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SUMÁRIO
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Epílogo
Bônus
Extra - Claudinha e Max
Agradecimentos
1ª edição, São Paulo
ariane@infinitoenquantodure.com.br
Esta obra segue as regras do Novo Acordo Ortográfico.
Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Todos os direitos reservados.
É proibido o armazenamento e/ou reprodução de qualquer parte desta obra através de
quaisquer meios sem o consentimento da autora.
A violação autoral é crime, previsto na lei nº 9.610/98, com aplicação legal pelo artigo 184 do
Código Penal.
Índice
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Epílogo
Bônus
Extra - Claudinha e Max
Agradecimentos
Dedico esta obra a todos que vivem intensamente o hoje.
Epígrafe
Soneto de fidelidade
Vinícius de Moraes
— Heitor, qual parte do “nunca mais aparece na minha frente”, você não entendeu? —
digo com ódio em sua direção.
— Ei, cara, sai dessa enquanto pode. Essa aí só faz a gente perder tempo — o imbecil
do meu ex-namorado fala e Murilo sai da moto.
Merda, tudo que eu não preciso é chamar atenção desse monte de gente agora. O
pessoal já está se aglomerando à nossa volta.
— Repete o que tu disse se é homem. — Murilo está com ódio nos olhos, a boca em
uma linha fina e as mãos fechadas ao lado do corpo.
— Ele é um idiota, vamos embora daqui. Não merece nosso tempo. — Tento afastá-lo,
entretanto, o Heitor não para. Ele nunca para.
— Tô falando de brother pra brother, cara. Não vale a pena esperar, ela demora muito
pra abrir essas pernas grossas e delic...
Heitor não consegue nem terminar a frase. Murilo dá um soco tão forte no seu nariz
que acho que o quebrou. Merda! O que eu faço agora? Ele não para de socar sua cara, vai
desfigurá-lo.
Esse idiota merece levar uma bela surra, mas não quero confusão e nem ser espetáculo
para essa gente toda.
— Murilo, por favor, vamos embora — imploro puxando-o pelo braço e ele me olha.
Acho que percebe meu desespero porque para de bater. Está segurando Heitor pela gola
da camisa.
— Escuta aqui, seu merda! Se tu preza por sua vida de bosta, não chega perto dela.
Esquece que ela existe. Homens como tu despertam o pior de mim, não sabem tratar uma
mulher com respeito — ameaça e soca mais uma vez, só que agora lá embaixo.
— Idiota é você, depois não diga que não avisei — Heitor ainda esbraveja jogado no
chão, cuspindo sangue.
Puxo Murilo e subo na moto, quero sair dali o quanto antes.
***
Vamos para minha casa em silêncio, porém, não consigo conter o sorriso pela cena. Foi
merecido! Murilo deu o soco que eu devia ter dado. Estamos esperando o elevador e ele ainda
está tenso.
— Por que você está tão bravo? Eu nem ligo mais para o que aquele idiota diz.
— Como tu conseguiu ficar com aquilo, Alice? Ele é desses babacas bem babacas.
— Não sei como também, eu costumo ser bem cega. — Dou de ombros. —Para um
garoto de programa tu é bem defensor das mulheres, hein!? — tento brincar.
— O que tem a ver, Alice? — Murilo fecha a cara e fica sério.
— Ai, desculpa. Era para ser uma piada. Não teve graça.
— Ser garoto de programa é bem diferente de ser babaca. Eu nunca forcei ninguém a
fazer nada, tampouco, agredi. Seja verbalmente ou fisicamente. Só faço com consentimento.
Nunca tive um relacionamento, mas nem por isso tratei mal as mulheres com quem saí. Tanto é
que a gente já podia ter acabado com isso faz tempo, só que eu te respeitei. No dia do seu
aniversário não chegamos lá porque eu não quis fazer nada com você bêbada.
— Eu sei, eu sei. — Pego em sua mão e olho em seus olhos castanhos. — Desculpa
mesmo, não devia ter dito isso.
Não consigo decifrá-lo, contudo, esse olhar é sempre carregado. Parece que uma vida
passa em sua mente quando está assim e ele fica em dúvida do que fazer. É estranho e intenso,
ao mesmo tempo.
Se for parar para pensar, realmente faz tempo que estamos nos encontrando. Parece
uma eternidade desde o dia em que abri a porta e me deparei com um homem cheiroso de
cabeça baixa. Eu me senti atraída por ele instantaneamente, como nenhum outro ainda tinha
feito.
— Nunca quis tanto fazer isso — penso alto.
— O quê? — Murilo pergunta confuso e eu fico sem graça.
Já estamos na porta de casa e eu abro a fechadura.
— Estou aqui lembrando que faz tempo mesmo que estamos nos encontrando. E você é
a primeira pessoa que eu, de fato, quero muito.
— Alice... — ele começa a dizer, mas o interrompo com um beijo.
A temperatura sobe rapidamente quando nossos lábios se tocam. Adoro essas sensações
diferentes que aparecem em meu corpo com seu toque. Minhas pernas se mexem
involuntariamente e um líquido se forma entre elas. Sinto um frio na barriga e um puxão
começa a se formar, mas não um puxão que dói. Um bem prazeroso. Não paro o beijo e abro a
porta com dificuldade. Eu quero esse homem hoje. Dentro de mim.
Como não sei se temos companhia em casa, o direciono ainda com minha boca na sua
até o quarto e fecho a porta. Já estamos sem ar e eu com uma vontade enorme de senti-lo.
— Alice, a gente não precisa fazer isso agora — explica com dificuldade.
O beijo mexe com ele tanto quanto faz comigo.
— Eu quero, Murilo. Eu quero muito.
Ele segura meu queixo e me olha para ter certeza que eu realmente estou preparada
para isso. Fecho os olhos ao sentir suas mãos pela lateral do meu corpo. Murilo tira minha
blusa com delicadeza e parte para a calça, se abaixando e ficando na altura da minha cintura.
Meu Deus do céu, que visão!
Mordo os lábios e coloco as mãos no seu cabelo, massageando enquanto ele me deixa
apenas de calcinha e sutiã, dando beijos quentes nas minhas pernas.
— Tu gosta dos meus lábios, Alice? — ele pergunta, dando mordidinhas perto da
minha virilha.
— Ai, sim. Eu gosto... Muito!
— E disso, tu gosta?
Nem tenho tempo para assimilar do que ele está falando. Afasta minha calcinha com a
boca, enfiando um dedo dentro de mim. Fico até tonta com tanto desejo.
— Murilo... — gemo e ele intensifica as estocadas.
— Tão molhadinha pra mim.
Como é boa essa sensação. Por que mesmo demorei tanto para experimentá-la? Coloco
as mãos nos meus seios, tocando-os devagar, e Murilo geme.
— Gata, assim tu vai me matar.
Puxo-o pela gola da camisa e invado sua boca novamente. Nem estou me
reconhecendo, sinto como se meus instintos estivessem me guiando. Tiro sua camisa e o jogo
na cama. Murilo me olha assustado, mas com divertimento. Também está gostando da Alice
sem vergonha.
Subo em sua perna e começo a abrir sua calça. Um desejo de experimentá-lo me
consome. Ele já sentiu meu gosto, eu queria muito sentir o dele também. Será que deveria? Ai,
que se foda! Sem pensar demais agora, Alice. Apenas faça.
Deixo-o só de cueca e me aninho na sua lateral. Murilo já percebeu minha intenção e
está com os lábios entreabertos, ansioso pelo meu toque.
— Eu... eu queria sentir seu gosto... Posso?
— Claro, gata — responde com os olhos cheios de desejo e tira a cueca, deixando seu
belo membro a centímetros do meu rosto.
Paro um segundo para pensar e respiro fundo. Eu quero fazer isso, não tem nada de
mais.
— Desculpa se eu não fizer direito, tá?! — digo e não espero a resposta.
Seguro-o firme e encosto minha boca nele.
— Puta merda, Alice! Que boca quente.
A sensação da minha boca quente no seu membro realmente é boa. Um choque
gostoso. Fico envergonhada no começo, mas logo pego o jeito estimulada pelas gemidas e
puxões de cabelo do Murilo. Cada chupada ele fica mais excitado, e eu vou ficando junto.
Nossa, é gostoso dar prazer. Parece que a gente fica mais empolgada dando do que recebendo.
Passo as mãos na parte debaixo do seu pênis e ele geme alto, já percebi que sente tesão
aqui e decido passar a língua, lambendo devagar.
— Alice, que delícia. Ahhhhh...
Continuo enquanto o masturbo com as mãos. Ele está quase lá, intercalando gemidos,
suspiros e palavrões.
— Quero sentir seu gosto — peço me entregando ao momento e volto com a boca para
seu membro.
É o que faltava. Murilo curva o corpo e deixa seu líquido quente sair na minha boca.
Um líquido espesso e de um gosto que não sei dizer qual é. Mas é bom. Muito bom! Eu mal
termino de engolir, sou surpreendida com suas mãos fortes me jogando de costas na cama. Ele
fica por cima e começa a beijar meu pescoço ferozmente.
— Alice... — sussurra no meu ouvido. — Isso foi... Foi muito bom. É sério, acho que
nunca gozei com tanta vontade.
Fico empolgada com seu elogio e mexo meu corpo, encaixando certinho seu membro
entre as minhas pernas. Já estou latejando por dentro de desejo. Eu o quero muito dentro de
mim! Mesmo de calcinha, só senti-lo assim tão perto me deixa louca.
Ele sorri no meu pescoço e vai descendo lentamente, suas mãos acompanhando os
lábios. Uma pegada firme que adoro. Quando chega perto da minha calcinha e a segura com a
ponta dos dedos, Murilo para de repente e fica em silêncio.
De imediato imagino que faz parte do charme, no entanto, ele logo coloca uma mão na
cabeça e se levanta. Parece tonto.
— Está tudo bem? — pergunto preocupada.
Murilo apenas me olha confuso e cai. Cai no chão com tudo. Só lembro de gritar,
desesperada, e correr a seu encontro.
Ele desmaiou.
Pego o telefone e ligo para a emergência tremendo, enquanto visto sua roupa e enfio a
minha no corpo de qualquer jeito. Meu Deus! O que aconteceu?
Capítulo 22
♫ Doente feito um cão, você sentirá muito.
Pegue leve. Diga boa noite. Pegue leve. ♫
Sick as a dog, Aerosmith
MURILO
Estou tonto, enjoado. Minha cabeça dói e sinto uma forte dor do lado esquerdo do
corpo, na região lombar. Chega até a me faltar o ar.
Cadê Alice?
Agora mesmo estava com ela, na sua casa. A gente quase chegou lá. De repente minha
vista ficou escurecida e não lembro mais. Parece que caí.
Abro os olhos com dificuldade e observo o local. Estou dentro da ambulância, deitado
na maca. Tem um paramédico checando meus sinais vitais.
— Murilo, tu consegue falar? Está bem?
— Eu... estou tonto. Muita dor aqui. — Aponto para a parte debaixo das minhas costas
fazendo uma careta. Caralho! Dói demais.
Não consigo ficar com os olhos abertos, a tontura está forte. Vejo tudo embaçado.
Escuto a voz de Alice e fico mais calmo. Ela está aqui!
— Por favor! Pelo amor de Deus, me deixa entrar na ambulância com vocês.
— Moça, tu é da família?
— Eu... — ela para um pouco — sou namorada. Moço, estou desesperada. A gente
tava bem em um minuto, no outro ele caiu com tudo no chão. Do nada. Não sei o que pensar.
Por favor. — Sua voz já soa baixa no final da frase. Parece realmente preocupada.
— Tá bom, vai, pode entrar. Já vamos sair.
Alice suspira e entra rápido na ambulância. Consigo sentir sua presença. Abro os olhos
devagar, porém, mal consigo mantê-los assim. Ela percebe e abre um sorriso enorme, vindo em
minha direção, mesmo com o paramédico ainda me examinando.
— Murilo, graças a Deus! — Se ajoelha e pega minha mão esquerda. Está tremendo. —
Eu fiquei com tanto medo. Fica bem, tá?! Eu tô aqui.
— Moça, se vai ficar aqui, não pode atrapalhar o atendimento. Sente ali e espere. Já
estamos saindo — adverte o paramédico.
Ela fica tensa, levanta e se senta longe de mim. Queria responder, xingá-lo por ser
estúpido, mas estou sem forças. Meus olhos se fecham novamente. A dor está ficando intensa
demais e tenho falta de ar. Recebo uma máscara de oxigênio e tento relaxar pensando no que
Alice disse: Namorada.
Até que essa palavra que sempre odiei soa bem na boca dela.
***
Quando percebo, já estamos no hospital. O balanço de tirar a maca da ambulância está
aumentando o meu enjoo. Acho que vou... Droga! Viro-me de lado e vomito próximo do
paramédico.
— Murilo, você está bem? — Alice vem correndo do outro lado e segura meu pescoço,
ajeitando o meu cabelo para não sujar.
Olho-a de relance, está com os olhos inchados. Estava chorando? Tenho vontade de
abraçá-la, parece muito nervosa. As dores na lombar voltam a ficar intensas e me encosto de
novo na maca.
— Rápido, vamos levá-lo pra dentro! — um enfermeiro anuncia e se aproxima.
— O paciente refere fortes dores lombares, estava inconsciente até agora pouco.
Saturação baixa, mas já fizemos oxigenoterapia. Sinais vitais instáveis — o paramédico passa
minhas condições.
Começo a me mover de novo e sinto que Alice está próxima, com aqueles olhos
grandes cheios de preocupação.
— Moça, tu não pode passar daqui. Espere ali na recepção que o médico atualiza o
quadro dele mais tarde. Se quiser, avise a família.
Eu continuo e ela fica ali parada, pensativa. Não tem para quem avisar. Olívia e Raul
são duas crianças, Dona Emília está com eles. Somos só nós.
Aliás, que droga!
Preciso sair logo daqui. Amanhã de manhã não tem quem fique com meus irmãos. É
levar na escola, fazer comida e à tarde cuidar deles.
Sou levado para uma sala grande. Dois enfermeiros estão me passando da maca para
uma cama espaçosa e um médico chega logo em seguida.
— Murilo, eu sou o Doutor Bernardo. Você consegue falar?
— Sim — respondo com dificuldade.
— Como está sua urina? Clara? Escura?
— Está mais escura ultimamente.
— Dói ao urinar?
— Essa semana tem ardido um pouco, mas não me preocupei. — Arqueio com outra
pontada nas costas.
O médico me deixa virado de lado e dá pequenas pancadinhas com o punho fechado na
região lombar, de cima para baixo. Caralho! Grito de dor.
— Você tem sentido, nos últimos tempos, dor de cabeça, coceira na pele, fadiga, perda
de apetite?
Paro um pouco para pensar. Dor de cabeça eu sempre tive bastante, desde criança, mas
realmente tem ficado pior. Eu imaginei que poderia ser por causa da rotina corrida e da
infinidade de problemas que tenho. Não durmo direito. Minha pele também anda coçando com
frequência, esses dias até comentei com Dona Emília que parecia que estava com alergia de
alguma coisa. A fadiga piorou muito hoje, antes era meio imperceptível, de vez em quando. A
fome? Se for pensar, antes eu comia melhor. Alice come mais que eu.
— Sim. Acho que sim para todos.
— Murilo, vamos fazer exames de sangue e de urina para confirmar, entretanto, creio
que você está com algum problema renal. Vou passar um medicamento para dor enquanto
aguardamos os resultados.
Ahhh... Mas que beleza! Estou precisando mesmo de mais problema na minha vida. O
médico sai, passando orientações ao enfermeiro.
— Tu consegue se levantar, Murilo, para colher a urina?
Estou com uma dor da porra, só que nem fodendo vou mijar naquele coletor desumano.
Faço que sim com a cabeça e ele me ajuda caminhar até o banheiro. Minha boca está seca,
preciso de água. O xixi sai com dificuldade, está mais escuro que o normal e arde bastante. O
enfermeiro aproveita e coloca em mim aquelas roupas ridículas de hospital.
Quando retorno para a cama, uma enfermeira está arrumando a seringa para tirar o
sangue. Ela se vira e, quando me vê, encara descaradamente. Começa pelas tatuagens e
percorre todo o corpo. Fica até com os lábios entreabertos. Eu costumava gostar dessa reação
nas mulheres antes, hoje não ligo. Prefiro as covinhas da Alice quando a faço rir.
Mas que desgraça, merda!
O que é isso, Murilo?
A dor deve estar afetando meu cérebro.
Deito-me e a enfermeira se aproxima com a seringa. Continua me encarando sem
cerimônia. Se fosse em outros tempos... Ela até que é gostosinha! Ruiva, com sardinhas pelo
rosto e uma bela comissão de frente. Um terceiro enfermeiro entra no quarto e chama minha
atenção ao mencionar Alice.
— Murilo, precisamos do seu RG. Sua namorada Alice está pendente com isso para
finalizar a ficha.
A enfermeira ruiva fica cabisbaixa com a palavra "namorada". Tenho vontade de rir da
situação, até que é engraçado. Faço sinal para o bolso da minha calça e peço a carteira. Retiro e
entrego para o homem que aguarda na minha frente.
— Tu pode me fazer um favor? Diga para Alice que estou melhor — peço me
remexendo na cama, outra pontada na lombar.
— Pode deixar, eu digo. — Ele sai e a enfermeira atirada me olha curiosa.
— Tu não parece bem pra mim — provoca espetando a agulha no meu braço.
Faz tempo que não tenho essa sensação! A última vez não foi para colher sangue.
Estava no Morro em uma época de recaída.
— Pois é, mas não quero preocupar minha namorada. — Forço um sorriso. Nem sei por
que disse isso, porém, me divirto por dentro com a cara de raiva dela.
— O remédio que estou colocando aqui no soro vai te dar sono e melhorar um pouco a
dor — o enfermeiro que me ajudou no banheiro explica saindo da sala. — Descanse um pouco,
Murilo.
A ruiva também termina seu trabalho e sai sem dizer nada. Fico lá sozinho no quarto,
reparando no local. Tem dois leitos vazios, poltronas beges no canto da sala, aparelhos
médicos entre cada cama. Sinto minhas pálpebras pesando e fecho os olhos. Não adianta, é
melhor tentar dormir.
***
Acordo meio atordoado, será que dormi muito? O remédio deve ter feito efeito, graças
a Deus! Agora sinto leves pontadas apenas na lombar. Viro-me para o lado e dou de cara com
lindos olhos esverdeados me encarando, aquelas covinhas de matar. Também percebo que os
dois leitos que estavam vazios foram ocupados por uma criança e uma mulher de meia idade.
— Está melhor? — Alice pergunta.
— Sim — respondo preguiçoso, a encarando. Adoro me perder nos seus olhos.
— Eu não posso ficar muito aqui. Tive que reviver meus 8 anos e fazer os olhos pidões
do Gato de Botas para convencer o enfermeiro me deixar te ver um pouquinho — ela fala
sorrindo e eu sorrio junto.
— Aposto que nem precisava, ele teria feito só pela sua beleza — provoco. — Não se
esqueça que tu é gostosa pra caralho.
— Vejo que já está bem mesmo, fazendo até piada velha. — Fica corada e sorri
novamente, me batendo nos ombros.
O enfermeiro aparece na porta neste momento e avisa que Alice precisa sair. Ela faz
bico e me dá um beijo na bochecha, se dirigindo em direção à porta. Eu me lembro do Raul e
da Olívia e, mesmo não querendo, tento recorrer a ela. Infelizmente, não tenho muitas pessoas
disponíveis, e de confiança, no meu círculo de contatos.
— Alice, desculpa te pedir isso, mas será que tem alguma chance de tu levar meus
irmãos na escola amanhã cedo? Espero que antes da hora do almoço consiga sair daqui.
— Claro, Murilo! Eu ia lá mesmo cedinho falar com Dona Emília, perguntar se podia
ajudar com eles.
— Ela trabalha cedo, cuida de uma senhora idosa. Não tem como deixá-la na mão e eu
não tenho mais a quem recorrer.
— Não se preocupe com isso, eu os levo sim.
— Obrigado, Alice.
— Não por isso. Fica bem, tá?! Vou ficar mais um pouquinho lá na recepção.
— Que horas são? — Perdi totalmente a noção do tempo.
— Três da manhã.
— O quê? Alice, pelo amor de Deus, vai embora! Tem que dormir. Daqui a pouco tu
precisa ir trabalhar.
Ela apenas ri e sai da sala me dando um tchau. Ai, essa mulher! Me deixa sem palavras.
Com raiva e admiração ao mesmo tempo. O médico, acho que é Doutor Bernardo o nome dele,
chega logo em seguida. Está com um semblante sério segurando uns papéis na mão. Ajeito-me
na cama.
— Murilo, você já teve caso de doença renal na família?
— Minha mãe morreu com vários problemas de saúde, inclusive nos rins.
— Qual foi o diagnóstico dela?
— Não foi conclusivo. Foi considerado abuso de álcool e todo tipo de droga. Apesar
de, na época, ela estar mais limpa por causa do nascimento da minha irmã, os médicos
disseram que o estrago já tinha sido feito.
— Mais alguém na família? Sabe se vocês possuem alguma doença hereditária?
— Não tenho contato com ninguém da família. Não sei.
O médico continua sério. Que merda! Não parece que vai dar uma boa notícia. Minhas
mãos começam a suar frio.
— Murilo, seus resultados chegaram. Sua proteinúria, que é a perda excessiva de
proteínas através da urina, está muito alta. Bem acima do normal. Eu pedi um exame de sangue
completo e tivemos algumas alterações sérias que me preocuparam muito. Quero fazer mais
uns exames para ter certeza absoluta, contudo, temo más notícias. O diagnóstico pode ser mais
sério do que uma simples cólica renal.
Fico sem reação. Mais sério? Mais sério quanto? Dá para minha vida ser mais fodida?
É possível isso? Uma infinidade de perguntas sem respostas começam a brotar na minha
mente. O médico ainda está parado na minha frente e o encaro sério.
— Por favor, não atualiza as informações para a moça que está lá fora. Não diga sobre
essa possibilidade de algo mais grave. Não é da minha família, somos só amigos. Não diga
nada a ela, ok, doutor? Não quero preocupar Alice.
