não planejasse atrair um


cliente?

Ela acenou com a cabeça.

— Um Ford Bronco mil novecentos e setenta.

— Mesmo? Um carro de cinquenta anos? Eu não sei


como é.

— Você já viu o filme Velocidade Máxima?

— Não tenho certeza.

— Bem, é o que Keanu Reeves dirigia. Assisti ao filme


vinte vezes quando foi lançado, só para verificar o carro de
seu personagem.

Ela sorriu. — Esse não é o tipo de carro que esperava


que você cobiçasse.
— Acho que há muito sobre mim que descobrirá esta
noite que não esperava. — Apontei para frente. — Pare na
frente das lojas.

— Perto daquele grupo de caras?

— Sim.

Autumn fez o que pedi, mas quando estacionou o carro,


ia desligar a ignição.

— Mantenha-o funcionando. Só vou demorar um minuto.

— Eu quero ir com você.

— Você não vai comigo.

— Por que não?

— Pode simplesmente confiar em mim?

Ela suspirou. — Está bem, está bem. Vou esperar no


carro.

Abri minha porta e voltei antes de sair. — Tranque as


portas atrás de mim.

Havia três caras em frente a uma mercearia fechada do


bairro. Eles me olharam quando me aproximei.

— Estou procurando uma criança de doze anos chamada


Storm. Alguma chance de tê-lo visto por aí?
O mais alto dos três ergueu o queixo. — Quem está
perguntando?

— Eu. O meu nome é Decker.

Ele balançou sua cabeça. — Eu não conheço nenhum


Decker.

— Não moro mais no bairro. Eu costumava ficar com


Dario na Cleveland Street e fazer minhas refeições com Bud
quase todas as noites.

O cara coçou o queixo. — Decker, hein? Isso soa familiar.

— Olha, estou tentando encontrar o garoto para mantê-


lo longe de mais problemas do que já tem. — Inclinei minha
cabeça em direção ao carro. — É a sua assistente social no
carro. Está colocando seu pescoço em risco agora por não
ligar dizendo que ele desapareceu de Park House. Se não
encontrá-lo, teremos que reportar, e então estará em uma
merda mais profunda do que precisa.

Dois dos caras se entreolharam e um acenou com a


cabeça. — Não sei se o garoto que está procurando está lá,
mas há um grupo em torno dessa idade que passa o tempo no
lote abandonado na Avenida Belmont. E dê uma olhada atrás
da pizzaria na Jerome Street.

— Obrigado.

Autumn e eu paramos no parque, já que estava no


caminho. Corri e olhei em volta, mas estava vazio, então lhe
dei direções para o lote abandonado que os rapazes da loja
haviam mencionado.

— Conhece este bairro muito bem. Você tinha clientes


aqui quando lidava com crimes de rua?

— Não. Eu mesmo morava aqui.

— Mesmo? Acho que não mencionou isso quando... nos


encontramos para trocar a bagagem.

Olhei e esperei até que seus olhos encontrassem os


meus. — Acho que não mencionou que eu só tinha setenta e
duas horas para lhe contar a história da minha vida porque
você desapareceria.

Ela sorriu tristemente. — Acho que mereço isso.

Ficamos ambos quietos até chegarmos ao


estacionamento abandonado. Mais uma vez, saí sozinho e
troquei algumas palavras com as pessoas que encontrei.
Infelizmente, Storm não estava lá, mas uma das crianças o
conhecia e sugeriu tentar o quarteirão de alguma garota
chamada Katrina, porque Storm “estava caído pela garota”.

Fomos de um lugar para o outro, ao longo de duas horas.


Estava começando a parecer uma tentativa inútil quando
finalmente vi um garoto do tamanho de Storm andando
sozinho em um quarteirão que não deveria estar. Nós
chegamos perto e, com certeza, era ele.
Quando nos aproximamos, Autumn perguntou — Posso
lidar com isso?

Concordei. — Claro. Fique perto do carro, por favor. E se


ele agir como um fedelho e sair correndo, volte para o carro e
me deixe persegui-lo a pé. Combinado?

— Combinado.

Observei do carro enquanto Autumn e Storm falavam.


Parecia que ela o repreendeu bem, e a criança era inteligente
o suficiente para apenas aceitar e não discutir de volta. Ele
subiu no banco de trás, cerca de dez minutos depois,
enquanto Autumn ficava atrás do volante. Eu virei.

— Tenho certeza de que Autumn cobriu a maior parte do


que precisava ser dito, então vou apenas acrescentar duas
coisas. — Contei com meu dedo. — Um, pode não dar a
mínima para o que acontece com você, mas Autumn aqui
pode ser presa por não informar que fugiu. Darei um salto de
fé e assumirei que não sabia disso, mas agora que sabe,
precisa pensar duas vezes sobre como suas ações afetam os
outros, especialmente uma pessoa que é boa para você. —
Storm estava evitando contato visual, então falei com um tom
severo. — Olhe para mim.

Os seus olhos brilharam quando encontraram os meus.

— Com quantas pessoas na sua vida você pode contar?


Tenho um bom pressentimento de que esse número é baixo.
Então, lhe darei alguns conselhos de vida, de homem para
homem – não de advogado para cliente idiota. Quando
encontra uma pessoa que lhe protege, se certifique de
protegê-la. Por isso, de agora em diante, antes de fazer algo
estúpido, aja como um homem e pense nas consequências.
Entendido?

Surpreendentemente, ele não resmungou muito. —


Entendi.

Autumn estava dirigindo, então não podia ver nossa


interação, mas balancei a cabeça em sua direção, esperando
que ele entendesse.

Storm franziu a testa, mas depois de um momento,


falou. — Desculpe, Autumn. Não tive a intenção de causar
problemas para você.

Satisfeito, continuei minha palestra. — E, número dois,


pode ser um garoto durão, mas não anda por essas ruas
sozinho à noite. Você fica com um amigo, ou melhor ainda,
dois ou três deles. Se cresceu aqui, sabe que o que estava
fazendo era estúpido. Pode ter amigos e conhecer os
quarteirões para se manter longe, mas não é seguro aqui
sozinho, não importa o quão durão seja.

Ele não foi tão receptivo a esse comentário, mas pelo


menos não discutiu. Honestamente, metade da dificuldade
para uma criança em sua situação era saber quais batalhas
lutar e a quais se render. Storm era inteligente e descobrira
isso cedo.
— Não me lembro de que lado era a delegacia de polícia
— disse Autumn enquanto dirigia. — Eu viro à direita ou à
esquerda no sinal?

— A delegacia está à direita, mas vá para a esquerda.


Vamos deixá-lo em Park House antes de você me levar de
volta para o meu carro.

— Tudo bem. Posso lidar com isso daqui. Já fiz você sair
tão tarde.

— Estou bem. Prefiro ter certeza de que o gerente da


residência não se precipitou e chamou a condicional, e
também que ninguém lhe incomode.

— Oh, certo. Obrigada.

Park House estava quieto e, felizmente, ninguém havia


chamado a condicional. Então, quando soube que não havia
problemas se formando, esperei do lado de fora para dar a
Autumn e Storm algum tempo para conversar. Senti que ela
queria ter outra conversa franca com ele.

Estava encostado no seu carro quando saiu alguns


minutos depois.

— Está tudo bem?

Ela acenou com a cabeça. — Embora também achasse


que tudo ficaria bem outro dia quando eu o deixei. Eu
simplesmente não entendo o que é preciso para assustá-lo.
— Infelizmente, nada assusta muito uma criança como
ele.

Os olhos de Autumn vagaram silenciosamente pelo meu


rosto. — Parece que está dizendo isso por experiência própria.

— Estou.

Ela fez uma careta que me lembrou por que não falava
muito sobre como cresci. Detestava pena. Esta merda deve
ser guardada para pessoas que não conseguem se conter.

Enfiei minha mão nos bolsos. — Todo garoto maluco que


consegue se levantar da sujeira tem uma pessoa que fez a
diferença em sua vida. Você é a pessoa de Storm. Pode
precisar usar isso a seu favor às vezes.

— O que quer dizer?

— Ele não se valoriza agora, mas te valoriza. Não hesite


em fazer o que fiz no carro – recordá-lo que suas
consequências poderão lhe colocar em apuros ou prejudicá-la
de alguma forma. Ele fará a coisa certa por você, mesmo que
ainda não faça a coisa certa por si mesmo.

— Isso parece muito manipulador para colocar sobre ele.

Sorrio. — Confie em mim, ele está te manipulando mais.

Autumn suspirou. — Obrigada. Não apenas por vir


comigo, mas por me dar algumas dicas sobre o que está
acontecendo na mente de Storm. Eles não ensinam esse tipo
de coisa na escola de serviço social.
— A qualquer momento.

— Eu te devo uma. Não tenho certeza se posso colocar


uma capa e vir em seu resgate como fez por mim esta noite,
mas mantenha meu IOU22 em seu bolso, caso precise de
ajuda com o serviço social em um caso algum dia ou qualquer
outra coisa.

Concordei.

— Vamos — disse. — Vou deixá-lo no seu carro antes


que seja hora de já estar no trabalho.

— A verdade, que tal sairmos para tomar um café ou


uma bebida? Eu não estou cansado.

Autumn mordiscou o lábio inferior. — Eu devo ir.

Teria sido mais inteligente usar seu IOU para que falasse
bem sobre mim com seu namorado, mas em vez disso,
coloquei a mão no bolso e fingi puxar algo. Estendendo minha
mão vazia para ela, disse — Gostaria de sacar este IOU que
está queimando um buraco no meu bolso. — Sorrio. — Tome
um café comigo.
CAPÍTULO 7

Autumn

— Isso é latim? — Os meus olhos seguiram o braço de


Donovan enquanto ele erguia sua bebida.

— É sim.

— O que significa? Se não se importa que eu pergunte.

— De jeito nenhum. Vincit qui se vincit. Traduz-se em


vence quem se vence. Alguém de quem sou próximo
costumava dizer isso o tempo todo quando eu era criança, me
metendo em problemas. Basicamente, significa que se puder
me controlar, posso conquistar qualquer coisa.

— Isso simplifica muito, não é?

Donovan sorriu, mostrando uma de suas covinhas, e isso


desencadeou uma vibração na boca do meu estômago. O seu
sorriso tinha uma espécie de qualidade diabólica espreitando
sob a superfície. Era confiante e de alguma forma
abertamente sexual. Perigoso. Era isso mesmo. Levei meus
olhos para longe de seu rosto, apenas para vê-los pousar em
seus antebraços. Isso certamente não ajudou muito minha
situação. Eram tão musculosos e bronzeados, e todas as
tatuagens tornavam todo o pacote insanamente sexy.
— Sabe, você fica muito diferente de jeans e camiseta do
que de terno e gravata.

Os seus olhos percorreram meu rosto. — Oh sim? Qual


gosta mais?

Esta foi uma pergunta difícil, como ter que decidir entre
trufas de chocolate ao leite Godiva ou amargo; ambas eram
deliciosas. Embora houvesse algo perigoso para a minha
sanidade mental sobre um homem que parecia tão bom
quanto Donovan em um terno sob medida e tinha todas
aquelas tatuagens escondidas por baixo, mas não achei
inteligente compartilhar esses pensamentos, então dei de
ombros e voltei a saborear minhas batatas fritas.

Quando olhei para cima, encontrei Donovan me olhando


como se eu tivesse duas cabeças. — O quê? — Limpei meu
queixo e olhei para minha camisa. — Derramei alguma coisa
ou algo assim?

O seu rosto era uma mistura estranha de divertido e


enojado. — Você acabou de mergulhar sua batata frita no seu
shake de chocolate e comê-la?

— Oh. — Rio. — Acho que sim.

— Isso é nojento.

— Você já experimentou?

— Não.

— Então como sabe que é nojento? Você pode adorar.


Donovan sorriu enquanto tomava um gole de seu milk-
shake de chocolate. — Nunca comi merda de cachorro
também. Tenho certeza de que há algumas coisas que não
precisa experimentar para saber que não terão um gosto bom.

— Tanto faz. — Dei de ombros. — Não sabe o que está


perdendo.

Donovan e eu tínhamos ido a uma lanchonete vinte e


quatro horas para tomar café, não muito longe de Park House,
mas eu estava com um pouco de fome, já que não tinha
jantado, então decidi pedir um shake com batata frita,
enquanto ele optou por apenas um shake. Vir aqui com ele
provavelmente foi uma coisa estúpida de se fazer, mas como
poderia dizer não depois que ele passou horas vasculhando as
ruas para encontrar Storm comigo? Pelo menos foi por isso
que disse a mim mesma que concordei em vir. Não tinha nada
a ver com o quão bonito o homem sentado à minha frente era,
ou quão forte a atração magnética em sua direção me
agarrava.

— Você sabia que as batatas fritas são um dos alimentos


mais caros da Venezuela? — Apontei-lhe uma batata frita. —
O McDonald's até os tirou do cardápio por um tempo.

— Não sabia disso. Você foi para a Venezuela


recentemente?

Balancei minha cabeça. — Li uma vez quando estava


procurando algo.
Ele sorriu. — Deixe-me adivinhar – alguém mencionou
que as batatas eram o alimento mais rico em amido, e isso a
fez cair na toca do coelho do Google. Senti falta das suas
análises e curiosidades aleatórias.

Coloquei minha língua para fora porque, bem, ele estava


certo. Descobri isso em uma de minhas quedas na toca do
coelho da pesquisa, então não tive resposta.

Os olhos de Donovan caíram para minha boca. — Você


não deve colocar essa coisa para fora, a menos que esteja
planejando usá-la. — Ele piscou.

Rio, mas também engoli o suficiente do meu shake para


congelar o cérebro, porque precisava me acalmar. Mexendo o
que restava no meu copo com o canudo, disse — Então...
espero não ter interrompido nada quando liguei esta noite. É
noite de sábado e tudo.

Ele sorriu. Deus, ele realmente precisa parar de fazer


isso.

— Está me perguntando se eu estava em um encontro?

— Não — disse defensivamente. — Eu só estava dizendo


que espero não ter interrompido nada de bom.

— Interrompeu.

Fiz uma careta, sentindo uma pontada inesperada de


ciúme. — Oh, desculpe.
Donovan se inclinou, seu sorriso malicioso se alargando.
— Tinha um encontro ardente planejado com o Bruce Willi, e
quanto a você? Algum plano estragado para esta noite?

Balancei minha cabeça. — Apenas uma noite de


encontro com The Bachelor.

O nariz de Donovan torceu-se. — Você gosta desse


programa?

— Estou viciada – tanto que não consigo lidar com o


estresse de assistir uma vez por semana e esperar para
descobrir o que aconteceu. Eu os gravo e não começo até que
possa passar uma noite inteira comendo os episódios. A
minha amiga Skye e eu assistimos juntas.

Ele deu uma risadinha. — Acho engraçado quando as


mulheres falam sobre as pessoas naquele programa como se
fossem reais.

— O que quer dizer “como se fossem reais”. Elas são


reais.

— Não acha que programas como este são roteirizados?

— Não diga isso!

Ele riu. — Acabei de dizer à Autumn, de oito anos, que


Papai Noel não existe?

— Bem, mesmo que tenha um roteiro, é melhor do que –


qual herói de ação envelhecido disse que assistiria? Bruce
Willis ou Tom Cruise?
— Bruce.

— Esses filmes são mais falsos do que The Bachelor. A


maioria dos atores nem mesmo faz suas próprias cenas de
ação.

Os olhos de Donovan piscaram em meus lábios por um


momento. Foi menos de um segundo – poderia ter piscado e
perdido – mas aquela fração de segundo desencadeou um
frenesi de borboletas no meu estômago. Isto, esta foi a razão
de ter feito algo que nunca fiz antes e passado um fim de
semana inteiro com um homem que mal conhecia. Nós
apenas tivemos que olhar um para o outro, e faíscas voaram.
Senti necessidade de mudar de assunto, mas, sério, o que é
mais seguro do que falar de filmes de ação?

— De qualquer forma... — disse. — Estou feliz por não


ter interrompido nenhum grande plano que tivesse para esta
noite.

Ele acenou com a cabeça, e então o silêncio caiu


enquanto me observava. Tive a nítida sensação de que ele
estava debatendo em dizer algo, e quando finalmente falou,
percebi que estava certa.

— Então... o Dickster23. Há quanto tempo está


acontecendo?

Mexi meu shake novamente para evitar contato visual. —


Não muito tempo. Mais ou menos um mês.
Ele assentiu. — Acho que as coisas mudaram no último
ano, então?

As minhas sobrancelhas se juntaram. — O que quer


dizer?

— Depois de nossa troca de bagagem, você desapareceu


porque só queria o que tínhamos – um fim de semana, não
um relacionamento, e agora está em um.

— Não estou em um relacionamento sério com Blake.


Estamos apenas saindo.

— Mesmo assim, deu a ele o seu número de telefone e


deixou que a visse mais de uma vez...

— É diferente.

— Como?

— Bem, Blake e eu só nos vemos realmente uma vez por


semana, se tanto. Mantemos as coisas simples. Ele é
divorciado com filhos e não está procurando nada
complicado.

— Eu teria mantido as coisas simples, se fosse isso que


queria.

— Mesmo? Porque eu não teria sido capaz.

— Por que não?


— Não sei. — Balancei minha cabeça. — O tempo que
passamos juntos contudo não me pareceu algo simples. Foi
para você?

Ele me estudou. — Não, mas isso não significa que teria


te pressionado por mais do que estava pronta para dar.
Trabalho de oitenta a noventa horas por semana na maioria
das semanas, de qualquer maneira.

Suspirei. — Eu apenas prefiro manter as coisas


descomplicadas.

— Então, as coisas com Dickson... são descomplicadas?

— Sim.

— E isso significa...

— Não sei. Acho que significa que não preciso me


preocupar com o fato de qualquer um de nossos sentimentos
se tornar excessivo.

Donovan coçou o queixo. — Deixe-me ver se entendo


isso. Gostou de mim e se divertiu naquele fim de semana que
passamos juntos, mas pensou que um de nós ou ambos
podíamos desenvolver sentimentos. Você não precisa se
preocupar com isso com Dickson, então continua saindo com
ele.

— Bem... sim.

— Você, então só sai com homens de quem realmente


não gosta?
— Eu, uhh... não... quero dizer... bem. — Balancei a
minha cabeça. — Pare de me advogar. Você está me deixando
confusa com o que estou dizendo.

Donovan sorriu e balançou a cabeça. — É realmente


uma pena estar deste lado.

— Qual lado?

— A besteira não-é-você-sou-eu. Normalmente sou eu


que estou desviando como está agora.

— Eu não estou desviando. Estou tentando ser honesta


com você.

Os seus olhos, novamente caíram para meus lábios. Só


que desta vez, demoraram muito mais. Quando finalmente se
levantaram para olhar para o meu rosto, parecia que ele podia
ver através de mim. — Então, ambos não são exclusivos, é
isso?

— É exclusivo para mim.

Ele apertou os olhos. — E não é para ele?

Dei de ombros. — Talvez seja. Não tenho certeza. Nunca


discutimos isso, mas prefiro apenas... sabe... com uma
pessoa de cada vez.

A mandíbula de Donovan flexionou e sua pele bronzeada


pareceu ficar um pouco mais escura. Ele deu um breve aceno
de cabeça. — Entendido.
Poucos minutos depois, a garçonete veio verificar como
estávamos. Quando disse que não queria mais nada, Donovan
pediu a conta. Já era tarde, mas tive a sensação de que seu
desejo repentino de encerrar a noite não tinha nada a ver com
o tempo.

Depois de discutirmos a conta e Donovan pagar, fomos


para o meu carro. A viagem de volta para a delegacia de
polícia foi tranquila, mas o ar parecia cheio de palavras não
ditas. Parei ao lado de seu carro e estacionei o meu.

— Bem, obrigada novamente por esta noite. Realmente


aprecio tudo o que fez por Storm.

— Não é um problema.

Donovan abriu a porta do carro e se virou para me


encarar assim que saiu. As luzes do estacionamento
lançavam um brilho suave e amarelado em seu rosto bonito.
Olhou para mim por um momento e então lentamente – como
se me dando tempo para detê-lo – estendeu a mão e segurou
minha bochecha, acariciando minha pele com o polegar. O
meu coração ricocheteou no meu peito.

— Por que parece tão errado sair deste carro sem te dar
um beijo de boa noite? — Os seus olhos mais uma vez caíram
para os meus lábios, e não pude controlar o quão rápido meu
peito começou a subir e descer.

— Eu... eu não sei.


Ele se inclinou lentamente. Pensei no começo que ele iria
fazê-lo realmente, mas no último momento mudou e seus
lábios foram para o meu ouvido. — Você me pararia se o
fizesse?

Naquele momento, absolutamente não teria parado. Pior,


parte de mim queria que ele fizesse. Muito. Segurei minha
respiração, esperando por isso mesmo, mas quando não disse
nada, Donovan se afastou e procurou meus olhos. Acariciou
minha bochecha uma última vez antes de se afastar.

— O que há entre nós pode não ser simples, mas


também não acabou. Volte para casa em segurança, Red.
CAPÍTULO 8

Donovan

Estar no antigo bairro na última semana me lembrou de


que fazia muito tempo desde que parei para ver Bud. Bud –
nome verdadeiro Frances Yankowski – era a coisa mais
próxima de um pai que já conheci. Se estou sendo real, era a
coisa mais próxima de uma mãe também. Então, na noite
seguinte, em vez de ir para casa depois de sair do escritório,
voltei para o Brooklyn e parei em um comércio local para
descobrir onde Bud abriu uma loja por esses dias. Entrei em
uma mercearia de esquina que estava lá desde que eu era
criança, embora nunca tivesse visto a mulher atrás do balcão
antes.

— Oi. Pode me dizer como chegar à Bud’s Flower Shop,


por favor? — Esse era o código para Onde Bud está ocupando
hoje para alimentar a comunidade à noite? Todas as empresas
locais sabiam a resposta e nunca se importaram em ajudar a
espalhar a palavra. Pelo menos não se importavam em
compartilhar as informações com pessoas que pareciam que
precisavam de uma refeição grátis.

A caixa porém me olhou de cima a baixo e franziu a


testa.
Sim, eu sei. Não mudei minhas roupas de trabalho. A
maioria das pessoas o julga porque usa roupas de segunda
mão com buracos, mas não no meu antigo reduto. Entrar com
ar de quem faz compras na Brooks Brothers24, certamente
irritará alguém.

— Rua Carnie, número quatrocentos e sessenta e dois.


— Ergueu o queixo para os corredores atrás de mim. —
Parece que talvez possa se dar ao luxo de levar uma
sobremesa ou algo assim.

— Boa ideia. — Sorrio e peguei meia dúzia de pacotes de


biscoitos da prateleira e os levei até a caixa registradora para
pagar. — Tenha uma boa noite.

Quando cheguei ao endereço que a mulher me deu, as


pessoas estavam entrando e saindo de uma casa dilapidada
com janelas fechadas com tábuas, então sabia que era o lugar
certo. Bud servia um jantar comunitário sete dias por semana
em qualquer prédio ou estacionamento abandonado que
pudesse encontrar. Às vezes, ficava em um local por meses,
outras vezes era expulso depois de apenas um ou dois dias.
As pessoas que normalmente faziam mal a ele eram os
proprietários que deixaram o prédio ficar tão degradado que
não era mais alugável, ou o banco que havia retomado a
propriedade. Policiais faziam vista grossa para Bud. Ao longo
dos anos, até os vi deixar pessoas que tinham recolhido e que
precisavam de uma refeição.
Para seu trabalho diurno, Bud possuía uma rota de
provisões Boar's Head25. Todas as manhãs, entregava carnes
frescas em delicatesse, restaurantes e supermercados, mas
também pegava a comida prestes a expirar, que transformava
em um banquete diário para alimentar os famintos e
desabrigados da comunidade, mas ninguém comia de graça
mais de uma vez. Sem exceções. Tinha que trabalhar para
Bud a fim de a ser alimentado, quer ajudasse a cuidar de seu
jardim, carregasse e descarregasse seu caminhão cheio de
suprimentos ou ajudasse a cuidar do gramado dos
restaurantes que o ajudavam. Bud era o coração desta
comunidade, e também era a única maneira de eu comer uma
refeição decente na maior parte do tempo quando minha mãe
partiu.

Entrando na casa decadente, caminhei até a fileira de


mesas onde Bud estava servindo comida esquentada em
pequenas chapas elétricas de fogão. Podia estar perto dos
setenta agora, mas era astuto e nunca perdia nada. Não
pensei que ele tivesse me notado entrar, até que resmungou
sem olhar para cima.

— Jesus Cristo, você parece um narc. — Bud acenou


com a colher de servir em sua mão, apontando para o meu
terno.

Eu rio, se estivesse usando uma roupa de empregada


doméstica francesa, minhas bolas estourariam menos por
aqui. — É bom ver você também, Bud.
Ele acenou com a cabeça em direção ao lugar vazio ao
seu lado atrás da mesa de serviço. — Vista um avental,
garoto. Posso precisar de ajuda, mas não quero que bagunce
essa roupa de macaco.

Treze ou trinta, não importava. Faço tudo o que o velho


diz. Por isso, durante a hora seguinte, servimos o jantar lado
a lado, falando merda enquanto servíamos macarrão
primavera, brócolis e pão de um ou dois dias que havia
transformado em torrada de alho. Perguntei-lhe sobre suas
amadas plantas, e tagarelou sobre algumas novas sementes
variegadas de tomate que estava cultivando e que foram
desenvolvidas no México. A maneira como disse isso me
mostra que eu deveria ficar impressionado. Às sete e meia em
ponto, desligamos as chapas quentes, que entravam e saíam
todos os dias para que ninguém pudesse roubá-las, e levamos
dois pratos de comida para a varanda da frente e nos
sentamos para comer.

— O que há de novo na terra dos mandas-chuvas?


Conseguiu escapar daqueles idiotas do esquema Ponzi26 que
ultimamente roubam as economias da aposentadoria das
pessoas?

— Felizmente, não. — Enfiei uma garfada cheia de


macarrão na boca. Era provavelmente a coisa mais saborosa
que comi em meses. Bud não brincava quando se tratava de
cozinhar ou de suas plantas. Limpei o molho da boca. —
Como está o seu joelho?
— Está aguentando. A umidade está baixa, então isso
ajuda. Não tenho ideia de por que a Flórida é a terra dos
velhos. O calor seco é muito mais fácil para os ossos velhos.

Bud me contou todas as últimas fofocas da vizinhança –


quem estava brigando com quem e quem foi pego fazendo o
quê. Eu lhe disse que parei para ver Dario outro dia e, antes
que percebesse, éramos os dois únicos restantes na casa.

— Beleza... — Ele se levantou. — Acho que é melhor


irmos antes que os drogados fiquem irritados por estarmos no
seu berço.

Eu sorrio. — Vou carregar sua van.

Empacotei todos os suprimentos e tranquei a parte de


trás da van de Bud com a mesma corrente enferrujada e
cadeado que usava desde que eu era criança. Ainda
segurando, disse — Acho que talvez seja a hora de uma nova
fechadura.

— Por que? Essa está quebrada?

— Não, mas está enferrujada “pra” caralho. Um dia a


chave não vai girar mais.

Bud encolheu os ombros. — Este então será o dia em


que procuro uma nova fechadura.

Apertamos as mãos ao lado da van. — Se não estiver


ocupado neste fim de semana — disse — preciso consertar o
jardim. Poderia usar um par de mãos extras.
— Sábado ou domingo?

— Sábado. Tenho planos com minha amiga no domingo.

Merda. Precisava trabalhar no sábado – manter meu


faturamento alto. Eu teria que ir até o raiar do dia, mas
encontraria uma maneira de fazê-lo. — Que horas? —
Perguntei.

— Duas soa bem para mim. Quando terminar, pode me


ajudar a preparar o serviço de jantar da noite.

Eu concordei. — Soa bem. Vejo você no sábado.

Comecei a me afastar, mas voltei. — Ei, se importa se eu


levar alguém?

Bud encolheu os ombros. — Ele tem braços e sabe usar


uma pá?

— Ele tem braços, e posso ensiná-lo a usar uma pá se


não souber. É um cliente meu de doze anos. Infelizmente, a
criança me lembra muito eu mesmo nessa idade.

— Oh, senhor. — Bud balançou a cabeça. — Não tenho


certeza se posso lidar com dois de vocês, mas sim, tudo bem.
Traga-o.

♥♥♥
— Pá? Acabou de dizer à Sra. Benson em Park House que
íamos ao seu escritório para conversar sobre estratégia.

— Bem, isso não foi uma mentira total. Considero onde


quer que eu esteja, meu escritório, e queria discutir seu caso
por alguns minutos em algum momento hoje.

— Por que porém vai cavar a sujeira de alguém?

Olhei para Storm e de volta para a estrada. — Não vou.

— Você acabou de dizer que íamos à casa de um cara


para cavar seu antigo jardim para que pudesse preparar para
plantar um novo. Isso não é cavar na sujeira?

— Sim, mas você perguntou por que eu estava indo


escavar a terra. Eu não vou. Nós vamos.

Storm me olhou como se eu tivesse duas cabeças. — Não


vou limpar sujeira.

— Quer apostar?

— Que porra é essa?

Apontei para ele. — Cuidado com a língua. Bud fará você


picar uma dúzia de cebolas, mesmo que não precise delas
cortadas, se falar assim. Além disso, tenha algum respeito.
Sou mais velho que você e também sou seu advogado.

— Se é meu advogado, deveria me libertar em vez de me


levar para cavar sujeira.
Eu tive que me impedir de rir alto. Esse garoto era tããão
eu aos doze anos. Razão pela qual sabia que ele precisava de
um homem como Bud em sua vida.

— Você sabe sobre o jantar gratuito que está aberto as


pessoas em seu antigo bairro?

— Você quer dizer o velho que alimenta os drogados?

— Seu nome é Bud, e não apenas alimenta pessoas com


problemas de dependência. Qualquer pessoa que estiver com
fome pode comer uma refeição quente dele todas as noites. É
o seu jardim que vamos revirar.

Storm encolheu os ombros. — Tanto faz. Por que temos


que ajudar?

— Porque se não ajudar a plantar as árvores, não merece


ficar na sombra.

O seu rosto se contraiu. — Também plantaremos


árvores?

Eu sorrio. — Não. Só quis dizer que tem que retribuir às


pessoas que dão na vida.

— Por quê?

— Muitos motivos. Ajudar outras pessoas que precisam


de ajuda. Fará você se sentir bem consigo mesmo. Ensina-o
valores.
Storm praticamente se desligou. Olhou ao redor da frente
do meu carro. — Isto é madeira verdadeira?

Eu concordei. — É nogueira.

— Você, então ajuda a plantar árvores e faz com que as


pessoas as derrubem para colocá-las dentro do seu carro
luxuoso.

Não consegui esconder meu sorriso dessa vez. — É um


espertinho.

Storm apontou o dedo para mim. — Cuidado com a


linguagem ou cortará cebolas.

Este seria um longo dia.

♥♥♥

— Então, qual é a sua história? — Bud estava na janela


dos fundos de sua casa, observando Storm enquanto
trabalhava no jardim.

Lavei minhas mãos na pia da cozinha. — Mora em Park


House. Muito esperto, pais inúteis, e usa os punhos para
expressar sua raiva.

Os olhos de Bud encontraram os meus brevemente antes


de ele voltar a olhar para fora. — Parece um menino que
conhecia.
Enxuguei minhas mãos, enchi dois copos com água fria e
fui ficar ao seu lado na janela. — Sim. — Entreguei-lhe um
copo. — Ele poderia definitivamente poderia usar alguma
orientação.

Bud bebeu sua água. — Drogas?

Balancei minha cabeça. — Erva. Nada mais que eu


saiba.

— Bem, isso é bom. Alguma família de que se possa


falar?

— A mãe está viva, mas nem apareceu para visitá-lo no


seu aniversário. Ela é uma viciada.

Bud franziu a testa. A sua filha era viciada. Ele a perdeu


para uma overdose no mesmo ano em que nasci. Não era algo
que falava com frequência, mas eu sabia que era parte de
como começou a alimentar as pessoas. Costumava arrastá-la
para fora do tipo de edifício em que passava as noites agora.
Frequentemente, quando ia procurá-la, via crianças famintas
sentadas enquanto seus pais exaustos usavam o pouco
dinheiro que tinham para comprar mais drogas. Alimentando
a vizinhança e passando um tempo nos lugares que passava
sempre me pareceu parte punição e parte penitência – por
não ser capaz de salvar sua filha.

— Ele tem uma assistente social em quem parece confiar


— disse. — Autumn.
Bud acenou com a cabeça. — É bom que tenha alguém.
Embora ambos saibamos que as pessoas do serviço social
tendem a entrar e sair muito rápido. Um dia estão aqui, no
próximo se foram, e então uma criança como Storm se sente
abandonada de novo.

Eu sabia que isso era verdade, então evitei mencionar


que sua assistente social já havia deixado uma criança como
Storm se sentindo abandonada – eu.

Storm terminou a última remodelação do jardim,


enquanto Bud e eu começamos a nos preparar para seu
serviço de refeição noturno. Saí para ligar para Park House,
depois que nós três terminamos, e avisar a gerente que levaria
Storm para jantar e que o levaria de volta depois. Ela claro,
estava bem com isso, já que os advogados estavam na lista de
visitantes aprovados que poderiam tirar as crianças do prédio.
Isso também deixou uma pessoa a menos com que se
preocupar.

Quando voltei para dentro, pedi a Storm que me


ajudasse a começar a carregar a van de Bud. — Pensei que
hoje à noite poderíamos ajudar a servir o jantar com Bud.

Storm encolheu os ombros. — Tudo bem.

Ele nunca diria, mas tinha certeza de que realmente


gostou de trabalhar no jardim esta tarde.

— Bud é abreviação de quê? — Perguntou enquanto


caminhávamos de volta para a casa. — Budrick ou algo
assim?

— O nome de Bud é na verdade Frances. Todo mundo o


chama de Bud27 por causa de seu jardim – como os brotos de
plantas. O homem pode cultivar qualquer coisa.

Storm balançou a cabeça. — Frances é pior do que


Augustus.

Baguncei o cabelo de Storm quando abri a porta. — Vá


se lavar, Augustus.

♥♥♥

O dia tinha corrido melhor ainda do que esperava. Storm


tinha baixado a guarda, e eu tinha certeza de que estava
chocado ao ver algumas pessoas que conhecia no serviço de
jantar, incluindo um de seus amigos do bairro.

Fui até Park House e estacionei o carro. — Disse à


gerente com quem falei antes, que iria levá-lo para jantar —
disse. — Não mencionei onde íamos comer.

Storm sorriu. — Está me dizendo para mentir?

— Absolutamente não. Se alguém perguntar, conte a


verdade. Estava apenas avisando que não elaborei sobre onde
foi o jantar, então, se não vier à tona, não veio à tona.
O sorriso de Storm se alargou. — Então... não minta,
mas omita alguns dos detalhes.

Empurrei seu ombro. — Não seja a porra de um pé no


saco.

Ele deu uma risadinha. — Direi a Bud que você disse


saco, então terá que picar cebolas.

Saímos do carro e caminhamos em direção à entrada. —


Seja legal, ou não terá a oportunidade de aceitar a oferta de
Bud.

Bud perguntou a Storm se ele poderia estar interessado


em uma velha bicicleta que tinha em sua garagem em troca
de pintar a cerca de seu quintal.

— Pode me levar lá no próximo fim de semana para que


eu possa começar a pintar?

Concordei. — Deixe-me falar com Autumn e ver o que ela


diz.

Fiz o check-in de Storm, dentro da Park House, na


recepção. Ele me surpreendeu quando estendeu a mão. —
Obrigado — disse.

Sorrio enquanto nos cumprimentávamos. — Sem


problemas.

O caminho de volta para o carro, me senti muito bem.


Fazia muito tempo que não passava um tempo com Bud.
Além disso, tive a sensação de que talvez Bud pudesse usar
um Storm em sua vida quase tanto quanto Storm poderia
usar um Bud.

Havia em seguida, o bônus adicional – tinha um motivo


para ligar para Autumn amanhã.
CAPÍTULO 9

Donovan

— Está tudo bem? — A minha assistente perguntou


quando finalmente entrei no escritório no meio da tarde. —
Achei que estaria de volta em algumas horas.

Suspirei. — Sim, eu também. O juiz O'Halloran negou a


moção do queixoso para uma continuação, então acabamos
iniciando o julgamento. Tenho sorte de meu argumento de
abertura estar pronto.

— Oh, uau. Sim, ainda bem. — Ela apontou para a porta


do meu escritório. — As suas mensagens estão a sua mesa,
mas uma mulher ligou duas vezes. Não acho que fosse uma
cliente porque não reconheci o nome e, quando lhe perguntei
a que se referia, disse que era pessoal. — A minha assistente
estremeceu. — Ela me parecia meio chateada e frustrada,
então talvez queira ligar de volta primeiro.

A minha testa se enrugou. Não tinha irritado nenhuma


mulher ultimamente, pelo menos que eu soubesse. — Qual
era o seu nome?

— Autumn Wilde. O seu número está em sua mesa.


Merda, no que Storm se meteu agora? E eu aqui
pensando que tinha me aproximado dele um pouco ontem.

Tirei meu paletó e o joguei nas costas da cadeira. Antes


mesmo que tivesse tempo de olhar para a pilha de mensagens
sobre a minha mesa, minha assistente apareceu no meu
escritório. — Umm... tem uma chamada na linha um.

Balancei minha cabeça. — Diga que ligarei de volta.


Preciso de um minuto para me organizar.

— É Autumn Wilde de novo.

Concordei. — Vou atender. Pode fechar a porta, por


favor?

Sentando a minha mesa, peguei o receptor e apertei a


linha um. — Autumn, o que está acontecendo?

— Por que você não me ligou de volta?

— Porque estive no tribunal toda a manhã e tarde. O que


aconteceu? Storm teve problemas de novo?

— Não, mas tenho certeza de que é apenas uma questão


de tempo, levando em consideração que você o leva para sair
com viciados em drogas.

A minha cabeça recuou. — O quê?

— Por que acha que levar uma criança problemática de


doze anos a um prédio abandonado cheio de viciados em
drogas seria uma boa ideia?
Levantei minha mão, embora obviamente não pudesse
me ver. — Espere um segundo. Acho que você só tem metade
da história.

— Mesmo? Então não levou Storm para um prédio


abandonado ontem à noite? Um que foi fechado com tábuas?

— Eu levei, mas ...

— E o prédio não estava cheio de viciados em drogas e


moradores de rua? Ah, e um cara chama a si mesmo de Jesus
e se ofereceu para que Storm se juntasse a seus discípulos?

Balancei minha cabeça. — Artemis é inofensivo. É um


pouco doente mental, mas nunca fez mal a ninguém.

— Sério, Donovan? Um pouco doente mental? Que


diabos?

— Escute, sei que parece ruim, mas você está


entendendo tudo completamente fora do contexto. Storm lhe
disse por que estávamos lá, ou sobre Bud?

— Storm não me disse nada. Quando o vi hoje cedo,


perguntei como foi seu fim de semana, e apenas deu de
ombros e disse que estava bem. Ele, aparentemente, estava se
gabando para algumas crianças porém sobre ficar em uma
casa de crack, e um dos meninos mais novos foi inteligente o
suficiente para vir me contar – principalmente porque admira
Storm, e a mãe do garoto morreu de overdose de drogas, por
isso estava preocupado.
Merda. Esfreguei meu rosto com as mãos. — OK.
Realmente não é o que parece. Levei Storm para conhecer
Bud – um local que serve um jantar noturno na comunidade.
Eu o conheço há mais de vinte anos. É um cara bom, e Storm
nunca ficou fora da minha vista, nunca esteve em perigo.
Juro.

— Se nunca esteve em perigo, e o lugar para onde o


levou era um lugar tão honesto, então por que mentiu para a
gerente da casa?

— Eu não menti. Eu disse que estava levando-o para


jantar.

— Não me advogue, Donovan. Omitir informações é tanto


uma mentira quanto contar uma mentira descarada – porque
não está divulgando a história verdadeira. Pode ser
perfeitamente aceitável em sua linha de trabalho, mas não é
na minha, ou na vida em geral.

Passei a mão pelo cabelo. — Olha, sinto muito. Eu não


queria te aborrecer. Realmente acho que Bud pode ser bom
para Storm. Planejava ligar para você hoje, mas o tribunal
demorou muito. Bud ofereceu um emprego a Storm, e acho...

— Um trabalho? Fazendo o quê? Vendendo drogas?

Suspirei. Autumn tinha uma imagem na cabeça, e não


seria capaz de mudá-la a menos que visse a história real por
si mesma. Olhei para o meu relógio. Passava um pouco das
cinco. — Você já jantou?
— Não, mas o que isso...

Eu a interrompi desta vez. — Bom. Não jante. Pego você


em uma hora. Podemos discutir isso durante uma refeição.

— Eu não vou jantar com você!

— Não se iluda. Não é um encontro. Bud fica insultado


se o visitar e não comer sua comida. Precisa então comer para
ver para onde levei Storm. Precisa ver por si mesma. Envie-
me o seu endereço.

♥♥♥

— E então, quando tinha treze anos, roubou um Cadillac


e bateu em um carro da polícia.

Levantei as minhas mãos. — Eu não roubei o carro. O


irmão de Jimmy Lutz comprou por cem dólares.

Bud balançou a cabeça. — Comprou um Cadillac de um


ano de idade em bom estado por cem dólares, e ele e seu
amigo idiota pensaram que eram honestos, então o levaram
para um passeio. Andaram três quarteirões e bateram bem na
parte de trás de um carro da polícia.

Autumn riu. Ela praticamente tinha um sorriso no rosto


desde o minuto em que nos sentamos com Bud. Tinha
esquecido o quão encantador o velho poderia ser, e esperava
que ele continuasse contando histórias – nem me importava
se me faziam parecer uma idiota total – porque olhar para o
sorriso no rosto de Autumn superou minha necessidade de
parecer legal de lavada. Autumn me pegou olhando para ela e
seus olhos se estreitaram por um segundo – como se estivesse
tentando descobrir o que estava acontecendo em minha
cabeça. Eu felizmente lhe contaria, mas provavelmente levaria
um tapa. A verdade, foi sua culpa. Porque, como ela poderia
esperar que eu visse seus lábios se curvarem de alegria e não
me lembrasse de como fizeram a mesma coisa quando a
peguei no fim de semana que passamos juntos?

Algumas mulheres fazem caretas estranhas quando


chegam ao orgasmo – olhos bem fechados, boca contorcida
como se tivessem acabado de chupar um limão. Estive com
uma mulher que logo antes de gozar, toda a cor sumiu de seu
rosto e seus olhos ficaram arregalados, e então a sua boca se
abriu para um grito silencioso. A primeira vez que o vi, pensei
que poderia haver um assassino de machado acima de mim
prestes a me cortar o crânio. Não com Autumn porém, ela
sorriu durante o orgasmo, e foi fenomenal “pra” caralho.

Depois que Bud contou mais algumas histórias sobre


como eu era uma criança horrível, pediu licença para falar
com outra pessoa.

Balancei a cabeça em direção ao cara de cabelos


compridos e aparência hippie usando jeans rasgados, que
poderia se passar por um dos sem-teto que veio comer. —
Este é o pastor da igreja episcopal local. Bud não permite que
ninguém entre e pregue – seja um conselheiro de dependência
ou um membro do clero, mas mantém contato com todos os
líderes da igreja local. Se há algo acontecendo nesta
comunidade, a equipe sabe sobre isso.

Autumn observou Bud cumprimentar o pastor e ambos


os homens saíram juntos. — Ele é incrível. Não posso
acreditar que ele só perdeu quatro dias servindo o jantar em
vinte e seis anos. Nunca fica doente?

— Sinceramente, não consigo me lembrar de ele ter


ficado doente, pelo menos não o suficiente para mantê-lo
abatido. Embora não tenha certeza de que algo poderia
manter aquele homem no chão, exceto talvez uma corda e
algumas correntes. — Zombei. — Mesmo assim, encontraria
uma maneira.

— Desculpe-me, tirei conclusões precipitadas sobre você


trazer Storm aqui. Eu não tinha ideia de que tantas lições
poderiam ser ministradas em um lugar como este.

— Está tudo bem. Deveria tê-la avisado, mas só


planejava levá-lo para conhecer Bud, não trazê-lo para jantar
aqui. Eu nem tenho certeza do que esperava que acontecesse
ao trazê-lo para a casa de Bud. Acho que sinto que Bud me
salvou, então talvez um pouco disso possa passar para Storm.

Autumn sorriu calorosamente. — Acho que a sua mãe


pediu para você se voluntariar com Bud porque se meteu em
problemas quando era adolescente?
Empurrei o milho no prato com o garfo. — Voluntário?
Não exatamente. Comecei a trabalhar para Bud porque estava
com fome.

O sorriso de Autumn murchou. — Oh, me desculpe. Eu


apenas presumi...

— Está tudo bem. Não precisa se desculpar. Não tenho


vergonha de onde vim ou das coisas que tive que fazer para
comer. Não mais, de qualquer maneira. Só não falo sobre elas
com frequência porque, uma vez que as pessoas sabem que
sua mãe era uma prostituta e às vezes desaparecia por dias
ou semanas, deixando uma criança de oito anos sozinha,
olham para você de maneira diferente.

O rosto de Autumn suavizou. Apontei-lhe com o meu


garfo. — Tipo assim, me olham exatamente assim.

Ela sorriu. — Desculpe. Você tem alguma outra família?

— Apenas Bud. A minha mãe ainda está viva – pelo


menos da última vez que fez contato para pedir dinheiro ela
estava. O meu pai era um John28. A minha mãe não tinha
ideia de qual e não parecia pensar que era importante de
qualquer maneira. Ambos os meus avós morreram antes de
eu nascer. Tiveram minha mãe tarde na vida e, pelo que sei,
era filha única. Embora metade das coisas que saem da boca
da minha mãe sejam mentiras, é possível que eu tenha
alguns parentes de sangue em algum lugar. Poderia ser
parente da Rainha da Inglaterra, pelo que sei.
Autumn ficou quieta por um momento. — É engraçado.
Você é como uma cebola. A primeira vez que nos encontramos
naquele café, pensei que tinha decifrado você.

— Decifrado como o quê?

Encolheu os ombros. — Achei que fosse como a maioria


dos homens com quem cresci em Old Greenwich, Connecticut
– inteligente, educado, rico, uma espécie de colher de prata29.
Sabe, ir para Harvard e usar camisas e botões de punho feitos
sob medida, embora os trinta minifrascos de shampoo e
condicionador e outras coisas que estavam em sua mala
realmente me confundissem.

— Isso faz de nós dois, então. Estava confuso sobre por


que você precisava de quatro vibradores gigantes em sua
bolsa.

As bochechas de Autumn ficaram rosadas. Ela cobriu o


rosto com as mãos. — Oh meu Deus. — Riu. — Eu posso
explicar isso...

— Eu meio que descobri quando tomamos café, e você


mencionou que tinha acabado de voltar de uma festa de
despedida de solteira e tinha algumas decorações
embaraçosas na sua mala. A menos que, normalmente
carregue isso com você. — Levantei meu queixo em direção a
sua bolsa. — Há um aí agora?

— Não! — Riu. — Deus... estou feliz que pelo menos


éramos bisbilhoteiros, então.
— A verdade, não tinha mexido na sua mala até que ser
tão inflexível sobre eu não mexer na sua. Então tive que
mexer.

— Tudo bem, bem... — balançou a cabeça. — Sabe por


que eu tinha algumas coisas estranhas. Penso por isso que é
justo que me fale sobre as coisas na sua mala. Passou por um
carrinho de limpeza sem vigilância ao sair e se sentiu um
rebelde ou algo assim?

— Nah. Apenas um velho hábito. Quando era criança e


minha mãe não voltava para casa por um longo período,
ficava quase sem nada. Eu me esgueirava para um hotel,
encontrava alguém da limpeza, fingia que era um hóspede e
pedia um pouco mais de tudo. — Dei de ombros. — Viajo uma
quantia decente a negócios, então não pago xampu ou pasta
de dente há anos. Normalmente não peço mais nada extra, a
menos que por acaso veja uma pessoa da limpeza no
corredor. Nessa viagem, quando passei pelo quarto ao lado,
uma mulher estava limpando. Perguntei-lhe se poderia deixar
um ou dois extras no meu quarto. Ela disse que não havia
problema e me disse que eu era exatamente igual ao seu filho.
Quando voltei, ela tinha deixado um monte de merda.

Autumn sorriu. — Viu? Você é uma cebola. Nunca teria


imaginado que tinha todas essas tatuagens escondidas sob a
camisa social que usava quando nos conhecemos no
Starbucks também. Quando perguntei sobre elas, você disse
que passou por alguns anos loucos de adolescência. Presumi
por isso que se rebelou contra sua família rica e rígida por um
tempo. Depois, havia as plantas por todo o apartamento. Isto
realmente me abalou, por algum motivo estranho. Você disse
que só gostava de plantas, mas presumi que havia uma
mulher em sua vida que as havia deixado para trás.

Eu sorrio. — Bud me iniciou nas plantas. Trabalho


demais para ter um cachorro ou um hobby, então são
praticamente isso.

— Vejo isso agora.

— Além disso, elas não falam de volta.

— Falam de volta? Tipo, você fala com elas?

Dei de ombros. — Normalmente, apenas pratico minha


abertura ou encerramento para um caso com elas, mas às
vezes pegam o peso das coisas quando estou chateado.

Autumn sorriu. Não pude deixar de olhar para os seus


lábios. Quando me pegou, apontei para seu prato. — Você
quer mais?

Ela esfregou o estômago. — Não, obrigada. Estava


contudo realmente delicioso.

Concordei. — Qual é a sua história, então? Sabe muito


sobre a minha vida agora, mas eu realmente não sei muito
sobre você.

— O que quer saber?


Dei de ombros. — Não sei. Como entrou no serviço
social? Você sempre quis ajudar as crianças?

— Não, praticamente peguei um longo caminho para


chegar aqui. Fui para a faculdade de administração de
empresas e depois comecei a faculdade de direito em Yale,
mas fiz meu primeiro ano e decidi que não era o que queria
fazer.

— Sério?

— Sim. Você já sabe que meu pai é advogado. Yale foi


sua alma mater30, e ele sempre esperou que eu fosse para lá.

— Ele sempre teve esperanças, não você?

— Sei que parece bobagem, mas não sei se alguma vez


pensei no que queria antes de começar a estudar. Como não
tinha paixão por mais nada, e era isso que se esperava que eu
fizesse, fiz o que queriam.

— O que a fez mudar de ideia?

Autumn olhou para baixo. — Tudo.

Fiquei quieto, esperando por mais, mas ela não deu mais
detalhes.

— Como entrou no serviço social?

Ela suspirou. — É uma longa história, mas conheci uma


jovem que havia passado por momentos difíceis e queria
ajudá-la de alguma forma, só que não sabia como. Isto me fez
pensar, então examinei uma classe que fazia parte do
programa de mestrado em serviço social para ver se era isso o
que queria fazer. Decidi me inscrever no programa completo,
na terceira semana. Estou trabalhando no meu PhD em
aconselhamento psicológico agora. Faço aulas de meio
período. Tirei férias no verão, mas devo terminar no ano que
vem.

— Uau, isso é impressionante. Não é fácil pular de um


caminho depois de entrar. Eu lhe dou muito crédito por voltar
e descobrir o que queria fazer. A maioria das pessoas teria
terminado a faculdade de direito e seria péssimo praticando.

— Obrigada. — Sorriu. — E você? Sempre soube que


queria ser advogado?

— Eu sabia que precisaria de um ou seria um. Só não


tinha certeza de como as coisas aconteceriam.

Ela riu. — É uma coincidência que cresceu lutando, e


que está em uma profissão que paga bem e lida com clientes
ricos? Enquanto eu cresci em Old Greenwich, Connecticut,
muito mimada e cercada por pessoas ricas, e estou em uma
profissão que paga mal, e principalmente lido com pessoas na
pobreza o dia todo?

Esfreguei meu queixo. — Acho que ambos aprendemos o


que não queríamos da vida. — Pauso. — Você ainda mantém
contato com ela?

As sobrancelhas de Autumn se juntaram. — Quem?


— A garota que conheceu e que queria ajudar, mas não
sabia como?

Ela sorriu. — Mantenho, na verdade. Skye fará vinte e


dois anos no próximo mês e se tornou minha melhor amiga ao
longo dos anos.

Bud se aproximou e apontou para o relógio. — É hora de


fechar a loja. — Acenou para dois caras parados alguns
metros atrás dele. — Consegui Tweedle Dee e Tweedle Dum31
para me ajudarem a desmontar e carregar tudo na van. Por
que vocês dois, crianças, não saem daqui antes que seja tarde
demais?

Levantei minha mão ao meu ouvido e coloquei em


concha. — O que é isso? Devo ter ouvido errado. Parece que
acabou de me oferecer uma refeição grátis. — Olhei para o
outro lado da mesa para Autumn. — Ninguém come de graça
mais de uma vez sob o comando de Bud.

Bud acenou com a mão para mim. — Cuidado,


espertinho, ou farei você lixar a ferrugem de alguns canos que
tenho no meu porão.

Balancei minha cabeça. — Já é hora de fazer isso?


Parece que ainda ontem me fizeste fazê-lo com um pedaço de
lixa que tinha sido tão usada que quase não restava abrasivo.

Bud piscou para Autumn. — Eu tinha uma lixa nova na


gaveta o tempo todo. Não me lembro do que fez para me
irritar, mas tenho certeza de que mereceu.
Autumn riu. — Eu acredito em você.

— Além disso — Bud disse — tenho alguns buracos em


minhas paredes que podem precisar de massa, se não perdeu
o jeito com uma espátula de massa corrida. Sei que o
trabalho manual não é sua praia hoje em dia. Posso dizer
pelas suas mãos de aparência suave, menino bonito.

— As minhas mãos não são macias, velho.

— Bom. — Assentiu. — Você pode então me pagar pelo


jantar quando trouxer a criança para começar a ganhar
aquela bicicleta.

Olhei para Autumn. — Tudo bem para você se Storm


fizer algum trabalho para Bud?

Ela assentiu com um sorriso. — Acho que seria muito


bom para ele.

Despedimo-nos de Bud e disse que o veria no fim de


semana seguinte. Autumn estava quieta no caminho de volta
para seu apartamento. Eu também, mas isso foi
principalmente porque passei o tempo debatendo sobre
sequestrá-la e arrastá-la para minha casa para lembrá-la de
como nosso fim de semana juntos foi incrível. A alguns
edifícios de distância do seu, estacionei e desliguei o motor.

— Vou acompanhá-la — anunciei.

— Isso não é necessário.

— Talvez não, mas farei de qualquer maneira.


Corri para o seu lado do carro para que pudesse abrir a
porta e ofereci minha mão para ajudá-la a sair. Ela hesitou,
mas aceitou. Muito cedo, estávamos a sua port.

Ela se virou para mim. — Obrigada por esta noite. E,


novamente, sinto muito por pular em sua garganta sem
entender para onde levou Storm e por quê.

Dei de ombros. — Tudo bem. Ele precisa de alguém para


protegê-lo. Prefiro que fique puta do que ninguém dando a
mínima.

Autumn acenou com a cabeça, mas olhou para baixo.


Quando olhou para cima, pude ver a hesitação em seu rosto.
— Posso te perguntar uma coisa pessoal?

— Diga.

— O serviço social alguma vez esteve envolvido quando


era mais jovem? Quer dizer, você encontrou Bud porque
precisava de um lugar para comer. Eles não interviram?

Dei de ombros. — Às vezes. Principalmente quando me


metia em problemas, mas ligava para os meus amigos e os
mandava ir aos lugares habituais da minha mãe, e lhe
pagavam vinte dólares para ir à delegacia e fingir que se
importava, como se eu fosse apenas uma criança fora de
controle. Os serviços sociais não olharam mais
profundamente, já que alguém vinha me buscar. Acho que há
muitas crianças como Storm que não têm ninguém para
fingir.
Ela suspirou. — O sistema está longe de ser perfeito.

— Tudo funcionou no final.

— Acho.

— Posso te perguntar algo pessoal agora?

— Claro. É justo, já que sou tão intrometida.

— Qual é a razão pela qual não quer um relacionamento


e só sai com caras que querem o mesmo?

Ela franziu o cenho. — Você realmente vai direto ao


ponto, não é?

— Desculpe. Risco profissional, acho. Gostaria porém de


entender o que estou perdendo aqui. Eu sei que é alguma
coisa.

Autumn acenou com a cabeça. Ela desviou o olhar antes


de começar a falar novamente. — Estava em um
relacionamento que... acabou. E não estou pronta para isso
de novo.

Podia ver que ela estava desconfortável falando sobre


isso, mas me deixou entrar um pouco, então empurrei
suavemente. — Há quanto tempo isso acabou?

— Seis anos.

Uau. Era muito tempo para superar as coisas, mas me


ocorreu que talvez tivesse sofrido uma perda. Isto
definitivamente poderia fazer com que demorasse mais do que
o normal para voltar ao cavalo, por assim dizer.

Antes que pudesse perguntar mais alguma coisa, ela se


virou para entrar.

— Boa noite, Donovan. Obrigada novamente por tudo.


CAPÍTULO 10

Autumn

Dez anos atrás

— Foi um belo presente que deu a Lena. — A voz


profunda parecia vir do nada.

— Jesus. Você me assustou “pra” caralho.

— Há quanto tempo está sentada aqui?

— Não sei. — Dei de ombros. — Talvez vinte minutos.

O quintal estava escuro como breu, mas conhecia a voz.


Braden Erlich. O filho do mais novo parceiro do meu pai no
trabalho. Correção, o filho ridiculamente gostoso do mais novo
parceiro do meu pai no trabalho.

— As luzes estão quebradas? — Perguntou. — Aquelas


que se acendem quando detectam movimento?

— Não que eu saiba.

Braden ficou quieto por um momento. — Isto significa


que não se moveu por vinte minutos?

Sorrio no escuro. — É uma espécie de hobby. Gosto de


ver quanto tempo posso ficar parada antes que os detectores
de movimento me peguem.

— Qual é o seu recorde?

Detectei uma pitada de diversão em sua voz.

— Vinte e seis minutos.

Ele ficou em silêncio por um tempo. — Bem. Vamos ver


se podemos quebrá-lo.

Eu rio, mas tomei cuidado para não mover meu rosto


muito ou deixar meu corpo tremer. — Você ficará aí parado e
não se moverá para que eu possa quebrar meu recorde?

— Depende.

— De quê?

— Se admitir que deu de presente um outro presente,


acabei de ver a noiva do seu pai abri-lo lá dentro.

— O que te faz pensar que eu o devolvi?

— A minha mãe lhe deu na sua festa de formatura do


ensino médio, três meses atrás.

Merda. Ela deu? Fechei meus olhos. Oh meu Deus. Acho


que pode ter dado. — Desculpe — disse.

— Está arrependida do quê? Não quer uma estatueta de


porcelana quando tiver dezoito anos?
— É um Lladro32. Provavelmente custou setecentos
dólares.

— Não custou tanto à minha mãe.

— Como sabe?

— Porque ela ganhou de presente da minha avó, há dois


anos.

Os meus olhos se arregalaram. — Está brincando?

— Não.

Rio. — Uau, agora definitivamente não me sinto mal.

— Não deveria. Você é muito bonita para se sentir mal.

Oh, uau. Estava definitivamente feliz por ainda estarmos


no escuro, então não me viu corar. — Obrigada.

— De nada.

— Sabia que existe um Lladro de edição limitada que


custa quarente e sete mil dólares? Fizeram apenas
quinhentos deles.

— Você verificou o valor antes de decidir usar como um


novo presente, hein?

