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Mateus 28.

19: O batismo trinitário é uma


adulteração das palavras de Jesus?
Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do
Espírito Santo. (Mateus 28:19)

Uma questão que tem “alçado sua voz” nos últimos tempos, principalmente com o fácil acesso à
informação através da internet, profetizado em Daniel 12:4, e devido aos avanços da crítica textual
moderna. Afinal de contas, o texto de Mateus 28 19, presente hoje em todas as traduções bíblicas
cristãs, que contém a fórmula do batismo trinitário ensinado e reproduzido por praticamente
todas as igrejas evangélicas e católicas, (supostamente) dito por Jesus, é realmente um texto
adulterado? “Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e
do Filho, e do Espírito Santo.” (Mateus 28:19 ACF)

O nome da Trindade no ensino de “Jesus“.


É verdade que praticamente todos os manuscritos gregos do evangelho de Mateus, que somam
aproximadamente 1700, são unânimes em reproduzir o batismo trinitário em Mateus 28 19 do
jeito que já conhecemos. No entanto, uma coisa é intrigante, e isso não podemos negar. É que em
todo o tempo do ministério do Salvador no mundo, ele sempre ensinou em seu próprio nome, e
não em nome da “trindade”. Vejamos alguns versículos, das próprias traduções do texto grego,
que mostram isso.

● “E qualquer que receber em meu nome um menino, tal como este, a mim me recebe.” (ACF’11
Mt 18:5)
● “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles.”
(ACF’11 Mt 18:20)
● “E todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou mulher, ou
filhos, ou terras, por amor de meu nome, receberá cem vezes tanto, e herdará a vida eterna.”
(ACF’11 Mt 19:29)
● “Porque muitos virão em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo; e enganarão a muitos.” (ACF’11
Mt 24:5)
● “Jesus, porém, disse: Não lho proibais; porque ninguém há que faça milagre em meu nome e
possa logo falar mal de mim.” (ACF’11 Mc 9:39)
● “Porquanto, qualquer que vos der a beber um copo de água em meu nome, porque sois
discípulos de Cristo, em verdade vos digo que não perderá o seu galardão.” (ACF’11 Mc 9:41)
● “E sereis odiados por todos por causa do meu nome; mas quem perseverar até ao fim, esse será
salvo.” (ACF’11 Mc 13:13)
● “E estes sinais seguirão aos que crerem: Em meu nome expulsarão os demônios; falarão novas
línguas;” (ACF’11 Mc 16:17)
● “E tudo quanto pedirdes em meu nome eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho.”
(ACF’11 Jo 14:13)
● “Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei.” (ACF’11 Jo 14:14)
● “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará
todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito.” (ACF’11 Jo 14:26)
● “Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei, para que vades e deis
fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto em meu nome pedirdes ao Pai ele
vo-lo conceda.” (ACF’11 Jo 15:16)
● “Até agora nada pedistes em meu nome; pedi, e recebereis, para que o vosso gozo se cumpra.”
(ACF’11 Jo 16:24)
● “Naquele dia pedireis em meu nome, e não vos digo que eu rogarei por vós ao Pai;” (ACF’11 Jo
16:26)

Não é estranho que, em todo tempo de seu ministério, o Senhor tenha ensinado sempre dizendo
“em meu nome”, e no final ele faça uma mudança tão drástica de ensinamento? Além do mais…

A discrepância de Mateus 28 19…


Ao analisarmos o texto de Mateus 28 19 reproduzido nas traduções gregas das palavras
aramaicas/hebraicas do Senhor (vide At. 26:14), notamos no contexto que há certa discrepância.
Portanto, vamos voltar ao versículo 18 para entender melhor.

Jesus, aproximando-se,
falou-lhes, dizendo:
— Toda a autoridade me foi
dada no céu e na terra.
(Mateus 28:18 NAA)

Ora, se foi dada a ele toda a


autoridade, então era natural que ele
reivindicasse fazer discípulos e
imergi-los (batizá-los) em nome de
quem?
Imaginando que você naturalmente saiba da resposta, e supondo que o Senhor teria dito “façam
discípulos de todas as nações, imergindo-os (batizando) em meu nome“, então podemos fazer
uma conexão direta com o que de fato aconteceu em todos os relatos do livro dos Atos dos
apóstolos, como se segue:

O batismo (imersão) em Atos dos apóstolos.


