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GUARULHOS – SP
SUMÁRIO
3
Inezil Penna Marinho escreveu várias obras sobre História da Educação Física e
do Esporte brasileiros, um fato inédito, visto que no período anterior os autores
reportavam-se basicamente a reproduzir estudos produzidos por autores estrangeiros
cujas temáticas desenvolvidas referiam-se, sobretudo, a história do Esporte e da
Educação Física em outros contextos como, por exemplo, na Grécia Antiga, e na Idade
Média ou, então, na França, na Alemanha, nos Estados Unidos, entre outros. Inezil
marcou a diferença pois escreveu sobre a Educação Física e o Esporte no Brasil incluindo
ainda a capoeira.
Fonte: grupoescolar.com
Para além de Inezil, outros autores também se farão presentes nessa segunda
fase, que se diferencia da anterior exatamente pelo desenvolvimento de pesquisas
relacionadas ao contexto nacional. A concepção historiográfica que sustenta essas
pesquisas é marcada, como na fase anterior, pela descrição e memorização de fatos,
data se nomes sem haver uma análise do material pesquisado compondo, o que Peter
4
Burke (1991) denominou como história episódica. Na análise desenvolvida por Janice
Mazo,
5
Tanto quanto a vertente marxista, outras abordagens teóricas e metodológicas
começaram a frutificar na área cujas pesquisas foram e ainda são frequentemente
citadas, nas ementas que constituem a disciplina de História da Educação Física e/ou
Esporte em vários cursos de formação.
Aportes teóricos advindos da Escola dos Analles, Micro História, História Oral,
História Cultural, Nova História, História Social, História do Cotidiano, História Pós
Estruturalista, História das Mulheres, tornam-se visíveis nos estudos e pesquisas
desenvolvidos na Educação Física brasileira indicando um movimento de “renovação
historiográfica” quando comparadas às etapas anteriores nas quais a História factual e
descritiva mantinha certa dominância no campo. Renovação essa que pode ser
creditada, segundo Janice Mazo, a expansão dos cursos de Pós-Graduação em
Educação Física nas universidades brasileiras a partir da década de 1990 possibilitando
a ampliação de estudos historiográficos. “Percebe-se, a partir deste movimento, uma
atitude mais cuidadosa dos pesquisadores com relação ao campo da produção
historiográfica no que tange aos pressupostos teóricos eleitos, à produção discursiva e à
construção de novas narrativas através das fontes (GOELLNER ET AL, 2010, p. 390).
Feita essa breve referência à inserção do conhecimento e da pesquisa
historiográfica na Educação Física brasileira, considero importante registrar que esse
caminhar não se deu de modo contínuo e linear.
Se olharmos as ementas das disciplinas e as investigações em desenvolvimento
nos dias atuais é possível identificar todas as abordagens aqui mencionadas, inclusive,
a da História Episódica com ênfase nos seus aspectos descritivos e factuais. Isso se dá
porque, como já mencionei anteriormente, a História não é sinônimo de história. Ou seja,
aquilo que se registra do passado não necessariamente é aquilo que aconteceu no
passado ou ainda não é o próprio passado.
7
Fonte: hoje.unisul.br
8
Se a História é uma narrativa que tanto pode dizer do passado como também
ocultá-lo não há possibilidade alguma de pensar que exista uma História da Educação
Física e/ou Esporte senão em Histórias. Lembremos que aquilo que nos chega do
passado não é o passado em si, mas o registro que alguém fez dele. Nas palavras de
Jenkins “o passado que “conhecemos” é sempre condicionado por nossas próprias
visões, nosso próprio “presente“. Assim como somos produtos do passado, assim
também o passado conhecido (a história) é um artefato nosso. Ninguém, não importando
quão imerso esteja no passado, consegue despojar-se de seu conhecimento e de suas
pressuposições” (2004, p. 33).
Pensando especificamente no campo da História da Educação Física e/ou Esporte
é possível vislumbrar um horizonte pleno de multiplicidades, de interpretações, de
olhares, de formas de narrar vários acontecimentos como, por exemplo, história de
diferentes modalidades esportivas, de instituições 45 (clubes, associações esportivas,
comitês olímpicos, federações e confederações), pessoas (atletas, técnicos, dirigentes,
professores, etc), eventos, competições de nível internacional, nacional, regional e local.
A história de um clube, por exemplo, pode ser narrada apenas ressaltando seus
dirigentes, suas conquistas e glórias, seus méritos. Como também, dependendo de quem
registra essa história, pode evidenciar as disputas de poder, os fracassos e insucessos,
ou seja, àquilo que está nas zonas de sombra da trajetória dessa instituição. Jenkins,
outra vez, nos ajuda a pensar sobre esse aspecto quando afirma que:
Não é possível relatar mais que uma fração do que já ocorreu, e o relato de um
historiador nunca corresponde exatamente ao passado: o simples volume desse
último inviabiliza a História total. A maior parte das informações sobre o passado
nunca foi registrada, e a maior parte do que permaneceu é fugaz. (...) A História
depende dos olhos e da voz de outrem; vemos por intermédio de um intérprete
que se interpõe entre os acontecimentos passados e a leitura que dele fazemos
(2004, p.30-32).
A participação das mulheres no esporte ilustra muito bem essa afirmação. Basta
ler muitos documentos que se propõem a contar a história de várias modalidades
esportivas e o que encontramos é a narrativa histórica dos homens! Pouca ou nenhuma
menção se faz as mulheres, como se elas não tivessem participação alguma na
estruturação do esporte brasileiro. Com isso quero afirmar que a falta de registro sobre
9
as mulheres no esporte não significa a sua ausência, mas a ausência de registros sobre
essa participação.
Um bom exemplo para refletir sobre essa questão é o Museu do Futebol, localizado
no Estádio do Pacaembu, em São Paulo cuja missão é “investigar, divulgar e preservar
o futebol como manifestação da cultura brasileira”10. O que se vê ao percorrer seus
acervos e exposições é que esse museu tematiza o futebol praticado por homens11. A
participação das mulheres é silenciada como se elas não estivessem, há muito tempo,
atuando na modalidade, seja como jogadoras, treinadoras, espectadoras, torcedoras,
gestoras, árbitras, enfim, como se não fizessem parte dessa História.
