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4.9. Esse caráter cíclico do assédio reforça a necessidade de que situações de menor
reprovabilidade sejam desde logo combatidas, de modo a se evitar o aumento progressivo da tensão e, de
consequência, o alcance de situações de extrema gravidade.
4.10. Entretanto, é necessário se valer de balizas objetivas e precisas quando da análise do tema,
para que se evite incorrer em dois erros graves, os quais a atividade correcional está permanentemente
sujeita a cometer: i) de um lado, tem-se o risco de punir com sanções mais brandas (advertência ou
suspensão) condutas gravosas que violem frontalmente a dignidade das vítimas; ou ii) de outro, tem-se o
risco de punir com sancionamento máximo (penalidades expulsivas) condutas não caracterizadas por
especial gravidade, as quais, embora gerem desconforto ou inconveniência no ambiente de trabalho ou de
prestação de serviço público, não violam bens jurídicos mais sensíveis, não causando danos significativos
à dignidade sexual, honra ou intimidade das pessoas por elas atingidas.
4.11. Para tanto, importante se guiar por parâmetros minimamente objetivos e precisos para a
exata compreensão da natureza da conduta (sempre, repita-se, destacando-se a necessidade de extremo
zelo e cuidado na apreciação dos fatos, para que cada conduta seja avaliada diante dos elementos do caso
concreto, sobretudo à luz do impacto causado às vítimas, devendo-se evitar proceder a categorizações
abstratas das condutas; necessário, portanto, abster-se da tentativa de buscar definir, prévia e
abstratamente, qual conduta seria leve e qual seria grave).
4.12. Nesse intento de se buscar parâmetros minimamente precisos para a compreensão da
situação, na análise concreta da conduta imprópria de teor sexual pode-se utilizar como inspiração o
seguinte quadro, retirado do mesmo material didático acima mencionado, e adaptado do trabalho de
4.13. Entretanto, ressalte-se pela terceira vez: mesmo condutas abstratamente consideradas de
baixo ou médio grau de reprovabilidade têm potencial para resultar em danos irreparáveis à saúde mental,
psicológica e sexual das vítimas, razão pela qual se repete o destaque quanto à necessidade de extremo
zelo e cuidado na apreciação dos fatos, para que cada conduta seja avaliada diante dos elementos do caso
concreto, sobretudo à luz do impacto causado às vítimas, devendo-se evitar proceder a categorizações
abstratas das condutas, não sendo correto buscar definir, prévia e abstratamente, qual conduta seria leve e
qual seria grave. O diagrama acima exposto serve apenas de ponto de partida e orientação para a
análise, cuja essência depende necessariamente da análise dos elementos presentes em cada caso concreto.
4.14. E, a partir de toda a análise acima empreendida, apresenta-se a seguinte sugestão para o
tratamento disciplinar das condutas sexuais impróprias praticadas no ambiente de trabalho ou que tenham
repercussão sobre ele ou sobre outros agentes públicos: para fins de tipificação de infrações
disciplinares, propõe-se, nos termos do Parecer nº 0015/2023/CONSUNIAO/CGU/AGU, uniformizar-se
o entendimento no sentido de utilizar a expressão "assédio sexual" apenas em referência às condutas de
natureza sexual, não consentidas, que tenham como efeito causar constrangimento e prejuízo a bens
jurídicos relevantes, tais como a dignidade, a intimidade, a privacidade, a honra e a liberdade sexual de
outro agente público ou de usuário de serviço público. Daí decorre que, configurado o assédio sexual
nesta perspectiva, impõe-se o enquadramento da conduta como infração disciplinar grave (art. 117,
IX – Valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função
pública – ou art. 132, V – Incontinência pública e conduta escandalosa, na repartição), em face das quais
se obriga a autoridade competente à aplicação de penalidade expulsiva, sem qualquer margem de
discricionariedade para dosimetria diversa.
4.15. Sobre a capitulação específica da conduta em análise, o mencionado Estudo Temático da
CGU oferece importantes subsídios doutrinários, complementares àqueles já destacados no Parecer nº
0015/2023/CONSUNIAO/CGU/AGU, transcritos nos itens 3.5 e 3.6, supra, conforme se verifica no
seguinte trecho (p. 5 – destacou-se):
A doutrina distingue dois tipos de assédio sexual: assédio por chantagem e assédio
por intimidação.
Assédio sexual por chantagem ou quid pro quo é o que ocorre quando há a exigência de
uma conduta sexual, em troca de benefícios ou para evitar prejuízos na relação de trabalho.