Eu rio. — A verdade não. Às vezes apenas leio sobre


coisas realmente aleatórias.

— Interessante.
Provavelmente soei como uma idiota completa. — Não
fico em casa fazendo isso nem nada. É algo que faço de vez
em quando.

— Gosto disso. Você é curiosa.

Um minuto se passou e nenhum de nós disse nada.


Eventualmente, Braden falou. — Você ainda está aí?

— Estou.

— Não tinha medo de que Lena se lembrasse de ter


aberto isso na sua festa de formatura?

— Lena não estava na minha festa de formatura. Ela e


meu pai só se conheceram no dia quatro de julho.

— Isso foi há menos de dois meses.

— Sim.

— Eles já estão noivos?

— Ele a pediu em casamento no aniversário de um mês.

— Uau.

— Sim. Isto parece ser uma coisa para ele. Pediu sua
última esposa em casamento no aniversário de seis meses.

— A sua última esposa? Quantas teve?

— Esta será a sua quarta.

— Qual era o número da sua mãe?


— Ela foi a primeira, morreu quando eu tinha doze anos.

— Eu sinto muito.

— Obrigada.

— Eu me sinto mal por fazê-la falar sobre isso. Acho que


sei onde posso conseguir um bom Lladro para compensá-la.

Eu rio. — Estou bem, mas obrigada pela oferta.

— Por que está sentada aqui no escuro, afinal?

— São todas pessoas do trabalho do meu pai e da família


de Lena. Além disso, é uma noite clara e gosto de olhar para
as estrelas.

— Você já foi ao Long Wharf Park para ver as estrelas?

— Não. Onde fica?

— New Haven.

Suspirei. — O meu pai me enche o saco sobre dirigir na


I-95 à noite, já que tirei minha carteira de motorista há
apenas seis meses. Talvez meu amigo Alley me leve.

Ele ficou quieto um pouco. — Estou dirigindo há três


anos.

O meu coração acelerou. Ele estava dizendo que queria


me levar para ver as estrelas?
Antes que pudesse responder, ele falou novamente. — Eu
te direi uma coisa. Que tal fazermos uma pequena aposta? Se
bater seu recorde, darei instruções sobre o melhor local para
ver as estrelas, mas se não fizer isso, tem que me deixar levá-
la.

Ummm... Quem se importa com o recorde idiota?

Imediatamente comecei a descobrir como poderia fazer o


detector de movimento disparar sem parecer que tinha feito
de propósito.

— Então... temos um acordo? — Braden disse.

Tentei parecer indiferente. — Certo. Por que não?

Cinco segundos depois, as luzes se acenderam. Pisquei


enquanto meus olhos se ajustavam. Eu me mexi? Não achei
que tivesse.

Olhei para Braden, que exibia um sorriso de orelha a


orelha.

— Eu não me mexi — disse.

O seu sorriso se tornou mais amplo. — Eu sei. Balancei


o meu braço no ar. A aposta que concordou não especificou
de quem seria a culpa de as luzes se acenderem, apenas que
sim. — Ele inclinou a cabeça e estendeu a mão. — Venha,
vamos sair daqui.
CAPÍTULO 11

Autumn

— Ei! — Sorrio para o rosto da minha amiga Skye


piscando na tela e deslizei para atender. Eu nunca tinha visto
a foto antes. Os seus olhos estavam cruzados e sua língua
pendurada adoravelmente.

— Estou começando a me sentir negligenciada — disse.


— Você não liga... não escreve...

Rio. — Quando mudou sua foto no meu telefone?

— A última vez que estive aí. Se bem me lembro, estava


me ignorando, ocupada em seu laptop pesquisando a origem
de alguma música que ouviu em um comercial.

— Ah sim. “Magic” de The Pilots. Eles são da Escócia,


sabe.

— Claro que sei. Você me contou isso e quatrocentos


outros fatos que pesquisou depois de assistir a um comercial
de dez segundos.

Um táxi na rua ao meu lado tocou a buzina.

— Onde está? — Skye perguntou.


— A caminho de encontrar Blake para jantar. Peguei um
Uber, mas o trânsito estava parado, então saí para andar os
dois últimos quarteirões.

— Blake? Este é o cara novo, que eu disse que parecia


chato?

— Ele é muito simpático.

— Assim como meu vizinho de setenta e oito anos,


Wilbur. Lembre-me de arranjar para você se não der certo.

— Fofa.

— De qualquer forma, só liguei para saber se ainda


estamos de pé para próxima semana e ver se tudo deu certo
com sua criança que sumiu. Você deveria me ligar no dia
seguinte.

— Desculpe. As coisas têm estado um pouco... não sei...


estranhas ultimamente. Eu me senti tão distraída. Deveria ter
ligado, mas encontramos Storm, e está bem, e estamos
definitivamente de pé para a próxima semana. Estou
morrendo de vontade de saber o que acontece com Kayla.

— Tudo bem, ótimo. Estará tudo bem, de outra forma?


Algo está fazendo você se sentir estranha?

— Você se lembra de um cara de quem falei chamado


Donovan?

— O cara da bagagem com todas as plantas cujos ossos


queria pular, mas não pulou?
Sorrio. — Esse mesmo.

— O que tem ele?

— Bem, nós nos encontramos de novo.

— Ooooh – aquele cara era definitivamente mais


interessante do que o novo. Tinha tatuagens. Nunca conheci
um cara chato com tatuagens. Deixe-me adivinhar, Blake não
tem nenhuma?

Suspirei. — Ele realmente não tem.

— Então, você também está vendo o Green Thumb33


agora?

Balancei minha cabeça. — Não em um nível pessoal, mas


ele está representando Storm, então acho que irei vê-lo. — O
restaurante onde encontraria Blake ficava a apenas alguns
prédios abaixo. — Escute, preciso correr. Estou prestes a
entrar para jantar. Te vejo na próxima semana?

— Mal posso esperar. Tenha uma boa noite.

— Você também.

Deslizei para desligar a ligação assim que alcancei a


porta do restaurante. Antes de entrar, parei e respirei fundo.
Poderia ter usado mais alguns minutos para clarear minha
cabeça, mas já estava atrasada e não queria ser rude.
Esperava que meu humor melhorasse antes de chegar, em vez
disso, passei de não sentir vontade de sair para temer isso,
mas abri o meu melhor sorriso quando a recepcionista me
mostrou a mesa. Blake já estava sentado.

Ele se levantou e beijou minha bochecha. — Você está


linda.

— Obrigada.

Ele puxou minha cadeira e me sentei. — Desculpe, estou


atrasada.

— Estava começando a pensar que me daria o cano.

— O meu Uber cancelou três vezes. Deveria ter enviado


uma mensagem para você.

— Eu teria buscado você na casa da sua amiga.

Quase esqueci que menti para Blake e lhe disse que viria
direto da casa de uma amiga para evitar que ele me pegasse.
Eu disse isso sem nenhum pensamento, na verdade. Quando
me disse que estaria na minha casa às sete, por algum motivo
entrei em pânico e disse que o encontraria no restaurante.
Então estive imaginando um motivo pelo qual não poderia ir à
minha casa. Os últimos dias, fiz o possível para evitar pensar
no porquê disso, porque, no fundo, sabia a resposta. Não
queria Blake no meu apartamento porque não conseguia
parar de pensar em outro homem. E foi exatamente por isso
que me obriguei a vir hoje à noite, quando preferia ficar em
casa olhando para a TV.
— Ela mora do outro lado da cidade, e seu escritório é
muito perto daqui.

— Você vale o transtorno.

Forcei um sorriso. A garçonete veio com a carta de


vinhos. Sabia que Blake gostava de tinto, então olhei e disse
— O que quiser está bom.

— Tem certeza?

— Positivo.

Conheci Blake no Tinder. Tínhamos saído para tomar um


café, que era meu primeiro encontro habitual. Dessa forma,
se fosse estranho ou se o cara acabasse sendo um canalha,
saía da minha miséria com relativa rapidez. Blake e eu porém
nunca tivemos um minuto de constrangimento desde que
começamos a nos ver. A nossa conversa sempre pareceu fluir
naturalmente, e nunca tivemos um silêncio desconfortável...
até agora. Eu não tinha certeza se era a minha cabeça ou
não, mas de repente me senti desajeitada, sem nada para
dizer. Peguei então, um breadstick para ter um motivo para
não falar.

— Como foi o trabalho esta semana? — Perguntou. —


Parecia ocupada quando conversamos outro dia.

Concordei. — A nossa carga de casos deve ser de dezoito.


Ontem recebi meu trigésimo primeiro caso ativo.
— O seu escritório parece o meu. Exceto que mais casos
significa mais dinheiro para mim. Significa apenas trabalho
extra para você.

Concordei. — Eu nem quero pensar sobre o que


realmente ganho por hora.

— Já pensou em ir para a faculdade de direito? Há um


bom dinheiro, e ainda pode ajudar as pessoas assumindo
alguns casos pro Bono.

Nunca mencionei que fizera faculdade de direito por um


ano e não tinha vontade de discutir o assunto agora, por
algum motivo. Por isso, balancei a minha cabeça. — Sim, não
acho que isso seja para mim.

— Falando em pro Bono, como vão as coisas com a


criança com quem precisava de ajuda?

— Está indo bem. — Se contarmos que fugir alguns dias


depois de ser preso e sair para um abrigo improvisado para
sem-teto está indo bem, claro.

— Bom. Avise-me se o advogado que designei para você


não estiver prestando a atenção que precisa.

Oh, ele está me dando muita atenção.

Lembrei-me de Donovan dizendo que era candidato a ser


sócio e precisava do voto de Blake, então achei que falar bem
dele poderia ajudar. Era o mínimo que podia fazer.
— Donovan tem sido realmente ótimo. Esta não foi a
primeira vez que Storm teve problemas, então não é um caso
tão fácil, mas definitivamente está trabalhando mais do que
qualquer outro advogado com quem lidei ao longo dos anos
com as minhas crianças. — Limpei minha garganta. — Ele
está no seu escritório há muito tempo?

— Um pouco mais de sete anos. Nunca fui um grande fã


dele, pessoalmente, mas tem um histórico impressionante.

Imediatamente me senti na defensiva. — Ele parecia bom


o suficiente para mim. O que não gosta nele?

— Ele tem uma atitude intratável. É típico do tipo de


pessoa que contratamos.

— Que tipo seria?

Blake encolheu os ombros. — Colheres de prata mimado


das universidades da Ivy League.

Obviamente, ele não conhecia o seu empregado muito


bem, mas a última coisa que Donovan precisava era que as
suspeitas de seu chefe fossem levantadas por eu defendê-lo.
Por isso coloquei um sorriso falso. — Conheço o tipo, mas
parece estar fazendo um ótimo trabalho para Storm.

A garçonete entregou nosso vinho. Serviu um gole para


Blake, que provou e acenou com a cabeça antes que ela
enchesse as nossas taças.
— Decker é candidato a sócio — explicou Blake. —
Adicionamos dois a cada cinco anos. Um dos caras é uma
certeza; está na empresa há doze anos e é sólido. Portanto,
fica entre Decker e meia dúzia de outros candidatos ao
segundo lugar. A verde, porém, é entre ele e outro cara.

— Oh? Você está se inclinando mais para um do que


para o outro? — Fiquei ansiosa esperando sua resposta.

— Não Decker — disse depois de um momento. — O


outro cara que está conosco há dez anos. Ele dedicou seu
tempo.

O meu coração afundou. — Oh. Então, é mais baseado


no tempo de serviço?

— Nem sempre. Tornei-me sócio depois de oito. Decker


fatura mais horas do que qualquer um, mas não precisa que
seu ego seja afetado fazendo isso em tempo recorde.

Suspirei interiormente. — Bem, parece que tomou sua


decisão, então.

— Ainda há tempo antes da votação. — Estendeu a mão


sobre a mesa e entrelaçou seus dedos com os meus. — Tenho
uma aposta com um dos outros sócios que Decker dispensa
um cliente que fez algo estúpido esta tarde. Se conseguir se
controlar e não dispensá-lo e cuidar bem de você, posso
considerar mudar meu voto.
♥♥♥

— A minha casa está bem? — Blake afivelou o cinto de


segurança e olhou para mim em busca de uma resposta.

— Ummm... acho que estou indo para casa. Tive uma


dor de cabeça chegando o dia todo, e é aquela época do mês,
então poderia ter uma boa noite de sono.

Blake franziu a testa, mas tentou encobrir. — Claro.

Ele me acompanhou até a porta, no meu prédio. — Está


livre no próximo sábado à tarde, por acaso?

— Umm...

— Temos um churrasco do escritório para os sócios. Para


ser honesto, geralmente é uma tortura. Poderia precisar de
companhia. A maioria das pessoas traz suas famílias ou um
encontro. Ter você ao meu lado tornaria o dia mais
suportável.

Ele leu a hesitação em meu rosto.

— Além disso, os meus parceiros gostariam de conhecê-


la.

Fiquei surpresa. — Eles sabem sobre mim?

— Tive de mencionar que estava saindo com alguém para


obter a aprovação dos outros sócios que me permitissem
adicionar um caso pro Bono depois de já termos ultrapassado
nossa cota para o ano. Posso ter me gabado de como a
mulher que estava vendo é uma boa samaritana.

Droga. Como poderia dizer não para ser sua


acompanhante quando saiu do seu caminho por mim? Não
consegui, então forcei outro sorriso. — Certo. Um churrasco
parece divertido.

Já que tínhamos saído para jantar às sete, eram apenas


nove e meia quando me joguei no sofá vestindo meu moletom
favorito. Era tarde demais para começar a assistir a The
Bachelor. Além disso, prometi à Skye que esperaria para
assistirmos juntas, em vez disso, naveguei pelas redes sociais
no meu telefone.

A minha mente porém estava em outro lugar. Tinha


estado desde que Blake e eu falamos sobre Donovan – mesmo
antes disso, para ser honesta comigo mesma. Eu também não
tinha certeza de como lidar com as informações que
compartilhou comigo no jantar sobre o que Donovan
precisava fazer para se tornar sócio. Por um lado, seria errado
compartilhar uma conversa particular que tive com o cara
com quem estava saindo. Por outro lado, Donovan tinha ido
acima e além por Storm e quando me ajudou a procurá-lo –
sem mencionar apresentá-lo a Bud e tentar ensiná-lo alguns
valores. Portanto, sentia que devia uma a Donovan, e passar
adiante algumas informações privilegiadas como vingança
poderia acertar as nossas contas.
Fiquei sentada lá por dez minutos, olhando para o
número de telefone de Donovan em meus contatos enquanto
debatia-o repetidamente. O meu telefone vibrou na minha
mão, em um momento, e quando percebi quem tinha me
enviado uma mensagem, foi o sinal de que precisava tomar
uma decisão.

Donovan: Bud precisa adiar Storm trabalhando para ele


amanhã até o final da tarde. Ele esqueceu que tem um
compromisso.

Digitei de volta.

Autumn: Oh, ok. Obrigada por me avisar. A que horas


acha que devo leva-lo?

Donovan: Ás 3 deve ser bom.

Autumn: obrigada.

Bati meu dedo indicador em meus lábios por um minuto,


debatendo uma última vez como trazer à tona o que tinha
aprendido. Eventualmente, decidi que uma conversa ao vivo
seria melhor.

Autumn: você está ocupado? Pode falar um pouco?

O meu telefone tocou cinco segundos depois. Peguei com


um sorriso. — Olá.

— Ainda não descobriu? — disse. — Nunca estou muito


ocupado para você.
Deus, senti aquela voz aveludada e profunda na minha
barriga. O seu som e seu flerte fez meu sorriso se esticar
tanto que fiquei surpresa que meu rosto não rachou. —
Aposto que diz isso para todas as garotas.

— Não. Apenas uma.

Eu rio. — Escute, isso é meio estranho de se mencionar,


mas falei com Blake mais cedo, e me perguntou como
estavam as coisas no caso de Storm. Disse que tudo estava
indo muito bem, e então ele mencionou que você era
candidato a sócio.

— Ok...

— Ele disse que ainda estava indeciso quanto ao voto,


mas que havia duas coisas que poderiam influenciá-lo.

— O que seriam?

— Sair-se bem no caso de Storm e – realmente não sei a


que caso isso se refere, mas disse que você tinha um cliente
que fez algo estúpido hoje, e se conseguisse não dispensá-lo,
seria um bom presságio para você.

Donovan ficou em silêncio por tanto tempo que me


perguntei se poderia ter desligado.

— Você ainda está aí?

Ele soltou um longo gemido. — Pooooora!

— Qual é o problema?
— Eu o dispensei há vinte minutos.

— Você dispensou o cliente? Eu nem sabia que isso era


uma coisa.

Pelo som de sua voz, o imaginei passando a mão pelo


cabelo. — É coisa minha. — Fez uma pausa. — Droga!

— Desculpe.

— Não é sua culpa. Eu só... foda-se... foda-se... foda-se!


Preciso entrar em contato com Bentley.

— Esse é o cliente?

— Sim.

— Tudo bem. Bem, vou deixá-lo lidar com isso.

— Jesus, sete anos trabalhando “pra” caramba poderiam


ter ido pela janela se não tivesse me dito isso.

Foi bom ter ajudado. — Bem, agora estou feliz por ter ido
hoje à noite, afinal.

— Ter ido?

— Jantar com Blake.

A linha ficou em silêncio. Quando Donovan finalmente


falou de novo, sua voz estava neutra. — Tenho que correr.
Obrigado pela informação.
CAPÍTULO 12

Donovan

— Que diabos?

Fiquei parado na calçada da casa de Bud com um saco


de lixo na mão, vendo um carro descer a rua. O som de algo
raspando no asfalto ficou mais alto à medida que se
aproximava, e faíscas dispararam da roda do lado do
motorista. Quando o carro parou, percebi que era Autumn ao
volante. A sua lateral traseira estava completamente
amassada e algo de metal pendurado nela, o que deve ter sido
a fonte do atrito e das faíscas. Pude ver que estava exausta,
especialmente depois que estacionou e tentou sair, mas a
porta parecia não abrir.

— Pare — gritei e coloquei minha mão para cima. Ela


ainda enfiou o ombro na porta mais uma vez. Aproximei-me
do carro. — Deixe-me tentar abri-la deste lado.

Os primeiros puxões na porta abriram um pouco, mas


não o suficiente para ela sair. Então levantei um pé na lateral
da porta para alavancar e abri a coisa. Autumn saiu
resmungando, enquanto Storm caminhava do lado do
passageiro do carro parecendo um pouco nervoso. Ele não
parecia tão inquieto na noite em que foi preso na delegacia.
— O que aconteceu com seu carro? — Perguntei.

— Alguém bateu em mim.

— Você está bem? — Olhei para Storm. — Está bem?

— Estamos bem — Autumn me assegurou. — Não


estávamos no carro quando aconteceu. Parei a alguns
quarteirões de distância para pegar um bolo e trazer para
Bud. Quando saí, alguém bateu no meu carro. — Ela olhou
para o amassado, então acenou com a cabeça em direção a
Storm. — Felizmente, este aqui não acha que sou capaz de
entrar em uma loja sem um guarda-costas, ou ele estaria no
carro.

Isso me fez sorrir. Não é como se tivesse sido assaltada


em plena luz do dia – bem aqui, pelo menos as chances de
isso acontecer eram baixas – mas também não a teria deixado
entrar sozinha.

Balancei a cabeça para Storm. — Bom trabalho.

Autumn revirou os olhos. — Quando pedi ao outro


motorista o cartão do seguro, disse que não tinha. Quem
dirige sem seguro?

— Você conseguiu um relatório policial? — Perguntei.

— Sim, embora o cara não quisesse que eu ligasse para


eles.

Bem, isso explicava por que estavam uma hora


atrasados. Estava começando a pensar que ela não
apareceria, que talvez estivesse chateada por causa da minha
atitude na noite passada ao telefone.

Agachei-me ao lado de seu pneu e dei uma olhada no


volante. — O policial deveria ter chamado um caminhão de
reboque. Você não deveria ter dirigido esta coisa.

— É apenas um amassado.

Balancei minha cabeça. — Olhe o aro do pneu. É para


ser redondo, Autumn.

Ela apertou os olhos e franziu a testa. — Oh... não


percebi isso.

— O seu aro está torto, parte da carroceria do seu carro


está puxando os freios do pneu e está arrastando o metal.

Ela suspirou. — Excelente.

Balancei a cabeça em direção à casa de Bud. — Vamos.


Vamos entrar. Há uma boa oficina a alguns quarteirões de
distância – ou pelo menos havia alguns anos atrás. Vou
verificar com Bud para ver se ainda está aberta. Se estiver,
podemos pedir-lhes que deem uma olhada e verifiquem se
podem torná-lo seguro para dirigir. Então, pelo menos pode
consertá-lo em algum lugar mais perto de casa.

— Como é que vamos chegar lá? Você acabou de dizer


que não era seguro para dirigir.

— Não é. É por isso que dirigirei seu carro e pode me


seguir no meu. Storm pode ficar aqui com Bud.
♥♥♥

— Obrigada por isso — disse Autumn.

Abri a porta do passageiro do meu carro do lado de fora


da Demott's Body Shop.

Autumn me olhou antes de entrar. — Ouça, sobre a noite


passada ao telefone. Desculpe-me se chateei você.

— Está tudo bem. Percebi algo depois que desligamos


que me fez sentir melhor.

O seu rosto se enrugou. — O quê?

— Você estava falando comigo sobre Dickson – me


contando coisas que não teria mencionado se ele estivesse
com você.

— Sim, então?

— Isso significa que estava em casa sozinha. Saiu para


jantar com um cara com quem está saindo há algum tempo,
mas estava de volta à sua casa, sozinha, e não eram nem dez
horas.

— Estava com dor de cabeça.

Eu sorrio. — Claro que sim.

— Está sorrindo do quê? Você não acredita em mim?


Balancei minha cabeça. — Nem um pouco. Só saiu com
ele para manter essa barreira entre nós, mas no final, não
conseguiu nem passar a noite com ele.

— Não pense muito em si mesmo.

Dei de ombros. — Tudo bem. Não tem que admitir. Sei a


verdade. E só para saber, também não estive com mais
ninguém desde a noite na delegacia. Eu tenho paciência.
Esperarei até que esteja pronta.

Ela estreitou os olhos para mim. — E se eu nunca estiver


pronta? Você me esperará para sempre?

Dei meio passo mais perto. Estávamos agora frente a


frente. Autumn não fez nenhuma tentativa de recuar
enquanto me observava de perto, mas não era a hora, nem o
lugar, para ver o que faria se eu pressionasse. Deixei meus
olhos, em vez disso, caírem sobre seus pés e lentamente
trabalharem seu caminho de volta, roçando de forma
apreciativa sobre a curva de seu quadril e se agarrando a
seus lindos e fartos seios. Os seus mamilos endureceram
através de sua camiseta enquanto observava, como uma flor
desabrochando. Quando meus olhos finalmente alcançaram
seu rosto novamente, seus lábios estavam separados, seus
olhos semicerrados.

Inclinei-me e sussurrei em seu ouvido. —


Definitivamente não vai demorar para sempre.
♥♥♥

— Oh meu Deus, e então Lindsey se senta bem entre eles


e o beija.

— Aquela garota não passa de problemas — disse Bud.

— Eu sei, não é? Aparentemente porém, o nosso bachelor


está em apuros. Ele gosta dessa Justine também.

Balancei minha cabeça. — Não consigo acreditar na


conversa que estou ouvindo. Sinto que estou almoçando com
Juliette.

Autumn e Bud tinham falado sobre The Bachelor nos


últimos vinte minutos. Sabia que Autumn assistia aquela
merda, mas Bud? Apenas continuei balançando minha
cabeça. Ele disse que sua nova “amiga” assistia, e se
interessou também.

Autumn se virou para mim. — Quem é Juliette?

— Uma colega de trabalho. Não se preocupe. Ela não é


uma ameaça para você. — Pisquei. — Juliette não é meu tipo.

Autumn revirou os olhos, mas vi o sorriso quando se


virou. — Você já assistiu?

— Não, e estou surpreso que assista. É basicamente um


show onde um cara consegue namorar, tipo, vinte mulheres
ao mesmo tempo enquanto fazem uma merda exagerada para
lutar por atenção. As mulheres adoram, mas as mesmas
mulheres perdem a cabeça se um homem que estão
namorando quiser namorar até mesmo uma outra mulher.

Autumn balançou a cabeça. — Há uma diferença entre o


que as mulheres desejam na vida real e o que desejam em
seus reality shows.

— Se você diz...

Storm veio da garagem. Esteve lá fora, limpando e


pintando a maior parte do dia. — Estou faminto.

— Vou servir sanduíches quentes e abertos para o jantar


esta noite, — disse Bud. — E você pode se servir da geladeira.

Balancei minha cabeça. — Por que não peço uma pizza


para nós? Os seus sanduíches abertos e quentes são sempre
um grande sucesso, sem sobras.

Bud sorriu. — Isso é porque torro o pão na grelha e


derreto o queijo antes de despejar o molho de carne por cima.
Era o favorito de Donovan quando criança. Tinha que
esconder três se não aparecesse para jantar mais cedo.

Storm arranhou sua têmpora. — Costumava comer com


os pobres?

— Não, eu costumava ser o pobre.

— Você agora porém nada em dinheiro. É um advogado


com um carro luxuoso e seus sapatos são sempre brilhantes.
— Sim, e?

Encolheu os ombros. — Pobre continua pobre, na


maioria das vezes.

Estava consertando a porta de um armário, mas parei e


dei a Storm toda a minha atenção. — Se pensa assim,
geralmente é o que acontece. Precisa ser capaz de se ver bem-
sucedido para uma oportunidade de encontrar o sucesso.
Precisa trabalhar mais do que alguém que tem as coisas
entregues a eles. — Senti os olhos de Autumn em mim, então
olhei. — Sem ofensa.

Ela sorriu. — Nenhuma ofensa.

— Já competiu corrida na escola? — Perguntei a Storm.

— Sim.

— Sabe por que os corredores não começam todos da


mesma linha?

— Porque a trilha interna é mais curta.

— Isso mesmo. Eles tornam isso justo para todos, mas


na vida real, essa porcaria não acontece. Algumas pessoas
começam por trás – e por outras razões além de simplesmente
serem pobres. — Fiz uma pausa, me certificando de que
estava me seguindo. Ele deu o menor dos acenos. — Portanto,
aprenda a correr mais rápido e nunca se esqueça de que há
pessoas começando ainda mais atrás do que você.
Terminei de consertar o armário e ajudei Autumn, que
estava pintando o acabamento na cozinha de Bud enquanto
eu trabalhava. Poderia ter ajudado Storm, mas Bud foi lá
para ajudar, e pensei que um pouco de tempo sozinho entre
eles poderia fazer bem ao garoto. Além disso, não resisti à
oportunidade de trabalhar perto de Autumn. Roubei olhares
sempre que tive oportunidade – quando se esticou acima da
cabeça para pintar as molduras da parte superior e a blusa
subiu, expondo sua pele cremosa e macia, quando se curvou
para mergulhar o pincel na tinta, me dando uma visão limpa
de sua bunda fenomenal.

Eu era muito óbvio, e Autumn me pegou em flagrante em


mais de uma ocasião, mas a cada vez ela sorria, ao invés de
chamar minha atenção. Sabia que ela tinha uma ideia do que
estava se passando pela minha cabeça, mas me perguntei se
conseguia ler minha mente tão bem quanto eu às vezes
conseguia ler a dela. Já que não levei um tapa, diria que
provavelmente só tínhamos um leitor de mentes na sala.

Depois que terminamos uma pizza inteira, Bud precisava


se preparar para sair para o serviço de jantar, e Autumn
tinha que levar Storm de volta para Park House, então os levei
para a oficina para ver se os mecânicos foram capazes de
consertar o carro de Autumn o suficiente para colocá-lo em
um estado dirigível. Infelizmente, não era apenas uma simples
rachadura no aro e precisava ser enviado para soldagem.
Deixamos então o seu carro lá, e Autumn e eu levamos Storm
embora juntos. Pouco antes de ele sair, ela perguntou se
tinha planos para a noite, e ele respondeu que ia estudar.

— Você realmente acha que ele estudará esta noite? —


Perguntou-me uma vez que estávamos sozinhos no carro.

— Definitivamente não.

— Talvez tenha realmente escutado você dizer que teve


que trabalhar o dobro?

Olhei da estrada para ela, mostrando um rosto que dizia


sem chance.

— Bem, vou pensar positivo e presumir que estava sendo


sincero.

Eu sorrio. — Faça isso, mas ele não estava.

— Como pode ter tanta certeza?

— Eu sou bom em dizer quando as pessoas estão


mentindo. É meu superpoder. Sou um detector de mentiras
humano.

— É assim mesmo?

— É.

Ela bateu o dedo nos lábios. Mesmo enquanto dirigia,


podia ver as rodas girando em sua cabeça.

— Eu amo abacaxi na minha pizza. É minha comida


favorita.
Levantei uma sobrancelha. — Devo dizer se está
mentindo?

— Sim. Vá em frente, detector de mentiras humano.


Vamos ver como seus superpoderes são bons.

Estávamos prestes a passar por um Wendy's34, então


liguei meu pisca-alerta e virei para o estacionamento.

A testa de Autumn se enrugou. — Está com fome?

— Não, mas preciso olhar para você para que meu


superpoder funcione. — Puxei para a primeira vaga de
estacionamento disponível e coloquei o carro na vaga. Então
me mexi no banco para olhar para ela.

Definitivamente gosto deste jogo. Com esta visão, devemos


jogar com mais frequência. — Vá em frente — disse. — Fale
sobre sua pizza favorita novamente.

Autumn se virou para mim e se endireitou em seu banco.


O seu sorriso divertido era assustadoramente adorável.

— Eu amo abacaxi na minha pizza. É minha comida


favorita.

A verdade, não sabia se ela estava mentindo ou não, mas


imaginei que tinha uma chance de cinquenta por cento, então
blefei. — Mentira.

Os seus olhos brilharam. — Como sabia?

— Eu te disse. Tenho um detector de mentiras.


Ela riu. — Isso poderia ter sido apenas sorte. Deixe-me
tentar de novo.

— Fique à vontade.

Ela olhou pela janela por um momento e depois se virou.


— Quando tinha doze anos, fugi de casa.

A sua apresentação foi bem diferente do jeito que falou


sobre a pizza, então percebi que isso não era uma mentira. —
Verdade.

O seu queixo caiu, mas fez o possível para não parecer


impressionada. — Outro palpite de sorte.

Cruzei meus braços sobre meu peito. — Quantos serão


necessários para acreditar em minhas habilidades?

— Não sei. Cinco seguidos?

— Bem, então vamos lá. A verdade, espere um segundo.


Estou curioso. Por que fugiu de casa?

Ela franziu o cenho. — A minha mãe havia morrido seis


meses antes, e meu pai voltou para casa com uma mulher
que nunca conheci e me disse que ia se casar.

— Merda. Desculpe.

Autumn encolheu os ombros. — Tudo bem. Só desci


algumas portas até a casa da minha amiga Jane, e a sua mãe
me fez biscoitos, então não estava exatamente passando
aperto com uma bandana amarrada a um pedaço de pau
pendurado no ombro. Além disso, aquele casamento durou
apenas oito meses.

— Aquele casamento? Quantos já houve?

— Muitos. Ele acabou de ficar noivo recentemente.

Esta parte da verdade me fez pensar se seu querido e


velho pai era parte do motivo pelo qual ela era tão azeda em
relacionamentos.

— Ok... tenho outro — disse. Só que desta vez, enquanto


falava, estendeu a mão e ajustou o brinco. — Certa vez, tive
um caso com meu professor universitário.

— Mentira.

— Como sabia disso? Eu poderia ter tido. Recebi


cantadas algumas vezes.

— Detector de mentiras. Eu te disse. — Estendi a mão e


toquei seu brinco. — Além disso, você toca isto quando
mente.

Os seus olhos se arregalaram. — Eu toco?

— Você toca.

— Uau. Nunca percebi isso. Você é superperceptivo?


Percebe coisas assim em todo mundo?

— Eu não percebo isso em todo mundo. — Os meus


olhos procuraram os dela. — Apenas pessoas nas quais estou
interessado.

Os olhos de Autumn se suavizaram e esqueci


completamente que estávamos em um estacionamento
movimentado no meio do Brooklyn. Carros entravam e saíam
da linha de drive-thru atrás de nós, um carro aleatório
buzinou em algum lugar na vizinhança não muito distante,
mas o momento parecia estranhamente íntimo e romântico –
e eu definitivamente fui acusado de não ser romântico ao
longo dos anos por mais de uma mulher.

— Você? — Sussurrei. — Acha que sabe se estou


mentindo?

Ela ficou tão quieta. Isso me fez pensar se sentia a


mesma coisa que eu – como se estivéssemos em uma pequena
bolha, uma que não queria estourar com o movimento.

— Eu não sei — disse calmamente.

— Vamos experimentar. — Aproximei-me um ou dois


centímetros e abaixei a cabeça para ficarmos exatamente cara
a cara. — Acho você absolutamente incrível.

Ela engoliu em seco. — Não sei.

— Verdade. Vamos tentar de novo. — Aproximei-me mais


um centímetro. — Não consigo parar de pensar em você desde
que a vi parada com minha bagagem.

Autumn mordeu o lábio inferior. — Mentira.


Balancei minha cabeça para frente e para trás
lentamente. — Verdade. Mais uma. Quero tanto beijá-la que
dói “pra” caralho.

Engoliu em seco novamente e sussurrou — Verdade?

Um sorriso se espalhou pelo meu rosto. —


Absolutamente, porra.

Autumn sorriu de volta, e por alguns segundos, pensei


que estávamos fazendo progresso, que ela poderia realmente
me dar luz verde para chupar seus lindos lábios como estava
morrendo de vontade desde o momento em que voltou para
minha vida, mas então vi acontecer. O que quer que seja que
a segura, bateu como um relâmpago. O seu sorriso murchou
para uma carranca, e pigarreou enquanto se recostava em
seu banco.

— Isso deve ser útil em sua profissão. Ter – como


chamou? Um detector de mentiras?

Continuei olhando para ela, embora virasse a cabeça e


olhasse pela janela.

— Sim, é útil.

— Isso é bom.

Ela não disse mais nada. Aparentemente, nosso joguinho


acabou.

Coloquei o carro em marcha à ré e dirigi o resto do


caminho para casa. O restante da viagem foi limitado a uma
conversa fiada sem sentido. Autumn estava quieta enquanto a
acompanhava até a porta.

— A propósito, nunca lhe agradeci — disse.

— Pelo quê?

— Por salvar a minha bunda.

— Oh?

— Depois que desligamos ontem à noite, consegui ligar


para o cliente que havia dispensado e acalmar as coisas. Foi
fisicamente doloroso beijar a sua bunda, mas consegui, então
não explodi minha chance de sociedade... ainda.

Autumn sorriu quando chegamos à sua porta. — Estou


feliz por ter ajudado, porque devo alguns favores a você.
Obrigada por tudo que fez hoje, Donovan. Sinto que lhe digo
isso com frequência. Estou sempre lhe agradecendo por algo –
ajudar Storm, me ajudar a encontrá-lo quando foge, me
ajudar a lidar com meu carro hoje. Você é muito...

Levantei uma sobrancelha quando ela parou. — Útil?

Ela deu uma risadinha. — Ia dizer que é um bom amigo,


mas sim. Você é útil.

Puxei uma mecha de seu cabelo. — É assim que pensa


sobre mim? Com um bom amigo?

— Sim. — Ela olhou para baixo, mas acenou com a


cabeça. — Você é um bom amigo.
Estendi a mão e toquei o pulso de sua mão brincando
atualmente com seu brinco. A princípio ficou confusa, mas
então percebeu o que eu estava apontando.

Autumn cobriu sua boca. — Oh, meu Deus.

Sorrio e pisquei. — Eu mal posso esperar para lhe


obrigar a dizer essas palavras novamente em breve,
mentirosa.
CAPÍTULO 13

Autumn

Oito anos atrás

— Mais um. — Nick estendeu a garrafa de tequila para


mim.

Balancei minha cabeça. — De jeito nenhum. Já atingi


meu limite.

A minha amiga Felicia apontou para mim. — O seu limite


é um. Dê-me isso.

Nick revirou os olhos. — Pensei que estávamos


comemorando você chutando todas as nossas bundas no
teste de cálculo.

— Estamos, mas celebro com responsabilidade. Ficar


bêbado e pelado enquanto está no drive-thru pedindo Taco
Bell, e depois ficar agressivo quando a mulher na janela não
dá a sua comida.

Nick sorriu. — Isso foi uma vez, e aquela mulher


realmente precisava se soltar.

Felicia e eu rimos. — Acho que descobrimos a razão de


estarmos comemorando minha pontuação perfeita no teste e
não sua nota baixa.

Nick pegou a garrafa de Felicia e bebeu outro longo gole


antes de entregá-la a um de seus irmãos da fraternidade. —
Dancem comigo, senhoritas.

Olhei em volta. Ninguém mais na festa estava dançando,


mas isso nunca impediu Nick, e cara, ele poderia dançar. Dei
de ombros. — Certo. Por que não?

Nick fez uma grande comoção sobre a necessidade de


mais espaço na sala de estar e gritou para seu amigo
aumentar o volume da música. Quando já estávamos no meio
da música, a maior parte da festa tinha se juntado a nós.
Nick ficou a minha frente e colocou a bunda para fora, e fingi
lhe dar um tapa. Felicia e eu o imprensamos entre nós e
giramos nossos quadris enquanto movíamos para cima e para
baixo. Foi inofensivo - nós três estávamos brincando desde
que nos conhecemos na orientação de calouros no ano
passado. Além disso, Nick gostava mais do nosso professor
assistente de cálculo, Ian, do que Felicia ou eu.

Dançamos mais algumas músicas e então cantamos


junto ao som de uma nova balada de Ariana Grande enquanto
a interpretamos. Eu me virei, a certa altura, fingindo ser a
garota da música que vai embora, e por acaso olhei para o
outro lado da sala. Os meus olhos encontraram os de Braden.
Pisquei algumas vezes. Tinha bebido alguns drinques, mas
não podia ser ele, embora se parecesse exatamente com ele...
de qualquer forma, quem quer que fosse não parecia muito
feliz. O cara parou no canto da sala e não fez nenhum esforço
para vir em minha direção, embora estivesse claramente me
olhando. Fiz sinal aos meus amigos que voltaria e fui em
direção ao cara, enxugando o suor da minha testa.

— Oh meu Deus, é você mesmo. Achei que estava vendo


coisas. — Sorrio. — O que está fazendo aqui? Não tinha ideia
de que você viria este fim de semana.

— Obviamente. Vim visitar minha namorada e a


encontro moendo contra um cara. Acho que isso deixa ambos
surpresos.

Acenei para meu amigo. — É apenas o Nick. Eu o


mencionei.

— Tenho certeza que disse que estudam juntos, não que


ficam se esfregando.

— Nick é gay. Não está interessado em mim. Estamos


apenas nos divertindo.

— Está se divertindo me fazendo parecer um idiota?

— Como estou fazendo você parecer um idiota?

Alguém aumentou o volume da música ainda mais.


Braden franziu a testa. Ele teve que se inclinar para frente e
gritar para que pudesse ouvi-lo. — Este não é meu ambiente.
Estou indo embora. Vejo-a na próxima vez que voltar para
casa.
— Indo? O quê? Não. Não seja ridículo. Deixe-me dizer
aos meus amigos que estou indo embora. Volto já.

Eu me espremi no meio da multidão para voltar para


Nick e Felicia, mal conseguindo me ouvir enquanto gritava
para eles por cima da música; mas apontei para Braden e
acenei um adeus, e pareceram entender o que eu estava
tentando lhes dizer.

Voltei para Braden e saímos juntos. Quando saí para a


varanda, o meu amigo Jason não viu o cara atrás de mim e
me envolveu em um abraço de urso.

— Aqui está ela. Seja minha parceira de beer pong35,


linda?

Podia sentir a tensão irradiando do homem atrás de mim


antes mesmo de me virar. Desembaraçando-me de Jason,
disse — Umm... Estou indo. Este é meu namorado, Braden.

Jason estendeu a mão. — Braden, seu bastardo sortudo.

Braden olhou para a sua mão e de volta para ele sem


dizer uma palavra, então cruzou os braços sobre o peito.

Jason pode ter bebido por algumas horas, mas não havia
como não perceber a frieza. Entendeu a dica e puxou a mão.
— Está bem então. — Ele chamou minha atenção. — Você
está bem, Autumn?

Sorrio, apreciando sua preocupação, por mais


equivocada que fosse. — Sim, estou bem. Obrigada, Jason.
Braden e eu descemos as escadas e cruzamos o
gramado. Ele desviou para a direita na calçada, então segui
seu exemplo, embora meu dormitório fosse à esquerda.
Passamos por mais algumas casas de fraternidade enquanto
caminhávamos pelo quarteirão em silêncio. Quando
encontramos um BMW, Braden caminhou em sua direção.

— É isso que está dirigindo? O carro é de quem?

Ele contornou o lado do passageiro e abriu a porta para


mim. — É meu.

— Seu? O que aconteceu com o Toyota?

— Eu me livrei dele. Achei que precisava de um carro


melhor para levar os clientes, agora que tenho um emprego.

Os meus olhos se arregalaram. — Você conseguiu o


trabalho? Qual deles?

— Recebi ofertas de três, mas aceitei o emprego na


Andrews e Wilde.

— Você aceitou o emprego na empresa de nossos pais?


Achei que não queria fazer isso?

— Pensei sobre isso. Foi a melhor oferta. Além disso,


conseguirei casos muito mais cedo do que faria em outros
lugares.

— Uau. Parabéns! — Joguei meus braços em volta do


seu pescoço e apertei. Braden não me abraçou de volta, mas
também não me impediu. — Estou tão orgulhosa de você.
— Obrigado. — Acenou com a cabeça em direção à porta
do carro aberta. — Por que você não entra?

Uma vez que estávamos dentro e afivelados, decidi


limpar o ar, embora tenha ficado surpresa ao ver Braden,
fiquei realmente feliz por ele estar aqui. — Escute, não tive a
intenção de aborrecê-lo por dançar com Nick. Acho que o vejo
como inofensivo, já que não gosta de garotas, e nós estávamos
apenas dançando.

— Moer não é dançar. É simular sexo. Mesmo que o cara


não esteja interessado, você estava dando um show para uma
maldita casa de fraternidade, Autumn.

Eu nunca pensei nisso desta forma. A verdade, nunca


pensei sobre dançar. Tomaríamos apenas alguns drinques e
queimaríamos um pouco do estresse. — Sinto muito. Não vi
as coisas desta forma, mas acho que você está certo.

Braden continuou balançando a cabeça e olhando para a


estrada, embora ainda estivéssemos estacionados. — É isso
que faz todo fim de semana? Ir a casas de fraternidades e
ficar bêbada? Jogar beer pong e agir como uma prostituta?

A minha cabeça estalou para trás. — Prostituta? Não ajo


como uma prostituta. Posso dançar com os meus amigos,
mas não me chame de prostituta.

— Talvez então tente não agir como tal.

— Eu me desculpei. Disse que não estava pensando em


como minha dança poderia parecer aos outros, mas não me
chame de prostituta. A verdade, não me ofenda. — Soltei o
cinto e agarrei a maçaneta da porta. Quando fui abri-la,
Braden pegou meu outro pulso. O seu aperto era muito forte.

— Owww. Você está me machucando. Solte-me.

A mandíbula de Braden flexionou. Olhou diretamente


para mim, mas senti que ele não estava realmente me vendo.
— Braden, largue. Isso machuca.

Depois de mais alguns batimentos cardíacos, soltou


minha mão. — Fique. Não saia.

Esfreguei meu pulso. — Isso doeu, Braden.

— Desculpe. Não quis fazer isso. Só queria impedi-la de


ir embora.

Algo sobre o incidente não caiu bem, e meu instinto me


disse para sair.

Braden porém acariciou meu cabelo. — Sinto muito,


baby. Desculpe por tudo – por te ofender e por apertar com
tanta força. — Ergueu meu pulso até a boca e beijou-o por
dentro. — Dirigi todo o caminho depois do trabalho para te
fazer uma surpresa e te contar as boas notícias, e quando te
encontrei, estava em cima de outro cara, e depois outro cara
te agarrou. — Ele balançou sua cabeça. — Exagerei, eu te
amo. Perdoe-me?

Eu me senti mal. Ele dirigiu cinco horas até Boston


apenas para me encontrar me esfregando em outro cara. —
Tudo bem. Apenas, por favor, não deixe isso acontecer de
novo.

Ele sorriu. — Não acontecerá. — Inclinando-se sobre o


console central, afastou o cabelo do meu rosto. — Senti a sua
falta. Estou feliz por ter te encontrado.

Eu amoleci. — Também senti sua falta.

Quando ligou o carro, pela primeira vez me dei conta de


que ele havia me encontrado. — Como sabia onde eu estava
esta noite?

— O seu iPhone. Rastreador de localização.

— Oh. — Pensei um minuto. — Não sabia que estava


usando isso. Não tenho que lhe conceder acesso ou algo
assim?

Braden encolheu os ombros e estendeu a mão. — Acho


que você fez em algum momento.

Tive, mais uma vez, uma sensação fugaz e engraçada,


mas este era meu namorado há dois anos... provavelmente
compartilhei minha localização com ele em algum momento e
simplesmente não me lembrava. Empurrei isso de lado e
entrelacei meus dedos com os dele.

Ainda assim, pelo resto do fim de semana, não consegui


me livrar desta sensação mesquinha. Continuei tentando me
lembrar exatamente quando compartilhei minha localização
com Braden. Eu tinha uma memória muito boa, mas por mais
que pensasse e por quanto tempo, não conseguia me lembrar
de tê-lo feito.
CAPÍTULO 14

Donovan

— Vamos, Elliott. Trabalhe comigo nisso.

Elliott Silver jogou um arquivo de sua mesa sobre uma


mesa dobrável instalada à direita. O arquivo atingiu uma
pilha gigante e derrubou duas outras pastas no chão. Ele
franziu a testa.

Eu definitivamente não perdi meus dias no escritório do


DA36.

— Tem dois antecedentes e tem doze anos, Decker. Ele


também quebrou dois ossos do nariz do cara – a violência
está aumentando. Este é exatamente o tipo de caso em que
não deveria fechar um acordo.

— E se dermos a você um traficante?

Elliott acenou com as mãos em torno de seu escritório. —


Pareço precisar de outro caso?

— Este não seria outro caso. Seria um caso melhor. Pode


se livrar dessa merda sem valor sobre um menor e prender
um cara que poluiu as ruas com drogas por anos.

Ele balançou sua cabeça. — Sem ofensa, Decker, mas


tudo o que tenho que fazer é dirigir meu carro até quase
qualquer esquina daquele bairro, baixar minha janela e
balançar um pouco de verde37 – e posso pegar um traficante.
Por que deixarei algum malandro escapar quando não preciso
de tudo o que ele tem?

Isto estava se tornando mais difícil do que pensava. —


Storm não é malandro. É um bom garoto com boas notas que
acabou de se ferrar na vida. É uma vítima do ambiente.
Colocá-lo em um centro de detenção juvenil só agravará isso,
não o tornar melhor.

Elliott semicerrou os olhos para mim antes de rir. —


Droga. Ficou ainda melhor com o passar dos anos. Quase
acredito que você acha que esse garoto tem uma chance.

Soltei um suspiro profundo. Este garoto tem uma chance.


Sei disso porque eu era esse maldito garoto. Geralmente não
sou o tipo de cara que joga merda nas pessoas, mas me sentia
muito desesperado agora.

Inclinei-me para frente em meu assento. — Ouça. Nunca


cometeu um erro?

— Alguma vez quebrei o nariz de outra pessoa? Não, não


quebrei.

— Ok, mas deve ter cometido algum erro. — Hesitei,


porque realmente não é meu estilo ameaçar alguém – pelo
menos não desde que cresci, mas foda-se. Precisava disso,
por mais de um motivo. — Talvez até aqui no trabalho uma
vez? Nunca cometeu um erro que poderia ter ferrado você de
alguma forma, e alguém em algum lugar lhe deu uma
segunda chance?

Elliott começou a arrumar sua pasta, mas parou no meio


do caminho e olhou para mim. Durante nosso primeiro ano
no escritório do promotor, ele estragou um caso regiamente –
quebrou o sigilo de uma mulher com quem estava dormindo,
que descobriu ser a irmã do traficante de drogas que armou
para ele. Eu peguei o caso e enterrei para ele, fechando um
acordo que o cara não merecia.

Ele segurou meus olhos enquanto balançava a cabeça. —


Você é um filho da puta, sabia disso?

Baixei a cabeça e a balancei, com vergonha de olhar o


cara nos olhos. — Preciso disto, Elliott.

Ele voltou a enfiar arquivos em sua pasta e falou entre os


dentes cerrados. — Tudo bem, mas não vou retirar as
acusações imediatamente. Ele entrará em um programa de
desvio antes do julgamento. Irá a um psicólogo semanalmente
durante um ano, se inscreverá em um programa de controle
da raiva e fará cinquenta horas de serviço comunitário. —
Ergueu um dedo em advertência. — Se, e quando completar
tudo, e desde que não se meta mais em problemas, então
retirarei as acusações.

Eu interiormente faço um soco da vitória. — Combinado.

Elliott me olhou diretamente nos olhos. — E nós estamos


quites depois disto. Não estou brincando, Decker. Não puxe
essa merda para cima de mim de novo.

Concordei. — Entendido.

Ele apontou para a porta atrás de mim. — Agora dê o


fora do meu escritório.

♥♥♥

— Por que está tão atrasado? — Juliette limpou a boca,


amassou o guardanapo e o jogou na vasilha de comida vazia
sobre a mesa.

Peguei a sacola e tirei meu almoço. Telefonaram para


nosso pedido usual de quarta-feira, enquanto eu estava
voltando do escritório do promotor.

— Estava no centro, em um caso.

— Oh, sim? Que bilionário indigno salvou hoje?

Sentei-me e abri meu camarão Szechuan com brócolis. —


Hoje usei meus superpoderes para o bem de uma criança, se
quer saber.

Trent e Juliette se entreolharam. — Você já descobriu


uma estratégia para lidar com as coisas? — Perguntou.

Peguei um camarão com meus pauzinhos e coloquei na


boca. — Nenhuma estratégia necessária. Fiz um acordo.
Juliette balançou a cabeça. — Não estava me referindo
ao garoto. Eu quis dizer a sua assistente social.

A minha testa enrugou e encolhi os ombros. — Eu não


disse a ela ainda, mas tenho certeza que ficará feliz com isso.

— Eu quis dizer como lidará com as coisas depois de


dormir com ela de novo? Isso já aconteceu? Não te vemos há
alguns dias...

— Não estou dormindo com Autumn, mamãe e papai,


mas se estivesse, por que precisaria de uma estratégia? É
muito simples... mais ou menos como fazer um hokey
pokey38 vertical. Você coloca seu pênis para dentro, puxa seu
pênis para fora, coloca seu pênis para dentro e o sacode todo.
Posso anotar as direções, se quiserem. Eu sei que já faz um
tempo para ambos.

Juliette estava mordiscando a ponta de seu pauzinho,


mas agora o usou para espetar meu braço. — Sério, idiota. O
que fará a respeito de Dickson?

— Bem, não farei com ele hokey pokey vertical.

— Deixe de ser um idiota, e fale sério por um minuto —


disse. — Você precisa do voto de Dickson. Acha realmente que
quando ele descobrir que está transando com a mulher com
quem está saindo, votará em você?

— Primeiramente, não estou dormindo com a Autumn e,


em segundo lugar, se o fizesse, não seria da conta dele.
Juliette franziu a testa. — Então esse é o seu plano? Não
tem um.

Olhei para Trent como a voz da razão. — O que estou


perdendo aqui? Que planos devo ter?

Trent chupou o canudo de seu refrigerante até que fez


um som vazio de sucção. — O seu plano deveria ser recuar,
pelo menos até depois da votação da sociedade.

— Como posso fugir de um caso?

Juliette revirou os olhos. — Você acabou de dizer que


resolveu o caso no qual ela está envolvida. Ligue para ela e
lhe dê a boa notícia, e então não fale com ela novamente por
um mês ou mais.

Estava pensando mais ao longo em lhe dizer


pessoalmente e sugerir que tomássemos uma bebida para
comemorar, mas não mencionei isso. — Está se preocupando
à toa.

Almoçamos em uma sala de conferências com paredes de


vidro, basicamente um aquário. Assim que levantei outro
pedaço de camarão à boca, ninguém menos que o próprio
Dickson passou. Olhou para dentro, me viu e abriu a porta.

— Decker, o que está acontecendo com o caso Stone?

Que idiota. Sabia o que ele queria dizer, mas por que
deixá-lo escapar facilmente? — Stone? Acabou de chegar?
Não estou familiarizado com ele.
Os seus lábios se contraíram. — Você nem mesmo se
lembra do maldito nome do garoto? O pro Bono que lhe
designei...

— Oh! Storm. O nome do meu cliente é Storm.

— Tanto faz. Onde está nisso?

De jeito nenhum eu iria deixá-lo ligar para Autumn com


minhas boas notícias. — Estou conversando com o promotor.
Parece promissor.

Ele assentiu. — Bom. Faça acontecer. Este caso é


importante para mim. Mantenha-me atualizado.

Cerrei os dentes e estampei um sorriso de político. —


Com certeza.

Assim que se virou para ir embora, disse — Não acho


que preciso lembrá-lo de que tem muito em que pensar no
modo como as coisas correm no próximo mês. Certifique-se de
dar tudo de si em cada caso – mesmo aqueles pelos quais não
somos pagos. Não apenas deslize pela superfície porque não
há horas faturáveis envolvidas.

Como se ele realmente se importasse com casos pro


Bono. O ano passado, quando meu caso de brinde foi para
um residente de uma casa de repouso, me disse que o tempo
que eu gastaria deveria ser proporcional ao tempo que a
mulher duraria.
A minha mandíbula flexionou. — Claro. Não deslizarei.
Vou penetrar o mais fundo possível.

Vi os olhos de Juliette se arregalarem, do canto do meu


olho. Ela rapidamente desviou o olhar. Se Dickson percebeu,
não demonstrou. Olhou entre nós três e acenou com a
cabeça. — Bom. Mantenha-me atualizado.

Assim que a porta se fechou e estava no corredor, os


olhos de Juliette se arregalaram. — Você é louco?

Sorrio. — Só estou fazendo o que o chefe quer.

— Você é tão idiota. Esqueça o comentário estúpido e de


penetração profunda. Felizmente, isso pareceu passar
despercebido por ele, mas lhe perguntou se resolveu o caso –
o que você fez – e ainda assim disse que estava trabalhando
nisso porque quer ser o único a contar a Autumn.

— Então? — Dei de ombros. — Por que não deveria


contar à minha cliente as boas notícias?

— Autumn não é sua cliente. A criança é. Além disso, ele


pediu que o mantivesse informado sobre o andamento do
caso. Não acha que ele ficará irritado quando descobrir pela
mulher que está saindo que você resolveu tudo?

Ela tinha razão, mas não deixaria aquele idiota levar o


crédito pelas cordas que tive que puxar. Balancei minha
cabeça. — Pare de se preocupar tanto. Vai funcionar.

— Sabe do que você precisa?


Acenei. — Sei. A verdade, sou a única pessoa que sabe
do que preciso.

Juliette me ignorou. — Você precisa de uma distração.

Estar aqui no escritório parecia uma distração


ultimamente. — Estou bem.

— Vou marcar um encontro para você com minha amiga.


Ela é uma instrutora de ioga – se curva como um pretzel e é
linda.

— Estou bem, mas obrigado.

Trent ficou quieto, mas olhou para mim e balançou a


cabeça. — Juliette está certa. Falta pouco mais de um mês
para a votação de sociedade. Dickson está te perturbando
sobre como esse caso está indo por um motivo. Obviamente
gosta muito de Autumn. Não estou dizendo que recue para
sempre, mas talvez deixe o que quer em banho-maria por um
tempo. Um mês não é muito tempo para esperar.

Fazia menos de uma semana desde que vi Autumn, e já


fazia muito tempo. Eu tinha certeza de que meus amigos
estavam exagerando, mas não demoraria muito para perceber
que talvez a sua perspectiva tivesse algum mérito...
CAPÍTULO 15

Autumn

Não estava no espírito para ir a uma festa.

As minhas entranhas se agitaram enquanto íamos aos


Hamptons para o churrasco. Eu não conseguia afastar a
sensação de que estava fazendo algo errado – como se fosse
culpada, embora não tivesse cometido um crime. Bem,
nenhum crime físico de qualquer maneira. Agora,
estrangulamento emocional? Essa era uma história
totalmente diferente.

Blake olhou para onde eu estava sentada olhando pela


janela. — Está se sentindo bem hoje?

— Sim. Só tenho muito em que pensar no trabalho.

Ele assentiu. — Stone está causando problemas de novo?

Fiz uma careta. — Storm. E não, na verdade tem estado


um pouco melhor ultimamente.

— Blake Jr., meu filho de oito anos, também passa por


fases em que faz um drama. Normalmente é só porque quer
um pouco mais de atenção.
Ummm... Acho que Storm pode estar mais chateado por
sua mãe ser uma viciada que o abandonou, e está preso
vivendo em um abrigo cheio de crianças problemáticas que
ninguém quer. — A maioria das minhas crianças agem porque
estão com raiva, em vez de querer atenção. Eles não sabem
como lidar com suas emoções e foram ensinados na rua que
qualquer demonstração de sentimentos é uma fraqueza.

Blake sorriu. — Ouça você – já parece a Dra. Wilde.

Tentei sorrir e voltei a olhar pela janela.

A casa de Rupert Kravitz ficava no pequeno vilarejo de


Sagaponack, que fazia parte dos Hamptons. Se Blake não
tivesse me dito que era o código postal mais caro da Costa
Leste, poderia até ter gostado da pitoresca cidadezinha
enquanto passávamos, mas assim que começou a recitar os
nomes de pessoas famosas que moravam aqui e de quantos
agentes da Goldman Sachs39 possuíam casas sobre água,
senti o mesmo gosto ruim na boca que tive ao voltar para
casa, para o bom e velho Greenwich e os amigos arrogantes
do meu pai.

Para ser sincera, lamento ter vindo hoje.

Dentro do complexo Kravitz, me senti como se tivesse


entrado em uma festa de aposentadoria. Homens com cabelo
branco, calças cáqui e blazers azul-marinho ficavam bebendo
em copos de cristal, enquanto suas esposas de rostos
congelados usavam chapéus grandes para manter o Botox
protegido dos danos do sol. Sorrio enquanto Blake fazia as
apresentações, colocando o mesmo sorriso plástico que usei
nas festas do meu pai durante anos. Havia, lá fora, alguns
caras mais jovens, mas Blake definitivamente parecia ser um
dos mais jovens, se não o mais jovem. Percebi também que
conheci muitos associados chamados Rupert, Michael e Larry
e, embora houvesse pelo menos alguma diversidade entre os
homens, não havia uma única Susan, Michelle ou Christine.

— A sua empresa não gosta de mulheres como sócias? —


Perguntei discretamente em nosso caminho até um bar ao ar
livre montado à beira da piscina.

Blake sorriu. — Nós temos uma. Tínhamos duas, mas


sobrou uma.

— Quantos associados existem no total?

— Há nove sócios seniores que administram a empresa e


vinte e oito associados adicionais que compartilham o capital.

— Trinta e sete associados e têm uma mulher – e, claro,


aquela que foi embora. Ela poderia ter saído porque se sentia
deslocada?