Dado esse exemplo, quero enfatizar que é impossível tomar a História da
Educação Física e/ou Esportes no singular pois são muitos os seus temas, objetos,
problemas, instrumentos analíticos e fontes. A tarefa de registrar a história, grosso modo
atribuída aos historiadores, possibilita múltiplas interpretações de um mesmo
acontecimento cujo resultado (ou seja, a narrativa) vai depender “das fontes existentes,
dos recursos teórico-metodológicos escolhidos e de um olhar, dentre vários outros
possíveis, marcado por nossa atualidade, vale dizer, por nossa inserção cultural e social,
enfim, por nossa própria subjetividade” (RAGO, 2004, p. 10).
Nas palavras de Sandra Pesavento “tudo o que foi um dia poderá vir a ser contado
de outra forma, cabendo ao historiador elaborar uma versão plausível, verossímil de
como foi. Mesmo admitindo uma certa invariabilidade no ter sido, as formas de narrar o
como foi são múltiplas e isso implica colocar em xeque a veracidade dos fatos” (2003, p.
51). Nesse sentido é possível afirmar que o trabalho historiográfico busca se aproximar
o máximo possível do que aconteceu um dia e que o historiador pode relatar um tempo
transcorrido mesmo que esse mesmo tempo ou fato relatado possa ser objeto de outras
tantas versões. A História, portanto, não trabalha com “a verdade”, mas com a
verossimilhança.
A impossibilidade de uma História no singular é uma boa justificativa para o
incentivo ao estudo e à pesquisa nos cursos de formação em Educação Física na medida
em que poderá fomentar a emergência de outras versões sobre algum tema já
investigado ou ainda de novos temas como, por exemplo, investigações sobre contextos
10
locais e regionais, sobre diferentes etnias, sobre pequenos clubes e associações
esportivas, entre outras possibilidades.
Fonte: blogeducacaofisica.com.br
11
não se pode modificar, apenas compreender. O presente, no entanto, é algo em
construção cuja história depende também de nossa ação1.
1
GOELLNER, Silvana Vilodre.. In: VILODREGOELLNE, Silvana. A Importância do conhecimento
histórico na formação de professores de educação física e a desconstrução da história no singular.
[S. l.], 2012. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/kinesis/article/download/5721/3935. Acesso em: 12
ago. 2019.
12
epidemias devido à ausência de condições básicas de sobrevivência, além de uma
quantidade enorme de mão de obra sem qualificação, analfabeta, para manusear as
máquinas nas fábricas e posteriormente as pressões dos operários por direitos a
cidadania. A Educação Física segundo Herold Junior (2005, p.5) aparece nos
documentos escritos na época como uma solução para curar as mazelas sociais e
acelerar o processo de transformação.
No ambiente escolar a Educação Física surge a partir da metade do século XIX
sob forte influência da Instituição médica, militar e posteriormente também do movimento
pedagógico escolanovista, que estava sendo importado pelos intelectuais brasileiros na
preocupação de uma educação que acabasse com as mazelas sociais, valorizando o
processo de ensino focado nas necessidades e nos interesses dos alunos.
A escola nova bastante difundida entre os educadores acabou segundo Saviani
[...] provocando o afrouxamento da disciplina e a despreocupação com a transmissão de
conhecimentos, acabou por rebaixar o nível do ensino destinado às camadas populares
as quais muito frequentemente tem na escola o único meio de acesso ao conhecimento
elaborado. Em contrapartida, “a escola nova” aprimorou a qualidade do ensino destinado
às elites. (1993, p. 22).
O movimento escolanovista aparece para contribuir com o dito desenvolvimento
do Brasil. Nesse período os intelectuais e os políticos acreditavam que dependeria de
instruir e educar o povo, tido e havido por analfabeto, doente e despreparado para as
novas formas de trabalho industrial, organizado sob a lógica capitalista de produção
(VAGO, 1999, p. 31). Para tanto precisariam que as escolas consideradas inoperantes
atingissem a tríade educação intelectual, moral e física. Esse era o espaço que iria ditar
o que seria importante para os estudantes e consequentemente para a sociedade.
13
Fonte: acervo.oglobo.globo.com
[...] era entendida como atividade exclusivamente prática, fato este que contribuiu
para não diferenciá-la da instrução física militar. Certamente, também não houve
uma ação teórica-prática de crítica ao quadro apontado, no sentido de
desenvolver um corpo de conhecimento científico que pudesse imprimir uma
identidade pedagógica à Educação Física no Física no currículo escolar. (1992,
p.53).
14
A grande aceitação dos esportes pela população culmina com o surgimento de
novas tendências e possibilidades para as aulas de Educação Física a partir do final do
Estado Novo, superando o método oficial- francês. Segundo Coletivo de autores (1992,
p.54) destaca como concorrentes o método Austríaco e principalmente a Desportiva
Generalizada, sistematizado na Inglaterra e divulgado no Brasil por Auguste Listello. As
aulas de Educação Física deixam de ser desenvolvidas sob a rigidez alienante dos
militares, e passa a ser confundida com simples práticas esportivas desprovidas de
significados sociais para os alunos, já que as aulas tornaram um prolongamento da
instituição esporte. O professor que na verdade era instrutor pelas influências militares e
o aluno recruta agora a relação é professor treinador e aluno atleta (COLETIVO DE
AUTORES, 1992, p.54).
Com a promulgação em 1961 da lei de Diretrizes e Bases da Educação, tornando-
a obrigatório no ensino primário e médio, as crises políticas e econômicas que ocorreram
no país e a diminuição do investimento estatal em políticas sociais, fortaleceram o esporte
como conteúdo único das aulas de Educação Física.
