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COLOSSENSES

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Original em inglês:

New Testament Commentary: Colossians

Author: William Hendriksen

TRADUTOR: CARLOS BIAGINI

Baker Book House

Grand Rapids, Michigan, 1964

Colossenses (William Hendriksen)

CONTEÚDO

ABREVIATURAS

INTRODUÇÃO

I. Por que devemos estudar Colossenses e Filemom?

II. A cidade de Colossos

III. A igreja em Colossos

IV. O propósito de Paulo ao escrever Colossenses e Filemom

V. Lugar e tempo em que foram escritas Colossenses e Filemom

VI. Paternidade literária de Colossenses e Filemom

COLOSSENSES 1
1. Saudação - Cl 1:1, 2

2. A ação de graças e a oração - Cl 1:3–14

A. Ação de graças. Cl 1:3–8

B. A oração. Fp 1:9-11

3. A preeminência do Filho - Cl 1:15–20

A. Na criação - Cl 1:15-17

B. Na redenção - Cl 1:18-20

4. O amor reconciliador do Filho para os colossenses e o dever

que dele se depreende, continuar na fé - Cl 1:21-23

5. A participação do apóstolo em pregar “o mistério”, isto é,

“Cristo em vós, a esperança da glória” - Cl 1:24-29

Resumo de Colossenses 1

COLOSSENSES 2

1. Advertências contra filosofias ilusórias - Cl 2:1–10

2. Advertências contra o cerimonialismo judaico - Cl 2:11-17

3. Advertências contra o culto aos anjos - Cl 2:18-19

4. Advertências contra o ascetismo - Cl 2:20-23

Resumo de Colossenses 2

Colossenses (William Hendriksen)

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COLOSSENSES 3:1-17

1. Os crentes devem ser consequentes - Cl 3:1–4

2. Portanto, devem “fazer morrer” e “deixar” os antigos

vícios - Cl 3:5-11

3. Devem “vestir-se” das novas virtudes - Cl 3:12-17

Resumo de Colossenses 3:1–17

COLOSSENSES 3:18 – 4:1

1. Esposas e seus esposos - Cl 3:18, 19

2. Filhos e seus pais - Cl 3:20, 21

3. Escravos e seus senhores - Cl 3:22 – 4:1

Resumo de Colossenses 3:22 – 4:1

COLOSSENSES 4:2-18

1. Chamado à oração - Cl 4:2–4

2. Ênfase numa conduta sábia e num falar cheio de graça -

Cl 4:5–6

3. Recomendação para Tíquico e Onésimo, que foram enviados

de Roma com notícias e palavras de alento - Cl 4:7–9

4. Saudações - Cl 4:10–15

5. Pede-se um intercâmbio de cartas - Cl 4:16

6. Vigorosa admoestação a Arquipo - Cl 4:17


7. Saudação pessoal, recordatório, bênção - Cl 4:18

Ideias de Colossenses 4:2–18

BIBLIOGRAFIA

BREVE BIBLIOGRAFIA SOBRE A ESCRAVIDÃO

BIBLIOGRAFIA GERAL

Colossenses (William Hendriksen)

ABREVIATURAS

Las letras que corresponden a abreviaturas de libros son seguidas


de un punto. Aquellas que se refieren a revistas o publicaciones
similares no tienen puntos y están en bastardilla. De esta manera es
posible distinguir de inmediato si las abreviaturas se refieren a un
libro o a una revista..

A. Abreviaturas de libros

A.R.V. American Standard Revised Version

A.V. Authorized Version (King James)

Gram. N.T. A. T. Robertson, Grammar of the Greek New Testament in


the Light of Historical Research

H.B.A. Hurlbut, Bible Atlas

I.S.B.E. International Standard Bible Encyclopedia

L.N.T. (Th) Thayer’s Greek-English Lexicon of the New Testament


L.N.T. (A. and G.) W. F. Arndt and F. W. Gingrich, A Greek-English
Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature
M.M. The Vocabulary of the Greek New Testament Illustrated from
the Papyri and Other Non-Literary Sources, por James Hope Moulton
y George Milligan (edición de Grand Rapids, 1952) N.N. Novum
Testamentum Graece, editado por D. Eberhard Nestle y D. Erwin
Nestle C.N.T. Guillermo Hendriksen, Comentario del Nuevo
Testamento

R.S.V. Revised Standard Version

Th. W.N.T. Theologisches Wörterbuch zum Neuen Testament editado


por G. Kittel

W.D.B. Westminster Dictionary of the Bible

W.H.A.B. Westminster Historical Atlas to the Bible

Colossenses (William Hendriksen)

B. Abreviaturas de de revistas

AThR Anglican Theological Review

Bib Sac Bibliotheca Sacra

Coll Mech Collectanea Mechliniensia

ExT Expository Times

JBL Journal of Biblical Literature

JThS Journal of Theological Studies

NTS New Testament Studies

Colossenses (William Hendriksen)

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INTRODUÇÃO

I. POR QUE DEVEMOS ESTUDAR COLOSSENSES E FILEMOM?

A razão básica para o estudo de qualquer livro da Bíblia é dada em


2Tm 3:16, 17. Além disso, podemos perguntar: Por que devemos,
especialmente hoje, estudar estas cartas?

1. Acima de tudo, porque estamos vivendo na era espacial.

Escutamos e lemos a respeito de programas espaciais, galáxias,


explorações lunares e homens em órbita. Podemos ver, até certo
ponto, voos orbitais na tela de televisão. Discutimos sobre as
probabilidades das viagens interplanetárias. Assim que é natural que
como cristãos perguntemos: “Como se relaciona nosso Senhor e
Salvador Jesus Cristo com este vasto universo espacial e com os
sistemas revestir? Ou talvez está afastado de tudo isso?” Para o
grande consolo de todos os crentes, Colossenses responde esta
pergunta básica (veja-se especialmente sobre Cl 1:16, 17, 20).

2. Além disso, esta é a era do ecumenismo.

Hoje, nos círculos religiosos, a comunidade cristã inter-


denominacional (chamada ecumenismo) está fazendo progressos.
Como muitos a concebem, esta comunhão deve chegar a ser uma
união orgânica. Sonham com uma superigreja. Será este um corpo
sem cabeça?

E se deve ter uma cabeça, será uma cabeça terrestre? Esta é uma
pergunta muito real no dia de hoje, uma vez que não só o
protestantismo, mas também o catolicismo romano está olhando
para uma união eclesiástica final. Inclusive, enquanto este livro está
sendo escrito, líderes protestantes se estão reunindo num concílio
ecumênico convidados pelo papa. Porventura não esteve ele
proclamando fortemente que os “irmãos separados” deveriam juntar-
se, que deveriam

Colossenses (William Hendriksen)


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voltar ao rebanho e reconhecer a suprema autoridade de … Roma?


Mas deve a igreja ter uma cabeça terrestre? Quem é, afinal, a
cabeça da igreja, tanto orgânica como governante, sim, e não tão
somente da igreja, mas de todas as coisas? Colossenses responde
esta pergunta também (veja-se sobre Cl 1:18, 19, 24; 2:10, 19).
Cuidemos para não rejeitar ou jamais comprometer este ensino.

Agora, no movimento ecumênico existem homens que desejam

seriamente promover o tipo de unidade espiritual que Cristo


aprovaria; de fato, que Ele ordenou (ver C.N.T. sobre Jo 17:21). Por
conseguinte, sua intenção é que os membros de várias
denominações e panos de fundo se reúnam e discutam suas
diferenças, para, se possível, resolver sem sacrificar as coisas
essenciais, e assim fundir as denominações onde quer que isto
puder ser feito para benefício espiritual de todos os interessados, e
investigar também as possíveis vias de mútua cooperação para
atividades filantrópicas e culturais. Tudo isso deve ser estimulado.

O ecumenismo neste sentido é algo que não deve ser esquivado,


mas antes, ser recebido com agrado.

No entanto, há outros que pareceriam ter renunciado (como se


alguma vez o tivessem sustentado!) ao conceito do caráter absoluto
da religião cristã e do caráter todo-suficiente de Cristo. Parece que
seu propósito é estabelecer uma igreja mundial, isto é, não só fundir
os grupos protestantes, católicos romanos e russos ortodoxos, mas
ainda unir as religiões cristãs com as não-cristãs. Parecem sentir que
Cristo, sem dúvida, tem algo a oferecer, que de fato tem muito a
oferecer, mas nem tudo. Rama, Vishnu, Zoroastro, Buda, Confúcio,
Moisés e Maomé também têm feito suas contribuições. Conta-se que
Gandhi aceitava todas as religiões como suas. Parece que os
extremistas do presente movimento ecumênico estão imitando
Gandhi.
Agora, esta negação implícita da todo-suficiência de Cristo é a
mesma heresia (embora apresentada de forma diferente) que Paulo
enfrentou quando escreveu Colossenses. É definitiva ou não a
religião cristã? É Cristo todo-suficiente ou necessitamos outros
salvadores que O

Colossenses (William Hendriksen)

complementem? Colossenses responde a esta pergunta. A epístola


completa é uma resposta, mas veja-se especialmente Cl 1:18; 2:9,
10.

3. A época presente chama a uma reflexão básica sobre a deidade


de Cristo.

O simples fato desta ênfase no ecumenismo enfrenta a igreja com a


necessidade de reconsiderar suas crenças básicas com relação ao
Cristo.

Se Cristo é realmente Deus, no mesmo sentido em que o Pai (e o


Espírito) é Deus, então os unitários, os judeus e os maometanos
devem ser excluídos do movimento ecumênico, ou há alguma
possibilidade de compromisso aqui? A teologia de Karl Barth também
nos impõe a necessidade de refletir sobre perguntas básicas
semelhantes com relação a Cristo, perguntas tais como: “há três
pessoas em uma única divina essência?” Vemos, pois, que esta era
espacial, esta era do ecumenismo, é também a era que força a um
reexame de nossas crenças históricas e confessionais referente à
relação que Cristo sustenta com o Pai e a Trindade. E também neste
ponto Colossenses fala com grande clareza (veja-se sobre Cl 1:15a;
2:9).

4. Esta é a era do pragmatismo.

Deve admitir-se que de maneira nenhuma todos estão interessados


em meditar e refletir nas verdades teológicas profundas. A ordem de
hoje é: “As ideias devem ser provadas por seu valor prático”. Não se
pergunta

“é verdade?”, mas o que geralmente se deseja saber é, “funciona?”.

Colossenses nos faz ver que estas duas perguntas não podem ser
separadas. Naturalmente, o cristianismo é uma maneira de viver,
mas é uma maneira de viver baseada numa convicção, numa
poderosa e fortificante doutrina. Aquele que é o Objeto de nossa fé
também é a Fonte de nossa vida. a. O que significa esta fé, e b.
como se vive esta vida cristã, são coisas explicadas aqui com tão
excelente beleza e magnificência, que a observação de A.
Deissmann é altamente relevante:

“Quando abro a porta da capela da Epístola aos Colossenses é


como se

Colossenses (William Hendriksen)

João Sebastian (Bach) mesmo estivesse sentado ao órgão”. Para a.


veja-se especialmente Colossenses 1; e para b. especialmente Cl
3:5–17.

5. A era na qual vivemos também está marcada por uma nova


ênfase sobre a grande verdade da igualdade de todos os homens
com relação ao seu Criador.

São muitos os que concordam em que todos os homens estão

igualmente inabilitados por natureza, e que todos igualmente estão


necessitados de salvação, que todos estão moralmente obrigados a
viver sua vida para a glória de Deus; e que, portanto, nenhum
homem tem direito de oprimir o seu próximo. Agora, se isso for
verdade, então qual deve ser a relação entre raça e raça, esposo e
esposa, pais e filhos, senhor e escravo, padrão e empregado? E se a
relação é tensa, como se pode eliminar a tensão? Quanto a isso há
muita discrepância. Colossenses nos ajuda nisso também. O ensino
de Cl 3:18–4:1 não pode ser descuidado sem prejuízo para os
relacionamentos entre pessoas.

É em Filemom especialmente onde achamos uma ilustração prática


(um exemplo da vida real que todos podem considerar) da forma em
que deve resolver semelhante problema. A lição que ali nos ensina
tem um imenso significado prático para a era em que estamos
vivendo. E como se fosse pouco, esta pequena carta nos brinda um
fascinante olhar para o interior da alma de Paulo, como o homem, o
cristão prático e afetuoso.

6. Finalmente, devido ao fato de que os sinais da volta de nosso


Senhor estão começando a multiplicar-se, existe hoje um renovado
interesse na doutrina das últimas coisas.

Com olhos anelantes os crentes olham rumo à “herança dos santos


na luz” (Cl 1:12). Neste ponto Colossenses também tem muito a
oferecer. O alvo de Paulo é “apresentar a cada homem perfeito em
Cristo” (Cl 1:22, 28). E Paulo oferece aos seus companheiros
cristãos de Colossos a esperança (uma esperança imutável e
segura) de que “quando Cristo seja manifestado, então eles também
serão manifestados com ele

Colossenses (William Hendriksen)

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em glória” (Cl 3:4). Isto tem que ser verdade, porque acaso não
estão ainda hoje suas vidas “escondidas com Cristo em Deus”? Esse
Senhor vivo é “Cristo em vós, a esperança da glória”.

Portanto, de qualquer ponto de vista, esta joia de epístola está a par


da discussão e reflexão de hoje e ainda leva a dianteira. É muito
atual. E

é assim porque apresenta o Cristo que é o mesmo ontem, hoje e


pelos séculos, e quem é:

a. O arquiteto e sustentador do universo;


b. A cabeça de todas as coisas, e especialmente a cabeça orgânica
e governante de Seu próprio corpo, a igreja; Cristo é o todo-
suficiente e único Salvador dela;

c. A imagem do Deus invisível, que incorpora em Si mesmo toda a


plenitude da deidade;

d. A fonte da vida, da paz e da alegria do cristão; e. O galardoador


daqueles que se esforçam para ser uma bênção para outros, sem
levar em conta sua posição social; e

f. Como presente dentro de nós, nossa “Esperança da glória”.

II. A CIDADE DE COLOSSOS

A. Geografia

É essencial para o bom entendimento da epístola de Paulo aos


colossenses, que conheçamos os aspectos gerais do território em
que estava localizada a cidade de Colossos. A carta faz menção de
três cidades: Hierápolis (Cl 4:13), Laodiceia (Cl 2:1; 4:13–16) e
Colossos ou Colosae (Cl 1:2). Embora originalmente estas foram
cidades frígias, nos dias de Paulo tinham chegado a ser parte da
província romana da “Ásia”.

Sua antiga localização está no que hoje é chamado a Turquia, na


Ásia (menor). Ser-nos-á de grande ajuda, pois, uns quantos esboços
ligeiros, passando do familiar ao menos conhecido, e omitindo a
propósito detalhes desnecessários. Quase todos os estudantes da
Bíblia estão
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familiarizados com a figura da Ásia Menor ocidental. Neste primeiro


esboço apresentamos Hierápolis, Laodiceia e Colossos, e as
colocamos com relação a toda a região, particularmente com Éfeso,
que era o centro da atividade missionária de Paulo nesta parte de
sua terceira viagem missionária, durante a qual as três igrejas, e
provavelmente outras mais, deveriam ter sido fundadas (At 19:10; Ap
1:11). Basta uma olhada para notar as distâncias, uma vez que os
lados de cada quadrado representa 160 quilômetros
aproximadamente. Por conseguinte, Éfeso encontra-se a 160
quilômetros aproximadamente a oeste das três cidades.

ÁSIA MENOR OCIDENTAL COM ÉFESO E AS TRÊS CIDADES

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Perto de 1500 quilômetros aéreos ao ONO (oeste-noroeste) destas


três cidades estava Roma. Numa viagem real estaria a muito mais de
1700 quilômetros das três; a distância varia segundo a rota que se
tome.
Longe para o leste e um pouco para o sul das três cidades estava a
cidade que foi o lugar do nascimento de Paulo (refiro a Tarso), e ao
sudeste desta cidade estava Antioquia da Síria, cidade da qual Paulo
empreendeu sua terceira viagem missionária. Também devemos ter
em mente que com relação aos lugares a leste das três cidades, as
distâncias numa viagem real eram também grandemente maiores
que as distâncias diretas ou por ar que se indicam no mapa.
Naqueles dias não havia nada semelhante a nossas autopistas, às
vezes com túneis. Também era preciso rodear obstáculos menores.
Se alguém desejava viajar por terra de Antioquia da Síria a Tarso,
devia rodear o Golfo da Cilícia, como o indica a linha dedilhada.

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As três cidades relacionadas com Roma: Éfeso, Tarso, Antioquia da


Síria.

As três cidades estavam situadas no vale do Lico. O rio Lico,


conhecido também como o “Pequeno Meandro”, bifurca-se do
Meandro, o qual é apresentado num mapa atual como o rio
Menderes. O vale do Lico tem a forma de um triângulo retângulo,
com as montanhas Mosina como sua hipotenusa, as cordilheiras do
Salvaco e Cadmos como sua base, e o vale de Meandro como sua
altitude. Hierápolis e Laodiceia estavam localizadas, uma num lado
do rio e a outra na ribeira oposta do mesmo. Ambas as cidades
estavam separadas por mais ou menos dez quilômetros. Colossos
abrangia as duas margens do rio, e estava situada a uns dezoito
quilômetros para o leste, com uma ligeira inclinação para o sul. A
acrópoles da cidade estava na ribeira sul; as tumbas e edifícios para
o norte. Portanto, Colossos ocupava um vale apertado do alto Lico.

Estava bela e estrategicamente localizada, com a Cordilheira


Cadmus erguendo-se muito escarpadamente ao sul, e com a
Cordilheira Mosina ao norte. A estrada oriental atravessava
Colossos, uma vez que os caminhos seguiam pelos vales de forma
natural.
Note-se que no mapa 3, que vem a seguir, os lados de cada
quadrado representam 16 quilômetros.

Surge a seguinte pergunta: “quando Paulo viajou de Antioquia da


Síria a Éfeso, dentro da província romana da Ásia, que rota tomou?”

topou ou não com a cidade de Colossos? Os Atlas bíblicos nos


oferecem uma variedade de possibilidades:

1. L.H. Grollenberg, no Atlas of the Bible, parece ter adotado o ponto


de vista da Galácia setentrional, e desta forma faz com que a viagem
do apóstolo se efetuasse pelo extremo norte. Mesmo quando Paulo
por fim se encaminhasse para Éfeso, estaria muito ao norte para
topar com Colossos. A discussão desta teoria não corresponde ao
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presente comentário. Aqueles que estiverem interessados nas


razões que tenho para rejeitar esta teoria da Galácia setentrional
poderão encontrá-

las em meu livro Bible Survey, pp. 334–336.

ESBOÇO DO VALE DO LICO

2. Outros (como J.L. Hurlbut, en A Bible Atlas, p. 121; G.E. Wright e


F.V. Filson, en The Westminster Historical Atlas to the Bible, lâmina
XV), enviam Paulo de Antioquia da Pisídia até Éfeso através das
montanhas, uma forma difícil e pouco comum de viajar. Esta rota
também evita a cidade de Colossos, estando muito a norte.

3. É muito mais natural que Paulo tivesse tomado a rota que, entre
outros, Emil G. Kraeling aponta no Rand McNally Bible Atlas, mapa
20.

É a rota que parte de Antioquia da Síria, seguindo depois por Tarso,


Derbe, Listra, Icônio, Antioquia da Pisídia, Apameia, Colossos,

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Laodiceia, e desta forma seguindo pelo vale de Meandro, até Éfeso.


Esta rota passa justo através de Colossos. É a rota ilustrada no
esboço que vem a seguir. O propósito deste esboço não é sugerir
que isto agora foi estabelecido (Paulo poderia ter tomado a rota
indicada acima sob o número 2.), mas só manifesta esta
possibilidade, uma vez que era a forma mais natural de viajar.

Quando alguém pergunta: “Por que os mapas evitam

escrupulosamente a cidade de Colossos na rota da terceira viagem


de Paulo?”, a resposta bem pode ser que isto se deve, em parte, à
influência desse grande erudito, com quem todo o círculo da
erudição bíblica está profundamente endividada, ou seja, Sir William
Mitchell Ramsay (veja-se especialmente sua Historical Geography of
Asia Minor; e sua Cities and Bishoprics of Phrygia). No entanto, o
próprio Ramsay admite que “a rota frequente e comum de comércio
entre Antioquia e a costa oeste passava através de Apameia e
Colossos”. Por que, então, não segue esta direção? Eis aqui sua
própria declaração: “Mas pareceria da Epístola aos Colossenses (Cl
2:1), que os cristãos de Colossos e Laodiceia não haviam visto seu
rosto (o de Paulo)”. Mas se depreende realmente da citação indicada
(Cl 2:1) que Paulo nunca passou por Colossos? Não é este um caso
em que se baseia muito sobre muito pouco? Não pode ser possível
que Paulo passasse pelo lugar embora ele não fundasse
pessoalmente a igreja? Por isso, parece-me que a afirmação de L.

Berkhof é muito mais cuidadosa: “Embora seja possível que Paulo


entrasse no vale do Lico, a verdade é que ele não achou nem fundou
a igreja ali, uma vez que ele mesmo afirma em Cl 2:1 que os
colossenses não o tinham visto face a face”. 1 E sobre a rota
montanhosa pela qual muitos comentadores enviam a Paulo,
Sherman E. Johnson afirma: “no entanto, esta é uma rota pouco
comum e improvável”. 2 A estrada e a via férrea hoje estão onde
esperaríamos que estivessem, nos vales dos rios 1 L. Berkhof, New
Testament Introduction, p. 214.

2 “Laodicea and its Neighbors,” BA, Vol. XIII, No. 1 (Feb. 1950), pp.
1–18. A citação é da p. 4.

