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Revista de Teoria da História Ano 1, Número 3, junho/ 2010 Universidade Federal de Goiás ISSN: 2175-5892

Cultura Política e Histor iografia Alemã No Século XIX:


A Escola Histórica Prussiana e a Histor ische Zeitschr ift.

Professor Adjunto de Teor ia da Histór ia


Julio Bentivoglio
PPGHIS-UFES
E-mail: juliobentivoglio@gmail.com

RESUMO
A constituição da ciência histór ica alemã no século XIX coincidiu com um
momento ímpar da pr ópr ia histór ia da Alemanha – o processo de unificação
política e de for mação do Impér io – no qual a investigação histór ica esteve dir et a
ou indir etamente r elacionada à emer gência do nacionalismo e à política pr ussiana.
Naquele per íodo, duas escolas histór icas se tor nar am r efer ências aos jovens
histor iadores: a escola r ankeana e a escola histór ica pr ussiana. Este ar ti go
pr etende car acter izá-las e discutir a for mação da cultur a histor iogr áfica ger mânica
oitocentista tomando como r efer ência a Hi st or ische Zeit schr ift .

Palavr as-Chave: teor ia da histór ia; histór ia intelectual; historiografia alemã; século
XIX.

ABSTRACT
The constitution of the German historical science in the nineteenth centur y
coincided with an unpr ecedented moment of the histor y of Ger many – the process
of political unification and for mation of the Empir e – in w hich histor ical resear ch
w as dir ectly or indirectly r elated to the emer gence of nationalism and Pr ussian
policy. At that time, t w o schools have become histor ical refer ences to young
histor ians: the Rankean school and the Pr ussian Histor ical Pchool. This ar ticle aims
to char acter ize them and discuss the for mat ion of the 19 t h centur y Germanic
cultur al historiography taking the Hist or ische Zei t schrift like refer ence.

Keyw or ds: theor y of histor y; intellectual histor y; ger man histor iogr aphy;
nineteenth centur y.

Tar efa difícil definir escolas histór icas, delimitando-as num cer to tempo e
espaço, localizando suas idéias de for ça e os elementos que confer em identidade
aos histor iador es que as compõem. Um r ecur so que permite um pri meir o passo

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nesta dir eção é analisar seus expoentes, bem como sua pr odução o que,
invar iavelmente, nos leva a um deter minado per iódico. Tal como podemos
vislumbr ar uma escola dos Annal es nas páginas da revista homônima ou uma Nova
Esquer da Inglesa nos arti gos da New Left ser ia possível identificar uma Escola
Histór ica Pr ussiana nas páginas da Hist or ische Zeit schr ift ?
Lamentavelmente a historiografia alemã dur ante o século XIX foi r eduzida
a uma imagem distor cida e car icata de um histor iador só: Fr anz Leopold von
Ranke. Como se toda a pr odução histor iogr áfica germânica adotasse a escr it a
r ankeana da história. Essa imagem dur adour a que sur ge ainda hoje em cert as
inter pr etações (FUNARI & SILVA, 2008) obliter a a exist ência de difer entes escolas
– ou movimentos – em solo alemão dur ante o oitocentos, das quais se destacar am
de um lado Ranke e seus seguidor es e de outr o a Escola Histór ica Pr ussiana, tal
como localizam os intér pr et es (Igger s, 1983) (SOUTHARD, 1995). É este o objeto
das linhas que se seguem, discutir a histor iogr afia ger mânica em suas linhas mais
ger ais e analisar o contexto histór ico em que foi pr oduzida, tomando como
r efer ência a Hi stor ische Zeit schr ift (Revista Histór ica), cr iada por Heinr ich von
Sybel em 1859, per iódico que existe até hoje e ofer ece um panor ama bastant e
sensível da pr odução histor iográfica alemã.
Em Michel de Cer t eau (2002) encontr amos uma chave analítica acur ada
para se pensar a oper ação histor iogr áfica e, por conseguinte, a pr odução individual
e coletiva dos histor iador es, visto ser r esultante da r elação entr e det er minados
pr ocessos de institucionalização – os lugar es –, a confor mação de determinadas
r egr as ou métodos – as prát icas – e, por fim, a expr essão e mater ialização de um
saber consubstanciado em regimes de escr it a . Em outr as palavras, nesta operação
obser va-se a r epr odução de algumas est r atégias funcionais: a institucionalização e
r eunião em tor no de centr os univer sitár ios privilegiados, a adoção de
pr ocedimentos metodológicos semelhantes e o exer cício de uma for ma de escrita,
que, a seu modo, privilegia um per iódico par ticular ; r esponsável por integr ar os
sujeitos do saber , as pr áticas e os cir cuitos de cir culação do conhecimento
histór ico, pr oduzindo um vínculo entr e as univer sidades, os histor iador es, as
associações científicas e os ar quivos, gar antindo a gênese e a divulgação das idéias

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do gr upo. Longe de quer er pr opor um esquema, tenho me convencido de que as


escol as histór icas dos séculos XIX e XX par ecem seguir um cer to desenho: sua
dur ação – constituição e influência – não costuma exceder um século; or ientam-se
a par tir de um gr ande cent r o, uma univer sidade que se destaca e pr ojeta suas
obr as histór icas que são r econhecidas e t r aduzidas em outr os países1 e, por fim,
cujo pr ogr ama e identidade do gr upo é cr ist alizado por meio de um instrumento
de difusão fundamental, uma r evista, uma coleção, uma sér ie. Ser ia possível
localizar ainda outr as iniciativas que consubstanciam as escolas, r elacionadas ao
acesso e contr ole privilegiado de cer t as fontes. Senão vejamos, a Escola Histór ica
Pr ussiana sediada na Univer sidade de Ber lim t or nou-se pujante já em meados de
1840, notabilizou-se pela publicação da Monument a Ger mani cae Hist or ica e uma
das r efer ênci as cent r ais do gr upo foi a Hist ori sche Zeit schr ift , tendo seu ocaso
ocor r ido em meados da virada do século após a quer ela de Kar l Lampr echt.2
O interesse por este tem sur giu-me em meados de 2003, quando me
convenci de que os historiador es alemães oit ocentistas tinham sido r eduzidos a
um lugar -comum. A emer gência da histór ia produzida na Alemanha atualmente,
que é bastante conhecida pelos leitor es br asilei ros, a partir, sobr etudo, do contato
com Gumbrecht (2003), Rüsen 2001) e Koselleck (2006), conduziu-me ao
pensamento histór ico ger mânico do século XIX. E r evelou que ele não passava
exclusivamente pela obr a de Ranke, que ainda hoje é muito mal-conhecida3, mas
também por Niebuhr , Dr oysen e Ger vinus, estes dois últimos expoentes da
chamada Escola Histór ica Prussiana. Da leitur a destes historiador es estampou-se a
ur gência par a que sua obr a fosse estudada. Assim sur gir am as tr aduções do

1 E é cur ioso que quase todos est es hi stori ador es iniciam sua car r ei r a em alguma univer si dade
per ifér i ca e depoi s migr am par a um pól o mai or e mai s impor t ante na ár ea. Deste cent r o passam a
per egr inar e confer enci ar em outr os centr os impor tant es, em outr as univer si dades dentr o e for a de
seu país.
2 A escol a met ódica fr ancesa, composta por Monod, Fagni ez, Langlois e Seignobos dentr e outr os, de

modo semel hante, aglutinou-se em tor no da Revue Hist or ique de 1876 – nome idêntico à r evi sta
alemã – e da Sor bonne ir r adi ando um ti po de escr i ta da histór ia que depois ser ia combati da por
uma nova escola, os Annales, que i ni ci a suas at ividades a par tir de 1929 na r evista homônima, Bloch
e Febvr e também se deslocam de Est r asbur go par a a Sor bonne e até o final do século XX for am uma
influente cor r ent e hi stor i ogr áfica. A micr o-hist ór i a segue padr ão similar , nas páginas dos Quader ni
St or i ci .
3 Basta lembr ar que, a r igor , existem apenas doi s ensai os sobr e o pensamento dest e autor , o

pr i mei r o r edigido por Sér gio Buar que de Holanda (1981) e o últi mo, publicado em 2010, por si nal
uma análise que nada deixa dever ao célebr e hi stor i ador , de autor ia de Sér gi o da Mat a (2010).
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Manual de Dr oysen (2009) e dos Fundament os de t eor ia da histór ia (2010) de


Ger vinus. O desper tar epistemológico da Histór ia, vivido na Alemanha do século
XIX r efer enda um momento singular em que o pensamento histór ico, ou suas
idéias-for ça par ecem tomar consciência de si, historicizando-se, situando seus
lugar es e sua per t ença, confr ontando sua pr ópria histór ia e projetando-se no
futuro. Nascia a ciência histór ica. Outr o detalhe impor tante er a a conver gência
particular de ciência e política, visto existir um diálogo intenso entr e pensamento
histór ico e ação política, haja vista a história subsidiar e ser subsidiada pelo debate
político em tor no da unificação alemã, dos conflitos ter r itoriais e do nacionalismo
emer gente de tal maneir a que nem mesmo Ranke escapou a isso; o que por si
desmistifica a inter pr etação ingênua e os ataques desfer idos contra seu pr et enso
apar tidar ismo. Ao contrár io de Kar l Mar x, cujas obr as histór icas procur avam
pr oduzir ação junto ao povo, em particular os trabalhadores, aqueles histor iador es
pr ussianos escreviam par a os príncipes e para a bur guesia, embor a não
despr ezassem o diálogo junto à opinião pública, mas par a isso se serviam da
impr ensa.
Como se tr at a de uma pesquisa em desenvolvimento, talvez existam mai s
per guntas e indícios que r espostas categór icas neste ar tigo. A meta, bastant e
modesta, ser á pensar a Escola Histór ica Prussiana a par tir da Revi st a Hist ór ica ,
uma das pr imeir as do gêner o em todo o mundo. Ela foi anter ior às congêner es:
Revue Hist or ique (1876) dos metódicos Monod e Fagniez, English Hi stor ical Review
(1886) fundada na Univesidade de Oxfor d ou os Annales (1929) de Mar c Bloch e
Lucien Febvr e. E também r elacioná-la com um per fil e uma análise sobr e a
tr ajetór ia dos histor iadores que a compunham. Este texto expr essa, portanto, tanto
a necessidade da desfigur ação de lugar es-comuns da histor iogr afia alemã dur ant e
o século XIX, quanto as dificuldades inerent es àqueles que se enver edam pelo
estudo da histór ia da historiogr afia. E vai enfatizar a conver gência entr e o
desenvolvimento da ciência histórica alemã e o pr ocesso de unificação política.
Vínculo, por sinal, per cebido por um dos histor iador es alemães mais conhecidos do
período, ganhador do pr êmio Nobel de Liter atur a em 1904, Theodor Mommsen:
Eis o hor izont e do fut ur o: or gani zar o Estado institucionali zado de for ma
que o comér cio alemão, a manufatur a alemã, a ar t e alemã, a ciênci a

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al emã, a sociedade alemã e a vi da alemã continuem equipar adas ou se


equipar em ao poder da nação. (THEODOR MOMMSEN, 1871, Apud
MARTINS, 2010)

Em muitas alusões à historiogr afia alemã do século XIX é comum r efer ir em-
se a ela como sendo positivista, factual e conser vador a (FUNARI & SILVA, 2008).
Pesa sobre aqueles histor iador es e, em especial, sobre o pai desta histór ia alemã o
anátema de uma condenação categór ica, afinal Ranke par ece ser a síntese de tudo
aquilo que não se deve fazer em Histór ia, algo que poder ia ser r esumido numa
fór mula: “nar r ar os fatos como acontecer am, ser objetivo e imparcial (Cf.
CARDOSO, 1988). Como se fosse fácil r esolver estas questões em um autor cuja
obr a é tão vasta quanto complexa1. Creio que sob esta censur a ataviar am
exatamente aquilo que todo histor iador dever ia evitar : r epr oduzir acr iticamente
uma máxima, incor r er em anacronismo e não tomar toda uma histor iogr afia a
partir de apenas um r epr esent ante. Esta é a primeir a imagem a ser desfigur ada,
que elimina esta leitur a r educionista, superficial e equivocada.
A complexidade da definição par a o que r ecentemente sur ge sob a r ubr ica
de histór ia da histor iogr afia exige que algumas adver tências sejam levantadas. A
pr imeir a r emete à pr ópr ia histor icidade do conceito de hist oriador , um léxico
antigo que sofr eu mutações no pensamento ocidental em meados do século XIX,
quando se passou a distinguir historiador es de cr onistas ou de memor ialistas. A
segunda ao pr oblema da relação autor(es) e obra(s), ou ainda, num sentido mais
amplo, da constr ução de identidades em um gr upo específico de histor iador es. De
cer to modo, esta questão é a mesma que ocor re nos estudos consagr ados à histór ia
intelectual, embora em outr o r egistr o. Nos estudos fr anceses consagr ados ao tema,
destacam-se os t r abalhos de Jean-François Sir inelli e de Michel Winock com uma
ênfase sociológica sobre as car tografias de intelectuais, suas redes de solidar iedade
e de oposição, seus modos de integração e em tor no da for mação de ger ações
(SILVA In: LOPES, 2006:15s). A r efer ência maior é o pensamento de Pier r e
Bor dieu, sobr etudo em suas noções de campo e de habit us (SILVA In: LOPES,
2006:16). A esta influência fr ancesa existe uma outr a da New Int ellectual Histor y