Durante a ditadura militar grande foi à repressão às mobilizações dos setores
organizados da sociedade, mas contraditoriamente, de incentivo as práticas corporais
inclusive as coletivas, como a criação do programa Esporte Para todos. Nesse momento
histórico a educação institucionalizada, passa sob fortes influências tecnicista. A escola
possuía o papel de ensinar a fazer, sendo uma das formas de contribuir com a qualidade
da mão de obra do mercado de trabalho brasileiro. Isso veio a fortalecer o esporte nas
escolas, contribuindo com muita eficiência como afirma Linczuk (2000) para com os
interesses dominantes, em formar jovens “dóceis e saudáveis” e preparados para uma
sociedade competitiva.
O desporto usado como ferramenta política pelo Estado possui plena aceitação
dos professores de educação física, no qual Carvalho (1994, p. 24) diz que “não é o
desporto que é alienante e servil à classe dominante, mas os professores que trabalham
as práticas desportivas sob a égide de uma ideologia voltada para a alienação dos
indivíduos” quase sempre é usado para escamotear a realidade dos “chutadores de bola”,
estudando o não como um fenômeno social construído historicamente com significados
diferentes nesta sociedade de classes, mas simplesmente como atividade biológica que
15
proporciona divertimento e descanso com nenhum desenvolvimento humano efetivo nas
suas vivencias seja elas passivas ou ativas.
Surge então com esse pensamento, vindos dos questionamentos ao modelo
opressor vigente no país, uma necessidade por uma formação profissional que contribua
para a necessária transformação social clamada pela população, tendo o desporto como
um dos elementos para essa mudança. Logo, surge o movimento renovador da Educação
Física que comunga com o esse processo de mudança social do país.
A educação física que ocorria na escola não podia ser aquela com características
militares, e este profissional precisava mostrar que, para além do gesto, existia um
movimento diante de um tempo e de um espaço onde: o corpo (ser humano) que
realizava o movimento precisava ser conscientizado sobre o grupo (classe social), que
fazia parte de um espaço (contexto sociohistorico político) que precisava ser
transformado em busca de uma necessária justiça e igualdade para todos”. (MORAES E
ALMEIDA, 2004, p.159).
Essa preocupação com a Educação Física como prática social começa a emergir
na década de 70 e início dos anos 80, reflexos das mudanças clamadas pela população
no período, da ascensão do pensamento pedagógico de esquerda no país. Movimentos
progressistas intensificam o debate para a superação da Educação Física enquanto
disciplina meramente prática. Logo na Educação Física instaura-se uma crise de
identidade pela “[...] constatação de dependência de outras disciplinas cientificas e do
desejo de torna-se ciência” (BRACHT, 1999, p. 30).
Os anos 80 são considerados férteis para a Educação Física brasileira, com um
aumento significativo na produção cientifica, possibilitando o seu entendimento para além
dos aspectos biológicos do ser humano. Ela que até então se prestava para a adaptação
do ser humano a ordem oficial, adquirindo um caráter reprodutivista, começa a fornecer
elementos para criticar-la e então vislumbrar a superação do estado de exploração das
camadas populares.
No entanto, esse mesmo movimento que serviu como suporte para a elaboração
da proposta do coletivo de autores- Critico Superadora na década de 90, não avançou
muito nesse período, já que apesar da abertura para o conflito na qual a análise da
Educação Física desenvolve-se não somente para sustentabilidade do status quo da
16
burguesia, mas com um olhar para o ser humano, predominou segundo Caparroz (1997,
p. 10), “[...] denuncia do estabelecido, sem que houvesse um mergulho mais intenso na
análise das práticas pedagógicas efetivas [...]”. Muitos foram às discussões sobre a
importância da Educação Física, mas poucas foram às ações efetivas que se
concretizaram em ações reais nas escolas durante a década de 80.
Apesar dos discursos desvinculados do modelo hegemônico, a sistematização de
uma proposta que rompesse com o modelo tradicional de Educação Física se encontra
distante da realidade de muitos professores. Aquele grupo de autores que buscou na
cultura corporal avançar na fundamentação da Educação Física na escola a favor do
desenvolvimento dos estudantes como ser autônomo e capaz de transformar a realidade,
ainda não se materializou no interior da escola.
Rocha Junior (2000, p. 15) ao analisar a proposta do coletivo de autores diz que
[...] na tarefa de apresentar um modelo diferente os autores acabam por também cair na
relação funcionalista que criticam, pois entendem que a educação, e no caso a educação
física, devem estar a serviço da mudança social numa perspectiva transformadora.
A proposta do coletivo de autores foi elaborada a partir da perspectiva pedagógica
histórico- critica “[...] que se diferencia da visão crítica reprodutivista, uma vez que procura
articular um tipo de orientação pedagógica que seja crítica, sem ser reprodutivista”.
(SAVIANI, 1995, p. 77). A teoria critico reprodutivista, limita-se a criticar a realidade, a
constatar que esta é imutável, pois não consegue avançar como proposta de intervenção.
17
Fonte: revistahcsm.coc.fiocruz.br
18
doença; a atividade física entendida como a execução de práticas físicas por meio de
modalidades esportivas” (CARVALHO, 2000, p. 32). A saúde é vista como algo estático,
de responsabilidade dos indivíduos que através da pratica da atividade física terá uma
melhoria na qualidade de vida, mesmo sendo o indivíduo explorado como mão de obra,
mesmo continuando sem ter uma educação de qualidade, sem saneamento básico,
mesmo sendo desempregado ou sem teto. A percepção restrita da Educação Física
produtora de saúde, existe pela segregação da profissão existente na década de 80 deste
séc. Ou pelas condições de existência dos seres humanos do séc. XVIII, XIX, XX e
também XXI.
A divisão criada é um fenômeno que contribui para legitimar a ação “despolitizada”
dos professores de Educação Física, mas tal necessita ser superada, pois são indivíduos
de uma mesma classe que independente do espaço de atuação, escola, clubes,
academias lutam pelos mesmos objetivos, a transformação da nossa realidade.