Aqui, até o momento, vamos reproduzir o texto das próprias traduções gregas do texto bíblico.

● “E disse-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo,
em remissão de pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo;” (ACF’11 Atos 2:38)
● “(Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do
Senhor Jesus).” (ACF’11 Atos 8:16)
● “E mandou que fossem batizados em nome do Senhor. Então rogaram-lhe que ficasse com eles
por alguns dias.” (ACF’11 Atos 10:48)
● “E os que ouviram foram batizados em nome do Senhor Jesus.” (ACF’11 Atos 19:5)

Será que cada um dos apóstolos, que estavam na frente do Senhor quando (supostamente) lhes
havia ordenado de modo claro, “batizem em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo”, não
obedeceram, não entenderam, ou por algum motivo fizeram diferente do que o Senhor ordenou?

Muitas tentativas de explicar por qual motivo os discípulos não batizaram em nome da trindade
são levantados, e cada uma delas são especulativas. Talvez o Senhor não havia dado uma fórmula
batismal exata com aquelas palavras, mas apenas a “essência do batismo“. Quem sabe os judeus
não estavam preparados para receber a doutrina da trindade naquele momento porque estavam
acostumados a ouvir que Deus é um (Deut. 6:4; Mar. 12:29; Jo. 17:3; 1 Cor. 8:6), etc.

Por isso, eu não quero adicionar aqui mais especulações, já que comparando o atual texto de
Mateus 28 19 traduzido dos textos gregos com outros versículos dentro dos próprios relatos
bíblicos nota-se grande incoerência. Além do mais, podemos adicionar a isso uma pergunta retórica
que Paulo faz aos crentes de Corinto, que nos dá mais uma pista de como originalmente era
realizado o batismo (a imersão) nas águas por eles mesmos. Vamos utilizar, mais uma vez, e por
enquanto, uma tradução do texto grego:

Em nome de quem Paulo batizava (imergia)?


"Está Cristo dividido? Foi Paulo crucificado por vós? Ou fostes vós batizados em nome de
Paulo?" (ACF'11 1 Coríntios 1:13)

Essa pergunta exige uma resposta óbvia de seus leitores,


“vocês foram batizados em nome de Paulo?”,

A resposta deveria ser um sonoro “Não!”;


“Mas então no nome de quem vocês foram batizados?”

Você, caro leitor, já consegue responder a pergunta?


A pergunta de Paulo (original “Shaul“) deixa claro que o batismo, isto é, o ritual judaico de imersão
em água era realizado no nome de um indivíduo apenas (especialmente no caso de João). E o texto
deixa claro como água que era no nome do Senhor, assim como o batismo de João foi reconhecido
com seu próprio nome também, vide Atos 19:3-5.

Então onde está escrito que o batismo deve ser somente no nome de
“Jesus” (original “Yeshua“)?
Não só os teólogos cristãos, mas toda a
cristandade em si geralmente defende a
unhas e dentes que todo o “Novo
Testamento” bíblico foi escrito em grego.
Entretanto, vários testemunhos dos
próprios pais da igreja afirmam o
contrário. Aqui vamos expor alguns para
nossa reflexão, correção e aprendizagem.

Mateus, tendo primeiro proclamado


o evangelho em hebraico, quando estava para ir também às outras nações, colocou-o por
escrito em sua língua natal e assim, por meio de seus escritos, supriu a necessidade de sua
presença entre eles.
de Cesareia, Eusébio. História Eclesiástica (p. 101). CPAD. Edição do Kindle.

No trecho acima, o historiador Eusébio de Cesareia faz uma citação dos escritos de Clemente de
Alexandria, que viveu entre os anos 150 a 215 EC.

Vamos a outro relato.

Sobre Mateus ele [Papias] declara como se segue:


“Mateus compôs sua história em dialeto hebraico e cada um traduzia segundo a
capacidade”.
de Cesareia, Eusébio. História Eclesiástica (p. 116). CPAD. Edição do Kindle.

Papias foi um escritor que viveu entre os anos 70 e 155 EC. Ele, da mesma forma que Clemente,
confirma que o evangelho (boas novas) segundo registrou Mateus (original “Matitiyahu“) foi escrito
na língua hebraica. Eusébio coleta este relato em sua obra História Eclesiástica também, como
vimos.

