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MÓDULO 10

O JEITO BARSI
DE INVESTIR
PROFESSORES LOUISE BARSI,
FABIO BARONI, FELIPE RUIZ E JEAN MELO

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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 3
OS MESTRES DO NOSSO MESTRE .......................................................................... 7
AÇÕES GARANTEM O FUTURO ............................................................................ 30
O JEITO BARSI DE INVESTIR (JBI).......................................................................... 49
ESTUDO PRÁTICO ............................................................................................... 77
CONCLUSÃO ..................................................................................................... 104

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INTRODUÇÃO
Vamos esmiuçar, neste módulo, como funciona o Jeito Barsi de Investir
(JBI), quais são suas origens e princípios, e como utilizá-lo para compor
uma carteira previdenciária de investimentos, com foco no recebimento
de dividendos.

Na disciplina de Value Investing, do módulo 2 deste MBA, apresentamos o


contexto histórico em que o estudo Ações Garantem o Futuro foi
produzido, na década de 1970. Diferentemente de outros operadores
profissionais da época, Luiz Barsi conhecia profundamente a arte de
analisar balanços e até via a atividade como algo prazeroso. É
compreensível: o trabalho como auditor era seu principal sustento antes
de ele se tornar investidor na Bolsa.

Após deixar um trabalho como CLT em uma firma de auditoria e


contabilidade, Barsi passou a auditar de maneira independente algumas
empresas de energia e saneamento. Uma delas foi a Saec, origem da
Sabesp dos dias de hoje. Ele ficou fascinado pela capacidade desse tipo de
empresa repassar a inflação aos preços – e os clientes não podem fugir
dos boletos no fim do mês. Além disso, essas companhias têm como
controlador um tipo de acionista sedento por bons dividendos, que
acabam sendo pagos também para outros pequenos acionistas.

Existe um segundo fator importante para compreender o momento da


história quando o estudo de Barsi foi escrito. Já havia naquele momento
uma preocupação com a ineficiência da Previdência. De fato, a figura da
Previdência como um sistema de Seguridade Social, tal como conhecemos
hoje, só viria a se concretizar muitos anos depois. Nas décadas de 1950 a
1970, os IAPs, ou Institutos de Aposentadorias e Pensões, faziam as vezes
de centralizadores da arrecadação dos recursos financeiros das entidades
de classe e eram politicamente e financeiramente fortalecidas pelo
sindicalismo.

Enquanto isso, tornaram-se extremamente populares os investimentos


em Previdência Complementar nos chamados Montepios. As mais
emblemáticas eram GBOEX, Pereira Barreto e Montepio da Família Militar.

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Todas faliram em meados da década de 1980 por má gestão, desvios e
baixa capitalização dos recursos.

Nesse cenário composto por IAPs politizadas e fortemente influenciadas


pelos sindicatos de um lado e por Fundos de Previdência Privados cada vez
mais robustos do outro, Barsi teve a ideia de construir uma carteira
previdenciária na Bolsa, de modo independente e investindo como pessoa
física. Para ele, um único gestor ou mesmo um comitê de gestores de um
fundo não tomariam decisões melhores do que ele próprio, que
trabalhava diretamente com investimentos e via enorme potencial nas
ações como provedoras de uma boa renda futura.

JEITO BARSI DE INVESTIR – CONCEITOS IMPORTANTES

Ainda no módulo 2, entendemos as principais diferenças entre as


estratégias de investimento Buy and Hold e Value Investing. De fato, Barsi
gosta de identificar ações de companhias sólidas, comprá-las e guardá-las
por tempo indeterminado. Ao montar uma posição, ele não planeja
quanto tempo permanecerá nela, nem qual percentual de valorização o
deixará satisfeito. No entanto, por considerar utópica a visão de que não
existe limite para se pagar por ativos de boa qualidade, o Jeito Barsi de
Investir (JBI) tem uma filosofia muito mais próxima do Value Investing.

Na nossa opinião, todo investimento tem valor. A graça do jogo é pagar


pouco por algo valioso e capaz de gerar excelentes dividendos no longo
prazo. Considerando o objetivo previdenciário, as empresas são
selecionadas por suas características fundamentais:

1. Resultados sólidos.

2. Consolidação no mercado.

3. Perenidade do negócio.

4. Política de distribuição de proventos.

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As quatro características são importantes para discernir quais empresas
são adequadas para uma carteira previdenciária. A Bolsa no Brasil possui
mais de 400 empresas listadas! O investidor precisa ter foco para não
perder tempo investigando ação por ação. Nasce daí o acrônimo BESST,
formado pelas iniciais de Bancos, Energia, Saneamento, Seguros e
Telecom – setores geralmente associados às características fundamentais
que buscamos selecionar. Esse filtro, então, precisa ser refinado ainda
mais qualitativamente, até chegar ao ponto de analisar a reputação do
acionista controlador, a qualidade dos gestores e o tamanho e a
concentração da base acionária.

Finalmente, por ter foco em "aposentadoria" e privilegiar horizontes de


longuíssimo prazo, algumas premissas são imprescindíveis para o
investimento se concretizar da maneira planejada. Antes mesmo de
selecionar suas ações, verifique se você tem condições de realizar:

• Aportes frequentes, sem valor mínimo estabelecido.

• Aplicação de uma parcela da renda que não comprometa o


orçamento pessoal.

• Destinação de recursos sem necessidade de desembolso no curto


prazo.

• Compra baseada na expectativa futura de geração de valor, não em


arbitragem ou especulação.

• Reinvestimento dos proventos.

Uma vez determinado o objetivo e as metas a atingir, o investidor estará


preparado para iniciar sua jornada. Antes de entrar nos conceitos
qualitativos e quantitativos de como formar uma carteira, é importante
entender que, como em qualquer novo aprendizado, existe um processo a
seguir.

Não é incomum ver pessoas procurando um material, seja um curso ou


um livro, prometendo ensiná-las a nunca perder dinheiro nos

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investimentos em ações ou a sempre ganhar na Bolsa, assegurando um
retorno superior ao do mercado com base em algum tipo de mágica, sem
esforço algum. Quando se aprende algo novo – como aprender a dirigir, a
falar um novo idioma, tocar um instrumento musical ou investir na bolsa –
sempre existe um processo composto por quatro fases.

Fase 1 – Incompetência Inconsciente. Para simplificar, pense em como as


pessoas aprendem a dirigir. No início, tudo é um pouco estranho. Um
carro tem vários botões, pedais e funções para manejar ao mesmo tempo.
Essa é a fase 1, chamada de Incompetência Inconsciente, um período em
que você não sabe que não sabe. Ou seja, uma tomada de decisão nesta
fase pode levar a algum erro. Ao falhar, porém, estamos aprendendo e
nos acostumando com essa nova informação.

Na verdade, é essencial errar nessa primeira fase. No mundo dos


investimentos, às vezes nos deparamos com incompetentes inconscientes
replicando estratégias dos outros. São pessoas que compram ações da
Paranapanema, por exemplo, só porque Barsi comprou, ou lidam com
derivativos sem conhecer os riscos. Num primeiro momento, podem
ganhar dinheiro, mas apenas por pura sorte – e há pouca chance de que
as coisas continuem dando certo.

Fase 2 – Incompetência Consciente. Quando ocorrem as falhas, começa a


segunda fase do processo, chamada de Incompetência Consciente, na qual
você sabe que não sabe. Nesta fase, a pessoa toma consciência e se
convence da necessidade de estudar mais ou pedir ajuda para continuar
aprendendo.

É o momento em que o motorista iniciante reconhece que precisa de uma


autoescola. No mundo da Bolsa, muitos de nossos alunos do MBA se
encontram nesta etapa. São pessoas se especializando e tentando
aprender lições depois de cometer erros, para um dia se tornarem
profissionais competentes e capazes de orientar seus clientes ou de se
estabeleçam como investidores independentes e críticos.

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Fase 3 – Competência Consciente. Feito é melhor do que perfeito, mas a
prática te deixa cada vez mais próximo disso. Aqui começa a fase 3,
chamada de Competência Consciente, quando você sabe o que sabe. O
motorista já conhece todas as funções do carro, mas às vezes deixa o
motor morrer ou erra a marcha. Algo semelhante acontece com os
investimentos: o investidor já entendeu a dinâmica do mercado, mas
ainda tem algumas dúvidas.

Fase 4 – Competência Inconsciente. Por fim, chega a fase 4, chamada de


Competência Inconsciente, quando você não sabe o quanto sabe. Nessa
etapa o motorista já conhece todos os movimentos, domina a direção e
dirige inconscientemente, no “piloto automático”.

Nas ações, ocorre o mesmo processo. Barsi não mais se utiliza de


ferramentas sofisticadas de valuation para saber se uma ação está cara ou
barata. Ele simplesmente sabe. Depois de ter analisado as características
das empresas de sua carteira inúmeras vezes e acompanhando o
comportamento do mercado por tantos anos, Barsi estabeleceu
parâmetros pessoais para chegar às conclusões necessárias.

OS MESTRES DO NOSSO MESTRE


Na sua trajetória como investidor, Barsi passou por todas as etapas do
processo de aprendizagem. Ao iniciar como operador da Bolsa na década
de 1970, ele percebeu de não cair nas práticas comuns da época -- e só
assim construiria um patrimônio em ações que, no longo prazo, pudesse
garantir seu futuro.

No início, a inspiração para o estudo Ações Garantem o Futuro veio da


experiência de Barsi como contador e auditor de empresas. O
conhecimento e a informação não se disseminavam com a facilidade de
hoje em dia e nem se ouvia falar em mentores de fora do país em quem se
inspirar. Mas Barsi pensou: “Se os controladores das empresas viviam de
dividendos, outros acionistas também poderiam”.

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Warren Buffett, foi, com toda a certeza, um dos nomes mais influentes na
carreira de Barsi, que dele incorporou o estilo frugal de levar a vida e
alguns comportamentos necessário para comprar ações. No entanto,
ambos têm alguns critérios distintos para selecionar boas ações.

Warren Buffet

É impossível começar a explorar o JBI sem antes embasar a discussão


teórica em torno de dois grandes precursores do Value Investing:
Benjamin Graham e Philip Fisher. Vejamos a seguir os princípios de
investimento desses dois autores, e como eles foram incorporados,
adaptados e aprimorados por Luiz Barsi.

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BENJAMIN GRAHAN

O economista, professor e investidor Benjamin Graham foi o autor de O


Investidor Inteligente, considerado a bíblia do Value Investing. Recebemos
no AGF diversas perguntas sobre esse livro, geralmente relacionada ao
checklist de alguns indicadores que contribuem para a percepção de valor
e preço. Trataremos desses indicadores mais adiante, mas já adiantamos:
não é esse o ponto mais importante do pensamento de Graham. A
mensagem real do livro se resume em cinco princípios centrais. Vamos a
eles.

1. A primeira lição de Graham você já deve ter visto por aqui: "Uma
ação não é apenas um sinal eletrônico. Ela representa o interesse
do proprietário em um negócio real, com valor intrínseco
independente do preço da ação". O autor faz, ao longo do livro,
várias menções a respeito da incerteza em relação ao processo de
precificação de uma ação. Alguns exemplos: "O futuro dos preços
de valores mobiliários nunca é previsível" e "Raramente é possível
fazer previsões confiáveis sobre mudanças, absolutas ou relativas,
nos preços".

O Investidor Inteligente, considerado a bíblia do Value Investing.

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2. Reconhecer a existência de uma distinção entre valor intrínseco e
preço, e que é difícil prever este último, nos leva à segunda grande
lição do livro: “O mercado é um pêndulo que sempre oscila entre o
otimismo insustentável (que torna as ações muito caras) e um
pessimismo injustificável (que as torna muito baratas). O investidor
inteligente é um realista que vende para os otimistas e compra dos
pessimistas”.

Nesse caso, Graham se refere ao investidor que compra uma ação a


um preço atrativo para vendê-la mais caro. A única diferença com o
Jeito Barsi de Investir está justamente no momento da venda.
Como o objetivo do JBI é previdenciário, só faz sentido vender uma
ação que subiu demais se seus fundamentos deixarem de ser
atrativos.

Voltando aos ânimos do mercado, Graham salienta que o índice


americano passou por uma impressionante evolução no período
pós-guerra: “A maior parte da evolução do mercado naquele
período foi baseada em uma mudança nas atitudes dos investidores
e especuladores, e não nos valores intrínsecos das companhias.
Dessa forma, essa evolução poderia ser facilmente denominada
uma operação de alavancagem.”

Em nossa opinião, em parte, isso também ocorreu com o Ibovespa.


Uma parcela da alta dos últimos anos se deu pelas expectativas de
um Brasil melhor, considerando a sinalização das reformas
estruturais importantes para o país, principalmente a da
Previdência e a Trabalhista. Outra parte foi artificialmente inflada
por uma taxa de juros inimaginavelmente baixa para os padrões
brasileiros. É importante, portanto, saber distinguir quando a alta
decorre da euforia de mercado e quando está baseada em dados
reais de melhora. Infelizmente, no curto prazo, é muito difícil fazer
essa distinção, e ninguém está livre de fazer uma interpretação
errada.

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3. A terceira grande lição de Benjamin Graham decorre justamente
dessa dificuldade em discernir o otimismo insustentável e o
pessimismo injustificável: “Não importa o quanto você é cuidadoso,
nenhum investidor pode eliminar o risco de errar”. A única maneira
de minimizar o risco de errar é insistindo no que Graham chamou
de “margem de segurança”: nunca pagar um preço elevado demais,
independentemente de quanto um investimento possa ser
atraente.

Uma das grandes dúvidas é como identificar um setor perene, no


qual as empresas fornecem produtos ou serviços tão essenciais que
muito provavelmente conseguirão se manter constantes ou em
crescimento ao longo de muitos anos. Nesse sentido, seria o setor
de saúde uma vertente de crescimento, considerando que a
demanda por esse tipo de serviço acompanhará o envelhecimento
da população? Não é bem assim! Graham também trata do assunto
e completa: “Perspectivas óbvias de crescimento físico em um
negócio não significam lucros óbvios para os investidores”.

Outro trecho sobre o assunto responde também a várias perguntas


do nosso público em relação ao investimento nas chamadas
empresas de crescimento: “Embora pareça fácil prever qual setor
crescerá mais rapidamente, essa previsão não tem valor real se a
maioria dos outros investidores já espera a mesma coisa. Quando
todo mundo decidir que um certo setor é obviamente o melhor
para se investir, os preços de suas ações já terão subido tanto que
os rendimentos futuros não terão para onde ir, a não ser para
baixo.”

Esse tipo de ativo, geralmente caracterizado por múltiplos elevados


em relação ao seu histórico, também costuma ter maior
volatilidade: “A experiência nos ensinou que, embora haja muitas
boas empresas em rápido crescimento cujo valor de mercado é
muito superior ao de seu patrimônio líquido, o comprador de tais
ações dependerá demais dos humores e das oscilações do mercado
acionário”.

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Graham fala então do tipo de setor que consideramos perene: “Em
comparação, o investidor em ações, digamos, de concessionárias de
utilidade pública com um valor aproximadamente equivalente ao de
seu patrimônio líquido, pode sempre se considerar o proprietário
de uma participação em um negócio saudável e em expansão,
adquirida a um preço racional, não obstante o que o mercado de
ações possa dizer ao contrário”.

Podemos afirmar o mesmo de outros setores tradicionais e muitas


vezes esquecidos pelo investidor por não estarem na moda: energia
(principalmente geração e transmissão), bancos, seguradoras,
saneamento, químicos e embalagens são alguns deles e,
curiosamente, são os que geralmente devem ser considerados para
compor uma carteira previdenciária.

4. O quarto princípio central de Graham é um complemento das lições


anteriores: “O valor futuro de todo investimento é uma função de
seu preço presente. Quanto mais alto o preço pago, menor o
ganho”. Como identificar os momentos de oportunidade? Graham
dá algumas pistas valiosas ao investidor: “A maioria dos novos
lançamentos é vendida em condições de mercado favoráveis, o que
significa favorável para o vendedor e, consequentemente, menos
favorável para o comprador”.

Uma forte evidência de um mercado excessivamente otimista é,


portanto, quando a percepção geral de euforia tiver tomado as
mídias de grande circulação e o número de IPOs houver aumentado
significativamente. De fato, os anos com maior número de
aberturas de capital antecederam as maiores quedas das bolsas ao
redor do mundo.

Evidentemente, não podemos garantir que um aumento das ofertas


significa uma crise logo adiante. Como o próprio Graham diz, “a vida
só pode ser entendida em retrospecto, mas deve ser vivida para
frente”. Mas os momentos de euforia são um forte indicador mais
favorável ao vendedor do que ao comprador.

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Resumindo, Graham afirma: “O verdadeiro investidor pode tirar
vantagem do preço de mercado diário ou desconsiderá-lo,
conforme ditado por suas próprias ideias e inclinações, mas
também precisa tomar conhecimento dos movimentos de preço
importantes, pois de outra forma seu julgamento será desprovido
de uma base”.

Aqui temos uma mensagem muito importante, já que outra dúvida


recorrente é se devemos comprar ações sem nos importar com o
preço. Na filosofia de investimento de Luiz Barsi, preço importa
SIM! Essa afirmação não está relacionada às oscilações de centavos,
mas justamente aos GRANDES movimentos, que levam as ações a
preços injustificáveis. Identificar esses momentos é de extrema
importância para o investidor não comprar caro demais. Caso
contrário, ele irá se arrepender em termos de retorno, tanto de
capital quanto de proventos.

Sobre o assunto, Graham finaliza com maestria: “Não é certo que o


investidor típico deva, em geral, abster-se de comprar até que níveis
de mercado baixos apareçam, porque isso pode envolver uma longa
espera, muito provavelmente a perda de renda (dividendos) e a
possível perda de uma oportunidade de investimento. Grosso
modo, pode ser melhor para o investidor comprar ações sempre
que tiver dinheiro para colocar em ações, exceto quando o nível
geral de mercado for muito mais alto do que pode ser justificado
pelos padrões de valor estabelecidos. Se ele deseja ser astuto, pode
procurar as oportunidades de subvalorização sempre presentes
em papéis individuais".

