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© 1ª ed.

2018 – Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS)

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Evangraf

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Eligio Resta – Università degli Studi Roma Tre (Itália)
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Ronaldo Bordin - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil)
Silvia López Safi – Universidad Nacional de Asunción (Paraguai)
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Virginia Zambrano – Universidade Salerno (Itália)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

F723 A formação docente no PEFPD/PARFOR na UERGS em Porto


Alegre / Adriana Helena Lau ... [et al.], organizadores. – Porto
Alegre : Evangraf, 2018.
176 p. : il.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-201-0056-1

1. Professores - Formação. 2. Educação básica. 3. Prática de


ensino. 4. Ensino profissional. 5. Tecnologia educacional. 6. Ensino
técnico. 7. Avaliação educacional. 8. Plano Nacional dos
Profissionais do Magistério da Educação Básica. I. Lau, Adriana
Helena.

CDU 371.13
CDD 370.71

(Bibliotecária responsável: Sabrina Leal Araujo – CRB 8/10213)


Novas perspectivas no ensino dos conceitos de Física Cinemática no 1º ano do ensino médio

NOVAS PERSPECTIVAS NO ENSINO DOS


CONCEITOS DE FÍSICA CINEMÁTICA NO 1º ANO
DO ENSINO MÉDIO

Katiane Maria Homsi Pedott1


Adriana Helena Lau2

INTRODUÇÃO

O ensino de Física vem sendo reproduzido dentro da sala de aula através


de metodologias ultrapassadas. Os rótulos preconceituosos que essa ciência
natural herda são originados dos problemas que a educação enfrenta e da
formação de professores, e não propriamente da Física.
A disciplina de Física é considerada de difícil compreensão, e a meto-
dologia tradicional, aplicada por muitos professores, não estimula o diálogo
entre aluno-professor e aluno-aluno. O professor que recebeu uma educação
tradicional tende a aplicá-la da mesma maneira para os seus alunos, e isso é
reflexo do despreparo docente, notado dentro das escolas. Pesquisas relatadas
também apontam o descontentamento dos professores na profissão (RO-
CHA FILHO, 2015).
Os resultados das avaliações dos alunos na disciplina de Física no ensino
médio, quando deveriam estar forjando sua escolha profissional, apresentam
alto índice de rejeição e reprovação. Portanto, há uma falta de interesse dos
1 Professora cursista do Programa Especial de Formação Pedagógica de Docentes da Universidade Estadual do Rio
Grande do Sul (PEFPD/Parfor UERGS). Graduada em Engenharia Elétrica. Professora de Química e Física na
Escola Estadual de Ensino Médio República Argentina. Professora de Física na Escola Estadual Professor Julio Grau.
2 Professora orientadora do PEFPD/Parfor UERGS. Licenciada em Ciências Biológicas. Mestre em Genética e
Biologia Molecular. Doutora em Ciências – Genética e Biologia Molecular. Professora adjunta na Universidade
Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). Coordenadora adjunta da UERGS junto ao sistema Universidade
Aberta do Brasil/Capes.

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Novas perspectivas no ensino dos conceitos de Física Cinemática no 1º ano do ensino médio

alunos pelo ensino de Física e também faltam professores formados nessa


graduação. A rejeição pela carreira da licenciatura em Física pode ser origina-
da por vários fatores, mas um deles é o modo como as aulas são ministradas
pelos professores. A metodologia que emprega excessiva matemática se carac-
teriza pelo apego às aulas copiadas e sem experimentação prática, que deixam
de ser atrativas aos alunos. Os docentes desconhecem ações pedagógicas que
contextualizam a Física no ambiente tecnológico contemporâneo (ROCHA
FILHO, 2015). Elio Ricardo (2010, p. 10) descreve muito bem o problema:
mais que em outras áreas, no caso do ensino das Ciências de modo
geral, e da Física em particular, isso se torna evidente, pois, ao mesmo
tempo que os alunos convivem com acontecimentos sociais signifi-
cativos estreitamente relacionados com as Ciências, e a Tecnologia e
seus produtos, recebem na escola um ensino de Ciências que se mostra
distante dos debates atuais. Muitas vezes, os alunos acabam por iden-
tificar uma Ciência ativa, moderna, e que está presente no mundo
real, todavia, distante e sem vínculos explícitos com uma Física que só
“funciona” na escola. Não é por outra razão que os professores frequen-
temente apontam a falta de interesse e motivação dos alunos como um
dos obstáculos para a aprendizagem.

