Você está na página 1de 75

SUMÁRIO

1. Introdução...................................................................... 3
2. Taxonomia..................................................................... 4
3. Família ancylostomidae e amarelão..................13
4. Larva migrans cutânea (LMC)..............................20
5. Schistosoma mansoni e esquistossomose.....24
6. Wuchereria bancroft e filariose...........................34
7. Enterobius vermicularis e
enterobiose/oxiuríase...................................................40
8. Trichuris trichiura e tricuríase................................45
9. Echinococcus granulosus e hidatidose............49
10. Hymenolepis nana.................................................56
11. Strongyloides stercolaris.....................................59
12. Taenia SP. ................................................................65
Referências bibliográficas .........................................74
HELMINTOS 3

1. INTRODUÇÃO períodos prolongados, seja por


ventosas, acúleos ou lábios;
Os helmintos constituem um grupo
muito numeroso de animais, incluindo • Ação anóxica → em decorrência
espécies de vida livre e de vida parasi- da absorção de sangue, resultando
tária. O termo helminto vem do grego em quadros de anemias em graus
hélmin, que significa verme. Repre- variados;
sentam os parasitos distribuídos nos • Ação tóxica → intensa produção
filos Platythelminthes, Nematoda e de antígenos, que vai ser respon-
Acanthocephala. sável por ativação de uma respos-
A ocorrência de parasitismo de helmin- ta inflamatória local;
tos no homem é muito comum. Estima-
• Ação enzimática → penetração
-se que cerca de 20% da população
ativa das larvas dos helmintos,
humana está parasitada por ancilos-
causando injúria tecidual pelo pro-
tomídeos, o que equivale a mais de 1
cesso digestivo enzimático.
bilhão de pessoas. A situação é equi-
valente em relação ao Ascaris lumbri-
coides. Estas infecções, em geral, resul- As helmintíases são responsáveis por
tam, para o hospedeiro, em danos que mais de 50% das infecções em crian-
se manifestam de formas variadas. ças, causando diarreia e levando à
Os helmintos atuam sob várias for- desnutrição. Além disso, associa-se a
mas dentro de seus hospedeiros, exe- elas, também, um total de 10 milhões
cutando ações com repercussões em de DALYs (Disability Adjusted Life
diversos mecanismos. Como exem- Years), ou seja, 10 milhões de dias
plo, podemos citar: de vida saudável perdidos devido ao
efeito da mortalidade e pela manei-
• Ação mecânica → obstrução intes- ra com que essas doenças afetam a
tinal pelo acúmulo de parasitas no qualidade de vida dos indivíduos.
lúmen dos intestinos, acarretando
distúrbios no peristaltismo desses
órgãos; SE LIGA! Nas crianças, os efeitos rela-
cionados ao acometimento cognitivo,
• Ação espoliadora → redução da oriundos dessas verminoses, são irre-
versíveis. Isso pode levar a distúrbios de
absorção de nutrientes a nível in-
memorização, aprendizagem a atenção.
testinal, também causada pelo há- Já o efeito sobre o crescimento corporal
bito hematófago destes parasitas; exercido por tais helmintos na infância,
são reversíveis, fortalecendo a necessi-
• Ação irritativa → presença des- dade de medidas e cuidados sanitários
ses parasitas fixados de forma como forma de prevenção primária de
tais doenças.
íntima às mucosas intestinais por
HELMINTOS 4

2. TAXONOMIA
FLUXOGRAMA COM OS PRINCIPAIS REPRE-
SENTANTES DA CLASSE DOS HELMINTOS

Reino → Animália.
Filo:
• Platelmintos → são os represen- HELMINTOS
tantes mais inferiores dos helmin-
tos, os quais se caracterizam por
apresentarem simetria bila-
teral, uma extremidade ante-
Reino
rior com órgãos sensitivos e
de fixação, e uma extremida-
de posterior. São achatados
Filo

Platelmintos Nematoda

Classe Trichuris trichiura


Ascaris lumbricoides
Enterobius vermicularis
Toxocara sp.
Família Ancylostomidae
Cestoda Trematoda Strongyloides stercoralis
Wuechereria bancrofti
Onchocerca volvulus
Mansonela ozzardi
Taenia sp
Schistosoma mansoni
Echinococcus granulosos
Fasciola hepática
Hymenolepis nana

estão divididos em quatro clas-


dorsoventralmente, sem celoma,
ses, sendo as mais importantes as
com ou sem tubo digestivo, sem
classes: Trematoda e Cestoda.
ânus, sem aparelho respiratório,
sistema excretor tipo protonefrídi-
co, com tecido conjuntivo enchen- A1) Classe Trematoda: são ecto ou
do os espaços entre os órgãos. endoparasitas. Os adultos não pos-
Pode ser de vida livre, endo ou ec- suem epiderme e cílios externos;
toparasitos. Seus representantes corpo não-segmentado e recoberto
HELMINTOS 5

por uma cutícula; com uma ou mais O sistema excretor é representado


ventosas; presença de tubo digesti- por dois tubos protonefridiais, um em
vo; ânus geralmente ausente; herma- cada lado, dirigidos posteriormente;
froditas ou não; evolução simples ou fundem-se na porção terminal, origi-
com hospedeiro intermediário. nando uma vesícula excretora que se
abre para o meio exterior através do
poro excretor. A célula em flama é a
Habitualmente são achatados dorso- unidade excretora e varia em número,
ventralmente, às vezes recurvados, conforme a espécie.
com face central côncava, de contor-
no oval ou alongado; outras vezes pa- Os trematódeos não possuem pro-
recem volumosos, com extremidade priamente um sistema circulatório,
posterior alongada e a anterior afilada contudo, em alguns deles podem ser
e truncada, ou globulosos e recurva- observados ductos mesenquimais.
dos dorsalmente. A forma típica é a de Nos Digenea, podem ocorrer espécies
folha. Essa classe compreende ainda hermafroditas (monoicas) e espécies
três grandes grupos de parasitos: As- com sexos separados (dioicas). A au-
pidogastrea, Monogea e Digenea, das tofertilização pode ocorrer nos trema-
quais interessa-nos a última por conter tódeos, contudo a fertilização cruzada
representantes que afetam o homem. parece ser o processo habitual.
Os trematódeos digenéticos pos- Poucos trematódeos são vivíparos,
suem órgãos de fixação comumente prevalecendo as espécies ovíparas.
representados pelas ventosa oral e O número de ovos depositados varia
acetábulo (ou ventosa ventral). O cor- consideravelmente com a espécie.
po é revestido por uma cutícula, de Nos Digenea, o ovo é geralmente oval
natureza acelular, possivelmente re- e de coloração clara ou marrom-es-
sultante de células mesenquimais. cura, com opérculo em uma das ex-
Logo abaixo da cutícula encontramos tremidades. Em algumas espécies, o
fina camada muscular. Abaixo da ca- ovo, ao ser eliminado, já contém uma
mada muscular e enchendo todo o larva (miracídio) desenvolvida; em
espaço interno, encontramos o me- outras, o ovo é eliminado não-em-
sênquima ou parênquima. Neste en- brionado (Fasciola, Euryrema) e o mi-
contram-se os sistemas digestivo, re- racídio é formado após a eliminação
produtor, excretor e nervoso. do ovo para o meio exterior. O mira-
São pobres em órgãos dos sentidos. cídio necessita alcançar um molusco
Terminações bulbosas com emissão para dar continuidade ao ciclo e pode
de cerdas podem ser encontradas, fazê-lo de dois modos: nos casos em
sobretudo no nível das ventosas. que o miracídio é liberado na água
HELMINTOS 6

(Schistosoma, Fasciola) ele penetra A2) Classe Cestoda: são endopara-


ativamente em um molusco aquático sitos desprovidos de epiderme, de
(Biomphalaria, Lymnaea), ou quando cavidade geral e de sistema digesti-
o miracídio permanece dentro do ovo vo. Os órgãos de fixação estão loca-
(Eurytrema), há necessidade de o ovo lizados na extremidade anterior. O
ser ingerido por um molusco de hábi- corpo é, em geral, alongado e cons-
to terrestre (Subulina) para dar conti- truído por segmentos; algumas vezes
nuidade ao ciclo. Os moluscos são os lembram trematódeos. Um cestódeo
primeiros hospedeiros intermediários. típico apresenta-se com três regiões
A evolução no hospedeiro intermedi- distintas: a mais anterior constituída
ário pode passar pelas fases de espo- pelo escólex, no qual se encontram os
rocisto, rédia, cercária, mesocercária órgãos de fixação; a segunda porção,
e metacercária. A formação de me- o colo ou o pescoço, suporta o escó-
tacercária algumas vezes exige um lex, e é o elemento de ligação com a
segundo hospedeiro intermediário. terceira região, que é o estróbilo, ni-
Quando a forma infectante é a cer- tidamente segmentado nas formas
cária, a infecção do hospedeiro defi- polizóicas.
nitivo se dá pela penetração ativa na À semelhança dos trematódeos, os
pele ou em mucosa (Schistosoma); e cestódeos são recobertos por uma
quando a forma infectante é a meta- cutícula, a qual repousa diretamente
cercária, a infecção do hospedeiro de- sobre o mesênquima, que nos Taenii-
finitivo se dá pela ingestão (Fasciola). dae é rico com corpúsculos calcários
As cercárias ou metacercárias, resul- (carbonato de cálcio). O sistema ner-
tantes de um único ovo, são nume- voso é, basicamente, constituído por
rosas, com isto aumentando a pos- gânglios na base do escólex e nervos
sibilidade da infecção do hospedeiro laterais, interligados por comissuras.
definitivo, no qual se completa o de- Não há órgãos sensoriais especiais. O
senvolvimento e ocorre a formação sistema excretor é protonefridial, com
de novos ovos. células flama. Canais excretores per-
correm lateralmente o corpo do ces-
tódeo e se interligam na parte poste-
rior da proglote, no último segmento,
formando a vesícula excretora e o
poro excretor. São, geralmente, her-
mafroditas. A presença de microtrí-
quias é responsável por estabelecer
Figura 1. Schistosoma mansoni. Fonte: Google
imagens uma interface de trocas nutritivas e
excreção dos resíduos e metabólitos,
HELMINTOS 7

sendo importante na absorção de nu- eliminados para o meio exterior, regu-


trientes no lúmen intestinal. larmente. Nos cestódeos desprovidos
Na maioria dos cestódeos há um con- de gonoporo, os ovos serão elimina-
junto de órgãos genitais masculinos dos para o exterior com ruptura do
e femininos por segmento (Taenia, proglote.
Hymenolepis). Pode ocorrer autofertilização da pro-
O aparelho genital masculino pode glote, com espermatozoides e óvulos
apresentar dois ou mais testículos, às produzidos pelos órgãos genitais do
vezes algumas dezenas, com canais segmento; outras vezes pode ocor-
eferentes que se unem e formam o rer fertilização de um segmento por
canal deferente, o qual pode se dilatar espermatozoides produzidos em
e formar uma vesícula seminal antes outros segmentos do mesmo cestó-
de alcançar a bolsa do cirro ou den- deo, ou fertilização entre cestódeos
tro dela; em seguida, se diferenciando diferentes.
em canal ejaculador, com glândulas A forma do ovo é variável. Em Pseu-
prostáticas; o segmento final é o cir- dophyllidea é ovóide ou elíptico, com
ro ou pênis, que pode ser dotado de ou sem opérculo. Em algumas espé-
espinhos. cies, o embrião é guarnecido por um
Os órgãos femininos compõem-se embrióforo ciliado e é conhecido por
de: ovário, frequentemente com dois “coracídio”, o qual, após liberado, nada
lobos interligados medianamente; o na água e é ingerido pelo hospedeiro
oviduto origina-se no ovário e atin- intermediário, um crustáceo copépo-
ge o oótipo; em torno deste estão as de, no interior do qual a larva se li-
glândulas de Mehlis; o útero tem ori- berta do embrióforo, migrando para a
gem no oótipo e pode exteriorizar-se cavidade geral do crustáceo, onde se
num poro uterino ou terminar em fun- desenvolve, tornando-se larva “pro-
do-de-saco. As glândulas vitelogêni- cercoide”. O segundo hospedeiro in-
cas podem situar-se abaixo do ovário, termediário, que pode ser um peixe,
como nos Himenolepididae e Taenii- ingere o crustáceo; a larva “procercoi-
dae, ou externamente aos testículos de” é liberada no intestino do peixe e
(ou em mistura com eles), como nos migra para os músculos, onde se de-
Pseudophyllidea. A vagina liga o poro senvolve para larva “pleurocercoide”
genital feminino ao oviduto, antes for- ou sparganum. O hospedeiro definiti-
mando o receptáculo. vo infecta-se pela ingestão de formas
infectantes contidas em tecidos mus-
Nos cestódeos dotados de gonopo- culares de peixes crus, mal cozidos
ros, os ovos são produzidos, com- ou mal passados.
pletam seu desenvolvimento e são
HELMINTOS 8

Nos Cyclophyllidea, onde estão in- membranas germinativas (Echino-


cluídas as espécies mais importantes coccus granuloso). Em todos estes
para a parasitologia humana, o ovo casos, a infecção do hospedeiro de-
contém uma oncosfera armada com finitivo, que é um vertebrado, ocorre
três pares de ganchos e o ciclo só tem por ingestão de formas larvais conti-
continuidade quando o ovo é ingeri- das em tecidos crus ou mal passados.
do pelo hospedeiro intermediário, que
pode ser um invertebrado ou um ver-
tebrado. Nas espécies que tem como
hospedeiro intermediário um inver-
tebrado, a oncosfera, após se libertar
do ovo, atravessa a parede intestinal
caindo na cavidade geral, onde se de-
senvolve para larva “cisticercoide”.
Na família Taeniidae, as larvas evo-
luem em vertebrados com a formação
de vesículas com abundante líquido,
as quais podem assumir quatro for- Figura 2. Família Taeniidae. Fonte: Google imagens
mas distintas: cisticerco, apresen-
tando uma vesícula com líquido, no
interior da qual se encontra um único • Nematódeos → filo Nematoda:
escólex invaginado (Taenia solium e dentro deste grupo são encontra-
Taenia saginata); estrobilocerco, que dos representantes com os mais
consiste em um escólex seguido de diversos tipos de vida e hábitat,
um falso estróbilo com uma peque- desde espécies saprófitas de vida
na vesícula na extremidade; cenuro, livre, aquáticas ou terrestres, até
grande vesícula de paredes finas e parasitos de vegetais e todos os
abundante líquido (líquido hidático) invertebrados e vertebrados.
com numerosos pequenos escólices
invaginados presos internamente à
membrana germinativa da larva; cis- São vermes com simetria bilateral,
to hidático ou hidátide, grande ve- três folhetos germinativos, sem seg-
sícula de paredes firmes e abundan- mentação verdadeira ou probóscide,
te líquidos com numeroso pequenos cilíndricos, alongados, desprovidos
escólex e presos à parede interna, de células em flama, cavidade geral
juntamente com vesículas-filhas, as sem revestimento epitelial, tamanho
quais também contêm líquido e es- variável, de poucos milímetros a de-
cólices invaginados presos às suas zenas de centímetros, tubo digestivo
HELMINTOS 9

completo, com abertura anal ou cloa- As gônadas, em geral, são tubulares,


cal terminal ou próxima da extremida- contínuas com os ductos reproduto-
de posterior; sexos, em geral, separa- res, ímpar (ou dupla) no macho, par
dos (dioicos), sendo o macho menor (ou ímpar) na fêmea. O sistema geni-
que a fêmea; corpo revestido por cutí- tal masculino é diferenciado em tes-
cula acelular, lisa ou com estriações. tículo, canal deferente, vesícula se-
Essa cutícula pode apresentar diver- minal e canal ejaculador, abrindo-se
sas formações: espinhos, cordões, na cloaca. Além dos ductos genitais,
expansões cefálicas, cervicais e cau- eles podem apresentar estruturas
dais. Nos machos, a expansão caudal acessórias: espículos, tubérculo, té-
pode formar a bolsa copuladora. Em lamo e bolsa copuladora. O aparelho
alguns nematódeos, na face ventral genital feminino é constituído funda-
anterior do corpo, abrem-se os poros mentalmente de ovário, oviduto, úte-
ou células glandulares, constituindo ro, vagina e vulva, que podem variar
a “faixa bacilar”. O pseudoceloma é em forma, disposição e número. Entre
cheio de líquido celomático, respon- o útero e a vagina pode-se distinguir
sável pelo equilíbrio hidrostático e uma estrutura denominada ovojec-
movimentos, além de envolver os ór- tor, dotado de esfíncter para regular a
gãos nele contidos (tubo digestivo e passagem dos ovos.
órgãos genitais). A reprodução e o processo de al-
Não há sistema circulatório ou siste- cance dos hospedeiros são bastante
ma vascular. A oxihemoglobina conti- diversificados nos nematódeos. Em
da no pseudoceloma, contendo subs- geral, são dioicos (sexos separados),
tâncias nutritivas e também resíduos mas existem hermafroditas, como em
metabólicos, é movimentada à custa rabditídeos.
das contraturas do corpo. Os espermatozoides fecundam os
O sistema nervoso consta de um cé- ovócitos em sua passagem pelo útero,
rebro formado por gânglios nervosos onde se completa a formação do ovo,
interligados por fibras nervosas, for- envolvido por três membranas. Em
mando um anel em torno do esôfago, alguns nematódeos, como Ascaris e
do qual partem nervos (geralmente Ancylostoma, o embrião se desen-
seis) dirigindo-se para frente e para volve dentro do ovo no meio exterior.
trás. Porém, em Strongyloides, o embrião
A excreção é feita através do apare- se desenvolve dentro do ovo ainda no
lho excretor, que é peculiar nos ne- útero da fêmea que elimina larvado.
matoides. É desprovido de células em Em filarídeos como a Wuchereria, o
flama. ovo tem desenvolvimento semelhan-
te, porém a casca é mole (bainha).
HELMINTOS 10

Deste modo, as fêmeas podem ser (heteroxênico), há necessidade de


ovíparas, ovovivíparas ou vivíparas. hospedeiro intermediário.
No desenvolvimento pós-embrio- Alcançado o estágio de larva infec-
nário, o nematódeo passa por cinco tante (geralmente o terceiro), para
estágios, e na passagem de um es- continuidade do desenvolvimento, há
tágio para o outro ocorre uma troca necessidade de infectar o hospedei-
de cutícula. O embrião que se forma ro definitivo, passivamente, quando a
dentro do ovo é a larva de primeiro larva infectante dentro do ovo é inge-
estágio ou L, e para completar o ciclo rida pelo hospedeiro (Ascaris, Entero-
pode fazê-lo direta ou indiretamen- bius), ou ativamente, quando a larva
te. No ciclo direto (monoxênico) não infectante penetra na pele ou mucosa
há necessidade de hospedeiro inter- (Ancylostoma, Strongyloides).
mediário, enquanto no ciclo indireto Há também a possibilidade de a L3
de um nematódeo ser ingerida por
um hospedeiro que não o definitivo
e nele encistar, comportando-se este
como hospedeiro paratênico.

Figura 3. Principais representantes do filo dos nematódeos. Imagem retirada da aula sobre Helmintos da seção de
Parasitologia da Plataforma Sanarflix.
HELMINTOS 11

Figura 4. Representação da cavidade interna dos nema- Figura 5. Representação da cavidade bucal dos nema-
telmintos. Imagem retirada da aula sobre Helmintos da telmintos, com seus três lábios. Imagem retirada da aula
seção de Parasitologia da Plataforma Sanarflix. sobre Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
Sanarflix.

Figura 6. Representação da estrutura dental (à esquerda) e


das lâminas cortantes (à direita) dos nematelmintos. Imagem
retirada da aula sobre Helmintos da seção de Parasitologia
da Plataforma Sanarflix.

Figura 7. Corte transversal demonstrando os componentes dos tecidos de sustentação dos nematelmintos. Imagem
retirada da aula sobre Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma Sanarflix.
HELMINTOS 12

• Relação parasita-hospedeiro → é dessa resposta pelo confronto pa-


representada pela produção de ci- rasita-hospedeiro. O parasita tenta
tocinas em decorrência de antíge- modular tal resposta no intuito de
nos liberados pelos parasitos. Isso não causar danos severos ao seu lo-
provocará uma resposta imunológi- cal de atuação para que sua sobrevi-
ca, com aumento do peristaltismo vência possa ser garantida, pois eles
intestinal e produção de muco pe- querem se desenvolver juntamente
las células caliciformes, dificultando com seus hospedeiros.
a expulsão do parasita. A produção
de citocinas e anticorpos vai induzir
a degranulação de eosinófilos e de De toda forma, percebe-se a ocorrên-
mastócitos. Caso essa resposta per- cia de danos irreversíveis, principal-
maneça ativa, haverá dano tecidual e mente devido à inflamação crônica e
necrose. Porém, há uma modulação prolongada.

