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BARROS, José D’Assunção. Teoria da História.

1 Princípios e conceitos
fundamentais. Petrópolis: Vozes, 2011.

85
Segundo Jorn Rusen no livro A razão histórica (2001) a teoria da história se refere ao
pensamento histórico em sua versão científica.
Segundo Arno Wehling em Historiografia e epistemologia histórica (2006), existiam
formas de conhecimento histórico bem antes da passagem do século XVIII para o XIX,
momento em que se passa a ter como parâmetro para a historiografia a cientificidade, e
no qual já se pode falar em “teorias da história”.

86
No século XVIII há mais propriamente filosofias da história, ao estilo de Herder ou
Kant, uma antessala das teorias da história, paradigmas que serão mais bem
exemplificados no século XIX com o positivismo, o historicismo e o materialismo
histórico.

88
Barros: “ Qualquer teoria da história pressupõe, simultaneamente, uma determinada
concepção sobre o que é a história e sobre o que deve ser a historiografia (isto é, o
campo de estudos que examina a história enquanto campo processual).”

Para Agnes Heller no ensaio Uma teoria da história (1981), as teorias da história podem
se referir a objetos específicos como eventos ou processos como a revolução francesa e
nazismo ou podem se configurar como teorias mais amplas e mais generalizadoras que
se refiram a uma série de eventos ou tipologia de eventos, como uma teoria das
revoluções ou do totalitarismo, se colocados os exemplos dados da Revolução francesa
e do Nazismo.

99
Para Febvre a história deveria ser reconstruída a partir do presente de acordo com um
problema e orientada pela formulação de hipóteses.

Volume 2: Os primeiros paradigmas: positivismo e historicismo. 2011


64
Barros argumenta que o século XIX praticamente abre e se encerra com o debate da
questão e interação entre a subjetividade e objetividade na história. Assim destaca que
haverá duas posições fundamentais em conflito na resposta desta questão: positivismo e
historicismo.

64-65
As divergências entre positivismo e historicismo estão centradas em 3 aspectos
fundamentais:
Dicotomia objetividade/subjetividade no que se refere à possibilidade ou não da história
chegar a leis gerais válidas para todas as sociedades humanas;
Padrão metodológico mais adequado à história (de acordo com o modelo das ciências
naturais, ou um padrão específico das ciências humanas);
A posição do historiador face ao conhecimento que produz (neutro, imerso na própria
subjetividade, engajado na transformação social).

65
Positivismo como paradigma já está pronto praticamente desde o início do século XIX,
pois herda uma série de pressupostos do iluminismo, entretanto, vai progressivamente
construindo uma visão de mundo tendencialmente conservadora, ao contrário dos
setores mais revolucionários do pensamento ilustrado.
O historicismo, pelo contrário, é um paradigma em construção no século XIX.
Influências pioneiras lhe faziam sombra como Herder (Johann Gottfried von Herder) e
Vico (Giambattista Vico) já no século XVIII em contraposição ao universalismo
iluminista predominante na intelectualidade da época que pensava uma história
universalizante e a natureza universal do homem, e não particularizante.

67
Observação: Alguns autores apontam Ranke como positivista (SCHAFF, 1971,
História e Verdade), sendo inclusive alvo da investida de teórica de Marc Bloch na
apologia da história, por Ranke conservar algumas características positivistas muito
claras, como o ideal de objetividade absoluta e neutralidade do pesquisador. Segundo
Barros e Ivan Domingues, isso acontece, pois, os historicistas ainda mantém um
positivismo difuso e não totalmente superado, e pelo fato de sua tradição teórica estar
em construção.
68
Os dois paradigmas opõem-se em relação à objetividade e subjetividade do
conhecimento histórico. Barros argumenta que os historicistas do século XIX tenderão a
não necessariamente enxergar a questão da subjetividade como um problema, mas como
uma riqueza ou como aquilo que permite a história se constituir como um conhecimento
de novo tipo.
Em oposição ao paradigma dos positivistas, esses historicistas buscarão opor o
paradigma da compreensão ao paradigma explicativo dos positivistas, aspecto que e
operacionalizado de forma distinta pelos historiadores vinculados a essa corrente.

Observação: alguns pontos de comparação:

Positivismo: leis gerais e universalidade humana; identidade de métodos com as


ciências sociais; objetividade científica e neutralidade (o objeto de estudo está na
natureza e o cientista dele se apropria)

Historicismo: relatividade do objeto histórico (inexistem leis de caráter geral, qualquer


fenômeno social só pode ser compreendido dentro da história), subjetividade do
historiador (o historiador também está dentro da história), distinção de métodos (entre
ciências humanas e ciências naturais)

86
Barros observa que a o positivismo realizou uma apropriação conservadora das ideias
ilustradas que inspiraram a revolução francesa.

