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O CAPITALISMO
Coleção Primeiros Passos
0,
Aristides Filho
Afrânio M. Catani
mr
O que é Subdesenvolvimento
ma
A Dinâmica da Economia
Horácio Gonzáles
Capitalista P refa cio:
a
Uma abordagem histórica Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo
AR
Mario Possas O que são Multinacionais
«comp
Bernardo Kucinski
Capitalismo Desorganizado &º edição
Claus Offe O que é Capital
Ladislau Dowbor
Vargas: O Capialismo em
Construção O que é Capital Internaciona!
Pedro Dutra Fonseca Rabah Benakouche
O que é Impenalismo
Macroeconomia da Dívida
Externa Brasileira
Afrânio M. Catani
Eliana Cardoso! Albert Fishlow
A Formação do 3º Munde
Padislau Dowbor
História da Ordem
internacional
Carlos Roberto Pellegrino
A Burguesia Brasileira
Jacob Gorender
A Industrialização Brasileira
Francisco Iglésias editora brasiliense
|
Copyright O by João Manuel Cardoso.de Mello, 1982
Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada,
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reproduzida por meios mecânicos qu outros quaisquer
sem autorização prévia do editor.
ISBN: 85-11-09010-X
Primeira edição. 1982
8º edição, 1991
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INTRODUÇÃO .....
CAPÍTULO I — As raízes do capitalismo retardatário
I. Da economia colonial à economia
exportadora capitalista ........
IH. A passagem da economia colonial
à economia exportadora capita-
lista no Brasil ........cc... 52
1. O início da crise da economia
colonial e a constituição da
economia mercantil-escravista
cafeeira nacional ........... 3
2. A dinâmica da economia mer-
cantil-escravista cafeeira na-
cional ....c.cccccccs 8
3. O momento decisivo da crise
da economia colonial e a emer-
gência do trabalho assalariado 72
CAPÍTULO II — A industrialização retardatária .... 89
o da
I. A problemática da industrializa-
ção retardatária ............... 96
itii ri ra o
Prefácio
Foi neste grande silêncio que pudemos escutar com maior tas para o terreno da formação e do desenvolvimento do modo de
que
clareza as vozes dos que tiveram a ousadia de pensar € dos produção capitalista na América Latina e, mais que isto, trazem a
no meio de idéia “de que a dinâmica social latino-americana é determinada,
ainda teimavam em fazê-lo, no exílio ou desterrados
só é uma crítica
seu povo. Neste sentido, O Capitalismo Tardio em primeira instância por fatores internos e, em última instância,
legítima das reflexões de Raul Prebisch, Aníbal Pinto, Celso Fur- por fatores externos, a partir do momento em que se estabelece o
Henrique Cardoso, Maria da Conceição Tavares, Estado Nacional”.
tado, Fernando
questões
Carlos Lessa, enquanto reconhece a legitimidade das João Manuel insiste em que o esforço de Cardoso e Falleto,
como João Manual admi-
levantadas por estes autores. Todos eles, no sentido de superar as limitações das hipóteses cepalinas, não
especif icidade
te, estiveram sempre envolvidos com o problema da pode se completar porque permanece prisioneiro do critério cepa;
do capitalismo periférico, mais precisamente, com as peculiaridades lino de periodização histórica (economia colonial/economia na-
no. A
da industrialização capitalista, no contexto latino-america cional, crescimento para fora industrialização por substituição de
” a história eco-
crítica não consiste, portanto, em “reinterpretar importações, industrialização extensiva industrialização intensiva).
nômica do Brasil, como caso paradigmático das “experiências” Para que essa superação seja efetivada no plano teórico, “teria
às per-
de industrialização latino-americanas, senão em perguntar sido preciso que não se localizasse o equívoco do pensamento da
gunias dos predecessores: o que procuram? Cepal na abstração dos condicionantes sociais e políticos, internos
da
A resposta de João Manuel é que a Economia Política e externos, do processo econômico, mas que se pensasse, até as
ão naciona l a par- últimas consegiiências, a História latino-americana como a for-
Cepal investiga a problemática da industrializaç
do proble- mação e o desenvolvimento de um certo capitalismo”.
tir de uma situação periférica e que para ela “o núcleo
consti-
ma da industrialização reside na antinomia entre a plena E para se pensar a História latino-americana como a forma-
e uma certa divisão internacional do trabalho
tuição da Nação ção e o desenvolvimento de um certo capitalismo é preciso começar
economia
que a havia convertido em Periferia, quer dizer, numa recusando na raiz o formalismo contido no paradigma cepalino.
sua
gue era comandada por decisões tomadas no Centro, porque Na verdade, argumenta o autor, há duas e não apenas uma eco-
demand a externa ”.
dinâmica estava presa, em última instância, à nomia primário-exportadora: a apoiada no trabalho escravo ea
depend en-
Nesta perspectiva, “as economias periféricas, enquanto organizada com trabalho assalariado. “Formalismo”, acrescenta,
econo-
tes, são meros prolongamentos do espaço econômico das “que é mera decorrência do conceito de capital de que se parte:
como econom ias
mias centrais e não se poderiam considerar não há capital, isto é, instrumentos de trabalho e mão-de-obra,
nacionais. Mais ainda, na medida em que continuassem a crescer tanto numa quanto na outra?” Para evitá-lo é necessário reconhe-
fora, as economias latino-americanas continuariam condena- cer que a diferença fundamental entre a economia colonial e a
para
la
das à miséria, pois qualquer esforço que fizessem para superá- economia primário-exportadora encontra-se, exatamente, nas dis-
ia à
seria frustrado: não é este o significado profundo da tendênc tintas relações sociais básicas que lhe estão subjacentes: trabalho
deterioração dos termos de troca? Dependência e pobreza eram, compulsório, servil ou escravo, de um lado, e trabalho assalariado,
pois, duas faces de uma mesma moeda, a situação periférica”. de outro.
O autor reconhece a grande contribuição de Fernando Hen- Desvencilhar-se do formalismo é, assim, começar a enten-
rique Cardoso e Enzo Falleto no aprofundamento crítico dr der o nascimento do capitalismo latino-americano pela forma
conceito de dependência, na medida em que avançam as pergun- peculiar de constituição de suas relações sociais básicas. Não basta
12 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
os grandes centros industriais, em torno dos resultante serve de estímulo aos empresários perifé-
assim,
quais a periferia do novo sistema, vasta e heterogênea, ricos para aumentarem a produção primária. Em
pouco tomava parte na melhoria de produtividade. troca, o aumento espontâneo da produção primária
Deniro desta periferia, o progresso técnico só atinge não traz consigo um aumento da demanda industrial
exíguos setores de sua ingente população, pois, geral- capaz de absorver aquele aumento. ..”.
mente, não penetra senão onde se faz necessário para
Às economias periférias enquanto exportadoras de pro-
produzir alimentos e matérias-primas a baixo custo, dutos primários (mais tarde se diria: na etapa do desenvolvi-
com destino aos grandes centros industriais”.2 mento para fora) não dispõem, assim, de comando sobre seu
A propagação desigual do progresso técnico (que é visto próprio crescimento, que, ao contrário, depende, em última
como a essência do desenvolvimento econômico) se
traduz, instância, do vigor da demanda cêntrica.
inada estrutu ra da A demanda por produtos primários exercida pelo centro,
portanto, na conformação de uma determ
do após o rápido auge do comércio internacional que vai, diga-
economia mundial, de uma certa divisão internacional
trabalho: de um lado, o centro, que compreende o conjunto mos, de 1880 a 1914, e marca o nascimento das economias
diver- periféricas, teria revelado pouco dinamismo, por duas razões:
das economias industrializadas, estruturas produtivas
sificadas e tecnicamente homogêneas; de outro, a periferi
a, devido ao crescimento econômico relativamente lento dos
integrada por economias exportadoras de produtos primári
os, países centrais e à queda de seu coeficiente global de impor-
estruturas tações, decorrente do deslocamento da hegemonia cêntrica da
alimentos e matérias-primas, aos países centrais,
produtivas altamente especializadas e duais. Inglaterra para os Estados Unidos.
O caráter de exportadoras de produtos primários impri- As consegiiências desta frouxidão da demanda são tanto
me à dinâmica das economias periféricas seu traço funda- mais graves quanto nos recordemos que, no Estudio, a lenti-
mental: dão com que o desenvolvimento industrial do centro vai
absorvendo o excesso real ou potencial de população ativa
“A indústria traz em si um elemento dinâmico qu dedicada à produção primária (na ausência de mobilidade in-
a produção primária não possui em grau comparável, ternacional de mão-de-obra) está na raiz da deterioração das
e
A produção primária, como seu nome indica, abrang relações de troca das economias periféricas:
as primeiras etapas do processo produtivo, enquanto
a indústria compreende as etapas subseguentes. “Trata-se de um fenômeno estreitamente vinculado à
Devido a esta posição relativa de ambas as atividades, forma de propagação universal do progresso técni-
o aumento da atividade industrial fomenta a atividade co... Este fenômeno é essencialmente dinâmico e
primária; esta, ao contrário, não possui o poder de demonstraremos que, em última instância (a deterio-
estimular a atividade industrial. Quando os empre- ração das relações de troca), se explica pela relativa
sários industriais, impelidos pelas forças ordinárias lentidão com que o desenvolvimento industrial do
da economia ou por fatores extraordinários de tempos mundo vai absorvendo o excesso real ou potencial
de guerra, expandem a produção, aumentam a de população ativa dedicada às atividades primárias...
demanda dos produtos primários e o maior lucro daí Há, portanto, em geral, uma relativa abundância de
potencial humano nas atividades primárias que tende universal, sérias dificuldades de importação, para que
a pressionar continuamente salários e preços dos os fatos demonstrassem as possibilidades industriais
produtos primários e impede, assim, que a periferia daqueles países (latino-americanos) e que, em se-
comparta com os centros industriais o fruto do pro- guida, a grande depressão dos anos trinta corroboras-
gresso técnico por eles alcançado. Mais ainda, im- se a idéia de que era necessário aproveitar tais possi-
pede a periferia de reter uma parte do fruto de seu bilidades para compensar, assim, mediante o desen-
próprio progresso técnico” volvimento interno, a notória insuficiência do impulso
que, de fora, havia estimulado até então a economia
A dinâmica da economia mundial tende, portanto, a apro-
fundar o desenvolvimento latino-americana; corroboração ratificada durante a
desigual (cuja expressão imediata
é o desnível de produtividade média e de renda entre centro
segunda guerra mundial, quando a indústria da Amé-
e periferia), porque o centro é capaz de conservar seus incre-
rica Latina, com todas as suas improvisações e difi-
mentos de produtividade e, ainda, de se apropriar de parte culdades, se transforma, entretanto, em fonte de em-
prego e consumo para uma parte apreciável e cres-
dos resultados do progresso iécnico introduzido na periferia.
Em outras palavras, há uma tendência à concentração dos
cente da população”.
frutos do progresso técnico nas economias centrais, e o meca- Que problemas deveria enfrentar esta industrialização que
nismo pelo qual isto se dá é a deterioração das relações surgira como reação espontânea das nações latino-americanas
de troca. as dificuldades de importação acarretadas pelas guerras
Se as transformações estruturais ocorridas no centro mundiais e pela Grande Depressão? A resposta é muito sim-
após 1914 parecem retirar toda e qualquer esperança de se ples: os problemas e, ao mesmo tempo, a especificidade da
apoiar o desenvolvimento latino-americano na expansão das industrialização latino-americana decorrem de seu caráter
exportações de produtos primários, o movimento real da eco- periférico. Ou melhor: a industrialização latino-americana é
nomia mundial, ao mesmo tempo, estimula a ruptura da problemática porque periférica.
divisão internacional do trabalho, e as economias latino-ame- A desigualdade do desenvolvimente mundial reflete-se.
ricanas, entram numa nova etapa — etapa do desenvolvi- em primeiro lugar, no descompasso entre as técnicas produ-
mento para dentro: tivas “avançadas” do centro e a capacidade de poupança de
“Antes da primeira guerra mundial já se haviam dado periferia:
aigumas manifestações incipientes desta nova etapa...
“Nos paises desenvolvidos, a técnica produtiva exige
to desenvolvimento para dentro)... Mas foi preciso
um alto grau de capital por homem; mas o desenvol-
que sobreviessem, com o primeiro conflito bélico
vimento paulatino da produtividade, devido precisa-
(4) Cf. Economic Survey, pp. 46/47. Fica claro, portanto, que a mente a tais técnicas, permitiu a estes países possuir
tentativa de dar outra roupagem conceitual à deterioração das uma renda “per capita”, mediante a qual realizam a
relações de troca, tomando-a por troca desigual, não somente
nada acrescenta a esta abordagem de Prebisch, como, na verdade poupança necessária para formar o capital requerido.
representa um passo atrás, dada sua formulação estática. Cf, Ao contrário, na maior parte dos países latino-ame-
A. EMMANUEL, L'Échange Inégal, Nouvelle édition revue et Z
complétée, Paris, Maspero, 1972, e as percucientes “Remarques ricanos a poupança é escassa, dado o baixo nível de
Théoriques” de Charles Bettelheim que seguem (pp. 295-341) ao
trabalho de Emmanuel. 65) Cf. Economic Survey, pp. 3/4,
18 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 19
renda. Quando cs que hoje são os grandes centros in- crescendo com o tempo, conforme a maior produtivi-
dustriais estavam em situação comparável à que apre- dade aumentava a renda e, com ela, a demanda cha-
sentam agora os países periféricos e sua renda era mada a absorver o incremento da produção, em quan-
relativamente pequena, a técnica produtiva exigia tidade, qualidade e variedade. Muito distinta é a
também um capital, por homem, relativamente peque- situação dos países que se vão incorporando agora à
no. Se refletirmos bem, a poupança não é grande ou técnica industrial moderna. A demanda aqui é débil,
pequena em si mesma, senão em relação à densidade porque a produtividade é pequena, porque a exí-
de capital resultante do progresso técnico. Neste sen- gua demanda se opõe, junto a outros fatores, ao em-
tido, a poupança da América Latina é, em geral, muito prego de elementos da mais avançada técnica”.
escassa em relação à técnica moderna... Em conse- Finalmente, o desenvolvimento para dentro manifesta-
quência, os países que empreenderam recentemente ria uma tendência ao desemprego estrutural, porque o pro-
seu desenvolvimento industrial desfrutam, por um gresso técnico traz consigo o desemprego, como nos centros,
lado, a vantagem de encontrar nos grandes centros mas a demanda de bens de capital a ele inerente não se ma-
uma técnica que lhes custou muito tempo e sacrifi- nifesta na periferia, à falta de indústrias de bens de capital.
cio; mas tropeçam, em troca, em todas as desvanta-
gens inerentes ao fato de seguir tardiamerte a evo- “Estas influências desfavoráveis à ocupação e aos sa-
lução dos acontecimentos”. É lários acarretaram frequentemente reações contrá-
rias ao progresso técnico, no desenvolvimento dos
A industrialização periférica esbarra, ademais, no dese- grandes países industriais. Entretanto o próprio pro-
quilíbrio entre as técnicas importadas e a relativa fragilidade gresso técnico, ao requerer crescentes inversões de
da demanda: capital, vai desenvolvendo em tais países um poderoso
“Outra conseqiência importante da disparidade entre elemento de absorção de gente desocupada, mediante
os graus de evoluçãoda renda e da técnica produtiva o desenvolvimento das indústrias de bens de capital. O
consiste na escassa intensidade da demanda, que, em progresso técnico cria, pois, desemprego, mas tende ao
termos gerais, caracteriza grande parte da população mesmo tempo a absorvê-lo, graças ao aumento das
latino-americana, apesar de sua magnitude numérica. inversões... Este elemento expansivo, cujos efeitos
Não somente a falta de capital ou de destreza para se propagam a toda a atividade econômica dos gran-
manejá-lo se opõe ao emprego da técnica avançada, des centros, falta nos países periféricos, de maneira
senão que a debilidade da demanda impede também a que, se suas exportações não forem suficientes para
obtenção das vantagens de produção em larga escala. dar emprego ao excesso de trabalhadores provocado
Muito menos se concebe que limitações desta natureza pelas inovações técnicas, não é de estranhar que o te-
tenham se oposto seriamente ao desenvolvimento da mor do desemprego seja latente e adquira, às vezes,
indústria dos grandes centros. A renda originariamen- formas de oposição pertinaz ao uso de dotações de
te exígua coincidiu ali com formas de produção de capital mais avançadas, cuja imediata consequência
escala proporcionalmente reduzida. Esta escala foi é reduzir a demanda de mão-de-obra na produção pri-
(6) Cf. Economic Survey, pp. 62/63. ) Cf. Economic Survey, pp. 63/64.
20 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 21
mária e industrial. A falta deste elemento espontâneo do espaço econômico das economias centrais e não se pode-
de desenvolvimento cria, na verdade, situações sin- riam considerar como economias nacionais. O Mais ainda, na
gulares. Na periferia, o progresso técnico traz consigo medida em que continuassem a crescer para fora, as econo-
desemprego, como nos centros, mas a demanda de mias latino-americanas continuariam condenadas à miséria,
bens de capital a ele inerente não se manifesta da pois qualquer esforço que fizessem para superá-la seria frus-
mesma forma que nos centros, pois faltam à perife- trado: não é este o significado profundo da tendência à dete-
ria as indústrias de capital; consegientemente, a de- rioração das relações de troca? Dependência e pobreza eram,
manda por bens de capital, em lugar de se refletir pois, duas faces de uma mesma moeda, a “situação
na economia do país em desenvolvimento, produz periférica”.
efeitos nas economias centrais, onde se produzem A industrialização aparece como o momento crucial de
estes bens de capital.” constituição da Nação, como modo da Nação se tornar reali-
A Economia Política da CEPAL nasceu, assim, para ex- dade, deixando de ser o que era, uma quase-ficção. Com ela,
plicar a natureza do processo de industrialização que eclodira, inicia-se uma nova etapa, a do desenvolvimento para dentro,
entre 1914 e 1945, em vários países, pôr a nu sua possível porque o centro dinâmico da economia se desloca para den-
trajetória, revelar os problemas que enfrentaria se quisesse tro da Nação, que passa a se comandar a si própria. Isto é, o
ter êxito e sugerir políticas econômicas que fossem aptas a deslocamento do centro dinâmico das economias latino-ame-
superá-los. Mas nasceu, ao mesmo tempo, para dizer em alto ricanas, quer dizer, a substituição da variável exógena de-
e bom som às Nações de “Nuestra América” que a industriali- manda externa pela variável endógena investimento coma
zação seria o único caminho a trilhar se desejassem se tornar motor da economia, equivale ao deslocamento para o interior
senhoras de seu próprio destino e, simultaneamente, se verem da Nação, dos centros de decisão. Ao mesmo tempo, como
livres da miséria. disse Prebisch em outro trabalho, a industrialização
Não é difícil, portanto, localizar a problemática da Eco- “não é um fim em si mesma, senão o único meio de
nomia Política da CEPAL,. Todo espaço do discurso cepalineo que (os países latino-americanos) dispõem para ir
está organizado em torno da idéia de independência econá- captando o fruto do progresso técnico e elevando
mica da Nação. Melhor ainda: a problemática cepalina é a
progressivamente o nível de vida das massas”, 10
problemática da industrialização nacional, a partir de uma
“situação periférica”. Numa palavra: construção das bases econômicas da
O núcleo do problema da industrialização reside na an- Nação e liquidação da pobreza são, também, dois aspectos
tinomia entre a plena constituição da Nação e uma certa de um mesmo processo, o de industrialização.
divisão internacional do trabalho que a havia convertido em 9 — Ninguém melhor que H. Singer, cuja influência sobre o pensa-
Periferia, quer dizer, numa economia que era comandada mento cepalino é de todos conhecida, expressou esta idéia. Cf.
H. SINGER, “The distribution of gains between investing and
por decisões tomadas no Centro, porque sua dinâmica estava borrowing countries”, American Economic Review, May, 1950,
presa, em última instância, à demanda externa, As economias pp. 4713-485, republicado em: OKUN, B. e RICHARDSON, R. W.
(org.): Studies in Economic Development, N. York, Holt, Ri-
periféricas, enquanto dependentes, são mero prolongamento nehart and Winston, 1961, pp. 170-180, especialmente pp. 170-172.
do Ci. R. PREBISCH, “El desarrollo Económico de América La-
tina y algunos de sus Principales Problemas”, in Boletin Eco-
(8) Cf. Economic Survey, p. 65. nómico para América Latina, 1961.
22 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 23
A oposição Nação/divisão internacional do trabalho re- samento cepalino foi se conformando. Do combate às políti-
nova-se no processo de industrialização periférica: a dispa- cas de estabilização de inspiração ortodoxa surgiu a teoria
ridade entre técnicas produtivas “avançadas” e a capacidade estruturalista da inflação; o fracasso quase generalizado
de poupança da periferia, o desequilíbrio entre as técnicas da industrialização, após 1955, levou à elaboração da teoria dos
importadas e a relativa fragilidade da demanda periférica e obstáculos estruturais, que desembocava na proposição de
a tendência ao subemprego são justamente suas novas ma- “reformas de estruturas”; o sucesso isolado da industriali-
nifestações. Em. outras palavras, a industrialização latino- zação brasileira tornou possível revelar, em sua integridade,
-americana, porque periférica, enfrenta problemas que lhe a rationale da industrialização latino-americana (dentro, na-
conferem especificidade que, pensando bem, se reduzem a turalmente, da problemática cepalina). 4D
um único: a ausência de uma indústria de bens de produção E assim chegamos aos meados da década dos sessenta,
num momento em que o Centro conformou uma estrutura quando a morte do movimento social nacional-desenvolvi-
industrial permeada por uma tecnologia extremamente mentista ficou evidente. A industrialização ou se abortara,
avançada. Daí que os efeitos expansivos do investimento se ou, quando tivera êxito, não trouxera consigo nem a liber-
filtrem para o exterior; daí que a importação de bens de tação nacional, nem, muito menos, a liquidação da miséria.
produção traga contida neles uma tecnologia desajustada às Com isto. uma pergunta ficava no ar: por que a História
necessidades latino-americanas. Exatamente porque a indus- teria tomado outro curso, defraudando esperanças que pa-
trialização latino-americana é problemática (e específica), a receram outrora tão bem fundadas? A resposta, no plano
resolução das dificuldades não pode ser entregue ao livre teórico, consistiu, sabemos todos, na formulação das “Teo-
jogo das forças de mercado, mas há de ser objeto de uma in- rias da Dependência”, que nasceram, assim, para enfrentar
tervenção consciente na realidade, que é apreendida pela a questão da não-industrialização-nacional.
idéia de planificação. A filiação cepalina da idéia de “dependência externa” é
Na medida em que a Economia Política da CEPAL vê clara, pois simples decorrência da concepção de desenvolvi-
a industrialização como industrialização nacional, prescinde- mento desigual da economia mundial capitalista, que se ex-
-se de qualquer esquema endógeno de acumulação, que po- prime na relação Centro/Periferia. Deste modo, não seria
deria revelar outras oposições (basicamente a oposição salá-
41 Cf, especialmente: de R. PREBISCH: El Desarro
rios/lucro). Existem, apenas, “impactos internos” decorren- llo Econômico
de América Latina y algunos de sus Principales Proble
mas, op.