Assédio sexual por intimidação ou ambiental é o que ocorre quando há provocações
sexuais inoportunas no ambiente de trabalho, com o objetivo de prejudicar a atuação laboral de
uma pessoa ou de criar uma situação ofensiva, de intimidação ou humilhação.
4.16. Nesse contexto, pode-se associar o chamado assédio sexual por chantagem à tipologia de
"valimento do cargo" (art. 117, IX), e o assédio sexual por intimidação ou ambiental à "incontinência
pública e conduta escandalosa" (art. 132, V), na linha do que já foi bem desenvolvido e explicado no
citado Parecer Vinculante.
Nota Técnica 3285 (2980925) SEI 00190.108994/2023-16 / pg. 6
4.17. Por outro lado, recomenda-se a utilização apenas da expressão "outras condutas de
conotação sexual" para os demais casos de condutas de médio ou baixo grau de reprovabilidade,
desagradáveis e prejudiciais ao ambiente de trabalho, mas que não configuram grave ofensa à moralidade
administrativa nem afronta direta aos bens jurídicos mencionados no parágrafo anterior – as quais poderão
configurar infrações disciplinares leves ou intermediárias, sujeitas às penalidades de advertência ou
suspensão.
4.18. Assim, na linha dos argumentos até aqui levantados e para fins de padronização, sugere-se a
adoção das seguintes nomenclaturas:
a) "condutas de conotação sexual" , expressão genérica que se refere tanto ao "assédio
sexual" como às condutas de menor grau de reprovabilidade ‒ trata-se de gênero que
engloba as duas espécies de condutas descritas nos itens a seguir;
b) "assédio sexual", expressão destinada a representar condutas graves, de maior grau de
reprovabilidade, que devem necessariamente resultar na aplicação de penalidades
expulsivas; e
c) "outras condutas de conotação sexual", expressão representativa de condutas de médio
ou baixo grau de reprovabilidade, passíveis de sancionamento com as penas de
advertência ou suspensão.
4.19. Nesse cenário, sugere-se o seguinte escalonamento quanto ao enquadramento disciplinar
das condutas analisadas na presente manifestação:
Consequência (atuação
Gradação da conduta Enquadramento recomendada para a
Administração Pública)
Violação aos deveres previstos
Situações de baixa ou média
no art. 116, incisos III, IX e XI Aplicação de sanção
reprovabilidade social, não atentatórias
(sem prejuízo de possíveis disciplinar de advertência
à liberdade sexual ou à dignidade do
outros enquadramentos, a ou suspensão até 90 dias
ofendido
depender do caso concreto)
Condutas de Assédio sexual (Parecer nº
conotação 0015/2023/CONSUNIAO/CGU/AGU):
sexual 1) Valimento do cargo para obtenção
de vantagem sexual; Art. 117, IX e 132, V (quando
2) Todas as condutas descritas no presentes os elementos
Aplicação de sanção
Título VI do Código Penal - Dos caracterizadores de cada tipo,
disciplinar expulsiva
crimes contra a dignidade sexual; nos termos do mencionado
3) Situações de elevado grau de Parecer)
reprovabilidade social, que ofendem
gravemente a moralidade
administrativa.
4.20. Sugere-se, também, de consequência, a adoção das medidas necessárias para adequar à
presente sugestão as nomenclaturas adotadas nos sistemas correcionais existentes no âmbito do SISCOR
(notadamente, o Sistema E-Pad e o Banco de Sanções).
5. CONCLUSÃO
5.1. Diante de todo o exposto, apresentam-se as seguintes conclusões:
a) A atividade correcional deve voltar suas atenções e sua atuação no sentido de prevenir
e combater qualquer conduta imprópria de teor sexual, não consentida, praticada no
exercício da função ou a pretexto dela, que contribua, mesmo que de forma leve, para a
deterioração do ambiente de trabalho, abrangendo em tal escopo desde condutas graves
(estupro, importunação sexual, contato físico íntimo indesejado, etc.) até condutas de
baixo ou médio grau de reprovabilidade (piadas ou conversas indesejáveis de conteúdo
sexual) que tenham potencial para causar prejuízos às relações de trabalho e à
manutenção de um ambiente laboral saudável e íntegro, desde que não configurem
utilização do cargo para obtenção de vantagem sexual;
Documento assinado eletronicamente por JOSE TRINDADE MONTEIRO NETO, Auditor Federal de
Finanças e Controle, em 16/10/2023, às 22:54, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no §
3º do art. 4º do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.