Figura 8. Representação esquemática da reação imunológica envolvida na parasitose. Fonte: Neves, 2016.
HELMINTOS 13

3. FAMÍLIA anos. No país, a ancilostomose é mais


ANCYLOSTOMIDAE E frequente por N. americanus.
AMARELÃO
Introdução UM PULO NA LITERATURA
Em 1919, Monteiro Lobato cunhou o
Essa família é uma das mais impor- termo “amarelão” para fazer referência
tantes famílias de nematódeos cujos às características apresentadas pelo
estágios parasitários ocorrem em seu personagem Jeca Tatu. Na épo-
ca, afirmou: “17 milhões são caricatu-
mamíferos, inclusive em humanos, ras derreadas no físico e no moral pela
causando ancilostomose. A ação dos ancilostomíase; a inteligência do ama-
parasitos, tanto por etiologia primá- relado atrofia-se e a triste criatura vive
ria como secundária, geralmente de- em soturno urupê humano, incapaz de
ação, incapaz de vontade, incapaz de
sencadeia um processo patológico de progresso; os escravos dos vermes, em
curso crônico, mas que pode resultar consequência da escravização do ho-
em consequências fatais. mem ao verme, fez o país em andrajosa
miséria econômica, resultado natural da
Duas espécies parasitam frequente- miséria fisiológica. O Jeca não é assim –
mente o homem e são responsáveis está assim”. Isso ressalta a importância
por uma doença tipicamente ane- dos meios de controle e profilaxia da do-
ença, haja vista que sua incidência está
miante, denominada ancilostomose, intimamente relacionada a situações de
ancilostomíase, amarelão ou opilação. maior pobreza e desigualdade social,
São elas: Ancylostoma duodenale e onde há deficiência de acesso à infraes-
trutura e serviços básicos de saúde.
Necator americanus, que produzem
praticamente o mesmo quadro clínico.
As ancilostomoses humanas são Taxonomia
geohelmintoses geralmente negli- REINO Animália
genciadas com grande importância no SUBREINO Metazoa
contexto universal, pois foi estimado FILO Nemathelmynthes
que cerca de 900 milhões de pesso- CLASSE Nematoda
as são parasitadas por A. duodenale ORDEM Strongylida
e N. americanus e, que desta popula- FAMILIA Ancylostomatidae
ção, 60 mil morrem, anualmente. Ancylostominae/
SUBFAMÍLIAS
No Brasil, mais prevalente em áre- Bunostominae

as rurais e sem saneamento básico. GÊNERO Ancylostoma/Necator


Ancylostoma duodenale
Ocorre preferencialmente em crian-
Ancylostoma ceylanicum →
ças com mais de seis anos, adoles- ESPÉCIE
muito comum na Ásia
centes e em indivíduos mais velhos, Necator americanus
independente do sexo. Neles, os pa- Tabela 1. Retirada e adaptada da aula sobre Helmintos
rasitos podem sobreviver por até 18 da seção de Parasitologia da Plataforma Sanarflix.
HELMINTOS 14

Biologia do parasito com as placas cortantes do Necator,


seja com os dentes e lancetas dos
Os ancilostomídeos medem cerca de
Ancylostoma. Já os A. braziliensis/ca-
1 cm de comprimento, os machos
ninum, precursores da larva migrans
sendo pouco menores que as fême-
cutânea, apresentam-se, respectiva-
as. Eles apresentam duas estruturas
mente com um par de dentes grande e
muito características: a cápsula bucal
outro pequeno, e três pares de dentes.
e a bolsa copuladora dos machos.
Nos vermes adultos, a fêmea é maior
Em ambos os sexos, a cápsula bucal
do que o macho em ambas as espé-
é uma modificação da extremidade
cies e, na extremidade posterior, ire-
anterior, formada pela cutícula, que
mos observar uma bolsa copuladora,
permite ao verme aderir, por sucção,
com morfologias diferentes a depen-
à parede do intestino. Tem forma glo-
der do ovo e da espécie. Essa bolsa
bular, com ampla abertura para o ex-
é uma expansão cuticular da extremi-
terior, em cujas margens encontram-
dade posterior dos machos, susten-
-se papilas sensoriais.
tada por raios carnosos agrupados de
A cápsula é provida de estruturas modo diferente para cada espécie.
que dilaceram a mucosa intestinal,
O ovo apresenta blastômeros no seu in-
como dentes, lâminas ou saliências
terior que, com a evolução e maturação,
pungitivas.
se transformarão em larvas. A mem-
O sistema digestório continua-se brana deste ovo é bem fina e delicada,
com um esôfago muscular claviforme necessitando da atuação do ambiente
e um intestino simples que, nas fême- para transformar a massa germinativa
as, termina no ânus e, nos machos, em larvas. O Necator põe 6 a 11 mil
abre-se na bolsa copuladora. ovos por dia, ao passo que Ancylosto-
Os ancilostomídeos que parasitam o ma duodenale põe 20 a 30 mil.
homem habitual ou ocasionalmente O embrionamento larvário completa-
podem ser distinguidos pela morfolo- -se no meio exterior em cerca de 18
gia da cápsula bucal e da bolsa co- horas e a eclosão dá-se em um ou
puladora. O Ancylostoma duodenale dois dias, saindo uma larva rabditoi-
apresenta dois pares de dentes na de, isto é, com o esôfago formado por
cápsula bucal, enquanto o Necator corpo, istmo e bulbo. A larva rabditó-
americanus apresenta lâminas cor- ide de 1º estádio (L1) mede cerca de
tantes na cápsula. 250 mcm de comprimento, o esôfago
Na ancilostomíase, as relações para- correspondendo a 1/3 disso. Ela se
sito-hospedeiro têm lugar através da alimenta ativamente de bactérias e
fixação do helminto à mucosa intes- de matéria orgânica do solo.
tinal que é aspirada e dilacerada, seja
HELMINTOS 15

A larva rabditoide de 2º estádio (L2) • Hipobiose → apenas o Ancylos-


cresce mais até atingir 500 a 700 toma é capaz de entrar em latên-
mcm. Seu esôfago alonga-se, pas- cia em casos de temperaturas não
sando a ser do tipo filarióide. Ocorre ótimas para o desenvolvimento de
então a 2ª muda, mas, agora, a ve- seu ciclo de vida. Volta a se repro-
lha cutícula permanece envolvendo duzir quando o meio em que está
a larva como uma bainha, isolando-a inserido é propício para retorno de
do meio ambiente, é a larva filarióide suas atividades e infestação dos
embainhanda ou encistada (L3). Uma hospedeiros.
semana depois torna-se infectante.
Nesse 3° estágio, ela já não se ali- Habitat
menta, mas passa a consumir suas
próprias reservas energéticas, que Os adultos serão encontrados a nível
lhe permitem crescer e mover-se ati- do intestino delgado, principalmente
vamente com um geotropismo nega- nas alças jejunais e no íleo. Eles se
tivo, mas com hidro, termo e tigmo- fixam intimamente na mucosa intes-
tropismo (de contato) positivos. tinal por meio da cápsula bucal, reali-
zando, assim, ação hematófaga.

SE LIGA! Para diferenciarmos a larva


rabditóide da filarióide, devemos anali- Ciclo biológico
sar o vestígio de primórdio genital para a
larva rabditóide, e a extremidade poste- Os ancilostomídeos, como muitos
rior pontiaguda para as larvas filarióides. outros nematódeos parasitos, apre-
sentam um ciclo biológico direto,
Características das larvas não necessitante de hospedeiros
intermediários.
• Geotropismo negativo → as larvas Os ovos depositados pelas fêmeas
sempre se concentram no ápice de no intestino delgado do hospedeiro,
superfícies; são eliminados para o meio exterior
• Tigmotropismo → capacidade que através das fezes. No meio exterior,
as larvas apresentam de se aderi- os ovos necessitam de um ambien-
rem à partículas sólidas; te propício, principalmente com boa
oxigenação, alta umidade e tempe-
• Hidrotropismo → migração e afini-
ratura elevada. São condições indis-
dade por água;
pensáveis para que se processe a
• Termotropismo → migração e afi- embrionia, formação da larva de pri-
nidade por altas temperaturas; meiro estágio (L1), do tipo rabditói-
de, e sua eclosão. No ambiente, a L1
HELMINTOS 16

recém-eclodida, apresenta movimen- pele, as larvas alcançam a circulação


tos serpentiformes e se alimenta de sanguínea e/ou linfática, e chegam ao
matéria orgânica e microrganismos, coração, seguindo para os pulmões
devendo, em seguida, perder a cutí- através das artérias pulmonares.
cula externa, após ganhar uma nova, Atingindo os alvéolos, as larvas mi-
transformando-se em larva de segun- gram para os bronquíolos, com auxí-
do estágio (L2), que é também do tipo lio de seus movimentos, secreções e
rabditóide. Subsequentemente, a L2, cílios da árvore brônquica. Dos brô-
que também tem movimentos ser- nquios atingem a traqueia, faringe e
pentiformes, começa a produzir uma laringe quando, então, são ingeridas,
nova cutícula, internamente, que pas- alcançando o intestino delgado, seu
sa a ser coberta pela cutícula velha, habitat final. Durante a migração pe-
passando então a se transformar em los pulmões, que dura de dois a sete
larva de terceiro estágio (L3), do tipo dias, a larva perde a cutícula e adquire
filarióide, denominada larva infectan- uma nova, transformando-se em lar-
te. A L3, por apresentar uma cutícula va do quarto estágio (L4). Ao chegar
externa que oblitera a cavidade bu- no intestino delgado, após 8 dias da
cal, não se alimenta, mas tem movi- infecção, a larva começa a exercer o
mentos serpentiformes que facilitam parasitismo hematófago, fixando a
a sua locomoção. A L3 é a única for- cápsula bucal na mucosa do duode-
ma infectante para o hospedeiro, ou no. A transformação da L4 em larva
seja, a infecção pelos ancilostomíde- de quinto estágio (L5) ocorre aproxi-
os só ocorre quando as L3 penetram madamente 15 dias após a infecção,
no corpo humano, ativamente, atra- e a diferenciação de L5 em forma
vés da pele, conjuntiva e mucosas, ou adulta ocorre após 30 dias infecção.
passivamente, por via oral. Os espécimes adultos, exercendo o
Quando a infecção é ativa, as L3, ao hematofagismo, iniciam a cópula, se-
contatarem o hospedeiro, são estimu- guida de postura. O período de pré-
ladas por efeitos térmicos e químicos, -patência, isto é, desde o momento
iniciam o processo de penetração, es- da penetração das L3 até a elimina-
capando da cutícula externa e, simul- ção dos ovos dos ancilostomídeos
taneamente, ajudadas pelos seus mo- pelas fezes, varia entre 35 e 60 dias
vimentos serpentiformes de extensão para A. duodenale e de 42 a 60 dias
e contração, começam a produzir en- para N. americanus.
zimas, semelhantes à colagenase, Quando a penetração das L3 é por via
que facilitam o seu acesso através oral, principalmente através da inges-
dos tecidos do hospedeiro. A pene- tão de alimentos ou água, as L3 per-
tração dura cerca de 30 minutos. Da dem a cutícula externa no estômago,
HELMINTOS 17

depois de dois a três dias da infecção, para L5 no transcurso de 15 dias da


e migram para o intestino delgado. À infecção. Com a diferenciação de L5
altura do duodeno, as larvas pene- em adultos, a cópula tem início e os
tram na mucosa, atingindo as células ovos logo em seguida começam a
de Lieberkuhn, onde mudam para L4, ser postos, sendo eliminados através
após cerca de cinco dias da infecção. das fezes. Quando a infecção é oral,
Em seguida, as larvas voltam à luz do os períodos de pré-patência para A.
intestino, se fixam à mucosa e iniciam duodenale e N. americanus são simi-
o repasto sanguíneo, devendo mudar lares aos da infecção transcutânea.
O tempo de vida médio do N. ameri-
canus é de 3-10 anos e do A. duode-
nale de 1-3 anos.

Figura 9. Ciclo biológico


de Ancylostomidae em
humanos: A) ovo recém-e-
liminado com as fezes; B)
ovo com larva de primeiro
estágio; C) eclosão da
larva de primeiro estágio;
D) larva de primeiro estágio, com tamanho
original de 300 mcm; E) formação da larva de
segundo estágio com restos de bainha e com
tamanho original de 400 mcm; F) larva de
terceiro estágio ou infectante, com tamanho
original de 600 mcm. As linhas tracejadas e
setas indicam as vias de penetração da larva
infectante: 1) transcutânea: circulação, cava,
coração, pulmão, traqueia, faringe, laringe
(ingestão), esôfago, estômago e intestino
delgado; 2) oral: ingestão, esôfago, estômago
e intestino delgado. Fonte: Imagem retirada
do livro Parasitologia Humana, 13ª ed., David
Pereira Neves, 2016.
HELMINTOS 18

Formas de transmissão cortantes, as lancetas, e a secreção


de suas glândulas cefálicas. Um fluxo
As formas de transmissão são va-
de sangue atravessa o tubo digestivo
riadas: alimentos, vetores mecâni-
dos vermes adultos, de onde poucos
cos, água, penetração ativa e direta
nutrientes são absorvidos, e o resto
(transcutânea).
goteja pelo ânus dos helmintos.
O organismo perde sangue na medi-
Manifestações clínicas da em que os vermes sugam a mu-
Variam segundo a espécie de anci- cosa e pelas pequenas hemorragias
lostomídeo, o período da infecção, residuais que ficam quando os para-
a carga parasitária, a localização e sitos mudam seus pontos de fixação.
o estágio em que se encontrem os A presença de anticoagulantes nas
parasitos. secreções orais dos parasitos tende a
facilitar a perda de sangue. Essas per-
Minutos depois da penetração das lar-
das variam com a espécie presente,
vas na pele, surgem prurido, eritema
sendo o volume médio perdido para
edematoso ou erupção pápulovesi-
cada Necator na ordem de 0,03-0,06
cular que duram alguns dias. Quadro
ml/dia. Com A. duodenale, a perda é
típico de dermatite urticariforme (hi-
de 0,15-0,30 ml/dia. A perda sanguí-
peremia, prurido e edema) pode estar
nea aumenta com a carga parasitária.
presente. Dias depois aparecem as
manifestações pulmonares, em geral Do sangue evacuado pelos helmin-
discretas, com tosse seca ou expecto- tos, 30-40% do ferro são reabsor-
ração. Estertores pulmonares e sinais vidos pelos intestinos. O resto deve
radiológicas da síndrome de Loeffler provir da dieta do paciente. Senão, as
podem aparecer, sobretudo nas infec- reservas hepáticas de ferro (900 mg)
ções por A. duodenale. Em geral, essa vão diminuindo até se esgotarem; e a
fase é silenciosa e não diagnosticada. produção de hemoglobina cai de for-
ma progressiva.
É no período de parasitismo intestinal
quando se observam quase todas as Se em função da ingestão de ferro e da
manifestações da ancilostomíase. As espoliação feita por 700 Necator hou-
lesões que os helmintos produzem ver um déficit diário de 4 mg de ferro,
na parede intestinal resultam da apli- serão necessários 900/4 = 225 dias
cação de sua cápsula bucal contra a para que a anemia comece a mani-
mucosa, com posterior dilaceração e festar-se. Essa é a principal razão pela
sucção de sangue e do tecido lisado, qual os indivíduos parasitados podem
que lhes servem de alimento. Para apresentar uma taxa normal de hemo-
isso, utilizam seus dentes ou placas globina durante um longo período.
HELMINTOS 19

A hipoproteinemia é outro sinal clí- solicitados exames de imagem, como


nico da doença, que se acompanha radiografia de tórax, ultrassonografia
de atrofia da mucosa intestinal, redu- e tomografia computadorizada para
ção ou achatamento das vilosidades, verificação de possível ocorrência de
e diminuição da absorção intestinal. síndrome de Loeffler.
Ela parece resultar tanto das perdas Ao hemograma, pode-se notar eosi-
sanguíneas como da ingestão insufi- nofilia acentuada, com 85% de eosi-
ciente de proteínas, mas também da nófilos na contagem mielóide.
atividade deficiente do fígado devido
à anóxia que resulta da anemia. Este Até o presente, vários testes imunoló-
mesmo efeito da anemia pode ser gicos, sorológicos evidenciam reações
sentido por outros órgãos e tecidos. mediadas por antígenos dos vermes,
Lesão renais podem causar albu- mas não têm sido utilizados na prática
minúria e hematúria. pelo alto índice de reações cruzadas.

Nas infestações intensas, é comum Para o exame parasitológico de fe-


aparecer, entre a 3ª e 5ª semanas, mal zes, vários métodos para a pesquisa
estar abdominal na região epigástri- de larvas podem ser utilizados, como:
ca, anorexia, náuseas e vômitos. Pode Hoffman, Baermann-Moraes, Rugai e
haver também cólicas, diarreia, mele- coprocultura pelo método de Harada &
na, febre, cansaço e emagrecimento. Mori. Pode-se também utilizar a pes-
quisa de larvas em secreções, como
líquidos orgânicos – lavado broncoal-
Diagnóstico veolar, escarro, urina e líquido pleural.
O diagnóstico da ancilostomíase pode
ser analisado sob o ponto de vista co- Tratamento
letivo ou individual. No diagnóstico
epidemiológico (coletivo) observa- A terapia medicamentosa, tanto indi-
-se o quadro geral da população. Já o vidual quanto coletiva, com base no
diagnóstico clínico individual baseia- tratamento halopático, utiliza vários
-se na anamnese e na associação de anti-helmínticos ou vermífugos de
sintomas cutâneos, pulmonares e in- amplo espectro, capazes de matar
testinais, seguidos ou não de anemia. diferentes espécies de helmintos, os
Em ambos os casos o diagnóstico de quais são eliminados nas fezes dos
certeza será alcançado pelo exame hospedeiros.
parasitológico de fezes. Atualmente, o uso de vermífugos à
A tríade sugestiva para o diagnósti- base de pirimidinas (pamoato de piran-
co clínico é: diarreia, dor abdominal tel) e de benzimidazóis (mebendazol e
e urticária. Além disso, podem ser albendazol) têm sido os mais indicados.
HELMINTOS 20

Estes últimos são mais eficientes. O Outros representantes da classe dos


pamoato de pirantel mata os parasitos benzimidazóis também podem ser
através de bloqueio neuromuscular por utilizados, como o cambendazol, na
antagonismo colinérgico, provocando dose habitual de 360 mg em dose
paralisia muscular, enquanto o meben- única após o jantar, e o tiabenzadol
dazol e o albendazol interferem na sín- na dose de 25 mg/kg/dia por 5-7 dias.
tese da molécula de tubulina, causando
destruição na estrutura de microtúbu-
los de diferentes células. 4. LARVA MIGRANS
CUTÂNEA (LMC)
Como adjuvantes ao tratamento, po-
de-se utilizar também ivermectina e Os animais domésticos e silvestre
suplementação alimentar com ferro e possuem uma série de parasitos,
dieta hiperproteica. cujas larvas infectantes só são capa-
zes de completar o ciclo quando al-
A dose de albendazol recomenda-
cançam seu hospedeiro próprio. As
da para o tratamento é de 400 mg,
larvas desses parasitos quando infec-
em dose única (repetir em 14 dias).
tam um hospedeiro anormal, inclusive
Em casos mais graves, o uso por 3
os humanos, podem não ser capazes
a 5 dias aumenta o índice de cura.
de evoluir nesse hospedeiro, podendo
Para o mebendazol, deve ser utiliza-
então realizar migrações através do
da a dose de 100 mg, 2x ao dia, por
tecido subcutâneo ou visceral e pro-
3 dias. Há também a opção de 500
duzir as síndromes conhecidas como
mg, 1x ao dia, por 3-5 dias (aumen-
larva migrans cutânea, larva migrans
ta a eficácia). O pamoato de pirantel
visceral e larva migrans ocular.
deve ser utilizado na dosagem de 10
mg/kg (máximo 1 g), em dose única. Também denominada dermatite ser-
Para o tratamento da ancilostomíase, piginosa, dermatite pruriginosa e po-
a dosagem de ivermectina deve ser pularmente conhecida como bicho
de 200 mcg/kg, em dose única. geográfico ou bicho das praias, apre-
senta distribuição cosmopolita, po-
Os principais efeitos adversos dos
rém ocorre com maior frequência nas
antiparasitários são cefaleia, tontura,
regiões tropicais e subtropicais.
vertigem, febre, convulsões, prurido,
erupção cutânea, alopécia, náuseas e Os principais agentes etiológicos
vômitos. Ivermectina pode causar hi- envolvidos são larvas infectantes
potensão, taquicardia e edema. Além de Ancylostoma braziliense e A. ca-
disso, o albendazol é contraindicado ninum, parasitos do intestino delgado
na gravidez por ser teratogênico, e a de cães e gatos. Larvas de moscas
ivermectina está contraindicada no do gênero Gasterophilus e Hipoder-
primeiro trimestre de gestação. ma, assim como formigas da espécie
HELMINTOS 21