As preocupações mais abrangentes com as questões sociais discutidas e
desenvolvidas pelos professores e pesquisadores da educação institucionalizada
necessitam avançar e serem incorporados pelos agentes de outros ambientes e estes
atuantes nas escolas precisam prosseguir com propostas metodológicas concretas na
sistematização dos conteúdos da Educação Física escolar (ALMEIDA E MORAES,
2003).
Desde a gênese da Educação Física na Europa percebemos que a maioria da
população é explorada por uma minoria, sendo poucos os momentos de construção de
alternativas ao modelo opressor. O canto da sereia é bastante forte tanto que vários não
resistiram e preferiram não enxergar tanta diferença existente entre os seres humanos
desde a origem dessa história.
A Educação Física constitui numa disciplina importante para a formação do ser
humano e precisa ser aprofundados os estudos, tanto nos espaços formais de atuação
como não formais. Por mais forte que seja os interesses precisa se encontrar
possibilidades de trabalhar com o Lazer como mecanismo de intervenção pedagógica,
contribuindo para os cidadãos conseguirem seus direitos. Perceber que a saúde está
diretamente relacionada com as condições materiais de vida dos agentes históricos, que
a educação física escolar faz parte de uma instituição de responsabilidade em formar
19
sujeitos e não marionetes do sistema capitalista e para isso necessita buscar aproximar
da realidade da população, romper com as perspectivas de fragmentação e
especialização do conhecimento produzido por ela e vislumbrar a integração e a
interação das multidimensões possibilitadas para a formação humana 2.
Os Jogos Olímpicos originais duraram mais de mil anos, de 776 antes de Cristo a
395 depois de Cristo. Mesmo antes disso já existiam competições parecidas, mas só a
partir de 776 a.C. há registo oficial dos jogos. Assim como a imitação moderna, as
Olimpíadas, os jogos eram realizados de quatro em quatro anos. Uma diferença com os
jogos de hoje é que antigamente o local era sempre o mesmo: a cidade de Olímpia, na
Grécia.
2
MATIAS, Wagner Barbosa. Panorama histórico da Educação Física no Brasil: primeiras
aproximações. EFDeportes.com: [s. n.], 2012. Disponível em:
https://www.efdeportes.com/efd164/panorama-historico-da-educacao-fisica.htm. Acesso em: 19 ago. 2019.
20
Fonte: turismogrecia.info.com.br
21
Olímpia tornou-se uma cidade sagrada, assim como hoje Jerusalém, ou Meca, e
a ida aos jogos era tanto um divertimento quanto uma peregrinação religiosa. É um pouco
difícil de entender, porque na nossa cultura, desporto e religião são totalmente
separados. No entanto, para o grego daquele tempo, Olímpia seria uma espécie de
Vaticano, onde também estivesse o estádio do Maracanã.
Existem ruínas de Olímpia, e descrições antigas, que dão uma ideia do que era
esse complexo desportivo-religioso, com vários estádios e templos. No principal templo,
o de Zeus, havia uma estátua de marfim e ouro representando esse deus, estátua essa
que media 13 metros de altura e era considerada uma das sete maravilhas do mundo
antigo.
Embora viajar, naquele tempo, fosse tão mais difícil do que hoje, vinham milhares
de pessoas, por terra e por mar, para assistir aos jogos. Até de colónias gregas distantes,
como a África ou a Espanha, vinham viajantes. Um contemporâneo disse que "você vai
a Olímpia e morre de calor, é amassado pela multidão, passa fome e sede, toma chuva
e morre de frio, mas apesar disso vale a pena ir para ver espetáculos tão bonitos."
A Grécia não existia como país - era apenas uma região com cultura comum, mas
com cidades independentes entre si. Essas cidades viviam em guerra entre si, mas
durante o período dos Jogos havia uma trégua, respeitada por todos. A cada quatro anos,
assim que se determinava a data do início dos jogos (que era baseada na lua cheia),
emissários saiam de cidade em cidade, a divulgar a data. Inicialmente a trégua era de
um mês, mas depois foi aumentada para dois meses, e mais tarde três, para proteger os
viajantes que tinham de vir de longe.
Só homens podiam competir nos Jogos antigos. Para evitar que alguma mulher se
fingisse de homem para competir - o que podia acontecer, pois nalgumas das cidades
gregas mulheres eram soldados - deu-se uma solução simples: todo mundo nu. Todos
competiam nus, em todas as modalidades de competição. Mulher podia, no máximo,
assistir aos jogos. E isso se fosse solteira. Mulher casada não podia nem assistir. Houve
um caso de uma mulher, viúva de um antigo campeão, que trouxe o seu filho para
competir, fingindo-se de treinador. O filho ganhou e a mãe, entusiasmada, pulou acerca
da pista para abraçar o seu filho.
22
Foi reconhecida como mulher, mas não foi castigada em homenagem ao falecido
marido. Para evitar novos acontecimentos desse tipo, a partir desse dia também os
treinadores tinham de estar nus. Aparentemente, a razão para essa discriminação contra
as mulheres casadas era ligada ao aspecto dos jogos como ritual religioso de fertilidade.
Só as virgens eram consideradas suficientemente puras para estar presentes.
OS JOGOS
23
AS MODALIDADES
Nas primeiras vezes em que se realizaram os jogos, havia uma única competição,
que era a corrida curta. Este seria o equivalente aos 100m de hoje, só que naquele tempo
a distância era de 192 metros. A pista tinha esse comprimento e era reta. Quando mais
tarde se adicionaram corridas maiores, corria-se ida e volta nessa mesma pista. A lenda
diz que essa distância foi determinada por Hércules, fundador mítico dos jogos, e que
essa era a distância que ele conseguia correr de um só fôlego, prendendo a respiração.
Fonte: static.significados.com.br
Depois da corrida curta foi criada a dupla, ida e volta, e depois a de 24 vezes a
pista. Mais tarde veio a corrida com armadura, em que os atletas corriam usando
capacete, protetor metálico nas pernas, e carregavam um escudo redondo. Escritores da
época dizem que era muito engraçado ver aqueles homenzarrões a correr com toda essa
parafernália... e nus.