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Meandro e Lico (veja-se “Lands of Bible Today”, publicado pela


National Geographic Society, dezembro 1956). Ao contrário do
ocorrido na segunda viagem, quando o itinerário de Paulo foi
mudado por um mandato divino (At 16:6–8), na terceira viagem, a
viagem de Antioquia da Síria a Éfeso foi levada a cabo de acordo
com seu próprio plano anterior, tal como o indica At 18:21 (cf. essa
referência com At 19:1), estando a aprovação divina sobre ele.
Portanto, é possível supor, sem dúvida, que ele tenha tomado a rota
mais usual e mais fácil. 3

PRIMEIRA PARTE Da TERCEIRA VIAGEM MISSIONÁRIA DE


PAULO

3 A observação de Lightfoot, de que Paulo “não se acovardaria de ir


por uma rota ou caminho pouco frequentada”, pode ser respondida
pela observação contrária de que não se escolhe ordinariamente tais
caminhos, a menos que haja alguma razão especial para fazê-lo. E
com relação às outras rotas que têm sido sugeridas, como as que
requerem consideráveis desvios, bem podemos perguntar: Por que
razão haveria Paulo de tomá-las, quando seu propósito, a saber, o
confirmar as igrejas já estabelecidas, e continuar seu caminho para
Éfeso de acordo com sua promessa, não o requeria? Nisto também
devo dar-me a liberdade de diferir com Lightfoot, quando afirma: “Na
segunda ocasião, o propósito principal do São Paulo era visitar as
igrejas da Galácia, as quais tinha fundado em sua primeira viagem
(At 18:23), e não é senão até ter cumprido esta sua intenção que ele
vai a Éfeso”. Pelo contrário, também Éfeso estava claramente no
plano desde o princípio, como já o indicamos. Veja-se J.B. Lightfoot,
Saint Paul’s Epistles to the Colossians and to Philemon, pp. 24–28.

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B. História
O vale do Lico estava infestado de movimentos telúricos. 4 A Ásia
Menor está situada dentro de uma zona de atividade vulcânica.
Agora, os movimentos telúricos e a atividade vulcânica indicam
desastres; pensemos, por exemplo, no dano que causou a Laodiceia
e Hierápolis um terremoto pelo ano 60 d.C. Não obstante, a terra
vulcânica também é um terreno fértil. É excelente para os pastos e a
vegetação. De modo que sobre os ricos prados do vale do Lico
pastavam grandes rebanhos de ovelhas, trazendo muita riqueza para
os manufatureiros de vestidos. Isto era tanto mais assim, porque as
águas deste vale estavam impregnadas de depósitos cretáceos.
Agora, embora seja verdade que estas formações cretáceas
voltavam estéril parte do solo, contudo, as águas cretáceas eram o
melhor para tingir o tecido. Esta é mais outra razão de por que a
indústria do vestido floresceu neste lugar. O negócio de tintureiro se
praticava nas três cidades. Não é surpreendente, pois, que as
cidades prosperassem, embora com o tempo sua sorte mudou
grandemente, como veremos mais adiante.

1. Colossos

Ninguém sabe quando foi fundada Colossos. Tudo o que sabemos é


que já nos tempos de Xerxes, rei da Pérsia (485–465 a.C.), era uma
comunidade florescente. Este Xerxes foi o “Assuero” do livro de
Ester, aquele que tirou do trono a rainha Vasti, quando esta recusou
aceder à seu irrazoável demanda. Ele foi o tirano que ordenou
castigar as águas do Helesponto com trezentas chibatadas e
decapitar os trabalhadores, porque, por causa de uma tormenta, o
primeiro intento de fazer uma ponte sobre o apertado canal terminou
num fracasso. Tendo conquistado 4 Estrabão ( Geografia XII.viii.16)
descreve-a como sísmica, sujeita a terremotos. J.B. Lightfoot nas
páginas 38–40 de seu livro, Saint Paul’s Epistles to the Colossians
and to Philemon, dá evidência documentária para os muitos
terremotos que sacudiram Laodiceia e a região circunvizinha nos
anos precedentes e subsequentes ao nascimento de Cristo.

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o Egito, este terrível ditador fez extensas preparações para invadir a
Grécia.

Agora, quando ele e seu exército iam a caminho do Helesponto,


procurando evitar um terreno mais difícil, passaram através de
Colossos e o vale do Lico. O historiador grego Heródoto, que em sua
história nos deu um vívido (embora nem sempre completamente
exato) relato dessa expedição frustrada, descreve-nos, em conexão
com este fato, a Colossos de 480 a.C. como “uma grande cidade da
Frígia” (VII.30).

Xerxes foi seguido por Artaxerxes I (465–425 a.C.), que permitiu a


Esdras guiar um número de judeus de volta a Jerusalém, e que
também autorizou a construção das muralhas sob a direção de
Neemias. Pouco depois Dario II começou a reinar sobre o
cambaleante império (423–404

a.C.). Agora, “Dario (II) e Parisatis tiveram dois filhos: Artaxerxes, o


mais velho e Ciro, o mais novo” (Xenofonte, Anábasis I.i.1.). Por
conseguinte, Dario II foi sucedido por seu filho mais velho Artaxerxes
II (404–358). Mas Ciro, o mais jovem, por causa da convicção que
tinha de que ele deveria ter sido o herdeiro do trono e também por
um rancor pessoal contra Artaxerxes, planejou uma revolta
completamente secreta reunindo aliados de várias regiões e sob
diversos pretextos. Uniu-se a Ciro um contingente de mais ou menos
“10.000” gregos. No entanto, em Cunaxa, perto das portas de
Babilônia, Ciro, o hábil e refinado ambicioso, foi assassinado
(Xenofonte, op. cit. I.viii. 24–29). Em conexão com esta campanha,
Xenofonte, um brilhante jovem ateniense, ganhou para si uma fama
perdurável, e a obteve em duas áreas: a. como líder da retirada dos
“10.000”, no qual demonstrou sua admirável destreza militar, que
adquiriu rapidamente, e b. como um mestre da narrativa, entregando
à posteridade, em seu Anábasis, um brilhante relato daquela marcha.

Agora, muito pouco depois de ter começado esta expedição,


enquanto partia para o sudeste de Sardes, o exército atracou a
Colossos e permaneceu ali por sete dias. É neste contexto que
Xenofonte chama a Colossos de 401 a.C. “uma cidade habitada e
próspera e grande” (I.ii.6).

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Na verdade, Colossos era grande, e isto não só com relação a seu


tamanho e população, mas também em importância estratégica.
Acaso não estava situada sobre uma estrada que unia o este com o
oeste da Ásia? Não era a chave para a entrada ao vale do Lico, e ao
mesmo tempo à estrada que ia ao leste, para Apameia e as portas
cilicianas? No entanto, com o tempo outras cidades foram fundadas
neste mesmo vale, assim que Colossos teve que dar as boas-vindas
a competidores, como veremos a seguir.

2. Laodiceia

A marcha dos “dez mil” tinha demonstrado a fraqueza do imenso


mas pesado e antiquado exército persa. Por conseguinte, Alexandre,
o Grande (336–323 a.C.) viu e aproveitou a oportunidade.
Expressando-o na linguagem simbólica de Daniel 8,
inesperadamente o bode emissário (Grécia e Macedônia sob o
comando de Alexandre) vem do poente correndo com fúria sobre a
terra e investindo sobre o carneiro de dois chifres (o império medo-
persa), derrubando-o ao solo e pisoteando-o.

Até a ira do homem estava glorificando a Deus: Alexandre não só


trouxe o domínio grego às regiões que conquistou, mas também o
idioma grego, com o resultado (imprevisto por Alexandre, mas
incluído nos planos de Deus) de que um tempo depois este idioma
poderia ser usado como um meio eficaz para a expansão do
evangelho. Os caminhos de Deus são maravilhosos.

Um tempo depois da morte de Alexandre, seu império foi dividido em


quatro partes (Dn 8:8). Lisímaco recebeu Trácia; Cassandro recebeu
Macedônia; Ptolomeu Sotero, Egito; e Seleuco, Síria e uma vasta
região a leste da Síria. Depois de algum tempo, Antíoco II (Teos)
reinou sobre a Síria (261–247 a.C.); Ptolomeu II Filadelfo (283–246
a.C.), que fora construtor de cidades, patrono das artes e a literatura,
reinou sobre o Egito. Estes dois reis fizeram uma aliança pelo qual o
rei da Síria se divorciaria de sua esposa e se casaria com a filha do
rei do Egito,

Colossenses (William Hendriksen)

20

Berenice. A realização deste ímpio plano só trouxe problemas (Dn


11:6).

O nome desta artificiosa, ardilosa e vingativa esposa era Laodice. Foi


para adular a esta mulher que a nova cidade de Laodiceia (a qual
substituiu a uma pequena cidade) recebeu este nome.

Embora Laodiceia não prosperasse imediatamente, uma vez que a


província romana da Ásia foi fundada (190 a.C.) a cidade começou a
florescer como um poderoso centro industrial. Muito em breve
Laodiceia fez-se famosa pela fina lã negra de suas ovelhas. Além
disso, pelo fato de que houve uma mudança no sistema de estradas,
também chegou a ser um importante cruzamento de estradas, um
lugar em que a estrada oriental encontrava-se com outras quatro
vias. A combinação de todos estes fatores favoráveis trouxe consigo
a indústria, o comércio, operações bancárias, riquezas (cf. Ap 3:14–
22) e prestígio político; também o último, uma vez que os romanos
fizeram de Laodiceia a capital de todo um distrito político que
abrangia vinte e cinco cidades.

3. Hierápolis

Numa região vulcânica geralmente existem muitas gretas das quais


brotam vapores e mananciais. Supõe-se que estes mananciais têm
propriedades curativas. Muitos os consideram de valor no tratamento
de condições tais como reumatismo, gota, dispepsia, etc. Daí que
com frequência se estabelecem estações termais nos arredores
desses mananciais. Exemplos de nossos dias são as termas
europeias de Aquisgran, Baden Baden, Bath, Spa; ou lugares
semelhantes nos Estados Unidos: Hot Springs, Las Vegas Springs,
White Sulphur Springs. Da mesma forma, Hierápolis também chegou
a ser um famoso balneário, uma cidade “cheia de banhos naturais”.
Milhares de pessoas reuniam-se ali para beber das águas, e também
para banhar-se nelas. Os

“transbordantes arroios” da cidade chegaram a ser suas “joias”.

Além disto, Hierápolis tinha seu Caronte ou Plutão, o qual era uma
fossa que afundava profundamente na terra, e do qual brotava um
vapor

Colossenses (William Hendriksen)

21

tão daninho que até envenenava as aves que voavam sobre ele. Era
de esperar-se que o povo supersticioso da época relacionasse e
dedicasse estes mananciais e esta cova profunda às divindades que
ali se adoravam.

Portanto, Hierápolis tinha uma multidão de templos. Com relação a


isso, com frequência afirma-se que o significado original da cidade
de Hierápolis é cidade sagrada. Esta possibilidade deve ser admitida.
Não obstante, também é possível que o nome se derive de uma
rainha amazona da mitologia, Hera.

4. A história posterior de Colossos com relação a Laodiceia e


Hierápolis

À vista da história que narramos, não causa surpresa que a longo


prazo Colossos não pudesse manter-se ao nível de suas
competidoras mais jovens e dotadas de uma forma muito mais
abundante. De fato, nem mesmo o terremoto que causou tanto dano
a Laodiceia e Hierápolis perto de 60 a.C. pôde inverter a tendência.
Os prósperos cidadãos de Laodiceia reedificaram imediatamente sua
cidade, e rejeitaram a ajuda do governo.
Também Hierápolis foi restaurada, embora não imediatamente. No
entanto, muito antes do 60 a.C. Colossos já tinha perdido a carreira.
Se alguém buscava saúde, prazer e repouso, iria a Hierápolis; e se
estava interessado em negócios ou política, dirigiria seus passos
direto a Laodiceia. Mas com relação a Colossos, o historiador e
geógrafo grego Estrabão, que escreveu duas gerações antes de
Paulo escrever Colossenses, chamou a Colossos de seus tempos
“uma cidade pequena”

(Geografia XII. viii. 13).

Hoje em dia as ruínas de Laodiceia ainda são bastante extensas. No


entanto, perto do tempo em que Denizli foi construída, uma parte
dessas ruínas foi usada como pedreira, e mais recentemente muitas
das pedras que restavam foram usadas na construção de uma via
férrea. Mas ainda subsiste essa pequena colina, ternamente
abraçada por dois pequenos tributários do rio Lico. Nesta colina
esteve uma vez Laodiceia. Ali

Colossenses (William Hendriksen)

22

podem ser vistas as ruínas dos dois teatros, um deles ainda bem
conservado; também o que resta do ginásio, um grande cemitério, o
aqueduto, e pedras da porta oriental.

Hierápolis é mais notável. Estava situada sobre um terraço elevado.

Sobre os precipitados escarpados que suportam este terraço,


brilhantes cataratas de pedras de um alvo puro, os depósitos
cretáceos dos arroios, descem até o plano de baixo. No outono estas
massas estancadas brilham com a luz do sol e podem ser vistas à
distância, brindando um precioso quadro. As ruínas de Hierápolis são
extensas. Sobre a elevada meseta ainda podem-se seguir os rastros
das muralhas da cidade; e também os pilares do antigo ginásio, os
restos do que bem pôde ter sido o salão de esculturas, as ruínas de
arcos, de um templo, de igrejas e de banhos.
Particularmente notáveis são as ruínas de dois teatros, o menor
pertencente à época helênica e o maior ao período romano. O último
está situado à margem oriental da cidade, sobre a ladeira da colina.
Até no estado em que está hoje, pode ser descrito como um dos
mais perfeitos teatros da Ásia Menor.

Agora comparemos o que resta de Colossos com tudo o que vimos.

Embora seja verdade que em 1835, quando o arqueólogo W. J.


Hamilton visitou este lugar, ainda se podiam ver alguns fundamentos
de edifícios, algumas colunas, fragmentos de cornijas e um cemitério
com pedras de uma forma especial, no entanto não se achou nada
que pudesse comparar-se às extensas e definidas ruínas das outras
duas cidades. E

muito do que ainda restava nesse lugar em 1835, hoje em dia


desapareceu, tendo sido usado para trabalhos de construção em
Honaz e outros lugares.

É maravilhoso o fato de que uma epístola tão importante como é


Colossenses fosse enviada a uma igreja localizada numa cidade que
nos dias de Paulo já era tão insignificante, uma igreja que
provavelmente era pequena em membresia. O que pode parecer
pequeno aos olhos dos homens com frequência é grande e
importante aos olhos de Deus.

Colossenses (William Hendriksen)

23

Agora observemos as pessoas a quem foi dirigida esta carta.

C. Destinatários

Colossos, situada mais para o leste que Laodiceia e Hierápolis, era a


mais frígia das três. Estava habitada por nativos da Frígia, pagãos
que adoravam vários deuses, como veremos mais adiante. Não
obstante, um número considerável de judeus se misturou com esta
população gentílica, devido ao fato de que Antíoco, o Grande (223–
187 a.C.) tinha transportado duas mil famílias da Mesopotâmia e
Babilônia a Lídia e Frígia. 5 Estes judeus prosperaram no vale do
Lico e também atraíram outros de seus concidadãos. O comércio
com lã tingida e outros possíveis negócios agiram como um ímã. As
inscrições da Frígia nos têm provido com muita informação sobre a
existência de colônias judaicas nesse lugar. 6 De modo que, pelo
ano 62 a.C., viveram pelo menos 11.000 judeus livres somente no
distrito do qual Laodiceia era a capital.

A população judaica inteira (incluindo mulheres e crianças) era,


naturalmente, muito maior que isso. 7 Sabemos do segundo capítulo
do livro de Atos que haviam judeus da Frígia entre aqueles que
participaram da festa do Pentecostes descrita ali.

Não obstante, seria um erro deduzir do precedente que os judeus


que emigraram ao vale do Lico, e seus descendentes, estavam
interessados nesta região só porque oferecia boas possibilidades
para os negócios. Para alguns deles os banhos de Hierápolis eram
uma atração muito mais forte que o comércio de Laodiceia e (por um
tempo) de Colossos. Ouvimos, à maneira de exemplo, o lamento do
talmudista: “Os vinhos e os banhos da Frígia separaram as dez tribos
de Israel”. 8

5 Josefo, Ant. XII.iii.4.

6 William M. Ramsay, Cities and Bishoprics of Phrygia, veja-se o


capítulo sobre “The Jews in Phrygia”.

7 Para a evidência veja-se Lightfoot, op. cit. , pp. 20, 21.

8 Talm. Babl. Sabbath 147b.

Colossenses (William Hendriksen)

24

Agora, pelo fato de que, como vimos, Colossos era uma típica cidade
pagã, com uma forte mescla de judeus, não nos deve surpreender se
descobrirmos que o perigo para a igreja fundada ali procedia de duas
fontes, ou seja, pagã e judaica, e até de uma mescla destas duas.

O vale do Lico pertenceu ao Império Romano desde 133 a.C. Mas


durante os séculos sete e oito d.C. foi invadido pelos sarracenos. Por
este tempo também, a cidade ficou deserta. Um terremoto foi
provavelmente um dos fatores contribuintes. Os habitantes se
mudaram a Chonas (mais tarde Honaz), um pouco para o sul, ao pé
do monte Cadmus. No século XII a cidade de Colossos desapareceu
completamente. 9

III. A IGREJA EM COLOSSOS

A. Seu estabelecimento

Esteve Paulo alguma vez em Colossos? Segundo alguns, nunca pôs


os pés nesse lugar. 10 Segundo outros, não só empregou algo de
seu tempo ali, mas também ele mesmo, em pessoa, fundou a igreja.
11 Agora, já mostramos que Paulo poderia ter passado por Colossos
em sua terceira viagem missionária, viajando de Antioquia da Síria a
Éfeso, na Ásia Menor. Mas o livro de Atos (At, 18:23; 19:1) nada
insinua a respeito de que o apóstolo fundasse alguma igreja nesta
viagem. Enquanto foi através do território no qual ainda não tinham
sido estabelecidas igrejas, a viagem deve ter sido em sua maior
parte ininterrupta, porque «não há alusão alguma a pregação em
lugares novos, mas só à confirmação de antigos convertidos»
(Ramsay). E não se pode provar que durante sua estadia em Éfeso,
Paulo visitasse Colossos com o propósito de fundar ou 9 Para
estudos sobre a geografia e arqueologia de Colossos e seus
arredores, veja-se a bibliografia geral que está no final deste livro.

10 Herman Ridderbos, De Brief van Paulus aan de Kolossenzen (


Commetaar op het Nieuwe Testament), p. 104. H.C. Thiessen,
Introduction to the New Testament, p. 231.

11 F. Wiggers, “Das Verhältniss des Apostels Paulus zu der


christlichen Gemeinde in Kolossä”, TSK
(1838), pp. 165–188.

Colossenses (William Hendriksen)

25

de encontrar-se com alguma igreja ali. Além disso, segundo o que


provavelmente é a melhor interpretação de Cl 2:2, quando Paulo
escreveu sua Epístola aos Colossenses, a membresia, até essa
data, ainda não havia visto seu rosto. Embora isto poderia ter-se
entendido como uma afirmação geral, admitindo as exceções, isto
era a verdade.

Dentro deste quadro de fatos estabelecidos há lugar para várias


possibilidades, nenhuma das quais deve ser completamente
excluída.

Mas seja como for, a verdade é que entre os muitos que devem ter
ouvido o apóstolo, quando trabalhava em sua sede de Éfeso, havia
pessoas do vale do Lico (At 19:8–10). Deve ter sido durante este
período (54–56 d.C.) que também a igreja de Colossos foi
estabelecida.

Agora, nesta igreja Paulo tinha muitos amigos notáveis:

1. Epafras. Este homem, provavelmente de origem gentílica, 12

tendo sido convertido através da pregação de Paulo, foi com toda


probabilidade o verdadeiro fundador das igrejas do vale do Lico (Cl
1:7).

Era colossense (Cl 4:12), servo de Cristo Jesus (Cl 4:12),


companheiro das prisões de Paulo, em Cristo Jesus (Fm 23; para
sua exposição veja-se Cl 4:10a), e um obreiro dedicado nas três
congregações vizinhas do vale do Lico (Cl 4:13). Era alguém que
vigiava em oração e que era fiel a ponto de estar disposto a sofrer
qualquer penalidade que estivesse reservada para ele como
embaixador de Cristo.
2. Filemom, Áfia e Arquipo. Pelo fato de que estes três são
mencionados uma vez (Fm 1:2) como os destinatários da carta mais
curta de Paulo, e pelo fato de que somos informados que a igreja
(evidentemente a que estava em Colossos; cf. Cl 4:9 com Fm 10, 16;
Cl 4:12 com Fm 23; e Cl 4:17 com Fm 2) costumava congregar-se na
casa de Filemom, a conclusão segura é que Filemom, Áfia e Arquipo
estavam relacionados estreitamente. Até poderiam ter pertencido à
mesma família: Filemom, o esposo e pai, Áfia, a esposa e mãe,
Arquipo, o filho.

12 Para o significado de seu nome e para qualquer conexão com


Epafrodito, que é mencionado na carta aos filipenses, veja-se C.N.T.
sobre Filipenses 2:25, nota 116.

Colossenses (William Hendriksen)

26

3. Onésimo (em anos posteriores). Foi escravo de Filemom. A carta


de Paulo a Filemom se centralizou em sua fuga, conversão e volta.
Veja-se a seção IV B; e também o comentário sobre Filemom deste
livro.

Estes foram, então, alguns dos amigos e ajudantes de Paulo na


congregação de Colossos, a qual foi estabelecida durante seu
ministério em Éfeso. Depois de terminar este ministério, Paulo saiu
para Trôade.

Então, tendo cruzado o mar Egeu, veio para Macedônia, e dali viajou
a Corinto. Dali mudou seu curso e passou a voltar a Jerusalém via
Macedônia. Tíquico, um cristão da província da Ásia, foi um dos que
se adiantou a Paulo em sua viagem da Macedônia a Trôade, e
esteve esperando o apóstolo naquela cidade (At 20:4). Seu nome
aparecerá outra vez ao terminar a seção B.