Por "investidor típico", ele se refere a nós, investidores não


profissionais. Não poderíamos concordar mais. O Jeito Barsi de
Investir é justamente sobre isso: formar um programa de compra
de ações baseado em seu retorno em proventos, aproveitando as
subvalorizações que SEMPRE aparecerão. SEMPRE haverá uma
empresa ou um setor específico mais barato do que os demais.

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5. Por fim, mas não menos importante, temos a quinta e última
grande lição: "O segredo do seu sucesso financeiro está em você
mesmo. Se você se tornar um pensador crítico que não acredita
fielmente em todos os 'fatos' de Wall Street e investe com
confiança e paciência, pode tirar vantagens constantes até mesmo
dos piores mercados de baixa. Ao desenvolver disciplina e coragem,
você pode evitar que as variações de humor de outras pessoas
governem seu destino financeiro. No fim das contas, o
comportamento de seus investimentos é bem menos importante do
que o seu próprio comportamento".

PHILIP FISHER

Warren Buffet costuma dizer que sua estratégia hoje é composta de


85% dos ensinamentos de Benjamin Graham e 15% dos postulados de
Phillip Fisher (para Barsi, esse percentual é um pouco mais
equilibrado). É impressionante como esses grandes investidores
chegaram a conclusões muito parecidas, apesar de o estilo de investir
de cada um deles ter seu próprio DNA.

Fisher pertence ao grupo dos pioneiros da teoria de investimentos


moderna. Foi também um dos primeiros a definir claramente as
características qualitativas de um bom investimento. Vamos sintetizar
aqui as principais lições de uma das melhores obras de Fisher (o livro
Investidores Conservadores Dormem Tranquilos). Para ele, são
considerados bons investimentos aqueles feitos em empresas
conservadoras, cuja análise deve se basear em quatro dimensões (uma
espécie de avaliação 360º, assim como costumamos fazer de acordo
com o Jeito Barsi de Investir).

1ª Dimensão: excelência em produção, marketing, pesquisa e


habilidade financeira. Fisher disse: "Essa dimensão se subdivide em
quatro categorias principais: produção de baixo custo, organização
de marketing fortalecida, pesquisas e esforços técnicos bem-
sucedidos e habilidade financeira."

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Dentro da primeira categoria, a de baixo custo, Fisher acrescenta:
"Para ser considerada um investimento realmente conservador,
uma empresa deve apresentar os custos de produção mais baixos -
ou tão baixos quanto qualquer uma de suas concorrentes - em
todas ou quase todas as suas linhas de produção".

Por que isso seria importante? Porque a empresa não apenas


estaria garantindo eficiência operacional, mas também poderia se
fortalecer diante da fraqueza de seus concorrentes. Sobre isso, o
autor conclui: "Quando um ano ruim abala a indústria, os preços
não costumam permanecer por muito tempo abaixo desse ponto de
neutralidade. Quanto mais tempo permanecem, maiores os
prejuízos em grande parte dos concorrentes cujos custos são mais
elevados, a ponto de alguns serem forçados a cessar a produção.
Isso aumenta quase automaticamente os lucros das empresas de
custo reduzido sobreviventes, que se beneficiam do aumento da
produção ao assumirem a demanda anteriormente preenchida por
unidades que encerraram suas atividades".

Ou seja, mesmo em crises, uma empresa conservadora e eficiente


preencherá o vácuo deixado pela quebra dos concorrentes, sem
necessariamente incorrer em práticas agressivas.

A segunda divisão dentro dessa primeira dimensão é o marketing.


"Uma empresa de marketing fortalecido deve estar sempre alerta
para os desejos mutáveis de seus clientes, para fornecer o que eles
querem no presente, e não o que costumavam desejar no passado".

Essa característica é importante. Muitos investidores e analistas


podem subestimá-la, confundindo marketing com propaganda. O
objetivo principal de qualquer empresa não está nela mesma, mas
sim em atender demandas, necessidades e desejos.

Por meio de uma estratégia de marketing uma companhia consegue


se sustentar em quatro pilares: produto e seus diferenciais;
direcionamento de público; praça e canais; e, finalmente, preço
adequado. Phil, como Warren Buffet gostava de chamá-lo, conclui

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exatamente isso. Para ele, a falta de um gerenciamento bem-
sucedido nessas áreas pode resultar em:

• Perda de um volume significativo de negócios que, em uma


situação diversa, estaria disponível.

• Produção a custos bem mais elevados e, consequentemente,


obtenção de lucros menores.

• Em razão das variações das margens de diversos elementos


das linhas de produto das empresas, há o fracasso em
alcançar os lucros máximos possíveis em determinada linha
de produção.

Capa da edição brasileira de um dos livros


mais importantes de Philip Fisher.

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O autor resume: “a companhia que se qualifica adequadamente na
primeira dimensão de um investimento conservador é uma
produtora ou operadora de custo bastante reduzido em sua área;
conta com um marketing e uma habilidade financeira de destaque;
além de uma destreza comprovada, acima da média, quanto ao
complexo problema do gerenciamento para obtenção de resultados
consideráveis de sua organização tecnológica ou de pesquisa”.

2ª Dimensão: fator humano. Essa dimensão lida com quem


produziu todos esses resultados e, mais importante, continuará a
produzi-los no futuro. “A força que impulsiona tais fatos é
basicamente o potencial humano”.

O autor descreve o ambiente ideal de uma empresa conservadora:


“As pessoas não devem estar envolvidas numa luta interna
infindável pelo poder. Antes, devem estar concentradas no trabalho
conjunto para o cumprimento de objetivos corporativos bem
estabelecidos. Um desses objetivos, imprescindível quando um
investimento obtém sucesso, é a disponibilidade de tempo para a
gestão de cúpula identificar e treinar funcionários qualificados e
motivados para o gerenciamento sênior”.

Basicamente, estamos falando aqui da capacidade de reter e formar


novos talentos. Para averiguar se isso acontece nas empresas, o
investidor pode buscar estar presente tanto quanto possível dos
eventos direcionados aos acionistas. Nessas oportunidades,
questione a gestão e procure saber se outros colaboradores de
outras áreas estão presentes. Seja curioso! Existem, inclusive,
empresas especializadas em pesquisar o ambiente de trabalho,
como a Love Mondays.

Para finalizar, Fisher descreve os três elementos que devem estar


sempre presentes nas análises sobre o fator humano:

• A empresa deve reconhecer que o mundo em que ela opera


avança em um índice constantemente crescente". Em outras
palavras, a transformação e o aperfeiçoamento têm de surgir

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do pensamento inovador para aprimorar um sistema de
trabalho, e não de uma reação forçada diante de uma crise.

• "Deve haver sempre um esforço consciente e contínuo,


baseado em fatos e não em ideologias, para que todos os
colaboradores sintam que a sua empresa é um bom lugar
para se trabalhar". A aposentadoria e os planos de
participação nos lucros desempenham um papel significativo
e criam um componente de propriedade.

• "A gestão deve estar disposta a se submeter à disciplina


necessária para um crescimento saudável". O objetivo de
crescimento do verdadeiro investimento não é simplesmente
auferir ganhos, mas evitar prejuízos.

3ª Dimensão: Características de Investimento de Alguns Negócios.


O autor apresenta essa dimensão como "o grau de existência de
determinadas características inerentes dentro da natureza do
próprio negócio que possibilitem uma lucratividade acima da média
para uma previsão futura".

Aqui, em nossa opinião, estão as lições mais valiosas para o nosso


público. Elas serão aprofundadas logo adiante ao tratar de critérios
quantitativos: avaliar a lucratividade não é olhar apenas o Lucro
Líquido. "A lucratividade pode ser expressa de duas maneiras. A
maneira fundamental é o retorno sobre os ativos investidos,
geralmente mais difícil para o investidor, pois costuma ser
destinado ao executivo. Por essa razão, comparar margens de lucro
em vendas pode ser mais proveitoso. Do ponto de vista da
segurança do investimento, toda ênfase está na margem de lucro
sobre as vendas".

Se uma empresa obtém números e margens atraentes, seu mercado


chamará a atenção de outras companhias. Fisher discorre sobre a
situação de alguns setores, como o de meios de pagamentos,
ocupado no Brasil por empresas como a Cielo: "Normalmente,
quando a competição potencial se transforma em concorrência real,

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a luta pelas vendas provoca maior ou menor redução na elevada
margem de lucro anterior. As altas margens de lucro podem ser
comparadas a um pote de mel aberto de propriedade da companhia
numa fase próspera. O mel inevitavelmente atrairá um enxame de
insetos famintos, prontos para devorá-lo".

O livro aborda com bastante propriedade o desenvolvimento


tecnológico e a economia de escala, mas admite que outras
circunstâncias podem criar oportunidades para altas e sustentáveis
margens de lucro. “Um exemplo disso é uma empresa que cria nos
seus clientes o hábito de, quase que automaticamente, especificar a
renovação do pedido dos seus produtos, como uma maneira de
mantê-los. Para isso, deve-se construir uma reputação de qualidade
e confiabilidade para determinado produto, de modo que a
companhia dominante seja quase um sinônimo, no inconsciente
popular, de uma fonte principal de fornecimento”. (...) “Resumindo
a questão da terceira dimensão de um investimento realmente
conservador: é necessário não somente contar com a qualidade do
pessoal, discutida na segunda dimensão, mas também fazer com
que esse pessoal, ou os seus predecessores, direcionem a
companhia para áreas de atividade em que haja razões inerentes,
dentro da economia de um negócio específico, para que a
lucratividade acima da média não seja apenas uma situação de
curto prazo”.

4ª Dimensão: O preço de um Investimento Conservador. Nessa


dimensão, Fisher especificamente dá algumas dicas de como
identificar um patamar de preço atrativo: “A maioria dos
investidores, incluindo muitos profissionais que deveriam ter um
conhecimento melhor sobre o assunto, acaba se confundindo sobre
essa questão por não ter um entendimento claro sobre o que faz o
preço de determinada ação subir ou cair de forma significativa”.

Ele resume os erros mais comuns dos investidores: alguns


descobrem muito tardiamente ter comprado ações por preços altos
demais; outros vendem no momento errado e por motivos
equivocados ações que, mantidas, seriam lucrativas no longo prazo.

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Fisher chama de “bem-afortunados” os investidores que mantêm
ações no longo prazo, devido ao fenômeno responsável pela maior
compensação com relação ao risco envolvido: “Esse fenômeno é o
aumento substancial no preço que resulta do efeito combinado da
súbita melhoria dos rendimentos por ação individual e do
considerável aumento simultâneo na proporção de preço-
rendimento”.

Fisher também lista os tipos de investimento e a escala de riscos em


que se encaixam. No nível mais baixo está a empresa bem-
conceituada em relação às três primeiras dimensões, mas que, no
presente momento, é considerada menos adequada pela
comunidade financeira e, portanto, conta com uma proporção de
preço-rendimento menor em relação à garantia desses fatos
fundamentais”.

O mais alto grau de risco é veementemente salientado durante todo


o livro como o mais perigoso de todos: “empresas com uma imagem
ou avaliação, em determinado momento, por toda a comunidade
financeira, bem superior ao normalmente justificado pela situação
imediata”. Em outras palavras, fuja das empresas da moda.

Por fim, Fisher faz importantes anotações sobre os níveis de preços


de uma ação, concluindo que a análise deve se basear na junção de
três avaliações distintas: “avaliação corrente, realizada pela
comunidade financeira da atratividade das ações de mercado como
um todo; do setor industrial do qual uma empresa específica faz
parte; e, finalmente, da companhia em si”.

Ele considera importantes os movimentos do mercado, chamando-


os de “consenso atual da comunidade financeira”. As ações subirão
ou cairão de acordo com esse humor, segundo Fisher, mas com um
detalhe importante: sem levar em conta “o quão distante esse
consenso possa estar em relação ao que acontece no presente e ao
que pode advir do futuro”.

Em outras palavras, o mercado tende a antecipar o valor da


perpetuidade de um negócio no presente, sem se preocupar em

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quanto tempo o futuro se tornará uma realidade. A expectativa
acaba sendo, muitas vezes, mais importante do que os próprios
fatos. “O único teste verdadeiro para saber se as ações estão
‘baratas’ ou ‘caras’ não é o seu preço corrente em relação ao preço
anterior, não importa o quanto possamos ter nos acostumado a ele,
e sim se as bases estruturais da companhia são significativamente
mais ou menos favoráveis em relação à corrente avaliação da
comunidade financeira sobre aquelas ações”.

Não é incomum ver investidores mais experientes atribuindo


"preços reais" aos ativos que acompanham há algum tempo. Nós
mesmos fazemos isso e é inevitável não considerar a chamada
"memória de mercado". No entanto, é importante incorporar a
evolução da lucratividade da empresa e a forma como ela está
sendo avaliada pelo mercado em geral a essa percepção.

Resumindo, a quarta dimensão conclui que os níveis de preço, em


um determinado momento, são determinados pela avaliação
corrente da comunidade financeira em relação à empresa em
questão, ao setor industrial em que está inserida e, até certo ponto,
ao nível geral de preços dessas ações. Como o nível geral de preços
das ações afeta o quadro final como um todo, essa tarefa depende,
de certo modo, de estimativas corretas sobre mudanças futuras em
certos elementos meramente financeiros, dos quais as taxas de
juros são, sem sombra de dúvida, o fator mais importante.

LUIZ BARSI

Mesmo distantes geograficamente e em mercados com grandes desníveis


de maturidade (na década de 1970, o mercado de ações dos Estados
Unidos estava anos-luz à frente do Brasil), Luiz Barsi chegou a conclusões
semelhantes às de Graham e Fisher. Os pilares fundamentais de qualquer
estratégia de sucesso, independentemente de suas particularidades,
envolvem obrigatoriamente entender os seguintes aspectos:

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1. Os retornos dos mercados não são os mesmos retornos dos
indivíduos, principalmente pelo fator COMPORTAMENTO. A
maioria perderá dinheiro na renda variável. Controlar os instintos
mais primitivos de seguir a manada é um grande desafio (ainda mais
nos dias de hoje, diante da intensidade e da agilidade na geração e
no processamento de informações pelos agentes econômicos).

2. Mentalidade de longo prazo é condição imprescindível. Boa parte


do componente matemático responsável pelo retorno depende do
fator tempo. Vamos lembrar que a fórmula dos juros compostos é
FV = PV . (1+i) ^n, sendo:

FV = Valor futuro (em inglês, Future Value).

PV = Valor presente (em inglês, Present Value).

i = Taxa de juros (em inglês, Interest Rate).

N ou Nper = número de períodos (em inglês, Number of


periods).

3. A primeira tarefa, e a mais trabalhosa, é se debruçar sobre a


qualidade da empresa. Nesse aspecto, as particularidades se
acentuam a depender do objetivo e do perfil de cada investidor.
Algumas características são consensuais, como qualidade da gestão
(ou seja, pessoas); habilidade financeira e operacional (ou seja,
eficiência de custos e de processos); e, finalmente, a natureza
intrínseca dos negócios (ou seja, vantagens e desvantagens
puramente inerentes ao funcionamento de determinado setor).

4. E, por último, mas definitivamente não menos importante,


nenhuma empresa é tão boa a ponto de você negligenciar o preço
a pagar pelas ações. Nem toda empresa excelente será um

22
excelente investimento. Fundamentalmente, uma das poucas coisas
não corrigidas pelo longo prazo é pagar caro por algo.

Luiz Barsi e sua autobiografia

Podemos agora costurar as principais lições destes grandes investidores à


estratégia de Barsi. Algumas particularidades do seu estilo de investir
costumam gerar bastante polêmica, mas veremos que novamente há
muito embasamento teórico nos demais autores trazidos aqui.

Dividendo como premissa central


A primeira conclusão: o sucesso da metodologia previdenciária, ao
contrário do que muitos podem alegar, não está relacionado
exclusivamente ao pioneirismo de Barsi no mercado brasileiro. Como ele
mesmo gosta de dizer: “Eu não inventei a carteira previdenciária, apenas
demonstrei que ela era possível”. Toda a sua linha de raciocínio tem
embasamentos teóricos e empíricos extremamente sólidos e está alinhada
aos grandes autores citados até aqui.

23
Qual é então o diferencial de Barsi em relação aos demais?
Indiscutivelmente, o peso atribuído por ele à capacidade de distribuição
dos dividendos em sua tomada de decisão. Não somente porque o
objetivo final é a renda em detrimento da valorização do patrimônio, mas
sim porque uma empresa capaz de distribuir proventos sustentáveis tem
grandes probabilidades de ter uma geração de fluxo de caixa saudável e
duradoura.

Ora, todas as aulas de valuation deste MBA são, no final do dia e


independentemente da técnica utilizada, um exercício para chegar ao
valor justo de uma companhia através do fluxo de caixa por ela gerado.
Dividendo - quando perenes, claro - é uma métrica confiável de
capacidade de geração de caixa.

Além disso, a maioria das empresas brasileiras de capital aberto possui


controlador definido ou um acionista de referência. A remuneração deste
acionista principal será uma das metas de entrega desse tipo de empresa -
e, por tabela, os demais acionistas se beneficiarão. Esse foi o grande pulo
do gato que levou Barsi a analisar empresas pagadoras de dividendos e
cunhar uma frase já famosa hoje em dia: “prefiro ser um pequeno dono
de um grande negócio do que um grande dono de um pequeno negócio”.
Por isso, a estratégia foi apelidada por ele de “previdenciária”: Uma
empresa vale aquilo que ela remunera.

Uma empresa vale aquilo que ela remunera


Já deixamos bem claro o quanto o preço importa. Portanto, o investidor
que se deixa influenciar pela massa ou se preocupa sem razão com o
efeito de quedas de mercado sobre sua carteira transformando, de forma
perversa, sua vantagem básica em uma desvantagem básica.