No século XX, as práticas docentes estavam ligadas a estruturas conceituais


e avaliativas, e não à aprendizagem, ao aluno como sujeito. O professor man-
tinha a postura arraigada nas concepções tradicionais. O aluno atuava como
receptor do conhecimento conceitual, e a memorização do conteúdo pelo alu-
no era a principal forma de avaliação do professor (ROCHA FILHO, 2015).
As aulas de Física meramente expositivas, com demonstrações de cálcu-
los matemáticos para descrever fenômenos físicos, assumem “que o educador
é o sujeito, que conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo
narrado”. Mais ainda, os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem
“enchidos” pelo educador” (FREIRE, 1987, p. 33). De acordo com Freire
(1987, p. 37), cabia ao professor, como opressor, “controlar, o pensar e a
ação, levando os homens ao ajustamento ao mundo”. Os alunos eram inibi-
dos por expressarem criatividade.
Os estudantes do século XXI não são passivos, comparados aos do século
anterior. O professor deve ensinar com mais aproximação ao aluno e expor
os conteúdos de forma criativa. Os alunos não devem receber uma educação

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bancária, opressora; eles devem ter aulas transformadoras, para que se sintam mo-
tivados e livres para buscar novos conhecimentos (FREIRE, 1987), não os conhe-
cimentos reproduzidos, aqueles formalizados nos livros didáticos, mas aqueles re-
construídos e ressignificados, a partir das experiências e vivências de sala de aula.
O conhecimento é um processo de busca conjunta, o saber é partici-
pativo nos diálogos do professor e do aluno. “É preciso ensinar os alunos
a pensar [...]. Pensar é procurar por si próprio, é criticar livremente e é
demonstrar de forma autônoma. O pensamento supõe então o jogo livre
das funções intelectuais e não o trabalho sob pressão e a repetição verbal”
(PIAGET, 1944, p. 2).
O professor que mobiliza o aluno a participar do processo de aprendi-
zagem assume a experiência de testar novas metodologias. A metodologia
da problematização (MP) é a educação da prática da liberdade, do diálogo,
objetivando o educar do aluno e simultaneamente o educar do professor,
através das práticas vivenciadas dentro da realidade. “Não mais educador do
educando do educador, mas educador-educando com educando-educador”
(FREIRE, 1987, p. 39).
A prática da MP no processo de ensino-aprendizagem da Física dentro
do mundo real, que contextualiza docente e discente, pode considerar uma
experiência baseada no arco de Maguerez.
A metodologia da problematização com o arco de Maguerez constitui
um rico caminho para estimular o desenvolvimento de saberes diver-
sos pelos seus participantes. A riqueza dessa metodologia está em suas
características e etapas, mobilizadoras de diferentes habilidades inte-
lectuais dos sujeitos, demandando, no entanto, disposição e esforços
pelos que a desenvolvem no sentido de seguir sistematizadamente a sua
orientação básica, para alcançar os resultados educativos pretendidos
(COLOMBO; BERBEL, 2007, p. 4).

Aplicar os conceitos da Física no mundo em que nos cerca passa neces-


sariamente pela aprendizagem da ciência, que está repleta de tecnologia. A
proposta da construção dos saberes busca o desenvolvimento e a apropria-
ção de habilidades lógicas e simbólicas. Os conhecimentos originam-se da
comunhão, do dialogar entre o professor e o aluno, das dúvidas que surgem
em um processo, que não é apenas de conhecer e descrever os fenômenos da
Física, mas também de alfabetização tecnológica. Os estudantes se capacitam

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através das suas observações, apropriando-se das habilidades e competências


de questionar, investigar e teorizar conceitos (GUIMARÃES; PIQUEIRA;
CARRON, 2013).
Delizoicov (2001) fundamenta a distribuição do conhecimento dos alu-
nos em dois níveis. A “cultura primeira”, constituída através do senso co-
mum, e a “cultura elaborada”, construída através do estudo da ciência. A
problematização inicia-se pelo primeiro nível. O aluno traz para a escola co-
nhecimentos prévios contidos nas teorias físicas. O estudante é parte essencial
da nova metodologia, em que o conhecimento adquire nova significação. A
MP busca melhores resultados de aprendizagem, considerando os conheci-
mentos que precisam ser ensinados na escola, e a importância do ensino e
aprendizagem dos conceitos, princípios, leis e teorias em igualdade de im-
portância com o ensino e aprendizagem da linguagem científica (VILLANI;
NASCIMENTO, 2003). O conteúdo é transmitido ao aluno, através das
relações com o mundo em que ele vive. Assim, as ciências são reconhecidas
dentro das tecnologias (VILLATORRE; HIGA; TYCHANOWICZ, 2009).
Isso implica uma intencionalidade do professor de ensinar os termos e as
formas de organização e significação dos elementos que compõem o conhe-
cimento científico. E para que os alunos do vnsino médio compreendam a
influência dos dados empíricos na sua aprendizagem, é importante que tra-
balhem em grupos (VILLANI; NASCIMENTO, 2003).
O objetivo deste trabalho foi problematizar o ensino de conceitos de
Física, através das aprendizagens vivenciadas na formação pedagógica, para
buscar uma forma de ensino e aprendizagem contextualizada, transformado-
ra e instigadora, tanto para os professores quanto para os alunos. Aplicamos a
metodologia da problematização através do arco de Maguerez para estimular
novas percepções dentro do espaço físico e consideramos os conhecimentos
prévios dos alunos para trabalhar os conceitos da Cinemática em atividades
no pátio da escola, como espaço pedagógico alternativo.

