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ROTEIRO PARA A TV DIGITAL INTERATIVA A PARTIR

DOS PRESSUPOSTOS DA HIPERMÍDIA

Fortaleza, CE, Maio 2011


i
Liádina Camargo , Universidade de Fortaleza, liadina@unifor.br

Setor Educacional
Educação Continuada em Geral

Áreas de Pesquisa em EaD


Inovação e Mudança

Natureza
Relatório de Pesquisa

Classe
Investigação Cientifica

RESUMO
Este artigo apresenta o processo de criação de um roteiro para programa televisivo
interativo, baseado nos pressupostos da hipermídia e centrado no
espectador-usuário interativo, possibilitando a gravação de um programa televisivo
interativo para avaliar a influencia do apresentador, como mediador e estimulador
das ações do espectador-usuário, quanto ao uso dos aplicativos de interação, por
meio do controle remoto da TV. Como resultado deste experimento, estudos
investigativos estão sendo desenvolvidos na melhoria do processo de roteirização
de programa televisivo interativo para a educação a distancia, sendo eles: estudos
de colaboração e produção de conteúdo para TVDi, estudos da usabilidade no uso
dos artefatos de interação, estudos sobre a conversão das mídias para o contexto
da TVDi. Este experimento faz parte das pesquisas realizadas no laboratório de
estudos em TVDi da Universidade de Fortaleza.

Palavras Chave: Roteiro, Televisão Digital, Educação a Distancia.


1. Introdução:

Com o advento da tecnologia digital, diversas formas de comunicação e expressão


modificam-se. A televisão passou a ser transmitida com melhor qualidade de
imagem e som, e novos recursos passaram a ser desenvolvidos e integrados a esta
discussão. A Televisão Digital Interativa representa a possibilidade de acesso a um
mundo virtual de informações e de serviços, com destaque na interatividade.

Barros[2], em sua pesquisa sobre modelagem de usuários, propôs uma


classificação dos perfis de usuários que julgou mais próxima da realidade brasileira
de televisão aberta, apontando as diversas características e comportamentos destes
novos usuários (Tele usuário).

Partindo do entendimento que não basta oferecer as funcionalidades para o


espectador-usuário interagir, é necessário que desenvolvedores e roteiristas tenham
em mente que o espectador-usuário seja um sujeito interativo, o que remeterá a
criação de roteiros televisivos que provoquem o desejo de interagir em busca de
novos conteúdos. Renó[7] aponta para um espectador-usuário diferente, que sofreu
mudanças vindas das suas experiências com as tecnologias da web e da sua
disposição para “navegar”, agora mais intensificada com a chegada da TV digital.

Neste contexto, se retoma a discussão sobre o relacionamento entre o público e


esta nova mídia; quais seriam os novos hábitos e necessidades destes
espectadores-usuários como se dará a relação sensorial-cognitiva; a liberdade de
escolha de canais de áudio e vídeo personalizados; os protocolos de tráficos de
canais de dados sendo executados de forma simultânea; a utilização de vídeo-
games e jogos digitais; o acesso à internet com suas ferramentas de comunicação e
interação; os novos ambientes de aprendizagem; ofertas dos serviços bancários e
comerciais, entre outras.

2. Termos e conceitos:

A interatividade terá impacto direto na concepção e na produção de programas


televisivos, as aplicações interativas deverão despertar a curiosidade e conquistar o
espectador-usuário, ela não é um recurso a mais ou uma jogada de marketing. A
interatividade propõe a produção de conteúdos que contribuam com a qualidade de
vida das pessoas, colaborando com a inserção social na cultura,
no entretenimento, na informação e em destaque na educação, fator relevante para
a mudança de cenário nacional quanto aos índices de baixa escolaridade.

De acordo com Vilches[8] “a interatividade não é um meio de comunicação, mas


uma função dentro de um processo de intercambio entre duas entidades humanas
ou máquinas”.

Considerando os pressupostos da hipermídia para a elaboração de um roteiro de


programa televisivo para TVDi, é necessário entender o significado de hipermídia.
Para Landow[4] o texto hipertextual incluir informação visual, sonora, de animação e
outras formas de informação, podendo encontrar neste cenário, fragmentos de vídeo
interligado ao texto, como arquivo de fotos, registros sonoros e animações, que
contribuem com o significado do conteúdo.

A hipermídia é considerada como a estrutura popular dos novos meios e ganhou


força com a web 2.0, que possibilita interagir e definir novos caminhos, ao invés de
uma leitura contemplativa do conteúdo oferecido. Para Vilches[8] o que
proporcionou à hipermídia, foi à convergência das mídias e a migração digital.