24
Muito mais tarde criou-se uma corrida de revezamento em que cada corredor, ao
acabar o seu trecho, passava ao seu companheiro de equipe uma tocha acesa. O
vencedor tinha a honra de acender a fogueira do altar de sacrifícios. Essa ideia foi usada
para a abertura dos jogos de hoje, em que um corredor chega no estádio com uma tocha
e acende uma chama simbólica.
O pentatlo era outra competição importante, introduzida em 708 a.C. Os cinco
eventos eram arremesso de disco, salto, arremesso de dardo, corrida e luta. Todos se
realizavam numa mesma tarde. Os dois últimos também aconteciam separadamente,
mas os três primeiros só existiam dentro do pentatlo.
O salto era em distância, o único salto que os gregos praticavam. Esse salto era
dado de uma posição parada, sem corrida para tomar impulso. Em vez disso usavam
dois pesos, um em cada mão, que eram jogados para frente para dar impulso. Esses
pesos se chamavam "halteres".
Um pouco mais tarde foram introduzidas as corridas de carros puxados por dois e
quatro cavalos e logo, também, a corrida de cavalos como a conhecemos hoje, com o
cavaleiro cavalgando o cavalo.
Fonte: media.istockphoto.com
27
Pode-se dizer que o desporto moderno, foi resultado de uma mudança dos
elementos da cultura corporal do movimento das classes populares e burguesas da
Inglaterra, como os jogos populares, que contava com diversos jogos com bola
(BRACHT, 2011). Conforme Sigoli e De Rose Jr. (2004):
28
No decorrer do século XIX, diversas práticas de lazer que exigiam esforços físicos
tomaram para si características do esporte moderno, com suas regras, especialmente
aquelas pautadas pelas idéias de “justiça” e na igualdade de êxito para todos, passando
a serem mais rigorosas, explícitas e diferenciadas (MARTINS; ALTMANN, 2007). Betti
(1991) afirma que as classes média e trabalhadora tiveram acesso à prática esportiva a
partir das conquistam trabalhistas, destacando-se a diminuição da jornada de trabalho, o
que acarretou em mais tempo de ócio. A partir de então ocorreu à proliferação em massa
dos clubes esportivos e organizações regionais (MCINTOSH, 1975 APUD BETTI, 1991).
Assim, a racionalização extremada, característica marcante do esporte atual, teve
início a partir da entrada da classe trabalhadora no campo esportivo e nas competições
(DA COSTA, 1988). Segundo Da Costa (1988), a burguesia sedentária, instrumentou
regras, para competir em igualdade de condições com os operários, muito mais aptos e
ativos fisicamente. Conforme o autor foi neste momento que despontaram as primeiras
noções da divisão entre profissionalismo e amadorismo na prática esportiva, com o
objetivo de segregar a classe trabalhadora, que tinha o esporte como meio de vida,
diferente da burguesia, que tinha no desporto uma oportunidade de convívio social e
prazer.
Betti (1991, p.45) afirma que em meados do século XIX o modelo esportivo
predominante era o da classe média, que deu aos vários jogos esportivos, alguns
descobertos em estado embrionário, organização, regras, técnicas e padrões de conduta
para os praticantes, em grande parte vigentes até hoje. A partir de 1857 e até o final do
século fundaram-se dezenas de associações esportivas nacionais na Inglaterra.
Para a classe empresarial na época, o esporte como alternativa nos momentos
de lazer da classe operária, se mostrou uma garantia de mão de obra produtiva e
alienada, mantendo o físico do empregado apto a suportar as longas jornadas laborais;
dando continuidade às ideias de produtividade, rendimento, respeito às regras pré-
determinadas e tempo, conceitos esses presentes nas fábricas e bases do capitalismo
moderno; como também, fomentando um “campo livre” para o trabalhador extravasar a
tensão do dia a dia, acalmando o sentimento de indignação contra as condições de vida
e trabalho, evitando assim revoltas populares (BRACHT, 2011).
29
Segundo Tubino (1993, p.19):
Outra contribuição importante para o movimento esportivo moderno, que até o final
do século XIX apresentava apenas as modalidades atletismo, o remo, o futebol, e
timidamente a natação, foi à participação da Associação Cristã de Moços, que
apresentou nos Estados Unidos os principais esportes coletivos, como o Basquetebol e
o Voleibol.
Após discorrermos sobre a origem do movimento esportivo moderno,
direcionaremos nossa pesquisa no capítulo seguinte, ao início dos Jogos Olímpicos da
Era Moderna, por considerarmos o evento como fator culminante para o desenvolvimento
do esporte quanto “fenômeno social”.
30
Fonte: s.glbimg.com
A ideologia Olímpica defendida através dos tempos pelo COI revela a profunda
influência do espírito cavalheiresco e nobre do esporte inglês do século XIX, que
Coubertain tentou universalizar através dos Jogos Olímpicos, e que hoje se
traduz no conceito de Fair-Play. [...]
32
Assim, percebendo o potencial político que o esporte tinha de mobilizar o povo, os
governos passaram a investir na especialização e treinamento de atletas como jamais
visto, levando a criação das políticas públicas para o desporto e das “Ciências do Esporte”
(BETTI, 1991; GONZÁLEZ, 1993 APUD SIGOLI; DE ROSE JR, 2004). Dessa forma o
esporte foi crescendo, junto com o número de modalidades e praticantes, paralelamente
à intervenção e controle do estado na maioria das nações (TUBINO, 1993).
Conforme Tubino (1993) o desporto passou a ignorar a perspectiva pedagógica
idealizada por Coubertain, e foi aos poucos se apropriando do princípio do rendimento,
que conforme Bracht (2011) associou-se assim cada vez mais o esporte aos
pressupostos do capitalismo moderno na busca por rendimento.