Quando Paulo atracou a Jerusalém, ao terminar sua terceira viagem


missionária, foi acusado falsamente e tomado prisioneiro. Muito em
breve começou seu encarceramento. Durou perto de cinco anos, e o
sofreu primeiro em Cesareia e depois em Roma. Agora, foi durante
seu encarceramento na capital imperial, que Epafras, o ministro da
igreja em Colossos, fez uma viagem a Roma, percorrendo pelo
menos 1700 a 2200

quilômetros (a distância depende da rota que tenha tomado) para


chegar à cidade. Em geral, um relatório que ele trouxe era favorável
(Cl 1:3–8), embora não totalmente. Paulo percebeu conta com
tristeza o fato de que a igreja enfrentava um duplo perigo.

B. Seus perigos

A fim de que possamos entender a natureza dos perigos que esta


igreja enfrentava, é bom ter em mente que estava composta inteira
ou quase totalmente de convertidos do mundo gentílico (Cl 1:21, 22,
27; 2:11–13; 3:5–7). Quase todas as variedades de paganismo que
nesse então se conheciam tinham um bom êxito nesta região.
Adoravam-se deidades tais como as frígias Cibele Sabacio, Men, Ísis
e Serápis, Hélio e

Colossenses (William Hendriksen)

27

Selene, Deméter e Ártemis. Por conseguinte, o mal básico que a


jovem igreja enfrentava era:

1. O perigo de recair no paganismo com sua crassa imoralidade.

A leitura cuidadosa de Cl 3:5–11 prova que este era um perigo


básico. Os membros da igreja de Colossos eram, pelo menos em
sua maior parte, recém-convertidos das trevas da vulgar
sensualidade do paganismo. Como tal, o perigo de recair em sua
anterior dissolução multiforme era muito real. E era assim pelas
seguintes razões: Em primeiro lugar, estavam as ligaduras à sua
maldade passada. O

hábito é como uma atadura. A pessoa entretece um fio cada dia, até
que chega a ser quase impossível romper a corda.
Em segundo lugar, estava a corrente do ambiente ímpio. É muito
difícil remar contra semelhante corrente, e opor-se às opiniões e à
vontade da maioria.

Em terceiro lugar, também estava a corrente interior das paixões dos


corações não consagrados totalmente. Embora os colossenses
tivessem aceito a Cristo, não tinham chegado a ser “perfeitos” da
noite para o dia.

E finalmente, estava o engano de Satanás, que buscava por meio de


todo tipo de ardilosas maquinações arrebatar as ovelhas da mão do
Pastor (cf. Jo 10:28).

Em vista de todas estas coisas, podemos entender a repetida


exortação de Paulo, que os colossenses deviam continuar em sua fé
recentemente adquirida, que não deviam mover-se do evangelho que
recentemente tinham recebido, que não deviam voltar às suas más
obras, e que, em vez disso, deviam “fazer morrer” coisas como
imoralidade, impureza, paixões, desejos ímpios, avidez, malícia,
calúnias, palavras vergonhosas e o proferir mentiras (Cl 1:21–23;
2:6; 3:5–11).

Colossenses (William Hendriksen)

28

2. O perigo de aceitar a heresia de Colossos.

Agora, o que tem que ver com tudo isso a “heresia de Colossos”?

Evidentemente, o propósito dos mestres do erro era mostrar aos


colossenses como eles poderiam ser capacitados a triunfar sobre os
pecados que acabamos de mencionar, quer dizer, sobre “os apetites
da carne”. Era como se eles tivessem dito: “estão sustentando uma
tremenda mas inútil batalha contra a tentação que surge de sua
natureza corrompida? Nós podemos ajudá-los. A fé em Cristo, por
boa que seja, não é suficiente, porque Cristo não é um Salvador
completo”.
É bem possível que, com relação a isso, eles estivessem usando a
palavra plenitude (veja-se mais adiante, a nota 56), como querendo
dizer:

“Cristo não lhes dará a plenitude de conhecimento, santidade, poder,


alegria, etc. Portanto, para que possam conseguir essa plenitude,
além de crer em Cristo devem seguir nossas ordenanças e regras.
Se fizerem isso, vocês poderão vencer e chegar até a maturidade, à
felicidade e salvação última”. 13

Que esta era realmente a conexão, é claro pelo fato de que Paulo,
tendo resumido “a filosofia e ocas sutilezas” destes marreteiros da
mentira com seus persuasivos argumentos sobre regulamentos e
regulações e sua jactância a respeito de visões que diziam ter tido,
conclui sua crítica dizendo: “regulações desta classe têm, na
verdade, aparência de sabedoria … (mas) são de nenhum valor,
servindo só para dar rédea solta à carne” (Cl 2:23). Em outras
palavras, vos farão mal em vez de ser uma ajuda. Depois passa a
indicar uma forma muitíssimo melhor (de fato, a única forma) de
ganhar a batalha contra a carne (capítulos 3 e 4), a forma que ele
mesmo compreendeu tão notavelmente em Rm 12:21b: “vence o mal
com o bem”, e em Rm 13:14 (a passagem que tanto significou para
esse grande líder da igreja antiga, ou seja, 13 C.F.D. Moule
demonstrou que “as prescrições colossenses estavam dirigidas a
combater a indulgência” ( The Epistle to the Colossians and to
Philemon, en The Cambridge Greek Testament Commentary, p. 110).
Todo o contexto aponta nesta direção.

Colossenses (William Hendriksen)

29

Agostinho), “revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e nada disponhais


para a carne”.

“A heresia de Colossos” era, portanto, um segundo perigo


acrescentado ao primeiro, e até certo ponto uma consequência dele.
Esta heresia pode descrever da seguinte forma:

a. Filosofia falsa (Cl 2:8), a qual, apesar de que pretendia ter


descoberto segredos e ter tido visões (Cl 2:18), negava toda a
suficiência e preeminência de Cristo. Paulo declara que a razão pela
qual ele proclama a grandeza de Cristo é que há alguns que a
negam e que estão procurando enganar a outros para que a neguem
também (Cl 2:2b–4; 2:8, 9; 2:16, 17). A soberana majestade e
completa suficiência de Cristo como o perfeito Salvador e Senhor
são enfatizadas em passagens como: Cl 1:13–20; 1:27, 28; 2:2–4;
2:8–10; 2:16, 17; 2:19; 3:1–4. Isto é básico para o que vem a seguir.

b. Cerimonialismo judaico (Cl 2:11, 16, 17; 3:11), o qual dava um


significado especial ao rito da circuncisão, às regulações quanto às
comidas, e à observância de dias especiais, tais como os que
pertenciam à economia da antiga dispensação. Todas essas coisas,
diz Paulo, são nada mais que “sombras”. Perderam o seu significado
agora que o objeto que faz a sombra, quer dizer, Cristo, chegou (Cl
2:17).

c. Adoração de anjos (Cl 1:16; 2:15; 2:18), a qual também desvirtua a


singularidade de Cristo, como se Ele fosse insuficiente para a
completa salvação.

d. Ascetismo (Cl 2:20–23), o qual em seu cruel trato do corpo ia além


do judaísmo. O apóstolo mostra sua total futilidade e aponta a Cristo
como a verdadeira resposta aos problemas de doutrina e da vida que
acossavam os colossenses (Cl 2:20–23 contrastado com Cl 3:1–4).

Surgem interrogantes que a carta não responde; por exemplo: qual é


o contexto mais amplo desta heresia colossense? Como se originou
esta heresia? Era um renovo do incipiente gnosticismo de tipo
ascético?

Poderia talvez ser uma consequência das teorias dos essênios,


cobertas,
Colossenses (William Hendriksen)

30

neste caso, com um verniz de fé cristã? Era uma mescla de


gnosticismo, essenismo (ele mesmo infectado já com o erro
gnóstico) e cristianismo?

Dão-nos alguma luz sobre isso os recentes achados dos manuscritos


do Mar Morto?

Aqui devemos andar em muito cuidado. Talvez poderemos dizer que


a heresia colossense era um sincretismo, isto é, uma estranha
mescla de elementos judaicos e pagãos. O gnosticismo, com sua
ênfase no

“conhecimento”, parece ter tido algo que ver com o assunto, uma vez
que é evidente pela epístola, que os falsos mestres colocavam uma
ênfase indevida em tais coisas como “conhecimento”, “sabedoria”,

“filosofia”, “mistério” e “discernimento místico”. Não obstante, a


evidência disso é usualmente indireta, quer dizer, com frequência
não expressa diretamente, mas que se deduz da insistência de Paulo
sobre que o verdadeiro conhecimento, sabedoria, mistério, etc.,
encontram-se em Cristo, nele sozinho (Cl 1:26, 27; 2:2; 4:3). de vez
em quando, errado-los são postos ao descoberto claramente deste
ponto de vista particular (Cl 2:4, 8a, 18, 23). Também se sabe que os
gnósticos exaltavam o espírito, e consideravam a matéria como o
assento do mal.

Para alguns deles, isto significava que o corpo devia ser desprezado,
que seus desejos naturais deviam ser suprimidos, se é que alguma
vez o indivíduo quisesse alcançar a meta da plenitude. Há os que
veem um reflexo desta falácia numa declaração que é uma dura
repreensão de Paulo, quando diz: “por que … vos submeteis a
preceitos, ‘não toques, nem proves, não manuseies’ ” (Cl 2:20, 21).
Também veem refletida e refutada a doutrina gnóstica das
emanações na advertência do apóstolo contra a adoração de anjos
(Cl 2:18).

No entanto, é bom fazer uma advertência, porque (1) ainda não


possuímos uma descrição razoavelmente completa do gnosticismo
do primeiro século d.C., e (2) tampouco estava dentro do propósito
do apóstolo apresentar uma explicação completa da heresia que
estava combatendo. Por tudo isso, quando certos autores, tirando
suas hipóteses da expressão “rudimentos do mundo” (Cl 2:8), que
traduzem “espíritos

Colossenses (William Hendriksen)

31

elementares do universo”, apresentam uma reconstrução mais ou


menos completa e detalhada desta heresia, bem podemos duvidar
em aceitá-la.

É muito interessante descrever estes “espíritos astrais” ou “poderes


planetários” como sendo também guardiões da lei mosaica. É
fascinante descrevê-los como combatendo com Cristo, quem, não
obstante, as despoja (Cl 2:15); apresentá-los também como tendo
instituído dias sagrados mediante os mesmos planetas sobre os
quais eles exercem controle, e como prescrevendo elaborados
preceitos de abstinência de tal forma que mediante a obediência a
estas regulações o espírito do homem possa chegar a desinfetar-se
do mundano e possa começar a subir através das várias “esferas” a
Deus. Mas, temos algum direito para formar todas estas conjeturas,
e preencher as lacunas que Paulo deixou abertas?

Existe outra objeção: Aceitando que é correto detectar na heresia de


Colossos alguma influência exercida pelo gnosticismo incipiente,
qualquer que seja sua origem (e aceitar isso parece ser algo
totalmente razoável), ainda permanece como totalmente verdadeiro
que a falsidade que Paulo censura tão severamente tinha um pano
de fundo
definitivamente judaica. Ela insistia no rito da circuncisão (Cl 2:11–
13) e na estrita observância da lei de Moisés com suas estipulações
referentes às comidas e festas (Cl 2:14, 16). Que isto é realmente o
que Paulo tem em mente está claro pelo fato de que ele considera a
lei como cumprida em Cristo (Cl 2:16, 17).

É verdade que a heresia, embora judaica, ia além do judaísmo que


Paulo descreve em Gálatas. Isto é claro especialmente por seu
rigoroso ascetismo, quer dizer, por sua insistência na obediência a
regras que não eram mais que “preceitos e doutrina de homens” (Cl
2:20–23). Estamos, porventura, lidando com uma forma extrema de
farisaísmo, ou com as doutrinas dos essênios?

Com relação aos essênios, veja-se Josefo, The Life (uma


autobiografia) 7–12; Jewish War II.119–161; Plínio, o Velho, Natural
History V.73; Filo, Fragment of the Apology for the Jews XI.1–7;
Lightfoot, op.cit. , pp. 82–94, 355–419.

Colossenses (William Hendriksen)

32

Josefo, que num tempo pertenceu a esta seita, tem muitas coisas
excelentes que nos dizer a respeito dela. Chama seus membros
“senhores de seu temperamento, campeões de fidelidade, ministros
de paz”, etc. No entanto, sua descrição também nos mostra que os
mesmos erros que marcavam a heresia colossense se achavam
entre eles. Estavam infectados fortemente com o gnosticismo
incipiente, porque, como ele mesmo nos conta: «é sua crença firme
que o corpo é corruptível e sua matéria constituinte não é
permanente, mas a alma é imortal e imperecível». Consideravam a
alma como «tendo chegado a estar encerrada na prisão do corpo».
Com relação ao cerimonialismo e ascetismo judaico, relata-nos que
«depois de Deus, eles perseveram em reverenciar o nome de seu
legislador (Moisés); qualquer que blasfemasse contra ele é castigado
com a morte». Também, «são mais estritos que todos os judeus em
abster-se do trabalho no sábado». Também faz referência à «sua
sobriedade e suas limitações em porções de comida e bebida que
cabe a cada um». Implica-se, pelo que diz, que estavam divididos em
dois grupos: celibatários e casados. Quanto ao primeiro grupo:
«Desdenham o casamento … Eles não o condenam em princípio

… mas desejam proteger-se da libertinagem da mulher», etc. Quanto


ao segundo grupo: «Provam suas esposas por três anos». Além
disso,

«desprezam as riquezas». Quanto à sua atitude com relação aos


anjos,

«preservam cuidadosamente os nomes dos anjos».

Devemos concluir por tudo isso, que os falsos mestres que


perturbavam os colossenses com suas sinistras doutrinas eram
essênios, que nominalmente se converteram a Cristo, mas que
retinham muitas de suas crenças anteriores? Alguns sustentam que
isso é impossível, porque na Ásia Menor não habitava nenhum
essênio. No entanto, Josefo afirma que «não habitavam nenhuma
cidade sozinha, mas se estabeleceram em grande número em todos
os povoados». Plínio, o Velho, fixa a sede deles

«ao lado oeste do Mar Morto». Filo acrescenta: «vivem em muitas


cidades da Judeia e em muitas vilas, e se reúnem em grandes
sociedades de muitos membros». Este autor também parece fazer
do ponto de vista

Colossenses (William Hendriksen)

33

dos essênios com relação ao casamento, um trampolim para sua


própria maneira não agradável de estimar a mulher: «Nenhum
essênio toma uma esposa, porque a mulher é uma criatura egoísta,
excessivamente zelosa e hábil para corromper a moral de seu
esposo e seduzi-lo por suas contínuas imposturas», etc. Seja como
for, é claro que a influência essênia poderia ter chegado até
Colossos. Já dissemos que muitos judeus viviam nessa região
particular.
Agora, uma vez que a seita de Qumran, que nos proveu com os
manuscritos do Mar Morto, mostra muitas destas mesmas
características (e tinha sua sede nessa mesma localidade), muitos
hoje têm a convicção de que a seita de Qumran deve ser identificada
com os essênios. Seu Manual de disciplina é provavelmente nossa
melhor fonte de informação sobre eles. Ao lê-lo não se pode evitar o
perguntar-se se talvez a advertência de Paulo “Se tiverem morrido
com Cristo aos rudimentos do mundo, por que, como se (ainda)
estivésseis vivendo no mundo, submetei-vos a preceitos: Não
toques, não proves, não manuseies”, era sua resposta às repetidas
admoestações deste Manual na forma de: «o tal não tocará», e «o tal
não provará».

Nisto devemos fazer uma cuidadosa diferença entre o ensino real do


Novo Testamento, por um lado, e as ideias e crenças que estavam
em voga (as quais reflete e contra as quais reage), por outro. Quanto
ao ensino, o Novo Testamento é, naturalmente, inteiramente único no
sentido de que «Jesus Cristo falou como nenhum outro homem, pela
simples razão que ele era diferente de qualquer homem», como E. J.

Young declarou em seu admirável artigo: “The Teacher of

Righteousness and Jesus Christ”, WTJ, vol. XVIII, No. 2 (maio,


1956), p. 145. Mas quanto aos erros que o Novo Testamento
combate, não existe nenhuma razão fundamental pela qual estes
não incluam o ascetismo dos essênios. No entanto, isto não significa
que estamos seguros que o apóstolo Paulo, ao escrever
Colossenses, estava combatendo um partido essênio, aqueles que
pretendiam ter sido convertidos a Cristo. Conhecemos muito pouco a
respeito das condições

Colossenses (William Hendriksen)

34

que prevaleciam durante o primeiro século d.C na Ásia Menor, para


fazer uma conclusão tão ousada. Eu concordo com a afirmação de
Millar Burrows: «O que os manuscritos do Mar Morto
verdadeiramente mostram foi resumido por Albright: eles mostram
que os escritores do Novo Testamento ‘compartilharam de uma
comum reserva de

terminologia e ideias bem conhecidas os essênios e’ — isto o


enfatizaria eu — ‘provavelmente familiares também a outras seitas
judaicas da época’» ( More Light on the Dead Sea Scrolls, p. 132).
No entanto, podemos afirmar que as fontes disponíveis nos dão um
quadro tal do sincretismo religioso nos dias de Paulo, que o erro que
este combate em Colossenses já não parece mais uma coisa
estranha. Cf. sobre Cl 2:8, 18, 21; 3:18, nota 76; e C.N.T. sobre 1Tm
4:3. O ponto principal que devemos levar em conta é que os errados,
por colocar muita atenção nos remédios de origem humana para não
recair no paganismo, realmente estavam negando a completa
suficiência de Cristo para a salvação.

Agora, a fim de combater este duplo perigo (o perigo de recair no


paganismo com sua grosseira sensualidade, e o de aceitar uma
solução errada), Paulo escreveu sua Epístola aos Colossenses. Uma
explicação mais detalhada do propósito desta epístola encontra-se
na próxima seção (IV).

Aquele que levou a carta ao seu destino foi Tíquico, a quem já


mencionamos. Ele foi acompanhado por Onésimo, o escravo
convertido que estava voltando ao seu senhor Filemom (Cl 4:7–9).
Eles também levavam a carta a Filemom a respeito de Onésimo (Fm
10–17), e a carta que nos foi transmitida como “A Epístola de Paulo
aos Efésios” (Ef 6:21, 22); mas cf. Cl 4:16.

C. Seu posterior

Paulo foi posto em liberdade de seu primeiro encarceramento em


Roma, o encarceramento durante o qual escreveu Colossenses,
Filemom, Efésios, e Filipenses. Para a prova desta libertação veja-se
C.N.T. acerca

Colossenses (William Hendriksen)


35

de 1 e 2 Timóteo e Tito, pp. 31–36. Tendo recuperado sua liberdade,


provavelmente viajou a Éfeso e daí a Colossos, tal como tinha
proposto (Fm 22). Não nos foi revelado o que aconteceu em sua
visita aos colossenses. Deve ter voltado a Éfeso pouco depois. Pelo
que toca às suas demais viagens, só há conjeturas com relação à
sua sequência; veja-se C.N.T. 1 e 2 Timóteo e Tito, pp. 48–50.

Quanto à congregação em Colossos, sua história subsequente é


desconhecida. Pareceria que o decaimento gradual da igreja foi ao
mesmo tempo com o da cidade. Por um tempo a igreja teve bispos
próprios. Não obstante, quando a população se mudou a Honaz, a
sede episcopal seguiu a população, até que por último, com a vinda
da conquista turca «o candelabro de ouro foi removido para sempre
da Eterna Presença» (J.B. Lightfoot, op.cit. , p. 72).

IV. O PROPÓSITO DE PAULO AO ESCREVER COLOSSENSES E

FILEMOM

A. Colossenses

Um dia durante seu primeiro encarceramento em Roma, Paulo


recebeu a visita do “ministro de Colossos, Epafras (já discutido
anteriormente). Este informou ao apóstolo sobre a condição da
igreja. O

relatório era, em sua maior parte, favorável: havia fé, amor e


esperança.

O evangelho estava produzindo abundante fruto (Cl 1:1–6; 2:5). No


entanto, sempre havia o perigo de cair outra vez nos primeiros
hábitos grosseiramente pecaminosos. Além disso, nesse mesmo
momento falsos mestres estavam procurando enganar a igreja
oferecendo uma solução que em nenhum sentido era uma solução,
mas antes, pioraria o assunto (“A heresia colossense” que já
descrevemos). Portanto, devia ser escrita uma carta, para que a
igreja não se afastasse do ensino puro de seu fiel pastor.
Colossenses (William Hendriksen)

36

Em conformidade com estes antecedentes, o propósito desta carta


foi como se segue:

1. Prevenir os colossenses de não voltar a cair em seu primeiro


estado com todos os vícios que destroem a alma (Cl 1:21, 23; 3:5–
11), e da “solução” que lhes procuravam introduzir os que se
recusavam a reconhecer a Jesus Cristo como o completo e suficiente
Salvador (Capítulo 2).

2. Dirigir a atenção deles “ao Filho do amor de Deus”, de tal forma


que eles pudessem confiar nEle, amá-Lo e adorá-Lo como a própria
imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, a cabeça
da igreja, Aquele que em todas as coisas é preeminente, e em quem
(e nEle somente) os crentes podem alcançar sua plenitude (Cl 1:13–
18; 2:8, 9).

3. Realçar entre eles o prestígio de seu fiel ministro, Epafras (Cl 1:7;
4:12, 13), quem, embora agora estivesse com Paulo em Roma, unia-
se a outros para enviar saudações, e sempre lutava em oração por
eles, e estava cheio de uma preocupação muito profunda por eles.