— Ok — ele confirma e fico aliviado por um minuto, até voltar a ficar perdido em
meus pensamentos.
Mais sério quanto?
Capítulo 23
♫ Deixo assim ficar subentendido. Como
uma ideia que existe na cabeça e não
tem a menor pretensão de acontecer. ♫
Mais uma de amor, Lulu Santos
ALICE
Fiquei aguardando na recepção por mais quarenta minutos depois de visitar Murilo. Eu
queria saber notícias, ninguém passa mal daquele jeito do nada. Tentei obter informações do
médico de plantão que o estava atendendo, mas sem sucesso por não ser da família. Só recebi
um simples "No momento ele está bem". Isso eu percebi, fez até piada para me provocar. O
que preciso saber é o motivo, a raiz do problema.
Chamei um Uber e acabo de chegar em casa. Entro no quarto e o cheiro dele ainda está
aqui. Um cheiro bom que me traz lembranças quentes de sua boca pelo meu corpo. Da minha
boca no seu. Balanço a cabeça para espantar os pensamentos.
Pego uma roupa leve e decido tomar um banho. Vai ter que ser um frio! Nem adianta
dormir essa hora, daqui a pouco amanhece e preciso ficar com Olívia e Raul. Arrumo-me
rapidamente e reforço o café. Ficar acordada hoje vai ser complicado. Por ainda ser sexta-feira,
preciso avisar meu chefe que aconteceu um imprevisto e não poderei trabalhar. Em mais de um
ano na empresa, nunca faltei. Acredito que ele vá entender.
O relógio marca seis horas. Vejo as chaves da Rabbit no balcão, até aprendi dirigir,
porém, não me atrevo a ir de moto. Além de não ter carta ainda, com sono não é uma boa
pedida. Chamo o Uber novamente. Graças a Deus inventaram esse aplicativo, o táxi no Rio é
de vender um rim!
Chego rapidamente no Alemão e já vejo Dona Emília na porta da casa do Murilo. Suas
feições são preocupadas, ela percebe que a moto dele não está ali. Aproximo-me cautelosa para
não assustar as crianças com más notícias.
— Alice! — Olívia vem em minha direção com os braços abertos e sorriso no rosto.
— Oi, pequena! Tudo bem? — Ela balança a cabeça em afirmativa e Raul também se
aproxima para me dar um beijo.
— Ele passou mal e está no hospital. Já explico melhor — sussurro para Dona Emília.
— O que vocês tão falando? É feio falá escondido, sabia? — Olívia puxa minha blusa
e nós todos rimos.
— Estou contando para Dona Emília que tenho uma surpresa. Vou levá-los na escola
daqui a pouco e depois vocês vão passar o dia comigo, lá em casa.
— Êeeee — os dois dizem em uníssono.
— Mas cadê o irmão? — Raul pergunta.
— Ele está ocupado hoje. Vão lá separando algumas coisas que queiram levar que eu já
vou ajudar.
Dona Emília está muito nervosa, não vê a hora que eu dê explicações. Explicações que,
infelizmente, eu não tenho. Puxo-a no canto da sala para evitar que as crianças ouçam.
— Dona Emília, nós estávamos juntos ontem à noite tranquilamente. Do nada o Murilo
ficou tonto e desmaiou. Nós corremos para o hospital, ele também teve falta de ar e vomitou.
Estava com fortes dores.
— Meu Deus! O que meu menino tem?
Tenho certeza neste momento, se é que ainda restavam dúvidas, que ela ama essa
família como se fosse a dela.
— Eu não sei — confesso desanimada. — O médico não quis dizer nada pra mim por
não ser da família. Mas quando eu saí de lá, nessa madrugada, o Murilo estava sem dor, até
fazendo piada. — Expresso um sorriso fraco.
— O Murilo é forte mesmo! Já passou por tanta coisa, coitado do meu menino. Ele
anda passando mal direto, com coceira no corpo, diarreia. Reclamou até de um zumbido no
ouvido. Mas pensa que vai ao médico? Vai nada! É teimoso igual a uma mula. Falei várias
vezes e insistia não ser nada. Espero que não seja mesmo.
— Se Deus quiser não será! — tento confortá-la, e também me confortar.
— Eu, infelizmente, não posso ficar com as crianças. Cuido de uma senhora idosa
agora durante o dia, não tem quem me substituir.
— Eu sei, eu sei. Fica tranquila, Dona Emília. Já avisei meu chefe que não vou ao
trabalho hoje. Vou deixá-los na escola e depois venho buscar para dormir em casa. Tudo bem?
— O Murilo não vai sair hoje?
— Não. Da pouca informação que o médico me deu, falou que precisava fazer mais uns
exames — conto e Dona Emília não gosta da notícia. Fica apreensiva de novo, mas não diz
nada.
Pergunto onde é a escola das crianças e ela me explica. Vou ao quarto ajudá-los e nos
apressamos para não atrasar. Como já tomaram café, conseguimos cumprir o prazo. O prédio
fica na favela mesmo, um local bem feio, cheio de pichações. Deixo-os lá e retorno para casa.
Paro no supermercado durante o caminho para comprar algo fácil de cozinhar. Também pego
ingredientes para um bolo de cenoura, que os irmãos do Murilo adoraram, e algumas
guloseimas. Coisa boa de ser criança é isso, não é?
Chego à república ajeitando as coisas e colocando as panelas no fogo. Meu Deus! Ser
dona de casa cansa e o tempo voa. Já são dez horas. Meu telefone toca e é Claudinha. Deve
estar entediada com os preparativos do casamento que foi no Sul.
— Oi, Claudinha.
— Vem me matar! Me mata que é melhor do que ficar aqui com essas pessoas chatas
me perguntando a cada cinco segundos “Cadê o namorado, cadê a roupa decente…” Ah, puta
que pariu! Odeio essas coisas, Alice — ela diz atônita e eu dou risada. Ela odeia mesmo.
— Calma, Claudinha! Domingo você tá de volta.
— Não conte com isso, até lá já me matei antes. — Dou risada mais uma vez. — O que
tu tá fazendo?
Ah, droga! Será que conto a verdade para ela? Claudinha vai me dar um sermão sobre
envolvimentos e blábláblá. Eu sei que não devia me envolver assim com os irmãos dele, sendo
que não temos nada. E nem nunca vamos ter. Contudo, como deixá-lo na mão se pode contar
com tão poucas pessoas? Decido dizer a verdade porque preciso também da ajuda da minha
amiga.
— Claudinha, eu vou contar uma coisa. Não surta, tá?!
— Tu transou, enfim, com o Murilo? — ela grita de ansiedade no telefone.
— Nossa, só pensa nisso, gente! — Reviro os olhos. — Não, não transei! Mas é sobre
ele mesmo que quero falar.
— Alice, pelo amor do Deus que tu acredita, não me diga que tá gostando dele?
— Claudinha, não interrompe, caralho! Escuta primeiro — peço estressada.
— Uauuuuu! A menina tá até falando palavrão.
— Você me irrita tem hora, sabia?! Eu não transei com o Murilo ainda, porém, ontem
quase chegamos lá. Teríamos chegado se ele não tivesse passado mal e desmaiado.
— Como assim? O que ele tem, Alice? — Agora parece preocupada ao telefone.
— Não sei — respondo triste. — Vai passar mais uma noite no hospital para exames.
Murilo não tem com quem deixar os irmãos de dia e me coloquei à disposição. Não me julga,
Claudinha! Ele não tem mais pra quem pedir.
Espero um sermão de trinta minutos na minha cabeça, entretanto, Claudinha não diz
nada. Ao contrário, fica em silêncio por uns segundos.
— Claudinha? — pergunto pensando que desligou na minha cara.
— Não vou julgar, Alice. Eu conheço a história dele, esqueceu?
— Não esqueci, mas pensei... Deixa pra lá! Queria te pedir uma coisa. Será que pode
me emprestar seu carro? Ficar andando de Uber pra baixo e pra cima é uma bosta.
— Claro! Vou ligar para Dona Rita liberar sua entrada. Ela tem uma cópia da chave de
casa lá nos fundos. A do carro está no balcão da cozinha.
— Obrigada, Claudinha.
— Alice, só me promete que não vai se envolver. Não ilude também essas pobres
crianças, fazendo-as pensar que tu vai ficar na vida delas. Sabe que não vai, né?
— Eu sei — respondo secamente, no fundo querendo dizer outra coisa.
Eu sei que não, porém, queria não saber. Vou sentir falta do Murilo sim, com certeza.
No entanto, o que mais vai doer é me afastar dessa família que aprendi a admirar.
***
O dia voou! Depois de falar com Claudinha, terminei o almoço correndo e fui na sua
casa pegar o carro. Busquei Olívia e Raul e passamos a tarde toda nos divertindo. Comemos
até dar dor de barriga, fui passear com eles no shopping à tarde e até assistimos Meu Malvado
Favorito 3 no cinema. Adoraram! Nem acreditei quando disseram que nunca tinham ido ao
cinema.
Liguei no hospital cinco vezes para saber informações do Murilo também. Não queria
levar as crianças lá para verem o irmão doente. Nas quatro primeiras tentativas me recusaram
dar qualquer notícia. Na última a mulher ficou com dó da minha insistência e me contou que
ele estava melhor, aguardando o resultado dos exames. Provavelmente, teria alta no período da
manhã. Graças a Deus!
Escureceu, voltamos para casa e pedi pizza. Agora está na hora de dormir e estou
arrumando a cama. Sorte que temos um colchão de casal aqui na república para o caso de
visitas. Olívia me encara com olhinhos brilhantes.
— O que foi, querida?
— Eu gostei do dia hoje. Foi muito divetido.
— Que bom, pequena! Fico feliz que tenha gostado.
— Eu também adorei. A gente podia fazer mais vezes, né?! — Raul entra na conversa.
Fico em silêncio, pensando se haverá outra oportunidade. Não posso iludi-los, como
bem disse Claudinha.
— Quem sabe. Tomara que sim!
— Eu não lembro da minha mamãe, mas você parece o que meus amiguinhos dizem
sobre a mamãe deles. Você é legal e cuida da gente. O Mu tem uma ótima namorada — Olívia
declara e fico em choque, com os olhos marejados.
— Querida — engulo em seco espantando as lágrimas —, não sou namorada do seu
irmão, somos apenas amigos. Nós também podemos ser. Mesmo quando Murilo e eu nos
afastarmos, vou conversar com ele para deixar eu sempre ter um tempinho com vocês. Tá
bem? Adorei conhecê-los!
— Tu jura, Alice? — Raul questiona.
— Eu juro! Vou pedir pra ele.
— Que bom! Eu lembro da mamãe e você é bem mais legal que ela. Dá carinho, brinca
com a gente e não usa aquelas coisas estranhas que a deixavam brava e sem paciência — Raul
confessa e as lágrimas que estava segurando caem.
Esse menininho especial deve ter presenciado muita coisa. A mãe provavelmente bebia
ou usava drogas. Murilo nunca contou muito sobre a família.
— Então, agora que tu é minha amiga, posso dormir?! Tô com sono! — Olívia
interrompe e me beija na bochecha.
— Boa noite, meus amores! Durmam com Deus — digo e saio do meu quarto,
deixando a luz do abajur ligada.
Preciso respirar um pouco, assimilar toda essa conversa. Murilo e eu não teremos um
futuro juntos, contudo, definitivamente, quero manter Olívia e Raul no meu.
Capítulo 24
♫ Uma noite longa por uma vida curta.
Mas já não me importa, basta poder te ajudar.
Eu tô na lanterna dos afogados. ♫
Lanterna dos afogados, Cássia Eller
MURILO
Odeio ficar sem fazer nada, preso numa cama de hospital. Meu celular acabou a bateria
faz tempo, a televisão foi monopolizada pelo menino que está no quarto junto comigo e nem
visita eu recebo. Ainda tenho que aguentar a angústia de esperar resultados de exames que
podem mudar minha vida. Não acredito que vou ter que ficar aqui até amanhã cedo. Que
droga!
O enfermeiro que me ajudou no banheiro ontem entra no quarto sorrindo, enquanto
checa o soro do garoto ao lado. Esse pessoal não descansa, não?
— Cara, sua namorada é insistente, hein?! Ela atormentou tanto a recepção para dar
informações suas que a Rita está até com dor de cabeça — declara divertindo-se.
— O quê? — Estou meio lento e demoro a entender.
Que namorada? Está falando com a pessoa certa?
— A menina que chegou com você, Alice. Está atormentando a recepção em busca de
notícias sobre sua saúde.
— Ah, sim. Ela é boa em convencer quando quer — digo sorrindo e ele sai do quarto.
É estranho dizer isso. Estou começando a gostar do som dessa palavra. Seria bom ter
Alice como namorada? Balanço a cabeça para espantar pensamentos que não vão acontecer e
me viro para tentar cochilar um pouco. Melhor do que ficar divagando.
***
Acordo com a presença do Doutor Bernardo no quarto. Quis dormir para tirar Alice da
cabeça, sonhei com ela. Merda! O que está acontecendo comigo? Tempo bom era quando me
divertia sem preocupação com nada. Agora só fico pensando nessa mulher.
— Boa tarde, Murilo. Sente-se melhor? — o médico pergunta sério e me desperta de
vez.
— Sim, não estou mais sentindo dores.
— Preciso ser sincero, não tenho boas notícias. Essas dores vão voltar.
— Como assim? Os resultados dos exames já ficaram prontos?
— Sim, e meu palpite estava certo.
— O que eu tenho, Doutor Bernardo? — questiono aflito, passando as mãos pelos
cabelos.
— Você tem uma doença hereditária considerada rara, conhecida como doença de
Fabry. É um distúrbio causado por uma deficiência no cromossomo X que faz com que o corpo
não produza a quantidade suficiente de uma enzima chamada alfa-GAL, responsável pela
remoção das substâncias gordurosas das células. A insuficiência dessa enzima faz com que a
gordura se acumule nas células e cause danos nos tecidos de todo o corpo.
— Não entendi direito. É uma doença séria?
— Muito séria, Murilo. Simplificando, a falta dessa enzima faz partes do corpo que
dependem de pequenos vasos sanguíneos ficarem obstruídas. As áreas mais afetadas são rins,
coração, sistema nervoso e pele. A doença de Fabry é um erro inato do metabolismo. Isto
significa que a criança já nasce com a alteração genética, sendo possível diagnosticar
precocemente, mesmo que os sintomas clínicos, em geral, tendam a aparecer apenas anos
depois. Por volta dos 20 anos de idade começa a surgir a perda de proteína na urina, que vi no
seu exame ontem, e que demonstra a lesão renal cada vez maior. Mais tarde há o
comprometimento dos vasos sanguíneos de diversos órgãos, que podem levar à morte através
de infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral. Um outro problema é a ocorrência de
insuficiência renal terminal.
Nossa! Não consigo nem assimilar direito tanta informação. Estou fodido.
— Mas essa questão de ser hereditária, quer dizer que peguei da minha mãe ou do meu
pai? — pergunto e o ódio sobe em minhas veias. Aposto que é dele! Nada de bom vem daquele
homem.
— Isso. É importante, inclusive, os familiares fazerem o aconselhamento genético para
a identificação de novos membros que possam ser portadores da doença.
— Todo filho de uma pessoa com essa doença herda? — O desespero me bate ao
pensar em Olívia e Raul. Não aguentaria algo assim com todos nós.
— Não. Os homens têm um cromossomo X e um cromossomo Y. As mulheres têm
dois cromossomos X. Um pai com a doença de Fabry transmite a mutação para todas suas
filhas, mas não para os filhos. As mulheres afetadas têm 50% de chance de passar tanto para
filhas como filhos.
— Tu tá querendo me dizer, então, que essa doença veio da minha mãe, não do meu
pai?
— Exatamente. Eu desconfiei quando você disse que ela teve complicações nos rins e
sua morte foi inconclusiva. Aliás, Murilo, preciso dizer que foi uma sorte muito grande eu
estar de plantão ontem. Atualmente, o maior desafio dessa doença é justamente o diagnóstico
precoce, pois, além de ser rara, não há características físicas aparentes. Muitos pacientes com
Fabry são inicialmente diagnosticados incorretamente e podem consultar diferentes
especialistas antes de obter um diagnóstico preciso. Eu percebi algo errado porque estou
fazendo Doutorado sobre doenças raras.
Isso é sorte ou azar? Ainda estou anestesiado com as informações, sem acreditar.
— Eu tenho mais dois irmãos da mesma mãe, são mais novos — conto com olhos
marejados.
— Eles precisam fazer exames também, mas fique tranquilo, Murilo. Acho muito
difícil todos vocês terem. No Brasil, foram identificados até o momento cerca de 220 pacientes
somente.
— E o que eu faço agora? Qual tratamento?
— A terapia engloba tratamentos de suporte e tratamentos específicos. O tratamento de
suporte serve para controlar os sintomas e sinais presentes e, geralmente, complementa a
terapia específica. A título de exemplo, para se prevenir as doenças cerebrovasculares, utiliza-
se medicação antiplaquetária ou anticoagulantes e a nível renal controla-se a hipertensão
arterial. O principal tratamento específico é a terapia de reposição enzimática, onde se repõem
as enzimas alfa-galactosidade A e beta-galactosidade Aa cada 15 dias. A tolerância é
normalmente boa e a finalidade é prevenir o progresso da doença nos doentes jovens e evitar
ou reverter o avanço nos doentes mais velhos. A terapia genética é uma técnica que propõe o
tratamento definitivo da doença, estando em fase experimental.
— E o SUS cobre esse tratamento? Porque eu não tenho dinheiro.
Mal sobrevivemos atualmente, não posso ter esse gasto.
— Embora, as duas terapias de reposição estejam disponíveis no Brasil, aprovadas pela
Anvisa, ainda não existe nenhum programa para garantir o acesso ao tratamento pelo SUS.
— Mas que droga! Vou morrer, então... — penso alto.
— Calma, Murilo. Conte comigo, estou disposto a ajudá-lo. Será um ótimo estudo de
caso para a minha tese de Doutorado e podemos facilitar o caminho para outras pessoas que
descubram a doença no futuro. — Forço um sorriso fraco, pelo menos uma boa notícia.
— Qual minha expectativa de vida, Doutor Bernardo?
— Já houve muitos avanços, mas a expectativa de vida dos portadores é reduzida em
20 anos para homens, principalmente, sem o tratamento adequado — explica e fecho os olhos,
em silêncio. — Murilo, eu sei que é muita coisa para assimilar, só tente manter a calma. As
alterações nos seus exames me mostram que até o momento a doença afetou apenas seus rins.
Sabe-se que a grande maioria dos pacientes com a doença irá ter algum comprometimento
renal ao longo da vida. Estou preocupado que essas dores avancem, por isso, vou acompanhar
de perto para o caso de hemodiálise e até transplante renal.
— Transplante?
— Sim, em muitos casos é necessário. Vou te passar encaminhamento para outros
médicos também. O tratamento é multidisciplinar. É preciso cuidar até da alimentação, pois o
consumo de certos alimentos pode aumentar a ingestão de água. Como há uma diminuição da
urina, os líquidos e o sal ficam acumulados no corpo, originando os inchaços e o aumento da
pressão arterial.
Balanço a cabeça apenas para confirmar que entendi e o Doutor Bernardo se retira.
Cara, não vou nem chegar aos 60. Se tiver sorte, terei mais 36 anos de vida.
Se tiver sorte!
Capítulo 25
♫ Sim, vou te deixar determinar o ritmo porque
não estou pensando direito. Minha cabeça está girando,
não consigo mais ver com clareza. ♫
Love me like you do, Ellie Goulding
ALICE
No começo da manhã ligo no hospital novamente para saber se Murilo terá alta e fico
aliviada ao ser informada que ele sairá depois do almoço. Dou comida para Olívia e Raul e os
levo até Dona Emília. Às duas e meia em ponto chego na recepção. Não deveria, mas estou até
com frio na barriga de tanta ansiedade em vê-lo.
Sou orientada a sentar e aguardar. Mexo no celular e me distraio por alguns minutos até
um homem atraente, de cabelos bagunçados e olhos castanhos penetrantes aparecer no meu
campo de visão. É tão lindo que nenhuma mulher consegue conter virar o pescoço para
admirá-lo. Ele parece surpreso em me ver e está com feições tristes. Será que aconteceu
alguma coisa e ninguém quis me falar? Praticamente corro em sua direção.
— Murilo, você está melhor? — pergunto e seguro sua mão.
Ele fica me olhando por um tempo, parece perdido em pensamentos.
— O que tu tá fazendo aqui?
— Eu liguei de manhã para saber que horas você ia sair, vim te buscar. Estou de carro.
Seus irmãos já estão com a Dona Emília — explico e ele continua me olhando.
Nossa, Murilo está estranho! Seu olhar profundo está três vezes mais misterioso e
intenso. É intimidante, parece que está vendo minha alma.
— Você está bem? Parece estranho.
— Sim — responde seco, sem tirar seus olhos dos meus.
— Tem certeza, Murilo? O médico descobriu o que você tem?
— Não foi nada de mais, Alice. Pode ficar tranquila. É cansaço e estresse, vou tomar
alguns remédios.
— Só isso? E aquela dor?
— É reflexo do estresse. Uma hora o corpo cobra as preocupações da mente.
Estranho é pouco para defini-lo, sinto que está me escondendo algo.
— Se você tiver com algum problema, pode me falar. A gente não tem nada, mas nos
tornamos amigos. Pode contar comigo — insisto.
— Tudo bem, Alice. Pode ficar tranquila, tá?
— Se você diz.
Murilo desvia o olhar pela primeira vez e sai caminhando ao meu lado. Não estou
acreditando muito em suas palavras. Espero que seja paranoia da minha cabeça. Depois de
tudo que já passou, o universo não faria algo ruim acontecer. Faria?
***
Quando chegamos ao Alemão, ele desce rapidamente do carro e vai em direção à casa
da Dona Emília. Bate na porta e me espera alcançá-lo para entrar. A casa dela é ainda mais
simples que a do Murilo, poucos móveis e bem antigos. Porém, é tudo muito limpo e
aconchegante. Raul o enxerga primeiro e vem em sua direção.
— Irmão, você voltou!