Porém, nós podemos ir ainda mais adiante com isso. Vejamos então mais relatos acerca de provas
históricas de que Mateus (Matityahu) escreveu originalmente e primeiramente em hebraico.

Diz-se que Panteno foi um deles e que chegou às Índias. E o relato é que ali descobriu que fora
antecedido por alguns que tinham conhecimento do Evangelho de Mateus, a quem Bartolomeu,
um dos apóstolos, havia pregado, deixando-lhes o Evangelho de Mateus em hebraico, que
também foi preservado até o presente.
de Cesareia, Eusébio. História Eclesiástica (p. 176). CPAD. Edição do Kindle.

Panteno foi um homem que morreu no final do segundo século de nossa era (ano 200), mas que
por volta do ano 190 fundou uma escola em Alexandria conhecida como Didascaleu. Nessa época
ainda se fazia menção do evangelho de Mateus em hebraico fora das regiões da Palestina. E ao
observarmos o relato de Eusébio mais atentamente, veremos que este texto em hebraico ainda
sobrevivia em seu tempo, e sua obra foi concluída por volta do ano 324.

Eusébio de Cesareia registra ainda um relato do estudioso Orígenes (185 – 253 EC), que também
afirma a autenticidade hebraica das boas novas segundo registrou Matitiyahu.

O relato diz:

Mas no primeiro livro de seus Comentários sobre o Evangelho de Mateus, seguindo o Cânon
Eclesiástico, ele atesta que conhece apenas quatro Evangelhos, conforme se segue: “Segundo
aprendi com a tradição a respeito dos quatro Evangelhos, que são os únicos inquestionáveis em
toda a Igreja de Deus em todo o mundo. O primeiro é escrito de acordo com Mateus, o mesmo
que fora publicano, mas depois apóstolo de Jesus Cristo, o qual, tendo-o publicado para os
convertidos judeus o escreveu em hebraico.
de Cesareia, Eusébio. História Eclesiástica (p. 226). CPAD. Edição do Kindle.

Para finalizar nossos relatos acerca da autenticidade histórica hebraica do evangelho de Mateus,
citaremos um comentário do Epifânio acerca dos
judeus nazarenos.

"Mas estes sectários... não se chamavam de


cristãos – mas de '‘nazarenos’'...
contudo, são simplesmente judeus completos.
Eles não só usam o Novo Testamento como
também o Antigo Testamento como o faz os
judeus (...).
Eles não possuem diferentes ideias, mas
confessam tudo exatamente como a Torá
descreve e na forma judaica – exceto, porém, por
sua crença no Messias. Pois eles reconhecem
tanto a ressurreição dos mortos quanto à criação divina de todas as coisas, e declaram que Deus
é Um, e que o Seu Filho é Yeshua, o Messias.
Eles são bem treinados no hebraico. Pois dentre eles a Torá inteira,
os Nevim (Profetas) e... os Ketuvim (Escritos) (...) são lidos em hebraico, como
certamente o são entre os judeus.
Eles são diferentes dos judeus, e diferentes dos cristãos, apenas no seguinte: Eles discordam dos
judeus porque chegaram à fé no Messias; mas como eles ainda estão na Torá – circuncisão, o
Shabat, e o restante – eles não estão de acordo com os cristãos... eles não são nada mais do que
judeus (...).
Eles possuem as Boas Novas de acordo com Matitiyahu completamente em hebraico. Pois
está claro que eles ainda preservam-nas no alfabeto hebraico, tal qual foram escritas
originalmente."
Epifânio; Panarion 29.

Epifânio de Salamina escreveu sua obra Panarion por volta do ano 374, e continua a afirmar que o
evangelho de Mateus foi escrito originalmente em hebraico. E não só isso, mas que ainda era
preservado fidedignamente como foi escrito entre um certo grupo de judeus chamados
“nazarenos” (ou “netzarim“).

Eusébio de Cesareia cita Mateus 28 19 sem o batismo trinitário.


Há vários outros relatos da autenticidade hebraica do evangelho de Mateus, como o de
Jerônimo (347 – 420), que chegou a possuir uma cópia original deste manuscrito.

Por fim, ao citar o texto de Mateus 28 19 em sua obra, História Eclesiástica, Eusébio menciona o
texto da seguinte forma:

Mas os outros apóstolos que eram perseguidos de várias maneiras, no intuito de destruí-los,
foram expulsos da terra de Judéia e seguiram caminho pregando o evangelho a todas as nações,
confiando no socorro de Cristo, que disse: “Ide e ensinai todas as nações em meu nome”.
de Cesareia, Eusébio. História Eclesiástica (p. 82). CPAD. Edição do Kindle.

