A formação e a atuação do psicólogo na realidade brasileira têm sido objeto de constante estudo. Essas investigações cresceram em quantidade na medida em que um maior número de psicólogos foi colocado no mercado de trabalho, muitas vezes denunciando um desajuste na situação de exercício das atividades profissionais. Quando se verifica o panorama geral desses estudos, incluindo as dissertações, as teses e os livros, percebe-se que a análise das relações entre a formação e a atuação do psicólogo organizacional merece maior atenção. Desde que surgiram os primeiros cursos de Psicologia, oficialmente regulamentados, a partir de 1964, poucas alterações são visíveis no processo formativo. Nas palavras de Bouvier e colaboradores (1988, p. 4), "até hoje a essência do curso não foi reformulada". Para Weber e Carraher (1982, p. 5), (...) existe consenso de que o currículo vigente no Brasil não reflete o estado atual da Psicologia como ciência e como profissão. Constatam-se defasagens patentes entre o que aqui é ensinado e o que é produzido nos grandes centros intelectuais, bem como entre o que o psicólogo aprendeu e os desafios que afronta cotidianamente na sua prática profissional. A formação profissional e o exercício das atividades de trabalho pelo psicólogo organizacional têm sido restritos, precários e deficientes. Os limites no preparo para a atuação, em muitos cursos de Psicologia, não ultrapassam as linhas demarcadas pela seleção e orientação profissional, o que revela uma obsolescência até no título conservado para a disciplina. Os departamentos que devotam à formação na área um empenho um pouco maior não conseguem avançar além do fornecimento de algumas técnicas tradicionais, em regra pela insuficiência no tempo disponível para o conteúdo que se pretende transmitir. A reivindicação por maior carga horária repete-se nas outras áreas. Isso, à primeira vista, permite pensar que o curso carece de maior duração. Contudo, a conclusão pode ser falaciosa, se forem ponderados outros aspectos, como a falta de integração das disciplinas. Conteúdos ensinados em disciplinas básicas, por exemplo, raramente são associados aos conceitos ou à prática em organizações. A manutenção da precariedade do sistema apoia-se em vários fatores. Entre eles está, sem dúvida, a nítida preferência do psicólogo pelas atividades da área clínica, desde o seu início no curso. O tempo total utilizado nos cinco anos de formação é fortemente dirigido para as disciplinas da área clínica. Essa identificação com o exercício de consultório, influenciada pela pretensa semelhança com as profissões liberais, traz implicações que dificultam a interação profissional em ambientes de trabalho, nos quais o parâmetro deve ser o grupo ou a comunidade. A desatenção acadêmica para a área é também revelada pelo reduzido número de pesquisas produzidas em Psicologia Organizacional nas universidades. Após investigar as pesquisas relatadas na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, no período de 1983 e 1984, uma das constatações de Matos (1988) é que "os pesquisadores brasileiros que relatam seus trabalhos na SBPC não se interessam por Psicologia do Trabalho" (p. 112). Mais adiante, ressalta que é "quase nada" o interesse da pesquisa em Psicologia "por problemas institucionais, organizacionais ou por qualquer coisa que se refira a desempenho de trabalho" (p. 119). Desde a década de 80, alguns avanços têm sido produzidos, com o acréscimo de inclusões de trabalhos de psicólogos, por exemplo, em congressos de psicologia e em outros campos do conhecimento, principalmente na administração. Já se conta também com um periódico acadêmico-científico voltado para a área: a Revista Psicológica: Organizações e Trabalho. A formação do psicólogo para atuar em organizações tem sido sobremaneira relegada. São inúmeras as evidências desse fato. Uma das mais óbvias é a quase ausência de cursos de pós-graduação existentes no País que oferecem oportunidades ao profissional para continuar seus estudos. Por outro lado, as atividades em empresas, de qualquer modo, revertem nas melhores remunerações da categoria. Bastos (1988, p. 178; p. 184) aponta que "nessa área encontramos as melhores remunerações dos serviços" e que o salário é o fator de maior peso na escolha dessa área como primeiro emprego. A situação conflui no encaminhamento de psicólogos despreparados para o exercício das atividades em organizações. Atividades que são realizadas com pouca satisfação do profissional (Borges-Andrade, 1987, p. 305; Bastos, 1988, p. 190; Borges-Andrade, 1988b, p. 266). Tanto pior para ele, enquanto pessoa, quanto para a imagem da profissão, dado o impacto e a rápida divulgação que ocorre no ambiente, como para a sociedade, pela perda de oportunidades de intervenções conscientes do potencial de mudança.