METODOLOGIA

A MP com o arco de Maguerez foi aplicada em duas turmas do 1º ano do


ensino médio, 101 e 102, para projeto em grupos com o conteúdo de Cinemáti-

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ca. Foram disponibilizadas tabelas com as principais grandezas físicas e suas uni-
dades de medida, conforme o Sistema Internacional, para consulta dos alunos.
Na turma 101, 19 alunos foram distribuídos em seis grupos. Na turma
102, 16 alunos formaram cinco grupos. Os grupos foram orientados a obser-
var a trajetória do portão da entrada da escola até a porta do prédio principal.
De acordo com Colombo e Berbel (2007, p. 4), as etapas da MP com o
arco de Maguerez e os seus desdobramentos estão relacionados a seguir:

1. Partir da observação da realidade de uma sala de aula, durante alguns


dias/horas para a identificação de problemas pedagógicos e a escolha
de um deles para o desenvolvimento da investigação. Atividade de-
senvolvida: estímulo das novas percepções dentro do espaço físico e
consideração dos conhecimentos prévios para trabalhar os conceitos
da Cinemática em atividades no pátio da escola.
2. Refletir sobre os possíveis fatores e determinantes maiores do pro-
blema eleito e definição dos pontos-chave do estudo. Atividade de-
senvolvida: obtenção da trajetória através do esboço de um mapa da
escola realizado no caderno de campo para propiciar que as dúvidas
iniciais sejam o caminho para as investigações necessárias ao estudo.
3. Investigação de cada um dos pontos-chave, buscando informações
onde quer que elas se encontrem e analisando-as para se responder
ao problema, compondo assim a teorização. Atividade desenvolvida:
oportunidade para o diálogo entre os participantes para que, na dis-
cussão, se busquem as respostas e os grupos se desenvolvam nas ativi-
dades, com participação efetiva de todos integrantes.
4. Elaboração de hipóteses de solução para o problema. Atividade desen-
volvida: valorização da criatividade do aluno em escolher os métodos
para obtenção de medidas das grandezas físicas envolvidas dentro das
delimitações do espaço físico da escola. Inicialmente não foi permiti-
do o uso de trena, régua ou qualquer objeto com escalas. Eles tinham
que decidir por um modo de mensurar, como passos, fios de linha,
mãos e outros objetos sem escalas.
5. Aplicação de uma ou mais das hipóteses de solução, como um retorno
do estudo à realidade investigada. Atividade desenvolvida: gerar nos

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alunos a necessidade da apropriação de outros conhecimentos como


hipóteses de solução para que eles relacionem o estudo teórico à re-
alidade da escola; discutir com os alunos quais grandezas físicas são
valorizadas no mundo real para promover a discussão da teoria em
sala de aula; auxiliar na redação de um relatório técnico-científico, no
laboratório de informática, para que desenvolvam e se apropriem de
habilidades lógicas e simbólicas.

A avaliação foi realizada no decorrer do processo e na conclusão de cada


uma das etapas. Na etapa 1, a partir dos referenciais de início e posição final,
os alunos mediram comprimento, área, perímetro e o tempo do trajeto para
calcular a velocidade média do percurso. Na etapa 2, os resultados foram
registrados no caderno de campo. Depois, na etapa 3, elaboraram um mapa
em escala. Por fim, na etapa 4, redigiram um relatório técnico-científico no
laboratório de informática.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A aplicação do planejamento descrito na seção anterior se deu a partir