tes da importação de certa tecnologia, visualizados pela ópti- cit. Problemas Teóricos y Prácticos del Crescimiento
Econó-
mico, Naciones Unidas, 1952. “Commercial policy in the
ca das funções macroeconômicas de produção, contrapostos, developed countries American Economic Review, maio,
under-
1959 e
em última análise, à baixa capacidade de poupança da pe- Hacia una dinâmica del desarrollo latinoamericano;
de Celso
riferia. Furtado: Formação Econômica do Brasil, 11º ed., São
Paulo,
Editora Nacional, 1971 (primeira edição, 1959) e Desenvo
lvi-
Assim nasceu, com o Estudio Económico de América La- mento e Subdesenvolvimento, Rio de Janeiro, Fundo de Cultura
,
1961, capítulos 3,4, 5 e 6; O. SUNKEL, “La inflación chilena
tina - 1949, a Economia Política da CEPAL, e foi na luta Un enfoque heterodoxo”, El Trimestre Económico, out/dez. 1958;
—
pela industrialização nacional que se desenvolveu. Foram A. PINTO, “Estabilidad y desarrollo”, El Trimestre Económico,
nas batalhas jan/março, 1960; D. SEERS, “Inflación y crescimiento: Resu-
em torno das orientações a serem imprimidas men de la experiencia latinoamerica”, Boletin Econômico
à política econômica, travadas com saber e imaginação por para América Latina, fev. 1962; M. C. TAVARES, “Auge y
Prebisch, Furtado, Anibal declinación del proceso de sustitución de importaciones en el
Pinto e tantos mais, que o pen- Brasil”, Boletin Económico de América Latina, março, 1964,
24 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
O CAPITALISMO TARDIO 25
tamos a especificidade da instauração de um modo certo capitalismo. Não se podendo arrancar de uma perio-
capitalista de produção em formações sociais que en- dização correta, nem de esquema que apanhasse concreta-
contram na dependência seu traço histórico pe- mente o movimento econômico da sociedade, a perspectiva
culiar”. (6 integradora perdeu-se, em boa parte, dando a impressão de
Penso, portanto, que Dependência e Desenvolvimento re- que se passou, apenas, à introdução das classes sociais no
presenta uma tentativa de constituir uma nova problemáti- corpo teórico cepalino. 18)
ca, a problemática da “instauração de um modo de produção Esta tarefa — a de repensar a História latino-americana
capitalista em formações sociais que encontram na depen- como formação e desenvolvimento do modo de produção ca-
dência seu traço histórico peculiar”, a problemática da for- pitalista — tem avançado consideravelmente nos últimos
mação e do desenvolvimento do modo de produção capita- anos, e é para ela que este trabalho pretende trazer alguma
lista na América Latina. Mais que isto, traz, a meu juízo, contribuição.
entre outras, uma contribuição fundamental: a idéia de que
a dinâmica social latino-americana é determinada, em pri-
meira instância, por “fatores internos”, e, em última instân-
cia, por “fatores externos”, a partir do momento em que se
estabelece o Estado Nacional. 47
É de se admitir, no entanto, que a tentativa não pôde
se completar porque para isto seria indispensável fazer a
crítica da Economia Política da CEPAL pelas raízes, e não
a partir de seus resultados como se procedeu: basicamente,
do critério cepalino de periodização histórica (economia
colonial/economia nacional, crescimento para fora, industria-
lização por substituição de importações e industrialização
extensiva/industrialização intensiva), que é reprodu-
zido tomando em conta “fatores
sociais e políticos” (So-
ciedade colonial/Sociedade Nacional, crescimento para fora,
consolidação do mercado interno, internacionalização do mer-
cado) e das explicações cepalinas para a “passagem econô-
mica” de uma etapa a outra, de um período a outro. Teria
sido preciso, enfim, que não se localizasse o equívoco do
pensamento da CEPAL na abstração dos condicionantes so-
ciais e políticos, internos e externos, do processo econômico,
mas que se pensasse, até as últimas consequências, a História
latino-americana como formação e desenvolvimento de um (18) Todas as dificuldades decorrentes da introdução das classes
sociais no corpo teórico cepalino aparecem, em cheio, no con-
(16) Op. cit., p. 139. ceito de marginalidade social, que deveria reter a especificidade
47 Op. cit., pp. 22 e segs. maior da estrutura de cl i |
Capítulo 1
AS RAÍZES DO CAPITALISMO RETARDATÁRIO
os países industriais, economia refexa porque atrelada aos nial e de sua dinâmica. Convém que nos detenhamos mais
demoradamente no exame desta tormentosa questão.
mera
namo quer
um número considerável de trabalhadores sem liber- cola, ou melhor, uma disponibilidade de terras quase ilimitada.
dade empregava-se sob direção e controle unificados, Quando estes dois requisitos — oferta de escravos a
na produção das principais colheitas”.O baixo preço e disponibilidade de terras quase ilimitada —
não puderam ser cumpridos, a “plantation” perdeu suas
condições de existência e se desintegrou, levando, na Anti-
Q Cf. M. WEBER, História Económica General, tradução espanhola,
4º edição, México, Fondo de Cultura Económica, 1964, p. 82.
Q) Cf. L. C. GRAY, History of Agriculture in the Southern United (4) Cf. M. WEBER, Economia y Sociedad, tradução espanhola, 2:
States apud E. GENOVESE, Economia Política de la Esclavitud, edição, México, Fondo de Cultura Económica, 1964, vol. I, pp.
tradução espanhola. Barcelona. Ediciones Peninsula, 1970, p. 21. 131 e segs.
a
34 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
O CAPITALISMO TARDIO 35
PE
guidade, a uma economia escravista de subsistência e, nos
concebido, reintroduzem o formalismo e tratam de
carac-
Tempos Modernos, ao cultivo da terra apoiado no trabalho terizar as economias coloniais a partir da presença
assalariado, ainda que, espontaneamente, desembocasse. na relações sociais servis ou escravistas. Fernando Henriq
de
ue
parceria. O Cardoso, arrancando da lapidar introdução de Hobsbawn as
Penso que os méritos maiores das análises de Weber Formações Econômicas Pré-Capitalistas, coloca a questão
em
consistem, de um lado, em reconhecer à economia colonial seus devidos termos:
ou às economias coloniais, caracterizando-as como “economias
certa espe- “A escravidão e a servidão repostas como necessá-
de 'plantation' ” ou de “semi-'plan tation' ?, uma
rias para a produção em larga escala numa fase do
cificidade e, de outro, em buscar compreende r, a partir daí,
desenvolvimento do capitalismo e para a comercia-
suas condições de persistência, crescimento e mudança. Repre-
lização no mercado internacional, têm em comum
sentam, pois, inegavelmente, um avanço em relação à con-
com a escravidão antiga e a servidão medieval
cepção que as quer capitalistas pelo simples fato de. a
apenas a forma. Estas são necessariamente limitadas
produção ser mercantil e de o lucro consistir no princípio
na medida em que combinam relações sociais básicas.
reitor da atividade econômica; como, também, dão um passo
Porém, o que importa não é quantas são as relações
aà frente dos que, por haver servos e escravos, pensam à
sociais básicas e como se combinam abstratamente,
economia colonial feudal ou escravista.
mas como são 'inventadas' e “reinventadas' em
Não é por outra razão que sua influência tem sido contextos específicos”. 9
marcante. No entanto, ainda assim, a concepção de Weber
Fica claro, portanto, que não é lícito identificar o modo
está viciada pelo formalismo. Retendo apenas elementos
de produção dominante nas formações sociais coloniais a
gerais — produção mercantil de produtos agrícolas, apoiada
partir, apenas, da forma que assumem as relações sociais
no irabalho escravo, própria de colônias sujeitas a monopólio
básicas, como se escravidão fosse igual a modo de produção
de comércio — abstrai-se o que é essencial ao se desprezarem
escravista, e servidão, a feudalismo. Este procedimento exclui
os vários contextos em que a “plantation” se situou histori- ,
pura e simplesmente, o nível e a organização das
camente. Quer dizer, abstrai-se ora sua Antiguidade, ora sua forças
produtivas, sua articulação com as relações sociais de pro-
Modernidade. Com isto, incapacita-se para determinar tanto
dução e, não menos importante, os processos históricos que
suas gêneses quanto sua dinâmica, que não pode nem ser
constituíram e deram “sentido” a tais sociedades.
deduzida — como se economia escravista de subsistência, par- Que seme-
lhança, senão a formal, guardariam, por exemplo, a
ceria ou exploração assentada no trabalho assalariado fossem, economia
mercantil-escravista brasileira e a economia mercan
sempre, possibilidades fundadas in abstrato — nem, muito til-
escravista romano-cartaginesa?
menos, ser extraída ex post do efetivamente ocorrido.
Para quem é prisioneiro de esquemas de desenvolvi-
Outros, imaginando partir do conceito de modo de mento social pré-concebidos, à moda da filosofia
da história,
produção e acreditando que todas as sociedades teriam as dificuldades nascem de todos os lados. Como
as especifi-
de percorrer necessariamente, uma a uma, as etapas de um
determinado esquema de desenvolvimento histórico pré- (6) Cf, F. H. CARDOSO, As Classes Sociais na
América Latina, São
Paulo, 1973, p. 11 (Exemplar mimeografado); E.
HOBSBAWN,
Prólogo a K. Marx: Formaciones Económicas Pré-Cap
(65) Cf. M. WEBER, História Económica General, pp. 82 e segs. italistas,
Cuadernos de Pasado y Presente, n.º 20, 1971.
36 JOÃO O CAPITALISMO TARDIO 37
MANUEL CARDOSO DE MELLO
cidades são por demais gritantes para serem ignoradas, pro- produção e o trabalhador direto está sujeito à compulsão.
cura-se surpreendê-las com expressões como “semi”, “para”, Quer dizer, a empresa colonial de exportação assenta-se no
“de caráter”, etc., com o que se escamoteia o problema. De trabalho compulsório, servil ou escravo. O setor produtor de
parca valia, obviamente, é proceder à sua constatação, salien- alimentos só é mercantil na medida em que o tempo de tra-
tando-se que a Colônia contém, mesclados, elementos escra- balho da força de trabalho empregada no setor exportador
vistas, feudais e capitalistas. Tampouco é frutífero querer é dedicado, exclusivamente, à produção de mercadorias de
dar
um passo à frente e subordinar uns elementos a outros; exportação. Este setor pode estar organizado à base de tra-
teríamos, então, conforme o elemento tido como dominante, balho servil, trabalho escravo ou, mesmo, por produtores
capitalismo parcial (falta, apenas, o trabalho assalariado... ) independentes. Porém, parte do tempo de trabalho da força
ba de trabalho do setor exportador pode ser empregada na
etc. O É
Não há outra alternativa além de encarar este problema produção de subsistência. Neste caso, o caráter mercantil do
vi erramos
de frente, assumindo
setor produtor de alimentos desaparece e ele surge como
os riscos da empresa, e reconstruir o
conceito de Economia Colonial. que embutido no setor exportador. &
Nossa tarefa consistirá, pois, em tentar A economia colonial define-se, portanto, como altamente
precisar uma
nova problemática. reexaminando especializada e complementar à economia metropolitana. Esta
o conceito de economia
colonial, entendendo a constituição das “economias complementaridade se traduz num determinado padrão de
primário-
exportadoras” como surgimento do capitalismo comércio: exporiam-se produtos coloniais e se importam
na América
Latina e delimitando, ao menos, as questões produtos manufaturados e, no caso de economias fundadas
envolvidas na
Passagem da economia colonial à capitalista, ainda na escravidão negra, escravos. Por outro lado, a articulação
que não
especificamente capitalista. Isto posto, buscar-se-á exami economia metropolitana-economia colonial a isto não se
nar
esta transição, em seus aspectos econômicos, tal como resume, porque este padrão de comércio se efetiva através
se deu
no Brasil. do monopólio de comércio exercido pela burguesia comercial
metropolitana, do exclusivo metropolitano, como então era
chamado.
1 Da Economia Colonial à Economia Exportadora Pergunto: por que a economia colonial tem esta feição
Capitalista
« não outra? Por que a produção colonial é complementar?
Comecemos por desenhar, rapidamente, os contornos da Por que c trabalho é servil ou escravo? Por que há mono-
economia colonial. Estão presentes dois setores: um expor- pólio de comércio”
tador e um produtor de alimentos. O setor exportador produz, à explicação não há de residir nem na existência de
em larga escala, produtos coloniais (açúcar, tabaco, metais recursos naturais ou no clima tropical, que não eram mais
preciosos, etc.) destinados ao mercado mundial. A produção que condições, que pré-requisitos da produção colonial. Nem
mercantil é organizada pelos proprietários dos meios de a falta de homens, na Metrópole, suficientes para as tarefas
de Colonização deve ser apontada como razão para o trabalho
() Para uma crítica aguda, nestes pontos, veja-se compulsório. Isto, no máximo, como sublinhou F. Novais,
€C. CARDOSO,
“Severo Martinez Pelãez y el caráter del Regimen Colonial
”, em
em ts oeramerço
explicaria a presença econômica de outros homens, mas À economia colonial or ganiza-se, pois, para cumprir uma
certamente não esclarece por que estes homens estiveram função: a de instrumento de acumulação primitiva de
sujeitos à servidão ou foram escravizados. Nem se pode parar, capital. O) Dever-se-iam estabelecer, portanto, mecanismos
no caso do monopólio de comércio, na explicação, por demais capazes de ajustar a economia colonial
à sua razão de ser,
óbvia, de que, assim, a burguesia comercial metropolitana mecanismos de exploração que permi
tissem: 1) produzisse
poderia auferir maiores lucros. a economia colonial um excedente que
se transformava em
Se quisermos ir além das aparências, a resposta a todas as lucros ao se comercializar a produção
no mercado interna-
indagações começa por reconhecer que a Colonização Moderna cional; 2) a criação de mercados coloniais
à produção metro-
integra um processo mais amplo, o de constituição do modo politana; e 3) que o lucro gerado na colônia
fosse apro-
de produção capitalista, e por explicitar seu caráter comercial priado quase que integralmente pela burguesia metro
politana.
e capitalista. Foi o que, em trabalho lapidar, demonstrou A produção colonial deveria ser, deste modo,
mercantil.
Fernando A. Novais: Não uma produção mercantil qualquer, porém produção
mercantil que, comercializável no mercado mundial,
“Absolutismo, sociedade estamental, capitalismo co- não
concorresse com a produção metropolitana. Do
mercial, política mercantilista, expansão ultramarina contrário,
in extremis, o comércio se tornaria impossível
. Produção
E em
e colonial são partes de um todo, interagem rever-
colonial, em suma, quer dizer produção mercantil compl
sivamente neste complexo que se poderia chamar, e-
Meme
mentar, produção de produtos agrícolas coloniais e de
mantendo um termo da tradição, de Antigo Regime. metais
omnes
os
preciosos. 4)
São, no conjunto, processos correlatos e interdepen-
Por outro lado, não é difícil compreender que
dentes, produtos todos das tensões geradas pela desin- somente
haveria produção colonial se houvesse traba
tegração do feudalismo, em curso, para a constituição lho compulsório,
servil (encomienda, mita, indentured, etc.)
ou escravo.
ss pomer
do modo de produção capitalista. Nesta fase interme-
O fundamental, no caso das “áreas vazia
diária em que a expansão das relações mercantis s”, é a abun-
dância de terras apropriáveis. Não se
trata, certamente, de
rnErica:
promovia a superação da economia dominial e a
um dado natural, mas da existência de terra farta para
transição do regime servil para o assalariado, o capital a
produção, pelos colonos, da auto-subsistência.
mercantil encontrava obstáculos de toda a ordem Explico-me.
Se o móvel da empresa colonial era o lucro,
para manter o ritmo de expansão das atividades e tratava-se
de rebaixar, ao máximo, o custo de reproduç
ascensão social; e daí, no plano econômico, a neces- ão da força de
trabalho. Havendo abundância de terras
sidade de apoios externos — as economias coloniais apropriáveis, os
— para fomentar a acumulação, e no plano político a
40) “Encarada, pois, neste contexto, a
centralização do poder para unificar o mercado colonização do Novo Mundo
na Época Moderna apresenta-se como
peça de um sistema,
nacional e mobilizar recursos para o desenvolvi- instrumento de acumulação Primitiva da
época do Capitalismo
Mercantil... Completase o sentido profundo da Coloni
mento”. comercial e capitalista, elemento consti zação:
tutivo no processo de
formação do capitalismo moderno”, Cf.
F. A. NOVAIS, Op. cit,
P. 75. Sobre a acumulação primitiva, veja-se
K. MARX, El Capital,
(& Cf. F. A. NOVAIS, Portugal e Brasili na Crise,
i do Antigo Sistema tradução espanhola, 2.º edição, México,
Fondo de Cultura Econó.
Colonial (1777/1808), S. Paulo (Exemplar mimeografado), 1972, mica, 1973, vol. I, pp. 607/649.
capítulo II: A Crise do Antigo Sistema Colonial, p. 71. (1) Cf. FA. NOVAIS, Op. cit. pp. 103 e segs.
O CAPITALISMO TARDIO 41
40 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
mendavam a máxima
colonos contariam com a possibilidade de produzirem a dificuldades de captação dos lucros reco
própria subsistência, transformando-se em pequenos proprie- por parte das autoridades metropolitanas.
fiscalização
tários e, especialmente, em posseiros. Nestas condições, obter
agora, onde reside a especificidade da eco-
Revela-se,
produção mercantil em larga escala significava assalariar a Produção a
nomia colonial dos Tempos Modernos.
sua força de trabalho, o que exigiria que a taxa de salários épocas da Idade Média
trabalho servil, sir, como em várias
oferecida fosse suficientemente elevada para compensar, ntil e trabalho
segunda servidão”; produção merca
aos té
ABAS. !
olhos dos colonos, a alternativa da auto-subsistência. ansiçãoe
mercantil
Assim mm
escravo, como
ascrav na Antiguidade. Po rém produção
cus
sendo, o trabalho compulsório estimular à
era mais rentável que o trabalho escravo “reinventados” para
emprego de trabalho assalariado. 4% do feudalismo para o capitalismo.
Não se deve esquecer, ademais, que o tráfico negreiro
comercial não se limitou na América raina
abriu um setor do comércio colonial altamente O capital
rentável e E conqie :
representou poderosa alavanca à acumulação a explorar os modos de produção pré-existentes
de capitais, que lhe
como demonstrou F. Novais. “9 Ao contrário, desdobrou o âmbito da circulação
tuindo à eco
No caso das áreas densamente povoadas em próprio e invadiu a esfera da produção, consti
que estavam seu caráter ne
estabelecidas sociedades com um grau de complex nomia colonial, Imprimiu-lhe, desde logo,
idade rela- ção no merea o
tivamente grande, para que a desorganização cantil, assegurando-lhe a realização da produ
do modo de de colonizar pisa
produção então predominante mundial. Para subjugá-la, pois se tratava
fosse seguida pela estrutu- ne servil c o traba
o capitalismo, “reinventou” o trabalho
ração da economia colonial, nada restava senão
“reinventar” repro dução
a servidão, mediante o “transplante” de formas jurídicas escravo e, no caso da escravidão, assegurou a
o tráfico , setor do comér cio colonial
metropolitanas. 14 das relações sociais, com
e mola de acumulação. Em suma, o tipo de desenvolvimento
Finalmente, o monopólio de comércio. o exclusivo es sociais
metropolitano, era o mecanismo fundamental das forças produtivas e as correspondentes relaçõ
pelo qual o ial em seu.
excedente gerado na colônia se transferia à burguesi de produção são instauradas pelo capital comerc
a comer-
cial metropolitana, bem como providenciava que por ela proveito.
o caráter
fossem supridos os mercados coloniais. 4 exclusiv
idade na De outro lado, vão se pode perder de vista
compra rebaixava ao máximo os preços de
aguisição dos a
produtos coloniais = a exclusividade na e o caráter determinanie, para seu mov
venda estabelecia Andes coloniais
Para os produtos metropolitanos os mais que não se definem no seu espaço.
altos preços pos- mento, das contradições
mente
síveis. A este mecanismo básico de transfer
ência de lucros mas no das economias metropolitanas, e mais especifica
acrescia outro, a tributação, que assumia ho espaço das relações entre uma e outras. Em última
papel relevante em
se tratando de “economias mineiras”, desde o movimento próprio da economia colonial foi-lhe
que as evidentes análise,
retirado pela impossibilidade de acumular autonomamente
ao se estabelecerem a apropriação e o controle do excedente
(2 Cf. os trabalhos de E, WILLIAMS, E.
GENOVESE e FA. NOVAIS
(13 “Paradoxalmente, é a partir do tráfico
negreiro que se pode comercial metropolitana.
entender a escravidão africana colonia
l, e não o contrário.”
pela burguesia
Cf. FP. NOVAIS, Op. cit., p. 112.
(4 Não cabe, no âmbito deste trabalho,
a discussão do modo de
produção preexistente à conquista nestas Us Cf. F. NOVAIS, Op. cit. pp. 94/97 e 115.
áreas.
42 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 43
Todas estas reflexões parecem tornar impossível con- da marcha rumo ao “capitalismo industrial”) também o são.
ceber um Modo de Produção Colonial ou Modos de Produção Na metrópole, a libertação do trabalho, o trabalho assalariado;
Coloniais. 4) Que modo de produção é este que não parece na colônia, a “reinvenção” de formas de relações sociais
reter em si qualquer especificidade quanto ao tipo e ao nível pré-capitalistas. Progresso e, ao mesmo tempo, aparente re-
das forças produtivas e correspondentes relações sociais de trocesso — aparente porque ingrediente indispensável ao
produção? Que modo de produção é este que não se reproduz progresso.
e cuja dinâmica depende, quase que inteiramente, de contra- Se o “Antigo Regime”, uma estrutura de transição, está
dições que lhe são próprias? na Metrópole, mas, também, na Colônia, é forçoso admitir
Mas, por outro lado, pergunto: é possível conceber o que se na Metrópole há capitalismo, porque o capital trans-
movimento, isto é, a transição do feudalismo para o capita- fere-se para a esfera da produção, subordinando formalmente
lismo, abstraindo o papel desempenhado pelas economias o trabalho ao capital, seja no “putting out system”, seja na
coloniais? Não: tanto a acumulação de capital e sua concen- manufatura, há, também, modo de produção colonial ou
tração nas mãos da burguesia comercial metropolitana quanto modos de produção coloniais, como acentuou, argutamente,
a criação de mercados coloniais foram fatores essenciais (digo Fernando Henrique Cardoso. &) Mais ainda, também na
ron
essenciais, não únicos ou mais importantes) à constituição da colônia existe capitalismo, ainda que de maneira formal:
uia
capitalismo. 47)
“Na segunda classe de colônias — as plantações, que
rue
O que há, portanto, é uma única totalidade, ou melhor,
foram, desde seu nascimento, especulação comercial,
ec m
um único processo, em que o “sentido” e os rumos são deter- centros de produção para o mercado mundial —
castro
minados pelas contradições que animam as economias metro- existe um modo de produção capitalista se bem que
politanas. Se economia colonial e economia metropolitana são
Reg fon
somente de maneira formal, dado que a escravidão
faces da mesma moeda, empresa colonial e manufatura
entre os negros exclui o assalariado livre, que é a
es O
(tomada como a estrutura produtiva que apanha o “sentido”
base sobre a qual a produção capitalista repousa.
Seen
Entretanto, os que se dedicam ao comércio de es-
(16) Ciro Cardoso propõe pensar em modos de produção coloniais
distinguindo: 1) um modo de produção escravista
cravos são capitalistas. O sistema de produção intro-
colonial; 2)
um modo de produção baseado na exploração do trabalho índio,
eta
duzido por eles não se origina na escravidão, senão
estabelecido na região nuclear da América pré-colombiana e 3)
um modo de produção vigente na América do Norte, “economia que é introduzido dentro dela. Neste caso, o capitalista
diversificada e autônoma de pequenos proprietários”. Cf. C. e o senhor são a mesma pessoa. ..”.49)
ng
aceitar, por tudo que foi dito, que se possa imaginar presente
numa colônia de povoamento e não de exploração, um modo constituir no motor da atividade econômica que imprime
de produção colonial, caráter formalmente capitalista ao regime colonial de pro-
PERA
(47) CI. K. MARX, op. cit., loc. cit. e, dentre a copiosa literatura sobre dução. Nem, muito menos, o simples fato de participar a
a questão, especialmente: E. WILLIAMS — Capitalism & Sla.
very. 2º edição. N. York, 1961; P. MANTOUX: Industrial Revolu- economia colonial do mercado mundial.
tion in Eighteenth Century, tradução inglesa, nova edição, Lon-
dres, 1961; F. NOVAIS, “Sistema Colonial, Industrialização e (18) Cf. F. H. CARDOSO, gp. cit., passim.
Etapas do Desenvolvimento”, separata de Estudos Históricos 9, 49) Cf. K. MARX, História Crítica de la Teoria de la Plusvalia, tra-
Marília, 1973. Em sentido contrário, mas não convincentemente, dução espanhola, México, Fondo de Cultura Económica, 1944,
por exemplo, os trabalhos do P. Bairoch e Phyllis Deano. vol, II. pp. 332/3383.