À vista do fato de que Tíquico fosse o portador da Epístola aos


Colossenses e também da carta dirigida a Filemom, um membro da
igreja de Colossos e proprietário do escravo Onésimo (quem estava
sendo devolvido ao seu senhor), devemos acrescentar um quarto
ponto aos três que já mencionamos, ou seja:

4. Enfatizar entre os colossenses a virtude do perdão e da bondade.

A expressão de John Knox não é muito forte: «O conteúdo total da


Epístola aos Colossenses está mais ou menos dominado pelo
interesse de Paulo em Onésimo» ( Philemon among the Letters of
Paul, p. 35). Isto poderia justificar, pelo menos em parte, o fato de
que o apóstolo escreva detalhadamente sobre a importância de
mostrar afeto de coração (Cl 3:12–14) e também o fato de que
empregue considerável espaço para a relação entre escravos e
senhores (Cl 3:22–4:1, cinco versículos, quatro dos quais são muitos
longos), enquanto fala pouco sobre a relação entre esposos e
esposas, e sobre a relação entre filhos e pais (Cl 3:18–21, todos

Colossenses (William Hendriksen)

37

juntos são só quatro versículos curtos; em contraste com Ef 5:22–


6:4, dezesseis versículos).

B. Filemom

1. Uma teoria que se separa do tradicional.

O ponto quatro da seção precedente mostra a íntima relação que há


entre Colossenses e Filemom. Portanto, quando Herman Baker, o
publicador deste Comentário do Novo Testamento, sugeriu que
Colossenses e Filemom sejam tratados num só volume, seu
conselho foi excelente. Estas duas cartas, uma escrita à igreja e a
outra escrita principalmente a uma família dessa igreja, não devem
ser separadas.

Grande parte do crédito por ter enfatizado esta verdade deve-se aos
trabalhos de exegetas como Edgar J. Goodspeed e John Knox.

No entanto, isto não significa que concordemos totalmente com a


posição que estes homens tomaram acerca do propósito de
Filemom.

Tendo estudado cuidadosamente seus escritos e os livros e artigos


daqueles que estão de acordo ou em desacordo com eles, 14
convencemo-nos que enquanto devemos estar agradecidos pela luz
que arrojaram sobre a estreita relação entre Colossenses e Filemom,
não podemos aceitar sua reconstrução da história. O que é, quando
muito, meramente provável, às vezes é apresentado como se fosse
totalmente certo; o que é meramente possível, como se fosse
provável; e o que é muito discutível, como se pelo menos fosse
possível. Pelo fato de que há diferenças 14 Veja-se o seguinte: E.J.
Goodspeed, New Solutions for New Testament Problems; The
Meaning of Ephesians; The Key to Ephesians; J. Knox, Philemon
among the Letters of Paul; criticado por C.F.D.

Moule en su valiosa obra, The Epistles of Paul the Apostle to the


Colossians and to Philemon, veja-se especialmente pp. 14–21, J.
Knox procura responder esta crítica na edição revisada (1959) de
seu livro que mencionamos. De Knox é também The Epistle to
Philemon (Introdução e Exegese em The Interpreter’s Bible, vol. XI).
Veja-se além disso: P.N. Harrison, “Onesimus and Philemon”, ATR

XXXII (1950), pp. 286–294. C.L. Mitton, The Epistle to the Ephesians;
The Formation of the Pauline Corpus of Letters; Heinrich Greeven,
“Prüfung der Thesen von J. Knox zum Philemonbrief”, TZ, 79

(1954), pp. 373–378. Mais antigos são: E.R. Goodenough, “Paul and
Onesimus” HTR, 22 (1929), pp.

181–183; e Albert E. Barnett, The New Testament: Its Making and


Meaning, pp. 79–92; 184–185.

Colossenses (William Hendriksen)

38

menores entre Knox e Goodspeed, a apresentação que faremos a


seguir (a menos que se indique) é substancialmente a de Knox.

Resumidamente, então, de acordo com seu ponto de vista, o


propósito primário da carta de Paulo a Filemom não é que Onésimo
seja perdoado por sua ofensa por ter fugido de seu senhor e também
por tê-lo defraudado provavelmente, mas antes, este escravo seja
libertado e voltado para Paulo para o serviço do evangelho.

A maneira como Knox reconstrói os eventos pertencentes a

Onésimo, faz com que se convertam numa fascinante história, uma


espécie de novela muito apropriada para a dramatização:
a. Aqui, então, está o escravo, que apesar de levar o nome de
proveitoso (Onésimo) não era de proveito para seu superior. Vivia
com seu dono em Colossos, mas o nome deste último não era
Filemom, mas sim Arquipo ( Philemon among the Letters of Paul, p.
58). Este Arquipo era protetor e membro da igreja de Colossos. Os
membros da igreja juntar-se-iam em sua casa para adorar. Filemom,
embora também se menciona nos primeiros versículos da pequena
carta, vivia em outra parte; veja-se o ponto d.

b. Onésimo, não estando em graça com seu senhor, poderia ter


fugido, embora isto não se expresse com tantas palavras. E deve ter
visitado Paulo no lugar de seu encarceramento, embora isto
tampouco se especifica claramente. Seja como for, Paulo estava na
prisão, talvez em Éfeso (p. 33), não muito longe de Colossos.

c. Através do ministério de Paulo o escravo chegou a ser cristão.

Aquele que uma vez era inútil chegou a ser muito útil. Na verdade,
chegou a ser uma ajuda tão boa que o apóstolo teria gostado de
retê-lo junto a ele, e isto não por razões pessoais, mas pela obra
evangelística.

Contudo, depois de uma devida consideração do assunto, Paulo


decidiu devolver o escravo ao seu dono, Arquipo, com o propósito de
que este pudesse por sua própria vontade emancipá-lo e devolvê-lo
a Paulo para a obra do reino (p. 29).

Colossenses (William Hendriksen)

39

d. Mas, consentirá Arquipo em libertar seu escravo? Se Onésimo


realmente extorquiu ao seu senhor, não seria porventura
severamente castigado? Mas Paulo encontrou uma solução. O
escravo seria enviado na companhia do fiel Tíquico. Nas mãos de
Tíquico também estaria uma carta a favor do escravo. O corpo da
carta se dirige a Arquipo (p. 62).
Agora, com o propósito de acrescentar mais peso à sua petição, o
apóstolo se esforça para conseguir que outros apoiem sua petição.
Não estava Laodiceia muito perto de Colossos? E as igrejas do vale
do Lico, acaso não tinham buscada liderança num homem (ou seja,
Filemom) que tinha sua sede em Laodiceia (p. 70)? Portanto, que
Filemom leia a carta, e que dê seu apoio à petição de Paulo. E que
então a carta, com esse respaldo, seja lida à igreja de Colossos.
Tendo chegado a Colossos, via Laodiceia, pode bem ser designada
agora como “a carta a Laodiceia”.

Em sua Epístola aos Colossenses (Cl 4:16), o apóstolo pede que


esta pequena carta, que tem que ver com Onésimo, seja lida aos
colossenses.

Knox afirma: «Em minha opinião há uma probabilidade, que se


aproxima a uma segurança, de que esta carta (a “de Laodiceia”) era
nosso Filemom» (p. 45).

e. Em Cl 4:17, Paulo afirma: “Dizei a Arquipo: ‘Olha que cumpra o


ministério que recebeste”. Este “ministério” é a missão de libertar a
Onésimo e enviá-lo de volta a Paulo para uma atividade
evangelística.

A carta que nós chamamos Filemom é, então, «uma carta a um


indivíduo, com o desejo de que sua leitura seja ouvida pelo grupo ao
qual pertencia Arquipo e que era capaz de exercer algum controle
sobre sua conduta» (p. 60).

O plano dá resultado. O escravo viaja a Laodiceia na companhia de


Tíquico. Ali Filemom apoia a petição de Paulo. Finalmente, o escravo
e a carta chegam a Colossos. A igreja apoia a demanda cristã de
Paulo sobre um de seus membros (p. 53). Deste modo, Onésimo
volta a Paulo.

f. E aqui vem o aspecto mais interessante de todos. Paulo usa


Onésimo como o tinha planejado. E, eis aqui! aquele que uma vez foi
um escravo, depois de um tempo chega a ser nada menos que o
bispo da
Colossenses (William Hendriksen)

40

igreja de Éfeso! Inácio, bispo da igreja de Antioquia da Síria, em seu


caminho para Roma e ao martírio, detém-se em Esmirna, na Ásia
Menor.

Escreve uma carta aos efésios, na qual expressa sua gratidão pela
visita de Onésimo e outros. Naquela carta diz: «Pelo fato de que
então, no nome de Deus, recebi toda vossa congregação na pessoa
de Onésimo, um homem de um amor inexprimível e vosso bispo, eu
vos suplico em Jesus Cristo para amar a ele e a todos os que estão
como ele. Porque bendito é Aquele que vos permitiu a honra de
receber tal bispo” (Efésios I,1; cf.

VIII, 2).

O clímax deste bordado exegético é a sugestão de que depois da


morte de Paulo, o Bispo Onésimo, o ex-escravo que estava tão
profundamente endividado com o apóstolo, fez uma coleção das
epístolas paulinas; quer dizer, a publicação do corpo das cartas de
Paulo foi feita sob sua direção (p. 107). Goodspeed se inclina à
conclusão de que o próprio Filemom escreveu Efésios como uma
carta anexa ou acompanhante ( The Key to Ephesians, xvi). Knox
parece apoiar esta posição (p. 96). Mas a discussão desta teoria não
pertence aqui, mas ao comentário sobre Efésios.

2. Crítica.

A seguir os parágrafos a.b., etc. respondem respectivamente os


parágrafos a.b., etc., acima.

a. A interpretação mais natural de Fm 1 e 2, é a que considera


Filemom, Áfia e Arquipo como membros de uma e a mesma família,
juntamente com o escravo Onésimo. Eles viviam em Colossos (Cl
4:9).
Além disso, o dono do escravo não era Arquipo, e sim Filemom, a
pessoa à quem Paulo se dirige em primeiro lugar e ao longo de toda
a carta.

b. Com toda probabilidade, Paulo estava em Roma, não em Éfeso,


quando escreveu Colossenses e Filemom. Veja-se o ponto V deste

comentário. Cf. C.N.T. sobre Filipenses, ponto V da Introdução.

Colossenses (William Hendriksen)

41

c. No versículo 14 o apóstolo não já está pedindo que Onésimo lhe


seja devolvido. Em vez disso, o versículo seguinte (v. 15b) parece
implicar que Onésimo permanecerá na companhia de Filemom (“para
que o recebesse para sempre”), o qual já não deve, porém,
considerá-lo mais como um escravo, e sim como um irmão amado (v.
16). Além disso, Paulo, que tem sua mente posta em deixar o lugar
de seu encarceramento e que desde já está pedindo que lhe
preparem alojamento para quando chegar (Fm 22), quase não
pediria que Onésimo lhe seja devolvido.

d. Cl 4:16, embora admitidamente difícil, parece referir-se a um


intercâmbio de cartas dirigidas às igrejas (veja-se o comentário sobre
esse versículo).

e. Certamente é muito mais natural interpretar as palavras, “Olha que


cumpras o ministério que recebeste no Senhor” (Cl 4:17), como
referindo-se ao dever que tinha Arquipo de levar a cabo uma missão
espiritual, que referindo-se à sua obrigação de libertar um escravo,
até se fosse para um trabalho evangelístico. Veja-se o comentário
sobre este versículo.

f. Se depois de meio século Inácio realmente esteve fazendo


referência a um ex-escravo em sua carta aos efésios, a favor do qual
Paulo fizesse sua maravilhosa súplica, teria sido natural que tivesse
feito uma clara referência a esta carta prévia do grande apóstolo;
assim como, por exemplo, Policarpo, que, escrevendo aos filipenses,
claramente lhes lembra da carta anterior de Paulo. O fato de que
Inácio tenha lido a carta de Paulo a Filemom e que ao mesmo tempo
inclua evidências disso em sua Epístola aos Efésios, de maneira
nenhuma prova que o bispo Onésimo era o ex-escravo.

Assim foi demonstrado que a teoria do Knox, embora valiosa quanto


a que se mostra a íntima relação que há entre Colossenses e
Filemom, no entanto carece de provas como uma reconstrução
histórica dos fatos. Nenhum dano foi feito ao ponto de vista
tradicional.

Colossenses (William Hendriksen)

42

3. O verdadeiro propósito da carta de Paulo a Filemom.

O verdadeiro pano de fundo, portanto, é como segue: Filemom era


um dos pilares da igreja de Colossos. Ele amava ao Senhor e aos
irmãos, e tinha dado evidência sólida deste fato vez após vez (Fm 7).
Era o filho espiritual de Paulo, porque, tenha sido direta ou
indiretamente (veja-se sobre Fm 19), Deus tinha usado a Paulo para
mudá-lo. Sua nova vida não só tinha afetado a ele, mas também à
sua família. É provável que Áfia fosse sua esposa, e Arquipo seu
filho. Os amigos que haviam aceito ao Senhor reuniam-se
regularmente em sua casa para o culto (Fm 2). Na ausência de
Epafras, é provável que Arquipo estivesse a cargo do serviço (Cl
4:17). Ele pode ter sido um homem jovem, que, bem como Timóteo,
precisava ser animado (cf. 1Tm 4:12).

Ora, Onésimo era um dos escravos da família de Filemom. Este


escravo tinha fugido, viajando sempre para Roma. Em Roma teve
contato com Paulo. E assim como o Senhor abençoou anteriormente
a obra deste grande missionário no coração do senhor, assim
também agora a abençoou no coração do escravo. Tão querido
chegou a ser este último para o apóstolo, que Paulo o chama “meu
filho, a quem gerei em minhas prisões” (Fm 10), “meu próprio
coração” (Fm 12), “um irmão amado especialmente para mim, mas
quanto mais para ti, tanto na carne como no Senhor” (v. 16), “o fiel e
amado irmão” (Cl 4:9). Com gosto de Paulo teria retido Onésimo ao
seu lado como seu assistente, uma vez que por fim seu caráter
andava em conformidade com seu nome. Neste contexto, veja-se Fp
11, e note-se o jogo de palavras baseado num sinônimo do nome
deste escravo:

“Onésimo, quem anteriormente te fora inútil, mas que agora é útil


tanto a ti como a mim”. Compare-se também o versículo 20 no
original.

Mas Paulo não considerou correto reter Onésimo em Roma. Assim


que decidiu enviá-lo de volta ao seu senhor com uma súplica
redigida cuidadosa e cortesmente, para que este o aceitasse como a
um que já não é mais um mero escravo, mas agora é um irmão
amado. E se em algo tinha defraudado ao seu senhor, Paulo estava
disposto a assumir

Colossenses (William Hendriksen)

43

plenamente a responsabilidade do pagamento da dívida. Com um


tato insuperável, o grande apóstolo acrescenta: “por não dizer que tu
me deves teu próprio ser, além disso”. v. 19.

Paulo não o ordena, embora, como ele mesmo afirma, tem o direito
de fazê-lo, em vez disso, apela ao coração de Filemom (v. 9). Ele
está totalmente confiante de que este último fará “ainda mais do que
lhe foi pedido (v. 21). O apóstolo abriga esperanças de ser libertado
de seu presente encarceramento e confia em que Filemom lhe
“preparará um quarto de hóspedes” (v. 22).

É desnecessário dizer que embora esta epístola totalmente


inspirada, não condene em tantas palavras a instituição da
escravidão, contudo dirige um golpe ao seu espírito e transforma o
escravo num amado irmão.
Portanto, o propósito de Paulo ao escrever Filemom pode resumir-se
como segue:

1. Assegurar o perdão para Onésimo.

2. Dirigir um golpe à escravidão em seu próprio coração, pedindo


com muito tato que, em harmonia com a regra de Cristo, o amor seja
mostrado a todos, incluindo os escravos.

3. Prover para si mesmo um lugar de alojamento para depois de sair


livre de seu encarceramento.

V. LUGAR E TEMPO EM QUE FORAM ESCRITAS COLOSSENSES


E

FILEMOM

Colossenses e Filemom, bem como Efésios e Filipenses, são


epístolas escritas na prisão.

O lugar de origem e, em geral, a data de uma determina a data das


quatro. Veja-se a detalhada discussão no C.N.T. sobre Filipenses,
seção V da Introdução.

Colossenses (William Hendriksen)

44

Colossenses, Filemom e Efésios são enviadas ao seu destino por


Tíquico e Onésimo, todas num só viagem (cf. Cl 4:7–9, Fm 10–12 e
Ef 6:21, 22).

Quanto à condição em que se achava Paulo, ele estava na prisão (Cl


1:24; 4:3, 10, 18; Fm 1, 9, 23). Em adição a Onésimo, outros nomes
são mencionados, tanto em Colossenses como em Filemom. Estes
são os companheiros de Paulo: Lucas, Aristarco, Marcos, Epafras e
Demas (Cl 4:10–14; Fm 23, 24); Timóteo também é mencionado
junto com Paulo no primeiro versículo de ambas as epístolas. Jesus,
chamado o Justo, também está com Paulo (Cl 4:11), mas não é
mencionado em Filemom.

Paulo desfruta de certa liberdade para pregar o evangelho (Cl 4:3, 4).

Tem a esperança de ser posto em liberdade (Fm 22).

Em tudo isso não há nada que contradiga o ponto de vista

tradicional da origem romana destas cartas. A relativa liberdade da


qual Paulo desfruta, harmoniza com o relato de sua situação em
Roma (At 28:30, 31), mas não com a de seu encarceramento em
Cesareia (At 24–

26). A presença de Lucas é inexplicável se estas epístolas foram


enviadas de uma prisão em Éfeso, porque Lucas, em vez disso, nos
transmitiu uma narração detalhada do ministério de Paulo naquela
cidade (At 19), mas não menciona nada a respeito de algum
encarceramento nesse lugar, e, de fato, não se encontrava com
Paulo nessa ocasião. Mas Lucas definitivamente viajou com Paulo a
Roma (At 27:1; 28:16). E

assim também o fez Aristarco (At 27:2). Além disso, se Roma for o
lugar do encarceramento de Paulo quando foram escritas as
Epístolas aos Colossenses e a Filemom, então, em vista de 1Pe
5:13, a presença de Marcos se entende facilmente, porque Marcos
parece ter estado nesta

“Babilônia” pouco depois.

Colossenses (William Hendriksen)

45

E com relação ao tempo, tudo aponta a uma data dentro do período


61–63 d.C., talvez em algum lugar em ou perto da metade deste
período, pelo menos antes de ter sido escrita Filipenses. 15

VI. PATERNIDADE LITERÁRIA DE COLOSSENSES E FILEMOM16


A. Colossenses

Tem-se esgrimido principalmente três argumentos contra a

paternidade literária paulina referente a Colossenses. Já foi


demonstrado por muitos comentaristas que os três são respondidos
facilmente quando os fatos são examinados.

As “objeções”, 17 então, são como segue: (1) A linguagem e o estilo


demonstram que Paulo não pôde ter sido o escritor.

15 Veja-se C.N.T. sobre Filipenses, seção V da Introdução; e para


uma discussão de toda a cronologia paulina, veja-se W. Hendriksen,
Bible Survey, pp. 62–64, 70.

16 Veja-se a detalhada discussão na importante obra de Ernst Percy,


Die Probleme der Kolosser-und Epheserbriefe, 1946.

17 E. Th. Mayerhoff inicia o ataque. Veja-se sua obra, Der Brief an


die Colosser mit vornehmlicher Berücksichtigung der drei
Pastoralbriefe kritisch geprüft. Este autor considera que Colossenses
é uma imitação de Efésios, uma epístola que considera pertencente
a Paulo. F. C. Baur e seus seguidores, a escola Tubinga posterior,
negam a autenticidade de todas as cartas que levam o nome de
Paulo, com a exceção de Gálatas, 1 e 2 Coríntios, e a maior parte de
Romanos. Mas a negação de Baur está viciada pelos pressupostos
hegelianos sobre os quais descansa. Para Baur o que determina
tudo é se uma epístola se caracteriza ou não por uma linha de
argumentação anti-judaizante. Desta maneira canaliza todo o
pensamento de Paulo numa só direção. Isto é manifestamente
injusto. H. J. Holztmann, em sua obra Kritik der Epheser-und
Kolosserbriefe, considera a carta que nos chegou com o nome de
Colossenses como se na verdade a autêntica Colossenses fosse
uma carta originalmente mais curta, à qual foram acrescentadas
algumas interpolações de Efésios, trabalho que foi feito por um
paulinista que no processo de redação pôde ter usado a
Colossenses original e genuína. Na verdade, A. S. Peake tem toda a
razão, quando afirma: “A complexidade desta hipótese fala
fatalmente contra ela mesma”

( Critical Introduction to the New Testament, p. 52). Um autor mais


recente que encontra um núcleo genuíno na Colossenses que
possuímos é Charles Masson, L’Epitre de Saint Paul aux Colossiens
(en Commentaire du Nouveau Testament X, 1950, pp. 83ss).

Colossenses (William Hendriksen)

46

a. Palavras usadas e palavras omitidas.

Colossenses contém trinta e quatro palavras que não se acham em


nenhuma outra parte do Novo Testamento e várias palavras
adicionais que não aparecem em nenhuma outra epístola de Paulo.
Por outro lado, palavras comuns a Paulo, tais como justiça
(δικαιοσύνη), salvação (σωτηρία), revelação (_ποκάλυψις) e ab-rogar
(καταργείν), não se encontram em Colossenses.

Resposta: A percentagem de tais palavras excepcionais, achadas


em Colossenses, mas em nenhuma outra parte, é comparável ao de
outras epístolas, por exemplo, Romanos (numa seção de tamanho
semelhante) e Filipenses. Um tema diferente requer palavras
diferentes. Portanto, muitas destas palavras encontram-se em
Colossenses 1 e 2, onde o escritor combate uma heresia única; veja-
se especialmente Cl 2:16–23. 18

Isto também explica o fato de que outras palavras, usadas em outras


epístolas, discutindo outros temas, não se encontram aqui.