Na elaboração do roteiro televisivo para um programa de audiência (cenário


experimental da pesquisa), também é considerado o conceito de não-linearidade,
que se configura como conteúdo audiovisual que rompem com a estrutura
tradicional de roteiro linear (início, desenvolvimento, construção, finalização). “A não
linearidade prevê a desconstrução do roteiro tradicional e dá ênfase a criação de
módulos audiovisuais que possuem sentidos sozinhos e/ou relacionados a outros
módulos. Isso permite novas e variadas formas de percepção de um programa” [1].

A não-linearidade tem a premissa de desconstruir o roteiro tradicional e dar ênfase a


criação de múltiplos caminhos. A não-linearidade nas narrativas audiovisuais não é
uma ocorrência do avanço das tecnologias, ela vem sendo praticada desde o início
do cinema, quando se introduziu o conceito de montagem, usado por MARTIN[5]
que declara: “o processo de digitalização permitiu transferir a função criadora da
montagem, que antes era restrita somente ao criador da obra, também para a
audiência, a partir de recursos tecnológicos”.

3. Processo de criação do roteiro para um programa televisivo interativo:


A criação de um roteiro para um programa televisivo passa por um processo criativo
e dinâmico, associado à velocidade do pensamento, dos impulsos ocasionados pelo
estímulo da visão, audição, tato, olfato, paladar.
O trabalho de roteirização baseado na hipermídia identifica todas as possibilidades
de relacionamento entre o conteúdo e o espectador-usuário, e estabelecem as
diretrizes da narrativa audiovisual, posicionando os links, os conteúdos e os efeitos
[3].
O roteiro para a TV interativa associa de forma direta os recursos técnicos
específicos para a navegabilidade não-linear (fruição, simultaneidade) que favorece ao
espectador-usuário criar seus caminhos de leitura reunindo inúmeras informações
multimidiáticas como texto, gráfico, áudio, vídeo. Roteirizar um programa nos
pressupostos da hipermídia requer dos desenvolvedores a identificação de níveis
hierárquicos de conteúdos (grau de aprofundamento dos seus dados), interface
(disposição dos conteúdos, botões), redes de links (estruturação, navegação),
possibilitando que outros conteúdos sejam trazidos pelo próprio espectador–usuário
para a tela da TV. Renó[7] declara que o hipertexto funciona como uma “ferramenta
para a mente”, onde se desenvolve a estrutura desejada de acordo com suas
opções cognitivas.
A proposta do criar um roteiro a partir dos pressupostos da hipermídia foi decorrente
de atividades realizadas de forma espontânea, necessitando inserir recursos na
“contação de historia” e a oferta de vários caminhos que provocassem no
espectador-usuário, o desejo de interagir através de aplicativos programados para
este fim.
A seguir, algumas atividades que ocorrem de forma espontânea no processo de
criação do roteiro televisivo:

Atividades realizadas na criação de um roteiro:

• Definir o programa;
• Definir o conteúdo (lexia, níveis de complexidade);
• Definir o argumento (local, fatos, época);
• Definir o tipo de interação (apresentação, escolha, jogo);
• Definir o tipo de mídias de comunicação para a interação;
• Definir a tela principal de navegação;
• Definir o conceito de menu, a relação de objetos e palavras para o
público-alvo;
• Definir o tempo de permanência da informação no vídeo;
• A quantidade de interação desejada e a ordem de apresentação;
• Orientação ao espectador sobre o uso da interação;
• A interface (design, metáfora).

Tabela1 – atividades espontâneas no processo de criação do roteiro televisivo


As etapas de construção de roteiro para um programa televisivo interativo reuniu
ii
conceitos de Práxis [6] e os conceitos de construção de roteiro para novas mídias,
defendida por Willian Van Nostran e adotado por Gosciola[3].
Na tabela2, estão relacionadas às etapas do processo de construção do roteiro, as
técnicas e atividades a serem realizadas em cada uma delas. A seguir é
apresentado o processo utilizado na criação do roteiro para um programa televisivo
interativo:

Roteiro para a TV Digital Interativa


Fases Técnicas e Atividades
1. Concepção Ativação, levantamento e  Brainstorming  Entrevistas
analise das necessidades e especificação  Identificação da Equipe de desenvolvedores
dos objetivos do programa  Formação de objetivos do programa

2. Elaboração Assimilação, levantamento e  Definição de conteúdo (historia contada)


análise dos requisitos relevantes,  Análise dos programas e do mediador
identificação de recursos e planejamento  Análise de público-alvo  Identificação do
para a fase de construção Mediador  Focalização de conteúdo
 Experiência direta e observação  Recurso
(cartas, fotos, documentos)

3. Construção Esboço, definição dos  Formação de programa  Análise


componentes do programa, definição de estrutural  Design do programa interativo
arquitetura e tecnologia de interação.  Tempo e espaço (mídia contínua)
Desenho dos testes, Implementação de  Formatos de roteiro de audiologo-visual
funções de interação.  Tipos de interação (quantidade, localização)
 Desenvolvimentos dos aplicativos de
interação  Artefatos de interação
 Não-linearidade