da mobilização conjunta, em que todos se uniram em um mesmo propósito:
sair da sala de aula e assumir outro espaço pedagógico. Os alunos veem o
pátio de uma forma muito diferente dos professores. A euforia tomou conta
dos alunos quando souberam que as aulas seriam no pátio. Não foram dadas
instruções precisas do que seria feito.
Primeiramente, os alunos foram orientados a observar o pátio, registran-
do e desenhando no caderno de campo sistematicamente o que enxergavam
nele e envolta dele. Os integrantes do grupo discutiam para saber onde co-
meçar a fazer seus registros e entravam em acordos diante dos diferentes con-
flitos e dúvidas que iam surgindo durante o processo. Problematizando essas
questões, uma parte do grupo se destina a solucionar parte dos diferentes
problemas orquestrados, identificando as carências e dificuldades de várias
ordens (BERBEL, 2006).
Na segunda etapa, os alunos foram descobrindo os pontos-chave, como,
a posição inicial e a posição final da trajetória, refletindo sobre as possíveis

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causas dos problemas em estudo, o porquê de desenhar e o que utilizar para


esboçar o traçado da trajetória da forma mais próxima do real. Trazendo uma
não consciência da existência de limitações, foram medindo erradamente por
diversas vezes.
A terceira etapa era de teorização. Através da investigação, os alunos bus-
cam a experiência técnica por meio de consultas a especialistas e, assim, re-
fletem sobre as limitações possíveis de solução, incluindo a participação do
grupo todo, distribuídas em tarefas.
As hipóteses de soluções firmadas através das informações obtidas foram
tratadas, analisadas e avaliadas. Formaram ideias conforme o croqui do dese-
nho até mensurarem o caminho percorrido, deslocamento, largura e compri-
mentos desejados.
A quinta e última etapa é da aplicação à realidade. Envolve a obtenção
das medidas, o uso das unidades de medidas, as conversões e proporções do
espaço físico da escola.
Dividir as turmas em grupos facilitou o diálogo entre seus integrantes.
O caderno de campo serviu para os alunos fazerem todas as anotações. De
acordo com Berbel (1998), dialogar durante as etapas da MP promove a
apropriação dos conhecimentos. O trabalho adquiriu significação quando foi
desenvolvido pelos alunos dentro da realidade do mundo em que eles vivem.
Os resultados foram sumarizados na Tabela 1.

Tabela 1 – Resultados da avaliação trimestral

Avaliação trimestral
Turma 101 102
N° de alunos 19 16
Grupos 6 5
Caderno de campo 100% 100%
Relatório técnico-científico 100% 80%
Mapa da escola 83,3% 80%
Envolvimento com o trabalho 88,9% 86,4%

Fonte: A autora (2018)

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Novas perspectivas no ensino dos conceitos de Física Cinemática no 1º ano do ensino médio

O uso do caderno de campo como ferramenta cognitiva e de organização


dos dados teve 100% de adesão. Um grupo de cada turma não entregou o
mapa da escola. O desenvolvimento e a apropriação de habilidades lógicas
e simbólicas foram avaliados no relatório técnico-científico. Um grupo da
turma 102 não entregou o relatório. A maioria dos alunos que se envolveram
nas atividades apresentou dificuldades, sendo a produção do relatório a mais
crítica e a obtenção das medidas a mais fácil. Os quesitos avaliados foram
tomados em conjunto e revelaram que 86,4% da turma 101 se envolveram
com todas as etapas do trabalho; na turma 102, 88,9% cumpriram todas as
atividades.
A problematização do conhecimento do aluno é fomentada pelo pro-
fessor. Os alunos vão expondo, a partir de poucas questões propostas, suas
dúvidas sobre o tema. “O ponto culminante desta problematização é fazer
com que o aluno sinta a necessidade da aquisição de outros conhecimentos
que ainda não detém [...]” (DELIZOICOV, 2001). Tal compromisso está
implícito na argumentação de Berbel (1998, p. 11) acerca da MP:
na Metodologia da Problematização, após o estudo de um problema po-
derão surgir outros, como desdobramentos do primeiro, só percebidos pelos
alunos com o estudo aprofundado deste. Os conhecimentos científicos tam-
bém são importantes e são buscados na etapa da teorização. No entanto,
ao mesmo tempo são buscadas as percepções ou representações de pessoas que
vivem o problema ou convivem com situações em que está presente, além de
informações de outras fontes. Os diferentes tipos de saberes são conjugados
pelos alunos enquanto constroem seus conhecimentos, que envolvem rela-
ções entre o técnico-científico e o social, político, ético [...].