Murilo nem espera ele chegar ao seu lado e já o puxa para um abraço. Não um abraço
qualquer, um daqueles de aquecer o coração, de verdade. Não sei se é sempre assim quando
ficam algum tempo sem se ver, se está aliviado de ter voltado bem... Fico até emocionada com
o contato tão íntimo.
Olívia também aparece na porta da cozinha e vem correndo para entrar na roda. Ele a
pega no colo e dá vários beijinhos, enquanto faz coceguinhas na sua barriga e um som
delicioso invade o ambiente. Dona Emília está encostada no canto, com um semblante
indecifrável.
— Tava com saudade, Mu.
— Eu também, meu amor. Tu se comportou direitinho com a Alice?
— Sim, foi muito divetido. Nós comemos várias coisas gostosas, passeamos no shopp e
assistimos o filme do Minio. Ela agora é minha amiga, disse que estará com a gente para
sempre.
Ah droga! Não era para Olívia falar isso assim. Fico imóvel e pálida na mesma hora,
Murilo me olha tenso e vejo Dona Emília esconder um sorriso.
— Murilo, pode descansar. Eu fico com as crianças hoje.
— Não, Dona Emília. Estou bem já.
— Nem pensar. Vai pra casa, toma um banho e come algo decente. Sei que no hospital
a comida é horrível.
Ele tenta argumentar de novo, mas acaba aceitando. Está sério, pensativo e não olhou
nenhuma vez na minha direção enquanto saíamos da casa de Dona Emília. Merda! Está bravo
com a história de "para sempre". Péssima hora, Olívia. Nem deu tempo de me explicar antes.
— Olha só, se preferir ficar sozinho nos falamos mais tarde ou amanhã, tá? —
pergunto ao chegarmos à sua porta.
— Alice, por que você falou aquilo para a Olívia? — Ele me encara e abre a fechadura,
dando espaço para que eu entre.
— Desculpa. Eu queria ter explicado direito antes. Nos divertimos muito ontem, eles
estavam animados me falando o quanto estavam felizes e eu não resisti.
— Tu tem noção que não temos nada, né? Essa aproximação que eu temia. Raul e
Olívia não deveriam se apegar a você. Muito menos te chamar de "amiga para sempre" —
confessa preocupado.
Eu sei que realmente não temos nada, ele é um garoto de programa. Contudo, sinto um
frio na barriga ao ouvi-lo confirmar isso.
— Eu sei, Murilo. Fique tranquilo que não estou criando falsas expectativas de nada.
Lembro muito bem do nosso acordo. Mas queria falar algo sobre as crianças.
— O que, Alice?
— Mesmo quando a gente terminar isso, não nos vermos mais, eu gostaria de continuar
o contato com seus irmãos de vez em quando. Sei lá, uma vez por mês. Para sairmos,
passearmos um pouco. São maravilhosos e eu queria muito manter a amizade deles.
Murilo fica em silêncio por um minuto. Suas expressões se suavizam e percebo que
fica mais aliviado. Ai, graças a Deus! Estava com medo de sair gritando comigo.
— Por que você faria isso? — questiona baixinho, quase não ouço.
— Porque eu gosto deles, de verdade. Independentemente de qualquer coisa entre nós,
Olívia e Raul não têm nada a ver com isso. Eu posso combinar de pegá-los na Dona Emília se
você autorizar e...
Não consigo terminar de falar. Murilo me invade. Segura-me forte na cintura e me beija
desesperado. Sinto até que está sufocado, como se estivesse carregando o peso do mundo nas
costas e o soltasse por um minuto. O calor chega rapidamente. Como pode esse homem me
deixar excitada com um toque?
Ele tranca a porta da casa e me pega no colo, sem descolar sua boca da minha. Passo
minhas pernas por sua cintura e consigo sentir sua ereção. Fico feliz de não ser a única afetada
por nossa aproximação. Caminha em direção ao seu pequeno quarto e vou me perdendo em
seus lábios. Poderia beijá-lo o dia todo e não me cansaria. Lábios macios que me levam à
loucura com mordidas. Murilo aperta minha bunda com as duas mãos e dou um gemido alto. Já
estou completamente molhada e com desejo dele.
— Alice... — sussurra no meu ouvido.
— Eu quero você, Murilo.
— Ahhh... caralho! — Seus olhos vidram quando fecho minha mão na sua calça.
Ele me coloca sentada na beirada da cama e fica na minha frente, se despindo. Meu
Deus do céu! É muito gostoso. Toma controle do meu prazer mantendo o olhar o tempo todo
para captar as reações. Inconscientemente mordo os lábios e aperto minhas pernas.
— Tu já tá molhadinha pra mim, Alice?
Confirmo com a cabeça e Murilo joga longe sua calça, me deixando com uma visão
maravilhosa de seu membro grande por dentro de uma cueca boxer preta. Fica linda no
contraste de sua pele clara e coxas grossas. Que calor!
— Eu quero ver.
— O quê? — Fico meio perdida com a visão que não escuto o início da fala.
— Eu quero ver o quanto tu tá molhadinha.
De novo não consigo falar. Ele me joga deitada na cama e começa a tirar minha calça.
Meu coração parece que vai sair pela boca.
Ai, droga! Será que pode fazer isso depois de dois dias no hospital?
— Murilo...
— Sim... — responde puxando minha calcinha e mal consigo raciocinar.
— Você… — tento continuar e ele beija a ponta dos meus pés, acariciando minhas
pernas. — Você pode fazer isso?
— Isso? — chega na altura da minha virilha e escancara minhas pernas. Caralho! Solto
outro gemido, dessa vez mais alto ainda.
— É... Você pode? Acabou de sair do hospital.
Ele nem me responde. Sua boca cai com tudo em mim. Aqueles lábios fazem ainda
mais maravilhas lá. Já estou sem ar.
— Murilo... É sério...
Para mostrar que não quer conversa, enfia dois dedos de uma vez para me calar.
Caramba, dá muito certo!
— Eu não quero gozar agora... — digo em um suspiro. — Quero ficar louca com você
dentro de mim.
De onde está saindo essas coisas?
Espanto o medo e me deixo envolver pelo momento. Murilo levanta a cabeça para me
olhar. Senhor! Essa visão é para deixar qualquer uma louca. Cabelo bagunçado, lábios
inchados... E ele ainda está os lambendo.
— Ah é?! Então vou deixá-la ainda mais com vontade.
— É possível? — Quase não consigo acreditar.
— Com certeza é.
Murilo sobe seu corpo e chega na minha boca de novo. É gostoso sentir meu próprio
gosto. Ele me beija com vontade e encaixa seu membro perfeitamente entre minhas pernas.
Ok, com certeza ele pode me deixar com mais vontade. Muito mais vontade.
Enquanto vai descendo a boca pela minha orelha, meu pescoço, meu ombro… Se mexe
em um ritmo lento. Caralho! Que coisa boa. E olha que não sou de falar palavrão, na verdade
odeio palavrão.
— Puta que pariu, Murilo! Ahhhhhhh... — Contorço-me toda quando sua boca chega
aos meus seios e ele puxa o sutiã para cima, sem cerimônia, se deliciando deles.
— Shhh... Ainda tem mais. Tu não queria ficar com vontade?
Não estou conseguindo nem enxergar mais direito, minha vista está embaçada. Ele tira
o sutiã e fica sugando um dos meus seios, deixando mordidinhas e lambendo. A outra mão está
entretendo o outro. Troca de lado e vou ficando completamente louca. Louca de desejo por
esse homem.
Agarro suas costas e seu cabelo. Ele geme, sei que gosta. Murilo coloca um dedo
novamente na minha vagina, onde seu membro, totalmente ereto, me castiga ainda vestido, e
eu quase não aguento. Estou praticamente toda latejando.
Ele para e eu aproveito para inverter os papéis. Agora vai sofrer um pouco. Viro-me
rapidamente e fico por cima. Seus olhos vidram, não esperava por essa.
— Caralho, Alice! Que vista, você assim em cima de mim. Gostosa! — elogia
enquanto acaricia meus dois seios com as mãos.
Eu começo a cavalgar nele ainda de cueca.
— Ahhhhhhhh... Porra... — geme alto e eu intensifico.
— Vai pagar com a mesma moeda — falo divertida e Murilo me aperta. Está gostando
da brincadeira.
Começo no pescoço e me deleito no salgado da sua pele enquanto esfrego meu quadril
contra ele. Eu beijo tudo. Cochicho elogios em sua pele. Quando levanto o olhar, encontro-o
me observando. Aperto os olhos fechados enquanto ele crava suas mãos nas minhas costas.
Adoro essa pegada mais firme. Geme e pressiona sua testa contra a minha.
— Alice, eu não tenho tanto autocontrole como você. Não vou aguentar tu assim tão
gostosa em cima de mim. Ahhhhhhhhhhh... — Para quando desço de repente para baixo e
coloco as mãos por dentro da cueca, acariciando. Que delícia ouvir esse gemido.
— Shhhhhhh... Ainda tem mais.
— Está copiando minhas frases agora, é? — Ele abre aquele sorriso maravilhoso. —
Cadê a Alice toda certinha, meu Deus?
— Está dormindo agora, deixa a outra agir — respondo tirando sua cueca e colocando
meus lábios no seu membro.
— Que porra está tentando fazer comigo? Que boca, Alice. Que boca!
Suas palavras me incentivam a chupar cada vez mais. Estou confiante. Acho que
Murilo percebe, pois tudo nele é uma respiração pesada e ruídos graves. Sua expressão é de
tirar o fôlego.
— Deus... Alice... — Toca meu rosto gentilmente. Eu movo minha boca sobre ele,
fazendo cada toque dizer algo.
— Quer que eu pare, Murilo? — Ele aperta os olhos fechados. — Ou quer que eu
continue te tocando?
Quando os abre, há desejo lá. Faminto. Ele envolve a mão no meu cabelo e me puxa no
beijo mais intenso que já trocamos. Murilo tem gosto de tesão. Cheiro também. Seu olhar
esquenta minha pele. Agora não tem volta.
Fico novamente por baixo, presa por esse corpo quente e musculoso. Eu puxo seu
cabelo. Afundo dentes em seu ombro. Cada ruído grave me deixa ainda mais inebriada. Cada
vez que ele se aperta contra mim, posso sentir mais dele. E quanto mais eu sinto, mais eu
preciso. Quando o seu volume encosta na minha vagina perco o ar. Vai acontecer mesmo!
— Alice... — chama com uma voz rouca. — Tu quer mesmo fazer isso?
— Eu quero perder minha virgindade com você. Nunca quis tanto algo na vida como
isso.
Ele volta a me tocar. Cada canto do meu corpo é explorado. Murilo venera minha pele
e faz ruídos suaves que falam mais alto do que a maioria das palavras que já disse. Estou
desesperada para perguntar se isso é normal. Se as outras mulheres com quem ele esteve, se
suas clientes, se sentem assim. Escolho apenas sentir com o silêncio.
Eu o beijo. Sua resposta é faminta. Nunca precisei de nada quanto preciso dele dentro
de mim. Acho que Murilo percebe. Agarra seu jeans do chão, tira sua carteira e coloca uma
camisinha. Jamais imaginei que poderia ser incrivelmente excitante vê-lo assim. Um arrepio
corre por minha espinha. Vou perder minha virgindade.
Ele se ajeita entre minhas pernas novamente e me olha profundamente. Quer confirmar
com meu olhar se quero mesmo fazer isso. Respondo o encarando na mesma intensidade e
encosta seu membro na minha vagina. Agora colocando-o mesmo lá dentro.
Ai. Meu. Deus!
Há pressão, muita pressão, e aumenta enquanto empurra à frente. Ele não vai longe
porque eu, sem querer, solto um grunhido de dor. Está ardendo muito.
— Você está bem? — Vejo sua preocupação, está quase desistindo.
Devo estar mesmo com cara de dor. Faço que sim com a cabeça.
— Não pare — imploro.
Murilo se move novamente, então, a pressão começa a queimar. Quando fecho meus
olhos contra a dor, ele para.
— Alice, se quiser fazer isso, continue olhando pra mim, tá? Eu preciso saber que tu
quer, que está bem. Eu nunca estive com uma virgem, isso aqui é novidade também.
Nunca esteve?
Uma alegria invade meu coração.
Pelo menos em uma coisa sou novidade para ele, algo único. Talvez se lembre de mim
um dia por isso. Obedeço e não fecho mais os olhos. Ficamos nos encarando o tempo todo,
enquanto seu membro vai afundando dentro de mim. Ele está devagar, bem devagar, e
ouvimos nossa respiração ofegante dando eco em todo quarto.
— Tu é incrível — cochicha contra meus lábios. — Eu sabia que seria, mas... Deus,
Alice. Tão apertadinha. Muito gostosa!
Músculos se estendem e doem. Uma pontada de pânico me atinge. Será que vai caber?
Ele balança de um lado para o outro e consegue ir um pouco mais fundo cada vez. Interrompe
o olhar por um minuto para me beijar. Um beijo terno e carinhoso.
— Desculpa por doer.
Outra pressão. Então outra. Eu solto uma longa respiração e ele também. Está
totalmente dentro de mim.
Totalmente.
Eu olho para Murilo surpresa. A dor foi substituída por uma queimação pulsante.
Prazer. Ele sorri feliz e acaricia meu rosto. Somos apenas nós agora. Conectados. É a coisa
mais incrível que já senti. Transbordando com ele, mal posso respirar.
— Tu é... inacreditável. — Abaixa a cabeça no meu pescoço e apenas respira.
Eu o seguro e saboreio o momento. Acaricio suas costas e me remexo com ele.
Com cada arremetida a queimação diminui e, após alguns minutos, estou sem fôlego e
arqueando pela penetração profunda dele. Suas arremetidas se tornam mais confiantes.
— Murilo, isso é delicioso — suspiro no seu ouvido.
Ele beija meu ombro e pressiona a testa contra ele.
— Tu é gostosa demais. Muito apertada. Meu Deus, eu não vou aguentar — admite
com aquela voz rouca e sexy.
Quase não estamos respirando mais. Estou pingando suor e somos só grunhidos.
Suspiros ásperos enquanto nos beijamos e agarramos um ao outro.
Quero contar como ele me tira o fôlego, mas não consigo. Estou hipnotizada demais.
Logo não consigo manter meus olhos abertos, então fecho-os e apenas sinto.
Ele continua penetrando, agora mais forte, e começo a sentir uma onda de prazer
chegando. Abro os olhos para encontrá-lo boquiaberto.
— Alice... não posso mais. Eu vou... Ohhhhhhhhhhh...
Ele desmonta e eu o acompanho.
Uau.
Murilo cai à frente e murmura cochichos incoerentes no meu peito. Suspiro sentindo-
me pesada e saciada. Não posso me mover e não quero.
Estou dolorida. Mas quem se importa depois disso?
Foi muito melhor do que tinha imaginado. Foi intenso. Foi… Foi sem palavras.
Encosto a cabeça em seu peito e me aninho um pouco. Suas batidas soam estranhas,
como se houvesse um eco a mais em seu peito. Abraço-o forte pela cintura.
Será que posso fazer isso?
Deixo para pensar outra hora.
Capítulo 26
♫ Eu quero te contar meu segredo só com
o som da minha respiração. Eu quero saber
que seu coração bate. Quero te dizer. ♫
Let there be love, Christina Aguilerar
MURILO
Eu não acredito que vou assumir isso: estou apaixonado por essa mulher.
Nunca tive experiência parecida na vida, me rendi aos seus encantos. Ela mexeu
comigo desde o dia que a encontrei pela primeira vez. Devia ter fugido daquelas covinhas e
rostinho corado. Alice é muito mais forte do que pensa, muito mais inteligente do que mostra e
muito mais linda do que possa imaginar.
Além de sua beleza exterior que, meu Deus, é de tirar o fôlego, ela tem uma beleza
cada vez mais rara hoje em dia. É bonita por dentro. Preocupa-se sem esperar nada em troca,
quer ajudar genuinamente. Ontem já fiquei mexido quando o enfermeiro falou sobre suas
ligações, porém, vê-la me esperando hoje foi demais. Alice parecia tão feliz em me ver. Veio
até correndo, embora tentasse esconder.
E com meus irmãos, então? Eu estava decidido a parar com isso, a pedir que seguisse
sua vida. Na verdade, eu ainda penso nisso. Alice merece um homem muito melhor do que eu.
Um que não tenha tanta bagagem, tanto problema. Um que possa envelhecer com ela e lhe dar
filhos. Eu não poderei nada disso. Mas como resistir depois de dizer que, mesmo que a gente
tome rumos diferentes, quer continuar vendo Olívia e Raul?
Deitado aqui na minha cama apertada agora, passando a mão em seus cabelos enquanto
ela tenta recuperar a respiração, só consigo pensar como sou um cara de sorte. Eu posso não ter
muito tempo, entretanto, vivi a melhor experiência ao senti-la de um jeito tão profundo.
Não posso negar, eu tive muitas mulheres. Muitas que nem sei dizer. Foram altas,
baixas, magras, gordas, loiras, morenas, negras, ruivas... Algumas mais bonitas que Alice,
inclusive. Contudo, nada se compara a ela. Toda essa beleza sumia com um minuto de
conversa. Pessoas vazias. Com Alice, sua beleza só aumenta à medida que você a conhece.
Caralho! Não acredito que estou mesmo de quatro. Não acredito que realmente me
interessei por alguém. Não só interessar, aliás. É como se meu coração fosse sair do peito.
Nunca tive conexão no sexo. Até hoje. Eu não queria mais sair de dentro dela, nossos corpos
encaixados perfeitamente. E se Deus poderia me aliviar de todos esses problemas que
surgiram, transformou minha garota em uma safada na cama. Como não amar? É a perfeição
que todo homem procura.
Tirando-me dos devaneios, Alice acaricia a lateral da minha cintura e levanta a cabeça,
com aqueles olhos esverdeados lindos. Sorri e eu retribuo. Tenho que controlar minhas
emoções. Não quero dizer nada para ela, mas está difícil.
— Posso te fazer uma pergunta? — pede e fico receoso com o assunto.
Tomara que não pergunte de outras mulheres, não quero estragar o momento a
deixando triste.
— Sim.
— Por que você tem só uma tatuagem colorida?
Ufa! Mas ainda está pensando nisso? Lembro-me dessa pergunta no dia que fiquei
morrendo de raiva dela ser intrometida. Naquele tempo eu não responderia isso para ninguém,
todavia, como ela já passou dessa fase e sabe dos meus irmãos, não vejo problema em dizer.
— Foi a última que fiz, é para Olívia e Raul. Como te contei brevemente, tive uma vida
de merda. Eu comecei cedo a ir para o caminho errado das drogas e do crime e me perdi
totalmente. Só acordei de verdade no fim dos meus 18 anos, ou seja, há pouco tempo. Minha
mãe morreu em seguida e tive que me virar com duas crianças, uma casa, contas... Queria
deixar no meu corpo uma marca dessa nova fase, uma vida mais colorida sem as sombras do
passado, e fiz a Fênix.
— Eu conheço a história. O pássaro que morria e depois renascia, certo?
— Isso mesmo — concordo e meus pensamentos se perdem novamente.
Queria poder ter outra chance de renascer, longe dessa merda de doença!
— É muito linda — elogia passando as mãos delicadas no meu pescoço e já começo a
ficar animado de novo.
Caralho! Ela percebe e dá risada.
— Já?
— Com uma mulher gostosa assim fica difícil se segurar — confesso e Alice sorri
novamente, mas em seguida faz uma careta. Deve estar dolorida.
— Está doendo?
— Um pouco. Nada de mais.
— Ouviu, amigo?! Sossega aí que Alice tem que melhorar para o segundo round.
— Mal posso esperar.
— Safadinha! — Dou um tapa na sua bunda e minha garota solta um gritinho.
— Vamos fazer assim: vou me limpar rapidinho e tu toma um banho. Farei algo pra
gente comer, estou morrendo de fome.
— Nossa, também estou morrendo de fome!
Dou um selinho em seus lábios e corro para o banheiro. Quando volto, ela está enrolada
no lençol, sentada na cama com o cabelo todo bagunçado. Linda! Amo os seus diferentes
lados, de tímida a safada.
— O que tu quer comer?
— Surpreenda-me! — desafia e entra no banheiro.
Escuto o som da ducha ligada e, juro, tenho uma vontade enorme de entrar e fodê-la
encostada na parede. Mas tenho que esperar mais um pouco. Talvez o banho ajude na dor.
Olho para a cama e a mancha de sangue prova sua inocência. Meu Deus! Como essa
mulher incrível aceitou isso? Do sonho do príncipe encantado para um garoto de programa?
Um garoto de programa todo errado. Eu ganhei na loteria por conhecê-la, porém, será que
Alice pode dizer o mesmo? Será que ainda deseja uma vida de contos de fadas? Espanto os
pensamentos e saio com o lençol na mão para lavar. Agora não.
Vou para a cozinha e opto por fazer meu omeletão. É simples, rápido e delicioso. Vai
de tudo um pouco. Separo os ovos, bacon, cebola, cenoura, tomate, cebolinha, manteiga, leite,
trigo, sal e fermento em pó. Tenho tempo de picar todos os ingredientes, bater os ovos e nada
da Alice voltar. Será que foi embora pela janela? Afff... Murilo, não seja ridículo! Deve ter
passado uns trinta minutos já. Quando decido sair em sua procura, ela aparece na porta.
C.a.r.a.l.h.o!
Devo estar de queixo caído, nem ligo. Minha garota lavou os cabelos e eles caem
graciosos em seus ombros. Não vestiu suas roupas. Pegou uma das minhas camisetas e está só
com ela.
Caralho de novo! Que tesão da porra.
Como é alta e tem um corpão, a peça não fica grande. Está justinha, marcando aquelas
tentações de coxas.
— O que foi? Tudo bem eu usar uma camiseta sua? — pergunta receosa.
Deve ter entendido errado a minha cara de tonto.
— Caralho, Alice! Caralho! — digo em voz alta o meu pensamento e ela fica imóvel,
os olhos tensos. — Pode usar essa camiseta para o resto da vida. Tu tá querendo me matar, só
pode. Meu pau vai fugir da calça com você vestida desse jeito. Tá um tesão!
Ela relaxa e sorri, vindo em minha direção.