Por que deveriam estar? Percy tem toda a razão quando afirma:

«Portanto pode afirmar-se certamente que do aspecto lexicográfico,


nenhum argumento sério pode apresentar-se contra o caráter
genuíno desta epístola» ( op. cit. , p. 18).

b. Características estilísticas.
Colossenses contém cadeias de cláusulas quase intermináveis. De
modo que o capítulo 1 só contém cinco orações no original, e uma
delas (vv. 9–20) é uma cláusula de 218 palavras.

Além disso, esta carta amontoa sinônimos: orar e pedir (Cl 1:9),
paciência e longanimidade (Cl 1:11), santos, sem mancha e
irrepreensíveis (Cl 1:22), fundados e firmes (ou “cimentados e
inamovíveis” Cl 1:23), séculos e gerações (Cl 1:26), arraigados,
edificados e estabelecidos (Cl 2:7).

18 E algumas destas palavras provavelmente foram tomadas da


terminologia técnica dos falsos mestres.

Colossenses (William Hendriksen)

47

Novamente, é rica em cláusulas em aposto, tais como: “o Pai … que


nos resgatou … e trasladou ao reino do Filho do seu amor, em quem
temos nossa redenção (Cl 1:12–14) … quem é a imagem do Deus
invisível”, etc. (Cl 1:15–20).

E, finalmente, certas partículas que ocorrem frequentemente nas


epístolas que verdadeiramente pertencem a Paulo (γάρ, ο_ν, διότι,
_ρα, διό) raramente são usadas aqui ou não aparecem nunca em
Colossenses.

Resposta: Deve admitir-se francamente que algumas destas

características de estilo se acham em Colossenses num grau


superior que em qualquer outro lugar das epístolas de Paulo. Não
obstante, a diferença de maneira nenhuma é terminante, como o
indicará o seguinte: Orações extensas encontram-se também em
outras epístolas

paulinas. Por exemplo, Rm 1:1–7 tem 93 palavras no original; 2:5–10

tem 87; e Fp 3:8–11 tem 78.


Os sinônimos aumentam em Romanos; veja-se Rm 1:18, 21, 25, 29,
etc. Também ocorre o mesmo em outras epístolas; por exemplo, em
Filipenses: pleno conhecimento e discernimento agudo (Fp 1:9),
puros e irrepreensíveis (Fp 1:10), glória e louvor (Fp 1:11), inveja e
rivalidade (Fp 1:15), ardente anelo e esperança (Cl 1:20), e assim
poderíamos continuar facilmente.

As cláusulas em aposto, particularmente aquelas que descrevem a


deidade, com frequência são de uma natureza litúrgica. Encontram-
se frequentemente em hinos antigos de louvores ao Senhor, Deus,
Cristo, em breves confissões de fé e em doxologias. Paulo tem
muitas delas, bem como os profetas. E aumentam nas liturgias das
sinagogas, até hoje.

Quando os crentes (quer de forma individual ou coletiva) são cheios


de gratidão a Deus, expressarão humilde e entusiastamente este
sentimento de gratidão e adoração, descrevendo em cláusula após
cláusula a grandeza, fidelidade, sabedoria e amor de Deus.
Porventura Romanos não começa com esse testemunho, cheio de
alegria explosiva (Rm 1:3–

5)? Acrescentamos os seguintes como alguns dos exemplos mais


evidentes: 2Co 1:3–4; 1Tm 3:16; e logo voltando ao Antigo
Testamento:

Colossenses (William Hendriksen)

48

Is 44:24–28; Sl 103:2–5; 104:2–5; 136. Além disso, Cl 1:15–20, com


suas cláusulas em aposto, poderia ser um hino que Paulo está
citando.

Veja-se sobre essa passagem.

E finalmente, no que se refere a essas partículas, o argumento


baseado nelas tem muito pouco valor, se tiver alguém, _ρα não
aparece nem uma vez em Filipenses; διό só uma vez em Gálatas;
διότι só uma vez na longa Epístola de Paulo aos Coríntios, nem uma
vez em 2

Coríntios; de modo que só uma vez aparece nos trinta e nove


capítulos que possuímos da correspondência de Paulo aos coríntios!
Portanto, um argumento que busque a rejeição de Colossenses
como uma genuína epístola de Paulo, não tem muito apoio se o
baseamos no fato de que nos quatro capítulos dessa carta não se
encontra διότι. E o número relativamente limitado de ο_ν em
Colossenses, em contraste com sua frequente repetição em
Romanos e em 1 Coríntios, é fácil de explicar. O

assunto surge do fato de que nestas epístolas de data mais antiga, o


apóstolo está argumentando com aqueles a quem se dirige,
enquanto em Colossenses está prevenindo contra a heresia.

Um dos mais recentes opositores da paternidade literária de Paulo


com relação a Colossenses (e de todas as epístolas que a tradição
atribui a Paulo, com exceção de Gálatas, Romanos, 1 e 2 Coríntios)
é Andrew Morton. Ele baseia seu “argumento” sobre o uso que Paulo
faz da conjunção kai, a qual significa: e, também, até, etc. Com a
ajuda de um computador sentiu-se confirmado em sua intuição que
um autor mostrará uma norma consequente no uso desta conjunção.
Portanto, dando por sentado que Paulo é o escritor de Gálatas, etc.,
e que este fato está muito além de toda discussão, mas que a
distribuição que encontramos em Colossenses com relação ao uso
de kai é diferente ao usado em Gálatas, etc., provaria, então, que a
tradição está num erro ao considerar Paulo como o escritor de
Colossenses.

Agora, se Morton pudesse provar que todo autor grego, não importa
em que sentido empregue a conjunção kai (quer use no sentido de e,
também, até ou em algum sentido adversativo como e contudo, no

Colossenses (William Hendriksen)

49
entanto), não importa qual seja o conteúdo ou natureza de sua
composição (seja narrativa, descritiva, didática, oratória ou
doxológica), não importa quando, por que, ou a quem escreva, e sem
levar em conta a quem use como seu secretário e quanta liberdade
dê ao seu secretário no uso de kai, revela uma norma consequente
em seu uso desta conjunção, então seu argumento teria algum valor.
Tal como está, baseia muito em muito pouco. Por conseguinte,
William Toedtman diz algo certo em sua crítica:

“Portanto, as kais são as figuras menos dignas de confiança para


colocá-las num computador” ( Time, março 29, 1963, p. 8).

Portanto, quando todos os fatos são examinados, fica claro que nada
que está na linguagem ou estilo de Colossenses pode ser usado
como um argumento contra sua autenticidade.

(2) A heresia que aqui se combate é a do gnosticismo do segundo


século. Portanto, o Paulo do primeiro século não pôde ter sido seu
escritor.

O uso de palavras como plenitude (πλήρωμα, Cl 1:19; 2:9), mistério


(μυστήριον, Cl 1:26, 27; 2:2; 4:3), idades (α__νες, Cl. 1:26),
sabedoria (σοφία, Cl 1:9, 28; 2:3, 23; 3:16; 4:5) e conhecimento
(γν_σις, Cl 2:3), como também a ideia de toda uma série de anjos (Cl
1:16; 2:10; 2:15) apontam à heresia de Valentim.

Para uma detalhada explicação destes termos, veja-se o comentário.

Resposta: Só basta afirmar que o gnosticismo do segundo século


não considerou Colossenses como uma epístola dirigida contra suas
crenças. De fato, fazem muito uso dela. Além disso, vai aumentando
a evidência que indica que formas incipientes de gnosticismo já
estavam presentes no primeiro século. 19

19 Veja-se J. M. Bulman, “Valentinus and his School”, no S.H.E.R.K.


(extensão do século XX), pp.

1146, 1147, e a literatura que ali se menciona; cf. F. L. Cross (editor),


The Jung Codex: A Newly Discovered Gnostic Papyrus. Para um
breve resumo do gnosticismo do segundo e terceiro século, veja-se o
artigo de A. M. Renwick, “Gnosticism” no Baker’s Dictionary of
Theology, pp. 237–238.

Colossenses (William Hendriksen)

50

(3) A «elevada cristologia» que encontramos em Colossenses não é


paulina. Antes, lembra-nos a doutrina do Logos no Evangelho
segundo João.

Resposta: É totalmente certo que em nenhuma das epístolas que a


igreja reconhece como tendo sido escritas por Paulo, encontramos a
doutrina da preeminência de Cristo e sua relação com o Pai, o
universo, os anjos e a igreja de uma forma tão ampla como a que
vemos em Colossenses. Mas, não é totalmente provável que esta
ênfase na singularidade de Cristo, sua supremacia sobretudo, surge
da negação expressa ou implícita da mesma da parte dos hereges
de Colossos?

Certamente, a cristologia que encontramos aqui, embora mais


detalhada, não é nenhuma cristologia “mais elevada” que a que
encontramos em outras epístolas escritas por Paulo, tanto as mais
anteriores (Rm 9:5

segundo a leitura correta; 1Co 8:6; 2Co 4:4) como as escritas um


pouco mais tarde (Fp 2:6) e as últimas (1Tm 3:16; Tt 2:13).

Na verdade, os argumentos contra a paternidade literária de Paulo


com relação a Colossenses são, antes, superficiais. Não só a carta
afirma ter sido escrita por Paulo (Cl 1:1; 4:18), mas o caráter de
Paulo, tal como se revela em outras cartas, é aqui claramente
manifesto:

Primeiro, Colossenses é muito semelhante a Efésios. Aquele que


escreveu Efésios também escreveu Colossenses. Não obstante, este
argumento tem pouco valor para aqueles que rejeitam a paternidade
literária paulina de Efésios com muita mais força até que o fazem
com Colossenses. Para evitar repetições e pelo bem da boa ordem,
a relação que existe entre Colossenses e Efésios se reserva para o
comentário sobre Efésios.

Segundo, Colossenses descreve o mesmo tipo de escritor que nos


fala nas páginas das quase universalmente reconhecidas epístolas
paulinas, tais como Romanos, 1 e 2 Coríntios, e Gálatas. Além disso,
devido ao fato de que Filipenses é, como Colossenses, uma carta
escrita na prisão, tem também as mesmas marcas de autenticidade.
Note-se as colunas de comparação nas tábuas dadas a seguir.

Colossenses (William Hendriksen)

51

Portanto, se for aceito que Paulo escreveu Filipenses, como se deve


fazer (veja-se C.N.T. sobre Filipenses, seção VI da Introdução), a
conclusão de que Paulo escreveu também Colossenses parece ser
lógica.

Note-se, pois, o grande parecido na forma de expressão.

Colossenses Romanos 1 e 2 Filipenses Coríntios, Gálatas

1. O escritor está profundamente interessado nos destinatários.

Col.1:3, 9; 2:1

Rm 1:8, 9; 1Co 3:1, 2; 2Co 1:6, 23; Gl 4:19, 20

Fp 1:3–11, 25, 26; 2:25-30

2. Gosta de animá-los e elogiá-los.

Cl 1:4–6; 2:5

Rm 1:8; 15:14; 16:19; 1Co 1:4–7; 2Co 8:7; Gl 4:14, 15; 5:7

Fp 4:1, 15–17
3. Afirma que toda virtude daqueles a quem se dirige procede de
Deus, dando toda a glória a Ele somente.

Cl 1:5, 12, 29

Rm 8:28–30; 1Co 1:4; 12:4–11; 2Co 1:3, 4; 2:14; Gl 5:22–25

Fp 1:6; 3:9; 4:13

4. Escreve de uma forma comovedora sobre a supremacia do amor.

Cl 3:12–17

Rm 12:9–21; 1Co 13; 2Co 5:14; 6:6; 11:11; 12:15; Gl 5:6, 13, 14, 22

Fp 1:9, 16; 2:1, 2

5. Está cheio de gratidão a Deus, que o escolheu e fez dele um


ministro do evangelho, embora não merecesse.

Cl 1:23, 25

1Co 15:9; 2Co 11:16; 12:10; Gl 1:15–17

Fp 3:4–14

Colossenses (William Hendriksen)

52

6. Faz uma lista de virtudes e vícios.

Cl 3:5–9, 12–14

Rm 1:29–32; 1Co 5:9, 10; 6:9, 10; Gl 5:22, 23

Fp 3:2, 19; 4:8

7. Nunca teme afirmar sua autoridade.


Cl 2:1–4:6

Rm 12–16; 1Co 5:13; 16:1; 2Co 13:1–5

Fp 2:12–18; 4:1–9

8. Quando as condições são totalmente favoráveis, agradece a Deus


por aqueles a quem escreve e às vezes lhes assegura que

constantemente intercede por eles.

Cl 1:3–12

Rm 1:8–12 1Co 1:4–9; 2Co 1:3–7

Fp 1:3–11

9. Adverte encarecidamente contra os que buscam desencaminhar a


outros.

Colossenses 2

Rm 16:17, 18; 1Co 1:10–17; 5:1; 6:1; 11; 2Co 13; Gl 1:6–10, etc.

Filipenses 3

10. Ama “o evangelho”.

Cl 1:5–7, 23

Rm 1:16, 17; 2:16 (“meu evangelho”); 1Co 15:1; Gl 1:6–9

Fp 1:5, 7, 12, 16, 27, etc.

Em adição à semelhança que acabamos de mencionar (veja-se as


colunas 1 e 3 na tábua), como terceiro ponto, quero chamar a
atenção ao que vem a seguir:

Os versículos 9–11 do primeiro capítulo de ambas as epístolas


(Colossenses e Filipenses) contêm um resumo da oração que fez
pelos destinatários. Note-se que, apesar de que de maneira
nenhuma as duas orações são as mesmas, no entanto, existe uma
semelhança notável: o escritor ora que seus amigos possam crescer
ou aumentar em graça,

Colossenses (William Hendriksen)

53

possam levar fruto abundantemente, e possam ter cada vez mais o


conhecimento verdadeiro e experimental de Deus.

Pelo que concerne àqueles que foram reconciliados por Cristo, Cl


1:22 mostra que o propósito de Deus é apresentá-los a Si mesmo
sem mancha ( sem nenhuma falta). Fp 2:15 nos indica que esta
qualidade de ser sem mancha, não só depois desta vida, mas
também aqui e agora, deve ser o alvo de todo crente. Um meio
importante para este fim é a palavra ou a mensagem de Deus, como
se vê claramente em Cl 1:25 e Fp 1:14. A perfeição sempre é o alvo
(Cl 1:28; cf. Fp 3:12). O Espírito de Cristo é Aquele que dá o poder
(Cl 1:8; e cf. o v. 29; cf. Fp 1:19 e veja-se 3:21). Quanto a si mesmo,
Paulo está suprindo o que falta das aflições de Cristo (Cl 1:24),
assim como Epafrodito supriu o que faltava no serviço que os
filipenses tinham estado prestando a Paulo (Fp 2:30).

Note-se os sofrimentos ou aflições de Cristo dos quais fala


Colossenses.

Filipenses também fala sobre o desejo do apóstolo de conhecer a


participação de seus padecimentos (Fp 3:10). Naturalmente, se os
colossenses forem produzir abundante fruto deverão apegar-se à
verdade tal como a aprenderam de Epafras (Cl 1:7), exatamente
como os filipenses deverão continuar na verdade tal como a
aprenderam de Paulo (Fp 4:9).

Indo agora ao segundo capítulo de Colossenses, notamos que Paulo


está enfrentando um conflito gigantesco pelos colossenses, etc. (Cl
2:1).
Em Filipenses também se faz menção de um conflito no qual tanto
eles como ele estavam comprometidos (Fp 1:30). A ausência física
de Paulo não impedia sua comunhão espiritual com os colossenses
(Cl 2:5) e tampouco devia impedir que os filipenses permanecessem
firmes (Fp 1:27). Há uma referência à uma espécie de circuncisão
que se eleva acima daquela que é meramente física (Cl 2:11). Isto
nos lembra imediatamente de Fp 3:3. De todas as cartas que
tradicionalmente se atribuíram a Paulo, só nas epístolas que foram
escritas da prisão (Cl 2:18, 23; 3:12; Ef 4:21; Fp 2:3) usa-se uma
palavra (ταπεινοφροσύνη), a qual, dependendo do contexto em cada
caso particular, foi traduzida de

Colossenses (William Hendriksen)

54

diferentes maneiras: pouca estima de si mesmo, humildade,


modéstia (mas a RA sempre traduz humildade). Note-se também o
uso frequente do verbo encher, repletar ou completar (πληρόω). A
palavra aparece no segundo capítulo de Colossenses, versículo 10
(cf. Cl 1:9, 25; 4:17). Isto nos lembra de Fp 1:11; 2:2; 4:18, 19. O
número de vezes que este verbo aparece em Colossenses, Efésios e
Filipenses forma um forte contraste com a pouca frequência com que
aparece em outras epístolas (cf. sobre Cl 1:19, incluindo a nota 56).

A direção para o céu, rumo à qual, segundo Cl 3:1, 2, deve voltar-se


o anelo do coração, sem dúvida está em harmonia com o chamado
para o céu que, segundo Fp 3:14, o crente recebeu. As coisas que
estão sobre a terra (Cl 3:2), coisas que não devem absorver nosso
interesse, estão em harmonia com as coisas terrenas sobre as quais
os inimigos da cruz de Cristo fixam sua atenção (Fp 3:19). O coração
compassivo que se nos exige em Cl 3:12 é semelhante à terna
misericórdia e compaixão mencionada em Fp 2:1. A bela referência
feita à paz de Deus (Cl 3:15) traz à mente a reconfortante passagem
de Fp 4:7.

Por último, pelo que toca a Colossenses 4, a menção das cadeias (Cl
4:18 cf. Fp 1:7, 13, 14, 17; Fm 10, 13), é peculiar às epístolas do
primeiro encarceramento de Paulo em Roma (com a exceção de
uma ocasião em 2Tm 2:9). E o resumo do mandamento “Dizei a
Arquipo: Olha que cumpras o ministério que recebeste no Senhor,
que o leves a cabo” (Cl 4:17) lembra-nos as palavras, similarmente
cortantes: “Rogo a Evódia e rogo a Síntique que sejam do mesmo
sentir no Senhor” (Fp 4:2).

O testemunho da igreja primitiva está em harmonia com a

conclusão que foi derivada da própria epístola.

Deste modo, Eusébio, depois de ter feito uma completa

investigação da literatura ao seu dispor, declara: «No entanto, são


evidentes, e claras as quatorze (cartas) de Paulo. Contudo, não é
justo ignorar que alguns rejeitam a (carta) aos hebreus» ( História
Eclesiástica, III.iii.4, 5). Obviamente, Eusébio, escrevendo no
começo do quarto

Colossenses (William Hendriksen)

55

século, teve conhecimento de que a totalidade da igreja ortodoxa


aceitava Colossenses como uma carta escrita por Paulo.

De Eusébio podemos retroceder até Orígenes (floresceu 210–250),


quem em sua obra Contra Celso, diz: «e nos escritos de Paulo … as
seguintes palavras pode ler-se na Epístola aos Colossenses.
Ninguém vos prive de vosso premio», etc., citando assim Cl 2:18, 19.

Note-se que aqui Paulo é mencionado especificamente como o


escritor desta carta. Orígenes, em suas diversas obras, cita de cada
um dos capítulos de Colossenses. 20

De Orígenes podemos ir ainda mais atrás, ao seu mestre, Clemente


de Alexandria (floresceu 190–220 d.C). Em sua obra Stromata ou
Miscelâneas, mais de uma vez refere-se ou cita de cada capítulo.
Para ele o escritor de Colossenses é “o apóstolo”. Também em seu
Paedagogos ou Instrutor cita Colossenses vez após vez. Perto desse
tempo, Tertuliano (floresceu 193–216 d.C.) cita a advertência contra
a «filosofia e enganos ocos» (Cl 2:8) e atribui esta advertência «ao
apóstolo», a mesma pessoa que chama «o próprio Paulo» (
Prescription Against Heretics, VII, y cf. VI). Além disso, vez após vez
cita de Colossenses as passagens que falam da grandeza de Cristo.
Veja-se especialmente sua obra Contra Marcião.

Irineu era anterior a estes por uns poucos anos, embora por um
longo tempo foi contemporâneo de Clemente de Alexandria e
Tertuliano.

Que ele tinha a Paulo por escritor de Colossenses está claro por
suas próprias palavras: “O próprio Paulo declarou … ‘Só Lucas está
comigo’

… E novamente afirma em sua Epístola aos Colossenses ‘Lucas, o


médico amado, vos saúda’» (Cl 4:14, veja-se Contra Heresias
III.xiv,1).

Nem um só capítulo de Colossenses permanece sem ser citado ou


sem ser aludido nas obras de Irineu. Agora, quando Irineu atribui
Colossenses a Paulo, seu testemunho deve ter muito peso. Ele tinha
viajado 20 Para referências detalhadas de Orígenes e também dos
primeiros escritores, veja-se os índices dos textos de Ante-Nicene
Fathers.

Colossenses (William Hendriksen)

56

extensamente, estava intimamente relacionado com quase a


totalidade da igreja, e vivia num momento e época em que as mais
antigas tradições apostólicas ainda estavam latentes.

O Fragmento Muratoriano (perto 180–200), um estudo dos livros do


Novo Testamento, definitivamente menciona Paulo como o escritor
de Colossenses.
Um pouco antes disto, Teófilo de Antioquia fez uma distinção entre o
Logos interno e o Logos emitido, e chama a este Logos em seu
estado emitido “o primogênito de toda criação” ( A Autólico XXII), o
qual nos traz à mente Colossenses 1:15. Esta frase também aparece
no Diálogo com Trifo LXXXV, de Justino Mártir. Justino Mártir
escreveu em algum tempo entre 155 e 161. 21 A Epístola aos
Colossenses também estava incluída no cânon de Marcião, na
Antiga Latina e na Antiga Siríaca.

Portanto, o testemunho a favor da paternidade literária de Paulo é


esmagador. O testemunho, tanto interno como externo, só permite
uma conclusão, ou seja, que foi Paulo que escreveu Colossenses.