Sonelopis geminata, também podem pelas vias oral, cutânea e transplacen-


provocar esta síndrome. tária. As L3 sofrem duas mudas nes-
ses hospedeiros, chegam ao intesti-
no delgado e atingem a maturidade
sexual em aproximadamente quatro
semanas.
As L3 penetram ativamente na pele
do ser humano e migram através do
tecido subcutâneo durante semanas
ou meses e então morrem. À medida
que as L3 progridem, deixam atrás de
si um rastro sinuoso conhecido popu-
larmente como “bicho geográfico” ou
Figura 10. Bicho geográfico no dorso do pé direito.
“bicho das praias”.
Fonte: Google imagens
Menos frequentemente, as L3 podem
ser ingeridas e ao atingirem o intesti-
Ciclo biológico no hospedeiro no podem migrar através das vísce-
definitivo ras, provocando a síndrome da larva
migrans visceral (LMV), comumente
Ancylostoma caninum e A. brazilien- causa pelos agentes etiológicos To-
se são os agentes etiológicos mais xocara canis e Toxocara catis.
frequentes de LMC. As fêmeas des-
Essas larvas também podem atingir a
tes parasitos realizam a postura de
circulação sanguínea e serem trans-
milhares de ovos, que são eliminados
portadas aos pulmões, onde atraves-
diariamente com as fezes dos cães
sam seus capilares e alcançam a ár-
e gatos infectados. No meio exte-
vore brônquica, realizando mudas, e
rior, em condições ideais de umida-
podendo ser encontradas nos escar-
de, temperatura e oxigenação, ocorre
ros ou serem deglutidas completando
desenvolvimento da larva de primeiro
o ciclo. Todavia, são poucos os casos
estágio (L1) dentro do ovo, que eclo-
registrados de vermes adultos de A.
de e se alimenta de matéria orgânica
caninum parasitando o intestino del-
e microrganismos presentes no solo.
gado humano. Tal fato pode estar rela-
Em um período de aproximadamen-
cionado com a dificuldade de diagnós-
te sete dias, a L1 realiza duas mudas,
tico, uma vez que este é realizado pelo
atingindo o terceiro estágio, que é o
exame da cápsula bucal do parasito e
de larva infectante (L3). Esta pode so-
não pelos ovos presentes nas fezes.
breviver no solo por várias semanas.
Os cães e gatos podem se infectar
HELMINTOS 22

Patogenia e Quadro Clínico


SE LIGA! A larva migrans cutânea é au-
As partes do corpo atingidas com
tolimitada, mas a complicação principal
mais frequência são aquelas que en- é o surgimento de infecções secundá-
tram em maior contato com o solo: rias no local lesionado!
pés, pernas, nádegas, mãos e ante-
braços e, mais raramente, boca, lá-
bios e palato. Algumas vezes, as le- Diagnóstico
sões são múltiplas, podendo ocorrer Baseia-se no exame clínico que inclui
em várias partes do corpo. anamnese e presença de sintomas e
O momento da penetração pode pas- do aspecto dermatológico da lesão,
sar despercebido ou ser acompanha- caracterizado por erupção linear e
do de eritema e prurido em pacientes tortuosa na pele.
sensíveis. No local da penetração das
L3, aparece primeiramente uma le- Tratamento
são eritemopapulosa que evolui, as-
sumindo um aspecto vesicular. Em Nos casos mais benignos, o tratamen-
sua migração, as larvas produzem to pode ser dispensado, uma vez que a
um rastro saliente e pruriginoso, que infecção pode se resolver espontane-
por vezes, pode estar acompanha- amente ao fim de alguns dias. Todavia,
do de infecções secundárias decor- em alguns casos a infecção pode se es-
rentes do ato de se coçar, que leva a tender por semanas ou meses. Assim,
escoriações na pele. Nas lesões mais para uso tópico, a droga de escolha é
antigas, há formação de crostas, que o tiabendazol, sendo recomendado a
desaparecem lentamente, deixando aplicação de pomada, quatro vezes ao
uma linha sinuosa escura, que poste- dia. Geralmente, o prurido diminui em
riormente também desaparece. 24 a 72 h e a cura clínica ocorre dentro
de 7 a 14 dias. Em casos de infecções
Em alguns casos, há comprometi-
múltiplas, associa-se o uso oral de tia-
mento pulmonar apresentando sinto-
bendazol na dose de 25 mg/kg, 2x ao
mas alérgicos (síndrome de Loeffler).
dia, durante dois dias, não excedendo
Nos casos de reinfecção, o quadro de
3 g por dia.
hipersensibilidade agrava-se devido
à reação do hospedeiro frente à ação O uso oral de 400 mg de albendazol
antigênica das larvas, sendo frequen- ou ivermectina na dose de 200 mg/
te o aparecimento de eosinofilia. kg, tem apresentado sucesso no tra-
tamento da LMC.
Nos casos de infecções microbia-
nas secundárias, deve-se associar
HELMINTOS 23

ao tratamento de escolha a utiliza- Nos casos de intolerância a medica-


ção de anti-histamínicos e esteroides ção, embora menos eficiente, pode-
tópicos. -se usar cloretila ou neve carbônica,
que matam a larva pelo frio.

MAPA MENTAL SOBRE A ANCILOSTOMÍASE E LMC

Ancilostomíase Larva migrans cutânea

Necator americanus e
Dermatite serpiginosa
Ancylostoma duodenale

Ancylostoma braziliense
Dimorfismo sexual
e Ancylostoma caninum

Larvas filarióides

Larvas rabditóides Lesão eritematopapulosa

Síndrome de Loeffler →
Intestino delgado
pode estar presente

Formas de transmissão Diagnóstico

• Vetores mecânicos
• Mebendazol (100 mg) e Exame clínico bem feito!
• Água
albendazol (400 mg)
• Alimentos
• Pamoato de pirantel
• Penetração ativa e direta
(10 mg/kg)
Tratamento
• Diarreia
• Dor abdominal
Tratamento
• Urticária
Autolimitada

Dermatite urticariforme Exame parasitológico de fezes


• Albendazol → 400 mg
• Ivermectina → 200 mg/kg

Síndrome de Loeffler Hipoproteinemia


HELMINTOS 24

5. SCHISTOSOMA Focos de transmissão isolados encon-


MANSONI E tram-se do Pará ao Rio Grande do Sul,
ESQUISTOSSOMOSE sendo os do Sul de formação recente.
Introdução
SE LIGA! A esquistossomose é uma
Agente da esquistossomose intes- doença de notificação compulsória caso
tinal, ocorrendo na África, Antilhas e ocorra em regiões não endêmicas.
América do Sul. Pertence ao filo dos
platelmintos, classe Trematoda, famí-
Morfologia
lia Schistosomatidae.
No Brasil, a doença é popularmente A morfologia do S. mansoni deve ser
conhecida como “xistose”, “barriga estudada nas várias fases que podem
d’água” ou “mal-do-caramujo”, atin- ser encontradas em seu ciclo biológi-
gindo milhões de pessoas. co: adulto (macho e fêmea), ovo, mi-
racídio, esporocisto e cercária.
As espécies do gênero Schistosoma
que afetam o homem chegaram às • Macho → mede cerca de 1 cm.
Américas durante o tráfico de escra- Tem cor esbranquiçada, com te-
vos e com os imigrantes orientais asiá- gumento recoberto de minúsculas
ticos. Entretanto, apenas o S. mansoni projeções (tubérculos). Apresenta
aqui se fixou, seguramente pelo en- o corpo dividido em duas porções:
contro de bons hospedeiros interme- anterior, na qual encontramos a
diários e pelas condições ambientais ventosa oral e a ventosa ventral
semelhantes às da região de origem. (acetábulo), e a posterior, que se
inicia logo após a ventosa ventral,
onde encontramos o canal ginecó-
Epidemiologia foro, este nada mais é do que do-
A esquistossomose existe em 76 paí- bras das laterais do corpo no sen-
ses da África, Ásia e Américas, mas S. tido longitudinal que servem para
mansoni é encontrado sobretudo na albergar a fêmea e fecundá-la.
África, na América do Sul e no Caribe. Logo atrás do acetábulo encontra-
mos de sete a nove massas testi-
Atualmente, as principais áreas en-
culares que se abrem diretamente
dêmicas no Brasil encontram-se em
no canal ginecóforo. O verme não
uma faixa oriental que inclui regiões
possui órgão copulador e, assim,
do Rio Grande do Norte, Paraíba, Per-
os espermatozoides passam pelos
nambuco, Alagoas e Sergipe, alar-
canais deferentes, que se abrem
gando-se nos estados da Bahia, Mi-
no poro genital, dentro do canal
nas Gerais e áreas do Espírito Santo.
HELMINTOS 25

ginecóforo, e aí alcançam a fêmea, cílios maiores e espículos anterio-


fecundando-a. res, provavelmente importantes no
processo de penetração nos mo-
• Fêmea → mede cerca de 1,5 cm.
luscos e, finalmente, terminações
Tem cor mais escura devido ao
nervosas, que teriam funções tá-
ceco com sangue semidigerido, e
teis e sensoriais. O aparelho excre-
possui tegumento liso. Na metade
tor é composto por solenócitos.
anterior, encontramos a ventosa
oral e o acetábulo. Seguinte a este Um único miracídio produz 300
temos a vulva, depois o útero (com mil cercarias e 50% deles morrem
um ou dois ovos) e o ovário. A me- após 8 h, com o restante vindo a
tade posterior é preenchida pelas morrer em até 12 h.
glândulas vitelogênicas e pelo ceco. • Cercária → apresentam compri-
• Ovo → mede cerca de 150 mcm de mento total de 500 mcm, cauda bi-
comprimento e 60 mcm de largu- furcada medindo 230 por 50 mcm
ra, sem opérculo, com um formato e corpo cercariano com 190 por 70
oval, e na parte mais larga apre- mcm. Duas ventosas estão presen-
senta um epísculo voltado para tes. A ventosa oral apresenta as ter-
trás. O que caracteriza o ovo ma- minações das chamadas glândulas
duro é a presença de um miracídio de penetração, sendo quatro pares
formado, visível pela transparência pré-acetabulares e quatro pares
da casca. O ovo maduro é a forma pós-acetabulares, e abertura que
usualmente encontrada nas fezes. se conecta com o chamado intes-
tino primitivo, primórdio do sistema
• Miracídio → apresenta forma cilín- digestivo. A ventosa ventral é maior
drica, com dimensões médias de e possui musculatura mais desen-
180 mcm de comprimento por 64 volvida. É principalmente através
mcm de largura. Apresenta, ade- desta ventosa que a cercária fixa-
mais, células epidérmicas, onde -se na pele do hospedeiro no pro-
se implantam os cílios, os quais cesso de penetração. A cauda ser-
permitem o movimento no meio ve apenas para a movimentação da
aquático. A extremidade anterior larva no meio líquido.
apresenta uma papila apical, ou te-
rebratorium, que pode se amoldar
em forma de uma ventosa. Nela, Habitat
encontram-se as terminações das
Os vermes adultos vivem no sistema
glândulas adesivas de penetra-
porta. Os esquistosômulos quando
ção e o tubo digestivo. Também
chegam ao fígado apresentam um
são encontrados um conjunto de
ganho de biomassa exponencial e,
HELMINTOS 26

após atingirem a maturação sexual, Os ovos podem ficar presos na muco-


em torno de 25 dias, migram para os sa intestinal ou serem arrastados para
ramos terminais da veia mesentérica o fígado. Os ovos que conseguirem
inferior, principalmente na altura da chegar à luz intestinal vão para o ex-
parede intestinal do plexo hemorroi- terior junto com o bolo fecal e têm uma
dário, onde se acasalam e, em torno expectativa de vida de 24 horas (fezes
do 35º dia, as fêmeas iniciam a pos- líquidas) a cinco dias (fezes sólidas).
tura dos ovos. Alcançando a água, os ovos liberam o
miracídio, estimulado pelos seguintes
fatores: temperaturas mais altas, luz
Ciclo Biológico intensa e oxigenação da água.
O Schistosoma mansoni, ao atingir A capacidade de penetração do mi-
a fase adulta de seu ciclo biológico racídio nos moluscos restringe-se a
no sistema vascular do homem e de cerca de oito horas após a eclosão e é
outros mamíferos, alcança as veias notavelmente influenciada pela tem-
mesentéricas, principalmente a veia peratura. O epitélio é ultrapassado e
mesentérica inferior, migrando con- a larva se estabelece no tecido sub-
tra a corrente circulatória. As fêmeas cutâneo. Esse processo tem duração
fazem a postura no nível da submu- entre 10 e 15 minutos e cerca de ape-
cosa. Cada fêmea põe cerca de 400 nas 30% dos miracídios são capazes
ovos por dia na parede de capilares e de penetrar e evoluir em B. glabrata.
vênulas, e cerca de 50% destes ga-
Inicialmente, o esporocisto apresenta
nham o meio externo. Cinco anos é a
movimentos ameboides, que dimi-
vida média do Schistosoma mansoni,
nuem com o tempo, até a completa
embora alguns casais possam viver
imobilidade da larva. As células ger-
mais de 30 anos eliminando ovos.
minativas, em número de 50 a 100,
Os ovos colocados nos tecidos levam
iniciam, então, um intenso processo
cerca de uma semana para tornarem-
de multiplicação (poliembrionia), fa-
-se maduros (miracídio formado). Da
zendo com que, após 72 horas, a lar-
submucosa chegam à luz intestinal.
va, chamada esporocisto primário, do-
Essa migração demora dias; isto é, bre de tamanho. Na segunda semana
desde que o ovo é colocado, até que da infecção, observa-se no interior do
atinja a luz intestinal, decorre um pe- esporocisto uma série de ramifica-
ríodo mínimo de seis dias, tempo ne- ções tubulares, que preenchem todos
cessário para a maturação do ovo. Se, os espaços intercelulares do tecido
decorridos cerca de 20 dias, os ovos conjuntivo. No interior dessas rami-
não conseguirem atingir a luz intesti- ficações, as células germinativas en-
nal, ocorrerá a morte dos miracídios. contram-se em franca multiplicação.
HELMINTOS 27

Em condições ideais de temperatura Apesar de as cercarias poderem vi-


– entre 25 e 28°C – ocorre a formação ver por 36 a 58 horas, sua maior ati-
dos esporocistos secundários, que se vidade e capacidade infectiva ocorrem
inicia a partir do 14° dia após a pe- nas primeiras oito horas de vida. Na-
netração do miracídio. A formação dam ativamente na água, não sendo,
do esporocisto secundário inicia-se entretanto, atraídas pelo hospedeiro
com um aglomerado de células ger- preferido, mas só se desenvolverão
minativas nas paredes do esporocisto no hospedeiro correto. As cercarias
primário, verificando-se uma vacuoli- são capazes de penetrar na pele e
zação acentuada na parte central da nas mucosas. Ao alcançarem a pele
larva. Esses aglomerados se reorga- do homem, se fixam preferentemente
nizam e dão origem a septos, fican- entre os folículos pilosos com auxílio
do o esporocisto primário dividido em das duas ventosas e de uma substân-
150 a 200 camadas, cada septo ou cia mucoproteica secretada por suas
camada já podendo ser considerado glândulas acetabulares. Em seguida,
um esporocisto secundário, esporo- tomam a posição vertical, apoiando-
cisto-filho ou esporocisto II. -se na pele pela ventosa oral. Por ação
Os esporocistos secundários, algum lítica e ação mecânica, promovem a
tempo depois de terem atingido o penetração do corpo cercariano e a
seu destino final, apresentam três concomitante perda da cauda. Este
áreas de estruturas bem definidas. processo dura de 5 a 15 minutos.
A primeira seria o chamado poro de A penetração e migração coincidem
nascimento. A segunda área apre- com o esvaziamento das glândulas
senta cercárias desenvolvidas ou em pré-acetabulares ricas em enzimas
desenvolvimento. Por fim, a terceira proteolíticas. Quando ingeridas com
tem células embrionárias, que po- água, as que chegam ao estôma-
deriam representar um outro tipo de go são destruídas pelo suco gástri-
reprodução. co, mas as que penetram na mucosa
Esta última geração de células em- bucal desenvolvem-se normalmen-
brionárias origina novos esporocistos, te. Após a penetração, as larvas re-
que são então chamados esporocis- sultantes, denominadas esquistos-
tos III. Esses esporocistos III fornecem sômulos, adaptam-se às condições
a única explicação plausível para uma fisiológicas do meio interno, migram
prolongada eliminação de cercarias pelo tecido subcutâneo e, ao pene-
nos caramujos infectados, pois não trarem em u, vaso, são levadas passi-
ocorrendo isso, deveria haver uma vamente da pele até os pulmões pelo
exaustão no processo de formação sistema vascular sanguíneo, via cora-
cercariana nos esporocistos II. ção direito.
HELMINTOS 28

Dos pulmões, os esquistossômulos se a penetração. Daí migram, acasala-


dirigem para o sistema porta, poden- dos, para o território da veia mesen-
do usar duas vias para realizar essa térica inferior, onde farão oviposição.
migração: uma via sanguínea e outra A transformação dos ovos imaturos
transtissular. A migração pela via san- depositados nos tecidos em torno
guínea seria feita pela seguinte rota: do 35° dia da infecção e a formação
das arteríolas pulmonares e dos capi- do miracídio (ovo maduro) demanda
lares alveolares os esquistossômulos de seis dias. Os primeiros
ganhariam as veias pulmonares (pe- ovos são vistos nas
quena circulação) chegando ao cora- fezes cerca de 42 dias
ção esquerdo; acompanhando o fluxo após a infecção do
sanguíneo, seriam disseminados pela hospedeiro.
aorta (grande circulação) para mais di-
versos pontos até chegar a rede capilar
terminal. Aqueles que conseguissem
chegar ao sistema porta-hepático per-
maneceriam ali, os demais ou reinicia-
riam novo ciclo ou pereceriam. Já pela
via transtissular, os esquis-
tossômulos seguiriam
o seguinte caminho:
dos alvéolos pulmo-
nares perfurariam ati-
vamente o parênquima
pulmonar, atravessando
a pleura e o diafragma,
e chegariam à cavidade
peritoneal, perfurando a
cápsula e o parênquima
hepático, alcançando, final-
mente, o sistema porta-hepá-
tico. Possivelmente, as duas vias
de migração estão envolvidas, sendo
a sanguínea a mais importante. Figura 11. Ciclo do S. mansoni. A) ovo com miracídio al-
cançando a água; B) miracídio nadando para um caramujo –
Uma vez no sistema porta-hepático, Biomphalaria; C) penetração do miracídio nas partes moles
do caramujo; D) esporocisto; E) esporocisto; F) esporocisto
os esquistossômulos se alimentam e 2º com cercárias dentro; G) cercárias saindo do caramujo; H)
se desenvolvem transformando-se cercárias nadando para o novo hospedeiro. Imagem retirada
do livro Parasitologia Humana, 13ª ed., David Pereira Neves,
em machos e fêmeas 25-28 dias após 2016.
HELMINTOS 29