44 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 45
Ao contrário, há, formalmente, capitalismo porque a conjunto da periferia), porque só produção em massa pode
escravidão é escravidão introduzida pelo capital e a gênese significar preços baixos. Não mais produção mercantil para
da economia colonial recebe todo o peso que lhe é devido. fomentar a acumulação primitiva, senão produção mercantil
Há capitalismo, formalmente, porque o capital comercial in- complementar para rebaixar os custos de reprodução da força
vadiu a órbita da produção, estabelecendo a empresa colonist. de trabalho e para baratear o custo dos elementos compo-
Indo muito além do simples domínio direto da produção, o nentes do capital constante.
capital subordina o trabalho e esta subordinação é formal, Há contradição entre capitalismo industrial e formas de
porque seu domínio exige formas de trabalho compulsório. trabalho compulsório porque se exige, na periferia, genera-
Fica claro, enfim, que o decisivo são as articulações entre lização das relações mercantis, quer dizer, mercantilização
capitalismo e colonização, o caráter de instrumento de acumu- das forças de trabalho. Só o trabalho assalariado poderia
lação primitiva da economia colonial. significar mercados os mais amplos possíveis e, simultanea-
Porém, se existe unidade entre desenvolvimento do mente, produção mercantil complementar em massa.
Há contradição entre capitalismo industrial e monopólio
sentara um estímulo fundamental ao capitalismo no « seríodo do mercado colonial porque só a sua remoção permitiria que
manufatureiro”, o movimento leva à Revolução Industrial, os mercados coloniais (depois periféricos) pudessem ser apro-
ao nascimento do modo especificamente capitalista de pro- priados diretamente, eliminando-se o lucro comercial mono-
dução. A acumulação, doravante, poderá “andar sobre seus polista. Quer dizer, o que se almeja é subordinar o capital
próprios pés”, deixará de necessitar de apoios externos com comercial, transformá-lo apenas numa face do capital
o surgimento de forças produtivas capitalistas, industrial.
Este movimento, a passagem ao “capitalismo industrial”, Há, ainda, contradição entre capital industrial e exclu-
propõe e estimula a liquidação da economia colonial. O que sivo metropolitano porque só a sua liquidação era a garantia
era solidariedade se transforma em oposição, o que era esti- de que se produzisse livre de restrições e de preços fixados
múlo se converte em grilhão. Economia Colonial e Capita- monopolisticamente.
lismo passam a guardar, de agora em diante, relações Em suma: o capitalismo industrial “propõe” a formação
contraditórias. de uma periferia produtora, em massa, de produtos primá-
Hã contradição entre capitalismo industrial e produção ros de exporiação. organizando-se a produção em bases
colonial não porque a produção da periferia, em constituição, capitalistas, quer dizer, mediante trabalho assalariado. É desta
deva deixar de ser mercantil e complementar. Ao contrário, periferia que deveriam fazer parte as economias latino-
o que se requer é produção de produtos primários de expor- americanas, conjuntamente as demais economias pré-capi-
tação. Porém, não se trata mais de produção colonial, pois o talistas.
“sentido” da produção mercantil complementar é bem outro. Uma questão vem, imediatamente, ao espírito: que
Não mais produtos agrícolas coloniais e metais preciosos, e, poder dispunha o capitalismo para moldar esta periferia? É
sim, alimentos e matérias-primas produzidos em massa (pelo preciso, no entanto, abandonar esta abstração, o capitalismo
em geral, e reperguntar: qual o “poder de difusão” do capi-
20) Sobre este ponto, veja-se o justamente clássico trabalho de E
talismo na etapa competitiva, em que o capital industrial
WILLIAMS e F. A. NOVAIS. inglês, por ter-se afirmado antes, foi amplamente hegemô-
46 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO
47
r
nico no mercado mundial? Tentemos respondê-la de moda eflexa”, e o industrialismo
”
“
: 3015 E
livre-cambista pode, no máximo
axtremamente esquemático, para não ultrapassar os limites ,
,
deste trabalho.
A Revolução Industrial, com sua fome de mercados,
promoveu a crise das “economias pré-capitalistas milenares” Se o Primeiro momento
do cap
italismo competitivo sign
relativamente complexas com as quais entrou em contacto: ficar;
a crise, logo após se criara i-
m condições para a reor
zação das economias pré a i
“O tear à mão e o torno de fiar, origens de um -capitalistas: de um lado
com as Corn Laws, , em 1546,
exército incontável de tecelães e fiadores, eram os estavam batidos os int
eresses protecio-
pivots centrais da estrutura social da Índia... O nistas agrários de outro, o deslocamento
do foco da acumu-
invasor britânico acabou com o tear à mão e des- lação da indústria têxtil para a indústria de b
produção, que d
troçou o torno de fiar. A Inglaterra começou por se dá definiti
Mania, em tailway
desalojar os tecidos de algodão dos mercados euro- 1845/7, estimula, em seguida
peus... e terminou por invadir a pátria do algodão
com tecidos de algodão... (A) decadência das cida-
des da Índia, que haviam se tornado célebres por
seus tecidos, não pode ser considerada a pior con-
sequência da dominação inglesa. O vapor e a ciência inglês plasma a economia
da Índia de acordo com seus
resses, Promovendo O sur inte-
britânicas destruíram, em todo indostão, a união gimento da economia exp
algodoeira fundada no tra ortador:
entre a agricultura e a indústria artesanal”. Cb balho assalariado:
Até agor :
Na América Latina, o capitalismo industrial traz consigo a, as classes governantes da Grã-Bretanha
o início da crise das economias coloniais: não se destrói seu SO se interessaram pelo Progresso da Índia de um
modo acidental, transitório
fundamento último, o trabalho compulsório, mas, tão-somente, e a título de exceção
A aristocracia queria conquistá-la,
se estimula decisivamente a ruptura do Pacto Colonial e a rocracia a dinhei
saqueá-la, e a industrio
constituição dos Estados Nacionais. Não se liquida o trabalho cracia queria submetê-l
a com
o baixo preço de suas
compulsório, em primeiro lugar, porque a ele em nada afe- mercadorias. Mas, agora,
a
situação mudou. A industrio
tava a entrada dos produtos industriais ingleses e, em segundo cracia descobriu que seus
interesses vitais reclamam
lugar, porque a transformação do trabalho compulsório em a transformação da Índia
num País produtor, o que
trabalho livre era, agora, uma decisão nacional. Em outras exige, antes de tudo pro-
Porcionar-lhe obras de irr
palavras: a queda de um dos elementos da economia colonial, igação e vias de comuni-
cação interna... Eu sei que
o binômio monopólio de comércio/dominação política metro- a industriocracia inglesa
politana, abrira inteiramente os mercados latino-aniericanos 22 Sobre a mudança do padr
se, entre quiros: Davia S. ãoLAN
de acumula ã
cepas eme
j
ao capital industrial inglês; porém, com o consegiente nascer
—
DES — The Unbotaa Erva
gica ange and Indu strial Development
do Estado Nacional, a História latino-americana deixa de ser Europe from 1750 to the Prese i
q nt, ; Cambriridge, 1969,
E p . 41 e
J. à SO TUMPETER, Business .
Cycles, a Theoretical Historical
age
Qi) Cf. K. MARX, “La dominación Británica en la India”, em K. Ga 1964 opualysis of Capitalist Process,
+ 1964, p. 201 e segs. ed. abridged, N
(ed. Penguin, 1969), pp. 109 E. qose
HOBSBA
MARX e F. ENGELS, Sobre el Colonialismo, Cuadernos de Pasado
y Presente 37, Córdoba, Siglo XXI, 1973, p. 27. pire
muintaço "mu uStry and ns]
TE
b E ; TRAL
“DE
Er
O CAPITALISMO TARDIO 49
48 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
de
Bem outra é a situação entre 1880 e 1900, momento
trata de cobrir a Índia com estradas de ferro com caracterização
emergência do capitalismo monopolista. Numa
o exelusivo objetivo de extrair, a um custo mais os traços mais gerais
para mais de sumária, explici temos
reduzido, o algodão e outras matérias-primas neces- tração intensi fica-se
deste movimento: 1) o processo de concen
sárias às suas fábricas”.0% tempo, numa ace-
extraordinariamente, centrado, ao mesmo
Na América Latina a situação é distinta: o capitalismo
leração do ritmo de incorporação do progresso técnico e numa
industrial inglês nem tem o mesmo poder, nem maior inte- da ciência
nova tecnologia, antes baseada na aplicação direta
resse na reorganização das economias nacionais; não tem o científica, que no engenho mecânico e, por
e da investigação
mesmo poder porque estava diante de Estados Nacionais, chamada por Veblen de Tecnologia da Física
isto mesmo,
por mais fracos que fossem, e não de suas colônias; não ção Industrial”,
e da Química”; 2) durante a “Segunda Revolu
tem maior interesse porque não surgem por aqui oportu- endo a monopolização
o processo de concentração vai promov
nidades de inversão de capitais suficientemente atrativas, isto cada vez
dos principais mercados industriais por empresas
é, capazes de concorrer tanto com as Colônias inglesas, bancário
maiores: 3) este processo é comandado pelo capital
quanto, e principalmente, com os países que atravessam: mescla do ao grande capital
(que se vai monopolizando),
vigorosos processos de industrialização (Estados Unidos, 4) com O sur-
industrial, conformando-se o capital financeiro:
etc)“ Em outras palavras, o fraco “poder de difusão” do (Estados Unidos,
gimento de outras potências industriais
capitalismo exercido sobre as nações latino-americanas há de se O monopó lio industr ial inglês e
Alemanha, Japão). quebra-
ser explicado, em última análise, não peia ausência ou frou- existiu nO
se dissolve a “complementariedade restrita” que
xidão da demanda externa, mas pelas dificuldades internas terceiro quartel do século; 5) as exportações de capitais
se
diversos
de organização de economias exportadoras vigorosas. Orde intensificam, bem como a concorrência entre os
isto se deu, como no Brasil, foi possível, em certo sentido, de inversã o se trava sem
capitalismos financeiros por áreas
criar a própria demanda, e as importações de capitais desem- as princip ais
quartel; 6) surge o colonialismo monopolista, e
º) Em
penharam um papel crucial na passagem da economia potências capitalistas terminam por repartir o mundo.
colonial à economia exportadora capitalista, ainda que não princípios do século, a passagem ao capitalismo monopolista
tão “visível” ao observador. se completara, uma vez que O monopólio já desempenhava
É de e reconhecer, no entanto. que q “poder de difusão” um papel decisivo na vida econômica. adentrando no seu
6
doe capitalismo na etapa competitiva, isto é, da Revolução período inicial, que se encerra, digamos, entre 1930 e 1945
industrial ao início de “Grande Depressão”, se manteve da exportação de capitais exprim e a
A dominância
relativamente restrito, devido, em última instância. às suas
transferência dos princípios monopolistas à concorrência pela
próprias limitações, porque só na Inglaterra havia atingido lmente,
captura de mercados em disputa, que eram, especia
um estágio relativamente avançado.
(25) Sobre as transformações ocorridas entre 1873 e 1896, o período
Q3 Cf, K. MARX, “Futuros resultados de ia dominación Británica en O excelente cap. 5.º do
Depressão”, ver especialmente,
em
tados do exterior, pode desenvolver toda a sua nomia capitalista exportadora no Brasil, e, ainda, procurando
função de transplante e de desenvolvimento do recuperar as linhas gerais do movimento.
capital, entendido como relação social”.€%
a constituição
Na América Latina, entre, grosso modo, 1880 e 1900, 1. O início da crise da economia colonial e
tanto a extraordinária ativação mercantil-escravista cafeeira nacional
da exportação de capitais da economia
(quer se tenham dirigido à constituição das empresas compo- e a subseqtente
A queda do “exclusivo metropolitano”
nentes do núcleo produtivo do complexo exportador, quer
am, indiscutivelmente, o
à montagem da infra-estrutura indispensável, direta ou indi- formação do Estado Nacional marc
ial no Brasil.
retamente,
início da crise da economia colon
à sua operação), quanto, em alguns casos, a de forma alguma
imigração em massa, foram cruciais ao nascimento
Os rumos da crise, porém, não estavam
das eco- ter regredido à eco
nomias exportadoras capitalistas.C” Não se pode, porém, pré-fixados. Poderíamos, perfeitamente,
mais se tendo em
pensar nem em “importação”, nem em “transplante do capi- nomia escravista de subsistência, tanto
de oferta, da “economia
talismo”, uma vez que aquele movimento não se reduz ao conta o esgotamento, por insuficiência
outros produtos
movimento das economias industriais: ao contrário, há que mineira” e a falta de perspectivas de vários
partir da dinâmica das economias nacionais latino-americanas de exportação.
Não foi o que sucedeu, e é necessário compreender de
e, então, demonstrar de que modo as exportações de capitais
vista cafeeira
e a imigração se “engancham” nela e a transformam “de que maneira nasceu a economia mercantil-escra
marca, ao
dentro”. nacional. Vale dizer. como o espocar da crise
da eco-
Concluindo, há que assumir a passagem da economia mesmo tempo, 2 revitalização do caráter mercantil
, dentr o, no entan to,
colonial à economia exportadora capitalista em toda sua com- nomia e o revigoramento da escravidão
de uma economia controlada nacionalme nte.
plexidade, tomando o movimento como determinado, em pri- dos quadros
meira instância, por “fatores internos” e, em última instância, Examinemos a questão.
por “fatores externos”. Porém, a menos que nos contentemos O processo de produção em qualquer economia mercantil-
”
com petições de princípio, é preciso não somente explicitá-los, escravista principia-se com a existência de um “quantum
ca ra
rar
mas, também, demonstrar de que modo «se articularam, em que se metamorfoscia, em seguida, em
de capitai-dinheiro.
cada momento do processo. E o que tentaremos fazer ao estu- terras, meios de produção e escravos, os quais, combinados
darmos a transição tal como se efetivou nc Brasil. de um certo modo, se transformam em mercadorias. As mer-
RA cadorias, ao serem realizadas, assumem novamente a forma
IH A Passagem da Economia Colonial à Economia de capital-dinheiro, agora acrescido de um plus, o lucro.
Exportadora Capitalista no Brasil Indagar, portanto, a gênese da economia mercantil-
No âmbito imposto ao presente trabalho, limitar-nos- escravista cafeeira há de significar:
emos à análise da passagem da economia colonial à eco- 1) investigar as origens do capital-dinheiro que a ela
se dirigiu;
(28) Cf. P. SANTI, “El debate sobre el imperialismo em los clasicos
del Marxismo”, em R. BANFI et alii, op. cit., pp. 40/41. e a mobilização dos recursos
2) examinar a existência
(29) Para a exportação de capitais britânicos entre 1880 e 1900, cf.
RIPPY, op. cit. e STONE, op. cit. produtivos;
54 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
O CAPITALISMO TARDIO 55
em última análise, eo
oferta brasileira que permite,
Não nos esqueçamos, finalmente, de que persistiria outro da
tempo, es o
te e, ao mesmo
“problema de financiamento”. O café, planta perene que tem demanda se amplie constantemen
de certas condições, o crescimen
um longo período de maturação, exige considerável emprego mule novamente, dentro
de mão-de-obra tanto para o plantio, quanto para os cuidados da oferta.
neste momento, por que a Na
rotineiros, que se alongam por quase todo o ano. Seria indis- Podemos compreender,
latifúndio escravista. Como a
pensável, portanto, cobrir ao menos em parte certas despesas presa cafeeira surge como
porque existisse uma o
antes que o cafezal entrasse em produção (por exemplo: parte fúndio, não somente
titu ição . ur os
à sua cons
da subsistência do escravo que ele mesmo não produzisse, repartição de terras prévia a sos
lmente porque, da os
salários para os empregados em trabalho de vigilância etc.). latifúndio também e principa ce
definindo a produção
Fixemo-nos, agora, no nascimento e “sentido” da de- dos recursos produtivos e se
a, as margens de lucro sem
manda externa por café. Nas três primeiras décadas do século mais como produção em mass uso
uma escala mínima de pro
XIX, o café deixou de ser produto colonial, uma vez que reduzidas, o que impunha n e
determinava estimo
seu consumo se generalizou, Para que isto pudesse ocorrer, lucrativa e, reversivamente, De
barreira à entrada.
os preços internacionais baixaram, em grande parte devido tosos, que funcionavam como es i e
nte porque escr avos
ac crescimento da oferta brasileira. Foi o que observou, com fúndio escravista, não some
io escravista também OA
pertinência, Roberto Simonsen: disponíveis. Surge como latifúnd o
em vista, novamente, lh
cipalmente porque, tendo
“O consumo europeu,no final desse século (XIX) stimento exigido, o ç ao
da demanda externa é O inve s av
não atingira, ainda, 1 milhão de sacas. O valor de rou-se mais rentável.
escravo, superexplorado, most
seu comércio não era, pois, dos mais elevados. Mas alho assalariado, não porque
excluído, mais uma vez, O trab
a sua adoção definitiva pelos núcleos de civilização O capital demonsirasãe
da Europa ia incrementar seu maior emprego na era
nestas plagas e naqueles tempos
Assim o foi porque a taxa le
qualquer vocação escravista.
industrial do século XIX, quando a humanidade níveis elevados, pois haveria
salários dever-se-la fixar em
necessitava desenvolver grande atividade física e acs olhos dos produtores diretos a alternativa
de compensar
intelectual, O café, nesse tempo. passou a ser usado tência ,
ia, como Pp osseiros 3 ou
com A
I
de produzirem sua própr subsisstênc
propria subsi
por operários e quem facilitou seu uso, proporcio- o custo de reprodução do
pequenos proprietários. E gor isto,
nando grande produção e relativa redução de preços, r livre.
toi o Brasil, que, a partir de 1830, tornar-se-ia, inin- escravo era menor que o do trabalhado
1830,
terruptamente, a maior região produtora de café do Produzindo “muito” e “barato”, o Brasil, já em
Java, torna ndo-
mundo”. 5 pudera bater a concorrência do Ceilão e de
mundi al, e o café se alçar a a primeiro
se o primeiro produtor
A demanda externa, por conseguinte, não foi mero fator e sul- amer ican a. 69 Neste
produto de exportação brasileira
independente e inerte, sobre o qual a economia brasileira a economia mercantil-escravista cafeeira
mesmo momento,
não teve a menor ação. Ao contrário, é a própria expansão
assumira seus traços definitivos: grande empresa produzindo
apoiada no trabalho escravo, articulada a
em larga escala,
G5) Cf. R. SIMONSEN, “Aspectos da história econômica do café”,
em Evolução Industrial do Brasil e outros Estudos, São Pavio,
(6) Cf. R. SIMONSEN, op. cit., Joc. cit. e cisranose em
Editora Nacional, 1973, p. 171.
Br “AL
O CAPITALISMO TARDIO 59
58 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
domésticos, urbanos, etc.), mas estas reservas deveriam se mente; 2) a produção interna equivaleri
a à redução substan-
esgotar mais dia, menos dia. | cial da taxa de exploração; 3) deprimir-s
e-iam, tudo o mais
constante, tanto a taxa de lucro das unida
Esta situação-limite, isto é, a concentração na economia des em operação,
quanto as perspectivas de negócio;
cafeeira de todo o “plantel” existente, não seria jamais atin- 4) que a economia
cafeeira fosse capaz ou não de absor
gida. Suponhamos que restassem para serem transferidos ver este aumento de
preços, dependeria da queda necessária da
apenas os escravos dedicados à produção de outros produtos taxa de exploração
e da taxa de lucro prévia a ele; 5) ainda
de exportação, e serviços a ela acoplados. Não se conse- que isto fosse
inviável, a acumulação Prosseguiria até
guindo atraí-los ao lhes oferecer “um tratamento mais absorver a totali-
dade da escravatia existente; 6) esta
humano”, tornava-se necessário que O proprietário deste situação-limite se
alcançaria apenas se a economia cafeeira
ativo particular fosse obrigado ou estivesse disposto a rea- conseguisse supor-
tar a elevação brutal e inevitável dos
lizá-lo. Não existia, entretanto, nenhum mecanismo, mesmo preços; 7) se não, 0
teto seria atingido muito antes, porque os preço
na crise, que compelisse as demais “células exportadoras s subiriam
até certo ponto e a partir daí “explodiriam”,
a se desfazerem dos cativos. Neste sentido, pode-se dizer, no momento
em que já se tivesse absorvido o “excedente”
portanto, que a decisão dependia, estritamente, da vontade “depositado”
nas outras células exportadoras.
dos proprietários.
É hora de Passar ao exame da segunda
Qual o significado da venda, por uma “célula expor- condição a que
está sujeita a dinâmica da economia
tadora”, da totalidade dos escravos que utilizasse? Os empre- mercantil-escravista
cafeeira, ou seja, a disponibilidade de terras
sários renunciariam tanto aos lucros esperados, quanto aos em que a pro-
dução pudesse ser lucrativa. Não se trata, no entanto, de
serviços prestados pelos escravos existentes e seus acréscimos.
limite geográfico. Ao contrário, esta
E o que é mais importante: o valor dos demais ativos (terra, restrição advém do ca-
ráter extensivo da acumulação, própr
meios de produção) seria praticamente destruído, uma vez io ao crescimento de
qualquer economia mercantil-escravista
impossível organizar a produção de outro modo. . A acumulação so-
mente poderia ir adiante se contas
se, constantemente, com
Dada a demanda de escravos exercida pela economia novas terras próprias ao café, supondo uma técnica “exten-
cafeeira, os preços tenderiam a subir mais e mais, na medida siva” e invariável, bem como constante a fertilidade natural
em que, a pouco e pouco, fosse sendo absorvido o excesso, do solo.
relativamente ao comportamento esperado da demanda ex- Este limite, no entanto, não seria atingido. Compreen-
terna e ao quantum desejado de serviços. Chegaria, inapela- damos a questão. Ocupar, sempre,
novas terras próprias ao
velmente, um momento em que, transposto o limite, os preços café exigiria, a partir de certo ponto
, interiorização, o que
“explodiriam”. Depois, paulatina e inevitavelmente, a em- provocaria, dentro dos limites da
economia mercantil-escra-
presa cafeeira iria se atrofiando na medida em que contasse, vista, elevação persistente dos custo
s de transportes. Enten-
cada vez mais, com um menor número de escravos. damo-nos bem. Quando digo dentro dos
quadros da economia
mercantil-escravista, quero me referir
É interessante, agora, sintetizar a argumentação: 1) para ao fato de que a um
que se acumulasse ou, ao menos, mantivesse a produção no setor produtor mercantil e escravista
deve corresponder um
setor de transportes também mercantil
mesmo nível, após a interrupção do tráfico internacional, era e escravista, Quer
absolutamente imprescindível “produzir” escravos interna- dizer, um setor independente, apoiado no
trabalho escravo e
O CAPITALISMO TARDIO
JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
64
replantar café nas
atingido se fosse possível
na força animal, desde que a presença do escravo, ainda aqui, seria novamente pe atingisse
adotada. terras da “zona velha” e se a produtividade por
impunha limites estreitos à tecnologia à esta altura,
a zona madura”, que,
contínua dos custos de trans- o mesmo que na “primitiv o, entre um
Deste modo, a elevação produção oscilaria, entã
já teria envelhecido. À
portes promoveria, coeteris paribus, a queda também con- erminado “chão”.
nível “prévio” e um det
tínua da taxa de lucro, até o ponto em que travaria a acumu- ração
se promova uma recupe
lação. A maior fertilidade natural do solo das novas terras, Esta hipótese admite que nto, enta
plena das terras, no
total do solo. À recomposição
o “Oeste Paulista”, poderia compensar o crescimento dos os limites fossem móveis,
momento, pois que dificil- dificilmente ocorreria. Enquanto
custos de transportes até certo predatórias de
cafeeiros adotariam técnicas
mente se imaginaria um aumento ad infinitum. Logo, este os empresários fertili-
despesas desnecessárias (adubos,
fator teria uma ação apenas temporá ria. De outro lado, a cultivo, evitando
e surgiria uma Vez à fron-
suposição de técnica constante, inclusive a de transportes, zantes, etc.). O problema soment
co restaria a fazer.“ A
pode soar um tanto irrealista (por exemplo, substitui-se a teira agrícola inexistente, e aí pou
a uma lenta e inexorável re-
mula pelo carro de boi trafegando em estradas). Basta, economia cafeeira tenderia
porém, a existência de um limite intransponível, dentro dos gressão,
se das condições de
quadros de uma economia mercantil-escravista, para não Isto posto, detenhamo-nos na amáli
mercados externos. E
invalidar o raciocínio. realização da produção cafeeira nos
Suponhamos que a acumulação se estanque, bloqueada preciso distinguir, muito claramente, dois períodos, o de ge-
o de post-generalização.
pelos custos de transportes. Que sucederia? Para compre- neralização de consumo mundial e
dos preços para
ender a questão é indispensável ter em conta que o caráter No primeiro, seria inevitável uma queda
ampla s camadas da
permanente da cultura cafeeira e o ciclo produtivo que lhe que o café se integrasse ao consumo de
endo seu caráter de
é próprio, provocam a formação de três estratos na lavoura: população dos países importadores, perd
colonial. No segundo, não se delinearia qualquer
“uma faixa ou zona pioneira, onde o café está pene- produto
de preços, mas Se estabeleceria tão so0-
trando; uma região em que ele já se encontra conso- tendência definida
do qual o café seria ex-
lidado e plenamente produtivo; uma região deca- mente um limite superior, acima
dente. onde a cultura se encontra em regressão”. Cb cluído do “consume popular”
três fato-
Existe em cada momentc. portanic, uma capacidade O limite superior de preços seria imposto por
a concorrência de
produtiva instalada nas zonas “velha” e “madura” e uma res. Em primei iugar, o café sofreria
por exemplo) e
capacidade produtiva em construção na “zona nova”. Ora, outros substitutos quase perfeitos (o chá,
desloc aria para eles.
interrompida a acumulação, teríamos, apenas, uma “zona ultrapassado o limite, a demanda se
a ou potencial-
madura”. A produção decresceria, inevitavelmente, à medida Ademais, o café brasileiro concorreria efetiv
o preço-
em que os cafeeiros da “zona velha” produzissem cada vez mente com outros países produtores e, transposto
ada do merca do. Final-
menos, até seu abandono. O nível de produção “original” teto, a oferta brasileira seria desloc
mente, ao atingir certo preço o café seria excluído da “cesta do lado da oferta, verbi gratia do período de maturação do
de consumo popular”, uma vez “produto de sobremesa”4) cafeeiro. “9
Tomado em conta este limite superior, não haveria qual- Conclui-se, portanto, que os preços internacionais não
quer tendência secular, mas tão somente movimentos oscila- suportariam o peso de fator compensatório à elevação de
tórios de preços, decorrentes de três origens: 1) do caráter custos provocada tanto pelo crescimento das despesas de
permanente da cultura cafeeira, associado a seu período de transportes, quanto pela subida de preços de escravos: no
maturação de quatro a cinco anos; 2) das condições da de- períodc de generalização do consumo, porque há uma ten-
manda externa, que são relativamente autônomas, porque dência à baixa de preços e se requer, ao contrário, baixo
atreladas às pulsações das economias importadoras; e 3) da custo do escravo e reduzidos custos de transportes, para que
intervenção de fatores naturais. a produção se expanda e compense a diminuição da margem
de lucro pelo acréscimo da massa de lucro; no período de
As oscilações de preços tendem a assumir caráter cíclico.
