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Limites da democracia
De Junho de 2013 ao governo Bolsonaro
Para Carolina
Capa
Folha de Rosto
Introdução
Agradecimentos
Notas
Introdução
1. Pemedebismo, presidencialismo de coalizão e crise da
democracia [pp. 45-79]
2. Métricas, analíticas e partidos na democracia do digital
3. Das “novas direitas” à eleição de Bolsonaro
4. O governo Bolsonaro como forma-limite do
pemedebismo
Considerações finais
Referências bibliográficas
Autor
Créditos
Introdução
Uma maneira de apresentar este livro é dizer que ele tenta entender
a radical mudança ocorrida no uso de uma palavra: “polarização”. O
que se começou a chamar, a partir dos anos 2000, de “polarização”
nada tem a ver com o que essa palavra passou a significar depois
das eleições de 2018. A mudança do sentido e do significado de
“polarização” é emblema de transformações estruturais na vida
social, na relação entre sociedade e instituições, do funcionamento
mesmo das instituições.
Até meados da década de 2010, polarização queria dizer que o
sistema político se organizava em dois polos, representados por
dois partidos, PT e PSDB. O partido que vencia a eleição presidencial
se tornava líder da coalizão de governo. Começava por criar um
cordão sanitário em torno de áreas consideradas estratégicas,
preservando-as o quanto possível do loteamento político. O restante
do governo era dividido mais ou menos proporcionalmente ao peso
institucional das diferentes forças políticas.
No modelo que prevaleceu de 1994 a 2013, partidos funcionam
como empresas de venda de apoio parlamentar a governos de
coalizão. Se um indivíduo ou grupo considera que não foi
devidamente contemplado na distribuição dos quinhões, ou se
simplesmente acha que pode conseguir mais, migra para outro
partido, ou acaba por fundar um novo, estimulando a fragmentação
partidária. Cabe ao síndico do condomínio no poder conferir a
homogeneidade possível a esse arquipélago de interesses,
estabelecendo agendas transversais de governo. Essa função foi
desempenhada nesse período por PT e PSDB. A esse modo de
operar, que a ciência política brasileira convencionou chamar de
presidencialismo de coalizão, chamei de pemedebismo,[1] em
homenagem ao partido que, durante pelo menos três décadas, foi o
líder do cartel de empresas de venda de apoio parlamentar, o PMDB
— o qual, a partir de 2018, mudou seu nome para MDB.
Na metáfora de campos magnéticos da polarização, os dois
polos disputavam quem iria atrair para si o pântano de PMDBs entre
as duas margens de terra firme. Um documento explícito desse
modelo é o registro de uma fala do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso em conversa com o ex-governador do Distrito
Federal Cristovam Buarque no ano de 2004 e que pode ser
encontrada no site oficial do PSDB. Em determinado momento da
conversa, o ex-presidente do Real afirmou:
não foi obtido por acaso. Ao contrário, foi fruto de uma estratégia
deliberada por parte da campanha do candidato. Cabe destacar
que, em maio de 2016, Bolsonaro foi batizado nas águas do rio
Jordão pelo pastor Everaldo, membro da Assembleia de Deus
(Ministério de Madureira). A campanha de Bolsonaro usou
slogans carregados de referências religiosas, tais como “E
conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João, 8,32), e
“Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. Alguns dos mais
importantes apoiadores de sua campanha eram evangélicos.
Entre eles, pode-se destacar o senador Magno Malta (Partido da
República, PR) e o deputado Onyx Lorenzoni (Democratas, DEM),
que, com a vitória de Bolsonaro, tornou-se ministro da Casa Civil.
Bolsonaro recebeu apoio das principais lideranças pentecostais
brasileiras, tais como Edir Macedo (fundador e líder da IURD),
Romildo Ribeiro Soares (líder da Igreja Internacional da Graça de
Deus), Valdemiro Santiago (líder da Igreja Mundial do Poder de
Deus), Estevam e Sônia Hernandes (líderes da Igreja Renascer
em Cristo), Robson Rodovalho (líder da Igreja Sara Nossa Terra),
Silas Malafaia (líder do Ministério Vitória em Cristo — AD), Manoel
Ferreira (líder do Ministério de Madureira — AD), José Wellington
Bezerra da Costa (líder do Ministério do Belém — AD) e Mário de
Oliveira (presidente da Igreja do Evangelho Quadrangular do
Brasil).[51]
Introdução
26. Ibid., p. 38. Entendo que essa posição guarda afinidades com a
hipótese explicativa de “fracionalização endógena” proposta por
Cesar Zucco e Timothy J. Power, “Fragmentation without
Cleavages?”, op. cit. No entanto, uma consideração detalhada da
proposta de Zucco e Power e de suas possíveis afinidades com o
pemedebismo levaria muito longe, só podendo ser devidamente
desenvolvida em separado.
