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E ÊN IA E

ExP RI C E S NTIDO: O OLHAR DAS


MÃES SOBRE A EXPERIÊNCIA DA ESCUTA DE
1-nsróRIAS PARA CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE
VULNERABILIDADE SOCIAL

Erinelda da Costa Paixão9


Tamara Queiroz Bezerra Larripa 10
Francisco Ari de Andrade11

INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é apresentar a experiência de contação


de histórias sob a perspectiva das mães das crianças assistidas pelo Ins­
tituto da Primeira Infância do Ceará (IPREDE). Fundado em 1986, o
IPREDE conta, hoje, com mais de trinta anos de experiências atuando
no terceiro setor, atendendo, mensalmente, mais de 1.000 crianças com
comprometimento nutricional que vivem em situação de vulnerabilidade
socia� incluindo seus/ suas cuidadores, que podem ser as mães, familiares
ou demais responsáveis. A atuação do IPREDE desenvolve-se através
de uma visão holistica que se concentra em quatro pilares: assistencial,
científico, estético e sustentabilidade.
A atividade de contação de histórias, foco de análise nesse estudo,
fez p arte do projeto de extensão Ateliê do Iprede: educação e experih1cia
estética no terceiro setor, no interstício 2017-2018, que, em uma proposta
multidisciplinar de intervenção na área da Arte e da Educação, e abran­
gendo docentes e discentes do Instituto de Cultura e Arte (ICA) e da
Faculdade de Educação (FACED) da Universidade federal do Ceará,
busc ava fortalecer o pilar estético do instituto.

' Doutoranda em
Educação (UFC). CV: htrp://bues.cnpq.b r/2296478093367208

-
Mestre em Educação (UFC). CV: hup://laues.cnpq.br/1335475821885974 _
11
Doutorem Educação (UFC). P ro fe,sor 1\ssociado (UFC). CV: htrp://lacccs.cnpq.br/48845499488690,9
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MENTE DE PALHA, CORPO DE LATA: DA
MAGIA DE OZ À INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Alejandro Knaesel Arrabal 12

INTRODUÇÃO

ossos pensamentos e valores são produro de vivências, pai­


xões e escolhas marcadas pelos aconte_çimentos de nosso tempo.
As trocas simbólicas que realizamos entre o mundo e nossa cons­
ciência acontecem na lingu agem.
A produção da fantasia e da realidade implica em um processo
interconscitutivo, na medida em que, simultaneamente, o fantástico
produz elementos do real e o real do fantástico. O que reconhecemos
em nós como "humanidade" encontra-se no centro dessa relação.
As reflexões aqui apresentadas levam em conta esses pressupos­
tos, a fim de explorar algumas questões que se encontram dos debates
a respeito do desenvolvimento e aplicação de máquinas cognitivamente
responsivas. Para tanto, opta-se por discorrer sobre questões relacionadas
a concepção e ao emprego da Inteligência Artificial no contemporâneo,
em diálogo com o universo lúdico da obra " Niágico de Oz", consi­
derando em especial as características e aspirações dos personagens o
" spantalho" e o "Homem de Lata".

DA MAGIA DE OZ Á INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Definida pelo próprio autor como "um conto de fadas moderno,


escrito para divertir as crianças" (VlL LA, 2019, p. 7), "O Mágico de

I! Douwr em Direno Público (UNIS! OS). Professor e pesquisador (F RB).