Ele deu uma risadinha. — Elaina foi embora porque se


mudou para a Grécia, na verdade. É de onde era
originalmente. A sua mãe ficou doente, então tirou licença
para ir cuidar dela e, enquanto estava lá, decidiu que queria
uma vida mais simples em casa.

— Por que há tão poucas mulheres associadas?


— Acho que porque não é fácil ser sócio da firma. O
advogado médio trabalha de setenta a oitenta horas por
semana por mais de dez anos antes de conseguir. Você se
forma em direito por volta dos 24 anos, e muitas mulheres
querem um trabalho menos exigente porque se casam e têm
filhos, ou planejam ter.

— Isso parece incrivelmente arcaico.

— Pode ser. — Encolheu os ombros. — É uma decisão de


equilíbrio contudo entre a vida pessoal e profissional. Se é
casado com seu trabalho, é difícil ser casado com outra
pessoa. Basta perguntar à minha ex-mulher. — Aproximamo-
nos do bar. — Quer vinho?

— Claro. Branco, por favor.

Enquanto esperávamos por nossas bebidas, olhei ao


redor. — Você me apresentou a muitas esposas, então como
estes caras fazem funcionar?

— Não funcionam. Não com suas primeiras esposas de


qualquer maneira. — Blake examinou a sala. — Nenhuma
mulher que eu possa ver no momento é a original. Quando se
casa pela primeira vez, geralmente se casa por amor, e essa
pessoa espera seu amor e tempo em troca. Depois que isso
não dá certo, se casa por companheirismo e conveniência.
Todas as suas cartas estão sobre a mesa, então ambos sabem
no que estão se metendo.

— Isso parece... triste.


— Pode ser, mas também é realista. Muitas mulheres
perdem as parcerias porque querem uma família, mas da
mesma forma que muitos homens perdem uma família porque
querem uma parceria.

Eu não tinha certeza se era o meu humor antes de


chegarmos, ou a conversa que tínhamos acabado de ter, mas
um sentimento de melancolia se instalou. A descrição de
Blake de uma segunda esposa me fez perceber que era
basicamente o que eu estava procurando – um companheiro
para passar o tempo, mas nunca realmente amar. Fiquei
triste por nunca ter paixão, pelo menos não do tipo que
consome seu coração, corpo e alma. Claro, havia paixão
sexual – que eu poderia ter. E nos últimos anos isso foi o
suficiente. Posso até ter esquecido que qualquer coisa mais do
que aquilo que poderia existir, mas parecia impossível tirar da
minha cabeça ultimamente.

— Você ficará bem por alguns minutos? — Blake


perguntou. — Preciso ir ao banheiro masculino após a longa
viagem.

— Oh... sim, claro.

Ele beijou minha bochecha e realmente me senti aliviada


quando se afastou. Precisava ficar sozinha por alguns
minutos. As minhas emoções estúpidas estavam levando o
melhor de mim hoje. Ainda assim, enquanto olhava para a
água azul e límpida da piscina, não pude deixar de pensar em
Donovan. O que senti ao seu redor foi tão diferente do que
senti quando passei um tempo com Blake. Donovan me fez
querer – querer mais, correr mais riscos, confiar novamente,
acreditar que o mundo poderia mudar e ser um bom lugar.
Doía fisicamente reprimir todos estes sentimentos. Suspirei e
tomei um gole de vinho.

Cedo demais, Blake voltou. — Está com saudades de


mim? — disse.

— Claro — menti.

Uma leve brisa soprou, picando minha pele. Estava com


um vestido de verão e esfreguei meu braço por causa do frio.

— Está com frio? — As sobrancelhas de Blake franziram.

— Não estava até agora. A brisa me arrepiou um pouco.

Blake tinha um guardanapo enrolado na bebida em sua


mão. Ele o tirou do vidro e o usou para limpar o suor da
testa. — Devo ter perdido esta brisa que pegou. Se vier de
novo, envie-a em minha direção. Está muito quente aqui na
piscina.

Achei que era porque estava com uma camisa de manga


comprida, enquanto eu estava usando um vestido de verão. —
Por que não vamos ficar embaixo do toldo? Não estou com
muito frio. Foi apenas aquela brisa que me deu arrepios.

— Isso seria ótimo, se não se importa.

Começamos a caminhar em direção à casa, eu na frente


de Blake. Estive olhando para baixo, com cuidado para não
deixar meu calcanhar preso no gramado, mas quando
chegamos ao pátio, olhei para cima e congelei. Blake esbarrou
nas minhas costas, derramando um pouco de sua bebida em
minha pele exposta. Ele se desculpou, mas eu estava muito
ocupada olhando para a frente para prestar atenção ao que
dizia.

Aqueles arrepios afinal, não foram causados por uma


brisa.

Pisquei algumas vezes para ter certeza de que minha


mente não estava me pregando peças, mas os olhos azuis
fixos em mim eram tão reais quanto poderiam ser.

O que Donovan está fazendo aqui?

♥♥♥

Era eu agora quem estava suando.

Fiquei ao lado de Blake, fazendo o meu melhor para


fingir que fazia parte da conversa que estava tendo com um
de seus parceiros, mas meus olhos continuavam voltando
para o homem parado do outro lado do pátio. A cada trinta
segundos ou mais, olhava para ele, e toda vez o encontrava
olhando de volta para mim. Fiquei nervosa por Blake pegá-lo
e pensar que ele estava me olhando, e isto prejudicaria suas
chances de se tornar sócio. Blake já havia dito que não era
um grande fã de Donovan Decker. Fiquei totalmente ereta, me
sentindo à espera de que um acidente de carro acontecesse.
Podia vê-lo, disparando pela estrada a cento e cinquenta
quilômetros por hora, mas não podia fazer nada para pará-lo.

Estava perdida em minha cabeça enquanto as pessoas


ao meu redor falavam, até que a conversa finalmente chamou
minha atenção.

— Vejo que Mills e Decker chegaram. O que acha dos


dois?

— Eu gosto de Mills — disse Blake. — Ele é inteligente,


toma decisões sólidas e investiu seu tempo. Decker é um
advogado melhor, mas também é um cabeça quente. Age com
base nas emoções, e isso indica que provavelmente não está
pronto para a sociedade.

— Isso é verdade. — O outro cara inclinou sua bebida


para Blake. — Decker contudo também tem um faturamento
melhor do que Mills, e traz uma boa parcela dos novos
negócios. Ele fez um nome para si mesmo entre os fazedores
de chuva40 de Wall Street como alguém a quem recorrer
quando a merda chegar ao ventilador. Não gostaria que ele
abandonasse o navio e levasse esse negócio com ele.
Precisamos lhe dar um motivo para ficar por aqui.

Blake encolheu os ombros. — Ainda não decidi ao certo.


— Olhou para mim e piscou. — Estou vendo como algumas
coisas dão certo.
Limpei minha garganta. — Achei que hoje fosse um
churrasco só para os sócios?

— É. Bem, mais ou menos. Todos os sócios vêm, mas os


candidatos finais a sócios também são sempre convidados. É
uma forma de conhecê-los fora do escritório. Muitos dos
sócios tiveram pouquíssima interação com caras de diferentes
divisões, no entanto, podem votar. Portanto, é tradição que os
candidatos sejam convidados.

O outro cara sorriu. — É a última oportunidade de


rastejar.

Poucos minutos depois, o sócio dono da casa chamou


Blake para dentro. Ele se desculpou e beijou minha
bochecha. — Volto em alguns minutos.

Donovan caminhou, no minuto em que ele saiu do deque


através da arcada. O meu coração estava batendo forte no
peito no momento em que parou ao meu lado.

— Não esperava vê-la aqui. — A sua voz era firme, mas


seus olhos estavam nadando em emoção.

Fiz uma careta. — Não tinha ideia de que estaria aqui


também. Blake disse que era um churrasco de sócios, e você
nunca mencionou que viria.

Donovan bebeu de uma garrafa de cerveja. Não passou


despercebido que era provavelmente o único que não bebia de
um copo de cristal nesta festa chique. Ele me olhou por cima
da garrafa enquanto engolia. — Eu te liguei ontem. Você não
retornou minha ligação.

— Desculpe. Eu... eu estava ocupada.

— Ocupada me evitando...

— Donovan, eu... — Por cima do ombro, vi Blake sair da


casa e voltar para o deque. Donovan deve ter percebido a
mudança em meu rosto e se virou para seguir minha linha de
visão.

Blake estava a apenas alguns metros de distância


quando Donovan se virou. Olhou para trás e para frente entre
os meus olhos antes de se inclinar para sussurrar: — Está me
matando “pra” caralho ver as suas mãos em você – mesmo
que apenas em suas costas. Gosta da sensação de como ele te
toca?

As suas palavras podem ter soado com raiva, mas havia


muita mágoa em sua voz. O meu peito apertou e tive que
engolir para limpar o nó na garganta. Donovan se afastou e se
endireitou, bebendo o resto de sua cerveja sem tirar os olhos
de mim.

— Decker — disse Blake com um breve aceno de cabeça.


A sua mão serpenteou em volta da minha cintura e os olhos
de Donovan se moveram para encarar os dedos visíveis de
frente. Os meus olhos se fecharam enquanto silenciosamente
rezava para que não fizesse algo estúpido.

— Dickson. — Donovan retribuiu a saudação rápida.


— O que está acontecendo com o caso da Autumn? Achei
que passá-lo a você seria uma decisão inteligente. Estou
começando contudo a me questionar. Estava contando com
você para, pelo menos, levar as acusações a uma
contravenção.

A mandíbula de Donovan apertou. — A verdade,


consegui colocar Storm em um programa de desvio pré-
julgamento. As acusações serão completamente retiradas se
ele fizer algumas pequenas coisas e manter o nariz longe de
problemas por um ano.

Pisquei. — Você conseguiu?

Donovan acenou com a cabeça. — Liguei para você para


discutir os detalhes ontem – foi direto para a caixa postal
após um toque. Devia estar ao telefone... ou pressionado para
ignorar.

Rio nervosamente. — Devia estar ao telefone. Acho que


não verifiquei minhas mensagens, mas esta é uma ótima
notícia. Como conseguiu fazer isso acontecer? Foi seu terceiro
golpe, então achei que estava realmente em apuros.

Os lábios de Donovan se curvaram para o que parecia


um sorriso, mas não havia nada de feliz nisso. — Vendi
minha alma ao diabo, mas achei que este era um caso
importante e valia a pena.

Blake tirou a mão da minha cintura e estendeu-a para


Donovan. — Bom trabalho. Vou me lembrar disso. Você
realmente me surpreendeu recentemente. Tive certeza de que
largaria o velho Bentley depois da merda que ele fez na
semana passada.

Os olhos de Donovan brilharam nos meus. Ele colocou a


mão na mão de Blake, mas suas palavras foram claramente
direcionadas para mim. — Eu queria, mas percebi que
provavelmente não era a melhor ideia.

A mulher a quem fui apresentada anteriormente como a


anfitriã da festa, a esposa do sócio em cuja casa estávamos,
se aproximou e envolveu o bíceps de Donovan com as mãos.
— Aí está você. É bom vê-lo, Donovan.

— Você também, Monica.

— O meu marido se recusou a perguntar se era solteiro,


então pensei em vir e fazer as honras.

Novamente os olhos de Donovan encontraram os meus.


— Eu sou.

— Bom. — Ela inclinou a cabeça em direção à piscina


onde uma linda mulher estava.

Ela provavelmente estava em seus vinte e poucos anos e


usava um vestido branco curto que exibia pernas bronzeadas
de metros de comprimento. — Gostaria de apresentá-lo à
minha sobrinha. Ela acabou de se mudar da Califórnia e
começou a estudar direito no outono. Pensei que talvez ambos
pudessem ser amigos.
O ciúme percorreu minhas veias. Eu sabia que era
absolutamente ridículo, considerando que estava de pé com o
braço de outro homem ao meu redor, mas a lógica não mudou
o que eu sentia.

Donovan sorriu graciosamente. — Claro. — Acenou com


a cabeça mais uma vez para Blake e seguiu a anfitriã até a
mulher na piscina sem olhar para mim.

Pelo resto da tarde, tentei me concentrar em qualquer


conversa da qual deveria ter participado enquanto tentava
não observar algumas pessoas do outro lado do quintal.
Falhei miseravelmente. Cada vez que a loira jogava o cabelo,
me sentia como um touro olhando para uma capa vermelha –
e Deus, ela chicoteava suas mechas. Fiquei grata por ser um
dia quente, então o avermelhamento do meu rosto seria
menos evidente. Ela, em um momento, pressionou as mãos
no peito de Donovan enquanto ria, e eu só queria ir para
casa.

— Com licença um minuto, por favor — disse a Blake e a


qualquer parceiro com quem estávamos conversando.
Honestamente, todos pareciam iguais. — Poderia me
direcionar ao banheiro?

— Claro. — Apontou para a casa. — Suba as escadas e


vire à esquerda ou à direita. Há um em qualquer direção.

Virei à esquerda, no topo da escada, mas alguém estava


naquele banheiro, então fui em busca do outro. Encontrando-
o livre, me fechei dentro, joguei minha bolsa em cima do
reservatório do vaso sanitário e agarrei as laterais da pia,
exalando profundamente. Parecia a primeira vez que consegui
respirar em horas. Queria espirrar um pouco de água fria no
rosto, mas não tinha maquiagem para consertar a bagunça
que faria. Abaixei a minha cabeça, em vez disso, e então
fechei os meus olhos e respirei fundo algumas vezes. Depois
de um ou dois minutos, comecei a me sentir um pouco
melhor – até ouvir a batida.

Não tenho ideia do porquê, mas apenas encarei a porta


sem dizer uma palavra. Depois de trinta ou mais segundos de
silêncio, a maçaneta balançou para frente e para trás, mas eu
a tranquei atrás de mim. Quando um pouco mais de tempo se
passou, pensei que talvez a pessoa tivesse entendido a dica,
mas então ouvi outra batida, e desta vez, foi seguida por uma
voz.

— Sou eu.

Donovan.

Fui até a porta e inclinei minha cabeça contra ela,


falando baixinho. — Vá embora.

— Não vou a lugar nenhum. Abra a porta, Autumn.

Debati em discutir com ele, mas tinha a sensação de que


ele não recuaria, e eu não queria que ninguém o notasse
parado falando através da porta do banheiro; então
destranquei-a.
Donovan abriu com hesitação. Quando não disse ou fiz
nada, ele entrou e fechou a fechadura atrás de si.

— É melhor não ficar muito tempo — disse. — A sua


nova amiga se perguntará onde está.

O canto do lábio de Donovan se contraiu. — Com


ciúmes?

Fiz uma careta. — Não.

O seu lábio retorcido deu lugar a um sorriso cheio de


presunção. — Certo.

Suspirei. — O que quer, Donovan? Você será pego aqui.


Devia voltar lá para baixo.

— Eu não dou a mínima para ser pego. E o que eu


quero? Achei que já tivesse percebido isso. — Ele se
aproximou. — Quero você, Autumn.

Olhei para baixo, balançando minha cabeça. — Apenas


vá com a loira. — Até mesmo dizer as palavras causou uma
dor aguda dentro do meu peito.

— Eu não quero a loira. Quero o que está bem a minha


frente. — Ele deslizou dois dedos sob meu queixo e ergueu a
minha cabeça para que nossos olhos se encontrassem. —
Estou louco por você, Autumn. Sei que sente o mesmo por
mim. O que será necessário para finalmente admitir isso?

Senti o gosto de sal na garganta e engoli em seco para


lutar contra as lágrimas que sabia que estavam a caminho. —
Não posso, Donovan.

Ele se aproximou. — Pode. Não sei por que está com


tanto medo, mas seja o que for, vou ajudá-la a superá-lo.

Eu aguentaria ficar com ciúmes. Poderia lidar com o


ciúme e a sua raiva, mas não poderia lidar com ele sendo tão
incrível e carinhoso. Lágrimas encheram meus olhos.

— Donovan...

Ele deu mais um passo e segurou minhas bochechas.


Uma lágrima quente derramou e começou a rolar pelo meu
rosto, mas seu polegar a pegou. — Não sei mais o que dizer
para te convencer. Então, quero te mostrar. — Olhou para
trás e para frente entre os meus olhos. — Pare-me agora se
não estiver bem com isso.

O meu coração bateu forte no meu peito. A minha cabeça


estava uma bagunça de emoções conflitantes, mas meu corpo
não. Queria o que estava prestes a acontecer mais do que
poderia me lembrar de querer alguma coisa – tanto que meus
lábios se separaram e minha língua deslizou ao longo da
minha boca para molhá-los antes que pudesse pensar sobre o
que estavam se preparando para. Donovan observou
atentamente. Mesmo que meu corpo tivesse basicamente
estendido o tapete vermelho e o convidado a me beijar, ele
ainda me deu tempo para mudar de ideia.

Ele se inclinou mais perto, centímetro por centímetro


meticuloso, até que estivéssemos nariz com nariz, e minhas
inspirações se tornaram suas exalações. Uma de suas
grandes mãos escorregou da minha bochecha para caminhar
até a parte de trás do meu pescoço. Donovan olhou nos meus
olhos uma última vez e, embora tivesse dito que eu precisava
detê-lo, vi uma pitada de hesitação. Naquele momento, o
pânico que estava sentindo sobre ele me beijando de repente
se transformou em pânico de que não beijaria. Então acenei
com a cabeça.

O maior sorriso cruzou seu rosto, pouco antes de ele


esmagar seus lábios nos meus. As nossas línguas colidiram
ansiosamente. Fazia quase um ano desde que nos beijamos,
mas nossos corpos não precisaram de tempo para se
reencontrar. A mão de Donovan no meu pescoço deslizou
para a minha bunda, e com um puxão rápido, me içou no ar.
As minhas pernas envolveram sua cintura e ele se virou e nos
guiou até que as minhas costas bateram na parede. Donovan
se esfregou entre minhas pernas separadas e uma mão
enrolou em meu cabelo e puxou minha cabeça para trás,
expondo meu pescoço. Ele gemeu enquanto beijava dos meus
lábios até meu queixo e chupou meu pescoço.

— Foda-se — rosnou. — Você sente isso? Tem que sentir.


Está arranhando por dentro, tentando sair. — Pegou minha
boca novamente.

Nada jamais teve um gosto tão bom ou parecia tão certo.


Absolutamente nada. Era impossível negar a conexão física,
mesmo que eu continuasse negando a emocional.
Não tinha certeza de quanto tempo ficamos assim –
beijando e agarrando, tateando e moendo – mas nunca quis
que acabasse. Tudo parecia tão certo, tão perfeito. Embora se
saiba o que dizem sobre todas as coisas boas...

Elas são interrompidas por uma batida a porta.

— Donovan...
CAPÍTULO 16

Autumn

— Donovan... — Cutuquei seu peito. — Ouviu isso?

Ele murmurou através de nossos lábios unidos. — Diga


meu nome de novo. Eu adoro isso, porra.

— Não... Donovan... — Afastei-me. — Alguém bateu à


porta.

Ele segurou meu pescoço com firmeza e tentou me trazer


para mais perto novamente. — Isso é apenas meu coração
batendo forte contra minhas costelas.

Poderia estar imaginando? Acho que não, mas estava tão


absorta no momento que tudo era possível. Escutei
atentamente por alguns batimentos cardíacos, mas o único
som era a nossa respiração pesada.

— Viu? — Donovan disse. Ele cutucou meu pescoço mais


uma vez mais perto dele. — Agora me dê essa boca.

Assim que nossos lábios se encontraram porém, outra


batida veio, desta vez mais alta. — Tem alguém aí?

Engasguei com o som da voz do homem. Donovan


rapidamente cobriu minha boca com uma mão e levou o
indicador aos lábios com a outra. Os meus olhos estavam
arregalados quando inclinou a cabeça em direção à porta e
falou. — Ocupado. Sairei em um minuto.

— Desculpe. Sem pressa.

Os olhos de Donovan voltaram para os meus. Ele


novamente fez o sinal de shhh com o dedo. Concordei com a
cabeça, e ele tirou a mão e me colocou no chão antes de me
guiar para o outro lado do banheiro e abrir a torneira.

Ele se inclinou e sussurrou em meu ouvido. — Kyle


Andrews. É um sócio – um cara decente, mas almoça todos os
dias com Dickson.

Senti a cor sumir do meu rosto. — O que faremos?

— Vou sair primeiro e tentar distrai-lo para que possa


escapar.

— Oh meu Deus! Seremos pegos.

— Eu não deixarei que nada lhe aconteça.

— Não estou preocupada comigo, Donovan. Sim, é uma


coisa horrível de se fazer quando estou aqui com outro
homem e ficarei mortificada, mas as coisas com Blake são
casuais. Você perderá o seu emprego, no entanto.

— Não se preocupe comigo.

Balancei minha cabeça. — Vamos apenas ficar aqui.


Donovan franziu a testa. — O cara está esperando. Além
disso, eventualmente as pessoas perceberão que estamos
faltando. Dickson certamente vai, se tiver a metade do
cérebro.

— Por que não dizemos simplesmente que não estava me


sentindo bem e você veio me ajudar?

Os olhos de Donovan caíram para a minha boca, e


correu o dedo sobre o meu lábio inferior inchado. — Ele não é
um idiota.

Soltei uma rajada nervosa de ar quente e balancei a


cabeça. — OK.

— Escute a porta. Quando disser que está calor hoje,


significa que você pode escapar.

Concordei. Donovan desligou a água e foi até a porta. Eu


o segui de perto para não deixar de ouvir nada. Assim que
alcançou a maçaneta, parou e se virou. Pegando minhas
bochechas, se inclinou e deu um último beijo gentil em meus
lábios. Pronta? Ele murmurou.

Eu não estava, mas assenti mesmo assim. Senti-me


fisicamente mal quando abriu a porta o suficiente para
escapar, em vez de fechá-la atrás de si, deixou uma fresta
aberta para eu ouvir.

— Demorou bastante — disse a voz do homem.


— Desculpe. Ei, onde está sua esposa, por falar nisso?
Cheryl, certo?

— Sim. Ela não veio. Está em casa com o que chama de


“gravidez sem fim”. Deus me livre de lembrá-la que ainda tem
dois meses pela frente.

Donovan deu uma risadinha. — Ela é designer, certo?

Como diabos ele está ficando tão calmo e soando tão


normal?

— A maior parte do tempo gasta uma fortuna


redecorando quartos que fez um ou dois anos atrás em nossa
casa, mas sim – era uma designer de interiores.

— Você viu a pintura no final do corredor?

— Não, por quê?

— Você se importaria de tirar uma foto e lhe perguntar


se ela sabe quem é o artista?

— Por que simplesmente não pergunta a Kravitz?

— Ele não se lembra.

— Oh... sim, claro.

Escutei enquanto passos se afastavam da porta. Quando


pararam, Donovan disse — É este. Acho que foi melhor que
sua esposa não tenha vindo, visto que está quente como o
inferno lá fora hoje.
Oh Deus. Esta foi a minha deixa. Achei que fosse
vomitar, mas abri a porta o suficiente para espiar pelo
corredor. O parceiro estava de costas para mim enquanto
encarava a pintura e mexia em seu telefone. Donovan se
inclinou para trás e olhou em minha direção antes de acenar
com a mão para eu sair. Respirei fundo, coloquei minha bolsa
no ombro enquanto saía pela porta e corri para as escadas o
mais silenciosamente que pude. Não tinha ideia se alguém me
viu, porque não parei para olhar para trás. O sangue correu
em minhas veias enquanto corria para o nível principal. Só
quando meus pés deixaram o último degrau é que percebi que
estava prendendo a respiração. E, aparentemente, também
não estava prestando atenção para onde estava indo, porque
dei de cara com um peitoral sólido.

— Uau. Onde está o fogo? — Blake sorriu, mas deu uma


olhada no meu rosto e seus lábios curvados murcharam. —
Você está bem?

As minhas mãos tremiam. As pontas dos meus dedos


estavam dormentes e não conseguia nem tentar esconder que
não tinha mais sangue no rosto. Uma camada de suor
também apareceu na minha testa.

Quando não respondi imediatamente, Blake colocou as


mãos nos meus ombros. — Você está doente?

Oh, graças a Deus. Precisava de alguém para me desse


uma mentira sólida. Concordei. — Sim. Sinto muito. Não
tenho certeza se estou pegando alguma coisa ou talvez tenha
comido algo que não combinava comigo, mas passei mal.

— Estava me perguntando por que demorou tanto no


banheiro. Quer que eu lhe traga alguma coisa? Um
refrigerante ou água ou algo assim?

— Não. — Balancei minha cabeça. — Sinto muito. Acho


que ligarei para um Uber e irei para casa.

— Um Uber? Não seja boba. Eu te levo.

— Não. É a sua festa de trabalho e não estamos aqui há


muito tempo. Você deveria ficar. Não quero estragar a sua
tarde.

Blake sorriu calorosamente. — Não está estragando


nada. Odeio essas coisas, de qualquer maneira. Já mostrei
minha cara um pouco. Era tudo que precisava fazer.

Eu realmente só queria sair furtivamente pela porta,


pular em um Uber e correr de volta para a cidade, mas
também não queria levantar suspeitas. Então balancei a
cabeça, embora a ideia de passar duas horas dirigindo de
volta de Hamptons em um carro com Blake depois do que
tinha acontecido no banheiro me fizesse sentir que teria
urticária.

Blake se inclinou para frente e beijou minha testa. — Há


uma biblioteca no final do corredor – última porta à sua
esquerda. Por que não vai se sentar lá. Vou fazer uma rodada
rápida de despedidas e sairemos daqui.
Precisava colocar minha cabeça no lugar certo, então lhe
agradeci e caminhei pelo corredor. Dez minutos depois, Blake
entrou na biblioteca.

— Desculpe por ter demorado tanto — disse. — Está


pronta para ir?

Levantei-me e tentei um último esforço. — Realmente


não é nenhum problema pegar um Uber. Tem certeza de que
não prefere ficar a passar duas horas no carro com alguém
que não se sente bem?

Blake passou os braços ao meu redor e me trouxe para o


seu peito. — Duas horas com você doente é melhor do que
uma tarde com todos esses palhaços, de qualquer maneira. —
Ele beijou o topo da minha cabeça.

Deus, por que tinha que ser tão legal? Como se eu já não
me sentisse um merda.

— Vamos. — Ele me soltou e gesticulou em direção à


porta. — Vamos tirar você daqui.

Achei que tivéssemos saído ilesos da festa até que Blake


abriu a porta da frente para mim. Donovan estava do lado de
fora na varanda sozinho. Ele olhou para mim, depois para
Blake, depois para mim de novo, sem dizer uma palavra.

— O que está fazendo aqui, Decker? — Blake fechou a


porta atrás dele. — Você não está tentando escapar da festa,
está?
O rosto de Donovan permaneceu impassível. — Não. Só
precisava de um pouco de ar fresco.

— Está se sentindo mal? Autumn acha que algo que


comeu pode não ter caído bem. Espero que todo o lugar não
tenha uma intoxicação alimentar.

Donovan olhou diretamente para mim. — Tenho certeza


que não é uma intoxicação alimentar.

— Bom. Tudo bem então, aproveite a festa. —


Completamente alheio, Blake colocou a mão nas minhas
costas. — E Decker, esta é uma boa oportunidade para você
hoje. Portanto, não faça algo estúpido e estrague tudo.

Fecho meus olhos. Deus, onde estava aquele conselho


meia hora atrás? Senti os olhos de Donovan em mim, mas
não queria piorar as coisas, então mantive minha cabeça
baixa quando me despedi e caminhei até o carro, afundada
em uma caminhada de vergonha.

A viagem para casa foi longa e a gastei perdida em minha


cabeça. Respondi quando Blake me fez uma pergunta direta,
mas fora isso não falei muito. Felizmente, tanto os sintomas
físicos que exibi quanto a distância mental podem ser
atribuídos a não me sentir bem. Quando chegamos ao meu
apartamento, Blake começou a procurar um lugar para
estacionar, mas eu realmente precisava ficar sozinha.

— Sinto muito por ter feito você sair da festa mais cedo,
mas se não se importa, realmente não estou a fim de ter
companhia no momento.

— Oh. Sim, claro. Entendo. Também gosto de ficar


sozinho quando não me sinto bem.

Forcei um sorriso. — Obrigada.

— Vou estacionar e acompanhá-la até a porta.

Balancei minha cabeça. — Está tudo bem. Não precisa


me acompanhar.

— Tem certeza?

Concordei.

— Pelo menos deixe-me estacionar e abrir sua porta.

— OK.

Blake deu a volta para o meu lado e abriu a porta do


passageiro. Estendendo a mão, me ajudou a sair do carro e
manteve minha mão na dele. — Vou enviar uma mensagem
mais tarde para ver como está se sentindo.

Tinha certeza de que ainda estaria me sentindo do


mesmo jeito – como um pedaço gigante de merda. Mesmo
assim, sorri de novo. — Obrigada.

Ele se inclinou para um beijo e uma onda de pânico


tomou conta de mim. Sem pensar, coloquei minha mão em
seu peito e o parei. O rosto de Blake se enrugou.

— Eu... eu não quero deixá-lo doente.


Ele sorriu. — Vou arriscar.

Cobri minha boca. — Não... sério.

Blake me deu um sorriso conciliador e levou minha mão


à boca, roçando seus lábios nos nós dos dedos. — Melhoras.
Vejo você em breve.
CAPÍTULO 17

Donovan

Não vou ligar. A bola está do seu lado. Se ela quiser


continuar vendo aquele idiota, por mim tudo bem. Não posso
fazer nada a respeito.

Engoli minha terceira vodca com limão desde que entrei


pela porta nem mesmo uma hora atrás, peguei o frasco de
spray do balcão da cozinha e comecei a regar minhas plantas
com raiva enquanto reclamava.

— É besteira. Não tem como ela sentir o mesmo por


Dickson.

Spray. Spray.

— Eu só preciso transar. Isso é tudo que é essa merda.

Spray. Spray.

— Não ligarei para ela. Dane-se isso. Sabe o quê? Foda-


se ela.

Spray. Spray.

Lembrei-me então de como ela parecia naquele banheiro


porém – bochechas vermelhas, lábios inchados, cabelo que
parecia ter acabado de ser preso – porque tinha, por mim.
Linda “pra” caralho. E então a sua aparência ao sair da casa –
pálida, nervosa, tão doente quanto fingia estar.

Talvez eu deva apenas verificá-la...

Olhei para o meu celular no balcão e balancei a cabeça.

— Não. Não ligarei para ela. Ela está bem.

Spray. Spray.

E se...

— Não. — Spray. Spray. — Apenas não.

Dez minutos depois, minhas plantas estavam se


afogando, então resolvi me juntar a elas e me servir de outra
vodca. Era mais um cara de duas cervejas, ou uma taça de
vinho no jantar, então o destilado me atingia como uma
tonelada de tijolos.

Bebi a metade do quarto copo e olhei para o meu celular.

— Pare de olhar para mim ou vou borrifar você também.

Este último comentário, por algum motivo ridículo, me


fez rir loucamente. Senti-me um pouco louco de pé no meio
do meu apartamento, curvado em estado de histeria, mas
quando terminei, minha raiva se dissipou. Aparentemente,
precisava de uma boa risada... ou uma quarta vodca.

Peguei meu telefone do balcão, não mais com raiva, e me


dirigi para a sala com o resto da minha bebida na mão.
Chutei meus pés para cima e alternei entre inclinar minha
cabeça para trás e olhar para o teto e beber minha vodca,
perdido em pensamentos.

Aquele beijo de merda. Por mais piegas que parecesse, eu


era um cara que gostava de beijos. Não acontecia com muita
frequência, mas quando se enfiava a língua na boca de uma
mulher e o seu gosto o consumia – era melhor do que a maior
parte do sexo. Sim, é verdade. Sou um cara e acho que um
beijo pode ser melhor do que um orgasmo. A questão é que
sou um cara de trinta anos. Vamos admitir, minha mão pode
me dar um orgasmo. Um buraco na parede funcionaria em
caso de emergência. E não quero ser um idiota presunçoso,
mas tenho muita sorte com as mulheres quando quero ter.
Portanto, o sexo em si mesmo – gozar em uma boceta, boca,
mão ou onde quer que seja – é ótimo, mas é bastante comum
geralmente. Um beijo contudo com uma mulher que está sob
sua pele? Não há nada de comum nisso. Esta merda é
inesquecível.

Terminando minha bebida, decidi que precisava saber se


eu era o único que se sentia assim. Coloquei então o meu
copo vazio sobre a mesa de centro e chamei meus contatos.
Autumn era a primeira. Nem precisei perder tempo
percorrendo.

Ela atendeu no segundo toque. — Ei.

Correndo o risco de soar como um filha da puta maior do


que o comentário do beijo provavelmente já me fez, sua voz
enviou uma injeção de calor em minhas veias.

— Acha que um beijo pode ser melhor do que sexo?

— Se tivesse me perguntado isso há um ano,


provavelmente teria dito não.

Deixei minha cabeça cair para trás contra o encosto do


sofá novamente, curtindo o momento. — Agora?

— Agora acho que um beijo pode parecer oxigênio


quando não consigo respirar.

Sorrio. — Está sozinha?

— Estou.

— Onde está o Dick?

— Ele me deixou em meu apartamento.

— É isso que ele queria?

Ela suspirou. — É o que eu queria.

— Por que isto?

— Porque não tenho o hábito de enfiar a língua na


garganta de dois homens em um dia.

Nós dois ficamos em silêncio por um tempo.


Eventualmente, disse — Isso foi um maldito beijo. — Quando
ela não respondeu, perguntei — Não foi?

— Sim, mas também foi errado.


— Não me pareceu errado.

— Eu estava lá com outro homem, Donovan.

— Com quem tem um relacionamento aberto e nem


mesmo gosta muito.

— Quem disse que não gosto muito de Blake?

— Eu disse. Pode mesmo me dizer que gosta dele?

Ela ficou quieta novamente por um tempo. Quando falou,


sua voz era suave. — Não é que não goste dele, é muito legal e
inteligente. Temos uma boa conversa.

Eu bufei. — Tive uma boa conversa com as minhas


plantas mais cedo. Não significa que quero chupar a cara
delas.

— Donovan...

Balancei minha cabeça. — Autumn.

— Eu sinto muito por hoje. Estou lhe dando sinais


confusos. O beijo não deveria ter acontecido.

— Foda-se, não deveria.

— Gosto de você, Donovan. Eu realmente gosto.

— Eu gosto de você também. Um inferno de um monte.


Tanto que não consigo pensar direito ultimamente. Você é
tudo em que penso. Então qual é o problema?
— Eu te disse. Não quero um relacionamento.

— Está em um com Dickson porém...

— É um tipo diferente de relacionamento.

— Bem, pegarei o que puder. Qualquer que seja o acordo


que tenha com Dickson, eu aceito.

— Gostaria que fosse assim tão fácil.

— Por que não é?

— Porque...

Eu sabia no fundo, a resposta, embora não a


compreendesse de todo. — Porque você tem sentimentos por
mim e não por ele.

— Sei que isso soa ridículo, mas sim.

— Ajudaria se eu fosse um idiota com você? Talvez


pudéssemos planejar sair e não apareceria.

Ela riu baixinho. — Você é um cara bom, Donovan.

Poderia dizer que esta conversa estava chegando ao fim.


Empurrei então, mais uma vez. — Diga-me por que não sai
com um cara de quem gosta. Pelo menos me dê isso para que
possa aceitá-lo e seguir em frente.

— Eu só... quero ficar focada no meu trabalho e acabar a


faculdade.
Sabia que isso era besteira, mas além de ser um idiota,
não tinha para onde ir a partir daqui. Desta vez fui eu quem
soltou o grande suspiro. Nenhum de nós disse nada por cinco
minutos depois disso, mas ouvi a sua respiração e não estava
prestes a desligar. As negociações, o primeiro a romper um
impasse quase sempre perde.

— Sinto muito, Donovan — disse finalmente. — Acho


contudo que precisamos de alguma distância entre nós neste
momento.

Tive que limpar minha garganta e me sentar. — Tudo


bem. Quer que o caso de Storm seja transferido para outra
pessoa?

— Não. Ele confia em você, e isso não acontece com


muita frequência. Você fez um acordo por ele além disso,
então acho que as coisas estão quase concluídas.

— Sim. Ele precisará comparecer perante o juiz para


aceitar os termos, mas isso deve levar dez minutos.

— OK. Obrigada.

— Bem, acho que não há mais nada a dizer. Pedirei à


minha assistente que ligue para você quando tiver a data da
apresentação, para que não precise falar comigo mais do que
o necessário.

A voz de Autumn soou tão triste quanto eu. — OK.


Eu queria ser legal, mas estava frustrado, e o álcool com
certeza não ajudou. — Aproveite sua vida sem emoções, Red.

♥♥♥

A sexta-feira seguinte foi nosso happy hour de trabalho.


Não tive nenhum contato com Autumn, não que esperasse
depois de nossa última conversa. Mesmo assim, a semana foi
uma droga. Perdi um importante argumento de julgamento
sumário, perdi um dia inteiro redigindo moções para impedir
o banco de confiscar mais ativos do Sr. Bentley – o que fariam
de qualquer maneira, mas o cliente exigiu que eu tentasse – e
hoje tive que substituir um parceiro cuja esposa havia
perdido a mãe e ser advogado auxiliar em um caso para
Dickson, entre todas as pessoas.

Eu não tinha certeza do que era pior, passar o dia inteiro


sentado ao seu lado ou o fato de que ele fez um ótimo
trabalho nas argumentações orais. Pelo menos o assunto
Autumn nunca apareceu. Graças a Deus. Tudo o que eu
queria fazer era ir para casa e lamentar para as minhas
plantas, mas Trent e Juliette não aceitariam. Praticamente
me arrastaram para o happy hour. E agora, enquanto bebia
uma cerveja que não queria, percebi por que Juliette estava
tão entusiasmada sobre eu vir esta noite.
— Donovan, esta é minha amiga Margo. — Juliette
sorriu. — Eu a mencionei para você. Ela é a instrutora de
ioga.

Dei um breve aceno de cabeça. — Como está, Margo?

Ela me olhou de cima a baixo, nem mesmo tentando


esconder seu interesse. — O meu dia acabou de melhorar.

Merda. A mulher era linda. Pequena, com olhos grandes,


lábios carnudos e uma cintura fina, mas um monte de seios e
bunda – exatamente o tipo pelo qual normalmente me sentiria
atraído, mas não tinha interesse. Juliette, pensando que
tinha me feito um favor, sorriu para mim e balançou os
dedos. — Tootle-oo41. Deixarei que se conheçam melhor.

Excelente.

Margo jogou a bolsa no balcão ao meu lado e ergueu a


mão para chamar a atenção do barman. — Posso te pagar
uma bebida? — Perguntou.

Eu não estava interessado, mas também não era um


idiota. — Não, obrigado. — Quando Freddie, o barman
regular, se aproximou, Margo pediu um baybreeze42.
Levantei meu queixo para ele. — Coloque isso na minha
conta, certo, Freddie?

— Claro, chefe. — Bateu os nós dos dedos contra o bar.


— É “pra” já.
— Obrigada — disse Margo. Ela se virou para mim. —
Então, Juliette me disse que está solteiro?

— Estou.

— Por que?

Levantei uma sobrancelha. — Por que estou solteiro?

Ela acenou com a cabeça.

— Não sabia que precisava de um motivo para ser


solteiro.

Margo sorriu. — Você é um advogado – um matador pelo


que Juliette me disse. É obviamente bonito. Não acho que
seja novidade para você, já que há um espelho bem ali. E a
minha amiga diz que é um cara genuinamente bom. Homens
assim não ficam solteiros por muito tempo.

Sorrio e esfreguei meu lábio. — Juliette disse que sou


um advogado matador e um cara bom, hein?

Margo encolheu os ombros. — Disse, mas não deixe isso


subir à sua cabeça. Ela também disse que pode ser um idiota
gigante às vezes.

Eu rio. — Bem. Agora isso soa mais como a Juliette que


conheço. Estava começando a me preocupar, talvez estivesse
morrendo ou algo assim, dizendo todas aquelas coisas boas
sobre mim.
Margo sorriu e inclinou a cabeça. — Então, qual é o seu
problema? Rompimento recente? Pegador? Fobia de
compromisso? — Semicerrou os olhos para mim. — Eu não te
considero um filhinho da mamãe.

— Definitivamente não sou um filhinho da mamãe, mas


também não tive uma separação recente. Não tenho medo de
compromisso e, se sou um pegador, não sou muito bom
nisso, considerando que já se passaram cerca de quatro ou
cinco meses desde que fiz sexo.

Margo suspirou e baixou a cabeça dramaticamente. —


Então você é o pior tipo de homem solteiro.

Ela era divertida e eu estava curioso, então mordi. —


Qual é o pior tipo de solteiro?

Ela colocou a mão sobre o coração e balançou a cabeça.


— Está a fim de uma mulher que não está interessada.

O meu sorriso caiu.

Margo percebeu e esfregou meu braço. — Desculpe. Não


tive a intenção de te chatear.

Forcei um sorriso. — Está tudo bem. Não chateou.

Freddie se aproximou e deslizou a bebida de Margo pelo


bar. — Um baybreeze para a moça bonita.

— Obrigado, Freddie. — Acenei.


Margo tomou um gole de sua bebida enquanto estudava
meu rosto, depois colocou seu coquetel no balcão e esfregou
as mãos. — Ok, desembucha.

Balancei minha cabeça. — Desembucha o quê?

— Os seus problemas femininos.

— Não posso fazer isso.

— Certamente pode. Às vezes, é preciso um estranho


para lhe dar uma perspectiva sobre o que está acontecendo –
a menos que já saiba qual é o problema.

Honestamente, me sentia muito desesperado, mas esta


mulher parecia legal, e claramente veio aqui com expectativas
diferentes para a noite. Eu não queria ser um deprimente
total e arruinar a sua noite. — Está tudo bem, mas obrigado
pela oferta. Eu agradeço.

Margo bebeu mais um pouco de seu coquetel e, quando


estava terminando minha cerveja, disse — Estou apaixonada
por um homem casado.

Tossi o álcool pelo canal errado e falei com a voz rouca.


— Como é?

Ela sorriu. — Você me ouviu. Ele é dono da academia em


que trabalho e de outras duas.

— Merda. Ele sabe?


Margo balançou o dedo para frente e para trás. — Não
tão rápido. Se não vamos voltar para casa juntos e tentar
fazer um ao outro esquecer, vamos compartilhar nossos
segredos de maneira justa. Qual é o nome dela, pelo menos?

— Autumn.

— Nome bonito. Ela tem cabelo ruivo?

Sorrio. — Tem, e olhos verdes.

— Legal. Donald tem olhos azuis. — Acenou com a


cabeça em direção a uma mesa. — Quer sentar e conversar?
Não sei se ajudará algum de nós, mas não tenho nada melhor
para fazer.

Rio. — Claro. Por que não?

Margo e eu conversamos nas duas horas e meia


seguintes. Era uma pena estar tão consumido por uma
mulher que não tinha interesse em ficar comigo, porque
gostei muito de Margo. Era inteligente e uma pessoa honesta.
Além disso, instrutora de ioga. O seu conselho para mim foi
fazer exatamente o oposto do que fiz com Autumn – não ir
embora. Suspeitava da mesma coisa que eu – que Autumn
estava em um relacionamento ruim e se queimou ou perdeu
alguém, o que a fez perder a confiança nos homens. Ela então
sugeriu que lhe mostrasse que podia confiar em mim, não
desistindo tão facilmente. Não tinha certeza se sua
abordagem estava correta, mas foi bom ver as coisas da
perspectiva de uma mulher. Infelizmente, meu conselho para
ela não foi tão instigante. Disse-lhe para encontrar um novo
emprego e não olhar para trás. Donald gostava da atenção
que recebia dela, mas nunca deixaria sua esposa – que estava
grávida de seu segundo filho.

Voltamos para o bar para que eu pudesse fechar a conta.


— Deixe-me perguntar uma coisa... Você tem um tipo?

Margo sorriu. — Aparentemente casado, careca e um


idiota.

Rio. — Não, quis dizer, conheceu o Trent?

As suas sobrancelhas se ergueram. — O baixinho que é


realmente jovem?

Eu sorrio. — É esse mesmo.

— Juliette me apresentou a ele mais cedo. Serei honesta,


ele não é o tipo que normalmente escolheria. — Sorriu. —
Você, por outro lado...

Acenei. — Entendo, mas lhe dê uma chance. É um cara


ótimo. Ele também tem trinta anos, embora não pareça.
Algum dia isto será uma coisa boa.

Ela mordeu o lábio em contemplação antes de sorrir. —


OK. Que diabos? Eu vou.

— Venha, vou te deixar conversando com ele na hora de


sair.
Era cedo ainda quando cheguei em casa, cerca de dez
horas. Tomei um banho rápido e reguei minhas plantas –
desta vez, sem reclamar para elas. Talvez minha conversa
com Margo tenha me feito algum bem, afinal.

Fiquei chateado a semana toda, mas de repente me senti


um pouco mais relaxado. Sente-me então, peguei meu
telefone e rolei até minhas fotos, indo direto para o meu
arquivo de favoritos e a única foto solitária na pasta. Autumn.
Eu não tinha ideia de que vinte e quatro horas depois de tirá-
la, a foto seria tudo que teria para me impedir de pensar que
o fim de semana inteiro foi uma invenção da minha
imaginação. E agora era um lembrete de que o destino a
trouxe de volta para mim. Talvez Margo estivesse certa. As
coisas boas não acontecem para as pessoas que vão embora.
Vêm para pessoas que lutam pelo que desejam. Foi o que fiz
na escola e em minha carreira, e me serviu bem, então por
que estava desistindo tão facilmente de algo que sabia que
não tinha acabado?

A resposta não demorou muito para vir até mim. Eu não


estava.

Dane-se isso. Jogar a toalha não era meu estilo. Estava


pronto para doze rounds completos em uma luta, então
tínhamos um longo caminho pela frente.

Com um último olhar para a foto, mudei para os


contatos e selecionei o primeiro nome. Eu teria que pisar com
cuidado – poderia haver uma linha tênue entre deixar uma
mulher saber que iria esperá-la e o assédio. Precisava
descobrir como lidar com isso corretamente, mas por
enquanto, começaria com um texto simples.

Donovan: Estou com saudades.


CAPÍTULO 18

Autumn

— O que você acha disso? — Peguei um vestido de seda


verde que comprei, mas nunca usei, do meu armário e o
pressionei contra o meu corpo antes de me virar para mostrar
a Skye.

— Parece Gucci com sua pele e cabelo.

Enruguei minha testa. — Gucci?

Skye revirou os olhos. — Significa que parece sexy. Às


vezes não consigo acreditar que está na casa dos vinte anos.
O seu vocabulário é o mesmo da minha mãe.

— Uhh. Obrigada?

Ela virou a página de sua revista enquanto estava


sentada na minha cama com um sorriso malicioso. — Não foi
um elogio.

Eu rio e me aproximei do espelho. — Acha que o material


é muito pegajoso?

Ela virou outra página, ergueu a amostra de um anúncio


de perfume e levou-a ao nariz para cheirar. — Não existe algo
como muito pegajoso. Onde usará isso? Além disto... —
torceu o nariz. — Isso cheira a merda.

— Deixe-me cheirar. — Estendeu a revista e me


aproximei e cheirei a página. — Eu gosto.

Ela balançou a cabeça novamente e murmurou baixinho.


— Você realmente está se transformando em minha mãe.

Aos vinte e dois anos, Skye era apenas seis anos mais
nova do que eu, mas às vezes parecia que poderia ser minha
filha. Provavelmente porque era uma criança de verdade
quando nos conhecemos há seis anos.

— Para que é o vestido?

— Tribunal amanhã com uma das minhas crianças.

Ela fechou a revista e balançou as sobrancelhas. —


Ahh... o advogado rico e gostoso que rouba xampu de hotéis e
tem um monte de plantas. O que está acontecendo? Preciso
de todos os detalhes. Você o viu de novo?

Concordei. — Sim... e as coisas ficaram um pouco


complicadas.

— Complicado bom ou complicado ruim?

— Eu meio que fui a uma festa com Blake – disse-lhe que


eles trabalham no mesmo escritório. Tecnicamente, Blake é
um dos chefes de Donovan. Enfim, na festa, acabei dando
uns amassos com Donovan em um banheiro.
— Puta merda. — Ela jogou a revista para o lado e bateu
palmas. — Não pensei que você fosse assim.

Sentei na cama e suspirei. — Eu não sou, Skye.

— Então dê o fora no outro cara.

— Não é isso...

— Então o que é?

— Eu só... não estou pronta.

— Ok, bem... o que está fazendo para se preparar?

Fiz uma careta. — Está jogando minhas próprias


palavras de volta para mim, não é?

— Não. Estou apenas reciclando bons conselhos.

Sorrio tristemente. — Eu sei, eu sei. Dei-lhe um sermão e


te pressionei por anos. Você não precisa me lembrar de que
sou hipócrita. Eu sou boa em falar por falar, mas
aparentemente não muito boa em fazer o mesmo.

Skye pegou minha mão e apertou. — Tudo bem.


Andamos quando estamos prontos para andar, mas talvez
você precise começar a dar passos de bebê.

— Eu dei. Tenho namorado nos últimos anos.

— Não, você tem feito sexo com homens com os quais


não vê futuro. Só sai com caras que não estão procurando por
uma conexão emocional. A única vez que realmente se
conectou com um cara, passou um fim de semana com ele e
não queria fazer sexo. Não acha que isto é um problema? Vai
dormir com um homem de quem não gosta, e não dormirá
com aquele que gosta. Não tenho certeza se isto conta como
dar passos de bebê. É mais como engatinhar.

Soltei um suspiro profundo. — Pode ser, mas gosto das


coisas do jeito que estão.

— Realmente? A ideia de um advogado gostoso


transando com outra mulher não te incomoda?

Skye e eu tínhamos feito um pacto anos atrás de nunca


mentir uma para a outra sobre o que estávamos sentindo.
Não importa o quê. Tínhamos passado por algumas verdades
muito difíceis, então não mentiria para ela agora.

Fiz uma careta. — Isso realmente me dá vontade de jogar


algo – como um abajur pela janela, sem abri-la primeiro.

— Oh, querida. — Ela sorriu tristemente e apertou


minha mão novamente.

Dez minutos atrás, senti como se Skye fosse minha filha,


e agora ela se sentia a mais madura. De certa forma, ela
cresceu mais do que eu, até teve um namorado sério por
quase um ano. E enquanto namorava, eu limitava as coisas
ao sexo. Até o ano passado, não conheci um homem que me
interessasse o suficiente para querer mais. Então perdi minha
bagagem e fiquei fortemente atraída em apenas três dias, mas
corri na outra direção o mais rápido que pude e,
eventualmente, parei de pensar nele todos os dias – até que a
vida me lançou um obstáculo cruel.

— Quando foi a última vez que falou com a Lillian?

Lillian era a minha terapeuta e a de Skye, e a forma


como nos conhecemos. Normalmente, nunca encontrava
outro paciente enquanto esperava minha consulta semanal. O
escritório de Lillian era superprivado e discreto – mantinha
duas salas de espera separadas para que os pacientes nunca
precisassem se ver, mas um dia cheguei cedo e Skye entrou
chorando sem hora marcada. A recepcionista misturou as
salas, então ambas acabamos nos sentando uma de frente
para a outra. Levamos apenas quinze minutos conversando
para nos estabelecermos, e o resto é história.

— Já se passaram provavelmente cerca de dois anos —


digo.

— Acha que talvez seja hora de voltar? Você está indo


muito bem – não me entenda mal, mas você merece muito
mais da vida.

Suspirei. Parei de ir porque não me sentia mais


quebrada. Quando comecei a ver Lillian, eu era uma bagunça
de vidro quebrado. Ela me ajudou a juntar todas as peças.
Não foi até agora que percebi que minhas peças estavam
apenas encaixadas, não permanentemente coladas.

— Pensarei sobre isso.


— Bom. — Skye sorriu. — Agora me dê detalhes sobre o
beijo.

— Foi... — Balancei minha cabeça. — Diferente de tudo


que já experimentei. Esqueci completamente onde estávamos
e me senti perdida no momento. É difícil de explicar, mas
Donovan tem essa aspereza na maneira como me toca que me
faz sentir como se estivesse perdendo a cabeça por mim, e é a
coisa mais sexy de todas. Foi assim o fim de semana que
passamos juntos também. Ele é quase dominante quando as
coisas ficam físicas, o que normalmente odiaria, mas sei no
meu coração que não é uma coisa de controle para ele. É
mais ele expressando o quanto me quer. Se um dos
associados não tivesse interrompido, acho que talvez
tivéssemos acabado fazendo sexo contra a parede.

Os olhos de Skye se arregalaram. — Vocês foram pegos?

Neguei com minha cabeça. — Quase fomos, no entanto.


Consegui escapar porém, fingi estar doente e Blake me levou
para casa.

— Você o viu desde então?

— Donovan? Não. Conversamos ao telefone mais tarde


naquela noite, e lhe disse que achava que deveríamos manter
distância.

— Há quanto tempo foi isso?

— Cerca de duas semanas.


— Então você não tem contato com ele há algum tempo?

— Bem, essa é a coisa estranha. Depois que


conversamos ao telefone, ele não me contatou por quase uma
semana, mas então recebi uma mensagem uma noite que
dizia estou com saudades. Não respondi e no dia seguinte
recebi um enorme buquê de flores com um bilhete que dizia
ainda pensando em você. E todos os dias desde então, fez algo
assim, mas não nos vemos ou nos falamos há duas semanas.

— Huh...

— Huh, O quê?

— Ele não sabe nada sobre o seu passado, certo?

— Não, por quê?

— Porque está te dando espaço, mas te deixando saber


que ele não vai a lugar nenhum. É exatamente assim que se
lida com alguém como nós, mas ele não conhece a história.

— Ele é muito inteligente e intuitivo.

— Então provavelmente percebeu que você está se


apaixonando por ele e está apenas com medo.

Eu não estava me apaixonando, estava?

Skye viu minha expressão e riu. — Você descobrirá


eventualmente. Agora vamos, temos quatro episódios para
assistir. Estou morrendo de vontade de saber qual é a história
daquela vadia louca que foi tirada da cerimônia da rosa
depois de desmaiar.

♥♥♥

— Bom dia.

Era possível ser sexy com apenas duas palavras? Não


achava, mas Donovan Decker parecia capaz de ser – e apenas
às oito e quarenta e cinco da manhã de uma segunda-feira,
também. Não tinha certeza se era o terno bem ajustado de
três mil dólares cobrindo a massa de tatuagens que eu sabia
que estavam escondidas por baixo, ou o sorriso arrogante que
puxou seus lábios enquanto sua voz profunda permanecia tão
firme. Bom dia. Foda-se minha vida.

Suspirei. — Bom dia.

Storm ergueu os olhos do telefone por meio segundo. —


Ei...

— Está prestes a cair um aguaceiro a qualquer minuto —


disse Donovan. — Por que não entramos, e encontrarei uma
sala vazia para conversarmos antes de vermos o juiz?

— OK.

O tribunal tinha uma daquelas portas giratórias de


catraca. Donovan estendeu a mão para Storm entrar
primeiro. Assim que o compartimento seguinte surgiu,
estendeu a mão para mim, mas me surpreendeu pulando na
pequena área apertada bem atrás de mim. E como se já não
estivesse abalada com a proximidade, senti seu hálito quente
em meu pescoço enquanto sussurrava em meu ouvido. —
Está linda. Verde é a minha segunda cor favorita em você.

Quase tropecei ao andar pela porta giratória, mas


consegui sair do outro lado, feliz por ter um pouco de ar.
Donovan parecia perfeitamente bem.

— Por aqui — disse.

Caminhamos pelo longo corredor até a última sala à


esquerda. Donovan abriu a porta e olhou para dentro.
Encontrando-a vazia, a abriu mais amplamente. — Vamos
entrar aqui para conversar.

Storm foi primeiro, e então foi a minha vez. — Qual é a


sua favorita em primeiro? — Perguntei ao passar.

Os olhos de Donovan brilharam. — Nude.

Esta será uma longa manhã.

A brincadeira parou quando Donovan entrou no seu


papel de advogado e explicou os termos do acordo a Storm.

— Entendeu tudo o que eu acabei de dizer?

— Sim. Se eu não tiver problemas por um ano, as


acusações serão retiradas.
— Certo — disse Donovan. — O que acontece se tiver
problemas porém durante o próximo ano?

— Mesmo? — Storm disse. — Eu não sou um idiota.

— Storm... — avisei.

Donovan sorriu. — Está bem. Sei que parece que estou


fazendo uma pergunta simples, mas a resposta não é tão
simples quanto pensa. Se tiver problemas durante o próximo
ano, a acusação pendente será restabelecida juntamente com
quaisquer novas cobranças feitas contra você. Isto significa
que um juiz do tribunal de família está julgando dois crimes
ao mesmo tempo. Parece semântico, mas um juiz que tem
duas acusações à frente do nariz se sentirá obrigado a lhe dar
uma lição, então o resultado pode ser mais sério do que dois
juízes diferentes presidindo duas acusações diferentes com
seis meses de intervalo. Isto pode não ser justo, mas essa é a
verdade da questão.

— Então o que faço? Aceitar a pancada com este para ter


uma chance melhor da próxima vez? — Storm perguntou.

— Não. — Donovan se inclinou para frente e se certificou


de ter a atenção de Storm, então falou lentamente. —
Certifique-se de que não haja uma próxima vez. Não pode
haver uma próxima vez, Storm.

— Tudo bem... — resmungou.

— Falo sério. Você acabará em um lugar ruim de onde


não voltará. — Donovan ergueu o braço e puxou a manga da
camisa, expondo o relógio... mas também deu um vislumbre
de suas tatuagens. Os olhos de Storm se prenderam na tinta
antes de encontrar seu advogado novamente, e isso me fez
pensar se Donovan precisava verificar a hora em seu relógio.

— Tudo bem. Entendo — disse Storm.

Donovan acenou com a cabeça. — Bom.

— Terminamos agora? Tenho que mijar.

— Sim, terminamos — disse Donovan. — Vou


acompanhá-lo ao banheiro e ver se o juiz está no horário esta
manhã. — Ele se virou para mim. — Volto em alguns
minutos.

Poucos minutos depois, um oficial de justiça abriu a


porta da sala em que eu estava sozinha.

— Oh, desculpe. Achei que Decker estava aqui.

— Ele está — disse. — Ou estava. Foi ao banheiro


apenas. Deve voltar a qualquer minuto.

— Bem. Poderia informá-lo que há uma mudança de


planos e que o juiz Oakley está pronto para recebê-lo agora?

— Oh, tudo bem. Obrigada. Vou avisá-lo.

Quando Donovan não voltou depois de mais alguns


minutos, juntei minhas coisas e decidi ir procurá-lo. Eu o vi
parado do lado de fora do banheiro masculino, falando com o
homem que reconheci como o promotor da última vez que
estivemos aqui. Não queria interromper, então esperei que
terminassem a alguns metros de distância, pensando em dar
privacidade a eles, mas aparentemente não esperei longe o
suficiente para evitar a conversa deles.

— Então, qual é o negócio com a mulher que vem com


seu cliente?

— Ela é a sua assistente social.

— Alguma chance de saber se ela é solteira?

Donovan levou um minuto para responder. — Felizmente


casada e com seis filhos. O marido é um boxeador
profissional.

— Merda. OK. Vou manter distância.

— Boa ideia.

Storm saiu do banheiro e se aproximou de mim, ao invés


de Donovan. Então Donovan se virou para segui-lo e me
encontrou parada a cerca de dois metros de distância.
Estudou-me, provavelmente tentando descobrir se eu tinha
ouvido.

Levantei uma sobrancelha e sorri.

Ele riu para si mesmo e voltou-se para o promotor. — Te


vejo lá dentro.