B. Filemom

Pelo fato de que a pequena carta de Filemom está ligada a


Colossenses (Cl 4:10–17; cf. Fm 2, 23, 24), a paternidade literária
paulina da última é um poderoso argumento em favor de uma
idêntica paternidade literária quanto à primeira. Além disso, o escritor
não só se chama a si próprio Paulo, e isto não menos de três vezes
(vs. 1, 9 e 19), mas a petição que apresenta, a qual é o tema central
da carta, é de um caráter tão pessoal e definido que não existe
nenhuma boa razão que possa demonstrar que foi um falsificador
aquele que a escreveu. Além disso, a personalidade de Paulo (a qual
combina aspectos tais como um profundo interesse nos demais,
satisfação de mencionar as boas 21 É muito provável que haja um
eco de Colossenses nos muito antigos escritos da Epístola de
Barnabé e em Inácio, A epístola aos Efésios; mas, para que andar
em busca de prováveis referências, se tantas provas claras já foram
providas?

Colossenses (William Hendriksen)

57

qualidades dos demais, a convicção de que atrás de cada virtude


humana está Deus como doador, uma ênfase em ter um espírito
misericordioso e perdoador) marca esta pequena gema tão
vividamente como o faz com Colossenses.

Portanto, não admira que Eusébio lhe dê um lugar em sua lista dos
livros reconhecidos por todos ( História Eclesiástica III. xxv; cf. III. iii)
e que a considere como uma carta de Paulo “verdadeira, genuína e
reconhecida”. Orígenes também a aceita como uma carta de Paulo (
Homilias sobre Jr 19). Tertuliano a conhecia bem, e por causa de seu
testemunho sabemos que até Marcião a aceitava, embora esse
herege rejeitasse 1 e 2 Timóteo e Tito (Tertuliano, Contra Marcião
V.xxi). É

provável que Inácio tirasse de Paulo seu jogo de palavras com o


nome próprio de Onésimo. (cf. Fm 10, 11, 20 com Inácio, Aos
Efésios, capítulo 2). A carta também se encontra no Fragmento
Muratoriano e nas versões Antiga Latina e Antiga Siríaca.

O fato de que a evidência externa para a carta a Filemom não seja


tão extensiva como o é para algumas outras cartas de Paulo, é fácil
compreender: a petição para que o escravo fugitivo seja recebido
cordialmente é muito breve e contém pouco material que possa ser
usado em controvérsias doutrinárias. Não obstante, desde o próprio
começo seu aceitação foi quase universal. Um ataque que se lhe fez
nos quarto séculos e quinto (com base em que era indigno da mente
de Paulo e de nenhum valor para a edificação) já foi respondido por
Jerônimo ( Comentário sobre Filemom, Prefácio) Crisóstomo ( Tema
de Filemom) e outros. Um ataque muito mais recente pelo F.C. Baur
está em harmonia com sua rejeição da autenticidade da grande
maioria das epístolas que tradicionalmente se atribuem a Paulo
(veja-se a nota 16, acima), e é um resultado de seus preconceitos
filosóficos. Chama a esta pequena carta

“o embrião de um romance cristão”, e se refere ao fato de que quem


tem sido aquele que a escrevesse, usou algumas palavras que o
verdadeiro Paulo nunca usou. Pode-se responder tão facilmente a
seus argumentos que quase não merece comentário. Um autor
chama, sem nenhuma
Colossenses (William Hendriksen)

58

injustiça, a este ataque à paternidade literária paulina de Filemom


“um dos piores disparates do Baur”. Toda esta carta aponta tão
claramente a Paulo, que aqueles que pensam diferente hoje em dia
são uma minoria.

ESBOÇO DE COLOSSENSES

Tema: Cristo, o preeminente, o único e o todo-suficiente Salvador I.


Este único e todo-suficiente Salvador é o objeto da fé dos crentes,
capítulos 1 e 2

A. Esta verdade se expõe de uma forma positiva no capítulo 1

1. Saudação

2. Uma ação de graças e oração fervente

3. A preeminência do Filho

a. Na criação

b. Na redenção

4. O amor reconciliador para os colossenses e o dever que dali se


depreende, ou seja, continuar na fé

5. A participação do apóstolo em pregar “o mistério”, isto é,

“Cristo em vós, a esperança da glória”

B. A verdade se expõe não só positivamente, mas também agora


tanto positiva quanto negativamente, capítulo 2, e em contraste com
a “heresia colossense” com sua:

1. Filosofia ilusória
2. Cerimonialismo judaico

3. Adoração aos anjos

4. Ascetismo

II. Este único e todo-suficiente Salvador é a fonte da vida dos


crentes, e assim a verdadeira resposta aos perigos que enfrentam,
capítulos 3 e 4

A. Esta verdade aplica-se a todos os crentes, Cl 3:1–17

Colossenses (William Hendriksen)

59

1. Os crentes devem ser consequentes. Devem viver em

conformidade com o fato de que foram ressuscitados com

Cristo, quem é a vida deles

2. Portanto, devem “fazer morrer” e “deixar” os antigos vícios; e 3.


Devem “pôr-se” as novas virtudes

B. Esta verdade aplica-se a grupos especiais, Cl 3:18–4:1

1. Às esposas e seus esposos

2. Aos filhos e seus pais

3. Aos servos e seus senhores

C. Ultima admoestações, saudações, etc., Cl 4:2–18

1. Se admoesta a eles a orar

2. Faz-se ênfase numa conduta sábia e de uma forma de falar


decorosa
3. Uma palavra de recomendação para Tíquico e Onésimo,

aqueles que foram enviados com notícias e palavras de alento 4.


Saudações

5. Solicita-se um intercâmbio de cartas

6. Dá-se uma vigorosa indicação a Arquipo

7. Saudação final

Colossenses (William Hendriksen)

60

COLOSSENSES 1

I. Este único e todo-suficiente Salvador é o objeto da fé dos crentes,


capítulos 1 e 2

A. Esta verdade se expõe de uma forma positiva no capítulo 1

1. SAUDAÇÃO - CL 1:1, 2

1. Embora Paulo esteja no mundo e faz uso do mundo, contudo não


pertence ao mundo. Como qualquer escritor de cartas, faz uso do
modelo literário do mundo, mas no processo de tomar esse modelo o
transforma, levantando-o a um nível mais alto. Nos dias de Paulo,
um homem do mundo em geral começaria colocando: a. o nome da
pessoa que escreve, b. o nome da pessoa (ou pessoas) a quem se
dirige, c. palavras de saudação. O apóstolo segue o mesmo método,
mas o embeleza e santifica totalmente ao relacionar imediatamente
tanto o remetente como aos destinatários com Cristo (um apóstolo
de Cristo Jesus”, “irmãos em Cristo”), e ao falar da obra de Cristo
(“graça e paz”) desde o princípio, na saudação.

O apóstolo escreve, Paulo, um apóstolo de Cristo Jesus.


Apresenta-se a si mesmo como sendo, em toda a extensão da
palavra, um representante oficial do Salvador Ungido, como seu
porta-voz. Afirma que seu nomeação e autoridade os deve a Cristo
Jesus. É ninguém menos que o próprio Cristo quem fala com sua
igreja através de Paulo. E Paulo tinha recebido do Senhor
ressuscitado e exaltado a difícil mas gloriosa tarefa de ser um
apóstolo, sim, o apóstolo aos gentios, não exclusiva mas
especialmente a eles (At 9:5, 6, 15, 16; 22:10–21; 26:15–18; Rm 1:1,
5; Gl 1:1; 2:9).

Paulo continua, mediante a vontade de Deus. Ele tinha alcançado


seu alto ofício, não por aspiração (veja-se At 9:11), nem por
usurpação

— assim não era Paulo! — nem tampouco por nominação da parte


de

Colossenses (William Hendriksen)

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outros homens (Gl 1:1, 16, 17), mas por meio de preparação divina
(Gl 1:15, 16), tendo sido afastado e capacitado pela atividade da
vontade soberana de Deus (1Co 1:1; 2Co 1:1; Gl 1:1; Ef 1:1; 2Tm
1:1; cf. Rm 15:32; 2Co 8:5).

Paulo acrescenta, e Timóteo nosso irmão (cf. 2Co 1:1; Fp 1:1; 1Ts
1:1; 2Ts 1:1; Fm 1). Isto não nos deve surpreender, uma vez que
evidentemente Timóteo estava nesse mesmo momento perto de
Paulo e desejava enviar saudações. Além disso, Timóteo tinha
estado algum tempo com Paulo em Éfeso durante sua terceira
viagem missionária (At 19:1, 22), e deste modo poderia ter chegado
a conhecer algumas pessoas de Colossos, que teriam vindo ouvir
Paulo naquele período (At 19:10).

Ao chamar Timóteo “nosso irmão”, Paulo, apesar de que com isso


implica que seu associado mais jovem não era um apóstolo no
sentido pleno da palavra, estava enfatizando a íntima relação que
havia entre ele e seu companheiro. Paulo amava Timóteo profunda e
ternamente (Fp 2:19–23). Paulo, Timóteo e todos os membros da
igreja de Colossos, todos pertenciam à mesma família espiritual. Não
obstante, Paulo, e somente Paulo, deve ser considerado como o
verdadeiro escritor desta carta (note-se as palavras “eu, Paulo” de Cl
1:23; cf. 1:24–2:5; 4:3, 7–

18), e não Paulo e Timóteo.

Paulo continua, aos santos e irmãos fiéis em Cristo que estão em


Colossos. Santos são aqueles que foram separados pelo Senhor
para glorificá-Lo. Eles são os consagrados, e aqui o Israel da nova
dispensação, cuja tarefa é proclamar as virtudes de Deus (1Pe 2:9).
De modo que santos são aquelas pessoas sobre as quais o Senhor
derramou uma graça abundante e a quem encomendou uma grande

responsabilidade. Idealmente, os santos são crentes. Assim também


aqui: a frase “aos santos e fiéis irmãos” (note-se que no grego o
artigo definido os não é repetido diante do segundo substantivo)
comunica uma só ideia, uma vez que os santos que são fiéis a sua
chamada também são, naturalmente, fiéis irmãos crentes, e isto “em
Cristo”, quer dizer, em virtude de sua união com Ele. A adição das
palavras “que estão em

Colossenses (William Hendriksen)

62

Colossos” demonstra que esta carta estava dirigida principalmente a


esta congregação, embora em segundo lugar para a igreja vizinha de
Laodiceia (Cl 4:16), e, na verdade, a toda igreja ao longo de toda
esta dispensação.

A própria saudação é como segue: graça a vós e paz de Deus


nosso Pai. Deste modo está sendo pronunciado sobre todos os
santos e irmãos fiéis em Cristo que estão em Colossos, graça, isto é,
o favor de Deus (espontâneo e imerecido) manifestado em atos, sua
benevolência soberana, eficaz e livremente derramada, e também o
resultado que ela produz, paz, isto é, a certeza da reconciliação
através do sangue da cruz, verdadeira integridade e prosperidade
espirituais; estas duas bênçãos (graça e paz) fluem de Deus nosso
Pai”. Deste modo, a saudação grega

“saúde” ( chairein, cf. At 15:23) e a hebraica “paz” (“shalom”, cf. Jz


19:20) são combinadas, aprofundadas e enriquecidas. A graça (
charis) é aquela da qual se fala em Ef 2:8 - “Porque pela graça fostes
salvos mediante a fé, e isto não é de vós; é um dom de Deus”. A paz
( eiréné) é aquela grande bênção que Cristo nos deixou como
resultado de sua morte expiatória (Jo 14:27). Ela ultrapassa todo
entendimento (Fp 4:7).

Repare na brevidade desta saudação. Apenas uma das saudações


de todas as epístolas de Paulo é mais curta. (1Ts 1:1 é a que contém
menos palavras; Rm 1:1–7 é a que contém mais). Aqui em
Colossenses, a referência que geralmente se acrescenta a respeito
da segunda pessoa da trindade: “e do Senhor Jesus Cristo” (como
aparece em Romanos; 1 e 2

Coríntios; Gálatas; Efésios; Filipenses; 2 Tessalonicenses, e


Filemom),

“e Cristo Jesus nosso Senhor” (como em 1 e 2 Timóteo) “e Cristo


Jesus nosso Salvador” (como em Tito), não aparece nos melhores
manuscritos.

Não sabemos que razão teria Paulo para proceder desta forma. Mas
uma coisa, sim, é certa: o apóstolo de nenhuma forma está
denegrindo a glória e majestade de Cristo. Não está procurando
exaltar ao Pai às custas do Filho, uma vez que esta é precisamente a
epístola na qual a deidade da segunda pessoa da Trindade, Sua
preeminência sobre todas as criaturas (incluindo todas as hostes de
anjos) e sua idoneidade completa

Colossenses (William Hendriksen)

63

para a salvação, são expostas na forma mais clara possível, e


enfatizadas na forma mais vigorosa. Porventura não seria possível
que qualquer referência que aqui pudesse ter-se feito ao Senhor
Jesus Cristo fosse omitida a propósito, a fim de que em contraste ele
poderia ser singularizado para a discussão especial nos versículos
que seguem imediatamente? Observe-se a menção específica que
se faz a “nosso Senhor Jesus Cristo” no v. 3 e as demais referências
feitas a Ele nos versículos 4 e 7, e especialmente no parágrafo sobre
o Filho do amor de Deus nos versículos 15–20.

Para mais detalhes sobre certos aspectos das saudações que Paulo
faz no começo de suas cartas, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2

Tessalonicenses, pp. 47–56; e sobre Filipenses 1:1 e 2; e sobre 1 e 2

Timóteo e Tito, pp. 59–67; 383–386.

2. A AÇÃO DE GRAÇAS E A ORAÇÃO - CL 1:3–14

A. Ação de graças. Cl 1:3–8

3. Ao orar por vós sempre damos graças a Deus. Nas cartas


desse então, a saudação do princípio era seguida por uma ação de
graças.

Assim, numa antiga carta se lê: “Dou graças ao Senhor a Serápis


que quando estava em perigo no meio do mar, ele me salvou

imediatamente”. 22 Esta sequência (uma saudação seguida por uma


ação de graças) também é paulina. 23 No entanto, Paulo não dá
graças a uma 22 A. Deissmann, Light From the Ancient East
(traducido del alemán por L.R.M. Strachan, quarta edição, 1922, pp.
179, 180).

23 Os comentaristas concordam em que em quase todas as suas


cartas, a ação de graças e/ou a doxologia de Paulo vêm depois da
saudação. Quanto aos detalhes há algo de confusão. Segundo
alguns comentaristas, quase completamente conservadores, em
todas as cartas de Paulo, “com exceção de Gálatas”, a saudação é
seguida por uma ação de graças. Mas, estes comentaristas não
percebem o fato de que, por implicação, estão renunciando à
paternidade literária paulina de Tito? Isto não se deve fazer. Veja-se
C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, pp. 10–42, 428–433 (nota 193). No
entanto, segundo outros a ação de graças não só é omitida em
Gálatas e Tito, mas em 1 Timóteo também. De fato, é verdade de
que nesta última a ação de graças ou doxologia não vem

Colossenses (William Hendriksen)

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deidade pagã, mas ao único Deus verdadeiro. A espontânea ação de


graças de Paulo, a que se adere Timóteo, 24 e que segundo o
testemunho explícito do apóstolo sempre25 é um elemento das
orações que se fazem pelos colossenses, é oferecida a Deus o Pai
de nosso Senhor Jesus Cristo (cf. Rm 15:6; 2Co 1:3; 11:31; Ef 1:3;
3:14). Nosso Senhor, que tem o direito a esse nome devido ao fato
de que comprou o Seu povo com Seu sangue, sendo então seu
Senhor Soberano, e ao qual como ao seu Salvador Ungido Paulo dá
alegremente esta honra, é em sua mesmíssima essência o único
Filho de Deus. Ele é Filho por natureza. Nós somos filhos por
adoção. Ele tem todo o direito de chamar a Deus “meu Pai”

(Mt 26:39, 42), e fazer a majestosa afirmação: “Eu e o Pai somos


um”

(Jo 10:30; cf. 14:9). Chamar a Deus “o Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo”

tem um propósito eminentemente prático, como o apóstolo


demonstra claramente em 2Co 1:3. Em sua capacidade de Pai de
nosso Senhor Jesus Cristo. Ele é o “Pai de misericórdia e Deus de
toda consolação”. Através de Cristo toda bênção espiritual desce até
nós do Pai. E se Cristo for “o Filho do amor de Deus”, como Paulo
afirma neste mesmo capítulo (Cl 1:13), então Deus deve ser o Pai de
amor, o Pai amante. Note-se também essa bela palavra que está
cheia de uma fé que consegue tomar possessão de seu objeto, refiro
a nosso: “o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”.
Portanto, no sentido mais sublime e consolador, ele é nosso Pai. Que
razão mais poderosa para dar graças!

imediatamente depois da saudação. No entanto, também temos uma


ação de graças no começo do versículo 12, depois de um parágrafo
intermediário Tito, em todas as epístolas de Paulo a saudação é
seguida, seja imediatamente ou pouco depois, por uma ação de
graças e/ou doxologia. Para a doxologia veja-se 2Co 1:3ss.; para a
doxologia e a ação de graças, Ef 1:3ss., e Ef 1:15ss.

24 Pelo fato de que Paulo e Timóteo são mencionados no contexto


imediato (v. 1) é natural que interpretemos o “damos graças” do v. 3
como referindo-se a eles e não como um plural retórico. Veja-se
C.N.T. sobre 1 e 2 Tessalonicenses, p. 96, nota 65.

25 Embora seja gramaticalmente possível (com o R.V., R.V. 1960, e


outras) construir sempre com orar, é melhor unir o termo a damos
graças. Isto é o correto se se considerar o contexto que segue
imediatamente (vv. 4–8), no qual se dão as razões para a ação de
graças, e também em vista de 1Co 1:4; Ef 1:16; Fp 1:3; 1Ts 1:2; 2Ts
1:3 e Fm 3.
Colossenses (William Hendriksen)

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4, 5a. Paulo diz “Ao orar por vós, sempre damos graças a Deus, o
Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”, porque ouvimos que vossa fé
em Cristo Jesus e do amor que abrigais para com todos os
santos. A construção mais simples dos versículos 4–8 é a de
considerar toda esta seção como dando as razões para a ação de
graças. A petição propriamente dita começa no versículo 9. Tanto a
ação de graças como a petição pertencem à essência da oração (Fp
4:6). Agora, também é uma excelente psicologia cristã que Paulo
desde tão cedo mencione algumas razões para dar graças a Deus
referente a certas condições básicas que se davam em Colossos.
Existiam perigos que ameaçavam a igreja. Além disso, certas
fraquezas estão claramente implicadas (Cl 3:5–11; cf. 2:2, 4, 8, etc.).
Mas mesmo antes que Paulo comece a referir-se a estas coisas,
acima de tudo assegura aos destinatários desta carta que está
convencido de que a obra da graça de Deus é evidente em suas
vidas.

Que lição para todo pai, conselheiro, mestre e pastor, especialmente


nesses casos em que parece apropriado ter que admoestar ou até
repreender fortemente! Há tal coisa como tato cristão (veja-se o
apêndice). E este tato está em completa harmonia com a
honestidade.

Paulo menciona o fato de que ele e Timóteo ouviram (veja-se sobre o


v. 8) da fé que os colossenses têm em Cristo Jesus, quer dizer, de
sua permanente confiança em e entrega pessoal ao Salvador
Ungido. 26

Também associa com a fé em Cristo Jesus o amor para todos os


santos.

Estas duas coisas vão juntas, porque a fé sempre opera através do


amor (Gl 5:6). O mesmo ímã (Cristo Jesus)27 que os atraiu a Si
mesmo e que os transformou em santos, ao mesmo tempo as leva à
íntima comunhão dos uns com os outros. De modo que, idealmente
falando, cada crente guarda em seu coração os seus irmãos na fé,
não importa onde vivam ou 26 Devido ao fato de que o texto usa a
preposição _ν y no ε_ς, alguns pensam que não é correto considerar
Cristo como o objeto da fé, mas que Ele deve ser considerado como
a esfera na qual se exerce a fé. Esta interpretação ignora a
flexibilidade que há quanto ao uso do verbo πιστεύω e suas
preposições e casos. Veja-se Gram. N.T. Bl.-Debr. seções 187(6),
206(2), 233(2), 235(2), 397(2).

27 A resposta a pergunta, “por que Cristo Jesus em vez de Jesus


Cristo?”, encontra-se no C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, p. 61,
nota 19.

Colossenses (William Hendriksen)

66

de que raça sejam (Jo 13:34; Fp 1:7, 8; 1Jo 4:7–11). Paulo continua,
por causa da esperança reservada nos céus para vós. Deste
modo, à fé e o amor agora acrescenta a esperança, completando
assim a bem conhecida tríade. 28 No Novo Testamento esta tríade
não está limitada aos escritos de Paulo. Também aparece
frequentemente na literatura anteapostólica.

É muito provável que Paulo não a inventasse. Pode ter sido parte da
terminologia comum dos primeiros cristãos. De fato, estas mesmas
graças destacam-se no ensino e no ministério de Jesus. O Senhor,
quando estava no mundo, vez após vez enfatizou a importância da fé
(Mt 6:30; 8:10, 26; 9:2, 22, 29; 14:31; 15:28; 16:8; 17:20; 21:21;
23:23, etc.). Sua própria presença, suas palavras de regozijo, suas
brilhantes e belas promessas e suas obras de redenção inspiravam
esperança, mesmo quando não usasse a própria palavra (Mt 9:2;
14:27; Mc 5:36; 6:50; 9:23; Jo 11:11, 23, 40; 1Pe 1:3, etc.). Também
colocou muita ênfase no amor e na verdade o considerava como a
própria essência da lei e o evangelho, o maior da tríade (Mt 5:43–46;
19:19; Jo 13:34, 35; 14:15, 23; 15:12, 13, 17; 17:26; 21:15, 16, 17,
etc.). Com muita frequência e na forma mais natural combinou estas
três coisas. Um exemplo notável disto encontra-se em João 11:

1. Amor

“E Jesus amava (ou: apreciava com amor) a Marta, a sua irmã e a


Lázaro” (v. 5).