Post-generalização porque não se verificaria qualquer ten-
A expansão começa com a subida dos preços internacionais,
dência à alta de preços do café.
impulsionados pela expansão das economias importadoras,
que promove o revigoramento da demanda externa, ou por A tendência à queda da taxa de lucros da economia mer-
contração da oferta, causada por fenômenos naturais (geadas, cantil-escravista cafeeira não poderia, portanto, ser contra-
secas, etc.). Em seguida, os preços internos se elevam, na balançada pelo crescimento dos preços. Este fato não é senão
mesma proporção ou não, de acordo com a evolução da taxa a tradução da primazia da acumulação sobre a realização. E
de câmbio. Cresce a taxa de lucro das empresas em operação a acumulação, como vimos, encontrava diversas barreiras:
pró-tanto e a taxa de acumulação aumenta ou não, depen- 1) em última instância, esbarrava na disponibilidade de
dendo das perspectivas do negócio. Supondo lucrativas novas terras em que a produção pudesse ser lucrativa; 2) em pri-
inversões, as ordens de investimento seriam dadas e se ini- meira instância, estava bloqueada pelo aumento dos custos
ciaria a construção da nova capacidade produtiva. Com sua de transportes, desde que nada seria capaz de detê-lo dentro
entrada em operação, os preços internacionais caíriam em tal dos quadros de uma economia mercantil-escravista; 3) o pro-
ou qual intensidade, conforme a conjuntura das economias blema da reprodução da força de trabalho escrava poderia,
importadoras, bem como os preços internos, segundo o mo- em tese, ser contornado, dependendo das condições que apon-
vimento da taxa cambial, A taxa de lucro se deprimiria e se tamos.
estancaria a acumulação. Fica claro, agera, por que o ciclo Esta é a oportunidade para enfrentarmos um problema
cafeeiro não resulta, apenas, dos movimentos cíclicos das que vimos ignorando, o do financiamento da acumulação, que
economias importadoras, mas, também, de fatores atuantes envolve, do mesmo modo, a questão de seu controle. Recorro,
uma vez mais, a Maria Sylvia Carvalho Franco:
(43) O limite superior, a cada momento, seria retido pela elastici-
dade-preço e pela elasticidade-substituição. A entrada de novos “Ele (o comissário) não se limitava a financiar o em-
competidores principiaria, ademais, quando se tivesse ultrapas- preendimento agrícola, mas, também, geria os inves-
sado o preço de exclusão. É natural que está subjacente ao limite
superior a baixa elasticidade-renda do café e, ao mesmo tempo, timentos feitos, não obstante se eximisse da adminis-
seu caráter de “produto de sobremesa”. tração do processo de trabalho... Vê-se, assim, que
(44) Cf. A. DELFIM NETTO, O Problema do Café no Brasil, 2.º ira- o comissário, embora de modo explícito manipulasse
pressão, S. Paulo, 1966, pp. 3 e segs. (Boletim nº 5 da FCEA.
da USP). o seu capital no circuito do comércio e das-Linanças,
E
E.
IA -
eme. de
PT Pro!
i o set
O CAPITALISMO TARDIO 69
68 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
de fato o empregou de maneira muito direta no pro- é, apenas, uma das faces da moeda. Também o
Esta
cesso de produção... Assim, parece-me correto dizer mercantil estava preso num círculo de ferro: apro-
capital
compulsório
que o comissário, ao controlar os investimentos em priando-se da quase totalidade dos lucros, era
cafeeira (não havend o nenhuma
dinheiro e a venda das mercadorias, dominando os fazê-los retornar à empresa
pontos extremos do movimento do capital no pro- outra oportunidade de inversão), única maneira de proceder
cesso de produção, canalizava para si a valorização aí N
à sua valorização.
pro-
realizada e se dirimia dos riscos correspondentes, Com isto se esclarece, também, de que maneira se
ão cafeeir a, desde que co-
corridos pelo sujeito que detinha a propriedade fun- cedia ao financiamento da expans
riava m dos lucros,
diária... Correlatamente à sua (do fazendeiro) de- missários e bancos, uma vez que se aprop
para
pendência para com o comissário, houve a quase im- se encarregavam de sua concentração e canalização
possibilidade de se desenvolver a capitalização do novos investimentos.
setor agrícola”
“*) Desaparecera o monopólio do comércio colonial, que
or a
Não há qualquer margem de dúvida. O capital mercantil conseguia reduzir os lucros retidos pelo setor produt
compra dos produt os colo-
continua a dominar a agora economia nacional, através da quase nada, fixando os preços de
olitan os. Sur-
ação do comissário. que alcança seu auge em 1850, depois niais e os preços de venda dos produtos metrop
lio
compartilhada pelos grandes “bancos cafeeiros” que come- gira em seu lugar o oligopsônio comercial e o oligopó
o
cam a se formar desde então. financeiro. que, manipulando os preços de compra € fixand
exorbitantes taxas de juros, termi naram por conduz ir ao
Esta dependência, que é constitutiva à economia ca-
mesmo resultado, à dominação do capital mercantil.
feeira, se repõe alimentada por dois fatores fundamentais.
De um lado, os investimentos para a formação do cafezal E possível, agora, tentar recuperar as linhas gerais do
eram vultosos e seu prazo de maturação bastante longo; de movimento da economia cafeeira entre 1810 e 1870.
outro, a estrutura de comercialização e financiamento, por O período de 1810 a 1850 marca, simultaneamente, 05
causa do maciço investimento inicial, revelava-se altamente momentos de constituição e consolidação, bem como de ge-
concentrada, ao contrário da estrutura da oferta de café. O neralização do consumo de café nos mercados centrais. Isto
iazendeiro estava preso aq que Stein chamou, quer dizer que foi possível expandir a produção, entre
sugestiva-
mente, de círculo de ferro, e, acrescento eu, à dominação 1821/1836 « 1841/1850. cerca de seis vezes, enfrentando e
do capital mercantil: ao mesmo tempo promovendo uma sensível baixa dos preços
internacionais (cerca de 40%), ainda que parte dela fosse
“Foi assim que o círculo vicioso que consistia em
absorvida por desvalorização da taxa de câmbio, “”
derrubar a mata virgem para plantar café, empe-
nhando as safras futuras para obter mais dinheiro e O êxito é explicável por várias razões. Contou-se, em
comprar mais escravos para desbastar matas e primeiro lugar, com abundante oferta de terras, as do Vale
plantar mais café, encerrou num círculo de ferro a
(47) Ver para produção, preços internacionais, taxa de câmbio e
economia de Vassouras”.49 preços internos até 1850, A. E. TAUNAY, História do Café no
Brasil, R. de Janeiro, Departamento Nacional do Café, 1939,
transcritos em H. O. Portoccarero de Castro, “Viabilidade eco-
(45) Cf. Maria Sylvia CARVALHO FRANCO, Op. cit. p. 171 nômica da Escravidão no Brasil; 1880-1888”, em Revista Brasi
(46) Cf. S. STEIN, Op. cit. p. 36. » Op. cit, pp. 171/173 e 176. leira de Economia, vol. 27, nº 1, 1973.
70 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
O CAPITALISMO TARDIO 71
do Paraíba, próximas a portos de embarque, o que significa
contrabalançou, ao menos de modo relativo,
custos de transportes “suportáveis”; de outro lado, a per- os efeitos per-
versos pelo lado dos custos, mantendo
sistência do tráfico internacional assegurou o suprimento de positivas as perspec-
tivas do negócio cafeeiro, A produção cresceu
escravos e os preços, ainda que subissem perto de cinco consideravel-
mente. 6D
vezes, foram contidos relativamente ao que teriam sido na
Quando o grosso da nova capacidade
ausência desta fonte de suprimento. G% produtiva começa
a entrar em operação, em 1863,
No entanto, é preciso ir mais além. Os custos foram os preços internacionais e
internos se deprimem consideravel
comprimidos em “níveis lucrativos” por dois outros motivos. mente, estancando a ex-
Pansão. Entretanto, em 1868, a produção
De início, devido ao cultivo predatório da terra, sobre o que mundial de café se
reduz, sob o efeito de fatores naturais.
não preciso me estender aqui; além disto, por causa da Isto e a elevação do
consumo mundial promoveram a subida
extraordinária taxa de exploração imposta ao escravo. “? dos preços interna-
cionais e internos até 1875.62 A pergunta
Fica claro, definitivamente, que as técnicas predatórias do pertinente é se
teria sido possível à economia mercanti
solo não resultaram pura e simplesmente da presença do l-escravista cafeeira
se expandir sem quaisquer modificações fund
escravo como trabalhador direto. Nem, muito menos, a amentais.
Penso que não. Emília Viotti da Costa, depoi
superexploração a que estava submetido decorria, digamos s de nos dar
uma vívida descrição das crescentes dific
assim, de uma propriedade da escravidão. Tanto um quanto uldades dos trans-
Portes, a partir já de 1855, e de seus altos
a ouíra provêm, antes de mais nada, da lógica do lucro. Pro- e crescentes custos
conclui de modo a não permitir nenhum
duzir em larga escala a baixos preços era a única maneira de equívoco:
“A lavoura de café via-se limitada
expandir a produção auferindo lucros e enfrentando com na sua expansão
pelos altos fretes que tornavam impossível
êxito a concorrência dos demais países produtores. o cultivo
além de uma certa distância dos portos”.
A subida de preços, a partir de 1857, foi providencial. 63
Poder-se-ia argumentar que o sistema
Sem ela, dificilmente a economia cafeeira teria podido se de transportes,
mesmo mantendo seu caráter escravista, quer
expandir. Não suportaria a elevação do preço do escravo, dizer, assen-
tado no binômio escravo-força animal, comporta
verificada apesar do vigoroso tráfico interprovincial e das ria transfor-
mações como a melhoria de estradas de rodagem conj
“reservas” de que dispunha, uma vez que as importações nos ugada
ao transporte em carroças. A mesma Emília Viotti adverte
anos que precederam imediatamente o encerramento do
para a grande dificuldade enfrentada: a falta de braços
tráfico ficaram bem acima das necessidades. Ademais, na para
a construção e conservação dos caminhos. 69 E, com isto,
medida em que se foram ocupando terras mais distantes do
tocamos no outro ponto.
litoral, os custos de transportes devem ter crescido aprecia-
Como se já não bastasse a elevação dos custos de trans-
velmente. 6» O aumento dos preços internacionais, portanto,
portes para travá-la, na medida em que fosse adentrando e
(48) Cf, para preços de escravos: 8. STEIN, Op. cit., p. 269; para a interior de São Paulo, a economia cafeeira esbarraria, inexo-
marcha do café: S. MILLIET, Roteiro do Café e Outros Ensaios,
edição definitiva, S. Paulo, BIPA, 7/75. ravelmente, na carência de trabalho escravo a preços lucra-
(49) Sobre o cultivo predatório, Cf., por exemplo, S. STEIN, Op. cit.;
sobre a elevada taxa de exploração, Emília VIOTTI DA COSTA, GD) Cf. A. DELFIM NETTO, Op. cit. pp. 10 e segs.
Op. cit. 62 Para a expansão do ciclo que se inicia em 1868, ver A. DELFIM
60 Para importações e preços de escravos, ver S. STEIN, Op. cit.; NETTO, Op. cit. pp. 16 e segs. ,
para custos de transportes, Emília VIOTTI DA COSTA, Op. cit.; 63) Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op. cit., p. 173.
para a marcha do café, S. MILLIET, Op. cit. 64) Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op. cit., pp. 161 e segs.
TARDIO 73
72 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO
do Estado. Foram dispensados, em 1846, às fábricas de assalariado é realizada após seu consumo no processo pro-
tecidos de algodão, vários incentivos, tais como isenção dutivo. Ademais, a rotação do capital variável é mais rápida
de tarifa para a importação de máquinas, isenção de im- que a do capital fixo representado pelo escravo, que se dis-
postos sobre transportes internos e externos, etc.; e, em tende por toda sua “vida útil”.
1847, confirmou-se a dispensa de direitos alfandegários sobre No entanto, é absurdo supor iguais as eficiências do
matérias-primas destinadas às fábricas nacionais. Estabeleceu- trabalho escravo e assalariado. Inicialmente, porque o tra-
se, em 1857, uma revisão tarifária, no sentido “um pouco mais balho escravo se ajusta ao processo produtivo às custas de
liberal”, mas se elevaram, novamente, os direitos alfandegá- coação, enquanto o trabalhador livre tende a se sentir retri-
rios em 1867, até que a Tarifa Rio Branco, em 1874, “enve- buído com o salário, Além disto, a escravidão bloqueava
“reda por um liberalismo moderado”. 6% tanto uma maior divisão técnica do trabalho, quanto a espe-
Não se pode dizer, portanto, que tenha havido falta de cialização do escravo, porque era próprio de sua condição
proteção depois de 1844. Nem é lícito considerar reduzido seu que se mantivesse res. A produtividade do trabalhador assa-
nível, pois lembro, com Furtado, que a primeira tarifa norte- lariado, mesmo admitindo idênticas técnicas, utilização da
americana era de 5% ad valorem para os tecidos de algodão, capacidade produtiva e preços, haveria de ser muito maior,
e a média, de 8,9%, alcançando-se 17,5% apenas em 1810, o que acresceria o diferencial de custos. Finalmente, o fosso
quando a indústria têxtil já estava consolidada. 6” aumentaria devido às despesas com o trabalho de vigilância.
Não se está autorizado, portanto, a atribuir o bloqueio Se passarmos a raciocinar (como convém) dinamicamente,
da industrialização à carência de proteção. O verdadeiro pro- veremos que as coisas ficarão muito piores para a indústria
blema começa aí: há que explicar por que o nível de proteção, escravista. O progresso técnico é próprio ao capitalismo, en-
que jamais foi baixo, revelou-se insuficiente. quanto está, praticamente, excluído da indústria escravista.
Volto, agora, ao problema que coloquei: surgiria a grande Não somente porque existem limites estreitos à técnica ado-
indústria escravista de modo a reativar a economia mercantil- tada, decorrentes da presença do escravo, mas, também, por-
escravista nacional? Não, e por várias razões. 69) que é inteiramente irracional ao empresário elevar o grau de
Não é difícil compreender que os custos da indústria mecanização, “sucateando” parte do “equipamento” repre-
escravista deveriam ser marcadamente superiores aos da in- sentado pelo mancípio antes que se esgote sua “vida útil”.
dústria capitalista, Admitamos igual técnica, idêntico grau de Conclua-se, pois, que o diferencial de custos subiria
utilização da capacidade produtiva, mesmo preço e eficiência constantemente, uma vez que o diferencial de produtividade
produtiva igual para o escravo e para o trabalhador assala- aumentaria da mesma forma. Não se pode imaginar, nem de
riado. Ainda assim, a taxa de lucro da indústria escravista longe, que uma possível diferença entre a taxa de salários e
seria muito inferior, por dois motivos. Primeiro, porque o o custo de manutenção do escravo compensasse todos os
pagamento da força de trabalho é inteiramente adiantado outros fatores que apontamos.
quando há escravos, enquanto a remuneração do trabalho As razões situadas na esfera da produção são as funda-
mentais. É claro que a incapacidade da indústria escravista
68) Cí. Nícia Villela LUZ, Op. cit., pp.
69 Cf. C. FURTADO, op. cit. p. 100.
24 e 37.
de criar e dispor de mercados iria pesando cada vez mais, na
(60) Apóio-me no que se segue em PF. H. CARDOSO, Capitalismo e medida em que a indústria capitalista dos países centrais
Escravidão no Brasil Meridional, S. Paulo, Difusão Européia do
Livro, 1962, pp. 168 e segs. avançasse no processo de concentração, aumentando seguida-
O CAPITALISMO TARDIO mM
76 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
imediatamente, ao
vem, espírito: não en-
mente a dimensão das unidades produtivas e gerando eco- Uma pergunta . as 9
a
gendraria a crise condi ções para O surgimento do capitalismo!
nomias de escala a cada passo mais significativas. Porém a
explicação, em última instância, recai na órbita da produção, Tentemos respondê-la.
ar, desde
pois o que contrasta é o caráter progressivo do capitalismo e Não é preciso repisar argumentos: há que rejeit
rrência pela
a natureza antiprogressiva da economia mercantil-escravisia. logo, a “explicação” da impossibilidade de conco
ão não está aí, e
pretensa falta de proteção. O cerne da quest
Não é preciso, portanto, apelar para fatores tais que clareza a razão
um homem de então, Borja Castro, viu com
preço do escravo, por exemplo, para compreender por que a industrialização
fundamental, responsável pelo bloqueio da
indústria escravista era incapaz de, a longo prazo, suportar capitalista:
a concorrência da indústria capitalista dos países centrais. A está obstada) pela falta de uma
“(A industrialização
menos, é claro, que se pudesse imaginar um extraordinário superabundante que, impelida pela ne-
população
e crescente grau de proteção. varios meios a
cessidade, procure desenvolver por
atividade industrial ou se subme ter ao regime monó-
Está claro, do mesmo modo, por que estava fora de
fábricas e cuja civilização a tenha
alcance da indústria escravista concorrer por força de trabalho tono das grandes
convencido de que a natureza nunca é assaz liberal
e capital-dinheiro com a agricultura escravista de exportação.
para fornecer espontaneamente tudo que exige sua
Na medida em que os processos de produção na agricultura
própria civilização. 6»
fossem simples, ou seja, extensivos, detinha-se poder de con-
Há homens, mas o mercado de trabalho está vazio, DOt-
corrência no mercado internacional. Nem foi por outra razão
ante, não podem
que se chegou a estabelecer uma situação de monopólio para que os homens, em quantidade superabund
falta de suficientes
o conjunto das economias mercantis-escravistas — situação ser submetidos pelo capital. Por que há
jados de
trabalhadores livres, quer dizer, de homens despo
passível de ser quebrada “de fora” com a penetração do a Carvalho
meios de produção e de subsistência? Maria Sylvi
progresso técnicc na agricultura dos países centrais, “contor- ement e:
Franco responde convincent
nando-se” gradativamente o diferencial entre a taxa de de grandes exten-
“Peta sijuacão — a propriedade
salários e os custos de manutenção do escravo (incluída a ultura
sões de terra ocupadas parcialmente pela agric
depreciação). ou e con-
mercantil realizada por escravos — possibilit
pro-
4 conclusão é inevitável: a crise da economia mercantil- solidou a existência de homens destituídos de
escravista nacional não seria obstada via constituição da priedade e meios de produ ção, mas não de sua posse,
ões
grande indústria escravista. Que algumas tenham surgido e que não foram plenamente submetidos às press
que o
demonstra, apenas, o alto grau de proteção de que gozaram econômicas decorrentes desta condição, dado
os grandes incentivos que receberam; que tenham desapa- peso da produção significativa para O sistema como
recido confirma inteiramente o que vimos dizendo. um todo não recaiu sobre seus ombros. Assim, numa
sociedade em que há concentração de meios de
A crise da economia mercantil-escravista nacional não produção, onde vagarosa mas progressivamente
]
t encontraria qualquer saída mantendo-se escravista e mer-
tt
cantil. Rondava-nos, novamente, o fantasma da regressão. (61) Cf. BORJA CASTRO, ap
DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 79
JOÃO MANUEL CARDOSO
78
Não havendo condições para a transformação da força de o capital financeiro inglês, tornado possível e estimulado
H
fer-
trabalho em mercadoria, pré-requisito indispensável, estaria pelo Estado, começa por explicar o extraordinário surto
|
; bloqueada a industrialização capitalista. O que não quer dizer, roviário da segunda metade dos 60. 69
te, os efeitos da
Emília Viotti sintetizou, admiravelmen
t
4 entendamo-nos bem, que apenas ela seria o suficiente. Te-
!
: de ferro sobre a economia mercantil-escravista
ríamos de enfrentar, em seguida (do ponto de vista lógico, é estrada
.
claro), o problema da capacidade para importar, dada a ine- cafeeira:
que com sua const rução uma ver-
xistência de uma indústria de bens de produção, ainda que “E fácil imaginar
se operava na economia cafeeira:
manufatureira, e muitos outros. Porém, é ocioso cogitar disto, dadeira revolução
desviados da lavoura porque apli-
neste passo. Portanto também não se poderia esperar que a bracos até então
agora, voltar-se
economia cafeeira, naquela altura, passasse a se apoiar no cados aos transporte que podiam,
ez nas comunicações,
trabalho assalarido, ainda que o capital mercantil, que para as culturas; maior rapid
s fretes ; melhor
comandava a acumulação, não fosse perseguido por qualquer maior capacidade de transporte, baixo
sentava superior
preconceito escravista... conservação do produto, que apre
altos no mercado
qualidade e obtinha preços mais
Nem industrialização capitalista, nem economia cafeeira possi bilid ades de maiores
internacional; portanto,
organizada com trabalho assalariado. A regressão, a longo & traba lho assala-
lucros, novas perspectivas para
prazo, deixaria de ser um mero fantasma. (6)
riado”.