Nas etapas da metodologia da problematização, se fortaleceu a capaci-


dade de imaginação dos alunos. Dentro de um contexto social e político,
executaram, encaminharam e tomaram decisões. Muitos problemas foram
solucionados com a contribuição da metodologia, podendo proporcionar co-
nexões lógicas voltadas para o seu meio (BERBEL, 2006).
As etapas da MP aplicadas no ensino do conteúdo de Cinemática pro-
porcionaram a incorporação dos conceitos e teorias da Física como novos co-
nhecimentos. Os problemas gerados durante a investigação fizeram com que
os conceitos e as grandezas físicas adquirissem significação. A professora, ao
mesmo tempo que promove a discussão entre os participantes, problematiza

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possíveis inconsistências formuladas. No diálogo em que se oportuna desen-


volver a busca por respostas, gera-se no aluno a necessidade de apropriação de
outros conhecimentos inéditos (DELIZOICOV, 2001).
Segundo Piaget (1944), num ambiente livre, sem a pressão dos métodos
de avaliação, o aluno foi ensinado a pensar e a dialogar. O ensinamento é um
processo de uma ação conjunta, da mesma forma que o conhecimento. E assim
se fez com os alunos no pátio da escola, promovendo ação criativa e participati-
va em todo o processo do trabalho, com liberdade de dialogar com o professor.
A aprendizagem vem da imaginação e da criatividade dos alunos (VILLA-
TORRE; HIGA; TYCHANOWICZ, 2009) ao serem instigados sobre as
noções de continuidade espacial. Através da problematização dos conceitos
da Cinemática, geraram-se melhores resultados nas avaliações dos alunos. O
processo de aprendizagem foi efetivado com a finalidade de apropriação dos
termos técnicos, embora estes já fossem conhecidos pelos alunos, mas não
empregados e mobilizados na prática.
Delizoicov (2001) diz que o ponto culminante da problematização é fa-
zer com que o aluno sinta a necessidade de adquirir novos conhecimentos. E
acrescento que sejam sucessivas necessidades, no plural, para que a fonte seja
ilimitada. Enquanto os alunos sentirem faltar algo, o professor fomenta-os
com suas discussões, a fim de promover a busca por respostas, indicando os
caminhos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No universo do aluno e do professor está embutida a Física conceitual.


É a partir da nossa vivência comum, da nossa compreensão e domínio do
mundo real que iniciamos a construção dos saberes. Para sustentar o processo
de ensino-aprendizagem da MP, usei como base o diálogo. E considerando os
conhecimentos prévios dos alunos sobre os conceitos da Cinemática, conse-
gui que eles fossem percebendo as grandezas físicas dentro do espaço físico da
escola. Aplicar a Cinemática no pátio foi como usar um laboratório didático
de física, assim iniciando um novo processo de construção pedagógica.
Nesse processo eliminei das aulas de Física as técnicas didáticas no mo-
delo de sala de aula para dar lugar às aulas de observação no pátio da escola.

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Foi motivador para que os resultados chegassem ao desenho do mapa da


escola com as medidas aproximadas do real. A metodologia tradicional, que
contempla somente a memorização de fórmulas, foi trocada pela criatividade
do aluno, valorizando suas escolhas dos pontos-chave para obter as grandezas
físicas envolvidas e suas medidas. O método repetitivo caracterizado pela ma-
téria dada no quadro, com muitos exercícios, foi trocado pela valorização do
uso do caderno de campo como ferramenta cognitiva e de organização dos
dados. Foi gerada no aluno a necessidade da apropriação de outros conheci-
mentos, despertando o interesse pela ciência em seu contexto de produção.
Notamos o desenvolvimento da maturidade nos alunos, que em grupos se
envolveram na busca do conhecimento através de diálogos e experimentações
e se tornaram mais críticos. A criatividade foi esboçada nos mapas, ricos em
detalhes, e a autonomia na apropriação dos saberes descrita na redação de um
relatório técnico-científico, realizado no laboratório de informática. A maioria
dos alunos participou das atividades e poucos apresentaram dificuldades, sendo
a produção do relatório a mais crítica e a obtenção das medidas a mais fácil.
Concluímos que a metodologia permitiu a vivência do ensino-aprendi-
zagem como processo, ressignificando as leis fundamentadas da Cinemática
clássica, oportunizando a (re)construção do conhecimento de uma forma di-
ferenciada, tanto para mim, como docente, quanto para os alunos. A meto-
dologia da problematização foi utilizada não só para o ensino-aprendizagem
do aluno, mas também para educar a nós, professores. Sinto-me motivada
para aderir à concepção da nova metodologia e buscar meios paralelos ao in-
centivo para realizar futuras atualizações profissionais com acesso a pesquisas
recentes sobre educação científica.

REFERÊNCIAS

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