“De maneira que os judeus diziam: Olhai como (constantemente) o


amava” (v. 36).

2. Esperança

“Esta enfermidade não é para morte …” (v. 4).

28 Veja-se A.M. Hunter, “Faith, Hope, Love—A Primitive Christian


Triad”, ET xlix (1937–1938), p.

428f.

Colossenses (William Hendriksen)

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“Nosso amigo Lázaro está dormindo, mas eu vou despertá-lo” (v.

11).

“Eu sou a ressurreição e a vida, aquele que crê em mim, embora


morra, contudo viverá, e todo aquele que vive e crê em mim jamais
morrerá” (vv. 25, 26a).

Apesar de que nenhuma destas afirmações contêm a palavra

esperança, contudo são totalmente inspiradoras de esperança.

3. Fé

“Crês isto?” (v. 26b). (Note-se como a esperança e a fé estão


intimamente relacionadas).
“Não te disse que se creres, verás a glória de Deus?” (v. 40).

Encontramos outro exemplo sobressalente de amor, fé e esperança


no discurso de Cristo no cenáculo, durante a noite em que lavou os
pés de Seus discípulos, instituiu a Ceia do Senhor e foi traído.
“Tendo amado os seus, que estavam no mundo, amou-os até o fim”
(Jo 13:1). E

sublinhou a importância do amor mediante o lavamento dos pés de


Seus discípulos e a instituição do novo mandamento: “que vos ameis
continuamente uns aos outros” (Jo 13:34). Imediatamente depois
exortou a Seus discípulos a ter uma fé permanente em Deus e nEle:
“Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em
mim” (Jo 14:1). E

em seguida levantou neles a esperança, ao assegurar-lhes: “Na casa


de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria
dito. Pois vou preparar-vos lugar. E, quando eu for e vos preparar
lugar, voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu
estou, estejais vós também” (Jo 14:2, 3).

Portanto, não admira encontrar esta tríade nos escritos inspirados


daqueles que captaram o espírito dos exemplos e ensinos de Cristo.

Encontramos a sequência em variadas formas, embora os três


membros da tríade nem sempre ocorram em sucessão imediata:

Colossenses (William Hendriksen)

68

a. fé, esperança e amor (Rm 5:1–5; 1Co 13:13 «a passagem mais


conhecida daqueles nos quais aparece esta tríade»; Heb. 10:22–24;
1 P.

1:21, 22).

b. fé, amor e esperança (Cl 1:4, 5; 1Ts. 1:3; 5:8).


c. esperança, fé e amor (1Pe. 1:3–8).

d. amor, esperança e fé (Ef 4:2–5; Heb. 6:10–12).

No entanto, alguns tiveram dificuldade com o fato de que Paulo aqui


em Cl 1:4, 5 (onde segue a sequência b.) parece estar dizendo que a
fé e o amor dos colossense estão baseados na esperança. Repare
nas palavras: “por causa da esperança”. Como pode a esperança ser
a razão para a fé e o amor? Muitos intérpretes, aparentemente
desesperados por encontrar uma solução a este problema procuram
reconstruir a cláusula (ou pelo menos as ideias que nela se
expressam) de tal forma que lhes permita escapar da ideia de que a
fé e o amor pudessem estar baseados na esperança. 29 Não
obstante, semelhante reordenação das palavras desta oração é
absolutamente desnecessária. As atitudes e atividades mentais e
morais do cristão, tais como o ter fé, esperança e amor, sempre
reagem umas sobre outras. Em geral, quanto mais cresça uma, mais
crescerá a 29 Alguns traduzem os versículos 3–5 como se
significassem: “Ao orar por vós sempre damos graças a Deus …
porque ouvimos de vossa fé em Cristo Jesus e do amor que abrigais
para com todos os santos, e porque (também ouvimos) de vossa
esperança”. Outros traduzem: “damos graças a Deus … (orando
sempre por vós, tendo ouvido de vossa fé … e de vosso amor) por
causa da esperança”. Desta forma, a esperança, e ela somente, é
considerada como a razão pela qual dar graças. Lenski está certo
quando diz: “Mas esta construção dá como resultado uma ideia
estranha, ou seja, que depois de ter ouvido a respeito da fé e o amor
dos colossenses, Paulo e Timóteo não dão graças por esta fé e
amor, como é de esperar-se, mas sim só pela esperança reservada
para os colossenses.… Nenhum leitor comum remeteria a frase
governada por διά tão atrás para conseguir esse significado, e depois
seguir com a leitura”. Contudo, esta construção, que conecta a
esperança com a ação de graças do apóstolo e evita a dificuldade de
convertê-la na razão da fé e o amor, é defendida, numa ou outra
forma, por G.G.

Findlay (“A Biblical Note”, Exp, first series, 10 «1879», pp. 74–80).
Atanásio, Calovio, Conybeare, Eadie, Hofmann, Michaelis, Storr, etc.
Mas se opõem a ela Bruce, Calvino, De Wette, Ellicott, Erasmo,
Lenski, Lightfoot, C.F.D. Moule, Ridderbos, Robertson, etc. Os
comentaristas deste último grupo creem que é uma boa interpretação
dizer que a fé e o amor estão baseados na esperança. Eu concordo
com este parecer, e isto também pela razão gramatical que no
original as palavras “por causa da esperança” estão unidas muito
mais estreitamente com “fé … e amor” que com “sempre damos
graças a Deus”.

Colossenses (William Hendriksen)

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outra. Isto vale também para a esperança. Ela afeta poderosa e


beneficamente a fé e o amor. 30 A esperança cristã não é um mero
desejo.

Antes, é um anelo fervente, uma expectação confiante e uma espera


paciente do cumprimento das promessas de Deus, uma certeza
totalmente cristocêntrica (cf. Cl 1:27) de que estas promessas
realmente se realizarão. É uma força viva e santificante (1Pe 1:3; 1Jo
3:3).

Portanto, como vai ser possível que a esperança de glória, glória da


qual já recebemos uma antecipação (2Co 1:22; 5:5; Ef 1:14), não
fortaleça nossa fé nAquele que mereceu para nós todas estas
bênçãos, ou seja, o Senhor Jesus Cristo? E como não vai aumentar
nosso amor por aqueles com os quais vamos compartilhar esta
bênção pela eternidade? Como não vai intensificar nosso sentimento
de unidade com os santos de todas as idades? E se isso é verdade
com relação à esperança considerada como uma atitude e atividade
do coração e a mente, certamente que não é menos certo com
relação à esperança considerada como uma realidade objetiva, a
saber, o que estamos esperando, que é o sentido em que se usa a
palavra aqui em Cl 1:5a, como também em Gl 5:5 e Tt 2:13 (alguns
intérpretes acrescentariam à lista Heb. 6:18). Como o próprio
contexto o indica, a esperança a que se refere é “a herança dos
santos na luz” (Cl 1:12). Portanto, lemos aqui que está “reservada no
céu para vós”, uma expressão que imediatamente nos lembra os
tesouros celestiais dos quais Jesus fala em Mt 5:20, e da “herança
incorruptível, incontaminada e imarcescível, reservada nos céus para
vós”, da qual fala Pedro (1Pe 1:4).

É a glória que nos será revelada (Rm 8:18), a paz e a alegria que
pertencem à “nossa pátria que está no céu” (Fp 3:20; cf. Jo 14:1–4).
Esta realização de nossa esperança, esta glória, é tão fascinante que
na medida que a podemos contemplar de longe a saudamos (Heb.
11:13), fortalecida nossa fé no Doador, e aumentado e intensificado
nosso amor por todos os Seus filhos, com quem a compartilharemos.

30 A interação dos elementos que compõem a experiência cristã


foram discutidos no C.N.T. sobre Jo 7:17, 18.

Colossenses (William Hendriksen)

70

5b–8. Com relação a esta esperança, Paulo afirma o seguinte, da


qual já ouvistes antes na mensagem da verdade, ou seja, o
evangelho. Pelo fato de que o apóstolo mesmo explica esta
declaração no versículo 7, é pouco o que nós temos que comentar
aqui. A ideia principal é ainda a ação de graças pelas bênçãos
derramadas sobre os colossenses. Note-se, no entanto, que embora
esta seja a ideia principal na mente de Paulo, contudo sua afirmação
encerra algo mais. Nas entrelinhas pode ver-se facilmente uma
advertência: «Ó colossenses, cheio de gratidão testifico que com
relação a esta gloriosa esperança vós ouvistes uma mensagem que
era verdadeira, crescente e frutífera (5b, 6). Portanto, não permitais
que mestres de doutrinas falsas vos desviem do caminho correto.
Persisti firmemente na verdade que foi proclamada no evangelho».
Sobre o significado de evangelho, veja-se C.N.T. sobre Fp 1:27. Este
é o evangelho, o qual fez com que sua entrada seja sentida entre
vós, 31 como na verdade está produzindo fruto e crescendo no
mundo inteiro. Como uma razão para estar agradecidos, lembra
aos colossenses o poder (cf.
Rm 1:16) e a bem-sucedida carreira do evangelho. Esta afirmação
também encerra algo mais: “Porventura não lembrais a gloriosa
mudança ocorrida quando a verdade redentora de Deus fez sua
primeira aparição entre vós? Esse evangelho não necessita
nenhuma adição ou suplemento.

Sua influência se manifesta de uma forma sempre crescente, tanto


extensiva, invadindo região após região, como intensivamente,
produzindo cada vez mais fruto nos corações ganhos para Cristo.
Não tentem mudar a poderosa obra de Deus pelos pobres recursos
humanos”

(cf. Cl 2:8).

O que sempre deixou pasmado o historiador, é o rápido progresso do


evangelho em seus primeiros dias. Pela metade do segundo século,
Justino Mártir escreveu: “Não existe povo, gregos ou bárbaros, ou da
raça que sejam, não importa por que apelativo ou como sejam
chamados, 31 Essa é a tradução correta, e não simplesmente “o qual
chegou a vós”. Veja-se Oepke, artigo sobre παρουσία, πάρειμι,
Th.W.N.T., p. 863ss.

Colossenses (William Hendriksen)

71

se habitam em tendas ou se vagam em carretas cobertas, entre


aqueles que não seja oferecidas orações e ações de graças ao Pai e
Criador de todas as coisas no nome do Jesus crucificado”. Meio
século depois Tertuliano acrescentava: “Tão somente aparecemos
ontem, e no entanto já enchemos vossas cidades, ilhas, campos,
vossos palácios, senado e fórum. Somente lhes deixamos os seus
templos”. R. H. Glover ( The Progress of World-Wide Missions, p.
39), afirma: “Baseado sobre todos os dados disponíveis, calculou-se
que para fins do período apostólico, o número total de discípulos
cristãos tinha chegado a meio milhão”.
Agora, não existia sob a direção divina outro homem que fosse mais
eficaz na pregação das gloriosas boas novas de salvação que o
próprio Paulo. Tendo sido resgatado por Cristo (contra quem antes
lutou rancorosamente), seu coração foi cheio de amor e zelo santo
pela verdade. Chegou a dar sua própria vida por ela. Arrazoou com
judeus e gentios, implorou a eles (cf. 2Co 5:20, 21), fez milagres
entre eles, visitou-os em seus lares, chorou por eles. Em poucas
palavras, amou-os.

Quando esteve presente entre eles, seu exemplo — trabalhando com


suas mãos para ganhar a vida, admoestando-os e animando-os,
tratando com eles como um pai o faria com seus filhos — causou
uma profunda impressão. Estava sempre apontando para fora de si
mesmo, a Cristo.

Quando estava ausente, eles sempre estiveram em sua mente e lhes


enviou vibrantes e palpitantes mensagens, de coração a coração. Se
as circunstâncias o permitiam, voltaria a visitá-los ou os enviaria um
delegado que os ajudasse a resolver seus problemas. Levou suas
cargas até o trono da graça em oração. E não admira que as
pessoas viessem de perto e de longe para vê-lo e ouvi-lo. E aqueles
que o ouviram o comunicaram a outros, e estes ainda a outros mais,
etc. As seguintes passagens servem para ilustrar como foi que o
evangelho, através do ministério de Paulo e daqueles que puseram
atenção à sua pregação, frutificava e crescia:

“Todos os que habitavam na (província romana da) Ásia, judeus e


gregos, ouviram a palavra do Senhor Jesus” (At 19:10).

Colossenses (William Hendriksen)

72

“E a palavra do Senhor crescia e prevalecia poderosamente” (At


19:20).

“Porque de vós repercutiu a palavra do Senhor não só na


Macedônia e Acaia, mas também por toda parte se divulgou a vossa
fé para com Deus, a tal ponto de não termos necessidade de
acrescentar coisa alguma; pois eles mesmos, no tocante a nós,
proclamam que repercussão teve o nosso ingresso no vosso meio, e
como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o
Deus vivo e verdadeiro”

(1Ts 1:8, 9).

“Quero ainda, irmãos, cientificar-vos de que as coisas que me


aconteceram têm, antes, contribuído para o progresso do evangelho;
de maneira que as minhas cadeias, em Cristo, se tornaram
conhecidas de toda a guarda pretoriana e de todos os demais” (Fp
1:12, 13). 32

No entanto, embora Paulo ocupasse o papel principal na propagação


do evangelho, ele mesmo aqui em Cl 1:6 está colocando toda a
ênfase no fato de que o próprio evangelho está frutificando e
crescendo pelo poder e a graça de Deus. É como se estivesse
dizendo: «não menosprezem a vitalidade da semente que foi
espalhada sobre o terreno (veja-se Mc 4:26–29; cf. Is 55:11). Essa
semente está germinando, crescendo e produzindo fruto». O
evangelho jamais depende do homem, nem sequer de Paulo. É a
obra de Deus na qual lhe apraz usar o homem.

O que se disse implica também um crescimento e uma frutificação


intensiva ou interior, uma influência exercida pelo evangelho sobre
as vidas das pessoas que o ouviu e lhe prestou atenção. Pensemos
em frutos tais como a fé, o amor e a esperança (vv. 4 e 5), com uma
ênfase marcada no amor (v. 8). E acrescentemos a isso os frutos
mencionados com tão surpreendente beleza nos versículos 9–12 (cf.
Gl 5:22, 23). Os frutos para a eternidade se evidenciavam por todas
as partes. E falando de forma mas definida, este por todas as partes,
também incluía o vale 32 Para um resumo da estratégia que Paulo
seguia em sua obra missionária veja-se minha obra Bible Survey, pp.
199–207.

Colossenses (William Hendriksen)


73

do Lico, agora com uma nova ênfase na igreja de Colossos. Já se


deixou sentado (nos vv. 4 e 5) que o evangelho não era infrutífero
nesse lugar, e por implicação se reafirmou a mesma coisa no
princípio do versículo 6

(“o qual fez com que sua entrada seja sentida entre vós”). O apóstolo
volta a este caso específico de frutificação, ao continuar dizendo:
como também o faz entre vós desde dia em que ouvistes e
reconhecestes a graça de Deus em seu caráter genuíno. A nota
principal ainda é a de ação de graças. A inferência é: «Assim que,
colossenses, não destruais esta árvore frutífera. Não escuteis
àqueles que estão procurando vos privar da grande bênção que
chegou a vós». Não só tinham chegado a conhecer a verdade, mas
também a reconhecê-la como certa, e isto desde o dia em que a
ouviram pela primeira vez. Esse reconhecimento é algo mais que um
conhecimento abstrato e intelectual. É a aceitação e apropriação
alegre da verdade centralizada em Cristo. Esta verdade tem que ver
com nada menos que com a graça de Deus, seu amor soberano em
ação e seu favor para aqueles que não merecem. Eles tinham
chegado a reconhecer esta graça de Deus “em seu caráter genuíno”,
sem ter sido diluída por extravagâncias filosóficas ou acréscimos do
judaísmo. 33

Com relação a este verdadeiro evangelho da graça, o qual está


frutificando cada vez mais por todas as partes, assim como também
o está fazendo entre os colossenses desde o dia em que o ouviram e
aceitaram, Paulo continua dizendo: como o aprendestes de
Epafras, nosso amado conservo, que é um fiel ministro de
Cristo de nossa parte. 34

33 Embora se possa dizer algo a favor da tradução “chegaram a


conhecer verdadeiramente”, parece-me que é melhor conectar as
palavras _ν _ληθεί_ diretamente com o que lhe precede de forma
imediata, τ_ν χάριν το_ θεο_. Prefiro esta construção por duas
razões: a. no v. 5 menciona-se “a mensagem (ou a palavra) de a
verdade”; e b. o propósito da carta, ou seja, colocar a verdade sobre
a preeminência e toda-suficiência de Cristo em contraste com a
mentira que estava sendo propagada pelos falsos mestres.

34 Junto com A.R.V., R.S.V., B.J., Bíblia das Américas, Bruce, C.F.D.
Moule, Ridderbos, Robertson, etc., aceito a leitura _μ_ν em lugar de
_μ_ν. É verdade que ambas as leituras dariam bom sentido.

Contudo, pareceria que a frase “ministro da nossa parte” ajusta-se


mais exatamente às palavras “nosso amado conservo”. Epafras,
quem provavelmente devia sua conversão a Paulo, era o
representante do apóstolo nas igrejas de Colossos, Laodiceia e
Hierápolis (cf. Cl 4:13). Outra razão para adotar esta

Colossenses (William Hendriksen)

74

Quanto a Epafras, o “ministro” da igreja de Colossos, etc. (o qual


veio para ver Paulo em Roma, para, entre outras coisas, informar o
apóstolo sobre as condições em que estava a igreja, e para
conseguir sua ajuda na batalha contra a mundanalidade e a heresia),
veja-se a Introdução III A e IV A. Ao chamá-lo “nosso amado
conservo” e “fiel ministro de Cristo de nossa parte”, Paulo está
fazendo três coisas: a. está colocando o selo de sua aprovação
sobre Epafras e sobre o evangelho que ele tinha ensinado aos
colossenses; b. por implicação está condenando qualquer sistema de
pensamento que esteja em conflito com este único evangelho
verdadeiro; e c. está afirmando: «Aqueles que rejeitam o evangelho
como o ensinou nosso amado Epafras, também estão rejeitando a
nós (Paulo e Timóteo) e nosso ensino … e lembrai que nós, por sua
vez, representamos a Cristo (veja-se sobre o v. 1), assim como
também Epafras é um fiel ministro de Cristo». Naturalmente, a ideia
principal é a gratidão a Deus pelo fato de que por boca do fiel servo
Epafras, os colossenses tinham ouvido e aceito o glorioso evangelho
que estava produzindo fruto entre eles. As palavras do versículo 3,
“ao orar por vós, sempre damos graças a Deus”, controlam tudo o
que vem a seguir nos versículos 4–8. O apóstolo continua falando a
respeito de Epafras, o qual também nos deu a conhecer vosso
amor no Espírito. Esta declaração volta a tomar a ideia expressa
anteriormente (veja-se o v. 4b). O fato de que tanto Paulo como os
outros apóstolos consideravam o amor como o fruto mais precioso
da graça de Deus, é evidente não só por 1Co 13:13 (“e o mais
importante deles é o amor”), mas o é também por passagens tais
como: Colossenses 3:14 1 João 4:8

1 João 3:14 1 Pedro 4:8

leitura está no fato de que tem melhor apoio textual, como diz C.F.D.
Moule “testemunhas antigas e bem distribuídas”, o qual não se pode
dizer da outra leitura.

Colossenses (William Hendriksen)

75

E porventura não era precisamente esta a ênfase do próprio Cristo?

Veja-se Jo 13:1, 34, 35; 15:12; cf. Mc 12:28–31. Com toda


probabilidade, o apóstolo, para evitar que se arraigue a ideia de que
Epafras lhe tinha pintado um quadro excessivamente sombrio a
respeito das condições prevalecentes entre os crentes de Colossos,
faz ênfase no fato de que seu digno conservo lhe tinha entregue um
relatório entusiasta do amor que eles tinham. Este é o amor “para
com todos os santos”, sobre o qual Paulo acaba de falar. Esse amor
jamais pode ser separado se daquele amor que tem a Deus como
seu objeto. Este último assinala ao deleite inteligente e com
propósito que se tem no Deus triúno, a entrega espontânea e
agradecida da personalidade inteira Àquele que Se revelou a Si
mesmo em Jesus Cristo, o que também resulta num anelo profundo
e firme por uma verdadeira prosperidade para todos os Seus filhos.

Referente a este último aspecto deste amor — sobre o qual recai a


ênfase neste contexto —,manifesta-se nas três graças da unidade, a
humildade, e o serviço (Fp 2:2–4); portanto, em amabilidade,
verdadeira simpatia e num espírito perdoador (Cl 3:12–14). Note-se o
modificador, “vosso amor no Espírito”. Embora haja alguns que
afirmam que simplesmente significa “amor espiritual”, sem referir-se
de forma alguma ao Espírito Santo, no entanto esta opinião está
contra o fato de que em passagens como Rm 15:30; Gl 5:22 e Ef
3:16, 17 o amor cristão é considerado decididamente como fruto do
Espírito que habita em nós. Esse amor é plantado e alimentado pelo
Espírito. Além disso, é uma característica de Paulo que, tendo
mencionado a Deus o Pai (vv. 2 e 3) e a Cristo Jesus o Filho (vv. 3, 4
e 7), depois se refira à terceira pessoa da trindade, ou seja, o
Espírito. Cf. Rm 8:15–17; 2Co 13:14; Ef 1:3–14; 2:18; 3:14–17; 4:4–
6; 5:18–21. 35

35 A frase _ν πνεύματι, embora nem sempre, com frequência refere-


se ao Espírito Santo (Rm 8:9; cf.

8:16; Ef 2:22; 5:18; 6:18; cf. Jd 20; 1Tm 3:16; veja-se C.N.T. sobre 1
e 2 Timóteo e Tito, p. 161). Por isso, pois, não posso estar de acordo
com o comentário de Lenski nas pp. 31 e 32 de seu Interpretation of
Colossians, Thessalonians, Timothy, Titus, Philemon.

