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HISTÓRIA DE VIDA DOS TESTUDINES: UMA REVISÃO

Júlia Albarral de Santana1, Daniele Gehres1, Francielly Silva Gomes1,


Giulia Machado Pereira1, Luíza Schettert Mattia1, Valeska Martins2

Palavras-chave: Animais silvestres. Cágados. Chelonia. Répteis.

1 INTRODUÇÃO
Os quelônios pertencem a classe Reptilia, subclasse Anapsida (sem aberturas temporais),
ordem Chelonia (Testudinata ou Testudines), subordens Cryptodira e Pleurodira (O’MALLEY,
2005; CUBAS; BAPTISTOTTE, 2006; HERNÁNDEZDIVERS; HERNÁNDEZ-DIVERS,
2006). Segundo Cubas, Silva e Catão-Dias (2014), os Testudines são os únicos répteis que
possuem a coluna vertebral fixada à carapaça e possuem a escápula localizada ventralmente às
costelas. As tartarugas podem ser chamadas de Quelônio, porém o termo preferível é Testudines.
Atualmente, segundo ICMBIO, 20% da fauna mundial dos quelônios é formada por espécies da
subordem Cryptodira (que contém as espécies que retraem a cabeça para dentro da carapaça
dobrando o pescoço horizontalmente), e 80% da subordem Pleurodira (aquelas que retraem a
cabeça dobrando o pescoço em “S”). A presença destes répteis ocorre em praticamente todos os
ecossistemas brasileiros e, por serem ectotérmicos, são especialmente diversos e abundantes nas
regiões mais quentes do país (MARTINS; MOLINA, 2008). A alimentação dos quelônios é
diversificada tendo espécies carnívoras, onívoras e herbívoras. Em grande parte das espécies em
pelo menos uma fase da vida a alimentação é onívora (constituída de proteína animal e fibras
vegetais) (KLOSOVSKI, 2003).
Devido ao aumento de mercado para os Pets não-convencionais, algumas espécies de
testudines, provenientes de criadouros legalizados, frequentemente são vendidos como pets,
tornando necessário o conhecimento dos médicos veterinários das diferentes características
anatômicas, fisiológicas e biológicas da ordem. Este trabalho objetivou relatar os aspectos
relacionados a história de vida dos Testudines, contribuindo com o conhecimento de profissionais
e futuros profissionais em medicina veterinária.

2 MATERIAIS E MÉTODOS
Foi realizada uma revisão bibliográfica a partir de livros, artigos nacionais e internacionais
publicados em revistas científicas eletrônicas, acessadas por meio remoto nos principais sites de
busca eletrônica (PUBMed, Scielo, Science Direct e Google Acadêmico). Foram utilizadas as

1
Discente do curso de Medicina Veterinária, da Universidade de Cruz Alta - Unicruz, Cruz Alta, Brasil.
2
Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Saúde Animal, Docente da Universidade de Cruz Alta, Cruz Alta, RS.
E-mail: valsilva@unicruz.edu.br.