Via de transmissão ou mesmo do Trematoda de outros


animais penetram na pele do homem.
Penetração ativa das cercárias na
Essa dermatite - exantema maculo-
pele e mucosa. As cercarias penetram
papular pruriginoso- é caracterizada
mais frequentemente nos pés e nas
por “sensação de comichão”, erupção
pernas por serem áreas do corpo que
urticariforme e é seguida, dentro de
mais ficam em contato com águas
24 horas, por eritema, edema, peque-
contaminadas. O horário em que são
nas pápulas e dor. É, em geral, mais
vistas em maior quantidade na água
intensa nas reinfceções (hipersensi-
e com maior atividade é entre 10 e 16
bilidade) nas quais há interferência de
horas, quando a luz solar e o calor são
mastócitos (liberação de histamina),
mais intensos. Os locais onde se dá
complemento, eosinófilos e IgE.
a transmissão mais frequente são os
focos peridomiciliares, como valas de • Esquistossomose aguda: fase pré-
irrigação de horta, açudes (reservató- -postural → em geral, é uma fase
rios de água e local de brinquedo de com sintomatologia variada, que
crianças) e pequenos córregos onde ocorre cerca de 10-35 dias após
as lavadeiras e crianças costumam ir. a infecção. Neste período, há pa-
cientes que não se queixam de
SE LIGA! A liberação das cercárias se-
nada (forma inaparente ou as-
gue o ciclo circadiano, ou seja, é mais sintomática) e outros reclamam
intensa no período entre 10 e 16 horas. de mal-estar, com ou sem febre,
sintomas pulmonares (tosse), do-
res musculares, desconforto ab-
Patogenia e manifestações
dominal e um quadro de hepatite
clínicas
aguda, causada, provavelmente,
A patogenia da esquistossomose está pelos produtos da destruição dos
ligada a vários fatores, como cepa do esquistossômulos.
parasito, carga parasitária adquirida,
• Esquistossomose aguda: fase agu-
idade, estado nutricional e resposta
da → aparece em torno de 50 dias
imunológica do indivíduo. De todos
e dura até cerca de 120 dias após
estes fatores parece que os dois mais
a infecção. Nessa fase, pode ocor-
importantes são a carga parasitária e
rer uma disseminação miliar de
a resposta do sistema imunológico de
ovos, principalmente na parede do
cada paciente.
intestino, com áreas de necrose, le-
A chamada dermatite cercariana ou vando a uma enterocolite aguda; e
dermatite do nadador pode ocorrer no fígado, provocando a formação
quando as cercárias do Schistosoma de granulomas simultaneamente,
HELMINTOS 30

caracterizando a forma toxêmica peristaltismo e constipação cons-


que pode apresentar-se como do- tante. Entretanto, a maioria dos ca-
ença aguda, febril, acompanhada sos crônicos é benigna, com pre-
de sudorese, calafrios, emagreci- dominância de alguns granulomas
mento, fenômenos alérgicos, diar- nodulares, e o paciente queixan-
reia, disenteria, cólicas, tenesmo, do-se, esporadicamente, de dores
hepatoesplenomegalia discreta, abdominais e fases de diarreia ou
linfadenopatia, leucocitose com constipação, intercaladas de lon-
eosinofilia, aumento das globuli- gos períodos normais. A diarreia
nas e alterações discretas das pro- mucossanguinolenta é devido a
vas de função hepática. passagem simultânea de vários
ovos para a luz intestinal, ocasio-
nando pequenas, mas numerosas,
Pode haver até mesmo a morte do hemorragias e edema.
paciente na fase toxêmica ou, então,
como ocorre com a maioria dos casos, • Fígado: as alterações hepáticas tí-
evoluir para a esquistossomose crô- picas surgem a partir do início da
nica, cuja evolução é lenta. oviposição e formação de granu-
lomas. Em consequência, teremos
É importante ressaltar que o granulo-
um quadro evolutivo, dependendo
ma da fase crônica é benéfico para o
do número de ovos que chega a
paciente, apesar de parecer parado-
esse órgão, bem como do grau de
xal, já que a esquistossomose é tipi-
reação granulomatosa que indu-
camente uma imunopatologia, pois
zem. No início, o fígado apresenta-
em indivíduos imunossuprimidos não
-se aumentado de volume e bas-
ocorre reação granulomatosa, mas
tante doloroso à palpação. Os ovos
existe uma extensa área de necrose
prendem-se nos espaços porta,
liquefativa em torno do ovo, devido a
com a formação de numerosos
enzimas proteolíticas produzidas pelo
granulomas. Com o efeito acumu-
miracídio.
lativo das lesões granulomatosas
em torno dos ovos, as alterações
Esquistossomose crônica hepáticas se tornarão mais sérias.
O fígado, que inicialmente está au-
• Intestino: em muitos casos, o pa- mentado de volume, em fase pos-
ciente apresenta diarreia mucos- terior pode estar menor e fibrosado.
sanguinolenta, dor abdominal e te- Nesta fase, aparece o quadro de
nesmo. Nos casos crônicos graves, “fibrose de Symmers”, ou seja, uma
pode haver fibrose da alça retos- peripileflebite granulomatosa, com
sigmoide, levando a diminuição do neoformação conjuntivo-vascular
HELMINTOS 31

ao redor dos vasos portais, onde se • Varizes → desenvolvimento da cir-


vê uma retração da cápsula hepá- culação colateral anormal intra-he-
tica por fibrosamento dos espaços pática (shunts) e de anastomoses
porta e manutenção da integrida- ao nível do plexo hemorroidário,
de do parênquima hepático. Dessa umbigo, região inguinal e esôfago,
forma, não se nota a cirrose hepá- em uma tentativa de compensar
tica, mas sim a fibrose do órgão, a circulação portal obstruída e di-
cuja retração de sua cápsula em minuir a hipertensão portal. Essa
numerosos pontos provoca a for- circulação colateral do esôfago
mação de saliências ou lobulações. promove a formação das “varizes
esofagianas”, que podem romper-
-se, provocando uma hemorragia,
Assim sendo, os granulomas hepáti- muitas vezes fatal.
cos irão causar uma endoflebite aguda
e fibrose periportal, a qual provocará • Ascite (barriga d’água) → este
obstrução dos ramos intra-hepáticos achado clínico é visto nas for-
da veia porta. Esta obstrução trará, mas hepatoesplênicas mais gra-
como consequência, a manifestação ves e decorre das alterações he-
mais típica e mais grave da esquis- modinâmicas, principalmente a
tossomose que é a hipertensão por- hipertensão.
tal. Essa hipertensão poderá intensi- • Lesões a distância → são devi-
ficar-se com a evolução da doença, das a antígenos e complexos an-
causando uma série de alterações. tígeno-anticorpo que tendem a
• Esplenomegalia → inicialmente, depositar-se em certos órgãos,
ocorre uma hiperplasia do tecido como rins e pulmões. Os imuno-
reticular e dos elementos do sis- complexos são capazes de ativar
tema monocítico fagocitário, que é o complemento, desencadeando
provocada por um fenômeno imu- reações inflamatórias. No rim, cos-
noalérgico. Observa-se, predomi- tumam depositar-se nos gloméru-
nantemente na polpa vermelha e los, levando a lesões que se tradu-
centro germinal dos folículos lin- zem por proteinúria e até mesmo
fóides, uma proliferação basofílica hematúria.
que coincide com um aumento de
imunoglobulinas e posteriormen-
te, devido principalmente a con-
gestão passiva do ramo esplênico,
com distensão dos sinusóides.
HELMINTOS 32

MAPA MENTAL SOBRE AS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES


CLÍNICAS POR FASES NA ESQUISTOSSOMOSE

Esquistossomose

Fase

Aguda Aguda Crônica

• Enterocolite aguda Intestino


Pré-postural
• Toxemia hepática
• Sudorese
• Calafrios • Diarreia mucossanguinolenta
• Assintomática • Emagrecimento • Dor abdominal
• Mal estar • Atopias • Tenesmo
• Febre • Disenteria
• Tosse • Cólicas
• Dores musculares • Tenesmos Fígado
• Desconforto abdominal • Linfadenia
• Hepatite aguda • Eosinofilia
• Alterações da função hepática
• Hepatomegalia dolorosa
• Fibrose de Symmers
• Hipertensão portal

Diagnóstico
Esplenomegalia e basofilia
Contribuem para que se suspeite des-
ta doença o fato de proceder o paciente
Ascite
de uma zona endêmica ou de ter visitado
um foco conhecido e nele se banhado, se
o quadro clínico for compatível com os da Varizes esôfagogástricas
esquistossomose.
Entretanto, os variados quadros que a in- Lesões à distância

fecção por S. mansoni costuma produzir


podem ter outras causas, nenhum sinal ou
Rins Pulmões
sintoma lhe sendo específico.
HELMINTOS 33

Os métodos laboratoriais são, portan- Ambos são administrados por via


to, essências para o diagnóstico. Eles oral, em dose única que depende do
pode ser: peso do paciente.
• Coproscópicos: busca de ovos do O tratamento com o praziquantel
helminto nas fezes. Os principais (comprimidos com 600 mg) é feito
métodos laboratoriais para encon- com 40 mg/kg. Nas infecções ma-
tro do ovo nas fezes são: exame ciças, administrar duas doses de 25
direto a fresco, sedimentação es- ou 30 mg/kg cada, com intervalo de
pontânea, centrífugo-sedimenta- 6 horas. A taxa de cura varia de 70 a
ção, Kato-Katz (quantitativo e mais 100%, segundo as regiões.
utilizado); Já o uso de oxamniquine (cápsulas
• Imunológicos: demonstração da de 250 mg ou xarope 50 mg/ml) é
presença de anticorpos ou de an- feita com dose de 15 mg/kg. Tomar
tígenos de S. mansoni no soro por de preferência depois das refeições.
técnicas sorológicas, ou pela intra- Crianças com menos de 30 kg devem
dermorreação. Apresentam pos- tomar duas doses, cada uma com 10
sibilidade de falso-positivo e rea- mg/kg, em intervalo de 4 a 6 horas.
ções cruzadas com espécies não Os principais efeitos colaterais des-
mansônica, sendo indicados ape- sas drogas são cefaleia, tontura, verti-
nas quando a parasitemia é muito gem, mal estar, febre, excitação, irrita-
baixa; bilidade e diarreia. Praziquantel pode
causar eosinofilia e broncopneumonia
• Método da DNA polimerase;
por imunocomplexos. Oxamniquine
• Exame histopatológico em amos- pode causar sudorese, aumento de
tra de biópsia retal. transaminases, hematúria e colúria.
Ambos são contraindicados na gravi-
dez e lactação.
Em relação ao diagnóstico por ima-
gem, pode-se utilizar US ou TC, sen- Alguns casos graves podem requerer
do mais utilizados para acompanha- tratamento cirúrgico.
mento da fase crônica da doença.
Profilaxia
Tratamento Deve ser feita por meio do sanea-
Dois medicamentos de alta eficácia, mento básico e educação sanitá-
baixa toxicidade e fácil administra- ria. Ademais, orientações devem
ção estão atualmente em uso, sendo ser ofertadas, como não entrar em
eles o praziquantel e a oxamniquine. contato com coleções de água que
HELMINTOS 34

contenham caramujos. Outras medi- O Brasil apresenta focos atípicos de


das incluem o controle biológico dos surto da doença, sobretudo em Per-
moluscos com niclosamida, remover nambuco (Recife e região metro-
vegetação aquática, aumentar a velo- politana). Desde 2014, o país tem
cidade da corrente aquática, introdu- implantado medidas para total erra-
zir linhagens resistentes ao S. man- dicação da doença no estado.
soni e o tratamento preventivo com
praziquantel nas regiões endêmicas.
Taxonomia
REINO Animmalia
6. WUCHERERIA SUBREINO Metazoa
BANCROFT E FILARIOSE FILO Nemathelmynthes
A filariose linfática humana é causa- CLASSE Nematoda
da por helmintos Nematoda das es- ORDEM Spirurida
pécies Wuchereria bancrofti, Brugia FAMÍLIA Onchocercidae

malayi e B. timori. Essa enfermidade é SUBFAMÍLIAS Ancylostominae/Bunostominae

endêmica em várias regiões de muita GÊNERO Wuchereria

pobreza e com clima tropical ou sub- ESPÉCIE Wuchereria bancrofti

tropical na Ásia, África e Américas, Tabela 2. Tabela retirada e adaptada da aula sobre
Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
sendo um sério problema de saúde Sanarflix.
pública. É estimada em 1 bilhão a po-
pulação que vive em áreas de risco de
contrair a infecção e em 120 milhões Transmissão: vetor biológico
o número de parasitados. Destes, FILO Arthropoda
aproximadamente 112 milhões são CLASSE Insecta
portadores de W. bancrofti. A filario- ORDEM Diptera
se linfática no continente americano FAMÍLIA Culicidae
é causada exclusivamente pela W. GÊNERO Culex
bancrofti, sendo também conhecida ESPÉCIE Culex quinquefasciatus
como elefantíase, em uma de suas Tabela 3. Tabela retirada e adaptada da aula sobre
manifestações na fase crônica. Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
Sanarflix.
A Organização Mundial da Saúde es-
tabeleceu uma meta para erradicação
da filariose no mundo, incluindo a in- A transmissão se dá unicamente pela
terrupção da transmissão, prevenção picada do inseto vetor e deposição
e alívio de incapacidades associadas das larvas infectantes na pele lesada.
à filariose linfática. Parece que o estímulo que provoca
a saída das larvas da probóscide do
HELMINTOS 35

mosquito é o calor emanado do corpo microfilárias que possuem uma


humano. A pele, estando úmida, per- membrana extremamente delica-
mite a progressão e penetração das da e que funciona como uma bai-
larvas. É importante salientar que a nha flexível. A microfilária mede de
vida média de um mosquito do gêne- 250 a 300 mcm de comprimento e
ro Culex é de aproximadamente um se movimenta ativamente na cor-
mês e o ciclo biológico do parasito rente sanguínea do hospedeiro. A
no interior deste vetor (de microfilária presença da bainha é importante,
ingerida até larva L3) ocorre em tor- pois alguns filarídeos encontrados
no de 20 dias. Assim, é curto o pe- no sangue não possuem tal estru-
ríodo de tempo no qual o vetor pode tura, sendo este um dos critérios
estar transmitindo o parasito ao ser morfológicos para o diagnóstico
humano. diferencial.
• Larvas → são encontradas no in-
Biologia do parasito seto vetor. A larva de primeiro es-
tágio (L1) mede em torno de 300
A W. bancrofti possui diferentes for- mcm de comprimento e é originá-
mas evolutivas nos hospedeiros ver- ria da transformação da microfilá-
tebrados (humanos) e invertebrados ria. Essa larva se diferencia em lar-
(mosquitos vetores). va de segundo estágio (L2), duas
• Verme adulto macho → corpo del- a três vezes maior, e sofre nova
gado e branco-leitoso. Mede de muda originando a larva infectante
3,5-4,5 cm de comprimento e 0,1 (L3) que tem entre 1,5 e 2,0 mcm
mm de diâmetro. Extremidade an- de comprimento.
terior afilada e posterior enrolada
ventralmente.
Habitat
• Verme adulto fêmea → corpo del-
Vermes adultos machos e fêmeas
gado e branco-leitoso. Mede de
permanecem juntos nos vasos e gân-
7 a 10 cm de comprimento e 0,3
glios linfáticos humanos, vivendo, em
mm de diâmetro. Possui órgãos
média, quatro a oito anos. As regiões
genitais duplos, com exceção da
do corpo humano que normalmente
vagina, que é única e se exterioriza
abrigam as formas adultas são: pél-
em uma vulva localizada próxima à
vica (atingindo pernas e escroto), ma-
extremidade anterior.
mas e braços (mais raramente). São
• Microfilária → esta forma tam- frequentemente localizados nos va-
bém é conhecida como embrião. sos linfáticos do cordão espermático,
A fêmea grávida faz a postura de causando aumento e dano escrotal.
HELMINTOS 36

As microfilárias eliminadas pela fê- tornam-se vermes adultos e, 7 a 8


mea grávida saem dos ductos linfáti- meses depois, as fêmeas grávidas
cos e ganham a circulação sanguínea produzem as primeiras microfilárias.
do hospedeiro.
Patogenia
Ciclo biológico
É importante distinguir os casos
É do tipo heteroxênico. A fêmea Culex de infecção, ou seja, presença de
quinquefasciatus, ao exercer o hema- vermes e microfilárias sem sintoma-
tofagismo em pessoas parasitadas, tologia aparente, dos casos de doen-
ingere microfilárias, que no estômago ça. Os pacientes assintomáticos ou
do mosquito, após poucas horas, per- com manifestações discretas podem
dem a bainha, atravessam a parede apresentar alta microfilaremia, e os
do estômago do inseto, caem na ca- pacientes com elefantíase ou outras
vidade geral e migram para o tórax, manifestações crônicas não apresen-
onde se alojam nos músculos toráci- tam microfilaremia periférica ou esta
cos e transformam-se em uma larva, é bastante reduzida. Algumas mani-
a larva salsichoide ou L1. Seis a dez festações, especialmente as imunoin-
dias após o repasto infectante, ocorre flamatórias, se devem às microfilá-
a primeira muda originando a L2. rias, e outras, aos vermes adultos. As
Esta cresce muito e, 10-15 dias de- alterações provocadas pelos vermes
pois, sofre a segunda muda transfor- adultos são mais conhecidas, poden-
mando-se em larva infectante (L3), do incluir desde uma pequena estase
medindo aproximadamente 2 mm, linfática até a elefantíase. As lesões
que migra pelo inseto até alcançar a podem ser de origem inflamatória ou
probóscide (aparelho picador), con- não e são oriundas de dois fatores
centrando-se no lábio do mosquito. principais: mecânicos e irritativos.
O ciclo no hospedeiro invertebrado • Ação mecânica → a presença de
é de 15 a 20 dias em temperatura vermes adultos dentro de um vaso
de 20-25°C, mas, em temperaturas linfático pode provocar estase lin-
mais elevadas, pode ocorrer em me- fática com linfangiectasia (dilata-
nor período. Em condições de labora- ção dos vasos linfáticos); e derra-
tório, este ciclo ocorre em 12-15 dias. mamento linfático ou linforragia.
Quando o inseto vetor vai fazer novo Esse derramamento, ocorrendo
repasto sanguíneo, as larvas L3 esca- nos tecidos, provocará o edema
pam do lábio, penetram pela solução linfático. Ocorrendo na cavidade
de continuidade da pele do hospedei- abdominal, teremos a ascite linfá-
ro, migram para os vasos linfáticos, tica e, quando na túnica escrotal,
HELMINTOS 37

a linfocele. Pode também ocorrer crescimento para o desenvolvimento


derramamento de linfa nas vias de linfangiectasias.
urinárias (linfúria/quilúria).
• Ação irritativa → a presença dos Manifestações clínicas
vermes adultos dentro dos vasos
linfáticos, bem como dos produtos A doença caracteriza-se por uma
oriundos do seu metabolismo ou variedade de manifestações clínicas
de sua desintegração após a mor- que podem ser devidas aos vermes
te, provoca fenômenos inflamató- adultos no sistema linfático ou oriun-
rios. Como consequência, teremos das da resposta imune/inflamatória
a linfangite retrógrada (inflamação do hospedeiro contra microfilárias.
dos vasos) e adenite (inflamação e As quatro principais formas clínicas
hipertrofia dos gânglios linfáticos). da filariose linfática são: assintomá-
Frequentemente aparecem fenô- tica ou doença subclínica; manifesta-
menos alérgicos, como urticárias e ções agudas; manifestações crônicas;
edemas extrafocais. e eosinofilia pulmonar tropical (EPT).
Indivíduos assintomáticos são aque-
O conjunto das duas ações, com o les com microfilárias no sangue e sem
passar dos anos, evolui para o qua- sintomatologia aparente. Mas, com o
dro de elefantíase devido ao proces- uso da linfocintilografia e da ultrasso-
so inflamatório crônico, com fibrose nografia, tem-se verificado que esses
crônica. assintomáticos, na realidade, apre-
sentam doença subclínica com danos
aos vasos linfáticos (dilatação e pro-
SE LIGA! A linfangite é retrógrada, ou liferação do endotélio) ou ao sistema
seja, surge da matriz dos membros em
direção às regiões periféricas, o que per-
renal (hematúria microscópica), me-
mite diferenciar de outros tipos de lin- recendo atenção médica precoce.
fangite, como a bacteriana, por exemplo.
As manifestações agudas são prin-
cipalmente a linfangite retrógrada
Fatores de virulência localizada principalmente nos mem-
bros e adenite, associadas a febre e
A presença da Wolbachia sp asso- mal estar. As linfangites agudas têm
ciada ao W. bancrofti causa aumen- curta duração e evoluem no sentido
to da patogenicidade, uma vez que da raiz do membro para a extremida-
ocorre uma simbiose, com maior ex- de. As adenites aparecem principal-
pressão gênica, culminando na maior mente nas regiões inguinal, axilar e
liberação de citocinas e fatores de epitrocleana.
HELMINTOS 38

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA FILARIOSE

FILARIOSE

Fase

Assintomática Aguda Crônica

Linfangite retrógrada Inicia-se após alguns


Doença subclínica
localizada nos membros anos dos ataques
agudos em moradores
de áreas endêmicas
Já existem danos nos vasos Adenite → regiões inguinal,
linfáticos ou sistema renal axilar e epitrocleana
Linfedema
As manifestações crônicas são linfede-
Febre
ma, hidrocele, quilúria e elefantíase, e Hidrocele

iniciam-se, em geral, alguns anos após


Quílúria
o início dos ataques agudos em mora- Mal estar

dores de áreas endêmicas. A hidrocele Elefantíase


é a mais comum destas manifestações crônicas e
frequentemente se desenvolve na ausência de rea- Eosinofilia
pulmonar tropical
ções inflamatórias prévias. Pacientes com hidrocele
podem apresentar microfilárias no sangue periféri- Crise asmatiforme
co. A elefantíase geralmente se localiza nos mem-
bros inferiores e na região escrotal, e está associada Tosse paroxísitca

a episódios inflamatórios recorrentes. A incidência


Falta de apetite
e gravidade das manifestações aumentam com a
idade e lesões crônicas podem tornar-se irreversí- Fibrose intersticial crônica
veis. Alguns pacientes também podem apresentar
comprometimento renal (quilúria). A eosinofilia pul- Perda de peso
monar tropical é uma síndrome caracterizada por
sintomas de asma brônquica, sendo uma manifes-
tação relativamente rara. É uma hiper-responsivi-
dade aos antígenos filariais. Pode ocorrer crise as-
matiforme e tosse paroxística, com falta de apetite,
perda de peso e, na fase crônica, pode evoluir para
fibrose intersticial crônica nos pulmões.
HELMINTOS 39

SAIBA MAIS!