Quando se aproximou, o sorriso ainda estava em seu


rosto.
— Acho que um policial armado teria sido mais eficaz do
que um boxeador.

Donovan riu e colocou a mão nas minhas costas. —


Provavelmente está certa, mas vamos lá, vamos entrar e selar
este negócio.

O telefone de Donovan começou a zumbir, enquanto


caminhávamos em direção à sala do tribunal, verificou o
identificador de chamadas e seu passo vacilou.

— Tudo certo? — Perguntei.

— Sim. É o Bud. Geralmente não liga durante o dia. A


verdade, raramente pega o telefone, mas vou chamá-lo
quando terminarmos. Eles estão prontos para nós. —
Donovan abriu a porta do tribunal.

Ele se acomodou a mesa do réu com Storm, e eu me


sentei na fileira atrás deles na seção de espectadores.
Enquanto esperávamos o juiz se sentar, notei Donovan tirar o
telefone do bolso novamente e olhar para ele. O seu rosto
parecia preocupado, mas o oficial de justiça ocupou o seu
lugar e o tribunal foi chamado à ordem.

Todo o processo demorou menos de cinco minutos.


Fiquei triste ao ver o quão rotineiro era ter um garoto de doze
anos na frente do juiz para que as acusações criminais
pudessem ser lidas em voz alta. Assim que o promotor disse
que havia concordado em um acordo com o réu, o juiz mal
ergueu os olhos antes de bater o martelo e a coisa toda
acabou.

Donovan arrumou tudo e nós três saímos do tribunal.


Ele pegou o telefone novamente, de volta ao saguão. — Com
licença um minuto.

Ele deu alguns passos para longe, mas ouvi seu lado da
conversa.

— O que foi, Bud? Tudo certo?

Pausa.

— Merda. Onde você está?

Pausa.

— O que aconteceu?

Pausa.

— Estarei aí em meia hora.

Donovan parecia exausto quando voltou.

— O que está acontecendo? Bud está bem?

— Ele... — Donovan olhou para Storm e claramente


mudou de direção. — Está bem. — Então chamou a minha
atenção e me disse que nem tudo estava bem.

— Fechamos o negócio aqui. — Virou-se para Storm. —


Mantenha-se longe de problemas. Não me importo se os
problemas vierem lhe procurar. Corre para o outro lado.

Storm revirou os olhos. — Tanto faz.

Donovan gesticulou em direção à porta. — Preciso ir


embora. Vocês estão bem para sair daqui?

— Sim, claro. — Concordei. — Vá em frente.

Eu mal tinha pronunciado as palavras, e Donovan já


estava correndo em direção à saída. Felizmente, Storm estava
tão ocupado compensando os oito minutos colossais que não
podia estar em seu telefone que não pareceu notar nada de
estranho.

Coloquei minha mão em seu ombro. — Vamos. Vamos


voltar para a escola.

♥♥♥

Tinha sido eu a dizer que Donovan e eu precisávamos


manter a distância, mas não podia deixar as coisas como
terminaram hoje. Depois que deixei Storm na escola, voltei ao
meu escritório para mergulhar em uma montanha de
papelada, mas não conseguia me concentrar. Estava
preocupada com Bud e queria ter certeza de que ele estava
bem. Enviei uma mensagem rápida para checar Donovan.

Autumn: Bud está bem?


Dez minutos depois, meu telefone tocou com uma
mensagem de resposta.

Donovan: Foi roubado ontem à noite. Roubaram a sua


van. Ele tentou lutar contra eles, então o espancaram.

Ah, não!

Comecei a digitar de volta, mas decidi ligar. Donovan


atendeu no primeiro toque.

— Ele está bem?

— Estará. Ele é um velho bastardo durão. Está com um


rim lesionado devido a um chute de bota nas costas, um
braço quebrado e alguns pontos no rosto, mas o médico disse
que se recuperará totalmente, embora queiram mantê-lo por
uma ou duas noites para observação. Quando cheguei ao
hospital, ele estava tentando tirar as intravenosas sozinho e
sair contra o conselho médico.

— Por que ele faria isso?

— Porque ele não tinha ninguém para servir o jantar esta


noite. Eu nem tenho certeza de como diabos planejava
cozinhar qualquer coisa quando a van que roubaram tinha
tudo o que ele usava.

— Oh meu Deus. Isso é insano.

— Ele só concordou em ficar porque prometi que


cuidaria do jantar esta noite.
— Não acredito que ele se preocupa mais com isso do
que com sua própria saúde.

— Não me diga. — Donovan suspirou.

— Há algo que eu possa fazer?

— Nah. Já recrutei meus amigos da vizinhança para me


ajudar a servir esta noite. Só pegarei vinte baldes de frango do
KFC e purê de batata.

— Oh, é uma boa ideia.

— Só espero que ele não tente escapar de novo enquanto


eu estiver fora.

— Poderia visitá-lo, se quiser. Ficar de olho nele.

— Está tudo bem.

— Não, de verdade. Ficaria feliz em visitá-lo, se acha que


ele não se importaria que eu passasse por lá.

— Provavelmente faria seu ano. Você não apenas é linda,


mas também lhe dará a chance de contar mais histórias sobre
mim, de quando eu era criança, que não tem interesse em
ouvir.

— Quem disse que não tenho interesse em ouvir


histórias interessantes sobre você?

Donovan riu. — Tudo bem. Ele está no Memorial


Hospital. A vizinhança não é ótima, então estacione no
estacionamento sob um poste de luz.

Sorrio. — Sim, pai.

— Estou falando sério. Não preciso que ambos sejam


roubados em vinte e quatro horas.

— Estacionarei em algum lugar seguro.

— Obrigado.

— Existe algum horário em particular que acha que eu


deveria ir?

— Ficarei por aqui provavelmente até as cinco. Então, a


qualquer momento depois disso, ele estará sozinho.

— OK. Vou logo depois do trabalho.

— Obrigado.

— Não precisa me agradecer. Estou feliz em fazer isso.


Gosto muito do Bud.

— Certo. Seja cuidadosa.

— Você também. Se estão dispostos a bater em um velho


por uma van, Deus sabe o que fariam com o seu carro
luxuoso.

Depois que desligamos, sentei-me à minha mesa por um


longo tempo, sentindo uma onda de emoções que não sabia
como lidar. Senti-me péssima com o que aconteceu com Bud,
mas não conseguia parar de pensar em como me sentiria se
algo tivesse acontecido com Donovan. Poderia lidar com
algumas das coisas que chocalhavam em minha cabeça – que
me sentiria triste, chateada, com raiva, com medo, mas a
única emoção que não conseguia aceitar era o
arrependimento.

Passei anos me arrependendo de coisas que fiz, ou da


maneira como lidei com elas, até que finalmente me perdoei e
aceitei que o que aconteceu não foi minha culpa. Usei o
arrependimento como uma forma de me punir, e aqui estava
eu, fazendo tudo de novo.

Fiz então algo antes de mudar de ideia. Peguei meu


telefone e disquei para a terapeuta que não via há dois anos.

— Oi. Aqui é Autumn Wilde. Queria marcar uma


consulta...
CAPÍTULO 19

Autumn

— Tem gosto de lama. Há uma mercearia vinte e quatro


horas do outro lado da rua que faz o melhor café com doce de
leite do estado.

— Jesus. — A minha mão cobriu meu coração quando


me virei. Donovan se encostou casualmente na porta da sala
de visitas. — Você me assustou “pra” caralho. Eu não ouvi
você entrar.

Ele deu aquele sorriso sexy. — São quase onze e meia.


Por que ainda está aqui?

Suspirei. — Honestamente, perdi a noção do tempo até


que cheguei aqui para pegar uma xícara de café. Bud é tão
divertido. Ele realmente sabe contar uma história.

Donovan balançou a cabeça. — Acho que algumas


dessas histórias me fizeram parecer um pouco merda.

Sorrio. — Você realmente foi preso por fazer sexo em um


carro da polícia?

Donovan baixou a cabeça. — Eu não estava fazendo


sexo. Tínhamos treze anos e estávamos dando uns amassos.
Isso é o que fazíamos antigamente pela privacidade.
Encontraríamos um carro aberto e ficaríamos no banco de
trás por um tempo. Era meio inofensivo, geralmente. O carro
da polícia não estava sinalizado, em minha defesa e estava
parado em um estacionamento vazio. E o policial que nos
pegou era tio do garoto com quem a garota que eu estava
saindo namorava. — Ergueu as mãos. — Eu também não
sabia que ela tinha namorado.

Rio. — A história foi muito mais animada quando Bud a


contou.

— Tenho certeza que foi.

— Acabaram de levar Bud para uma tomografia. Ele


tinha um pouco de sangue na urina esta noite. A enfermeira
disse que isso acontece depois de um trauma, mas querem ter
certeza de que não há nenhuma ruptura que perderam da
primeira vez.

— Sim. Verifiquei com o posto de enfermagem alguns


minutos atrás. Disseram que demorará mais ou menos uma
hora antes que ele volte ao quarto. Ficarei por aqui. Quer que
te acompanhe até o seu carro?

— Se não se importa, gostaria de esperar e ter certeza de


que tudo deu certo com o exame.

Donovan sorriu e inclinou a cabeça em direção ao


corredor. — Quer ir tomar uma xícara de café de verdade,
então?
— Claro, mas julgarei se é o melhor café do estado ou
não. Eu sou uma esnobe por café, embora realmente não
possa me dar ao luxo de ser.

Atravessamos a rua até uma pequena loja pela qual


provavelmente teria passado no caminho para um Starbucks
e não teria dado atenção, mas Donovan estava certo; o café
era incrível.

— Não posso acreditar que este grande copo custou


apenas um dólar e cinquenta. Isso custaria seis dólares no
Starbucks e nem a metade tão deliciosa.

Donovan deu um gole em seu próprio copo. — Disse-lhe


que era bom. Aqui é um mundo diferente de Manhattan. A
maioria das pessoas no Soho ou em Chelsea não colocaria um
pé neste lugar para dar uma chance a uma loja familiar
porque não têm letreiros elegantes e sofás de couro.

Mordi meu lábio inferior. — Eu sei, porque sou uma


dessas pessoas. Ou pelo menos era, mas isso pode ter
mudado minha mente.

— Bom. Perde-se muita coisa na vida ao julgar um livro


pela capa.

Os meus olhos encontraram os de Donovan enquanto


abria a porta da frente do hospital para mim. — Esse é um
bom lembrete.

Dentro do elevador, pressionei o número sete para voltar


ao andar de Bud.
— Ele vai demorar um pouco. Está bonito lá fora. Quer
tomar um pouco de ar fresco?

— Sim, claro.

Donovan ergueu o queixo para o painel do elevador. —


Aperte o dez, então.

A minha testa se enrugou. — Dez para o ar fresco?

Ele piscou. — É o meu local secreto.

Segui Donovan por um monte de corredores quase


vazios, no décimo andar, até chegarmos a um conjunto de
portas duplas com uma placa vermelha que dizia Somente
Funcionários.

Donovan olhou em volta antes de abri-las. — Depois de


você.

— Umm... teremos problemas por entrar aqui?

Ele sorriu. — Não, se não formos pegos.

Balancei minha cabeça. — Foi isso que disse para a


garota que subiu na traseira do carro da polícia não
identificado?

Donovan sorriu. — Vamos, viva um pouco. Prometo-lhe


aconselhamento jurídico gratuito se for presa.

— Uhhh... pode fazer isso da cela ao meu lado?


Rimos, mas entrei pela porta. Depois de outra série de
curvas, chegamos a uma porta de aço que dava para um
conjunto de degraus de concreto. No topo, Donovan abriu
outra porta. Descobri que isso levava ao telhado.

— Como diabos sabe sobre isso?

Donovan foi até um banco e limpou a poeira para nós


antes que me sentasse. — Posso muito bem dizer o layout de
cada hospital nos cinco distritos.

— Por quê?

Ele tomou um gole de café quando se sentou ao meu


lado. — A minha mãe passava muito tempo neles quando eu
era criança. Às vezes, um John a machucava em vez de pagar;
outras vezes tinha uma overdose. Eu não gostava de deixá-la
sozinha, mas não deixam uma criança sozinha ficar, então
encontrava um lugar para passar a noite no prédio. Muitas
vezes era o telhado.

— E ninguém nunca notou você?

— Às vezes, um médico ou enfermeira dizia algo se me


encontrassem aqui sozinho, mas vêm aqui para se esconder e
fumar cigarros. Então, se dissessem alguma coisa, eu
perguntaria se o chefe e os pacientes sabiam que fumavam.
Isso geralmente os fazia me deixar em paz. Algumas vezes,
chamaram a segurança e mandaram que me expulsassem.

Rio. — Oh meu Deus. Isso é insano.


Donovan encolheu os ombros. — Isso é vida.

— Acredite ou não, realmente fui escoltada para fora de


um hospital uma vez.

Ele ergueu uma sobrancelha. — Isso eu tenho que ouvir.

Senti-me meio orgulhosa do meu mau comportamento.


— Bem, acho que tinha cerca de dezesseis anos na época.
Perdi minha mãe aos doze anos para o câncer e me aproximei
mais de meu pai. Certa noite, estava na casa de um amigo
quando recebi um telefonema informando que meu pai havia
sofrido um ataque cardíaco. Fui ao hospital e perguntei no
pronto-socorro onde poderia encontrá-lo. Disseram que ainda
estavam trabalhando nele, mas para me sentar e que me
avisariam quando pudesse vê-lo. Uma mulher na sala de
espera chamada Candy se aproximou e se apresentou como
noiva do meu pai. O meu pai tinha acabado de se divorciar
alguns meses antes, e não tinha ideia de que estava
namorando alguém. Estava confusa, mas honestamente, meu
pai enlouqueceu depois que minha mãe morreu, então não
me surpreenderia ele ficar noivo de novo. Um pouco depois, o
médico saiu e falou conosco. Disse que meu pai estava
estável, mas precisava de uma cirurgia e perguntou se ele
estava se esforçando quando começou a sentir dores no peito.
Candy então começou a descrever, em detalhes, como meu
pai era um menino mau e tinha acabado de fazer cinquenta
flexões depois de ter o orgasmo negado durante o sexo como
parte de sua punição.
— Merda. — Donovan deu uma risadinha. — Você bateu
nela ou algo assim?

— Não. Fiquei meio chocada depois de ouvir isso. Bati


nela depois que o médico foi embora porque disse que não
gostava de seu anel de noivado – era muito pequeno. Olhei
para baixo e vi que ela tinha o anel da minha avó em seu
dedo. Ela agiu como se a tivesse esfaqueado, fazendo uma
cena dramática, então a segurança me acompanhou para
fora.

— Não achei que você fosse capaz, Red. — Sorriu. —


Afinal, há uma valentona escondida aí dentro.

Bati meu ombro no dele. — Bem, estou aqui ilegalmente


em um telhado, sabe.

— Isso é verdade.

Uma pequena brisa soprou e Donovan se levantou para


tirar o paletó. Ele se ofereceu para envolvê-lo em meus
ombros.

— Não, tudo bem. Estou bem.

— Estou quente. Além disso, se não pegar, nos farei


entrar e gosto de ficar aqui fora com você.

Os nossos olhos se encontraram. Realmente gostei de


ficar daqui com ele também. Mesmo que estivéssemos fora, no
meio do Brooklyn, parecia nosso próprio lugar secreto. Então
aceitei o paletó. — Obrigada.
Ele voltou a sentar-se. — Então é por isso que você e seu
pai não se dão tão bem? Não gosta da sua madrasta?

— Oh, Candy não é mais minha madrasta. Ela foi minha


madrasta três ou quatro esposas atrás. Honestamente perdi a
noção.

— Três ou quatro esposas atrás? Além disso, foi casado


com sua mãe, e disse que ele tinha acabado de se divorciar
antes de se encontrar com Candy, a dom. Então são, o que,
seis ou sete casamentos?

— Sim. A verdade, acho que são sete, mas ele se casará


novamente em algumas semanas, então seriam oito.

— Por que ele continua fazendo isso?

Balancei minha cabeça. — Não sei. Não falamos muito


mais.

— Por causa da série de Candys com quem se casou?

— Não. Houve um tempo em minha vida em que


realmente precisava que ele estivesse lá para mim, e ele não
estava.

Donovan olhou nos meus olhos. — Eu sinto muito.

— Obrigada. Tenho sentimentos confusos sobre me


distanciar dele. Sei que pelo pouco que acabei de te dizer
provavelmente não soa assim, mas houve uma época em que
era um ótimo pai e marido. Ele e minha mãe eram namorados
no ensino médio e realmente se amavam. Quando ela ficou
doente, isso quebrou o ânimo de ambos. Lembro-me que nos
últimos dias da minha mãe, estava mais preocupada sobre
como meu pai continuaria depois que ela se fosse do que
como eu estaria. Ela me fez prometer que sempre cuidaria
dele por ela. Então, parte de mim se sente culpada por não
cuidar mais.

— Tenho certeza de que tem seus motivos. — Fez uma


pausa e se certificou de que eu estava olhando para ele
novamente. — Posso ficar sentado aqui a noite toda se quiser
falar sobre eles.

Isso fez meu coração apertar, mas não estava pronta


para ir lá. — Obrigada. Provavelmente porém deveríamos ver
se Bud voltou.

Donovan acenou com a cabeça, um pouco de decepção


espreitando por trás de seus olhos. — Claro. Vamos fazer
isso.

Bud estava sendo levado de volta para seu quarto


quando Donovan e eu voltamos. Ele olhou entre nós e franziu
a testa. — Estou morrendo e ninguém me diz?

Donovan enfiou a mão nos bolsos. — Você é teimoso


demais para chutar o balde, meu velho.

— É claro que sim. — Bud ajustou suas cobertas. —


Como foi o jantar esta noite? Todos que precisavam ser
alimentados foram alimentados?
— Foram. Dario e Ray me ajudaram, então foi mais como
um jantar e um show de comédia, mas ninguém está com
fome agora.

Bud acenou com a cabeça. — Bom. Obrigado.

— Não é um problema.

Bud olhou para mim. — E você deveria estar em casa


dormindo, mocinha.

Sorrio. — Só queria ter certeza de que tudo saiu bem


com a sua tomografia.

Como se fosse uma deixa, um médico entrou. — Sr.


Yankowski?

— O meu nome é Bud. Frances Yankowski é apenas o


que minha mãe escreveu na certidão de nascimento para
garantir que eu aprendesse a me cuidar no pátio da escola.

O médico sorriu. — Tudo bem, Bud então. Acabei de dar


uma olhada em sua tomografia. Talvez seus acompanhantes
possam esperar do lado de fora enquanto conversamos sobre
os resultados?

Bud acenou para mim. — Está tudo bem. Eles são


família.

O médico explicou que, embora o rim parecesse apenas


machucado, o sangue na urina de Bud poderia ser um sinal
de dano, e precisavam continuar monitorando sua urina e
repetir o exame em vinte e quatro horas.
Bud balançou a cabeça. — Eu me sinto bem. Vou para
casa amanhã de manhã. Voltarei se piorar.

— Prefiro que você nos dê duas noites.

— E eu prefiro parecer com ele. — Apontou para


Donovan. — Mesmo assim, fiquei preso com esta careta.

Donovan falou com o médico. — Tem alguma regra


contra os pacientes serem amarrados à cama?

O médico sorriu. — Receio que sim, filho.

Donovan passou a mão pelo cabelo. — Cobrirei o jantar


de novo amanhã. Dario cuidará de sua rota durante o dia. Já
discutimos o assunto.

Bud cruzou os braços sobre o peito. — Nenhuma


porcaria de fast-food. Estas pessoas precisam de uma refeição
balanceada.

— Eu tenho que estar no tribunal o dia todo amanhã.


Hambúrgueres e cachorros-quentes servirão? Posso pegar
uma grelha no caminho depois do trabalho.

— Com que acompanhamento?

Donovan cruzou os braços sobre o peito, imitando a


postura usual de Bud. — Ketchup. Um dia já foi um tomate.

Parecia que um impasse estava prestes a acontecer,


então interrompi. — Faço uma deliciosa salada de brócolis.
Vai muito bem com hambúrgueres.
O rosto de Bud se suavizou. — Obrigado, querida.

— Então, temos um acordo? — Donovan perguntou.

— Tudo bem — Bud resmungou. — Pegue pãezinhos de


trigo integral porém. Toda aquela farinha processada não é
saudável.

Donovan murmurou baixinho. — Nem lutar contra


ladrões de carros.

O médico estava observando a negociação como uma


partida de tênis. As suas sobrancelhas se ergueram. — Temos
um acordo, então? O Sr. Yankow – quero dizer, Bud – ficará
pelo menos mais uma ou duas noites?

Bud ergueu um dedo. — Não, pelo menos outra noite.


Mais uma noite. Duas, máximo.

O médico sorriu. — Vou aceitar. Vamos começar por aí.

Donovan e eu ficamos mais alguns minutos, depois que o


médico saiu, antes de deixar Bud para descansar um pouco.
Donovan disse que voltaria para checá-lo antes do tribunal, e
deixei meu número de telefone para Bud, caso precisasse de
alguma coisa durante o dia de amanhã. Depois, Donovan me
acompanhou até meu carro.

Ele olhou para o poste sob o qual havia estacionado. —


Muito bem.

— Ora, obrigada.
— Você realmente não precisa fazer salada de brócolis.
Posso comprar alguns acompanhamentos prontos na loja
quando pegar os hambúrgueres.

— Não seja bobo. Disse a Bud que faria, e quero fazê-lo.

Donovan sorriu e acenou com a cabeça. — Está bem


então. Posso pegar a salada com você depois de ir ao
supermercado para comprar hambúrgueres após o tribunal.

As minhas sobrancelhas franziram. — A que horas sai do


tribunal?

— Quatro e meia, a menos que nos atrasemos.

— Por que não busco os hambúrgueres enquanto pego os


ingredientes para a salada de brócolis? Vou até a loja de
qualquer maneira.

— Tem certeza que não se importa? Isso na verdade seria


útil, porque também preciso pegar uma grelha para cozinhar,
já que roubaram todo o seu equipamento.

— Claro que não. Fico feliz em ajudar.

— Tudo bem, então. Obrigado.

— Gostaria de ajudar a servir o jantar também.

— Tem certeza?

— Positivo.
— Ok então, vou buscá-la depois de pegar a grelha e
outras coisas que preciso, e podemos servir o jantar juntos.
Você terá um monte de coisas para colocar e tirar do carro.

— Isso soa como um plano.

— Oh, quase esqueci. — Donovan enfiou a mão no bolso


interno do paletó e tirou a carteira. — Pegue este cartão de
crédito para pagar por tudo.

Eu o dispensei com um aceno. — Não há necessidade.


Eu pago.

— Você não pagará por toda aquela comida, Autumn.

— Você tem razão. Não vou. Tenho um cartão black do


meu pai que está em minha carteira juntando poeira. Ele
sempre me diz para usá-lo para qualquer coisa importante
para mim, e isto é. — Sorrio. — Acho que comprarei coisas de
primeira linha – talvez hambúrgueres de carne Kobe43.

Donovan riu enquanto abria a porta do meu carro. Ele


segurou o topo enquanto eu entrava.

— Boa noite, Donovan. — Sorrio.

— Boa noite, Red. Obrigado por tudo. — Parou por um


momento. — Trabalhamos bem juntos, não é?

Eu sorrio. — Trabalhamos.

Ele piscou. — Tenha cuidado ao dirigir para casa.


CAPÍTULO 20

Donovan

— Este é um lugar agradável. — Olhei ao redor do


refúgio sagrado do apartamento de Autumn. Era pequeno,
mas com uma decoração muito legal com um monte de fotos
em preto e branco de coisas na cidade tiradas de ângulos
estranhos, como os fios de suspensão da Ponte do Brooklyn
fotografados a pé e a Times Square tirada enquanto subia as
escadas do metrô. — Você mesma tirou as fotos?

— Não. Comprei-as de um artista de rua anos atrás.


Gosto de como mostram partes icônicas da cidade, mas de
uma forma atípica. — Ela tirou uma caixa da geladeira e a
colocou no balcão. — Esqueci que nunca esteve aqui.

— Nunca fui convidado.

Autumn sorriu. — Espero não ter exagerado com esta


salada de brócolis. Fiz um palpite sobre quantas pessoas
vieram jantar na noite em que fui com você. Calculei cerca de
cem.

Concordei. — Palpite certeiro.

— Pedi duas caixas térmicas emprestadas a um vizinho,


então a carne está nelas. Não conseguia colocar tudo na
minha geladeira. — Ela se abaixou para levantar outra caixa
da prateleira de baixo, e me aproximei e peguei para ela.

— Jesus. O que há aqui? Pedras?

— Fiz vinte quilos. Não queria que se esgotasse.

— Acho que você deu conta do acompanhamento.

A cozinha de Autumn era uma cozinha típica de New


York que mal tinha espaço para uma pessoa, então, quando
me juntei a ela para retirar a caixa, nossos corpos estavam
quase se tocando. Correndo o risco de soar como um
completo mariquinha, senti em minhas entranhas. Minhas
entranhas. Acho que nunca usei essa palavra até agora, mas
foda-se se tudo, desde as minhas costelas até a base das
minhas bolas, não estava formigando.

Coloquei a segunda caixa no balcão e fiz questão de me


virar para falar com ela. Ela olhou para mim por baixo
daqueles cílios longos e escuros com seus grandes olhos
verdes, e foi como no banheiro do churrasco dos sócios de
novo. Exceto que se começássemos desta vez, não haveria
ninguém por perto para interromper. Claro, tínhamos pessoas
para alimentar, mas realmente morreriam de fome se o jantar
não fosse servido por uma noite? Encontrei-me debatendo
realmente este pensamento, até que algo atrás de Autumn
chamou minha atenção. A cozinha tinha uma pequena janela,
que atualmente estava aberta. Uma brisa que nem senti ter
soprado, porque as cortinas se levantaram um pouco,
revelando uma planta no parapeito da janela.
Isso era... Não, não poderia ser.

Autumn então olhou por cima do ombro para ver o que


havia chamado minha atenção, e quando se virou, o olhar em
seu rosto me disse que o pensamento maluco que tive estava
certo. Ela chupou o lábio inferior entre os dentes e seus olhos
brilharam como uma criança sendo pega com um biscoito do
pote de biscoitos.

Balancei a cabeça para a planta sem tirar os olhos dela.


— Essa planta é minha, não é?

Autumn balançou a cabeça com um sorriso enorme. —


Não.

Eu a contornei e fui até a janela, levantando o vaso.


Estava maior e o vaso havia sido trocado, mas tinha quase
certeza de que era minha plantinha. Sabia porque cruzei duas
das minhas plantas existentes – uma tinha folhas verdes com
uma listra amarela e a outra tinha pequenas saliências
amareladas nas folhas – e esta tinha folhas verdes com uma
listra amarela e saliências; mal era uma muda quando
desapareceu do meu apartamento. Percebi que estava
faltando na semana seguinte ao nosso fim de semana juntos,
e presumi que o garoto do outro lado do corredor que às vezes
pagava para regar as plantas a tinha matado ou algo assim.

Estudei seu rosto. O meu detector de mentiras não tinha


dúvidas de que ela estava mentindo. — Sério? Onde
conseguiu isso?
— Na loja.

— Qual loja?

Ela balançou a cabeça e desviou o olhar. — Não sei. A


loja de planta.

Sorrio. — A loja de plantas?

— Não me lembro como era chamada.

— Eu me lembro. — Inclinei-me para ficarmos cara a


cara e me aproximei. Autumn parecia um cervo nos faróis,
mas ainda havia um brilho em seus olhos. Estava gostando
de me sacanear tanto quanto eu estava gostando de sacanear
ela. — Você a comprou de um lugar chamado Casa do
Donovan.

— Não. — Ela sorriu de orelha a orelha.

— Conseguiu, de fato.

— Não consegui.

— Não pensei que fosse uma ladra, Red.

— Não sou uma ladra. Eu só... peguei emprestado, ok?

As minhas sobrancelhas saltaram. — Pegou emprestado?

Ela acenou com a cabeça. — Isso mesmo.

— Há quase um ano?

— Acho que sim.


— Você então, estava planejando devolvê-la?

Ela não conseguia se conter mais – rompeu-se. As suas


mãos cobriram o rosto e começou a rir. — Tudo bem, tudo
bem. Peguei no seu apartamento. Não a peguei na loja de
plantas e não planejava devolvê-la.

Eu agora estava rindo também. — Faz isto


frequentemente? Tirar algo do apartamento de um homem?

— Não! Juro. Eu nunca fiz isso antes. A verdade, só


roubei uma coisa em toda a minha vida – um broche do
NSYNC44 quando tinha dez anos – e me senti tão culpada por
isso que voltei no dia seguinte e o coloquei na loja. — Ela
ainda estava com o rosto coberto com as mãos.

Gentilmente retirei seus dedos para que pudesse ver


seus olhos. — Você queria uma lembrança do nosso fim de
semana juntos?

— Não sei por que peguei; apenas peguei. Se não sabia,


estou muito envergonhada. Eu sinto muito.

Escovei uma mecha de cabelo atrás de sua orelha. —


Não tenha vergonha. Fico feliz que sentiu a necessidade de
levar uma lembrança. Desde que estamos nos esclarecendo,
também tenho algo seu.

Os meus olhos se arregalaram novamente. — Tem?

Concordei. — Eu não roubei. Porque, sabe, não sou um


ladrão como você, mas encontrei um pedaço de papel dobrado
debaixo da minha cama uma semana depois que fugiu de
mim. Deve ter caído da sua bagagem e não percebi até então.

— Que papel?

Enfiei a mão no bolso e tirei minha carteira.


Desdobrando a folha de papel que ainda carregava comigo,
mostrando-a.

Autumn a pegou. Fechou os olhos depois de ler as


primeiras linhas. — Oh meu Deus. Existe um buraco em que
possa entrar? Primeiro você percebe que roubei uma de suas
plantas, e agora descubro que leu uma lista em ordem
alfabética de desculpas que escrevi. — Corou e balançou a
cabeça. — Quem faz estas coisas? Por que está interessado
em mim? Eu sou esquisita demais.

— Normal é superestimado, Red. Estou contudo curioso


para saber em quem usa as desculpas.

— O meu pai. Nunca esquece nada, então se lhe desse a


mesma desculpa da última vez que precisei desligar o
telefone, ele se lembraria.

— Então começou uma lista?

— Um pouco antes de te conhecer no ano passado, ele


me ligou na manhã em que estava saindo para Vegas. Eu
disse que estava entrando em um elevador e precisava
desligar. Aparentemente, disse isso em nossas duas últimas
ligações e ele me pediu para provar. Não gosto de voar, então
tomei algumas taças de vinho no voo e fiz essa lista, meio que
uma piada. — Suspirou. — Podemos trocar? Pegarei este
papel de volta e vou queimá-lo, e pode ter sua planta de volta.
Podemos então, fingir que essa conversa nunca aconteceu.

Sorrio. — O papel é seu, mas também pode ficar com a


planta. Gosto que mantenha algo por perto que te faz lembrar
de mim.

Autumn ainda estava olhando para o chão, então


coloquei dois dedos sob seu queixo e levantei até que nossos
olhos se encontrassem. — Significa que enquanto sua mente
não queria mais nada comigo, seu coração queria. Posso
trabalhar com isso.

Ela balançou a cabeça com uma sugestão de sorriso


ameaçador. — Você pode trabalhar com isso?

— Sim. Sou paciente. — Toquei a ponta de seu nariz. —


O coração sempre vence no final.

♥♥♥

O serviço de jantar naquela noite correu bem. Alguns dos


meus velhos amigos vieram e nos ajudaram, e me certifiquei
de que um deles ficasse ao lado de Autumn enquanto eu
estivesse ocupado. As multidões que vinham para ser
alimentadas nem sempre tinham as melhores maneiras,
especialmente porque alguns deles estavam bêbados ou
drogados demais para pensar direito. Mencionei à Autumn,
no caminho para casa, que havia falado com o médico de
Bud, que disse que Bud estava indo muito bem e poderia ir
para casa amanhã ou no dia seguinte.

— Oh, isso é maravilhoso — disse. — Imagino que não


será fácil fazer as coisas com aquele gesso no braço. Talvez eu
possa preparar algumas refeições para ele e trazê-las?

— Se o resto da sua comida for algo parecido com aquela


salada de brócolis, tenho certeza que vai adorar. Para ser
honesto... — meus olhos se voltaram para Autumn e depois
de volta para a estrada. — Quando disse salada de brócolis,
achei que não ia funcionar muito bem. A multidão que chega
é mais carne e batata do que salada, mas aquilo estava muito
bom.

— Obrigada. É a receita da minha mãe. — Olhou pela


janela por um momento. — Ela e meu pai só me disseram que
o câncer da mamãe estava de volta alguns meses antes de ela
morrer. Tinha um tumor cerebral inoperável. Havia se
submetido a quimioterapia e radiação anos antes, o que
retardou o crescimento, mas um segundo tumor se
desenvolveu em um lugar que não podiam nem mesmo tratar.

— Eu sinto muito.

— Obrigada. Não me disseram o que estava acontecendo


porque eu tinha doze anos e estava ocupada com meus
amigos, e queriam que minha vida continuasse o mais normal
possível. A minha mãe porém decidiu que me ensinaria a
cozinhar. Acho que era sua maneira de passar o tempo
comigo. Portanto, a maior parte do que me lembro dos
últimos meses com ela é de estar na cozinha e rir. Acho que é
uma das razões pelas quais adoro cozinhar.

— Essas são boas lembranças.

Ela acenou com a cabeça. — Fiquei zangada quando ela


morreu por não terem me contado, mas pensando bem, pode
ter sido o melhor. Se soubesse, não teria sido capaz de relaxar
e aproveitar aquele tempo com ela. Eu teria ficado com medo.

— Faz sentido.

— Enfim. — Encolheu os ombros. — Farei algumas


refeições para Bud para congelar e deixá-las quando voltar do
hospital, se achar que está tudo bem.

— Vou avisá-lo. — Nunca falamos realmente sobre o que


aconteceu no churrasco, ou depois, então me perguntei qual
era o estado de seu relacionamento com Blake. Achei que este
poderia ser um momento tão bom quanto qualquer outro para
bisbilhotar. — Isto interromperá os planos que tem para sexta
à noite?

Ela sorriu. — Não.

Bati no volante, debatendo se deveria continuar fazendo


perguntas para as quais não gostaria de ter respostas.
Eventualmente, a curiosidade venceu. — E o resto do fim de
semana? Algum plano interessante?
— Só domingo à noite. A minha amiga Skye vem.
Deveríamos assistir The Bachelor a última vez que saímos,
mas só passamos por dois episódios e ambas desmaiamos.

— Chocante — disse. — Já que o show é tão fascinante.

— Foi o vinho, não o show sendo chato.

— Uh-huh.

— Você? Algum plano para este fim de semana?

— Trabalho. Bud. Serviço de jantar. Isto ocupará tudo.

— Também posso ajudar com o serviço de jantar. Talvez


possamos nos revezar para que não tenha que fazer isso
todas as noites até que Bud esteja bem o suficiente para lidar
com as coisas.

Como o inferno, eu a deixaria dirigir até um prédio


abandonado para servir as pessoas que estavam sem muita
sorte para pagar uma refeição, mas sabia que se dissesse
isso, acabaria em algum tipo de argumento de igualdade de
direitos. Então, em vez disso, aproveitei a oportunidade para
bisbilhotar mais um pouco.

— Sem encontro no sábado à noite?

— Não.

— Por que não?


— Poderia te perguntar a mesma coisa. Por que não tem
um encontro ardente no sábado à noite?

— Não sou eu quem está namorando alguém.

A boca de Autumn se espalhou em uma linha sombria.


Olhou pela janela e falou baixinho. — Nem eu.

— Como é? — Inclinei-me em sua direção. Poderia ter


ouvido errado?

Ela suspirou. — Não estou mais saindo com Blake.

— Quando isto aconteceu?

— O dia seguinte ao churrasco.

Um sorriso se espalhou pelo meu rosto. — Sinto muito


por ouvir isso.

Ela deu uma risadinha. — Sim, você parece realmente


arrependido.

— O que aconteceu?

A cabeça de Autumn virou em minha direção e olhei para


ela e de volta para a estrada. — O quê?

— Não sabe o que aconteceu?

Parei no semáforo da esquina da sua rua. — Bem,


obviamente sei o que aconteceu no churrasco, mas quis dizer
o que fez você decidir desistir.
— Isso, Donovan. Blake foi muito legal comigo, e não
estava sendo muito legal com ele.

O semáforo mudou, então virei a esquina e comecei a


procurar uma vaga. Felizmente, havia muito para carregar
sozinha. Quando passamos pelo seu prédio, Autumn virou a
cabeça, estudando um carro estacionado em fila dupla do
lado de fora.

— Droga. — Gemeu.

— Qual é o problema?

— Tenho certeza de que é o carro do meu pai.

— O Porsche amarelo?

— É uma de suas muitas compras na crise da meia-


idade.

— Por que ele estaria aqui?

— Ele faz isto em ocasiões em que não atendo suas


ligações.

— Quer que eu dê a volta no quarteirão algumas vezes


para ver se ele vai embora?

Ela franziu o cenho. — Embora adorasse a ideia,


provavelmente deveria apenas lidar com isso e acabar logo.

Havia uma vaga livre alguns edifícios abaixo, então


estacionei. — Quer que eu espere aqui enquanto fala com ele?
Depois carrego as caixas?

— Não. — Ela balançou a cabeça. — Se não se importa,


pode ser mais fácil se eu tiver um amortecedor.

Dei de ombros. — Sem problemas.

Empilhei as caixas térmicas vazias uma em cima da


outra e carreguei-as, enquanto Autumn trazia a sacola com
recipientes e talheres. Quando nos aproximamos do Porsche
estacionado em fila dupla, a porta do motorista se abriu e um
homem que imaginei ser o seu pai saiu. Ele olhou entre nós.

— Já estava na hora. Estou esperando há quase três


horas.

— Não teria que esperar se me ligasse para dizer que


viria. Poderia ter lhe dito que não estaria em casa.

O seu pai parecia que ainda estava vestido do trabalho,


sem o paletó. Isso significava que ficou no carro por três
horas e nunca pensou em tirar a maldita gravata?

— Bem, preciso falar com você. — Ele olhou para mim


novamente e depois para sua filha. — Preferencialmente
sozinhos.

Olhei para Autumn e ela balançou a cabeça. Quando me


virei para o seu pai, que olhava para mim com expectativa. —
Desculpe senhor. Se Autumn não quer que eu vá embora,
ficarei. — Coloquei as caixas térmicas no chão, achando que
seria melhor para cumprimentar. Estendi minha mão, dando
um passo à frente. — Donovan Decker. Prazer em conhecê-lo.

O seu pai olhou para minha mão como se estivesse


pensando em não apertar, mas eventualmente a agarrou e
resmungou algo.

Quando voltei para o lado de Autumn, seus ombros


caíram. — O que você quer, pai?

— Vou me casar em duas semanas.

— Estou ciente. Recebi o convite chique pelo correio.

— Bem, então, por que não respondeu?

— Porque pensei que se respondesse da maneira que


queria responder, você apareceria a minha porta.

— Quantos anos ficará chateada por eu seguir em


frente? A sua mãe gostaria que eu fosse feliz.

— Isto não tem nada a ver com a mamãe. Não a arraste


para isso. E você seguiu em frente sete vezes nos últimos
quinze anos. — Ela se virou para mim e bateu o indicador nos
lábios. — Ou talvez sejam oito vezes. Não o vejo há alguns
meses. Muita coisa pode acontecer...

— Não seja desrespeitosa — seu pai gritou.

Autumn balançou a cabeça. — Vá para casa, pai.


— Estará no casamento? — Respirou fundo e controlou a
atitude, falando com uma voz mais suave e gentil. —
Significaria muito para mim.

Autumn franziu a testa. — Silas estará lá?

— Claro que não. Sabe que não faria isso com você.

— Não, eu não sei disso.

— Autumn, por favor, venha.

Ela balançou a cabeça. — Não sei. Vou pensar sobre


isso, ok?

O seu pai franziu os lábios, mas não disse mais nada.


Caminhou até Autumn e beijou sua bochecha. — Obrigado.

— Está tarde — ela disse. — Eu deveria entrar.

O seu pai acenou com a cabeça. Ofereceu um vago aceno


em minha direção, e então voltou para seu carro amarelo
chamativo.

Peguei as caixas e caminhamos até a entrada de seu


prédio em silêncio. A subida do elevador também foi
silenciosa. Quando chegamos à sua porta, pescou as chaves
da bolsa e se virou para mim.

— Peço desculpas por isso.

— Nada para se desculpar. Se conhecesse minha mãe,


entenderia por que achei essa interação muito agradável.
Autumn sorriu, mas não atingiu seus olhos.

— Você está bem? — Perguntei.

Ela acenou com a cabeça. — Ele só... não sei. Ele tem
um senso de prioridade distorcido às vezes.

— Pelo que disse, você não gosta de um dos amigos do


seu pai... Silas?

— Silas era seu parceiro de negócios.

— Não é uma fã?

— Não.

— Algo aconteceu entre vocês dois?

Ela balançou a cabeça. — Não entre mim e Silas. Eu


namorei seu filho por quatro anos e meio. As coisas...
acabaram nas férias de Natal do meu primeiro ano na
faculdade de direito.

Esperei que dissesse mais, mas ela não disse; então algo
me ocorreu.

— Foi nessa época que você também começou a ter


dúvidas sobre a decisão de carreira, não foi?

Autumn olhou para baixo. — Tive muitas dúvidas


naquele ano. — Respirou fundo e soltou o ar com um sorriso
forçado. — Eu deveria entrar. Está ficando tarde, e tenho um
compromisso amanhã cedo. Pode simplesmente deixar as
caixas aqui. Vou trazê-las para dentro, e devolvê-las ao meu
vizinho amanhã de qualquer maneira.

Odiava ir embora, especialmente quando ela estava


claramente se sentindo para baixo, mas pensei que tínhamos
feito muito progresso nos últimos dias e não queria estragar
as coisas não dando espaço a ela. Então concordei com a
cabeça. — OK, mas abra a porta e entre antes de eu sair.

Ela sorriu tristemente. — Você é como um guarda-


costas.

— Nunca é demais ter cuidado.

Autumn destrancou a porta e deslizei as duas caixas


térmicas para dentro. Ela segurou a porta aberta depois de
entrar. — Boa noite, Donovan.

— Boa noite, Red.

Esperei até ouvir o clique da fechadura antes de sair.


Pensei em todos os acontecimentos inesperados da noite, no
caminho para a casa. Descobri que o garoto que contratei
para regar minhas plantas não matou uma afinal, uma certa
ruivinha a roubou. Autumn também jogou uma bomba no
carro de volta para casa – não estava mais saindo com Blake.
Havia em seguida o seu pai, que era praticamente o que eu
esperava das coisas limitadas que ela me disse; mas mesmo
com tudo isso, a única coisa que não conseguia parar de me
perguntar era o que diabos tinha acontecido durante o
primeiro ano da faculdade de direito.
CAPÍTULO 21

Autumn

Seis anos atrás

— Deus, é tão bom sair com vocês. — Inclinei minha


cabeça no ombro da minha amiga Anna enquanto
caminhávamos do campo para o estacionamento. Tínhamos
acabado de passar a tarde assistindo a um show ao ar livre
com um grupo de amigos que não via desde o início da
faculdade de direito. Fui aceita em duas das minhas três
principais escolhas, mas decidi ficar em casa e ir para Yale, a
alma mater do meu pai – e também para onde Braden foi.

Anna puxou meu cabelo. — Deveria tentar fazê-lo com


mais frequência. Nunca te vemos.

— Eu sinto muito. A faculdade de direito me manteve


mais ocupada do que pensava.

— Está tudo bem. Estou apenas provocando. Como estão


as coisas entre você e Braden?

— Boas, acho.

— Uh-oh. Problemas no paraíso.


— Nem tanto. Nada que deva reclamar de qualquer
maneira. Ele só... não sei. Ele realmente quer me ajudar na
faculdade de direito. Braden é inteligente, então eu
provavelmente deveria querer toda a ajuda que quer dar, mas
preciso descobrir por conta própria algumas vezes. Tipo,
muitas pessoas do meu grupo estudam juntas, e quando
mencionei que pensava em ir à biblioteca para me juntar a
elas, ele ficou estranho com isso. Acho que o ofende por nem
sempre querer a sua ajuda.

— Isso é porque o homem é louco por você.

Sorrio. Havíamos alcançado o parque após o início do


show, então meu carro estava estacionado na grama quase
todo o caminho de volta a entrada. Quando olhei em volta, vi
um carro prateado que parecia o BMW de Braden, mas o sol
estava forte e não pude ver se havia alguém lá dentro. Protegi
meus olhos, semicerrando-os, mas só pude ter um vislumbre
do perfil de um homem, embora parecesse que poderia ser
Braden. Alguns segundos depois, o carro arrancou. O show
estava lotado e nós estávamos em Greenwich, então BMWs
custavam dez centavos a dúzia... no entanto, algo me
incomodava. Era a segunda vez nos últimos dias que pensei
ter visto um carro que se parecia com o de Braden, mas cada
vez que chegava perto o suficiente para dar uma boa olhada,
o carro tinha se afastado.

— Terra para Autumn.


Olhei para minha amiga, que estava me olhando com
expectativa. — Eu sinto muito. Você disse alguma coisa?

— Eu disse, nem todo mundo pode ter um cara que é


louco por eles, mas conheci um cara no fim de semana
passado que era louco na cama.

Estava totalmente confusa por um minuto. — Oh, uau.


Conte-me tudo.

Anna mergulhou em uma história sobre um baterista


magro com um moicano que conheceu em um café no fim de
semana passado, que tinha o pênis mais grosso que já vira.
Ela me fez rir e, em poucos minutos, esqueci completamente
a sensação estranha que tive – pelo menos temporariamente.

♥♥♥

— Ei, linda. — Braden recostou-se na cadeira e sorriu. —


Não sabia que viria. Esta é uma boa surpresa.

Andei atrás da mesa de Braden, coloquei uma das duas


sacolas da minha mão e me inclinei para lhe dar um beijo. —
O meu pai tem trabalhado tanto ultimamente que lhe
preparei um almoço saudável. Ele se esquece de comer
quando está em julgamento. Pensei em trazer algo para você
também.
Ele envolveu seus dedos em volta da minha cintura e me
puxou para baixo em seu colo.

Rio. — A sua porta está aberta. Qualquer um pode


passar.

— É domingo. Somos poucos aqui.

Braden roçou seu nariz com o meu. — Tenho saudades


de você.

— Eu também. — Sorrio. — Ainda estamos combinados


para hoje à noite?

Ele tirou uma mecha do meu cabelo do rosto. — Estamos


definitivamente combinados. Fiz uma reserva para as sete
horas naquele novo pequeno restaurante italiano que você
adorou.

— Oh, hum. Você estará aqui até lá?

— Provavelmente. Não fiz tanto quanto pensava que faria


ontem.

Por alguma razão, o carro que tinha visto no


estacionamento ontem surgiu na minha cabeça. — Até que
horas ficou aqui na noite passada?

— Não sei. — Braden encolheu os ombros. —


Provavelmente cerca de nove.

Eu sorrio. — Bem, então, deixarei você sossegado para


que possa sair daqui a tempo do jantar desta noite. Além
disso, não quero que o almoço do meu pai esfrie. Vou subir
correndo para o seu escritório.

— Bem. Vou buscá-la por volta das seis e meia.

Eu o beijei mais uma vez antes de subir as escadas, onde


meu pai tinha o proverbial escritório de canto.

— Toc, toc — disse. — Entrega para o Sr. Workaholic.

O meu pai jogou a caneta na mesa e sorriu. — O que


está fazendo aqui, docinho?

Levantei a sacola de comida. — Fiz almoço para você. Sei


como fica quando está no meio de um julgamento. Ou se
esquece de comer ou come porcaria.

Ele sorriu calorosamente. — A sua mãe costumava me


trazer almoço quando eu trabalhava nos fins de semana.

— Eu sei, mas você não trabalhava aos domingos


naquela época.

— Eu ainda tento não fazer, a menos que seja


absolutamente necessário, mas não tive escolha hoje. Perdi
toda a maldita tarde de ontem por causa dos malditos
percevejos.

O meu nariz torceu. — Percevejos?

Ele apontou para o teto. — A seguradora um andar


acima encontrou percevejos em um sofá em seu saguão,
então a manutenção do prédio inspecionou todo o lugar.
Tínhamos alguns em nosso saguão também. Dedetizaram o
prédio inteiro na noite passada. Ninguém podia entrar por
doze horas.

— Pensei tê-lo ouvido sair de casa às seis da manhã?

O meu pai acenou com a cabeça. — Sim, eu saí.

— A que horas dedetizaram o escritório ontem?

— Cinco da tarde.

— Cinco? Então, ninguém poderia estar no prédio depois


das cinco horas?

— Não, a menos que quisessem ter um terceiro braço.

— E se alguém estivesse aqui quando passaram o


inseticida?

O meu pai balançou a cabeça. — Ninguém estava aqui.


Mandei a segurança ir de escritório em escritório para
garantir que o local estivesse vazio antes de começarmos a
dedetização.
CAPÍTULO 22

Autumn

— É bom ver você, Autumn. — Dra. Lillian Burke cruzou


as mãos em cima do caderno em seu colo. — Você parece
muito bem. Deixou seu cabelo crescer mais.

Estendi a mão e enrolei uma mecha do meu cabelo. —


Sim, apenas mais um pouco que acaba em um coque no topo
da minha cabeça, suponho.

— Então, como vão as coisas? Ainda trabalha para os


serviços sociais?

— Trabalho, e ainda amo. — Sorrio. — Melhor decisão


que você já me ajudou a tomar.

Lillian sorriu. — Estou emocionada em ouvir isso.


Passamos mais tempo em nosso trabalho do que com nossos
entes queridos, por isso é importante gostar do que fazemos.

— A verdade, estou trabalhando no meu doutorado


agora. Não acho que tenha começado isso quando
conversamos pela última vez. Estava pensando há quanto
tempo não estive aqui enquanto estava na sala de espera.
Achei que fossem dois anos, mas acho que foram uns três.
— Foram. Completará três anos no próximo mês, na
verdade. Olhei eu mesma mais cedo, mas parabéns pela sua
graduação. Conversamos sobre você querer se tornar uma
terapeuta, mas ainda não havia iniciado um programa. Isso é
fantástico.

— Estou devagar, meio período, mas estou chegando lá.


Devo me formar depois de mais dois semestres.
Honestamente, acho que parte do motivo pelo qual parei de te
ver é porque senti que precisava ser capaz de ficar em pé
sobre meus próprios pés se fosse sentar em sua cadeira em
algum momento.

— Discutimos isso já. Os terapeutas têm terapeutas. Não


é apenas bom, é incentivado nesta profissão.

Concordei. — Eu sei. Acho que só precisava sentir que


poderia sobreviver sem você. Agora que sei que posso, não
sinto mais que seja um problema.

— Bem, estou feliz em saber que sente que pode


sobreviver sem mim. Embora nunca tive dúvidas.

— Obrigada.

— Então me diga o que está acontecendo em sua vida.


Como vão as coisas com o seu pai?

— Mais ou menos o mesmo. Ele se casará em algumas


semanas... de novo. Apareceu no meu apartamento ontem à
noite porque não devolvi o cartão de resposta, e estava
evitando suas ligações porque não queria discutir o fato de
não querer ir ao casamento.

Lillian sorriu. — Parece que não perdi muito nessa


frente.

— Definitivamente não. Casado. Divorciado. Limpar.


Repetir.

— Você? Ainda está tomando Ambien para ajudá-la a


dormir à noite?

— O meu médico regular tem me incomodado para


tentar desmamar, como você sempre fez. Sim, ainda preciso
deles para dormir.

Ela acenou com a cabeça.

— Sabia que os golfinhos dormem com um olho aberto?

— Dormem?

— É chamado de sono uni-hemisférico. O olho direito


fecha quando o lado esquerdo do cérebro dorme e o esquerdo
fecha quando o direito dorme. Não conseguem dormir
completamente porque precisam se lembrar de respirar.

Lillian sorriu. — Senti falta dos seus fatos aleatórios,


mas como você não é, de fato, um golfinho, ainda acho que se
livrar do remédio pode ser uma coisa boa.

Suspirei. — Sim, eu sei.


— E quanto à sua vida pessoal? Existe alguém especial
hoje em dia? Está namorando alguém?

— Não estou namorando ninguém. Estava, mas terminei


recentemente.

— Por que terminou?

— Eu me senti mal porque tenho sentimentos crescentes


por outra pessoa.

— Oh... — Lillian pegou sua caneta na mesinha e


escreveu algo em seu livro. — Eu teria que olhar para trás em
minhas anotações, mas tenho certeza que esta é a primeira
vez que mencionou ter sentimentos por alguém. Obviamente,
falamos sobre homens com quem namorou, mas geralmente
usa palavras como compatível ou divertido para descrever
seus relacionamentos, não sentimentos. Estou animada em
saber que você está interessada em alguém com quem tem
uma conexão emocional. A mulher que se sentou à minha
frente alguns anos atrás teria corrido para o outro lado se seu
coração tivesse investido em um homem.

Sorrio. — Bem, meio que fiz. É uma longa história, mas


conheci Donovan no ano passado. Temos a mesma mala, e
peguei a sua e não a minha no aeroporto. Nós nos
encontramos para trocar as malas, nos demos bem e
tomamos um café. O café levou ao jantar, e o jantar levou a
um fim de semana incrível.
— Isso soa um pouco como destino, quase um conto de
fadas.

Concordei. — Exceto por eu ser eu mesma, quando o


baile acabou, me transformei em uma abóbora e fugi.

— Por acaso deixou uma pantufa de cristal para trás?

Neguei com a cabeça. — Definitivamente não – embora


ele diga que voltou para a cafeteria onde nos conhecemos por
algumas semanas depois, na esperança de me ver. Então
acho que ele estava tentando ser o Príncipe Encantado, mas
sabe que aperfeiçoei a arte de evitar, então não nos
encontramos de novo por quase um ano. Ele acabou sendo o
advogado de uma das minhas crianças. Entrei na delegacia
uma noite e lá estava ele.

— Oh, uau. — Sorriu. — Parece que o destino não estava


aceitando o que você estava fazendo. Fale-me sobre este
homem. Disse que o seu nome é Donovan?

Concordei. — Bem, ele é o oposto da maioria dos homens


que namorei. Você não pensaria assim, do lado de fora. Ele é
inteligente, bem-sucedido, usa ternos bonitos e foi para uma
faculdade da Ivy League, mas por baixo do exterior, é muito
mais. Ele cresceu com menos do que nada, então trabalhou
muito duro para estar onde está, e isso o torna muito mais
resistente do que qualquer pessoa com quem já namorei. Os
homens que namoro geralmente são meio moles por dentro,
enquanto Donovan é feito de aço. Estou extremamente
atraída por essa força interior.
— Ele parece maravilhoso. Normalmente, quando me
contava sobre um homem com quem estava namorando,
mencionava primeiro os seus atributos físicos e depois lia seu
currículo. Não fez nada disso quando descreveu Donovan.
Você falou de coração.

— Bem, ele também é ridiculamente bonito, então tem


isso – com um corpo de morrer por baixo daquela camisa
social impecável. Tem muitas tatuagens também que acho
incrivelmente sexy. — Apontei para os meus braços. — Veja.
É por isso que não comecei com uma descrição. Tenho
arrepios só de pensar em como ele é.

Lillian riu. — Alguma chance de ele ter um irmão mais


velho?

— É engraçado. Donovan, de várias maneiras, é tão


cauteloso quanto eu em permitir que as pessoas vejam o que
está por baixo. Só temos motivos diferentes.

— Parece que ele deixou você entrar contudo.

Concordei. — Ele deixou.

— Você compartilhou seu passado com ele?

Balancei minha cabeça. — Ele é uma pessoa muito


perspicaz, então definitivamente sabe que há algo
espreitando, mas não falei com ele sobre... sabe.

— Qual é a situação do seu relacionamento com


Donovan agora? Disse que recentemente terminou com outra
pessoa, mas você e Donovan estão namorando?

Fiz uma careta. — Não.

— Ele convidou você para sair?

Sorrio tristemente. — Mais de uma vez.

— Estou supondo que não sairá com ele porque


realmente gosta dele?

Balancei a cabeça e olhei para baixo.

— Não tenha vergonha de ter medo, Autumn. Temer algo


grande é a natureza humana, e todos nós temos medo.

— Odeio quão fraca eu sou.

— Ter medo não é uma fraqueza. Nem um pouco. Sentir


medo é um instinto protetor que todos temos e é saudável.
Pense nisso como um sistema de alarme doméstico. Os
nossos medos dispararam um forte aviso para as pessoas que
não devemos permitir, e isso é uma coisa boa.

— Sim, mas meu sistema de alarme quer manter todos


fora.

Lillian balançou a cabeça. — Aconteceu em um ponto,


mas está aqui. Você está aqui hoje, Autumn. Isso significa que
já aceitou que há alguém que deseja deixar entrar. Só não
tem certeza de como fazê-lo porque já faz muito tempo.
Soltei um suspiro profundo. — Sim, acho que você está
certa.

— Os seus medos sabotaram seus relacionamentos, ao


longo dos anos. Saiu com homens que sabia que não tinha
nenhuma conexão emocional verdadeira. Há um ano sabotou
as coisas com Donovan porque não estava pronta para
enfrentá-las, mas está pronta agora. Você já deu o primeiro
passo, apenas aparecendo hoje. Fez todo o trabalho árduo por
conta própria, então agora precisamos ajudá-la no resto do
caminho.

— Como faço isso?

— A única maneira de superar seus medos é forçando o


cerne. Você tem que abraçar o que tem medo.

— Eu tenho namorado contudo.

— Você não tem medo de namorar. Está com medo de


confiar em alguém novamente.

Suspirei. — Acho que sim. Quero confiar em Donovan.


Eu realmente quero, mas não tenho certeza de como.

Lillian acenou com a cabeça. — Um bom lugar para


começar pode ser contando a ele sobre o que aconteceu.
CAPÍTULO 23

Donovan

O carro de Autumn já estava estacionado do lado de fora


quando cheguei.

Durante toda a tarde, disse a mim mesmo que não sairia


do trabalho mais cedo e passar na casa de Bud. Tinha uma
dúzia de horas hoje que ainda precisava faturar, clientes que
precisavam ser chamados de volta e um julgamento chegando
para me preparar. Geralmente aos sábados, chegava ao
escritório às sete, mas hoje Bud teve alta às dez, então o
peguei e o levei para casa e o acomodei assim que chegamos
lá.

O meu início habitual às 7h da manhã se transformou


em chegar ao escritório quase 13h, e sairia por volta das
16h30 para substituir Bud servindo o jantar esta noite, mas
achei que dava para fazer muita coisa em três horas e meia.
Infelizmente, não considerei o quão distraído estaria durante
toda a maldita tarde sabendo que Autumn estava na casa de
Bud. Eventualmente, desisti e larguei tudo. Eu não estava
fazendo merda nenhuma de qualquer maneira, então não
havia sentido em ficar sentado a minha mesa.

A porta da frente estava destrancada. Balancei minha


cabeça, pensando que teria que falar com Bud sobre isso. O
homem acabara de passar dois dias no hospital após ser
espancado na rua. Precisava ser mais cuidadoso.

Encontrei Autumn na cozinha lavando pratos. Ela não


me ouviu entrar, então parei por um momento para ficar a
porta e observá-la. Um leve sorriso enfeitou seu lindo rosto, e
a cada dois segundos os cantos de seus lábios se contraíram
ligeiramente – como se estivesse pensando em algo que a
divertia. Droga, ela era linda. Eu tinha a intenção de deixá-la
saber que entrei antes que me visse, então não a assustaria,
mas ela deve ter sentido alguém olhando porque sua cabeça
de repente se levantou.