Partindo do pressuposto de que não haja perda de fundamento, quando


cair o preço de uma ação incluída na sua carteira (ou candidata a isso), o
jacaré estará pronto para dar o bote. Outro momento interessante para os
aportes é a proximidade do anúncio de pagamento de dividendos. Essa é a
chamada estratégia de Dividendo Inteligente, possível graças à
previsibilidade das empresas com esse perfil em relação à política de
proventos.

24
As ações de crescimento estão proibidas então? NÃO! Mas novamente,
cumpra algumas metas previdenciárias antes de adentrar esse tipo de
investimento. Um bom investimento em uma empresa de crescimento vai
depender do seu preço, sempre. Sobre o assunto, Graham é enfático no
livro Investidor Inteligente: "O investidor inteligente se interessa por ações
de alto crescimento não quando elas são as mais populares, mas quando
algo dá errado". Raramente encontraremos uma excelente empresa a um
excelente preço se nada de errado estiver ocorrendo com ela. A tarefa é
descobrir se o problema é temporário, o que justificaria uma compra no
momento de queda no preço do ativo, ou se há uma perda grave de
fundamento.

Veremos mais adiante que Barsi utiliza o preço teto como um dos
parâmetros para selecionar empresas. Trata-se de uma métrica derivada
da equação de dividend yield, que nos fornece, ao invertermos algumas
variáveis, o valor máximo a pagar por um ativo dada uma rentabilidade
mínima desejada em dividendos. Para Barsi, portanto, uma ação valerá o
quanto ela poderá remunerar o acionista.

Além disso, é preciso considerar que o investimento previdenciário pode


servir para todos, mas algumas características fundamentais do
comportamento do investidor com esse perfil trazem uma performance
imbatível. É o que Graham chama de Investidor Empreendedor: “O traço
determinante é sua vontade de dedicar tempo e dar apuro à seleção de
títulos que sejam seguros e mais atraentes do que a média”. A esse tipo
de perfil faz total sentido uma estratégia de stock viking. Por outro lado, o
autor descreve o Investidor Defensivo: “procurará principalmente evitar
as perdas ou erros graves. Seu objetivo secundário será se livrar de
trabalho, aborrecimento e necessidade de tomar decisões com
frequência”. A esse perfil, um fundo passivo como um ETF poderia trazer
maiores benefícios.

Concentração versus diversificação


Outro tema importante é a porcentagem recomendável do patrimônio de
um investidor em ações. Graham recomenda: “nunca destine uma
porcentagem inferior a 25% ou superior a 75% de seus recursos às ações
ordinárias, com uma consequente proporção inversa em títulos”. Na nossa

25
opinião, esse peso é muito particular. Sugerimos que, antes de investir em
ações, você primeiro tenha uma reserva de emergência na renda fixa. O
dinheiro na Bolsa é aquele realmente destinado para investimento e que
não será necessário no curto prazo.

É possível ter uma carteira com 100% em ações? Sim, mas são raros os
investidores que reúnem as condições favoráveis para isso. Nesse quesito,
também concordamos com a recomendação de Graham: “para uma
minoria ínfima de investidores, uma carteira 100% em ações pode fazer
sentido. Você é um deles se: tem dinheiro suficiente para sustentar a
família durante pelo menos um ano; investirá consistentemente durante
pelo menos 20 anos; sobreviveu a um mercado de baixa; não vendeu
ações durante a baixa; comprou mais ações durante a baixa; implementou
um plano formal para controlar seu próprio comportamento de
investidor.”

No total, Barsi tem cerca de 40 ações em sua carteira, incluindo todas as


classes de ativos de uma mesma empresa (como UNIP3, UNIP5 e UNIP6).
Se desconsiderarmos as variações de tickers, a carteira é composta por 32
empresas, incluindo previdenciárias e de oportunidade. É uma boa
diversificação, mas devemos considerar que Barsi investe há 53 anos, o
que equivale à inclusão de menos de 1 empresa nova na carteira a cada
ano!

Para o investidor de longo prazo, a diversificação ocorre ao longo do


tempo, conforme as oportunidades de bons preços vão surgindo. No início
de sua trajetória, Barsi focou em adquirir muitas ações de poucas e boas
empresas, sendo sua meta principal a de ter 100 mil ações da CESP.

No livro O Investidor Inteligente, Benjamin Graham recomenda que uma


carteira tenha no mínimo 10 e no máximo 30 papéis. Concordamos com
essa recomendação, mas a formação dessa carteira deve ocorrer
gradualmente. Na estratégia previdenciária, a concentração no início é
fundamental, pois os dividendos são pagos em função do número de
ações possuídas.

Da posição de Barsi, gostaríamos de destacar as ações integrantes da


carteira previdenciária: AES Tietê, Klabin, Taesa, Unipar e Banco do Brasil.

26
Outras ações na carteira são Banco Santander, Eletrobrás, Transmissora
Paulista, Sabesp e Auren. A fortuna estimada varia conforme a flutuação
de mercado, mas gira em torno de R$ 4 bilhões.

O motivo: é extremamente difícil pensar em um investidor iniciante com


expertise ou maturidade suficiente para acompanhar diversos ativos ao
mesmo tempo. Com o tempo e a experiência, e por questões de
oportunidades no meio do caminho, o portfólio seria complementado
com outras empresas.

Segundo Graham, “as fortunas realmente grandes oriundas de ações


ordinárias foram feitas por pessoas que colocaram todo seu dinheiro em
um investimento que conheciam muito bem. Entretanto, quase nenhuma
fortuna pequena foi feita dessa forma, e poucas fortunas grandes foram
mantidas dessa maneira”. Reparem que a diversificação ocorre
naturalmente como forma de manutenção do patrimônio, não de criação.
O autor conclui: “O problema está em se sentir corajoso demais ou
tentado a aumentar esse retorno ao se desviar por outros caminhos”.

Não poderíamos concordar mais. Por diversas vezes vemos investidores se


perdendo, vendendo papéis da carteira previdenciária para comprar
outros papéis e alavancar. Você pode e deve ter papéis de boas
oportunidades em sua carteira para proporcionar um ganho, mas tudo
dependerá, dentre outros fatores, do momento e de quanto você
conseguirá aportar mensalmente.

Não se pode generalizar, mas com base em nossas próprias experiências, a


estratégia de concentração em alguns papéis deve ser prioridade até o
momento em que a renda mensal com dividendos seja satisfatória e esses
recursos possam ser aplicados em oportunidades sem atrapalhar o
objetivo previdenciário. As palavras de ordem são Prioridade, Disciplina e
Paciência (P.D.P).

Não é incomum vermos investidores pequenos aportando menos de R$


1.000 por mês, divididos em 10 papéis diferentes. Não fazemos assim. Em
nossa opinião, esse tipo de diversificação não tem muita eficácia. Afinal, o
dividendo é pago em função da quantidade de ações possuídas, e não
sobre o valor financeiro. Não temos nenhuma regra formal sobre o

27
assunto, mas talvez um bom parâmetro para evitar a pulverização seja
multiplicar por 3 o número de anos investindo – o resultado será a
quantidade máxima de papéis na carteira. Um investidor que, por
exemplo, esteja há 5 anos na Bolsa, poderia ter no máximo 15 ativos em
carteira.

Nunca delegue 100% dos seus investimentos para um gestor.


Eis outra citação do livro de Graham a respeito de uma premissa da
metodologia de carteira previdenciária: “O investidor inteligente não fará
suas compras e vendas com base apenas nas recomendações recebidas de
um serviço financeiro. Uma vez entendido esse ponto, o papel do serviço
financeiro de fornecer informações e sugestões torna-se útil”.

Muitos investidores, infelizmente, por falta de prática, insegurança ou até


preguiça, optam por terceirizar completamente a decisão sobre seus
investimentos para terceiros. Tornam-se dependentes e não usuários
desses serviços e só se recordam de verificar suas rentabilidades no
momento de declarar o Imposto de Renda.

Em nossa opinião, a ajuda de um profissional é imprescindível, justamente


para ser um interlocutor com quem o investidor possa exercitar o seu
senso crítico, solucionar dúvidas e obter materiais e conteúdo, mas nunca
como alguém a quem delegar as decisões. Em outras palavras, não
estamos falando para terceirizar a decisão de investimento, mas sim pedir
ajuda e aconselhamento. Para cada perfil de investidor, haverá um tipo de
profissional mais adequado, seja via assessoria, consultoria ou de maneira
independente, através da assinatura de carteiras recomendadas.

Barsi sempre foi um defensor ferrenho de que o investidor deve ser seu
próprio gestor, afinal, a estrutura de fundos costuma ser muito mais
vantajosa para o próprio fundo do que para o cotista. As taxas de
administração e performance, ao longo dos anos, vão corroendo a
rentabilidade.

Benjamin Graham também aborda o assunto: “O típico gestor de recursos


não tem escolha a não ser imitar todos os movimentos do Sr. Mercado.
Portanto, não há razão para que você não possa alcançar resultados tão

28
bons quanto os profissionais. O que você não pode fazer é ganhar dos
profissionais no jogo deles. Os profissionais não conseguem ganhar nem
em seu próprio jogo! Para isso, reconheça que investir com inteligência
envolve controlar o controlável. Você não pode controlar se as ações
superarão o mercado hoje ou amanhã. No curto prazo, o retorno é refém
do Sr. Mercado e de seus caprichos. No entanto, você pode controlar seus
custos de corretagem, custos de propriedade, suas expectativas, seus
riscos e seu próprio comportamento”.

Na literatura de Value Investing, não faltam nomes, inclusive de gestores,


defendendo que o investidor individual é capaz de obter retornos
satisfatórios seguindo uma trajetória independente. Exemplos desses
autores são Peter Lynch, autor do livro Batendo o Mercado, e John Bogle,
que escreveu O Investidor de Bom Senso.

Em mercados mais desenvolvidos, como o americano, faz muito mais


sentido para os investidores individuais aplicarem via ETFs, que inclusive
pagam dividendos. Quem sabe um dia teremos uma estrutura parecida,
com fundos passivos robustos e pagadores de dividendos? Por enquanto,
tributariamente compensa muito mais para o investidor com foco em
renda passiva no Brasil aplicar diretamente em ações como pessoa física
do que em ETFs, que não distribuem proventos (se o fizessem,
provavelmente seriam tributados).

Nunca siga uma dica


O último tema relevante ao qual o investidor deve prestar atenção:
cuidado com as dicas na era dos influenciadores digitais. A internet trouxe
enormes benefícios, mas as informações parecem estar cada vez mais
pobres em qualidade. Tomemos como exemplo uma dica perigosa
recentemente divulgada pelo YouTube: compre ações de empresas que
você conhece.

Ora, conhecer os produtos da Apple ou do Burger King não é motivo


suficiente para comprar ações dessas empresas. Essa frase perigosa muito
provavelmente foi distorcida dos pensamentos de Peter Lynch, um dos
maiores investidores americanos. Diz ele: “você pode se sair melhor que
os especialistas se utilizar sua vantagem ao investir em companhias ou

29
setores que você já compreende”. Não é uma regra totalmente
implausível, e centenas de investidores lucraram com ela ao longo dos
anos, mas é preciso aplicá-la completamente: “Encontrar uma companhia
promissora é apenas o primeiro passo. O próximo é pesquisar.” Para
Lynch, ninguém deveria investir em uma empresa, seja qual for a
qualidade de seus produtos, sem estudar seus balanços financeiros e
estimar seu valor comercial. Exatamente como propomos aqui no Jeito
Barsi de Investir.

AÇÕES GARANTEM O FUTURO


Até aqui, revisitamos os principais conceitos teóricos do JBI, trazendo os
principais expoentes da literatura internacional do Value Investing.
Guardadas as devidas proporções e particularidades, encontramos
diversas semelhanças entre Barsi, Graham, Philip Fisher, Peter Lynch,
Warren Buffett e outros.

Daqui em diante, nos concentraremos em compreender como usar a


sabedoria de todos esses grandes investidores para montar um portfólio
em que as ações garantam o seu futuro – obviamente, portanto, com um
viés voltado para a carteira previdenciária. Poderíamos começar pelo
passo a passo de como montar essa carteira, mas vale a pena abordar
primeiro o que NÃO fazer.

SETORES À PROVA DE BARSI

A bolsa no Brasil engloba um universo de mais de 400 empresas. Procurar


boas opções dentre elas seria como buscar uma agulha no palheiro. No
entanto, se invertermos a lógica em uma espécie de funil, sobram muito
menos opções para analisar. Ignorar as empresas de setores inadequados
às estratégias do JBI ajudará a poupar tempo.

Chamamos esses setores de “à prova de Barsi”: Aviação Civil, Construção


Civil, Frigoríficos, Varejo e Turismo e Lazer. Não são setores ruins. Eles

30
apenas têm características inerentes que não condizem com as premissas
da nossa estratégia:

• Aviação Civil: tente lembrar quantas empresas de transporte aéreo


já quebraram: Vasp, Varig, Transbrasil e, mais recentemente,
Avianca e Itapemirim. Trata-se de um setor em constante evolução
e crescimento e não há a menor possibilidade de retrocedermos
para uma era sem transporte aéreo. Esse tipo de empresa enfrenta
dificuldades específicas, como custos com combustíveis e
dolarização de boa parte das despesas, além de uma forte
dependência macroeconômica, com capital e mão de obra intensiva
e qualificada. As empresas aéreas são importantes e empregam
milhares de pessoas, mas sempre há quebras. Um dos
ensinamentos de Benjamin Graham é que o crescimento de um
setor não necessariamente se traduz em ganhos para os acionistas.

O investidor focado em renda a longo prazo não pode se dar ao luxo


de perder tempo com um tipo de empresa cujo histórico não indica
longevidade. Outro fator importantíssimo são as margens de lucro,
sem as quais não sobra nada no final do ano para investimento e
distribuição aos acionistas.

Aviões da Transbrasil abandonados


no Aeroporto de Brasília em 2008

31
• Varejo: é outro setor à prova de Barsi (em um sentido amplo, sem
entrar nas particularidades dos nichos de mercado). Novamente,
quantas grandes marcas do varejo desapareceram nos últimos 30
anos? Podemos citar Mappin, Casa Sopre, Mesbla, Ultralar, Clipper,
Eletro Radiobrás e, mais recentemente, Máquina de Vendas,
formada pela união entre as redes Insinuante e Ricardo Eletro. Essas
empresas costumam ter forte dependência macroeconômica e
margens extremamente apertadas. Outras características do setor
são as baixíssimas barreiras de entrada, a concorrência acirrada, a
pequena ou inexistente fidelidade do cliente à marca e a
sensibilidade da relação entre preço e demanda.

• Turismo e Lazer: Esse setor tem semelhanças com a Aviação e o


Varejo, como a incapacidade de produzir resultados consistentes, as
margens comprimidas, a necessidade de grande infraestrutura
operacional e a dependência de diversos fatores externos que
fogem ao controle da gestão (além de parte dos custos ser
dolarizada). No Brasil, tivemos o caso da Soletra, outrora a maior
operadora de viagens do país, que saiu do mercado no início dos
anos 2000 após acumular dívidas impagáveis.

• Frigoríficos e Construção Civil: Além de todos os fatores citados nos


setores à prova de Barsi vistos até aqui, acrescentamos também a
grande influência do preço das commodities sobre essas empresas,
tornando-as extremamente cíclicas. Embora os frigoríficos
constituam um setor bastante concentrado e com altas barreiras de
entrada, seus resultados historicamente oscilam de anos muito
bons para anos catastróficos (essas empresas podem passar longos
períodos sem distribuir dividendos). A construção civil, por sua vez,
também tem características bastante cíclicas. Além disso, depende
fortemente do comportamento da taxa de juros. Inúmeras
construtoras e incorporadoras de diversos portes faliram ou
passaram por processos de recuperação judicial. Podemos citar
Encol, PDG, Rossi, Esser, Grupo Schahin, sem contar as empreiteiras
ligadas à Operação Lava Jato, como Odebrecht, OAS, Camargo
Corrêa e Engevix, entre outras.

32
Em resumo, os setores à prova de Barsi são extremamente complexos,
expostos a inúmeros fatores incontroláveis e com margens insuficientes
para remunerar com constância o investidor interessado em dividendos.
Obviamente, você até poderá encontrar exceções no meio do caminho,
mas não vemos por que focar nesses setores se há outros muito mais
aderentes à metodologia de carteira previdenciária.

BESST

Das 400 empresas listadas em Bolsa no Brasil, praticamente a metade


seria excluída após um filtro inicial. A partir disso, podemos analisar as
características a buscar em uma companhia para integrar uma carteira
previdenciária. Se o objetivo é renda para o futuro, devemos procurar o
seguinte:

1. Resultados sólidos – ou seja, um histórico de números consistentes,


de preferência sem flutuações muito bruscas.

2. Consolidação no mercado – em outras palavras, empresas mais


maduras e com capacidade de repassar a inflação para os preços.

3. Perenidade do negócio – algo muito ligado à longevidade de seus


projetos.

4. Política de distribuição de proventos.

Em nossa experiência, essas características estão presentes nos setores


que formam o acrônimo BESST (Bancos, Energia, Seguros, Saneamento e
Telecom), cujas empresas prestam serviços essenciais, e o cliente
praticamente não tem poder de barganha diante de ajustes de preço. São
altas as barreiras de entrada e generosas as margens de operação.

33
Fachada da B3, em São Paulo.

Obviamente, não são setores indestrutíveis. Em 2013, por exemplo, a MP


579 assombrou as empresas de energia – o “E” do acrônimo – ao tentar
baixar as tarifas da conta de luz, além de alterar as regras do jogo para as
concessões em hidrelétricas. Mesmo assim, a grande maioria das
empresas resistiu, em boa parte amparada pela solidez jurídica
proporcionada pelos contratos de longo prazo e pela essencialidade do
seu serviço.