Segundo Da Costa (1988), o próprio Barão de Coubertain não estava satisfeito
com os rumos do esporte, e tentou amenizar os exageros em 1930, publicando a “Carta
da Reforma Esportiva”, onde para o idealizador das Olimpíadas: “[...] o esporte estaria
sendo acusado na época, de contribuir para a ‘fadiga física’, regressão intelectual e
difusão do espírito mercantil [...]” (DA COSTA, 1988, p. 102).
Na carta, Coubertain culpa os educadores, o poder público, as federações e a
mídia pelos rumos do esporte e determina que fossem claras as definições de esporte
para desenvolver a cultura física e para competição; também incentiva o desporto
individual para adultos e a ludicidade no esporte da juventude (DA COSTA, 1988).
Com certeza, os Jogos Olímpicos foram os principais responsáveis pela
universalização da Instituição Esportiva, visto que propagaram um modelo esportivo com
padrões de funcionamento, regras e normas de conduta, mas também acarretaram
conflitos internos entre países (BETTI, 1991).
33
Fonte: viajento.files.wordpress.com
4 O ESPORTE NO BRASIL
3
ESTEVES, Bruno Botti. A trajetória do esporte moderno: dos primórdios ao fenômeno social. [S. l.: s.
n.], 2014. Disponível em: https://www.efdeportes.com/efd199/a-trajetoria-do-esporte-moderno.htm.
Acesso em: 21 ago. 2019.
34
para se escrever a história do turfe nacional, história que, na falta de testemunhas
oculares e de documentos já hoje raríssimos, poderá ser para o futuro adulterada”
(Pacheco, 1893, p.7). No caso do remo, também se pode perceber preocupação
semelhante em 1909, no livro de Alberto Mendonça, que junto com Ernesto Curvello
Júnior foi um dos primeiros a sistematizar observações sobre sua história:
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sensível diferença, principalmente no que se refere à compreensão teórica e
metodológica.
A obra de Inezil é um exemplo de estudo histórico bem desenvolvido nos padrões
de uma abordagem factual. As diferenças começam nos seus investimentos na história
brasileira, até então pouco abordada, e passam por sua erudição e pela utilização de
fontes diversificadas. Na verdade, nos seus últimos artigos já se pode identificar
mudanças, que apontam para uma perspectiva mais crítica e interpretativa da história. É
também dessa fase a importante obra de Mário Filho, na qual se destaca O negro no
futebol brasileiro (a primeira edição é de 1947). Dialogando com as considerações de
Gilberto Freyre acerca de uma possível originalidade brasileira na forma de jogar, o
jornalista envolvia claramente o velho esporte bretão na construção de discursos acerca
da identidade nacional.
A despeito das muitas polêmicas que a cercam, trata-se inegavelmente de leitura
obrigatória.
A quarta fase (década de 1980) é marcada pela crítica e pelo anúncio de
redimensionamento dos estudos anteriores, a partir fundamentalmente de uma
inspiração teórica marxista. Embora as obras desse momento tenham significado uma
importante mudança de enfoque, problemas anteriores persistem, além de um novo ter
emergido (ou reaparecido):
36
Fonte: br.freepik.com
37
iniciativas de pesquisa: busca-se discutir com maior profundidade a presença e o papel
da prática nos diversos quadros socioculturais.
A quinta e atual fase (a partir da década de 1990), portanto, é marcada por uma
maior sistematização e institucionalização dos estudos e pela configuração mais clara da
História do Esporte como um campo de investigação.
Curiosamente, esse movimento de conformação do campo teve início não no
âmbito da disciplina História, mas sim na área de Educação Física, tendo como marcos
a criação de um grupo dedicado ao tema, na Universidade Estadual de Campinas, e a
realização dos Encontros Nacionais de História da Educação Física e do Esporte. Um
fato importante, pelo aspecto pioneiro, merece ainda ser lembrado: a realização do I
Congresso de Filosofia, História, Sociologia e Educação Física Comparada, em agosto
de 1990, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro; provavelmente a primeira
experiência especificamente organizada para discutir o assunto no país.
Na área de História, durante mais tempo persistiram as ressalvas ou pouca
consideração da importância do tema. Patrícia Falco Genovez (1998) abordou com
propriedade tal questão. A autora demonstra como obras importantes, que apontam para
a necessidade da construção de uma história social e/ou cultural mais ampla, sequer
citam o esporte como objeto de estudo. Mais ainda, constata que até o final da década
de 1990, no interior das reuniões científicas importantes na área, como nos eventos
promovidos pela Associação Nacional de História (Anpuh), raros foram os trabalhos
sobre o assunto. Para Genovez (1998, p.9), não se percebia que:
“(...) o corpo não é, pois um objeto. Pela mesma razão, a consciência que tenho
não é um pensamento, quer dizer que não posso decompô-lo e recompô-lo para
formar dele uma ideia clara. Sua unidade é sempre implícita e confusa. Ele é
sempre outra coisa além do que é, sempre sexualidade ao mesmo tempo que
liberdade, enraizado na natureza no momento mesmo em que se transforma pela
cultura, nunca fechado sobre si mesmo, e nunca ultrapassado. Se se trata do
corpo de outro ou de meu próprio corpo, não tenho outro meio de conhecer o
corpo humano senão vivendo-o, quer dizer, retomar por minha conta o drama que
o atravessa e me confundir com ele. Sou, pois meu corpo (...)” (CAVALARI, 1996,
p. 47-8)
4
MELO, Victor Andrade de; FORTES, Rafael. . In: MELO, Victor Andrade de; FORTES, Rafael.
História do Esporte: PANORAMA E PERSPECTIVAS. [S. l.: s. n.], 2010. Disponível em:
http://ojs.ufgd.edu.br/index.php/FRONTEIRAS/article/download/1180/724. Acesso em: 21 ago. 2019.