4. Revisão Realização de testes de


aceitação no ambiente do espectador  Testes com potenciais espectador-usuário
usuário, operação experimental do  Incorporação de resultados  Testes dos
programa, analise dos quesitos de interação aplicativos  Protótipo dos aplicativos
interativos

5. Edição Construção finalizada, revisão e  Compilação dos dados  Edição


modificação, aperfeiçoamento dos quesitos  Autoração  Refinamento
de interação. Identificação dos resultados
Tabela2 – Processo de criação do roteiro para TVDinterativa
Também foram estabelecidas as formas de participação do espectadorusuário em
função dos aspectos de interação:

Múltiplas modalidades. Usuários podem interagir de forma auditiva (falando ao


telefone), gestual ou textual. Neste ultimo caso, eles não precisam se limitar a
informações na tela da TV, podendo, por exemplo, fazer uso de envio de SMS via
um celular;

Múltiplas formas de interação. Fornecer aos usuários dois tipos de interação (somente
saída, e entrada/saída) em unção das suas possibilidades de canal de retorno. No
caso do usuário não ter canal de retorno (interatividade local) então permitir que ele
tenha acesso detalhado a dados que não requerem a atualização constante, como
informações de sujeitos/personagens, por exemplo.

As decisões sobre os aspectos de interação dependem dos recursos disponíveis


pela emissora de TV (como das aplicações de TVDi, contratos com operadoras,
etc), da estrutura usada pelo espectador-usuário e dos objetivos a serem
alcançados com o roteiro em questão.

4. Aplicação da pesquisa:

O objetivo da pesquisa foi exclusivamente a análise da interatividade, a partir da


utilização do controle remoto pelo espectador-usuário, e o seu
comportamento/autonomia na participação ou não, nos aplicativos, como também a
influencia do mediador no comportamento do usuário.
Para tanto, foi proposto um processo para a construção do roteiro de um programa
de entretenimento interativo, voltado ao publico feminino, em uma emissora de TV
com grande audiência e gravado nos estúdios da emissora, com a participação dos
profissionais da TV.
Os testes de usabilidade e interação foram desenvolvidos no laboratório de
pesquisa – LUQS, da Universidade de Fortaleza, estruturado para os estudos em
TVDi, que para este experimento, teve as seguintes características:

a) Perfil do espectador-usuário -Mulheres na faixa etária entre 35 e 55


anos, baixa escolaridade, atividade profissional em serviços gerais,
geralmente mãe, com pouca familiaridade com o computador. Possuidoras de
celular e televisão. Assistem TV entre 2h e 5h/dia.

b) Obstáculos percebidos para a adoção da TVDi -Desconhecimento dos


artefatos de interação existentes no controle remoto como as cores e símbolos
do para as atividades interativas; dificuldade funcional, receio do desconhecido.

c) Conteúdo do Programa -A “história contata” aborda o tema traição, e foi


roteirizada em três blocos, conforme apresentado a seguir:

• O roteiro definiu a atividade de interação em cinco momentos, com


chamadas “diretas e indiretas”. Para “contar a historia” (roteirizar o conteúdo)
foram utilizados recursos hipermidiáticos (vídeo, documentos, textos, fotos,
depoimentos, entrevistas).
• Os Cenários de Interação, também chamados de Aplicações
Interativas, desenvolvidos para este experimento foram: votação e jogo.
• O desenvolvedor disponibiliza aplicativos que podem ser acessados
por meio da aplicação principal (Menu). Na tela da TV, aparece um ícone “i”
criado para que o espectador-usuário identifique que a aplicação está
disponível e poderá ser utilizada. A seguir, as especificações dos cenários de
interação:

Cenário1-incentivar o espectador-
usuário a participar, de forma direta,
com o incentivo do mediador, fazendo
uma “chamada” direta (Você que nos
assiste, dê a sua opinião...)
Cenário 2-incentivar o espectador-
usuário a participar, de forma direta,
com letreiros informativos na tela em
momento temporal, ensinando “como”
interagir utilizando o controle remoto

Figura 2 – a mediadora Maysa ensina a


usar o controle remoto com as funções de
interação espectador-usuário

Cenário 3-incentivar o espectador-


usuário a participar, em momento
temporal, ensinando “como”
interagir utilizando o controle remoto
e o aplicativo Menu de opções de
interação (desenvolvido em
linguagem NCL)

Figura 3 – a mediadora Maysa incentiva


orienta e incentiva o uso do Menu Interativo
pelo espectador-usuário

Cenário 4 – incentivar o
espectador-usuário a acompanhar o
Cenário 5 -não incentivar o usuário
andamento das votações de forma
a participar nem de forma direta ou
direta (chamada) e indireta (letreiro
indireta, observar se os cenários de
sem chamada).
interação 1, 2, 3, 4 foram suficientes
qu
para o espectador-usuário se
e
motive e interaja sozinho em
momento atemporal.