O setor energético é subdividido em quatro segmentos: Geração,


Transmissão, Distribuição e Comercialização. Distribuição e
comercialização são atividades um pouco mais complexas, estão sujeitas à
inadimplência do cliente e possuem altos custos de manutenção e
operação, sendo difícil encontrar empresas atuando exclusivamente
nesses dois segmentos.

Empresas mais focadas em geração, transmissão ou até mesmo


verticalizadas em mais de um segmento geralmente possuem contratos de
longuíssimo prazo, atrelados à correção de um índice inflacionário.

34
Dependem pouco ou nada do cliente final e precisam se preocupar
basicamente com a disponibilidade do sistema. Por essas características,
seu fluxo de caixa tem uma previsibilidade ímpar e, consequentemente,
são boas pagadoras de proventos.

Vejamos agora os bancos (“B”). Essas instituições basicamente ganham


dinheiro com serviços bancários e empréstimos, repassando os custos de
captação para os clientes. As margens são elevadas, mas sempre é preciso
observar a qualidade da carteira de crédito e a inadimplência.

O “S” de seguros representa um negócio bom demais. O produto


comercializado é a confiança, a segurança sobre o uso de algum bem ou
direito - aqueles que pagam pelo serviço, portanto, rezam para não
precisar usufruir do benefício proporcionado pelas seguradoras. Por
captar os recursos antecipadamente, antes de saber se haverá ou não o
desembolso, essas empresas trabalham como se fossem grandes
tesourarias, beneficiando-se de taxas de juros elevadas.

Já o “S” de saneamento básico funciona sob o modelo de concessão ou de


parcerias público-privadas, com reajustes anuais no contrato de acordo
com a inflação, além de revisões tarifárias a cada quatro anos. É um
segmento ainda muito carente de investimentos e em fase de
consolidação após o novo Marco do Saneamento.

Por fim, temos o “T” de telecomunicações. Assim como os demais, é um


setor de margens bastante generosas, extremamente concentrado e com
barreiras de entrada elevadas, principalmente pelos altos investimentos
necessários em infraestrutura. Por outro lado, a comunicação tem se
tornado uma necessidade cada vez mais básica, mostrando que essas
empresas se adaptaram bem à evolução tecnológica.

Considerando apenas os setores do BESST, reduzimos o número de


empresas na nossa mira para pouco menos de 100 opções. Claro, não
basta fechar os olhos e comprar qualquer ação apenas por ser o papel de
um banco, de uma companhia de energia, de saneamento, de
telecomunicações ou uma seguradora. Daqui em diante, a avaliação do
investidor precisa passar por ajustes finos e pela adequação ao perfil de
cada um. Barsi, por exemplo, prefere empresas de controle definido, o

35
que pode não ser uma prioridade para outros. Gostamos também de
investigar a fundo a reputação e experiência dos gestores, o que implica
uma avaliação muito subjetiva.

POLÍTICA DE DIVIDENDOS

O debate a respeito da importância dos dividendos no comportamento do


investidor existe há bastante tempo. Na década de 1960, os prestigiados
economistas Franco Modigliani e Merton Miller, considerados os pais da
teoria moderna das finanças, publicaram o livro The Dividendo Irrelevance
Theory (A Teoria da Irrelevância do Dividendo, numa tradução livre). Sua
hipótese: o dividendo simplesmente não afeta os preços das ações, o
comportamento dos investidores e, portanto, a estrutura de capital de
uma empresa.

Essa teoria considera, no entanto, que a negociação ocorre em um cenário


de perfeito equilíbrio dos mercados, sem impostos, custos de agência e
assimetria informacional. Nesse mundo perfeito de Modigliani e Miller, os
investidores pouco se importam com os dividendos. Um provento acima
do esperado seria reinvestido. Uma remuneração abaixo da expectativa
levaria o investidor a simplesmente vender suas ações para cobrir o
montante residual, replicando o fluxo de caixa que seria proveniente dos
dividendos. "Os investidores são indiferentes à política de dividendos de
uma companhia porque eles podem criar seus próprios fluxos de caixa
vendendo a ação", disseram Modigliani e Miller.

Na teoria, pode até fazer sentido. Na prática, porém, o mercado não é


eficiente e está à mercê dos ruídos e das percepções distintas. O imposto
é uma certeza, assim como a assimetria informacional e o conflito de
agência. Depois do anúncio de um gordo dividendo, é comum ver
investidores se perguntando por que não compraram determinada ação.

Uma frase do investidor brasileiro Décio Bazin sintetiza muito bem o


sentimento sobre os dividendos: “Nas noites escuras, todos os que
aplicam na Bolsa buscam os dividendos como farol para se orientarem.
Mas quem precisa de farol quando o sol aparece?” Geralmente, a

36
estratégia de dividendos só é incentivada em momentos de instabilidade
dos mercados, afinal funcionam como um porto seguro.

Seja sincero: em períodos de grandes quedas, qual empresa você venderia


primeiro? A que representa uma oportunidade, cuja promessa é talvez dar
certo um dia, ou aquela que provavelmente continuará distribuindo
dividendos em épocas de turbulência? Essa é a premissa básica de uma
escola de pensamento contraposta à de Modigliani e Miller. Ela também
surgiu na década de 1960, quando os economistas Myron Gordon e John
Lintner criaram a chamada Teoria do Pássaro na Mão. Para eles, o
acionista está disposto a selecionar empresas boas pagadoras de
dividendos, pois o crescimento e lucro futuro são incertos, enquanto o
lucro presente pode ser antecipado.

Usamos esse mesmo paralelo para rebater o argumento de que o


dividendo é irrelevante por ser descontado do valor da ação. Claro, é um
ajuste necessário, afinal, saíram recursos do CNPJ para os sócios e isso
precisa ser expurgado do preço.

Não significa, porém, que os recursos simplesmente tenham saído de um


bolso para outro, mas sim que houve uma antecipação de um lucro já
materializado. O provento ajusta a cotação e, do mesmo modo, sai do
preço médio gerencial. Na prática, o investidor abate o seu custo total de
aquisição! Os proventos recebidos antecipadamente, portanto, reduzem a
percepção de incerteza, elevando o valor intrínseco da companhia ao
reduzir o custo de capital próprio exigido.

Gordon e Lintner não foram os únicos defensores dos dividendos. Nos


livros Security Analysis e O Investidor Inteligente, Benjamin Graham
argumenta que a teoria da irrelevância ignora alguns fatores práticos e
psicológicos do investidor. Um deles é o chamado efeito clientela (Luiz
Barsi o chama de "ser parceiro"). Empresas que distribuem proventos com
frequência ao longo dos anos constroem uma base fiel de acionistas,
diminuindo as oscilações bruscas na cotação e reduzindo a percepção de
risco dos ativos.

Analisar a política de distribuição de dividendos é um pilar fundamental


para selecionar as ações de uma carteira previdenciária. Se a companhia

37
não remunera adequadamente seu acionista, a estratégia de renda cai por
terra.

Existem dois tipos de empresas que não pagam dividendos: as que não
querem e as que não podem. O primeiro caso muitas vezes é
compreensível. Até mesmo boas pagadoras de dividendos passam por
turbulências ou períodos de maior investimento ou desalavancagem. Mas
se o fundamento estiver mantido e a pausa nas distribuições for
circunstancial, ainda estarão preservados os motivos pelos quais esta ação
entrou na carteira. É recomendável, no entanto, passar longe das
companhias que não PODEM pagar dividendos, como aquelas em fase de
crescimento ou com margens tão estreitas que os investimentos e o capex
corroem todo o fluxo de caixa.

É um bom momento para esclarecer uma dúvida frequente. As empresas


não seriam obrigadas pela Lei 6.404/76, mais conhecida como Lei das S.A,
a distribuírem o dividendo mínimo e obrigatório de 25%? Existe aqui uma
questão interpretativa a ser observada. A lei de fato preconiza a
obrigatoriedade do dividendo, mas o Estatuto Social de uma companhia é
sua Carta Magna, e valerá o que nele estiver determinado.

Um exemplo é o do Magazine Luiza. O artigo 34 do Estatuto Social da


empresa determina o pagamento mínimo de 15% do lucro líquido do
exercício, podendo o Conselho de Administração deliberar a distribuição
de dividendos intermediários ou de Juros Sobre o Capital Próprio (JCP).
Perceba que o percentual estabelecido é menor do que o da Lei das S.A.

Outra empresa que recentemente surpreendeu Barsi em uma de suas


pesquisas foi a OceanPact. A Cláusula 44 do Estatuto Social, parágrafo 2º,
determina que o dividendo mínimo obrigatório é de 0,1% do lucro líquido
ajustado. Isso prova que o Estatuto é soberano, podendo ser alterado
mediante expressa autorização da Assembleia Geral de Acionistas.

Essa observação é de extrema importância. O Estatuto delimita um


mínimo, mas o valor distribuído pode ser maior. Muitas empresas
determinam ao Conselho de Administração, com aprovação posterior da
Assembleia, decidir sobre a distribuição dividendos acima do mínimo,
baseando-se nos balancetes semestrais, trimestrais ou mensais.

38
Justamente por isso, é de extrema importância ler e compreender como
as empresas remuneram seus acionistas.

No Estatuto Social encontramos não só o payout, que é a parcela do lucro


ajustado a ser distribuída, mas também outros elementos importantes:

• Os gatilhos que permitem distribuições extras às obrigatórias.

• A forma de pagamento, que pode ser em dividendos ou JCP.

• O período de apuração, anúncio e pagamento.

• O direito das respectivas classes de ações, se houver, como ON, PN,


PNA ou PNB.

• A base de cálculo dos proventos.

Em muitos casos, as regras são tão específicas que a empresa opta por
manter um estatuto simples e deixar a definição das diretrizes e condutas
para a política de remuneração ao acionista. Na falta deste documento, o
estatuto permanece como o guia principal.

Antes de explorarmos algumas das principais políticas de proventos do


mercado, é importante conhecer os diferentes tipos de dividendos. Os
mais comuns são: regular, intermediário, intercalar, complementar e
extraordinário.

• Dividendo regular: como o nome sugere, é o mesmo que o mínimo


obrigatório, definido previamente. Pode ser pago na periodicidade
determinada pela empresa (mensal, trimestral, semestral ou anual)
e refere-se ao exercício corrente.

• Dividendos intercalares e intermediários: são apurados de acordo


com os balancetes, geralmente trimestrais ou semestrais. A
principal diferença entre os dois é que o intercalar se refere aos
balancetes levantados no curso do próprio exercício, dispensando a

39
aprovação dos acionistas, enquanto os dividendos intermediários
são pagos tendo como referência os resultados de exercícios
anteriores (ou seja, que já passaram pelo rito da Assembleia).

• Dividendo complementar: geralmente depende de um ou mais


indicadores definidos pela empresa. São distribuídos de forma a
complementar a remuneração do acionista de acordo com métricas
que variam entre alavancagem, endividamento, solvência,
necessidade de capex e exigências regulatórias.

• Dividendo extraordinário: tem, de fato, um caráter de exceção e


costuma ser mais discricionário por parte do Conselho de
Administração. Esse tipo de provento é muito difícil de prever, pois
depende de diversos fatores estratégicos definidos pela governança
e, principalmente, do acúmulo das reservas de lucros passados,
geralmente a base para essa distribuição.

Para ilustrar os gatilhos que permitem distribuições extras, tomamos


como exemplo a Política de Dividendos da Copasa (Companhia de
Saneamento de Minas Gerais). Segundo o documento, até 31 de março de
cada ano, o Conselho de Administração deverá definir o payout regular do
exercício, observando o intervalo mínimo do dividendo obrigatório de 25%
e o limite máximo de 50%. Adicionalmente, em todo segundo trimestre do
exercício, a Administração divulgará o "Cálculo do Enquadramento
Regulatório", que é o múltiplo de Dívida Líquida corrente dividido pelo
EBITDA acumulado nos 12 meses anteriores. Se o múltiplo de
alavancagem estiver acima do intervalo de 2,1, o percentual de
distribuição será o mínimo obrigatório. Caso esteja dentro do intervalo, a
remuneração obedecerá a banda entre 25% e 50%. Caso esteja abaixo, ou
seja, em situação confortável e respeitada a saúde financeira e o plano de
investimento da empresa, a distribuição poderá ser maior.

A companhia prevê também o pagamento de dividendos extraordinários.


A última vez que isso ocorreu foi no exercício de 2020, quando o Conselho
recomendou a distribuição de R$ 820 milhões em dividendos
extraordinários, o equivalente a mais de 100% do lucro líquido. Isso só foi

40
possível com a utilização de parte do saldo acumulado até o exercício
anterior na Conta de Reservas de Retenção de Lucros.

Em casos assim, a distribuição dos dividendos se torna muito mais


discricionária do que o comum, por depender de avaliações esporádicas
dos órgãos de Governança. Essa prática é comum em empresas estatais
ou de capital misto, pois confere ao Conselho uma certa flexibilidade nas
distribuições. Pode ser benéfico se a estrutura de governança estabelecida
for confiável.

Na Petrobras, por exemplo, a política de remuneração ao acionista


embasou a antecipação de R$ 47 bilhões em dividendos ao final de 2022.
O Estatuto, aprovado em Assembleia, fala apenas em distribuição mínima
de 25%, enquanto a política, aprovada pelo Conselho de Administração,
estabelece uma série de regras, entre as quais:

1) Uma remuneração mínima anual de US$ 4 bilhões para exercícios


em que o preço médio do Brent for superior a US$ 40/bbl
(independente do endividamento).

2) Distribuição intercalar de 60% da diferença entre o fluxo de caixa


operacional e os investimentos, caso a dívida bruta seja igual ou
inferior a US$ 65 bilhões e tenha resultado positivo acumulado.

3) Pagamento de dividendos extraordinários superiores ao mínimo


obrigatório e aos demais quesitos acima, independentemente de
seu nível de endividamento, observada a sustentabilidade
financeira da Companhia.

Tais critérios, embora mais flexíveis, não ferem o Estatuto e, portanto,


foram considerados legais pelo Tribunal de Contas da União, quando
houve a tentativa de barrar as distribuições aos acionistas. No caso da
Petrobras, observando o plano de investimento e a saúde financeira, a
distribuição de todo o excedente de caixa faz sentido quando avaliamos o
histórico recente de corrupção e desvio de recursos. Com o dividendo na

41
mão do acionista, inclusive da própria União, cada um pode definir o seu
destino com mais transparência.

Para ilustrar a forma e o período de apuração, tomamos como exemplo a


Política de Remuneração ao Acionista do Banco do Brasil. O Estatuto do
banco, em seu Artigo 49, estabelece uma distribuição semestral mínima
de 25% sobre o lucro líquido ajustado, permitindo o anúncio de
dividendos intermediários.

No entanto, respeitando a política, o Conselho de Administração define


todo início de ano o payout vigente do exercício, respeitando os
indicadores de saúde financeira, o Plano de Capital, a Declaração de
Apetite e Tolerância a Riscos, e as perspectivas dos mercados de atuação,
entre outros aspectos. Em 2023, o banco foi além e, a exemplo do que
outras empresas do setor já praticam, anunciou em fato relevante não só
o payout, mas também as datas de anúncio, datacom, dataex e data de
pagamento.

Isso proporciona total transparência e previsibilidade ao acionista para


programar seus aportes e reinvestimentos de acordo com o cronograma
estabelecido. Como o banco fornece guidance (uma projeção de
resultados), fica fácil para acionistas, analistas e outros players de
mercado calcular suas próprias remunerações.

A forma de pagamento é mais vaga - pode ser em dividendos ou JCP.


Olhando o histórico recente, os pagamentos antecipados têm sido em
dividendos, enquanto os complementares vêm sendo realizados sob a
forma de Juros sobre capital próprio. O BB é uma das poucas empresas
que corrige monetariamente o provento do acionista desde o momento
do anúncio até o seu pagamento.

A distinção dos direitos dos detentores das diferentes classes de ações é


válida apenas para empresas fora do Novo Mercado, que possuem outras
classes de ativos além das ações ordinárias (ON). O Bradesco, por
exemplo, distingue os direitos dos detentores de ON e PN. Aos
preferencialistas é atribuído um dividendo 10% superior às ações
ordinárias. Esse pormenor é importante, pois vai pautar a sua decisão
sobre qual ticker escolher na hora de investir.

42
Nossa preferência tem pendido cada vez mais para as classes de ativos
mais líquidos, porque há mais demanda por aluguel e a possibilidade do
uso das opções para realizar o dividendo sintético. No caso do Bradesco,
ambos os tickers têm liquidez aceitável, e a decisão nesse caso deve ser
pautada pelo custo-benefício. A que estiver mais barata e pagando melhor
deve ser incluída na carteira.

Outro direito dos acionistas sobre o qual o Estatuto não deve ser omisso é
o tag along, um mecanismo de defesa que garante aos minoritários o
direito de vender suas participações em caso de troca de controle. Um tag
along de 100% significa que, caso o controle da companhia seja vendido,
os pequenos investidores têm direito de receber pelas ações o mesmo
valor pago aos controladores. No caso do Bradesco, esse direito é de 80%
para ambas as classes. Na Transmissora Paulista, o tag along é de 0% nas
preferenciais e de 80% nas ordinárias.

Por fim, chegamos ao último aspecto importante de uma política de


dividendos: a base de cálculo dos proventos. Nos últimos anos, os grandes
destaques entre as pagadoras de dividendos foram as exportadoras de
commodities. É comum que essas empresas deixem de pagar proventos
em momentos em que os preços internacionais não estejam tão
favoráveis, dada a natureza mais volátil dos lucros, afetados
principalmente por questões cambiais. Algumas exportadoras, no entanto,
mesmo em um cenário mais pessimista, continuam gerando fluxo de caixa
bastante positivo e, em tese, poderiam distribuir dividendos sem gerar
prejuízos.

