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Sobre Mao de Seda
Sobre Mao de Seda
RESUMO
Este artigo é centrado no caso “mão de seda” que ocorreu no Pará em 1888 e foi
marcado pelo envolvimento do praça do Corpo de Polícia e capoeira Antonio da Costa
Junior, vulgo Mão de seda, na tentativa de assassinato de Francisco Xavier da Veiga
Cabral, comerciante e político do partido liberal conhecido na cidade de Belém. A partir
deste evento que movimentou a capital da Província do Pará, com grande repercussão
na imprensa escrita, busco compreender melhor a força policial, assim como sua ligação
com a política no final do Império, seu cotidiano, sua relação com a marginalidade e o
envolvimento de membros da Polícia em crimes. Para isto utilizei fontes como jornais,
processo crimes, relatórios do Presidente da Província do Pará e minutas do chefe de
Polícia.
Palavras chaves: Polícia, Política e Criminalidade.
ABSTRACT
Cet article a commencé à partir d’un étude sur le cas « mão de seda » qui est
arrivé au Pará en 1888,oú nous avons la participation d’un soldat de la force policial et «
capoeira » Antonio da Costa Junior,appelé vulgairement mão de seda,qui a essayé de tuer
Francisco Xavier Veiga Cabral,un commerçant et membre du parti politique libéral, trés
connu dans la ville de Belém. À partir d’un étude sur cet événement je cherche à mieux
comprendre la force policial,ses rélations avec la marginalité,avec les crimes et sa
liaison avec la politique à la fin de l’impire. Comme support à cette recherche,j'ai utilisé
des journaux,le processus sur le cas, le rapport du président de la Province du Pará et
des cahiers de solicitations policiers directionés au chef de police.
* Aluno da graduação na Universidade Federal do Pará e desde 2009, bolsista PIBIC/UFPA, integrante do
projeto de pesquisa “A força das casernas no Pará da Primeira República (1889-1930), coordenado pelo
Professor Doutor William Gaia Farias.
Mots- clés : Police, Politique et Criminalité
É a própria forma legal dada ao sistema policial das províncias que desloca o eixo da
autoridade de um papel de manutenção da ordem e de repressão ao crime para incluí-la na rede de
favores distribuídos pelo Estado, que teria como contrapartida um papel garantidor de um
resultado positivo nas disputas eleitoral. (BRETAS, 1998. p. 219-220.)
Neste sentido, usar a Polícia para garantir vitorias nas disputas políticas não era
algo incomum no processo eleitoral, devemos destacar que o uso da força não ocorria
somente com o uso de policiais, ocorrendo ainda à utilização de seguranças particulares
denominados como capangas. Uma opinião mais branda, embora irônica, descreve o
capanga como “individuo que se lança nas lutas eleitorais em busca de um salário e
muito mais ainda por gosto”. (GRAHAN, 1997, p. 185.). Segundo Vicente Salles
(2004) estes homens foram muito utilizados durante a República nas disputas entre
lauristas e lemistas3. Entre os capangas podemos destacar os capoeiras ou maltas que
eram arregimentadas por grupos que estavam disputando o poder na Província do Pará.
“as maltas de capoeira estiveram presentes em vários conflitos.” (FARIAS, 2005, p. 77)
A força policial como era responsável por manter a ordem tinha papel
importantíssimo nestas disputas políticas. Sendo assim, era fundamental para o grupo
que estava no poder construir no Corpo Militar de Polícia uma estrutura que permitisse
o seu controle e, para isto, praticava-se o clientelismo para indicar os delegados e
subdelegados4. “Por isto, o governo – isto é, o gabinete governante – usava o poder do
3
Estas denominações são usadas para identificar os partidários de Lauro Sodré e Antonio lemos
respectivamente.
4
Minuta de oficio ao comandante do Corpo Militar de Policia. Ano: 1888. Códice: 1942. E a, Minuta
de oficio ao chefe de policia. Ano: 1888. Códice: 1925. Esta documentação encontra-se no Arquivo
Publico do Estado Pará.
clientelismo para garantir a eleições da câmara de deputados que quisesse”. (GRAHAN,
1997, p. 185.).
A prática do clientelismo, no caso em questão, levou Antonio da Costa Junior
para o Corpo Militar de Polícia por meio de alistamento ordenado diretamente por
autoridades locais, talvez por este motivo o caso tenha alcançado muita repercussão no
cenário político paraense, amplamente divulgado pela imprensa do Partido Liberal que
viu na tentativa de assassinato de Veiga Cabral a oportunidade para criticar os
conservadores, ainda mais por que Mão de seda era um criminoso conhecido na cidade
de Belém e que tinha registrado uma acusação por assassinato na Província de
Pernambuco.