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seguintes palavras-chave para a busca dos artigos: Anatomia, Cágados, Tartaruga, Testudines.
Foram utilizados artigos publicados no período de 1993 a 2009.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
As espécies da ordem Testudines possuem presença de casco dividido em carapaça (parte
superior) e plastrão (parte inferior), ambos formados por uma combinação de elementos ósseos e
células epidérmicas, denominados escudos córneos, dispostos de maneira regular e que
acompanham o crescimento da parte óssea (LEGLER, 1993; POUGH; HEISER; McFARLAND,
1999). A queratinização da pele determina que a maioria das trocas gasosas seja pulmonar. O
grande volume pulmonar é adaptado para ambas as formas de respiração, aquática e terrestre, e
também serve como controle de flutuação para tartarugas aquáticas (CUBAS; SILVA; CATÃO-
DIAS, 2014). Os pulmões fixam-se dorsalmente a carapaça e ventralmente às membranas que
estão anexadas ao fígado, estômago e trato intestinal. Eles não possuem um diafragma que separa
os pulmões dos outros órgãos (MADER, 2008). Pela ausência de diafragma, tartarugas utilizam
pressão de aspiração negativa. Segundo Cubas, Silva, Catão-Dias (2014), os répteis desenvolvem
períodos variáveis de apneia, interrompendo os ciclos ventilatórios, dessa forma o animal possui
o controle ventilatório. Além disso, possuem uma alta capacidade para o metabolismo anaeróbico.
A frequência cardíaca dos répteis está relacionada com a temperatura, tamanho,
metabolismo e estado respiratório. O átrio direito se abre dentro da cava venosa a qual origina em
seu aspecto ventral as duas aortas. O átrio esquerdo recebe sangue dos pulmões pelas veias
pulmonares direita e esquerda e o descarrega dentro da cava arteriosa. A cava pulmonar é o
equivalente ao ventrículo direito dos mamíferos e se abre dentro da artéria pulmonar. Uma crista
muscular separa parcialmente a cava pulmonar da cava venosa e pode também redirecionar o fluxo
sanguíneo (O’MALLEY, 2005; DEVOE, 2010). O cavum arteriosum e venosum estão em uma
continuidade anatômica próxima da base do coração pela via do canal interventricular. O sangue
venoso sistêmico enche os cavum venosum e pulmonale, enquanto o retorno venoso pulmonar
enche o cavum arteriosum. O sangue da jugular e pré-cava chega ao seio venoso, vai para o átrio
direito, a válvula interventricular fecha o canal interventricular, vai para o cavum venosum, ao
redor da crista muscular, cai no cavum pulmonale. Com a sístole ventricular há ejeção de sangue
venoso pela artéria pulmonar. Sangue arterial chega ao coração pelas veias pulmonares ao átrio
esquerdo, chegam ao cavum artesiosum e venosum através do canal interventricular. Do cavum
venosum, vai para os arcos aórticos esquerdo e direito durante a sístole ventricular (CUBAS;
SILVA; CATÃO-DIAS, 2014).
Os répteis são animais ectotérmicos, ou seja, utilizam fontes externas de calor para regular
a temperatura corporal. É nesse grupo taxonômico que estão presentes os quelônios, representados
pelas tartarugas, tracajás e jabutis (MARTINS; MOLINA, 2008). A temperatura ambiental de 24-

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29°C° é adequada para a maioria das espécies (MADER, 2008). A velocidade de ingestão está
intimamente ligada a temperatura, sendo que em meses mais quentes, a digestão é mais rápida, e
em meses mais frios, é mais lenta. As tartarugas aquáticas começam sua vida como carnívoras e
terminam como onívoras na vida adulta. Já os jabutis são primariamente herbívoros e as grandes
tartarugas terrestres alimentam-se de grama, forragem e vegetais. O tempo de digestão de
alimentos de origem animal depende de uma porcentagem considerável do peso corpóreo do
predador. O trato gastrintestinal dos testudines herbívoros é maior que os dos carnívoros e é
expandido para permitir a colonização microbiana. A pequena capacidade do estômago de
testudines herbívoros e a ação bactericida do suco gástrico impedem o estômago de atuar como
câmara de fermentação contendo simbiontes celulóticos. A decomposição simbionte de tecido
vegetal ocupa papel no ceco e no cólon (CUBAS; SILVA; CATÃO-DIAS, 2014).
A temperatura, além de atuar no metabolismo cardiorrespiratório e alimentar, influencia
na parte reprodutiva. A determinação sexual é influenciada pela temperatura durante a terceira
metade de incubação. A incubação pode ser de 2 meses em algumas espécies de clima temperado,
mas de até 8 a 9 meses em algumas espécies tropicais (O’MALLEY, 2005). A temperatura mais
quente produz fêmeas, enquanto a temperatura mais baixa produz machos (CUBAS; SILVA;
CATÃO-DIAS, 2014). Na espécie Emys orbicularis, a temperatura de incubação para machos é
de 27,5ºC e nas fêmeas, 29ºC, para Jabutis Gochelone carbonaria e G. denticulata ainda não
existem informações seguras acerca do modo de determinação do sexo (FERREIRA JÚNIOR,
2009). Cada subespécie possui variações de temperaturas, em um estudo desenvolvido em Pelotas
– RS notificou que os ovos de Trachemys dorbigni não suportam temperatura acima de 35ºC
(FAGUNDES, 2007).
Em muitas espécimes, para facilitar a intromissão, os machos possuem caudas mais longas
e grossas, um plastrão côncavo nos jabutis e, se houver, um entalhe anal no
plastrão que é mais estreito e profundo. Muitas machos de tartarugas aquáticas possuem unhas
maiores, as quais são usadas para cortejar as fêmeas. As fêmeas têm cauda mais curta, que afinam
abruptamente na parte posterior da cloaca, cuja abertura tende a ficar próxima à margem da
concha. O plastrão nas fêmeas é geralmente plano e o entalhe anal é mais largo e mais raso, talvez
para ajudar na ovoposição (MADER, 2008).