Como equacionar essa questão? Ora, respeitando a Lei das S.A. de


pagamento mínimo obrigatório em relação aos lucros, mas estabelecendo
outros parâmetros mais operacionais para embasar a distribuição. É o
caso da Klabin, que utiliza o mínimo obrigatório de 25%, mas cujo objetivo
é propor dividendos em um percentual alvo de 15% a 25% do Ebitda
ajustado. Isso garante maior previsibilidade e previne que um trimestre
atípico afete a remuneração dos acionistas.

Outro caso emblemático é o da Vale, cuja política de remuneração utiliza


o critério de distribuir 30% do Ebitda ajustado menos os investimentos
correntes apurados nas demonstrações do semestre. A empresa leva em

43
consideração o primeiro semestre para os proventos distribuídos em
setembro e o segundo semestre para a parcela dos proventos de março.

Fica claro que não se pode subestimar a importância de conhecer os


direitos dos acionistas, principalmente quanto à remuneração. Afinal, o os
boletos do investidor no futuro serão pagos com a renda gerada pelo
patrimônio acumulado.

Nenhuma estratégia no mundo, no entanto, é indestrutível. Como


Benjamin Graham disse de forma muito adequada, as pessoas cometem
erros ao longo do processo e na metodologia previdenciária não é
diferente. Desconfie de quem conta apenas suas glórias e não compartilha
nada a respeito dos fracassos.

Um dos erros frequentemente cometido pelos investidores


previdenciários é tomar a decisão de investimento baseado apenas no
dividend yield, principal indicador para quem acompanha as métricas de
proventos. Trataremos dele com mais profundidade nos próximos
capítulos, mas basicamente o dividend yield consiste na divisão do
dividendo distribuído por ação nos 12 meses anteriores pelo preço atual
da ação.

Para decidir um investimento na Bolsa não basta fazer um ranking das


maiores pagadoras de dividendos a cada ano. Se fosse simples assim,
todos seriam milionários. Muitos fatores podem levar uma empresa a
pagar ou não dividendos, e justamente aqui mora o perigo. Empresas que
distribuem proventos esporadicamente ou que estejam passando por
algum problema de governança podem figurar nessa lista e levar o
investidor a cometer erros. O que buscamos são as companhias que
pagam dividendos de modo consistente e perene.

Todo investidor está sujeito a cometer erros. Até mesmo Luiz Barsi. Em
2012, a Oi anunciou um ambicioso plano estratégico para crescer e fazer
frente às suas concorrentes. A empresa, fruto da fusão da Brasil Telecom e
da Telemar, era a grande aposta do Governo Federal para se tornar uma
“super tele”, como parte de uma estratégia de estimular a formação de
um grupo de grandes companhias que passaram a ser conhecidas como as
“campeãs nacionais”.

44
A euforia do mercado tinha uma razão: os números apresentados pela Oi
eram da casa dos 10 dígitos! Estavam previstos investimentos de mais de
R$ 24 bilhões até 2015, inclusive com o pagamento de impressionantes R$
8 bilhões em dividendos. Na época dessa discussão, a companhia aprovou
em assembleia o pagamento de R$ 2 bilhões em proventos, levando todos
a crer que a promessa de proventos bilionários seria cumprida até o
último centavo.

Barsi não pensou duas vezes e estudou a companhia. A Oi parecia sólida e


em um setor tido como perene. Estava aparentemente descontada em
relação aos seus pares e tinha uma meta ambiciosa que, tudo indicava,
poderia ser cumprida. Ele montou uma pequena posição, como é do seu
feitio.

O tempo foi passando e os resultados começaram a não aparecer na


velocidade prometida. O mercado questionava a empresa, mas engolia
algumas desculpas dadas pela diretoria. Pois bem, no final de 2013, Barsi
já não estava tão convencido de que a Oi conseguiria pagar os R$ 8 bilhões
em proventos. Ele havia se iludido pela promessa de um dividendo
gigantesco que não seria cumprido. Era hora de vender e assumir o
prejuízo.

Nesse momento, outro erro poderia ser cometido pelos investidores que
buscam renda: a ilusão proporcionada por um dividend yield altíssimo.
Ocorre que o yield é calculado sobre os dividendos dos 12 meses
anteriores, enquanto o preço é corrente, rapidamente corrigido pela
expectativa do mercado. Se o numerador se mantém e o denominador
cai, o yield aumenta. Isso ocorre não pelo crescimento do dividendo, mas
pela queda do preço – e no caso da Oi não se configurava uma
oportunidade para comprar, pois o recuo das cotações se devia a
problemas de gestão e governança.

Quem comprou a ação da Oi em 2013 animado pelo dividend yield de


2012 viu esse indicador virar pó no ano seguinte. A empresa não pagou
mais proventos. É importante, portanto, não apenas calcular o yield, mas
interpretá-lo corretamente.

45
OUTROS TIPOS DE REMUNERAÇÃO DO ACIONISTA

Nem só de dividendos vive o acionista. Ao longo desta disciplina,


abordamos outras formas de remunerar os sócios de empresas. Os Juros
Sobre Capital Próprio (JCP ou JSCP) aparecem de modo recorrente.
Diferentemente do dividendo, esse provento é tratado contabilmente
como despesa, deduzida da base de cálculo dos tributos.

Trata-se de um tipo de provento criado no Brasil em 1995, quando a Lei


9.249 pôs fim à correção monetária nos balanços e criou uma forma de
recompensar os acionistas através do patrimônio líquido das empresas.
Para as companhias, por outro lado, isso servia, em tese, como estímulo
para o investimento.

O cálculo do JCP leva em consideração a taxa de juros de longo prazo


(TJLP), definida trimestralmente pelo Banco Central. O cálculo é realizado
pro rata die, ou seja, proporcional, tornando possível a distribuição desse
provento em janelas trimestrais ou semestrais do balanço.

Os juros são calculados com base no valor do patrimônio líquido,


considerando apenas algumas contas do PL:

(1) capital social.

(2) reservas de capital.

(3) reservas de lucro.

(4) ações em tesouraria.

(5) prejuízos acumulados.

Sobre o montante dessas contas, é aplicada a TJLP, que precisa respeitar o


maior dos seguintes limites:

46
(a) até 50% do lucro líquido do período vigente (antes da dedução
dos juros).

(b) 50% dos lucros acumulados e reservas de lucros de períodos


anteriores.

Para usufruir da dedução, a empresa precisa anunciar o pagamento dos


JCP dentro do exercício. Por isso, muitas empresas, cujo balanço auditado
costuma ser publicado apenas a partir de fevereiro, antecipam os
proventos do quarto trimestre para novembro ou dezembro.

Outra forma menos usual de remunerar os sócios é através das


bonificações. Funciona assim: além de dividendos e de JCP, os lucros
acumulados no patrimônio líquido podem ser integralizados ao capital
social e entregues ao acionista sob a forma de novas ações emitidas.

Contabilmente, trata-se de uma transferência de recursos da linha de


reserva de lucros para a de capital social. A empresa emite novas ações
proporcionalmente a essa transferência e as entrega aos acionistas de
acordo com a posição de cada um. Se uma empresa possui 1 milhão de
ações em circulação e pretende bonificar seus acionistas com 10%,
precisará emitir 100 mil novas ações. Nesse caso, um investidor que
detenha 100 ações ganhará outras 10. O acionista que possuir 5.000 ações
receberá outras 500. Como nenhum deles desembolsou um centavo
sequer para aumentar sua posição, o preço médio de aquisição cai e o
dividendo distribuído vai aumentar. É preciso ficar atento se a bonificação
possui valor nominal. Caso positivo, constará no anúncio da bonificação o
preço para efeito de contabilização do imposto de renda.

Recapitulando: para qualquer empresa, existem poucas opções viáveis de


destinação dos lucros, todas com o objetivo de maximizar o valor para os
acionistas. Por ordem de prioridade, os recursos serão direcionados
primeiramente para reservas legais e estatutárias, e a partir de então
poderão ser distribuídos ou retidos. A distribuição poderá ser feita por
meio do pagamento de JCP ou de dividendos. Caso a opção seja a
retenção, os lucros poderão ser reinvestidos em novos projetos, usados

47
para fortalecer o capital de giro ou até mesmo para adquirir outra
empresa. Mas e se a melhor oportunidade do momento forem suas
próprias ações?

Sim, isso é possível: recomprar as próprias ações no mercado é outra


forma indireta de remuneração. Chamada também de buyback, a
recompra de ações, como o nome sugere, é uma operação em que uma
empresa compra as ações de sua própria emissão, negociadas no pregão.
As ações recompradas saem de circulação e passam a integrar a conta de
ações em tesouraria.

As ações em tesouraria não têm direito a proventos. No momento da


distribuição dos lucros, portanto, o dividendo por ação tende a ser maior,
ainda que o acionista não tenha aumentado sua participação ou a
empresa não tenha lucrado mais no período.

A tabela a seguir mostra como funciona a dinâmica da recompra de ações.


Suponha uma empresa com lucro líquido de R$ 10.000 e 1.000 ações
emitidas em circulação, com payout de 25%. Um investidor que tenha
comprado 100 ações receberia então R$ 2,50 por ação todos os anos, ou
seja, um total de R$ 250.

No ano seguinte, a empresa decide recomprar 10% das ações em


circulação. O lucro se mantém o mesmo – 10.000 reais –, mas agora ele é
repartido em 900 ações no total. Mantido o payout, o dividendo por ação
agora seria de 2,77 reais, beneficiando aquele mesmo acionista detentor
de 100 ações com 277 reais por ano.

SEM RECOMPRA COM RECOMPRA DE 10%


Lucro Líquido R$ 10.000 R$ 10.000

No de ações no mercado 1.000 900

Payout 25% 25%

Dividendo por ação R$ 2,50 R$ 2,77

Qtd. de ações na carteira 100 100

Valor total do dividendo recebido R$ 250 R$ 277

48
Veja que o investidor não realizou nenhum aporte, mas receberá um valor
maior. Outra grande vantagem: não é necessário fazer nenhum ajuste na
declaração de imposto de renda, porque o lucro simplesmente será
dividido por um número menor de ações em circulação.

Um programa de recompra de ações somente faz sentido nas seguintes


condições: (1) se a empresa tiver caixa sobrando; (2) se o preço de
mercado for considerado descontado em relação às perspectivas de longo
prazo. Em outras palavras, a recompra sinaliza ao mercado que a empresa
está barata. Prova disso foi o boom de 2020, no auge da crise pandêmica,
quando mais de 70 desses programas foram anunciados – o maior número
desde 1998.

As empresas precisam seguir algumas regras. Primeiro, o Conselho de


Administração precisa autorizar a recompra. Depois, o programa deve ser
protocolado no órgão responsável pela fiscalização do mercado, a CVM.
Após a aprovação, a empresa tem a obrigação de divulgar as condições do
buyback, geralmente com a data de início e fim, classe e quantidade de
ativos, não excedendo 10% das ações em circulação, destinação das ações
recompradas e a corretora ou banco intermediador.

A empresa tem até 12 meses para completar o seu plano, mas sem a
obrigação efetiva de comprar as ações. Caso o preço suba, por exemplo,
poderá optar por não realizar novas compras. Justamente por isso, é
extremamente importante para o investidor acompanhar quantas ações
foram efetivamente para a tesouraria e qual o seu destino. Elas poderão
ser simplesmente canceladas ou alienadas quando a administração julgar
lucrativo.

Agora que você já sabe todas as formas de obter renda com ações, vamos
para a sua carteira no JBI.

O JEITO BARSI DE INVESTIR (JBI)


Os critérios quantitativos ficaram por último por uma boa razão.
Queríamos deixar claro que a primeira tarefa, e talvez a mais demorada,

49
seja conhecer as características qualitativas das empresas filtradas. Uma
diligência básica no Estatuto, na política de proventos, nos históricos dos
resultados ou na gestão da companhia pode poupar o trabalho de analisar
os números de uma empresa que nem sequer passaria nos seus crivos
pessoais.

Muitos investidores manifestam, por exemplo, certo desconforto em


relação às empresas que não oferecem tag along. Mesmo que seja um
ativo barato, dificilmente se sentiriam confortáveis em mantê-lo por um
longo período na carteira.

É importante compreender que, antes de QUALQUER análise quantitativa,


o investidor deve saber explicar o que a empresa faz, qual sua atividade,
produtos e aplicabilidade. Não adianta olhar os números se você não
entende o efeito prático das variações deles.

Justamente por isso, a análise das demonstrações contábeis é altamente


subjetiva e sujeita a uma série de limitações. Nesta aula, vamos relembrar
algumas dicas e preceitos básicos de contabilidade (disciplina estudada
em um dos módulos anteriores deste MBA) para que você possa entender
o cálculo que apresentaremos sobre o preço-teto mais adiante.

CRITÉRIOS QUANTITATIVOS

O ponto de partida para a leitura de um balanço é a opinião de quem viu a


empresa por dentro: o Relatório dos Auditores Independentes. Não é
possível iniciar a análise sem verificar este relatório. O objetivo é constatar
se a auditoria externa identificou alguma inconsistência, além de apontar
os principais assuntos de auditoria, ou seja, os temas mais relevantes e
discutidos durante os trabalhos.

Recomendamos fortemente que vocês analisem as demonstrações


financeiras e suas notas explicativas, a fim de verificar se há algo que
chama mais atenção. Essa fase é para fazer uma avaliação inicial sobre a
situação da empresa. A atitude mais útil para conseguir extrair alguma
informação das demonstrações contábeis é a leitura diligente de seu
conteúdo.

50
É possível tirar uma série de conclusões apenas "olhando" os
demonstrativos, sem precisar fazer uma única conta sequer. Uma dessas
técnicas chama-se Análise Horizontal e Vertical, na maioria das vezes já
apresentada nas tabelas de resultado.

A análise horizontal consiste na comparação entre os valores de uma


mesma conta ou grupo de contas em diferentes exercícios sociais.

Você está fazendo uma análise horizontal quando compara o lucro deste
ano com o do ano anterior, por exemplo. O analista pode calcular as
variações percentuais em relação ao ano imediatamente anterior ou em
relação a um ano fixo para efeitos de comparação.

Já a análise vertical simplesmente relativiza as contas de um mesmo


exercício social. Pode ser empregada para comparar empresas do mesmo
setor a fim de entender a estrutura de investimento em ativos, passivos e
a composição do resultado do período. Ao analisar a margem bruta na
DRE, você está fazendo uma análise vertical (dividindo o lucro bruto pela
receita e comparando duas contas de um mesmo exercício).

Os cálculos em si são divisões básicas e bastante simples. O mais


importante é tentar compreender os principais motivos das variações nas
contas analisadas. Além disso, como a análise vertical relativiza o
tamanho, é possível comparar empresas do mesmo setor. A simples
utilização dessa técnica pode responder a algumas perguntas importantes.
A empresa está se endividando ou realizando novos investimentos? O que
aconteceu com o estoque? Estão sendo feitos investimentos no
imobilizado, como no parque fabril? As vendas estão crescendo? Como o
negócio está se comportando em termos de resultados?

De posse do balanço, também é possível relativizar algumas dessas linhas


para encontrarmos indicadores que contam uma história. Esse é o
objetivo da contabilidade: você não deve ser escravo dos indicadores, mas
sim manipulá-los da melhor maneira para que eles te sirvam. Este é
justamente o propósito da técnica chamada de múltiplos: avaliar um ativo
com base na forma como ativos similares são precificados no mercado.

51
Ao utilizarmos essa metodologia, alguns desafios aparecem no meio do
caminho, como a dificuldade de encontrar ativos similares listados em
bolsa, pelo menos aqui no Brasil. É fundamental também a padronização
dos múltiplos, geralmente calculados com base em duas fontes: os preços
vigentes no mercado acionário e os preços praticados na compra e na
venda de empresas. Vamos examinar alguns conceitos importantes para
uma boa análise por múltiplos:

Valor de mercado
Não haveria lógica em fazer uma comparação pura e simples dos preços
de ações de diferentes empresas, pois o que interessa não é o preço da
ação individual, mas sim o valor de Bolsa ou o chamado Valor de Mercado
da empresa. Em um mercado eficiente, o preço refletiria os seus lucros
potenciais e seus dividendos, os riscos do negócio, os riscos financeiros e o
valor dos ativos.

Valor de mercado = cotação das ações X quantidade de ações emitidas

Valor total da empresa


Se somarmos as dívidas financeiras, líquidas de seu disponível – ou seja, a
dívida líquida ao seu Valor de Mercado – chegaremos ao Valor
Empresarial, que permite comparações entre empresas com graus de
endividamento diferentes.

Valor Total da Empresa = Valor de Mercado + Valor das dívidas


financeiras - Valor do disponível

Só é possível comparar o Valor de uma Empresa (VE), antes do efeito da


dívida, ou seja, com indicadores operacionais como ativos, receita de
vendas, Ebitda, Ebit, Nopat e fluxo de caixa livre para a empresa, estes
também indicadores anteriores ao efeito da dívida.

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Ebitda
Um dos múltiplos mais comum usa o Ebitda como referência. Por ser
independente da estrutura de capital, esse indicador permite a
comparação de empresas com diferentes níveis de capitalização. Isso
justifica sua grande utilização nas avaliações para compra e venda de
empresas. Lembre-se, porém, que não podemos confundir Ebitda com
fluxo de caixa para empresa, apesar de existir uma forte correlação entre
ambos.

Outra grande vantagem do Ebitda: é fácil encontrá-lo a partir dos


demonstrativos, sem necessidade de estimativas ou projeções de
investimentos, que podem oscilar muito em razão dos planos de expansão
da empresa. Apenas uma ressalva: é importante o investidor saber que
esse indicador pode supervalorizar empresas que necessitam de grandes
investimentos para crescer.