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Propomos o conceito de corporeidade como o nosso ponto de partida para
trabalhar os componentes motores que estão ligados ao processo de escolarização, pois
esta integra tudo o que o homem é e pode manifestar neste mundo: espírito, alma,
sangue, ossos, nervos, cérebro, etc. Com o paradigma da corporeidade rompe-se com o
modelo cartesiano, não havendo mais distinção “entre essência e existência, ou a razão
e o sentimento. O cérebro não é o órgão da inteligência, mas o corpo todo é inteligente;
nem o coração, a sede dos sentimentos, pois o corpo inteiro é sensível. O homem deixou
de ter um corpo e passou a ser um corpo”. (FREITAS, 1999, 62)
Fonte: segs.com.br
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Nesta trajetória, das práticas corporais, a ginástica surgiu ou foi resgatada na
sociedade ocidental, moderna, como um movimento de natureza popular sem qualquer
relação com a instituição escolar, tendo sido identificada por seus métodos, escolas e
país de origem de seus estudiosos. Por exemplo, no Brasil, os métodos mais conhecidos
foram o francês, alemão e sueco. Porém, o mais divulgado e adotado foi o método
francês. Embora estes métodos não tenham sido pensados inicialmente para a escola
foram adaptados em princípios e fins para esta realidade. De forma que esta ginástica
“compreendia exercícios individuais, em duplas, quartetos; o ato de levantar e transportar
pessoas e objetos; esgrima; danças; jogos e posteriormente, já no final do século XIX, os
jogos esportivos; a música; o canto e os exercícios militares” (SOARES, 1996, p.8).
Porém, o que mais chama atenção, apesar da abrangência e diversidade de conteúdos
de ensino, é que se tem claro a sua especificidade, pois as “ciências que dão suporte aos
estudos e pesquisas deste conteúdo são aquelas de natureza física e biológica” e,
aqueles que pensaram a atividade física, “a partir de parâmetros científicos, (...), o fizeram
com os instrumentos de seu tempo“ (p. 8-9).
A partir do século XX o termo Ginástica foi substituído pelo de Educação Física,
dando lugar à educação do gesto e a um conteúdo de natureza esportiva. “A abrangência
anterior perde terreno para a aula como o lugar do treino esportivo e do jogo esportivo
como conteúdo senão único, certamente predominante. As partes constitutivas de uma
aula são ditadas pela Fisiologia, agora já acrescida do item ‘esforço’, do que pela
Pedagogia” (SOARES, 1996, p. 9). Todavia, apesar de haver predominância do esporte
nas aulas de Educação Física, esta mantinha uma especificidade, sendo o seu conteúdo
de domínio daquele que ensina. Mas esta situação será alterada no final dos anos 70,
quando cede lugar para a Psicomotricidade, sendo considerada esta mudança “um dos
momentos mais ricos e mais contraditórios de sua história recente. ” (p. 9)
42
Dessa forma, com a psicomotricidade, vislumbra-se o perfil de um professor
voltado para a aprendizagem, cabendo lembrar que esta estuda o homem na sua unidade
como pessoa, pois “a intervenção psicomotora então se situa em âmbito global, numa
tentativa de modificar toda uma atitude em relação ao seu corpo, como lugar de
sensação, expressão e criação” (NICOLA, 2004, p. 5).
Porém, os pressupostos teóricos que fundamentaram a Educação Física na
Educação Infantil, e evidenciaram a psicomotricidade como referencial capaz de dar
conta da especificidade do trabalho pedagógico junto às crianças, também indicaram que
o assunto merece ser aprofundado.
Fonte: facebook.com/profdeeducacaofisica
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Sayão (2002, p. 55) nos lembra que a psicomotricidade “se constituiu na escola e
na Educação Infantil como um suporte para as aprendizagens cognitivas. O movimento,
neste caso, serve de recurso pedagógico visando ao sucesso da criança em outros
campos do conhecimento”.
No bojo do que foi colocado o que se compreende é que o professor deve dominar,
em seu arcabouço teórico, o conteúdo da psicomotricidade, mas que o mesmo não sirva
para limitar a criança em suas linguagens de movimento quer seja na prescrição de
diagnósticos, quer seja no enquadramento das mesmas. Os trabalhos de intervenção na
escola são necessários, mas não podem se constituir num fim em si mesmo.
Para Florestam Fernandes (1979) e Deborah Thomé Sayão (2002) a cultura infantil
tanto expressa a incorporação, transferência e aceitação, pelas crianças, da cultura
adulta, quanto permite transformar aquilo que é aprendido, dos adultos, em
manifestações tipicamente infantis. As histórias de vida das crianças, nas suas origens
socioculturais, classe social, gênero, religião e etnia, também interferem na constituição
de uma cultura infantil. De modo que estas singularidades devem ser consideradas, pois
possibilitam um conhecimento maior das crianças, bem como da apreensão de um
universo multicultural a ser compreendido pelo professor e interagido pelos alunos. Neste
contexto, conscientizar as crianças sobre a diversidade cultural; incentivar o
conhecimento/reconhecimento das diferenças; considerar as questões de gênero,
visando o reconhecimento das identidades das crianças, pois desde cedo elas vão
incorporando regras, valores, normas, crenças que refletem os papéis sociais, implica em
pensar num currículo emancipatório.
Entretanto, para que um trabalho integrado ocorra, há necessidade de se conhecer
a realidade da escola, mapear seus limites, compreender a visão de corpo que está
subjacente ao cotidiano dos professores.
“(...) o corpo não é, pois, um objeto. Pela mesma razão, a consciência que tenho
não é um pensamento, quer dizer que não posso decompô-lo e recompô-lo para
formar dele uma ideia clara. Sua unidade é sempre implícita e confusa. Ele é
sempre outra coisa além do que é, sempre sexualidade ao mesmo tempo que
liberdade, enraizado na natureza no momento mesmo em que se transforma pela
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cultura, nunca fechado sobre si mesmo, e nunca ultrapassado. Se se trata do
corpo de outro ou de meu próprio corpo, não tenho outro meio de conhecer o
corpo humano senão vivendo-o, quer dizer, retomar por minha conta o drama que
o atravessa e me confundir com ele. Sou, pois meu corpo (...)” (CAVALARI, 1996,
p. 47-8)
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tridimensionalidade. As imagens do corpo representam as folhagens, a roupagem,
significando dizer que o corpo é (re) colonizado pela imagem do corpo - formado numa
ideia precisa de processo, de dinamismo, e da múltipla influência sócio-histórico-culturais
que recebe – mas que busca o seu assento na “estrutura” do esquema corporal.