— Oh meu Deus. — Ergueu a mão molhada e ensaboada


e cobriu o coração. — Há quanto tempo está parado aí?

Sorrio. — Desculpe. Não muito.

— Por que não disse nada?

— Eu ia, mas estava muito ocupado tentando descobrir


no que estava pensando que a fez sorrir.

— Eu estava sorrindo?

Concordei. — No que estava pensando agora?

Ela desviou o olhar. — Nada.

Aproximei-me alguns passos e fiquei do outro lado da


ilha da cozinha. — Nada, hein? Tem certeza disso?
Autumn pigarreou. — Bud acabou de comer. Adormeceu
em sua poltrona.

Acenei com a cabeça. — Disseram que ele não dormia


bem no hospital. Tenho certeza que estava preocupado com a
casa ficar vazia por alguns dias. As pessoas por aqui veem
uma oportunidade e a aproveitam.

Ela franziu o cenho. — Por que ele não se muda?

— Porque esta é a sua casa e tem um propósito ao


ajudar a comunidade. Além disso, tem seu jardim nos fundos
e a oficina na garagem.

— Imagino. — Autumn encolheu os ombros. — Esse tipo


de coisa já aconteceu antes? Onde ele foi atacado?

— Não. As pessoas geralmente cuidam de Bud porque ele


é uma boa pessoa e muito respeitado. É uma comunidade
muito unida, em sua maior parte. O problema é que também
é fácil conseguir drogas em meia dúzia de cantos por aqui,
por isso atrai estranhos – e não bons.

Autumn terminou de enxaguar o último prato da pia e


desligou a água. — Quer comer alguma coisa? Ainda não
guardei o almoço. Provavelmente ainda está quente.

— Cheira bem, mas não, tudo bem. Prefiro que deixe isso
para o Bud. Não será fácil para ele fazer muito por um tempo
com aquele braço engessado.
— Fiz lasanha, macarrão fagioli e frango francês. Ele tem
então, pelo menos, uma dúzia de jantares para começar.
Congelei alguns e deixei alguns na geladeira pelos próximos
dias.

— Obrigado por fazer tudo isso por ele.

— Achei que estaria no trabalho a tarde toda hoje, já que


pegou Bud no hospital esta manhã, e você está cobrindo o
seu serviço de jantar.

— Queria ver como ele estava. Eu não tinha certeza de


que horas você viria.

A voz de Bud explodiu, da outra sala. — A minha bunda.


Ele perguntou esta manhã se sabia a que horas você viria, e
eu lhe disse que você ligou e disse que estaria aqui agora.

Rio e baixei minha cabeça enquanto gritava de volta —


Muito obrigado, Bud. Deveria ser o meu braço-direito, e não
contar os meus segredos.

— Não posso dizer que te culpo. Ela cozinha muito bem.

Autumn agora estava rindo. Ela gritou — Obrigada, Bud!

— Sem problemas, querida.

Baixei minha voz e pisquei. — Vou dar uma olhada nele


de qualquer maneira.

Bud estava em sua velha poltrona reclinável de couro


surrada com os pés para cima.
— Como está se sentindo, velho?

— Bem. — Apontou para o gesso. — Se isso fosse


embora, por outro lado, minha vida seria muito mais fácil.
Sou uma merda com minha mão esquerda.

— Achei melhor regar as plantas no quintal para não


molhar o gesso no primeiro dia em casa.

— Oh, bom. Escolha os tomates que estão prontos


enquanto está lá fora, ok?

— Certo.

O quintal de Bud era praticamente uma fazenda, então


regar e colher frutas maduras não era uma tarefa de dois
minutos. O sol estava forte e eu estava com uma camisa de
manga comprida e calça comprida, então, quando terminei,
estava suando. Joguei uma muda de roupa em uma mochila
esta manhã, imaginando que gostaria de tirar minhas roupas
antes de fazer o serviço de jantar, então a peguei do meu
carro antes de voltar para casa.

— Se importa se eu tomar um banho rápido? — Bud e


Autumn estavam sentados juntos na sala de estar.

— Use o do seu antigo quarto.

Depois de um banho rápido, alcancei o armário abaixo


da pia, aquele onde as toalhas sempre foram guardadas.
Infelizmente, não tinha pensado em verificar se Bud ainda
guardava no armário até depois de estar todo molhado.
Merda.

Puxei o jeans da minha bolsa pelas minhas pernas


molhadas e escapei do banheiro para pegar uma toalha para
me secar antes de me vestir completamente, mas quando fui
em direção ao banheiro do corredor, a porta se abriu de
repente. Autumn saiu e piscou algumas vezes antes de seus
olhos caírem para o meu peito nu. Saí do outro banheiro
resmungando com jeans grudando em minhas pernas, mas
de repente queria beijar Bud por não encher aquele armário
de toalhas.

Autumn nem tentou esconder que me olhava. Os seus


olhos percorreram meu peito, lentamente percorreram meu
abdômen e brilharam quando chegaram ao topo da minha
calça jeans. Sabia que não tinha abotoado e não me preocupei
em colocar a cueca para ir buscar uma toalha, mas não tinha
percebido que na pressa de puxar a calça, deixei a cabeça do
meu pau empurrada para cima e para fora. O meu primeiro
instinto foi encobrir, não intencionalmente ser um idiota
lascivo, mas quando os lábios de Autumn se separaram,
forcei minhas mãos a ficarem ao lado do corpo.

Jesus Cristo. O jeito que ela me olhava, eu não queria


nada mais do que levá-la de costas para o banheiro e fechar a
porta atrás de nós. E no momento, achei que ela poderia
realmente me deixar; mas então...

Um estrondo alto soou do outro cômodo. — Merda!


Bud poderia muito bem ter jogado um balde de água
gelada em nós. Autumn e eu saímos correndo. Encontramos
Bud na cozinha com a porta da geladeira aberta e uma
bagunça por todo o chão.

— O que aconteceu?

— Tentei pegar uma colher daquela torta de pudim de


chocolate que Autumn trouxe, mas o gesso estúpido
atrapalhou.

Fechei meus olhos e balancei minha cabeça. O prato de


torta de vidro estava espatifado no chão e Bud estava
descalço. — Vá se sentar. Vou limpar.

— Por que diabos está seminu?

— Porque, aparentemente, você não guarda mais toalhas


no banheiro de hóspedes.

— Bem, vá colocar algumas roupas.

Considerando o momento que ele arruinou, poderia


muito bem. Virei-me para Autumn. — Deixa. Vou dar um jeito
nisso depois de me vestir. Não quero que você se corte.

Peguei uma toalha do outro banheiro e terminei de me


secar. Por meio segundo, considerei me masturbar com a
memória de Autumn olhando para a cabeça do meu pau com
os lábios entreabertos – uma memória que ficaria para
sempre gravada em meu cérebro, mas não faz essa merda no
banheiro de outro homem, especialmente aquele que evitou
que sua cabeça caísse no vaso sanitário exatamente no
mesmo cômodo em mais de uma ocasião na adolescência.
Então, em vez disso, fiz um trabalho rápido de me vestir e
depois fui para a garagem para o aspirador. Quando terminei
de limpar a cozinha, já era hora de sair para servir o jantar.

Entrei na sala e encontrei Bud prestes a adormecer em


sua poltrona reclinável novamente, assistindo a um velho
filme de faroeste em preto e branco na TV.

O nariz de Autumn estava enterrado em seu telefone. —


Sabia que Gone with the Wind45 foi o primeiro filme colorido a
ganhar um Oscar? — Perguntou, olhando para cima.

Sorrio. — Não sabia. Não tenho certeza de como consegui


sobreviver sem esse pedaço de informação.

Ela fez uma careta e eu rio. — Preciso começar a


preparar o serviço de jantar.

Autumn ficou de pé. — Quer ajuda hoje à noite?

— Claro, se não se importa. — Como se eu fosse recusar


passar um tempo com ela, mesmo que fosse em uma casa
abandonada com um monte de pessoas questionáveis.

Dissemos adeus a um Bud sonolento e eu lhe disse que


estaria de volta amanhã para ver como estava. Ele não seria
Bud se não tivesse argumentado comigo que não precisava de
ajuda, mas eu voltaria, não importa o que dissesse.
Disse à Autumn para pular para o meu carro, lá fora, e
iríamos juntos pegar a comida que pedi antes de servir o
jantar. Posso ter esticado a verdade e lhe dito que a casa de
Bud era no meu caminho de volta para casa, então seria fácil
pegar o seu carro. Quero dizer, era se pegasse o caminho
completamente fora do meu caminho para chegar em casa,
mas gostava dela por perto.

Já que presumi que estaria trabalhando em meu


escritório até o último minuto desta tarde, pedi alguns six-
foot heroes46 e algumas saladas para o jantar. Isso tornava
as coisas mais suaves, já que não precisávamos nos
preocupar em manter a comida quente, mas estava feliz por
Bud não ter perguntado o que eu serviria, porque qualquer
coisa além de uma refeição quente não era aceitável para ele.

Fiquei de olho em Autumn, ao longo da noite. Ela atraiu


muita atenção por trás da mesa de servir, a maior parte
amigável, mas nunca se pode ser cuidadoso demais. Algumas
das pessoas que comeram aqui não estavam com um estado
de espírito estável, que é a vibração que recebi de dois caras
que entraram tropeçando quando estávamos prestes a
encerrar a noite e fecharmos.

— Aww, vamos, moça bonita. — O mais alto dos dois


estendeu o prato para Autumn. — Pode me dar mais do que
isso, não pode?

Reconheci o mais baixo como um traficante de drogas


local – pelo menos era quando eu morava na vizinhança. Ele
era provavelmente cerca de dez anos mais velho do que eu e
tinha entrado e saído da prisão, embora não acompanhasse
mais as pessoas da vizinhança. Considerando meu próprio
passado, tentei não julgar, mas não gostei do tom que seu
amigo usou.

Aproximei-me e parei ao lado de Autumn. — Posso


ajudá-los com algo?

O cara zombou. — Não. Tudo parece bem aqui.

O mais baixo olhou para mim. — Você é o Decker, certo?


Morava a dois quarteirões daqui?

— Isso mesmo.

Ele ergueu o punho para bater. — Como vai, cara? Você


é um grande advogado agora ou algo assim, não é?

Bati os punhos com o cara. — Sou advogado, sim.

— Penal? — O seu amigo perguntou.

Balancei minha cabeça. — Não do tipo que possa estar


interessado.

O cara puxou a cabeça para trás. — O que isso deveria


significar?

— Sou especialista em crimes de colarinho branco –


apropriação indébita, fraude corporativa, manipulação de
ações, esse tipo de coisa.
— Muito bom para o lugar de onde veio, hein?

Esta conversa estava indo para uma direção que não


gostei. — De jeito nenhum. — Dei de ombros. — É apenas no
que sou bom. Se alguma vez estiver em apuros por algo
assim, eu sou o cara.

Poderia dizer pelo olhar em seu rosto que não tinha


certeza se eu estava sendo sincero. Olhou-me por alguns
segundos antes de assentir. — Sim, ok.

Os dois foram se sentar e Autumn olhou para mim. —


Aposto que você entende muito isso – pessoas daqui que não
gostam que tenha se dado bem.

Dei de ombros. — É o que é. Entendo.

— Storm esconde o fato de que ele recebe notas “As” dos


seus amigos.

Eu sorrio. — Costumava fazer a mesma coisa. A maioria


das pessoas quer ver você se saindo bem, mas muito poucas
querem que se saia melhor do que elas. É difícil ser
adolescente e ser diferente em circunstâncias normais, mas
aqui? É mais do que difícil. Pode ser perigoso.

— Isso é louco.

— Talvez, mas é a verdade. Na rua, se as pessoas não


conseguem se relacionar com você, não confiam em você. E
quando não tem muito mais além da sua palavra, a confiança
significa tudo. — Olhei para ambos os caras.
O cara que eu conhecia da vizinhança estava ocupado
comendo, mas o outro cara estava olhando para Autumn. Os
seus olhos mudaram para encontrar os meus, e segurei seu
olhar até que ele desviou.

Quinze minutos depois, meu amigo Dario fez uma visita


surpresa enquanto estávamos desmontando as mesas que eu
trouxera. Nós nos cumprimentamos.

— Como está o Bud? — Perguntou.

— Bem. Embora esteja engessado, então precisará de


ajuda por um tempo.

— É sobre isso que vim falar com você. A equipe e eu


temos os próximos cinco dias. Sei que você precisa trabalhar
até tarde, e o velho bastardo não confia em ninguém.

Soltei um suspiro profundo. — Obrigado, Dario. Isso


realmente ajudaria.

Ele apontou para mim. — Você estará cobrindo no


próximo sábado à noite contudo. A minha senhora precisa de
um pouco de amor nos fins de semana.

Sorrio. — É assim que está chamando a mão direita hoje


em dia. A sua senhora?

Dario deu um soco no meu braço. — Idiota.

Observo os últimos dois caras saírem, por cima do seu


ombro – aquele que conhecia e aquele que me deu uma
impressão ruim. Os meus ombros relaxaram um pouco.
Autumn se afastou para atender uma ligação pouco antes de
Dario entrar. Ela se aproximou e sorriu.

— Autumn, este é Dario. O que quer que diga, ele é um


mentiroso.

Autumn riu. — Donovan o mencionou antes. Prazer em


conhecê-lo.

Dario levou a mão de Autumn aos lábios e beijou o topo.


— O prazer é todo meu.

Estreitei meus olhos. — Pega leve, idiota.

Os olhos de Dario brilharam com diversão. Ele sabia


como me irritar. — Donovan diz que você é inteligente. Então
acho que provavelmente escolhe a personalidade... — deu um
tapinha no peito antes de apontar para mim com uma
carranca. — ... em vez de boa aparência. Este bastardo
envelhecerá, mas sempre serei divertido.

Autumn riu. — Tenho certeza que será.

Ela parecia chateada ao telefone alguns minutos atrás,


então balancei a cabeça em direção ao celular em sua mão. —
Tudo certo?

Ela suspirou. — Uma das minhas crianças foi pega com


maconha esta noite.

— Ele está preso? Precisa de ajuda?


Ela sorriu e balançou a cabeça. — Felizmente era apenas
alguém do abrigo e não a polícia. Obrigada pela oferta
contudo. A verdade, preciso fazer outra ligação sobre isso. O
sinal é interrompido aqui, então sairei por um minuto.

Olhei para a porta da frente. Todo mundo tinha ido, mas


isso não importava. Se reunir era um esporte por aqui. Então,
gesticulei em direção à porta dos fundos. — Por que não tenta
desse lado?

— Ok. Deixe-me ajudá-lo a embalar tudo primeiro.

— Eu dou conta. Faça sua ligação. — Fiz um gesto para


Dario. — Este idiota vai me ajudar de qualquer maneira.

Como tínhamos servido apenas sanduíches e saladas,


demorou apenas cinco minutos para empacotar tudo. A única
coisa que faltava fazer era carregar o carro com as mesas,
cadeiras e a caixa térmica. Olhei para trás. Autumn ainda
estava ao telefone, então disse a Dario para me dar uma mão
para carregar tudo. Depois que arrumamos o porta-malas e o
banco de trás, notei que o cara que conhecia da dupla
anterior ainda rondava algumas casas abaixo, mas o seu
amigo estava faltando.

— Ei — gritei. — Onde está seu amigo?

Ele apontou para o quintal. — Foi mijar. O cara deve ter


se perdido.

Os cabelos da minha nuca se arrepiaram e não perdi


tempo fechando o porta-malas antes de partir para casa. Abri
a porta da frente e corri direto para os fundos. O lixo estava a
apenas alguns metros de Autumn. Ele recuou e ergueu as
mãos no ar quando me viu voar pela porta.

— O que diabos está fazendo aqui?

O cara continuou recuando. — Só conversando com a


moça bonita.

Olhei para Autumn. — Você está bem?

Dario estourou pela porta dos fundos.

— Sim, estou bem. — Ela parecia um pouco nervosa ao


olhar entre nós dois, mas balançou a cabeça. — Ele estava
saindo.

— Por que não vai andando, Eddie? — Dario deu um


breve aceno de cabeça e olhou para o cara.

Fiz uma careta. — Não me faça pedir também.

Eddie parecia muito chateado, mas isso não era nada


comparado com a raiva que irradiava de mim. A veia do meu
pescoço inchou e meu coração bateu a um milhão de
quilômetros por minuto.

Pelo menos o idiota era inteligente o suficiente para


perceber que ir embora era a única opção que tinha. Ele
bufou, mas caminhou ao redor da casa sem dizer outra
palavra. Eu o segui para ter certeza de que realmente saiu.
Assim que saiu para a rua, voltei-me para Autumn. —
Tem certeza que está bem?

— Sim, estou bem. Só um pouco abalada. Ele não fez


nada, apenas me pegou desprevenida porque eu estava ao
telefone e, de repente, estava parado a alguns metros de
distância, no escuro. Ele me perguntou se eu queria ir à festa,
e disse que achava melhor se ele fosse embora.

Esfreguei meu pescoço e soltei um suspiro irregular. —


Eu sinto muito. Não deveria tê-la deixado sozinha.

— Só estive aqui por alguns minutos.

Balancei minha cabeça. — Isso são alguns minutos a


mais.

Demorou até que entrássemos no carro e dirigíssemos


seis ou oito quarteirões antes que meu coração começasse a
desacelerar. Autumn apenas continuou olhando para a
janela, os braços em volta do corpo com força.

— Sinto muito, Autumn.

— Está tudo bem. Não é sua culpa e nada aconteceu.

—É minha culpa, e você não parece bem.

Ela franziu a testa e se virou para olhar mais um pouco


para fora da janela. A casa de Bud não era muito longe,
então, alguns minutos depois, paramos do lado de fora.
Estacionei o carro. Nunca seria capaz de relaxar apenas
deixando-a ir embora. — Você se importaria se te seguisse
para casa? — Perguntei. — Ou melhor ainda, pode deixar seu
carro aqui e eu te levo?

Ela olhou para baixo por um minuto antes de assentir.


— Pode me seguir, mas entre quando chegarmos lá. Eu quero
mesmo falar com você.
CAPÍTULO 24

Donovan

Autumn estava quieta quando nos acomodamos em seu


apartamento.

— Quer uma taça de vinho? — Perguntou.

— Claro, se quiser um pouco.

Ela sorriu sem entusiasmo. — Definitivamente beberei


um pouco. Por que não se acomoda no sofá, e eu pego duas
taças para nós.

— Obrigado.

Autumn voltou alguns minutos depois. Serviu o vinho e


também amarrou o cabelo em um coque bagunçado no topo
da cabeça e colocou uma calça de ioga e uma camiseta.

Ela me viu observando-a. — Desculpe. Precisava estar


confortável.

— Nada para se desculpar. Adoro o seu cabelo amarrado


assim, na verdade.

Ela tomou um gole de vinho e sorriu. — Gosta? Perdi


meia hora secando-o mais cedo para ficar bonito. Tudo que
tinha que fazer era não escová-lo e torcer em um nó?
Os meus olhos percorreram seu lindo rosto. — O seu
cabelo está assim na foto que tirei de você durante o fim de
semana que passamos juntos. Depois que me deu o cano,
olhei muito para ela. Diria quantas vezes, mas isso pode
assustá-la novamente, e acho que já fodi o suficiente por um
dia.

Autumn colocou o vinho sobre a mesa e colocou a mão


suavemente no meu joelho. — Você não estragou nada hoje. A
verdade, é que fez exatamente o oposto.

— O que quer dizer?

— Vou chegar lá, mas primeiro, que foto você tirou de


mim?

Sorrio. — Você estava no fogão da minha cozinha. O seu


cabelo estava todo amarrado como está agora, e estava com a
minha camiseta do dia anterior.

Ela balançou a cabeça. — Eu nem me lembro disso.

Peguei meu celular no bolso da calça, abri o aplicativo de


fotos e rolei até a pasta que a mantinha antes de virar o
telefone para lhe mostrar.

Autumn pegou o celular da minha mão e o estudou. —


Pareço uma bagunça.

— Você está linda.

Ela continuou olhando. Eventualmente, suspirou. — Não


concordo, mas direi que pareço feliz.
Peguei meu telefone de volta e olhei para a foto mais uma
vez. — Pensei que estivesse. Eu sei que naquele fim de
semana fui o mais feliz que estive em muito tempo.

Os olhos de Autumn se moveram para frente e para trás


entre os meus. Podia ver que algo a estava incomodando.
Depois de um tempo, respirou fundo, pegou seu vinho, bebeu
todo o resto do copo e levantou um joelho no sofá para me
encarar diretamente.

— O verão do meu último ano no colégio, conheci


Braden. Bem, isso não é totalmente verdade. Eu o vi algumas
vezes ao longo dos anos, mas realmente não o conhecia. O
seu pai trabalhou para o meu pai antes de se tornarem
sócios. Achei Braden fofo, mas ele era alguns anos mais
velho, então nunca olhou em minha direção a não ser para
dizer olá até aquele verão, quando eu tinha dezoito anos.

Autumn olhou para sua taça de vinho vazia. Sabia desde


a primeira frase que essa história não teria um final feliz, mas
também sabia que precisava ouvi-la, porque preencheria
muitas das peças que faltavam no quebra-cabeça de Autumn
Wilde que vinha tentando resolver há muito tempo.

Peguei sua taça vazia e troquei-a com a minha, três


quartos cheia.

Ela sorriu tristemente e respirou fundo novamente antes


de continuar. — Braden estava no primeiro semestre da
faculdade de direito e não era nada parecido com os meninos
com quem tinha saído no colégio. Eu não tinha ideia do que
queria fazer com o resto da minha vida, e ele era tão motivado
e maduro, e pareceu atraído por mim por algum motivo. —
Virou a cabeça e olhou fixamente por um minuto. — Quando
olho para aquele primeiro verão, ainda não vejo as bandeiras
vermelhas que perdi. — Franziu o cenho. — Acho que isso me
assombra quase tanto quanto qualquer outra coisa.

— O que aconteceu?

— Braden e eu namoramos por quatro anos e meio. As


coisas não ficaram ruins de repente. Ficamos muito próximos
naquele primeiro verão. Eu já tinha namorado antes, mas foi
meu primeiro relacionamento sério. Depois, fui para a
faculdade. Só fui para Boston, então eram apenas algumas
horas de carro. Eu voltava para casa com frequência e às
vezes Braden me visitava. De vez em quando ele até me
surpreendia e não me dizia que estava vindo, mas às vezes
sentia mais como se ele estivesse me vigiando, em vez de
realmente querer me ver.

Definitivamente não gostei da direção que isso estava


tomando. Parecia que a música sinistra de um filme de terror
tinha começado a tocar.

— De qualquer forma... — Autumn torceu as mãos. — Ao


longo dos anos, nunca houve o suficiente para fazer um
alarme disparar – nem uma única coisa, de qualquer
maneira. — Balançou a cabeça. — Talvez houvesse, e eu
estivesse em negação. Não sei. Notava pequenas coisas –
como se achasse que seu carro estava me seguindo, mas
então desaparecia. Às vezes lhe perguntava sobre coisas que
tinha observado, mas suas respostas eram tão verossímeis
que continuava atribuindo isso à minha própria paranoia. Ele
realmente me fez sentir louca por pensar que teria tempo ou
inclinação para me seguir. Além do mais, e sei que isso parece
horrível, mas foi um relacionamento fácil. Os nossos pais
eram parceiros de negócios e melhores amigos, e tomei a
decisão de ir para a faculdade de direito, então Braden foi
capaz de desmistificar todo o processo. — Encolheu os
ombros. — Eu só... era muito confiante e ingênua naquela
época. Muito confiante.

Eu não tinha certeza do que dizer ou fazer. Parecia que


ela precisava se livrar de algo pegando o caminho mais longo,
ao invés de ir direto ao ponto, mas caramba, meu coração
estava em agonia esperando aquele outro sapato cair. Mesmo
assim, fiquei quieto.

Autumn acabou com o vinho em minha taça.

— Quer um pouco mais? — Perguntei.

Ela balançou a cabeça. — Não deveria. Eu só precisava


me acalmar. Prometo que chegarei ao fim dessa história em
breve.

Peguei a sua mão na minha e apertei. — Leve o tempo


que precisar. Não há pressa.

Ela acenou com a cabeça e olhou para baixo por um


minuto novamente antes de continuar. — Depois que terminei
a faculdade e voltei para casa, mais coisas começaram a
levantar bandeiras vermelhas. Eu pensava que ele estava me
seguindo, e depois o pegava mentindo sobre estar no
trabalho. Ele tinha esse jeito de mudar as coisas e me
convencer de que me sentia culpada porque estava ficando
distante. Estava na faculdade de direito e conhecendo novas
pessoas e queria um pouco de liberdade, então ele não estava
errado. Estávamos nos distanciando, mas ele esperou quatro
longos anos para que eu voltasse para casa. Então me senti
mal ao considerar terminar tudo, especialmente porque
enquanto estávamos juntos, ele era tão bom para mim.
Embora depois de pegá-lo em algumas mentiras, achei difícil
acreditar em qualquer coisa que dissesse. Um dia, notei
alguns dos meus e-mails marcados como lidos, embora
tivesse certeza de nunca tê-los aberto. As coisas começaram a
parecer muito prejudiciais à saúde, então, finalmente, disse a
Braden que precisava de uma pausa.

— Como isto acabou?

— Melhor do que esperava, no início, mas ele estava


convencido de que eu estava estressada por causa do meu
primeiro ano na faculdade de direito, e era apenas uma pausa
e nós voltaríamos.

— Vocês voltaram?

Ela balançou a cabeça. — Mantivemos contato, mas


depois que terminei as coisas, soube rapidamente que havia
tomado a decisão certa por vários motivos.
— Ok...

— Assim que percebeu que estava acabado e eu estava


seguindo em frente, coisas estranhas começaram a acontecer.

— Como o quê?

— Bem, eu costumava estudar com um pequeno grupo.


Uma das pessoas do meu grupo era esse cara, Mark. Uma
noite, éramos os dois últimos do nosso grupo a deixar a
biblioteca e, quando saímos, Braden estava lá. Disse que
estaria fazendo uma pesquisa tarde da noite, mas suspeitei
que estava me seguindo novamente. Ele foi educado quando o
apresentei a Mark, mas pude ver como estava furioso por
dentro. Poucos dias depois, Mark foi atacado.

— Por Braden?

— Nunca consegui provar, mas sempre suspeitei disso. A


pessoa o atacou enquanto caminhava para o carro tarde da
noite, mas nem tentaram tirar a sua carteira ou as chaves do
carro. Veio por trás dele, então nunca olhou no rosto do cara,
e o cara não disse uma única palavra durante o ataque. Tudo
o que Mark conseguiu dizer à polícia foi que o cara estava
usando sapatos sociais pretos. Claro, Braden e alguns outros
milhões de homens usam sapatos sociais.

Passei a mão pelo cabelo. — Jesus.

— Havia outras pequenas coisas, mas naquele ponto,


parei de falar com Braden completamente. Não atendia
quando ligava, e então ele me enviava longos e-mails e
mensagens de texto me fazendo sentir péssima pelas coisas
que estava pensando. — Ela respirou fundo e me olhou nos
olhos. — Uma noite ele apareceu em minha casa.

Todos os pelos dos meus braços se arrepiaram.

Autumn olhou para baixo e, quando sua cabeça voltou


para cima, seus olhos se encheram de lágrimas. — Disse que
só queria conversar. Ele estava chorando e me senti mal.
Então o deixei entrar.

Eu não conseguia respirar esperando o resto.

A sua voz era quase um sussurro quando continuou. —


Ninguém estava em casa. E ele... ele... me estuprou.

Congelei. Sabia que a história ia para um lugar feio, mas


não esse. Achei que ele tinha batido nela e talvez a assustado.
Não isso... Fecho meus olhos.

— Autumn... — Balancei minha cabeça. — Porra.


Autumn.

Quando abri os olhos, as lágrimas rolavam por seu rosto,


então fiz a única coisa que parecia certa. Eu a puxei contra
mim e a segurei com tanta força que em um ponto, me
preocupei que pudesse estar machucando-a. as minhas
próprias lágrimas caíram nas costas de sua camisa. Depois de
um tempo, ela se afastou.

— Quero terminar. — Enxugou as lágrimas e depois


estendeu a mão e secou as minhas. — Eu cheguei até aqui e
preciso colocar tudo para fora.

Balancei a cabeça e engoli um grande nó na garganta. —


Você não precisa. Não para mim.

Ela acenou com a cabeça. — Obrigada, mas preciso fazer


isso por mim.

Deus, se eu já não fosse louco por essa mulher, seria


agora. Aposto que ela não tinha ideia de quão forte era.

Autumn me contou o resto de sua história, pela meia


hora seguinte. Como não tinha ido imediatamente à polícia,
porque a princípio não tinha percebido o que era. Eles fizeram
sexo por anos, e embora dissesse a ele repetidamente para
parar desta vez, ela não lutou fisicamente com ele com mais
do que um empurrão. Eventualmente, ela apenas parou,
apavorada demais para se mover, esperando que ele
terminasse. Então, quando o choque de tudo isso passou, se
sentiu parcialmente culpada de alguma forma. Ela o deixou
entrar, o acusou de coisas que ele poderia não ter feito. Ela o
deixou chateado – pelo menos foi assim que ela viu no início.

Então, para piorar as coisas, quando ela finalmente


começou a passar do estado de choque para a raiva e decidiu
falar com alguém, essa pessoa não a apoiou.

O seu pai. O seu maldito pai.

O idiota teve a coragem de questioná-la se poderia estar


dando sinais contraditórios a Braden. Como se houvesse
qualquer outro sinal que importasse quando uma mulher diz
não.

Quando ela encontrou coragem para ir à polícia, é claro


que não havia mais evidências físicas. Portanto, era a palavra
dela contra a dele – um membro íntegro da comunidade
jurídica sem registro anterior. E quando entrevistaram os
amigos de Braden, ele os convenceu a mentir, ou mentiu para
seus amigos o tempo todo, porque disseram à polícia que
Autumn foi quem o perseguiu, que ela ficou chateada e
persistente quando ele tinha rompido as coisas.

O promotor disse que prosseguiria com o caso, mas


somente depois de alertá-la sobre o provável desfecho e como
os casos geralmente eram traumáticos para as vítimas. Não
fiquei surpreso, pois sabia em primeira mão que os
promotores não gostavam de prosseguir em um caso perdido.
Os recursos eram escassos e, convenhamos, os advogados
não gostavam de estragar seus registros.

Autumn soltou um suspiro irregular e forçou um sorriso.


— Agora gostaria de tomar outra taça de vinho. Você gostaria
de outra? Ou, na verdade, gostaria da sua primeira desde que
acabei bebendo a sua?

Fiquei de pé. — Definitivamente, mas vou pegá-las.


Preciso usar o banheiro, de qualquer maneira.

Depois de encher duas taças até a borda, fui espirrar um


pouco de água no rosto. Parecia que tinha acabado de correr
uma maratona, embora mal tivesse saído do sofá na última
hora. Estava fisicamente esgotado, então não conseguia nem
imaginar como Autumn se sentia. Enquanto estava lá, pela
primeira vez me ocorreu por que ela decidiu me contar tudo
esta noite. Estive tão consumido com sua história que não
levei um momento para perceber o que poderia tê-la levado a
compartilhá-la. Esta noite, no quintal, tinha trazido à
superfície memórias de ter sido atacada.

Tive vontade de bater minha cabeça contra a parede por


ser um maldito idiota. Por que diabos a trouxe para um lugar
como aquele, para começar, muito menos lhe disse para ir
atrás de uma melhor recepção de telefone celular? Fecho
meus olhos.

Que idiota eu sou.

Voltei para a sala de estar me sentindo mal fisicamente.


Sentado no sofá, meus cotovelos sobre os joelhos e a cabeça
caindo em minhas mãos, queria chutar minha própria bunda.
— Ouça, Autumn, realmente sinto muito pelo que aconteceu
esta noite.

— Nada aconteceu, Donovan.

— Esta não é a questão. Nunca deveria ter deixado você


lá fora sozinha – nem mesmo por um minuto. Eu sei o tipo de
problema que aparece.

Autumn estendeu a mão e pegou a minha. — Se eu


tivesse chamado seu nome, você estaria de volta em dois
segundos.
— Sim, claro, mas...

Ela apertou minha mão e esperou até que eu olhasse


para ela. — Eu comecei a ver minha antiga psiquiatra
novamente. Não me consultava com ela há alguns anos. Sabe
por que eu fui?

— Por que?

— Porque tenho problemas de confiança. Grandes.


Passei os últimos anos namorando caras com quem sabia que
não me envolveria emocionalmente porque não confio em mim
mesma para ver as coisas chegando. Honestamente, não
achava que era capaz de querer mais com um homem.

Não passou despercebido que ela estava falando no


tempo passado – não achava que fosse capaz. Não, eu não
acho que sou capaz, mas depois das últimas horas, estava
com medo de aumentar minhas esperanças. Precisava das
coisas explicitas.

— Agora porém? — Perguntei.

Ela sorriu. — Gosto de você, Donovan. Sempre gostei. A


verdade, gostei muito de você e aquele fim de semana que
passamos juntos me assustou. Dizem que o tempo cura
velhas feridas. Não tenho certeza se as minhas vão se curar
totalmente, mas estou cansada de deixá-las controlar minha
vida. Ano passado, quando nos conhecemos, eu não estava
pronta. Revelação completa, não tenho certeza se estou
totalmente pronta agora. Ainda tomo pílulas para dormir
apenas para relaxar o suficiente para adormecer à noite e
posso não confiar tanto quanto deveria, mas gostaria de
tentar, se você ainda estiver interessado.

Sorrio. — O meu interesse é mesmo uma questão em sua


mente?

Ela mordeu o lábio inferior. — Bem, eu não queria


presumir.

— Deixe-me ser bem claro. — Peguei suas mãos e me


aproximei mais no sofá até que nossos joelhos se tocassem. —
Nunca me interessei tanto por uma mulher em minha vida.
Quer me quisesse ou não, você me teve no ano passado,
Autumn.

Ela sorriu. — Precisamos ir devagar.

— Posso ir devagar.

Autumn deu uma risadinha. — Não tenho certeza se


acredito nisso, mas acredito que você tentará ir devagar.

— Não acha que posso ir devagar?

Uma hora atrás, ouvir sua história fez meu coração se


partir. Agora o sorriso em seu rosto parecia a cola juntando
tudo de novo.

— Não tenho certeza se nenhum de nós é muito bom em


ir devagar quando se trata do outro.
— Pelo menos não estamos sozinhos na luta. — Levantei
sua mão e levei sua palma aos meus lábios. — Não será fácil,
mas tentarei ser menos charmoso.

Ela riu, e outra rachadura no meu coração se fechou. —


Tenho certeza de que será difícil para você.

Olhei em seus olhos. — Obrigado por compartilhar tudo


comigo esta noite.

— Obrigada por não desistir de mim.

— Venha aqui. — Puxei sua mão, guiando-a do local ao


meu lado no sofá para o meu colo. Desta vez, quando a
envolvi em meus braços, foi diferente. Ela não estava me
deixando consolá-la; estava me deixando abraçá-la porque
queria que eu a abraçasse, e foi incrível “pra” caralho.
Quando me afastei, nossos rostos estavam próximos e queria
tanto beijá-la, mas me contive – e estava muito orgulhoso de
mim mesmo.

As minhas mãos alisaram o cabelo de cada lado de seu


rosto. — Acho que preciso de algumas regras básicas para ir
devagar. Tudo o que quero fazer é beijá-la agora, e tenho
medo de estragar tudo se não estabelecer limites.

Ela sorriu. — OK. Provavelmente é uma boa ideia.

— Então manda ver. Como faremos isto?

Autumn bateu o dedo nos lábios. — Acho que devemos


limitar a frequência com que nos vemos. Que tal uma vez por
semana?

— Três vezes.

Ela riu. — Oh meu Deus. Você acabou de entrar no


modo advogado para negociar. Sinto que preciso do meu
próprio advogado agora para não ser pisoteada.

Sorrio. — Desculpe. Que tal dois dias?

— Eu acho que é bom.

— OK. O que mais tem?

— E se tentarmos não entrar na rotina? Sinto que é o


que acontece quando um relacionamento entra em um
território sério. Você se acomoda em uma previsibilidade
cotidiana e familiar. Talvez pudéssemos estender o que
acontece no início do namoro, onde meio que experimenta
para onde vai e o que o outro gosta.

Dei de ombros. — Isso soa bem para mim. Gosto de


experimentar coisas novas e experimentá-las com você é
ainda melhor.

— E provavelmente não deveríamos fazer planos de longo


prazo. Acho que manter as coisas para o futuro imediato –
digamos, nas próximas semanas – deixa as coisas mais leves.

— Muito bem. Algo mais?

Ela mordeu o lábio. — Só mais uma, acho, mas tenho a


sensação de que pode não gostar.
— Manda ver.

— Bem, sexo... não faço isto há alguns anos depois...


sabe... e então só fiz sem uma conexão emocional. Então,
honestamente, já faz muito tempo desde que combinei os
dois, e apenas contemplar isso realmente me assusta.

O meu rosto caiu, embora não tivesse nada a ver com


não fazer sexo.

Autumn percebeu. — Eu não... Não, isso saiu errado.


Não quis dizer que não tive uma conexão emocional com você
no fim de semana que passamos juntos, se é isso que está
pensando. A verdade, é exatamente o oposto. Senti coisas por
você e é por isso que não queria fazer sexo de verdade naquele
fim de semana. Achei que isso manteria as coisas em um
nível mais amigável, mas mesmo sem sexo, o que senti me fez
correr o mais rápido que pude. O que é exatamente o que
estou tentando evitar que aconteça agora, indo devagar.

Passei a mão pelo cabelo, soltei um suspiro profundo e


assenti. — Sim, claro. O que for preciso.

— Obrigada. Eu sei que estou pedindo muito.

Corri meus dedos por sua bochecha. — É justo. Estou


recebendo muito em troca. Você.

Ela esfregou sua bochecha contra minha mão. — Acho


que é tudo das minhas regras. E você? Quer adicionar alguma
coisa?
— Você não mencionou exclusividade. Não acho que
aguento saber que está saindo com outros homens neste
momento.

Ela balançou a cabeça. — Eu não vou. Mesmo quando


evitava relacionamentos que pudessem levar a qualquer coisa,
não saía com mais de uma pessoa ao mesmo tempo.
Simplesmente não é minha praia.

— Bom. Então estamos na mesma página.

— Então é isso? — Perguntou.

O advogado em mim não conseguia deixar de pensar nas


coisas em termos de contrato, e uma coisa que sempre gostei
de negociar para meus clientes era uma out clause47. — Vou
seguir essas regras o melhor que puder — disse. — Porque
são importantes para você, mas a bola está do seu lado, Red.
Se chegar a um ponto em que esteja pronta para passar mais
tempo juntos, ou quiser fazer planos para o futuro, só precisa
me avisar.

Ela sorriu. — O mesmo vale para se eu quiser fazer sexo?


Só tenho que deixá-lo saber?

Um sorriso perverso se espalhou pelo meu rosto. — Não,


querida. Para isso, precisa fazer mais do que apenas me
informar. Depois de todo esse tempo, vou fazer você implorar.
CAPÍTULO 25

Autumn

— Para onde ele está te levando? — Skye deitou de


barriga na minha cama com os pés balançando no ar como
uma adolescente.

— Ele não vai me dizer. Esse é o problema. — Joguei


outra roupa ao seu lado voltei para o meu armário.

— Você lhe perguntou o que vestir?

— Disse para usar algo sexy. — Não tenho ideia do que


isso significa. — Tipo, uso salto alto ou não?

Skye sorriu. — Acho que nunca te vi assim.

Tirei minha cabeça do armário. — Assim como?

— Uma pilha de nervos. Você realmente gosta desse


cara, hein?

Suspirei. — Gosto.

— Importa-se se eu ficar até ele chegar aqui? Estou


curiosa para conhecê-lo.

Balancei minha cabeça. — Claro que não, mas deve estar


aqui em cerca de vinte minutos, então me ajude a encontrar
algo para que não esteja nua quando ele chegar.
Skye se levantou e se juntou a mim no minúsculo
armário. — Estar nua quando ele chegar pode resolver o seu
problema de roupa. Tenho certeza que ele adoraria.

— Vamos tentar ir devagar.

— Entediante. — Skye mexeu nos cabides do meu


armário e tirou um vestido azul royal aberto nas costas. —
Deveria usar isto.

Eu o segurei contra mim. — Acha? É meio sexy.

— Pensei que ele disse para usar algo sexy.

— Disse, mas não quero enviar a mensagem errada.

— O que quer que a roupa diga?

— Não sei. Que as coisas são casuais e me esforço, mas


não surtei ao experimentar cinquenta roupas apenas para o
encontro.

— Oh, não precisa se preocupar com esse vestido


dizendo tudo isso.

— Não?

— De jeito nenhum. Porque seu rosto vai dizer


exatamente o oposto de qualquer maneira.

— Ugh... isso não ajuda.

Ela encolheu os ombros. — Talvez não, mas é a verdade.


Então você pode muito bem parecer gostosa, já que nunca
será capaz de esconder a verdade.

Passei mais quinze minutos experimentando meia dúzia


de roupas, mas no final acabei usando o vestido azul. Quando
a porta zumbiu, abri o aplicativo que tinha no celular para ver
quem estava lá embaixo e comecei a me sentir enjoada. —
Talvez eu deva cancelar. Não me sinto bem.

Skye arrancou meu celular da minha mão. — Oooh... ele


é lindo. — Ela apertou o botão para falar enquanto apertava o
botão de desbloqueio que abria a fechadura no andar de
baixo. — Venha cá, coisa gostosa.

A minha resposta madura, quando me olhou foi mostrar


minha língua.

— Atraente — ela sorriu. — Talvez ele vá chupá-la mais


tarde, se tiver sorte.

— Preciso fazer xixi antes de ir. Posso confiar em você


para deixá-lo entrar se ele estiver aqui antes de eu terminar?

— Claro. — Ela sorriu. — O que poderia acontecer?

Enquanto fixava meu batom no banheiro, ouvi Skye


falando do outro cômodo. — Então, você já teve uma van?

— Não, não tenho.

— Feriu algum animal?

— Não posso dizer que sim.


Oh senhor. Limpei o batom e abri a porta do banheiro.
Assim que me aproximei da sala de estar, Skye disse — Posso
ver seus dentes, por favor?

— Skye! — Gritei.

Ela se virou com uma cara inocente. — O quê?

— O que você está fazendo?

— Tentando descobrir se ele é perigoso. Você precisa de


uma van para colocar os filhotes, de modo que possa atrair
crianças, e li que a maioria dos assassinos em série não
começa machucando pessoas. Evoluem a partir de pequenos
animais.

Balancei minha cabeça. — E os seus dentes?

Ela sorriu. — Isso foi para meus próprios propósitos. Eu


apenas gosto de um homem que não tem muitas obturações.

Felizmente, Donovan era um bom esportista. Aproximei-


me e coloquei meu braço em volta da minha melhor amiga. —
Vejo que você já conheceu minha amiga Skye.

— Conheci. Ela é protetora. Esta é uma boa qualidade


em um amigo.

— Isto é. Embora louca... nem tanto. — Apertei seu


ombro. — Skye estava de saída.

Ela agarrou sua bolsa e me beijou na bochecha antes de


se virar para Donovan.
— Tenho dois conselhos para você.

— OK...

— Um, se não conseguir fazê-la falar, experimente


Twisted Tea48. Ela os engole e relaxa. Então não pode fazê-la
se calar.

Donovan sorriu. — Bom saber.

— E dois, não a machuque. — Enfiou a mão no bolso e


tirou uma carteira masculina de couro preto, deixando-a
balançar entre dois dedos. — Porque sei onde você mora
agora.

Donovan deu um tapinha nas calças. As suas


sobrancelhas se juntaram. — É a minha carteira?

— Não se sinta mal. — Skye sorriu. — Tenho um rosto


angelical. Engana a todos.

Donovan pegou sua carteira de volta e coçou a cabeça


quando ela saiu correndo pela porta. Uma vez que fechada
atrás dela, as suas sobrancelhas se ergueram. — Bem, isso
foi... interessante. Acho que foi ela quem me deixou entrar e
me chamou de coisa gostosa?

Concordei. — Tenho um aplicativo que se conecta à


câmera no andar de baixo. Dependendo do apartamento para
o qual liga, os inquilinos podem ver o vídeo de quem está na
porta. É uma das razões pelas quais escolhi o prédio.
— Legal. Embora ache que você tem mais chance de ser
roubada por sua amiga. Ela rouba carteiras com frequência?

Rio. — É um dos muitos talentos de Skye. Felizmente,


não usa muito esse hoje em dia.

— Ela costumava?

Concordei. — Antigamente, sim.

— Ela era um dos seus casos?

— Não, mas Skye é muito aberta sobre sua história,


então não se importaria que eu lhe contasse. Ela dá palestras
em escolas e outras coisas agora. Nós nos encontramos no
consultório de um terapeuta e fomos para a mesma reunião
de apoio à vítima por anos.

O rosto de Donovan caiu. — Então ela foi...

Concordei. — O seu tio. Tudo começou quando tinha


apenas nove anos.

— Jesus Cristo.

— Furtar carteiras se tornou um de seus hobbies, assim


como se cortar e dormir com homens adultos quando mal
tinha chegado à puberdade, mas percorreu um longo
caminho. — Balancei minha cabeça. — De qualquer forma, é
deprimente falar sobre isso. Não vamos continuar de onde
paramos na outra noite.
Ele fez o que pôde para sorrir, mas pude ver que acabei
com o início da nossa noite. Tentei trazer o clima de volta
inclinando minha cabeça. — Por que não começamos de
novo? Você bate, eu atendo a porta e pode me dizer como
estou bonita?

O canto da boca de Donovan se contraiu. Estava


brincando, mas ele se virou, abriu a porta e saiu, fechando-a
atrás de si. Alguns segundos depois, houve uma batida.

Sorri de orelha a orelha ao abri-la. — Oi. Está alguns


minutos adiantado.

Os seus olhos caíram para os meus pés e muito


lentamente trabalharam seu caminho pelo meu corpo.
Quando nossos olhos se encontraram, estava com todo o
corpo formigando. — Está fenomenal.

Eu lhe disse para sair, bater e me dizer como eu estava


bonita; no entanto, ainda corei com o comentário. —
Obrigada. Você também não está tão mal.

Donovan entrou e fechou a porta atrás de si. Senti-me


tonta, uma sensação à qual definitivamente não estava
acostumada. Ele envolveu uma mão em volta da minha
cintura e a outra deslizou no meu cabelo.

— Beije-me — rosnou. — Não posso esperar mais.

Inclinei-me para frente, mas não tive a chance de


prosseguir com o beijo, porque Donovan imediatamente
assumiu. Esmagou seus lábios nos meus, engolindo um
suspiro inesperado. Assim como naquele dia no banheiro, em
segundos tinha esquecido completamente onde estava. Ele
cheirava incrível, e mesmo que seu corpo não fosse
empurrado contra o meu, senti o calor que emanava dele, e
isso me deixou em chamas. Agarrei-me a ele e minhas unhas
cravaram em suas costas enquanto ele puxava sua boca da
minha para sugar até meu pescoço, dentes arranhando meu
queixo e respiração quente enviando uma onda de choque que
senti entre minhas pernas. Senhor, este homem sabe beijar.

No momento em que paramos, eu estava ofegante.

— Isto é melhor? — Rosnou.

— Oh meu Deus, melhor do que o quê? Eu nem me


lembro do que estávamos falando.

Donovan sorriu. — Você me disse para fazer uma nova


entrada. — Os seus olhos percorreram meu rosto. —
Realmente está linda.

Tive que piscar algumas vezes para sair da minha névoa.


— Obrigada.

Ele acariciou minha bochecha com o polegar. — Poderia


ficar aqui e fazer isso por horas, mas provavelmente devemos
ir. Temos um horário.

— Um horário? Quer dizer uma reserva?

Ele enfiou as mãos nos bolsos. — Não.

— Para onde vamos que precisamos de um horário?


— Você verá.

Normalmente não amo surpresas, mas esta noite foi uma


exceção. Já fazia muito tempo desde que deixei meu coração
bater, e parecia quase libertador. Sorrio. — Deixe-me pegar
minha bolsa.

♥♥♥

— Chegamos? — Olhei ao redor do estacionamento do


shopping center. Havia um barbeiro, uma loja de tacos
fechada, uma lavanderia a seco, um estúdio de balé e um
restaurante chinês.

Donovan desafivelou o cinto de segurança. — Chegamos.

Olhei para a fileira de lojas novamente. — Vamos comer


comida chinesa?

— Não.

— Pegar sua roupa na lavanderia?

Ele sorriu. — Não.

— Cortar o cabelo?

— Você está ficando sem opções...

Olhei as lojas mais uma vez para me certificar de que


não estava perdendo nada, mas a única coisa que restou foi o
estúdio de balé.

— Oh meu Deus. Você é secretamente uma bailarina e se


apresentará para mim.

— Não exatamente, mas está ficando mais quente. — Ele


saiu do carro e deu a volta para abrir minha porta, me
oferecendo sua mão.

— O estúdio de balé também dá aulas de dança para


casais. Ano passado, durante nosso fim de semana juntos,
você me pediu para descrever minha ideia da mulher perfeita.
Quando perguntei sobre o homem perfeito, disse que ele sabia
dançar. — Encolheu os ombros. — Eu não sei. Então, percebi
que precisava aprender, e você também queria evitar a
previsibilidade do dia a dia e ir devagar. Achei que ter aulas
de dança seria bastante imprevisível.

O meu coração disparou. Ele se lembrou do que eu disse


há muito tempo e queria ser meu Sr. Perfeito. Estávamos há
vinte minutos em nosso primeiro encontro e percebi que ir
devagar com esse homem não tinha nada a ver com qualquer
coisa que pudesse controlar. Eu precisava controlar meu
próprio coração, ou seria um caso perdido mais rápido do que
poderia dizer dois pés esquerdos.

— Umm... acho que deveria ter mencionado algo para


você.

As sobrancelhas de Donovan se juntaram. — O quê?


— O motivo pelo qual o Sr. Perfeito precisa saber dançar
é porque sou péssima nisso.

— Tenho certeza que não é tão ruim.

Levantei meu cotovelo e mostrei a ele uma pequena


cicatriz. — Está vendo isso?

— Sim.

— Isso é do meu único recital de dança. Tinha oito anos


e não conseguia acertar a direita e a esquerda nem em caso
de vida ou morte. Honestamente, ainda não consigo. Tenho
que pensar sobre com que mão escrevo para descobrir. De
qualquer forma, fui para a esquerda quando deveria ir para a
direita – de novo. Bati em algumas das outras bailarinas e caí
para fora do palco. Caí sobre meu cotovelo, desloquei-o e levei
nove pontos.

Donovan parecia divertido. Ele se curvou e deu um beijo


suave na minha cicatriz. — Pobrezinha, mas não se preocupe,
prometo não deixá-la cair do palco hoje.

— Tudo bem, mas não diga que não avisei. Estou de


salto, então seus dedos do pé não estão absolutamente
seguros.

Ele sorriu e olhou para o relógio. — Eu vou correr o


risco, mas a aula começa em dois minutos, então é melhor
irmos.
Por dentro, fiquei surpresa ao descobrir que éramos os
únicos na sala de espera. Uma mulher de cabelos brancos
com rabo de cavalo, vestindo um collant e uma saia longa e
esvoaçante saiu da parte de trás para nos cumprimentar.

— Olá de novo, Donovan. É bom ver você. — Ela se virou


para mim e sorriu enquanto estendia a mão. — E você deve
ser Autumn.

— Sou. — Nós nos cumprimentamos.

— Eu sou Beverly, mas todo mundo me chama de Bev.


Serei sua instrutora hoje. Vocês estão prontos para começar?

Respirei fundo. — Acho que sim.

— Não se preocupe. Vamos alongar e aquecer seus


tornozelos para minimizar o risco de lesões. — Ela abriu a
porta nos fundos e acenou para que a seguíssemos. — Por
aqui. — Dentro havia um típico estúdio de dança, com
espelhos nas paredes, piso de madeira e uma barra de balé
em ambos os lados da sala. Bev apontou para uma parede de
cubículos. — Você pode simplesmente colocar sua bolsa e
qualquer outra coisa em um desses. Estará seguro, pois
somos apenas nós.

— Somos apenas... nós?

Ela olhou entre Donovan e eu. — O seu namorado


reservou uma aula particular.
— Oh... — Não tenho ideia do porquê, mas isso me
assustou ainda mais. Acho que porque toda a atenção estaria
sobre nós, e seria ainda mais aparente que eu era péssima.

Donovan deve ter percebido minha apreensão. Ele se


inclinou e sussurrou em meu ouvido. — Não temos que ficar
se não quiser.

Balancei minha cabeça e consegui sorrir, aceitando a


situação. — Não... não, será divertido.

— Tem certeza?

— Sim. — Concordei. — Vamos fazer isso.

Não muito depois de começarmos nossa aula, ficou claro


quem era o melhor dançarino.

Olhei para meu parceiro. — Tem certeza de que nunca


fez isso antes? Talvez tenha tido algumas aulas quando
criança?

— Quais são as chances de conseguir que Storm tenha


aulas de dança?

— Uh, quase nulas.

— Não só nunca poderíamos ter pagado aulas de dança


quando era criança, como de jeito nenhum teria me arriscado
a fazê-las e meus amigos descobrirem. Eles teriam me
torturado por anos ou me dado uma surra de merda.
Provavelmente ambos. A maior parte do mundo está mudando
para melhor hoje em dia, mas nada muda no antigo bairro.
Donovan pressionou a mão nas minhas costas para
guiar meus passos enquanto Bev estava ao nosso lado
contando.

— Um-dois, um-dois. É isso. Dois rápidos para o lado e


depois um passo lento para frente. Você conta o lento em
duas batidas da música e o rápido em uma.

Estava feliz que ele parecia saber do que diabos ela


estava falando. Bev nos orientou a adicionar na segunda
etapa agora, algo chamado “Juntos, Juntos”, mas nem tinha
percebido que estávamos trabalhando em duas etapas
diferentes. Embora, novamente, Donovan pareceu entender
rapidamente e assumiu uma forte liderança. Em nossa
terceira ou quarta tentativa de juntar as duas etapas
diferentes que ela aparentemente nos ensinou, comecei a
sentir que estava pegando o jeito. Exceto em um momento,
dei um passo à frente quando deveria ter dado um passo para
trás e acabei pisando bem no pé de Donovan.

Ele estremeceu, mas rapidamente apagou a dor que


causei de seu rosto.

— Eu sinto muito.

— Sem problemas. — Riu.

Bev nos disse, poucos minutos depois, para fazer um


intervalo de cinco minutos e saiu da sala. Donovan comprou
duas águas da máquina do saguão e depois voltamos para o
estúdio.
Estava com calor e bebi metade da garrafa. — Eu só
quero dizer que é uma velha história de que se não sabe
dançar, não é bom de cama. Não há correlação real.

Donovan sorriu. — Você tem ritmo, simplesmente não


consegue memorizar os passos. Definitivamente ainda
confunde sua esquerda e direita e, às vezes, frente e atrás.

— Sim... este sempre foi meu problema quando era


pequena também.

Donovan bebeu o resto de sua água e piscou. — Além


disso, não tenho nenhuma preocupação sobre nós dois na
cama. Já sei que somos uma boa combinação.

— Como?

— Contato visual. Você dá um contato visual incrível.

Rio. — Eu nem sei o que isso significa.

— Você me olha com intensidade. Imita a maneira como


me sinto por dentro quando olho para você. Química tem tudo
a ver com contato visual.

Os nossos olhares se encontraram e meu coração


acelerou. Acho que ele tinha razão. Tínhamos tido aquela
faísca desde o primeiro momento em que nos conhecemos.

Bev voltou e Donovan pediu licença para ir falar com ela


no aparelho de som. Eles trocaram algumas palavras e ela
sorriu ao olhar para mim, mas não pude ouvir o que estavam
dizendo.
— Sobre o que era tudo isso? — Cutuquei quando voltou.

— Nada. — Ele pegou uma das minhas mãos e envolveu


a outra nas minhas costas quando a música começou.

Bev estava de volta ao nosso lado e contando novamente


antes que pudesse interrogá-lo mais. A segunda metade de
nossa lição foi melhor do que a primeira. Finalmente comecei
a relaxar e me divertir quando parei de me importar com a
minha aparência. Para ser honesta, da maneira como
Donovan olhou para mim, sabia que me julgar por alguns
erros era a coisa mais distante de sua mente. A certa altura,
Bev recuou.

— Bem. Faltam cerca de dez minutos para a nossa aula.


Realmente gostei de trabalhar com vocês. Se estiverem
interessados em continuar, liguem para mim.

— Obrigado, Bev — ambos dissemos.

Ela voltou para a música, mudou a canção e acenou


uma última vez enquanto saía do estúdio de dança para o
saguão.

— Estou confusa. Ela não acabou de dizer que faltavam


dez minutos?

Donovan me puxou para seus braços. Ao contrário da


maneira como me segurou durante a aula de rumba, nossos
corpos estavam pressionados agora.
— Perguntei se poderíamos ter dez minutos para dançar
sozinhos. A sua aula foi boa, mas havia muita distância entre
nós. Quero-a mais perto.

A introdução instrumental de “Slow Dance” de John


Legend terminou e ele começou a cantarolar. O meu corpo
derreteu com o toque de Donovan enquanto balançávamos
para frente e para trás.

— Esta foi uma ideia muito atenciosa. Obrigada.

— Sejamos realistas, meus motivos não eram


inteiramente altruístas. Essas aulas também foram uma
oportunidade para mantê-la por perto durante a primeira
hora do nosso encontro.

Eu rio, e Donovan nos girou, enterrando o nariz no meu


pescoço e inspirando profundamente.

— Sabe, você arruinou um encontro para mim por causa


do seu cheiro — disse ele.

Puxei minha cabeça para trás. — Como assim?

— Você cheira a baunilha. Poucos meses depois que


desapareceu, saí com uma mulher. Depois do nosso encontro,
ela me convidou para um drinque em seu apartamento.
Quando chegamos lá, acendeu algumas velas – fez a sala
inteira cheirar a baunilha. Tomei uma taça de vinho, lhe disse
que tinha uma reunião matinal da qual havia me esquecido e
encerrei a noite.
Eu não pude deixar de sorrir.

Donovan balançou a cabeça e riu. — Vejo que está


realmente chateada por ter arruinado meu encontro.

— Diz o homem que me seguiu até o banheiro durante


um dos meus.

Ele gemeu. — Não vamos falar sobre nada disso. Pensar


em você com Blake – ou qualquer outro cara, nesse caso – me
faz sentir explosivo.

— Se isso te faz sentir melhor, tenho vontade de socar a


mulher que acendeu velas para você.

Ele sorriu. — Sim.

— Você sabe muito sobre a minha história de namoro,


mas nunca me contou sobre a sua. Já posso dizer que é
muito bom nesse negócio de namoro para não ter tido muitas
namoradas.

— O que quer saber?

— Bem, já teve uma namorada séria?

— Uma, na faculdade de direito. Namoramos por cerca


de dois anos. Acabou quando nos separamos depois de nos
formarmos.

— E ... desde então?


— Já namorei, mas sempre fui sincero que não procuro
nada sério e meu trabalho é minha prioridade. Acontece que
às vezes as melhores coisas acontecem quando você nem está
olhando.

Mordi meu lábio inferior. — Você me assusta muito,


Donovan.