— Se eu fosse tu não viria aqui agora — advirto.
— Por que não? — provoca com voz sensual.
Já estou apaixonado, desse jeito vou até escrever uma música.
— Alice, não me tente!
— Sabe, eu tava pensando enquanto tomava banho... — fala encostando seu corpo no
meu. — Foi maravilhosa essa experiência, mas ainda falta uma coisa.
— Falta? — questiono engolindo em seco.
Aonde ela quer chegar?
— Eu queria ver como você faz quando não está com uma menina virgem — solta
tentando ser firme, ainda sim, fica corada ao falar.
— O quê? — pergunto para ter certeza que ouvi bem.
Alice enlaça seus braços no meu pescoço e chega mais perto. Ahhh... Esse cheiro de
banho com seu perfume natural.
— Não pegue leve comigo desta vez, Murilo — sussurra em meu ouvido.
Puta que pariu!
Fico olhando para ela um minuto. Tentando absorver seu pedido, tentando lembrar que
é melhor não me envolver mais do que já estou envolvido. Posso ficar perdidamente louco por
Alice.
— Por favor. — pede e meu lado selvagem toma totalmente conta de mim.
Movido por puro desejo de fodê-la bem fundo, no meio da minha cozinha, viro-a
bruscamente de costas e coloco minhas mãos entre suas pernas, enfiando, sem pedir, um dedo
lá.
Alice geme alto e inclina a cabeça, me dando espaço para devorar seu pescoço.
— Tu quer foder gostoso, então, Alice?
— Sim... — responde em suspiros e eu enfio dois dedos dentro dela.
— Então seja uma boa garota e me obedece. Ok?
— Ok.
Estoco com força, fazendo movimentos circulares. Tiro meus dedos e os levo em sua
boca. Quero vê-la chupar tudo.
Não aguento a Alice safada, ela vai acabar comigo. Não reclama, deixa rolar. Lambe
vagarosamente cada um dos meus dedos como se estivesse chupando meu pau. Ahhhh, merda!
Estou fodido.
Abaixo em sua frente e rasgo sua calcinha com as mãos. Sua pupila se dilata, ela está
gostando desse jeito selvagem.
— Agora tu pode me ver melhor chupando, Alice. Presta bem atenção.
Entro com minha cabeça entre suas pernas, de uma forma que ela possa ver
perfeitamente o que estou fazendo. Seguro-a firme pela bunda, dando tapinhas e apalpando
com gosto.
— Ahhhhh... Murilo.
Ela é só gemido. Não está aguentando nem respirar direito. Sua perna está ficando mole
embaixo de mim. Alice se apoia na mesa para não cair. Abaixo minha calça com uma das
mãos e começo a me tocar.
— Olha aqui. Estou me masturbando enquanto fodo você com minha boca. Se toca,
Alice. Levanta essa blusa, acaricia seus seios pra mim.
Queria ler seus pensamentos. Minha garota está com os olhos ardendo de desejo, morde
os lábios constantemente. Parece até que vai sentir dor, de tanto que os pressiona. Fico de lado
para que ela possa ver meu pau, e volto a torturá-la com a língua. Sei trabalhar, modéstia à
parte.
Não deixo nenhum minuto de olhá-la e quase gozo quando me obedece e levanta a
blusa. Alice está sem sutiã. Oh, meu Deus, que visão! Aperta o bico do peito e os acaricia
devagar. Pego uma de suas mãos e a coloco ali para me ajudar.
— Enfia, Alice. Se masturba também — encorajo e ela faz. Caralho!
Chego ao seu ponto fraco, o clitóris, e é só gemido. Não me importo que esteja alto.
Que se foda se alguém ouvir! Quero essa mulher louca por mim. Quero inteira. Minha.
Levanto sem avisar e a viro de costas novamente, colocando-a de bruços sobre a mesa
da cozinha. Faço tudo tão rápido que se assusta e grita. Porém, é um grito de prazer que chega
direto lá embaixo.
— Tá bom assim? — pergunto, mas fico sem resposta. Alice está extasiada, só balança
a cabeça. — Ahh... Você de quatro assim!
Pego uma camisinha do bolso da calça e rasgo o pacote com a boca. Enquanto faço isso
com uma mão, a outra está dentro dela, estocando firme. Essa visão da sua bunda está quase
me explodindo. Coloco-a e entro rapidamente sem pedir licença.
— Diga-me se em algum momento machucar ou tu quiser parar, ok? — aviso ofegante.
É bom demais estar dentro dela. Não quero mais sair daqui.
— Ok — responde também com dificuldade. — Ahhhhhhhhhhhhh…
Sua reação às minhas investidas mais duras é maravilhosa.
Entro num transe e não consigo sair de lá. Cada impulso mais fundo e forte que o outro.
Estou segurando suas costas com uma mão, enquanto apoio a outra na mesa. Nem dei o
trabalho de tirar minha calça, ela está caída sobre meus pés, assim como Alice continua com a
blusa. Estou a fodendo na mesa.
Minha respiração já está profunda, debruço-me sobre ela e agarro seus seios por dentro
da blusa, apertando-os com força. Lindos. Meus.
— Mais forte — incentiva e vou à loucura.
Gemo em seu ouvido e agarro seus quadris com as duas mãos. Quer mais forte? Assim
teremos! Bato mais e mais rápido, uma batida alucinante. Alice começa a gritar alto e tampo
sua boca.
— Toque-se. Agora! Vem gozar comigo.
Ela desce suas mãos na vagina inchada. Queria poder estar sem camisinha para senti-la
pura. Para marcá-la para sempre, onde ninguém vai chegar. Tiro-a da mesa e a deixo em um
ângulo mais baixo, onde sua bunda fica arrebitada.
— Ahhhhhhhhhhhh... Murilo, eu não vou aguentar — confessa.
A penetração nesse ângulo é ainda mais profunda, intensa. Já estou à beira do orgasmo.
— Eu quero que tu goze primeiro, depois vou gozar na sua boca.
Quando percebo que minha garota está chegando lá, entre gemidos, suspiros e gritos
abafados, volto a penetrar fundo. E rápido. Alice se perde em mim, começa a ficar mole.
Deixo-a ajoelhada no chão e saio dela, quase não me aguentando. Jogo meu jato de líquido
quente na sua boca aberta à minha espera.
— Ohhhhhhh... Caralho, Alice!
Fico anestesiado com o turbilhão que me toma, olho para Alice e ela parece como eu.
Estamos perdidos em sensações.
— Nossa, Murilo... Isso foi... foi... Não tenho palavras.
Ajudo-a se levantar com um sorriso que é retribuído.
— Tu... Alice, tu me deixa louco. Sério, nunca foi assim tão intenso. Com ninguém.
— Sério? — pergunta muito animada.
— Sério. Meu coração não quer desacelerar.
— O meu também não.
Encaro-a por alguns minutos. Meu Deus, o que eu vou fazer? É justo ficar com Alice?
Nunca quis tanto uma coisa na vida. Queria que agora pudesse ler meus pensamentos e me
ajudasse a fazer o certo.
Pego em suas mãos e a levo até o banheiro. Temos que nos lavar de novo e, dessa vez,
vou entrar junto para ensaboá-la.
— Alice, eu quero tomar banho com você, mas para seu bem é melhor ficarmos um
pouco longe. — Sorrio.
— Acho que consigo fazer isso — responde divertida.
Adoro esse seu jeitinho. Droga, estou virando aqueles idiotas que acha tudo lindo. Que
beleza!
Tiro minha blusa dela e ligo o chuveiro no quente. Alice está me observando com as
mãos tampando o corpo. É engraçado como seu modo tímida é ligado automaticamente quando
não está no sexo.
— Não precisa ficar com vergonha. Tu é linda! — encorajo e ela cora.
Livro-me da calça e entramos no box. É apertado, então minha ideia de ficar longe não
dá muito certo. Merda! Acalme-se, Murilo. Não posso machucá-la, já foi demais o que
acabamos de fazer.
Pego a bucha e esfrego sabão na minha garota. Começo por seu pescoço e vou
descendo lentamente. Não desviamos o olhar. Ela parece assustada. Na verdade, esse é um
momento muito íntimo. Nunca dei banho em uma pessoa antes, estou adorando. Abaixo-me
em sua frente e Alice suspira. Dou risada e balanço a cabeça em negativa para seus
pensamentos. Pego suas pernas grossas e deliciosas para lavar. Oh, força de vontade. Cadê
você?
Levanto-me e ela tira a bucha das minhas mãos.
— Minha vez — avisa e eu não reclamo. Deixo-a também ter esse contato.
Alice segura na minha cintura e começa pelo abdômen. Chega mais perto e encosta
seus seios nus redondos no meu peito. Olho-a em chamas.
— Não faz isso. Já estou no limite — suplico em seu ouvido.
Ela não escuta e chega ainda mais perto, envolvendo-me em um abraço enquanto
ensaboa minhas costas. Sinto sua risada no meu pescoço. Estou fodido. Completamente fodido,
louco por ela.
Alice desce a esponja para meu membro e se demora ali. Aprendeu a torturar, filha da
mãe! Sobe novamente, joga a espoja no chão, segura meus cabelos com as duas mãos e me
beija. Um beijo que começa muito devagar. Íntimo demais.
Encosto-a na parede e a pego pelas pernas, que se grudam nas minhas costas. Amo
segurá-la assim, firme em meus braços. Estou ardendo de desejo, mas quero fazer tudo
devagar. Quero fazer amor com ela de novo, como da primeira vez. Com aquela conexão de
olhares e corpos. Não paramos o beijo, ainda terno. Queria muito entrar nela sem camisinha.
Sei que não é certo, só que estou morrendo de vontade.
— Alice... — chamo com a voz rouca. — Tu toma pílula ou algum outro método
contraceptivo?
— Comecei a tomar pílula quando aceitei ficar com você. Por quê? — explica e
arregala os olhos. Já sabe o que vou falar.
— Tu confia em mim?
— Muito — responde sem um milésimo de segundo de dúvida.
Porra! Amo essa mulher.
— Eu faço exames regularmente, não tenho nenhuma doença contagiosa. Eu juro.
Nunca, nunca fiquei com uma mulher sem camisinha. Mas, Deus, Alice! Eu queria entrar em
você sem nada. Tu deixa?
— Sim…
Meu coração está batendo acelerado, droga, tomara que não perceba. Ainda estou com
ela no meu colo, encostada na parede. Volto a beijá-la com carinho e coloco meus dedos entre
suas pernas.
— Ahhh... Sempre pronta, que delícia.
Ela respira com dificuldade, já com puro desejo de me ter novamente. Possuo-a
devagar, quero lento, bem lento desta vez. Alice está apoiando suas mãos nos meus ombros e
joga a cabeça para trás quando estou completamente dentro dela.
— Alice... Meu Deus... Porra! Tão apertada, tão molhada... tão gostosa!
É incrível estar dentro dela sem nada que me atrapalhe senti-la por inteiro. Ahhh,
mulher, o que você está fazendo comigo? Seguro-a mais firme pelas pernas e começo a
aumentar o ritmo lentamente. De pouquinho a pouquinho. Dou beijos molhados e quentes até
os seus seios. Alice chega mais perto, enlaçando seus braços no meu pescoço e baixando a
cabeça no meu ombro.
— Murilo... é sempre assim, tão bom? — sussurra.
— Na verdade, não. A gente que se encaixa muito bem — respondo sinceramente.
Eu queria dizer mais, queria dizer que nunca tive um sexo tão maravilhoso. Que nunca
tinha feito amor na vida, porém, ainda não decidi se isso é uma boa ideia.
Aproveito a nova posição para estocá-la mais fundo, ainda lentamente. Estamos
grudados, só ouvindo respirações pesadas, gemidos e suspiros. Porra! Não imaginava que o
lento poderia ser tão bom. Voltamos os olhares e já não estou aguentando mais.
— Fica olhando pra mim, tá? — peço e ela concorda.
E assim tenho a experiência mais incrível que já tive com uma mulher. Intensa, com
sentimento. Entro e tiro meu pau de dentro dela completando-a, nos deixando à beira do
orgasmo.
— Rápido, por favor, Murilo. Não aguento mais.
Também não aguento e a obedeço, afundando-me nela mais e mais fundo. Alice está
mordendo os lábios, cravando suas unhas nas minhas costas. Eu estou apertando sua bunda
com força.
— Vem comigo. Vem!
Ela vai. Oh, caralho, ela vai! Perco-me na sensação sem explicação de deixar meu
líquido invadi-la. Dou um gemido alto e animalesco, jogo minha cabeça para trás, totalmente
perdido no êxtase daquele momento. Uau, isso foi demais!
Alice me abraça, me abraça forte quando a coloco no chão. E ficamos assim por um
tempo que não sei dizer, em silêncio, absorvendo essa intimidade intensa. Só deixando a água
cair sobre nós.
***
Quando me dou conta, já são oito horas da noite. Depois do banho inesquecível, fomos
comer, enfim, meu omeletão. Tive que fazer três de tanta fome. Amo o jeito de Alice sem
cerimônia. Foi ela quem pediu o terceiro, disse que ainda nem tinha tampado o buraco do
estômago. Gargalhei por longos minutos.
Ela me ajudou a lavar a louça quando terminamos e lhe contei um pouco sobre minha
infância e adolescência. Depois de Max e Vagner, é a única que sabe essas coisas. Falei da
experiência horrível da prisão, apanhando todo dia porque me achavam X9. Cheguei a ficar em
coma com uma surra de vinte garotos. Também comentei sobre as drogas que minha mãe
usava e os perrengues que uma criança assustada teve que enfrentar. Alice ficou boquiaberta a
maior parte do tempo, não acreditava naquilo. Sempre com um olhar de ternura.
Agora estamos deitados no sofá, com as pernas na mesinha do centro comendo pipoca
e assistindo a "Como se fosse a primeira vez". Se alguém me falasse isso há dois meses eu
morreria de tanto rir. Vendo filme de romance, em um sábado à noite. Com uma mulher. Sem
sexo.
Alice encosta a cabeça nos meus ombros, o cansaço da maratona de hoje deve estar
chegando.
— Tá com sono?
— Nossa, bateu uma canseira aqui! — confessa e sorri.
— Normal, vem cá. — Deito-a com a cabeça no meu colo e afago seus cabelos.
Ela se aninha e tenta prestar atenção no filme. A cena está na parte que Adam Sandler
descobre que a mulher por quem se apaixonou tem um problema sério de memória e sempre
esquece o que aconteceu no dia ao dormir.
— Deve ser muito triste isso, né?! Ter uma doença que você não tem controle, não tem
cura. Você não pode ter lembranças, aproveitar os momentos, os filhos.
Fico em silêncio com seu comentário. Droga! Uma hora eu teria que cair na realidade.
A minha consciência volta com tudo para lembrar que foi uma péssima ideia o que fizemos
hoje. Se eu já estava apaixonado de manhã, agora estou completamente louco. Meu coração só
bate por Alice, ela domina todos meus pensamentos.
— Tu sonha em ter filhos? Essas coisas de família? — questiono tentando ser casual,
mas até engulo em seco. Sorte que ela não pode me ver.
— Claro! Que mulher não gostaria de ter filhos? Eu queria dois, uma menina e um
menino — responde sorrindo, sem tirar os olhos da televisão.
Puta que pariu! Comigo Alice nunca teria filhos se ficássemos juntos. Nem fodendo ia
arriscar a vida de uma criança inocente com uma merda de doença hereditária que pode
destruí-la e suas próximas gerações. Continuo afagando seus cabelos e ela cai no sono.
Meu coração se aperta. É justo pedir para Alice ficar comigo? É justo inseri-la nesse
universo da favela, eu com duas crianças de bagagem? Não tenho emprego fixo, já fui garoto
de programa. Sou pobre, mal conseguimos sobreviver. E o pior, tenho uma doença rara. Prazo
já estipulado. O médico foi muito claro ao explicar que não terei uma vida fácil. Esse problema
nos rins foi só o primeiro. Serei um peso para ela, um peso atrapalhando seus sonhos.
Meu Deus! O que eu faço? Por favor, me dê um sinal. Meu coração a quer, minha
mente diz para deixá-la seguir em frente. Acredito que fui importante, Alice já está muito mais
solta de que quando a conheci. Começou a ver o mundo por outro ângulo. Só de ter feito isso
por ela me sinto feliz.
Um telefone começa a tocar, me levanto encostando sua cabeça na almofada. Dormiu
mesmo, tão linda assim despreocupada. Quando chego ao quarto percebo que não é o meu, e
sim o dela. Cinco ligações perdidas da sua mãe. Deve estar ruim mesmo o aparelho, só ouvi
agora o toque.
Seguro-o nas mãos e meu sinal vem. Vem e não é nada agradável, aperta meu coração e
me deixa sem ar. Na tela aparece uma mensagem bem clara e que não me deixa dúvidas.
Alice, por favor, me escuta. Foca nos seus planos, filha, seus planos de uma vida toda.
Esquece esse cara. Ele não é pra você.
Maldito celular estragado!
Se não estivesse com problemas não veria essa mensagem. Mas eu queria um sinal,
agora não posso ignorá-lo. Preciso deixar Alice ir, não sou mesmo homem o suficiente para
ela. Merece alguém melhor, sem um passado assombroso, sem doença para destruir um futuro
próspero. Sento na cama e fico lá por horas, com a cabeça baixa e as mãos no pescoço.
A única mulher que amei, provavelmente, a única que vou amar.
Eu queria meu “para sempre” com ela.
Porra! Como eu queria que essa merda existisse.
Capítulo 27
♫ Só temos uma vida para viver e não temos tempo
pra desperdiçar, pra desperdiçar. Então,
deixe-me dar um tempo ao seu coração. ♫
Give your heart a break, Demi Lovato
ALICE
Acordo com o pescoço doendo, não acredito que peguei no sono. Que horas são? A
televisão está ligada no mesmo canal e o pote de pipoca foi deixado na mesinha. Procuro
Murilo, mas ele não está aqui. Sento no sofá com os olhos meio fechados, ajeitando o cabelo e
puxando a blusa para baixo. Ainda estou com ela, tenho que admitir que fica sexy mesmo.
Aliás, meu Deus! O que aconteceu hoje? Nem acredito que perdi minha virgindade
com esse homem maravilhoso que se faz de durão, entretanto, no fundo é uma pessoa incrível
e dedicada à família. Confesso que no início o julguei, mas não há como não admirá-lo agora.
Sei os seus motivos.
Estou me sentindo tão diferente. Como se estivesse completa pela primeira vez. Meu
coração acelera só de lembrar as cenas de horas antes. Cama, cozinha, banheiro... Nem sei
dizer qual foi melhor. Eu fui tão ousada! De onde saiu aquilo de provocá-lo? Seja de onde for,
gostei. Gostei de aproveitar o momento sem pensar demais. Preciso fazer isso mais vezes na
vida, agir por impulso pode ser muito bom. E se não for, vale o aprendizado.
Levanto-me e vou procurá-lo pela casa, está tudo muito silencioso. Quando chego na
porta do seu quarto, vejo-o sentado na cama, de cabeça baixa e mãos no pescoço. Tão
pensativo! Parece que ficou horas nessa posição.
— Tudo bem? — pergunto indo em sua direção e ele levanta a cabeça assustado.
Os olhos estão vermelhos, se não o conhecesse diria até que chorou.
— Já acordou? — responde com outra pergunta. — Que horas são?
— Não sei, perdi a noção. Faz tempo que você está aqui? Aconteceu alguma coisa?
— Não, tá tudo certo — Murilo diz tentando ser casual, mas tenho certeza de que
aconteceu algo. Sexto sentido de mulher não falha! — Queria te perguntar uma coisa.
— Sim.
— Tu gostou da experiência da primeira vez? Foi como sempre quis?
— Foi muito melhor do que eu tinha imaginado — afirmo sorrindo. E foi mesmo!
— Sério?
— Muito sério — falo e sento-me ao seu lado na cama.
— Que bom, fico feliz por isso.
— E pra você?
— Pra mim o quê?
— Foi bom?
— Foi único! — admite e abaixa a cabeça de novo, passando as mãos pelos cabelos.
— Você quer me falar alguma coisa? — questiono e Murilo fica em silêncio, me
olhando por longos segundos.
Vejo confusão em seus lindos olhos castanhos.
— Sabe o que é, Alice... Eu... Eu gostei muito mesmo dessa experiência, foi bem
diferente pra mim. Mas... agora preciso seguir minha vida. Desculpe, não quero magoar
você… Se lembra do nosso acordo, né?! — pergunta ansioso.
Ok, por essa eu não esperava.
Fico tão em choque com as palavras que nem consigo responder de imediato. É claro
que me lembro do acordo. Apenas encontros esporádicos sem envolvimento para que eu
pudesse perder minha virgindade.
Hoje perdi, agora acabou.
Alice, você sabia que não era para ter sentimentos por ele. É um garoto de programa,
conhece dezenas de mulheres por semana. Por que acha que com você seria diferente? Cliente
vip? Droga de reações físicas para nossos sentimentos!
Minhas mãos estão suando frio, sinto tremores na barriga, meus olhos não piscam e
minha boca está seca. Preciso responder algo logo. Não quero parecer a mesma menininha
sonhadora e chata de antes. Até porque não sou mais. Eu cresci bastante nesse tempo, e tenho
que agradecer Murilo por isso.
Respira, calma! Foram bons momentos vividos juntos e é isso que você precisa levar.
Guarde os sorrisos e os olhares na lembrança. Não precisa se arrepender da sua escolha.
— Lembro sim — respondo, enfim, com um sorriso fraco. — E agradeço você pela
proposta. Acho que tive bons aprendizados nesse tempo, não só naquilo, pra vida!
— Tu é uma garota incrível, viu?! Não deixe nunca que digam o contrário. Confie em
você, no seu verdadeiro eu, que tudo se ajeita. Não vai ser um mar de rosas sempre, mas tu
chega lá — Murilo encoraja segurando minhas mãos e me encarando daquela forma que dá
vontade de abandonar tudo.
— Eu posso ver as crianças de vez em quando? Combino com a Dona Emília de pegar
com ela — questiono esperançosa. Não queria me afastar deles, já são meus amigos.
— Claro! Agradeço muito por isso. Tu não precisa...