90
O contexto que acompanha a passagem do discurso iluminista revolucionário sobre as
ciências da sociedade a um discurso conservador que seria com o positivismo no século
XIX, é o assentamento da burguesia após as posições conquistadas pela Revolução e
reajustadas após a restauração napoleônica na sociedade industrial europeia.

91
Dessa forma o positivismo acrescenta ao ideal iluminista de progresso, o conceito de
ordem. O maior representante dessa corrente seria Auguste Comte, francês.

92
Há um deslocamento da antiga filosofia iluminista que tinha perspectivas de
transformação da sociedade para a nova proposta positivista de conservação das
hierarquias sociais de sua época. Marcuse em Razão e Revolução tece críticas a isso, e
Benjamin em suas teses sobre a história critica o que seria um engodo para as classes
não dominantes a concepção de progresso mecanicista.

103
Reconfiguração do positivismo por Émile Durkheim, que reconhece a influência de
Comte. O positivismo no século XX exerceu mais influência nas sociologia que na
história propriamente dita.

105
Mais recentemente, historiadores como Arthur Marwick e Geoffrey Rudolph Elton
tenderam a retormar o projeto positivista. Elton propunha uma investigação
independente, racional e imparcial da documentação em seu ensaio “Retorno aos
essenciais” (1991).
Alun Munslow chamou-os de reconstrucionistas em seu livro Deconstructing History
(2006), devido a oposição radical ao desconstrucionismo que caracteriza historiadores
pós-modernos e a virada linguística, e a revalorização do empirismo não teórico.
Nas palavras de munslow:
Elton and Marwick are among the most outspoken advocates of the modernist
‘craftsman’ approach to historical study, maintaining that history is still about
objective and forensic research into the sources, the reconstructing of the past as it
actually happened, and the freedom of the whole process from ideological
contamination and/or the linguistic a priorism of emplotment and troping. (2006 p.
20)

107
O historicismo alemão pode ser compreendido no contexto de afirmação dos Estados
nacionais no século XIX, enquanto o positivismo francês pode ser compreendido com
uma herança conservadora do iluminismo francês.
Barros novamente afirma que os interesses do historicismo também são, em seus
primórdios, relacionados a ideais conservadores, mas não os da burguesia industrial, e
sim à burocracia estatal que financia seus projetos e aos interesses dos grandes estados
nacionais. Claro que estão relacionados no plano geral, (burguesia e Estados).

108
De modo geral os primeiros historicistas alemães estavam interessados na unificação
alemã, todos os territórios com língua germânica e que possuíam realidades político-
administrativas, e de encaminhar a modernização sem riscos revolucionários.

109
Embora seja possível traçar paralelos entre as concepções conservadoras do positivismo
e do historicismo, o último se diferenciava por buscar uma história especificamente
nacional, portanto não universalista. Em geral os historicistas buscavam um afastamento
do evento da Revolução Francesa, e não viam a idade média e períodos anteriores com o
desprezo que carregavam os iluministas franceses. Para Josep Fontana em A História
dos Homens (2004), tanto historicismo como positivismo eram frutos da necessidade
representada pelo paradoxo de encaminhar uma modernização política que
encaminhasse o desenvolvimento industrial e atendesse aos interesses da burguesia e
conservasse alguns privilégios

110
Ancorado na ideia de nacionalismo, o historicismo alemão buscou recuperar uma
documentação alemã de remontava à idade média e a crítica dessas fontes a partir de
procedimentos filológicos. Em relação às fontes e as sociedades analisadas o
historicismo já apresentava um relativismo em relação a fixidez dos esquemas
positivistas.

135-136
Importante notar que o historicismo está intimamente ligado a uma história política ou
da política, em sentido bastante restrito, exclusivamente dentro do Estado, ou entre
confrontos entre Estados.
Para Ranke, as nações são sempre concebidas no interior de Estados. Os exemplos de
Ranke estão ainda em sua História dos Papas.

137
Observação: esse historicismo conservador (que Barros chama de realista em oposição
a uma relativista), mais fixado nas contribuições de Ranke, foi alvo das duras críticas
que Lucien Febvre desferiu em seu Combates pela História.

Johann Gustav Droysen e Wilhelm Dilthey, bem como Paul Ricoeur e Reinhart
Koselleck mais recentemente ampliaram e renovaram a tradição historicista. Droysen,
por exemplo, em Historik, traduzida no Brasil como Manual de teoria da história, já
afirmava por exemplo que as fontes, apesar de trazerem dados objetivos, também
sofrem interferências pelo imaginário da época e pela imaginação do historiador.
147
Dilthey, por exemplo, estabelece uma oposição entre duas posturas metodológicas, uma
compreensiva, relativa às ciências do espírito, e outra explicativa, relativa às ciências
naturais. As últimas se ateriam a uma explicação exterior, enquanto as outras, do
espírito, seria necessário compreender os fenômenos humanos, seus sentidos, suas
implicações simbólicas e ideológicas, etc.