— Posso dizer o mesmo sobre você, Red. Sabe o quê?

— O quê?

— Tenho mais medo do que perderei se não dermos uma


chance real.

Respirei fundo e balancei a cabeça. — Ok.

Donovan me puxou contra ele novamente e me levou ao


redor da pista de dança algumas vezes. Segurou-me um
pouco mais forte e tive a sensação de que não tinha nada a
ver com a dança. Normalmente, qualquer possessividade de
um homem me fazia correr, mas não desta vez. Gostava que
Donovan se sentisse assim por mim, principalmente porque o
sentimento era mútuo e, de alguma forma, era menos
assustador para mim dessa forma.

A música chegou ao fim, mas Donovan manteve minha


mão na sua.

— Está pronta para o nosso encontro?

— Pensei que este fosse o nosso encontro?


— Nah. Isto era apenas eu encontrando uma maneira de
ter seus seios empurrados contra meu peito quando
deveríamos ir devagar.

Rio, mas fiquei na ponta dos pés e toquei meus lábios


nos dele. — Você não pode me enganar, Sr. Decker. É
atencioso e doce e tem um lado muito romântico.

Ele olhou para trás e para frente entre os meus olhos. —


Oh, sim? Bem, se isso for verdade, é melhor manter isso em
segredo. Tenho uma reputação de idiota que preciso manter
intacta.

A minha barriga deu um pequeno salto mortal. A


maneira como olhou para mim transformou minhas
entranhas em mingau quente. Eu ainda tinha vontade de
fugir, mas estava aprendendo que poderia superar essas
crises se apenas aguentasse e levasse as coisas devagar.

Embora cada minuto que passei com este homem tenha


feito a esperança dentro de mim florescer um pouco mais.
Estava aprendendo a confiar de novo e só esperava que, desta
vez, minha confiança não estivesse perdida.
CAPÍTULO 26

Donovan

— Este lugar é lindo. — Autumn colocou o guardanapo


no colo. — Já esteve aqui antes?

Hesitei antes de responder. O advogado em mim sempre


jogou xadrez, tentando descobrir aonde a conversa poderia
levar, com base em uma determinada resposta. Nesse caso, se
dissesse sim, poderia levá-la a perguntar se eu tinha marcado
um encontro aqui, e não queria que ela não se sentisse
especial.

Autumn ergueu uma sobrancelha. — Terra para


Donovan. Você está aí?

Concordei. — Sim, desculpe-me. Simplesmente fiquei


preso em minha cabeça. Já estive aqui antes.

— O que quer dizer com preso em sua cabeça? Algo está


te incomodando?

Mais uma vez, tirei um minuto para debater como essa


conversa poderia se desenrolar, e Autumn percebeu.

— Fale comigo — disse. — O que está acontecendo?

Decidi confessar. — Estou pensando demais porque não


quero estragar esta noite.
— O que está pensando demais contudo?

— Você me perguntou se já estive aqui antes. Estive, mas


tentava descobrir se, ao admiti-lo, você ficaria desanimada
porque estive aqui com outra pessoa.

— Entendo. Bem, ser honesto comigo é mais importante


do que o fato de ter trazido outra mulher aqui.

Passei a mão pelo cabelo. — Sim, claro. Sinto muito. Faz


muito tempo que não fico nervoso em um encontro.

Autumn sorriu. — Troquei de roupa dez vezes antes de


me buscar. Então você não está sozinho.

Os meus olhos caíram para seu decote. — Você escolheu


o certo.

Ela riu. — Obrigada, mas o que faremos sobre isso?

— O seu vestido?

— Não. Nossos nervos.

Poderia pensar em algumas maneiras de resolver os


nervos – nenhuma das quais fazia parte do seu decreto para ir
devagar. Então, mantive esses pensamentos para mim e dei
de ombros. — Vinho?

Ela acenou com a cabeça. — Parece perfeito.

A garçonete veio anotar nosso pedido de bebida, e


Autumn escolheu uma garrafa.
— Sabe — disse — quando comecei a namorar de novo,
meus nervos estavam à flor da pele. Cancelei meus dois
primeiros encontros porque não conseguia suportar o estresse
que os antecedeu. Quando contei à minha terapeuta sobre
isso, ela sugeriu que eu escrevesse uma lista de todas as
coisas pelas quais estava nervosa e, em seguida, uma lista de
todas as coisas pelas quais sou grata. Parece bobo dizer isso
em voz alta agora, mas funcionou muito bem para mim.

Balancei minha cabeça. — Não parece bobo. Faz sentido,


na verdade. Reconhecer um problema tira seu poder.

Ela acenou com a cabeça. — Quer experimentar? Já que


estamos ambos nervosos?

— Agora mesmo?

— Sim. Não temos que escrevê-los. Talvez possamos


apenas contar um ao outro.

— Bem. Damas primeiro.

Autumn bateu o dedo no lábio. — Ok... bem... estou


nervosa porque gosto de você. E tenho medo de que, se me
permitir apaixonar, não verei as coisas que deveria ver.

Porra. Doeu ouvir o quanto aquele pedaço de merda a


tinha bagunçado. Estiquei-me sobre a mesa e peguei a sua
mão. — Um bom homem não tem partes de si mesmo que
está escondendo, Autumn.
Ela sorriu tristemente. — Eu sei disso, mas o que
logicamente sei e como minhas emoções lidam com as coisas
nem sempre se reconciliam. Estou sendo honesta sobre as
coisas que me deixam nervosa.

Concordei. — Entendo.

A garçonete veio e trouxe a garrafa de vinho que


pedimos. Derramou uma pequena quantidade em uma taça, e
passei para Autumn para um teste de sabor.

Ela acenou com a cabeça. — É delicioso. Obrigada.

— Gostariam que colocasse um aperitivo para vocês


enquanto examinam o menu? Hoje temos burrata caseira e
nossa lula frita é um dos pratos mais populares.

Olhei para Autumn e ela acenou com a cabeça. — Gosto


de ambos. Qualquer um está bom para mim.

— Vamos querer um de cada, por favor.

Depois que a garçonete desapareceu, Autumn disse —


Você? Por que está nervoso? Disse que estava nervoso por
estragar tudo, mas há algo em particular que o preocupa?

Bebi um pouco do meu vinho e fiquei pensando se


deveria ser honesto. Percebendo que estava novamente
filtrando meus pensamentos, mesmo quando ela havia sido
franca com sua resposta, decidi dizer dane-se e ir com
completa honestidade.
— Estou nervoso porque sou louco por você e temo que,
se vir a verdade sobre onde estou, vou assustá-la.

Autumn sorriu. — Você é louco por mim?

— Você não pode dizer?

Ela mordeu o lábio. — Posso fazer outra confissão sobre


algo que me deixa nervosa?

— Claro.

— Eu não confio mais no meu próprio julgamento.


Então, embora tenha percebido como se sentia, uma parte de
mim esteve ocupada inventando outras razões pelas quais
está interessado em mim.

As minhas sobrancelhas se juntaram. — Como o quê?

Autumn tomou um gole de vinho. — Bem, você é


competitivo e, às vezes, os homens se sentem atraídos por
mulheres que não demonstram interesse por elas.

— Acha que estou jogando?

Ela balançou a cabeça. — Eu não... Bem, não realmente,


mas é isso – quando se perde a confiança em seu próprio
julgamento, você analisa tudo em excesso até encontrar algo
errado. É como uma necessidade compulsiva de encontrar
dúvidas em mim mesma.

Entendia a psicologia por trás disso, mas não sabia como


reprimir as vozes em sua cabeça. Suponho que a única coisa
que poderia fazer seria dialogar com elas. Então fechei meus
olhos.

— Você tem uma pequena cicatriz no joelho direito.


Coloca canela no seu café, mas se não for do seu tipo normal,
passa o dedo por cima do potinho e prova o gosto. Também
gosta de vasculhar armários de cozinha que não são seus
quando acha que ninguém está olhando. Quando está
pensando sobre um problema, bate o indicador no lábio, mas
quando seus pensamentos são sujos, você morde.

Abri meus olhos para encontrar os de Autumn. — Como


sabe de tudo isso?

— Eu a vi vasculhar meus armários de cozinha no fim de


semana que passamos juntos. Pensou que eu estava
dormindo, mas a porta do quarto estava entreaberta e pude
vê-la na cozinha.

— Por que não disse nada?

Dei de ombros. — Porque queria que você vasculhasse


meus armários se isso te deixasse feliz.

— Como sabia sobre a cicatriz no meu joelho?

— Você tirou uma soneca no sofá enquanto estávamos


assistindo a um filme, e não conseguia parar de olhar para
você. Queria memorizar cada sarda, cada curva...

A boca de Autumn estava aberta. Engolindo em seco. —


Acho que também bato no lábio com o dedo.
Eu sorrio. — Eu sei que faz. Sabe por que eu sei?

— Por quê?

— Porque não consigo tirar meus olhos de você, não


consigo desde a primeira vez que nos conhecemos. E naquela
época, não tinha ideia de que você sumiria. Então, não... —
balancei minha cabeça. — Não posso estar interessado em
você porque é a garota que não posso ter, porque eu era um
caso perdido antes mesmo de você partir.

O rosto de Autumn suavizou. — Eu não sei o que dizer,


Donovan.

— Não tem que dizer nada. Apenas me dê a chance de


mostrar a você...

Ela me olhou nos olhos por um longo tempo antes de


respirar fundo e assentir. — OK.

— Sim?

— Sim. — Sorriu.

A garçonete entregou nossos aperitivos. Parecia que


precisávamos do minuto que isso nos deu. Como a noite havia
começado de forma pesada, assim que a garçonete saiu, voltei
a nossa conversa para o que achei ser a parte mais segura do
exercício de terapia de Autumn.

— Então, o que estamos fazendo? Coisas pelas quais


somos gratos?
— Penso que sim. Quer que eu vá primeiro de novo?

— Claro.

Ela começou a tocar o lábio com o dedo, mas sorriu ao se


conter. — Ok, vamos ver... sou grata pela minha saúde, bons
amigos, por ter um trabalho que é gratificante, boa comida...
— olhou para mim. — E uma segunda chance.

— Legal...

Ela tomou um gole de vinho e ergueu o queixo. — Sua


vez. Pelo que é grato?

— Bem, Bud estaria perto do topo da lista. Sou grato por


todas as coisas que fez por mim ao longo dos anos, e sou
grato por ele não estar mais ferido do que quando foi atacado.

— Eu também sou grata por isso. — Autumn cortou sua


burrata.

— Também sou grato por uma carreira de que gosto,


amigos que me toleram e por ter um pé-de-meia no banco –
algo com que definitivamente não cresci.

Autumn colocou um pedaço de burrata na boca e fechou


os olhos. Um olhar que só poderia descrever como orgástico
surgiu em seu rosto. Os meus olhos estavam grudados em
seus lábios. Droga. Estou com ciúme de um pedaço de queijo.
Também comecei a endurecer debaixo da mesa. Esta mulher
me fez sentir como um adolescente. Deveríamos levar as
coisas devagar, e vê-la comer me deixou excitado?
Infelizmente, pressenti muita masturbação no meu futuro.

Ela abriu os olhos e limpei a garganta, ainda olhando


para seus lindos lábios. — Burrata. Sou extremamente grato
pela burrata.

Autumn parecia divertida, mas verdadeiramente


inocente. — Você é um grande fã de burrata?

— Sou um grande fã da cara que você faz enquanto


come.

— Que cara eu faço?

Inclinei-me para frente. — A mesma que fez quando cai


em você.

Ela cobriu a boca e corou. — Ah, meu Deus, sério?

Concordei. — Sério.

Felizmente, a garçonete veio verificar como estávamos e


ver se estávamos prontos para pedir o jantar. Mais um
minuto dessa conversa, e o guardanapo branco sobre meu
colo pareceria mais como se estivesse tentando agitar uma
bandeira para me render.

Desta vez, quando ficamos sozinhos novamente, mudei a


conversa para algo muito mais seguro.

— Então, como está Storm?


— Está indo muito bem. Embora fique me perguntando
quando pode ir trabalhar na casa de Bud. Ele realmente quer
ganhar aquela bicicleta que Bud lhe prometeu, mas não tinha
certeza se Bud se sentiria bem para isso ainda.

— Eu parei lá esta manhã, e ele estava cavando parte do


jardim com uma mão. Definitivamente está se sentindo
melhor.

Ela sorriu. — Fico feliz em ouvir isso. Ele é o tipo de


homem com quem se preocupa se fica sentado assistindo TV
por muito tempo.

— Absolutamente.

— Bem, se acha que ele realmente quer, provavelmente


poderia levá-lo lá no domingo.

— Vou lhe perguntar quando fizer uma visita novamente,


mas tenho certeza de que não vai ter problema.

O resto da noite passou rápido demais, embora tenha


parado e arrastado a sobremesa por tanto tempo que a
garçonete estava nos dando um mau-olhar. Simplesmente
não estava pronto para o nosso primeiro encontro acabar, e
tinha certeza que ir devagar não incluía passar a noite.

Quando chegamos ao apartamento de Autumn,


estacionei.

— Gostaria de dar um passeio? — Perguntei. Foi uma


noite suficientemente agradável.
Ela apontou para seus sapatos. — Eu normalmente
gostaria, mas estes não são realmente sapatos de caminhada.

Estacionei sob um poste de luz, então o interior do carro


estava bem iluminado. Segui suas pernas sexy até as
sandálias de tiras de salto alto que estava usando.

— Esqueci-me de mencionar o quanto sou grato por seus


sapatos mais cedo. — Os meus olhos percorreram o caminho
de volta por suas pernas e sobre o tecido fino de seu vestido.
— E por esse vestido. Estou muito grato por esse vestido.

Ela deu uma risadinha. — E quanto ao meu sutiã e


calcinha? Não é grato por eles?

— Não sei. Deixe-me ver, para que possa decidir.

Autumn se aproximou de mim e pegou minha mão. O


sorriso radiante em seu rosto fez meu coração inchar no meu
peito.

— Eu me diverti muito esta noite — disse.

— Eu também.

Ela mordeu o lábio inferior. — Você poderia... subir um


pouco, se quiser.

Claro que não havia nada que quisesse mais, mas não
tinha certeza se era uma boa ideia. Enquanto internamente
debatia seu convite, meus olhos caíram, e foi quando percebi
que seus mamilos estavam duros – saindo de seu vestido
como os belos chifres de um demônio. Não havia como entrar
e manter distância. E eu não poderia estragar o ir devagar em
nossa primeira noite oficial. Então limpei minha garganta e
usei cada grama de força de vontade que tinha em mim.

— Provavelmente é melhor se eu não fizer isso.

Autumn parecia um pouco desapontada, mas balançou a


cabeça. — Você tem razão. Obrigada.

Nós dois ficamos em silêncio enquanto a acompanhava


até a porta. Dentro do saguão, nenhum de nós apertou o
botão do elevador. Autumn olhou para baixo por um minuto
antes de encontrar meus olhos.

— Acho que devo esclarecer que só porque quero ir


devagar, não significa que a vontade de me mover mais
rápido, principalmente fisicamente, não existe. Porque é...
muito mesmo.

Poderia realmente me perder no verde de seus olhos. Eu


sabia que quando ela ficava nervosa, eles ficavam quase cinza
pálido, e é assim que estavam agora.

Segurei suas bochechas. — Eu a queria desde o dia em


que nos conhecemos, mesmo durante aqueles meses que não
soube se a veria novamente. O que desejo é mais do que
apenas estar dentro de você, quero consumir você.

Os seus olhos pularam entre os meus por alguns


segundos antes de ela me pegar completamente desprevenido
e se lançar sobre mim. Os nossos lábios caíram, e tropecei
alguns passos para trás, lutando para manter o equilíbrio.
Quando me estabilizei, passei meus braços ao seu redor e
levantei até que seus pés saíssem do chão. Autumn enfiou os
dedos no meu cabelo e puxou, me puxando para mais perto,
embora fosse fisicamente impossível encontrar uma fração de
centímetro de espaço entre nós. Enrolei minha mão na parte
de trás de seu cabelo e puxei para ter acesso ao seu pescoço.
Em seguida, suguei até a clavícula e de volta à orelha.

— Você está me matando — gemi. — Vou fazer com que


seja presa por exposição indecente em um minuto.

Autumn murmurou através de nossos lábios unidos. —


Conheço um bom advogado. Não se preocupe com isso.

Não tenho a mínima ideia de quanto tempo ficamos


assim – talvez quinze ou vinte minutos, mas quando paramos
para respirar, os lábios de Autumn estavam inchados, seu
cabelo tinha aquele visual sexy, apenas fodido, e ambos
estávamos ofegantes.

Usei meu polegar para limpar o batom manchado sob


seu lábio. — Estou tão duro, não tenho certeza se consigo
andar.

Ela deu uma risadinha. Deus, adoro esse som.

— As minhas partes estão inchadas e formigando.

Eu gemi e fechei meus olhos. — Você está me matando,


Red.
Ficamos no saguão por mais alguns minutos.
Eventualmente, fui eu quem apertou o botão do elevador.
Quando chegou, escovei meus lábios com os dela uma última
vez.

— Vou enviar uma mensagem amanhã? Tudo bem?

Ela assentiu com um sorriso. — Definitivamente.

Autumn entrou no elevador e disse boa noite. Quando as


portas começaram a se fechar, ela estendeu o braço, fazendo
com que se abrissem novamente.

— Espere um segundo...

Ela mergulhou uma mão sob a bainha da saia, estendeu


a mão até a cintura, de alguma forma conseguindo não se
expor, e a próxima coisa que soube foi que ela estava
deslizando a calcinha pelas pernas.

Foda-me. Um fio-dental de renda preta. O pedaço de


material atingiu o chão, e ela saiu antes de se inclinar para
frente e enfiá-lo no meu bolso.

— Você disse que não tinha certeza se estava grato pela


minha calcinha, já que não a tinha visto. — Autumn voltou
para o elevador e mexeu os dedos. Ela tinha o maior sorriso
diabólico em seu rosto. — Boa noite, Donovan.

Fiquei sem palavras enquanto as portas se fechavam,


então balancei minha cabeça.
Eu estava errado. O seu sorriso não era diabólico – ela
era o diabo.

Puxando a tira de renda do bolso, olhei para ela por um


minuto antes de fechá-la em meu punho e correr para a
porta. De repente, não conseguia sair de lá rápido o
suficiente. No minuto em que chegasse em casa, estaria
usando essa coisa – em volta do meu pau enquanto minha
mão teria um dia de trabalho.
CAPÍTULO 27

Donovan

— Onde diabos você estava? — Trent se recostou na


cadeira e largou o garfo.

— Desculpe, estou atrasado. Não consegui tirar um


cliente do maldito telefone.

— Não estou falando em se atrasar para o almoço. Fui ao


seu escritório duas vezes esta semana para ver se queria
pedir algum jantar, e sua porta estava fechada e as luzes
apagadas.

Eu sorrio. Os meus amigos ainda não sabiam que


Autumn e eu estávamos juntos. — Tinha coisas mais
importantes para fazer.

As sobrancelhas de Juliette se ergueram. Ela cobriu a


boca cheia com um guardanapo e se inclinou para sentir
minha testa. — Mais importante do que trabalhar? Você está
doente?

— Não.

— Então o que é mais importante do que trabalhar logo


antes da votação do próximo sócio?
— A minha garota.

— Puta merda — disse Trent. — Você está sorrindo por


causa de uma mulher?

— Estou. — Também estive com a sua calcinha no bolso


nos últimos três dias, mas não compartilhei essa parte.

— Há uma mulher lá fora que passou nos seus testes,


então?

— Com distinção.

— Uau — disse Juliette. Ela se virou para Trent


enquanto apontava para mim. — Ele está apaixonado. O
nosso pequeno playboy está crescendo tão rápido.

Tirei o recipiente com meu almoço da sacola. — Faça


piada o quanto quiser. Eu nem me importo.

Trent enxugou a boca com o guardanapo. — Nunca


pensei que veria esse dia. Devíamos ter um encontro duplo.

— Não acho que ela tenha alguma amiga de dezesseis


anos para você — provoquei e mordi meu sanduíche. — Vou
perguntar porém.

— Eu não estava pedindo para me arranjar, idiota. Se


tivesse estado por aí recentemente, saberia que tenho minha
própria garota.

Parei de mastigar. — Não é uma inflável?


— Vai se foder. Uma de verdade – e é gostosa demais
também.

Fiquei feliz em ver meu amigo feliz, mas isso não me


impediria de estourar suas bolas. — Não é menor de idade,
não é uma boneca inflável, e é gostosa? Está pagando a ela
então?

Trent jogou o guardanapo em mim. — Eu a conheci no


bar algumas semanas atrás. É amiga de Juliette. A verdade,
você conversou conosco antes de sair. Ela tem um gosto
excelente, então conheceu você primeiro, mas voltou para
casa comigo.

Levantei uma sobrancelha. — Qual é o seu nome?

— Margo.

Maldição, a mulher que lhe enviei depois de reclamar


para ela sobre Autumn. Eu não mencionaria que ela me
atacou primeiro. Concordei. — Margo... parece familiar.
Morena?

— Sim.

— Vocês dois se deram bem?

— Passamos quase todas as noites juntos desde então.

Acenei com a cabeça. — Bom para você.

Juliette e Trent se entreolharam de maneira engraçada.


— O quê?

Ela balançou a cabeça. — Você está agindo estranho.


Apenas alguns golpes em Trent e... está sorrindo demais.

Cruzei minhas mãos atrás da minha cabeça. — Isso é


porque estou feliz por estar vivo, senhoras e senhores.

Trent se voltou para Juliette. Ela encolheu os ombros. —


Não olhe para mim. Verifiquei sua cabeça. Sem febre.

Trent terminou de mastigar. — Bem, morderei a isca.


Conte-nos sobre esta criatura mágica que parece ter roubado
seu cérebro. Como ela se parece? Qual é o tamanho do chifre
de unicórnio no topo de sua cabeça, e ela deixa-o brincar com
ele?

Posso ter ficado com os olhos um pouco estrelados. —


Ela é linda – cabelo vermelho, olhos verdes, pele de
alabastro49.

O rosto de Juliette se contraiu. Ela apontou para mim


enquanto olhava para Trent. — Ele acabou de usar a palavra
alabastro?

O meu amigo balançou a cabeça. — Ele definitivamente


perdeu a cabeça se isso é o que penso que é. Cabelo ruivo e
olhos verdes? Por favor, me diga que esta não é a namorada
de Blake.

Sorrio. — Não é.
— Graças a Deus.

Sorrio. — Porque não está mais vendo o Dick. Ela é toda


minha.

Trent jogou o garfo na mesa e olhou para o teto com um


gemido. — Merda.

— Você deveria estar feliz por mim. Finalmente conheci


alguém. Tudo o que sempre faz é estourar minhas bolas,
porque não me estabelecia.

Trent balançou a cabeça. — Deixe-me ver se entendi.


Você passou sete anos trabalhando duro para se tornar sócio
desta firma. E algumas semanas antes de realmente chegar
lá, você começa a trabalhar meio período, perdendo horas
faturáveis e transando com a namorada de um sócio de cujo
voto precisa para alcançar à linha de chegada.

— Relaxa, amigo. Eles eram casuais, e ela desistiu. Blake


não tem ideia de que estamos nos vendo, nem mesmo sabe
que nos conhecemos antes de eu pegar aquele caso pro Bono
que me designou. Eu não tenho me descuidado. As minhas
horas faturáveis estão baixas, mas estão reduzidas ao que
workaholics normais tentam fazer com que a sociedade fature.

— Uh-huh. — Trent acenou com a cabeça. — Está se


aventurando em gelo fino, meu amigo. Você nunca ouviu o
ditado “o que é feito no escuro sempre encontra seu caminho
para a luz”?
Dei de ombros. — Não poderia me importar menos se
Blake descobrir a longo prazo. Parte de mim está ansiosa por
isso. É praticamente culpa dele, de qualquer maneira. Se não
tivesse sido muito preguiçoso para aceitar o caso pro Bono
que jogou em mim, Autumn e eu provavelmente nunca
teríamos nos visto novamente. Além disso, só preciso mantê-
lo em segredo por um pouco mais de tempo. Então serei um
sócio e serei duro para ele se não gostar.

Juliette balançou a cabeça. — Eu não tenho um bom


pressentimento sobre isso. É melhor ter cuidado.

— Pare de se preocupar. Está tudo bem. Ele não


descobrirá de jeito nenhum.

Trent franziu os lábios e fez um som alto de beijo.

Sorrio. — Chega de beijos para você, amigo. Sou um


homem de uma mulher agora.

— Não estava mandando um beijo para você, cara. — Ele


balançou sua cabeça. — Você disse que não há como ele
descobrir. Isso fui eu dando um beijo de adeus a sua sorte,
enquanto sua bunda arrogante explodia porta afora com
aquela lufada de ar quente.

♥♥♥
A semana seguinte, minha vida passou de ótima a
fenomenal. Se conhecesse uma palavra melhor do que essa, a
usaria, mas não tive muitos motivos para reforçar meu
vocabulário de superlativos relacionados ao estado da minha
vida nos últimos trinta anos. Claro, tive sucesso – e até
alguns meses atrás, achava que era o que precisava para me
fazer feliz. Eu nem sabia que estava insatisfeito até, bem, ser
consumido por Autumn.

Fomos à casa de Bud, no domingo, para que Storm


pudesse fazer o trabalho que concordou em troca da bicicleta.
Autumn e eu pintamos o interior enquanto estávamos lá, e
consegui enfiá-la furtivamente na garagem e roubar uns
amassos enquanto nos beijávamos como dois adolescentes
excitados. À noite, servi o jantar com Bud; ele ainda estava
com o gesso, mas queria ajudar – e por ajuda, quero dizer,
queria mandar em mim como se eu não soubesse o que
estava fazendo após quinze anos fazendo-o com ele, mas isso
o deixou feliz, e fiquei feliz por ele estar de bom humor
novamente, então não dei a mínima.

Levei Autumn para jantar – em uma pista de boliche, na


quarta-feira à noite, onde começou a espancar minha bunda e
ter uma pontuação de duzentos e seis. Aparentemente, seu
pai tinha uma equipe de boliche para seu escritório de
advocacia, e sempre se juntou a eles enquanto crescia. Eu
normalmente, era supercompetitivo, e uma derrota para
qualquer um teria machucado meu ego, mas desta vez não
me importei se a minha garota me deu uma surra, porque ela
sorriu a noite toda. Além disso, toda vez que ela fazia um
strike, pulava para cima e para baixo, o que eu gostava muito.

Consegui também, de alguma forma, faturar uma das


minhas semanas mais altas, e o velho Kravitz desceu da torre
de marfim para me dizer que fiz um ótimo trabalho para um
de seus clientes VIP pessoais que se meteu em problemas
com a SEC50.

Sim, a merda não poderia estar melhor.

O meu telefone zumbiu sobre a minha mesa, e a foto que


tirei de Autumn no ano passado apareceu na tela. Correndo o
risco de soar como um idiota, um pouco de calor percorreu
minha barriga. A verdade, se me sentir assim me tornava um
idiota – estava perdendo muito tentando ser legal durante
toda a minha vida.

Recostando-me na cadeira, deslizei a tela para


responder.

— Ei, linda.

— Você atende ao telefone assim para todas as mulheres,


não é? — Ouvi o sorriso em sua voz.

— Não há nenhuma outra mulher, querida.

Ela suspirou. — Liguei para dizer obrigada pelas coisas


que comprou para Storm.
Parei no Park House esta manhã e deixei uma sacola com
um cadeado para a bicicleta que Bud tinha lhe dado, e
também um moletom da Nike com uma faixa refletora na
lateral para quando inevitavelmente andasse no escuro, mas
ele já tinha ido para a escola e eu estava atrasado. A mulher
na recepção estava ocupada ao telefone, então escrevi o nome
de Storm na sacola e fiz sinal de que estava saindo. Foi só
quando cheguei ao carro que percebi que me esqueci de
deixar meu nome.

— Como sabia que eu lhe dei algo?

— Hmmm... Um bom palpite? Quando parei no Park


House para uma reunião mais cedo, Rochelle, na recepção me
disse que um cara gostoso deixou uma sacola para Storm.

Sorrio. — Você acha que sou gostoso?

Ela riu. — Posso ver seu rosto exultante e arrogante


agora mesmo através de um telefonema. Deixe-me adivinhar,
está recostado na cadeira também?

Saltei para frente no meu assento. — Não, não estou.

Ela riu. — De qualquer forma, só liguei para dizer


obrigada por fazer isso. Foi muito fofo. Não quero tomar muito
do seu tempo.

— Você é sempre uma pausa bem-vinda.

— Está trabalhando até tarde esta noite?


— Sim. Você e Skye assistirão a seu programa e falarão
sobre mim?

— Acredite ou não, nem tudo é sobre você.

— Definitivamente não acredito nisso.

Ela deu uma risadinha. — Vejo você amanhã à noite?

— Mal posso esperar.

— Eu também.

Uma hora depois, Blake Dickson apareceu a porta do


meu escritório. Eu estava ao telefone com um cliente, mas
não o impediu de entrar e se sentar enquanto terminava
minha ligação.

Forcei um sorriso alegre quando desliguei. — O que se


passa, chefe?

Ele pegou um peso de papel de cristal com formato do


globo que mantinha em minha mesa e o jogou para cima e
para baixo como se fosse uma bola antiestresse. Cerrei os
dentes – foi um presente de Bud quando me formei na
faculdade de direito e era o único item pessoal encontrado em
meu escritório.

— Preciso de um favor.

Eu também preciso de um, dê o fora do meu escritório.

— Claro, o que houve?


— Tenho um jantar amanhã à noite com Todd Aster.
Você ajudou a esmagar uma investigação que os federais
fizeram sobre alguns de seus investimentos alguns anos
atrás.

— Sim, me lembro dele.

— Bem, ele está passando por um divórcio complicado e,


aparentemente, sua esposa tem alguns documentos
relacionados a esse investimento que podem ser prejudiciais.

— Estatuto de limitações ainda em aberto?

Blake acenou com a cabeça. — Infelizmente.

— Ok... como posso ajudar?

— Substitua-me no jantar de amanhã.

Merda. — Uh, tenho planos.

Blake se sentou um pouco mais ereto. — Eu também, e


conto com você para cuidar disso por mim.

Claro que não poderia dizer não. Então balancei a


cabeça. — Sem problemas. Vou reorganizar minha agenda.

Dickson se levantou e foi até a porta sem nem mesmo


agradecer. Ele se virou no último minuto.

— A votação está chegando. Serei sincero, eu era


praticamente da equipe Mills quando os candidatos a sócio
foram anunciados, mas você provou ser alguém em quem
posso confiar, alguém em quem posso confiar para me apoiar.

A ironia não passou despercebida, embora tenha


colocado um sólido sorriso falso. — Claro. Fico feliz em
ajudar.

— Pedirei à minha assistente que lhe envie os detalhes.

Depois que ele saiu, afundei na cadeira. Eu não queria ir


a um maldito jantar; queria passar a noite com Autumn. A
sua regra de duas noites por semana já estava me matando.
Reduzir para uma não era uma opção.

Quando o e-mail da assistente de Dickson chegou,


perguntei se poderíamos mudar o jantar das sete para as seis.

O resto do dia me escapou, e eram quase oito horas


quando verifiquei meu e-mail e encontrei uma resposta
confirmando que ela tinha sido capaz de mudar o horário.
Esperançosamente, Autumn não se importaria de se reunir
um pouco mais tarde. Eu sabia que sua amiga estava na sua
casa para a maratona de Bachelor hoje à noite, então não
queria ligar e interromper. Enviei uma mensagem, em vez
disso.

Donovan: Importa-se de jantarmos tarde amanhã à noite?


Aconteceu algo no trabalho e tenho que ir a um jantar com um
cliente às seis. Provavelmente terminarei por volta das oito ou
oito e meia.

Autumn respondeu imediatamente.


Autumn: Caramba, vou começar a ficar complexada.
Primeiro, Skye cancela comigo, agora você está mudando nosso
encontro... Brincadeira. Claro, tudo bem.

Donovan: Skye realmente cancelou com você?

Autumn: Sim. Ela acha que está com gripe.

Donovan: Lamento ouvir isso. Eu sei que você estava


ansiosa por isso.

Autumn: Estamos nos últimos cinco episódios e não


posso assistir TV ou entrar nas redes sociais porque não quero
descobrir acidentalmente quem ganhou! Eu lhe disse que se o
resultado do seu teste for positivo para gripe, assistirei sem ela
porque preciso entrar na Internet.

Eu rio. Nunca consegui entender como tantas mulheres


inteligentes amavam aquele show idiota.

Donovan: Alerta de spoiler. Ele escolhe aquela que


ninguém gosta.

Autumn: OMG! Está brincando comigo? Ele escolhe a


Meghan?

Merda.

Donovan: Estava brincando. Não tenho ideia de como


termina, ou como começa, por falar nisso. Embora a maior
parte dessa merda termine da mesma maneira – o que for
melhor para a audiência.
Autumn: Você quase me deu um ataque cardíaco.
Meghan é uma merda!

Rio para mim mesmo.

Donovan: Enviarei uma mensagem quando estiver a


caminho amanhã.

Autumn: Ok. Tenha uma boa noite.

♥♥♥

A audiência que tive na tarde seguinte acabou levando


dois minutos porque o advogado da oposição apareceu e
pediu um adiamento no último minuto. Já que encontraria o
cliente de Dickson em um restaurante mais próximo da
minha casa do que do escritório, decidi trabalhar o resto da
tarde em casa. Tinha um trabalho de preparação para um
julgamento que se aproximava e, de qualquer maneira, minha
casa tinha menos distrações.

Quando entrei, meu celular tocou.

Sorrio e respondo. — Ei, bonita.

— Isso é um rebaixamento de linda? Acho que era linda


ontem.

— Definitivamente não.
— Estava pensando – perguntou se poderíamos jantar
mais tarde porque tem que encontrar um cliente para jantar,
certo?

— Sim.

— Por que sairíamos para jantar se você já comeu?

Dei de ombros. — Você tem que comer. Além disso,


quero te ver.

— Eu te quero ver também, mas poderíamos


simplesmente ficar aqui. Comerei antes de vir. Pule a
sobremesa com seu cliente, e farei para você o melhor sundae
de sorvete que já comeu.

Sorrio. — Se tem certeza de que não se importa, isso me


parece ótimo. Quer que eu pegue um sorvete no caminho?

— Não há necessidade. Tenho todos os suprimentos dos


meus planos cancelados com Skye ontem à noite, incluindo
cones de waffle frescos com chocolate. Eles estragarão antes
que possa vir. Ela testou positivo para gripe.

— Lamento ouvir isso.

— Obrigada. Deixarei um pouco de sopa para ela no


caminho do trabalho para casa. Preciso correr porém, estou
prestes a entrar no metrô.

— Bom. Tome cuidado. Vejo você mais tarde.


Tirei minhas roupas de trabalho, peguei meu laptop e me
sentei no sofá. O meu escritório mantinha um portal on-line
onde podia entrar e baixar os depoimentos que precisava
reler. Conforme clicava na web porém, um anúncio apareceu
para o novo aplicativo de streaming da ABC. Anunciava
alguns de seus programas de sucesso disponíveis, incluindo
The Bachelor. Sorrio, pensando em Autumn, e cliquei para
fechá-lo, mas em vez de acertar o X, devo ter acertado o ícone
para aumentá-lo, porque uma prévia de um grupo de
mulheres saindo de limusines apareceu e alguns idiotas
entregaram uma rosa a cada uma. Desliguei uma segunda
vez, mas então uma garota saiu de uma limusine vestindo
uma fantasia de dançarina do ventre.

Hmpf. Talvez assista alguns minutos antes de mergulhar


no meu trabalho...
CAPÍTULO 28

Autumn

— Ei.

Donovan sorriu para mim do outro lado da porta, e


borboletas começaram a dançar no meu estômago. Deus, ele é
delicioso. Talvez não fosse uma ideia tão boa convidá-lo para
um encontro no meu apartamento esta noite. Ele percebeu
minha leve hesitação, embora deva ter interpretado mal o que
estava acontecendo em minha cabeça.

Ele levantou uma mochila que não tinha notado em sua


mão. — Não é uma mala de viagem, juro. Eu apenas coloquei
uma muda de roupa para poder tirar esse terno que tive que
usar para o jantar.

Afastei-me para deixá-lo entrar e ele parou a minha


frente, cara a cara.

— Estava apreciando a vista, não me preocupando que


pudesse ficar além do limite.

O lado direito de sua boca se contraiu em um sorriso


arrogante. — Oh, sim? Bem, pode me ver trocar de roupa se
quiser a visualização completa. — Ele se inclinou e deu um
beijo em meus lábios. Com nossas bocas ainda presas, falou
baixinho — Senti sua falta.
Três pequenas palavras e as paredes ao redor do meu
coração já estavam desmoronando. Não era porque eram
doces – embora é claro que eram – mas porque sabia que ele
falava sério. Como uma mulher que não confiava em um
homem há muito tempo, sentia em meus ossos que ele estava
sendo honesto. E isso me deixou inquieta, quando deveria ter
feito exatamente o oposto. Então, ao invés de ser honesta e
lhe dizer que sentia a sua falta também, meu senso de
autopreservação entrou em ação e me afastei daquele
momento com sarcasmo.

— Qual é o seu nome mesmo?

Ele bateu no meu nariz com o dedo. — Espertinha.

Fechei a porta com um sorriso.

— Desculpe pelo atraso. O cliente não calava a boca.

— Está tudo bem. — Apontei para meus dedos do pé e os


mexi. — Precisavam ser pintados de qualquer maneira. Skye e
eu geralmente fazemos isso quando ela vem para nossas
sessões de maratonas.

— Como ela está se sentindo?

— Com dores e com uma leve febre. Quando fui deixar a


sopa, o seu namorado estava lá e estava deixando-o tomar
conta dela. É assim que sei que ela não está se sentindo bem;
ela não deixa as pessoas fazerem coisas por ela. É muito
independente.
Donovan inclinou a cabeça. — Soa familiar.

Sorrio. — Acho que sim. Tenho certeza que tem a ver


com nossos problemas de confiança.

Ele assentiu. — Entendo. Crescendo, nunca me


aproximei muito de ninguém. Se não deixar as pessoas
entrarem, não faz mal quando vão embora.

Fiz uma careta. — Sinto muito. Isso é exatamente o que


fiz com você no ano passado também. Tínhamos uma conexão
e fugi.

— Está tudo bem. Você teve seus motivos.

Nunca realmente considerei como pode não ser tão fácil


para Donovan confiar em mim por causa do que eu fiz. — Não
está nada bem. Eu deveria ter pelo menos sido franca sobre o
que estava fazendo e dizer adeus.

— Isso ficou para trás agora.

— Como é atrás de você porém? Deixou-me entrar


quando mantém distância da maioria das pessoas. Já fugi de
você uma vez. Faz parecer tão fácil superar o seu medo das
pessoas que se importa em ir embora.

Donovan olhou para mim por um momento. — Não é


fácil, Autumn, mas você vale a pena.

Isso poderia ter sido a coisa mais linda que alguém já me


disse. — Uau. — Balancei minha cabeça. — Eu nem sei o que
dizer.
Ele desviou o olhar e depois voltou para mim com um
sorriso infantil. — Você não tem que dizer nada. Só não vá
embora sem falar comigo de novo.

Fechei a distância entre nós e passei meus braços em


volta do seu pescoço. — Posso fazer isso.

Ele me puxou contra ele. — Bom. Porque sei onde mora


neste momento, e rastrearia sua bunda.

— Esperançosamente, isso não será necessário. — Rio.


— Então, reservou espaço para a sobremesa?

Os olhos de Donovan caíram entre nós. Deste ponto de


vista, estava olhando diretamente para a minha camisa. —
Sempre há espaço para a sobremesa.

Ele balançou as sobrancelhas e eu rio.

— Então, prefere lascas de chocolate com coco torrado,


biscoitos e creme ou manteiga de amendoim com chocolate?

— Sim.

— Boa escolha, também gosto de um gostinho de cada


um. Por que não se troca e relaxa, e vou preparar para nós?

Donovan desapareceu no banheiro e voltou momentos


depois em jeans e uma camiseta. Ele jogou sua mochila na
lateral do sofá e se acomodou.

— Estava olhando alguns filmes antes de você chegar


aqui, mas não tinha certeza de que tipo gostava, então salvei
alguns dos meus favoritos na Netflix, se quiser dar uma
olhada.

— Tenho algo em mente, na verdade, que pensei que


gostaria de assistir — disse. — Darei uma dica.

— Oh... tudo bem. — Preparei duas tigelas de sorvete


com calda de chocolate, chantilly e crocantes e me dirigi para
o sofá. A sua tigela estava duas vezes mais cheia que a
minha. — Esta é a sua. Exagerei um pouco. Espero que goste
de todo o lixo que coloquei.

— Não há muito que não coma – exceto ketchup. A


minha mãe não cozinhava muito, mas quando tinha cerca de
sete ou oito anos, ela teve um namorado idiota morando
conosco por um tempo. Ele costumava fazer ovos para o café
da manhã e colocar ketchup sobre eles. Eu lhe disse que não
gostava de ketchup no meu, e depois disso colocou o dobro no
meu prato. Não comi essas coisas desde o dia em que ele se
mudou.

— Bom saber. Estava pensando em adicionar um pouco


de ketchup aos nossos sundaes também.

Ele deu uma risadinha.

Coloquei meus pés debaixo de mim no sofá e puxei um


cobertor sobre meu colo antes de colocar uma colher de
sorvete em minha boca. — Então, o que vamos assistir?

Donovan pegou o controle remoto e apertou um botão. A


TV se iluminou com meia dúzia de episódios de The Bachelor.
— Awww. Você é muito doce, mas não temos que assistir
isso. Eu sei que não é um fã.

— Como descobrirei se o pai de Kayla realmente bate em


Brad durante a visita à sua cidade natal ou não, se não
assistir ao próximo episódio?

Os meus olhos brilharam. — Você assistiu The Bachelor?

— Você me disse que assistiria os últimos cinco


episódios, se Skye estivesse com gripe. — Encolheu os
ombros. — Achei que tinha algum trabalho a fazer. Saí do
tribunal hoje cedo, então assisti até onde você parou.

As minhas entranhas derreteram. — Eu não posso


acreditar que fez isso.

Ele engoliu um pouco do sorvete e apontou a colher para


mim. — Se mencionar isso para Bud, eu negarei.

Fingi fechar minha boca sobre o meu sorriso. — O seu


segredo está seguro comigo.

Depois que terminei minha sobremesa, me aconcheguei


ao lado de Donovan no sofá e nos cobri com um cobertor. A
certa altura, ele fez uma pausa no sorvete e pousou a mão em
minha coxa. Parecia que poderia queimar uma marca em
minha pele nua. Fiz o meu melhor para ignorá-lo. No meio do
primeiro episódio, meu celular tocou. Estava na mesinha ao
lado de Donovan, então me entregou. Papai apareceu na tela.
Suspirei. — Ele tem sido implacável nos últimos dias. O
seu casamento é no próximo fim de semana e ainda não dei
uma resposta. A minha terapeuta acha que devo ir.

Donovan apertou um botão na TV para pausar o show.


— Você não quer porém?

Balancei minha cabeça e silenciei meu telefone. — Não


sei. Costumávamos ser tão próximos, especialmente depois
que minha mãe morreu. Não tenho muita família além dele. A
minha mãe era filha única e seus pais faleceram quando eu
era pequena; mas... é difícil para mim esquecer como ele lidou
com as coisas seis anos atrás.

Os olhos de Donovan percorreram meu rosto. — Você


mencionou que ele não apoiou depois, mas ele não ficou ao
seu lado quando as coisas aconteceram?

— Ele insistiu que eu fizesse terapia e fez tudo o que


pedi, mas ficou meio distante durante a coisa toda. Na
delegacia, quando finalmente decidi me apresentar e relatar o
que havia acontecido, chorei o tempo todo, e a policial me
confortou. O meu pai ficou sentado lá, quase desligado, e eu
não conseguia entender como poderia permanecer parceiro do
pai de Braden depois de tudo o que me ouviu dizer.

— O que ele disse quando lhe contou isso?

Fiz uma careta. — Não contei – não no começo, de


qualquer maneira. Deixei toda a minha raiva em relação a ele
crescer por um longo tempo. Cerca de um ano depois que
tudo aconteceu, minha terapeuta me convenceu a falar com
ele. Infelizmente, fiz isso depois de beber um pouco demais
uma noite, e a conversa não saiu como deveria. Fiquei muito
emocionada e disse algumas coisas horríveis, e depois me
recusei a falar com ele após ficar sóbria – não fui muito
madura, eu sei.

— Uma pessoa que passou pelo que você passou, lida


com isso da maneira que for necessária. Parece-me que nem
deveria ter tido essa discussão, ou lidar com nada disso.

— Quando me recusei a ouvi-lo, foi falar com a minha


terapeuta. Ela não quis discutir nada com ele, mas ele lhe
pediu que o ouvisse e falasse comigo em seu nome. Alegou
que ficou em choque por um tempo, que se viu passando
pelas emoções comigo, mas foi desligado mentalmente, como
se estivesse assistindo a um filme sobre o que estava
acontecendo. É por isso que não era emocional ou simpático
na época.

— E você não acredita nisso?

— Não sei. A minha terapeuta diz que muitas das coisas


que lhe descreveu são sintomas clássicos de choque
psicológico, mas só... — balancei minha cabeça. — Eu me
sentia tão sozinha naquela época, e é difícil para eu esquecer.
Além disso, há sua série de casamentos e as coisas malucas
que fez ao longo dos anos.

— Ele ainda é sócio do pai?


— Não, ele não é. Ele se separou de seu sócio, na
semana seguinte ao meu discurso bêbada. Alegou que não
percebeu o quanto isso me aborrecia porque não disse nada e
porque demitiram Braden depois que fui à polícia. — Balancei
minha cabeça. — Honestamente, ele tentou me compensar
por anos. Lidou com as coisas da maneira errada, mas talvez
tivesse seus motivos. Gostaria de perdoá-lo e esquecer, mas
não sei como.

— Você tem que fazer os dois?

— O que quer dizer?

— Perdoar e esquecer – acho que são duas coisas


diferentes. Quando perdoa, se permite parar de abrigar
ressentimento para que possa estar em paz com algo. Perdoei
minha mãe pela merda que fez enquanto eu crescia – por
desaparecer por meses a fio e me deixar nas ruas para me
defender sozinho. Ela não é perfeita, com certeza, mas
precisava me livrar do ressentimento por mim mais do que por
ela. Agora, não esqueci. Sempre que ela liga para pedir
dinheiro, eu me lembro, mas pergunto como está e falo com
ela assim mesmo. Às vezes, até nos encontramos para jantar,
se não desligar na minha cara depois que eu disser que não
lhe darei nenhum dinheiro para que possa colocar no nariz.

Ele acariciou minha bochecha. — Não acho que você


possa esquecer, e acho que isso provavelmente é uma coisa
boa, porque aprendemos com todas as merdas do nosso
passado, mas ainda pode escolher perdoar, se quiser. —
Donovan ergueu as mãos. — Para ser claro, não estou do lado
de seu pai. Tudo o que você me disse me faz desgostar dele
mais do que já não gostava. Estou porém do seu lado e, se
quiser seguir em frente, deveria. Não pode esperar até ser
capaz de perdoar e esquecer. Porque provavelmente nunca
esquecerá.

Oh meu Deus. Ondas de emoção tomaram conta de mim.


Durante anos, minha terapeuta vinha tentando me convencer
a seguir em frente com meu pai e, em cinco minutos, esse
homem me alcançou. Ele estava absolutamente certo. Se
estivesse esperando para ter qualquer relacionamento com
meu pai até que tudo isso tivesse passado, esperaria para
sempre. Parecia que um grande peso havia sido tirado de
meus ombros.

— Você seria meu acompanhante no casamento dele se


eu fosse?

Donovan sorriu. — Querida, se me pedisse para ser seu


par para levá-la ao inferno, não diria não. Claro que vou com
você. Eu ficaria feliz.

Sorrio de volta. — Ok, bem, não tenho certeza se o


casamento número oito e uma viagem para o inferno são tão
diferentes, por isso, obrigada.

Ele piscou. — Sem problemas.

Donovan raspou o resto de seu sorvete do fundo de sua


tigela como se não tivesse acabado de me falar sobre um
avanço monumental em minha vida. O homem não tinha
ideia de como era perfeito. Para ter a aparência que tinha, ter
a inteligência que tinha e um conhecimento tão profundo da
psicologia humana imperfeita? Ele era muito especial.

Estendi a mão e belisquei seu braço.

Ele olhou para o local e ergueu os olhos com um sorriso


torto adoravelmente. — Por que isso?

— Apenas me certificando de que você é real.

Ele nunca tirou os olhos de mim enquanto colocava sua


tigela de sorvete sobre a mesa e me pegava em seu colo. Rio
enquanto o montava.

Donovan cravou os dedos no meu cabelo e puxou meus


lábios para baixo para encontrar os dele. — Venha aqui.
Deixe-me te mostrar o real.

A sua língua mergulhou para dentro, e inclinou minha


cabeça levemente para aprofundar o beijo. Senhor, este
homem podia fazer coisas mágicas com sua boca. Lembrei do
nosso fim de semana que ele foi muito generoso em mostrar
esse talento em outros lugares. Havia algo tão desesperador
quando nos tocávamos. Tinha sido assim desde o início; como
se depois de colidirmos, precisássemos um do outro para
sobreviver.

Eu o senti endurecer embaixo de mim enquanto nos


beijávamos. Com as minhas pernas abertas, o jeans de sua
calça empurrou contra meu clitóris, e apertei mais forte,
desesperada por atrito.

Donovan gemeu e agarrou meus quadris. Começou a me


guiar para frente e para trás sobre sua ereção, e as coisas se
tornaram um frenesi muito rápido.

Oh meu Deus. Posso gozar apenas me esfregando neste


homem.

O meu corpo desacelerou, percebendo que era


exatamente o que estava para acontecer.

— Quer que eu pare? — Donovan murmurou entre


nossos lábios selados.

— Não, eu... eu...

Ele se afastou para que pudéssemos nos ver. Fiquei um


pouco envergonhada, mas não queria que pensasse que tinha
feito algo errado.

— Eu quase... sabe.

O sorriso mais perverso se espalhou pelo rosto de


Donovan. — Quase teve um orgasmo me montando
totalmente vestido?

— Não fique tão presunçoso. Fui eu quem fez todo o


trabalho.

— Oh, sim? — Ele me levantou, em um movimento


furtivo, de seu colo e minhas costas estavam de repente
contra o sofá. Escalou e pairou sobre mim. — Bem, não
podemos ter isso agora, podemos? — Beijou meu nariz, depois
meu queixo, e abaixou a cabeça para beijar meu pescoço
antes de dar um beijo no topo do meu decote. A sua voz
estava mais baixa e rouca quando falou novamente. — Por
que deveria ser a única a fazer o trabalho? Acho que preciso
ajudar aqui. — Donovan levantou a barra da minha camiseta
e beijou meu umbigo, em seguida, tocou o botão do meu short
enquanto olhava para mim. Os seus olhos estavam escuros e
encobertos, mas não quebrou o contato quando abriu meu
short. — Quero enterrar meu rosto em você e não parar até
senti-la gozar em toda a minha língua. Desejo você, Autumn.
Querer é uma palavra muito mansa. O que sinto é muito mais
ganancioso do que isso.

Engoli.

— Diga-me que está tudo bem. Eu não quero te forçar


muito rápido e ser um arrependimento no dia seguinte.

O seu tom fez meu coração doer. Ele tinha sido tão
incrível e constante comigo, e em troca só lhe dei dúvidas.
Evitei intimidade com Donovan porque outro homem em
quem confiava havia tirado algo de mim. Talvez fosse hora de
perdoar outra pessoa pelas coisas que aconteceram – eu.
Como um homem sábio uma vez me disse, seguir em frente
não significava esquecer. Eu só precisava me libertar, e olhar
para o homem bonito que tanto queria parecia o primeiro
passo na direção certa.
Concordei. — Quero você, Donovan.

Os seus olhos saltaram, procurando por segurança nos


meus.

— Não vou me arrepender amanhã e não vou


desaparecer.

— Tem certeza?

Concordei.

No entanto, ainda havia hesitação em seu rosto. — O que


está fora dos limites?

Eu sorrio. — Nada.

Os olhos azuis de Donovan escureceram para quase


pretos. — Nada? Isso pode ser um édito perigoso de dar a um
homem que a quer há um ano. Você pode não andar amanhã.

Um arrepio percorreu meu corpo. Apreciei a ideia de


estar muito arrebatada para sair da cama, mas se ele pensava
que era o único que se sentia desesperado, estava
absolutamente errado. Levantei uma sobrancelha. — Talvez
você não consiga andar quando eu terminar com você.

Os olhos de Donovan brilharam. — Isso soa como um


desafio e não gosto de perder.

— Manda ver, Sr. Decker.


Ele respondeu beliscando meu umbigo; em vez de ser
registrado como dor, enviou uma descarga elétrica direto para
baixo entre minhas pernas. Donovan puxou meu zíper para
baixo e tirou meu short e calcinha. Ele deu um beijo suave no
topo do meu osso púbico e olhou para mim. — Só por isso,
não conseguirá ficar aí deitada enquanto faço você gozar.

Ele se sentou de joelhos e arrastou meu corpo para cima


do sofá antes de virar de costas e deslizar para o meu lugar.
Ele guiou uma das minhas pernas para montar em seu peito.
— Levante sua bunda, querida. Você vai montar meu rosto.

O meu queixo caiu. Donovan estendeu a mão e bateu no


meu queixo com um sorriso atrevido. — É uma oferta muito
generosa. Aceitar mais tarde. Agora, basta colocar seu chapéu
de cowgirl.

Antes que pudesse me orientar completamente, seus


dedos estavam mordendo meus quadris enquanto me
levantava e me guiava para seu rosto. Por um breve segundo,
eu me senti um pouco constrangida, mas tudo isso saiu pela
porta com um movimento de sua língua. O meu clitóris era
como um para-raios, e um golpe enviou tremores elétricos
pelo meu corpo. A fome cresceu enquanto ele traçava minha
abertura, me provocando com lambidas suaves e vibrantes.
Manteve um ritmo constante, crescendo e desenvolvendo,
mas cada vez que pensava que poderia cair do precipício, ele
diminuía a velocidade e começávamos todo o jogo de gato e
rato de novo. Depois de mais quatro rodadas, cada uma
terminando com o mesmo resultado, fiquei frustrada e
finalmente comecei a mover meus quadris.

— Aí está ela — disse. — Monte-me, linda menina. Monte


meu rosto.

Percebendo que ele estava retendo até que eu assumisse


o controle, tive vontade de matá-lo – mas isso teria que
esperar até depois. Até então, eu jogaria seu jogo. Moendo,
esfreguei minha boceta molhada em todo o seu rosto e levei
sua língua para chupar exatamente onde precisava. Essa
onda cresceu novamente, mais rápida e furiosa, e gemi
enquanto meus quadris se agitavam descaradamente.

— Eu... eu... vou...

Donovan não esperou que eu terminasse a frase. Agarrou


meu clitóris e chupou forte, detonando uma explosão dentro
de mim. Ouvi os seus sons amordaçados gemendo quando me
desfiz, o meu corpo convulsionando tão forte que as lágrimas
picaram os cantos dos meus olhos. Muito depois que a onda
atingiu o pico, ele ainda me lambia como um homem que não
se alimentava há dias e eu era sua última refeição. Eu mal
conseguia manter meu corpo ereto quando ele finalmente
diminuiu a velocidade. Sentindo que minha espiral
descendente estava prestes a cair, ele me levantou e me guiou
para deitar em cima dele com minha cabeça contra seu peito.

— Isso foi... — Fiz uma pausa e tentei encontrar o


adjetivo certo, mas incrível não parecia fazer justiça ao que
havia acontecido.
Donovan beijou o topo da minha cabeça. — O início. Foi
apenas o começo.
CAPÍTULO 29

Autumn

Sexo sem uma conexão emocional pode ser fisicamente


satisfatório, mas realmente ter sentimentos por alguém trouxe
as coisas a um nível totalmente novo – um lugar que esqueci
que existia, ou talvez nunca tivesse realmente conhecido.

Depois que Donovan caiu em cima de mim, ficamos


deitados no sofá conversando por um longo tempo. Tracei o
contorno de uma das tatuagens menores em preto e branco
em seu braço.

— Existe uma razão para todas as suas tatuagens serem


preto e branco?

Ele encolheu os ombros. — Fiz as primeiras dessa forma,


e acho que simplesmente não senti que nenhuma nova
precisasse se destacar mais do que as outras.

— Esta tem algum significado especial?

Era um pequeno pássaro fechado em uma gaiola.

— Fiz quando tinha dezesseis anos. Quase resumia a


maneira como estava me sentindo naquela época. Eu me
sentia como esse pássaro.

— Não sabia que se podia fazer tatuagens tão jovem.


— Pode conseguir qualquer coisa no bairro antigo. Pode
não ser em uma loja com licença, mas muitos caras tatuam
em suas casas.

— Oh.

Donovan sorriu e acariciou meu cabelo. — Não é como se


faz em Old Greenwich, Connecticut?

Rio. — Provavelmente não. — Esfreguei meu dedo sobre


o passarinho solitário. — Acho que posso me relacionar com
esse cara também. Exceto que sentiu como se estivesse preso
ao seu ambiente. Eu me tranquei voluntariamente nos
últimos seis anos. Para ser honesta, até tive problemas com
sexo. Pensei que estava quebrada — disse.

Donovan inclinou meu queixo para olhar para ele. — O


que quer dizer?

— Não conseguia ter um orgasmo do jeito que acabei de


ter. Só os tive durante o sexo real, e apenas se eu estivesse
por cima.

Donovan franziu a testa. — Precisava manter o controle.


Isso é compreensível.

— Eu não quero isso com você contudo. Prometa-me


algo?

— Qualquer coisa.

— Não me trate como vidro.


As suas sobrancelhas franziram. — É isso que acha que
acabei de fazer? Tê-la montado meu rosto era te tratar como
se fosse frágil?

Sorrio. — Não, definitivamente não, mas estava hesitante


no início, e tivemos uma conversa em que você perguntou o
que estava fora dos limites.

— Você fez algumas regras, Autumn. Tenho andado na


ponta dos pés, tentando não quebrá-las.

— Exatamente – exatamente o que acabou de dizer. Na


ponta dos pés. Não quero que sinta que precisa fazer isso.
Demorei um pouco para chegar aqui porque estava com
medo, mas estou aqui agora e não quero que segure mais
nada.

Ele estudou meu rosto. — Estamos falando


emocionalmente ou sexualmente?

— Ambos.

O seu polegar acariciou minha bochecha. — Está tudo


bem então, em dizer que estou de ponta-cabeça por você? Que
penso em você o dia todo, e que minha vida inteira não teve
propósito até o dia em que te conheci? Que me dá um
propósito na vida, e isso é para te fazer feliz?

Quase não conseguia respirar. Donovan deu um sorriso


infantil. — Muito?
Balancei minha cabeça. — Não, não é muito. Você me
pegou de surpresa, só isso.

Ele sorriu. — OK.

— E sexualmente, também. Não se contenha. Quero


dizer. Quero a aresta que você teve comigo naquele fim de
semana em que estivemos juntos, antes que soubesse o que
tinha acontecido comigo. É difícil para mim admitir, mas você
pode ser meio mandão quando brincamos, e realmente adoro
isso.

Um sorriso perverso se espalhou por seu rosto. — Oh,


sim? Gosta de mim mandão na cama?

Revirei meus olhos. — Não deixe isso subir à sua cabeça.