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27. Sobre esses pontos, ver o balanço realizado por Yan de Souza
Carreirão, “O sistema partidário brasileiro: Um debate com a
literatura recente”, op. cit.
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38. Sobre isso, ver Marcos Nobre, “Crise da democracia e crise das
teorias da democracia”. In: Maurício Fiore e Miriam Dolhnikoff
(Orgs.), Mosaico de olhares: Pesquisa e futuro no cinquentenário do
Cebrap. São Paulo: Sesc, 2021.
[ «« ]
39. Examinei a noção de “lulismo” tal como cunhada por André
Singer em Os sentidos do lulismo: Reforma gradual e pacto
conservador (São Paulo: Companhia das Letras, 2012) no Anexo a
Imobilismo em movimento, intitulado “‘Pemedebismo' e ‘lulismo': Um
debate com André Singer”. Remeto a esse texto para quem se
interessar por minha reconstrução e crítica dessa posição, razão
pela qual também ela não será examinada em maior detalhe neste
capítulo. Retomarei o diálogo com a posição de Singer adiante, no
capítulo 3, a propósito dos desenvolvimentos posteriores a Junho.
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45. Paolo Gerbaudo, The Digital Party, op. cit., especialmente pp.
30-42.
[ «« ]
54. Marcus André Melo e Carlos Pereira, Making Brazil Work, op.
cit., p. 56.
[ «« ]
58. Ibid.
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4. Ibid., p. 280.
[ «« ]
20. Ibid.
[ «« ]
27. Ralph Schroeder, Social Theory after the Internet, op. cit., p. 8.
[ «« ]
28. David Karpf, Analytic Activism: Digital Listening and the New
Political Strategy. Oxford: Oxford University Press, 2015.
[ «« ]
33. Ralph Schroeder, Social Theory after the Internet, op. cit., p. 142.
[ «« ]
44. Ralph Schroeder, Social Theory after the Internet, op. cit., p. 43.
[ «« ]
46. Cathy O'Neil, por exemplo, é uma autora que parece tender para
um diagnóstico de uma completa substituição das antigas formas de
hierarquização pela lógica algorítmica, fundada em big data e
métricas. Ver seu livro Algoritmos de destruição em massa: Como o
big data aumenta a desigualdade e ameaça a democracia (Santo
André: Rua do Sabão, 2020). Entendo que vai na mesma direção
Shoshana Zuboff, A era do capitalismo de vigilância: A luta por um
futuro humano na nova fronteira do poder (Rio de Janeiro:
Intrínseca, 2021).
[ «« ]
47. Ralph Schroeder, Social Theory after the Internet, op. cit., pp.
65-6.
[ «« ]
53. Mesmo ano, aliás, em que foi publicado pela primeira vez o
Capitalismo, socialismo e democracia, de Joseph Schumpeter. Não
é também casual que as definições minimalistas de partido de
ambos coincidam, em grande medida. Apenas Schattschneider tem
seu foco dirigido para peculiaridades e particularidades, o que não é
o foco de Schumpeter. Sobre esse caráter minimalista da definição
de partido, ver adiante.
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64. Angelo Panebianco, Modelli di partito, op. cit., pp. 130 ss.
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71. Ibid., p. 5.
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72. Sobre isso, ver Ralph Schroeder, Social Theory after the
Internet, op. cit., p. 141.
[ «« ]
73. Paolo Gerbaudo, The Digital Party, op. cit., pp. 4-5.
[ «« ]
74. Richard S. Katz e Peter Mair, “Changing Models of Party
Organization and Party Democracy”, op. cit., especialmente pp. 14
ss.
[ «« ]
75. Sobre isso, ver Paolo Gerbaudo, The Digital Party, op. cit. Por
exemplo: “Em organizações mais antigas, como partidos políticos
tradicionais, o uso da tecnologia digital tende a dizer respeito a
processos intraorganizacionais e à comunicação externa dos
partidos com seus públicos-alvo. Essas organizações tendem a ser
muito prudentes na incorporação de tecnologia digital em suas
operações e continuam a ver a televisão e a imprensa como seus
principais campos de campanha” (p. 13).
[ «« ]
84. Yascha Mounk, The People vs. Democracy: Why Our Freedom
Is in Danger and How to Save It. Cambridge, Mass.: Harvard
University Press, 2018.
[ «« ]
90. Ibid.
[ «« ]
3. Das “novas direitas” à eleição de Bolsonaro
11. Lembrando aqui, uma vez mais, que a discussão mais cerrada
com a noção de “lulismo” tal como formulada por André Singer até
2012 se encontra no “Anexo” a Imobilismo em movimento, razão
pela qual não foi incluída na íntegra no capítulo 1.