• Quilocele → presença de líquido linfático, rico em quilomícrons, situado entre a túnica


albugínea e a mucosa da bolsa escrotal.
• Quilúria → eliminação de líquido linfático rico em quilomícrons pelas vias urinárias. A urina
se torna esbranquiçada e com aspecto leitoso.
• Linfoescroto → entidade rara que ocorre pela ruptura dos vasos linfáticos mais superfi-
ciais, com extravasamento de líquidos para a região externa da bolsa escrotal.
• Hidrocele → presença de líquido fluidificado plasmático entre a túnica albugínea e a mu-
cosa da bolsa escrotal. Pode ocorrer de forma congênita devido ao não fechamento do
conduto peritônio-vaginal e também pode ser uma manifestação crônica da filariose.
O tratamento dessas entidades pode ser cirúrgico. Nos casos de linfoescroto, faz-se ne-
cessário o tratamento com antibióticos para impedir a progressão de um quadro infeccioso
bacteriano.

Diagnóstico sensibilidade e especificidade al-


tas. Porém, são caros, principal-
• Clínico → é difícil devido a seme- mente a imunocromatografia.
lhança das alterações provoca-
das pela W. bancrofti com aque- • Biologia molecular → pesquisa de
las produzidas por outros agentes DNA do verme, porém caro.
etiológicos com efeitos parecidos. • Métodos de imagem → USG e
Em uma área endêmica, a história linfocintilografia.
clínica de febre recorrente associa-
da a adenolinfangite pode ser indi-
cativa de infecção filarial. Paciente Tratamento
com alteração pulmonar, eosinofi- Os medicamentos tradicionalmente
lia sanguínea e altos níveis de IgE utilizados no tratamento são a iver-
total no soro levanta a suspeita de mectina e a dietilcarbamazina. Eles
EPT. destroem as microfilárias, mas não
• Laboratorial → pesquisa de micro- matam os vermes adultos nem os
filárias por meio do esfregaço san- simbiontes naturais das Wuchereria
guíneo e gota espessa no período – as Wolbachia que, quando libera-
noturno. Técnicas de concentração das no sangue, produzem a reação
podem ser utilizadas para aumen- de Mazzotti (agravamento transitório
to da sensibilidade do teste. da sintomatologia).
• Métodos imunológicos → ELI- A ivermectina é um excelente micro-
SA e imunocromatografia com filaricida de ação prolongada. Usa-se
HELMINTOS 40

em dose única de 10-20 mg/kg, por Profilaxia


via oral (longe das refeições), sendo
O saneamento ambiental faz parte
contraindicada durante a gestação
do controle de vetores, ao promo-
e a lactação. Tem sido empregada
ver a drenagem de águas pluviais e
em doses pequenas no tratamen-
o tratamento dos esgotos, fazendo
to de massa. Mas, como não cura a
com o que a população de Culex seja
infecção, ela deve ser associada ao
reduzida.
albendazol.
O contato homem-mosquito tam-
A dietilcarbamazina, há tempos utili-
bém pode ser reduzido pela telagem
zada contra a filariose, age através de
das casas nas portas, janelas e ou-
mecanismos imunológicos, mas não
tras aberturas para o que se empre-
destrói todas as microfilárias, permi-
gam telas de nylon ou telas metálicas
tindo a infecção dos insetos.
plastificadas.
Os efeitos colaterais dos tratamen-
Nas áreas endêmicas, devem ser ins-
tos tradicionais, por serem em geral
talados mosquiteiros em todas as ca-
desagradáveis, levam muitas vezes
mas. Os melhores são os mosquitei-
os pacientes a esquivarem-se da
ros impregnados com os inseticidas
quimioterapia.
piretroides.
Atualmente, recomenda-se o trata-
mento com antibióticos de largo es-
pectro que, destruindo a Wolbachia, 7. ENTEROBIUS
causam a morte tanto dos vermes VERMICULARIS E
adultos como das microfilárias, sem ENTEROBIOSE/OXIURÍASE
provocar a reação de Mazzoti. Este nematelminto, outrora denomi-
A higienização local deve ser feita nado Oxiurus vermicularis, é o agen-
para o combate às infecções secun- te etiológico da enterobiose (ou
dárias. Além disso, drenagem linfá- oxiuríase), parasitose intestinal pe-
tica, fisioterapia e meias elásticas de culiar à espécie humana e frequente
compressão são medidas úteis. em crianças, sobretudo em menores
As cirurgias plástica e vascular re- de 10 anos. Essa infecção é mais co-
construtivas permitem a remoção dos mum em países de clima temperado,
parasitos e a recuperação da área principalmente pelas menores medi-
comprometida. das de higienização adotadas peran-
te temperaturas mais amenas, e de-
corrente de aglomerações. Estima-se,
hoje, uma prevalência de variável de
22-65% na população mundial.
HELMINTOS 41

Apresenta ciclo biológico curto (45- com dois úteros. Cada ramo ute-
60 dias), com tempo de vida também. rino se continua com o oviduto e
Porém, a enterobiose dura meses de- ovário.
vido a facilidade com que as reinfec-
• Macho → mede cerca de 5 mm de
ções ocorrem, de forma constante.
comprimento, por 0,2 mm de di-
âmetro. Cauda fortemente recur-
Taxonomia vada em sentido ventral, com um
espículo presente. Apresenta um
REINO Animmalia
único testículo.
SUBREINO Metazoa
FILO Nemathelmynthes • Ovo → mede cerca de 50 mcm de
CLASSE Secementhea comprimento por 20 mcm de lar-
ORDEM Rhabditida gura. Apresenta o aspecto gros-
FAMÍLIA Oxyuridae seiro de um D, pois um dos lados é
GÊNERO Enterobius sensivelmente achatado e o outro é
ESPÉCIE Enterobius vermicularis convexo. Possui membrana dupla,
Tabela 4. Tabela retirada e adaptada da aula sobre lisa e transparente. No momento
Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
Sanarflix.
em que sai da fêmea, já apresenta
no seu interior uma larva.

Biologia do parasito
Habitat
O E. vermicularis apresenta nítido di-
morfismo sexual, entretanto, alguns Machos e fêmeas vivem no ceco e
caracteres são comuns aos dois se- apêndice. As fêmeas, repletas de
xos: cor branca e aspecto filiforme. Na ovos (5 a 16 mil ovos), são encontra-
extremidade anterior, lateralmente à das na região perianal.
boca, notam-se expansões vesicu- Em mulheres, ocasionalmente pode-
losas muito típicas, chamadas “asas -se encontrar esse parasito na vagi-
cefálicas”. A boca é pequena, seguida na, útero e bexiga.
de um esôfago também típico, sendo
claviforme, terminando em um bulbo
cardíaco. Ciclo biológico

• Fêmea → mede cerca de 1 cm de É do tipo monoxênico. Após a cópu-


comprimento, por 0,4 mm de diâ- la, os machos são eliminados com as
metro. Possui cauda pontiaguda e fezes e morrem. As fêmeas, repletas
longa. A vulva abre-se na porção de ovos, se desprendem do ceco e di-
média anterior, a qual é seguida por rigem-se para o ânus (principalmente
uma curta vagina que se comunica à noite). Os ovos são eliminados pelo
HELMINTOS 42

próprio rompimento da fêmea devi- horas e são ingeridos pelo hospe-


do a algum traumatismo ou disseca- deiro. No intestino delgado, as lar-
mento. Como ela se assemelha a um vas rabditoides eclodem e sofrem
“saco de ovos”, com a cutícula extre- duas mudas no trajeto intestinal até
mamente distendida, parece que o o ceco. Aí chegando, transformam-se
rompimento da mesma se torna fácil. em vermes adultos. Um a dois meses
Os ovos eliminados, já embrionados, depois as fêmeas são encontradas na
se tornam infectantes em poucas região perianal. Não havendo reinfec-
ção, o parasitismo extingue-se aí.

Figura 12. Ciclo do E. vermicularis. A) Machos e fêmeas no ceco; 1) Ovos depositados na região perianal; 2) Ovos no
meio exterior, contaminando alimentos; 3) Ovos da região perianal levados a boca pelas mãos; 4) Ingestão de ovos
embrionados: eclosão de larvas no intestino delgado, migração de larvas até o ceco; vermes adultos. Cerca de 30 a
40 dias após a infecção, as fêmeas já estão repletas de ovos. Imagem retirada do livro Parasitologia Humana, 13ª ed.,
David Pereira Neves, 2016.
HELMINTOS 43

Transmissão quando vê o verme (chamado popu-


larmente de “lagartinha”) nas fezes.
Os mecanismos de transmissão que
Em infecções maiores, pode provocar
podem ocorrer são;
enterite catarral por ação mecânica e
• Heteroinfecção: quando ovos pre- irritativa. O ceco apresenta-se infla-
sentes na poeira ou alimentos atin- mado e, ocasionalmente, o apêndice
gem novo hospedeiro (é também também é atingido.
conhecida como primo-infecção); A ação patogênica é, principalmen-
• Indireta: quando ovos presen- te, de natureza mecânica e irritativa,
tes na poeira ou alimentos atin- devido a capacidade dos vermes de
gem o mesmo hospedeiro que os produzirem pequenas erosões na
eliminou; mucosa onde se fixam, ou pela capa-
cidade de provocarem uma inflama-
• Autoinfecção externa ou direta: a
ção catarral quando o parasitismo for
criança (frequentemente) ou adul-
intenso.
to (raramente) levam os ovos da
região perianal à boca. É o princi- Em geral, apenas uma em cada dez
pal mecanismo responsável pela crianças infectadas apresenta sinto-
cronicidade dessa verminose; mas, podendo-se encontrar uma ou
algumas fêmeas no períneo a cada
• Autoinfecção interna: parece ser manhã.
um processo raro no qual as larvas
eclodiriam ainda dentro do reto e O principal sintoma é o prurido na re-
depois migrariam até o ceco, trans- gião anal, que leva o paciente a co-
formando-se em vermes adultos; çar-se e chega mesmo a produzir es-
coriações. O períneo fica vermelho e
• Retroinfecção: as larvas eclodem congesto, podendo dar lugar a infec-
na região perianal (externamente), ções. Também podem surgir lesões
penetram pelo ânus e migram pelo na mucosa retal. Em meninas pode
intestino grosso chegando até o haver prurido vulvar.
ceco, onde se transformam em
Fenômenos de hipersensibilidade po-
vermes adultos.
dem estar presentes, pois os pacien-
tes também sentem prurido nasal.
Patogenia Crises de urticária não são raras.
Na maioria dos casos, o parasitismo
passa despercebido pelo paciente.
Este só nota que alberga o verme
quando sente ligeiro prurido anal ou
HELMINTOS 44

SAIBA MAIS!
A presença dos machos na região perianal está mais associada a erosões crônicas pela ocor-
rência de reações inflamatórias granulomatosas.

Diagnóstico períneo, de manhã, antes do banho,


pela técnica de fita adesiva/método de
Irritabilidade, distúrbios do sono ou in-
Graham, onde um segmento desta fita
sônia podem resultar do parasitismo.
é disposto em volta de uma lâmina de
Na esfera genital, a irritabilidade local
microscopia com a parte colante para
leva, eventualmente, a um exagerado
fora. Colocada contra o ânus e, depois,
erotismo, masturbação ou ninfomania.
aproximando-se as nádegas, os para-
No parasitismo intenso, instala-se uma sitos da pele aderem a fita que é, em
colite crônica, com fezes amolecidas ou seguida, colada sobre a lâmina. Deve-
diarreia e inapetência. Em consequên- -se examinar a lâmina ao microscópio.
cia, há um emagrecimento do paciente.
A análise histológica da região peria-
Pensa-se em enterobiose nos casos nal também pode ser utilizada, porém
de prurido anal que se agrava a noite, não é feita como rotina.
com eosinofilia ligeira (4-15% de eo-
sinófilos) e sem outras causas.
Tratamento
O diagnóstico laboratorial pode ser
feito por meio de métodos diretos e O tratamento é feito com um dos me-
indiretos. dicamentos seguintes, de largo es-
A análise macroscópica pode ser fei- pectro, que agem também contra ou-
ta pela simples observação ou pela tros helmintos intestinais:
tamização. • Albendazol → dose única (400
O exame de fezes (com enriqueci- mg), por via oral, repetir 2 semanas
mento) só revela 5 a 10% dos casos, depois;
devendo ser feita a análise microscó- • Mebendazol → 100 mg, 2x ao dia,
pica por meio do método de Hoffman. por 3 dias;
O diagnóstico é fácil quando as pes-
• Pamoato de pirantel → dose úni-
soas que cuidam das crianças encon-
ca (10 mg/kg), por via oral, repetir
tram vermes no períneo, na roupa ín-
após 15 dias;
tima ou na roupa de cama.
O melhor método para o diagnóstico • Piperazina (50 mg/kg) → tomar
é a busca de ovos (ou de vermes) no durante uma semana.
HELMINTOS 45

Os efeitos adversos mais comuns desinfetantes e promover a educação


desses fármacos são cefaleia, náuse- sanitária dos usuários.
as, vômitos, dor abdominal e diarreia.
A expectativa de cura com um só tra- 8. TRICHURIS TRICHIURA
tamento é de 80 a 90%. Com dois, E TRICURÍASE
aproxima-se de 100%.
A tricuríase/tricurose/tricocefalose é
Apesar da curta vida dos helmintos,
uma doença cosmopolita, com distri-
o parasitismo dura, em geral, mui-
buição semelhante a da ascaridíase.
tos anos devido a facilidade com que
A prevalência oscila entre 30 a 80%
ocorrem as infecções. Por isso, deve-
da população geral, incidindo princi-
-se tratar, ao mesmo tempo, toda a
palmente em crianças.
família ou os grupos inteiros nas es-
colas, asilos e orfanatos. No Brasil, a prevalência é próxima de
30%, sendo mais elevada na Ama-
zônia e na faixa litorânea, de clima
Profilaxia e controle equatorial e com chuvas distribuídas
Nenhuma medida isolada é suficiente pelo ano todo.
para interromper a transmissão desta As crianças apresentam as cargas
helmintíase. Mas, quando aplicada a to- parasitárias mais altas e as sintoma-
dos os membros de uma família ou de tologias mais pronunciadas.
um grupo, a terapêutica é mais eficaz. Mais concentrada nas periferias das
Ela deve ser repetida a curtos interva- áreas urbanas, em regiões de clima
los – cerca de 20 dias – para que não quente e úmido e baixo IDH.
se complete o ciclo biológico do parasi-
to. Medidas que devem acompanhar a
quimioterapia são banhos matinais di- Taxonomia
ários de chuveiro e lavagem cuidadosa REINO Animmalia
das mãos depois de defecar, antes de SUBREINO Metazoa
comer e de preparar alimentos. FILO Nemathelmynthes
Recomenda-se também manter as CLASSE Secementhea
unhas curtas e limpas com esco- ORDEM Trichinellida
va; impedir a coçagem, com poma- FAMÍLIA Trichuridae
da antipruriginosa e vestimenta de GÊNERO
Trichuris (cauda em forma de
macacões nas crianças para dormir; cabelo)

mudar frequentemente a roupa de ESPÉCIE Trichuris trichiura


Tabela 5. Tabela retirada e adaptada da aula sobre
cama; evitar superlotação dos quar- Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
tos, arejá-los bem e remover a poeira; Sanarflix.
manter os sanitários limpos, aplicar
HELMINTOS 46

Biologia do parasito Transmissão


São vermes redondos de tamanho Os ovos de T. trichiura eliminados
pequeno ou médio, filiformes em sua com as fezes do hospedeiro infecta-
porção anterior e fusiformes poste- do contaminam o ambiente, em locais
riormente. As fêmeas adultas medem sem saneamento básico. Como os
3-5 cm de comprimento, sendo os ovos são extremamente resistentes
machos um pouco menores. O seg- às condições ambientes, podem ser
mento delgado anterior é mais longo disseminados pelo vento ou pela água
que o posterior. e contaminar os alimentos sólidos ou
Os órgãos bucais são rudimentares líquidos, sendo, então, ingeridos pelo
e o esôfago é formado por uma colu- hospedeiro. Ovos de T. trichiura tam-
na de células secretoras (esticócitos), bém podem ser disseminados por
sem musculatura, e apresenta delga- moscas domésticas, que transportam
do canal atravessando todo o seg- os ovos na superfície externa do cor-
mento delgado do corpo. O conjunto po, do local onde as fezes foram de-
é o esticossomo. positadas até o alimento. Em algumas
áreas de alta prevalência de tricuríase
Os órgãos reprodutores são muito tem sido demonstrada que a prática
simples e singelos, tanto no macho de geofagia é muito frequente, prin-
como na fêmea. cipalmente entre crianças e mulheres
A extremidade posterior do macho é grávidas, sendo esta uma importan-
enrolada ventralmente em espiral e te fonte de infecção, especialmente
da cloaca projeta-se um longo espí- em algumas regiões da África, Índia e
culo envolvido por uma bainha cuticu- América Latina.
lar recoberta de minúsculos espinhos.
Ovos medem 50-55 mcm de com- Habitat
primento por 22 mcm de largura,
apresentam um formato elíptico ca- Os adultos de T. trichiura são parasi-
racterístico com poros salientes e tos do intestino grosso de humanos
transparentes em ambas extremida- e, em infecções leves ou modera-
des, preenchidos por material lipídico. das, estes vermes habitam principal-
A casca do ovo de Trichuris é forma- mente o ceco e cólon ascendente do
da por três camadas distintas, uma hospedeiro. Nas infecções intensas,
camada lipídica externa, uma cama- ocupam também cólon distal, reto
da quitinosa intermediária e uma ca- e porção distal do íleo. T. trichiura é
mada vitelínica interna, que favorece considerado por muitos autores um
a resistência destes ovos a fatores parasito tissular, pois toda a região
ambientais. esofagiana do parasito penetra na
HELMINTOS 47

camada epitelial da mucosa intesti- Na região do ceco, as larvas migram


nal do hospedeiro, onde se alimenta por dentro das células epiteliais, em
principalmente de resto dos enteróci- direção ao lúmen intestinal, formando
tos lisados pela ação de enzimas pro- túneis sinuosos na superfície epitelial
teolíticas secretadas pelas glândulas da mucosa. Durante este período, as
esofagianas do parasito (esticócitos). larvas se desenvolvem em vermes
Alguns autores demonstram a pre- adultos, passando pelos quatro es-
sença de sangue no esôfago de ver- tágios larvais típicos do desenvolvi-
mes adultos, sugerindo a utilização mento dos nematódeos; ocorre a di-
de sangue do hospedeiro como fonte ferenciação dos esticócitos na região
alimentar. A porção posterior do T. tri- esofagiana, e do órgão genital na por-
chiura permanece exposta ao lúmen ção posterior, para a junção do esôfa-
intestinal, facilitando a reprodução e a go com o intestino. O crescimento e
eliminação dos ovos. desenvolvimento dos vermes levam
ao rompimento das células epiteliais
e a exposição da porção posterior do
Ciclo biológico corpo de T. trichiura à luz intestinal do
É do tipo monoxênico. Fêmeas e ma- hospedeiro.
chos que habitam o intestino grosso Apenas uma pequena parte (5-22%)
se reproduzem sexuadamente e os dos ovos infectantes ingeridos com-
ovos são eliminados para o meio ex- pleta o desenvolvimento até vermes
terno com as fezes. A fêmea fecun- adultos. Estima-se que o período pré-
dada elimina 3000-20000 ovos por -patente da tricuríase no homem, tem-
dia, sugerindo uma reposição diária po entre a infecção até a eliminação
de 5% a 30% dos cerca de 60000 dos ovos pelas fezes do hospedeiro, é
ovos encontrados no útero. O em- de aproximadamente 60-90 dias.
brião contido no ovo recém-elimina-
do se desenvolve no ambiente para
se tornar infectante. O período de de- Patogenia e manifestações
senvolvimento do ovo depende das clínicas
condições ambientais. A gravidade da tricuríase depende
Os ovos infectantes podem contami- da carga parasitária, mas também
nar alimentos sólidos e líquidos, po- tem importante influência de fatores,
dendo, assim, serem ingeridos pelo como idade do hospedeiro, estado
homem. As larvas de T. trichiura eclo- nutricional e distribuição dos vermes
dem através de um dos poros pre- adultos no intestino.
sentes nas extremidades do ovo, no Em geral, observa-se uma correlação
intestino delgado do hospedeiro. positiva entre intensidade de infecção e
HELMINTOS 48

gravidade da sintomatologia, portanto, casos, pode-se observar uma diarreia


a maioria dos pacientes com infecções intermitente com presença abundan-
leves é assintomática ou apresenta te de muco e, algumas vezes, sangue;
sintomatologia intestinal discreta, en- dor abdominal com tenesmo; anemia;
quanto os pacientes com infecção mo- desnutrição grave caracterizada por
derada apresentam graus variados de peso e altura abaixo do nível aceitável
sintomas, como cefaleia, dor epigástri- para a idade; e, algumas vezes, pro-
ca e no baixo abdome, diarreia, náuse- lapso retal reversível.
as e vômitos. A síndrome disentérica Como complicações de casos mais
crônica é, em geral, relatada em crian- graves, podem ocorrer obstruções do
ças com infecções intensas e, nestes cólon e perfuração intestinal.