A imagem do corpo é o conceito e a vivência que se constrói sobre o esquema
corporal, trazendo consigo o mundo humano das significações, pois na imagem estão
presentes os afetos, os valores, a história pessoal, marcada nos gestos, no olhar, no
corpo que se move, que repousa, que simboliza. Enfim, na imagem do corpo está
implícito não apenas o corpóreo, meu corpo como objeto de reflexão, mas,
principalmente, a corporeidade, o corpo-sujeito que age no mundo e que, nesta inter-
relação, estende-se para ele, perde suas fronteiras anatomicamente definidas e torna-se
marcado pelos símbolos de suas vivências, torna-se presença (FREIRE, 1999). Dessa
forma eu estou no mundo, não em meu corpo, pois o polo da presença é o outro.
Fonte: nova-escola-producao.s3.amazonaws.com
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Nos estudos de Rosa Neto (2002), o esquema corporal foi tratado abarcando
alguns pressupostos da imagem corporal, mas colocando a sua ênfase maior no modelo
postural, esquema. Por exemplo;
Embora em seu livro tenha começado pela motricidade fina, depois motricidade
global, equilíbrio, esquema corporal, organização espacial, organização temporal e
encerrado com a lateralidade observa-se que o esquema corporal traz consigo,
subjacente a ele, o papel de mediação entre os diferentes componentes motores.
Entretanto, numa leitura não atenta o que se poderá observar, num primeiro momento,
no âmbito da “aparência” e não da “essência”, é um conjunto de componentes motores,
podendo-se até entender que estes componentes possuem “vida própria” e não,
necessariamente, uma inter-relação.
Quando se refere à organização espacial assinala que esta envolve tanto o espaço
do corpo, diretamente acessível, como o espaço que nos rodeia, finito enquanto é
familiar, mas que se estende ao infinito, ao universo, e desvanece-se no tempo. No geral,
a organização espacial depende, ao mesmo tempo, da estrutura de nosso próprio corpo
((estrutura anatômica, biomecânica, fisiológica, etc.), da natureza do meio que nos rodeia
e de suas características. Portanto, todas as modalidades sensoriais participam em certa
medida na percepção espacial: a 791 visões, a audição, o tato, a propriocepção e o olfato.
De forma que a orientação espacial designa nossa habilidade para avaliar com precisão
a relação física entre nosso corpo e o ambiente.
Assim, o olho e o ouvido, o labirinto, os receptores articulares e tendinosos, os
fusos neuromotores e a pele representam o ponto de partida de nossa experiência
espacial restrita a duas etapas: uma ligada à percepção imediata do ambiente - sensório-
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motora e a outras baseada nas operações mentais que saem do espaço representativo
e intelectual. (p. 21, 22)
Com relação à organização temporal observou-se que esta ficou restrita à
memória, relacionada aos componentes de ordem e duração que o ritmo reúne. A ordem
ou a distribuição cronológica das mudanças, ou dos acontecimentos sucessivos
representa o aspecto qualitativo do tempo e a duração seu aspecto quantitativo. Por sua
vez, a noção de duração resulta de uma elaboração ativa do ser humano de informações
sensoriais, tendo como conteúdo físico (mudanças, velocidade, espaço recorrido,
movimento, crescimento da medida) proporcionando a base do nosso conhecimento do
tempo e de sua organização. No que se refere à noção de tempo este foi avaliado
considerando que o tempo e a duração estão circunscritos a um movimento cuja
velocidade (distância percorrida durante um intervalo de tempo) é constante. Porém, a
organização temporal incluí uma dimensão lógica [conhecimento da ordem (esta
percepção nos leva a distinguir o simultâneo do sucessivo), uma dimensão convencional
(sistema cultural de referências, horas, dias, semanas, meses, anos) e um aspecto de
vivência, sendo que a consciência do tempo (evolui e amadurece com a idade) se
estrutura sobre as mudanças percebidas. A percepção da duração começa pela
discriminação do instantâneo e do duradouro que se estabelece a partir de 10 a 50m para
a audição e 100 a 120 para a visão. (p. 23) .
A lateralidade foi compreendida como a preferência de utilização de uma das
partes simétricas do corpo: mão, olho, ouvido, perna, sendo que a lateralização cortical
foi vista como a especialidade de um dos hemisférios, outorgando a um deles a iniciativa
da organização do ato motor. No que se refere ao equilíbrio este foi considerado a base
primordial de toda ação diferenciada dos segmentos corporais. Portanto, o equilíbrio é o
estado de um corpo quando forças distintas que atuam sobre ele se compensam e
anulam-se mutualmente. Entretanto, do ponto de vista biológico, a possibilidade de
manter posturas, posições e atitudes indica existência de equilíbrio.
No que diz respeito a motricidade fina esta foi desenvolvida na forma de
coordenação visuomanual, imprescindível para pegar um objeto e lançá-lo, para
escrever, desenhar, pintar, recortar, etc., porém, a mesma é um processo de ação em
que existe coincidência entre o ato motor e uma estimulação visual percebida. E no que
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se refere à motricidade global esta foi concebida como movimento motor global, seja ele
mais simples, é um movimento sinestésico, tátil, labiríntico, visual, espacial, temporal, e
assim por diante.
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6 BIBLIOGRAFIA BÁSICA
DEL PRIORE, Mary, MELO, Victor. Andrade de Melo. História do Esporte no Brasil: do
Império aos dias atuais. São Paulo: Editora UNESP, 2009.
SOARES, Carmen. Educação Física: raízes européias e Brasil. Campinas, SP: Autores
Associados, 1994.
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