5
Fala com que o excelentíssimo senhor Conselheiro Francisco José Cardoso Junior, primeiro vice-
presidente da província do Pará, abril a 1ª Sessão da 26 ª legislatura da Assembléia Provincial no
dia 4 de março de 1888. Pará, Typ. do "Diário de Noticias," 1888.
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/563/000050.html
É um número expressivo de crimes cometidos por policiais, e destes nenhum foi
tão significativo quando o caso Mão de seda, que envolveu, dentre outros, um policial e
um político do partido Liberal. O caso teve muita repercussão na Província do Pará,
sendo apresentado como um plano do governo conservador contra a oposição liberal.
O caso é importante por que Antonio da Costa Junior não era um cidadão
exemplar, muito pelo contrario, era conhecido na cidade por seu envolvimento em
crimes registrados em Belém. Mesmo conhecido por este tipo de registro, foi
incorporado à Polícia no dia 7 de fevereiro de 1888 e, após uma semana investiu em
uma tentativa de assassinato. O caso foi discutido exaustivamente na imprensa paraense,
espaço privilegiado de acalorados debates entre liberais e conservadores.
Cabe uma instigante interrogação: porque um capoeira tão conhecido por
envolvimento em crimes foi alistado no Corpo Militar de Polícia? Muitas podem ser as
razões que motivaram este alistamento, fato este que para o jornal A Província do Pará
não era incomum ter criminosos incorporados a força policial. O referido órgão de
imprensa, de orientação liberal, defendia que havia grande numero de criminosos
atuando como agentes secretos ou seguranças do chefe de polícia do Pará6.
No dia da formação de culpa de Mão de seda o tumulto na cidade durou de meio
dia até as quatro horas da tarde. Para conter o alvoroço o governo colocou em ação a
força policial que contava com 28 praças, sendo 20 de infantaria e 8 da cavalaria. O uso
da força policial foi visto pelos liberais como uma tentativa de conter a oposição.7
A tentativa de assassinato quanto o alistamento de Mão de seda foram objetos de
grandes debates e investigação policial envolvendo o comando do Corpo Militar de
Polícia, governo e partidos políticos.
Houve a abertura de um processo para apurar a troca e a queima do livro de
alistamento do Corpo de Polícia. Neste documento o comandante da corporação José
Sotero de Meneses afirmou que fora contra o alistamento, por ser Antonio Costa Junior
“um gatuno” conhecido na cidade e não ficaria bem para a corporação ter a seu serviço
“um sicário”, mas, não pode fazer nada, uma vez que Mão de seda teria sido indicado
pelo chefe de polícia Antonio Bezerra da Rocha Moraes e pelo conselheiro Cardoso
6
A Província do Pará, Belém, 25/02/1888, p. 2.
7
Idem.
Junior. Neste mesmo depoimento Sotero apresentou um motivo para o alistamento de
Antonio da costa Junior na Polícia8.
Perguntado qual era o fim, que o presidente da Província e o chefe da polícia... tinha com
o alistamento de Antonio da Costa Junior no Corpo Militar de Polícia? Respondeu que lhe dissera
o doutor Bezerra chefe de polícia que prendera a uma certa quadrilha de larápios e que sendo
Costa Junior, um deles e não tendo verba para pagar a Polícia se então seria alistado, so digo,
alistado no campo somente para fazer jus ao ordenado ficando desde logo a sua disposição para
fins que lhe tinha em vista o que efetivamente aconteceu9.
Percebemos que as autoridades nem sempre seguem as leis tão qual ela é
produzida, o que nos lembra as afirmativas de E. P. Thompson (1997) no estudo sobre o
processo de desenvolvimento da Lei Negra na Inglaterra ele percebe que as autoridades
fazem uso das leis de acordo com seus interesses. Esta lógica parece estar presente no
caso Mão de seda, onde um o criminoso Antonio da Costa Junior e preso juntamente
com um grupo, mas é liberado e por não ter dinheiro para pagar por esta, é alistado no
Corpo de Militar Polícia para pagar suas dividas com os seus rendimentos10.