Preço/Lucro
Os indicadores de Valor de Mercado (VM) só podem ser comparados com
indicadores formados APÓS a dívida, como patrimônio líquido, lucro
líquido e fluxo de caixa livre para os acionistas. Um dos mais conhecidos é
o Preço/Lucro (P/L). Utilizamos esse indicador com mais atenção no caso
dos bancos, que não possuem endividamento, tornando a comparação
mais lógica. Uma desvantagem é que o P/L não pode ser utilizado por
empresas com prejuízo, que sofrem os impactos dos juros e despesas
financeiras.

Preço/Valor Patrimonial
Os dois indicadores a seguir são os mais utilizados por nós e, é claro,
também pelo Barsi. O primeiro deles é o Preço/Valor patrimonial por
ação, com o qual muitos talvez já estejam familiarizados, embora nem
todo mundo saiba muito bem como interpretá-lo. A ideia é comparar o
preço de mercado de uma empresa com o quanto os investimentos feitos
pelos acionistas a preço de custo valorizaram por ação.

Explicando melhor: um indicador abaixo de 1 mostra que o valor de


mercado da empresa é inferior ao seu patrimônio (o contrário também é

53
verdadeiro: um indicador acima de 1 demonstra um valor de mercado
superior ao patrimonial). A correta interpretação deste múltiplo está
sujeita à análise dos motivos pelos quais o preço e o PL variaram – só
depois será possível afirmar se a ação está "cara" ou "barata".

Seu melhor aliado é o histórico. Claro que a rentabilidade passada não


garante a rentabilidade futura. Entretanto, só temos o passado para
analisar.

Payout
Na esteira dos múltiplos de dividendos, não podemos nos esquecer do
payout, já mencionado em outras partes deste módulo, que se trata do
percentual do lucro líquido distribuível destinado à remuneração dos
acionistas.

Um exemplo: se uma empresa lucra R$100, dos quais R$50 são


distribuídos aos acionistas, o payout será equivalente a 50%. O restante
será destinado às reservas obrigatórias, como a reserva legal e outras
demandas estatutárias.

Cash Dividend Coverage Ratio


Outro indicador de dividendos muito difundido na literatura internacional
é o Cash Dividend Coverage Ratio, que compara o dividendo pago com o
fluxo de caixa operacional (FCO) gerado pela companhia. Um indicador
negativo sugere que as operações da empresa não têm gerado caixa
suficiente para manter o pagamento de dividendos e que o financiamento
desses pagamentos provavelmente está vindo do fluxo de caixa das
atividades de financiamento.

Dividend yield e Yield on cost


O indicador mais comum de todos é o dividend yield, ou rendimento em
dividendos -- a divisão do dividendo distribuído por ação nos últimos 12
meses pelo preço atual da ação. Outra variação do mesmo índice é o yield
on cost, que leva em consideração o dividendo pago nos últimos 12 meses

54
em relação ao preço médio de cada investidor. Nessa divisão, o acionista é
capaz de encontrar sua rentabilidade pessoal com os proventos.

Imagine a seguinte situação: você compra uma empresa por 10 reais e


recebe dela 1 real em proventos no primeiro ano, ou seja, 10%. Após
alguns anos, os resultados melhoram e a empresa passa a pagar 5 reais de
dividendos por ação, cuja cotação agora é de 50 reais. Para quem compra
esse ativo neste momento, o yield é o mesmo (10%) – mas para quem o
comprou por 10 reais, a rentabilidade será de 50%. Isso explica muito do
comportamento dos investidores de longo prazo, afinal, é muito alto o
custo de oportunidade em se desfazer de um ativo com uma rentabilidade
assim.

TÉCNICAS DE VALUATION COM DIVIDENDOS

Antes de partirmos para algumas das técnicas de valuation com


dividendos mais utilizadas pelo mercado, vamos falar sobre alguns filtros
que podem ser aplicados antes dessa análise mais criteriosa.

O mais famoso, sem dúvida, é o filtro de Graham. No livro O Investidor


Inteligente, ele defende que investir por conta própria é possível, desde
que sejam aplicadas uma bateria de testes para selecionar suas ações e se
certificar de alguns fundamentos.

Graham aponta sete critérios para selecionar boas ações:

1) Faturamento anual superior a US$ 100 milhões (ou US$ 50


milhões no caso de concessionárias de serviços públicos).

2) Liquidez Corrente maior ou igual a 2 (ou seja, o ativo


circulante deve ser o dobro do passivo circulante).

3) Endividamento de Longo Prazo menor ou igual ao capital


de giro.

55
4) Histórico de lucros positivos por pelo menos dez anos,
com crescimento de lucros em pelo menos um terço dos
dez anos anteriores.

5) Pagamento ininterrupto de dividendos por pelo menos 20


anos.

6) Preço/Lucro menor ou igual a 15 nos 3 anos anteriores.

7) Preço/Valor Patrimonial por ação menor ou igual a 1,5.

No entanto, os filtros de Graham foram desenvolvidos para o mercado


americano, economicamente muito mais estável do que o brasileiro. Além
disso, por lá existe um número muito maior de empresas listadas e há
muito mais tempo!

O histórico e o tamanho da base de dados nos Estados Unidos são muito


superiores aos do mercado brasileiro, tornando inviável utilização dos
filtros de Graham por aqui. Nós os aplicamos e não encontramos
nenhuma empresa que atingisse os requisitos necessários. Não quer dizer
que não existam empresas de qualidade e baratas na nossa Bolsa.
Devemos levar em consideração as turbulências recentes pelas quais
passou o nosso mercado, como uma recessão profunda de 2012 a 2016 e
uma pandemia.

No AGF, não utilizamos nenhum tipo de filtro padronizado. Preferimos


comparar múltiplos de empresas dos mesmos segmentos. Como
acompanhamos um universo relativamente pequeno de empresas
(basicamente os setores BESST), esse trabalho não fica tão exaustivo. É
incabível, por exemplo, comparar um P/L de um banco ou de uma
seguradora com o de uma empresa de energia. São negócios
completamente diferentes, portanto, não comparáveis entre si.

O problema de se basear apenas em filtros é excluir boas empresas,


cotadas a bons preços e que tenham passado por uma situação recente,
mas temporária, de dificuldade. Não quer dizer que essas companhias
tenham perdido os fundamentos. A pandemia foi um grande exemplo

56
disso. Muitas empresas das nossas carteiras deixaram temporariamente
de pagar dividendos, mas nem por isso nós as vendemos. Ao contrário,
por conhecer seus históricos, vimos muitas oportunidades surgirem a
preços antes inimagináveis.

Um segundo fator a ser observado na metodologia previdenciária é a


atenção ao preço teto, sobre o qual falaremos daqui a pouco. Nós nos
preocupamos muito com a margem de segurança e com o yield histórico
para depois investigar mais a fundo os demais múltiplos. De uma vez por
todas: não existe um único indicador, um super trunfo que te trará todas
as respostas. Isso não existe no mercado de ações.

Apesar das controvérsias entre os economistas, alguns desses estudiosos


formularam teses que incluíam os dividendos como uma forma de calcular
o valor justo de uma empresa. Um dos mais estudados é o modelo de
crescimento de Gordon, que usa como premissa básica o perfil de
empresas mais maduras, com taxas de crescimento de lucros e dividendos
mais estáveis ao longo do tempo.

Esse modelo relaciona o valor da ação aos dividendos futuros esperados


da empresa, considerando uma taxa de retorno exigida pelo investidor e
uma taxa de crescimento esperado dos dividendos. A fórmula, então, fica
assim:

VALOR DA AÇÃO = DPA/(Ke - G)

Sendo:

● DPA o dividendo por ação esperado para o próximo período,


já crescendo a uma taxa g esperada.

● Ke é a taxa de retorno exigida pelo investidor ou o custo de


capital próprio.

● g a taxa de crescimento constante dos dividendos.

57
Vamos usar como exemplo numérico o levantamento feito pelo livro O
investidor em ações de dividendos para as ações do Itaú. Os autores
salientam logo de início que, embora o banco tenha vários anos de
histórico de pagamento, sua política de distribuição mudou sensivelmente
ao longo dos anos, tornando difícil o uso de uma proxy para um
crescimento médio de dividendos. Isso se repete em grande parte das
empresas brasileiras.

De qualquer forma, continuamos para efeitos didáticos. Os autores


assumem para o crescimento dos dividendos um g = a 10,48%. Partindo
desse pressuposto, o DPA projetado seria de 2,55 reais e para o retorno
exigido, utilizaram o retorno anual médio do Ibovespa desde 1998, que foi
de 13,34%.

A conta fica assim:

Valor da ação = R$ 2,55 / (0,1334 - 0,1048) = R$ 89,16

Trata-se de um valor supervalorizado devido ao uso indevido de uma taxa


de crescimento estável superior à taxa de crescimento esperado do PIB
para os próximos anos. O contrário também poderia acontecer: se
usássemos uma taxa de crescimento g baixa, o valor justo seria
subavaliado.

Note que o modelo de desconto de dividendos de Gordon traz ao valor


presente (ou seja, a valores de hoje) uma série infinita de pagamentos de
dividendos. Qualquer mudança no retorno esperado pode interferir
bastante no valor estimado. Por isso, gostamos de calcular este indicador
todos os anos, levando em consideração apenas o nosso retorno em
dividendos esperado ao ano.

Assumir um crescimento constante em um país como o nosso torna o


valuation pela metodologia de Gordon muitas vezes extremamente
otimista e fora da realidade de mercado. Qualquer indicador será uma
armadilha perigosa se não for interpretado da maneira correta.

58
Preço teto
Encontrar o valor justo de uma empresa não é uma arte precisa e exige
estudo e dedicação. Cada empresa e setor demandará uma avaliação
individual, mas essa não é a métrica mais utilizada no nosso dia a dia.

O histórico de dividendos é o que aplicamos para ter uma noção mais


clara a respeito do valor de uma empresa e determinar se ela está cara ou
barata antes de fazer um aporte. O que fazemos, então, é utilizar nosso
retorno mínimo aceitável em dividendos de 6% a.a como forma de
determinar um preço máximo para uma ação.

Trata-se de uma métrica simples e efetiva, que não se importa com os


centavos encontrados nas diferenças entre técnicas de valuation. Não é
uma metodologia feita para encontrar o valor justo, mas sim um valor-
teto que impeça o investidor de incorrer no pior tipo de erro durante sua
trajetória: pagar caro por um ativo. Em outras palavras, é um cálculo de
margem de segurança.

O indicador que mais utilizamos é o dividend yield, não apenas para avaliar
o pagamento de dividendos de uma ação, mas também para definir um
preço máximo de entrada em um portfólio. Isso é possível porque o
indicador só pode ser um balizador para empresas que possuem um bom
histórico de proventos. Além disso, o perfil de empreendimentos que
procuramos costuma ter comportamento mais defensivo e previsível no
longo prazo.

O preço da ação determinará se uma boa empresa pagadora de


dividendos será um bom investimento. Como também já dissemos
anteriormente, o perfil de projetos que procuramos costumam apresentar
comportamentos previsíveis de resultados e distribuição de proventos, e
consequentemente de preços. A equação de preço-teto consiste em uma
reconstrução da própria equação do dividend yield.

Pegamos a fórmula:

Yield = Dividendo por ação / Preço

59
e a transformamos em:

Preço = Dividendo por ação/ yield mínimo esperado

Para ter um parâmetro estável, optamos por sempre manter o


denominador em 6% a.a. Essa métrica acompanha Barsi desde o início de
sua trajetória, quando a taxa de 6% a.a. já era considerada um balizador
de mercado para determinar se uma empresa pagava bons dividendos ou
não.

Há duas formas de se calcular o preço teto. O primeiro e mais usual


baseia-se no dividendo médio, cujos dados são públicos e acessíveis a
todos. Esse talvez seja o método mais conservador e seguro. Costumamos
usar no AGF a média dos últimos 6 anos, o que nos dá uma previsibilidade
maior em como a empresa se comportou em relação à distribuição de
dividendos durante um bom tempo.

No entanto, se você quiser ser ainda mais conservador, pode usar uma
média histórica de 10 anos ou outro período de sua escolha. Nas técnicas
de valuation, tudo é possível - depende dos critérios que o investidor
desejar atribuir a cada uma das variáveis.

Vamos tomar como exemplo as ações da BB Seguridade. De acordo com


os dados extraídos do AGF+ e validados no RI, a média paga por ação nos
últimos 6 anos (2017 a 2022) girou em torno de R$ 2,01. Atenção: para
chegar nesta base de cálculo, utilizamos sempre o dividendo PAGO em
regime de caixa por ano, independente da competência do exercício a que
se refere o anúncio.

No caso específico de BBSE3, excluímos também um pagamento


extraordinário de restituição de capital em 2020 no montante de R$ 1,35,
um valor que certamente levaria a média erroneamente para cima.

60
Qual seria, então, o preço limite a pagar pelas ações da BB Seguridade,
considerando o retorno mínimo de 6% a.a.? A conta é simples: dividimos o
valor do dividendo médio pago nos últimos 6 anos pelos 6% a.a - no nosso
exemplo, resultaria em um preço teto de aproximadamente R$ 33,50.

Em outras palavras, esse seria o preço equivalente a uma rentabilidade de


6% a.a. Quanto mais distante desse teto estiver o preço de mercado, mais
barata estará a ação sob a perspectiva dos dividendos no Jeito Barsi de
Investir. Em resumo, quanto mais abaixo desse teto, maior será sua
margem de segurança e, consequentemente, maior será seu dividend
yield.

Esse método, porém, não permite capturar rapidamente as mudanças na


política de distribuição de dividendos. Tomemos como exemplo a Klabin.
Até recentemente, a empresa tinha uma média de distribuição de R$ 0,10
por ação e um preço teto de R$ 1,66. Esse valor estaria muito aquém das
cotações da época, em torno de R$ 3 por ação. Nesses momentos é
preciso ter senso crítico para uma análise mais apurada.

Se observarmos o histórico de dividendos da empresa com atenção,


veremos que ela vinha crescendo de forma constante. De meados de 2015
até 2017, houve uma queda brusca nos proventos distribuídos. Nesse
período, a empresa concentrou esforços na construção do projeto Puma I,
um empreendimento gigantesco que marcou a entrada da companhia no
segmento de exportação de celulose. Em 2018, já observamos uma
retomada maior da distribuição dos dividendos.

61
Floresta da Klabin: ativos biológicos.

Nesse caso, a aplicação do preço teto médio levaria o investidor à


conclusão de que a empresa estava cara. Seria o melhor indicador?
Acreditamos que não, pois ele não consegue capturar com precisão a
mudança de patamar da empresa de 2018 em diante.

A segunda alternativa, então, para o cálculo do preço teto, usa como


parâmetro inicial o dividendo projetado para o ano em vez da média. O
caminho aqui é um pouco mais trabalhoso, principalmente se o investidor
não tiver acesso a plataformas pagas.

Para chegarmos ao dividendo projetado para o ano, pegamos


primeiramente o consenso de mercado para o lucro líquido por ação. O
consenso de mercado é uma espécie de média entre as projeções feitas
pelas principais casas de análise e bancos de investimento. Com a
projeção do lucro por ação em mãos, multiplicamos esse valor pelo
respectivo payout e, finalmente, chegamos a uma estimativa de dividendo
por ação.

62
Uma alternativa caseira para o projetado é utilizar o guidance fornecido
pelas próprias empresas. Infelizmente, poucas adotam essa prática de
divulgar as projeções de lucro para o ano. Uma das exceções é o Banco do
Brasil. No início de 2022, a companhia esperava lucrar no mínimo R$ 23
bilhões. Considerando o payout anunciado de 40%, esse resultado
representava uma distribuição de proventos bruta total de
aproximadamente R$ 9,2 bilhões. Em uma base acionária com 2,86
bilhões de ações, seriam aproximadamente R$ 3,21 em dividendos por
ação.

Como qualquer técnica de valuation, o projetivo não é uma ciência exata e


cada uma das premissas pode mudar a qualquer instante, resultando em
pequenas adaptações ao longo do caminho. No caso do Banco do Brasil, a
empresa acabou gerando muito mais lucro do que o esperado,
distribuindo em 2022 mais de R$ 4 por ação ao seu acionista.

Para o investidor iniciante, ainda sem muita prática para interpretar esses
movimentos de mercado, o uso do dividendo médio pago nos 6 anos
anteriores pode ser uma metodologia mais adequada – tanto pela
simplificação matemática, quanto pelo fácil acesso a essas informações e
pelo conservadorismo dos números.

O maior limitador deste modelo: ele só funciona para empresas que


pagam dividendos com certa previsibilidade. Para ações cujos lucros sejam
fortemente impactados por questões cambiais e pelos preços das
commodities, essa técnica dificulta muito qualquer tipo de previsão.
Nesses casos, utilizamos com maior frequência outros indicadores, como
os múltiplos.

Outro limitador: pagamentos em anos excepcionalmente bons, como


aconteceram recentemente com o próprio Banco do Brasil e com a Taesa,
levam o preço teto para níveis até mesmo superiores ao seu preço justo, o
que não faz o menor sentido. Nesses casos, recomendamos o uso do
preço teto médio.

63
O ESTUDO ORIGINAL

Já revisamos a fundamentação histórica e teórica do Value Investing e do


dividend investing. Recapitulamos também algumas das particularidades
do Jeito Barsi de Investir para selecionar boas empresas, a bons preços e
que paguem bons dividendos. Agora, chegamos na fase final da
montagem da carteira previdenciária: o momento de definir as suas metas
em quantidade de ações.

No estudo original Ações Garantem o Futuro, assim como na maioria das


empresas que Barsi avalia, ele faz uma análise retrospectiva (olhando para
o passado) e uma análise projetiva (olhando para o futuro).
Diferentemente de outros investidores e analistas, Barsi geralmente tenta
trabalhar somente com fatos e evita qualquer exercício de previsão de
lucros futuros.

Na visão dele, o investimento precisa fazer sentido com base nos


resultados que a empresa já entregou, e não somente nas promessas para
o futuro. Na análise projetiva, o único fator realmente importante é
quantificar os aportes que se pretende fazer, considerando o nível de
dividendos e bonificações esperados.