Volume 3: os paradigmas revolucionários

16
Com muitas variações e desdobramentos, o materialismo histórico foi fundado por
Marx e Engels ainda no século XIX.

17
É preciso não confundir o materialismo histórico necessariamente com o programa
político marxista, pode-se pensar o paradigma materialista histórico como uma forma de
analisar e escrever a história, mas que não necessariamente almeje uma sociedade
socialista.

23
Marx inverte a dialética idealista de Hegel ao situar o desenvolvimento material como o
ponto de partida da história em um materialismo dialético.

24
A crítica de Marx ao materialismo de Feuerbach é pq ele não leva o desenvolvimento
histórico em consideração.
Materialismo histórico enquanto campo teórico-metodológico específico que permite
compreender a dinâmica das sociedades humanas
Lembrar que as ideias de socialismo são anteriores a Marx, que buscou construir um
socialismo científico.

26
Dialética, materialismo e historicidade são aqueles elementos mais fundamentais que
não se pode abstrair do materialismo histórico. Uma concepção de materialismo e
dialética que possivelmente estivesse abstraída da historicidade, provavelmente
resultaria em algum tipo de estruturalismo.

27
Alguns conceitos-chave:
Práxis: algo que une teoria e prática, pensamento e ação, um desdobramento da dialética
Luta de classes: combinação de historicidade e dialética
Modo de produção: núcleo mínimo de materialidade de uma determinada formação
social

31
Contribuição à crítica da economia política é o texto de Marx e Engels que apresenta
como alegoria o par base-superestrutura, que depois seria dogmatizado em algumas
acepções do marxismo.

44
O que Marx e Engels então propondo é um rompimento com a história a velha história
política e lançando um olhar historiográfico para bases econômico-sociais.

45
Em A Ideologia Alemã, os autores já criticavam o uso de conceitos abstratos
desvinculados da história real. O uso apriorístico serviria apenas para facilitar a
organização do material histórico.

47
Gramsci considerava o marxismo o historicismo absoluto, isto é, para Marx tudo poder
analisado historicamente.

59
Lukács afirma que o capitalismo moderno assume uma forma mercantil, que se reflete
em todos os âmbitos da vida social. É nesse contexto que a consciência do proletariado,
nas palavras de Lukács, tendem à reificação. Lucáks remarca que isso se deve pois
nenhum outro sistema foi capaz de transformar a força de trabalho em mercadoria.
60
Para Gramsci, estrutura e superestrutura constituiriam um bloco histórico, com vínculo
orgânico, e não como relação de determinação.

62
Pierre Vilar e Braudel como marxistas, ou influenciados pelo marxismo na Escola dos
Annales.

64
Escola inglesa do marxismo (Hobsbawm, Thompson, Christopher Hill), o mundo da
cultura passa a ser considerado como parte integrante do mundo da produção, e não
como reflexo da infraestrutura de uma sociedade.

Observação: Sobre o determinismo muitas vezes assumidos por marxistas ditos


ortodoxos, Gramsci já tratava como um infantilismo tratar qualquer flutuação da política
e da ideologia como uma expressão imediata da infraestrutura. Citar Althusser e o
desprezo pela história, assim como suas contribuições, e as críticas de Thompson e
Vilar. Para Thompson, por exemplo, não é possível descrever um modo de produção
puramente em termos econômicos, separando de elementos de cultura.

Volume 5: A Escola dos Annales e a Nova História

42
Lembrar que o grupo de historiadores que assumiu por volta da década de 1970, num
movimento conhecido como a Nova História (nouvelle histoire), estaria mais em
ruptura com as primeiras gerações dos Annales. François Dosse (A história em
migalhas, 1987) pensa que são rupturistas, Peter Burke (A escola dos Annales, 1990)
pensa que são continuístas.

109
História-problema, interpretativa, problematizada, apoiada em hipóteses, em
contraposição a uma história factual
210
“François Dosse, com seu livro A história em migalhas (1987), será o principal
inventariante das rupturas entre 0 grande arco que une as duas primeiras gerações dos
Annczles (1929-1968) e o novo fraseado historiográfico impresso pela chamada
Nouvelle Histoire, embora indique algumas continuidades importantes entre esta
geração que se afirma a partir de 1968 e as duas gerações que conduziram os Annales
até a saída de cena de Braudel. As principais continuidades seriarn a
interdisciplinaridade (até perigosamente exagerada pelos novos, conforme sua análise),
a emblemática referência a u111a História-problema, e a insistência de alguns
historiadores do grupo em uma recusa do tratamento tradicional do político. Entre as
descontinuidades, a mais grave - e, na verdade, a fundadora de outras rupturas - seria a
rejeição de uma pesquisa globalizante em favor de uma fragmentação e pulverização da
história que ele denomina de "história em migalhas': aqui voltando contra seu próprio
autor uma expressão originalmente proferida por Pierre Nora (n. 1931) por ocasião da
divulgação de uma obra coletiva do grupo que foi intitulada História: novos problemas,
novas abordagens, novos objetos (1974).”