— Eu quero! Quero sair com eles porque gosto. São crianças incríveis.
— Obrigado mesmo — agradece de cabeça baixa novamente, acariciando meus dedos.
— Eu vou indo, então, tá?! Preciso arrumar as coisas lá em casa. Olívia, Raul e eu
fizemos uma boa bagunça — explico sorrindo.
— Já? — Murilo levanta a cabeça de repente, vejo tristeza ali. — Eu levo você, então.
— Sua moto ficou lá em casa, esqueceu? E eu tô com o carro da Claudinha.
— Nossa, é verdade. Posso ir com você pra pegar a Rabbit?
— Tá bom.
Levanto da cama, que me traz lindas lembranças, e pego minha roupa na escrivaninha
do computador. Nem estou acreditando que disse tudo isso numa boa, sem surtar nem idealizar
nada. Enquanto me visto, Murilo não tira os olhos de mim, como se registrasse na memória
cada parte do meu corpo. Eu realmente vou sentir falta desse homem, do seu cheiro, seu
sorriso, seu toque... Contudo, eu sabia desde o começo que teria um prazo para o fim, e apesar
da dor que insiste em apertar o meu peito, estou feliz por ter aceitado.
Foram dias maravilhosos, que eu não teria se tivesse continuado sonhando com o
príncipe encantado. Eu não menti. Minha primeira vez foi totalmente diferente do que tinha
imaginado. Só que foi também bem melhor. Não tinha velas espalhadas pelo ambiente nem
pétalas de rosas na cama, mas havia um homem e uma mulher conectados profundamente. Isso
não vou esquecer jamais.
Entramos no carro em silêncio, Murilo ainda está bem pensativo. Conversamos só o
necessário, enquanto ele se perde em olhar para o nada pela janela. Faço o mesmo. Espero que
tenha sido uma experiência legal para ele como foi para mim. Não tenho a pretensão de ter
sido a melhor, mas gostaria que se lembrasse com carinho. Porque com certeza o farei.
Assim que chegamos à república a tensão fica ainda maior, despedidas nunca foram
meu forte.
— Você quer subir pra pegar a chave?
— Eu espero aqui, pode ser? Quero pegar Olívia e Raul com a Dona Emília hoje ainda.
— Tudo bem, só um minuto.
Confesso que não reclamaria se ele subisse e a gente repetisse mais uma vez nossas
cenas de intimidade intensa. Porém, é melhor assim. Eu preciso acalmar esse coração que
ainda está batendo forte e não confundir as coisas. Foi bom enquanto durou. Foi muito bom!
Espanto uma lágrima que escapa dos olhos com o canto da mão e pego a chave no balcão da
cozinha.
Ao encontrá-lo de novo na entrada do prédio, está encostado na mureta, perto da
portaria, olhando para o céu. Que visão linda, vou sentir saudade...
— Aqui está. — Aproximo-me entregando-as.
Ele olha para mim com aqueles olhos. Aqueles de tirar o fôlego e cruza os dedos nas
minhas mãos, encostando seu corpo no meu. Sobe para a minha cintura e me abraça forte.
— Obrigado, Alice. Obrigado por tudo, tá?! — fala baixinho em meu ouvido.
— Eu que agradeço —respondo quase inaudível.
E, então, nossos lábios se encontram mais uma vez em um beijo que começa terno,
singelo, e rapidamente se torna desesperado. Não tenho dúvidas, é um adeus, uma despedida.
Mesmo que me encontre com os irmãos dele, provavelmente Murilo não verei mais.
***
O domingo passa arrastando e, por mais que eu queira esquecer, as cenas do dia
anterior não saem da minha cabeça. Droga, Alice! Cadê a parte do não se envolver? Não se
apaixonar? Preciso distrair minha mente e nada melhor do que a louca da minha amiga.
Claudinha chegou de viagem agora há pouco e está vindo para casa de táxi para saber
das novidades. O porteiro já até anunciou sua chegada. Quando mencionei ao telefone que
tinha perdido a virgindade, quase enfartou no aeroporto. A campainha toca e sei que é ela.
— Alice, conte-me tudo, não me esconda nada! — Claudinha chega apavorada, nem
espera eu abrir a porta direito.
— Olá! Boa tarde pra você também.
— Boa tarde o cacete! Desembucha mulher, 19 anos para acontecer e tu quer se ater a
formalidades — fala e eu caio na risada. Com ela não tem como ficar triste.
— Então, foi ontem. Depois que ele saiu do hospital, ficamos sozinhos na casa dele e
rolou.
— Nem esperou o menino se recuperar direito? — Claudinha me provoca divertida.
— Pois é. — Coro.
Passo a próxima hora contando quase todos os detalhes para minha amiga curiosa que
questiona a cada dois segundos. Algumas coisas como, as que aconteceram no chuveiro,
prefiro guardar só para mim.
— Caramba, Alice! Três vezes seguidas? Tá fraca não, hein?! Na minha primeira vez
eu achei horrível, doeu pra caramba.
— Doeu só um pouco, depois eu gostei.
— Ele foi cuidadoso com você?
— Sim, muito — admito lembrando de todo cuidado que Murilo teve.
— O que foi? Alice, não me diga que tu tá triste porque não vai ver mais ele?
— O quê? Não. Tô de boa, Claudinha.
— Sei! Como se não te conhecesse… — ela bufa.
— Obrigada por ter insistido nessa ideia maluca, viu?! Foi inesquecível. Acho que
pude ver a vida por uma perspectiva diferente durante esse tempo convivendo com ele e seus
irmãos. Até tomei uma decisão hoje cedo.
— Qual? — pergunta curiosa.
— Vou mudar de curso. Amanhã mesmo procurarei a universidade para ver como
funciona. Terei que sair do estágio, mas não tem problema. Tenho um dinheiro guardado e vou
economizando até conseguir outro na área de Serviço Social.
— Caralho, Alice! Que ótima notícia. Fico muito feliz por você. Siga seu coração.
Abraço minha amiga e sorrio por dentro com a ironia de sua frase. Se eu fosse seguir
meu coração, a essa hora estaria com um certo alguém lá no Morro do Alemão.
Capítulo 28
♫ Por favor, tenha misericórdia de mim.
Vá com calma com o meu coração, mesmo
que não seja sua intenção me machucar. ♫
Mercy, Shawn Mendes
MURILO
O dia passou voando! Graças a Deus, porque ontem foi um inferno. Cada minuto do
meu domingo pensei em Alice e em como esquecê-la. As lembranças do seu cheiro, seu
sorriso, seu gosto me deixam louco. É uma droga estar apaixonado! Se você não pode ficar
com a pessoa, fode sua vida. Como eu queria estar com ela agora, compartilhar esse momento
de alívio.
A única notícia boa desta segunda-feira nublada é que Olívia e Raul não herdaram a
minha doença. Se todos nós tivéssemos, eu não ia suportar. Hoje de manhã os trouxe para fazer
a análise do DNA em uma clínica particular, devido à influência e ajuda do Doutor Bernardo, e
agora no início da noite já ficou pronto. O resultado sai rápido, ainda bem.
— Você não tem mesmo mais parentes próximos que possamos fazer a análise do
hederograma? É importante identificar outros membros da família para o tratamento —
pergunta Doutor Bernardo.
— Se temos, eu não tenho contato. Meus avós não conversavam com a minha mãe.
— Entendo. Então, agora é focar no seu tratamento, Murilo. Já estou verificando para
conseguir a terapia de reposição enzimática pelo SUS.
— Uma curiosidade, Doutor. Por que eles precisaram fazer exame de DNA e eu não?
— Nos homens, a confirmação do diagnóstico da doença é feita através de um exame
de sangue que mede a atividade da enzima alfa-galactosidade A. Como muitas mulheres
apresentam atividade da α-Gal A dentro dos limites de normalidade, é ideal que seja solicitada
a análise do DNA para que o diagnóstico possa ser confirmado. Não há registro de homens
com Síndrome de Down e Doença de Fabry, por isso, achei melhor avaliar o Raul também pelo
DNA para não ter erro.
— Ahh, sim. Pelo DNA não tem como errar, né?! Sei lá, descobrir no futuro a doença?
— Não! É garantido.
— Ufa, que bom! Obrigado por tudo. Não sei como agradecê-lo.
— Não tem o que agradecer, Murilo. Tem que se cuidar! Você precisa tomar os outros
remédios que passei para o tratamento sintomático do rim, que foi o principal órgão afetado até
o momento. Se progredir, como já expliquei, pode ser necessário iniciar a hemodiálise e até
optar pelo transplante.
— O senhor acha que vou precisar de um transplante? Tenho pouquíssimas pessoas
conhecidas que poderiam fazer o teste de compatibilidade e sei que a fila de espera é longa.
— Temos que monitorar, a situação atual não é das melhores. Encontrar um doador
vivo entre os familiares e mais próximos é o ideal e mais rápido. A principal característica das
listas é que elas não funcionam por ordem de chegada, em que o primeiro a se inscrever
receberá o órgão antes do segundo e assim consecutivamente. Em vez disso, os critérios
obedecem a condições médicas. São três fatores determinantes: compatibilidade dos grupos
sanguíneos, tempo de espera e gravidade da doença.
— Espero que não precise.
***
Saio do consultório em Ipanema já por volta das sete e meia da noite e paro um pouco
na Praia de Copacabana para olhar o mar. Ele sempre acalma meus pensamentos. Não quero
ficar abusando da Dona Emília agora que não estou fazendo programa, mas preciso de um
momento. Aconteceu muita coisa nesses últimos dias, me sinto pesado. O que mais me intriga,
porém, é que apesar do diagnóstico preocupante e sério que recebi de uma doença rara não é
isso que ocupa minha mente. E sim ela. Suas covinhas, seu olhar, seu corpo quente... Puta que
pariu, estou ferrado!
Meu celular vibra e vejo a foto de Max chamando no Skype pela terceira vez hoje.
Ontem à noite, em um dos momentos de tristeza, mandei e-mail para ele contando as péssimas
novidades sobre minha saúde. Que droga! Não devia ter falado porra nenhuma, agora vai ficar
me atormentando.
Penso em ignorá-lo de novo, entretanto, aproveito o sinal do Wi-fi na orla e o silêncio
em minha volta, apesar do local costumar ser lotado, para atendê-lo.
— Caralho, Murilo! Joga uma bomba na gente e não atende essa merda de telefone.
— Estava ocupado, Max — defendo e ele revira os olhos.
— Que história é essa de doença rara? Pelo amor de Deus! Estou quase pegando um
avião aqui.
— Estou na rua, Max. Acabei de sair da clínica onde Olívia e Raul também fizeram
exames. Depois eu converso com calma em casa. Mas, resumindo, eles estão limpos, graças a
Deus, e eu terei que fazer acompanhamento médico para o resto da minha curta vida.
— Como assim curta? — pergunta preocupado.
— Quem tem essa doença tem expectativa de vida reduzida.
— Porra, Murilo! Que merda...
— Ei, olha quem está aqui.
Uma voz conhecida interrompe a conversa, vindo pelas minhas costas e Max fica
pálido na tela do Skype. Também reconhece esse som.
Abaixo o celular para que ela não veja. Tudo que eu não preciso agora é um clima
tenso entre Max e Claudinha. Desde que ele foi embora e a deixou nunca mais se falaram.
Acredito que ainda se amem, mas ela não vai assumir nunca. Assim como eu.
— Oi, Claudinha — acentuo seu nome para que Max permaneça em silêncio.
— Eu ia lá no bar do Rafa te procurar, mas tava ali andando na areia para refrescar as
ideias e o vi.
— Até esqueço que tu mora por aqui. Por que ia me procurar? — questiono curioso.
Será que aconteceu algo com Alice?
— Pra te pagar, ué. Trato é trato! Fiquei sabendo que, enfim, vocês chegaram lá. —
Ela sorri e eu fico sério.
Que merda é essa de pagar? De forma alguma vou aceitar qualquer dinheiro pelos
momentos maravilhosos que tive com Alice.
— Eu não quero um centavo por isso, Claudinha — falo e ela arregala os olhos,
fechando a cara.
— Por que não? Foi o combinado.
— Foi antes de eu conhecê-la. Não vou cobrar porque não me senti com uma cliente,
foi bom e não quero receber por isso.
Se eu pudesse ler mentes, tenho certeza que veria Claudinha me xingando de tudo
quanto é palavrão existente na face da Terra. Droga! Tenho que segurar esse impulso de
homem apaixonado perto dos outros.
— Não me olha com essa cara, Claudinha. Já fiz isso outras vezes quando curto a
cliente. Fica na paz que não estou de quatro por sua amiga, não — explico tentando parecer
verdadeiro.
— Mas é um mentiroso mesmo! — o filho da puta do Max fala alto e Claudinha fica
paralisada. Droga!
— Tu… tu tava em alguma ligação? — ela questiona querendo ter certeza que ouviu
direito.
— Desculpa, Claudinha. Eu estava falando com o Max antes de tu chegar e tentei não
criar um clima chato.
— Bom, já vou indo, então. Tem certeza que não quer a grana?
—Tenho sim — respondo convicto.
— Espera aí, Claudinha. Não precisa ir por minha causa — o idiota do Max continua
falando. Meu Deus! Não tem noção do perigo. — Você está bem? Tô com saudade.
— Pois eu não tenho nenhuma. E se estou bem ou não, não te interessa. — Ela pisa
duro e sai explodindo de raiva.
Quando está bem longe do meu campo de visão, ajeito o celular que já estava levantado
a essa altura e não resisto da vontade de tirar sarro do meu amigo.
— Cara, é sério isso? Tu é um sem noção — falo rindo.
— Cala a boca, Murilo. Você não sabe como tive que me segurar para não falar nada
antes.
— Claudinha ainda não superou a separação de vocês, sabe disso?
— Me dói muito isso. Queria que ela entendesse minha escolha.
— Tenho certeza que ela gosta de você ainda. Se não gostasse não ia agir assim.
— Eu sei. — Ele sorri esperançoso. — Ela gosta e você está de quatro por essa tal de
Alice.
— Não me enche, Max!
— Eu soube desde o dia que me falou sobre ela outro dia — enaltece orgulhoso.
— Eu gosto dela sim. Está satisfeito?
— Ahhh, meu caro, isso é muito mais que gostar. Conheço essa cara de bobo.
— Não abusa, Max — aviso tentando parecer irritado, mas, no fundo, aliviado de
assumir isso para alguém. — Conversamos mais tarde, preciso ir embora.
— Tudo bem, apaixonado — responde gargalhando.
— Vá se ferrar!
Desligo e volto a apreciar o mar mais um pouco. É! Não tem mesmo como negar. Estou
apaixonado por Alice. Reparo as ondas indo e vindo e, pela primeira vez nos meus 22 anos de
vida, tenho a inspiração de uma música romântica. A primeira feita para ela.
Capítulo 29
♫ Abra seus planos e, caramba, você é livre. Olhe dentro
do seu coração e vai descobrir que o céu é seu. ♫
I'm yours, Jason Mraz
ALICE
Dizem que o tempo cura as feridas, que faz a gente esquecer e seguir em frente. Eu,
realmente, avancei depois que conheci Murilo. Porém, tirá-lo da minha cabeça é outra coisa
bem diferente. Já se passaram seis meses desde o dia que o vi pela última vez. Parece que foi
ontem. Sinto sua presença cada vez mais viva dentro de mim.
Quando nos despedimos naquele sábado muitas palavras não foram ditas. Eu queria
contar que estava apaixonada e que adoraria tentar um relacionamento de verdade, passar mais
tempo com ele. Tive outras experiências passageiras nesses meses e nem se compara. Só não
me arrependo de ter deixado como combinado porque acredito que algo mais duradouro não
combina com o seu jeito e eu, realmente, precisava de um tempo para mim. Nem que eu
quisesse ia conseguir manter o Murilo só no sexo. Já estava, ou estou, para lá de envolvida.
O ruim de ser uma sonhadora e idealizar as coisas é que você vive em um mundo de
ilusão, onde tudo é perfeito e os problemas não existem. Daí cai na realidade, leva uma porrada
depois da outra e se torna uma sombra.
Não fosse meu conto de fada totalmente invertido, talvez ainda estivesse sonhando
acordada. Vivendo de aparências em vez de aproveitar das dificuldades do dia a dia para
crescer. Continuaria me sentindo vítima da minha própria história, não a protagonista. Graças a
Deus acordei. E amo a pessoa que me tornei depois que o conheci.
Naquela mesma semana que nos despedimos, eu conversei com meu chefe e expliquei
que ia mudar de curso na faculdade. João nem acreditou que Administração não era meu
sonho. Segundo ele, eu fazia tão bem meu trabalho e era tão dedicada que podia jurar que
sempre quis ser uma empresária. Mas nunca quis, apesar de achar a profissão muito
interessante.
Sorte que tinha começado há pouco tempo o segundo semestre, então, minha
transferência para Serviço Social não foi difícil. Longe de ter sido tudo maravilhoso nos
primeiros dias, como acontece nos filmes quando a mocinha resolve dar uma reviravolta em
sua vida. Ainda sim, eu adorei a mudança apesar dos pesares.
Tive dificuldade de começar do zero e muitas vezes questionei se tinha tomado a
decisão certa. Afinal, era um excelente estágio. João me deu a certeza de contratação garantida
para tentar me convencer, mas fui firme. Sem contar o salário acima da média, plano de saúde
e cesta básica.
Demorei quatro meses para encontrar um novo estágio, e ele não é nada glamouroso.
Passei a trabalhar em uma casa de apoio para crianças vítimas de abuso e descobri que meus
problemas não são nada perto daquelas pessoinhas frágeis e inocentes que foram roubadas de
si tão cedo. Cresci mais nesses últimos meses do que nos meus 19 anos de vida, com certeza.
O trabalho requer muito mais do meu psicológico e paga, infinitamente, menos que o
outro. Recebo um salário mínimo que mal dá para o aluguel e minhas contas básicas. Não que
eu fosse uma gastadeira, porém, hoje em dia economizo ainda mais. O que está me ajudando é
a loja virtual da Claudinha. Não é que a aparente loucura dela está dando super certo? Minha
amiga fatura cerca de dez mil por mês com suas roupas e a ajudo com a parte administrativa
nas horas vagas. Esse dinheiro extra que salva os dias que insistem em sobrar no fim do mês.
Olho para a paisagem urbana típica do Morro do Alemão, pelo vidro do carro, e meu
coração se inquieta espantando meus pensamentos. Sempre fico na expectativa de encontrá-lo,
o que nunca acontece, claro. Como combinamos, Murilo permitiu que eu continuasse vendo os
seus irmãos e assim tenho feito, religiosamente, todo último domingo de cada mês. Claudinha
sempre me empresta seu carro para que eu possa aproveitar bastante com eles. Na última visita
fomos ao Zoológico e hoje vamos ao Aquário.
Paro o carro na frente da casa da Dona Emília e os dois já estão na porta me esperando
junto com ela. Que saudade que fico deles! Se pudesse os pegava mais vezes no mês. Pena que
está muito corrido, e nem sei se Murilo deixaria.
— Oi, lindezas! — cumprimento sorrindo ao sair do carro.
— Saudade! — Olívia fala correndo ao meu encontro.
— Tu tá linda — Raul diz dando um beijo na minha bochecha.
— Saudade de vocês também. — Abraço a pequena. — Obrigada, Raul.
Dona Emília toda vez me olha enigmática, como se quisesse contar mil segredos, mas
não pode falar nada. Chega a dar uma aflição de tanta curiosidade em saber o que ela está
pensando.
— Oi, Dona Emília. Tudo bem?
— Tudo.
É a que se resume responder sempre e eu, roboticamente, balanço a cabeça em
afirmação. Virou um ritual engraçado.
— Bora passear?
— Simmm! — respondem em uníssono.
Despeço-me da senhora misteriosa e parto com as crianças para o Aquário. Depois
programei um piquenique no parque, as coisas já estão no carro.
— Agora você está gostando da escola nova, Raul? — questiono olhando para o
carona. Ele sempre gosta de sentar na frente comigo.
— Ah sim, agora tá ficando legal. Estamos fazendo aula de esporte e música. Sabia que
tô aprendendo a tocar violão igual ao irmão?
Há quatro meses Raul me contou que estava mudando para uma instituição de ensino
adequada para atender crianças com Síndrome de Down, inclusive, com professores
capacitados e em tempo integral. É uma escola pública normal, entretanto, estão a tornando
modelo para educação inclusiva. Ele não gostou muito no começo, achava chato porque não
tinha amigos.
— Que bom! O que eu falei pra você? Com o tempo a gente se acostuma com as coisas
— explico animada e ele sorri contente.
Sempre evito ao máximo dar corda para os assuntos relacionados ao Murilo porque
percebi, no primeiro domingo que os peguei, que foram instruídos a não dar informações sobre
isso. Tento respeitar, apesar da curiosidade.
— Eu continuo não gostando desse tal de integral. Achava mais legal passá a tarde com
o Mu. — Olívia emburra no banco de trás.
Ela também conseguiu uma vaga no ensino integral da mesma escola que o Raul.
Fiquei muito feliz quando me contaram porque significa que Murilo agora tem tempo durante
o dia. Espero do fundo do coração que tenha conseguido um emprego porque só de imaginá-lo
com clientes me sobe uma raiva... Afasto os pensamentos ciumentos.
— Por que, Olívia? — pergunto sorrindo.
Ela sempre conta uma história mais engraçada que a outra do motivo de não gostar.
— Aquela merenda é ruim demais. Eu tive que comê bolo da princesa com beterraba
esta semana. Eca! — Imita cara de nojo e eu caio na gargalhada.
— Mas é saudável, faz bem querida — tento incentivar em meio ao riso.
— É o que o Mu falou. Mas você pensa que ele come beterraba? Come nada. Qué falá
pra mim comê, mas comê que é bom, nada. — Caio na gargalhada novamente.
Por isso amo essa família, eles são maravilhosos!
— Eu aposto que ele come sim, você que não vê.
— Tu defende porque é namorada dele — Olívia diz fazendo bico e até engasgo com a
risada que estava dando.
— Nós não somos namorados, já falei pra você, querida.
— Mas podia ser. Eu ouvi o Mu dizê para o Raul que tava com saudade de você esses
dias enquanto ensinava ele tocar violão.