Porém não regredimos, avançamos. Comecemos a en- a máquina foi introduzida no beneficiamento
Ademais,
tander por quê, Paulista”, enquanto e
café, nos anos 70, no “Oeste
do
ulhado nos processos rot
Tudo se iniciou com a introdução da estrada de ferro, Vale do Paraíba continuou merg o
uldades financeiras.
comandada pelo capital mercantil nacional e apoiada, deci- neiros, enredado em graves dific
do beneficiamento teve dois
sivamente, pelo capital financeiro inglés, única forma de surgimento da grande indústria
escravo é melhorou, sensi-
rebaixamento dos custos de transportes: efeitos básicos: poupou trabalho
do produto, permitindo alcançar
“Mas a importância das ferrovias inglesas velmente, a qualidade
nos Estados (69)
cafeeiros é marcante, mesmo que forças mais pode- melhores preços internacionais.
derr que = a» estra estrada de Ler
ferro, manto
rosas diticil enten
Não é » difíci tende
fossem responsáveis inicialmente pela sua iciam ento te»
especialmente, «- aà grande indústria ria dodo benefvenenicia
fundação. As principais ferrovias que serviam as lhe
vista no poupar traba
áreas caíeeiras eram de propriedade ou forcam a economia mercantil-escra
financiadas porte s € melhorar a quah-
pelos britânicos”. (6) escravo, reduzir os custos de trans
E ver
ao] remo ; OsE ob stáculos
dade do café.ç Reforçam, em suma, 3
É indiscutível, também, que o Estado brasileiro, ao incrementando tanto a
que entravam seu desenvolvimento,
conceder garantia de juros aos investimentos externos em
ferrovias
ferrovias, assegurando ao capital estrangeiro rentabilidade 66 “R. GRAHAM, Op. cit, p. 60. Sobre a implantação das
o Estado
com a economia, cafeeira e com
vinculações
certa a longo prazo, desempenhou um papel essencial. Em “o Sm ua
de Matos, Ca ee
ct. o recente trabalho de Odilon Nogueira pp. 48 e segs.
suma, o entrelaçamento do capital mercantil nacional com S. Paulo, Ed. Alfaô mega, 1974,
rovias, 2º ed.,
pp. 173/1748.
(6D Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op. cit.,
cit. pp.177/178.
(65) CF. R GRAHAM, Grã-Bretanha e o (68) Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op.
Início da Modernização cit., loc. cit.
Bras.:. tradução portuguesa,
do (69) Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op.
S. Paulo, Brasiliense,
ee—-—e
1973, p. 77.
er
CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 83
82 JOÃO MANUEL
A estrada de ferro e a maquinização do beneficiamento 2) Célio DEBES descreve as extremas dificuldades para obtenção
cafe- de mão-de-obra para a construção da Cia. Paulista de Estradas
não somente reforçam a economia mercantil-escravista de Ferro, Cf. A caminho do Oeste (subsídio para a história da
eira nacional. Aco mesmo tempe, se opõem a ela, criando Companhia Paulista de Estradas de Ferro), S. Paulo, 1968, pp.
37 e segs.
condições para a emergência do trabalho assalariado. (3) Cf. E. GENOVESE, Economia Política de ia Esclavitud, passim.
(74) Sobre os pioneiros e sua ação econômica, Cf. P. MONBEIG,
(9) Cf, A. DELFIM NETTO, Op. cit. pp. 16/21. Pionniers et Planteurs de São Paulo, Paris, Armand Colin, 1952.
QD Cf. A DELFIM NETTO, Op. cit., p. 21. pp. 121/125,
ro
faia ooo (oco
84 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO TARDIO 85
O CAPITALISMO
deveriam ser organizadas com trabalhadores livres) lhes todas as despesas com o bene-
líquido, deduzidas
fariam impiedosa concorrência. 09 ficiamento, transportes, comissão de venda, impos-
A solução vislumbrada, desde o início, foi a imigração. fazendeiros em
tos, etc. Sobre os gastos feitos pelos
Como se tratasse de “colonizar para o capital” e não colo- aos colonos cobravam-se juros de 6%,
adiantamentos
nizar para povoar, para ocupar vazios territoriais, a intro- da data do adiantamento. Os
que corriam a partir
dução de núcleos de colonização de nada valia, era puro
eram considerados solidariamente responsá-
colonos
desperdício: Aplicavam-se na amortização pelo
veis pela dívida.
“Os fazendeiros, por seu turno, pensavam que os menos 50% dos lucros anuais.” O?
núcleos não tinham qualquer utilidade para prover avam-se de que
O fracasso foi rotundo. Os colonos queix
trabalhadores para suas fazendas e reivindicaram o cafeeiros, do peso
se lhes atribuíam para cultivo os piores
término do programa (de colonização). Um grupo de lhes cobravam, a
insuportável das dívidas, dos juros que
influentes fazendeiros declarou, por exemplo, em € medid as € o
precariedade das casas, de fraude nos pesos
1878, que “ademais de ser prejudicial e onerosa senti am-se escra vizados. Us
contabilidade, etc.; em suma,
para o Tesouro, a colonização oficial era completa- se de que a gente que
fazendeiros, por sua vez, queixavam-
mente inútil 7.089 de origem, pouce
recebiam era o rebotalho em seus países
dizer, tinham-se
dada ao trabalho, viciada e desordeira; quer
Tentou-se a parceria, já em fins dos 40, quando a lucidez
de Vergueiro previa, para breve. o fim da escravidão. Emília |
por esbulhados.0?
Viotti descreve as linhas gerais do sistema adotado: desejavam os
Nem poderia deixar de ser assim. O que
proletários e não
“Os colonos eram contratados na Europa e encami- fazendeiros era converter os parceiros em
nhados para as fazendas de café. Tinham sua viagem ambicionavam os par-
fomentar futuros concorrentes. O que
transformarea
paga, bem como o transporte até as fazendas. Essas ceiros não era se proletarizarem, mas sim, se
como epa le
despesas, assim como o necessário para a manuten-
em proprietários, encarando sua condição
ção, entravam como adiantamento até que pudessem um pecúlio, o bastante para dar o “salto.
etapa para formar
sustentar-se pelo próprio irabalho. Atribuía-se a do cada vez
Abandonada esta via, a da parceria, foi fican
cada família uma porção de cafeeiros na proporção fluxo abundante de
mais patente que convinha gerar um
de sua capacidade para cuitivar, colher e beneficiar. à empre sa cafeeira.
homens pobres que se dirigisse para
Era-lhes facultado o plantio de viveres necessários das pelo Conse-
Pobres, pelas razões tão bem compreendi
ao próprio sustento, entre as filas do café, enquanto
lheiro Antonio Prado:
as plantas eram novas. Quando isso não era mais
ita sua
possível, podiam plantar em locais indicados pelos fa- “Prado mais tarde tornou mesmo mais explíc
que os imi-
zendeiros. Em caso de alienação de parte dos víveres, posição, quando notou, com satisfação,
cabia metade ao fazendeiro. Vendido o café, obri- grantes, cuja passagem para São Paulo era paga,
eram tão pobres que nem podiam comprar sua pró-
gava-se este a entregar ao colono a metade do lucro
terra, nem abrir pequenos negócios, mas, tão
pria
(5) Cf. R, SIMONSEN, Op. cit., passim e £. STEIN, Op. cit., passim.
(6) Cf. M. HALL. The Origins of Mass Imigration in Brazil (1871/ 7 Cf. Emília
íli VIOTTI DA COSTA, Op. cit.,
i PD. 81/82.
1914), University Microfilm, 1972, p. 8. 8) Cf. Emília VIOTTI DA COSTA, Op. cit., pp. 83/92.
MELLO O CAPITALISMO TARDIO 87
JOÃO MANUEL CARDOSO DE
86
Ve sd
D
88 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
k
É k º p .
nf: ornaram se uma só e mesma coisa. Em 1688, extinguia-se
E
Ê a escravidão:
ore
Capítulo 1
um recurso — o escravo. Agora de novo os brancos
livres: o suprimento de escravos escasseava e o
rare
m no máximo rela-
as limitações do setor externo seja e dependente. Daí que a análise se apóie no setor externo,
expansão das dm
tivas, isto é, que haja uma certa nos sucessivos ajustes entre as estruturas de oferta e de-
inferior à do cresci-
portações, embora a uma taxa manda globais, no desafio do estrangulamento externo a que
mento do produto”. a Nação responde com o crescimento industrial interno. Daí
entem-se, primei- não haver nem sombra de um esquema endógeno de acumu-
Quanto aos condicionantes internos, sali
strialização inten-
ramente, as dificuldades impostas à indu lação de capital (quando outras oposições no interior da
pelo tamanho relativamente estreito dos mercados Nação poderiam vir à tona...), visualizando-se os “impactos
siva
latino-americanos, tomando em conta que a tecnologia impor- internos” do processo de industrialização pela óptica neo-
escalas de produção ajustadas aos mercados dos clássica das funções macroeconômicas de produção (indus-
tada impõe
desenvolvidos. Ademais, a importação de tecnologia, trialização extensiva X industrialização intensiva, produção
países
concebida naturalmente para as economias líderes, e não mais ou menos capitalística, etc.).
adequada à disponibilidade fatorial dos países latino-ameri- Nós, ao contrário, partiremos do silêncio do paradigma
canos, traria graves problemas: cepalino: pensaremos a industrialização latino-americana
de ordem geral também são como uma industrialização capitalista; mais ainda, como uma
“Os inconvenientes
determinada industrialização capitalista: uma industrialização
bastante conhecidos e podem ser resumidos do se-
capitalista retardatária. Vejamos, em seguida, qual seria sua
guinte modo: para um dado volume de produto a
problemática.
(6) Cf. Maria da Conceição TAVARES, Op. cit., p. 46.
(7) Cf. Maria da Conceição TAVARES, Op. cit, p. 47. (& Cf. Maria da Conceição TAVARES, Op. cit., p. 50.
Hb
ag
sena
TARDIO 97
O CAPITALISMO
a indústria de ento do capital industrial, ia ' eiramente contida nos equipamentos disponíveis
mento do nascim
constituem, nO mo no mer
me e O internacional;
i i tamanho da planta mínima
| e
capitalistas?
forças produtivas do mercado, o investimento inicial al inteiramente
intei íveis é
órbita
evidentemente, na
A razão não está, cria demanda não nomia brasileira de então. EE
exportador cafeeiro
porque O complexo também, para meios Estas são as EIS
«referências À lerações que explicam,
consideraçõ i no essencial, a
de consumo, como,
somente para bens um outro
equívoco tão comum,
pela indústria de bens de consumo assalariad o
relação capital/trabalh
por possuir uma maior constante.
q are la a EA 3
que há nesta
Ainda reconhecendo não está aí.
penso que O fundamental
verdade, é preciso
corretamente a questão,
Para compreender em
do século passado,
s últimas décadas
atentar que, nas' dua ção dos princi s
pai
cesso de monopoliza
(469) Cf. . sobre este ponto D. LANDES, The U
ção com O pro
con jun volução In-
da “Segunda Re bridge, Cambridge University Press, 1989 ao p ueus, Cam
industriais e no bojo
mercados
104 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 105
dá nascimento e estimula a grande indústria, ao mesmo tempo Estamos, até aqui, no plano dos “efeitos de encadea-
impõe limites estreitos à acumulação industrial. €? mento” dentro do complexo exportador. Aproximemo-nos
A este modo de articulação entre o capital cafeeiro e o mais do processo de acumulação
expansão da economia. e
capital industrial corresponde um determinado padrão de Admitamos que os impostos sejam empregados na compra
acumulação que contém em si mesmo unidade e contradição. de bens de produção e no pagamento de salários, que os
Deixemos de lado, por ora, o movimento histórico conjunto lucros se repartam entre consumo capitalista e acumulação,
e que os salários sejam integralmente consumidos em ali-
do capital cafeeiro e do capital industrial e nos detenhamos,
mentos e bens manufaturados de consumo. Começa a ficar
analiticamente, nos principais traços desse padrão de acumu-
claro que a produção de café é, simultaneamente, demanda
lação mediante uma dupla demarche:
por terras, meios de produção e força de trabalho, pelo lado
1) iluminar os aspectos da estrutura de repro- e, pelo lado do gasto corrente, demanda por
da acumulação,
dução, em que se encontram articuladas, num assalariado e bens de consumo
alimentos, bens de consumo
esquema simples de dois setores, as relações básicas
capitalista.
de interdependência entre demanda, oferta e custo
de reprodução, que conferem unidade à expansão A acumulação de meios de produção e o consumo capi-
conjunta do complexo exportador cafeeiro e da gran- talista se financiam com a capacidade para importar gerada
e a de-
de indústria; pelo próprio complexo exportador cafeeiro. Someni
de alimenios s bens manufaturados de consumo
2) sugerir como no movimento cíciico de manda
tura mercant il de
acumulação do capital cafeeiro se resolvem as con- assalariado, uma vez constituídos a agricul
produção inter-
tradições que surgem para a acumulação industrial, alimentos e o setor industrial, é atendida por
da força de trabalho.
decorrentes de seu caráter simultaneamente subor- na, com o que se internaliza a reprodução
dinado e competitivo ao capital cafeeiro. enire O capital
Estabelece-se uma mútua dependência
industrial, dentro de um padrão
Comecemos por explicar a reprodução do capital cafe- cafeeiro e “o capita!
eiro em seu conjunto. A agricultura cafeeira no seu pro- ue corresponde a uma dinâmica interseto-
cesso de produção incorre em determinados custos -- sim- iretanto. dos clássicos esquemas de repro-
Ê iticadamente: depar tamentos, porque as q condiç
o?
ões
INDO «e
te
depreciação do vapital fixo, pagamentos de ducão com o dois,
4
go)
ã quee 5 se eletiva no com facilidade, ainda que sua taxa corrente de rentabili-
da ização,
realizaç
dependem do problema dade seja relativamente menor que a do café.
mercado internacional.
o capital
ital indu
i strial
i depende, dup lamente ; No segundo momento, a taxa de acumulação real se
ão. Em primeiroJo luga
ves r, acelera, respondendo atrasada aos preços. A excessiva imo-
do ftal
capi es teiro paraa sua expans
cafe
pr
dade produtiva está bilização em cafezais, assim como a tendência à superpro-
ara repor € amnliar a capaci
| economia cafeeira, que dução, requerem mais capital do que a taxa interna de renta-
i o rtar gerada pela
:capacii dade para 1Mp
dadeiro departamento de bens bilidade pode financiar. Na impossibilidade de se desmobilizar
faz as vezes, assim, de um ver é in-
lugar, o capt tal industrial e o capital industrial já invertido e de se reverter o fluxo
de produção. Em segundo ato
mercados e Feu cresci interno de financiamento, uma vez que as margens correntes
capaz de gerar seus próprios aos merca : de lucro do setor industrial, apesar de crescentes, continuam
do ponto de vista da realização,
está atrelado, la
xo exportador cafeeiro, ain inferiores às do capital cafeeiro, faz-se apelo ou ao auxílio
externos criados pelo comple ão. Deci -
ou da urbanizaç estatal ou ao capital estrangeiro. Se as entradas de capital
que seja atr avés do gasto público o,
siva, no entanto, é a depend
ência pelo lado da acumulaçã são abundantes, aumenta a capacidade para importar e se
forças produti vas capitalistas supre a economia cafeeira de meios financeiros suficientes
que exp rime a ausência de cafeeiro, que para agiientar a taxa de acumulação, mas, ao mesmo tempo,
e a subordinação do capi tal industrial ao capital
(18) aumentam as possibilidades de concorrência externa à indús-
é dominantemente mercantil. tria já instalada, numa situação (suponhamos) de queda do
permite, n aturalmente,
Este esquema de reprodução grau de proteção.
o capital cafeeiro e o capital
aclarar, apenas, a unidade entre
iramente O movimento hege- O setor industrial então se defende da tendência ao
industrial, escapando-lhe inte
associação contraditória com declínio de sua taxa interna de rentabilidade acntuande a
mônico do capital cafeeiro e sua traços mais
tentar reter seus concorrência intercapitalista. Aceleram-se a concentração e
o capital industrial. Convém
lo de ciclo. | a centralização do capital industrial, modernizando-se as
gerais, imaginando um mode
da economia cafeeira podem empresas e aumentando suas escalas, à custa da liquidação
Os períodos de expansão
por dois momentos. No pri- de empresas marginais. Ainda que a taxa de acumulação
ser pensados coino constituídos
real de acumulação cafeeira cresce menos global da indústria não suba e mesmo decline, a capacidade
meiro, a taxa
Os lucros brutos sobem com Os produtiva das empresas mais fortes se amplia e seus custos
que a financeira, porgus
sado. As
preços e o dispêndio em acumulação reage defa diretos de produção podem inclusive cair, devido à incor-
rior es às da indús-
margens de lucro brutas do café são supe poração do progresso técnico que acompanha as importações
sfe-
tria, mas há capital monetário disponível para ser tran de máquinas e equipamentos.
de
rido ao setor industrial e aumenta a oferta de bens Quando, finalmente, os preços do café começam a cair,
importados para expandir a capacidade produtiva pressionados pela superacumulação, iniciando-se a etapa
produção
oduzir
industrial. Vale dizer, o capital industrial pode-se repr declinante do ciclo, a taxa de rentabilidade relativa do capital
industrial sobe e ajuda a manter, por pouco tempo, a taxa
de
(18) A ausência de núcleo fundamental do departamento de bens de acumulação da economia. No instante em que estala a
, salientad a argutame nte no importan te trabalho de M.
produção
Merkav, não configura apenas sua dependência tecnológica.
Cf. crise, definitivamente, tanto o complexo exportador quanto
M. MERKAV, Dependencia Tecnológica, Monopólio e Cresci a indústria são arrastados. Mas a quebra da capacidade para
miento, tradução espanhola, B. Aires, E. Periferia, 1972,
[CER S CUImALDE
É]
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Foo
h -R nn
k
Ta
pr
ed qa SAE
108 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 109
a ee
importar defende, em certa medida, o capital industrial, que de inversão ao capital estrangeiro: quer ao capital de emprés-
Egas TD
começa a se recuperar lentamente através de gradual utili- timo, de forma predominante, quer ao capital de risco, que
zação da capacidade ociosa. No momento em que os preços se dirige basicamente aos setores de infra-estrutura, comer-
internacionais e internos tornam a subir, começa um nove cial e financeiro, mas, também, ao setor industrial.
ciclo de expansão conjunta. portanto,
O período que se estende de 1888 a 1933 marca,
Como sublinhei, este modelo de ciclo conjunto do capital o momento de nascimento e consolidação do capital industrial.
cafeeiro e do capital industrial não se dá conta do movi- Mais que isto, c intenso desenvolvimento do capital cafeeiro
os pré-
É mento histórico da acumulação, senão que permite que gestou as condições de sua negação, ao engendrar
nos aproximemos dele. Ajuda a compreender, por exemplo, para que à economia brasileira
1 requisitos fundamentais
29”. De um
por que os períodos de teste de resistência do setor industrial pudesse responder criativamente à “Crise de
são os em que, por força da expansão cafeeira, a economia lado, constituem-se uma agricultura mercantil de alimentos
se abre, promovendo-se a modernização industrial, que vai capazes de,
e uma indústria de bens de consumo assalariado
acompanhada pela concentração e centralização do capital. a massa de
ao se expandirem, reproduzir ampliadamente
trabalho, que jé
Pode ocorrer, inclusive, uma diversificação da estrutura in- forca de trabalho oferecida no mercado de
dustrial, o que não se verificaria nem em períodos de escas- de outro, forma-se um
possuía dimensões significativas;
nada
produção (pequena
Aus pede
sez de capacidade para importar (crise ou guerra), nem ainda de indústrias leves de bens de
núcleo
ipi pai
oa primeira etapa do cicio de expansão, em que a rentabili- , uma agricultura
indústria do aço, cimenio, eic.) e, tambén:
crescerem. ensejariam
dade das indústrias já instaladas sobe e dá lugar à reinversão mercantil de matérias-primas que, ao
do c apital constante sem
interna de lucros no próprio ramo positivo. Aclara também a reprodução ampliada de fração
por que, nos períodos em que há sérias dificuldades para apelo às importações.
importar, a taxa de acumulação real! industrial não pode ovida objetivamente
A recuperação da economia, prom
crescer, ainda que a taxa de lucro efetiva aumente, estimu-
pela política econômica do Estado, fez com que a capacidade
lada, inclusive, pela elevação do grau de proteção. e mesmo, em
aciosa pelo desfalecimento da demanda
criada
segurança, o modo ns preen chida s. Com
Isto posto, pode-se estabelecer, com certos casos, a anterior à crise, fosse
de ticulação | corrente das empresas foi recom-
de economia Drasileira com as economias
isto, a Jucratividade
casos. aumentada. Por outro jado, a taxa
posta ou, naqueles
bens produção foi de
brasileira na economia mundi de lucro esperada da indústria leve de
determinada: pelo lado da realização do capital cafeeiro e pelo externo gerado pela
favorecida pelo forte protecionismo
o inves-
lado da acumulação do capital industrial. Esta dependência quebra da capacidade para importar, enquanto
resulta, na verdade, da não constituição de forças produtivas consumo assalariado foi
timento nas indústrias de bens de
de novos equipa-
capitalistas, isto é, do bloqueio da industrialização (que se bloqueado pela proibição de importação
expressa internamente na hegemonia do capital cafeeiro, que de 1931 a 1937. Desencadeia-se, então, uma
mentos, vigente
é dominantemente mercantil, sobre ô capital industrial). Por bases, que só foi pos-
expansão econômica fundada em novas
outro lado, a fragilidade do capitalismo brasileiro transfor- de certa capact-
sível, de um lado, porque já dispúnhamos
medidas de política
mou-nos em campo de exportação de capitais dos países dade de acumulação e, de outro, devido a
para
capitalistas maduros, ao criar, não obstante, oportunidades econômica que sustentaram relativamente a capacidade
DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 113
JOÃO MANUEL CARDOSO
10
de troca tenham piorado, Há, durante toda esta fase, um crescimento mais que
(não obstante as relações
importar que o fariam ; proporcional do departamento de bens de produção. Porém
é que se deterioraram mu ito menos
o certo s de caié é indiscutível que “sua capacidade produtiva nos principais
maciçamente Os excedente
se o Estado não retirasse 1937, para ramos produtivos é insuficiente para cobrir sequer as neces-
l), e a reservaram, até
do mercado internaciona ão, O que sidades correntes de funcionamento da economia a uma. taxa
leve de bens de produç
a ampliação da indústria da indústria de acumulação mais alta. Muito menos é capaz de manter
capacidade produtiva
exigiu a sobreutilização da a capacidade produtiva crescendo a um ritmo sustentado na
assalariados.
de bens de consumo para íodo frente da demanda final”.29)
ia uma nova fase do per
Penso que em 1933 se inic aco rdo com O setor industrial, portanto, se liberta da dependência
acumulação se move de
de transição, porque à 1855, há um que o atrelava, direta ou indiretamente, pelo lado da reali-
fase, que se estende até
um novo padrão. Nesta industriali- zação dos lucros, à economia cafeeira. Porém, a capacidade
processo de industrializ
ação restringida0? Há
à S€ assentar para importar continua a impor à taxa de acumulação indus-
da acumulação passa
zação, porque à dinâmica um movi- trial um limite em última instância, ainda que as restrições
ou mel hor, porque existe
na expansão industrial, roduzem, con- dentro do padrão de acumulação, possam ser vencidas suces-
mulação, em que se rep
mento endógeno de acu tal
do capi sivamente, com a contínua diferenciação da indústria leve
trabalho e parte crescente
juntamente, a força de se encontra de bens de produção e da indústria de bens de consumo pro-
à industrialização
constante industriais; mas da acumu- movidas à sombra de um forte grau de proteção.
es técnicas e financeiras
restringida porque as bas golpe, O
ão são ins ufi cie nt es par a que se implante, num O problema crucial consiste, desta forma, em explicar
laç s de produção, que por que a industrialização se manteve restringida. Ou melhor,
fundamental indústria de ben
da
núcleo da de-
pro dutiva crescer adiante por que não se instalou, de forma mais ou menos concen-
permitiria à capacidade olvimento trada no tempo e adiante da demanda, o núcleo fundamental
o o processo de desenv
manda, autodeterminand do departamento de bens de produção, mas, ao contrário, sua
industrial, implantação se deu de maneira limitada e relativamente
in- lenta, ampliando-se as bases técnicas da acumulação a pouco
da fase de Industrialização Restr
(19) Para as linhas fundamentais Econ ômic a do Brasi l, caps. e pouco, sempre, porém, a reboque da demanda, €D
ação
gida ver: O. FURTADO, Form cit.; Cc.
da Conceição TAVARES, Op.
