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É nesse contexto que nasceu na França a escola liberal romântica, que teve por figura máxima
aquele a quem Charles Péguy chamou de o “gênio da história”, Jules Michelet. A
contribuição dessa escola e as ambições da história, que marca uma ruptura decisiva com os
conceitos e as práticas anteriores – a tal ponto que se pode datar dessa época o verdadeiro
“movimento da história”, as tentativas de casar ciência e arte, mais a vontade de nutrir a com
filosofia dão às publicações desse período o estatuto de obras literárias e as elevam ao nível
de uma reflexão fundamental sobre a história e a forma de se escrevê-la, o magistério então
reconhecido aos historiadores, que faz deste os artesãos da consciência nacional. A revolução
francesa marca de fato uma ruptura fundamental na consciência histórica. Ela produz uma
modificação do regime de historicidade, quer dizer, uma mudança do lugar e dos valores
relativos atribuídos ao presente, ao passado e ao futuro na percepção dos coetâneos. Até
então, o passado não tinha sido realmente passado como ultrapassado.
A historiografia da primeira metade do século X1X se inscreve numa relação complexa entre
três polos a que podemos chamar de recursos: a erudição, a filosofia, a literatura. Cada obra
oferece delas uma trama particular.
Humbold emprega mais adiante o termo analogia. Ele inscreve a prática historiadora numa
tensão entre investigação rigorosa, imparcial e crítica, que é um elemento constitutivo de seu
ofício - sua “missão profissional” –, e a necessidade de operar uma síntese que mobilize a
intuição do todo.
A história longe de ser concebida como uma ata do real, é apresentada como uma imitação, à
imagem da criação artística. Entretanto, destaca Humboldt, a finalidade é diferente, já eu a
história é animada pela ambição de tender para o verdadeiro. Para atingir esse objetivo, a
história tem que se emancipar da filosofia. Com Humboldt, temos o nascimento do
historicismo, isto é, de uma história ligada ao particular para tentar dar conta da ação humana.
Humbold inspira grandemente o historiador alemão Leopold Von Ranke.
Leopold Von Ranke (1795-1886) é uma figura maior dentro da historiografia alemã.
Professor da Universidade de Berlim de 1825 a 1871, ele é, desde 1841, o historiador oficial
da Prússia. Sua obra histórica é centrada na reforma (especialmente na Alemanha, na França
e na Inglaterra), mas sua influência ultrapassa de muito o campo da história moderna. É líder
de uma escola, o “seminário”, no qual viriam, a partir de 1833, se iniciar na crítica e no
método históricos a maioria dos eruditos e historiadores alemães, como Droysen, que foi seu
aluno e fala de Ranke-Schule (Escola de Ranke)
A corrente historicista trazida por Ranke não se resume à historiografia de Além-Reno. Johan
Gustav Droysen defende, por seu lado, uma história de reflexão em sua obra Précis de
Theorie de ‘Histoire, que rompe com a teoria do refletido, cara a Ranke. Ele problematiza a
historicidade fundamental de qualquer investigação histórica e convida o historiador a
enunciar explicitamente as questões que formula aos vestígios conservados, bem como a se
perguntar sobre as razões que o levaram a formulá-las.
Na entrada do século XX, as qualidades que um historiador deve ter estão definidas:
modéstia, prudência, erudição, recusa das paixões. A profissionalização dos historiadores
decorre, num primeiro momento, de uma operação de delimitação, da definição de uma
norma legitima que marque os contornos de uma comunidade cientifica que garanta a
validade do saber histórico. Essa clausura se efetua em dois planos: a organização do ensino e
a codificação do método.
O discurso do método histórico é delimitado em 1898 por Charles- Victor Langlois e Charles
Seignobos em Introduction aux études historiques. Ambos são professores titulares de
história e doutores em história medieval. É para transmitir as competências assim adquiridas
na École des Chartes que ele se torna professor assistente, mais tarde catedrático da Sorbone.
Nos anos 1890-1910, a história metódica entra numa zona de turbulência. Encontra-se
aprisionada entre dois fogos: de um lado, os que censuram seu culto da objetividade e a sua
fraqueza em considerar os processos específicos do conhecimento histórico; de outro, os que
denunciam seu enraizamento grande demais no particular e no individual, o que tem por
resultado um déficit científico. Em ambos os casos, é a definição largamente empírica das
práticas que é derrubada. Na Alemanha, o debate se inicia nos anos 1890. Ele opõe, de um
lado, os que são favoráveis a uma mutação cientifica da história que deveria se operar mais
ou menos a partir do modelo das ciências da natureza, considerando (de vários modos) a
noção de coerção, quer para contribuir as leis do devir histórico (Karl Marx), quer para
definir os tipos de ideais (Max Weber), de outro lado, aqueles que defende a história como
ciência do espírito (Wilhelm Dilthey).
Diferente do que ocorreu nos anos 1870, agora é uma reversa que, de preferência, se
manifesta diante das teorias alemãs. Dessa forma, a viradas do século é marcada por uma
relativa autonomização em relação a Alemanha, cujos debates são lidos através dos
enfrentamentos que opõem, na França, os Durkheimianos e os metódicos. Essa
instrumentalização que amalgama posições muito diferentes para reconstruir uma oposição
simples entre partidários de uma ciência monotética, calcada nas ciências naturais, e
historicistas ideográficos foi por muito tempo capaz de encobrir a complexidade das
questões levantadas Além-Reno.