— Shhhhhhh! — Raul coloca o dedo indicador na boca e pede silêncio para a irmã.
Estou tão atordoada com a informação que nem consigo acompanhar a cena.
— Tu disse que ia guardar segredo, Olívia.
— Ahhh é — ela responde batendo a mão na boca. — O Mu não disse nada não, tô
confundindo tudo. Já chegou no Aquário? — desconversa.
Essa garota é esperta!
— Chegamos! — tento responder animada.
O resto do dia é perfeito, como todos que estamos juntos. O único problema deste
domingo ensolarado é que meu coração traiçoeiro não consegue parar de repetir a frase
"Saudade de você" para o meu cérebro.
Capítulo 30
♫ Eu te vejo em todos os rostos vazios na multidão.
Acordado a noite toda, a noite toda e todos os dias. ♫
I don't wanna live forever, Taylor Swift
MURILO
Pareço uma criança que fez arte e está fugindo aqui parado nesta janela, espiando
escondido o que acontece no vizinho. A que ponto chegamos, hein, Murilo? Meu Deus! Ela
consegue ficar cada vez mais linda. Enquanto desce do carro, reparo no seu shortinho curto
que realça as coxas grossas e na blusa de algodão que moldura suas curvas. Que saudade de
senti-la. Está sorrindo e o que mais quero agora é beijar aquela covinha que se forma em seu
rosto doce.
Toda vez que Alice vem aqui, para buscar ou trazer Olívia e Raul, meu coração quase
sai pela boca de tanto que bate descompassado. Caralho! Nunca imaginei que gostaria tanto de
alguém assim na vida. Eu nem sei dizer o que sinto por ela. Foi inspirado nesse sentimento
sem explicação que nesses últimos seis meses as músicas fluíram naturalmente. Já posso até
fazer um CD só com trilhas sonoras para casais apaixonados. Eu sei, muito brega. Mas é o
efeito dela em mim.
Jorge e o pessoal da gravadora ficaram radiantes com minha fase melosa, porém,
tiraram muito sarro da minha cara, claro. Eu disse que isso nunca ia acontecer quando os
conheci e em pouco tempo já estava parecendo o Wando. Inclusive, acharam que combina
muito mais comigo o estilo romântico e estamos trabalhando nessa linha. Tenho que admitir
que fica bom mesmo. Estou até sendo comparado com "o novo Tiago Iorc" pela pegada
acústica, somente voz e violão.
Mas como nem tudo são flores, o projeto está parado no momento porque a droga da
minha doença deu as caras de novo. Parece que meu rim, definitivamente, não quer funcionar
direito e há três meses faço hemodiálise, três vezes por semana. É uma porcaria! Fico deitado
por quatro horas para que uma máquina limpe e filtre meu sangue, ou seja, faça o trabalho que
o rim doente não pode fazer. O procedimento libera o corpo dos resíduos prejudiciais à saúde,
como o excesso de sal e de líquidos. Geralmente são horas de tortura total porque a única coisa
que consigo fazer é pensar em Alice.
Pela falta de avanço no tratamento entrei na fila de transplante. Eu não ia permitir de
jeito nenhum, ainda sim, por desencargo de consciência Olívia e Raul fizeram o teste de
compatibilidade por exigência do Doutor Bernardo. Não são compatíveis. O pessoal dos
Narcóticos Anônimos, Dona Emília e seus familiares e até Max lá da Inglaterra também
fizeram. Ninguém é. A expectativa do hospital era meu pai pelo grau de parentesco, mas não
faço ideia de onde ele está. Mesmo que soubesse, não seria iludido. Ele nunca quis me ajudar,
não seria agora. A frustração é proporcional à expectativa gerada. Por isso, nunca crio
expectativa de nada. A tristeza é que, em média, os pacientes aguardam sete anos na fila aqui
no Rio de Janeiro à espera de um rim que não seja de doador vivo. O jeito é rezar para ir
levando até lá.
O que está nos salvando financeiramente é que a abençoada gravadora me contratou
como compositor enquanto não me recupero. Minhas antigas músicas, mais reflexivas, estão
ficando ótimas em uma banda nova de rock. Também estou recebendo auxílio-doença do
governo por ter uma enfermidade rara e consegui todo o tratamento gratuitamente por causa da
Política Nacional de Atenção Integral em Genética Clínica. Nem tenho como agradecer ao
Doutor Bernardo por todo esforço em me ajudar. Estaria fodido, pois fazer programa está fora
de questão.
Aliás, eu não consegui tocar uma mulher sequer desde o dia em que me despedi dela no
portão do seu apartamento. Duas semanas depois eu bem que tentei, após beber até cair de
tanta saudade lá no Bar do Rafa. Era muito bonita, morena de olhos verdes. Mas não era a
minha Alice e não saímos de uns beijos sem graça. O que me resta é me aliviar pensando em
nossa primeira vez e na bendita cozinha toda noite.
Volto a prestar atenção na linda garota da casa ao lado e já fico triste por ter que
esperar mais um mês para esse pequeno momento. O desespero foi tanto no começo que
cheguei a ir na faculdade para vê-la de longe, porém, fui pego pela Claudinha em uma dessas
tentativas e acho que minha desculpa de estar passando por ali não caiu. Preferi evitar e agora
só me restaram esses dez minutos a cada trinta dias. Dez minutos dos quais eu aproveito cada
segundo para gravá-la ainda mais no meu coração. É masoquista, eu sei, só que não consigo
evitar. Virei um completo idiota.
Alice sempre olha para minha casa antes de entrar no carro e voltar para sua vida. Está
fazendo isso neste exato momento e se não estivesse bem escondido podia jurar que pode me
ver. Eu consigo sentir que ela tem saudade também e tenho vontade de sair correndo para
agarrá-la, mas, não posso. É muito melhor que continue sem meus problemas. Uma coisa é
estar com meus irmãos uma vez por mês, outra é ter que aturá-los todo dia. Aguentar um
companheiro doente e sem perspectiva de vida. Eu a amo tanto que quero o melhor para ela.
Mesmo que isso signifique ficar cada dia mais longe de mim.
O carro dá partida e Olívia e Raul ficam eufóricos acenando para o veículo. Eles
gostam dela demais e esse carinho só faz meu sentimento aumentar. Dona Emília os pega pela
mão e vem em minha direção. A porta da sala se abre e pulo correndo no sofá, como se não
estivesse espiando nada.
— Mu, você tinha que ver que legal o tubarão que eu vi. Ele tinha um bocão assim, ó.
— Olívia entra correndo animada, imitando com as mãos o tamanho da boca do animal.
— Nossa, que legal, linda. O que mais vocês fizeram? — pergunto querendo saber
todos os detalhes, só que não posso parecer muito desesperado.
— A gente viu vários peixes. Tinha uns muito feios. Depois fomos ao parque e eu comi
bolo de cenoura. Tava delícia.
— Só isso, Olívia? — Raul olha para a irmã, travesso.
Oh, droga! O que será que essa pequena aprontou?
— Só, ué — responde na defensiva.
Conheço-a, com certeza, fez alguma coisa.
— Não vai contar o que você falou pra Alice? — Raul instiga.
— O que você falou, Olívia? — questiono impaciente.
— Nada de mais, Mu. Eu só falei que tu tava com saudade dela.
— O quê? — pergunto alto, levantando do sofá. — Por que tu falou isso?
— Porque é verdade — a espertinha fala sorrindo.
Passo as mãos nos cabelos, nervoso. Merda! Ela sempre está certa. Contudo, não
precisava falar nada. Não era para falar nada.
— Vão tomar banho, vão — ordeno mudando de assunto.
— Você tá bravo comigo? — Olívia questiona. — Não pode ficar bravo, tu ensinou a
não mentir, Mu.
— Não tô bravo, não. Vai logo tomar banho, vai.
Não tem como questionar isso. Minha irmã é lisa demais, sempre encontra um jeito de
se safar. Acompanho os dois correndo casa adentro e me viro para uma Dona Emília de cara
fechada. Preparo-me para o sermão. É sempre o mesmo.
— Tava espiando da janela de novo, Murilo?
— Espiando? Até parece. — Dou de ombros e me sento novamente.
— Vai pensando que me engana. Eu sei que tu está apaixonado por aquela mulher e
fica aí remoendo isso, ao invés de estar com ela. Tá perdendo tempo e você, mais do que
ninguém aqui, sabe como ele é precioso.
— Dona Emília, eu te adoro, mas não vamos discutir isso de novo. Já expliquei meus
motivos.
— Motivos que tu acha que são motivos. Nem perguntou para a menina o que ela quer,
saiu decidindo para os dois. Agora ficam sofrendo. Tá na cara que ela também gosta de você.
— Ela seguiu a vida dela, vai ser muito melhor sem mim — murmuro de cabeça baixa.
— Como tu pode garantir isso, Murilo? Para de ser teimoso. Que mania de carregar o
mundo nas costas sozinho, sem dividir o fardo com os outros. Toda vez que a vejo aqui nem
tenho coragem de encará-la. Fico com um nó entalado por você.
— Tu nunca disse nada, né? — pergunto a fitando.
— Não, mas eu devia. Já que te conheço o suficiente para saber que não vai atrás dela.
— Eu não vou mesmo, é melhor assim e pronto — afirmo e me levanto para pegar um
copo de água.
Estou com a boca seca e essa conversa está me dando até tontura.
— Não adianta falar com você mesmo, menino turrão!
Penso em responder, porém, uma forte dor atinge o lado esquerdo do meu corpo. Puta
que pariu! Está mais forte do que nunca. Apoio minhas mãos na estante da sala para não cair e
grito com a intensidade dos sintomas.
— Murilo, o que aconteceu? — Dona Emília corre em minha direção.
— Chama a ambulância. Agora! — suplico com dificuldade.
Não estou conseguindo respirar, todo o ar quer fugir pelos meus pulmões e temo pela
morte. Senhor, não permita que eu morra assim, sem ter conseguido dar um jeito na minha
vida e deixar algo para Olívia e Raul. Eles precisam de mim, por favor, por favor. Faço uma
prece sem jeito torcendo para quem quer que seja lá em cima me escutar.
O Samu não demora a chegar e preciso de oxigênio para continuar respirando. Não
consigo assimilar direito o que está acontecendo em minha volta por causa da dor, mas vejo
meus irmãos chorando, desesperados pela cena, e Dona Emília os abraçando.
O enfermeiro continua checando meus sinais e me coloca na maca rapidamente. Eu
quero falar para Olívia e Raul não se preocuparem, que vou ficar bem, só que minha voz não
sai e meus olhos já estão se fechando. Caralho! Que dor dos infernos.
Consigo levantar com dificuldade minhas pálpebras e fico ainda mais desesperado. De
um lado está Dona Emília falando ao telefone e algo me diz que está ligando para Alice.
Porra! Ela não me escuta. Mais à frente, meio borrado, tem um homem vindo correndo com as
mãos na cabeça. Parece meu pai. Meus olhos se fecham de vez.
Capítulo 31
♫ Meu coração dispara quando você ilumina meus olhos.
Presa no escuro, mas você é minha lanterna. Você me guia. ♫
Flashlight, Jessie J
ALICE
O que será que Murilo está fazendo hoje? Muitas clientes? Droga! Não posso ficar
pensando nisso. Vou enlouquecer assim. Eu sei que é idiota ter ciúme, eu já sabia do seu
trabalho, mas é mais forte do que eu. Queria ser sua, e ele só meu.
Toda vez que saio com as crianças fico na expectativa de vê-lo, nem que seja de longe.
Não tive sorte durante esse tempo todo. Se, pelo menos, eu fosse correspondida, podíamos
tentar. Aquele olhar parecia sentir o mesmo, porém, ele nunca disse nada. Nem eu, na
verdade… Por que amar é sempre complicado?
Enxugo as lágrimas que insistem em cair dos meus olhos e encosto o carro da
Claudinha próximo à calçada. Sua casa dos fundos é maior e mais bonita que a dos meus pais.
Ela odeia o dinheiro da família e não queria ficar na zona sul, contudo, resolveu aceitar por
insistência da avó com a condição de morar aqui. O que mais amo em minha amiga é que a
maior parte da herança dos Bittencourt é dela, só que ela nem se importa. Dá duro e rala como
todos nós, quer crescer por seu esforço.
— Claudinha, cheguei!
— Tô indo! — grita do segundo andar.
Sento no sofá e pego um espelho na bolsa para verificar se estou com cara de choro.
Tudo que eu não preciso agora é de sermão sobre relacionamentos.
— E aí, como foi com a criançada? — Ela desce as escadas perguntando.
— Foi ótimo! Eu sempre adoro passear com eles.
— Humm... E essa cara aí? — resmunga.
Mas que droga! Essa mulher percebe tudo.
— Que cara?
— De cachorro que caiu da mudança — Claudinha fala e eu caio na risada. Só ela
mesmo.
— Você e suas comparações.
— Não muda de assunto, Alice. Tá pensando nele ainda?
— Ai, Claudinha. Dá um tempo, pelo amor de Deus! Não quero brigar.
— Mais tempo, Alice? Tu passou seis meses chorando pelos cantos. Sai de casa para se
divertir só obrigada. Comeu mais sorvete que criança. Tenta se fazer de forte. Conheço essa
reação. Fiz a mesma coisa quando Max se foi.
— Que exagero! Foram meses muito bons para o meu amadurecimento. E até fiquei
com outras pessoas.
— Ficou, só que pensando no Murilo que eu sei — ela confirma e eu bufo.
— Alice, eu só queria que tu assumisse pra mim que está apaixonada por ele. Não sei
por que tem medo de me falar. Somos amigas. Eu vou brigar? Vou porque esse negócio de
amor só ferra com a vida da gente. Porém, queria que tu confiasse em mim pra desabafar, eu
quero o seu melhor.
— Você disse um milhão de vezes pra eu não me envolver, mas...
— Mas?
— Tá bom, assumo. Eu não queria, juro. Só que me apaixonei por ele. Perdidamente.
Intensamente. Agora pode dar o sermão que nunca serei correspondida, vai. — Dou de
ombros.
Claudinha fica séria me olhando, como se medisse as próximas palavras. Conheço-a
bem para saber que está em conflito se me diz ou não algo.
— Eu descobri uma coisa esses tempos atrás.
— Descobriu o quê? — pergunto e ela continua séria.
— Droga! Vou me arrepender de falar isso.
— Falar o que, Claudinha? Pelo amor de Deus, desembucha!
— O Murilo não faz mais programa. Antes até de vocês pararem de se ver.
— O quê? — grito e levanto do sofá rapidamente passando as mãos pelos cabelos. —
Como assim? E as crianças? Como ele está conseguindo dinheiro? Por que ele não me disse
nada?
— Calma, mulher! Não tenho todas as respostas do mundo. Só sei que Murilo não
aceitou o dinheiro que eu ia pagar.
— Não? Nossa, Claudinha! Por que não me disse antes?
— Não quis falar pra tu não criar expectativas. Isso não quer dizer nada.
Claudinha tem razão, infelizmente. Se significasse algo, Murilo não tinha me afastado.
Não sei se estou triste ou feliz. Pelo menos também não está com várias mulheres, cada dia
uma diferente.
— Foi ele quem contou que tinha parado?
— Não. Fui ao Bar do Rafa no final do mês passado e estava conversando com ele.
Perguntei se andava vendo o Murilo e me contou que ele tinha parado com o programa e não ia
mais lá.
Não consigo raciocinar direito. Se ele parou e nem está saindo mais à noite, será que
tem uma namorada? Ai, meu Deus, que droga! Esse homem está me deixando louca.
— Alice, eu não acredito que vou dizer isso, mas por que tu não vai falar com Murilo?
Diz o que sente. Eu acho que ele gosta de você, só não está sabendo lidar com o sentimento.
— Sério? Você acha mesmo, Claudinha?
— Eu o conheço há muito tempo e Murilo está com cara de idiota apaixonado.
Será? E se eu levar um fora? Quer saber, que se dane! Eu preciso falar com ele para
saber. Chega dessa falta de comunicação.
— Você me empresta o carro de novo?
— Claro, vai lá!
Pego minha bolsa no sofá e saio correndo com um milhão de perguntas na cabeça. Por
que ele não está mais fazendo programa? Arrumou um emprego? Por que não me contou?
Gosta de mim? Por que parou até de ir ao Bar do Rafa?
Calma, Alice! Respira. Em minutos você vai descobrir.
Entro no carro e coloco o cinto de segurança em tempo recorde. Meu pé chuta um
objeto e vejo meu telefone jogado no chão. Deve ter caído sem eu perceber quando cheguei.
Confiro rapidamente e aparecem nove ligações perdidas da Dona Emília na tela. Será que
aconteceu algo com as crianças? Retorno e fico aguardando ansiosa.
— Alice, graças a Deus tu atendeu!
— Dona Emília, desculpa, o telefone caiu no carro e eu nem percebi. Aconteceu
alguma coisa? — pergunto e ela começa a chorar.
Senhor! É mais sério do que eu imaginei.
— O que houve? A senhora está chorando?
— É... Murilo foi para o hospital.
— De novo? Ele está com dores? Foi mais sério? — questiono desesperada.
— Eu prometi que não falaria, mas não aguento mais ver vocês dois sofrendo. Ele é
muito teimoso, nunca vai te falar nada.
— Dona Emília, pelo amor de Deus, o que você prometeu? O que está acontecendo?
— Murilo tem uma doença muito séria, Alice. Uma doença rara, para ser mais
específica, e sem cura. Ela vai atacando várias partes do corpo e dessa vez é o rim que foi
afetado. Ele está fazendo hemodiálise há três meses, entrou na fila do transplante até.
— Doença rara? Transplante? — pergunto quase em sussurro. — Por que ele não me
disse nada? Talvez eu pudesse ajudar.
— Ele é assim. Guarda tudo para si e carrega o mundo nas costas. Meu menino é
guerreiro... — diz e nós duas estamos aos prantos ao telefone.
— Dona Emília, eu gosto tanto dele...
— Eu sei, eu sei. Desde o dia que vocês pararam de se ver, Murilo só faz ficar triste e
cabisbaixo. Ele gosta de você também, menina, como eu nunca o vi gostar de nada na vida.
— Preciso vê-lo agora, antes que seja tarde demais.
Fecho os olhos e respiro fundo. Dona Emília me passa o endereço do hospital e sigo o
mais rápido possível ao encontro do meu amor.
Espero que eu tenha tempo de dizer o quanto o amo, que senti saudade e como ele
mudou minha vida. Por favor, preciso de tempo. Nem que seja pouco tempo.
Capítulo 32
♫ Sinto muito por culpar você por tudo
que eu não consegui fazer. E eu feri a
mim mesmo por ferir você. ♫
Hurt, Christina Aguilera
CARLOS
Sigo a ambulância sem fazer a mínima ideia do que está acontecendo. O pavor sobe em
minhas veias e seguro firme o volante ao me lembrar daqueles olhos se fechando. O que
Murilo tem? Como tive coragem de abandonar uma criança? Por que nunca dei o amor que ele
sempre esperou? Eu fui um pai de merda, de merda para dois filhos. Um conheceu o pior de
mim, o outro nem sabe que existo. Desperdicei duas chances. As lembranças invadem minha
memória e lágrimas de remorso escorrem pelos meus olhos.
***
Maria vem em minha direção radiante, sorrindo e cantarolando. Como eu amo essa
mulher! Somos jovens demais, eu sei. Menores de idade, para ser mais específico. Mesmo que
sejamos de mundos tão diferentes, só penso em ficar com ela para sempre.
Eu, um pobre da favela, ela, uma menina linda e rica da zona sul. Nem acreditei
quando aceitou minha ideia de fugir de casa. Já faz cinco meses que moramos juntos. Estou
trabalhando e arrumei um cantinho para nós aqui no Morro. Sou o homem mais feliz deste
mundo.
— Por que tu tá animada assim, amor?
— Tenho uma surpresa — ela responde pegando em minha mão. — Vem!
Sigo-a sem reclamar pela nossa pequena casa. Se é no quarto, só pode ser coisa boa.
Quando Maria abre a porta percebo uma caixinha na cama e a olho sem entender. Está mais
linda do que nunca, seu sorriso é contagiante.
— O que tem ali, Maria?
— Vai lá abrir — encoraja animada.
Pego o objeto e balanço para tentar adivinhar o que é. Faço suspense só para deixá-la
louca. Maria é muito ansiosa, é divertido ver seu desespero. Abro, enfim, a caixinha e todo o
ar do meu pulmão se esvai. Balanço a cabeça para tentar acordar, mas não é um sonho.
Dentro tem sapatinhos. Sapatinhos de bebê.
— Que merda é essa? — pergunto alterado e seu sorriso some do rosto.
Maria coloca a mão na barriga instintivamente e seus olhos enchem de lágrimas. Com
certeza, não foi a reação que esperava. Mas que merda ela pensava? Que eu ia ficar feliz?
Droga! Só tenho 17 anos.
— É... Calma, amor. Eu... Eu estou grávida.
— Puta que pariu, Maria! Como foi que tu deixou isso acontecer? Tu não está
tomando a porcaria do remédio? — grito. Estou transtornado com a notícia.
— Eu não sei o que aconteceu, estava tomando sim. Só esqueci alguns dias, porém,
depois voltei ao normal.
— Tu esqueceu? — Sorrio sarcasticamente levantando os braços para o alto. —
Esqueceu, Maria?
— De... Desculpa.
— Tu fez isso de propósito? — questiono com a ira tomando conta de mim.
— Não. Claro que não. Por que tu tá falando isso?
— Tu sempre me disse que seu sonho era ter um filho. Mas pelo amor de Deus, a gente
mal tem uma casa. Não temos estrutura para isso.
— Eu juro que não fiz de propósito — ela diz e vejo verdade em seus olhos, mas
continuo puto da vida. — Estou com medo também, muito medo. Mas um filho é uma benção,
amor. A gente vai conseguir.
— Nós não vamos ter esse filho — falo decidido.
— O quê? — rebate alto, chorando desesperadamente.
— Eu não quero uma porra de uma criança, Maria. Não agora, talvez daqui muitos
anos. Nossa vida está ótima assim. Somos muito jovens para a responsabilidade de um filho.
— Eu não vou matar meu filho! — grita.