1 Concor do com Sér gi o da Mat a (2010) acer ca da exist ência de um ver dadeir o mito histor iogr áfi co a
r espeito de Ranke.
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anglo-saxã, que entende o texto como uma r elação de for ças, um nexo entr e
perspectivas e níveis diver sos que se configur am em det er minadas obr as e autor es
(KIRSCHNER in: LOPES, 2006:33). Nesta tendência temos a influência sedutor a da
hermenêutica filosófica e do desconstr ucionismo der ridadiano e seu maior
expoente é, sem dúvida Dominick La Capr a (KIRSCHNER in: LOPES, 2006:34-5).
Hayden White, a meu ver, apr esenta um diagnóstico bastante elucidativo acer ca do
campo. Ele se divide entr e os analistas
que 1) assumem uma posição de acor do com uma ou mais das
her menêuticas clássicas do século XIX (Hegel, Dilhey, Mar x, Fr eud) ou
seus her deir os do século XX; 2) advogam uma t eor ia fi lológica
neohumboldtiana da linguagem ul timamente r eelabor ada e r efinada por
Gadamer e Ri coeur , ou ent ão 3) subscr evem aber t amente a t eor ia pós-
saussur i ana do si gno lingüístico, dos quais são expoent es, ai nda que de
for ma difer enciada Foucault e Der r ida (WHITE, 1990:187-8).

Neste r egist ro, pode-se ponderar que, a seu modo, Pocock e Skinner quando
subsumem as cr iações individuais a um contexto maior , não deixam de ter sua
utilidade par a a histór ia intelectual e para a pr ópr ia história da histor iografia (Cf.
JASMIN & FERES JÚNIOR, 2007). Evidentemente, é pr eciso consider ar as cr íticas de
David Har lan ao chamado contextualismo, sobr etudo em Skinner , com sua
hermenêutica de fundo r omântico ancor ada na pr oposta t eór ica de resgate das
intenções originais do autor (HARLAN, 1989:585). Ponto alto das contr ibuições
r ecent es, sem dúvida devem ser localizados tanto em Koselleck, quanto em Jör n
Rüsen, visto ambos ter em dedicado estudos ao pr oblema da historiogr afia e de
como deve ser subsumido à análise da consciência histór ica (KOSELLECK, 2003,
RÜSEN, 2008). Como se vê, o exer cício de crítica histor iogr áfica a respeito da
histór ia da histor iogr afia não é algo fácil. Embora exist am tr abalhos clássicos1 a
tar efa apr esent a algumas dificuldades, sobr et udo acer ca da melhor maneira de
avaliar o sentido e o efeito pr oduzido pelas obras. Acr escente-se aí os problemas
iner entes de cr ítica, ou análise. Ou, como nas palavr as de Bar thes:
A cr ít ica funciona or dinar iamente (não é uma censur a), quer ao
mi cr oscópi o (esclar ecendo com paciência cada pormenor fil ol ógico,
autobi ogr áfico ou psicol ógico da obr a), quer ao t el escópi o (per scr utando
o gr ande espaço hi st ór i co que envolve o autor ) (2004:27).

1 A lista de autor es é exaustiva, mas, dentr e eles se dest acam Cr oce (1953), Momigliano (1993), Gooch
(1959), Collingwood (1972) e Igger s (1983) dent r e outr os.
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Numa tentativa de síntese eu dir ia que o debate a r espeito da histór ia da


histor iogr afia está mar cado or a pela ênfase na constituição do autor (e da autor ia –
sua for mação, mestr es, conceitos-chave), or a pelo problema da publicação das
obr as (e do que elas querem dizer ), or a pelo do seu efeito (sua aplicação em outras
obr as), or a pelo recur so à contextualização (pontos de inser ção e de disper são em
um deter minado lugar e per íodo, ou ainda face às disputas existentes). A
empr eitada se tor na ainda mais ár dua quando, em meio às difer enças de for mação
e de or ientação epistemológica se pr ocur am identidades que configur em a
existência de uma ger ação ou de um gr upo supr imindo, muitas vezes,
singularidades, quando não, elidindo a pr ópria autor ia, dissolvendo-a em pr áticas
ou em ideár ios coletivos. O desafio, por tanto, é o de discutir a exper iência daqueles
histor iadores e sua tr ajetória política e histor iogr áfica par a compr eender seu
percur so intelectual no contexto da unificação alemã, sem diluir tr ajetór ias
individuais em uma imagem coletiva, a fim de r estituir vida àqueles histor iadores
embalsamados por clichês, trazendo ao pr imeiro plano da cena os que for am
eclipsados pela magnitude de Ranke. Retr atá-los não como figuras ingênuas da
histor iogr afia alemã oitocentista ou mer os intelectuais conser vador es e
monarquistas, mas como histor iador es complexos vivendo em um per íodo
dr amático da história eur opéia. Em se tr at ando da apresentação de al guns
r esultados pr eliminar es cr eio que talvez estes pr essupostos não est ejam
plenamente atingidos neste ar tigo, pois ele apr esent a um momento de uma
pesquisa em andamento, não tendo a pr etensão de ser conclusivo.
O espaço de tempo vivido entre 1806 e 1871 é crucial par a se entender a
histór ia alemã. Entr e a der r ota fr agor osa em Iena par a Napoleão Bonapar te e a
vitór ia sobr e a Fr ança e anexação dos ter r itór ios de Alsácia e Lorena por Otto von
Bismar ck, que mar car am a fundação do Impér io Ger mânico, ocor rer am eventos
que distinguiram a emer gência do nacionalismo alemão e o compor tamento dos
estados ger mânicos em meio ao pr ocesso de unificação que ser ia capitaneado pelo
Reino da Pr ússia. A ocupação napoleônica mar cou a emer gência do nacionalismo e
o desejo de integr ação alemã.
Os excessos da Revolução Fr ancesa e de Napoleão ati çar am os
i nci pientes senti mentos nacionai s das pessoas e fi zer am-nos i r r omper

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em impiedosas l abar edas. A nacionalidade tomou o lugar da


humanidade. Ao esfor ço par a se r eali zar uma cultur a humana de car áter
univer sal , seguiu-se o que visava consolidar uma cul tur a nacional (...). e a
pr ópr i a ciência da histór ia nada hoje com bel a desenvoltur a na tor r ent e
nacional (SCHÄFER, 1884:I ).

Vale lembr ar , contudo, que em 1815 não havia instituições repr esentativas
na Pr ússia, mas já as havia na Bavária, em Baden e em Wüttember g. De qualquer
modo, par a a maior ia dos historiador es alemães, a dominação napoleônica evocou
o nacionalismo ger mânico. Br euilly indica que entr e 1815 e 1848 ter ia havido uma
dominação cooper ativa entr e austríacos e pr ussianos dos estados ger mânicos
(2002:27). Não cr eio. A exclusão da Áustr ia do Zolllver ein deixa isso muito clar o.
Em ter mos bem simples, as eli tes al emãs – em especial, a velha classe
agr ofeudal em declínio mater i al, inúmer os magnatas em ascensão na
i ndústr ia e nos bancos, e os pr ofessor es univer sitár ios – passar am a se
ver como guar di ães do car áter especi al da nação: pensavam ou
i magi navam que a Al emanha estava sendo assediada por um conluio de
i ni migos exter nos e, mais import ante, de inimi gos inter nos ( STERN,
2004:13).

Os histor iador es não poder iam fugir a estas demandas. Concomitante a


estes eventos for mava-se a ciência histór ica e se constituía uma esfer a pública
onde começava a se dest acar a figur a do intelectual ocupando espaço pr ivilegiado
no cenário político, na bur ocr acia est atal e se pr ojetando junto àquela sociedade
ar istocr ática. E muitos destes intelectuais for am, depois de Leopold von Ranke,
histor iadores, tal como Geor g Ger vinus, Johann Gustav Droysen, Kar l Wecker ,
Fr iedr ich Dahlmann, Geor g Waitz, Heinr ich von Sybel, Maximilian Duncker , Karl
Rotteck, Ludwig Häusser , Theodor Mommsen, Rudolf Haym, Heinr ich Treitschke e
Her mann Baumgar t en, que pareciam ter o estudo do passado e a atuação política
no pr esent e como vocações. A atividade deles foi mar cada não somente pelo vivo
sentimento de agir integrando o pensamento histór ico e seus conceitos às palavr as
de or dem usadas na impr ensa e na luta política, mas também por um compr omisso
com deter minadas for ças e seus pr ojetos políticos. O objeto contemplado, por tanto,
parece ilustrar um expr essivo ponto de conver gência no qual histór ia intelectual,
histór ia e histor iografia se ar ticulam, numa constelação par ticular, que pr ojetou
histor iadores e a pr ópria histór ia, intelectual e cientificament e, influenciando
ger ações de políticos na Alemanha e também de histor iador es em toda Eur opa e
em vár ias partes do mundo. Só para se ter uma idéia do destaque dos histor iador es
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nesta esfer a pública em for mação, basta lembrar que muitos deles foram
conselheiros políticos, editor es de jor nais, deputados ger ais ou ministr os.
O pr ópr io Ranke não escapou a est e processo, pois editou o Politisch-
hist ori che Zeit schri ft entre 1832 e 1836 a pedido da Casa de Br andembur go, bem
como foi conselheiro do r ei Fr eder ico IV da Pr ússia e de Maximiliano I da Bavier a
(BREISACH, 2007:262). O Hist or isch-Polit ische Zeit schr ift foi cr iado a pedido do
conde de Ber nstor ff, o minist ro dos Est r angeir os, que em 1833 tinha duas metas
clar as: combater os r adicais liber ais de esquer da e afir mar a autor idade do
gover no pr ussiano face às exigências do liber alismo político (IGGERS, 1983:70). O
von em seu sobr enome indica o título de nobr eza (bar ão) por ele obtido em 1865.
E vale lembr ar que suas aulas er am concor r idas, fr eqüentadas não soment e por
estudantes, mas também por autor idades, militar es, políticos, profissionais liber ais
e até integr ant es da bur ocr acia pr ussiana. Nem ele pode fugir do r eflexo que as
guer r as napoleônicas e depois a Restaur ação tiver am sobr e a for mação do
nacionalismo (Cf. HOBSBAWM, 1991) que ia ao encontr o do interesse cr escent e
pelo estudo das r aízes histór icas das difer entes nações européias, o que colocava a
histór ia como tematizador a do pensamento social . Não por acaso este pr ocesso foi
acompanhado pela pr esença t riunfante do historicismo como um verdadeir o
paradigma adotado em vár ios saber es em for mação (MEINECKE, 1997). Ao mesmo
tempo, nesta ânsia pelo vivido, evidentement e que as técnicas e a natur eza da
pr ópria histór ia também for am revistas1, explicitando a gênese de uma nova
consciência histór ica na qual os histor iador es r edimensionavam suas exper iências,
seus pr ojetos e a histor icidade do momento em que viviam. Assim, tanto o passado
quanto os saber es pr oduzidos sobr e ele viveram um desper tar epistemológico que
pode ser detect ado em vár ios moment os.
O pr imeir o destes momentos é a refer ência quase obr igatór ia ao
pensamento histórico de Chladenius, que em sua Algemeine Geschicht swissenchaft
de 1752 havia indicado o per cur so metodológico mais adequado para se estudar o
passado. Sua obr a balizou a cr ítica e a escr ita da histór ia ger mânicas ao destacar o
ponto de vista dos sujeitos histór icos e dos histor iador es-nar r ador es, r evelando