Há outras citações deste texto que aparecem da mesma forma em outras obras do Eusébio. Ele que
teve acesso à antiga Biblioteca de Cesareia que continha manuscritos originais. Ele certamente
transcreveu o texto de Mateus 28 19 em suas obras à partir daqueles manuscritos conservados ali
até então.

Adiciona-se a isso a citação que Jerônimo faz dessa biblioteca na sua obra “Dos Homens Ilustres”
(em latim: De Viris Illustribus), concluída por volta do ano 392, onde ele relata o seguinte no
capítulo 3:

“[Mateus] compôs um Evangelho de Cristo, na Judéia, na língua e nos caracteres hebraicos,


para o benefício dos da circuncisão que tinham crido. . . Ademais, o próprio hebraico acha-se
preservado até os dias de hoje na biblioteca de Cesareia, que o mártir Panfílio tão
diligentemente coletou”.

Ora, tendo Eusébio escrito ainda antes deste período, então só nos resta concluir que a citação de
Mateus 28 19 que ele faz em seus escritos são deste manuscrito original hebraico.

Mas talvez alguém pergunte:


Então onde está hoje este ou estes manuscritos hebraicos do evangelho de Mateus?
Isso é uma pergunta que exigiria um novo estudo, porém uma pesquisa na Wikipédia oferece uma
pequena lista de manuscritos sobreviventes que remontam a um texto mais antigo que a própria
data de descoberta destes. Vide “Shem Tob’s Hebrew Gospel of Matthew > Extant Manuscripts” (O
Evangelho Hebraico de Mateus de Shem Tob) (em inglês).

Um comentário na pesquisa da Bíblia de Jerusalém deixa a questão do batismo trinitário de


Mateus 28 19 ainda mais obscura.

Sabemos que a Bíblia de Jerusalém é uma das mais respeitadas no campo da pesquisa histórica da
redação e transmissão do texto bíblico. Ela não só traz um comentário que põe a autenticidade do
batismo trinitário de Mateus 28 19 em dúvida, mas ainda mostra que até o trecho adicional
trinitário de 1 João 5:7-8 também não é original, e por isso não foi reproduzido no texto da mesma.

O comentário acerca de Mateus 28 19 diz o seguinte:

É possível que, em sua forma precisa, essa fórmula reflita influência do uso litúrgico
posteriormente fixado na comunidade primitiva.
Sabe-se que o livro dos Atos fala em batizar "no nome de Jesus" (cf. At 1,5+; 2,38+).
Mais tarde deve ter-se estabelecido a associação do batizado às três pessoas da Trindade.
Quaisquer que tenham sido as variações nesse ponto, a realidade profunda permanece a
mesma. O batismo une à pessoa de Jesus Salvador; ora, toda a sua obra salvífica procede do
amor do Pai e se completa pela efusão do Espírito.

Soma-se a tudo isso o fato dos manuscritos gregos mais antigos do evangelho de Mateus, que são
dos séculos 2 e 3, serem apenas fragmentos do texto que nem sequer possuem o capítulo 28, como
já explicou o professor Jonathan Matthies em um de seus vídeos no seu canal do Youtube. Isso é
um forte indicativo de que o evangelho de Mateus teve outra fonte original. Logo, o capítulo 28
que existe hoje nas bíblias cristãs, traduzidas do grego, é do século 4 (pelo menos), quando a
doutrina da trindade foi finalmente formulada pelo clero católico romano.

Finalmente, no evangelho de Mateus em hebraico, não consta o trecho do batismo trinitário.


Aqui estamos disponibilizando uma tradução para o português em PDF (bit.ly/evmatheb) feita
por Sha’ul Bentsion. A pesquisa acerca deste assunto é muito extensa, portanto vamos finalizar por
aqui neste momento. É possível que façamos maior pesquisa e publicação de um conteúdo
exclusivo acerca do texto hebraico do evangelho de Matitiyahu (Mateus) no Projeto Bíblico Ezra
(biblia.pro.br). Fique por dentro, inscrevendo-se para novas publicações!

Pesquisa por: Gabriel da Rocha Filgueiras.


Publicação original: Blog Bíblia se Ensina.

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