O Senhor sabe que seu ego é grande o suficiente.

Donovan nos mudou de posição no sofá, então agora


estava de costas e ele estava deitado de lado. Ajudou a tirar o
resto da minha roupa antes de traçar uma linha imaginária
da minha clavícula até o meu seio, subindo e descendo até o
umbigo, antes de seguir o mesmo caminho de volta à minha
boca. Bateu no meu lábio inferior. — Sem limites... então?

Os nossos olhos se encontraram e balancei minha


cabeça.

Observei quando o azul claro de seus olhos escureceu


novamente. — Colocar você de joelhos com seu cabelo
enrolado em minhas mãos e foder seu rosto? Tudo bem?
Engoli. Jesus. Estava ficando excitada só de pensar
nisso, então assenti.

— Legal.

A sua mão viajou novamente para os meus seios, e


beliscou meu mamilo com força antes de esfregar entre meu
peito. — E sentar em seu peito enquanto deslizo meu pau
para dentro e para fora daqui e gozar em seu pescoço? Tudo
bem também?

Engoli novamente, mas balancei a cabeça.

— Linda. — A mão de Donovan desceu até o meio das


minhas pernas. Já estava molhada, mas ele correu os dedos
para cima e para baixo, espalhando a umidade antes de
deslizar suavemente um dedo dentro.

Engasguei e arqueei minhas costas.

— Dedos? Então, não há limite de quantos dentro de


você?

Fechei os olhos quando começou a entrar e sair. Depois


de algumas bombeadas molhadas, acrescentou um segundo
dedo.

— Dois se encaixam bem e apertado, mas acho que pelo


menos outro ficará bem, talvez até um vibrador às vezes. Tem
um desses, não tem, querida?

Abri meus olhos e balancei a cabeça.


Ele sorriu e acelerou o movimento da mão. — Bom, mal
posso esperar para usá-lo em você. Talvez quando te pegar
por trás. A sua bunda está fora dos limites?

Os meus olhos se arregalaram e Donovan sorriu e retirou


os dedos. — Apenas esclarecendo se realmente quer dizer sem
limites.

Balancei minha cabeça. — Eu nunca... fiz isso.

— Oposta a tentar?

— Acho que não.

Donovan se inclinou para frente e roçou seus lábios nos


meus antes de deslizar sua boca até minha orelha. — Não
estou com pressa, mas estou ansioso para fazer isso meu,
agora que sei que será a sua primeira vez. — Olhou nos meus
olhos com muita intensidade. — Mais alguma coisa que
precisamos discutir?

O meu peito estava subindo e descendo tão rápido. —


Acho que não.

Ele sorriu. — Bom.

A próxima coisa que soube foi que ele estava de pé, me


erguendo do sofá e me jogando por cima do ombro.

Rio. — O que você está fazendo?

Ele deu um tapa em minha bunda nua enquanto se


dirigia para o meu quarto. — Levando você para a cama para
que possa ter o comportamento perverso com você, agora que
acabou de me tirar as algemas.

Chutei meus pés, mas adorei cada minuto disso. —


Owww.

— Sem limites, querida. Acostume-se com um pouco de


dor. Esta bunda terá muitas marcas de mãos.

Dentro do quarto, esperava que me jogasse na cama,


mas ele não fez isso. Donovan me colocou no chão
suavemente, jogou sua carteira na mesa de cabeceira e
montou em mim enquanto eu estava deitada no centro da
cama. Nós dois estávamos sorrindo tanto.

Ele puxou sua camisa pela cabeça e se inclinou para


pressionar seus lábios nos meus. — Eu amo este sorriso. Isso
faz coisas comigo.

Dando uma olhada em todas as ondulações em seus


abdominais, corri meus dedos para cima e para baixo, sobre
os picos e vales de seus músculos. — Isso faz coisas comigo.

Donovan pegou minha mão e levou-a à boca, beijando


minha palma. O jeito que me olhou, com tanta reverência em
seus olhos, me fez sentir ardente por toda parte, mesmo
estando completamente nua. Abaixou seu corpo em cima de
mim e tomou minha boca em um beijo enquanto empurrava
suas calças por suas pernas. O calor e a dureza de sua ereção
contra meu estômago me deixaram desesperada. Deus, o
queria tanto, e meu corpo estava molhado e dolorido por ele.
Quando nosso beijo terminou, estendeu a mão para a mesa
de cabeceira e puxou um preservativo de sua carteira,
jogando todo o resto no chão.

O meu corpo formigou de antecipação enquanto o


observava usar os dentes para rasgar a embalagem. Ele se
embainhou e se acomodou entre as minhas pernas mais uma
vez, olhando profundamente nos meus olhos enquanto
empurrava para dentro de mim.

— Foda-se — gemeu. — É o paraíso aqui.

Ele balançou para dentro e para fora suavemente, sem


pressa para se certificar de que eu estava pronta. Mesmo que
o tivesse tocado antes, tinha esquecido o quão longo e grosso
era, e meu corpo precisava de algum incentivo gentil para
aceitar tudo dele. Quando finalmente estava lá dentro, seus
braços tremeram e parou enquanto olhava nos meus olhos.

— Você é tão bonita.

Senti uma onda de emoção. — Você também.

Ele me beijou suavemente, mas não demorou muito para


que as estocadas suaves ficassem duras e a tensão se
tornasse evidente em seu rosto. O suor banhava nossa pele, e
tudo, exceto nossos corpos molhados batendo um no outro,
desapareceu na distância. O som era totalmente erótico, e
meu corpo estava disparando em direção ao clímax. As veias
incharam no pescoço de Donovan enquanto esfregava,
criando atrito contra meu clitóris, e perdi minha batalha de
autocontrole.

— Donovan... — Puxei seu cabelo. — Não pare...

Ele mordeu meu ombro e meu corpo voou além da borda.


Orgasmos normalmente eram algo que perseguia, mas não
hoje. Hoje, lutei para não deixar isso me atropelar. Os meus
músculos pulsaram e meus olhos se fecharam enquanto onda
após onda de êxtase percorria meu corpo.

— Abra — murmurou. — Quero observá-la.

Foi uma luta, mas mantive meus olhos fixos nos dele.
Finalmente, quando as ondas começaram a subir, Donovan
acelerou o ritmo, movendo-se em direção ao seu próprio final
até que gemeu e se enterrou dentro do meu corpo uma última
vez. Mesmo através da camisinha, podia sentir o calor
escapando dele e se derramando em mim.

A maioria dos homens com quem estive ao longo dos


anos rolaria na cama ou se levantaria e iria ao banheiro
depois. E se não fizeram, eu fiz. Tínhamos feito amor e nunca
quis aqueles momentos íntimos depois, mas ansiava por eles
com Donovan quase tanto quanto o ato real.

Ele retirou uma mecha de cabelo suada do meu rosto. —


Quão mariquinha pensaria que eu sou se dissesse que parece
quase... sagrada?

Rio. — Posso pensar que fui para a igreja errada


enquanto crescia.
Ele roçou seus lábios com os meus. — Gostaria de não
ter que me levantar e lidar com essa camisinha. Quero ficar
onde estou... talvez amarrá-la e mantê-la debaixo de mim por
alguns dias.

Segurei sua bochecha. — Você não tem que me amarrar.


Não vou a lugar nenhum desta vez.

Donovan sorriu. — Gosto do som disso.

Ele saiu da cama e me apoiei no cotovelo para vê-lo


caminhar nu para o banheiro.

— Ei, bunda firme — gritei quando alcançou a porta.

Ele se virou com um sorriso. — Sim?

— Pode não ter que me amarrar mais para me manter,


mas isso não significa que não gostaria que fizesse isso de
qualquer maneira.

Ele riu e murmurou enquanto saía da sala. — Você será


a minha morte. Eu simplesmente sei disso.

♥♥♥

Acordei com uma luz ofuscante brilhando em meus


olhos. Um raio de sol estriou-se por entre duas venezianas
instáveis e pousou bem no meu rosto. Protegi meus olhos com
a mão e olhei para o relógio na mesa de cabeceira.
11:33? Isso poderia estar certo? Peguei meu celular para
verificar novamente. Fazia anos que não dormia até tão tarde,
mas com certeza já era quase meio-dia. Não pude evitar o
sorriso que surgiu em meus lábios enquanto me lembrava dos
motivos pelos quais dormi – os muitos, muitos motivos.
Donovan e eu fizemos uma maratona de sexo. Nem tinha
certeza de quantas vezes tínhamos feito, mas a última vez foi
com a luz mais linda. O amanhecer tinha acabado de raiar, e
aquele sol da manhã dourado-amarelado havia entrado pelas
cortinas como estava fazendo agora. Só então, o feixe pousou
no rosto bonito de Donovan enquanto estava em cima dele,
me balançando para outro orgasmo feliz. A sua mandíbula
estava salpicada de barba por fazer e seus olhos brilhavam de
um azul incrível. O dourado do sol os fazia parecer quase
translúcidos, mas foi seu sorriso que me tirou o fôlego. Ele
parecia realmente feliz me observando, e isso tornou o
momento muito mais íntimo.

O meu corpo doía da maneira mais deliciosa agora, e


entre as minhas pernas estava inchado, mas só de pensar em
como o senti fez meu corpo não se importar o quão dolorido
estava. Então rolei para ver o quão profundo o sono do
homem sexy ao meu lado estava, apenas para descobrir que
não estava dormindo. Afagando os lençóis, minha mão
encontrou o frio. Aparentemente, fui a única que dormiu até
mais tarde. Puxando o lençol da cama, enrolei-o em volta do
meu corpo e fui à busca de Donovan. O meu apartamento
estava silencioso e ele não estava em lugar nenhum, mas o
cheiro de café pairava no ar. Segui meu nariz até a cozinha e
encontrei um bule de café fresco com uma orquídea ao lado.
Abaixo da planta havia uma nota.

Tive que correr para o escritório para pegar um arquivo.


Quando tinha oito ou nove anos, perguntei a Bud sobre sexo.
Ele não me deu nenhum dos detalhes, mas me disse que a
parte mais importante de estar com uma mulher era garantir
que ela fosse alimentada na manhã seguinte. Portanto, há um
iogurte e parfait51 de frutas na geladeira e um bagel com
manteiga no balcão. Não tinha certeza do que você gostaria.
Programei o café para as onze, supondo que dormiria pelo
menos quatro horas. Volto ao meio-dia com o almoço.

Donovan

P.S. A sua casa precisa de mais plantas, e esta me


lembrou de você. A maioria das pessoas não entende as
orquídeas e pensa que são frágeis, mas na verdade não são. A
verdade é que são muito mais resistentes do que qualquer um
imagina e, claro, lindas.

Segurei o bilhete contra o peito como uma colegial. É


sério? Este homem era bom demais para ser real. Era lindo e
duro por fora, mas por dentro era macio e quase vulnerável.
Suspirei e coloquei a nota para baixo para me servir um café
muito necessário. Um pouco antes do meio-dia, decidi pular
no chuveiro antes que Donovan voltasse. Deixei a porta do
banheiro aberta para ouvir se ele batesse antes de eu sair,
mas estava apenas me enrolando em uma toalha quando ele o
fez.

— Ei — abri a porta.

Os olhos de Donovan desceram e voltaram a subir. —


Droga. — Seguiu pelo corredor e ergueu uma caixa. — O
entregador da Amazon estava prestes a bater para entregar
isto quando lhe disse que receberia. Você teria feito o dia
daquele garoto.

Sorrio timidamente. — Só o dia do garoto, não o seu?

Ele entrou e envolveu um braço em volta da minha


cintura, me arrastando para perto para roçar seus lábios nos
meus. — Você fez meu dia algumas vezes antes de o sol
nascer.

A maneira como olhou para os meus lábios quando falou


me deu um frio na barriga.

— Acho que fizemos o dia um do outro.

Dentro do meu apartamento, Donovan colocou a caixa


no balcão da cozinha. — A que horas acordou finalmente,
dorminhoca?

— Oh meu Deus. Não antes das onze e meia.

— Isso é efeito Ambien em sua mesa de cabeceira? Não a


vi tomar um.
Pisquei algumas vezes. Puta merda. Não tomei um
comprimido para dormir na noite passada. Foi a primeira vez
que adormeci em quase seis anos sem algum tipo de
assistência química. — Eu... eu não tomei um.

Donovan sorriu. — Isso significa que meu pau é melhor


do que remédio?

Ele estava, é claro, sendo atrevido, mas não entendia o


quão significativo era não tomar nada para mim.

— Não dormi uma única noite sem um comprimido em


quase seis anos, Donovan.

O seu sorriso sumiu. — Mesmo?

Concordei.

— Nem mesmo depois... — balançou a cabeça. — Sinto


muito, pode ser o Neandertal em mim, mas não posso
terminar essa frase. Só de pensar em você com outro
homem...

— Não, nunca. Nem uma vez. Eu mantenho um frasco


na minha bolsa e um frasco ao lado da cama. Alguns anos
atrás, gostava realmente de correr. Fiz uma meia maratona e
depois fui para uma after party. Estava exausta quando
cheguei em casa e pensei que poderia ser a noite em que
conseguiria fazer, mas não é uma coisa física; é mental. Não
importa o quão cansado esteja meu corpo, meu cérebro não
desliga.
— Acho que encontramos o ponto de inflexão para
mudar esse interruptor. Pode ser difícil acompanhar o que
fizemos ontem à noite, mas estou pronto para tentar. Ficarei
feliz em substituir seus comprimidos.

— Isso é muito nobre da sua parte, mas não acho que


tenha sido o esforço tanto quanto qualquer outra coisa.

As sobrancelhas de Donovan se juntaram. — O quê,


então?

— Eu me senti segura.

Observei enquanto ele engolia o que disse. Eu me senti


segura. Algo tão simples, mas significava tudo para mim.

Donovan fechou a distância entre nós e colocou uma


mecha de cabelo atrás da minha orelha. — Quero lhe dar o
mundo, mas você me deu dizendo isso, Red.
CAPÍTULO 30

Donovan

— Quando descobrirá se será sócio do seu escritório? —


Autumn tirou os sapatos e levantou as pernas dobradas no
banco. — Deve ser logo, certo?

Olhei por cima do ombro antes de mudar de faixa. —


Terça-feira após o Dia do Trabalho, um pouco mais de uma
semana.

Estávamos a caminho de Connecticut para o fim de


semana do casamento de seu pai.

— Acha que vai conseguir?

— O seu amigo Dickson tem sido muito amigável


ultimamente. O cliente que me pediu que levasse para jantar
ficou muito feliz com o conselho que lhe dei. Ele até mesmo
indicou um amigo seu, pelo qual Dickson me deu um tapinha
nas costas. Embora o cara seja um sacana, e eu não esteja
ansioso para trabalhar com ele.

— Não quero ser uma idiota, mas todos os seus clientes


não são sujos? Quero dizer, vêm ver você porque foram pegos
fazendo algo dissimulado e ilegal.
Ela tinha razão, mas não achei que todos fossem. Dei de
ombros. — Alguns realmente não são pessoas más.
Simplesmente se perdem ao longo do caminho em sua
escalada até o topo. Acredite ou não, muitas vezes essas
pessoas nem mesmo veem o que estão fazendo como errado
na hora em que estão fazendo. Tive um novo cliente acusado
de negociação com informações privilegiadas na semana
passada. Ele é um comerciante e descobriu algumas
informações não públicas sobre uma empresa para a qual um
amigo trabalha. A empresa estava prestes a obter um novo
medicamento aprovado pelo FDA52 que faria suas ações
enlouquecerem. A sua esposa contou à irmã, e a sua irmã
mencionou isso ao novo namorado, que fez hedge53 e
comprou uma tonelada de ações. Ele fez uma fortuna, mas
também chamou a atenção dos reguladores, que o rastrearam
ao meu cliente. O homem não deveria ter contado à esposa,
mas contou. Isso não o torna necessariamente uma pessoa
má.

— Sim, definitivamente não nesse caso, mas deve ser


difícil representar alguns deles.

— Nem sempre é fácil, mas algumas pessoas podem


aprender com as lições, especialmente as difíceis. Tento
pensar dessa maneira. Olhe para mim – fiz algumas merdas
muito idiotas e estava no caminho para um lugar ruim. Fui
preso três vezes antes dos dezesseis anos – principalmente
coisas menores, mas foi assim que a maioria das pessoas na
prisão também começou. Se alguém não tivesse me ajudado,
não tenho dúvidas de que estaria onde alguns de meus
amigos estão hoje: cumprindo pena.

— Está falando sobre Bud?

— Ele arriscou muito por mim. A última vez que tive


problemas reais, o juiz quis me dar uma lição. Bud colocou
sua casa sob fiança e fez um empréstimo para um advogado.
O que o tribunal nomeou tinha cerca de vinte e três anos, e
eu seria o seu primeiro caso real.

— Oh, uau.

— Bud apostou. Conseguimos um advogado que usava


camisas feitas sob medida e ele me livrou por um detalhe
técnico, embora não o merecesse. Aprendi três coisas com a
última prisão: uma, tive sorte e as chances eram de que não
acontecesse novamente. Dois, Bud acreditava em mim, e era
hora de eu começar a acreditar em mim mesmo. E três... —
Sorrio. — Eu realmente queria usar camisas feitas sob
medida.

Autumn riu. — Então é por isso que se tornou advogado?


Para poder comprar camisas sob medida?

Olhei para ela e de volta para a estrada. —


Provavelmente deveria dizer que é porque queria ajudar os
outros ou lutar por justiça ou alguma outra merda nobre,
mas saber que eu nunca teria que ir a um refeitório ou a um
cara como Bud para comer? Isso teve muito a ver com o
assunto. Além disso, como lhe disse, sou bom em ler as
pessoas e argumentar, e isso é metade da batalha em meu
trabalho.

— Oh, isso mesmo — brincou. — Esqueci que você acha


que é tão bom em saber o que as pessoas estão pensando.

— Eu não acho que sou bom nisso; sei que sou.

Autumn sorriu e fechou os olhos. — O que estou


pensando agora?

Eu rio. — Nós tivemos essa discussão. Há uma diferença


entre ler pessoas e ser um leitor de mentes. Não posso
estudar seu rosto enquanto estou dirigindo.

Autumn mordeu o lábio inferior. — Poderia encostar...

Agora esse tom eu podia ler. Estávamos a apenas meia


hora do hotel em que nos hospedaríamos, mas quem se
importava?

Peguei seu olhar por um segundo e liguei minha seta


para sair na próxima saída. Depois de parar no
estacionamento vazio de um canteiro de obras, me certifiquei
de estacionar longe das luzes da rua antes de desligar o motor
e virar para enfrentar Autumn.

Ela não disse uma palavra, e isso me fez pensar se


estava brincando, e eu tinha ido longe demais saindo da
estrada. Embora o sorriso perverso em seu rosto quando falou
me deixou esperançoso.
Autumn ficou de joelhos no assento e virou seu corpo
inteiro para me encarar. — Está melhor? — Inclinou a cabeça.
— Consegue ler o que estou pensando agora?

Olhei para baixo. Os seus mamilos estavam praticamente


perfurando sua camisa. — Está pensando em sentar no meu
colo e me montar...

Ela examinou o estacionamento silencioso e alcançou o


botão da minha calça. Com um movimento rápido, o abriu. —
Errado, advogado. A verdade, não estava pensando em
montar em você.

Bem, isso era uma pena, porque meu pau já estava bem
duro, mas joguei junto. — Os seus mamilos fazem minha
boca salivar, e o olhar sujo em seu rosto diz que está se
preparando para alguma coisa.

Ela puxou o zíper da minha calça lentamente. O som dos


dentes se separando foi melhor do que qualquer filme pornô
que já assisti.

Autumn olhou para mim por baixo de seus cílios grossos,


seus olhos brilhando diabolicamente. — Oh, estou me
preparando para algo certamente. — Ela passou a língua pelo
lábio superior. — Quero chupar seu pau.

— Jesus Cristo, Red. — A minha cabeça caiu para trás,


batendo contra o encosto de cabeça. — Diga isso de novo...

Ela se inclinou para o meu lado, seu nariz tocando


minha orelha e sussurrou na maldita voz mais sexy. — Quero
chupar seu pau.

Gemi. — Essa é a coisa mais sexy que já ouvi.

Ela mordeu o lóbulo da minha orelha. — Quero que me


mostre como você gosta. Enrole seus dedos no meu cabelo e
me mostre.

Eu estava ofegante como um cachorro e ela ainda nem


havia me tocado. — Isso será constrangedor. Já estou tão
excitado.

— Deslize sua calça para baixo para mim? — Sussurrou.

Deslizei aquela filha da puta para o chão em dois


segundos.

Autumn abaixou a cabeça e lambeu a umidade que já


havia se formado na ponta do meu pau. Pensei que ela fosse
me torturar por um tempo com mais provocações, mas me
surpreendeu “pra” caralho quando abriu bem a mandíbula e
levou quase todo o meu pau garganta abaixo.

— Jesus Cristo. — Curvei-me, e minha bunda levantou


do assento enquanto ela chupava meu comprimento de volta
quase até a ponta. O meu pau basicamente tinha uma mente
própria e a seguia. Ela parou na ponta, então cavei minhas
mãos em seu cabelo e a empurrei de volta para baixo.
Autumn gemeu. Foda-se, sim. Então a puxei de volta e a
empurrei uma segunda vez. Ela gemeu novamente.
Foda-me. Eu não aguentaria mais do que um minuto.
Fechei meus olhos e descansei minha cabeça contra o assento
enquanto puxava seu cabelo novamente, guiando sua cabeça
para cima. O meu pau estava encharcado com sua saliva, e o
som de sorver que ela fez enquanto balançava para cima e
para baixo me deixou louco. Não conseguia o suficiente e, de
repente, não conseguia rápido o suficiente. O meu aperto em
seu cabelo aumentou em um punho, e acelerei o movimento –
empurrando-a para baixo e, em seguida, puxando-a de volta,
empurrando-a para baixo e... oh, o som gorgolejante que fez
quando eu a empurrei um pouco mais.

Melhor. Maldição. Som. Do. Mundo.

Era isso. Estava acabado. O meu orgasmo estava


disparado como um trem de carga em fuga, então afrouxei
meu aperto em seu cabelo. — Autumn... baby... vou gozar.

Ela continuou, mantendo o ritmo que estabeleci, embora


não a guiasse mais.

— Autumn... você tem cinco segundos... — Gemi,


tentando me conter para que ela pudesse se mover antes que
disparasse minha carga, mas ela fez exatamente o oposto.
Chupou-me ainda mais fundo, até que me senti atingir o
fundo de sua garganta. Não houve contenção dessa vez.

— Porra... — meu corpo convulsionou quando deixei


escapar um longo jorro de esperma. — Porra... Porra...
poooora, — gemi.
Ofeguei como se estivesse correndo, tentando recuperar
o fôlego. Autumn apenas continuou deslizando para cima e
para baixo enquanto eu ficava sentado ali com meu crânio
pendurado contra o encosto de cabeça. Por fim, depois de um
ou dois minutos, ela enxugou a boca com as costas da mão e
se sentou.

— Isso foi... — Balancei minha cabeça. — Acho que


talvez você tenha que dirigir o resto do caminho. Não consigo
ver direito.

Ela deu uma risadinha.

— Eu pensei que este seria um fim de semana tenso indo


ao casamento do seu pai.

— Oh, confie em mim. Será. Ficarei tensa e arruinarei o


seu fim de semana. Essa foi apenas a minha maneira de dizer
obrigada por ter vindo. — Sorriu. — Acho que isso tem dois
significados agora.

— Estou feliz em vir54... a qualquer hora, em qualquer


lugar, com você. Eu definitivamente quero dizer isso de duas
maneiras. — Peguei a sua mão, enrolei na minha e levei os
nós dos dedos aos meus lábios para um beijo. — Farei o meu
melhor para garantir que você tenha um bom fim de semana.

Sorrimos um para o outro, e eu quis dizer o que disse.


Queria ajudá-la a ficar relaxada e aproveitar o tempo em
Connecticut. Claro, não tinha ideia de que não seria ela a
estragar o fim de semana... seria eu.
♥♥♥

— Merda. Esqueci-me de embalar as meias sociais.

Fui até minha bolsa, na manhã seguinte, para pegar


meu equipamento de corrida e percebi que só trouxe meias
brancas para usar com meus tênis. Autumn e eu acordamos
cedo, fizemos sexo e pedimos serviço de quarto. Depois,
perguntei se queria sair para correr, mas ela parecia contente
em ficar na cama pelas poucas horas que tínhamos antes de
precisarmos nos preparar para o casamento de seu pai.

— Estamos apenas a cerca de um quarteirão da principal


rua comercial. Posso ir até lá enquanto corre e comprar um
par. — Ela se sentou na cama e o lençol escorregou, me
dando uma bela vista de seus seios perfeitos. Acho que meus
olhos demoraram um pouco mais do que pensava.

— Acabamos de fazer sexo uma ou duas horas atrás, e


ainda assim está olhando para mim como se eu fosse seu
almoço. — Ela sorriu e levantou o lençol para se cobrir.

Aproximei-me e sentei na beira da cama ao seu lado.


Puxando o lençol de volta para baixo, disse — Eu
absolutamente gostaria de comê-la no almoço.

Ela corou.
— Não estou muito entusiasmado em correr, de qualquer
maneira. Por que não vamos comprar as meias quando quiser
levantar, e também tomaremos outro café, e quando
voltarmos, farei algumas flexões para me exercitar... com você
embaixo de mim.

Ela sorriu. — Isso soa bem. Embora você suado de uma


corrida também parece muito gostoso.

— Vou te dizer uma coisa, correrei ao redor do hotel


quando voltarmos, apenas o suficiente para ficar suado antes
de fazer flexões.

Ela riu, embora não estivesse realmente brincando. Se


ela gostasse de mim suado, suado eu ficaria.

Pouco depois, estávamos descendo a Greenwich Avenue.


Uma mulher virou a esquina e esbarrou direto em Autumn.
Ela tropeçou, mas segurei sua mão, então fui capaz de
impedi-la de cair.

— Eu sinto muito! — A mulher ergueu as mãos. — Não


estava prestando atenção para onde ia. Você está bem?

— Sim. Estou bem.

A mulher semicerrou os olhos. — Autumn? Autumn


Wilde?

As sobrancelhas de Autumn se curvaram. — Eu sinto


muito. Nós nos conhecemos?
— Sou Cara Fritz. Éramos boas amigas quando crianças.
Estávamos juntas na classe da quarta série do Sr. Fleming.

Autumn inclinou a cabeça e, em seguida, um olhar de


reconhecimento tomou conta de seu rosto. — Oh meu Deus.
Claro! Como poderia não reconhecê-la... Cara Fritz. Deus, já
faz muito tempo.

Cara olhou para mim. — Os meus pais se divorciaram na


sexta série. Eu me mudei para a cidade vizinha, e isso
significava uma nova escola, então Autumn e eu
eventualmente perdemos contato. Quatro quilômetros
parecem ser quatrocentos quando se tem essa idade.

Autumn acenou com a cabeça. — Isto é uma grande


verdade. É muito bom vê-la, no entanto. — Ela colocou a mão
no meu antebraço. — Eu sinto muito. Estou sendo rude. Este
é meu... namorado, Donovan.

Cara acenou com a cabeça. — Prazer em conhecê-lo,


Donovan. — Ela sorriu para Autumn. — Então, ainda mora
aqui em Greenwich?

— Não, na verdade, só estou na cidade para um


casamento. Eu moro em Manhattan agora.

— Oh, um casamento! — Seu rosto se iluminou e ela


estendeu a mão e balançou os dedos, exibindo um anel
brilhante. — É por isso que não estava prestando atenção
para onde ia. Acabei de ficar noiva ontem à noite e não
consigo parar de olhar para minha mão.
— Oh, uau. Parabéns.

— Sabe, eu ainda moro em Rock Ridge, mas meu


namorado... — sorriu. — Quer dizer, meu noivo mora aqui em
Greenwich. Está estacionando o carro em algum lugar porque
é tão impossível encontrar uma vaga aqui na avenida, mas ele
nasceu e foi criado aqui. Vocês dois podem se conhecer.
Foram para a mesma escola, embora ele fosse alguns anos
mais velho do que nós.

— Talvez — disse Autumn. — Qual o seu nome?

Só então um cara que parecia definitivamente pertencer


a Greenwich atravessou a rua e se dirigiu para nós. Usava
shorts cáqui, mangas compridas de botão e um suéter rosa
amarrado nos ombros.

— Oh, aqui está ele — Cara disse. Ela olhou para o cara
de aparência idiota como se fosse algum tipo de celebridade e
se aninhou em seu braço. — Querido, conhece Autumn
Wilde? Vocês estudaram na mesma escola.

O Sr. Suéter Rosa sorriu. Se eu me engano, aquela boca


branca e brilhante definitivamente tinha alguns dentes
extras.

— Conheço. Olá, Autumn. É ótimo ver você.

Esperei alguns segundos, mas Autumn não respondeu.


Então me virei para ver como estava e parecia que estava
prestes a desmaiar. Toda a cor havia sumido de seu rosto. Eu
a agarrei. — Autumn? Você está bem?
O seu corpo inteiro tremia. Ela estava tendo uma
convulsão?

— Oh meu Deus. — O rosto de Cara caiu. — Sou


enfermeira. Ela tem baixo nível de açúcar no sangue ou algo
assim?

Eu não tinha ideia do que diabos estava acontecendo. —


Acho que não. — Apertei seu braço, mas Autumn apenas
olhou para frente. — Autumn, você está bem?

Quando não respondeu, mas também não desmaiou nem


nada, uma sensação nauseante tomou conta de mim. Eu
segui sua linha de visão para o Sr. Suéter Rosa. Ao contrário
de sua noiva, ele não parecia nem um pouco preocupado. A
verdade, ele ainda tinha aquele sorriso grande e cheio de
dentes no rosto. Que porra é essa? Ele realmente parecia
muito satisfeito por Autumn não estar se sentindo bem.

Então me dei conta, como dirigir uma motocicleta a


cento e sessenta quilômetros por hora direto contra uma
parede de tijolos. Os cabelos da minha nuca se arrepiaram e
soube. Eu simplesmente soube, porra.

— O seu nome? — Levantei meu queixo, ainda


segurando Autumn. — Qual diabos é o seu nome?

O rosto do cara finalmente caiu. Acho que pode ter sido


porque viu o olhar assassino no meu. Ele também não
respondeu à minha pergunta.
Cara olhou para trás e para frente entre seu noivo e eu
algumas vezes. Ela parecia tão confusa quanto eu estava um
minuto atrás. — O que está acontecendo?

O impasse entre nós continuou enquanto ele a ignorava.


Parecia que a fumaça estava saindo do meu nariz e orelhas.

Cara falou mais alto. — Braden, o que está acontecendo?


CAPÍTULO 31

Donovan

Segurei minha cabeça em minhas mãos, puxando o


cabelo de ambos os lados, enquanto repetia o dia anterior
continuamente. Eventualmente, me levantei e caminhei até a
porta da cela. Pendurado nas barras, gritei para o policial
sentado em sua mesa a seis metros de distância. — Posso
fazer outra ligação, por favor?

O policial continuou olhando para sua papelada e me


ignorou completamente.

— Tenho direito a três ligações. Eu só usei duas.

Ele suspirou e sua caneta parou de escrever, mas ainda


não ergueu os olhos. — Sabemos que você conhece seus
direitos, advogado. Não precisa se exibir. Você se acha
especial porque é advogado – todos se acham especial, mas
hoje, não é um advogado, você é um criminoso. Farei isso
quando eu quiser.

Andei para frente e para trás na cela. Liguei para


Autumn duas vezes desde que tudo caiu. Ambas as vezes foi
direto para o correio de voz. A acusação seria nas próximas
horas, então se eu ligasse para ela e não atendesse
novamente, havia uma boa chance de ninguém estar lá para
minha audiência e não seria capaz de pagar a fiança que
definissem. Neste ponto, provavelmente devo ligar para Trent
ou Juliette – alguém que pudesse pelo menos manobrar pelo
sistema de fora, mas prefiro ficar preso mais um dia do que
não tentar chegar a Autumn. Precisava me desculpar...
precisava ver se ela estava bem.

Andei por mais vinte minutos antes de o policial


finalmente se aproximar e destrancar a cela. Estendeu a mão
para eu sair e caminhamos para sua mesa novamente.

— Número?

Falei o celular de Autumn e ele me entregou o telefone.

Tocou uma vez.

Vamos. Vamos lá... que não seja o correio de voz


novamente.

Fiquei aliviado quando não foi diretamente para uma


gravação após o primeiro toque, como aconteceu na noite
passada.

Tocou uma segunda vez.

Atenda, Autumn. Atenda.

Nada. Meu coração disparou quando o terceiro toque


veio.

Porra. Porra. Porra.


No meio do quarto toque, cortou para o mesmo correio de
voz. Fechei meus olhos enquanto ouvia sua voz e, em seguida,
limpei minha garganta.

— Autumn... sinto muito. Eu só preciso saber que está


bem. Se você não quer falar comigo, tudo bem. Por favor,
apenas responda para que eu saiba que está bem.

O policial estendeu a mão e colocou o velho receptor de


telefone na base.

— Se está ligando para a ruiva — disse — ela estava


fisicamente bem. Disse que caiu de bunda quando você e a
vítima estavam brigando. A minha parceira tomou seu
depoimento no local depois que colocamos você na viatura.

— Ele não é a porra de uma vítima. É um estuprador.

— Talvez sim, mas ele tem uma órbita ocular fraturada,


nariz quebrado e uma concussão. Hoje, por isso, é a vítima; e
se ele é a sua vítima. Se o que você afirma é verdade, deve
saber melhor do que ninguém que fazer vingança com as
próprias mãos não é o caminho certo a seguir.

Olhei para o dedo do policial. Estava com uma aliança de


casamento. Olhei então diretamente em seus olhos. — É
assim que você lidaria se tropeçasse com o cara que estuprou
a sua esposa e escapou impune?

O rosto do policial se suavizou. — Partimos para a


acusação em uma hora. Você parece uma merda. Vou levá-lo
ao banheiro masculino e deixá-lo se limpar.
Duas horas depois, eu estava sentado no corredor
privado ao lado da sala do tribunal, o lugar onde deixavam os
criminosos esperando que seus nomes fossem chamados. Eu
neguei um advogado nomeado pelo tribunal em favor de me
representar na audiência.

— Decker!

Fiquei de pé. Assim que entrei pela porta do tribunal,


procurei por Autumn. Eu a encontrei sentada na primeira
fileira, com um homem de aparência muito zangada ao seu
lado. Ela trouxe seu pai.

Porra.

O seu pai avançou até a pequena porta de madeira que


separava os agentes dos espectadores. — Gerald Wilde para o
réu, meritíssimo.

A minha primeira reação foi agradecer, mas não. Este era


o meu campo e sabia como jogar melhor do que ninguém,
mas hesitei porque era o seu pai, e fiquei feliz por ter feito isso
depois que o juiz falou novamente.

— Gerry... não deveria estar em lua de mel?

Os olhos de seu pai brilharam para mim antes de olhar


para o juiz. — Tive que adiar um dia.

Olhei de volta para Autumn algumas vezes. Ela


finalmente fez contato visual, mas rapidamente desviou o
olhar.
A audiência foi bastante normal, e o pai de Autumn fez
um bom trabalho. A fiança foi fixada em dez mil, o que não
era um problema. Depois que o juiz bateu o martelo, o pai de
Autumn resmungou para mim. — Não pagarei sua fiança.
Estou assumindo que possa pagar?

— Sim, senhor. Posso incomodá-lo a fazer uma ligação


para alguém do meu escritório que possa tratar do assunto a
partir daqui?

Ele fechou a pasta e a ergueu. — Não acho que isso seja


necessário. Alguém do seu escritório já está aqui.

— Está?

— Aparentemente, um dos oficiais do tribunal neste


prédio costumava ser um assistente jurídico em seu
escritório. Ela viu seu nome na pauta e fez uma ligação para
você. Se eu soubesse, não teria que adiar minha partida para
minha lua de mel.

— Sinto muito por isso, senhor. — Balancei minha


cabeça. — Lamento a confusão que causei no dia do seu
casamento. Eu só... perdi o controle vendo aquele cara até
mesmo olhar para Autumn depois do que fez.

O pai de Autumn baixou a cabeça. Colocou uma mão no


meu ombro e deu dois tapinhas nele. — Boa sorte.

Enquanto o oficial do tribunal me conduzia para fora da


sala do tribunal, olhei ao redor para ver se Trent ou Juliette
estavam lá dentro. Estava tão focado em Autumn que nem
tinha percebido se havia mais alguém aqui, mas com certeza,
alguém estava. Alguém do meu escritório, com certeza.

Adagas geladas foram atiradas em mim da última fileira


do tribunal. Fechei os olhos e soltei um suspiro irregular.

Bem quando pensei que as últimas vinte e quatro horas


não poderiam ficar piores.

Deus, eu estava errado.

Porque Blake Dickson estava me olhando no momento.

♥♥♥

Demorou até o final da tarde para ser processado. Depois


de pegar meus pertences pessoais no caixa e assinar a
papelada da fiança, saí para a escada do tribunal e respirei
fundo. O meu telefone deve ter se partido durante a briga, e
não tinha certeza se estava morto por não ter sido carregado
ou apenas completamente morto. Esperava que Autumn
estivesse esperando por mim, mas não havia sinal dela.
Embora encostado em um dos pilares altos próximos, alguém
definitivamente estava esperando para falar comigo.

Merda. Dickson.

Respirei fundo e me aproximei. Ele estava claramente


preocupado desde esta manhã, e era melhor acabar com isso.
— Ei. Desculpe por tudo — disse.

O rosto de Dickson estava duro. — Defina tudo. Estaria


se referindo a ser preso por agressão, me fazendo arrastar
minha bunda para fora da cama bem cedo em um domingo
para pagar sua fiança, ou transar com uma cliente que não
há muito tempo era minha namorada?

Fechei meus olhos e balancei minha cabeça. — Não é o


que parece.

— Não? Você não está fodendo uma cliente então?

— Tecnicamente, Autumn não é uma cliente. Storm é.

Eu soube no minuto em que as palavras saíram da


minha boca que era a coisa absolutamente errada a dizer,
mesmo que fosse a verdade.

Os olhos de Dickson se estreitaram. — Quando lhe pedi


que se certificasse de cuidar bem da cliente, não achei que
precisava explicar que não incluía enfiar seu pau nela.

Passei a mão pelo cabelo. — Não é tão simples assim.


Autumn e eu temos uma história. Quando me designou para
ajudar Storm, não tinha ideia de que ela estaria lá. Não nos
víamos há muito tempo. Havia muitos sentimentos não
resolvidos.

Dickson me olhou por um minuto sólido em silêncio


antes de empurrar o pilar em que estava apoiado. — E pensar
que estava realmente inclinado a votar em você.
Ele balançou a cabeça e começou a descer os degraus do
tribunal. No meio do caminho, se virou. — Sua prisão é algo
que os sócios precisam estar cientes, pois tem um efeito na
empresa. É minha responsabilidade informá-los,
independentemente da quebra de confiança pessoal.

— Compreendo.

Com apenas um olhar de nojo para se despedir, ele se


virou e continuou andando. Fiquei enraizado no mesmo lugar
até que foi embora, o peso de tudo de repente afundando. A
minha carreira, minha licença, minha liberdade, um provável
processo civil... realmente estraguei tudo desta vez, mas o
pior era o que faltava enquanto estava aqui sozinho na
escada: Autumn.

♥♥♥

— Oi. Estava no quarto quinze dez. Fizemos check-in na


sexta-feira e deveríamos fazer o check-out hoje, mas algo
aconteceu e, como já passou da hora do check-out, minha
chave não está funcionando. Saberia se o outro convidado
que estava comigo já saiu?

A mulher digitou algumas teclas no computador e sorriu.


— Sr. Decker?

— Este sou eu.


— Diz que há algo que o outro convidado deixou para
você. Espere um segundo e eu trarei.

Ela voltou carregando minha bagagem, com um envelope


na mão. — Posso apenas ver alguma identidade, por favor?

— Claro. — Tirei minha licença da carteira e lhe mostrei


antes que trouxesse minha bagagem de trás do balcão. A
mulher me ofereceu o envelope. — Aqui está. Posso fazer mais
alguma coisa por você?

— Acho que não. Muito obrigado.

Eu só dei alguns passos do balcão antes de abrir o


envelope. Dentro havia um bilhete com a caligrafia de
Autumn.

Donovan,

Sinto muito por tudo o que aconteceu. Prometi que não


fugiria sem dizer nada de novo, mas preciso de algum tempo e
espaço. Espero que entenda.

Autumn
CAPÍTULO 32

Donovan

O escritório inteiro estava zumbindo quando entrei na


manhã de segunda-feira. Ninguém me disse nada, mas as
vozes se acalmaram enquanto passava, e havia uma espécie
de estranheza nos sorrisos e saudações que recebi. Portanto,
presumi que Dickson tivesse aberto a boca para mais do que
apenas os sócios. Não fiquei surpreso. Para ele, não foi
apenas um golpe profissional. Foi pessoal, e não posso dizer
que o culpava. Trent e Juliette entraram em meu escritório
dois minutos depois de mim, ambos carregando blocos de
notas. Fecharam a porta atrás deles.

Suspirei e me sentei atrás da minha mesa. — Suponho


que já tenham ouvido.

— Que porra é essa, cara? — Trent balançou a cabeça


enquanto se sentava em uma cadeira.

— Eu sabia que isso explodiria na sua cara. — Juliette


franziu a testa.

— Quanto sabe?

— Dickson disse à sua assistente que você foi preso por


agressão criminosa e também estava transando com uma
cliente. Ele também insinuou que você tem um problema com
drogas e álcool.

— Excelente. — Balancei minha cabeça. A assistente de


Dickson tem uma boca gigante. Ela era como o canal de todas
as fofocas. Esfreguei minhas têmporas. — Acho que a boa
notícia é que não tenho problemas com bebida ou drogas.
Estava perfeitamente sóbrio quando dei uma surra no cara.

— Quem diabos era ele?

Afundei em minha cadeira. — É uma longa história, e


não é minha para contar. — Segurei os olhos de Trent. —
Confie em mim quando digo que ele merecia isso há muito
tempo e mereceu cada parte. Ele machucou Autumn, e não
estou falando sobre os seus sentimentos.

Trent acenou com a cabeça. — OK. OK. Então, para onde


vamos a partir daqui? Sou licenciado em Connecticut. Usou
um advogado nomeado pelo tribunal na acusação ou se
representou?

— Nenhum dos dois. O pai de Autumn veio. Ele é


advogado em Connecticut. Acho que realmente pode ter me
ajudado. Era amigo do juiz.

— Ele é penal?

Balancei minha cabeça. — Planejamento imobiliário,


acho. Ele é dono de uma empresa de tamanho decente. Tenho
certeza de que têm uma seção criminal.
— Quer que eles se envolvam?

— Definitivamente não.

— Muito bem. Bom, apresentarei uma notificação de


mudança de advogado hoje para deixar registrado que serei
seu advogado.

— Agradeço a oferta, mas posso lidar com isso.

Trent franziu a testa. — O ataque está relacionado a algo


que aconteceu entre o cara e Autumn, correto?

Concordei.

— Esse incidente, foi a primeira vez que entrou em


contato com o cara?

— Sim.

— Ele disse ou fez alguma coisa para provocá-lo?

— Sorriu.

Trent balançou a cabeça. — Você espancou um cara por


sorrir. Não acha que talvez não seja uma boa ideia
representar a si mesmo? Eu realmente preciso lembrá-lo do
velho ditado? “Um advogado que se representa em um
julgamento criminal tem um tolo como cliente”. O que fará
quando o cara sorrir para você do outro lado do corredor no
tribunal? Mesmo que não consiga pular para a sua mesa,
quão boas serão suas decisões quando todas forem
emocionais?
Passei a mão pelo cabelo e soltei um grande suspiro. —
Tudo bem... sim, você está certo, mas não é penal.

— Tudo bem. Você vai me ensinar. Não há melhor


advogado penal do que você. Só precisa de um porta-voz com
uma atitude calma para apresentar o seu caso.

Concordei. — OK. Obrigado.

Juliette estava quieta até agora. — Você e Autumn estão


bem?

O meu peito se apertou. As implicações legais e criminais


do que fiz não me preocuparam nem metade do que poderia
ter feito para o meu relacionamento com Autumn. Ela tinha
grandes problemas de confiança, sem mencionar que odiava
violência, e lhe mostrei em primeira mão que se pode tirar o
garoto da vizinhança violenta, mas não se pode tirar a
vizinhança violenta do garoto. Balancei minha cabeça. — Não
falo com ela desde sábado. Estava na minha acusação com
seu pai e pagou a fiança, mas saiu da cidade antes de eu ser
solto e me pediu para lhe dar algum tempo e espaço. Achei
que deveria ligar para ela esta noite.

Juliette estremeceu.

Suspirei. — Eu sei. Definitivamente sei. Já disse às


mulheres que precisava de um pouco de espaço em mais de
uma ocasião. Sabe o que eu realmente quis dizer? – Você é
um pouco frágil demais para despejar tudo de uma só vez,
então vamos fazer isso com pequenos passos. Acredite em
mim, entendo que não é bom.

— Talvez não seja tão ruim — ela disse depois de um


momento. — Eu obviamente não sei os detalhes, mas sei que
teve uma razão muito boa para o que fez. Ela conhece o
homem que você é e provavelmente só precisa de um pouco
de tempo para resolver algumas coisas.

Esperava que Juliette estivesse certa, mas tive uma


sensação nauseante no fundo do meu estômago. A maior luta
de Autumn para superar o que aconteceu com ela foi aceitar
não ter visto quem era Braden antes de atacá-la. Agora ela
pode estar se sentindo da mesma maneira por mim – e
duvidando de si mesma novamente.

♥♥♥

Correio de voz. Novamente. Eu não tinha deixado uma


mensagem nas outras duas vezes que tentei hoje, não
querendo deixar a bola com ela, mas a mensagem estava
chegando alta e clara agora, e se Autumn não fosse pegar o
telefone para me ouvir, teria que esperar que ela pelo menos
ouvisse a minha mensagem de voz. Tentei colocar meus
pensamentos em ordem enquanto ouvia a curta gravação,
mas não foi fácil.
— Ei — comecei. — Sei que me pediu um espaço, mas só
quero ter certeza de que você está bem. — Fiz uma pausa,
procurando as palavras certas, mas não havia nenhuma.
Então falei de coração. — Sei que o que fiz foi errado. Errei e
te decepcionei. Quando era criança, Bud sempre me dizia que
um momento de paciência quando está com raiva pode salvar
anos de arrependimento. — Cavei meus dedos em meu cabelo
e puxei. — Eu só... Ele sorriu para você. Ele não merece
respirar o mesmo ar que você respira, e surtei. Sinto muito,
Autumn. Sinto muito. Sei o que acha da violência e não sei
como te mostrar que a pessoa que viu naquele dia não sou
eu. Eu nunca te machucaria.

Fechei os olhos com força para conter as lágrimas e


balancei a cabeça. — Foda-se. Estou apaixonado por você,
Autumn. Não é assim que eu queria te dizer, mas é a verdade,
e preciso que saiba disso. Pode achar que é muito cedo, mas
acho que estou desde o momento em que entrou na cafeteria
no ano passado. — Soltei um suspiro profundo. — Enfim,
entendo que precise de algum tempo. Por favor, me ligue
quando quiser.

Desliguei meu telefone e sentei em minha mesa. Eram


nove horas da noite e algumas pessoas ainda estavam
circulando pelo escritório, mas não me importava. Eu chorei
como um bebê.
CAPÍTULO 33

Autumn

Apenas uma semana atrás, me senti como uma borboleta


que passou anos dentro de uma espécie de casulo. Estava
com tanto medo de me aventurar pelo mundo sozinha, mas
bati minhas asas algumas vezes e, assim que comecei a voar,
a escuridão isolada em que estive por tanto tempo parecia
mais um castigo do que um lugar de proteção. Eu agora
queria desesperadamente rastejar de volta para aquele
casulo, mas parecia que não conseguia mais caber.

Nos últimos dias, continuei repetindo esse pequeno


momento bobo que Donovan e eu compartilhamos.
Estávamos no hotel na noite anterior ao casamento do meu
pai. Porque mesmo cruzar a fronteira estadual de New York
para Connecticut me deixava tensa, decidi tomar um banho
quente. Depois, me sentei na mesa diagonalmente em frente à
cama onde Donovan estava assistindo a um jogo de beisebol
na TV.

Estava perdida em minha cabeça, pensando em quanto


tempo havia passado desde que estive na casa do meu pai,
enquanto secava a parte de trás do meu cabelo. Os meus
olhos, em um momento, encontraram os de Donovan no
espelho. Ele sorriu, aparentemente sem assistir mais ao jogo,
então desliguei o secador e perguntei o que estava olhando.
Ele deu de ombros e disse que estava apenas gostando de me
assistir. Voltei a fazer o que estava fazendo – o que era um pé
no saco, já que meu cabelo estava bem comprido. Donovan se
aproximou e pegou o secador e minha escova de minhas
mãos. Ele parecia completamente fora de seu elemento, quase
como se nem mesmo soubesse como inclinar o secador com
uma das mãos e trabalhar a escova de cabelo com a outra,
mas ficou ali – ainda usando uma camisa feita sob medida do
trabalho naquele dia, uma que cobria todas as suas
tatuagens duronas – por dez minutos e terminou de secar a
parte de trás do meu cabelo.

Foi então que eu soube. Sabia que não importava o


quanto tentasse, não importava o quanto lutasse, eu não
conseguia evitar me apaixonar por ele. É por isso que hoje,
depois de passar dias enrolada como uma bola na minha
cama, me levantei, procurei o endereço de um certo advogado
cujo nome nunca pensei que digitaria no Google e peguei o
trem para Hartford.

— Oi, estou aqui para ver... — Respirei fundo. — Braden


Erlich.

A recepcionista sorriu. — Claro. — Ela apertou algumas


teclas e ergueu os olhos. — Hmmm... Não tenho um
compromisso marcado para o Sr. Erlich esta tarde. Ele deve
ter se esquecido de colocá-la na agenda.

— Na verdade, não tenho hora marcada.

— Oh.
— Temos contudo alguns negócios que precisam ser
finalizados. Poderia apenas deixá-lo saber que estou aqui?

— Certo. Qual o seu nome, Por favor?

— Autumn Wilde.

Observei seu rosto enquanto ligava de volta para Braden.


— Oi. Autumn Wilde está aqui para vê-lo. Ela não está na
agenda, mas disse...

O homem do outro lado a cortou claramente. Ela ouviu


antes de cobrir o telefone e sussurrar — Eu disse seu nome
correto?

Sorrio. — Disse.

Ela descobriu o telefone. — Sim, o nome é


definitivamente Autumn Wilde.

A recepcionista parecia confusa ao desligar o telefone. —


Umm... Ele deve estar na outra linha ou algo assim. Tenho
certeza que ligará de volta quando terminar.

Assim que terminou de falar, Braden veio marchando


pelo corredor atrás dela. Tinha dois olhos pretos, um nariz
enfaixado e um olho estava inchado e fechado, embora quase
uma semana tivesse se passado. O seu rosto estava duro
enquanto me olhava, e achei que fosse vomitar. Ele contornou
a mesa da recepção e segurou meu cotovelo.

Eu o puxei para longe e assobiei — Não me toque.


Os olhos de Braden pularam para a recepcionista e de
volta para mim, e ergueu as mãos. — O que você quer?

— Falar com você.

A sua mandíbula flexionou. — Aqui não. Entre no meu


escritório.

— É geralmente assim que funciona — murmurei.

Consegui colocar um pé na frente do outro, de alguma


forma, enquanto caminhava para o santuário interno de seu
luxuoso escritório de advocacia. Quando chegamos à sua
porta, estendeu a mão para que eu entrasse primeiro. Entrei,
mas parei na sua frente.

— A porta permanece aberta.

— Prefiro privacidade.

— Eu preferia não ter que usar drogas à noite para


dormir, porque tenho medo que um animal entre no meu
apartamento e me estupre. Acho que nenhum de nós tem
nossa preferência, hein?

Braden esfregou o rosto com a mão enquanto me


encarava. — Tudo bem. Fale baixo.

Sentei-me no lado oposto de sua mesa. As minhas mãos


tremiam, então agarrei os braços da cadeira com todas as
minhas forças para que ele não visse.
Ele cruzou os braços sobre o peito. — Se está aqui para
tentar me fazer retirar as acusações contra seu namorado
vagabundo, desperdiçou uma viagem.

Quando pensei em vir aqui, pensei que seria difícil olhar


para Braden, mas no momento, era exatamente o oposto.
Talvez seja porque foi espancado e machucado, mas olhar
para ele me fez sentir mais forte, não como a fraca
acovardada que pensei que seria. O meu coração ainda
ricocheteou dentro do meu peito, minha pele estava pegajosa
e minha postura estava definitivamente rígida, mas achei que
poderia haver um pouco de alegria misturada com meu terror.
Inclinei minha cabeça. — Você pensa sobre o que fez comigo?

Ele se encolheu, mas tentou esconder. — Boa tentativa.


Está usando uma escuta ou tentando me gravar no seu
telefone?

Mantive contato visual enquanto levantei minha bolsa,


peguei meu telefone e coloquei-o sobre a mesa. Eu o liguei e
virei o celular para encará-lo enquanto pressionava o botão
para desligá-lo. Ele não disse nada, mas ainda não parecia
convencido. Então me levantei e estendi meus braços.

Depois de um olhar de um minuto, ele apontou para o


meu lugar. — O que você quer, Autumn?

— Quero respostas.

Ele olhou para trás e para frente entre os meus olhos. —


Para quê?
— Você seguiu em frente. Quero saber como.

Ele deu um sorriso maníaco. — Achou que eu ficaria


celibatário depois que terminamos?

Balancei minha cabeça. — Não, mas quero saber como


você dorme à noite sabendo que me estuprou.

Os seus olhos pularam para a porta atrás de mim. —


Diminua seu tom de voz.

— Ou o quê? — Sorrio ironicamente. — Oh... claro.


Ninguém aqui sabe do que foi acusado – ou o que fez. Se
soubessem, olhariam para você de uma forma um pouco
diferente. A maioria deles diria que não acredita, mas no
fundo de suas mentes... sempre haveria apenas... — Segurei
meu polegar e indicador para cima, exibindo um centímetro
de espaço. — Esse tanto – esse tanto de dúvida de que poderia
tê-lo. Mesmo as pessoas que gostam de você nunca sentiriam
o mesmo. Aposto que algumas das senhoras se certificariam
de que nunca seriam as últimas sozinhas no escritório com
você à noite também.

A mandíbula de Braden flexionou. — Vá direto ao ponto,


Autumn. Não sou um idiota, então não estou respondendo a
nenhuma de suas perguntas. Se isso é tudo que veio fazer...
— gesticulou em um círculo com a mão. — Não deixe a porta
bater na sua bunda no caminho para fora.

— Não esperava que respondesse às minhas perguntas e,


honestamente, não tenho certeza se há algo que possa dizer
que tenha algum valor para mim, mas você ouvirá o que tenho
a dizer. — Respirei fundo. — Por um ano depois que me
estuprou, costumava assistir a vídeos antigos nossos juntos.
Passei incontáveis horas estudando-os – observando a
maneira como me olhava, observando seus olhos para ver o
que perdi. Quer dizer, o diabo não sai de alguém
simplesmente um dia. Ele se infiltra em sua alma e, aos
poucos, suga o que há de bom em você. É como um câncer
não tratado. Infecciona e cresce e tira todo o bem de seu
corpo até que se torne uma casca degradada de quem já foi.
Então, não entendi como não vi acontecer. — Bati no meu
peito. — Não podia aceitar que passei quatro anos com uma
pessoa que era capaz de fazer uma coisa tão hedionda o
tempo todo, então tinha que ser porque perdi alguma coisa. A
alternativa era muito pior. Se não a vi em você, como o veria
em outra pessoa? Isso significava que ninguém era confiável.

Fiz uma pausa e balancei minha cabeça. — Sabia que


quando está procurando algo, sempre olha da esquerda para
a direita? Você nunca começa a examinar uma sala do lado
direito. E quando outro homem chega perto de você, mesmo
um cara que está passando e que não esteja lhe prestando,
você endireita os ombros. Devia ter sido um pavão, pelo
menos teria belas penas para exibir. Ah, e quando está
tomando uma bebida? Sempre a levanta para examinar
quanto resta antes de tomar o próximo gole. Passamos quatro
anos juntos e nunca percebi nada disso, mas assista a alguns
vídeos – ah, não sei, dez, talvez vinte mil vezes – e perceba as
coisas.
Peguei fiapos imaginários de minhas calças. — Sabe
como é difícil ver o rosto do homem que te estuprou no vídeo
repetidamente? Especialmente quando está rindo e se
divertindo neles, e percebe que ele provavelmente está rindo e
se divertindo agora também. Enquanto eu, eu tinha acabado
de vomitar meu jantar... de novo.

Respirei fundo novamente e estudei o rosto de Braden. O


que vi me fez sorrir. Tinha certeza de que o sorriso saiu tão
louco, mas não dei a mínima.

Toquei a pele do canto do meu olho esquerdo. — Você


apenas estremeceu. Foi muito leve, porque suponho que
tenha melhorado em esconder seus sinais ao longo dos anos,
mas eu vi. Esqueci de mencionar que, enquanto estudava
esses vídeos, também aprendi que você se sentiu
extremamente ameaçado por meu pai e por seu próprio pai.
— Apontei para o canto do olho. — É um pouco difícil de ver
hoje, cercado por todo esse preto e azul e hematomas, mas
está aí. Está se sentindo ameaçado agora.

Braden falou com os dentes cerrados. — Não se iluda. O


músculo do meu olho provavelmente está danificado, o que
causa contrações involuntárias. Vou me certificar de observar
isso no meu processo civil contra o bandido que está
namorando, depois de me certificar de que ele está preso.

— Claro, é isso. — Sorrio e olhei para minhas unhas. —


De qualquer forma, só queria que você soubesse mais
algumas coisas. Primeiro, arruinou a minha vida por seis
anos. Eu me culpei por não ver coisas em você, e por causa
disso mantive distância de qualquer pessoa com quem
pudesse ter uma conexão real. Tive medo de que ter
sentimentos novamente me tornasse cega para ver a verdade
sobre uma pessoa, como aconteceu com você. Confiei em
você. Mesmo quando soube que estava me seguindo e
mentindo sobre isso, ainda confiei em você o suficiente para
abrir a porta da minha casa e deixá-lo entrar naquela noite
para conversar. Senti-me mal por magoá-lo, embora não
tivesse feito nada de errado em nosso relacionamento.
Quando se recusou a parar, isso fez mais do que quebrar
minha confiança em você. Quebrou minha confiança em
todos os homens – inferno, quebrou minha confiança na
humanidade. Você foi meu primeiro, Braden. O meu primeiro
namorado sério, a minha primeira experiência sexual, meu
primeiro tudo. Os primeiros são onde aprendermos coisas
para o nosso segundo e terceiro. E aprendi coisas que
nenhuma mulher deveria aprender. Você arruinou minha vida.

Eu estava com a adrenalina alta desde que entrei, mas


agora sentia que a queda inevitável estava começando a criar
raízes. Sabia então que era hora de ir. De pé, alisei minhas
calças e olhei para o rosto que assombrou meus sonhos por
tantos anos. Era apropriado que estivesse espancado e
machucado.

— Adeus, Braden.

Quase cheguei à porta quando gritou atrás de mim. — É


isso? Você não vai nem implorar por clemência para o seu
namorado?