1É cur ioso neste sentido ver a hesit ação e o uso feito por Ranke do t er mo Hist or ie em lugar de Geschicht e
(RANKE, 2010) em muitas passagens de sua obr a.
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que o conhecimento histórico é mar cado pela crítica, tanto da per spectiva do
histor iador quanto dos testemunhos. O que não significa exatamente a aceitação de
que os estudos histór icos estejam contaminados pela sua subjetividade, mas o
r econhecimento da existência da pr ópr ia subjetividade, fer r amenta imprescindível
para uma corr eta compr eensão, outr o conceito fundamental por ele empr egado e
que ser ia fundamental na constituição do método histór ico poster ior ment e. A
cr ítica dos testemunhos, a compr eensão do passado e a busca pela objetividade
conhecer am em Chladenius um crítico veemente do ceticismo ou do r elativismo na
Histór ia.
O segundo momento r eside na obr a de Barthold Niebuhr , sobr etudo
sua Hist ór ia r omana , na qual desenvolveu inovador as técnicas de cr ítica histór ica
documental, buscando evitar tanto o anacr onismo quanto a repr odução acr ítica do
que diziam os documentos. Par tindo dos avanços r ecentes tanto da filologia quanto
da her menêutica, Niebuhr indicou par a os histor iadores duas oper ações
fundamentais da histór ia: a heurística e a sistemática. Sua contr ibuição é enor me,
bem como a r eper cussão de suas pesquisas; basta ver seu r econhecimento por
Ranke e Droysen; ambos revelam sua dívida metodológica a Niebuhr , que
r ealmente constituiu um momento de inflexão nas técnicas de pesquisa histór ica
na Alemanha. Essa tr adição veio, sobr etudo, da escola filológica de Göt t ingen , que
pr omoveu o exame cr ítico e rigor oso dos clássicos antigos e das fontes,
pr econizada por Wolf e Böckh. Este último foi o orientador de Dr oysen em seu
doutor ado. Junto com Wolf for am r esponsáveis pela disseminação da filologia e
também expr essavam a valorização pelos Estudos Clássicos no interior do
pensamento ger mânico, ao lado de nomes como Schleier macher, Schelling, Schiller
ou Humboldt.
O ter ceir o momento sur giu com Wilhelm von Humboldt e, para ser mais
pr eciso, com sua confer ência inaugur al pr ofer ida em 1821 na Universidade de
Ber lim: A t ar efa dos hist or iador es. Ali se encontr a a agenda científica dos
histor iadores pr ussianos, seu pr ograma fundamental, adotado como r eferência por
toda aquela ger ação. Competir ia ao histor iador reunir os fatos, pr ocur ando seus
nexos, identificando suas for ças motri zes e r epr oduzindo-os por meio de uma

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exposição nar r ativa. Nada poder ia ser mais clar o. Caber ia ao histor iador seguir
pr ocedimentos científicos e não abandonar a atividade cr iador a em seu ofício.
Pr opagador do histor icismo, Humboldt foi, ao lado de Chladenius e de Niebuhr ,
uma das maiores influências sobr e o pensamento de Ranke e de sua ger ação. Seu
nome ficou associado à Univer sidade de Ber lim, capitaneada a um dos cent ros
nevr álgicos do pensamento ger mânico, cujo pr ogr ama e organização for am por ele
r efor mulados tor nando-se refer ência par a r efor mas univer sit ár ias poster ior es.
Lecionar em Ber lim er a meta almejada por muitos pr ofessor es de então. Aquela
universidade, sobr etudo gr aças a Ranke e a Hegel, tinha seus postos cobiçados por
todo histor iador ou filósofo que desejasse ter pr ojeção em sua ár ea, tor nando-se
um pólo ir r adiador de novas doutr inas, e eles tiver am o mér ito de serem
consagr ados em vida não só na Alemanha, mas em toda Eur opa.
Um quar to momento corr esponde ao desenvolvimento dos tr abalhos de
Ranke e Dr oysen junto à Univer sidade de Ber lim: definindo a r elação entr e teor ia e
pr ática do novo saber. O modo como Ranke escolhia seus objetos de estudo, a
for ma como submetia as informações à cr ítica, bem como suas nar r ativas
pr ofundamente articuladas e expr essivas confer ir am-lhe uma posição de destaque.
Mas ao seu lado havia outr o gigant e, Dr oysen, r esponsável por desenvolver uma
ver dadeira teor ia da histór ia que consolidou o campo epi stemologicamente,
dotando-o da autonomia necessár ia face aos demais saber es que o destacou
perante sua ger ação. Ao que tudo indica, embor a cioso do método, inter essava
mais a Ranke a pr ática, a pesquisa e a escr ita da histór ia, ao contr ár io de Dr oysen,
que embor a tenha escr ito obr as histór icas absolutamente r igor osas e fosse
excelente pesquisador , teve maior e notável êxito com suas reflexões de or dem
teór ica. Junto-os aqui, não somente por que foram contempor âneos, ou por que
constituem a expr essão maior do pensamento histór ico ger mânico naquele
período, mas também por que, embor a fossem r ivais e não tivessem uma boa
convivência em Ber lim, suas obr as se complementam e r efer endam os
fundamentos da oper ação historiogr áfica de ent ão.
Um dos debates per manent es em r elação à histór ia pr osseguia, qual seja, o
de se vincular a nar r ativa histór ica aos domínios dos estudos liter ários. E foi par a

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r esolver esse conflito de fr onteir as que Ger vinus em seu Fundament os de t eor ia da
hist ória, r edigido em 1837, analisou a poética da histór ia, estipulando os elementos
constitutivos da nar rativa histór ica, distinguindo-a das nar r ativas ficcionais. Par a
além disso, pr opôs um modelo sugestivo par a se analisar a histór ia da
histor iogr afia ocidental bem como par a se definir alguns gêner os existentes na
escr ita da histór ia. Este corr esponde a um quinto momento, visto distinguir a
nar r ativa histór ica da ficcional de uma vez por todas, e pensar a histór ia como um
gêner o híbrido, mas específico, confer indo assim, um modelo genético de análise
da histor iogr afia. Pela pr imeir a vez havia discutido com pr ofundidade o pr oblema
da escr ita da histór ia, bem como havia exposto um novo modo de pensar a própr ia
histór ia da histór ia.
O último momento, a meu ver , r eside na cri ação da revista Hist or ische
Zeit schr ift (Estudos Histór icos) em 1859 por Heinr ich von Sybel, pupilo e discípulo
de Ranke na Univer sidade de Ber lim e amigo de Droysen desde as jornadas de
maio de 1848 em Fr ankfur t. Ali se consubstanciou o que pr ocurar ei defender como
sendo a efetivação de uma nova escola histór ica e a constituição de um r egime de
histor icidade par ticular par a a escrita da histór ia na Pr ússi a. Ela cor oa todo o
pr ocesso de for mação e matur ação de um tipo de história e sur ge quando as
manifestações pr ó-unificação alemã se ampliar am, sobretudo na Prússia, contando
com a par ticipação de muitos daqueles historiador es. Sem dúvida a Hi stor ische
Zeit schr ift foi um ponto de encontro, propagador das idéias do gr upo, projetando-o
na Alemanha e no exter ior. Sua influência explícita na Inglater r a, Itália, Espanha e
nos Estados Unidos, foi, mais velada na Fr ança1. Ao lado da r evista, for çoso é dizer
que a editora Duncker & Humblot, tornou-se também uma r efer ência par a o gr upo,
uma das maior es na Alemanha, cujo nascimento se deu auspiciosamente com a
cr iação da r evista At henaeum, publicada pelos ir mãos Schlegel e que depois se
pr ojetou com a publicação das obr as completas de Hegel e de Ranke. Nest a editor a
figur ar am gr andes obr as pr oduzidas pelo gr upo.
Ao tr atar da Escola Histór ia Pr ussiana, Rober t Southar d (1995) r evela que
para nascer ela t eve que super ar o inter dito r ankeano: o não-envolvimento dir eto

1 Embor a seus li vros sejam sempr e l idos, alguns tr aduzidos e seus nomes sempr e lembr ados por

Coulanges, por Monod, por Seignobos.


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do histor iador nos assuntos da política. Acredito, ao contr ár io, que a influência de
Ranke tinha indicado que o intelectual ou histor iador não é somente aquele que
pr ecisa se envolver dir et ament e nos acontecimentos políticos de seu tempo, mas
cujo pensamento pode ser uma for ça capaz de pr oduzir ação política no pr esente.
Seja subsidiando ou sendo subsidiado por um deter minado projeto político, seja
impr imindo seus postulados nos acontecimentos do pr esent e, seja agindo par a
r efutar pr ojetos ou postulados existentes. É pr eciso ainda lembr ar que as
universidades alemãs eram instituições estatais e que os gr aduados começavam a
ocupar um lugar especial naquela sociedade. O Código Geral Pr ussiano havia
incluído na sua classificação dos grupos sociais, além das t r adicionais nobreza,
bur guesia e campesinato os ser vidores do Estado, incluindo nesta r ubr ica os
diplomados1. Escolas e as universidades, afir mava o Código, “er am instituições do
Estado e só podiam ser fundadas com autor ização oficial” (RINGER, 1999, 37).
Aquelas univer sidades passavam por um per íodo de gr ande renovação nos estudos
e nas disciplinas. Em Göttingen, o neohumanismo enfatizava o apr eço pela cultur a
clássica, pelas r aízes cultur ais germânicas e pelos estudos filológicos. Em Halle
sur gia uma nova universidade, voltada par a cur sos mais técnicos e par a as ciências
aplicadas, como o Dir eito, a Administr ação e a Economia. Tratando daquelas
universidades dir á Ringer que na “cor te de Weimar e na Univer sidade de Jena,
cidade vizinha, quinze anos br ilhantes r eunir am al gumas das pr incipais figuras do
r enascimento cultur al alemão” (RINGER, 1999, p.35), como Schiller , Fichte, Hegel.
A pr ópr ia Univer sidade de Ber lim, que se destacava agor a como o centr o
nevr álgico pr ussiano, superando Pr aga2, Fr ankfur t, Göttingen e Leipzig, expr essava
o ideal de uma nova univer sidade, servindo de modelo para as futur as
universidades alemãs, que alter ar iam seus estatutos tendo-a como referência
(Ringer , 1999, 39). Mas est as novidades se adaptavam a uma sociedade
ar istocr ática, onde est es pr ofessor es er am transfor mados em conselheir os,
Geheimrät e, e vistos como leais e eminentes ser vidor es do Estado (RINGER, 1999,

1 Allgemeines Landr echt für die pr eussischen Staaten, par t e II, tít.VII-X, 1794.
2 Viena e Pr aga for am em al guns momentos, a capital do i mpér io ger mânico. A ascensão de Ber li m
foi r ecent e e está r elacionada com a ascensão dos Hohenzoll er n. “Gr aças às conquist as i nt er nas e
ext er nas e também à habi lidade di pl omática desta di nasti a, Ber lim se equipar ou a Par i s e a
Londr es, ent r e os séculos XVI II e XIX” (ELIAS, 1997: 22).
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51). Penso que esta leitur a desmistifica a possibilidade de uma atuação livr e e
apar tidár ia. Afinal a adesão dos docentes er a obtida por meio de um instr umento:
o dolor oso pr ocesso de habilitação dos candidatos a pr ofessor es efetivos nas
universidades alemãs. Os pr ofessor es tinham seu passado esquadr inhado pelos
Habilit at ionsschr ift antes de ser em admitidos, sobr etudo depois de 1871. “Este
sistema de r ecr utamento per maneceu essencialmente intacto até 1945” (IGGERS,
1983:25). De qualquer modo, o inter esse pelas questões do momento levar am à
cr iação de vár ias cadei ras de história contempor ânea, que atraíam gr ande público,
desviando os histor iador es da ciência par a a atuação política, cadeiras estas
ocupadas por histor iador es como Dr oysen, Sybel ou Ger vinus, dentr e outr os. E o
estudo da história política conduzia cada vez mais à r ejeição da possibilidade de
uma ética r acional de dir eitos e valor es universais, comum a todos os homens, pois
cada vez mais era vinculada a situações histór icas específicas1. Vale lembr ar que a
histór ia disputava com a mor al, a política e a filosofia o papel de nor teador a da
ação política. De qualquer modo, diz Mommsen
O intelectual alemão também se pode vangl or iar do que a ciênci a tr ouxe
de benefíci o do povo (...) o desempenho individual de cada um de nós,
em compar ação com o t odo, é de t al for ma ínfimo que apar ece como um
soldado no campo da bat al ha em que combateu (...) Muito ant es de as
ar mas alemãs ganhar em nos campos de batalha, a pesquisa alemã, em
seus campos, conquist ou o conheci mento e for çou nossos vizinhos a
apr ender nossa l íngua. (MOMMSEN, Apud MARTINS, 2010, p.114-5).