No caso da CESP, esse exercício ficava ainda mais fácil, já que os proventos
da empresa eram assegurados pelo seu estatuto social e pagos sempre
sobre seu valor nominal de Cr$ 1,00, independentemente do lucro anual
que a companhia viesse a obter. Na análise retrospectiva do estudo, Barsi
faz uma simulação para mostrar a importância que os proventos exercem
na rentabilidade do investimento.

Veja a seguir a reprodução de um quadro original do estudo, mostrando o


retrospecto de 3 anos da CESP (1972 a 1974).

64
Observe que, se o investidor tivesse adquirido 1.000 ações preferenciais
em maio de 1972, ao preço de Cr$ 0,90, ele teria passado pela seguinte
situação (lembrando que a empresa distribuía um dividendo anual de Cr$
0,10 por ação):

• Em 72, a CESP deu uma bonificação de 16% e pagou o


equivalente a Cr$ 108,00 em dividendos. Quem possuía 1.000
ações recebeu 160 novas ações bonificadas, e essas novas ações
também já pagaram dividendos.

• Em 73, ela deu outra bonificação de 12% e distribuiu o


equivalente a Cr$ 122,95 em dividendos.

• Por fim, em 74, a empresa deu uma nova e generosa bonificação


de 20% e pagou Cr$ 142,90 em dividendos.

Assim, o investidor que tivesse comprado inicialmente 1.000 ações


recebeu 558 novas ações bonificadas durante o período, totalizando ao
final 1.558 ações.

65
Para comprar as 1.000 ações, Barsi tinha investido Cr$ 900,00 – mas como
recebeu Cr$ 373,85 em dividendos, seu custo real foi de Cr$ 526,15
(equivalente ao valor investido menos o valor recebido em dividendos).
Ao dividir esse valor pelas 1.558 ações, o custo por ação caiu dos Cr$ 0,90
iniciais para somente Cr$ 0,34 – e isso em apenas 30 meses.

Outra forma de analisar a situação é através do retorno obtido no


período. Independentemente da oscilação no preço da ação, os Cr$
373,85 recebidos em dividendos equivalem a um retorno de 42% sobre o
capital de Cr$ 900,00 investidos – um retorno superior ao proporcionado
na época pelos títulos de renda fixa.

Utilizando uma análise projetiva, Barsi montou um plano de investimento


programado que se tornaria o embrião da estrutura geradora de renda
desenvolvida por ele. Barsi chamou-o de Plano de Investimento
Previdenciário, em cuja essência está a metodologia criada e utilizada por
ele há mais de meio século.

O trabalho considerou algumas premissas. Primeiro, o investidor


compraria 1.000 ações por mês pagando em média Cr$ 0,70 por ação,
resultando em um total de 12.000 ações por ano, em um montante
investido próximo a Cr$ 8.500 anuais. Tanto o prazo do investimento
quanto a quantidade comprada mensalmente ficariam a critério do
investidor. Quanto maiores fossem os dois, melhor.

Segundo ponto: o plano assumiu que a empresa daria uma bonificação


média de 10% ao ano, algo perfeitamente viável, já que nos três exercícios
anteriores essa média tinha sido de 16% ao ano.

Como terceira premissa, o trabalho considerou a manutenção do nível de


dividendos do estatuto, ou seja, 10%, sobre o valor nominal de Cr$ 1,00.
Os dividendos da CESP eram pagos em duas parcelas semestrais de 5%,
uma em maio e outra em novembro. A estimativa era que a empresa
distribuiria Cr$ 0,05 em maio e Cr$ 0,05 em novembro.

O quadro a seguir, também do estudo original, mostra a evolução da


carteira de ações do investidor. Barsi separou as compras de ações em

66
dois momentos no ano -- o primeiro de janeiro a julho (anterior ao
momento da distribuição da bonificação, que geralmente ocorria em julho
ou agosto) e o segundo de agosto a dezembro, incluindo as compras
restantes no ano.

No primeiro ano, o investidor compraria 1.000 ações por mês, totalizando


7.000 ações compradas entre os meses de janeiro a julho. Sobre essa
posição, receberia ainda uma bonificação de 10%, correspondente a 700
novas ações.

Com mais 5.000 ações compradas de agosto a dezembro, ele encerraria o


primeiro ano com 12.700 ações da CESP na sua carteira.
Essa seria a posição com que ele iniciaria o segundo ano do programa de
investimento. De janeiro a julho, compraria novamente 7.000 ações
novas, totalizando 19.700 ações. Essa quantidade daria a ele o direito de

67
receber 1.970 ações a título de bonificação. Com mais 5.000 ações
compradas de agosto a dezembro, ele encerraria o segundo ano com
26.670 ações na sua carteira.

Esse processo deveria ser repetido exaustivamente durante todos os anos


seguintes em um horizonte de 30 anos. Seguindo este plano à risca, o
investidor que começou comprando 1.000 ações no primeiro mês teria
acumulado mais de 2.000.000 de ações ao final do trigésimo ano.

Você deve estar se perguntando se, para iniciar um programa como esse,
não é preciso ter muito dinheiro? O próximo quadro ajuda a responder a
sua pergunta. Nele você pode observar a renda obtida com os dividendos
ao longo dos anos. As colunas “Ações com Direitos” mostram a posição de
ações em cada semestre com direito ao recebimento de dividendos.

68
As ações compradas nos cinco primeiros meses do ano dariam ao
acionista o direito de receber o dividendo pago em maio pela CESP. A
mesma lógica vale para o segundo semestre. As ações compradas ao
longo do ano até o 11o mês dariam o direito ao dividendo que seria pago
em novembro.

Assim, no primeiro ano, o investidor receberia, sobre a posição acumulada


de 5.000 ações até maio, Cr$ 250,00 em dividendos no primeiro semestre.
No segundo semestre, receberia mais Cr$ 585,00 sobre sua posição de
11.700 ações acumuladas até novembro. No primeiro ano, portanto, o
investir receberia Cr $835,00 em dividendos. Nos anos seguintes, a mesma
mecânica se repetiria em todos os semestres. O investidor encerraria o
trigésimo ano com uma renda anual próxima a Cr$ 200.000, um
crescimento de quase 240 vezes.

Ano a ano, os aportes continuam constantes, mas o recebimento de


dividendos vai crescendo progressivamente, até acontecer algo realmente
transformador. No sexto ano, a renda anual de dividendos chega a Cr$
8.976, superando o valor anual de Cr$ 8.500 em aportes. Em outras
palavras, a partir desse momento todas as novas compras de ações
poderiam ser feitas somente com os dividendos recebidos, sem a
necessidade de investimento adicional.

Aliás, como você pode ver na coluna retirada líquida anual, ainda sobraria
um valor que poderia ser retirado para outros usos pessoais. Ou, caso
você preferisse, também poderia direcionar esses recursos excedentes de
volta para o mercado, investindo na própria CESP ou em ações de alguma
outra empresa. Isso certamente te ajudaria a potencializar os resultados e
a acelerar o processo de conquista de uma renda generosa.

Por meio desse plano relativamente simples, Luiz Barsi consolidou sua
metodologia na Bolsa de Valores. Sua primeira meta foi a de ter 100.000
ações da CESP -- algo desafiador no início, mas batida com muita disciplina
nos aportes.

Além da disciplina, a mentalidade de longo prazo é fundamental para o


funcionamento de um plano como esse. E para isso, o investidor não deve
ficar preocupado com quanto a sua carteira “está valendo” ao longo do

69
processo, mas sim em manter o foco na remuneração recebida por meio
dos dividendos.

A ideia é que, enquanto a ação continuar cotada a um preço atrativo, e


principalmente quando ela cair, o investidor possa aproveitar para
comprar e acumular mais ações. Quando os preços sobem acima do
desejado, deve-se aguardar uma queda ou simplesmente direcionar os
recursos para outro ativo com características parecidas que esteja a um
preço mais atrativo.

Como pudemos ver no estudo Ações Garantem o Futuro, a escolha da


empresa ou das empresas para compor um portfólio previdenciário é um
ponto fundamental. O investidor passará vários anos investindo nessas
mesmas empresas. Se elas não atuam em um setor perene, cedo ou tarde
perderão relevância e os seus lucros vão sofrer. E com os lucros caindo, a
capacidade de distribuição de dividendos será bastante prejudicada.

É por isso que setores muito cíclicos, como o de construção civil, acabam
sendo problemáticos. Em geral, no topo do ciclo essas empresas geram
um ótimo caixa, mas buscam novos investimentos nos quais alocar capital
e crescer – o que é contraintuitivo, pois justamente nessa hora os ativos
disponíveis no mercado estão mais caros. Na baixa do ciclo, as empresas
preservam caixa para proteger os balanços e acabam privilegiando o
pagamento de dívidas. Em resumo, tanto na fase de alta quanto na de
baixa do ciclo, o dividendo para o acionista acaba ficando em segundo
plano.

Por fim, Barsi também busca investir em empresas em que o controlador


tem uma grande participação acionária. A chance desse controlador
distribuir um dividendo generoso é alta, já que ele distribuirá para ele
mesmo. E os acionistas minoritários acabam pegando carona e recebendo
também.

Vamos mais a fundo. Veja o estudo original Ações


Garantem o Futuro, de Luiz Barsi, disponível na pasta de
material de apoio da disciplina de Value Investing
(Módulo 2 do MBA).

70
NOVO ESTUDO: A KLABIN

Usando todos esses critérios e alguns outros já descritos em aulas


anteriores, trouxemos um estudo realizado em 2019, em que
selecionamos a Klabin para mostrar outro exemplo prático de um
programa de investimento previdenciário.

Como todos sabem, Luiz Barsi investe na empresa há muitos anos. A


empresa é uma das empresas líderes no setor de Papel e Celulose e tem
uma estrutura totalmente verticalizada. Todas as etapas da produção –
desde o plantio de árvores até a produção e comercialização de celulose,
papéis e embalagens – estão integradas dentro de sua própria estrutura.
Pela longevidade da Klabin, podemos ter uma noção da perenidade desse
setor. A empresa completou 123 anos em 2022. Seu setor está passando
por uma verdadeira revolução. Com o crescimento do e-commerce e das
tendências de sustentabilidade, a demanda por embalagens inovadoras e
sustentáveis é cada vez maior. Temos certeza absoluta de que essa
tendência veio para ficar.

De acordo com os mesmos critérios que levaram Barsi a selecionar os


papéis da CESP, a Klabin também se enquadra na composição de uma
carteira previdenciária. Além de atuar em um setor perene, a empresa é
controlada por um grupo de famílias sérias, confiáveis e competentes.
Seus produtos são de consumo essencial, que dificilmente vão sumir ou
ser substituídos um dia. Um exemplo é a celulose fluff, usada nas fraldas
infantis e de adultos. Mesmo com os altos e baixos da economia, a
demanda da maioria dos seus produtos permanece relativamente
protegida de oscilações demasiadamente bruscas. Isso torna o fluxo de
caixa da empresa mais previsível, bem como seus dividendos.

Dessa forma, mesmo nos momentos em que a empresa esteve mais


endividada, o caixa gerado foi suficiente para investir, pagar dívidas e ser
distribuído aos acionistas, mesmo que minimamente. O dividendo da
Klabin é garantido pelo estatuto da empresa, que estipula um percentual
não inferior a 25% do lucro líquido ajustado -- mas na prática, a empresa
tem ido além dessa obrigação estatutária.

71
No setor de celulose, é muito comum que alguns fatores com efeito não-
caixa – isto é, que não geram desembolso efetivo – impactem os
resultados contábeis da empresa, gerando às vezes prejuízo. Esses fatores,
em geral, são variações cambiais, que pesam sobre a dívida em moeda
estrangeira, e alguns outros, como a contabilização do valor dos ativos
biológicos.

Nesses casos, a empresa gera um bom resultado, mas acaba apresentando


um prejuízo. E se a empresa apresenta prejuízo, por lei não teria
obrigação de distribuir dividendo. Por isso a Klabin adotou a prática de
calcular os dividendos como sendo um percentual de 20% sobre o EBITDA
ajustado. Isso proporciona maior previsibilidade nos dividendos da
empresa.

Nos últimos anos, o dividendo da Klabin tem sido pago trimestralmente


em fevereiro, maio, agosto e novembro. A empresa sempre pagou só
dividendos, mas em 2018, pela primeira vez, passou também a distribuir
juros sobre capital próprio. O histórico dos dividendos pode ser obtido
diretamente no site de RI da empresa ou no AGF+, a que vocês têm
acesso.

A Klabin negocia atualmente ações ordinárias, preferenciais e units, que


são as mais líquidas, formadas por uma ação ordinária e quatro
preferenciais. Apesar de serem menos líquidas que as units, as
preferenciais ao longo dos anos fizeram mais sentido para uma carteira
previdenciária, já que distribuem o mesmo dividendo que as ONs e,
historicamente, sempre custaram um pouco menos.

Em um período de 10 anos, a Klabin distribuiu regularmente R$ 0,08 por


ação a cada ano, em média. Esses valores foram ajustados pelo
desdobramento de um para cinco feito pela empresa em 2014. No
período, a cotação média oscilou de R$ 0,73 em 2009 a R$ 3,20 em 2018.

Mais uma vez utilizando uma análise projetiva, podemos fazer um


exercício parecido com o feito por Barsi com a CESP. A ideia é mostrar
evolução da renda de um investidor que começou a investir na Klabin em
2009 comprando 1.200 ações por mês, e seguirá fazendo isso até
completar 30 anos de investimento.

72
Para facilitar a análise, usamos dados reais de 2009 até o final de 2018.
Daí em diante, assumimos algumas premissas:

(1) A distribuição de dividendos vai crescer junto com a inflação, a uma


taxa estimada de 5% ao ano.

(2) Os proventos sempre serão pagos ao final dos trimestres.

(3) Considerando as cotações médias da ação ao final desse período de


10 anos, assumimos um preço médio de compra de R$ 3,15 para os
anos seguintes.

Não se preocupe se a cotação da Klabin atingiu patamares superiores a


esse nos anos seguintes. Nosso objetivo é exemplificar o processo de
investimento. Como já foi dito anteriormente, se o patamar de preço de
uma ação deixa de ser interessante, o aporte do investidor é
imediatamente direcionado para outro ativo mais atrativo.

Lembre-se também que até 2015 a Klabin pagava dividendos três vezes ao
ano – e passou pagá-los quatro vezes ao ano, uma por trimestre, a partir
de 2016. No programa de investimento previdenciário o investidor define
uma determinada quantidade a ser comprada mensalmente (no caso,
1.200 ações), e segue o programa com total disciplina e sem nenhuma
interrupção.

Comprando 3.600 ações por trimestre, o investidor teria acumulado ao


final do primeiro ano um total de 14.400 ações. Seguindo o plano durante
os 30 anos seguintes, ao final do trigésimo ano ele teria acumulado
432.000 ações.

Como o objetivo é acumular uma grande quantidade de ações em carteira,


em nenhum momento o investidor as venderia ao longo de todo o
processo. Ou seja, mesmo com a cotação valorizando, o que certamente
vai acontecer durante o período, o investidor não deve se desfazer de sua
posição.

73
Com os aportes realizados e a quantidade de ações evoluindo, é hora de
analisar os proventos anuais. Obviamente, o fluxo de renda gerado pelos
dividendos vai crescendo com os anos, à medida que a quantidade de
ações em carteira aumenta. No início de seu projeto, em 2009, o
investidor teve uma renda quase insignificante com os dividendos: R$
197,21. Com o passar dos anos, essa renda aumentaria progressivamente
até atingir mais de R$ 172.000 no trigésimo ano. Finalmente, para
entender o resultado de tudo isso, devemos comparar o investimento
realizado com o fluxo de dividendos gerados, o que é apresentado na
próxima tabela 2.

74
Ao subtrair os proventos recebidos (primeira coluna à esquerda) do
investimento (segunda coluna), percebemos que durante quinze anos há
um investimento líquido, até que no 16o ano a renda gerada pelos
próprios dividendos já será suficiente para cumprir sua meta de
investimento mensal. A partir daí, fica a critério do próprio investidor
retirar parte da renda gerada pelos dividendos ou reinvestir um pedaço
disso. No exemplo, somente essa retirada já geraria uma renda de quase
R$ 127 mil por ano. Esse valor é uma função direta do tamanho dos
aportes ao longo dos anos. Quanto mais altos eles forem, maior a renda
anual futura.

METAS PARA A DIVERSIFICAÇÃO DA CARTEIRA

Todo estudo tem limitações teóricas e, para que possa ser extrapolado
para o futuro, é precisa adotar premissas sobre as quais não se tem
certeza, além de considerar algumas variáveis ceteris paribus (tudo ou
mais constante).

Sabemos que não é assim que a vida real funciona. Mas a experiência
mostra ser viável a estratégia a proposta pelo estudo Ações Garantem o
Futuro – selecionar uma excelente empresa, que pague bons dividendos
de maneira perene. Mas é preciso estar ciente de que ao longo de 30 anos
muitas coisas acontecem. A cotação da ação pode disparar bem acima do
preço teto. O dividendo pode cessar por algum motivo circunstancial,
como de fato aconteceu em 2020. Ou pode ocorrer até algo mais grave,
fora do alcance do investidor, como uma fraude.

