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ARTIGO

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O NAUFRÁGIO DO TITANIC E OS REFLEXOS PARA A


NAVEGAÇÃO MARÍTIMA ATUAL

Autor: Luiz Henrique da Costa Moreira


Professora: Monique de Siqueira Gonçalves

RESUMO
No início do século XX, empresas britânicas e demais empresas localizadas no continente
europeu disputavam a liderança para ver qual navio/empresa conseguiria cruzar o oceano
atlântico em menos dias. É nesse contexto que diante das circunstâncias, um acidente marítimo
ceifa mais de mil vidas, alertando todas as autoridades para com a segurança nas viagens
transatlânticas. Quais foram os erros? Quem negligenciou? São todas essas dúvidas que
discutiremos nesse artigo.
PALAVRA CHAVE: Naufrágio, Desastre, Incêndio.
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ANTECEDENTES, A CONSTRUÇÃO E OS MOVIMENTOS SEPARATISTAS


No ano de 2022, o naufrágio do RMS1 Titanic completa 110 anos e junto desses mais de um
século e uma década, muitas dúvidas ainda circundam aquele fatídico 14 de abril de 1912.
Muitos sobreviventes contavam em seus depoimentos histórias completamente divergentes.
Entre uma delas de que o navio não havia se partido, coisa que só ficaria provada em 1985,
durante uma caçada que diríamos não ser proposital. É que a pessoa que “encontrou” os
destroços do navio, o oceanógrafo Robert Ballard, conhecido por conta do achado, mas que
anos antes, precisamente em 1980, tinha encontrado e periciado dois submarinos nucleares que
afundaram no atlântico de maneira caracterizada pela própria marinha dos EUA como
“misteriosa”. Sabendo disso nos dias de hoje e reanalisando cada depoimento e cada versão
daquele dia, não é difícil encontramos conflitos de narrativas. Embora o RMS Titanic, um navio
que estava à serviço do correio britânico e que transportava mais de mil e duzentas pessoas
fosse o mais emblemático de todos, ele não foi o primeiro. Para entender tudo isso, devemos
voltar para o final do século XIX, onde expedições ao polo Norte eram conhecidas por serem
suicidas, pois se tratava de um território inóspito e desconhecido. Um caso que não muito é
lembrado ou discutido na história é a Expedição Fram (1893 – 1896), liderada pelo explorador
norueguês Fridtjof Nansen, que ficou à deriva no oceano polar por conta dos grandes gelos que
fizeram ele e sua tripulação abandonar o navio Fram e voltar puxado por cachorros no trenó,
sem realizar a chegada ao polo Norte. Por tanto, já se conhecia os perigos que o gelo no mar
podia proporcionar às viagens e expedições. Porém, ainda não existia uma vigilância constante
das placas de gelo ou icebergs que se deslocava em direção ao atlântico, mas não elimina o fato
de já haver alertas de gelo no mar no início do século XX. Isolados, mas existia.

1
RMS – Royal Mail Ship – Navio à serviço do correio real Britânico.
Fram deixa Bergen, Noruega, 2 de julho de 1893

Sabendo disso, devemos levar em consideração os atos políticos que cresciam dentro da Irlanda
do Norte no final do século XVIIII e no início do século XX. A Irlanda do Norte já vinha desde
a idade média brigando com o Inglaterra por autonomia em seu próprio país, coisa que só
acabaria no dia 10 de abril 1998 com o Acordo de Belfast, no mesmo dia que o Titanic partira
em sua viagem inaugural. Já embarcando no estágio de construção e batimento da quilha do
Titanic e de seu irmão Olympic, construídos nos estaleiros da Harland & Wolff2, em Belfast. A
White Star Line, uma empresa britânica, usava mão de obra irlandesa para construir os seus
navios. Com o sentimento nacionalista irlandês que já era crescente, mal remuneração dos
operários, e casos e mais casos de acidentes fatais com morte no estaleiro, houve sucessivas
convocações para greves, mas nada impediu a construção do navio. O documentário TITANIC –
A Lenda, produzido pela Discovery Channel, mostra que essas greves não eclodiram, pois,
capatazes à mando de empresários da White Star Line3, eram pagos para eliminar os líderes que
convocavam as paralisações, assim, impondo a lei do silêncio entre os operários, e instaurando
um regime árduo de trabalho. O tempo de construção dos dois navios foi recorde, em um tempo
de três anos. A fixação das chapas de aço era feita com rebites de aço ainda encandecido e a
marretadas fixos à furação pré-determinada. Maneira, hoje, considerada por muitos engenheiros
um erro, pois o metal, colocado em atrito, se parte com mais facilidade e ainda mais sob baixas
temperaturas.