Dosse afirma que a interdisciplinaridade renovadora das primeiras gerações havia sido
distorcida e exagerada pelos historiadores da Nouvelle Histoire.

211
“Além disso, com este novo modelo historiográfico, teria sido rompido o modelo
annalista original, este no qual, para além de se analisar o passado a partir de uma
problematização do presente, buscava-se considerar o passado como uma instância que
poderia beneficiar a compreensão do presente e mesmo a sua transformação. Dessa
maneira, traindo essa interação entre temporalidades que fora uma das marcas da
historiografia anterior e um dos seus itens programáticos mais importantes, com os
postulantes da "história em migalhas" (conforme a leitura de François Dosse) o diálogo
entre presente e passado estaria rompido, e o passado começaria a ser cultuado como
campo de análise a ser contemplado unidirecionalmente, sem o benefício que poderia
ser trazido pelo retorno, ao vivido atual, da reflexão sobre os diversos tempos históricos
anteriores.”

220
Bloch e Febvre são os pioneiros, Ernst Labrousse já começa a inserir a história
quantitativa já na década d e1930.

256-255
Braudel representa a segunda geração e será o mais influente. Entre 1946 e 1956, ano da
morte de Febvre, Braudel foi o segundo no movimento. Dali até 1969 reinará absoluto,
quando foi pressionado a partilhar o poder por meio da ampliação de cargos de direção
na revista.

303
A terceira geração e a nova história eclodem por assim dizer, em 1968.

306
De igual maneira, o principal das preocupações historiográficas parece se deslocar para
o âmbito da cultura, de modo que a História Cultural passa a ocupar uma posição central
no grande cenário das modalidades historiográficas.

307
Entre as incertezas, o "giro linguístico" iniciado nos anos 1960 - que começara a discutir
mais enfaticamente o estatuto da ideia de "realidade" e a apresentar a visão de que “tudo
é discurso" - atinge a própria historiografia.

317
Tudo certo: os exemplos que Jacques Le Goff oferece neste trecho realmente acenam
para a possibilidade de conciliação do objetivo de escrever uma História Total a partir
de pequenos recortes de espaço ou de estreitas fatias da vida social e humana. Os
pequenos recortes de espaço que circunscrevem uma vizinhança ou uma família, ou as
amplas mas finíssimas lâminas que recobrem uma prática ou um conjunto de
representações, podem, de fato, serem utilizados para enxergar mais amplo, inclusive
para recompor uma História Total.

330
Os estudos de mentalidades - ao lado de outra área que ficaria conhecida como
Antropologia Histórica - tornar-se-iam de fato os dois carros-chefe neste trem de
inúmeros vagões que foi a Nouvelle Histoire2'

332-333
Embora a História das Mentalidades tenha tido precursores
já na primeira metade do século XX, é apenas a partir da
década de 1960 que ela começa a se delinear como um novo
espaço de ação para os historiadores que propunham um
atento exame da dimensão da vida social que se relaciona
ao mundo mental e aos modos de sentir. A designação deste
novo campo histórico, por outro lado, e o próprio conceito
de "mentalidades" que o fundamenta, têm dado margem a
grandes debates que não poderão ser todos pormenorizados
aqm·-095 . Ha' autores que sustentam mesmo que ten·a s1' d o " o
próprio caráter fluido da noção [ de mentalidades] o que lhe
assegurou o êxito por meio de possibilidades indefinidas de
adaptação" (REVEL, 1993: 529)

Certamente contribuiu para a polêmica em torno da História


das Mentalidades o fato de que os historiadores filiados
a este campo foram os primeiros a se interessarem por
determinados temas não convencionais, desbravando certos
domínios da História que os historiadores ainda não haviam
pensado em investigar. Assim, Robert Maneirou propôs-se a
estudar a longa persistência de modos de sentir que motivaram
a prática da feitiçaria e sua repressão no livro Magistrados
e feiticeiros na França do século XVII (1979); Jean
Delumeau impôs a si a tarefa de examinar um complexo de
medos de longa duração que havia estruturado o modo de
sentir do homem europeu durante muito tempo, e cuja lenta
superação permitiu precisamente a passagem para o mundo
moderno (1978); e Philippe Aries (1977) e Michel Vovelle
(1982) empenharam-se em analisar os sentimentos do homem
diante da morte.

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