CV: htrp://lattes.cnpq.br/0957562986221644

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maneira que perdi meu amor pela moça Munchkin e parei de achar que
me casar ou não faria alguma diferença." (BAUM, 2013, p. 101). Assim
como fez com o Espantalho, Dorothy convidou o Homem de Lata a
conhecer Oz, na esperança de que o mago lhe conceda um novo coração.
Cérebro e coração, órgãos que integram a estrutura biológica de mui­
tos animais, conquistaram destaque cultural ao longo dos tempos. Supos­
tamente antagônicos em relação ao que simbolizam, ambos representam
aspectos importantes da condição humana: o primeiro evoca a memória,
a racionalidade e a inteligência, o outro a paixão, as emoções14 e os afetos.
a modernidade, o cérebro, a razão e o sujeito se tornam pratica­
mente um. Em meados do século XX, "numerosos discursos e práticas,
dentro e fora das disciplinas científicas e filosóficas, têm apresentado o
desenvolvimento da noção de ser humano como um 'sujeito cerebral'".
Assim, considera-se que o "ser" de cada indivíduo reside no cérebro,
"única parte do corpo que devemos possuir [ ...] para que sejamos nós
mesmos" (VIDAL, 2005, p. 169).
Admitir o cérebro como instância autônoma que governa o corpo
é urna leitura ainda dominante, a despeito dos avanços da neurociência
apontarem para um horizonte distinto:
A ideia de que o organismo inteiro, e não apena o corpo
ou o cérebro, interage com o meio ambiente é menospre­
zada com frequência, se é que se pode dizer que chega a
ser considerada. No entanto, quando vemos, ouvimos,
tocamos, saboreamos ou cheiramos, o corpo e o cérebro
participam na interação com o meio ambiente. [... ) Ter
percepção do meio ambiente [ ... ] não é uma questão
de fazer com que o cérebro receba sinaj [... ] O orga­
nismo altera-se ativamente de modo a obter a melhor

14 "Emo ção deriva do latim m,o,•ere, e111o/u.r - donde ro11111111ovtre. lnfiniti\ o e passado verbais referem-se a
um 'movimenro' energérico ou espirimal desde um ponto zero ou um pomo originário na direção de
um ourro, como consequência de uma cerca tensão, capaz de afetar ? rganicamente o corpo humano.
'Emorus' significa abalado, sacudido, post0 em movimenro." (SODRE, 2006, p. 29).

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coraçõe dos mortos. E o órgão que bombeia a vida
para toda pe soa era visto e considerado como sede da
abedoria e da inteligência, sendo associado à verdade
e à justiça.

o cotejo entre a razão e a emoção, Bingemer (2021) resgata Pas­


cal, filósofo que atribuiu ao coração o papel de limite da racionalidade
que, na sua época, gradualmente inclinava-se a questionar os desígnios
de Deus. Lembra Bingemer que Pascal é o autor da célebre frase "o
coração tem razões que a própria razão desconhece" 16•
o mundo fantástico de Oz, o Espantalho e o Homem de
Lata revelam expectativas ancoradas em valores contrapostos: "o
Espantalho defende que um cérebro é a coisa mais importante do
mundo, enquanto o Homem de Lata defende que o coração o é"
(SA "TOS; OZELAME, 2017, [n. p.]).
o contexto atual das tecnologias computacionais, os "sistemas (ou
plataformas) de Inteligência Artificial" são apresentados (e desenvolvidos)
sempre em confronto com atributos humanos. Ao longo da história da
computação, inúmeras disputas envolvendo habilidades de articulação
cognitiva e raciocínio foram propostas, rivalizando homens e máquinas.
Em uma publicação científica de 1950, o patrono da computação
Alan Turing formulou um modelo de teste que se tornou conhecido pelo
seu nome (Teste de Turing). Trata-se de uma avaliação "cega" envol­
vendo uma pessoa, um computador e um interrogador humano. Sem
que possam ser vistos, o interrogador submete os dois primeiros a uma
série de perguntas comunicadas e respondidas por escrito. es e Jogo,
o interrogador tenta descobrir quem é humano e quem é máquina. A

16 "POR QUE TER.lA o coração razões que a própria razão desconhece? Biai se PascaJ (
1632-1662), que
formulou essa conhecida sentenç a, foi filósofo na acepção que antigamente se dava ao vocábulo, isto é,
além de filó ofo era cientista (precoce). [... ] Pascal em matéria biológica viveu sua época. Assim como
De cartes, no mesmo século, sem razão plausível, sediou, em De Homi11e, a alma na glândula p ineal,
Pascal teria aceito a crença de que o coração, um músculo, pudesse ter, além de sentimentos, razões. E,
até hoje, perdura essa ideia de que o órgão, uma escrurura apenas inervada, mas não nen·osa, possa gerar
sensações." (ME DES, 2001, p. 213).