FLUXOGRAMA SEQUENCIAL DA PATOGENIA DA TRICURÍASE

Quadro anêmico Caquexia Baixas estaturas Redução cognitiva

Níveis de hormônio
Hematofagia ↑ TNF-alfa IGF-1 e precursor Perdas alimentares
do colágeno

Perdas sanguíneas

SAIBA MAIS!
A quimioprofilaxia em massa foi instituída no Brasil no intuito de reduzir os prejuízos pon-
deroestaturais e cognitivos em crianças acometidas com a tricuríase. Como esta profilaxia é
realizada pela administração de apenas um comprimido em dose única do tratamento para o
combate à doença, é útil na redução da parasitemia, mas inútil no controle de cura da doença.
Portanto, é ineficaz! A medida mais eficaz para redução de tais morbidades é a introdução do
tratamento adequado para tricuríase.

Diagnóstico • Diagnóstico laboratorial → qual-


quer método de exame de fezes
• Diagnóstico clínico → difícil de é adequado para o diagnóstico,
ser realizado pela presença de si- dada a abundância de ovos nas fe-
nais e sintomas comuns a outras zes dos pacientes e sua forma ca-
helmintíases. racterística. Para se avaliar a carga
HELMINTOS 49

parasitária, utilizam-se técnicas, Os ovos dos T. trichiura são mais sen-


como a de Stoll (de preferência), síveis a desidratação que os de ásca-
Hoffman ou a de Kato-Katz (quali- ris, razão pela qual é nos solos úmi-
tativo-quantitativo). Nas infecções dos e sombreados onde permanecem
leves, há menos de 5000 ovos por mais tempo vivos.
grama de fezes. Nas pesadas, há As medidas de controle são aquelas
mais de 10000 ovos/grama. recomendadas em relação às demais
parasitoses transmitidas pelo solo
Tratamento (geohelmintíases).

Vários anti-helmínticos são eficazes


SE LIGA! O tratamento em massa da
para o tratamento da tricuríase. As
tricuríase reduz as morbidades advindas
preferências atuais são para: da doença, mas não diminui o número e
a recorrência das infecções.
• Mebendazol → dose de 100 mg,
2x ao dia, durante 3 dias. Também
podem ser usados o albendazol e 9. ECHINOCOCCUS
o flubendazol; GRANULOSUS E
• Pamoato de oxantel → nos casos HIDATIDOSE
leves, administrar 10 mg/kg/peso Trata-se de uma zoonose, em que
do paciente, em dose única, por via os hospedeiros definitivos são cães
oral. Nos demais, dar essa dose 2 e outros animais silvestres, sendo
vezes ao dia por 3 dias. portadores da forma adultos desses
• Albendazol + ivermectina → asso- vermes. Já os hospedeiros intermedi-
ciação com maior eficácia de cura ários são ovinos, bovinos, cervídeos
da doença nos dias atuais. e camelídeos, onde se desenvolve a
hidatidose e os cistos hidáticos, sen-
do o homem um hospedeiro acidental
Profilaxia desse agente etiológico (estima-se
As únicas fontes de infecção são as de 2-3 milhões de infectados).
humanas, cabendo às crianças em Apresenta elevado impacto econô-
idade pré-escolar a maior responsa- mico devido ao enorme comprome-
bilidade na transmissão da tricuríase. timento visceral que esse helminto
O peridomicílio é a área mais afetada, provoca em seus hospedeiros inter-
devido a poluição fecal do solo, onde mediários. Uma vez infectados, as
as condições de saneamento e de hi- vísceras derivadas desses animais
giene são normalmente precárias. não podem utilizadas para o consumo
humano. Assim, após serem abatidos,
HELMINTOS 50

as vísceras são dadas aos cães, o que Biologia do parasito


corrobora a continuidade do ciclo da
E. granulosus, durante seu desen-
doença nestes animais.
volvimento, apresenta-se em três
diferentes formas: parasito adul-
Taxonomia to, presente no intestino delgado de
cães; ovos eliminados com as fezes
REINO Animmalia
dos cães; e a forma larval, conhecida
FILO Plathelmynthes
como cisto hidático ou hidátide, pre-
CLASSE Cestoda
sente nas vísceras dos hospedeiros
ORDEM Cyclophyllidea
intermediários, principalmente ovinos
FAMÍLIA Taeniidae
e bovinos.
GÊNERO Echinococcus
E. granulosus, E. vogelis, E. oligar- • Parasito adulto → é um cestódeo
ESPÉCIE
thus, E. multilocularis hermafrodita muito pequeno, me-
Tabela 6. Tabela retirada e adaptada da aula sobre dindo 4-6 mm de comprimento.
Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
Sanarflix. O escólex é globoso ou piriforme,
com quatro ventosas e um rostro
armado com 30 a 40 acúleos ou
Epidemiologia ganchos dispostos em duas filei-
A hidatidose é uma zoonose rural ras. O colo, região de crescimento
com ampla distribuição geográfica, do cestódeo, é curto, seguindo-
presente em todos os continentes, -se pelo estróbilo constituído por
sendo mais frequente no sul e oeste três a quatro proglotes. A primei-
dos Estados Unidos, Canadá, Alasca, ra proglote é imatura, com órgãos
Europa, Ásia e América do Sul. As re- genitais ainda não totalmente de-
giões de maior prevalência têm tradi- senvolvidos. A segunda é madura,
ção na criação de ovinos e no manejo com órgãos genitais masculinos,
destes animais utilizam o cão. órgãos genitais femininos e poro
genital, localizado à margem da
Na América Latina, segundo estimati-
proglote, onde abre-se a vagina e
vas, há cerca de meio milhão de pes-
a bolsa do cirrus. Na terceira pro-
soas infectadas com cisto hidático,
glote, que corresponde a 1/3 ou
com alta prevalência em áreas rurais
metade do estóbilo, encontra-se o
do Chile, Argentina, Uruguai, Peru e
útero, ocupando todo o espaço da
Brasil.
proglote, contendo no seu interior
No Brasil, quase todos os casos de 500 a 800 ovos.
hidatidose têm origem no Rio Grande
do Sul, onde esta doença é conhecida • Ovos → os ovos, ligeiramente esfé-
desde o início do século XX. ricos, medem 32 mcm de diâmetro
HELMINTOS 51

e são constituídos por uma mem-


brana externa, denominada embri-
óforo, contendo no seu interior a
oncosfera ou embrião hexacanto,
onde estão presentes seis gan-
chos ou acúleos.
• Cisto hidático → apresenta-se de
forma arredondada, com dimen-
sões variadas, dependendo da
idade do cisto e do tecido onde
este está localizado. Em infec-
ções recentes mede cerca de 1
mm, porém, meses depois, pode
medir vários centímetros. O cisto
hidático é formado por três mem-
branas e outras estruturas. Apre-
senta uma membrana adventícia,
uma membrana anista ou hialina
e uma membrana germinativa ou
prolígera. Dentre as demais estru-
turas presentes, estão as vesículas
prolígeras, o protoescólex ou escó-
lex invaginado, o líquido hidático, a Figura 13. Echinococcus granulosus – A) Verme adulto:
areia hidática e os cistos hidáticos A – rostro armado; V – ventosas; P) proglote jovem;
Pm – proglote madura; Pg -proglote grávida; B) Cisto
anômalos (cistos endógenos filhos hidático ou hidátide, medindo cerca de 5 cm de diâme-
e exógenos filhos). tro, apresentando: a – membrana adventícia (produzida
pelo órgão parasitado); b – membrana anista; c – mem-
brana prolígera; d – vesícula prolígera; e – escólex; ah
– areia hidática. Imagem retirada do livro Parasitologia
Humana, 13ª ed., David Pereira Neves, 2016.

SE LIGA! O ovo do E. granulosus é igual


ao ovo da Taenia sp.

Transmissão
Os cães adquirem a infecção (equi-
nococose) ao serem alimenta-
dos com vísceras dos hospedeiros
HELMINTOS 52

intermediários contendo cistos hidá- intestinal, alcançando a circulação


ticos férteis. Já os hospedeiros inter- sanguínea venosa, chegando ao fíga-
mediários, adquirem a infecção (hida- do e aos pulmões e, mais raramente,
tidose) ao ingerirem ovos eliminados a outros órgãos. Após seis meses da
no ambiente pelos cães parasitados. ingestão do ovo, o cisto hidático esta-
Nos humanos, a infecção muitas ve- rá maduro, permanecendo viável por
zes ocorre na infância, devido ao con- vários anos no hospedeiro interme-
tato mais próximo das crianças com diário. Nos hospedeiros definitivos, a
os cães, que quando infectados apre- infecção ocorre através da ingestão
sentam uma grande quantidade de de vísceras, principalmente de ovinos
ovos aderidos ao pelo, principalmen- e bovinos com cisto hidático fértil, ou
te da região perianal. Crianças, por seja, cistos contendo protoescóleces.
terem pouco cuidado com a higiene, Estes, ao chegarem no intestino, sob
principalmente sem o hábito de lavar ação principalmente da bile, evagi-
as mãos antes de alimentar-se, ao nam e fixam-se à mucosa, atingindo
brincarem com cães, podem ingerir a maturidade em dois meses, quando
diretamente estes ovos ou juntamen- proglotes grávidas e ovos começam
te com alimentos contaminados. a aparecer nas fezes. Os parasitos
adultos vivem aproximadamente qua-
tro meses e, portanto, se não houver
Ciclo biológico reinfecção, o cão ficará curado desta
Os ovos eliminados com as fezes dos parasitose.
cães, isoladamente ou dentro das
proglotes grávidas, chegam ao meio
Relação parasita-hospedeiro
ambiente, contaminando as pasta-
gens peridomicílio e o domicílio. Es- A presença desse helminto fará com
ses ovos, quando eliminados, já são que várias citocinas sejam produ-
infectantes, permanecendo viáveis zidas. No hospedeiro intermediário,
por vários meses em locais úmidos e haverá degranulação de eosinófilos
sombrios, mas são rapidamente des- e mastócitos, com produção de uma
truídos em locais com grande incidên- reação granulomatosa e posterior
cia de luz solar. Os ovos são ingeridos calcificação. Além disso, é comum
junto ao alimento e, no estômago, o observarmos urticárias, asma e cho-
embrióforo é semidigerido pela ação que anafilático (mais observado na
do suco gástrico. No duodeno, em presença de cistos hidáticos filhos
contato com a bile, liberam a oncosfe- exógenos, com liberação de areia hi-
ra ou embrião hexacanto, que através dática que é muito antigênica).
de seus ganchos, penetra na mucosa
HELMINTOS 53

Além disso, o cisto hidático vai cres- anos. O primeiro sinal é geralmen-
cendo gradativamente (5 cm/ano), te o tumor. A hidatidose do jovem
ocorrendo deslocamento e com- é quase sempre devida a um cisto
pressão do local instalado. Absorve escolecífero não complicado. Seu
nutrientes do tecido, produz e libera número é maior que o dos adultos
proteínas no espaço de instalação, jovens, que já eliminaram alguns
como também imunomoduladores, cistos. A supuração é rara e a for-
de forma a evitar um processo de cal- ma óssea é raríssima.
cificação e sua inatividade.
• Hidatidose hepática → o tumor lo-
calizado no fígado pode produzir
Manifestações clínicas sensação local de tensão, peso ou
dor, com irradiação para o ombro.
A infecção tem início por via digestiva Na face inferior deste órgão, causa
e as hidátides vão localizar-se no fí- sensação de mal estar ou plenitu-
gado em 75 a 80% dos casos, ou nos de gástrica, ou simula um quadro
pulmões em 10 a 20% deles. Nos de pseudolitíase, com cólicas, icte-
músculos, encontram-se 4,7% dos rícia e elevação da temperatura. À
cistos, no baço 2,3%, no rim 2,1% e palpação encontra-se uma tumo-
no cérebro 1,4%. ração do tamanho de uma laranja
Os cistos são múltiplos em 1/3 dos móvel. Também pode simular cir-
casos, mas fatores epidemiológicos rose hepática devido a compres-
e fisiológicos devem impedir que eles são da veia porta e estase venosa
sejam mais numerosos. nessa área.
Mesmo a parede íntegra dos cistos
permite a passagem de substâncias
antigênicas que levam a produção de
anticorpos. A sensibilização do pacien-
te dá lugar a reações alérgicas do tipo
urticária, edema angioneurótico, asma
e choque anafilático, assim como a re-
ação intradérmica de Casoni.
As ações do parasito são de ordem
física, por compressão ou desvio de
órgãos, ou metabólica.
Figura 14. Tomografia computadorizada de abdome
demonstrando região cística hipodensa (cisto simples
• Formas benignas → a doença unilocular) com ausência de septações e calcificações
contraída na infância raramente no lobo direito do fígado. Cisto hidático. Imagem retira-
da do site “O radiologista”.
é diagnosticada antes dos 10-15
HELMINTOS 54

• Hidatidose pulmonar → os cistos tornam seu crescimento irregular.


pulmonares podem ser aí forma- Ao insinuar-se por espaços estrei-
dos ou provirem de um cisto da tos, o cisto se fragmenta, cada frag-
superfície superior do fígado, que mento passando a comportar-se
perfurou o diafragma e invadiu o como uma hidátide filha externa. A
pulmão. O crescimento aí não en- ausência de sintomas permite que
contra resistência, mas pode ter- cresça como um tumor até causar
minar abrindo-se em um brônquio uma fratura óssea ou exteriorizar-se
e causando vômica (hidatidoptise) do osso. Quando na coluna verte-
em que se encontram vesículas e bral, produz quadro semelhante ao
estruturas membranosas. A aber- de mal de Pott ou quadros neuro-
tura pode ser também para a pleu- lógicos por compressão das raízes
ra, agravando o quadro. nervosas, que lentamente conduz a
uma paraplegia.

Figura 15. Radiografia de tórax evidenciando opaci-


dade arredondada de bordas mal definidas com área
hiperlucente no seu interior, localizada no terço superior
e posterior do hemitórax direito e imagem cavitária de
paredes irregulares com pequeno nível hidroaéreo na base
posterior do hemitórax direito, com velamento do seio cos-
tofrênico. Imagem retirada do artigo “Hidatidose pulmonar
e hepática com múltiplos cistos: um relato de caso”, 2018.

Figura 16. Tomografia linear do esterno demonstrando


aumento de volume e áreas líticas no mesmo. Imagem
• Hidatidose óssea → na medula, retirada do artigo “Hidatidose do esterno e musculatura
o cisto perde seu aspecto normal peitoral”, 2001.

devido às trabéculas ósseas que


HELMINTOS 55

• Hidatidose cerebral → nesta forma contendo areia hidática, contribuem


de hidatidose, os cistos evoluem de para o diagnóstico a origem do pa-
forma rápida. Há pouca resistência ciente, eosinofilia moderada ou alta
ao crescimento dos cistos hidáticos após punção ou ruptura de cisto.
dentro do cérebro. Está associada a A radiologia mostra bem as imagens
quadro clínico mais grave. dos cistos localizados no pulmão ou
na face superior do fígado, mas não é
suficiente para o diagnóstico específi-
co. Ela mostra também os cistos com
as paredes calcificadas, no interior do
fígado ou de outros locais. Cistos com
infecções anaeróbias ou aqueles em
que o ar penetrou mostram imagem
com nível líquido ou com descola-
mento da membrana de sua loja pri-
mitiva. As hidátides ósseas requerem
estudo radiológico.
A cintilografia permite localizar hidáti-
des no interior do parênquima hepáti-
co, mediante administração de radioi-
Figura 17. RNM em T1 evidenciando cisto hidático
primário volumoso no cérebro. Imagem retirada de J
sótopos e medida da radiação gama.
Neurol Neurosurg Psychiatry. 2009 Oct;80(10):1149.
A tomografia e a ecografia são técni-
cas modernas atualmente em uso que
Diagnóstico melhoraram notavelmente o diagnós-
tico da hidatidose humana.
A hidatidose é uma parasitose que
ora se mostra pobre de sinais e sinto- Como testes imunológicos, pode-se
mas, ora como doença polimorfa, ca- utilizar imunoeletroforese (primeiro
paz de produzir variadas síndromes a positivar-se), reação de floculação
sem características específicas. Pode do látex, hemaglutinação indireta
ser detectada após 10-15 anos do e o teste de ELISA. Ainda que mui-
início da doença. O diagnóstico dife- to específicos, esses testes não têm
rencial deve ser feito sobretudo com sensibilidade satisfatória, podendo
os processos tumorais do fígado ou dar resultados falsamente negativos.
dos pulmões. Portanto, devemos associá-los.