E é pr ecisamente est a relação entr e história, filosofia e política que


distinguiriam as escolas histór icas que se for maram na Alemanha oitocentista,
afinal elas não se limitar am à Ranke ou a sua obr a como quer em alguns
intér pr etes, tampouco constituíam uma identidade absoluta entre todos aqueles
histor iadores. Os própr ios alemães chegam a r econhecer a exist ência de vár ias
escolas: a escola Rankeana e Humboldtiana, a escola de Niebuhr (que exer ceu
enor me influência na Fr ança e veio a se r eforçar com o manual de Er nst
Ber nheim), a escola filológica de Böckh e de Gr imm, a escola r omântica de Goethe e
Novalis, a escola histór ica do Dir eito de von Savigny e, finalmente, a Escola
Histór ica pr ussiana (cf. MARTINS, 2008, p.; cf GOOCH, 1959). Em que se

1 Exempl os di sso ser iam as justificati vas dadas por Mommsen e Sybel sobr e os di r ei tos da
Al emanha sobr e a Alsáci a e Lor ena, em textos onde a ação política er a justificada pela histór ia.
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distinguiam? Que peculiar idades existem, por exemplo, em relação aos her deiros
de Ranke e ao gr upo dos histor iadores capitaneados por Ger vinus e Droysen?
Penso que foi, sobr etudo, a intr ínseca r elação que estabelecer am ent r e pesquisa e
postura intelectual, entr e pensamento e ação, entr e ciência e política. Até porque é
notável a her ança teórica e metodológica comum bem como a atmosfer a de
r espeito e rever ências mútuas entr e os seguidor es de Ranke e os integr antes da
Escola Histór ica. Desafetos haviam, r ivalidades também, como entr e Ranke e
Dr oysen, entr e Mommsen e Tr eit schke, ou entr e Sybel e Waitz. Mas, o grupo
assentava-se sobr e uma her ança epistemológica comum; foi mar cado pelo
histor icismo de Humboldt e de Ranke, pela r eação ao idealismo hegeliano e pela
absor ção de pr ocedimentos her menêuticos e filológicos na composição do método
– a cr ítica documental buscada em Niebuhr . Defendiam a atualidade de Aristóteles
– cujo pensamento é visto com r espeito –, muitos publicar am tr aduções, r edigir am
obr as voltadas par a a política e a histór ia do tempo pr esente, engajar am-se em
lutas na impr ensa per iódica, par ticipar am dir etamente na vida pública se
envolvendo no nacionalismo emergente – publicando textos de car áter político-
nacionalista –, propagando o ideal da Kleindeut sch dur ante e após as jor nadas de
1848 além de pr econizar um fundamento axiológico orientado pela defesa da
objetividade. Em sua maior ia er am pr otestantes, defensor es da monar quia
constitucional, integr avam-se às fileir as dos liberais moder ados
constitucionalistas, não condenar am as guer r as de unificação capitaneadas por
Bismar ck (salvo Ger vinus e Mommsen) e, por fim, escr ever am obr as de histór ia do
tempo pr esente. Em r esumo, mantinham atmosfer a de r espeito às escolas
ger mânicas de pensamento exist entes – her menêutica, filológica e filosófica –, que
er am vistas como coadjutor as na fundamentação da Histór ia, com um esforço
teór ico semelhante e mediante o recur so a pr ocedimentos metodológicos comuns.
Para Frit z Stern,
Encontr amos núcleos de excelência nas vidas de alguns de seus
i ndivíduos r epr esentat ivos; er am imbuídos de uma fé na ciência que
ai nda er a inocent e, uma fé semelhant e a uma r eligião. Er am pr ot egidos
por laços de ami zade, ti nham o apoio de uma sociedade disciplinada,
moviam-se por ambição or ganizada e cont avam com um sistema
educacional sem i gual. A ciência alemã e a sociedade alemã er am
pr ofundamente i nter li gadas (STERN, 2004:12).

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Compr ova-se assim a existência de um pr ocesso de institucionalização da


disciplina histór ica em cur so, marcado por lugar es e também por r egr as que
definiam a ciência histórica exer cit ada. Em r elação à escr ita da histór ia, maior es
estudos são ainda necessários par a aquilatar o nível de suas semelhanças e
difer enças no que concer ne aos aspectos figur ativos, estilísticos, r etór icos e
nar r ativos das obr as.
Fortes indícios subsumem seu sur gimento em meio a uma cr ise da
consciência histór ica eur opéia, vivida desde a Rest aur ação e mar cando o
pensamento e a política oitocentistas. Não é ocioso, por tanto, examinar a atuação
daqueles histor iador es como ator es históricos. Em primeir o lugar queriam
r efor mas, ademais, do início do século XIX até meados de 1848 buscavam algo
novo. Cr eio haver uma compr eensão entre eles sobr e a necessidade da for mação
de novos homens para uma nova Alemanha, incutida no papel que muitas vezes
atr ibuíam à Bil dung , embora isso não fosse algo homogêneo. Esses novos homens,
singulari zados na figura do intelectual, contudo, precisavam conviver com uma
velha política. Na crise da exper iência histór ica vivida, constr uíram novos pr ojetos
políticos – alguns já haviam sido potencializados na literatur a –, r eavaliar am suas
tr adições cultur ais, mas encontr ar am muitos obstáculos em r elação à ação política,
r evelando uma sensível tensão em cur so entr e a sociedade, a bur ocr acia
administr ativa e os gover nos ari stocr áticos ger mânicos. Assi m, embor a algumas
exper iências fossem questionadas, havia dificuldade em romper deter minadas
or ientações político-monárquicas e t ambém r eligiosas. Nem todas as t r adições,
por tanto, estavam per meáveis às mudanças em curso. Isto talvez explique o tr iunfo
da excessiva moder ação, bem como, da per sist ência do conser vador ismo.
Do ponto de vista político, de modo semelhante ao Br asil, os liber ais
moderados desejavam r efor mas, pois viam com r eservas a r evolução ou o
pr incípio democr ático. Igualmente não defendiam a igualdade absoluta ent r e os
homens. Lutavam, contudo, pela consolidação de uma esfer a pública cujo debate
jor nalístico é bastante expr essivo, mas que enfr ent ava o poder estatal e as
r etaliações políticas – que se valia de instr umentos como a censur a, a demissão ou

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a pr isão 1. Em uma atmosfer a pr ofundament e autoritár ia, pouco espaço er a


confer ido ao pr incípio democrático. Assim, liber ais r adicais, comunistas e
socialistas er am quase sempr e r esumidos à condição de anar quistas ou de
pertur bador es da or dem vigente. Nest a condição sofr iam ameaças de pr isão ou
er am for çados ao exílio.
Pode-se dizer que o nascimento do histor iador na Alemanha coincidiu com
a constituição deste saber e dest es intelectuais, ao lado da construção do est ado
Alemão, cujo passo inicial pode ser localizado na cr iação do Zoll ver ei n em 1834, e
depois atr avés de alianças político-militar es que viabilizar am as guer r as de
unificação sob a lider ança da Pr ússia. Dur ante este processo, muitos histor iador es
vir am-se integr ados no esfor ço de construção do novo Estado, integr ando-se à
bur ocr acia ou ao ser viço público, r ealizando missões diplomáticas, exer cendo a
docência e a pesquisa e atuando como funcionários ou como conselheir os. Ou seja,
for am intelectuais de pr ojeção em sua sociedade, ao lado de juristas, economistas,
políticos e filósofos, mas que or bitavam em t orno do Estado. Como foi exposto
anter ior ment e, nem o apar t idár io Ranke escapou a isso. De maneir a mais explícita
os histor iador es da Escola Histór ica não viam pr oblemas em integr ar escr itos
políticos de ocasião com estudos sobr e o tempo pr esente ou histór ia do passado.
Eles per cebiam uma r elação intr ínseca ent re as motivações do pr esente com a
investigação histór ica, ent r e a compr eensão teór ica do estudo das sociedades no
passado e a motivação par a a ação política no pr esente, subsumidas a uma mar cha,
ilustr ada pela Histór ia e pela pr ópria tr ajetór ia nacional alemã, escamoteando
pr etensões univer sais, pois a defesa das singular idades da histór ia alemã não
obliter ava a ambição que tinham de escr ever uma histór ia mundial, na qual a
Alemanha ocupava uma posição de destaque.
Curiosamente, os historiador es ger mânicos do século XIX par eciam inver ter
a fór mula de Koselleck: alimentavam muitas expectativas do passado, cuja
exper iência histór ica r edescobr iam cada vez mais gr aças à consulta de fontes
nunca manuseadas e ao r ecur so à cr ítica documental que possibilitava uma nova

1Foi o caso de Ger vinus, por exemplo, que t eve obr a censur ada e ameaça de pri são, de Dahl mann
que t ambém foi pr eso, da per seguição de Dr oysen na Dinamar ca. Ou ainda Kar l Wecker que per deu
sua cadeir a na univer sidade por questi onar o Par lamento de Baden.
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escr ita da história; e r ecor r iam a esta exper iência do passado a fim de encontr ar
uma conexão nos eventos ver ificados no pr esente e no futur o. Ou seja, pr ojetavam
o passado no futur o. Afinal, a histór ia não er a mestr a da vida, mas expr essava
for ças históricas per manentes que se configur avam de maneir a singular em cada
época e em cada povo. Nos eventos políticos ver ificavam uma soma em cur so, cuja
tendência e até mesmo cuja essência era univer sal. Tomavam os estudos do
passado como uma r efer ência par a pensar a at uação nos acontecimentos políticos
vivenciados no pr esente, vislumbr avam a pr esença de forças histór icas, de idéias
que se mater ializavam em difer entes sociedades, que possuíam um sentido que se
sentiam capazes de analisar . O que comprova a sedução do pensamento de Hegel, a
impr imir um for te teor teleológico na leitur a que muitos faziam a despeito de
r esistências. For ças histór icas impeliam o agir humano e est e possuía uma essência
a se r ealizar , mater ializada de maneir a incompleta em difer entes experiências
histór icas do passado e do pr esente. O século XIX, contudo, tr azia novamente a
possibilidade de tentar concr etizar esse ideal, embor a soubessem, por sua própr ia
exper iência, que isso poderia ou não ser r ealizado de imediato. A seu modo
colabor ar am par a r epensar o mito lei bziniano de que viviam no melhor dos
mundos possíveis, em uma época dour ada par a o pensamento e par a a cultur a
ger mânica. Após 1848 e, sobretudo, com o início das guer ras de unificação essa
imagem ganhou for ça ainda maior, embor a convivesse com vozes dissonantes.
Mais uma vez, r evela Mommsen,
Por cer to temos t ambém o or gulho de ser alemães, e disso não nos
encabulamos. De t odas as ost entações, nenhuma é mais vazia e falsa do
que a da modéstia al emã. Nada temos de modestos, não o quer emos ser e
nem que se di ga que o somos (...). No ent anto, mesmo se nos decl ar amos
nada modestos, não nos tor namos por isso cegos. (MOMMSEN Apud
MARTINS, 2010: 113).

As manifest ações nacionalistas ganhavam ímpeto e expr imiam o desejo de


for mação de um Império Ger mânico, uma monar quia constitucional sob o gover no
dos Hohenzoller n, ou seja, sob a liderança da Pr ússia e a exclusão da Áust ria.
Aqueles histor iadores viam a histór ia como um processo complexo, não como uma
r elação de causalidade, mas como constelações de eventos mar cados pela ação de
for ças histór icas, tendo um sentido: a realização da liber dade ou ainda da

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consumação da gr ande obra divina. Nisso fundiam convicções políticas e r eligiosas.


Este último aspecto não será destacado aqui. Mas, a liberdade era, par a eles, um
conceito complexo. Sua idéia de liber dade est ava fundada sobr e velhas tr adições
nacionais e entendia a autor idade r eal e o poder estatal como histor icamente
associados e não como antítese à livr e política. Mas essa per cepção tinha matizes
nos difer entes Estados – 39 ao todo – que compunham a Confeder ação Ger mânica.
Com a Unificação Alemã lider ada por Bismar ck (1866-1871), novamente
potencializou-se o otimismo ger mânico, afinal, depois da Revolução Francesa e das
r evoluções de 1820 e 1830, também a Alemanha par ecia r ealizar os desígnios
histór icos da humanidade. Essa impr essão er a sensível em muitos daqueles
histor iadores. E impr imiu neles, por conseguinte, a ênfase e o engajamento nos
acontecimentos. Em 1848 er a preciso agir, seja par a impedir a anarquia e os
excessos, seja par a dar a dir eção aos eventos. Mas, derr otadas em uma at mosfer a
r efor mist a a palavr a de or dem par a o momento foi, sem dúvida, moder ação. Muitos
histor iadores engajar am-se na cr ítica da realidade político-social alemã, tomando,
declar adament e, partido, em fr anca oposição ao mestr e Ranke. Só não par eciam se
lembr ar de que, em 1792, a Pr ússia havia lutado contra os revolucionár ios
fr anceses, tentando par ar a r evolução. Sobre aquela sociedade diz Norber t Elias:
O Est ado Hohenzol ler n ti nha todas as car act er ísticas de um Estado
mi litar que se er guer a at r avés de guer r as vi tor iosas. Seus dir i gent es
r econheciam a necessi dade de cr escent e industr iali zação e, lat o sensu, de
cr escent e moder nização. Mas os i ndust r iais bur gueses e os donos do
capital não for mavam o est r ato super i or que gover nava o país. A posição
da nobr eza mil itar e bur ocr ática, como o estr ato mais el evado e
poder oso da sociedade foi não só pr eser vada, mas t ambém for taleci da
pela vitór ia de 1871. Uma boa par te da classe média, mas não toda ela,
adaptou-se com r elativa r apidez a estas condições. Seus membr os
encaixar am-se na or dem soci al do Kai ser r eich como r epr esent antes de
uma classe de segunda cat egor ia, como subor dinados (ELI AS, 1997:26).