FINALIZAÇÃO DA CONSTRUÇÃO, LANÇAMENTO AO MAR, INCÊNDIO E


O VETO
Até seu lançamento ao mar, o Titanic era apenas um casco vazio. Sem acomodações, sem
elevadores, caldeiras ou instalações elétricas. Iria precisar mais um ano para que os artesãos,
escultores, arquitetos, engenheiros, eletricistas e decoradores viessem de toda a parte da Europa
para confeccionar o navio por inteiro. Muito se falava de uma invenção revolucionária que
continha na estrutura do navio e que o dava a fama de “inafundável”, as comportas estanque. O
próprio projetista e engenheiro chefe do navio que com as comportas, o navio poderia ter até
quatro compartimentos invadidos por água, e ainda sim se manteria estável. Fato comprovado
com seu irmão Olympic4, que se envolveu em um acidente com um o cruzador HMS Hawke,
realizando uma manobra. Na colisão, se abriu um buraco na parte traseira direita do navio, a
sala de máquinas foi tomada pela água, mas o navio continuou navegável, pois as comportas
2
Harland & Wolff – Responsável pela construção da estrutura do navio, dona dos estaleiros.
3
White Star Line – Responsável pela organização das viagens, pela decoração e demais arranjos do navio.
4
Olympic – Navio irmão do Titanic, foi construído no mesmo estaleiro, serviu na primeira guerra mundial como navio
hospital e foi aposentado em 1935.
estanque permitiam o navio flutuabilidade. Com isso, o atraso da viagem inaugural do Titanic se
atrasou, pois seu navio irmão ocupou sua doca para realização de reparos. Somente alguns
meses depois o Titanic teve a doca liberada para a fixação de suas hélices em seus eixos, e
assim poder realizar seus testes no mar. No mar, o Titanic teve um ótimo desempenho no
quesito velocidade, o motor ainda não estava liberado para realizar todo seu funcionamento, e
ainda sim, surpreendeu os projetistas e o capitão Edward Smith, que se aposentaria após a
viagem inaugural do navio. Apenas duas coisas chamam a atenção nos testes, a capacidade de
reversão dos motores e o jogo de leme 5 do navio. O Titanic, por ser um navio que deslocava um
enorme peso, tinha um leme muito pequeno e seus motores demoravam cerca de 43 segundos
para começar a fazer a reversão total. Hoje em dia, isso seria inaceitável, no caso do Titanic foi
aceito, pois estava dentro das normas da época. Segundos que custariam caro na noite do dia 14
de abril de 1912. Um caso muito curioso que envolve toda essa fase de testes do navio é o
incêndio ocorrido no armazenamento de carvão do Titanic que ardeu por pelo menos uma
semana. Alguns especialistas afirmam que, com esse incêndio com durabilidade de dias, pode
sim ter comprometido o quinto compartimento do navio, fazendo com que as fissuras do quinto
compartimento no dia da colisão com o iceberg abrisse com mais facilidade.