a) Resumo dos testes de interação


 A interação foi mais intensa na chamada “direta” do mediador para realizar a
interação, ressaltando a sua influencia sobre o espectador-usuário;
 As interações de uso com chamadas “não diretas” foram baixas, houve grande
envolvimento das participantes com a “história contada” (conteúdo) dispersando o
interesse pela aplicação;
 Alguns espectadores-usuários desejaram seguir outros caminhos, não-lineares,
gerando o interesse pela interação.

5. Conclusão:
A Televisão Digital Interativa é uma tecnologia recente e bastante promissora, visto
que seus objetivos então centrados na interação do ambiente televisivo. A pesquisa
desenvolvida foi de natureza aplicada, e se utilizou de base bibliográfica com
aplicação de questionários e a participação dos atores no uso das aplicações.

O resultado da pesquisa foi classificado em dois grupos: 1) Análise das formas de


comunicação que um programa de audiência deve integrar em seu roteiro para
facilitar a interação do espectador-usuário com aplicações para TV digital. Neste
quesito foi analisado o papel do mediador no apoio à facilidade de uso e à
motivação do usuário-expectador e as intenções de uso e de participação dos
sujeitos (espectador-usuário); o envolvimento do usuário-espectador com o
conteúdo televisivo; a convergência de mídias contempladas no roteiro interativo; a
análise do fluxo do roteiro e o uso das técnicas pelos profissionais da TV. 2) Análise
qualitativa das experiências de uso das aplicações votação e jogo pelo
espectador-usuário durante as sessões de usabilidade. Aqui estão incluídas as
informações coletadas sobre as reações das participantes (suas dificuldades e
emoções) para chamar uma aplicação e conseguir usá-la.

Os experimentos continuam com objetivo de aprimorar os aplicativos de interação,


bem como a arquitetura de dados para suportá-los, como também os estudos
exploratórios para o realinhamento do processo de construção do roteiro interativo,
a partir dos pressupostos da hipermídia, por entender que a integração e
convergência das mídias sustentam o diálogo interativo com o espectadorusuário.

Desta forma, este estudo abre espaços para a investigação da adoção da TVDi na
dimensão da educação a distancia como meio de promover a inserção cultural e
social, possibilitando que roteiros sejam construídos objetivando a interação e a
não-linearidade.
6. Referencias bibliográficas:

[1] ANGELUS, A; CASTRO. C. Oito Categorias para Produção de Conteúdo


Audiovisual em Televisão Digital e Multiplataformas. Revista de Comunicação
e Epistemologia da Universidade Católica de Brasília, ISSN 1981-2132.

[2] BARROS, G. A consistência da interface com o usuário para a TV


interativa. Universidade de São Paulo. São Paulo: POLI-USP. 2006

[3] GOSCIOLA, V. Roteiro para novas mídias – do cinema ás mídias


interativas. 2ª Ed. 2008. Editora SENAC. São Paulo.
[4] LANDOW, George. Hipertexto – La convergencia de la teoria
crítica contemporánea y el hipertexto. Barcelona: Paidós, 1995.

[5] MARTIN, M. A Linguagem Cinematográfica. São Paulo: Brasiliense, 2003

[6] PAULA, P. Engenharia de Software, fundamentos, métodos e padrões.


LTC. 2001. São Paulo.

[7] RENÓ, D. A linguagem para as novas mídias: a montagem audiovisual


como base para o cinema interativo. Revista de Comunicação e Epistemologia da
Universidade Católica de Brasília ISSN 1981-2132 174.

[8] VILCHES, L. A migração digital. São Paulo: Loyola, 2003.

7 -Agradecimento:
Agradeço a colaboração dos co-autores deste artigo Elizabeth Furtado, Patrícia
Vasconcelos, Eduardo Gularte que integram o grupo de pesquisa do LUQSUNIFOR.

i Liádina Camargo, mestre em informática aplicada, professora do Núcleo de Educação a Distancia e da graduação em
Ciência da Computação -Universidade de Fortaleza; pesquisadora do grupo IHC (laboratório de pesquisa LUQS),
Assessora do Núcleo de Educação a Distancia da Unifor, Coordenadora da especialização a distancia Docência em EaD e
da especialização TVDigital: Tecnologia e Comunicação.

ii Práxis, Processo para Aplicativos extensíveis Interativos. Um processo destinado a suportar projetos didáticos em
disciplinas de Engenharia de Software, com ênfase no desenvolvimento de aplicativos gráficos interativos, baseado na
tecnologia orientada a objetos [6].

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