[ «« ]
18. Sobre isso, ver Ricardo Mariano e Dirceu André Gerardi, “Apoio
evangélico a Bolsonaro: Antipetismo e sacralização da direita” (em
especial pp. 334 ss.) e Ronaldo de Almeida, “Players evangélicos na
crise brasileira (2013-2018)”, ambos em José Luis Pérez Guadalupe
e Brenda Carranza, Novo ativismo político no Brasil: Os evangélicos
do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung, 2020 (em
especial pp. 227 ss.). Não é de menor importância nesse contexto
que Bolsonaro tenha se casado, em 2007, com Michelle de Paula
Firmo Reinaldo, ativa integrante da Igreja Batista Atitude, tal como
ressaltado no artigo de Mariano e Gerardi, p. 345. Para um
acompanhamento contínuo e sistemático da presença e da
relevância eleitoral das denominações evangélicas desde as
eleições de 2014, ver o trabalho realizado pelo Iser, como por
exemplo em: Christina Vital da Cunha e Ana Carolina Evangelista,
“Electoral Strategies in 2018”, SUR, n. 29, 2019; e Christina Vital da
Cunha, Paulo Victor Leite Lopes e Janayna Lui, Religião e política:
Medos sociais, extremismo religioso e as eleições 2014 (Rio de
Janeiro: Fundação Heinrich Böll; Instituto de Estudos da Religião,
2017).
[ «« ]
19. Sobre isso, ver Camila Rocha, Esther Solano e Jonas Medeiros,
The Bolsonaro Paradox: The Public Sphere and Right-Wing
Counterpublicity in Contemporary Brazil (Berlim: Springer, 2021),
especialmente o cap. 4. Retomarei esses argumentos adiante.
[ «« ]
32. Camila Rocha, Menos Marx, mais Mises, op. cit., p. 93.
[ «« ]
33. Para a reconstrução desse processo, ver uma vez mais: Angela
Nagle, Kill All Normies, op. cit.; e Martin Moore, Democracy Hacked,
op. cit.
[ «« ]
35. Camila Rocha, Menos Marx, mais Mises, op. cit., p. 141.
[ «« ]
38. Ver p. 6.
[ «« ]
52. Camila Rocha, Menos Marx, mais Mises, op. cit., p. 162.
[ «« ]
58. Camila Rocha, Menos Marx, mais Mises, op. cit., p. 168.
[ «« ]
66. Julian E. Zelizer, Burning Down the House: Newt Gingrich, the
Fall of a Speaker, and the Rise of the New Republican Party. Nova
York: Penguin, 2020, p. 125.
[ «« ]
21. Até onde sei, falta contar concretamente, por exemplo, toda a
história das conexões do bolsonarismo nascente com os
movimentos de extrema direita pelo mundo. A pesquisa e os relatos
de Benjamin Teitelbaum em The War for Eternity: Inside Bannon's
Far-Right Circle of Global Power Brokers (Nova York: Dey Street
Books, 2020) mostram a ligação de Bolsonaro com o
Tradicionalismo por meio de Olavo de Carvalho, assim como a
relação deste com Steve Bannon a partir da ascensão de Bolsonaro
à presidência, em 2018. Mas não tenho conhecimento de uma
reconstrução minuciosa da história pregressa do bolsonarismo
nesses termos, especialmente a partir de 2014, sobretudo em
relação a suas fontes de financiamento, ao aprendizado de
tecnologia digital e a suas redes ideológicas.
[ «« ]
23. Arlie R. Hochschild, Strangers in their Own Land, op. cit., p. 19.
[ «« ]
25. Arlie R. Hochschild, Strangers in their Own Land, op. cit., p. 144.
[ «« ]
34. “Nas ruas, sete de setembro encheu; nas redes, #flopou: Com
piadas e pedidos de impeachment, oposição a Bolsonaro dominou o
debate no Twitter, produzindo o dobro de menções que os
apoiadores do presidente”, piauí, 7 set. 2021. Disponível em:
<piaui.folha.uol.com.br/nas-ruas-sete-de-setembro-encheu-nas-
redes-flopou/>. Acesso em: 1 abr. 2022.
[ «« ]
8. Ibid., p. 16.
[ «« ]
9. The Great Leveler: Violence and the History of Inequality from the
Stone Age to the Twenty-First Century. Princeton: Princeton
University Press, 2017.
[ «« ]
12. Paolo Gerbaudo, The Mask and the Flag: Populism, Citizenism
and Global Protest. Oxford: Oxford University Press, 2017.
[ «« ]
17. A esse respeito, ver Yuen Yuen Ang, China's Gilded Age: The
Paradox of Economic Boom and Vast Corruption (Cambridge:
Cambridge University Press, 2020).
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capa
Pedro Inoue
fotos de capa
[acima] Maria Objetiva/ Wikimedia Commons
[abaixo] Alan Santos/ PR/ Flickr
preparação
Leny Cordeiro
checagem
Érico Melo
índice remissivo (ed. impressa)
Luciano Marchiori
revisão
Jane Pessoa
Ana Maria Barbosa
versão digital
Antonio Hermida
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
ISBN 978-65-5692-298-0
CDD 320.981