Excetos nos raros casos de hidati- • Reação de Casoni → é feita com


doptise ou de punção exploradora líquido hidático de cistos férteis
de carneiro. Nos casos positivos,
HELMINTOS 56

5 a 10 minutos após a injeção in- Profilaxia e controle


tradérmica, forma-se pápula de
Basta impedir que os cães se alimen-
contornos irregulares (> 2 cm de
tem de vísceras cruas do gado para
diâmetro) e, após 24 horas, uma
cessar a transmissão. Além disso,
tumefação endurecida no local.
medidas eficazes incluem:
• Interdição do abate clandestino;
• Matadouros que não permitam
acesso aos cães e onde as vísce-
ras condenadas são destruídas;
• Controle sanitário do gado abatido
e estudo epidemiológico que iden-
tifique áreas endêmicas necessi-
tando atenção;
• Tratamento anti-helmíntico dos
Figura 18. Imagem retirada da aula sobre Helmintos da
seção de Parasitologia da Plataforma Sanarflix.
cães domésticos parasitados, feito
periodicamente;
• Adoção de técnicas de criação do
Tratamento
gado que dispensem o emprego
Excluída a eventualidade de cura es- de cães;
pontânea de cistos justahilares e re-
• Redução da população canina,
nais ou dos inoperáveis, o tratamento
em particular de cães vadios e
é sempre cirúrgico. O paciente deve
abandonados.
ser previamente dessensibilizado.
Durante a cirurgia, previne-se a dis-
seminação de areia hidática, des- 10. HYMENOLEPIS NANA
truindo-a mediante a substituição,
É uma tênia anã, de tamanho peque-
por punção, de uma parte do volume
no ou médio, parasita do intestino hu-
do cisto por álcool a 75% ou por solu-
mano. Trata-se de uma zoonose, com
ção de NaCl a 20%.
50-75 milhões de infectados. Esse
Para evitar recidivas, administrar, no parasita apresenta vida curta e capa-
pós-operatório, albendazol durante cidade imunizante.
4 semanas. A quimioterapia com al-
Com ciclo de vida direto e indireto,
bendazol, mebendazol ou praziquan-
encontra-se em maior quantidade
tel encontra-se ainda em fase de es-
nas áreas com maior densidade po-
tudo e avaliação.
pulacional, como creches, prisões e
HELMINTOS 57

escolas. Estima-se que 5-25% das filamentos longos. Popularmente,


crianças são acometidas por essa esse ovo é conhecido como “cha-
tênia. péu de mexicano visto por cima”.
• Larva cisticercoide → é uma pe-
Taxonomia quena larva, formada por um es-
cólex invaginado e envolvida por
REINO Animmalia
uma membrana. Contém pequena
SUBREINO Metazoa
quantidade de líquido. Mede cerca
FILO Plathelmynthes
de 500 mcm de diâmetro. Como
CLASSE Cestoda
nos demais cestoda, pode-se de-
ORDEM Cyclophyllidea
nominar de protoescólex ou escó-
FAMÍLIA Hymenolepididae
lex da larva.
GÊNERO Hymenolepis

ESPÉCIE
Hymenolepis nana, Hymenolepis • Habitat → o verme adulto é en-
diminuta contrado no intestino delgado,
Tabela 7. Tabela retirada e adaptada da aula sobre principalmente íleo e jejuno do ho-
Helmintos da seção de Parasitologia da Plataforma
Sanarflix. mem. Os ovos são encontrados
nas fezes e a larva cisticercoide
pode ser encontrada nas vilosida-
Biologia do parasito des intestinais do próprio ou na ca-
• Verme adulto → mede cerca de vidade geral do inseto hospedeiro
3-5 cm, com 100 a 200 proglo- intermediário.
tes bastante estreitas. Cada um
destes possui genitália masculina Ciclo biológico
e feminina. O escólex apresenta
quatro ventosas e um rosto retrátil Esse helminto pode apresentar dois
armado de ganchos. tipos de ciclo: um, monoxênico, em
que prescinde de hospedeiro inter-
• Ovos → são quase esféricos, me- mediário; e outro, heteroxênico, em
dindo cerca de 40 mcm de diâme- que usa hospedeiros intermediários,
tro. São transparentes e incolo- representados por insetos (Pulgas-
res. Apresentam uma membrana Pulex irritans, Xenopsylla cheopis e
externa delgada envolvendo um Ctenocephalides sp- e coleópteros).
espaço claro e, mais internamen-
te, apresentam outra membra- Ciclo monoxênico: os ovos são elimi-
na envolvendo a oncosfera. Essa nados juntamente com as fezes e po-
membrana interna apresenta dois dem ser ingeridos por alguma crian-
mamelões claros em posições ça. Ao passarem pelo estômago, os
opostas, dos quais partem alguns embrióforos são semidigeridos pelo
HELMINTOS 58

suco gástrico; daí chegam ao intesti- Manifestações clínicas


no delgado onde ocorre a eclosão da
Os distúrbios gastrointestinais só
oncosfera, que penetra nas vilosida-
aparecem quando os parasitos são
des do jejuno ou íleo, originando, em
muitos e, em geral, nas crianças me-
quatro dias, uma larva cisticercoide.
nores de 10 anos. Anorexia, emagre-
Dez dias depois a larva está madura, cimento, inquietação e prurido, são as
sai da vilosidade, desenvagina-se e manifestações mais frequentes. Nas
fixa-se à mucosa intestinal através do formas graves, há congestão e ulce-
escólex. Cerca de 20 dias depois já rações da mucosa, diarreia, dor abdo-
são vermes adultos. Esses possuem minal, náuseas e vômitos e, até mes-
uma vida curta, pois cerca de 14 dias mo, um quadro toxêmico.
depois morrem e são eliminados.
A maioria dos acometidos é assinto-
Deve ser ressaltado que esse ciclo é mática, porém os sinais e sintomas
o mais frequente e que as larvas cisti- dependem da quantidade de helmin-
cercoides, nas vilosidades intestinais, tos na luz intestinal e das ações es-
estimulam o sistema imune e confe- poliadora, traumática, mecânica e tó-
rem a imunidade ativa específica. xica, causando exacerbação do efeito
Ciclo heteroxênico: os ovos presentes patogênico.
no meio externo são ingeridos pelas É uma doença autolimitada nos adul-
larvas de algum dos insetos já cita- tos, mas nas crianças nem sempre há
dos. Ao chegarem ao intestino desses este padrão.
hospedeiros intermediários, liberam a
oncosfera, que se transforma em larva
cisticercoide. A criança pode aciden- Diagnóstico
talmente ingerir um inseto contendo O diagnóstico clínico é de pouca
larvas cisticercoides que, ao chega- utilidade e difícil, mas em casos de
rem ao intestino delgado, desenvagi- crianças com ataques epileptiformes
nam-se, fixam-se à mucosa e 20 dias deve-se pensar primeiramente em
depois já são vermes adultos. alguma verminose, a qual será confir-
mada, ou não, pelo exame de fezes.
SE LIGA! A maturação da larva nas vi- Na maioria das vezes, os pacientes
losidades intestinais promove reação são assintomáticos.
local, desenvolvendo imunidade contra
reinfecções, porém, em crianças, o sis- O diagnóstico laboratorial é feito pelo
tema imune é fisiologicamente compro- exame de fezes pelos métodos de
metido, podendo haver reinfecções. rotina e encontro do ovo característi-
co. Os principais métodos utilizados
são exame direto a fresco, Hoffman,
HELMINTOS 59

Kato-Katz e fita gomada. Deve ser re- Ciclo biológico


petido se negativo.
O parasito apresenta dois ciclos
possíveis:
Tratamento • Ciclo direto → as larvas rabditóides
Administrar praziquantel, dose única eliminadas com as fezes transfor-
de 25 mg/kg de peso ou niclosamida, mam-se, no meio exterior, em lar-
dose única de 2 gramas. Em ambos vas filarióides capazes de infectar
os casos, como os cisticercos não são diretamente as pessoas;
afetados por essas drogas na primei- • Ciclo indireto → larvas rabditóides
ra dose, tem-se que repetir o trata- formam, no solo, machos e fêmeas
mento mais 1 ou 2 vezes com 10 dias que produzem ovos; estes eclodem
de intervalo. produzindo larvas L1 que passam
O controle de cura deve ser feito den- a L2, infectantes para aqueles que
tre de 3 a 4 meses. andam descalços ou põem alguma
região cutânea em contato com o
solo. Somente as larvas filarióides
Profilaxia e controle são infectantes e penetram habi-
As principais medidas utilizadas na tualmente pela pele dos pés. Tam-
prevenção são a higiene rigorosa e o bém podem infectar por via oral
tratamento periódico das crianças. (sem fazer o ciclo pulmonar).

11. STRONGYLOIDES Morfologia


STERCOLARIS Os aspectos morfológicos das formas
Parasito do filo Nematoda e da famí- evolutivas do S. stercoralis são:
lia Strongyloididae, é um geohelminto • Fêmea partenogenética parasita
mais relevante em áreas tropicais e → possui corpo cilíndrico com as-
subtropicais. Mais frequente em indi- pecto filiforme longo, extremidade
víduos imunossuprimidos e etilistas. anterior arredondada e posterior
A estrongiloidíase é cosmopolita, com afilada. Mede de 1,7 a 2,5 mm
distribuição semelhante a da ancilos- de comprimento por 0,03 a 0,04
tomíase, mas com menor prevalência mm de largura. Apresenta cutícu-
(<10%). Apresenta distribuição mun- la fina e transparente, levemente
dial, especialmente nas regiões tropi- estriada no sentido transversal, em
cais, a maioria infectando mamíferos, toda a extensão do corpo. Apa-
entre eles cães, gatos e macacos. relho digestivo simples com boca
HELMINTOS 60

contendo três lábios; esôfago lon- se abre na cloaca. Apresenta dois


go, ocupando 25% do comprimen- pequenos espículos auxiliares na
to do parasito, tipo filarióide ou fi- cópula, que se deslocam sustenta-
lariforme, cilíndrico, que à altura do dos por uma estrutura quitinizada
quinto anterior, é circundado por denominada gubernáculo.
uma anel nervoso também deno-
• Ovos → são elípticos, de parede
minado colar esofagiano; seguido
fina e transparente, praticamente
pelo intestino simples, terminando
idênticos aos dos ancilostomídeos.
em ânus, próximo da extremidade
Os originários da fêmea parasita
posterior. O aparelho genital, com
medem 0,05 mm de comprimento
útero em disposição anfidelfa ou
por 0,03 mm de largura, e os da fê-
divergente, apresenta ovários, ovi-
mea de vida livre são maiores, me-
dutos e a vulva, localizada no ter-
dindo 0,07 mm de comprimento
ço posterior do corpo. Os ovos são
por 0,04 mm de largura. Excepcio-
alinhados em diferentes estágios
nalmente, os ovos podem ser ob-
de desenvolvimento embrioná-
servados nas fezes de indivíduos
rio, no máximo até nove em cada
com diarreia grave ou após utiliza-
ramo uterino; o anterior e o poste-
ção de laxantes.
rior. Não há receptáculo seminal.
A fêmea, que coloca de 30 a 40 • Larvas rabditóides → o esôfago,
ovos por dia, é ovovivípara, pois que é do rabditóide, dá origem ao
elimina na mucosa intestinal o ovo nome das larvas. As originárias das
já larvado. A larva rabditóide, que fêmeas parasitas são praticamente
é frequentemente liberada ainda indistinguíveis das originadas das
no interior do hospedeiro, torna-se fêmeas de vida livre. Apresentam
a forma evolutiva de fundamental cutícula fina e hialina. Medem 0,2 a
importância no diagnóstico. 0,3 mm de comprimento por 0,015
mm de largura. Apresentam vestí-
• Macho de vida livre → possui as-
bulo bucal curto, cuja profundidade
pecto fusiforme, com extremidade
é sempre inferior ao diâmetro da
anterior arredondada e posterior
larva, característica que a diferencia
recurvada ventralmente. Mede
das larvas rabditóides de ancilosto-
0,7 mm de comprimento por 0,04
mídeos, em que o vestíbulo bucal
mm de largura. Boca com três lá-
é alongado e sua profundidade é
bios, esôfago tipo rabditóide, se-
igual ao diâmetro do corpo. O intes-
guido de intestino terminando em
tino termina em ânus afastado da
cloaca. Aparelho genital contendo
extremidade posterior. Apresentam
testículos, vesícula seminal, canal
primórdio genital nítido formado por
deferente e canal ejaculador, que
HELMINTOS 61

um conjunto de células localizadas larva. Possuem cutícula fina e hia-


um pouco abaixo do centro corpo. lina e medem de 0,35 a 0,50 mm
Essa característica também auxilia de comprimento por 0,01 a 0,03
na diferenciação das larvas de an- mm de largura. Apresentam vestí-
cilostomídeos, que apresentam so- bulo bucal curto e intestino termi-
mente vestígio de primórdio genital. nando em ânus, um pouco distante
Terminam em cauda pontiaguda. da extremidade posterior. A porção
Visualizadas a fresco, as larvas se anterior é ligeiramente afilada e a
mostram muito ágeis com movi- posterior afina-se gradualmente,
mentos ondulatórios. As larvas L1 terminando em duas pontas, co-
ou L2 originadas da fêmea parasita nhecidas com cauda entalhada,
atingem o meio externo, sendo en- que a diferencia das larvas filariói-
contradas de 1 a 25 larvas por gra- des de ancilostomídeos, que pos-
ma de fezes. Nas formas dissemi- suem cauda pontiaguda. Esta é a
nadas são encontradas na bile, no forma infectante do parasito (L3)
escarro, na urina e nos líquidos duo- capaz, portanto, de penetrar pela
denal, pleural e cefalorraquidiano. pele ou pelas mucosas; além de se-
rem vistas no meio ambiente, tam-
• Larvas filarióides → o esôfago, que é
bém podem evoluir no interior do
do tipo filarióide, dá origem ao nome
hospedeiro, ocasionando os casos
das larvas. Este é longo, correspon-
de autoinfecção interna.
de a metade do comprimento da

Figura 19. Strongyloides stercoralis. Representação esquemática das formas evolutivas: an – ânus; bo – boca; ca –
cauda entalhada; cl – cloaca; ep – espículo; es – esôfago; in- intestino; ov – ovário; pg – primórdio genital nítido; te- tes-
tículo; ut- útero divergente; vb – vestíbulo bucal curto; vu – vulva. Imagem retirada do livro Parasitologia Humana, 13ª
ed., David Pereira Neves, 2016.
HELMINTOS 62

• Autoinfecção interna ou endógena


SE LIGA! Os ovos do S. stercoralis só → larvas rabditóides, ainda na luz
estão presentes em fezes diarreicas. intestinal de indivíduos infectados,
transformam-se em larvas filari-
óides, que penetram na mucosa
Transmissão
intestinal (íleo ou cólon). Esse me-
• Hetero ou primo-infecção → lar- canismo pode cronificar a doença
vas filarióides infectantes (L3) pe- por vários meses ou anos. Em ca-
netram usualmente através da sos raros, nesse tipo de autoinfec-
pele, não tendo preferência por um ção, podem ser encontradas fême-
ou outro ponto do tegumento, ou, as partenogenéticas nos pulmões.
ocasionalmente, através das mu- Esta modalidade pode ocorrer em
cosas, principalmente da boca e do indivíduos com estrongiloidíase e
esôfago. Em condições naturais, a constipação intestinal, devido ao
infecção percutânea se realiza de retardamento da eliminação do
modo idêntico ao dos ancilostomí- material fecal. Em pacientes com o
deos. Nas pessoas que não usam sem retardo de eliminação de fe-
calçados, a penetração ocorre zes, mas com baixa de imunidade
através da pele dos pés, particu- devido ao uso de drogas imunos-
larmente nos espaços interdigi- supressoras, radioterapia, neopla-
tais e lateralmente, uma vez que sias, síndrome nefrótica, presença
a superfície plantar muito espessa do vírus da imunodeficiência hu-
pode constituir uma barreira física. mana (HIV), síndrome da imuno-
Este modo de transmissão parece deficiência adquirida (AIDS), gravi-
ser o mais frequente. dez, desnutrição proteico-calórica,
alcoolismo crônico e idade avança-
• Autoinfecção externa ou exóge-
da, pode ocorrer autoinfecção in-
na → larvas rabditóides presen-
terna com presença de L1, L2 e L3
tes na região perianal de indivídu-
em diferentes órgãos. Coinfecção
os infectados transformam-se em
com vírus HTLV-1 também está
larvas filarióides infectantes e aí
relacionada com estabelecimento
penetram completando o ciclo di-
de infecção pelo S. stercoralis.
reto. Este modo de infecção pode
ocorrer em crianças, idosos ou pa-
cientes internados que defecam Patogenia e sintomatologia
na fralda e na roupa, ou ainda em
A longa permanência do parasito no
indivíduos que, por deficiência de
hospedeiro humano e a contínua pas-
higiene, deixam permanecer res-
sagem da larva filarióide através dos
tos de fezes em pelos perianais.
HELMINTOS 63

tecidos resulta em uma incessante • Cutânea → em geral é discreta,


exposição sistêmica aos antígenos ocorrendo nos pontos de penetra-
parasitários. A maioria dos indivídu- ção das larvas infectantes, tanto na
os desenvolve anticorpos das classes pele como nas mucosas, com re-
IgG, IgA, IgM e IgE específicos. Os ação celular apenas em torno das
anticorpos IgG são os mais frequen- larvas mortas que não consegui-
temente detectados, permanecen- ram atingir o sistema circulatório.
do positivos por longo tempo após a Nos casos de reinfecção, há rea-
cura terapêutica. Sabe-se que existe ção de hipersensibilidade com for-
uma balanço entre a presença de IgE mação de edema, eritema, prurido,
e IgG4 com demonstração de níveis pápulas hemorrágicas e urticária.
elevados de IgE em pacientes imu- Ocasionalmente, observa-se mi-
nocompetentes com estrongiloidíase, gração única ou múltipla das larvas
indicando proteção, mas na doença filarióides no tecido subcutâneo,
disseminada e nos casos de imunos- determinando um aspecto linear
supressão, os níveis de IgE total e es- ou serpiginoso urticariforme com
pecífica podem estar dentro da nor- prurido, lesão caracterizada como
malidade, enquanto níveis elevados larva currens, que ocorre mais fre-
de IgG4 ocorrem em casos graves da quentemente no tronco, nádegas,
doença. períneo, virilha e coxas, avançando
Indivíduos portadores de pequeno de 5 a 15 cm por hora.
número de parasitos no intestino ge- • Pulmonar → apresenta intensida-
ralmente são assintomáticos ou oli- de variável, porém presente em to-
gossintomáticos, mas isso não sig- dos os indivíduos infectados, sen-
nifica ausência de ação patogênica e do caracterizada por tosse com ou
de lesões. Formas graves, as vezes sem expectoração, febre, dispneia
fatais, relacionam-se com fatores ex- e crises asmatiformes decorrentes
trínsecos, principalmente pela carga das larvas filarióides e, ocasional-
parasitária adquirida, e com fatores mente, de fêmeas, que aí podem
intrínsecos. atingir a maturidade, produzindo
As principais alterações na estrongi- ovos e larvas rabditóides. A tra-
loidíase são devidas a ação mecânica, vessia das larvas do interior dos
traumática, irritativa, tóxica e antigê- capilares para os alvéolos provoca
nica decorrente não só das fêmeas hemorragia e infiltrado inflamatório
partenogenéticas, mas também das constituído de linfócitos e eosinó-
larvas e dos ovos. filos, que podem ser limitados ou,
em casos mais graves, provocar
broncopneumonia, síndrome de
HELMINTOS 64

Loefller, edema pulmonar e insufi- amostras, em dias alternados, haja


ciência respiratória. vista que as larvas não estão expos-
tas todas em um único momento e
• Intestinal → as fêmeas, com a fi-
esse número também é variável. A
nalidade de se fixar ou se alimen-
amostra deve ser fresca, sem conser-
tar, localizam-se principalmente
vantes. Os principais métodos para o
na mucosa do duodeno e jejuno,
exame parasitológico de fezes devem
limitando-se a zona glandular, ra-
levar em consideração o hidrotermo-
ramente ultrapassando a muscu-
tropismo das larvas, como o método
lar da mucosa, onde são aprisio-
de Rugai e Baermann-Moraes. A co-
nadas pelas células epitelióides e
procultura pelo método de Harada-
depois removidas pelos leucócitos
-Mori, Arakaki e Koga também pode
polimorfonucleares. A presença de
ser realizada.
fêmeas partenogenéticas, ovos e
larvas no intestino delgado ou oca- Outros exames que auxiliam no diag-
sionalmente no intestino grosso nóstico são hemograma (demons-
pode determinar a ocorrência de trando eosinofilia), radiografia de tó-
enterite catarral, enterite edemato- rax e métodos imunológicos, como
sa ou enterite ulcerosa. ELISA, IFI, WB e etc.
Podem aparecer larvas filarióides em
SE LIGA! O uso de corticosteroides esti- amostras de fezes envelhecidas e
mula a conversão das larvas rabditóides, pacientes com ritmo intestinal. Além
favorecendo a partenogênese. Além disso, ovos podem aparecer nas fe-
disso, o alcoolismo crônico também au-
menta os níveis de cortisol, culminando
zes em casos de diarreia decorrente
em imunossupressão e, assim, na maior de hiperinfecção.
conversão das larvas rabditóides em
Outras amostras podem ser colhi-
filarióides.
das das demais diversas fontes para
identificação das larvas rabditóides,
Diagnóstico como das secreções broncopulmo-
nares, secreção duodenal, urina, LCR,
O diagnóstico clínico é difícil. 50%
líquido pleural e ascético.
dos pacientes são assintomáticos e
os sintomas pulmonares e digestivos
são comuns a outras doenças. A trí- Tratamento
ade sugestiva para estrongiloidíase é
Os medicamentos atualmente reco-
dor abdominal, diarreia e urticária.
mendados são:
O diagnóstico laboratorial é feito
pela pesquisa de larvas rabditoides • Ivermectina por via oral, 200 mcg/
nas fezes. Devem ser colhidas 3-5 kg/dia, administrados em 2 vezes.
HELMINTOS 65

Contraindicada durante a gesta- 12. TAENIA SP.