— Ahhh tu vai. Eu não quero um bebê chorando e estragando nossa relação que
acabou de começar.
***
Soco o volante ao me lembrar de como fui um cretino. Maria era uma mulher linda, seu
sorriso iluminava o ambiente por onde passava. Ela sempre me disse que queria uma família
grande, cheia de crianças pulando e brincando. E quando isso aconteceu eu tornei a vida dela
um inferno. Foi aí que tudo começou, a nossa desgraça.
Culpei aquele ser ainda não formado na barriga da mulher que eu amava por estragar
minha vida. E ele não tinha culpa de nada. Só nasceu porque eu também participei, mas
naquele tempo não conseguia ver isso.
Maria bateu o pé e não tirou a criança tornando sua gravidez um martírio. Oito meses
de choros e brigas. Sempre que podia jogava na cara dela a culpa do nosso relacionamento não
ser o mesmo, a achava feia e gorda. Eu sei, repugnante. Tenho nojo do Carlos que fui.
Comecei a beber, voltei a usar drogas e ter com outras mulheres o que não tinha em casa.
A minha linda garota foi perdendo seu brilho e ficando cada vez mais deprimida. A
tristeza foi tanta que quando Murilo veio ao mundo ela teve depressão pós-parto. Eu achei
frescura na época e queria matá-la por ter feito de tudo para manter a gravidez e depois
simplesmente nem olhar direito para o moleque. Começou a beber também. Éramos dois
bêbados e drogados com uma criança em casa.
Tudo por minha culpa.
Não apoiei a mulher que amava. Abandonei meu filho. Destruí nossa família.
A ambulância chega ao hospital e demoro uma eternidade para conseguir a merda de
uma vaga no estacionamento. Enxugo as lágrimas com as costas da mão e saio correndo em
direção à recepção.
— Por favor, moça. Por favor — chamo a enfermeira que está na minha frente com
uma pasta na mão e falando ao telefone.
— Um minuto, senhor — ela responde.
Droga! Não posso esperar. Já esperei tempo demais.
— Por favor, preciso saber do meu filho — insisto.
A mulher fala mais uns segundos e desliga, me olhando com cautela.
— Pois não?
— Meu filho. Ele acabou de chegar aqui. Estava desacordado, quero saber pra onde ele
foi.
— Como é o nome dele, senhor?
— Murilo. Murilo Silva.
— Não tem nada dele ainda no sistema, senhor.
— Moça, pelo amor de Deus! Eu preciso...
— O senhor disse Murilo Silva? — Uma pessoa se aproxima interrompendo a
conversa, com roupa de médico.
— Sim. Ele é meu filho.
— O senhor é pai do Murilo? — pergunta com um suspiro.
— Sim.
Não estava entendendo a surpresa e alívio nos olhos do médico.
— Muito prazer, eu sou Doutor Bernardo. — Ele estende as mãos e eu cumprimento,
balançando a cabeça. — Venho acompanhando Murilo há uns seis meses e estamos precisando
muito conhecer um parente.
— O quê? Por quê? — questiono confuso.
— O senhor não sabe de nada?
— Não. Estava indo na casa dele para ter uma conversa definitiva e dei de cara com a
ambulância.
O médico assente e então me dá a pior notícia que poderia receber. Explica tudo sobre
uma doença rara que meu filho herdou da Maria e sobre sua saga por um doador compatível.
Ele corre risco de morte, pois o rim já está muito danificado. Fala sobre sua expectativa de
vida limitada e as dezenas de complicações que ainda terá neste tempo. Não estou nem mais
raciocinando direito.
— Eu quero fazer o teste de compatibilidade. Como funciona? Demora?
— A doação com o doador vivo é bem mais rápida. Temos que fazer vários exames
para certificar que você apresenta rins com bom funcionamento, não possui nenhuma doença
que possa ser transmitida ao receptor e que o seu risco de realizar a cirurgia seja reduzido. Há a
necessidade de ter compatibilidade sanguínea ABO com o receptor. São realizados ainda testes
para comprovar outras compatibilidades, como HLA e cross-match. São testes que misturam o
sangue do receptor e do doador para ver se há possibilidade de rejeição nas primeiras horas
pós-transplante. Se for positivo, o transplante não será realizado, pois a chance de rejeição é de
quase 100%. Venha, vou agilizar isso.
***
Termino os exames e fico sabendo pelo Doutor Bernardo que Murilo acordou. Imploro
para que ele me deixe vê-lo por um instante e sou vencido pela insistência. Agora estou aqui na
porta do quarto tomando coragem para entrar. Não quero que ele se altere e fique pior,
entretanto, precisamos conversar.
— Oi — digo sem jeito enquanto me dirijo para a cama. Está distraído, mas para
totalmente ao me ver.
— O que tu está fazendo aqui? — responde com raiva.
Odeio saber que meu filho não me suporta. Depois de tudo que fiz, como poderia ser
diferente?
— Murilo, não se altere. Você precisa descansar.
— Então saia daqui — fala secamente.
— Já soube da sua doença, sinto muito...
— Olha aqui, Carlos. Não preciso da droga da sua pena! Se, pelo menos, uma vez na
vida tu puder pensar em mim, some da minha frente.
— Eu fiz o teste de compatibilidade.
— O quê? — questiona incrédulo.
— Eu fiz os testes, Doutor Bernardo está muito confiante que posso doar meu rim pra
você.
— Que droga! —reclama baixinho virando o rosto.
— Olha, eu sei que você não quer ouvir, mas eu preciso te pedir perdão por tudo.
Desculpa por não estar presente na sua vida quando mais precisou, por ter feito sua mãe deixar
de ser ela mesma. Eu me culpo todos os dias pelo que fiz.
— Que bom que se culpa. Quero que morra se culpando — admite ainda com o rosto
virado.
Droga! Isso dói mais do que imaginei.
— Sabe, eu não sou mais aquele cara. Há dez anos estou limpo. Depois de ter
abandonado vocês eu fui ao fundo do poço, pensei muitas vezes que morreria. Pensei em me
matar, até. Eu merecia morrer pelo que fiz. Passei fome, morei na rua, me perdi nas piores
drogas. Até que fui morar em São Paulo e conheci um grupo terapêutico de religiosos. Fiquei
internado lá por cinco anos. Por isso, nem tenho mais o sotaque carioca. Quando estava sóbrio,
passei a ajudar com outros pacientes e nos afazeres da casa. Eles me acolheram e me salvaram,
me fizeram enxergar meus erros. Hoje tenho um emprego, uma casa. Sou um homem de bem.
Voltei para o Rio ano passado e estava procurando o melhor jeito de entrar em contato. Murilo,
Deus sabe que me arrependo. E queria muito que você me perdoasse — desabafo e meu filho
vira o rosto para mim, com lágrimas nos olhos.
— Por que tu demorou tanto pra voltar?
— Perdão, Murilo. Eu sei que demorei demais, mas agora estou aqui. Eu não sei
explicar o que senti quando soube que tenho outro filho. O Raul parece um garoto incrível,
como você. Eu gostaria muito de tentar consertar as coisas entre nós. Quando os abandonei eu
era jovem demais, não estava preparado para ser pai. Estraguei tudo.
— E tu acha que eu estava preparado para crescer sem um? Que o Raul estava? — ele
joga na minha cara e as lágrimas voltam a descer dos meus olhos.
— Não. Hoje sei que não, fui muito egoísta.
— Eu não consigo perdoar, desculpa. Sei que seria o nobre a fazer, ainda mais tu
sendo, por ironia do destino, meu mais possível salvador no momento. Mas droga, eu não
consigo. Tu não faz ideia do inferno que vivi. Tu não faz ideia — diz com a voz embargada.
— Eu faço... — respondo derrotado.
A dor do arrependimento invade novamente meu peito. Não tem mesmo como esperar
o perdão depois de tudo.
— Posso te pedir só uma coisa? — arrisco e Murilo balança a cabeça sem me encarar.
— Eu sei que o perdão você ainda não consegue dar, talvez nunca consiga e a culpa é minha.
Mas... Sei lá... Eu posso pelo menos ser mais presente agora? Conhecer o Raul, ficar mais
perto dele... De você?
— Tanto faz — responde baixinho, secando as lágrimas, e eu abro um sorriso de orelha
a orelha.
Tanto faz é melhor do que não. Posso sobreviver com isso. Quem sabe com o tempo
consigo provar que sou uma pessoa diferente.
Deixo-o descansando e volto para a recepção na expectativa dos resultados, rezando
para poder, uma vez na vida, fazer algo bom para Murilo. Chego e vejo uma menina alta, de
cabelos castanhos e olhos claros parada no balcão. Está desesperada, passando as mãos no
cabelo e gesticulando com a enfermeira.
Escuto o nome do meu filho de sua boca e percebo que está tentando saber notícias
dele. Reclama que espera há horas por uma informação e nada. Penso em ir em sua direção,
mas Doutor Bernardo aparece e começa a falar com ela.
Sento e fico a observando andar de um lado para o outro, impaciente. Olha no celular,
senta, levanta. Limpa os olhos lacrimejantes. Sem dúvidas, é uma garota que ama. Uma garota
que ama meu filho.
Um alívio percorre meu coração por ele ter alguém assim na vida, alguém que nunca
pude ser.
Capítulo 33
♫ O tempo passou, a vida mudou, mas eu continuo seu.
Eu só sei que a vida é mais colorida com você. ♫
Nocaute, Jorge e Mateus
MURILO
Carlos sai do quarto e sinto como se meu coração fosse explodir de tanto que está
apertado. Caralho! Eu não consigo perdoá-lo. Acho que nunca serei capaz. Nossa vida teve um
rumo totalmente diferente por causa da sua decisão de não me aceitar há 22 anos. Minha mãe
está morta, Raul cresceu sem o pai, Olívia não sabe de onde veio.
Porém, para uma coisa essa conversa foi boa. Sinto-me em paz por descarregar tudo
que estava entalado na minha garganta, soltar as lágrimas que estavam presas, ouvir pelo
menos sua versão. Eu tinha ódio dele até poucos minutos atrás, ódio mesmo, por tudo que ele
não foi. Agora não sinto nada. Nada bom e nada ruim. E eu não imaginava como isso poderia
ser libertador.
Quero esquecer esse passado de merda e, de agora em diante, só focar no futuro. Talvez
eu tenha poucas horas, poucos dias, poucos meses... Não importa! Só me interessam os
momentos que virão, não mais os que já se foram.
Viro-me na cama para ajeitar o corpo, ainda estou com dor na lombar, apesar da diálise
e da quantidade absurda de remédio que ingeri desde que cheguei. Doutor Bernardo aparece
sorrindo, então imagino que temos boas notícias.
— Murilo, como está se sentindo?
— Melhor. Só com um pouco de dor.
— Que bom! Olha, eu não devia falar isso ainda para não gerar falsas expectativas, mas
estou animado. Já fizemos os primeiros exames e um dos mais importantes deu positivo. Pelo
sangue vocês são compatíveis. Acredito que seu pai poderá ser o doador.
— Hum — digo somente.
Ainda não me sinto bem com isso. Que tapa na cara, não, destino?
— Até amanhã de manhã teremos todos os resultados e, se tudo ocorrer bem como
imagino, já vamos providenciar o transplante. Com doador vivo e parente, a burocracia é bem
menor — explica e eu aceno com a cabeça.
— Ah, olha só. Tem uma moça lá na recepção quase tendo um infarto de tanto nervoso.
Ela quer ver você desesperadamente e não para de encher o saco das enfermeiras. Posso
permitir sua entrada? Eu sei que não é parente, só que tô com dó da menina — admite sorrindo
e eu quase perco o ar.
É Alice, só pode ser Alice.
Ela está aqui!
Dona Emília deve ter avisado. Meu Deus, o que eu faço agora? Nunca precisei tanto de
sua presença, seu sorriso, seu jeito doce.
Não é justo com ela, Murilo. Meu lado racional tenta lembrar, porém, o coração trava
uma luta brava.
Que se foda o lado racional!
Eu, pelo menos, tenho que dizer tudo que sinto por essa mulher, ouvir o que ela tem a
me dizer. O que vai ser depois a gente descobre daqui a pouco.
— Por favor — respondo baixinho.
— Olha esse coração aí, hein, rapaz?! Um órgão com problema de cada vez, pelo amor
de Deus! — Doutor Bernardo fala divertido enquanto bate nos meus ombros e dá uma piscada.
Acompanho-o saindo do quarto com o olhar e começo a suar frio de nervoso. É agora!
Seis meses depois, com uma saudade que não cabe no peito, vou tê-la perto de mim outra vez
por um instante. Fecho os olhos e ainda consigo sentir seu cheiro. Calma. Respira. É só uma
garota, droga! Quem estou tentando enganar? Porra! Não é só uma garota. É minha garota.
Minha Alice.
Levo as mãos à cabeça para tentar relaxar um pouco e escuto um barulho na porta. É
ela. Linda como a vi horas atrás pela minha janela. Só que agora existem lágrimas nos seus
olhos inchados. Alice para por um instante e respira fundo ao me ver. Nem consigo me mexer,
estou como estátua na mesma posição só a encarando. Que saudade!
De repente ela corta o contato e corre. Corre e agarra minha cintura, depositando sua
cabeça no meu peito. Sinto um choque no meu corpo por tocá-la novamente. Acaricio seus
cabelos macios e encosto minha cabeça na sua. Ficamos assim por longos minutos. Ela
sentindo meu coração bater mais forte, eu me perdendo em seu cheiro.
Sem dizer. Nenhuma. Palavra.
***
Depois do que parece uma eternidade, não que esteja reclamando, Alice levanta a
cabeça e volta a me olhar. Senta-se na beirada da cama e eu a acompanho para que possamos,
enfim, conversar.
— Oi — ela diz mostrando suas covinhas maravilhosas.
— Adoro suas covinhas — admito tocando-as e Alice abre um lindo sorriso, roçando
seu rosto na minha mão.
— E eu adoro seu toque — confessa e retribuo o sorriso.
Merda! Estou fodidamente apaixonado por essa mulher.
— Precisamos conversar, Alice. Eu tenho muita coisa pra te falar.
— Sim... — Ela suspira e me encara. — Eu já sei que você está doente desde a época
que estávamos juntos, que parou de fazer programa, que precisa de um transplante. Por que
você me afastou, Murilo?
Minha vez de suspirar. Como ela sabe do programa? Como vou explicar o motivo do
meu afastamento sem envolver sua mãe? Não quero briga entre elas. A decisão foi só minha.
— Alice, eu estava me envolvendo muito com você e tinha medo de não atender suas
expectativas. Porra! Tu toda certinha com mil planejamentos pra vida, querendo um príncipe
encantando, e eu, um ferrado. Sem dinheiro, sem casa, sem trabalho, sem perspectiva. E ainda
com duas crianças. Como eu me encaixaria nisso, me fala? Achei injusto demais.
— Por que você só fez isso depois que a gente transou?
— Eu ia terminar nosso trato antes disso, eu juro. Naquele dia que sai do hospital. Só
que daí você chegou falando da Olívia e do Raul e eu não resisti. Caralho! Eu queria tanto
você naquela hora, que meus instintos foram muito mais fortes que os motivos para me afastar.
Desculpe se te feri.
A última coisa que queria na vida era feri-la!
— Sabe, aquele foi o melhor dia da minha vida — confessa e volto a encará-la
animado, com o coração acelerando ainda mais. — Realmente, eu sempre sonhei com o
príncipe, porém, não teria perdido meu tempo com contos de fada se soubesse que a vida real é
muito melhor.
— Alice, não me fala isso. — Puxo-a para perto de mim e encosto sua testa na minha.
Nossa respiração está irregular.
— Eu... — Engulo em seco para tomar coragem de falar. — Eu me apaixonei por você
no momento que levantei os olhos e te vi naquela porta no dia em que nos conhecemos. Tu
toda tímida, linda, engraçada... Eu demorei pra assumir a mim mesmo a intensidade dos
sentimentos porque, na verdade, eu nunca senti isso na vida. Por ninguém. Eu não sabia o que
era amar até você estar dentro de mim. Porra, Alice! Não se compara nem 1% com todas as
mulheres que já tive na vida juntas. Aquele dia não foi sexo pra mim. Foi muito mais que isso,
foi entrega. Sério! Aquele sábado foi minha perdição e minha resposta. Mas eu não sabia o que
você estava sentindo, e como descobri da doença achei que realmente deveria ser uma despe...
Sou interrompido por lábios quentes e desesperados encontrando os meus ainda mais
ávidos.
Nos beijamos.
Como queria isso.
Um beijo quente e nada delicado. Um beijo de saudade. De seis meses. De palavras não
ditas. De desencontros.
E, ah, de encontro!
Meu Deus, permita que eu posso sentir isso por um pouco mais de tempo.
— Preciso te falar uma coisa — interrompo o momento a contragosto. Preciso ser
sincero. Ela me olha. — Eu quero mais que tudo que já quis ficar com você, só que não tenho
muitos pontos a meu favor. Nós nunca poderemos ter filhos. Eu jamais arriscaria a vida de uma
criança com uma sentença de morte predefinida. Tem a Olívia e o Raul também, nunca vou
abandoná-los. Olívia pode até um dia criar asas e voar por este mundo, mas Raul sempre estará
por perto. Bem perto. E... eu, como tu sabe, posso ter mais complicações de saúde que esse
rim. Não vai ser uma vida fácil.
— Pode não ser, porém, vai ser uma vida com você. Isso já me basta! Eu sempre quis
ter filhos, mas Olívia e Raul podem ser os nossos. Já os amo tanto como se fossem. E, sobre
sua doença, poderá contar com alguém do seu lado na alegria e na tristeza, na saúde e na
doença — diz firme e meu coração acelera.
Alice é muito mais do que eu imaginei nos meus melhores sonhos.
Aperto-a na cintura e aproximo mais, emocionado. Minha vontade é possuí-la agora
mesmo. Seguro firme seus cabelos e desço minha boca por seu pescoço, deixando marcas por
onde passo.
— Alice, vai parecer loucura. Mas, porra! Eu preciso ter você.
— Aqui? — ela pergunta incrédula e ofegante, ficando corada.
Adoro quando fica com vergonha.
— Agora! Tu confia em mim?
— Com toda minha vida — responde sem hesitar e eu sorrio como um bobo.
— Fecha a porta como quem não quer nada e volta aqui. Teremos poucos minutos, mas
pela saudade que estou de você não precisaremos de mais que cinco.
— Ai, meu Deus! Tá bom — concorda animada, porém, percebo que está morrendo de
medo.
Deve ser a maior loucura que já fez na vida.
— Encosta a cortina também — continuo dando instruções.
Ela volta rapidamente para a cama e tiro em segundos seu short com a calcinha. Isso é
totalmente loucura, contudo, não consigo me controlar. Preciso mais dela agora do que o ar
que estou respirando.
— Alice, tu vai ter que ficar por cima, tá? Eu não posso fazer muito esforço.
— Tá bom. Não vai fazer mal pra você isso, né?!
— Vai fazer se eu não te sentir. Não estou aguentando mais.
Ela sorri e sobe na cama, quando me lembro da droga da camisinha.
— Não temos camisinha. Tudo bem?
— Sim. Eu confio em você. Continuo tomando pílula.
— Tenho um segredo pra te contar.
— O quê? — pergunta enquanto se ajeita em cima de mim e passa as mãos por dentro
dessa roupa ridícula de hospital.
Pelo menos nessas horas facilita. Solto um gemido.
— Caralho! Vai com calma, mulher. Não podemos fazer barulho. — Mordo os lábios
com força.
Alice está com sua vagina roçando meu pau e, mesmo de cueca, posso senti-la
encharcada para mim. Sem avisar enfio um dedo nela.
— Sempre pronta. Ahhh! Assim tu me mata — sussurro em seu ouvido enquanto
começo a penetrá-la lentamente com o dedo.
— O segredo... fala... temos pouco tempo.
— É... Sabe, eu não tive mais ninguém depois de você. Não consegui. Toda mulher que
chegava perto de mim só conseguia enxergar seu sorriso.
— Ahhh, amor — responde derretida, invadindo minha boca novamente.
Amor?
Meu coração até para.
Como uma palavrinha pequena, de apenas quatro letras, pode mexer tanto com a gente?
Tiro meus dedos de dentro dela, abaixo a cueca e a fodo com força, enquanto me
delicio com seus lábios. Ela ainda está de blusa e eu também com a parte de cima da roupa.
Vai ter que ser rápido, entretanto, será mais intenso do que nunca.
— Porra... Que saudade. Que saudade de você — confesso em seus lábios.
Ela se levanta e me dá uma visão do paraíso, cavalgando forte no meu pau. Estamos
mordendo os lábios para não fazer barulho, mas o som da respiração não dá para controlar. Só
se ouve isso no quarto pequeno que me colocaram. Sorte que Doutor Bernardo me deixou na
ala particular, mesmo eu não tendo plano de saúde, porque aqui não tem outros pacientes e
posso aproveitar minha namorada. Minha namorada? Ah sim, minha. Depois disso não tem
volta.
Alice intensifica o vai e vem do seu quadril e eu já não aguento mais. Estou no limite
do prazer.
— Goza comigo, vem! — chamo enfiando a mão por debaixo da blusa e apertando seus
seios.
Ela adora e vai à loucura, estamos quase lá.
— Não fecha os olhos, olha aqui pra mim.
Me. Perco. Totalmente. Nela.
Chegamos ao clímax e uma alegria imensa invade meu coração. Sinto coragem de
dizer, pela primeira vez na vida, uma frase que sempre achei bonita, porém, não via sentido.
— Eu te amo, Alice — confesso e ela parece transbordar de alegria, me dando seu
sorriso mais lindo.
— Eu também te amo, Murilo — fala tocando meu rosto e solto o ar que nem percebi
que estava segurando, puxando-a para um abraço.
Nunca pensei que seria tão feliz em toda minha vida.
***
Ajeito-me na cama e sinto o sol entrar pela cortina. Já é de manhã. Alice não poderia,
mas pelo jeito, Doutor Bernardo falou com os enfermeiros e ninguém reclamou dela ainda
estar aqui. Depois da aventura de ontem à noite, nos vestimos rapidamente para esconder os
vestígios e ficamos conversando até cair no sono, agarradinhos nesta pequena cama. Expliquei
tudo sobre a doença e meu novo trabalho na gravadora. Ela ficou mais entusiasmada que eu.