XXIII e seguintes; Maria a”, Bolet in Econó- A questão central há de residir, pois, em saber com
política económic
LESSA, “Quince afios de mbro , 1964; W. BAER, Indus- base em que esquema de acumulação nasceria a indústria
a, nove
mico para América Latin
lopment in Brazil, Homewood,
trialization and Economic Deve A Industrialização Brasileira: pesada de bens de produção no Brasil. Nenhuma indústria
AL,
III. Irwin, 1965; A. CAND e Coor- pesada surgiu a partir da expansão do mercado interno de
Ministério do Planejamento
Diagnóstico e Perspectivas, e W. SUZI GAN, Política do
A. VIL LEL A bens de consumo final. Historicamente, a indústria pesada
denação Geral, 1969; omia Brasileira, 1889-1945, R.
Governo e Crescimento da Econ
A. FISHLOW, “Origens e conse- nasceu apoiada à grande inovação representada pela estrada
de Janeiro, IPEA/INPES, 1978;
rtação no Brasil”, em Estudos
giiências da substituição de impo
Econômic os, 2(6). O conc eito de Industrialização Restringida
(20) Pia dese de docência de Maria da Conceição TAVARES, ainda
começou a ser elab orad o por Mari a da Conceição Tavares e por
a. ,
» Rr
andapi E
112
de ferro, e, ademais, contou, nos países atrasados (EUA, mercantil, invadindo, por exemplo, o ramo imobiliário urbano
Alemanha, Japão e Rússia) com o suporte decisivo do Estado e o de comercialização de produtos agrícolas.
qa
e com o apoio, não menos importante, do grande capital A lucratividade do capital industrial resultava, basica-
bancário, que, mobilizando e concentrando capitais, acabou mente, de dois fatores: em primeiro lugar, da natureza
(Lepc
par p
por se mesclar com o capital industrial. pouco competitiva do sistema industrial, em condições de
Na industrialização retardatária, os obstáculos a transpor alto grau de proteção (salvo no imediato post-guerra); ade-
se tornariam muito mais sérios. Já não se tratava de ir mais, do comportamento dos custos real e monetário da força
aim
aumentando, a saltos mais ou menos gradativos, as escalas de trabalho. |
de uma indústria existente, como ocorreu durante a Segunda A existência de uma contínua pressão sobre o mercado
Revolução Industrial. Ao contrário, o nascimento tardio da de trabalho, expressão tanto do crescimento vegetativo da
indústria pesada implicava numa descontinuidade tecnoló- força de trabalho urbano quanto de migrações internas, e
gica muito mais dramática, uma vez que se requeriam agora, o baixo poder autônomo de organização dos trabalhadores
desde o início, gigantescas economias de escala, maciço não fixavam um patamar mínimo para os salários, mas im-
volume do investimento inicial e tecnologia altamente sofis- pediam que sua subida emparelhasse com a da produtividade,
ticada, praticamente não disponível no mercado internacional, assegurando margens crescentes de lucro, uma vez que as
pois que controlada pelas grandes empresas oligopolistas dos empresas foram capazes de transferir aos preços o aumento
países industrializados. dos custos monetários da mão-de-obra direta.
Não é difícil entender que os riscos do investimento Naturalmente, a taxa de salários e os custos das maté-
privado se iornam insuportáveis num capitalismo como o rias-primas agrícolas dependiam, em última instância, das
brasileiro, dotado de bases técnicas muito estreitas. Além do condições de produção da agricultura mercantil, capitalista ou
mais. mesmo que o Estado definisse um bloco de investi- não, e da própria taxa de acumulação urbano-industrial, que
imprime um certo ritmo ao crescimento da demanda de pro-
mento (por exemplo, em energia elétrica e transportes ferro-
dutos agrícolas.
viários) que servisse de apoio ao capital industrial, restariam
A oferta agrícola parece ter respondido adequadamente
para serem enfrentados graves problemas com obtenção de
3 intenso pressão de demanda urbano-industrial, valendo-se
tecnoiogia no exterior, de mobilização « centralização de
do deslocamento da fronteira agrícola, do melhor aprovei-
capitais e de financiamento externo, criades pelas inversões
públicas e privadas. tamento das terras do latifúndio, da expansão da pequena
produção mercantil e, mesmo, em alguns momentos, da re-
Há, no entanto, outra razão que é decisiva. O capital
conversão das atividades de exportação.
industrial dispunha de oportunidades lucrativas de inversão,
com um risco baixo, na medida em que percorresse seu A contínua tendência à elevação dos preços agrícolas
dever-se-ia, portanto, ao surgimento e à consolidação de. oli-
“caminho natural”, afrontando sempre as “linhas de menor
gopsônios mercantis, que se teriam aproveitado exatamente
resistência”: expandir a indústria existente e promover a
dos problemas provocados pela velocidade de crescimento
diferenciação limitada do setor de bens de produção e do
da demanda, numa situação de extrema fragilidade finan-
setor de bens de consumo, com a formação da indústria
ceira e comercial dos produtos.
de bens duráveis “leves”, ou, mesmo, converter-se em capital
O CAPITALISMO TARDIO 115
CARDOSO DE MELLO
JOÃO MANUEL
114
não inibiu experiência com a indústria química pesada se revelou
o dos preços agrícolas
A tendência ao aument s stante amarga, em grande medida devido ao acesso bastante res-
u numa aicon
l, mas se reso lvee
a acumulação industria sa e Do apor- trito à “tecnologia de ponta”. Mesmo os investimentos pú-
deprimia os
pressão inflacionária, que ne Dos
blicos em infra-estrutura, que eram inteiramente solidários
eram elásticas pare
que as margens de lucro ne odio sor ao padrão de acumulação, atrasaram-se consideravelmente,
os custos promovi a
modo, a pressão sobre ativi gerando “pontos de estrangulamento” em energia e trans-
dos bens de pro us
preços de importação a o portes.
internos, dada Ê
transferida aos preços a o em
Evidentemente, os problemas de mobilizações de capitais
rial e o alto grau
dade do sistema indust Esta
e de suficiente capacidade para importar poderiam ser en-
o que S€ exige do
Nestas circunstâncias, con-
frentados com facilidade pela grande empresa internacional,
ão
proteção € tra as
con i ortaações
imp
se decidisse investir no Brasil. No entanto os anos compre-
claro: garantir forte ga ha
erxr dede bargan
"entes, impedir o fortalecii mento do pod endidos entre 1930 e 1946 não foram particularmente favo-
sindicalismo
ue poderia surgir com um ráveis à exportação de capital por conta de uma segiiência
dos traba em infra-estrutura,
a - timentos de eventos decorrentes da Grande Depressão. º) Durante os
a oba e
independente, realizar e baratas ao capital indus-
. ar
externas ias Ra anos de crise nas economias centrais, o grande capital oli-
assegurando economias açã o pol itico econômica
a intei-
laç ão
tipo de
trial. Quer dizer, um Se
gopolista passou por severas restrições financeiras decor-
rio a um esq squuema P riva rentes de fortes quedas de volume de vendas, quebra de
ramente solidá
À ári na
em. as ainda estreitas.
bases técnic margens de lucro e aumento de capacidade ociosa. No período
que repousava
a mindústriaupes a ] de
ada
â
Não somentee i
os INV estiimentos nna imediato de recuperação da Depressão, os investimentos in-
horho izontes o do cap ê
ão
bens de produção ão 4| amaisi estÍiveram| B oss do
ternos absorveram a maior parte do excedente de capital
especialmente, O padrão de is monetário nas economias centrais, e logo depois estourava
industrial, mas, aa
o
ec
ites objetivos à a
” >
terÍ res a
stado. E o fazia, i P or um E lado, ae man volia a padrões de crescimento “nacional-autárquicos” e, em
ão, espelh ada num poder tinanc ro vários casos, sob regime de força, onde os Estados
capacid ade de apropriaç
cap Nacionais
outro,
a licerces tributários, por passaram a centralizar ainda mais o financiamento à acumu-
amparado por frágeis a con sid eráção
e era vel
pusesse de umaa parcel com a lação de capital, principalmente para os meios de produção
impedir que O Estado dis ope raç ão
á-ia .€
dade para 1importar, ao ocup
da capaciid:
e setores básicos. Dentro deste clima de agressiva compe-
, numa situação em q
e expansão da indústria leve
tição capitalista internacional, a exportação de cepital
i ento exi
i anciam
ili dades de fin
xierno. produtivo pesado era ainda mais restringida pelos próprios
reduzidas as possibili
agora, por que não eso Estados Nacionais, empenhados em defender suas respectivas
Talvez se compreenda,
por razões . de fe à
Estado Novo definir, claramente, vantagens tecnológicas e reservar capacidada básica de acu-
side
bloco de inversões pesadas: a mulação para sustentar a indústria militar.
nacional, um ambicioso e
as, porque o o Além de todas estas razões, seria ingenuidade esperar ou
rurgia tornou-se possível, apen n
unda Guerra Mun a ,
Estados Unidos, durante a Seg supor que uma empresa internacional viesse correr sozinha os
es, O indi spen sáve inan
cedeu, por motivos político-militar 22) Ver sobre este ponto: L. COUTINHO, Maturity and Intematio-
ciamento exte rno e asse guro u O fornecimento dos equipa- nalization of Oligepoly Capitalism, Tese de doutoramento não
-se até 1954, e a
mentos; a questão do petróleo arrastou
publicada, Cornell University, 1974 (exemplar mimeografado).
O CAPITALISMO TARDIO 117
116 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
e detendo um frágil poder de acumulação. Mais que isto, junto de pequenas e médias empresas nacionais. Por isto
não era mesmo capaz sequer de definir com o Estado um mesmo, com a aceleração do crescimento industrial entre
esquema de acumulação que não significasse a estatização 1956 e 1961, a taxa de acumulação das grandes empresas
quase completa dos novos setores. Sua fraqueza política, nacionais e estrangeiras sobe mais que proporcionalmente
que correspondia à sua fragilidade econômica, retirava-lhe, à taxa de acumulação global do setor, mas há lugar, tam-
por outro lado, qualquer esperança de “privatizar” no futuro bém, não somente para a expansão das empresas pequenas e
o Estado. Por isso mesmo, o capital industrial nacional médias existentes, como para a entrada de novas.
“optou” pela entrada do capital estrangeiro nos novos Em suma, há na expansão uma profunda solidariedade,
setores e pelo papel relativamente limitado do Estado como ao nível da acumulação, entre Estado, empresa internacional
empresário. e empresa nacional, o que não elimina, evidentemente,
Ademais, a industrialização pesada promoveu uma forte fricções de ordem secundária.
expansão do capital industrial nacional. Nos setores metal- Conforme se pode verificar com facilidade, uma expansão
mecânicos que se instalam, a demanda derivada da grande como a que acabamos de analisar levaria, necessariamente,
empresa estrangeira estimula o surgimento, crescimento e a uma desaceleração do crescimento, ainda que se mantivesse
que a di-
modernização da pequena e média empresa nacional, confor- a mesma taxa de investimento público, uma vez
mando-se um oligopólio diferenciado. nucleado pela grande gestão da nova capacidade produtiva criada nos departa-
empresa estrangeira, com um cordão de pequenas e médias mentos de bens de produção e de bens de consumo capita-
empresas nacionais, tanto fornecedoras quanto distribuidoras. lista provocaria um corte significativo no investimento
italianos aa
: -
É preciso dizer, de imediato, que imi
imigran tes europ eus À i palme nte ua
(princi
várias economias im-
européias atrasadas foram sacudidas, rante a década de 1890. Seria de fato difícil, senao
nas duas últimas dé-
d de
cadas do século XIX, por profunda s para j
(6) Brasil, atrairi semelhant en ume
á ro
s transformações, que Ô
possível
funcionaram como fatores de expul seo a Argentina
i e, sobre tudo , os Ê s t ados
são, isto é, que provo- uni
imigran tes
caram a formação de imensos conti Li V m, n a mesma á
epoca, se : do
expandi
ie eco-,
ngentes de homens livres i
Unidos tivesse
=
e sem trabalho, dispostos a emigr e se, também, a economia italiana est
ar, criando as condições nomicamente
básicas para a constituição do crescendo
ig
A (
27) |
mercado internacional de vesse
trabalho. Como também é sabido, as regiões i lares ti
V ige ntes no
centro-norte e São portanto estas j es
condiçõ particu
]
ocidental da Europa representaram, q ue oexplicam,
1
eme: u ca
a
Ea!
&
na década de 80, a prin- mercado
, .
imrterna
ini ci j onal
,
de ! a o )
trabalh
ponderância.
de salários verificadas:
Surpreender a existência de
grandes contingentes de
trabalhadores livres no mercado
internacional, contrapondo-a Monetários (mil réis!
à demanda da empresa cafeeira, Salários
não basta para explicar
aquelas fortes correntes migratória
s para o Brasil, em que o apa
Carpa CO Colheita
fe
Ano
os sul-europeus representaram
mais de 90%, e apenas os
italianos, cerca de 60% do total.
so e
E não é suficiente porque 500
ieríamos
gratia dos
de enfrentar
Estados
a
Unidos
concorrência de ouiras nações, verbi 1566
mo
o
50
406
a
e da Argentina. Ocorre, porém, 1888
o
que estes fatores de desvio se enfraque 1890
so
ceram nitidamente, ao
90
uma vez que a economia norte-americana 1895
atravessa severa 90 so
crise entre 1893 e 1897, e que a 1898
economia argentina se man-
tém praticamente estagnada gration in Brazil
por toda a década dos 90. Fonte: Michael Hall, The i
Origins of Mass Immiuisra
University Microfilm, 1972, P. .
Sintetizando com Dougla onte 1871/1914,
s Graham:
CO Para a imig
ração estrangeira, ver o impo
,
a 1
GRAHAM, “Migração estr rtante trabalho de D.
angeira e a questão da ofer
de-obra no crescimento econ ta de
ômico brasileiro”, em Estudos mão.
nômicos, vol. 3, nº 1. Eco:
(em Cf. D. GRAHAM, Op. cit., p. 30.
JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
126
UAL DE ;
- DERA Ê
sau
e BEAR cara
128 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 129
do desequilíbrio externo dentro das regras do padrão-ouro mercantil, e que convém pensar num complexo exportador
implicava afetar, drasticamente, a taxa de rentabilidade cafeeiro, integrado por um núcleo produtivo, que inclui as
da economia cafeeira, a desvalorização da taxa
de câmbio atividades de beneficiamento, e por um segmento urbano,
surgia como solução para que se cortasse a demanda
exce- que acolhe os serviços de transportes (estradas de ferro,
dente por importações, preservando-se, bem
ou mal, a portos, etc.), as atividades comerciais (casas importadoras e
acumulação.
| exportadoras) e financeiras (bancos). Deste ponto de vista,
É claro que a política econômica do Estado contribuiu a acumulação cafeeira é, em grande medida, acumulação
para aprofundar ou bloquear as desvalorizaç imi-
ões (e a acumu- urbana, que absorveu boa parte da força de trabalho
lação): entre 1890 e 1894, uma política (trilhos,
monetária expansio- grante e exigiu a importação de meios de produção
nista, ao estimular a acumulação, ferroviário e por-
deve ter acentuado materiais de construção, equipamentos
desvalorizações; entre 1895 e 1898, em segundo lugar,
levando-se em conta de tuário, etc.). Perceberia mais claramente,
as receitas de exportação de quer no
café se contraem, uma olítica que a reprodução da força de trabalho empregada
monetária conservadora deve ter-lhe foi, em boa
s retirado impeto e núcleo produtivo, quer no segmento urbano
oteitãs e modo as desvalorizações cambiais e bens ma-
produziam parte, dependente das importações de alimentos
lei im antes sobre a acumulação
cação de Furtado é amplamente
cafeeira? A expli nufaturados de consumo. Cb
aceita e não cust a repro- lorizações
duzi-la: ro. Isto quer dizer, simplesmente, que as desva
que integ ravam tanto o
cambiais encareciam elementos
O processo de correção do da repro dução
desequilíbrio externo o o custo
significava, em última instânci custo dos meios de produção quant
a, uma transferência m, o cruci al (uma vez que à ele-
de renda daqueles que pagava da força de trabalho. Poré
lorizações sobre Os
aqueles que vendiam as expo
m importações par vação dos custos provocada pelas desva
re proporcional ac
meios de produção importados era semp
riações. Como as im
poriações eram pagas pela
seria o comporta-
crescimento dos preços internos do café)
coletividade em seu con-
Junto, os empresários urbanos, que esta-
mento dos salários monetários, rurais e
exportadores estavam, na
realidade, logrando socializar internas de expansão
mecanismos
as perdas que os vam atrelados, inclusive, às condições
econômicos tendiam e do setor industrial.
seus lucros”,
, concentrar em da agricultura mercantil de alimentos
relações entr e as
Há que tomar em conta, ainda, as
O problema, no entanto, se públicas que (seja
nos revelará muito mais com- desvalorizações cambiais e as finanças
o exo se:e abandonarmos as abstraçõÕ na tributação aos
es (exportadores importa permitido recordar) estavam assentadas
res como conjunto ds:a cole à União o poder de
tivi
ivi dade) de ue parte Furtad . fluxos de comércio exterior, cabendo
inc apar de assentar seu Faci os, o imposto às
ociniio no capital
iocín : cafeeiro “o tributar sobre as importações e, aos Estad
ani
e
da quota-ouro, em 1891, as tarifas pas- do aumento dos preços internos do café e do encarecimento
Com a abolição
saram a se cobrar ad valorem, com base na taxa de câmbio das importações pagas por todos. A recuperação do movi-
do tenha se valido, desde mento do complexo exportador cafeeiro exige, ao contrário,
oficial de 1891. Ainda que O Esta
alfandegários, através das a determinação das raizes pelas quais as margens de lucro
1892, da elevação dos direitos
mesmo, procedido à revisão se ampliaram, num momento, e se contraíram, no outro.
diversas leis orçamentárias, e,
a receita aduaneira real, como proporção Pergunto: por que a intensidade das desvalorizações foi,
tarifária de 1896,
manteve. O problema deve ter-se entre 1891 e 1894, superior à elevação dos salários monetá-
das importações, não se
após 1897, quando se decreta uma nova
agravado em muito rios, de tal modo que as margens de lucro puderam crescer?
1896, sob a alegação de que a
tarifa, em 25% inferior à de Que as desvalorizações tenham se comportado deste modo,
perversos sobre o custo
reforma anterior acarretara efeitos ainda quando as exportações estivessem crescendo, se deve
| a várias razões: 1) ao ritmo de acumulação do próprio com-
de vida. 2
as e a queda das im- plexo exportador cafeeiro; 2) à política monetária expansio-
Naturalmente, a corrosão das tarif
afetaram fortemente a unista; 3) ao comportamento do Gasto Público, que se man-
portações, especialmente após 1896,
comprimir às despesas
receita federal. Foi então necessário
teve relativamente alto (tomando em conta a queda da re-
investimento — apesar do ceita); 4) à demanda por meios de produção, alimentos e bens
de consumo e, em especial, as de
déficits orçamentários | vul- de consumo manufaturados exercida pelo setor industrial
que, passaram a se acumular
o valeu-se de emissões €, de instalação; 5) ao pequeno crescimento da agricultura
tosos, após 1892. Seu financiament
a externa, que cresceu
principalmente, da expansão da dívid
mercantil de alimentos e, finalmente, 6) à intensa especula-
vez que sua amorti-
cerca de 30% entre 1890 e 1897. Uma
ção cambial que caracterizou o período. De outra parte, o
a forte, O serviço da dívida comportamento dos salários monetários está preso à oferta
zação tem de ser feita em moed
o da receita, de outro superabundante de força de trabalho e à possibilidade de
externa passa a absorver boa proporçã
que as exportações não sobem o suficiente ou, compressão dos salários reais, anteriormente fixados acima
lado, desde
de pagamento vai se
mesmo, caem após 1895, a capacidade
do nível de subsistência.
cidade de endivida-
estreitando, com o que se reduz a capa Na medida em que as margens de lucro cresceram, a
mento. €» rentabilidade corrente dos cultivos se ampliou e se acelerou
agora, ao problema sob exame. o ritmo da acumulação, uma vez que as perspectivas de lucro
Isto posto, retornemos,
última análise, verificou-se uma estavam, inclusive, relativamente amparadas pela pequena:
Não há dúvida de que, em
transferência de renda em favor do capital cafeeiro, e queda dos preços internacionais.
cuja base se encontram, de um lado, a queda acentuada do A consequente ampliação da produção, no entanto, em-
e, de outro, à sensível contração purrava os preços internacionais para baixo. Em princípio,
salário real urbano e rural,
entanto, não é lícito deduzi-la as desvalorizações deveriam se aprofundar. Ocorre, porém,
da carga tributária real. No
que, de um lado, a entrada em operação de grande parte dos
e a LUZ,
ária ver: : Nídiaia . Vilel
ifári
içã
rição da polítítiica tarif
DEçãO
investimentos industriais gestados no momento anterior e,
ação do Brasi l, S. pao , DO
o À Luta ECola Industrializaçã v, passi m. Para ; talvez, algum crescimento da agricultura mercantil de ali-
Livro , 1961, capít ulos IV e
éi
ver FISHLOW, Op. A p te mentos, absorveram parte da “demanda potencial” por
a aritas sobre as importações, .
e finan ças públicas, A.
(33) Cf. para a dívida externa € DP. 451. importações; de outro lado, as políticas monetárias e de gasto
SUZIGAN, Op. cit., pp. 102 e segs.