A seguir , vejamos um per fil ger al daqueles histor iador es integr antes da
Escola Histór ica Prussiana e que tiveram ou exer cer am alguma função política
destacada no per íodo entr e 1848-1871 apr esentado no Quadr o 1 e que
colabor ar am na Hist or ische Zei t schr ift . Alguns deles integr ar am o Par tido do
Cassino, nome do hotel e r estaur ant e onde se encontravam, onde defendiam a
Kleindeut sch , a unificação, o Estado de dir eito, baseado na constituição; no qual
pediam ór gãos r epr esentativos eleitos pelos distr itos dos estados t r adicionais e
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advogavam a igualdade perant e a lei e o fim das r est r ições, como por exemplo aos
judeus. Alguns deles integr ar am, nos anos 1860, o Partido Nacional Liber al
(IGGERS, 1983:93). De um modo ger al r ejeitavam a filosofia da histór ia de Hegel, a
teor ia da lei natur al, a pr imazia do indivíduo – em seu lugar colocar am as for ças
histór icas – que pr oduziam o Estado e os indivíduos. Acreditavam no pr ogresso. E
entendiam que o poder não é soment e for ça, mas também um pr incípio ético.
Entr e os 830 deputados da Assembléia de Frankfur t em 1848-9, havia
apenas um tr abalhador e um camponês, 49 pr ofessor es univer sit ár ios, 57
pr ofessor es escolar es, 157 magistr ados, 66 advogados, 20 pr efeitos, 118
funcionários públicos, 18 médicos, 43 escritor es, 16 pastor es e 16 padr es. No total,
pelo menos 550 tinham diplomas de cur so superior , per to de 20% eram
pr ofessor es univer sitários, 35% funcionár ios públicos, 17% advogados (HUBER,
1960: v.2, 611). No total, 11 er am histor iador es. A essência dos t r abalhos r evelou-
se como “a unidade pela per suasão” (TAYLOR, 1945:76). Soldados do r ei
pr otegiam os tr abalhos. O nacionalismo tcheco da Bohemia contur bou a paz da
assembléia. E também a guer r a em Schleswig-Holstein. Em 1850 a Áustr ia
derr otou tropas bávaras e pr ussianas em Hesse (Olmutz), em r etaliação foi
novamente r ecusada no Zollver ein; poster ior mente, a guerr a com a França, em
1859, e a unificação italiana colocar am em xeque a hegemonia aust ríaca. Tem
início a expansão da supremacia pr ussiana, cuja hegemonia pode ser ilustr ada pela
famosa fr ase pr oferida em 8 de outubr o de 1862, pelo pr imeir o minist r o
pr ussiano, Bismar ck: “os pr oblemas atuais não ser ão r esolvidos por maior ia de
votos – este foi o er r o dos homens de 1848 e 1849 – mas por sangue e fer r o” (Apud
TAYLOR, 1945:101).
O desejo de par ticipação e de maior es liber dades políticas manifestou-se no
Parlamento de Fr ankfur t, mas as divisões inter nas entr e os par lamentares facilitou
a r ecomposição das for ças ar istocr áticas, culminando na sua dissolução em junho
de 1849 e na r ecusa da cor oa do Império por Fr ederico IV. Na Assembléia “valor es
liber ais pr edominar am, por exemplo, a separ ação entr e igr eja e Estado, a
independência do judiciár io, a instituição do habeas cor pus, a abolição da pena de
mor te (BREUILLY, 2002:45). O gr ande dilema er a ent re autor idade nacional – de

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base popular ? – e autor idade estatal, afinal os pr íncipes ger mânicos indicavam os
ministros em seus Est ados. Não obstante, as tendências r evolucionár ias for am
esmagadas, os ímpetos liber ais r efr eados e a disputa pela hegemonia face aos
estados germânicos foi resolvida em 1866 na Guer r a das Sete Semanas entr e
Pr ússia e Áustria. Ali se for mou a Confeder ação Alemã do Nor te, por Otto von
Bismar ck, o Reichst ag foi inaugur ado em fever eir o de 1867 e a Guerr a Fr anco-
Pr ussiana de 1870-1 selou a cr iação do Impér io, a integr ação dos Estados do sul e,
consequentemente, a unificação.
No Quadr o 1 estão r elacionados alguns histor iadores alemães do per íodo
que, além de obr as histór icas, produzir am t extos políticos ou exer cer am alguma
atividade política impor tante no per íodo estudado. Ele apr esenta alguns r esultados
parciais da pesquisa que desenvolvo. Nele r elaciono datas de nascimento e mor t e,
cidade natal, cur so estudado, univer sidades fr eqüentadas, amigos ou mest r es de
r elação mais estr eita, univer sidades onde at uar am, cargos legislativos, outros
car gos, publicações de car áter político e obras histór icas. Encontr am-se
r elacionados apenas 31 histor iadores; só par a se ter uma idéia na Hist or ische
Zeit schr ift são 273 ao todo que colabor ar am enviando 783 ar tigos entr e 1859 e
1900; mas eles per mitem fazer uma r adiogr afi a elucidativa dos historiador es e da
histor iogr afia alemã oitocentista. Ao todo, 11 tinham títulos de nobr eza.
Em pr imeir o lugar, nem todos er am pr ussianos, muitos nascer am em outros
Estados ger mânicos. Do mesmo modo embora os pr otestantes fossem a maior ia, é
possível localizar judeus e católicos atuando dentr o do gr upo. Uma outr a
car acter ística é a pr esença de pelo menos tr ês ger ações de histor iador es: a
pr imeir a composta por membr os como Ranke, Waitz, Ger vinus e Dr oysen; uma
segunda composta por Sybel, Mommsen, Duncker e Häusser; e, a última, composta
pela ger ação de Tr eitschke, Oncken, Waschsmut e outr os. Esta última ger ação
r epr esenta o ar r efecimento da hegemonia histor iogr áfica exer cida pelas duas
pr imeir as ger ações, com um afastamento bem maior do par adigma r ankeano.
Aspecto decisivo da for mação r evela que alguns universidades er am prefer idas e
que er a comum estudos desenvolvidos em mais de uma instituição. É como se
buscassem em cada univer sidade os melhor es cur sos desejados, ou ainda como se

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deixassem os estudos iniciais em sua cidade natal e seguissem par a outr os centros
mais especializados. Histór ia é o cur so mais fr eqüentado pelo gr upo r elacionado,
seguido por filologia, filosofia e dir eito. Ber lim e Heidelber g são as univer sidades
mais apr eciadas, seguidas por Fr eibur g, Göttingen, Leipzig e Bonn.
Os vínculos de amizade e afinidades pessoais dentr o do gr upo é bastant e
heter ogêneo, embor a Ranke, Sybel, Ger vinus, Dr oysen Häusser e Dahlmann fossem
figur as de destaque junto aos demais, sur gindo em várias biogr afias na condição de
mest res, supervisor es de estudos e pr ojetos mer ecedor es de crédito e gr atidão.
Além de algumas biogr afias for am consultadas enciclopédias de autor es alemães
para localizar os dados apr esentados no quadr o. Aqueles histor iadores lecionar am
em difer ent es univer sidades, embor a seja possível ver ificar que os que se
destacar am no campo costumavam ocupar cadeir as em Ber lim, Heidelberg, Bonn
ou Göttingen. Entre os r elacionados, 11 for am deputados no Par lamento em
Fr ankfurt de 1849, 13 for am deputados em seus Estados e 10 for am deputados no
Parlamento Nacional após 1871, o que indica uma intensa atividade política por
parte dos histor iador es. Não por acaso, muitos foram conselheir os de r eis e
pr íncipes ger mânicos, seis foram r eitores de universidades e sócios ou integrantes
de academias e sociedades científicas.
Em r elação à impr ensa, 15 for am editores de jor nais, a metade do conjunto
r ecor t ado, bem como escr eviam em jor nais, ao lado de outr os dois que apenas
escr eviam na impr ensa per iódica sem chegar à di reção. Já a pr odução
histor iogr áfica do conjunto não está definidamente indicada, faltando relacionar
algumas obr as, embor a possa ser dito que sua principal mar ca são histór ias
nacionais, estudos sobre a histór ia do tempo pr esente e biografias. Idade Média e
Er a Moder na eram dois per íodos bastant e apr eciados ao lado de histór ia r ecent e.
Mas aqui ainda são necessár ios maior es levantamentos par a afir mações mais
conclusivas.

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Quadro 1. Alguns Histor iadores Alemães Do Século XIX Envolvidos Em Assuntos De Natur eza Política.
NOME VIDA CI DADE FORMAÇÃO UNIVERSIDADE MESTRES/ LECI ONOU CARGOS OUTROS CARGOS OBRAS POLÍ TICAS OU OBRAS HISTÓRICAS
NATAL AMI GOS LEGI SLATI VOS JORNAIS
Kar l von ROTTECK 1775-1840 Freiburg Dir eito Freiburg Johann Jacobi Fr eiburg Par lamento de Presidente da Câmara Editor do jor nal O Liber al Hist ór ia Ger al, St aat slexikon
Baden e Conselheir o em
Freibur g, pr ó-r eitor da
Univer sidade de
Freibur g
Kar l Theodor Georg P. 1790-1869 Oberofleide Dir eito e Giessen e Dahlmann, Giessen, Kiel, Par lamento de Editor do jor nal St aat slexik on
WELCKER n Holberg Ciência Heidelber g Dr oysen Bonn e Baden, Par lamento O li ber al independente,
Ohm Polít ica e Ger vinus Fr eiburg de Fr ankfur t
Rudolf HAYM 1821-1901 Gr ünberg Teologia e Halle e Duncker Halle Par lamento de Discur sos e palestr antes Hegel e seu tempo, A escola
filologia Ber lim Frankfur t do pr imeir o pr ussiano r omânt ica,
Unidos Diet, A Assembleia Her der e sua vida.
Nacional Alemã, editor do
Preußische Jahr bücher ,
Hallesche Algmeneine
Lit er at ur Zeit ung,
Nat ion al Zeit ung
Georg WAITZ 1813-1886 Flensbur g Filosofia e Kiel e Berlim Ranke Kiel e Assembléia de Monumenta Rot teck-Welck er- Hist ór ia constit ucional alemã,
direito e Schelling Göttingen Schleswig-Holstein, Ger maniae Histórica St aat slexikon , For schun gen zu r deut schen
Par lamento de Gru ndzü ge der Polit ik, Geschicht e, Hist ór ia de Schleswig-
Frankfur t Holst ein.
Fr iedr ich von 1795-1868 Dinkelsbühl Dir eito- Er langen Ranke Munique Par lamento de Conselheir o dos r eis Estudos dos at ivos estatais
HERMANN economia Frankfur t Maximiliano I e II da econômicos, comer ciais, renda e
Baviera, Conselho de consumo.
Estado da Bavier a,
Academia Bávara de
Ciências
Reinhold PAULI 1823-1882 Ber lim Filologia e Bonn e Ber lim Dahlmann e Bonn, Secr etar ia da Wür ttember g e o desastr e Hist ór ia dos document os
história Ranke Mar burg, embaixada em Londres feder al hanseáticos, Ensaios sobr e a
Göttingen histór ia da I nglaterr a
Georg VOI GT 1827-1891 Konigsber g Histór ia Konigsber g Dr umman e Rostt ock, Membr o da Associação Jor nal Cultur al O Renascimento na Ant iguidade
Von Sybel Leipzig Comercial de Leipzig, Clássica
Academia de Ciências
da Bavier a, Sociedade
de Leipzig, Academia
de ciências de Viena
Wilhelm ONCKEN 1838-1905 Heidelber g Filologia, Heidelber g, Häusser Heidelber g Par lamento de Reitor da univer sidade Hist ór ia Ger al 44v., a Er a da
história e Gött ingen e Ber lin Hesse e Nacional de Giessen Revolução – do impér io à guer ra
filosofia de liber tação, A Era do Imperador
Wilhelm I, Fr eder ico o Grande.
Fr iedr ich DAHLMANN 1785-1860 Wismar Filosofia Copenhagen e Halle Wolff, Kiel, Par lamento de Secr etár io da cavalar ia Polít ica, r eduzida ao gr au Fontes para o est udo da histór ia
Von Kleist , Göttingen, Frankfur t 1848, em Schlesw ig Holstein, e medida das condições alemã, Histór ia da Dinamarca,
Gervinus, Iena, Bonn Par lamento de Líder da revolt a dos existen tes. Hist ór ia da revolução inglesa,
Welcker Er fur t Sete Hist ór ia da Revolução Fr ancesa
Maximilian DUNCKER 1811-1886 Ber lin Histór ia, Ber lim e Bonn Dr oysen, Halle, Par lamento de Dir etor dos Ar quivos Preussische Hist ór ia do Par lamento de