4 CONCLUSÃO
Existem diversas particularidades anatomofisiológicas dos testudines, este trabalho
abordou sistema esquelético, queratinização da pele, sistema respiratório, sistema cardiovascular,
sistema digestório, dimorfismo sexual, e aspectos importantes da temperatura em relação ao
metabolismo dos répteis. Assuntos relacionados a osmorregulação, sistema renal, equilíbrio ácido
básico, sistema reprodutivo, necessitam ser abordados de forma mais aprofundada e levados em

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consideração ao fazer o manejo e tratamento destes animais. Desta forma, este trabalho serve como
um auxílio para os estudantes e profissionais da área de medicina e biologia dos Testudines, não
devendo substituir buscas e leitura de artigos e livros.

REFERÊNCIAS

CUBAS, Z. S., SILVA, J. C. R., CATÃO-DIAS, J. L. Tratado de Animais Selvagens


Medicina Veterinária. 2 ed. São Paulo: Roca, v.1, p. 219-226, 2014.

CUBAS, P.H.; BAPTISTOTTE, C. Chelonia (Tartaruga, Cágado, Jabuti). In: CUBAS Z. S.;
SILVA J. C. R.; CATÃO-DIAS J. L. Tratado de Animais Selvagens Medicina Veterinária.
Editora Roca: São Paulo, 2006, p.86-119.

FAGUNDES, C.K. Dinâmica Populacional de Trachemys dorbigni, (Testudines: Emydidae)


em ambiente antrópico em Pelotas, RS. UFSM – Centro de Ciências Naturais e Exatas,
Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Animal , Santa Maria- RS, 2007

FERREIRA JÚNIOR, P. D. Aspectos Ecológicos da determinação de sexual em tartarugas.


Acta Amazônica, v. 39, n. 1, p. 139-154, 2009.

HERNÁNDEZ-DIVERS, S. M.; HERNÁNDEZ-DIVERS, S. J. Quelônios In: AGUILAR, R.;


HERNÁNDEZ-DIVERS, S. M.; HERNÁNDEZ-DIVERS, S. J. Atlas de Medicina,
Terapêutica e Patologia de Animais Exóticos. São Paulo: Interbook, 2006. p.175-212.

KLOSOVSKI, R. J. L. Análise das estratégias de conservação de quelônios brasileiros


LEONARDO Brasília, 2003. Centro Universitário de Brasília – UniCEUB Faculdade de
Ciências da Saúde – FACS. Disponível em:
https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/235/7448/1/9967938.pdf . Acesso em: 02 set 2021.

LEGLER, J.M. Morphology and physiology of the chelonia. In: GLASBY, C.J; ROSS, G. J. B.;
BEESLEY, P. (ed.) Fauna of Australia. [S.I.: s.n.], 1993, p.108-119.

MADER, D. R. How I treat metabolic bone diseases in reptiles. UNOPAR Científica, Ciências
Biológicas e da Saúde, Londrina, v.10, 2008.

MARTINS, M.; MOLINA, F.B. Programa geral dos repteis ameaçados no Brasil. Livro
Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Brasília, DF: MMA; Belo Horizonte:
Fundação Biodiversitas, 2008.

O’MALLEY, B. Clinical Anatomy and Physiology of Exotic Species. Editora Elsevier


Saunders, London, 2005, p.17-93.

POUGH; HEISER; McFARLAND; W.N. A vida dos vertebrados. 2 ed. São Paulo. Atheneu,
1999.

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