TARDIO 133
O CAPITALISMO
132 JOÃO MANUEL CARDCSO DE MELLO
diminuía
de. pagamentos do Estado
rior; porém, a capacidade contraíiam as
contracionistas freiam a acumulação, num momento em que da receita, bem como se
dia a dia com a erosão os da dívida
a queda acentuada dos preços internacionais haveria de er face aos serviç
possibi lidades de o Estado faz no
estar, por si mesma, deprimindo as “expectativas de lucro”. no
externa. desvalorizações
Com isto, as pressões para a desvalorização da taxa cambial O raciocínio. As
Tratemos de sumariar
gamen-
se amortecem relativamente, mesmo num instante de acen- sublinhamos, para O prolon
contribuem, por tudo que ent anto,
tuada queda das exportações. ão entre 1891 e 1894. No
to e a aceleração da expans pro dut iva
aumento da capacidade
Para que as margens de lucro pudessem ao menos se acabam gerando um tal interna-
va a queda dos preços
manter, seria, naturalmente, indispensável que os salários que perpetuava e aprofunda fort es, em se-
valorizações mais
monetários (na ausência de qualquer progresso técnico sig: cionais, o que exigiria des e-
de queda dos salários mon
nificativo) caíssem na mesma proporção que os preços in- guida, acompanhadas ou não por que inclusive
ternos do café. Porém, as próprias desvalorizações e, mais vez que isto era impossível,
tários. Uma Política
poderia ser escorado pela
ainda, os custos da produção industrial interna, protegida por este movimento não
que se conseguiria era
elas e pela tarifa, impulsionavam os salários monetários para do Estado, O máximo
Econômica
de lucro. Mas este mecanismo
cima. Ainda que parte do aumento “potencial” dos salários reduzir a queda das margens
razões internas, que eram
monetários pudesse ser freado pelo próprio esmorecimento a se esgotar, também por
tendia relativa dos
de um lado, devido à rigidez
da expressão cafeeira e pela abundante oferta de força de de duas ordens: preços
dência ac crescimento dos
trabalho, as margens de compressão iriam se estreitando na salários monetários e à ten outro,
or ao da taxa cambial; de
medida em que nos fôssemos aproximando do salário real de internos em ritmo superi sup ort e fina n-
o de liquidação o
subsistência, Em suma, há uma tendência à rigidez dos sa- porque se colocava em risc
lários monetários e a um maior crescimento do nível de ceiro do Estado. e
ser detida, entre 1891 e 1894,
preços internos em relação às desvalorizações. Quer dizer, A crise que pudera
delineada
e 1895 e 1896, aparece
para a queda das margens de lucro do complexo exportador relativamente contida entr ndo, em
urando-se plenamente qua
e para 5 elevação da rentabilidade corrente do setor in- já nos anos 1897/8, config o gover-
o Campos Sales assume
dustrial. fins de 1898, à administraçã graves
r, simultaneamente, dois
As finanças públicas, afetadas pelas desvalorizações, no. Dever-se-iam enfrenta da
exportador cafeeiro, decorrente
oscilavam num dilema: não elevar as tarifas e aceitar nada problemas: o do complexo
rota
is e internos. € O da bancar
mais nada menos que a bancarrota do Estado; elevar e baixa dos preços internaciona
contribuir para encarecer o custo de vida, isto é, para redu- financeira do Estado. r
ouviam-se clamores em favo
zir as margens de lucro do complexo exportador cafeeiro. Quanto à crise cafeeira, ex- o
do Estado no mercado, retirando
Enquanto as margens de lucro estiveram em expansão, po- de uma intervenção O pro-
O objetivo de “valorizar”
deria se tolerar que a erosão da receita pública não fosse cedente de produção com pre ços no
de forçar uma alta de
muito grande. Quando, porém, as margens já estavam duto; isto é, com O fito
ao menos, deter a baixa.
caindo, o que se exige é a diminuição da carga fiscal e, si- mercado internacional ou,
do,
iva era infactível. O Esta
multaneamente, a queda do nível da proteção concedida à No entanto, esta alternat
indústria. Comprimir a carga fiscal e manter minimamente di punha
ão dis
meii ro lugar, não de outros Mm eios de finan-
em priime
os gastos significava, especialmente, endividar-se no exte-
134 JCÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 135
ciá-la internamente a não ser as emissões, O que significaria as operações internas (imposto ao consumo).€9 Finalmente,
inflação, desvalorizações, etc. agravando a situação das o “funding” negociado pelo governo anterior foi imple-
finanças públicas, que já era desesperadora. Nem, eviden- mentado.
temente, se poderia contar com créditos externos, num Examinemos, detidamente, as consequências da crise
momento em que o Governo brasileiro, incapaz de saldar os cafeeira e da crise financeira do Estado em função das medi-
compromissos existentes, propunha aos credores internacio- das de política econômica tomadas.
nais um Funding Loan. Tentemos, em primeirc lugar, analisar os efeitos de uma
A única solução consistia em admitir a crise cafeeira. queda prolongada dos preços sobre a economia cafeeira. Con-
Murtinho, o Ministro da Fazenda, ponderava: vém distinguir, de início, a capacidade produtiva em
opera-
deve ser considerada em relação ção, capacidade produtiva em construção e acréscimo desejad
“A lavoura de café o
da capacidade produtiva. A capacidade produtiva em
ao consumo atual como composta de duas partes, uma opera-
ção compõe-se, obviamente, dos cafeeiros que já produzem.
constituída em terrenos e climas superiores por agri-
As empresas cafeeiras do núcleo produtivo enfrentam a mes-
cultores inteligentes e em boas condições econômicas,
ma estrutura de
outra representada pela cultura em terrenos e climas custos monetários (folha de salários, custos
de beneficiamento, custos de iransportes,
inferiores por agricultores rotineiros, em más condi- etc), mas, dado o
preço interno, auferem distintas margens de lucro. Assumi-
ções econômicas”. 6%
remos, aqui, que os produtos marginais, desde que localiza
| dos
E concluía: em terras de baixa fertilidade e possuindo um estoque com
“Convicto de que a intervenção oficial só poderia elevada idade média em relação à de máxima produtividade,
aumentar nossos males, o Governo deixou que a pro- conseguem apenas cobrir os custos monetários. A taxa
de
dução de café se reduzisse por seleção natural, deter- lucro, levando em conta a depreciação, é, portanto, negativa.
minando-se, assim, a liquidação e a eliminação dos Os produtores intramarginais obterão taxas de lucro positi-
que não tinham condições de vida, ficando ela nas vas, variando diretamente com a fertilidade do solo e inver-
mãos dos mais fortes e dos mais bem organizados samente à idade média do estoque de cafeeiros em relação à
para a luta”. 6) “ideal”,
A capacidade produtiva
Este o caminho encontrado para a crise cafeeira. Para fa- em construção, como se pode
depreender, é integrada pelos cafeeiros plantados, mas
zer frente à desesperadora situação das finanças públicas, a ainda
do não produtivos. Os custos monetários se reduzem à folha
tabeleceu-se, de um lado, a tarifa-ouro, exigindo-se 10% salários e às despesas financeiras, uma vez que,
de
dos impostos à importação em espécie, subindo esta em maior ou
valor
menor medida, o sistema bancário terá sido
percentagem 5% ao ano até que se estabilizasse º câmbio; e, utilizado, seja
Para o custeio dos salários, seja para a aquisição das
de outro, incrementou-se a carga tributária incidente sobre terras.
O acréscimo desejado da capacidade produtiva refere-s
e, por
inistro
Ório do Minis da Fazenda, R. de Ja sua vez, ao número de pés que se pretende plantar e
34) Cf. J. MURTINHO, Relatóri depende,
Gero Imprensa Nacional, 1899, p. Xv, apud C. M. PELAEZ, como é natural, da rentabilidade esperada do investimento.
. Cit, P.97. .. )
(5) e F MURTINHO, Relatório do Ministro da Fazenda, R. de Ja-
neiro, Imprensa Nacional, 1900, pp. 3/4, apud C. M. PELAEZ, G6) Para a reforma tributária, ver A. VILLELA e W. SUZIGAN,
Op. cit. p. 40. Op. cit. pp. 313, 334/3936 e 418,
TARDIO 137
O CAPITALISMO
136 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
,
complexo ex portador cafeeiro
A crise atravessada pelo da do que se
isto muito mais limita
ainda que grave, foi por é que as colheitas
à primeira vista. Prova
é levado a pensar
sensivelmente no pe-
e o volum e de exportações cresceram o de
or das receitas de exportaçã
ríodo, recup erando-se o val açõ es da
Com o “boom” de export
tant d ida ser absorvida a os
105 e segs.
RLSITO OS CENTRAL
serie saio A
é ER:o
o ay
ia raças am e e
RES Semi me na mo
O CAPITALISMO TARDIO 139
CARDOSO DE MELLO
138 JOÃO MANUEL
exportaçõe ões
ram cerca de 15% do gasto federal entre 1903 e 1913) em ao bom desempenho das
pôde manter-se, devido A ameaça da
infra-estrutura de transportes e melhoramentos urbanos, para
ent rad a sub s tan cia l de capitais externos.
e à ão
sanar as carências resultantes de quase uma década de para- porém, em 1913. o
A expansão detém-se, 1 d O no
importações
lisação dos investimentos públicos federais. Tal esforço de move uma corrida às ea :
onais do café,
investimento foi possível por duas razões: 1) pela expansac
esapo. ima ueda dos preços internaci
ue dm o N
ial inédito. a
tando am déficit comerc
firme da receita federal, estimulada pela recuperação
ata que a fazei
da atividade o
econômica após 1903 e pelo crescimento das fuga de capitais para O poss :
exportações, atribuível ao bom desempenho da economia ca- ctiva do con ;
à =
cambial e monetária,
feeira e da borracha; 2) pela retomada do endividamento mn o cravidade da situação N a
isas, cri ou se
externo, que teve papel fundamental. & ão da procura de div
ai pa a a intensificaç ai na
de liquidiem, per
É indiscutível que o gasto público esteve na raiz da extraordinária carência
recuperação da economia que se inicia em 1903, contribuindo pagamento devido ao mo
meios de
marcadamente para a expansão que teria começado por volta Conversão:
de 1906 e se acelerado, de modo significativo, em 1908/9 (não De asta a-
lem
uma ij
idéia desse moviimento
“Para se ter
é possível precisar mais à luz das informações disponíveis). É es da Caixa de Convers
brar-se o que as emissõ sis eem 1912
s
de força de ira-
“depositou” nas cidades um “excedente”
ele próprio, as
balho. de modo gue o capital cafeeiro cria,
Mais im a
nu portante, porém, se revelou a lei b Er
1888, que estabelecia 5 pluralidade à Uaiei bancária de ente.
a
quente tecla
orientação à
imnco alidade de emissões e
emissões, e a subse- condições de reprodução do capital-dinheiro exced
é
republicano:
Mação imprimida 4
a
matóris
matéria
a
pelo governo No entanto. = disponibilidade de trabalhadores livres
da força
não é suficiente para que se assegure à reprodução
cia de ah-
NS
101 implementada
id de trabalho. que dependeria, ademais, da existên
a le; bancária de Na medida em
do
aaqaestabelecime “d68, permitin- mentos e dos manufaturados de consumo.
nio de bancos de criou pre-
que a agriculiura comercial de alimentos não se
emissão. As notas
arias substituiriam
as notas do Tesouro e reso
l dois itens básicos componentes do custo de
viamente, os
Ni
veriam o problema de
escassez de dinheiro. Mas da força. de trabalho dependeriam do próprio
gulamentação da execução
aa reprodução
da reforma bancária
existiu que as emissões fos
sem feita s em prazo muit (6) Cf. A VILLELA e W. SUZIGAN, Op. cit., p. 104,
Para maiores
o
curto. Em apenas dois anos RAS, La Poli-
(1890-91), foram emitidos detalhes sobre o Encilhamento ver J. P. CALOGE
Nationale,
tique Monetaire du Brésil, R. Janeiro, Imprimerie
(52% * CE A. VILLELA e W. SUZIGAN, Op. 1910, pp. 179 e segs.
cit, p. 103. (54) Cf. A, VILLELA e W. SUZIGAN, Op. cit., pp. 104/105.
MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 147
146 JOÃO
ae ra wma co85- 7
ó
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eu
13
=3
PARRA Ama ne mma mem
148 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO TARDIO 149
O CAPITALISMO
lação em níveis muito mais baixos que Restam dlpor explic itar as razoes da aceleração
sa da taxa de
os anteriores, porém; e ses o + ,
nada despreziveis. Foi possivel, por l após
strial,
1
pos 190% no
it expansei
tl expan
DO Ga |
O 19ID
Capati e
isto, diversificar a pro- acumulação
acumu à Austria
laçãoE indus
O:
d ução, ingressando-se firmemente
na produção de alimentos, dade para importar principalmente entre 1908 « a
que cresce a tal ponto que, já na itaiss extern os,
externos , tanto
tanto 1 a a o,
para finan-
ne |
a a de capitai
À |
Primeira Gr ande Guerra, daeentrad
o
ac
aceler
e 1
cão
ação
Ed
da
15 . ,
grantes, verbi gratia após 1908; 3) forte expansão da agri- contra a Caixa de Conversão. De outro lado, como as impor-
cultura de alimentos, após 1906; 4) substancial elevação do tações de bens de capital o indicam, o setor industrial após
gasto público após 1907. Dadas estas condições e sabendo- 1910 sobreacumulou, desde que não se pode pretender que
se, ademais, que a taxa de salários se manteve praticamente a demanda tenha se expandido às mesmas taxas que a capa-
constante, bem como constante permaneceu o custo dos meios cidade produtiva. Estes os dois problemas que a Primeira
de produção importados, dada a estabilização da taxa de Grande Guerra veio resolver.
câmbio, fica claro que a taxa de lucro deve ter se elevado Não custa repetir que a falta de liquidez foi superada
durante todo o período, na medida em que a importação de por: 1) emissões destinadas a financiar os déficits incor-
equipamentos mais eficientes acrescia a produtividade da ridos pelo Tesouro Nacional; 2) emissões autorizadas para
força de trabalho e que seus ganhos eram inteiramente levar a cabo o “Programa de Assistência à Produção Nacio-
apropriados pelos capitalistas. Deste modo, o crescimento nal”; e 3) pelo poder concedido ao Banco do Brasil para
industrial há de ter-se acelerado, continuamente, a partir de efetuar operações de redesconto,
1905, ganhando impulso decisivo de 1907 em diante. As
Examinemos, agora, o comportamento da demanda por
cifras de importação de bens de capital não deixam a menor produção industrial nacional.) É preciso admitir, desde
sombra de dúvidas: logo, que a demanda por wage goods gerada pelo complexo
exportador cafeeiro não deverá ter-se mantido nos mesmos
Importação de Bens de Capital
(1939 = 100) níveis do pré-guerra: se bem o nível de emprego não fora
afetado, o salário real (supondo que estivesse acima da
Ano Índice de quantum subsistência) certamente caiu, provocando a diminuição da
massa de salários. De outro lado, apesar do esforço em-
1901 56,8 preendido, o gasto público não foi capaz sequer de se manter
1902 31,7
1903 38,0 em termos correntes.
1904 41,3
Tudo leva a crer, portanto, que a sustentação relativa
1905 62,3
1906 66,1 do gasto público e a defesa da economia cafeeira não expli-
1907 93,0
cam nem a manutenção da demanda, quanto mais seu cresci-
1908 96,4
1909 102,9 mento, que devem ser atribuídos a outros fatores. Em pri-
1910 118,7 meiro lugar, convém levar em conta um componente autô-
1911 153,6
1912 205,3 nomo bastante significativo: as exportações não-tradicionais
de alimentos e produtos industriais, que encontraram con-
Fonte: A. VILLELA e W. SUZIGAN, op. cit., p. 437. dições de penetrarem nos mercados externos devido à cons-
tituição de “economias de guerra”. Gozando desta situação
Mil novecentos e treze, no entanto, marca nitidamente
a interrupção da expansão, aprofundando-se a crise em 1914. (60) A importância da Primeira Guerra Mundial para o desenvolvi.
mento industrial tem despertado acesa controvérsia: Cf. Roberto
As raízes da crise industrial encontram-se, em primeiro Simonsen, “Evolução industrial do Brasil”, em Evolução Indus-
lugar, na perturbação financeira causada pela contração dos trial do Brasil e Outros Estudos, S. Paulo, Editora Nacional,
1973, pp. 5/52; W. Dean, Op. cit.; A. Villela e W, Suzigan, Op. cit.;
meios de pagamento, que resulta da “corrida” por divisas A. Fishlow, Op. cit.
TARDIO 157
O CAPITALISMO
156 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
período de o GA
1914/15 e 1918/19, quanto no 'gindo
excepcional, a participação dos bens de consumo não dui e 1924/25 e SA
sobe para 18,2 milhões entr a qua ndo
veis na pauta de exportações sobe de 3,8%, em 1901/13, para anos 1929/30 a 19
242 milhões de sacas nos
15,2%, em 1914 e 1918. Ademais, o papel da substancial segunda metade da déca
os cafeeiros plantados na 1 (62)
queda da capacidade para importar, aliada às dificuldades produtivos.
se tornaram plenamente.
físicas de suprimento, não é de se desprezar. Elevou-se, em
ifi caram-se condiçiçõões
extre mamente
muito, o poder de competição externo da indústria, permi- Naturalmente, verifi
umu ,
tindo reservar uma maior fatia do mercado interno para a favorável
café. A
i
árteeis
fért Pr óprias ao
ade de terras balho
produção nacional.
também, do lado da oferta de força de tra m
reu
.
Mundial contribuiu para a recuperação da crise industrial economia cafeeira teve que
ativa dos Estados RN
de 1913/14 e a posterior expansão da produção, que se fez vegetativo da população 1 nte rna s, se
õ ]
rações
i gr
j o, tanto pelas mig
lei da, aléá m dist
beneficia
absorvendo capacidade produtiva gerada anteriormente. A est ran gei ra,
, quanto pela imigração
pressão da demanda interna e externa sobre a capacidade parecem ter-se acelerado da sofrida du-
a se recuperar da que
instalada por alimentos, conjugada à elevação dos preços de que já em 1920 começa | na
Mundial
importação, gera fortes pressões inflacionárias, que, sancio- rante a Primeira Guerra ai coc
striCou
os exp
€ plexos ortadores6 , oO setor indu
expor
nadas por uma política monetária expansionista, provocam a Os demaisis com p na pou co
de alimentos é matérias
eievação do nível de preços. Como os salários dificilmente a agricultura mercantil “disputar o ler
de
acompanharam os preços dos bens manufaturados de con- o por isto, foram incapazes ca-
com ple xo oexportador café
sumo industrial e, também, porque os preços internos sobem mento
es fo a de trabalho com U
toda forç e
conta que as expor am
mais que os preços de importação, as margens de lucro do feeiro. Basta tomar em n e ho
l, em 1919, para, em
setor industrial devem ter-se ampliado consideravelmente. passam de 56% do tota E
do década, para que ná
Devido, no entanto, à existência de capacidade ociosa, à 70% na segunda metade tame
eito do medíocre compor
volta ao funcionamento de empresas postas fora de combate qualquer dúvida a resp revelar suas
adores. E é suficiente
an crise de 1913/14, e às dificuldades de importar, a taxa de demais complexos export e
que SE avalie o rel: ativament
acumutação de capital produtivo manteve-se em baixos níveis, tax le crescimento ; para (63:
=
o empenhnao da uçãoão agrí
vroduç
da prod asi cola e industrial.
à alta taxa de acumulação financeira se exprimiria fraco des
e | .
na de- dos 20 como um todo
manda por bens de produção exercida nc imediato . E avra: tomada a década
post- avo esxortnoriadadoor
r cafoeeiro otro
mos vor
u-s e
amenie O com- plexo exp
guerra. pratica o % a
no
no entant
ema ,
ntoo, a meia
mic c
co. aiE rmativiva,a,
Háá nestata afi a
inâ
din âmi
e a A
admitir que, durante O
2. Capital cafeeiro e capital dade, pois teríamos de da ei
industrial: a dinâmica da € ontariai com uma | alta ; capaci
acumulação entre 1919 e 1923 onoÉ miai cafeeira
À
re
teria sido capaz de
ção fechada”. Quer dizer,
n
“
“q quanto O
tanto O capital constante
O complexo exportador cafeeiro volta a conhecer, Euzir 4ampliadamente
prod
nos
anos 20, uma extraordinária expansão: a produç . asa de
ão média, Op. cit. p. 210.
que se situara próxima aos 14,1 milhões de sacas
LAEZ.
de produto de A. FIS HLOW, Op. Cit. D- 6
tanto entre (63 CE as os cit, Apêndice A e passim.
Op.
A. VILLELA e W. SUZIGAN,
6D Cf. A. VILLELA e W. SUZIGAN, Op. cit. p. 138.
os CO ITRAL |
| umpod
A
ra
ER
ant
JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 159
158
poderia deixar de se apoiar para a reprodução da força de cana. Novamente, o remédio encontrado foi “valorizar” o
trabalho tanto na indústria, quanto na agricultura mercantil café. Recolheram-se 4.500.000 sacas, mediante empréstimo
no período. tomado à Carteira de Redesconto do Banco do Brasil, depois
de alimentos, que crescem bastante
no entanto, “o café dará para tudo”: consolidado, juntamente a outros empréstimos menores, me-
Entre 1924 e 1929,
as exportações sobem para uma média de 93,5 milhões de diante o Empréstimo de Garantia do Café, concedido pelos
74,6 entre 1919 e 1923, as relações Rotschild, por Schroeder e Baring Brothers, em 1922, A Ter-
libras anuais, contra
das de capitais ceira Valorização, e ainda as safras nada excepcionais de
de troca melhoram substancialmente, e as entra
em muito. Submetidas a uma implacável 1921/22 e 1922/23, aliadas à retomada do crescimento da
externos aumentam
economia norte-americana, em 1922, conseguiram deter a
concorrência, nem a indústria nem a agricultura de ali-
puderam se expandir mais rapi- baixa ainda que muito relativamente, e ainda promoveram.
mentos e matérias-primas
a ligeira recuperação dos preços internacionais, em 1922 e
damente.
de realização foram alta- 1923. Os preços internos, no entanto, sobem substancialmente
Por outro lado, as condições
na década de 20, de 1921 a 1923, devido à profunda desvalorização da taxa de
mente estimulantes, não somente porque, câmbio, que passa de 16,5 para 44,3 mil réis por libra, Villela
ivamente, devido à
os mercados centrais crescem significat e Suzigan explicam por quê:
industriais, como porque
prosperidade de que gozam as nações
à “Valorização” do
se recorreu durante quase todo o tempo “Isso fo aumento das importações), aliado à queda
café. Senão, vejamos. no preço e volume exportado de café, em 1920/22,
da safra de 1917/18 indicava um diminuindo a receita de exportações, levou ao de-
Quando a floração
de sacas, O mesmo que
excedente de produção de. 4.000.000
saparecimento do saldo da balança comercial em
decidiu-se pela Segunda 1920/22 e gerou um déficit em 1920/21, trazendo
provocara o Acordo de Taubaté,
os do Tesouro Nacional,
Valorização”, que, recorrendo a crédit
(dadas as necessidades de remessas de capital) como
No entanto, em seguida, em junho consequência profundo desequilíbrio na balança de
recolhe 3.100.000 sacas.
seriamente
de 1918, sobreveio forte geada que danificou pagamentos... Assim, o saldo da balança comercial
e, com isto,
perto de 40% da capacidade instalada. Porqu em 1923 foi, na realidade, muito menor, caindo de
afetadas as safras de 1918/19 e 1919/20 e, também, &. 22.571.000 para £ 10.571.000. Só a dívida externa
ficassem
procedessem à recomposição de seus tinha uma despesa de & 14 milhões em 1923 e as
porque os operadores
remessas particulares eram de £. 12 milhões. Desse
IM NETTO, Op. cit. Pp. 92
(6% para as Valorizações ver: A. DELF modo, tem-se uma idéia do vulto do déficit do
e segs. C. M. PELAEZ, OP. cit., pp. 210.
TARDIO 161
160 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO
balanço de pagamentos naquele ano, superior a £ um fundo de defesa permanente, constituído por empréstimo
15 milhões, que acarretou uma grande desvaloriza-. residiria numa taxa sobre o café
externo, cuja garantia
ção da taxa cambial”.&) transportado no Estado de São Paulo.
de 1925/26 e 1926/27,
O inegável sucesso das operações valorizadoras foi aca- A ação do Instituto, para as safras
quotas mensais, me-
lentando a idéia de uma política de defesa permanente limitou-se à subdivisão das safras em
a retenção dos esto-
Quer dizer, não mais a intervenção
para impedir que os diante os reguladores, financiando-se
Paulo. Quando se
preços caíssem abaixo de um certo nível numa situação de ques através do Banco do Estado de São
d que, certamente,
crise, mas a destinada a manter o preço do café num patamar prenuncia para 1927/28 uma safra recor
elevado. A única medida efetiva tomada até 1924, quando a do mercado cafeeiro, o Ins-
romperia O relativo “equilíbrio”
Defesa Permanente o que ficou conhecido como a
estava a cargo do Governo Federal foi tituto resolve empreender
rado num empréstimo
a construção de armazéns reguladores, para impedir que a “Valorização de Rolim Teles”: esco
chegada em massa Lazard Brothers, concede
do café aos mercados pressionasse para externo, contraído em 1926 com
saca aos agricultores,
baixo os preços. Esta medida teve bastante êxito, pois a ela um adiantamento de 60 mil réis por
ução da “zona nova” €
deve ser atribuída a elevação dos preços internacionais em quase a metade dos custos de prod
”; com isto, os preços
1924. No entanto: cerca de um terço da “zona velha
e 1929, para o que
“em breve os lavradores compreenderam que todo internacionais mantiveram-se em 1928
safra de 1928/29.
o peso da defesa estava sobre suas costas porque os contribuiu a relativamente reduzida
favoráveis nos mercados exter-
conhecimentos emitidos pelos armazéns reguladores Em suma, as condições
explicam por que,
não eram facilmente negociáveis, uma vez que a nos e a “política de defesa permanente”
s internacionais sobem
ordem de despacho para o porto durava mais de 90 apesar do aumento da oferta, os preço
e se mantêm até 1928
ou 120 20 dias,
dis praze máximo
áxei concedido pelos bancos para 17,5 cents por libra, em 1924,
internos, no entanto,
para efeitos comerciais”.
(69) em torno de 20/21 cents. Os preços
o menos espetacular,
até 1926, têm uma evolução um pouc
Clamava-se que a Defesa Permanente se transferisse devido ao aumento
para o Estado de São Paulo, o que veio efetivamente a ocorrer desde que a taxa cambial se valorizou,
entrada de capitais ex-
das exportações e à aceleração da
em
un novembro bro de de 1924,4, com com a criação
criação dodo Instituio
Institui do )taie
Café dedr inuasse scorrendo, fo!
são Paulo ternos. Para impedir que isto cont
operaria nos mesmos
criada a Caixa de Estabilização, que
eiOq Enstituto
stituto definiu
: jniu as política
iti fese perrmanente
de defese 1 nas de câmbio foi des-
moldes da Caixa de Conversão. À taxa
seguintes bases: 1) g aÇ
regularização cias
das entradas
entrad de café Ê no em torno de 40
valorizada em 20%, em 1926, e sustentada
porto de Santos, mediante a retenção em armazéns e limi-
tação do transporte; 2) concessão de empréstimos a j mil réis a libra, até o colapso de 25.
e realização a
Analisadas as condições de acumulação
baixos sob o café depositado nos reguladores; 3) com va de é possí vel concluir:
café sempre que fosse julgada necessária para a contem ão que esteve sujeita a economia cafeeira,
de 1919 a 1921,
da oferta; 4) o financiamento do programa far-se-ia os preços internos mantêm-se elevados
com nível apenas ligeira-
crescem até 1925, permanecendo num
(65) Cf. A. VILLELA e W. . SUZ SUZIG i (67 Para a Política da Defesa Permanente
ver A. DELFIM NETTO,
(66) Cf. A. DELFIM NETTO, Op. E OP Site pp. tê/819. Op. cit., pp. 115 e segs. e C. M. PELAE Z, Op. cit.