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filosofia e Haym e Tubingen, Hesse, Par lamento Prussianos, Ministro St aat sschr ift en , Hallesche Frank fur t, A cr ise da refor ma.
filologia von Sybel de Frankfurt , dos Estrangeiros em Algmeneine Lit er at ur
Membr o do 1860, conselheir o de Zeit ung.
Par lamento Freder ico III ,
Nacional em 1867 6 meses preso por
par t icipar de
fr ater nidade, Academia
Prussiana de Ciências,
Academia de Göttingen
Ludw ig HÄUSSER 1818-1867 Kleeburg Histor ia Heidelber g Schlosser , Heidelber g Par lamento de Allgemeine Zeit un g Hist or ia da Alemanha da mor te de
Gervinus Baden Deut schen Zeit ung, Freder ico à Fundação da
Preußische Jahr bücher Confeder ação.
Theodor MOMMSEN 1817-1903 Gar ding Dir eito Kiel e Leipzig Mor it z Haupt e Zur ique, Deputado Nacional Amigo do rei da Jor nal de Rendsbur g Hist ór ia Romana, Dir eito Romano,
Otto Jahn, Max Breslau, em 1881 Dinamarca, Academia (1848), escr itos sobre a As províncias r omanas.
Weber Leipzig e de Ber lim, Sociedade r evolta da Saxônia em
Ber lim Real de Ciências da 1848 levam-no à
Saxônia, reit or da demissão, escr itos de
univer sidade de Ber lim combate ao anti -
semitismo
Georg GERVINUS 1805-1871 Dar mstadt Filologia Heidelber g Schlosser , Heidelber g e Par lamento de Academia de Ciências Deut sche Zeit un g, projet o Fundamentos de Teor ia da
Dahlmann Göttingen Frankfur t da Bavár ia da Constituição em 1847 Hist ór ia, Histór ia da Literat ura e
da Poesia Nacional, Histór ia do
século XIX.
Johann G. DROYSEN 1808-1884 Teptow Filologia Ber lim Böckh, Kiel, Iena e Par lamento de Academia Berlinense Preußische Hist ór ia do Helenismo, Histór ia
Gervinus, Ber lim Frankfur t de Ciências, Jahr bü cher ,Polit ische das Guerr as de Liber dade,
Duncker Histor iógrafo da Casa Schrift en. Guer r as de Hist ór ia da Política Pr ussiana,
de Brandembur go Liber t ação, A posição Conde Yor ck von War tenburg
polít ica da Pr ússia
Leopold von RANKE 1795-1886 Wiehe Teologia e Leipzig Schleiermache Ber lin Histor iógrafo da Casa Hist or isch-Polit ische Hist ór ia os povos latinos e
( Unstr ut ) filologia r, Humboldt , de Brandemburgo, Zeit schr ift , Sobr e as ger mânicos, Histór ia dos Papas,
Sybel, Savigny, barão von Ranke, afin idades e difer enças Hist ór ia da Refor ma, Histór ia
Niebuhr Membr o do Conselho ent re hist ór ia e polít ica fr ancesa, Hist ór ia I nglesa,
Real, Amer ican Har denber g und die Geschicht e des
Histor ical Associat ion, pr eussischen St aat es von 1793 bis
Memór ias da Casa de 1813, Sér via e Tur quia n o século
Brandembur go , XIX.
Kar l 1838-1892 Bonn Histór ia Bonn e Berlim e Sybel, Ranke, Konigsber g, Guilher me II assist iu Hist ór ia da Refor ma, Histór ia do
MAURENBRECHER Munique Siegfr ied Bonn e Leipzig suas aulas, Real I mpér io: Histór ia da fundação do
Hir sch Sociedade de Ciências I mpér io Alemão
da Saxonia
Heinr ich von 1834-1896 Dr esden Histór ia e Bonn, Leipzig, Bismar ck Kiel, Freibur g Deputado Nacional Editor do Pr eußische Ensaios histór ico-políticos
TREITSCHKE Economia Tübingen, Freibur g. e Heidelber g Jahr bü cher( depois foi alemães, A histór ia alemã do
expulso), A solução da século XI X, Luter o e da nação
questão de Schlesw ig- alemã,
Holstein, O fut ur o dos
estados do nor te alemão,
A guerr a ea r efor ma
feder al, Dez anos de luta
alemã 1865-1874.

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Escr itos sobr e assuntos


atuais, Alguns
comentár ios sobr e a
questão judaica, O projet o
da lei da escola prussiana.
August von 1832-1893 Bavenhause Histór ia Heidelber g e Häusser , Waitz Pr ofessor em Ar quivos do Reichstag Biografias de Gilher me II, duque
KLUCKHOHN n Gött ingen e Sybel Göttingen e cor respondência de da Baviera, de Ludw ig, de
Wittelsbach, car tas de Preder ico o Piedoso, de Louise,
Freder ico o Piedoso r ainha pr ussiana
Alfred BORETIUS 1836-1900 Meser itz Dir eito Ber lim e Halle Mommsen Zur ique e Ger maniae Nat ion al Zeit ung Freder ico o Gr ande e Car los
Ber lim Monumenta Histor ica Magno
Carl Wolfgang Paul 1838-1897 Leipzig Dir eito Heidelber g e Heidelber g e Democr ata e opositor da Hist ór ia da Grécia
Mendelssohn Freiburg Fr eiburg Prússia
BARTHOLDY
Heinr ich von SYBEL 1817-1895 Düsseldor f Histor ia e Ber lim Bonn Ranke, Voigt , Bonn, Deputado em Fundador com Ranke A nação alemã e o Hist ór ia da Pr imeira Cr uzada,
filosofia Maurenbreche Mar burg, Frankfur t e da Comissão Histór ica Impér io. Um tr at ado Hist ór ia da fundação do I mpér io
r Munique deputado na da Academia de histórico-polít ico, Alemão, Act a Bor ussica.
Assembléia de Ciências da Bavár ia, Kölnische Zeitung,
Kassel, Par lamento Dir etor dos Ar quivos Autonomen, Sobre a
de Er fur t e Prussianos, membro r elação da nossa
Par lamento do Instit uto Histór ico Univer sidade com a vida
Nacional de Roma, pública, Os par t idos
polít icos do Reno
Wilhelm JUNKMANN 1811-1886 Munique Filologia e Munique e Bonn Er nst Ar ndt , Deputado Nacional, Liga católica, Part ido Kat holischen Magazins Obs: não publicou na HZ
história Fr iedr ich Par lamento de do Cassino, Par iser für Wissenschaft und Allgemeinen Kir chen lexik ons,
Dahlmann Er fur t Hof, Leben, Allgemeinen Realenzyklopädie für
das kat holische Deutschland,
Regest a Hist or iae West faliae,
West falia Sacr a.
Jacob VENEDEY 1805-1871 Köln Dir eito Heidelber g, Bonn Heinr ich Bonn e Foi pro Pr é- Fest ival de Hambach, Deut schen Volksverein, Reise un d Rastt age in der
Heine, Geor g Zur ique Par lamento, foi do atividade política vár ios jor nais, Rotteck - Nor mandie, Die Deutschen und
Fein par lamento de int ensa, exilado Welcker Staatslexikons Fr anzosen nach dem Geist e ihr er
Rumpf e se elegeu Spr achen un d Sprü chwör ter .
par a o par lamento
de Fr ankfur t
Kurt WACHSMUTH 1837-1905 Naumburg Filologia e Iena e Bonn, Ber lim Ludw ig Lange, Mar burg, Pesquisa na Itália, Das alt e Gr iechenland im n euen,
historia Kar l Gottingen, r eitor da univer sidade Die St adt At hen im Alt ert um,
Lamprecht Heidelber g, de Leipzig St udien zu den gr iechischen
Leipzig Flor ilegien, Ausgaben von " Lydus
de ostent is" un d den gr iechischen
Kalender n
Paul HI NSCHI US 1835-1898 Ber lim Heidelber g Halle, Kiel Par lamento Parece que er a do Zeit schr ift für Die pr eußischen Kir chengeset ze
Nacional Part ido Cat ólico e do Geset zgebung und ( 4v) , Die Or den und
Part ido Liber al Rechtspflege in Pr eußen Kongr egat ionen der kat holischen
Kir che in Pr eußen, Das
landesherr liche Pat r onat recht
Ludw ig Kar l James 1825-1901 Tilsit Dir eito Ber lim, Gött ingen Gervinus, Er langen, Par lamento da Liga Part ido do Cassino, Deut schen Zeitung St aat sar chiv
AEGIDI Hambur g, Ger mânica do Norte, Deut schen

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Ber lim Par lamento nationalverein


Prussiano
Fr iedr ich von WEECH 1837-1905 Munique Histór ia Munique e Er har t Fr eiburg Bibliotecár io dos Codex diplomat icus Salemit anus,
Heidelber g Schür stab Ar quivos Gerais e Baden un t er den Gr oßherzögen
dir etor em 1885 Kar l Fr iedr ich, Kar l, Ludw ig 1738–
1830, Geschicht e der badischen
Ver fassung, Baden in den Jahr en
1852 bis 1877, Die Deut schen seit
der Refor mat ion.
Hermann Eduar d von 1841-1904 Fellin, Histór ia Dor pat e Heidelber g, Kar l J. Strassbur go, Academia Prussiana de Kolnischen Zeitung, Ludovico XI V, vár ios outr os
HOLST Estland Londres, Italia e Mar quar dt, Fr eiburg, Ciências Deut sch-amer ik anischen
Ar gélia Chicago Konver sations-Lexikons
Paul von 1834-1915 Schwedt Dir eito Halle, Heidelberg e Reinhold Academia de Er furt , Weimar ische Zeit ung Tomada da Bastilha.
BOJANOWSKI Ber lim Kohler Jor nalista em Par is,
bibliotecár io e
histor iador
Alfred STERN 1846-1936 Gött ingen Histór ia Heidelber g, Alber t Einstein Ber na, Zur ique Controvér sia Hist ór ia da Eur opa desde 1815
Gött ingen e Ber lim Baumgar ten- até a Liga de Fr ankfurt em 1871.
Treitschk e contr a os
judeus
Johann Fr iedr ich 1827-1914 Winter ber g Fredebur g Bonn Döllinger , Bonn e Pr aga Deputado pelo Conselheir o do kaiser Die Geschicht e der Quellen und
Ritt er von SCHULTE Wasser schlebe par t ido Nacional Francisco José, r eitor Lit er atur des Canonischen Recht s
n Liberal da univer sidade de von Gr at ian bis auf die Gegenwar t ,
Bonn
Ar nold SCHAEFER 1819-1883 Seehausen Filologia Leipzig Hermann, Greiswald, Reitor da univer sidade Demóstenes e seu tempo, Histór ia
clássica Wachsmut h, Bonn, de Bonn 1871-2, da guer ra dos Sete Anos,
Asbach Konigsber g Instituto Ar queológico
Alemão em Roma

Mar tin PHILIPPSON 1846-1916 Magdebur g Histór ia Bonn Bonn, Br üssel, Deut sch-I sr aelit ische Der Gr osse Kur für st Fr iedr ich
Gemeindebund, Wi lhelm von Br an denbur g. 3,
Jüdischen Fr iedhof Neuest e Geschicht e des jüdischen
Ber lin-Weißen see, Volk es
Ver band deut scher
Juden.
Julius Alber t Georg 1848-1919 Wer nikow Histór ia e Bonn, Ber lim e Paul Kehr , Tübingen, Soldado na guerra Hambur ger Zeit ung Documentos do Papado 1046-
von HARTTUNG filologia Gött ingen Burckhar dt Basel Franco-pr ussiana, 1198
Sociedade Histór ica de
Verona, Londres, Par is,
Roma, Tur im e
Paler mo, Geheimen
Staatsarchiv in Ber lin
Fr iedr ich Wilhelm 1813-1901 Nür ber g Histór ia Ber lim e Heidelberg Filho de Hegel Rostock e Par lamento de Editor do Cr ônicas dos Estados Ger mânicos
Kar l von HEGEL Er langen Er fur t Mecklenbur gischen
Zeitung
Richar d ROEPELL 1808-1893 Danzig Halle e Ber lim Heinr ich Leo, Breslau Par lamento de Academia de Ciências Anais Poloneses
Ranke Er fur t da Bavier a
Adolf BEER 1831-1902 Pr ossnitz Histór ia Ber lim, Heidelber g, Sybel Grosswar dein Deputado Nacional Ar quivos par a a Histór ia Geschicht e des Welt handels, Die