Retângulo vermelho indica a marca do incêndio, parte frontal esquerda, 1912

Por esse motivo, hoje sabemos que o navio, no dia em que estava no porto de Belfast se
dirigindo para Southampton, foi colocado com o lado direito virado para o público, para que a
marca do incêndio não pudesse ser vista pelos passageiros. Outro fato ocultado dos passageiros
foi o veto do presidente da White Star Line à época dos fatos, o Sr. Joseph Bruce Ismay, havia
impedido o projetista do navio, Sr. Thomas Andrews, que colocasse mais botes salva vidas no
navio, pois havia receio de que mais botes no convés poderia assustar os passageiros. Como
hoje sabemos, essa decisão foi fatal.

VIAGEM INAUGURAL, ASSÉDIO, ALERTAS DE GELO E O DESCASO

5
Leme – direcionador do navio.
Na sua viagem em mar aberto no Atlântico Norte, rumo a Nova York, o experiente capitão
Edward Smith, que era o marinheiro mais bem pago de sua época, se tornou comodoro na White
Star Line em 1904, o mesmo, que estava no comando do RMS Olympic, no dia do acidente com
o cruzador HMS6 Hawke, deu ordens de não usar a força total do navio enquanto estivessem nos
primeiros dias de viagem. Porém, alguns passageiros, no inquérito realizado após o acidente,
mencionam que Smith e os demais membros da tripulação cedessem aos assédios de Bruce
Ismay, presidente da White Star Line e passageiro do navio, para que aumentassem a velocidade
do navio. Isso foi decisivo para que no momento da colisão, o navio não tivesse tempo
suficiente para executar a reversão total dos motores. Outro fato que chama atenção em todo
esse conjunto, é o fato de os binóculos não serem mais vistos no posto de comando do navio
desde quando partiram de Southampton, outro fator que seria crucial.

Ilustração de Charles Dixon

Os alertas de gelo sistematicamente ignorados desde a partida de Southampton também é mais


um evento na cadeia que culmina no naufrágio do navio. Navios que navegavam águas mais ao
norte da posição do Titanic como o SS 7 Californian, enviava mensagens de alerta de gelo via
telégrafo, uma tecnologia que era nova e recém empregada nos navios, porém, o operador foi
interrompido pois queria transmitir mensagens ao continente. Avisos esses, que seria o último
enviado às 22h55m, alertavam o perigo de gelo nas proximidades do Titanic, o que também foi
ignorado. Como sabemos, às 23h45m da noite, o Titanic tinha seu encontro inadiável com o
iceberg que estava em seu caminho. O navio, seriamente danificado no seu lado esquerdo, teve
cinco compartimentos violados, as comportas estanque foram ativadas, mas não foram
suficientes para conter toda a água que entrava por cima dos anteparos, é nessa hora que o
engenheiro chefe, Sr. Thomas Andrews, dá o conselho para o capitão dê a ordem para lançar os
botes e abandonar o navio, pois em suas palavras, o navio iria afundar. Como já sabemos, os
botes salva-vidas não eram suficientes para todos, a decisão tomada foi de que mulheres e
crianças ocupassem os primeiros botes lançados. Porém, mulheres e crianças da terceira classe
não estavam incluídas nessa ordem. Está aqui, o descaso e a seletividade de “quem vamos
salvar”, o que aumentaria mais o número de vítimas fatais no naufrágio, coisa que foi
comunicada no inquérito por pessoas da terceira classe que sobreviveram por burlar o bloqueio
dos mesmos ao acesso aos botes. Às 00h05m do dia 15 de abril de 1912, foi emitido o último
pedido de socorro do Titanic, correspondente à CQD8. Somente o RMS Carpathia respondeu ao
6
HMS – Her/His Majesty’s Ship – Navios pertencentes à Marinha Britânica.
7
SS – Navios com atribuições militares ou civis.
8
CQD – Pedido de Socorro – Depois do naufrágio, o código foi modificado para SOS.
chamado, porém, só poderiam chegar no local 4 horas após o fim das comunicações. Às
01h30m o Titanic já se encontrava no fundo do Atlântico Norte, levando consigo mais de mil e
duzentas vidas, a maioria, pessoas da terceira classe. Porém, algumas pessoas da primeira classe
também morreram no naufrágio, como o caso do empresário John Jacob Astor e sua esposa, e o
casal dono da Macy’s Departament Store9.