Também me contou que mudou de curso e que conseguiu outro estágio. Não poderia estar mais
orgulhoso.
Perguntei o que fez durante os seis meses que ficamos afastados e meu coração se
entristeceu ao saber que sentiu minha falta tanto quanto senti a dela. Só não gostei da parte de
Claudinha a incentivando ir para baladas e ficar com outros caras. Meu sangue ferveu e
descobri que ciúme é um sentimento enlouquecedor. Sei que não posso falar nada, tive mais
mulheres do que me lembro, ainda sim, meu instinto primitivo queria que ela fosse só minha.
Agora ninguém chega mais perto dela!
Não enquanto nosso relacionamento durar. O que espero que seja por todo meu
pequeno tempo de vida. Sinto-a se mexendo e abraço-a acariciando seus cabelos.
— Bom dia, meu amor.
— Bom dia. Dormiu bem?
— Como nunca! Acho que preciso de tu sempre na cama comigo para poder relaxar —
brinco e ela me dá um tapa no ombro.
— Ai! — reclamo. — É sério, não estou brincando.
— Engraçadinho. Para sua sorte eu não pretendia sair dela tão cedo mesmo.
Adoro Alice solta e divertida. Somos surpreendidos com a chegada de Doutor Bernardo
e ela levanta correndo da cama, ajeitando o cabelo.
— Bom dia, jovens. Vejo que você não enfartou — diz olhando para Alice e sorrindo.
— E que você ainda está com seu coração no lugar. Isso é bom.
— Desculpa estar deitada na cama, eu sei que não pode, mas...
— Tudo bem, querida, fica tranquila. Eu expliquei para os enfermeiros que o Murilo
estava morrendo e que você era o último alento dele. Ficaram todos comovidos que nem
vieram incomodá-los — conta seu plano e nós dois gargalhamos, agradecidos. — Tenho boas
notícias!
— O rim? — Alice pergunta animada e ansiosa, ficando de pé.
— Sim! Todos os testes deram compatíveis. Vamos prepará-lo para a cirurgia, já estou
adiantando toda parte burocrática.
—Já, tão rápido?
— Sim, Murilo. Seu rim está muito prejudicado com a doença, não podemos arriscar
outra crise.
— E tem risco esta cirurgia, Doutor Bernardo? — Alice questiona cautelosa.
Ele já me explicou todas as complicações, sei que não será fácil.
— Toda pessoa que se submete a uma cirurgia e anestesia geral corre riscos que
podem, no entanto, serem minimizados com os exames pré-operatórios e os avanços nas
técnicas anestésicas e cirúrgicas. Pode haver depois também rejeição, então, precisamos ficar
bem atentos.
— Calma, amor. Vai dar tudo certo! Ainda não vai se livrar de mim — tento brincar,
mas ela continua tensa.
— Querida, você precisa sair agora. Eu a mantenho informada. Vou dar um minuto
para se despedirem — Doutor Bernardo pede.
— Ok, obrigado — agradeço e ele sai.
— Eu tô com medo de perder você de novo. E agora, definitivamente — Alice fala
vindo em minha direção na cama, com olhos lacrimejantes.
— Saiba que eu vou lutar com todas as forças do meu corpo para sobreviver.
— Prometa que vai lutar e ficar aqui pra mim — implora e enxugo suas lágrimas com
as mãos.
— Prometo. Se de tudo for minha hora — começo a falar e ela pede silêncio. — Se de
tudo for minha hora, saiba que tu foi muito amada e a melhor coisa que já me aconteceu.
Obrigado por tudo, amor. Eu já falei com a Dona Emília e, se eu morrer, ela vai ficar com as
crianças. Queria pedir pra tu ajudá-la sempre que puder.
— Claro, sempre — concorda agora soluçando.
— Eu tenho uma coisa pra você. Minha roupa está naquele armário ali. — Aponto para
o móvel no canto da sala. — Pega meu celular no bolso da calça, por favor.
Ela obedece confusa e pega o aparelho, entregando-me rapidamente.
— Por que você quer o celular?
— Eu contei ontem da gravadora, mas não expliquei que tipo de música estava
fazendo. São todas para você, Alice. Cada canção que eu compus nos últimos meses foi
pensando em ti — declaro e ela me abraça forte. — Não sei muito bem me expressar falando,
porém, nessas estrofes mostrei todo meu amor por você. Os vídeos caseiros que gravei pelo
computador estão na galeria de imagens.
— Eu te amo — ela diz emocionada.
— Eu também te amo. Agora vai! Já abusamos demais da boa vontade do Doutor
Bernardo. Seja o que Deus quiser!
Abraçamo-nos e nos beijamos entre lágrimas. Nada de palavras, somente o olhar que
amo. Alice sai de costas e me manda um beijo pelo ar, fechando a porta com o celular agarrado
na mão.
Meu coração se aperta já de saudade. Porra! Me deixe viver mais um pouco. Por favor,
só mais um pouco.
Capítulo 34
♫ Vem viver comigo o presente, o infinito enquanto dure. ♫
Infinito enquanto dure, Murilo Silva
ALICE
Saio do quarto, transtornada, com lágrimas que insistem em molhar meu rosto. Não
acredito que tanta coisa aconteceu de ontem para hoje: doença, transplante, sexo dentro do
hospital, declaração de amor. Ahhh... essa última parte. Pensei que meu coração fosse explodir
quando Murilo disse as palavras que tanto esperei ouvir.
Espanto os pensamentos que me ocorrem de poder ser a última vez que o vejo. Não
pode ser. Eu acredito em uma linda história para nós ainda, não as perfeitas dos contos de fada,
mas as construídas no dia a dia.
Volto a sentar na recepção e procuro um fone de ouvido na minha bolsa. Não saio
daqui até Murilo estar operado e bem. Já até avisei no trabalho que estou no hospital com meu
namorado. Aliás, soa bem dizer meu namorado, não é? Encontro o que estava querendo e
plugo no celular. Estou ansiosa para ouvir as músicas que ele compôs inspiradas em mim.
Desbloqueio a tela e aparece uma imagem linda dos irmãos sorrindo em um parque.
Meu amor está fazendo um ótimo trabalho com sua família. Tenho orgulho do homem que ele
se tornou, apesar de tudo que já passou. Faço carinho na foto e mais lágrimas caem dos meus
olhos. Senhor, que tudo dê certo nesta cirurgia! Muita gente precisa dele em sua vida. Inclusive
eu.
Vou na galeria e respiro fundo para apertar o play. Todos os últimos vídeos que
aparecem têm como miniatura ele sentado na cama, somente com o violão nas mãos. Clico no
primeiro e uma melodia linda invade meus ouvidos.
Infinito enquanto dure
♫ Era uma vez uma menina
Que de repente estava perdida
Os contos já não servem mais
As coisas ao seu redor passaram a ser reais
Por favor, se encontre
Corte as asas da imaginação
Sei que eu não chego nem perto do que seria ideal
Mas se espera por um príncipe
Não desaponte no final
No final, no final
Não pense muito lá na frente
Nem em nada que eu te jure
Vem viver comigo o presente
O infinito enquanto dure
Por favor, se encontre
Corte as asas da imaginação
Por favor, se encontre
Corte as asas da imaginação
Não pense muito lá na frente
Nem em nada que eu te jure
Vem viver comigo o presente
O infinito enquanto dure ♫
Ouça música exclusiva: www.infinitoenquantodure.com.br
O primeiro vídeo acaba e preciso urgente de um copo de água. Agora não são apenas
lágrimas que caem dos meus olhos, estou soluçando, literalmente. Foi a música mais linda que
já ouvi em toda minha vida! Murilo tem uma voz firme e delicada ao mesmo tempo, meio
rouca. Maravilhosa, com certeza vai fazer muito sucesso.
— Você está bem, querida? — uma senhora pergunta quando chego ao bebedouro.
— Sim, obrigada, só estou um pouco emocionada. — Pego o copo e viro com tudo
garganta abaixo.
— Está com alguém querido aqui no hospital? — questiona também pegando um copo.
— Sim. O amor da minha vida!
— O meu amor também está aqui, vai passar por uma cirurgia agora. Estou com o
coração apertado, mas, ao mesmo tempo, feliz por termos chegado até aqui. Joaquim está
muito doente, entreguei sua vida nas mãos de Deus. Não tenho o que lamentar, aproveitamos
cada segundo dos 53 anos que estamos casados. Tanto os momentos bons como os ruins foram
bem aproveitados.
— Espero poder dizer isso. Preciso de mais tempo com ele. Temos muitas histórias
para criar ainda. Mal começamos.
— Tenha fé, querida. Tenha fé que seu desejo pode se realizar.
— É tudo que tenho neste momento — respondo e me despeço da senhora.
Sento novamente na cadeira e volto com os fones de ouvido. Vai ser difícil ouvir todos
esses vídeos sem me emocionar. Respiro fundo e aperto o play.
Sapo apaixonado
Desde o dia que entrei naquele avião e fui para Inglaterra sonho em ver minha pequena
de novo. Já se passou tanto tempo, mas é como se ainda fosse adolescente vivendo o primeiro
amor. Na verdade, primeiro e único amor. Antes de Claudinha, eu tinha ficado com outras
garotas, claro, só que nada como ela. Destemida, bocuda, corajosa. Quem a vê pela primeira
vez pensa até que é uma boneca, tão baixinha, branquinha, olhos azuis límpidos como a água.
Minha pequena passa longe de ser frágil, é isso que mais amo nela. Não consegui ter nenhum
relacionamento sério depois do que vivemos. No começo tentei manter contato, não queria a
perder de vez, porém, ela nunca me retornou e-mails, mensagens nem ligações.
Agora estou de volta ao Brasil para ficar, prestes a vê-la novamente, e meu coração
parece que vai fugir do corpo. Bate acelerado. Estou ansioso e com medo ao mesmo tempo.
Tenho tanta saudade, mas duvido que vai sequer falar comigo. Claudinha é difícil de lidar, não
é do tipo que dá segundas chances. Entretanto, sou persistente, não vou desistir até
reconquistá-la.
Tento acalmar Murilo, buscando forças para também me acalmar. Estou muito feliz por
ele, enfim, se apaixonar por alguém. Alice é uma garota maravilhosa e ambos merecem ser
felizes. Distraio-me com o mar por um momento, pensando, pela milésima vez desde que
cheguei, como vou fazer para provar que só existe ela na minha vida.
Escuto meu amigo suspirar aliviado e meu olhar encontra Claudinha vindo pela areia
com uma senhora. Porra! Nem que eu quisesse ia conseguir ficar calmo agora que a vi. Ela
não é mais uma menina magrela. Já é mulher, está muito gostosa. Seu cabelo também não é
mais longo até a cintura, chega um pouco abaixo do ombro em um corte estiloso. Está com um
vestido azul que realça seus olhos, todas as suas curvas e aqueles seios maravilhosos que
sempre amei. Devo estar de boca aberta, mas nem ligo.
Não consigo deixar de imaginar que, se não tivesse ido embora, já poderíamos estar
casados. Quem sabe até com filhos. Fazíamos esses planos naquela época. Apesar de muito
doidinha, minha pequena queria constituir família. Teríamos três filhos morenos como eu e
com olhos claros como o dela. Pelo que obriguei Murilo me contar, parece que agora ela não é
mais essa garota.
Encaro-a novamente, está deslumbrante com o cair da noite e a luz da fogueira. Sorri
com Alice e não consigo conter o meu sorriso também, ao vê-la feliz. As horas passam voando
e o novo casal começa a se despedir. Droga! Nem consegui uma chance de falar com minha
pequena ainda. Percebo que pretende ir embora também e decido que não posso mais esperar o
momento certo. Talvez ele nunca apareça se tratando de nós dois.
— Não temos nada para conversar, Max. — Ela se vira, mas não me olha. Está focada
em minhas mãos no seu braço.
— Por que você nunca retornou minhas mensagens? Tentei entrar em contato por quase
três meses inteiros depois que fui embora.
— Por quê? Tu ainda pergunta, Max? Tu foi embora, oras. Além de me machucar indo
morar do outro lado do planeta, ainda queria me manter presa aqui? — solta alterada. Está
ficando nervosa.
— A gente podia ter feito dar certo. Eu amava você. Ainda amo.
— É o que sinto. Nunca deixei de sentir. Só queria que entendesse que era uma grande
oportunidade, eu não podia deixar para trás uma bolsa de estudos em uma das melhores
universidades de música do mundo. Você vivia me incentivando, não entendo como pode ficar
tão brava.
— Desculpa...
— Tu não precisa pedir desculpa de nada, Max. Já passou, eu era uma adolescente
iludida.
— Eu quero pedir desculpa. Eu sei que magoei você, mas sinto que ainda há amor aqui
— falo segurando sua mão.
— Está sentindo errado. Estou muito bem sem toda essa merda de sentimentalismo.
Gosto da minha vida assim. Aliás, estou feliz por você ter chegado tão longe. É merecido pelo
seu esforço. Nosso afastamento nunca foi pela bolsa, e sim como você foi — responde tirando
a sua mão da minha e começa a caminhar pela areia.
Vejo minha pequena se afastar cada vez mais e não tenho forças para sair do lugar. Eu
estraguei tudo, ela nunca vai me perdoar.
CLAUDINHA
Inferno! Por que esse desgraçado tinha que ficar ainda mais gostoso? Assim fica difícil
até de raciocinar as palavras. Quando o vi de costas olhando para o mar, assim que cheguei,
senti até um calafrio. Tentei evitar contato visual o casamento inteiro, mas não resisti. Não
posso negar que tive vontade de agarrá-lo ali mesmo, porém, logo me lembrei de que são águas
passadas e acalmei meu fogo. Depois disso me peguei o observando sem que percebesse. Sei
que também estava me secando, pois senti aquele olhar quente pelo meu corpo.
Se Max já era um moreno de parar o trânsito quando adolescente, imagina agora? Deve
ter várias namoradas na Inglaterra. Ganhou muito mais massa muscular, seu cabelo está mais
cortado, deixou cavanhaque... Ahhh, que porra viu! Para com isso, Maria Claudia. Você não
gosta dele, já passou.
Tiro os sapatos e continuo andando sem olhar para trás, não posso cair em tentação.
Não somos mais adolescentes, temos pensamentos muito diferentes hoje. Não daria certo nem
se eu quisesse. Lembrando, que eu não quero.
Max realmente partiu meu coração indo embora sem ter a dignidade de conversar
comigo sobre o momento mais importante da sua vida. Eu jamais teria pedido para ele ficar,
não era isso que eu queria. Ele tem muito talento, merecia a bolsa, de verdade. O que eu queria
era a sinceridade. Ter aberto o jogo desde o começo. Esperar tirar minha virgindade e um "eu
te amo" para partir foi demais.
Eu tive vontade de responder cada uma das mensagens e e-mails que ele mandou. As
ligações, então, me faziam perder até o ar. Só que eu não podia alimentar esse sentimento com
o Atlântico entre nós. Foi então que canalizei minha tristeza para a moda. Nessa época
comecei a gostar ainda mais de criar e hoje sou uma estilista em ascensão. De certo modo,
tenho até que agradecer nossa separação. Ficamos muito bem profissionalmente.
Percebo que estou no final da praia e começo a caminhar em direção a orla. Perdi a
carona com a mãe da Alice, agora preciso chamar um Uber. Quando viro-me, sinto mãos
pesadas no meu braço. Droga!
Max invade minha boca com desejo, segurando-me forte em seus braços. Tento negar o
beijo, mas não consigo resistir ao seu cheiro. Parece um feitiço para meu corpo. Ele morde
meus lábios do jeito que sabe que adoro e desce para meu pescoço. Puta que pariu! Está bem
melhor do que me lembrava. Subo minhas mãos para sua nuca e puxo firme seu cabelo. Como
diz o ditado, quem está na chuva é para se molhar. Agora que se foda, vou aproveitar o
momento.
Entrelaço minhas pernas em sua cintura e mordo sua orelha. Max geme alto, se
deliciando no meu pescoço. Ainda bem que estamos em uma praia afastada da região central e
tem pouquíssimas pessoas por perto. Todas concentradas nos seus afazeres, senão, iríamos
presos por atentado ao pudor.
— Pequena, que saudade — sussurra em meu ouvido e coloco os dedos em seus lábios,
pedindo silêncio.
Não quero ouvir nada, vamos só fazer isso e deixar rolar. Sem conversa. Ele me encara,
seus olhos castanhos ainda mais negros de puro tesão. Volto a beijá-lo e Max começa a
caminhar comigo em direção as pedras. Ah, sim, nós vamos transar loucamente hoje. E só
hoje.
Não paro de provocá-lo até que a gente chega em um cantinho bem escuro. Nossa, isso
é até perigoso se tratando de Rio de Janeiro, contudo, no momento só quero saber de tê-lo
dentro de mim. Desço do seu colo e começo a desabotoar sua blusa. Não vou tirá-la
totalmente, quero apenas sentir esses gominhos. Acaricio todo seu peitoral com as mãos e
lábios, Max geme puxando meu cabelo.
Abaixo-me e pego o cinto da sua calça. Ele me encara faiscando. Não perco tempo e
logo tiro seu membro para fora, caindo de boca e sentindo seu gosto.
— Porra, pequena! — geme sem desviar o olhar que também mantenho firme.
Faço questão de encará-lo o tempo todo para deixá-lo ainda mais louco de desejo.
Sugo-o com vontade, fazendo movimentos de vai e vem ao mesmo tempo com a mão. Parece
que faz tempo que ele não faz sexo porque já o sinto pronto para gozar.
— Eu não vou aguentar mais, pequena. Se não quiser que eu... Ohhh...
Sei que ele ia falar para eu tirar a boca, então, intensifiquei ainda mais as chupadas para
que nem consiga pensar demais. Ele me dá seu líquido quente e tomo tudo, lambendo os
lábios.
— Caralho, mulher! Saudade de você — fala voltando a tomar minha boca. Muito
mais intenso do que antes.
Max passa a me apalpar por todos os lados com suas mãos grandes. A tortura inicia no
pescoço, desce para os meus seios e vai para a bunda. Ele levanta meu vestido e segura firme
em minhas coxas.
— Quero sentir seu gosto, pequena — pede se abaixando e colocando minha calcinha
de lado.
Estou encostada em uma pedra e arqueio meu corpo quando ele enfia um dedo dentro
de mim. Depois acrescenta mais um e começa os movimentos.
Desce sua boca e eu me entrego à sensação do momento. Se tem uma coisa que esse
homem sabe fazer é chupar bem. Caralho! Max explora cada cantinho meu, acariciando
minhas pernas e torturando meu clitóris.
Seus olhos estão puro fogo quando ele se levanta e pega uma camisinha da carteira. Faz
tudo rapidamente e segura uma das minhas pernas mais alto, penetrando-me sem rodeios.
Droga, era assim que me lembrava dele. Quando está muito excitado não sabe ser gentil.
Max começa a me estocar com força e toco seus lábios com intensidade. Ele morde
meu pescoço e afasta um pouco o pano do meu decote.
— Ah, eu queria estar em um quarto para rasgar esse vestido, pequena — admite em
um gemido e ataca meus seios, dando chupadas e mordendo, enquanto acaricia o outro com a
mão. Depois inverte.
Cravo minhas unhas em suas costas, por dentro da blusa, e Max me fode bem fundo.
Segura minhas duas pernas e entrelaço-as na sua cintura, ainda encostada na pedra.
Ele chama e eu vou, em um orgasmo delicioso. Caralho! Faz tempo que não faço sexo
assim tão bom. Ficamos parados um minuto para recuperar o fôlego, eu encostada em seu
peito, ele com a cabeça deitada na minha. De repente segura meu rosto e dá um beijo terno em
minha testa.
— Eu te amo tanto.
Puta que pariu, Max! Não estraga o momento. Não passou de sexo, não quero mais
nada com você. Saio do seu aconchego e ajeito meu vestido e cabelo. Ele fica em silêncio
observando-me calçar as sandálias. Viro-me e começo a sair sem dar explicações.
— Embora. Foi só sexo, Max, não confunda as coisas — respondo e caminho sem
olhar para trás.
Agradecimentos
Primeiramente, quero agradecer você que chegou até aqui. Obrigada por dar uma
chance à história de amor do Murilo e da Alice.
Também agradeço a Deus pelo dom da vida e à minha família maravilhosa que me faz
viver intensamente o hoje, nas alegrias e tristezas. Meu marido Ednelson Prado e meus filhos,
Arthur e Matheus. Em especial ainda meu pai, José Batista, que contribuiu com as lindas
canções deste livro.
Comecei escrever Infinito enquanto dure no dia 9 de maio de 2017, sem nenhuma
pretensão, e olha onde estamos hoje! Alice e Murilo representam tantos e tantos casais que não
têm uma vida perfeita, mas vivem rodeados de amor. É isso que importa, não é mesmo?
Teve muita gente querida que fez esse sonho se tornar realidade e eu agradeço cada
uma de coração. No entanto, algumas foram essenciais.
Camila Gouvêa, que foi crucial para me ajudar na revisão da obra; Bárbara Pinheiro,
responsável pela revisão final; e Jéssica Bidoia, que me tirou centenas de dúvidas.
Matheus Estevão, cantor que escreveu a letra e emprestou sua linda voz para a música
tema do livro. Até hoje não sei lidar com a alegria que fiquei ao ouvi-la, resume perfeitamente
a história.
Wânia Araújo, que se tornou mais que uma leitora, uma amiga. É a presidente do fã
clube Murilindo junto com as lindas Danielle Barreto e Crys Carvalho.
Sem cada leitor do Wattpad o livro não alçaria voos mais altos. Teve quem leu desde o
comecinho, maratonou a história nas madrugadas, torceu, chorou, brigou comigo... Recebi até
ameaça da máfia, acredita? Meu muito obrigada a todos, sem exceção!
Por fim, e não menos importante, agradeço os novos amigos que fiz e os ensinamentos
que tive do mundo literário com os grupos Ajudando Escritores (AE) e Vale Ler. Vocês me
motivam a ir mais longe.
Beijos, Ari.
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