ção e o aleitamento. É o medica-
As tênias pertencem ao filo dos pla-
mento de escolha para pacientes
telmintos, classe Cestoda e gênero
imunossuprimidos, pois é o mais
Taenia. A teníase se desenvolve pela
bem tolerado.
forma adulta da tênia, enquanto a cis-
• Albendazol por via oral, 400 mg/ ticercose se forma pela presença da
kg/dia durante 3 dias. larva no corpo do hospedeiro. São
• Tiabendazol por via oral, 25 mg/kg, vermes hermafroditas.
2x ao dia, durante 7 a 10 dias. É É uma doença tropical negligencia-
recomendado nos casos de hipe- da, cosmopolita, causando enorme
rinfecção. Nos casos normais, 50 prejuízo econômico pela presença de
mg/kg (até um máximo de 3 gra- cisticercos em carnes de bovinos.
mas) em um dia, divididos em 2 a 4 Os cestódeos mais frequentemente
tomadas, depois das refeições. encontrados parasitando os humanos
pertencem a família Taeniidae, na qual
A taxa de cura é de 70 a 90% e, como são destacadas Taenia solium e Tae-
os medicamentos não matam as lar- nia saginata. Essas espécies, popu-
vas, convém repetir o tratamento para larmente conhecidas como solitárias,
evitar reinfecções externas ou internas. são responsáveis pelo complexo te-
níase-cisticercose, que pode ser defi-
Nos casos de constipação, efeito co- nido como um conjunto de alterações
lateral comum desses fármacos, po- patológicas causadas pelas formas
de-se utilizar laxativo para evitar rein- adultas e larvares nos hospedeiros.
fecção interna.
A prevalência deste complexo é fre-
quentemente subestimada devido a
Profilaxia vários fatores que dificultam o diag-
nóstico humano e animal. A cisticer-
Deve ser pautada em:
cose é altamente endêmica em áreas
• Educação sanitária → utilização de rurais da América Latina.
calçados, lavar as mãos, lavar os
alimentos, beber água fervida;
Morfologia
• Destino adequado das fezes → re-
des de esgoto e fossas sépticas; • Verme adulto → a T. saginata e a
T. solium apresentam corpo acha-
• Tratamento profilático de imu-
tado dorsoventralmente, em forma
nossuprimidos → para evitar
de fita, dividido em escólex ou ca-
reinfecção.
beça, colo ou pescoço e estróbilo
HELMINTOS 66

ou corpo. São de cor branca leitosa seja, a medida que cresce o colo,
com a extremidade anterior bas- vai ocorrendo a delimitação das
tante afilada e de difícil visualização. proglotes e cada uma delas inicia a
formação dos seus órgãos. Assim,
• Escólex → pequena dilatação, me-
quanto mais afastado do escólex,
dindo, na T. solium, de 0,6 a 1 mm
mais evoluídas são as proglotes.
e, na T. saginata, 1 a 2 mm de diâ-
metro, situada na extremidade an-
terior, funcionando como órgão de As proglotes são subdivididas em jo-
fixação do cestódeo à mucosa do vens, maduras e grávidas e têm a
intestino delgado humano. Apre- sua individualidade reprodutiva e ali-
senta quatro ventosas formadas mentar. As jovens são mais curtas e
de tecido muscular, arredondadas já apresentam o início do desenvolvi-
e proeminentes. A T. solium possui mento dos órgãos genitais masculinos,
o escólex globuloso com um rostro que se formam mais rapidamente que
situado em posição central, entre os femininos. A proglote madura pos-
as ventosas, armado com dupla sui os órgãos reprodutores completos
fileira de acúleos em formato de e aptos para a fecundação. As situa-
foice. A T. saginata tem o escólex das mais distantes do escólex, as pro-
inerme, sem rostro e acúleos. glotes grávidas, são mais compridas e
• Colo → porção mais delgada do internamente os órgãos reprodutores
corpo onde as células do parên- vão sofrendo involução enquanto o
quima estão em intensa atividade útero se ramifica cada vez mais, fican-
de multiplicação. É a zona de cres- do repleto de ovos. A proglote grávida
cimento do parasito ou de forma- de T. solium é quadrangular e o útero é
ção das proglotes. formado por 12 pares de ramificações
do tipo dendrítico, contendo até 80
• Estróbilo → é o restante do corpo mil ovos, enquanto a de T. saginata é
do parasito. Inicia-se após o colo, retangular, apresentando no máximo
observando-se diferenciação tis- 26 ramificações uterinas do tipo di-
sular que permite o reconheci- cotômico, contendo até 160 mil ovos.
mento de órgãos internos ou de Entretanto, apenas 50% dos ovos são
segmentação do estróbilo. Cada maduros e férteis. Essas proglotes so-
segmento formado denomina-se frem apólise, ou seja, desprendem-se
proglote ou anel, podendo ter de espontaneamente do estróbilo. Na T.
800 a 1000 e atingir 3 metros na solium, são eliminados passivamente
T. solium, ou mais de 1000, atin- com as fezes, de três a seis anéis uni-
gindo até 8 metros na T. saginata. dos, enquanto na T saginata as pro-
A estrobilização é progressiva, ou glotes se destacam separadamente,
HELMINTOS 67

podendo se deslocar ativamente, gra- Ciclo biológico


ças a sua musculatura robusta, conta-
Os humanos parasitados eliminam
minando a roupa íntima do hospedeiro.
as proglotes grávidas cheias de ovos
• Ovos → esféricos, morfologica- para o exterior. Em alguns casos, du-
mente indistinguíveis, medindo rante a apólise pode ocorrer formação
cerca de 30 mm de diâmetro. São de hérnia entre as proglotes devido a
constituídos por uma casca prote- não-cicatrização nas superfícies de
tora, embróforo, que é formada por ruptura entre as mesmas, o que fa-
blocos piramidais de quitina uni- cilita a expulsão dos ovos para a luz
dos entre si por uma substância intestinal e a eliminação com as fezes.
que lhe confere resistência no am- Mais frequentemente, as proglotes se
biente. Internamente, encontra-se rompem no meio externo, por efeito
o embrião hexacanto ou oncosfera, da contração muscular ou decompo-
provido de três pares de acúleos e sição de suas estruturas, liberando
dupla membrana. milhares de ovos no solo. No ambiente
úmido e protegido de luz solar inten-
• Cisticerco → o cisticerco da T. so-
sa, os ovos têm grande longevidade
lium é constituído de uma vesícula
mantendo-se infectantes por meses.
translúcida com líquido claro, con-
Um hospedeiro intermediário próprio
tendo, invaginado no seu interior,
(suíno para T. solium e bovino para T.
um escólex com quatro ventosas,
saginata) ingere os ovos, e os embri-
rostro e colo. O cisticerco da T. sa-
óforos no estômago sofrem a ação da
ginata apresenta a mesma morfo-
pepsina, que atua sobre a substância
logia, diferindo apenas pela ausên-
cementante dos blocos de quitina.
cia do rostro. A parede da vesícula
No intestino, as oncosferas sofrem
dos cisticercos é composta por três
a ação dos sais biliares, que são de
membranas: cuticular ou exter-
grande importância na sua ativação
na, uma celular ou intermediária, e
e liberação. Uma vez ativadas, as on-
uma reticular ou interna. Estas lar-
cosferas liberam-se do embrióforo e
vas podem atingir até 12 mm de
movimentam-se no sentido da vilo-
comprimento após quatro meses
sidade, onde penetram com auxílio
de infecção. No sistema nervoso
dos acúleos. Permanecem nesse lo-
central humano, o cisticerco pode
cal durante cerca de quatro dias para
se manter viável por vários anos.
adaptarem-se as condições fisiológi-
Durante este tempo, observam-se
cas do novo hospedeiro. Em seguida,
modificações anatômicas e fisioló-
penetram nas vênulas e atingem as
gicas até a completa calcificação
veias e os vasos linfáticos mesenté-
da larva.
ricos. Através da corrente circulatória,
HELMINTOS 68

são transportadas por via sanguí- eliminação de proglotes dessa espé-


nea a todos os órgãos e tecidos do cie ativamente pelo ânus e raramen-
organismo até atingirem o local de te pela boca. Durante o parasitismo,
implantação por bloqueio do capilar. várias proglotes grávidas se despren-
Posteriormente, atravessam a pare- dem diariamente do estróbilo, três a
de do vaso, instalando-se nos tecidos seis de cada vez em T. solium e oito
circunvizinhos. a nove em T. saginata. O colo, produ-
As oncosferas desenvolvem-se para zindo novas proglotes, mantém o pa-
cisticercos em qualquer tecido mole rasito em crescimento constante.
(pele, músculo esquelético e cardía-
co, olhos e cérebro), mas preferem os Transmissão
músculos de maior movimentação e
com maior oxigenação (masseter, lín- • Teníase → o hospedeiro definiti-
gua, coração e cérebro). vo (humanos) infecta-se ao inge-
No interior dos tecidos, perdem os rir carne suína ou bovina, crua ou
acúleos e cada oncosfera transfor- malcozida, infectada pelo cisticer-
ma-se em um pequeno cisticerco co de cada espécie de Taenia.
delgado e translúcido, que começa a
crescer atingindo, ao final de quatro A cisticercose humana é adquirida
ou cinco meses de infecção, 12 mm pela ingestão acidental de ovos viá-
de comprimento. Permanecem viá- veis da T. solium que foram elimina-
veis nos músculos por alguns meses dos nas fezes de portadores de te-
e o cisticerco da T. solium, no SNC, níase. Os mecanismos possíveis de
por alguns anos. A infecção humana infecção humana são:
ocorre pela ingestão de carne crua
ou malcozida de porco ou de boi in- • Autoinfecção externa: ocorre em
fectado. O cisticerco inferido sofre a portadores de T. solium quando
ação do suco gástrico, evagina-se e eliminam proglotes e ovos de sua
fixa-se, através do escólex, na muco- própria tênia levando-os a boca
sa do intestino delgado, transforman- pelas mãos contaminadas ou pela
do-se em uma tênia adulta, que pode coprofagia.
atingir até oito metros em alguns me- • Autoinfecção interna: poderá ocor-
ses. Três meses após a ingestão do rer durante vômitos ou movimen-
cisticerco, inicia-se a eliminação de tos retroperistálticos, possibilitan-
proglotes grávidas. A proglote grávi- do presença de proglotes grávidas
da de T. solium tem menor atividade ou ovos de T. solium no estôma-
locomotora que a de T. saginata, sen- go. Estes, depois da ação do suco
do observada em alguns pacientes a gástrico e posterior ativação das
HELMINTOS 69

oncosferas, voltariam ao intestino do abdome e perda de peso são


delgado, desenvolvendo o ciclo alguns dos sintomas observados
auto-infectante. em decorrência da infecção. Obs-
trução intestinal provocada pelo
• Heteroinfecção: ocorre quando os
estróbilo, ou ainda a penetração de
humanos ingerem alimentos ou
uma proglote no apêndice, apesar
água contaminados com os ovos
de raras, já foram relatadas.
da T. solium, disseminados no am-
biente através das dejeções de ou- • Cisticercose → é uma condição
tro paciente. grave, que provoca lesões impor-
tantes no paciente. Não está bem
estabelecido o grau de alteração
Patogenia e sintomatologia que a cisticercose provoca nos
• Teníase → apesar de ser a tênia animais. Como em geral os suí-
popularmente conhecida como nos são abatidos precocemente
solitária, indicando que um hos- (em torno de seis meses), muitas
pedeiro alberga apenas um para- vezes não se notam alterações de
sito, na prática, o que se observa monta. Mas, em reprodutores mais
são pessoas infectadas com mais velhos, o encontro de cisticerco no
de uma tênia da mesma espécie. coração, músculos mastigadores,
Devido ao longo período em que a respiratórios e cérebro leva a crer
T. solium ou T. saginata parasita o que sejam capazes de produzir
homem, elas podem causar fenô- sintomatologias, porém não bem
menos tóxicos alérgicos, através estudadas.
de substâncias excretadas, provo-
car hemorragias através da fixa- A cisticercose humana é responsável
ção na mucosa, destruir o epitélio e por graves alterações nos tecidos, e
produzir inflamação com infiltrado grande variedade de manifestações.
celular com hipo ou hipersecreção É uma doença pleomórfica pela pos-
de muco. O acelerado crescimen- sibilidade de o cisticerco alojar-se em
to do parasito requer um conside- diversas partes do organismo, como
rável suplemento nutricional, que tecidos musculares ou subcutâneos;
leva a uma competição com o hos- glândulas mamárias (mais raramen-
pedeiro, provocando consequên- te); globo ocular; e com mais frequên-
cias maléficas para o mesmo. Ton- cia no sistema nervoso central, inclu-
turas, astenia, apetite excessivo, sive intramedular, o que traz maiores
náuseas, vômitos, alargamento do repercussões clínicas.
abdome, dores de vários graus de
intensidade em diferentes regiões
HELMINTOS 70

As manifestações clínicas causadas ventrículos podem causar a obstru-


dependem de fatores, como núme- ção do fluxo líquido cefalorraquidiano,
ro, tamanho e localização dos cisti- hipertensão intracraniana e hidroce-
cercos; estágio de desenvolvimento; falia; e, finalmente, as calcificações,
se estão viáveis, em degeneração ou que correspondem a forma cicatricial
calcificados; e, finalmente, da respos- da neurocisticercose, estão associa-
ta imunológica do hospedeiro aos an- das a epileptogênese.
tígenos da larva. As localizações mais frequentes dos
Na cisticercose ocular sabe-se que cisticercos no SNC são leptomeninge
o cisticerco alcança o globo ocular e córtex (substância cinzenta). Cere-
através dos vasos da coroide, insta- belo e medula espinal já são locais
lando-se na retina. Na retina cresce, mais raros. As manifestações clíni-
provocando ou o descolamento desta cas em geral aparecem alguns me-
ou sua perfuração, atingindo o humor ses após a infecção. Em cerca de seis
vítreo. As consequências da cisticer- meses o cisticerco está maduro e tem
cose ocular são reações inflamatórias uma longevidade estimada entre dois
exsudativas que promoverão opa- e cinco anos no SNC. Neste processo,
cificação do humor vítreo, sinéquias são identificados os quatro estágios
posteriores da íris, uveítes ou até do cisticerco que culminam com a sua
pantoftalmias. Essas alterações, de- degeneração. Sabe-se que no início
pendendo da extensão, promovem a da fase de degeneração da larva, as
perda parcial ou total da visão e, oca- reações inflamatórias acentuam-se
sionalmente, até desorganização in- notavelmente, podendo ocorrer gra-
traocular e perda do olho. O parasito ves consequências, como encefalite
não atinge o cristalino, mas pode pro- focal, edema nos tecidos adjacentes,
mover a sua opacificação (catarata). vasculite e ruptura da barreira hema-
A cisticercose no sistema nervoso toencefálica, surgindo reações a dis-
central pode acometer o paciente por tância. As manifestações clínicas mais
três processos: presença do cisticerco frequentes são crises epilépticas, sín-
no parênquima cerebral ou nos espa- drome de hipertensão intracraniana,
ços liquóricos; pelo processo inflama- cefaleias, meningite cisticercótica,
tório decorrente; ou pela formação de distúrbios psíquicos, forma apoplética
fibroses, granulomas e calcificações. ou endarterítica e síndrome medular,
mais raramente. A neurocisticercose
Os cisticercos parenquimatosos po- é a principal causa da epilepsia nos
dem ser responsáveis por processos habitantes de áreas consideradas
compressivos, irritativos, vascula- endêmicas.
res e obstrutivos; os instalados nos
HELMINTOS 71

Diagnóstico Depois, deve-se colar a fita na lâmina


e examinar ao microscópio. O método
O diagnóstico é feito, muitas vezes,
só permite o diagnóstico de teníase,
pelo próprio paciente ao observar a
sem revelar a espécie e o risco even-
expulsão de proglotes. Quando elas
tual de cisticercose.
saem entre as evacuações e são en-
contradas nos lençóis ou na roupa Já os métodos imunológicos e mo-
íntima, trata-se de T. saginata. As leculares são fundamentais para o
proglotes daT. solium só saem pas- diagnóstico de cisticercose, haja vis-
sivamente, durante as evacuações e, ta que os ovos não saem pelas fezes
em geral, formando cadeias com 3 a como ocorre na teníase. Pode-se utili-
6 segmentos unidos. zar, então, ELISA, IFI, WB e PCR.
Para o diagnóstico de espécie, as Como métodos de imagem, pode-se
proglotes serão comprimidas entre 2 utilizar também radiografias e tomo-
lâminas de vidro grosso; o conjunto grafias específicas de cada região do
posto a clarear no ácido acético e, de- corpo.
pois, examinado com lupa para ver as Para os casos de cisticercose ocular,
estruturas uterinas: se com 15 a 30 cabe a realização de exame de fundo
ramos uterinos em cada lado da has- de olho (fundoscopia).
te e aspecto dicotômico é T. saginata;
se com 7 a 16 ramificações de cada
lado e aspecto dendrítico, é T. solium. Tratamento
Nos três primeiros meses da infec- • Teníase → várias drogas tenicidas
ção não se encontram proglotes nem podem ser utilizadas, como:
ovos. Depois, os ovos podem ser en- ◊ Niclosamida: medicamento
contrados no exame de fezes ou pes- insolúvel na água e não ab-
quisados com a técnica da fita adesi- sorvível pelo intestino. Prati-
va transparente. camente não apresenta efei-
Os ovos chegam a ser abundantes na tos colaterais. Tomar apenas
pele do períneo, onde as proglotes, ao líquidos, desde a véspera, e
passar pelo esfíncter anal, deixaram 2 gramas de niclosamida de
sair muitos deles pelas superfícies de uma só vez em jejum (crianças
apólise. A fita gomada, montada so- tomam 1 a 2 gramas), masti-
bre uma lâmina de microscopia com gando bem os comprimidos. A
a parte colante para fora, deve ser taxa de cura fica em torno de
aplicada contra o ânus e as nádegas 90%, dependendo do grau de
comprimidas contra ela, para que os micronização do produto;
ovos situados na pele possam aderir.
HELMINTOS 72

◊ Praziquantel: muito efetivo no vítreo, os sucessos são da ordem


tratamento das teníases, mas, de 75% e na subretina de 71%;
por ser absorvível pelo intes-
• A quimioterapia é feita com pra-
tino, é contraindicado nos ca-
ziquantel ou com albendazol. Po-
sos de cisticercose. Por essa
de-se associar anticonvulsivantes
razão, só se recomenda contra
e corticosteroides como adjuvan-
T. saginata, na dose de 5-10
tes. Para a cisticercose muscular e
mg/kg de peso corporal. Sua
subcutânea, não há necessidade
eficácia é de 96%;
de tratamento específico, já que
◊ Mebendazol: também usado esta é benigna.
só contra T. saginata, na dose
de 200 mg, duas vezes ao dia,
durante 4 dias; O praziquantel é contraindicado na
cisticercose ocular. Pacientes assin-
tomáticos ou com cisticercos mortos
Só a eliminação ou destruição do es- não devem ser tratados.
cólex assegura a cura. Portanto, se ele
não for encontrado nas evacuações,
aguardar cerca de quatro meses para Profilaxia
ver se as proglotes não reaparecem, As principais medidas de prevenção
exigindo novo tratamento. Nenhum de teníase e cisticercose se baseiam
tratamento é ovicida. em:
Para o tratamento da cisticercose, há • Não comer carne crua ou mal
algumas possibilidades: cozida;
• A neurocirurgia encontra indicação • Inspeção rigorosa da carne e fisca-
quando o número de parasitos é lização de matadouros, combaten-
pequeno e a localização favorável do o abate clandestino;
para a intervenção;
• Educação sanitária: lavar bem os
• Na cisticercose ocular, a cirurgia alimentos e mãos, beber água de
não oferece dificuldades quando boa procedência, impedir o conta-
o parasito se encontra na câmara to de suínos e bovinos com fezes e
anterior do olho, ou em situação saneamento básico.
subconjuntival ou subcutânea. No
HELMINTOS 73

MAPA MENTAL GERAL SOBRE HELMINTOS

Platelmintos HELMINTOS Nematelmintos

Achatados dorsoventralmente Simetria bilateral

Grego: hélmin
Acelomados Cilíndricos alongados

Protonefrídios Dióicos → machos e fêmeas


como sistema excretor Verme

Com ou sem tubo digestivo Hermafroditas


Helmintíases

Trematoda Tricuríase Trichuris trichiura

+ de 50% das
Schistosoma mansoni infecções em crianças Filariose Wuchereria bancrofti

Esquistossomose Ancilostomíase Necator americanus e


E. granulosus → Ciclos Ancylostoma duodenale
equinococose e
hidatidose
Cestoda Enterobiose Enterobius vermicularis
Hymenolepis Monoxênico
nana → tênia anã
→ himenolepíase
Taenia sp Estrongiloidíase Strongyloides stercoralis
Heteroxênico

Teníase e cisticercose
HELMINTOS 74

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Parasitologia Humana, 13ª ed., David Pereira Neves, 2016.
Parasitologia Médica, 3ª ed., Luís Rey, 2011.
Blackbook Clínica Médica, 2ª ed., Reynaldo Gomes de Oliveira, 2014.
Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde, Escola Nacional de
Saúde Pública Sérgio Arouca, Instituto Fiocruz.
Obrigon, AM, et al. Hidatidose pulmonar e hepática com múltiplos cistos: um relato de caso.
Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo. 2018; 53(3): 239-244.
Gomes, NH, et al. Hidatidose do esterno e musculatura peitoral. J Pneumologia. 2001; 27(4):
223-226.
Hidatidose hepática. O Radiologista – blogspot, 2008.
HELMINTOS 75

Você também pode gostar