Voltei. — Implorei para você parar uma vez, então já sei o


que acontece. Pouparei o meu fôlego para orar pelos outros
sobreviventes. Porque tenho certeza de que não sou a única
para quem fez isso.

O canto do olho se contraiu e sua mandíbula se


contraiu.

— Foi o que pensei — disse. — Apodreça no inferno,


estuprador.
CAPÍTULO 34

Donovan

Dez dias se passaram desde que vi Autumn pela última


vez. Ela enviou uma mensagem uma vez e disse que estava
bem, mas precisava resolver algumas coisas sozinha. Ficou
claro rapidamente porém que uma das coisas que precisava
resolver era eu.

Era a terça-feira após o Dia do Trabalho – o dia que eu


esperava há meses, e que agora temia.

— Você vem? — Trent enfiou a cabeça pela porta do meu


escritório.

— Preciso?

Ele sorriu tristemente. — Não, mas se passará por isso,


precisa começar a manter sua cabeça erguida e enfrentar as
consequências.

Suspirei e joguei minha caneta sobre a minha mesa. —


Tudo bem.

Pegamos o elevador juntos até o andar executivo. O


“anúncio” dos nomes dos novos sócios era sempre feito na
sala de conferências, antes de estourar o champanhe, mas as
pessoas prestes a serem nomeadas foram informadas antes
do Dia do Trabalho, porque tiveram que preencher um cheque
enorme para comprar formalmente a parceria. Nem preciso
dizer que meu telefone não tocou no fim de semana.

Trent deu um soco no meu braço quando o elevador


parou. — Queixo para cima, amigo.

Enfiei minhas mãos nos bolsos. — Pode deixar.

A sala de conferências do décimo quarto andar estava


lotada de pessoas, então tivemos que ficar no corredor, o que
me deixou aliviado. Juliette estava apertada perto da porta,
juntamente com outras sardinhas. Quando nos viu,
caminhou até nós. Ela deu uma olhada no meu rosto e
franziu a testa.

— Você ainda não ouviu falar dela?

Neguei com a cabeça. Era muito engraçado estarmos de


pé e esperando pelo anúncio de que alguém além de mim
tinha se tornado sócio, e Juliette sabia que não era esse o
motivo da minha cara feia.

Ela esfregou meu braço. — Ela vai mudar de ideia.

Eu poderia dizer pelo rosto de Juliette que nem mesmo


ela acreditava no que estava dizendo, mas era uma boa amiga
e eu não tinha energia para discutir de qualquer maneira.

— Obrigado.

Pelos próximos vinte minutos, fiquei parado enquanto


anunciavam os nomes dos novos sócios. Mantive meus olhos
fixos à frente, embora sentisse outros observando para ver
como eu reagiria. Quando finalmente acabou e as primeiras
garrafas de champanhe foram abertas, me inclinei para Trent.
— Vou sair daqui.

Ele deu um tapa no meu ombro. — Sim, claro. Fez o que


tinha que fazer. Não há razão para prolongar a tortura. Pedir
o jantar às sete?

Balancei minha cabeça. — Vou encerrar o meu dia, na


verdade. — Sorrio sem entusiasmo. — Um dos benefícios de
sair do caminho da sociedade – não importa se dedicar
quatorze horas todos os dias.

Trent acenou com a cabeça. — Pega leve, amigo.

Lá fora, na rua, respirei fundo e afrouxei a gravata. O ar


estava sufocante lá em cima, mas sabia que se fosse para
casa a essa hora, acabaria bebendo para entorpecer meus
pensamentos. Então decidi ir para a casa de Bud. Falei com
ele algumas vezes, mas não fui vê-lo desde o fim de semana
em Connecticut.

Eu o encontrei na garagem com uma trena dobrável


pendurada em seu gesso e uma serra ao seu lado na mesa.

— Que diabos está fazendo?

— Tenho essa maldita coisa presa. Preciso serrar porque


continuo batendo na merda enquanto caminho.
Rio e me aproximei para examinar o que diabos estava
acontecendo. — Para começar, por que está aí?

— Tive uma coceira. Estou suando nessa coisa e está


fazendo minha pele coçar como o inferno.

— Tentou puxá-la para fora?

— Oh, essa é uma ótima ideia. Gostaria de ter pensado


nisso. — Revirou os olhos. — O que acha, que sou um idiota?
Claro que tentei puxá-la – está presa.

— Deixe-me tentar antes de serrar.

Demorou cerca de dez minutos e um pouco de azeite


para lubrificar, mas tirei a coisa.

Bud balançou seu braço. — Não sei se conseguirei


aguentar as oito semanas que querem que eu mantenha essa
coisa.

— Leve-o dia após dia e faça o melhor que puder.

Bud sorriu. — Acredito que essa foi a minha fala para


você durante metade da sua vida.

Concordei. — Verdade.

Entramos na casa e Bud apontou para o regador que


tinha desde que eu era criança. — Ajude-me com as de
dentro, sim? Se usar a outra mão, derramo metade da água
no chão. Se usar a mão com o gesso, escorre pelo meu braço
e me deixa com coceira.
— Por que não se senta e relaxa. Vou aguar todas elas.

Bud puxou um banquinho do outro lado do balcão


enquanto enchia o regador. — Alguma novidade sobre as
acusações em Connecticut?

Balancei minha cabeça. — Nah. Preenchemos alguns


papéis e solicitamos uma conferência, mas não espero ouvir
nada por algumas semanas, pelo menos.

Ele assentiu. — As coisas com Autumn estão bem?

Fiz uma careta. — Ela nem quer falar comigo.

Os meus olhos encontraram os de Bud antes de começar


a regar seu milhão de plantas caseiras. Ele ficou quieto por
um tempo, o que não me surpreendeu. Bud não era um
homem que falava para preencher o silêncio.

— Aposto que ela está sofrendo.

Como se eu não me sentisse uma merda o suficiente. —


Claro que ela está sofrendo. E isso é minha culpa.

— Pode ser. — Encolheu os ombros. — Deixe-me


perguntar uma coisa porém. Não acha que ela provavelmente
estaria sofrendo só de encontrar o cara? Mesmo que você não
tivesse balançado tudo?

— Sim. Devia ter visto a sua aparência quando ele se


aproximou – como se ela tivesse visto um fantasma. O que
aconteceu pode ter sido há seis anos, mas foi há dois
segundos naquele momento.
— Ok... então vamos dizer que lidou com as coisas de
forma diferente. Ela provavelmente ainda estaria um pouco
nervosa por um tempo. O que você faria sobre isso?

— O que quer dizer com o que eu faria sobre isso?


Falaria com ela, ouviria tudo o que quisesse dizer. Não sairia
do seu lado, porra, se isso a fizesse se sentir melhor.

— Ok... E ainda assim você está aqui e não na casa dela


esta noite.

Terminei de regar uma samambaia que provavelmente


tinha a minha idade e coloquei o regador no chão. — Ela não
acredita que a violência seja justificada. Não quer falar
comigo.

— E em que você acredita?

— Acredito que o cara merece muito pior do que causei a


ele, mas isso não vem ao caso. Não era minha escolha a fazer.
Cometi um erro.

Bud sorriu. — Droga. Por que não podia ser tão fácil
fazê-lo admitir as coisas quando era adolescente?

Suspirei. — Pensei que tinha superado essa merda. Eu


cresci.

— Não tenho certeza se teria feito algo diferente no seu


lugar, filho. Este não é o caso de se entrar em uma briga por
causa da merda idiota que costumava brigar. Um homem
machucou sua mulher – um homem que nunca recebeu o que
merecia – e você queria mudar isso. A violência pode nunca
ser justificada, mas às vezes parece muito com justiça. — Os
olhos de Bud encontraram os meus. — Acho que você está
apaixonado por Autumn?

Concordei. — Nunca tive certeza se estava apaixonado


antes, mas agora percebo que quando se está, você sabe
muito bem disso.

— Lembra-se na oitava série, quando teve problemas por


interromper alguma aula de matemática avançada que o
colocaram, e o orientador te disse para simplesmente
abandonar a aula porque você não seria capaz de lidar com o
trabalho de qualquer maneira?

— Sr. Schultz. O homem tinha o pior hálito.

— Você abandonou a aula?

— Não, tirei cem em todos os testes.

— E o que fez com estes testes quando os recebeu de


volta?

— Coloquei cada um deles debaixo da porta de Schultz.


Não seria capaz de lidar com o trabalho, uma ova.

— E quando ficou desapontado por ter superado apenas


noventa e nove por cento de todas as pessoas que fizeram
aquele teste que teve que fazer para entrar na faculdade de
direito, sugeri que talvez devesse se inscrever em alguma
outra faculdade de direito além de Harvard, apenas para estar
seguro?

Dei de ombros. — Refiz o LSAT55 e tirei a nota perfeita.


Entrei em Harvard então.

— Está sentindo um padrão aqui, filho?

— Que eu não escuto?

Bud sorriu. — Bem, sim. Isso é definitivamente verdade,


mas não é esse o meu ponto desta vez. Você não desiste
quando quer algo. Durante toda a sua vida, encontrou
obstáculos e encontrou uma maneira de contorná-los.

— OK...

Bud balançou a cabeça. — Jesus, às vezes pode ser tão


idiota. Você está apaixonado por essa garota. Cometeu um
erro. Não deixe o erro ganhe. Conserte-o. Encontre uma
maneira de contornar. Não fique sentado torcendo para que
tudo dê certo.

♥♥♥

Durante todo o caminho de volta para Manhattan, fiquei


pensando no que Bud havia dito. Havia uma diferença entre
dar espaço a Autumn e sentar-se à margem. Estraguei tudo e
precisava assumir, mas também precisava ter certeza de que
ela sabia que eu não iria a lugar nenhum, e a maneira de
fazer isso, com certeza, não era por texto e correio de voz;
então, quando saí da ponte, virei para o centro em direção à
sua casa, em vez de ir para a parte alta em direção à minha.

Quando encontrei uma vaga para estacionar, eram quase


nove horas. Eu ainda não tinha ideia se estava fazendo a
coisa certa, mas o quanto pior poderia fazer agora? Respirei
fundo, caminhei até a porta e toquei a campainha do seu
apartamento.

Eu sabia que ela tinha um aplicativo onde podia ver e


ouvir quem estava na porta antes de permitir a entrada, então
enquanto estava lá e esperei para ouvir o som da fechadura
da porta abrindo, olhei para o canto e olhei para a câmera.

Vamos, Red. Deixe-me entrar.

Um minuto se passou e meu peito começou a ficar


pesado. Ela pode estar dormindo ou talvez até mesmo ter
saído, mas também pode estar fingindo que não está em casa
para me evitar. Como vim até aqui, toquei uma segunda vez e
olhei para a câmera.

— Autumn, só quero conversar. Vai me deixar subir? Ou


desça se não me quiser aí dentro. Não vou demorar, prometo.
Só preciso dizer algumas coisas e te deixarei em paz.

Mais uma vez, esperei. Os minutos que passaram foram


extenuantes. Decidi que esperaria cinco minutos, no início,
desde que lhe pedi para descer, e ela poderia esperar o
elevador ou algo assim, mas depois de cinco minutos,
justifiquei que isso pode não ser longo o suficiente.

Será que estava dormindo e precisava se vestir? Ou


precisava ir ao banheiro e depois se vestir?

Dez. Esperarei dez minutos. Cinco foi muito apressado.

Eu ainda não estava pronto para desistir contudo, após


seiscentos segundos.

O seu elevador é muito lento. Melhor esperar quinze.

Sim, quinze. Quinze se transformaram em vinte e vinte se


transformaram em meia hora. Parecia que estava com um nó
na garganta quando me virei para sair. Dei alguns passos,
então parei e me virei.

Foda-se. Se essa fosse a única maneira de ela me ouvir,


precisava aproveitar a oportunidade. Então, apertei a
campainha mais uma vez e olhei para a câmera.

— Autumn, sei que leu as minhas desculpas. E sinto


muito pelo que fiz, mas não sei por quanto tempo essa coisa
grava, então vou mergulhar nas coisas que não disse. —
Passei a mão pelo cabelo, tentando encontrar uma maneira de
expressar como me sentia. — Desde criança, queria mais do
que tinha – mais dinheiro, mais respeito, mais roupas, mais
reconhecimento, mais família, apenas mais. Até você entrar
na minha vida. Agora, nenhuma dessas coisas parece
importante. Não preciso de mais dinheiro, de mais
reconhecimento, de mais nada. Tudo que preciso é você.
Olhando para trás, há um ano achava que sabia de tudo, mas
a verdade é que não tinha ideia do que era amor, mas
finalmente descobri. O amor é suficiente. Nenhuma das
outras coisas é importante quando se encontra a pessoa
certa. Você está no meu coração, Autumn – inferno, você é a
dona do meu coração. Por favor, não se esqueça disso. —
Lágrimas encheram meus olhos e de repente me senti muito
exausto. Olhei para a câmera uma última vez. — Espero que
você esteja bem.

Decidi fazer uma caminhada para clarear um pouco a


cabeça antes de voltar ao volante. Depois de dois quarteirões,
passei por um bar e decidi entrar. Estava escuro e triste lá
dentro, então parecia encontrei o lugar certo. Sentei-me no
bar ao lado de um homem mais velho, que estava curvado
sobre sua bebida.

Ele olhou, então levantei meu queixo. — Ei.

— Ei, você — resmungou, não muito acolhedor.

Quando o barman apareceu, pedi uma cerveja primeiro.


— Preciso de algo mais forte, na verdade.

— O que você quer?

Balancei minha cabeça. — Eu não me importo. Algo


forte.

O velho ao meu lado franziu a testa. — Bourbon – faça


dois, um para mim.
Sorrio para o barman. — Dois bourbons, por favor.

O líquido âmbar queimou ao descer, embora o cara ao


meu lado não pareceu notar. Ele engoliu três dedos da bebida
como se fosse nada.

— A sua geração é mole — zombou.

Rio para mim mesmo. Ele não estava errado. Sobre a


maioria das pessoas, pelo menos. Embora gostasse de pensar
que era um pouco diferente da maioria das pessoas nascidas
no mesmo ano. Concordei. — São os troféus.

O rosto do velho enrugou-se. — O que é um troféu?

— Você sabe, estátuas de metal, ou hoje em dia são


quase todas de plástico, tenho certeza. As crianças ganham
quando praticam esportes e outras coisas.

— Oh, um troféu.

— Foi o que eu disse.

— Achei que havia algum novo significado que não


conhecia. O que um troféu tem a ver com o fato de serem
moles?

— Bem, em sua geração, havia apenas um troféu. Era


para o time vencedor. Hoje em dia, as crianças ganham
troféus ao terminar uma temporada – apenas por terminar.
Até o último colocado ganha um troféu.
O velho pensou a respeito e acenou com a cabeça. — Isso
é simplesmente estúpido.

Terminei o líquido em meu copo. O terceiro gole caiu tão


forte quanto o primeiro. Balancei o gelo, sacudindo-o. —
Como você bebe isso? Tem um gosto terrível e queima.

Ele sorriu. — Eu nunca tive a porra de um troféu.

Rio e levantei meu queixo para o barman. — Outra


rodada para mim e... — Olhei para o velho.

— Fred.

Concordei. — Para mim e Fred.

Sentei-me ao lado do meu novo amigo, nas horas


seguintes, e bebi muitos bourbons. Descobri que Fred não
gostava da geração do milênio porque tinha um neto mais ou
menos da minha idade que o havia desconvidado para uma
festa que estava dando neste fim de semana e não atendia
suas ligações. — Ele queria que eu fosse a uma festa de
revelação de sexo. Quem diabos dá uma festa e faz um bolo
para descobrir o sexo do bebê?

— A verdade, muitas pessoas fazem isso hoje em dia.

Fred franziu a testa e balançou a cabeça. — Como eu


disse, mole.

Sorrio, bebendo o meu terceiro bourbon com gelo. Estava


começando a me atingir agora, o que era ótimo.
— A minha época, os homens nem esperavam no
hospital para saber o que estavam tendo. Apenas deixávamos
a mulher e íamos para casa dormir um pouco. Se casasse
com uma garota legal, ela não ligaria para você até de manhã
para dizer o que teve, para que você pudesse descansar.

Rio. — Tenho quase certeza de que isso não funcionaria


com as mulheres hoje.

Ele me dispensou, resmungando.

Um pouco depois, me levantei para ir ao banheiro e


tropecei. Merda. Estava mais bêbado do que pensava. Fui me
aliviar e pretendia fechar minha conta, mas quando voltei,
Fred havia me comprado uma rodada, para variar.

Ele inclinou seu copo em minha direção. — Você não é


tão ruim para uma daquelas crianças do alfabeto. Nunca
consigo me lembrar quais são as idades para a geração X, Y
ou Z.

Sorrio. — Obrigado.

— Por que está sentado neste lugar deprimente então,


tentando beber mais que um velho profissional como eu?

— Problemas femininos.

Fred segurou seu copo em minha direção para tilintar. —


Mulheres fodidas. Tem que ter cuidado com elas, são
perigosas. Você conhece algum outro animal que pode obter
suco de uma noz sem quebrá-la?
Rio tanto que caí da cadeira. Fred ofereceu a mão para
me ajudar a levantar do chão. O seu aperto era muito forte
para um cara que devia estar chegando aos oitenta.

Assim que me levantei, coloquei a mão em seu ombro. —


Muito obrigado, amigo. Isso era exatamente o que eu
precisava.

— Cair no maldito chão?

— Nah. Não ser capaz de ficar em pé.

Disse que sairia, mas Fred me convenceu a beber mais


um. Aquela última bebida acabou comigo. Passei de bêbado
feliz a me sentindo muito infeliz por causa de Autumn
novamente. De jeito nenhum voltaria para casa no meu
estado, então comecei a ir em direção ao trem, pensando em
pegar meu carro amanhã, mas em algum momento, mudei e
voltei para a casa de Autumn. Não tinha ideia de que horas
eram, mas devia ser depois da meia-noite quando toquei.

— Autumn... sou eu. — Olhei para a câmera e apontei


para meu rosto. — Por favor, me deixe entrar.

Quando alguns minutos se passaram e ela não


respondeu, comecei a sentir raiva. O que deveria ter feito era
ir para a maldita casa, mas em vez disso, toquei novamente.

— Autumn, vai falar comigo?

Sem resposta. Estava magoado e triste e muito frustrado.


Toquei novamente, e então olhei para a câmera. — Sabe qual
é o seu problema? Você tem um maldito troféu. Ninguém
precisa trabalhar muito para conseguir um troféu só por
aparecer, mas a vida é difícil, Autumn. — Inclinei minha
cabeça contra a porta e murmurei. — A vida é difícil “pra”
caralho. — Fechei os olhos e acho que posso ter começado a
adormecer ali. Depois de um minuto, forcei meus olhos a
abrirem e empurrei a porta. Estava bêbado, emocionalmente
esgotado e cheio de tanta raiva reprimida que espancar
aquele idiota nem começou a me acalmar. A minha raiva não
era dirigida à Autumn, embora em minha névoa de bêbado,
ataquei qualquer um. Levantei meu dedo médio para a
câmera. — Foda-se tudo!
CAPÍTULO 35

Donovan

Acordei com o tremor de um vagão do metrô às seis da


manhã. Merda. Eu levantei minha cabeça. Onde diabos
estava? A mulher a minha frente me olhou feio e colocou o
braço em volta do filho.

— Desculpe.

Ela desviou o olhar.

O que diabos aconteceu noite passada? Lembrei-me dos


anúncios de sócios no escritório e de ir visitar Bud, mas tudo
depois disso ficou um pouco embaçado.

Oh, espere. Fui até a casa de Autumn, mas ela não


estava em casa. Vaguei então em algum bar.

O trem parou em uma estação. Não era a minha, mas


precisava de um pouco de ar fresco, então saltei e subi as
escadas cerca de oitocentos metros do meu apartamento.
Quando cheguei ao topo, um sem-teto estava sentado ao lado
da entrada. Isso estimulou minha memória um pouco mais.

Fred. Bebi um uísque nojento com um cara chamado


Fred no bar por algumas horas. Houve então uma parada
beligerante no apartamento de Autumn, que terminou comigo
apontando o dedo para a câmera de segurança. Depois disso,
a caminho da estação de trem, um morador de rua me pediu
dinheiro. Estava sentado do lado de fora de uma loja de
bebidas, então entrei e comprei um monte daquelas
garrafinhas que servem nos aviões e me sentei ao lado.
Bebemos cada uma das garrafas juntos. Não admira que me
sinta uma merda. Não tinha certeza, mas acho que posso ter
chorado em um ponto. Ótimo. Simplesmente ótimo. Está
realmente se recompondo quando Autumn precisa de você,
Decker.

Parei, no caminho para casa, em uma delicatesse e


comprei suco de laranja e Motrin. Quando cheguei ao meu
apartamento, estava pronto para dormir por algumas horas.
Não tinha ideia de quanto tempo havia dormido no trem, só
que não era o suficiente. Parecia que poderia desmaiar e não
acordar por dias. Eu até me inclinei contra a parede do
elevador enquanto subia até o meu andar.

Feliz por estar perto de um pouso forçado em minha


cama, saí do elevador com minha cabeça baixa e minha
mente em uma névoa espessa, mas alguns passos pelo
corredor e parecia que alguém tinha colocado desfibrilador no
meu peito e me acordou com um solavanco.

Eu tinha adormecido no elevador e estava sonhando?

Os meus passos, que na melhor das hipóteses estavam


pesados, de repente aumentou enquanto eu caminhava pelo
corredor. E meu coração seguiu direto.
Autumn estava sentada no chão ao lado da minha porta
olhando para seu telefone, mas se levantou assim que me viu.

— Ei, desculpe por parar sem ligar — disse.

— Você nunca precisa ligar primeiro.

Ela me olhou de cima a baixo. As minhas roupas


estavam uma bagunça amassada e tenho certeza de que meu
rosto estava coberto de barba por fazer. — Você ficou... fora a
noite toda?

Concordei. — Fui à sua casa. Você não estava em casa,


então parei em um bar a alguns quarteirões de distância e
bebi um pouco demais. Acordei no metrô.

— Isso não soa como você.

Soltei um suspiro profundo. — Aparentemente, não


tenho agido muito como eu mesmo ultimamente.

Autumn acenou com a cabeça. — Fiquei na casa de Skye


ontem à noite.

Ela parecia cansada, embora ainda fosse absolutamente


linda. Os seus olhos verdes estavam inchados e tinham
pequenas listras vermelhas neles, e sob seus olhos estavam
escuros e vazios.

— Você está bem? — Perguntei.

— Sim. Acha que podemos conversar?


— Claro. — Destranquei a porta do meu apartamento e
abri para ela passar primeiro. Ela foi direto para a sala.

Joguei minhas chaves no balcão da cozinha adjacente. —


Quer café?

— Adoraria.

Peguei o pó do armário e agarrei a cafeteira para encher


de água, mas tive que limpar minhas palmas em minha calça
para abrir a vasilha porque estava uma bagunça pegajosa de
tanto nervosismo. Assim que apertei o botão para começar a
preparar, disse a Autumn que voltaria já e fui ao banheiro
para me lavar e escovar os dentes antes de voltar para encher
duas canecas.

— Aqui está.

Ela se sentou na cadeira, não no sofá, que analisei


demais em minha cabeça como um mau sinal. Na lei, a
cadeira que um cliente ou advogado seleciona costuma dizer
muito sobre a pessoa ou sua posição de poder. Autumn,
sentada para manter distância entre nós, me incomodou.

Nós dois ficamos em silêncio enquanto me sentava. Ela


olhou para o chão, enquanto a observava atentamente.
Eventualmente, não aguentei e falei. — Você está dormindo?
Parece cansada.

Os seus olhos se ergueram para encontrar os meus. —


Entre idas e vindas. Parei de tomar o Ambien completamente
há alguns dias. Pesquisei e a insônia é comum depois que
para. O meu corpo está basicamente passando por
abstinência após anos de uso.

— Você dormiu muito bem na noite em que fiquei e se


esqueceu de tomá-lo.

Ela sorriu tristemente. — Acho que foi porque você


estava na minha cama.

Sorrio de volta. — Bem, se puder ajudar... Dormir é


importante, sabe.

O seu sorriso foi mais genuíno desta vez. Ela tomou um


gole de café e o colocou sobre a mesa. — Quero contar-lhe
algumas coisas sobre o que aconteceu há seis anos. Eu lhe
disse as partes que achei que precisava saber, mas não fui
exatamente aberta sobre como lidei com as coisas depois.

As minhas sobrancelhas franziram. — OK...

Ela respirou fundo. — A verdade, não fui à polícia duas


semanas depois que Braden me estuprou. Quer dizer, falei
com eles, mas não aconteceu da maneira que fiz você
acreditar. Eles realmente vieram até mim. — Autumn olhou
para cima e encontrou meus olhos. A dor nadando neles
causou uma dor aguda em meu peito. — Vieram porque eu
tinha tentado me suicidar. O meu pai me encontrou
inconsciente e ligou para o 9-1-1. Depois que tiraram a droga
do meu sistema e meus sinais vitais estavam estáveis, uma
policial me persuadiu a lhe contar o que aconteceu.
Senti o gosto de sal na garganta e engoli. Estendendo a
mão, peguei sua mão e apertei e não a soltei.

Ela tentou forçar um sorriso antes de continuar. — Fui à


minha médica regular e disse a ela que tinha problemas para
dormir, e ela me deu uma receita para Ambien. Pesquisei que
seriam necessários muitos comprimidos para uma overdose –
mais do que eu tinha, a menos que os mastigasse e os
forçasse na minha corrente sanguínea de uma vez. —
Respirou fundo novamente. — Então, coloquei o conteúdo do
frasco no meu Magic Bullet56 e cheirei o pó. — Riu, mas não
de um jeito engraçado. — Nunca tinha usado cocaína na
minha vida. As minhas primeiras linhas brancas foram
Ambien.

Jesus Cristo. Só queria envolvê-la em meus braços e


segurá-la, mas a sua linguagem corporal me disse que não
era a coisa certa a fazer. Eu também suspeitei que essa
revelação não era a única coisa que queria compartilhar...

Balancei minha cabeça. — Não importa como notificou.


O que importa é que você está saudável e sobreviveu.

— Pensei que tinha conseguido passar por isso, também.


Estava honestamente começando a sentir que estava
seguindo em frente e o passado estava para trás, mas não
estava. Poucos dias depois de encontrarmos Braden, comecei
a entrar em espiral novamente. Aquele animal estava
andando por aí como se nada tivesse acontecido, e eu aqui
não conseguia dormir e comer de novo, e você foi preso. Senti-
me muito mal. Uma noite, peguei o frasco de Ambien na mão
e fiquei sentada com ele por uma hora, olhando-o. — Autumn
olhou para baixo. — Nunca pensei em tomá-los de novo, mas
percebi que tinha muito com que lidar. Não lidar totalmente
com as coisas da última vez só piorou. Eu precisava me
colocar no estado de espírito certo. Não queria acabar em um
lugar ruim novamente. Então, fui à minha terapeuta algumas
vezes. Conversamos muito sobre o encerramento, e então... —
respirou fundo novamente e olhou nos meus olhos. — Fui ver
o Braden.

Quando meus olhos se arregalaram, ela balançou a


cabeça e as mãos.

— Não... não entre em pânico. Fui vê-lo em seu escritório


lotado e o fiz deixar a porta aberta. Sempre estive segura.

Embora estivesse aliviado, ainda não conseguia respirar


muito bem. — O que aconteceu?

— Ele foi malicioso e achou que eu estava usando uma


escuta tentando gravá-lo admitindo algo – exatamente o que
eu esperava, mas não fui lá para conseguir nada dele. Fui por
mim mesma, porque precisava dizer algumas coisas para ele.
— Balançou a cabeça. — Eu nem me lembro de tudo que
disse, mas queria que ele soubesse que arruinou muitos anos
da minha vida e me fez não confiar em ninguém ou em mim
mesma, quanto dano tinha causado - não que ache que ele se
importe, mas precisava olhar nos olhos dele e chamá-lo de
estuprador. — Sorriu. — Eu também lhe disse para apodrecer
no inferno, o que, surpreendentemente, foi mais catártico do
que o resto das coisas que disse.

Sorrio. Ela estava carregando o peso das escolhas de


outras pessoas em seus ombros por muito tempo, e eu estava
muito orgulhoso dela por ter se livrado disso. — Bom para
você.

— O seu rosto estava uma bagunça. Você fodeu bem com


ele. — Os cantos de seus lábios se contraíram, mas
rapidamente olhou para baixo novamente. — Odeio violência.
Não apenas por causa do que aconteceu comigo, mas também
por causa de todas as crianças com quem trabalho. Nunca
resolve nada, e só cria novos problemas.

— Eu sei. E fiz um monte de novos. Sinto muito,


Autumn. Realmente sinto.

Ela se aproximou e baixou a voz. — Posso te contar outro


segredo?

Concordei. — Claro.

— Eu não sinto muito, então você também não deveria


sentir.

O meu coração deu um salto, mas ainda estava com


medo de ter muitas esperanças. — Mesmo?

Acenou com a cabeça. Desta vez, foi ela quem apertou


minha mão. — Desculpe, eu o afastei. Só precisava de um
tempo para resolver as coisas. A verdade, parece que estou
dizendo que terminei de trabalhar com elas. Tenho certeza
que não, mas acho que finalmente comecei. Não posso
prometer que a proximidade não vai me assustar, ou que não
farei algo estúpido como fugir de novo, mas se me quiser, eu
gostaria de tentar.

— Se eu te quiser? — Estendi a mão e a puxei para fora


de sua cadeira para o meu colo. — Querida, tente se livrar de
mim.

Ela sorriu. — Você quis dizer o que disse em seu correio


de voz?

— O que foi que eu disse?

Autumn mordeu o lábio. — Que me ama.

— Você se assustaria se a amasse?

— Não. — Ela se inclinou mais perto para que


estivéssemos nariz com nariz. — Sabe por quê?

— Por quê?

— Porque eu também te amo.

O sorriso maior e mais idiota tomou conta do meu rosto.


— Eu te amo, “pra” caralho.

Ela deu uma risadinha. — Pra caralho, hein? Isso é


equivalente a muito?
Peguei seu rosto em minhas mãos e esmaguei meus
lábios com os dela. Quando separamos para respirar, sorri. —
Totalmente o suficiente.

As suas sobrancelhas baixaram. — Suficiente? Não quer


mais beijos?

Sorrio. — Oh não, quero mais beijos. A sua campainha,


por acaso, guarda os vídeos que grava quando alguém toca?

Ela acenou com a cabeça. — Por um mês ou até excluí-


los, por quê?

— Pode assistir mais tarde e descobrir o que quis dizer


com o suficiente.

Fui beijá-la de novo e então me dei conta de que não


finalizei professando meu amor por ela naquele vídeo da
campainha e dizendo que ela bastava. Voltei bêbado e
agressivo. Merda. — Posso pegar o seu telefone, na verdade,
emprestado por um segundo? Preciso ver aquele app...

♥♥♥

Saí para nos arranjar um jantar, naquela tarde, e fiz


uma parada inesperada. Enviei uma mensagem para Autumn
para que não se preocupasse por ficar fora por mais de quinze
minutos, que deveria ser o tempo para pegar comida chinesa
dois quarteirões adiante.
— Estava ficando preocupada. — Autumn ergueu os
olhos de seu laptop quando finalmente voltei. Estava sentada
com as pernas nuas e os pés para cima no sofá. — Você está
fora há quase duas horas e meia.

Coloquei a sacola de comida no balcão da cozinha e me


aproximei para beijá-la. — Desculpe.

Ela fechou o laptop. — Achei que falar com plantas fosse


uma velha história. É uma coisa real.

Sorrio. — Mergulhou fundo na conversa com as plantas


enquanto estive fora?

Ela encolheu os ombros. — Pensei que estava


inventando.

Voltei para a cozinha e desembrulhei os recipientes de


papelão com comida. — Não, mas admito, quando Bud me
disse que falava com elas, pensei que ele estava louco. Eu
mesmo pesquisei.

Autumn entrou na cozinha. Sentou-se na ilha em frente


a mim. — Assisti a um episódio inteiro de Mythbusters sobre
isso. Eles montaram várias estufas lado a lado. As estufas
silenciosas realmente mostraram a menor quantidade de
crescimento de plantas.

— Oh, sim?

Ela acenou com a cabeça e tirou um rolinho de uma


sacola. — Estou faminta.
Rio. Poderia dizer. Você nem esperou eu pegar os pratos
ou talheres.

Ela sorriu e cobriu a boca. — Desculpe.

— Estou brincando. Vamos comer das caixas e


compartilhar.

— Ok. — Ela terminou de mastigar e estendeu o rolinho


para mim. — Então, por que você demorou tanto, afinal?

Dei de ombros. — Tinha que consertar algo.

As suas sobrancelhas se juntaram. — Muito vago? Dê


uma mordida e me devolva esse rolinho.

— Uau, é mandona quando está com fome.

Ela estendeu sua mão. — Morda ou devolva.

Eu dei uma mordida e entreguei.

— O que consertou?

Apontei para meu braço esquerdo. — Uma tatuagem.

Ela riu. — Tá brincando né?

Empurrei minha manga e lhe mostrei o curativo. Um


pedaço de gaze foi esticado sobre a área, seguido por uma
cobertura de plástico transparente. — Não.

— Você decidiu aleatoriamente consertar uma tatuagem


no caminho para pegar nossa comida chinesa? Que
tatuagem?

— O pássaro.

— Aquele na jaula que fez quando tinha dezesseis anos?


Eu adoro essa. Foi muito significativo e pude me identificar
com o que estava sentindo no momento em que fez.

— Também podia, mas as coisas mudam.

— Não entendo.

Retirei lentamente o plástico do antebraço e levantei a


gaze. A tatuagem original era um único pássaro pequeno e
preto sozinho em sua gaiola. Jimmy da Dark Ink tinha feito
algumas das minhas tatuagens ao longo dos anos, por isso
sabia que o que queria seria uma solução fácil. Ele modificou
uma das barras e a transformou em uma porta, e agora a
gaiola estava aberta. Eu também o fiz adicionar um segundo
pássaro do lado de fora da porta.

— É colorida! — Autumn sorriu. — Pensei que havia me


dito que não achava nada importante o suficiente para ser
colorido.

— Não achava. Até agora.

— Uau. Bem, é linda. Antes era tão solitário, um pássaro


preso em uma gaiola, mas agora quase parece que o
passarinho vermelho está levando o outro para fora.

Sorrio. — Ela está.


— Ela? O pássaro vermelho é ela?

Concordei. — Ela é você, Red.

Observei o rosto de Autumn enquanto olhava para o meu


braço. Ela estava sorrindo e brincando, e seu rosto de repente
caiu. Perguntei-me se talvez fosse muito cedo e a tinha
assustado. Quando os seus olhos se encheram de lágrimas,
pensei que poderia realmente ter fodido tudo, mas então ela
se levantou e deu a volta no balcão.

Autumn se inclinou e beijou um pouco acima do topo da


bandagem que ainda estava parcialmente no lugar. — Amo. —
Olhou nos meus olhos. — E eu te amo, Donovan.

A minha cabeça caiu quando deixei escapar uma forte


rajada de ar. — Jesus. Graças a Deus. Achei que ia te
perturbar.

— Perturbar-me? Deus, não. — Colocou a mão sobre o


coração. — Só fiquei um pouco dominada pela emoção, só
isso. Amo-a e amo o que ela representa para você, embora
ache que entendeu ao contrário, Donovan. Você é o pássaro
vermelho que ajudou a abrir minha gaiola e me libertar, não o
contrário.

Inclinei minha testa contra a dela. — Era para ser assim,


Red. Sabe o que mais percebi há pouco?

— O quê?
— Você tem que assinar um formulário de autorização
quando faz uma tatuagem – pelo menos nos lugares legais
que vou agora. Não tinha ideia de qual era a data, então
perguntei ao cara atrás da mesa. Hoje é trinta de setembro.
Hoje faz um ano que você roubou minha bagagem.

— Mesmo?

Concordei.

— Tem certeza? Sei que a despedida de solteira foi depois


do Dia do Trabalho, mas não me lembro exatamente quando.

— Verifiquei a data na foto que tirei de você. Era a


manhã depois de termos ficado acordados a noite toda. A data
era primeiro de outubro.

— Uau. Então, um ano atrás, hoje. Parece que foi há


muito tempo. — Ela sorriu e colocou os braços em volta do
meu pescoço. — Está apaixonado por mim há muito tempo,
então.

Sorrio. — Corretamente, droga. Pode ter desaparecido de


mim, mas não conseguia parar de pensar em você. Por muito
tempo não consegui entender o porquê, mas tudo faz sentido
agora. Não podia deixá-la ir, porque eu não deveria.
Estávamos destinados a estar juntos.
EPÍLOGO

Autumn

Um ano depois

Chegamos ao restaurante alguns minutos mais cedo.


Donovan havia nos levou, embora normalmente andássemos
ou pegássemos o metrô para um lugar tão próximo, mas os
saltos altíssimos que usei para o nosso jantar de
comemoração não eram exatamente amigáveis.

— Oi — disse ao anfitrião. — Temos uma reserva para


seis pessoas às oito.

— Sobrenome, por favor.

— Provavelmente está como Decker.

Donovan se aproximou enquanto eu esperava. Colocou a


mão em volta da minha cintura e se inclinou para beijar meu
ombro nu.

— Sinto muito. — O maître balançou a cabeça. — Não


vejo uma reserva para Decker para as oito da noite.

Olhei para Donovan. — Era para as oito horas, certo?

— Está em seu nome. — Ele piscou para mim antes de


falar com o maître. — A reserva está no nome Wilde. Doutora
Wilde.

O homem examinou seu livro novamente. — Ah, sim,


aqui está. Dra. Autumn Wilde.

Revirei os olhos para Donovan, mas também não


consegui tirar o sorriso do meu rosto desde que chamaram a
Dra. Autumn Wilde na cerimônia de formatura de hoje.

Donovan sussurrou em meu ouvido. — Mal posso


esperar para chegar em casa mais tarde. Nunca comi uma
doutora antes. E esses saltos ficam quando arrancar este
vestido de você, doutora.

Assim como naquele dia fatídico em que nos conhecemos


em uma cafeteria para trocar bagagens há dois anos, um
friozinho na barriga. As coisas nunca ficaram entorpecidas
com este homem, e certamente não nos últimos doze meses.
Tanta coisa aconteceu, mas tudo isso nos tornou mais fortes.

Nas semanas que se passaram depois que fui ver


Braden, não conseguia parar de pensar na cara que ele fez
quando mencionei orar por suas outras vítimas. As
incontáveis horas que passei me torturando assistindo a
vídeos nossos depois que me atacou finalmente valeram a
pena. Soube naquele momento que não fui a única que ele
machucou. No início, apenas deixei isso me incomodar.
Afinal, estava tentando colocar essa parte da minha vida para
descansar e seguir em frente, mas finalmente, percebi que
isso era impossível. Se houvesse outras, poderia haver mais
no futuro, e eu não poderia viver comigo mesma se não
tentasse impedir que isso acontecesse. Então perguntei a
Donovan o que eu poderia fazer, e isso deu início a uma
cadeia de eventos que mudaria para sempre nossas vidas.

Donovan pediu a um investigador particular que usou


em muitos de seus casos no trabalho para bisbilhotar os
relacionamentos de Braden que vieram depois de mim ao
longo dos anos. Foi assim que descobrimos sobre Sarina
Emmitt, uma mulher que Braden namorou por um ano
depois de mim. O investigador falou com um dos colegas de
trabalho anteriores de Sarina e descobriu que duas semanas
antes de ela parar abruptamente e voltar para casa em Ohio,
apareceu para trabalhar em uma manhã de segunda-feira
com um olho roxo e disse às pessoas que tinha sido
assaltada. A sua amiga se perguntou se isso era realmente
verdade, porque ela parecia muito abalada, e alguns dos
detalhes de sua história não combinavam. O investigador
verificou a história com a polícia e não encontrou nenhum
assalto relatado. Então, arrisquei e reservei uma viagem para
Ohio.

Sarina negou veementemente, no início, que qualquer


coisa tivesse acontecido com ela, mas compartilhei minha
história e soube por seu rosto que ela estava mentindo. Fiquei
desapontada, mas não queria pressionar uma vítima. Deixei
meu número de celular então, e voei para casa no dia
seguinte. Vinte e três dias depois, ela ligou. Não conseguia
dormir desde que saí e estava pronta para contar sua
história. Essa ligação mudou tudo. Ao contrário de mim,
Sarina tinha evidências. Ela tinha uma campainha Ring, o
tipo que fazia vídeos de todos entrando e saindo, e salvou a
filmagem da noite que Braden a atacou – vídeo que incluía ela
atendendo a porta sem um olho roxo, e Braden saindo uma
hora mais tarde, com marcas de arranhões em todo o rosto.
Tinha até uma imagem dela saindo na manhã seguinte com
um olho roxo, embora ninguém mais tivesse entrado. Sarina
tentou lutar com Braden e perdeu. Estava em choque e
arrasada, mas de alguma forma, teve os meios para manter
suas roupas rasgadas, também.

Sarina e eu fomos juntas à polícia, de mãos dadas.


Braden foi preso três semanas depois e acusado de duas
acusações de estupro forçado em primeiro grau. E,
infelizmente, embora isso possa ter justificado ainda mais as
ações de Donovan, seu caso de agressão continuou
avançando – até que Cara, a agora ex-noiva de Braden,
apareceu para contar à polícia que Braden tinha realmente
começado a luta, e Donovan estava apenas se defendendo.
Aparentemente, ela teve um lampejo de dúvida sobre seu
noivo desde que viu meu rosto naquele dia. E depois de ouvir
a história de Sarina, não podia mais negar a verdade. Éramos
boas amigas na escola primária e ela queria me ajudar, o que
em sua mente significava contar uma mentirinha.

Não acho que o promotor acreditou nela, na verdade,


mas isso lhes deu um motivo para retirar as acusações contra
Donovan.

— Por aqui, por favor — disse o maître.


— Eu me pergunto se os outros já chegaram — pensei.

— Acho que vamos descobrir — disse Donovan.

Seguimos o maître pelo saguão e por um longo corredor.


Já estive no Tavern on the Green algumas vezes antes, mas
sempre estive sentada na sala de jantar principal. Viramos à
esquerda e depois à direita, e no final daquele corredor havia
um conjunto de portas duplas.

O maître, em vez de abri-las, parou e sorriu para


Donovan. — Vou deixá-la se acomodar Dra. Wilde.

— Obrigada.

A minha testa enrugou quando ele se afastou. — Está


nos deixando escolher qualquer mesa que quisermos?

Donovan colocou uma mecha de cabelo atrás da minha


orelha. — Acho que pode dizer isso. Antes de entrarmos, só
quero dizer mais uma vez o quanto estou orgulhoso de você.
Não apenas pela formatura, mas também por tudo que
passou no ano passado. Eu sei que não foi fácil.

— Eu não poderia ter feito isso sem você.

Donovan sorriu. — Isso é legal da sua parte, mas


besteira total. Você pode fazer qualquer coisa. Tive sorte de
estar junto, Red. — Roçou seus lábios contra os meus antes
de estender o cotovelo para mim. — Está pronta para
comemorar, Dra. Wilde?
Rio, pegando o seu braço. — Está agindo estranho, mas
sim, estou pronta.

Donovan abriu as portas duplas e entramos. Skye e seu


namorado, e meu pai e sua nova namorada (sim, se divorciou
novamente), já estavam sentados.

— Ei, pessoal!

Skye se levantou. — Espero que não pense que estou


pagando para ouvir minhas merdas, agora que é uma doutora
grande e chique.

Rio. — Nunca.

Nós nos abraçamos, mas quando fui cumprimentar o seu


namorado, percebi um rosto familiar por cima do ombro de
Skye. Os meus olhos se arregalaram. — Oh meu Deus. É o
Storm?

Ele sorriu. Parecia adorável em uma camisa e gravata,


mas com quem ele estava? Examinei a mesa e fiquei ainda
mais confusa. Metade da equipe com quem trabalhei no Park
House também estava aqui. Olhei para Donovan e ele se
inclinou.

— Eu não os deixaria gritar surpresa porque não queria


te assustar, droga — sussurrou. — Continue procurando
porém...

Examinei a sala, e devia haver cem pessoas – amigos


meus, amigos de Donovan, pessoas do meu trabalho e da
escola, Bud e sua amiga, os novos parceiros de Donovan,
Juliette e Trent (todos eles deixaram Kravitz, Polk e Hastings
há três meses e abriram seu próprio escritórios juntos), e a
nova noiva de Trent, Margo, também estava sorrindo.

Agarrei meu peito e me virei para Donovan. — Oh meu


Deus. Você fez tudo isso por mim? Como contatou todo
mundo?

— Tive muita ajuda de Storm e Skye. Você merecia uma


festa de formatura.

— Isso é loucura, mas muito obrigada! — Joguei meus


braços em volta do seu pescoço e esmaguei meus lábios nos
dele. — Eu amo você.

— Eu também, Red.

Esfreguei meu nariz com o de Donovan. — Sabia que


parte da topiaria que Edward aparou em, “Edward
Scissorhands”57 costumava estar em exibição aqui antes de o
restaurante fechar por alguns anos?

Donovan riu e beijou minha testa. — Você é apenas uma


infinidade de informações inúteis, Dra. Wilde. É uma das
coisas que amo em você.

Dei a volta na sala para cumprimentar as pessoas, pela


meia hora seguinte. Donovan permaneceu obedientemente ao
meu lado, apenas desaparecendo ocasionalmente para encher
minha taça de vinho. E as pessoas estavam me entregando
presentes! Estava completamente maravilhada. Quando
visitamos a última mesa, nossas mãos estavam ocupadas
novamente. Havia uma longa mesa de bufê ao lado da sala,
onde estávamos empilhando sacolas e caixas de presentes.
Aproximamos e colocamos o último lote sobre a mesa, e olhei
em volta mais uma vez.

— Ainda não consigo acreditar que você fez tudo isso. E


todas essas pessoas vieram comemorar comigo. — Apontei
para os presentes e balancei minha cabeça. — Tudo isso é
exagerado.

Donovan passou os braços em volta da minha cintura. —


Bem, ainda não te dei meu presente.

— Quer dizer que há mais do que apenas uma festa


gigante em um restaurante chique no meio do Central Park?
Tenho certeza de que não pode superar tudo isto.

Donovan sorriu. — Sabe que adoro desafios. — Beijou a


minha testa. — Fique aqui por um minuto.

Observei enquanto caminhava até Skye e voltou com


duas taças de champanhe. Entregando um para mim, pensei
que íamos tomar um pequeno drinque de comemoração, mas
em vez disso, limpou a garganta e gritou — Posso ter a
atenção de todos, por favor?

A sala estava ressoando com vozes, mas se acalmou.

— Obrigado. — Sorriu. — Só queria fazer um brinde, e


prometo que deixarei todos comerem.
— Fale rápido — gritou Storm, e todos riram.

— Em primeiro lugar, quero agradecer a todos por terem


vindo ajudar a comemorar o grande dia da Dra. Wilde.
Qualquer pessoa que esteja nesta sala sabe como ela é
apaixonada por ajudar as pessoas. — Apontou para Storm. —
Mesmo aqueles que são um pé no saco.

Todo mundo riu.

— Um minuto atrás, Autumn me disse que estava


impressionada com tudo isso. — Apontou para a mesa
presente. — Eu a lembrei de que ainda não tinha lhe dado o
meu presente, e me disse que seria difícil superar esta noite
perfeita, mas vocês me conhecem, não sou nada se não um
super-realizador.

Donovan colocou sua taça de champanhe na mesa de


presentes e tudo começou a acontecer em câmera lenta. Ele
se ajoelhou e pegou minha mão. A dele estava fria e úmida e,
quando olhei para baixo, pude ver como estava nervoso. Isso
tornou o momento muito mais surreal, porque meu homem
arrogante tinha nervos de aço.

Donovan levou minha mão à boca e beijou meus dedos.


— Autumn Renee Wilde, há dois anos você entrou em minha
vida e me bateu na bunda. Achei que tinha tudo o que queria,
mas você rapidamente me mostrou que eu ainda nem sabia o
que estava faltando. É a pessoa mais difícil que já conheci,
mas de alguma forma também consegue ser a mais gentil.
Antes de conhecê-la, vivia para o próximo desafio no trabalho,
mas agora, o único desafio que parece importante é ser o
homem que você merece.

Donovan fez uma pausa e olhou para baixo. Quando


seus olhos encontraram os meus novamente, estavam cheios
de lágrimas. — Red, fiquei tão orgulhoso de vê-la atravessar
aquele palco hoje. A única coisa que poderia me deixar mais
orgulhoso seria dizer às pessoas que a Dra. Wilde é minha
esposa. — Ele enfiou a mão no bolso, tirou uma caixa de anel
e abriu-a. A pedra lapidada de princesa mais linda cintilou
por dentro. — Case comigo, Autumn... por favor?

Praticamente derrubei Donovan quando colidi com ele,


envolvendo meus braços em volta de seu pescoço. — Sim!
Sim! Claro que me casarei com você.

Ele me agarrou em um abraço de urso e se levantou, me


levantando do chão enquanto pressionava seus lábios nos
meus.

A sala inteira explodiu em aplausos, vivas e assobios.

Eu não conseguia parar de sorrir quando nosso beijo


terminou. — Bem, você conseguiu. Como disse, seu presente
superou tudo.

— Querida, não era a esse presente a que me referia. —


Piscou. — Eu te darei este quando chegarmos em casa mais
tarde.
AGRADECIMENTOS

Para você, os leitores. Muito obrigada por seu


entusiasmo e lealdade. Espero que a história de Donovan e
Autumn tenha permitido que escapem por um pouco de
tempo, e que voltem em breve para ver quem poderão
encontrar a seguir!

Para Penelope, escrever é muito como andar de


montanha-russa, é muito melhor quando se tem amigos
sentado ao seu lado que o lembre de levantar as mãos e
desfrutar da viagem. Obrigada por sempre se encostar em
mim.

À Cheri, obrigada por sua amizade e apoio. Estou pronta


para mais aventuras na estrada!

À Julie, obrigada por sua amizade e sabedoria.

À Luna, a primeira pessoa com quem converso na


maioria das manhãs. Tanta coisa mudou ao longo dos anos,
mas posso sempre contar com a sua amizade e
encorajamento. Obrigada por estar sempre presente.

Ao meu incrível grupo de leitores do Facebook, Vi’s


Violets, 22.000 mulheres inteligentes que adoram falar de
livros juntas num só lugar? Sou uma mulher sortuda! Cada
uma de vocês é um presente. Obrigada por fazerem parte
desta viagem louca.
Para Sommer, obrigada por terem descoberto o que
quero, muitas vezes antes de eu o descobrir.

À minha agente e amiga, Kimberly Brower, obrigada por


estarem sempre presentes. Cada ano traz uma oportunidade
única da sua parte. Mal posso esperar para ver o que sonhas
a seguir!

Jéssica, Elaine, e Júlia, obrigada por suavizar todas as


arestas ásperas e por me fazer brilhar!

Kylie e a Jo do Give me Books, nem me lembro como


consegui antes de vocês, e espero nunca ter que descobri-lo!
Obrigada por tudo o que fazem.

A todos os bloggers, obrigada por inspirarem os leitores a


arriscarem em mim. Sem vocês, não existiriam.

Muito amor.

Vi
Notas

[←1]
-Senhor Grande Esbanjador.

[←2]
-Sapato ponta de asa ou sapato asa de á guia é um modelo masculino que possui um
padrã o de desenhos, feitos com pequenos furos na peça de couro e o padrã o de desenho
que se assemelha a uma á guia com as asas entreabertas.

[←3]
-Aeroporto Internacional John F. Kennedy é um aeroporto internacional no Queens, em New
Iorque.

[←4]
-Salvatore Ferragamo é uma empresa italiana de artigos de luxo, com sede em Florença,
Itá lia. E especializada em calçados, artigos de couro, reló gios suı́ços e roupas para homens e
mulheres.

[←5]
-Direito Harvard. Harvard University é uma universidade privada nos Estados Unidos, sendo
uma das mais prestigiadas universidades do mundo.

[←6]
-O nariz romano tem como principal caracterı́stica a giba nasal, aquela protuberâ ncia
localizada no dorso do nariz, que pode ser vista principalmente quando a pessoa está de
per il.

[←7]
-Personagem da mitologia grega considerado muito bonito.

[←8]
-E uma sé rie policial dos Estados Unidos. O drama mostra o processo complicado de
determinar a culpa ou a inocê ncia dos acusados.

[←9]
-Expressã o para uma xı́cara de café .

[←10]
-Pã o em forma de palito servido como entrada/petisco ou como acompanhamento de sopas.

[←11]
-A propriedade intelectual é a á rea do Direito que, por meio de leis, garante a
inventores ou responsá veis por qualquer produçã o do intelecto – seja nos domı́nios
industrial, cientı́f ico, literá rio ou artı́stico – o direito de obter, por um determinado
perı́o do de tempo, recompensa pela pró pria criaçã o.

[←12]
-A expressã o “a quarter” é usada para indicar um quarto de hora (15 minutos).

[←13]
-Pro Bono: prestaçã o gratuita, eventual e voluntá ria de serviços jurı́dicos em favor de
instituiçõ es sociais sem ins econô micos e aos seus assistidos, sempre que os bene iciá rios
nã o dispuserem de recursos para a contrataçã o de pro issional.

[←14]
-Açú car.

[←15]
-Assistant District Attorney – um procurador distrital que faz a representaçã o do Estado em
todos os julgamentos penais por crimes que ocorreram na jurisdiçã o geográ ica.

[←16]
-A Wall Street é uma rua na regiã o inferior de Manhattan, e é considerada o coraçã o
histó rico do atual Distrito Financeiro da cidade de Nova Iorque, onde se localiza a bolsa de
valores de Nova Iorque.

[←17]
-Dick é uma expressã o para idiota.

[←18]
-Você está fazendo uma cara.

[←19]
-Narc é uma gı́ria para "agente de narcó ticos", um agente federal ou agente da polı́cia
especializado em leis que lidam com drogas ilegais.

[←20]
-T he Bachelor é um reality show de encontros amorosos, produzido pela rede de televisã o
norte-americana ABC desde 2002.

[←21]
Uma pessoa viciada em trabalho.

[←22]
-Abreviaçã o de “I owe you”, um documento que reconhece a existê ncia de uma dı́vida.

[←23]
-Trocadilho com o sobrenome do personagem e gı́ria que signi ica imbecil ou uma pessoa
indesejá vel.
[←24]
-Brooks Brothers é a fabricante de roupas masculinas mais antiga dos Estados Unidos da
Amé rica, fundada em 1818, na cidade de Nova York.

[←25]
-E uma empresa fornecedora de carnes, queijos e condimentos.

[←26]
-Um esquema Ponzi é uma operaçã o fraudulenta so isticada de investimento do tipo
esquema em pirâ mide.

[←27]
Traduzindo, Bud pode signi icar broto, brotar, lorescer.

[←28]
-E qualquer homem cliente de uma prostituta.

[←29]
-Bem nascido, privilegiado. E uma lenda, “superstiçã o”: há quem diga que a primeira
refeiçã o de um bebê deva ser com uma colher de prata para garantir que o mesmo tenha
sempre bom apetite e cresça com saú de. Outra é que devemos colocar uma colher de prata
junto com uma moeda no banho do bebê , como forma de pedir riqueza para a criança.

[←30]
-Alma mater é uma frase alegó rica em latim usada por estudantes que frequentaram uma
determinada instituiçã o de ensino, que pode ser traduzida como a mã e que alimenta ou
nutre. Usada especialmente nos Estados Unidos, també m indica a instituiçã o onde a pessoa
se graduou.

[←31]
-Tweedle Dee e Tweedle Dum sã o personagens das obras de Lewis Carroll, Alice no Paı́s das
Maravilhas e Alice Atravé s do Espelho.

[←32]
-Lladró é uma empresa espanhola focada na produçã o de esculturas de porcelana de alta
qualidade.

[←33]
-Pode ser traduzido como “dedo verde/mã o verde”, é uma expressã o usada para algué m que
lida bem com plantas.

[←34]
-Uma rede de fast food.

[←35]
-E um jogo criado nas universidades norte-americanas durante os anos de 1960 em uma
versã o um pouco diferente do que é hoje. Originalmente o Beer Pong era jogado com
raquetes. Foi só na dé cada de 1980 e 1990 que o mé todo que jogamos foi inventado e
popularizado. O jogo consiste em acertar com uma bolinha de ping pong o copo do
adversá rio, fazendo-o beber e tirar o copo vazio da mesa. Ganha quem tirar todos os copos
do time adversá rio da mesa.

[←36]
-Pode signi icar: procuradoria, ministé rio pú blico, promotoria, gabinete do procurador,
escritó rio do advogado, procuradoria geral.

[←37]
-Balançar um pouco de verde seria mostrar as notas de dó lar.

[←38]
-Uma dança executada em cı́rculo, ou uma cançã o descrevendo os movimentos simples da
dança.

[←39]
-The Goldman Sachs Group, Inc. é um grupo inanceiro multinacional, sediado no Financial
District de New York.

[←40]
-Expressã o estadunidense para uma pessoa que gera rendimentos para uma empresa ou
organizaçã o atravé s da intermediaçã o de negó cios ou da atraçã o de clientes ou fundos.

[←41]
-Expressã o para “goodbye” – tchau/adeus.

[←42]
-E um coquetel que tem como base o Cape Codder – vodca com suco de cranberry - com a
adiçã o de suco de abacaxi.

[←43]
-Carne nobre, extremamente macia. Conhecida como carne “marmorizada”.

[←44]
-NSYNC foi uma boy band americana de mú sica pop. Os seus membros eram Lance Bass, JC
Chasez, Joey Fatone, Chris Kirkpatrick e Justin Timberlake.

[←45]
-E o Vento Levou, ilme de 1939.

[←46]
-Six-foot heroes é um sanduı́che bem grande – serve até 20 pessoas, feito com pã o de
baguete e recheio de preferê ncia.
[←47]
-Uma parte de um acordo que permite que algué m evite fazer algo que normalmente teria de
fazer.

[←48]
-Uma bebida enlatada, originá rio de Ohio, feita com chá gelado forte misturado com
limonada e á lcool.

[←49]
-Pedra branca ou clara, translú cida, macia, parecida com má rmore. Muito utilizada em
esculturas na Baixa Idade Mé dia.

[←50]
-U.S. Securities and Exchange Commission (SEC) é uma agê ncia reguladora independente do
governo federal responsá vel por proteger os investidores, manter o funcionamento justo e
ordenado dos mercados de valores mobiliá rios, e facilitar a formaçã o de capital.

[←51]
-Parfait é uma sobremesa de origem francesa, feita em camadas e que geralmente combina
frutas, iogurte, caldas, bolo, creme de leite e biscoito. E servida gelada.

[←52]
-Federal Drug Administration é o ó rgã o governamental dos EUA que faz o controle dos
alimentos (tanto humano como animal), suplementos alimentares, medicamentos (humano
e animal), cosmé ticos, equipamentos mé dicos, materiais bioló gicos e produtos derivados do
sangue humano.

[←53]
-Hedge é uma estraté gia de proteçã o para os riscos de um investimento, que neutraliza a
posiçã o comprada ou vendida para que seu preço nã o varie. Ao fazer uma operaçã o de
hedging, o investidor tem como objetivo eliminar a possibilidade de perdas futuras.

[←54]
-Em inglê s, “vir” també m pode signi icar “gozar”.

[←55]
-The Law School Admission Test (LSAT) é um teste padronizado exigido para admissã o em
faculdades de Direito principalmente dos Estados Unidos.

[←56]
-Um tipo de liquidi icador compacto.

[←57]
-Edward Mã os de Tesoura, ilme de 1990.

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