São riscos com os quais o investidor precisa conviver, mas eles podem ser
mitigados com a diversificação natural que ocorre ao longo do tempo
quando se adota o Jeito Barsi de Investir. Como já dissemos
anteriormente, não temos uma regra escrita em pedra, mas a métrica que
gostamos de usar para verificar se uma carteira está pulverizada é
multiplicar os anos de investimento por 3 (vamos lembrar: se um
investidor está na Bolsa há 3 anos, então seria aceitável encontrar em sua
carteira ações de 9 empresas diferentes). Quanto mais tempo, em tese,
maior a experiência e ar complexidade que esse acionista poderia se dar

75
ao luxo de adicionar à sua carteira. A quantidade de empresas em uma
carteira é uma métrica extremamente pessoal e deve levar em
consideração a premissa básica de que os dividendos são pagos em função
da quantidade de ações possuídas.
O nível de diversificação deve levar em consideração também a
capacidade de aporte individual. Uma carteira com R$ 1 milhão em
patrimônio provavelmente terá mais papéis do que uma carteira de R$ 50
mil. A diversificação dependerá também dos pesos que você atribuídos a
cada um dos setores BESST ou às empresas que mais gosta e tem metas
mais ambiciosas.

Vamos para a parte prática. Aqui a proposta é estabelecer a sua meta em


quantidade de ações de uma maneira diferente do Barsi, de trás para
frente. O planejamento de recursos deve considerar inicialmente qual a
renda mensal desejada, multiplicada por 12. Em seguida, basta dividir pela
taxa de juros anual pela qual o investimento será remunerado ao longo do
tempo.

A fórmula para compreender o valor do principal necessário para obter


determinada renda é simples:

Valor principal = Renda anual/ taxa anual

Um investidor que busque, por exemplo, uma renda complementar de R$


5.000 ao mês (R$ 60 mil ao ano), dividido por uma taxa conservadora de
6% anuais, deveria ter acumulado hoje um patrimônio de R$ 1 milhão. Se
esse mesmo investidor conseguisse, no entanto, uma taxa de retorno
estável esperada de 10% a.a, precisaria ter acumulado bem menos, cerca
de R$ 600 mil.

Como traduzir isso para metas em quantidade de ações? Depende de


alguns fatores extremamente dinâmicos da renda variável, como os
dividendos pagos por ação e os preços, sem contar o fator do
reinvestimento.

76
A construção das metas começa, com a mesma linha de raciocínio, pela
renda anual desejada. Basta dividir, então, pelo dividendo médio
distribuído por ação para chegar à posição necessária. Multiplique pelo
preço do ativo e encontre por fim o investimento total necessário para sua
carteira previdenciária.

ESTUDO PRÁTICO
O Ações Garantem o Futuro (AGF) nasceu com o objetivo de disseminar a
metodologia comprovadamente vencedora do maior investidor pessoa
física da bolsa: Luiz Barsi. Através de nossos cursos Jeito Barsi de Investir
e MBA em Value Investing, trazemos de forma didática a estratégia
previdenciária para que esteja acessível a todos a construção de um futuro
melhor sem depender de terceiros.

Como ferramenta auxiliar criamos também o AGF+, pelo qual através do


Aportador é possível obter auxílio para construir uma carteira
previdenciária, escolher empresas, definir metas e objetivos e
acompanhar a evolução da jornada de investidor. Caso ainda não tenha
ainda acesso ao AGF+, você pode obter o app na Apple Store, na Google
Store ou no site http://www.agfmais.com.br.

OBJETIVO DESTE ESTUDO

Muitos dizem que viver de dividendos é um mito de mercado, deixando de


lado uma estratégia baseada em dividendos em favor de uma estratégia
do giro e da rentabilidade. É preciso entender que, numa estratégia
baseada em dividendos, não há preocupação com o quanto um investidor
vai obter de rentabilidade no ano, e sim com o quanto de dividendos ele
receberá no mesmo período. São coisas completamente diferentes. O que
gera tranquilidade para as pessoas na aposentadoria é renda, e não
rentabilidade. Por isso o foco da estratégia é sempre acumular patrimônio
que gere renda para que tenhamos uma velhice tranquila.

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Esse estudo tem como objetivo acabar com esse mito, demonstrando com
número reais como se comporta uma estratégia de dividendos ao longo
do tempo. E esperamos inspirar outras pessoas a começar agora mesmo a
construir sua aposentadoria, para não se arrepender quando já for tarde
demais.

Todos os números e resultados serão apresentados nos tópicos a seguir.


Será ainda disponibilizada, para nossos alunos, a planilha com todos os
números, onde será possível simular os resultados a partir de seu aporte
mensal. Também serão disponibilizados os aportes do AGF+ no Aportador,
que poderão ser importados para visualização dos dados.

Acreditamos que até hoje não há um estudo similar ou uma planilha que
tenha proposto ao investidor essa simulação com números reais em um
período tão longo (10 anos). Esse estudo é meramente informativo, não se
configurando como recomendação de compra. Rentabilidade passada não
é garantia de rentabilidade futura.

PREMISSAS

A) O estudo é feito pelo período de 10 anos, de janeiro de 2013 a


dezembro de 2022. A ideia é que ao final de todo ano saia uma
versão atualizada da planilha para que os alunos continuem
acompanhando a evolução da estratégia.

B) Todos os valores, números, eventos, etc, são dados reais e


históricos obtidos do AGF+.

C) Compra no primeiro dia útil de cada mês.

D) Foram utilizadas três empresas: Vivo (VIVT3), Banco do Brasil


(BBAS3) e Taesa (TAEE11). São empresas de setores diferentes, que
pertencem ao BESST (Bancos, Energia, Saneamento, Seguro e
Telecom). Todas têm como característica a perenidade do negócio e
uma política de distribuição de dividendo adequada ao longo dos
anos.

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E) Foram feitas compras regulares todos os meses, independente da
condição de mercado, para exercitar também a disciplina do aporte
mensal.

F) Os preços utilizados para compra são os de fechamento do


primeiro dia útil de cada mês. Esses valores são nominais, ou seja, é
o preço real pago naquela época sem ajustes de eventos. Isso é
necessário para refletir a realidade da época.

G) Os proventos são contabilizados como recebidos por


competência, ou seja, a partir da datacom.

H) A escolha da empresa a investir no mês leva sempre alguns


fatores da Filosofia Barsi, como: preço, preço teto baseado no DPA
médio 6 anos, margem de segurança e Mapa do Dividendo
Inteligente (MDI).

▪ Preço: O preço é fundamental. É com base nele que


saberemos se o nosso retorno em dividendos será
satisfatório ou não baseado na métrica de 6% a.a.

▪ Dividendo por ação médio (DPA) de 6 anos: Aqui se


encontra um de nossos balizadores de até quanto
pagar. No estudo trabalhamos com a média dos
últimos 6 anos. Supondo que começamos a investir em
2013, pegamos a média de dividendos pagos dos
últimos 6 anos (de 2007 a 2012) de determinada
empresa e dividimos por 6% para obter o preço teto
médio. Para Vivo (VIVT3), isso dá um valor de R$ 67,29
conforme você pode observar na planilha a seguir.
Portanto, para 2013, o máximo que podemos pagar por
essa empresa com base na média dos últimos 6 anos é
R$ 67,29. Esse é um valor a ser respeitado. A
informação da média de proventos pagos no ano por
cada empresa pode ser obtida no site de RI de cada
uma delas. Caso você seja assinante do AGF+ essa
informação já está disponível e é calculada
automaticamente para você. Exemplo VIVT3:

79
▪ Margem de segurança: É a distância da cotação da
empresa em relação ao preço teto. O valor é definido
em percentual, quanto maior, melhor. Sua segurança
em comprar é maior, já que obterá um retorno em
dividendos mais satisfatório em relação ao preço pago.
Porém, vale observar que essa métrica sozinha não
deve ser a única balizadora na decisão de compra. Para
calculá-la basta pegar o preço teto e dividir pela
cotação atual. Em 2013, por exemplo, o Preço Teto do
ano para VIVT3 era de R$ 67,29, conforme vimos
anteriormente. A cotação em 02/01/2013 era de R$
44,10. Se dividirmos um pelo outro (67,29/44,10)
temos então o percentual de margem de segurança de
52,60% para essa compra.

▪ Mapa do Dividendo Inteligente: A equipe AGF mapeou


os meses de provável anúncio de dividendos por parte
das empresas, e pôs nesse estudo o nome de MDI ou
Mapa do Dividendo Inteligente. Com base nele,

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podemos apoiar nossa decisão de compra de
determinada empresa para que possamos então
utilizar de um fluxo de caixa constante, que somado ao
nosso aporte, acelera o processo e gera uma grande
bola de neve. Portanto, com base nos meses do MDI,
junto com as outras métricas acima, tomamos nossa
decisão de compra.

I) Todos os dividendos recebidos foram reinvestidos ao longo dos


meses, fazendo aumentar o aporte e criando uma “bola de neve”.

J) Os aportes foram atualizados com base na inflação de cada ano


anterior.

K) No estudo a seguir, apresentaremos uma simulação de aporte


em diversos intervalos, pois sabemos que a condição de cada um
difere muito, portanto usaremos os seguintes simulados de aporte
mensal inicial: R$ 500,00, R$ 1.000,00, R$ 2.000,00, R$ 4.500,00,
R$ 10.000,00, R$ 20.000,00.

ESTUDO 1 - APORTE DE R$ 4.500,00 POR MÊS

Iremos para fins de maiores detalhes, começar com o estudo


considerando um aporte de R$ 4.500,00. Iremos apresentar
informações da planilha (disponibilizada aos alunos) e dados da
ferramenta Aportador dentro do AGF+.

A plataforma AGF+, junto com o Aportador, conforme dito anteriormente,


ajuda as pessoas na construção e na conquista de metas da carteira
previdenciária. Quem já conhece o AGF+ sabe que, ao logar pela primeira
vez, é preciso responder qual renda com que a pessoa quer se aposentar e
em quanto tempo. Logo após, já é calculado o aporte mensal necessário
para se aposentar no período determinado pelo usuário. Nesse primeiro
estudo, foi informado que a pessoa gostaria de se aposentar em 20 anos
com R$ 10.000,00 de renda. Com base nisso, o Aportador informou que
seria necessário um aporte mensal de R$ 4.480,11, que arredondamos
para R$4.500,00, conforme imagem abaixo:

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CALCULANDO A META EM NÚMERO DE AÇÕES MANUALMENTE

Uma das grandes dúvidas é como calcular a meta em número de ações.


Apesar de ser muito simples as pessoas sempre têm essa dúvida. Vamos
pegar nosso exemplo acima, no qual a pessoa deseja se aposentar
recendo R$ 10.000,00 por mês, o que resulta em R$ 120.000,00 por ano
(R$10.000 X 12). Se eu tenho na carteira três empresas, quer dizer então
que desejo receber R$40.000,00 de cada uma (120.000/3). Agora,
precisamos saber qual é o dividendo por ação médio dos últimos 6 anos
dessas empresas. Essa informação de dividendos históricos anuais pode
ser obtida no site de RI das companhias ou dentro do AGF+.

Se somarmos todos esses proventos de VIVT3 dos últimos 6 anos e


dividirmos por 6, temos então o valor de 3,2411. Esse é o DPA médio.
Fazendo isso com cada uma das empresas temos os seguintes DPAs
médios:

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Agora basta dividir o valor em dividendo desejado por cada empresa pelo
DPA médio para achar qual a meta em número de ações. Exemplo VIVT3:
(40.000/3,2411) = 12.341 ações. Ao final temos as seguintes metas
conforme tabela a seguir:

CALCULANDO A META EM NÚMERO DE AÇÕES AUTOMATICAMENTE

O interessante é que, quanto mais as cotações caem, mais rápido você


consegue atingir as metas, pois você tem a possibilidade de comprar um
maior número de ações com o mesmo valor aportado. Esse é um dos
motivos pelo qual torcemos para que as cotações caiam ou pelo menos
fiquem estáveis. As metas podem sofrer alterações à medida em que a
média anual se altera. E essa é uma das grandes vantagens do Aportador
dentro do AGF+, pois ele consegue atualizar isso de forma dinâmica e
automática, na medida em que temos novos valores de DPA. Abaixo
temos a visão do Aportador com o cálculo de metas do número de ações.
Veja que os números são idênticos ao cálculo manual das metas.

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Vale a pena ainda dizer que no Aportador, à medida que você adiciona
novas empresas na sua carteira, a distribuição de metas já é feita
automaticamente de acordo com o número de empresas. Observe na
imagem acima que o Aportador automaticamente já nos deu a informação
de qual a meta em cada uma das empresas em número de ações para
alcançar o objetivo. Definida as metas, começamos a comprar as
empresas mês a mês ao longo de 2013 até 2022, com nossos aportes
mensais de R$ 4.500,00. Para que o documento não se ocupe com muitos
números da planilha optamos por omitir alguns dados. Mas todos eles
estão disponíveis na planilha que complementa nosso treinamento.

Aportes:

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Dividendos recebidos mês a mês:

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Resultado acumulado ano a ano:

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Observe acima que tivemos em 2022 um total em dividendos de R$
164.996,59, o que daria uma média de R$ 13.749,22 por mês em
dividendos. Em relação ao seu aporte inicial de R$ 4.500,00, significa que
só a partir dos dividendos recebidos foi possível aumentar o aporte em
mais de 36 vezes, já que com os dividendos recebidos foi feito o
reinvestimento. Vale lembrar que a meta inicial era uma aposentadoria de
R$ 10.000,00 por mês. Significa que atingimos nossa meta no 9o ano,
obtendo em 2021 uma média de R$ 10.455,00 reais mensais. Já em 2022,
ultrapassamos bastante nossa meta, com uma média de R$ 13.749 por
mês. Isso significa que já atingimos 137,5% em relação à meta de R$
10.000,00 por mês. Veja também que em 10 anos nosso desembolso total
foi de R$ 716.020. Ou seja, somente o total de dividendos que recebemos
nos últimos 10 anos (R$ 542.192) representa quase 76% do que foi
investido.

Por último, mas não menos importante, nosso YoC (Yield on Cost), que são
os dividendos recebidos nos últimos 12 meses dividido por nosso
desembolso, representou a incrível marca de 23,04%.

RESULTADO DAS METAS AO FINAL DE 10 ANOS

Concluído o período de 10 anos, vejamos como ficam nossa posição e as


metas inicialmente definidas:

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Observe que em 10 anos atingimos 89% da meta em VIVT3, 33% em
BBAS3 e 193% em TAEE11. Para o Banco do Brasil, atingimos uma meta
bem mais baixa do que as outras empresas, devido a termos passado
alguns anos sem comprar a empresa, já que ela não atendida nossas
premissas.

Uma dúvida que muitos podem ficar no momento é como conseguimos


atingir nossa meta de renda em 9 anos se não atingimos completamente o
número de ações estabelecido? Isso acontece porque muitas vezes a
premissa de 6% se mostra conservadora. E como ela é conservadora, o
normal é você atingir a meta antes. Lembre-se que tínhamos estabelecido
uma aposentadoria em 20 anos, que na verdade aconteceu em 9.

Vejamos como ficaram as metas no Aportador:

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GRÁFICOS DE EVOLUÇÃO NO APORTADOR
O Aportador dentro do AGF+ consegue ainda trazer gráficos sobre a
evolução do investidor ao longo do tempo. Veja a seguir como os gráficos
mostram uma evolução clara e constante:

Observe como o efeito do reinvestimento dos dividendos aumenta


consideravelmente o aporte ano a ano.

A meta anual de dividendos vem em uma linha crescente até atingir a


nossa meta de R$ 120.000 no ano. Temos também a informação de YoC
(Yield on Cost) de cada empresa:

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Os aportes e proventos pagos por cada empresa ao longo do tempo:

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E essa é a concentração percentual em cada empresa até na data final:

ALGUMAS OBSERVAÇÕES IMPORTANTES

De acordo com esse estudo, ao longo dos anos o investimento chegou a


R$ 716.020,04 (valor resultante da multiplicação de R$ 4.500,00 em 120
meses e considerando os ajustes de inflação a cada ano). Em 2022,
recebemos R$ 164.996,59, o que representa um Yield on Cost (YoC) a
partir do valor investido de 23,04%. No cenário atual em que vivemos,
com a Selic próxima de 14%, é uma ótima renda em relação ao
investimento inicial, o que só mostra o poder dos dividendos ao longo do
tempo. Em um projeto de carteira previdenciária, não temos como
objetivo a análise de rentabilidade no período, mas para fins educacionais
vejamos quanto tivemos de rentabilidade no período a partir da cotação
das empresas na data de hoje.

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Se considerarmos nosso desembolso de R$ 716.020,04, temos então uma
rentabilidade em 10 anos de 113,80%. Adicionando os proventos temos
quase 189%. Quem disse que empresas de dividendos não crescem? ;)

RESULTADO DE OUTROS ESTUDOS: APORTES DE R$ 500,00,


R$ 1000,00, R$ 2000,00, R$ 10.000,00 e R$ 20.000,00

Para que esse estudo não fique muito extenso e cansativo, iremos poupar
o leitor do detalhamento realizado no estudo anterior. Iremos apresentar
aqui somente os resultados em recebimento de dividendos de acordo com
cada valor de aporte, já que a planilha estará disponível para que
todos simulem e vejam os valores.

Aporte de R$ 500,00:

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Aporte de R$ 1.000,00:

Aporte de R$ 2.000,00:

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Aporte de R$ 10.000,00:

Aporte de R$ 20.000,00:

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CONCLUSÃO
Começamos este Módulo conhecendo conceitos mais teóricos e o
encerramos com o estudo prático, no qual pudemos observar que a
construção de uma carteira previdenciária focada em dividendos é
completamente viável e atingível. Bastando que o investidor tenha foco,
paciência e disciplina ao longo do tempo.

Fica muito claro que há dois fatores determinantes para acelerar a


conquista das metas: aporte e tempo. Aportes maiores permitem atenuar
o fator tempo para quem começa a investir mais tarde. Por isso, é muito
importante aumentar o máximo possível o aporte. Com foco e disciplina
você atingirá mais rapidamente as metas estabelecidas. A planilha está
disponível aos alunos para que todos possam ter a oportunidade de
simular o aporte de acordo com a realidade de cada um. Esperamos que
com esse estudo abra seus olhos para começar uma carteira
previdenciária e atingir, o quanto antes, a tão sonhada liberdade
financeira.

Apostila atualizada em 17/02/2023

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