162 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 163
mente inferior até 1929; como os salários monetários não O desenvolvimento industrial nos anos 20 está marcado,
devem ter subido no mesmo ritmo até 1925, as margens em primeiro lugar, por profunda modernização da indústria
de lucro se ampliaram substancialmente e, então, se esta- de bens de consumo assalariado. Examinemo-la rapida-
bilizaram daí em diante (supondo que os salários monetários mente.
e reais se mantiveram constantes). É interessante começar recordando que, durante a Pri-
Lança-se, agora, alguma luz sobre o problema das arti- meira Guerra Mundial, apesar da taxa de lucro efetiva ter-
culações entre a acumulação cafeeira e o caráter da política se elevado, o setor industrial foi duramente atingido pelas
econômica do Estado. Entre 1919 e 1923, não é difícil en- dificuldades físicas de suprimento de bens de produção e
tender que há estreita solidariedade “direita” entre a ex- pela falta de capacidade para importar. Quer dizer: Ge um
pansão cafeeira e as políticas monetárias expansionistas, em lado, reforçou-se, em muito, a capacidade financeira das
boa parte resultantes das políticas de defesa, ou entre a empresas, e, de outro, “acumulou-se” demanda por reposi-
expansão cafeeira e a política cambial. O que queremos ção, tanto mais se tenha em conta que, nos anos do Conflito,
sublinhar, porém, é que o estímulo decorrente da política os equipamentos foram sobreutilizados. Era natural, por-
econômica (monetária, cambial e de gasto público) sobre o tanto, que, escoradas nos lucros dos anos anteriores, as em-
setor industrial e a agricultura mercantil de alimentos não presas tratassem de exercer a “demanda reprimida”, numa
conflitou com a acumulação cafeeira, senão, mesmo, que a situação de desafogo cambial e de barateamento dos equipa-
sancionou, ao ajudar a garantir a reprodução do capital mentos, provocado pela valorização da taxa cambial. Além
variável cafeeiro, sem promover qualquer efeito perverso disto, as expectativas de lucro, numa situação de salários
sobre as margens de lucro do complexo exportador. A partir reais constantes (admitamos), e diante da possível intro-
de 1924, no entanto, o que se requer é a compressão dos dução de novos equipamentos mais eficientes, devem ter
custos de reprodução da força de trabalho ou, ao menos, estimulado, em muito, a taxa desejada de acumulação.
sua manutenção. O complexo cafeeiro, dada sua alta capa- Ocorre, porém, que a demanda por bens de consumo assa-
cidade de acumulação e de financiamento, e ainda a subida lariado não há de ter crescido, entre 1919 e 1921, às mes-
do poder de compra das exportações e o incremento da mas taxas que a capacidade produtiva, porque tanto a
entrada de capitais externos, podia dispensar não somente economia cafeeira atravessou em 1921 uma situação bas-
uma política monetária expansionista, como o crescimento tante difícil, quanto o gasto público se manteve praticamente
mais rápido do setor industrial e da agricultura de alimentos. constante entre 1920 e 1921. Nestas condições, em 1921, a
Eliminaram-se os déficits orçamentários e a política mone- concorrência intercapitalista se aguda, as empresas mais
tária pautou-se por “critérios conservadores”, de modo a débeis são eliminadas, a produção cai e os preçes diminuem.
não pôr em risco os interesses cafeeiros. Em seguida, isto é, em 1922 e 1923, a produção cresce não
Fixemos nossa atenção, em seguida, sobre o movimento somente “enxugando” capacidade ociosa, mas, também, com
da acumulação industrial. ampliação da capacidade produtiva, respaldada pelas mar-
gens de lucro das empresas sobreviventes, que se manti-
(68) As séries de Produto Industrial de A. VILLELA e W. SUZIGAN veram em níveis altos. Do lado da demanda, o crescimento
e de FISHLOW apresentam não poucas divergências. E preciso,
portanto, receber com cautela as considerações que fazemos a industrial é, por assim dizer, sancionado quer pela expansão
seguir, baseadas, também, em todas as outras indicações sobre cafeeira, quer pelo acréscimo do gasto público, em condições
o desempenho da economia.
O CAPITALISMO TARDIO 165
164 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
“(Em 1924) inúmeros privilégios foram concedidos atingiu as economias líderes. Ao contrário, as vicissitudes
às empresas que produzissem pelo menos 30 mil do complexo cafeeiro explicam-se, antes de mais nada, pelas
toneladas e que utilizassem exclusivamente matérias- contradições do processo de acumulação do capital cafeeiro,
primas e combustíveis nacionais. Um dos privilégios suavizadas e, simultaneamente, aprofundadas pela Política
mais importantes foi a isenção de taxas aduaneiras Econômica do Estado.
sobre maquinaria e uma série de equipamentos ne- A “política de defesa permanente”, ao manter a taxa de
cessários à
manufatura do cimento, assim como a lucro da agricultura cafeeira em níveis extraordinariamente
isenção do imposto de consumo. A Marinha Mercante elevados, por vários anos, promoveu uma enorme expansão
e as ferrovias federais garantiriam, no transporte de da capacidade produtiva: apenas para que se tenha uma idéia
maquinaria e matérias-primas, tarifas especiais aos da magnitude do crescimento, basta dizer que, entre 1928/
produtores”. Cb 29 e 1933/34, verificaram-se nada menos de três safras supe-
Penso, porém,que a implantação da indústria de cimento riores a 28 milhões de sacas.
está presa, essencialmente, a uma estratégia de ocupação a Por outro lado, ao elevar os preços internacionais do
longo prazo de uma faixa substancial do mercado brasileiro, produto; conduziu, também, a uma grande expansão da capa-
cujas expectativas de evolução, naquela altura, não deveriam cidade produtiva externa, acirrando a concorrência e mi-
deixar de ser alentadoras. Além disto, muito provavelmente, nando, gradativamente, a posição de quase-monopólio des-
os equipamentos transferidos para o Brasil estariam inteira- frutada pelo Brasil. Delfim Netto, em seu trabalho clássico,
mente amortizados. São, talvez, estas razões que explicam esclarece suficientemente a questão:
por que a Companhia Brasileira de Cimento Portland decidiu “O raciocínio central da defesa era o ajustamento
ampliar substancialmente sua capacidade produtiva em 1926 entre a oferta e a procura mundial do produto, pro-
e 1927, ainda que com notável capacidade ociosa. duzido artificialmente pelo Brasil para a sustentação
Em suma: o desenvolvimento industrial dos anos 20 do nível de preços. Como surpreendemos num rela-
salienta-se, simultaneamente, por uma profunda moderniza- tório do Presidente da República, calculava-se o
ção da indústria de bens de consumo assalariado e pela dife- consumo mundial provável e dele se subtraía a pro-
renciação da estrutura industrial, com a pequena indústria dução exportável de nossos concorrentes. O exce-
do aço ganhando forças e com a indústria de cimento se dente seria liberado pelo Brasil. Para garantir o
implantando. Ambos os fatos teriam enorme importância nível de preços, o Brasil assumia, assim, voluntaria-
quando a economia brasileira se recuperasse dos efeitos da mente, a posição de fornecedor residual. O que
crise de 29. nunca os defensores da defesa compreenderam foi
o fato de que a sustentação de preços representava
Nem sempre se tem compreendido, pelo menos com a
um estímulo fabuloso e um mercado inteiramente
suficiente clareza, o caráter da crise enfrentada pelo com-
plexo exportador cafeeiro a partir de outubro de 1929. Deve
aberto a nossos concorrentes”.
ficar bem claro que a crise não resulta da mera transfe- E, portanto, a existência de uma grande redundância de
rência a uma economia reflexa da Grande Depressão que capacidade, concentrada no Brasil, que explica, nuclearmente,
"t. C.M. PELAEZ, Op. cit., pp. 202-203. (2 Cf. A . DELFIM NETTO, Op. cit., p. 170.
e E a. a E
O CAPITALISMO TARDIO 169
168 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
a SÃO À im
seria suficientemente grande para que estes aban-
primários que importavam de outras nações. Com isto, a pro-
e-
dução africana cresceu durante toda a década dos 30, à donassem as plantações. Somente então se restab
a do
teceria o equilíbrio entre a oferta e a procur
a
sombra de tarifas preferenciais elevadas.!
Esclarecido este ponto, examinemos a crise e os meca- produto”. 9%
que,
nismos que explicam a recuperação, Haveriam de ser eliminadas, portanto, as empresas
monetá rios variáve is
A partir de outubro de 1929, começa a ruir o sistema de a cada momento, produzissem a custos
houves sem
defesa posto em prática pelo Instituto Paulista do Café. E se superiores aos preços e as que, na expansão,
insol-
esboroa não somente porque a demanda estivesse desfalecida, recorrido ao financiamento bancário e se mostrassem
constru ção da nova capacid ade
mas, também, porque o Governo Federal decidira abandonar ventes. Do mesmo modo, a
partir de um certo
o café à sua própria sorte. Washington Luiz, preocupado em produtiva seria inteiramente paralisada, a
salvar a Caixa de Estabilização, passara de ardoroso defensor momento, uma vez que as expectativas de lucro se dissipa-
da ação do Instituto a intransigente crédulo dos mecanismos ram inteiramente. “chão” da crise seria alcançado a um
O
nte
de mercado. preço internacional e interno que fosse apenas suficie
para cobrir os custos variáveis monetários e o consum o tcapt-
É, pois, interessante especular sobre a profundidade e
a duração da crise econômica brasileira supondo que: 1) talista de todas as empresas em funcionamento. E não poder
o Estado se abstivesse de qualquer intervenção no mercado restar nenhuma dúvida sobre a profundidade da crise. os
de
cafeeiro; e 2) o Estado perseguisse e efetivasse uma política preços internacionais do café caíram efetivamente cerca
mercad o de
fiscal ortodoxa, isto é, de equilíbrio orçamentário... 60%, entre 1929 e 1933, apesar da retirada do
O ajustamento entre a demanda externa e a oferta seria milhares de sacas. Com isto, o ajustamento da agricultura
produzido através do ajustamento do “estoque de capital”, cafeeira seria, certamente, alcançado à custa da destruição
isto é, via destruição da capacidade produtiva que se reve- de grande parte da capacidade produtiva instalada, de eleva-
lasse excedente. A queda dos preços externos acabaria se do Brasil, 11: edição,
4 Cf. C. FURTADO, Formação Econômica
S. Paulo, Editora Nacional, 1971, p. 188.
(3) Cf. A. DELFIM NETTO, Op. cit., pp. 139 e segs.
JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDK:. 171
170
díssimo grau de desemprego e queda substancial do salário lhantes, dada a situação reinante no mercado internacional de
monetário. produtos agrícolas. Do mesmo modo, eram bastante limitadas
Da agricultura cafeeira, a crise propagar-se-ia a toda as perspectivas de recuperação mais pronta a partir do setor
a economia. Não cremos necessário examinar, com mais industrial. Em primeiro lugar, porque o investimento em de-
, preciação teria efeitos dinâmicos bastante limitados, pois que
vagar, os mecanismos de propagação. A depressão atingiria
“num primeiro momento”, o segmento urbano do complexo filtraria para o exterior grande parte de seu poder de expan-
cafeeiro, tanto pela queda da demanda de serviços comer- são. Em segundo lugar, conforme já sublinhamos, seria
ciais-financeiros e de transportes, quanto pela insolvência das extremamente difícil imaginar um bloco de inovações capaz
empresas cafeeiras. “Em seguida” o corte no consumo atin- de arrancar a economia da prostração.
giria a indústria de wage goods e a agricultura comercial Parece lícito concluir, portanto, que, abstendo-se o Estado
de alimentos e matérias-primas, o que acarretaria novos de qualquer intervenção no mercado cafeeiro e se efetivando
efeitos perversos sobre a indústria de bens de consumo assa- uma política fiscal ortodoxa, tanto a depressão teria sido de
lariado e sobre a agricultura de mercado interno, etc. As extraordinária profundidade, quanto a economia brasileira
Finanças Públicas, afetadas pela queda das importações e dificilmente se recuperaria integralmente até o fim da
pelo rebaixamento do nível de atividade dos “setores in- Segunda Guerra.
ternos”, desempenhariam (esta é a hipótese) um papel pas- No entanto, a depressão não assumiu proporções catas-
sivo, cortando-se as despesas até o nível das receitas. tróficas, se bem que possa ser considerada severa, uma vez
que o produto interno bruto caiu cerca de 4% entre 1928 e
Importa, ao contrário, ter bem presente c momento em
1931, o ponto mais baixo. Mais ainda, a recuperação foi
que seria atingido o ponto mínimo da depressão. Para a
rápida, especialmente em relação a outros países, situando-
agricultura cafeeira, como se viu, o “chão” se estabeleceria
se o PIB já em 1932 acima do nível de 1928. 0) Tentemos
no ponto em que o preço fosse capaz, para todas as empresas
explicitar os mecanismos de recuperação que atuaram de
em funcionamento, de cobrir os custos monetários variáveis
da molde a conduzir a estés resultados.
e o consumo capitalista. Dada a severidade da depressão
indiscutivelmente ela imporia a toda a Não pode permanecer nenhuma dúvida de que a política
agricultura cafeeira,
economia seu ponto mínimo: a queda da demanda sofrida de defesa do café posta em prática pelo Estado tenha desem-
penhado o papel fundamental, ao assegurar a remuneração
pelo segmento urbano do complexo cafeeiro e pelo setor
industrial seria de tal ordem que o lucro ficaria apenas do café a preços internos que puderam, ao menos, cobrir os
ao consumo capitalista. O mesmo ocorreria em custos monetários variáveis e o consumo capitalista de grande
reduzido
parte das empresas cafeeiras intramarginais, e, deste modo,
relação à agricultura de mercado interno organizada em
sustentando relativamente o nível de operação e de renda
moldes capitalistas. A agricultura de alimentos e matérias-
do segmento urbano do complexo exportador.
primas fundada na pequena propriedade ou realizada no
Desde que a questão tem-se prestado a acesa contro-
interior do latifúndio regrediria à subsistência.
vérsia, convém examinar com algum cuidado de que modo
Cumpre, agora, indagar sobre a existência e o modo de
operou a política de defesa.
operação dos possíveis mecanismos automáticos de recupe-
ração. As possibilidades de uma rápida recuperação assen- (15) Ver as estimativas de A. VILLELA e W. SUZIGAN, Op. cit. e as
tada na agricultura de exportações não parecem muito bri- de A. FISHLOW, Op. cit.
SER
192 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO O CAPITALISMO TARDIO 173
Tão logo se manifestou a total impotência do Instituto O impacto expansionista das compras financiadas pelos
do Café, diante do esgotamento da capacidade de financia- créditos do Tesouro e do Banco do Brasil — de peso, aliás
mento do Banco do Estado de São Paulo e, também, do Salve- nada desprezível — não deve ser encarado apenas por sua
se quem puder de Washington Luiz, o governo estadual nego- participação relativa. Ao contrário, para evitar sérios equi-
ciou e obteve de quatro banqueiros internacionais emprés- vocos, é preciso não perder de vista que a política de defesa
timo de 20 milhões de libras esterlinas (720 mil contos), com é representada, conjuntamente, pela sustentação dos preços
o que adquiriu 3.100.000 sacas a 100 mil réis, sendo o res- externos, pelas desvalorizações cambiais e pelos efeitos anti-
tante empregado no refinanciamento de 13,5 milhões de depressivos das compras financiadas por créditos. O”
sacas. Se a importância nuclear da política de defesa do café
O Governo Provisório, após as tímidas providências da é insofismável, deve-se admitir a interveniência de outro
Gestão Whitaker, decidiu criar o Conselho Nacional de Café, mecanismo extremamente relevante. Não penso, é claro, no
que, através da compra e destruição de estoques, se encar- superávit da balança comercial como mecanismo de defesa
regaria da política de sustentação. Cumprindo seus objetivos, da renda interna. O superávit efetivamente resulta da falta
o Conselho Nacional do Café comprou café no montante de de demanda interna, que se traduz numa diminuição das
quase 30% da receita de exportação em 1931 e 1932, des- importações de bens de consumo € mais acentuadamente de
truindo :4,4 milhões de sacas entre maio de 1931 e feve- insumos e meios de produção geral ou de medidas da Poli-
reiro de 1933. Das despesas, 65% foram financiadas com im- tica Econômica destinadas a enfrentar a crise. À situação da
postos, e o restante com créditos do Banco do Brasil e do balança comercial é antes resultado da crise que uma medida
Tesouro Nacional. ex-ante tomada para combatê-la. Tenho em vista, ao con-
Foram exatamente estas compras maciças o eixo de toda trário. os déficits públicos de 1930 e 1932, que encontram
a sustentação do complexo exportador cafeciro. Em primeiro suas raízes nas despesas com a Revolução de 30, nos gastos
lugar, porque permitiram, diminuindo significativamente a com a “Guerra Paulista” de 1932 e no auxílio prestado aos
pressão da oferta, que se alcançassem preços internacionais Estados nordestinos assolados pela forte seca de 1930/33.”
mais elevados. Além disto, tornou-se possível que as desva- Em 1930, o déficit contribuiu, poderosamente, para deter
lorizações atuassem como mecanismo de defesa, atenuando, a queda da renda; em 1932, proporcionou 0 impulso decisivo
. : ; . de tisa o senior
mais ainda, a «queda dos preços internos Do contrário, para a recuperação. fouco importa constatar que o equilfori
abandonado o mercado à sua própria sorte, este mecanismo orçamentário não era perseguido pelo Estado. Nãc se pode
(os preços internacionais do café caem substancialmente mais ir contra os fatos: o comportamento efetivo do Estado
que os preços internos) perderia inteiramente sua efetivi- foi keynesiano em 1930 «e 1932, ainda que as intenções fossem
dade. Mesmo que tivesse sido financiada inteiramente com bem outras,
impostos, a aquisição dos excedentes teria desempenhado
um papel crucial. Mais ainda, como lembrou Fishlow, a carga contrário, os trabalhos de €. M. PELAEZ sobre a questão.
1D
o
do imposto à exportação há de ter recaído, em parte, sobre 8) O bapel do déficit público foi convenientemente sublinhad
este
por PELAEZ em seus trabalhos sobre a questão. Porém,
na
o consumidor estrangeiro, tendo-se presente a inelasticidade autor insistiu estranhamente não ter sido atingido intencio
efe-
da demanda de café. 09 mente, para concluir, de modo algo estranho, que a política
balança
tiva não foi Keynesiana. Quanto ao papel do déficit da A.
em Pelaez outro equívoco, como aliás sublinho u
comercial há
(06) Cf. A. FISHLOW, Op. cit., p. 28. FISHLOW, Op. cit., p. 29.
Conclusão
O objeto a que nos propusemos, plenamente conscientes
dos riscos a correr e das dificuldades a enfrentar, consistia
no estudo do processo de desenvolvimento econômico brasi-
leiro encarado como formação e desenvolvimento de um
certo capitalismo, quer dizer, de um capitalismo que nasceu
tardiamente.
A tentativa de revisão crítica partiu, em primeiro lugar,
de estudos existentes sobre nossa história econômica, das
visões globais, especialmente da notável Formação Econômica
do Brasil, de Celso Furtado, às monografias específicas mais
relevantes. Arrancamos, ainda, dos resultados teóricos da
Economia Política da CEPAL, a mais alta criação do pensa-
mento social latino-americano.
Não caberia aqui, por maçante, indicar, a passo e passo,
as conclusões a que chegamos, que não terão passado desper-
cebidas à leitura atenta. Gostaríamos de sublinhar, no
entanto, que a reinterpretação das linhas gerais da formação
e do desenvolvimento da economia brasileira decorrente da
investigação levou-nos, em simultâneo, a propor os contornos
maiores de uma nova problemática teórica.
Entendamo-nos bem, Não se trata de transpor os resul-
tados da análise do desenvolvimento brasileiro às demais
economias latino-americanas, como alguém, inadvertidamente,
poderia pensar (apenas para exemplificar: o significado da
escravidão negra não foi o mesmo em todos os países da
América Latina, o papel da imigração estrangeira na pas-
sagem para a economia exportadora capitalista foi insigni-
ao.
O CAPITALISMO TARDIO 177
176 JOÃO MANUEL CARDOSO DE MELLO
ficante em muito deles, enquanto que a expropriação de pode ser entendida sem se levar em consideração
tardatária
populações indígenas foi decisiva, etc.). O que pretendemos a dinâmica do capitalismo maduro?
dizer, isto sim, é que, a partir do estudo do capitalismo Mas, ao mesmo tempo, a História brasileira e latino-
tardio mais desenvolvido da América Latina, torna-se pos- de um determinado capitalismo, do
americana é a História
sível indicar teoricamente a direção em que se poderia re- tardio: sua especificidade não advém de surgir
capitalismo
por sua vez,
pensar a história econômica dos demais países latino-ameri- das entranhas da economia colonial, criatura,
m de gue
canos como a história do nascimento e do desenvolvimento do capital mercantil? Sua peculiaridade não prové
ompan hado de forças produt ivas
de capitalismos tardios. o capitalismo nasce desac
em que a esrand e
A nova problemática exprime-se, essencialmente, numa capitalistas? Sua originalidade não reside
surja conco-
diversa periodização do processo histórico e na produção de indústria pode surgir e se consolidar sem que
ção? Em
conceitos capazes de estruturá-lo em cada período. mitantemente um departamento de bens de produ
que, mesmo quando espoca, a industrialização pode se
A periodização (economia colonial — economia mercan- ta, a
til-escravista nacional — economia exportadora capitalista —
manter restringida? Em que, mesmo quando se comple
do Estado e
dinâmica da acumulação atrela-se às injunções
retardatária em suas três fases: nascimento. e consolidação com-
da graúde empresa oligopólica estrangeira, sem nunca
da grande indústria, industrialização restringida e industria-
portar-se na plenitude?
lização pesada), que aponta a direção do movimento da eco- é
Enfim, reversamente, a História do capitalismo
nomia, está complexamente determinada. Quer dizer, está
não pode forma r-se
determinada em primeira instância por “fatores” internos e, também a nossa História: o capitalismo
rial
sem o apoio da acumulação colonial; o capitalismo indust
em última instância, por “fatores” externos. Nem a História dução
aparece como singularidade irredutível, nem como a reali-
valeu-se da periferia para rebaixar o custo de repro
da força de irabalho quanto dos elementos compo-
zação monótona de etapas de desenvolvimento pré-fixadas,
tanto
quer
nentes do capital constante; ademais, dela se serviu
ainda que com alguns traços de rebeldia retidos pelo “semi”, industrial, quer como
como mercado para sua produção
“de caráter”, etc.; nem, muito menos, há ausência de História, financ eiro e, mais adiant e,
campo de exportação de capital
a que nos teria condenado nossa condição cubdesenvolvida
produtivo.
e periférica, como se nosso destino estivesse traçado desde desen
Assim colocada, a revisão crítica da formação e do
o descobrimento. Não: a História brasileira e latino-ameri- no
volvimento da economia brasileira, aqui proposta, abre,
cana é a História do capitalismo e, simultaneamente, a Histór ia. novas questõ es, re-
olano teórico e no campo da
História de nosso capitalismo. s. Se
equaciona velhos temas. sugere ampla gama de estudo
A História brasileira e latino-americana é História do assim é, estamos compensados de nossos esforç os.
capitalismo: a Economia Colonial não foi constituída no
movimento de seu nascimento? A passagem da economia
colonial à economia exportadora capitalista não é incompre-
ensível sem tomarmos em conta tanto a emergência do
capitalismo industrial quanto a transição do capitalismo
competitivo ao monopolista? Por acaso a industrialização re-
ua
mare sas
x
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Pr)
aa
O CAPITALISMO TARDIO 179