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--
comprm·ação da Inteligência rti ficial estaria na confirmação de que a
máquina apresentou wn desempenho equivalente ao de um ser humano,
a ponto de confundir o interrogador.
Garry Ira parov, renomado en.'{adrista soviético, enfren tou desafios
contra computadores de envolvido pela IBM, em 1985, 1996 e 199 .
Contudo, para ele, a relação entre a humanidade e as máquinas não pode
er reduzida ao antagoni mo. 06 er a o enxadrista que, "da mitologia à
ficção científica, a dualidade entre humanos e máquinas tem sido retratada
como uma questão de vida ou morte". Porém, "o triunfo da máquina
é [de certa forma] o triunfo da humanidade, algo que normalmente
e quecemo ao sermo vencidos por nossas criações". Ele considera
ainda que "Máquinas possuem cálculos, nós possuímos compreensão.
fáquina po suem instruçõe , nós possuímos propósito. Máquinas pos­
uem objetividade, nós possuímos paixão." (KASPAROV, 2017, [n. p.]).
despeito destas considerações, anos se passaram e novos "com­
bate "foram empreendidos pela IB11 (bem como por outras empresas)
a fim de "testar" tecnologias mais avançadas. Das disputas realizadas
cabe citar: a participação da máquina IB 1-Watson em um programa de
TV de pergunta e respostas (G1, 2011), o confronto do IBM Project
Debater (2019) com Harish atarajan, recordista de competições de
debates. SaJvo melhor entendimento, tais eventos pouco contribuíram
para atestar "inteligências", resultando em nada muito além do que um
sofisticado e constrangedor "espetáculo de eficiência computacional".
O mundo contemporâneo insiste em considerar a petjom1a11ce como
fator universal determinante. Longe de menosprezar a importâ ncia da
técnica e o valor do útil, ocorre que a convivência humana orientada
à sustentabilidade planetária não é viável apenas em termos de ideais
produtivistas ancorados em critério de eficiência. 0 no com pararmo
, .nas que nos
, .
com as maqw criamos, nos tornamos objeto de nós mesrn os

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algo
' ritmos e dados pré-programados, e suas
.
ào geradas com base nessas mformaçõcs. Embora""·
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r��
Parecer intcligente e capaz de tomar decisões, is.
. so é
resultado de seu tr ein amento e programação, e nao
de
uma compreensão intrínseca da realidade.

Portanto, assim como o Espantalho e o Homem de


Lata
foram enganados por Oz, a humanida de ta mbérn de\"e
er cautelosa ao colocar u rna fé cega na Inteligência Ar .
ti
ficial. É importante questionar e compr eender os limites
e as capacidades reais dessa tecnologia, bem corno os
possíveis impactos sociais, éticos e legais que ela pode tet

A Jnteligência Artificial pode ser uma ferramenta pode­


rosa para auxiliar em dfrersas áreas, de sde que seja uti­
lizada de forma responsável e ética. A comp reensão de
seus fundamentos e limitações nos ajuda a ter expectam-as
realistas e a tomar decisões informadas sobre seu uso.

Em resumo, embora exista a esperança de que a Inte­


ligência Artificial possa resolver problemas exi tenciais
da humanidade, é importante manter um olhar crítico e
questionador, evitando uma fé cega na capacidade da tec­
nologia de proporcionar respostas definitiYas. Oe,·emos
continuar a explorar e compreender tanto os benefícios
q uanto os desafios que a Inteligência Artificial apresenta,
a fim de tomar decisões informadas sobre seu papel em
nossas vidas. (CHATGPT, 2023).

REFERÊNCIAS
\ \'IGIL\(\TC do Amanhã: Ghost n de
i the Shell. Direção: Rupert Sanders. Produção
·
P aramounc P.tcrures,· Dream\,,V 'ork·s P1crur . ers·' A d
ra
es; Reltance Entertainment; Amblm · parrn
Productions. Estados Cni dos: Paramou nt P
icrures, 2017.
ALJT,\: Anjo de Combate. Direção: Rob x; Lighr·
: . ert Rod ng p - d e ZOth Cenrur\' Fo . t
· u ez. rod uçao
storm Enrertammenr; Trou blemaker zo h
.
tu dios,. T G E-ntercatnment. � ados Un
Est . .rdos.
Ctntury Fox, 2019.

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