O motivo para a entrada de criminosos na Polícia pode ser vário, mas não era
algo que acontecia somente no Pará, esta prática é descrita por Marcos Bretas (1997)
como algo recorrente dentro das forças militares no início da República do Brasil. No
Rio de Janeiro, por exemplo, foi destacado o ingresso de capoeiras no Corpo Militar
Polícia e forças armadas.
As fontes e a bibliografia nos levam a pensar a relação entre estes dois atores
como algo muito próximo. Na pesquisa encontrei um numero considerável de polícias
envolvidos em crimes. Mas, como bem alertou Bretas (1997), o fato de ingresso na
Polícia não significava uma mudança de vida, pois os policiais eram desvalorizados.
As maltas também foram muito utilizadas pelos políticos paraenses, que faziam
uso delas como capangas, principalmente para garantir vitorias nas eleições. Segundo
Vicente Salles (2004) estas maltas começaram a ser criadas no Pará no final do século
XIX, sendo formadas por capoeiras fugidos das perseguições que estavam sofrendo em
8
As Informações formam retiradas do processo movido para o esclarecimento da queima do livro-
mestre do Corpo Militar de Polícia, que se encontra do Arquivo Publico do Pará no fundo da
chefatura de polícia e na série autos.
9
Idem.
10
Idem.
outros estados e quando chegaram ao Estado do Pará acabaram sendo utilizados pelos
grupos políticos locais.
O caso Mão de seda colocou lenha nas disputas políticas no Pará e acabou
conduzindo a Polícia a uma crise que abalou a estrutura da corporação e chegou a ser
noticia em todo o Brasil, levando o Senador do Pará, Manoel José de Siqueira Mendes e
o Ministro Cotegipe a pedir esclarecimento sobre o caso11.
A partir deste pedido foi aberto um inquérito para apurar a denuncia de, que na
tentativa de esconder o alistamento de Antonio da Costa Junior, teria sido substituído o
livro-mestre do Corpo Militar de Polícia e depois queimado o mesmo. Esta atitude teria
sido tomada por um grupo de oficiais da Polícia que, na tentativa de manter o nome da
corporação, preferiu ocultar a informações acerca da entrada de Mão de Seda na Polícia.
No inquérito foram indiciados os oficiais José Sotero de Menezes, capitão do 15º
batalhão e ex-comandante do Corpo Militar de Polícia que foi um dos responsáveis pela
queima do livro mestre do Corpo de Polícia; os ex-oficias do mesmo Corpo Constancio
Antonio Silva, Cyriaco Leonardo de Jesus, Augusto Esaú Cardoso e os ex-sargentos
José Apolônio de Queiroz, Alípio Gonçalves Campos e José Moreira de Carvalho.
Quando interrogados estes alegaram que substituíram o livro-mestre com intuito
de evitar que o nome da Corporação fosse sujado pela tentativa de assassinato a Veiga
Cabral, e em seus depoimentos todos procuraram demonstrar a preocupação com
imagem do Corpo de Polícia12.
O Corpo de Polícia neste momento era pensado como a instituição responsável
por manter a ordem e proteger o patrimônio privado. “Sendo legalmente, a Polícia
definida como conjunto das forças públicas destinadas a manter ou restabelecer a ordem
social e assegurar a proteção das pessoas e propriedade” (MAUCH, 2004, p. 31.) Não
ficava bem para o Corpo Militar de Polícia estar envolvido com um gatuno conhecido
11
Fala com que o excelentíssimo senhor Conselheiro Francisco José Cardoso Junior. Op. Cit.
12
Auto de inquérito policial. Op. Cit.
na cidade, e que foi incorporado por ordem do senhor chefe de policia e do Vice
Presidente da Província. O fato da incorporação de Mão de seda a Polícia comprometia
a Corporação, mas também o governo da Província, pois tinha o envolvimento direto
com o caso o que levou o Presidente da Província do Pará “Sob pressão dos liberais e
resultado do inquérito, precisou exonerar os principais responsáveis pelas adulterações
no livro de registro de praças e pelo sumiço do livro de detalhes” (FARIAS, 2005, p.
149).
Com a exoneração destes oficiais a crise na Polícia do Pará estava instalada. A
força policial que neste momento já não era bem vista pela população, agora armava a
oposição ao governo a usar o caso Mão de seda e a queima do livro-mestre como
munição nas disputas político-partidárias.
4. Considerações finais
BRETAS, Marcos Luiz. A guerra das ruas: povo e polícia na cidade do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1997.
SALEM, Marcos David. História da polícia no Rio de Janeiro: 1808 a 1930: uma
instituição a serviço das classes dominantes. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.