IMPACTOS, MUDANÇAS E AS REGRAS MARÍTIMAS ATUAIS


O Titanic foi o acontecimento mais doloroso que precisou ocorrer para que as regras tivessem
que mudar. Mais de mil de duzentas pessoas tiveram que morrer para que governos tanto
europeus quanto estadunidense promovessem uma mudança drástica no código marítimo
vigente. A reação pública ao naufrágio do Titanic, que foi obviamente negativa e de muita
indignação que também impulsionou as autoridades a querer mudança. As pessoas que
chegaram no píer 34 em Nova York estavam em frangalhos, completamente em choque, sem
acreditar que conseguiram sair daquele pesadelo real com vida. Diante dessa conjuntura,
autoridades europeias e estadunidenses elaborassem mudanças nas regulamentações marítimas,
A Patrulha Internacional do Gelo foi criada para rastrear e reportar as embarcações para o
perigo de gelo no mar. A Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar
foi criada depois da criação da ONU para harmonizar e globalizar as leis marítimas. Com o
avanço da atual tecnologia proveniente dos pós Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) e da
Guerra Fria (1949 – 1989), com auxílio do radar, das imagens via satélite e guiados por GPS,
hoje é possível com muito mais facilidade e precisão evitar uma catástrofe dessa proporção.
Porém, não podemos nos ancorar na soberba do fato que embarcações, ainda, repleta de toda
tecnologia moderna seja “inafundável”, como foi o caso do Costa Concordia em 2012, que
mesmo com a tecnologia mais moderna de sua época, afundou na costa da Itália. Soberba essa
que, contaminou projetistas, engenheiros, empresários e homens com anos de experiência no
mar, no caso do Titanic. Devemos estar atentos as condições de segurança sob quaisquer
circunstâncias, com ou sem tecnologia, somos seres humanos, e ainda projetamos invenções
passíveis de erros graves ou de pequena escala, ainda sim, erros.

Jornal do dia 15 de abril de 1912 Bote salva-vidas se aproximando do RMS Carpathia, 1912

BIBLIOGRAFIA

9
Macy’s Departament Store – Grande loja de artigos femininos que existe até os dias de hoje.
SPREMO BORIS, Como eu encontrei o Titanic em uma operação secreta na Guerra Fria.
BBC News. Disponível em: <'Como encontrei o Titanic durante operação secreta na Guerra
Fria' - BBC News Brasil> Acesso em: 26/04/2022

PUFF, JEFFERSON, Cem anos após desastre do Titanic, acidentes com navios têm redução de
85%. BBC News. Disponível em: <Cem anos após desastre do Titanic, acidentes com navios
têm redução de 85% - BBC News Brasil> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, Expedição Fram. Wikipédia. Disponível em: <Expedição Fram – Wikipédia, a


enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, RMS Titanic. Wikipédia. Disponível em: <Naufrágio do RMS Titanic –


Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, Conflitos na Irlanda do Norte. Wikipédia. Disponível em: <Conflitos na Irlanda


do Norte – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, Edward Smith. Wikipedia. Disponível em: <Edward Smith – Wikipédia, a


enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, Naufrágio do RMS Titanic. Wikipédia. Disponível em: <Naufrágio do RMS


Titanic – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

WIKIPÉDIA, Naufrágio do Costa Concordia. Wikipédia. Disponível em: <Naufrágio do Costa


Concordia – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)> Acesso em: 26/04/2022

RINCÓN, MARIA LUCIANA, Evidências Apontam que Titanic sofreu enorme incêndio dias
antes de afundar. Megacurioso. Disponível em: <Evidências apontam que Titanic sofreu
enorme incêndio dias antes de afundar - Mega Curioso> Acesso em: 26/04/2022

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