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Pr aga e Viena (Romênia) austr íaca, Histor ischer or ient alische Polit ik Öst er reichs
Zeitschr ift seit 1774, Der St aatshaushalt
Österr eich-Ungar ns seit 1868, Die
Finanzen Öst err eichs im 19.
Jahr hundert , Leopold II., Fr anz II.
u nd Kat har in a von Rußlan d. Ihre
Korr espondenz
Er nst BERNHEIM 1850-1942 Hamburg Histór ia Ber lim, Heidelber g Georg Wait z, Greifsw ald Reitor da univer sidade Judeu que se conver teu ao Manual do Método Histór ico e da
Gött ingen e Julius de Greifswald pr otestantismo em 1886 filosofia da hist ór ia.
Estr asburgo Weizsäcker
Hans DELBRÜCK 1848-1929 Bergen auf Histór ia Heidelber g e Bonn Sybel Ber lim Deputado no Lutou na guerra Preussischen Jahr bücher Hist ór ia da ar te da guerr a 4v.
Rügen Par lamento alemão Franco-pr ussiana,
membro da delegação
alemã na Conferência
de Paz de Ver salhes em
1918
Font e: Deut sche National Bibliothek. Disponível em: htt p:/ / w ww .d-nb.de/ ; Elekt ronische Allgemeine Deutsche Biogr aphie. Disponível em: ht tp:/ / mdz10.bib-bvb.de/ ~ ndb/ adb_index.html, Deutsche Biogr aphie.
Disponível em: htt p:/ / www .deutsche-biogr aphie.de/ blaetter n.html. Biographie Por tal. Disponível em: ht tp:/ / w ww .biographie-por tal.eu/ search. Öster r eichisches Biographisches Lexikon 1815–1950. disponível em:
htt p:/ / ww w .biogr aphien.ac.at/ oebl?frames=yes.

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A par ticipação dos histor iador es nos assuntos políticos deixava clar o que
eles disputavam com os filósofos e os políticos o papel de tematizar em a liberdade,
e de r efletir em sobr e a política ou a governança. Esse envolvimento político
expr essa um per íodo decisivo da histór ia alemã, vivido entr e a der r ota par a
Napoleão e a vitór ia na Guer r a Fr anco-Pr ussiana. Segundo Nor ber t Elias, a “vitór ia
dos exér citos alemães sobr e a Fr ança foi, ao mesmo tempo, uma vitór ia da nobr eza
alemã sobr e a classe média alemã” (1997: 26). Com isso, eles t rocavam
“decisivamente, o idealismo bur guês clássico pelo manifesto r ealismo do poder ”
(ELIAS, 1997:27). De qualquer modo, a histór ia foi uma matriz disciplinar – bem
como o pensamento histor icista – e um instr umento capital par a a política no
período em tela. Com efeito, a “histór ia da Alemanha e do liber alismo alemão não
poder ia ser escr ita sem devotar consider ável espaço ao papel cent r al
desempenhado pelos histor iadores” (IGGERS, 1983:91). Assim, os histor iador es
for am impor tantes ator es do momento, algo que também ocor r eu em r elação à
Fr ança, onde Thiers, Guizot e Michelet, por exemplo, não se fur tar am de combater
na ar ena política e exer cer car gos públicos.
Sobr e as tr ajetór ias individuais algumas análises podem ser feitas. Ranke,
por exemplo, era um conser vador convicto, mas acompanhou a política de
Bismar ck com pouco entusiasmo. Embor a visse o chanceler com bons olhos, afinal
ele havia mantido a Pr ússia longe dos temor es da r evolução, não o defendia
aber tamente. O von em seu sobrenome, inclusive, foi um título nobiliár quico de
barão obtido em 1865. Ranke conclamava os histor iadores a contemplar o jogo das
for ças histór icas, não de maneir a desapaixonada apr egoam como seus cr íticos, mas
deixando as responsabilidades do gover no par a os homens de Estado, ou seja,
políticos (BENTIVOGLIO, 2010).
Theodor Mommsen editou um jor nal político em Schlesw ig-Holstein,
Ger vinus dir igiu a Gazet a Alemã. Em 1857 sur giu o per iódico Pr eussische
Jahrbücher (Anais Pr ussianos), cr iado quando Guilher me assumiu o gover no
devido aos pr oblemas mentais de Fr ederico IV, par a apoiar a causa da unificação
alemã e do gover no constitucional sob a lider ança da Pr ússia. A sua fr ente

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estiver am Sybel, Tr eitschke, Baumgar ten e Dilthey (IGGERS, 1983:91) – todos


histor iadores.
Da queda de Napoleão e da Restaur ação em 1815 até 1857 existiu a
Confeder ação Ger mânica for mada por 39 Estados independentes e cujas decisões
er am compar tilhadas por Prússia e Áust r ia, sob a hegemonia desta última. O clima
r eacionár io fez com ambas resistissem a for mas mais amplas de r epr esent ação
política, ger ando movimentos em 1820 e 1830; sem contar as ingerências nas
constantes intromissões políticas da Santa Aliança. Áustr ia e Pr ússia se uniram na
r epr essão, os decr etos de Kar lsbad r evelam isso, sobr etudo par a conter
conspir ações estudantis, motivadas pelas sociedades de estudantes, as
Bur schenschaft s. For am elas que or ganizar am os famosos festivais de Wartbur g em
1817 e de Hambach em 1832, emblemáticos par a se compr eender o nacionalismo
ger mânico. Ambos for am gestados pelas Bur schenschaft en . O festival de War tbur g
celebr ou o tr icentenár io de Luter o e o 4º aniver sár io da Batalha de Leipzig ( HAHN,
2001:27). Já o festival de Hambach tinha como mote a censur a da impr ensa e a
defesa do pr incípio democrático (HAHN, 2001:29). Mais de 30 mil pessoas ligadas
a est es eventos foram per seguidas pela polícia secr eta de Metter nich. A
r adicalização dos movimentos estudantis teve seu ponto alto no surgimento d´A
Gazet a Renana de Kar l Mar x, que começou a circular em 1842, e, em escala menor
com a Gazet a Al emã de Gervinus, sur gida em 1845.
Embor a depois da der r ota em Iena as aspir ações liberais tivessem sofr ido
dur o golpe, par adoxalmente o controle fr ancês sob terr itórios ger mânicos animou
cer tos ator es políticos em r elação ao ideár io liber al e teve importância decisiva na
emer gência do nacionalismo. A atmosfer a reacionária pós-Restaur ação também
contr ibuiu par a a expansão das r eivindicações de liber dade e de dir eitos
democr áticos, além de motivar outr os movimentos mais r adicais, ilustr ados pela
esquer da hegeliana e também pela liga dos comunistas. Os historiador es alemães
tendiam
a acr edi tar que a monar qui a Hohenzoller n, com seus aspectos
autor itár ios e ar istocr áticos e seu ethos bur ocr ático único, gar anti r i a
mel hor cami nho par a a defesa das liber dades individuai s e segur ança
jur ídi ca que uma democr acia em que políti ca pode ser mais r eativa aos
anseios da opinião públi ca que às consider ações e r azoes de Est ado
( IGGERS, 1983:15).
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Nas fór mulas políticas de então nutr iam admir ação pelo feder alismo nor te-
amer icano, ainda que não vissem com bons olhos o pr incípio democr ático que lhe
inspir ava; pelo liber alismo inglês – sobr etudo de Mill e de Bentham – cuja
monarquia constitucional bicamer al er a admir ada, ao lado do pensamento político
fr ancês or iundo de Montesquieu e de Benjamin Constant. Mas esses ideár ios eram
assimilados cr iticamente e adaptados às prát icas políticas vivenciadas em solo
ger mânico. Desse modo tradicionalismo, autor itar ismo e pr otecionismo er am
for ças que no universo das pr áticas políticas moldavam compr eensões de
liber dade e de r epr esentação política. Histor iador es liberais, como Dahlmann ou
Dr oysen, não defendiam uma monar quia parlament ar ista, como a inglesa ou a
br asileir a, mas uma monar quia constitucional em que r ei e administ r ador es da
bur ocr acia dever iam r espeit ar as liber dades civis e ser em coadjuvados por
instituições r epr esentativas eleitas par a a Câmar a Baixa – o Par lamento –, visto
justificarem a exi stência de uma Câmara Alta, for mada pela ar istocr acia
tr adicional.
Até o Vor mär z (Pr é-Mar ço) em 1848, um otimismo r einava entr e os cír culos
políticos e intelectuais. Vislumbr ava-se a possibilidade do sur gimento de um
Estado alemão unificado, com instituições r epr esentativas e gover no
constitucional. A despeito da r epr essão reinante, da censura e das r estr ições
políticas a int elligent sia ger mânica acr editava no triunfo do liber alismo. Afinal
viviam um momento de r ápido desenvolvimento econômico, cultur al e científico
que alimentava sentimentos patrióticos de integr ação, sediment ados no
pr essuposto de uma identidade histór ica e cultur al comum acompanhada pelas
alianças econômica – o Zollverein – e política – a Deut schesbund . O dualismo foi
r ompido apenas em 1849, quando, o impacto da revolução definiu melhor os
pr ojetos políticos existentes e ampliou a r ejeição à monar quia austr íaca,
pr enunciando a ascensão da Pr ússia. Se os episódios de 1848 em Fr ankfur t, Ber lim,
Bohemia e Schlesw ig-Holstein haviam demonstr ado àqueles políticos a
necessidade do uso de t r opas, aust r íacas ou alemãs, par a gar antir em as r efor mas e
evitar em ações políticas de uma esquer da r adical (IGGERS, 1983:22), nos conflitos
do nor te ficou patente que a Áustr ia não desejava a expansão do poder pr ussiano.
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A ação do exér cito pr ussiano contr a a r eivindicação da Dinamar ca por Holstein


indicou para a Prússia que somente a for ça militar não ser ia suficiente par a
conquistar a liderança fr ent e aos ter r itórios ger mânicos1. Ser ia preciso adotar o
caminho constitucional a fim de mant er sua lider ança sobr e a Confeder ação
Ger mânica e fazer alianças com os Estados ger mânicos mais for tes – excluindo-se a
Áustr ia – pr ojeto que ganhou até mesmo a adesão homens como Welcker e
Ger vinus. Agor a não se t rat ava soment e de evitar conflitos sociais inter nos, como a
atuação de Metternich havia prior izado ao lado da expansão e domínio sobre seus
ter r itór ios no lest e, mas, sobr etudo, conseguir alianças políticas exter nas. De início,
havia o desejo de integr ação de todos os est ados ger mânicos, com o passar do
tempo viu-se que a Áustr ia não poder ia integr ar a confeder ação.
Assim, até 1848 os intelectuais alemães desejavam a liber alização e a
unificação nacionais, face ao temor diante dos conflitos que colocavam em r isco a
or dem, em cr escente r adicalização política, que fizer am com que, salvo poucas
exceções, apoiassem o gover no pr ussiano de Fr ederico IV; depois, dur ante a cr ise
constitucional de 1862 e 1866 não apoiassem a política de Bismar ck, mas, enfim,
que se compr ometessem com ela a par tir de 1867. Quando Bismar ck r efor mou o
exér cito violando a constituição em 1862, o Pr eussi sche Jahr bücher pr otestou, mas
depois das vitórias de 1866 todos r eataram com Bismar ck, com exceção de
Ger vinus.
Par a Taylor, até 1848 os escr itor es alemães escr eviam par a si e par a os
pr íncipes, estavam longe da r ealidade. Não tinham público (TAYLOR, 1945: 54). E
ser ia inimaginável pensar o equilíbr io ger mânico sem Metternich, mas depois
daquele ano a posição da Áustr ia tor nou-se um pr oblema. A expansão dos jor nais
mudou este panor ama, indício de ampliação da esfer a pública e da constituição de
for ças disputando a ar ena política. O inter esse cr escente pelas questões do
momento levar am à cr iação de vár ias cadeir as de histór ia contempor ânea, que
atr aíam gr ande público, e acabavam por deslocar muitos histor iador es da ciência
para a atuação política, como foi o caso das aulas de Dr oysen em Kiel.

1 Dahlmann publi cou seu Polít i ca r eduzida ao gr au e medi da das condições exi st ent es par a tr atar desta
questão e foi um or ador ativo dos di r ei tos dos Schleswig-Hol steiner s ger mânicos contr a a monar quia
di namar quesa, ao l ado de Dr oysen, que i ncl usive t er i a que deixar a Univer sidade de Kiel por cont a disso.
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Quando em 1849 a contra-r evolução destr uiu os par lamentos eleitos


democr aticamente e muitas das liberdades cr iadas pela revolução (BREUILLY,
2002:55) e em 1850 Saxônia, Hannover , Bavária e Wüttemberg decidir am cr iar
uma nova liga de r einos, em oposição à Confeder ação Ger mânica, sendo realizadas
eleições para o parlamento de Er furt votar uma constituição par a esta liga, que foi
derr otada pelas t r opas austr íacos, pr eser vando a Confeder ação ( Bund ), ficou
evidente a impossibilidade de tr ansfor mações mais r adicais ou democr áticas par a
o futur o da Alemanha. Este episódio, chamado também de humilhação de Olmütz,
contudo, apenas abr eviou a fr anca ascensão da Pr ússia como lider ança política.
Nas palavr as de Von den Pfor dten, pr imeir o ministr o bávaro, “a luta pela
hegemonia ger mânica havia sido selada e a Áustr ia per deu” (Apud, BREUILLY
2002:58).
Ao contr ár io de Geor g Igger s que vê na chamada Escola Histór ica Pr ussiana
a expr essão de um otimismo político ingênuo face a estes acontecimentos, penso,
que poder iam ser otimistas, mas não er am ingênuos. Mommsen, Ger vinus e
Dr oysen, por exemplo, não acr editavam na existência de um aperfeiçoamento
espontâneo r ealizado pela histór ia que tor nar ia as instituições melhor es ou mais
justas, como pr odutos necessários do desenvolvimento histórico. Igualmente, par a
eles, o poder não poder ia ser somente o uso da for ça, mas o exer cício de pr incípios
éticos. Ou seja, ao contr ár io dos fr anceses que após a Revolução pr ocur aram
aplicar a lei natur al à política ou, ou de Hegel que colocava a supr emacia da r azão
sobr e a histór ia ou sobre os dir eitos individuais, r evelam um entendimento
político diver so ancor ado no pri ncípio constitucional. Dr oysen, por exemplo,
escr eveu as Guer r as de Liber t ação entre 1842-3 e a Hist ór ia da Polít ica Pr ussiana,
em 1855, obr as que tiveram for te impacto naquele contexto. Par a ele a lei é muito,
mas não é tudo e “o gr ande er r o do liber alismo vulgar foi ter insistido no gover no
baseado na soberania popular e por dir eitos individuais garantidos (...) e a
ver dadeira essência do constitucionalismo consiste em o Estado r emover de sua
competência tudo aquilo que não pr opr iamente per t ence a ele” (IGGERS,
1983:107). Nacionalidade, por tanto, deveria ser mais importante do que liber dade.

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A identidade ent r e os histor iador es pr ussianos não pode ser pensada sem
r eser vas, tanto do ponto de vista político, quanto do ponto de vista epistemológico.
Embor a sur gissem em um contexto comum e de uma mesma base, não são poucas
as difer enças existentes. Na Comissão Constitucional dur ante o Par lamento de
Fr ankfurt em 1849, Dahlmann e Dr oysen se opuser am ao voto universal, algo que
Mommsen e Ger vinus defendiam. Com o t empo, todos per ceber am que a
Unificação não poder ia ser feita a par tir de Fr ankfurt, mas de Ber lim. Outr o
exemplo ocor r eu dur ante a r efor ma do Exér cito por Bismar ck em 1861, quando
Duncker e Dr oysen não se manifestar am, mas Haym, editor do Pr eussische
Jahrbucher escr eveu um dur o ar tigo lamentado que o chanceler desejasse salvar a
velha ordem militar pr ussiana em uma nova Pr ússia. Tr eitschke, que apoiou
Bismar ck, foi convidado a deixar a r evista. Mas a vitór ia sobr e a Áustria em 1866
fez com que todos r eat assem com o gover no e, até mesmo Baumgar ten r ealizou
uma autocr ítica de sua r esistência à política do Reich . Somente Ger vinus
permaneceu ir reconciliável com a lider ança dos Hohenzoll er n , de Bismar ck e de
sua política militarista. Aos poucos, também Mommsen e Tr eitschke foram
percebendo que os princípios liberais er am inconciliáveis com um poder nacional
fundamentado na for ça. Note-se que este último er a um liberal da Saxônia, filho de
junker, de r aízes tchecas, que apoiou a Kult urkampf contr a a Igr eja católica bem
como defendia aber t amente seu antisemitismo. Par a Her man Baumgar ten e
Theodor Mommsen o caráter liber al do gover no de Bismar ck er a tênue, pois as
instituições e a própr ia sociedade estavam nas mãos de uma elite senhor ial
militar ist a e bur ocr ática de for te tr adição autor itária (IGGERS, 1983:23). Segundo
Mommsen
a estr utur a autor itár ia do Est ado alemão, sua par lament ar i zação
i ncompleta, seu víncul o com val or es de obediênci a mi litar es e
ar i st ocr áticos, i mpedir am a emer gência de um espír ito de
r esponsabi lidade política ent r e o povo alemão no t empo em que a
emer gência dos movi mentos políticos de massa junt o ao padr ão
constitucional do gover no bismar ckiano t or nou a cidadani a
absolut ament e necessár ia (Apud IGGERS, 1983:23).

As for ças políticas lentamente conduzir am à formação de clubes, ligas e


partidos políticos, os r adicais Clube Democr át ico foi cr iado em 23 de mar ço de
1848 e o Par tido Comunista em janei ro de 1848, os moder ados Clube
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Constitucional e o Par tido do Cassino em 1849. A simpatia pelos americanos não


er a velada. Rotteck e Welcker se inspir avam no feder alismo de Thomas Jeffer son,
Ger vinus afir mava que a Amér ica er a o Estado do futur o (HAHN, 1996:38) e
Dr oysen advogava um novo tipo de gover no r epr esent at i vo que poder i a
i ncr ement ar a unidade e coesão do Estado sem a eliminação completa da
estr ati ficação social exi st ent e ou, i gualmente impor tant e na Alemanha, a
supr essão das peculiar idades r egionais (SOUTHARD, 1995:16).

Buscar o just milieu , o equilíbr io, eis a tônica da moderação de Dr oysen. Em


seus estudos sobr e as Guerr as de Liber dade, ele “ofereceu uma exposição detalhada
da histór ia amer icana e eur opéia e demonstr ou a inevitabilidade histór ica da
unificação alemã como uma monar quia constitucional sob a preponder ância da
Pr ússia” ( Southar d, 1995:33). Em A posição polít i ca da Pr ússia , de 1845 defendeu
Fr eder ico IV e seu papel na manutenção da paz e no desenvolvimento cultur al e
econômico nos países ger mânicos.
Duncker em Cr ise da Refor ma, publicado em 1845, dividiu a histór ia em
quatr o per íodos: o pr imeir o é o do Iluminismo e seu pensamento ahistór ico, o
segundo é o do r omantismo e seu amor acr ítico pelo passado, o ter ceir o é o
idealismo de Hegel e sua tentativa de colocar conteúdos ilegítimos em for mas
legítimas e o último do empirismo, onde se inser ia. Duncker e Haym par ticiparam
do movimento pr otestante conhecido como Amigos da Luz ( Licht fr eunde), que
estabeleceu congr egações livr es em vár ias cidades alemãs. Separ avam o
desenvolvimento do Estado (pr ussiano) do desenvolvimento nacional
(ger mânico), cuja histór ia, no entanto, tinha uma mesma fonte: os desígnios
divinos. Duncker e Droysen estavam do lado das populações ger mânicas em
Schleswig-Holstein e contr a os dinamar queses. Tr at ando da Pr ússia, r evela
Duncker
A monar quia const ituci onal apar ece par a nós como uma demanda
r equer i da do t empo, como a necessi dade histór ica de nossa época, como
a r econci liação entr e o nor te e o sul da Alemanha, como o compr omisso
entr e o absol ut ismo e a liber dade. O pr incípio conqui st ado er a ser em
ofer ecidas condições aceitáveis, uma paz pr ópr ia par a ser concluída
entr e os par tidos em di sputa. Consti tuci onalismo, como desejamos, er a
par a ser democr ático e honr ado: não par a ser li mitado pel a
r epr esentação da bur guesia em que um admi ni str ação poder osa e
centr alizada contr olasse o balanço; er a par a pr oceder de um aut o
gover no das pr ovíncias e ser dir ecionado par a o caminho de um
Par lamento ger mâni co (Apud SOUTHARD, 1995:122).

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Dr oysen tinha medo da anar quia r epublicana (SOUTHARD, 1995:123) e da


r evolução, da guer r a civil. E temia que os pr íncipes não fossem r eceptivos,
compr eensivos com o projeto da unificação. Par a Droysen, “a Alemanha deveria ser
for te, mais for te que o per igo ou nossa esper ança” (Apud SOUTHARD, 1995:26). A
constituição prussiana, apr ovada, ter ia o mér it o de ser confeccionada com base na
r epr esentação pr ovincial. Suas expectativas, contudo, for am fr ustr adas pelos
acontecimentos e ele voltou-se para o tr abalho acadêmico.
Haym insistia que “o pr ocesso histór ico consiste no pr ogressivo
desenvolvimento da ideia que subsume todos os fatos e valor es” ( Southar d,
1995:87). Ele acr escentou à ideia de pr ogr esso contida na filosofia hegeliana,
embora abandonasse sua cr ença em ver dades at empor ais, a empi ricidade,
histor icizando a ética. A pedido de Duncker , Haym leu o panfleto de Gervinus A
Const it ui ção Prussiana r edigido em 1847 e chegou a conclusões par ecidas com as
de Dr oysen. A Pr ússia não pr ecisava de uma constituição por que o
constitucionalismo era algo inevitável, ela pr ecisava de uma constituição par a
pr epar ar o caminho da unificação. Enquanto Ger vinus apelava par a a for ça dos
negócios, Haym tr at ava do poder dos negócios – pensando-os como agentes de
mudança.
Sybel, pr otestante vivendo em um ter r itór io católico, era um fervor oso
adepto do modo r ankeano de escr ever e pesquisar história, mas não de fazer
política. Em 1843 escr eveu Sobr e os Tor ies e também Sobr e a r elação da nossa
Univer si dade com a vida pública. Cr iticava as monar quias absolutas, contr apondo-
as à liberdade, ao caminho constitucional e r epr esentativo. E também o mito do
herói de Edmund Bur ke. Redigiu Os par t idos pol ít icos do Reno em 1847, par a
combater o par tido feudo-cler ical. É dele o maior número de colabor ações na
Hist or ische Zeit schr ift , da qual foi o também o editor -chefe até 1895. Em seguida o
periódico foi dir igido no cur to per íodo de um ano, entr e 1895 e 1896 por Heinrich
von Treitschke e, em seguida por Fr iedr ich Meinecke de 1896 a 1935.
Ao tr atar dos histor iador es pr ussi anos, Southard r etr ata Duncker como
mais ingênuo, Haym como mais r aivoso, Dr oysen como mais enér gico e
personalista, Sybel como o mais conciliatór io.

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À guisa de conclusão eu lembrar ia que as motivações da pesquisa histór ica


partem sempr e de cir cunst âncias do pr esente r elacionadas às car ências de sentido
pr ovocadas pelas tr ansfor mações ocorr idas, e isso não foi difer ente em r elação aos
histor iadores alemães. Todos eles abandonar am a produção de uma histór ia
filosófica por outr a, mais empir ist a e mais voltada par a as r epostas aos problemas
colocados em seu tempo, que invar iavelmente se situava entr e a política e a
diplomacia. Lider anças em suas localidades, ar ticulados, cultos, autores conhecidos
e enér gicos, aqueles histor iador es não poder iam se fur tar do debate político vivido,
tampouco fugir do chamamento que a sua atuação exigia. Concor do com Rüsen que
vê na histor iogr afia
um modo de constituição nar r ativa de sentido, no qual domina o fator da
r el ação ao públ ico-al vo, de dir i gi r -se a al guém mediant e o pensament o
histór ico (que, ali ás, sempr e é pensado par a al guém, par a um público ou
par a um gr upo de pesquisador es, por exemplo). É det er mi nant e desse
modo e de sua especificidade cient ífica o ponto de vista da r el evância
comuni cati va. El a diz r espeito à r ecept ividade das hi st ór i as. (RÜSEN,
2008:28).

Assim, podemos per ceber que havia um r ico e pr ofundo diálogo que foi
estabelecido entre os histor iador es da Escola Histór ica Pr ussiana do século XIX e
sociedade na qual se inseriam, não somente no plano do pensamento, mas,
sobr etudo, no plano da ação, encur tando a distância ent r e ciência e política, suas
ver dadeiras e insepar áveis vocações.

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