Colossenses (William Hendriksen)

76

B. A oração. Fp 1:9-11

9. A cláusula de Paulo que contém 218 palavras começa aqui no


versículo 9 e chega até o versículo 20. No entanto, a preeminência
de Cristo é estabelecida começando com o versículo 15, continuando
até o versículo 20. Portanto, Col 1:9–14 pode considerar-se como
uma unidade de pensamento por si mesmo, uma comovedora
descrição da oração que Paulo e seus associados elevam pelos
colossenses. No original, esta parte da cláusula — seis versículos no
total — contém 106

palavras. 36 Esta seção começa como segue: E por esta razão,


quer dizer, 36 O apóstolo foi acusado de “estar andando pelo mato”
ou de estar falando coisas que realmente não têm nenhuma
sequência definida. É verdade que as ideias se amontoam em sua
cabeça de tal forma que nem sempre se deixa notar imediatamente
uma ordem lógica. Devido a isso, os intérpretes não estão de acordo
quanto a qual deveria ser a construção dos versículos 9–14. Alguns
são da opinião de que o apóstolo segue um percurso em
ziguezague, começando com uma ação de graças no v. 3, depois
cambíando à uma petição fervorosa no v. 9, e voltando novamente à
ação de graças no v. 12. No entanto, supondo que isso seja certo,
contudo não se poderia objetar este proceder. Porventura não
acontece o mesmo com frequência a todo crente? No entanto, penso
que esta opinião sobre o que o apóstolo está escrevendo está
errada. No v. 12 não é Paulo que dá graças, mas ali é dito que os
colossenses darão graças se “andarem como é digno do Senhor” (v.
10). Gramaticalmente falando, creio que a construção dos versículos
9–14 é como segue:

Versículo 9

A conjunção καί não significa “não só outros, mas também nós”;


tampouco significa, “não só vós oraís por nós, mas também nós
oramos por vós”. Antes, a ideia é “não só estamos dando graças a
Deus (como nos vv. 3–8), mas também estamos orando por vós”. O
complemento dos particípios προσευχόμενοι e α_τούμενοι (embora
solo indiretamente do primeiro) está na claúsula _να τληρωθήτε

κ.τ.λ. O que Paulo estava pedindo era que os colossenses pudessem


ser cheios do conhecimento claro da vontade de Deus.

Versículo 10a

O infinitivo περιπατ_σαι introduz o resultado que se espera: “de


modo que vivais vidas dignas do Senhor”, ou mais literalmente, “que
andeis de uma maneira digna do Senhorr”, assim como lê a TB.

Versículos 10b–12a

Os quatro particípios, ou seja, καρποφορο_ντες, α_ξανόμενοι,


δυναμούμενοι, ε_χαριστο_ντες, descrevem o que acontece quando
se vive vidas dignas do Senhor, para que assim os crentes de
Colossos (e com efeito, todos os crentes em todo lugar, tanto nesse
então como agora) pudessem saber se estavam vivendo essas vidas
e como poderiam alcançar maior perfeição no caminho para este
alvo.

Portanto, estes particípios podem ser considerados como


suplementos de περιπατ_σαι, e neste sentido podemos dizer que
estão em aposto ao significado do infinitivo.

Versículos 12b–13

Colossenses (William Hendriksen)

77

não só por causa do amor que se mencionou no versículo que


precede de forma imediata, mas com base em todas as evidências
da graça de Deus na vida dos colossenses, como se descrevem nos
versículos 3–8, desde o dia que o ouvimos jamais cessamos de
orar por vós. Paulo quer dizer que ele e seus associados (Timóteo,
veja-se v. 1; Epafras e outros que também são mencionados em Cl
4:10–14) começavam agora a orar

“como nunca antes tinham orado”; isto é, admitindo que antes tinham
estado orando por esta igreja, as notícias que tinham chegado até o
apóstolo com a chegada de Epafras tinham produzido um notável
aumento de oração, intercessão fervente, e isto com grande
regularidade (“jamais cessamos de orar”). Isto nos traz à mente a vez
que a pregação de Paulo acresceu em Corinto depois da chegada de
Silas e Timóteo (At 18:5). 37

O apóstolo cria firmemente na comunhão em oração”: a. ele (e seus


associados) estava orando pelos destinatários, e b. por sua vez
pedia aos destinatários que orassem por ele. Para o ponto a. veja-se
a coluna 1; para o ponto b. a coluna 2. Note-se como em cada um
dos exemplos que vêm a seguir tanto a certeza de que Paulo ora
pelos destinatários como a petição (expressa ou tácita) de que eles
orem por ele, aparece na mesma carta:
A referência ao Pai no v. 12a leva a claúsula participial modificativa
τ_ _κανώσαντι κ.τ.λ., e também leva a claúsula relativa modificativa
_ς _ρρύσατο κ.τ.λ. do v. 13. Estas claúsulas não são simplesmente
descritivas, mas também causais, visto que suprem outras razões
mais para dar graças.

Versículo 14

A referência ao “Filho do seu amor” no versículo 13 dá origem à


claúsula relativa modificativa _ν

_ _χομεν κ.τ.λ., expressando o significado redentor de Cristo em


forma de compêndio, assunto sobre o qual o apóstolo falará mais.

Conclusão: certamente aqui não há nenhuma divagação. Os


pensamentos se seguem uns aos outros em perfeita sequência.

37 Algumas vezes deu a estas simples palavras muito mais


significado que aquele que está permitido.

Esta afirmação de Paulo se usa para reforçar a teoria de que ele


jamais esteve em Colossos, de que não conhecia ninguém ali, de
que a igreja logo acabava de ser fundada, etc. Veja-se o que se
disse a respeito disto na Introdução, II. A cidade de Colossos, A.
Geografia; e também sobre Cl 2:1.

Colossenses (William Hendriksen)

78

1. 2.

Rm 1:9 15:30

Ef 1:16 6:18, 19

Fp 1:4 3:17a; 4:9 (tácita)

Cl 1:9 4:3
1 Ts. 1:2 5:25

2 Ts. 1:11 3:1

Fm 4 22

Com base nas bênçãos que eles já tinham recebido, o apóstolo pede
favores adicionais. Animado pelas evidências da graça de Deus que
já estavam presentes, pede provas adicionais. Esse é o significado
de “E

por esta razão”, etc. O Senhor não deseja que Seu povo peça muito
pouco. Ele não deseja que vivam insuficientemente e com
mesquinharia na esfera espiritual. Que vivam rica e suntuosamente,
em harmonia com o Sl 81:1!

Agora, a oração que aqui se registra nos versículos 9b–14 deve ser
comparada com as orações de Paulo que se acham nas outras
epístolas de sua primeira prisão em Roma (Ef 1:17–23; 3:14–21; Fp
1:9–11). Ao combiná-las, percebemos que o apóstolo ora que
aqueles a quem se dirige sejam enriquecidos em coisas tais como
sabedoria, conhecimento, poder, paciência, longanimidade, alegria,
gratidão e amor. Além disso, notamos que Jesus Cristo (aqui “o Filho
do seu amor”) é considerado como aquele através de quem são
derramadas estas graças sobre o crente, e que a glória de Deus
(aqui, “dando graças ao Pai”) é reconhecida como o propósito
máximo de todas as coisas.

Verdadeiramente, de nenhuma forma pode alguém permitir-se


ignorar as lições de Paulo sobre a vida de oração.

Paulo acaba de usar a palavra orar. Agora acrescenta pedindo. O

termo mais geral e compreensivo é “orar”, o qual assinala qualquer


forma de expressão reverente dirigida à deidade, sem importar se
“nos

Colossenses (William Hendriksen)


79

apegamos a Deus” mediante uma intercessão, súplica, adoração ou


ação de graças. Mas pedindo é muito mais específico, pois indica
que se está fazendo uma petição definida e humilde. Cf. Fp 4:6; 1Tm
2:1 para vários sinônimos de oração.

A oração continua como segue, que sejais cheios com38 o


conhecimento claro de sua vontade (conhecimento que
consiste) em toda sabedoria e entendimento espiritual. Em vão
procuraremos servir a Deus se não sabemos o que é que deseja de
nós (At 22:10, 14; Rm 12:2).

Agora, o conhecimento a que se alude aqui não é um conhecimento


abstrato ou teórico. Tal conhecimento meramente teórico pode ser
obtido por um cristão nominal e, com efeito, até certo ponto por um
incrédulo declarado e até pelo próprio Satanás.

Paulo tampouco tem em mente um depósito de informação oculta, tal


como o conhecimento de algumas contrasenhas. Este conhecimento
tampouco é do gênero da gnosis misteriosa que os mestres do tipo
gnóstico pretendiam ter para seus “iniciados”. Pelo contrário, é uma
compreensão profunda da natureza da revelação de Deus em Jesus
Cristo, uma revelação maravilhosa e redentora; e é um
discernimento que produz fruto para a vida prática, como o indica
também o contexto imediato (v. 10). Este conhecimento flui da
comunhão com Deus e leva à uma comunhão ainda mais profunda.
Portanto, este conhecimento claro (_πίγνωσις) transforma o coração
e renova a vida. Todas as vezes que esta palavra é usada no Novo
Testamento, tem este sentido definido: Rm 1:28; 10:2; Ef 1:17; 4:13;
Fp 1:9, 10; Cl 1:9, 10; 2:3; 3:10; 1Tm 2:4; 2Tm 2:25; 3:7; Tt 1:1; Fm
6; Hb 10:26; 2Pe 1:2, 3, 8; 2Pe 2:20; e cf. o verbo da mesma raiz em
1Co 13:12. Compare-se também o pano de fundo do Antigo
Testamento: “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria” (Pv 1:7;
cf. 9:10; e também Sl 25:12, 14; 111:10). Paulo ora 38 “Cheios com”
é o correto, mesmo quando o verbo πληρόω é usado aqui com o
acusativo, como em Fp 1:11 (cf. 2Ts 1:11). Nos outros lugares o
apóstolo o usa com o dativo (Rm 1:29; 2Co 7:4) ou com o genitivo
(Rm 15:13, 14). A única coisa que isso prova é que não há regra fixa
quanto aos casos que acompanham a este verbo. Além disso, a
tendência era usar o acusativo.

Colossenses (William Hendriksen)

80

para que os destinatários sejam cheios do conhecimento rico,


profundo e experimental da vontade de Deus. Não há dúvida de que
aqui se alude intencionalmente ao erro gnóstico, com o qual os
falsos mestres estavam procurando desviar os colossenses do
caminho correto. É como se Paulo estivesse dizendo: «O
conhecimento claro da vontade de Deus (que é o que principalmente
estamos pedindo para vós) é incomparavelmente mais rico e
satisfatório que o conhecimento ou gnosis que os defensores de
heresias vos oferecem». Este conhecimento penetrante, que é parte
da equipamento espiritual do cristão, consiste em “toda sabedoria e
entendimento espiritual”. Essa sabedoria é a habilidade de usar os
melhores meios para alcançar a meta mais alta, ou seja, uma vida
para a glória de Deus. E equivale a um entendimento que é ao
mesmo tempo espiritual e prático. Tal entendimento, pois, não se
deixa enganar pelas mutretas de Satanás, a sedução da carne ou as
presunçosas pretensões dos falsos mestres. Semelhante sabedoria
e entendimento — para a combinação destas duas palavras, veja-se
Êx 31:3; 35:31, 35; Is 10:13; 11:2; etc. — é a obra do Espírito Santo
nos corações humanos. Para as características da verdadeira
sabedoria cf. a preciosa passagem de Tg 3:17.

10–12. O propósito prático ou o resultado que se espera deste


conhecimento claro (que é o ponto de partida da oração de Paulo
pelos colossenses) expõe-se a seguir: de modo que vivais vidas
dignas do Senhor (cf. Ef 4:1; Fp 1:27; 1Ts 2:12; 3Jo 6). O apóstolo e
os que estão com ele oram pedindo que os colossenses possam
“andar” (cf. Gn 5:22, 24; 6:9, etc.) ou conduzir-se em harmonia com
as responsabilidades que sua nova relação com Deus lhes impõe, e
em harmonia com as bênçãos que esta nova relação proporciona.
Não deve haver nada de indiferença desta forma de vida. Pelo
contrário, deve ser de (seu) completo agrado (veja-se além sobre
Cl 3:22), deve ser um esforço consciente para agradar a Deus em
tudo (cf. 1Co 10:31; 1Ts 4:1). O fato de que esta conduta que
glorifica a Deus será efetivamente o resultado de ter sido cheio do
conhecimento claro de Sua vontade, é algo fácil de ver, uma

Colossenses (William Hendriksen)

81

vez que quanto mais O amarem, mais desejarão obedecer-Lhe em


pensamento, palavra e obra.

O apóstolo passa agora a descrever esta vida de santificação


mediante quatro particípios:

(1) em toda boa obra dando fruto.

Paulo atribui às boas obras um imenso valor quando são

consideradas como o fruto — não a raiz — da graça. Ef 2:8–10 é seu


próprio comentário.

(2) e crescendo no conhecimento claro de Deus. 39

Note-se que o apóstolo faz do conhecimento claro de Deus tanto o


ponto de partida (v. 9) como também a característica resultante (v.
10) da vida que agrada a Deus. Isto não nos deve estranhar, uma
vez que o conhecimento verdadeiro e experimental de Deus produz
sempre uma crescente medida desta mesma graça. Por isso,
embora do mesmo princípio da história, Jó já conhecia a Deus,
contudo depois de um tempo considerável ele pôde testificar: “De
ouvidas te tinha ouvido; mas agora meus olhos te veem. Portanto me
aborreço, e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:5, 6)

As seguintes passagens têm um significado muito semelhante: “Irão


de poder em poder” (Sl 84:7). “Mas o caminho dos justos é como a
luz da aurora, que vai aumentando até que o dia é perfeito” (Pv
4:18). O
próprio apóstolo, apesar de já conhecer a Cristo, ainda continua
orando por um conhecimento maior: “a fim de conhecê-lo” (Fp 3:10).

39 O que se diz do evangelho no v. 6 — produzindo fruto e


crescendo — aqui se afirma quanto aos crentes. Mas isto não
descarta a ideia de que aqui no v. 10 cada particípio tenha seu
próprio modificativo. E pelo fato de que não é algo anormal (em vista
de Gl 5:19, 22; Fp 1:22) que

“produzindo fruto” tenha como modificativo “em toda boa obra”, e


pelo fato de que não é ilógico (considerando 2Pe 3:18) que
“crescendo” ou “aumentando” esteja vinculado com “em
conhecimento claro de Deus”, e por último, pelo fato de que aqui em
Cl 1:10 estes dois modificativos (_ν ταντ_ _ργ_

_γαθ_ y τ_ _πιγνώσει το_ θεο_) estão bastante separados, não


existe nenhuma razão que nos obrigue a nos afasttar das traduções
portuguesas (RA, RC, B.J., Bíblia das Américas), as quais associam
o primeiro modificativo com καρποφορο_ντες, e o segundo com
α_ξανόμενοι. A única pequena mudança que sugiro (veja-se minha
tradução) é reter o ordem quiástica das palavras que se encontra no
original; portanto,

Colossenses (William Hendriksen)

82

(3) sendo fortalecidos com toda fortaleza.

A sentença que diz «conhecimento é poder» é uma verdade na vida


espiritual mais que em qualquer outra parte. Quando uma pessoa
cresce no conhecimento claro de Deus, sua força e valor aumentam.
A divina presença que habita nele o capacita a dizer, “tudo posso
naquele que me fortalece” (Fp 4:13). Paulo acrescenta, em
conformidade com seu glorioso poder. “Em conformidade com” é
uma expressão muito mais forte que

“de” ou “por”. Quando um multimilionário dá algo “de” suas riquezas


para uma boa causa, bem poderia estar dando muito pouco; mas se
doar

“em conformidade com” suas riquezas, a quantidade será vultosa. O

Espírito Santo não só dá “de,” mas também dá “em conformidade


com”.

Ef 1:19–23 nos mostra por que o poder de Deus é, na verdade,

“glorioso”. Aquilo para o qual é capacitado o cristão por esta força em


ação (κράτος) declara-se pelas palavras de forma que possais
exercer todo tipo de paciência e longanimidade. A paciência é a
graça de poder permanecer firme, é a coragem de perseverar na
execução da tarefa que alguém recebeu de Deus apesar de todas as
dificuldades e aflições, é o recusar-se a sucumbir ao desespero ou à
covardia. É um atributo humano, e se manifesta com relação às
coisas, isto é, com relação às circunstâncias em que uma pessoa vê-
se envolvida: aflição, sofrimento, perseguição, etc. A longanimidade
caracteriza a pessoa que, com relação àquelas pessoas que se
opõem a ela ou a afligem, exerce paciência, recusando render-se à
paixão ou à explosão de ira. Nos escritos de Paulo se relaciona com
virtudes como a bondade, a misericórdia, o amor, a benevolência, a
compaixão, a mansidão, a humildade, a clemência, e com um
espírito perdoador (Rm 2:4; Gl 5:22; Ef 4:2; Cl 3:12, 13).

diferente da paciência, esta longanimidade não só é um atributo


humano, mas também é um atributo divino. Se atribui a Deus (Rm
2:4; 9:22), a Cristo (1Tm 1:16), como também ao homem (2Co 6:6;
Gl 5:22; Ef 4:2; Cl 3:12, 13; 2Tm 4:2). Outra distinção é que a
longanimidade se mostra em nossa atitude para com as pessoas e
não para com as coisas.

Consideradas como virtudes humanas, tanto a paciência como a

Colossenses (William Hendriksen)

83
longanimidade são dons de Deus (Rm 15:5; Gl 5:22), e ambas são
estimuladas pela esperança, pela certeza de que Deus cumprirá
Suas promessas (Rm 8:25; 1Ts 1:3; 2Tm 4:2, 8; Heb. 6:12).

(4) com alegria40 dando graças ao Pai.

Graças à força que Deus lhes comunica, os crentes podem, até em


meio de tribulações, dar graças com alegria e regozijar-se com ação
de graças (cf. Mt 5:10–12; Lc 6:22, 23; At 5:41; 2Co 4:7–17; Fp 1:12–
21).

Esta ação de graças se dirige ao Pai, uma vez que Ele é que nos dá
livremente todas as coisas (Rm 8:32) através do “Filho do seu amor”
(v.

13). Paulo enfatiza a necessidade de dar graças vez após vez (2Co
1:11; Ef 5:20; Fp 4:6; Cl 3:17; 1Ts 5:18). Com relação a este
contexto, as razões pelas quais os colossenses devem dar graças ao
Pai se expressam nos versículos 12b, 13. Aqui, pois, faz-se notar
que o Pai é quem vos41

fez aptos para participar da herança dos santos na luz. Assim


como o Senhor na antiga dispensação proveu para Israel uma
herança terrena, a qual foi distribuída por sorte entre as várias tribos
e unidades mais pequenas da vida nacional (Gn 31:14; Nm 18:20; Js
13:16; 14:2; 16:1, etc.), da mesma forma proveu para os colossenses
uma porção ou parte na herança que é melhor. Esta gente provinha
principalmente do mundo 40 Sigo aqui a pontuação adotada pelo
N.N. Provavelmente a ideia expressa no v. 11 não necessita um
modificativo mais que lhe acompanhe. Além disso, se separarmos a
frase “com alegria” do particípio

“dando graças”, este seria o único particípio (dos quatro) que não
teria modificativo.

O argumento de Lightfoot, que não teria sentido colocar “com alegria”


junto a “dando graças”, uma vez que uma ação de graças “é em si
mesma um ato de regozijo”, é pouco convincente. Os autores, tanto
sagrados como seculares, com frequência acrescentam este tipo de
modificativos com o propósito de enfatizar algum aspecto da palavra
modificada. Se “com alegria” soa como um pleonasmo quando se
junta com “dando graças” por que não acontece o mesmo então no
versículo anterior, onde a frase “com toda fortaleza” é unida a “sendo
fortalecidos”? O Novo Testamento contém numerosos exemplos
desta classe. Quando não se abusa deste tipo de expressão, o estilo
do escritor é mais vívido e interessante.

No entanto, deve admitir-se que quer digamos “de forma que possais
exercer todo tipo de paciência e longanimidade com alegria, dando
graças”, etc., ou “de forma que possais exercer todo tipo de
paciência e longanimidade, com alegria dando graças”, etc., é pouca
a diferença no significado que resulta.

41 O apoio textual a favor de _μ_ς é mais fraco. Talvez se deva a


uma assimilação: veja-se o _μ_ς do v. 13.

Colossenses (William Hendriksen)

84

gentílico (veja-se Introdução III B), e num tempo estiveram


“separados de Cristo, alienados da comunidade de Israel e estranhos
às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no
mundo”. Mas “agora, em Cristo Jesus, vós, que em outro tempo
estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo” (Ef 2:12,
13).

O fato de que esta participação é um assunto de graça soberana e


que nada tem a ver com o mérito humano, está bem claro, acima de
tudo, pela própria palavra que se usa, ou seja, herança: a pessoa
recebe uma herança como uma dádiva; ela não a ganha. Além disso,
este fato também é enfatizado pelas palavras, “quem vos fez aptos”.
O melhor comentário deste versículo é a declaração que Paulo faz
em 2Co 3:5:
“nossa suficiência vem de Deus”. É Deus quem faz dignos42 àqueles
que em si mesmos não são dignos, e Aquele que os capacita desta
forma a participar da herança.

A herança dos santos quer dizer a herança dos crentes redimidos,


isto é, daqueles indivíduos humanos que, tendo sido tirados fora das
trevas e colocados na luz, estão consagrados a Deus. Embora
alguns comentaristas sejam da opinião de que aqui, em Cl 1:12, a
palavra santos refere-se a anjos, no entanto não existe nenhuma
base que sustente este ponto de vista. Paulo ama a palavra santos,
e vez após vez a usa em suas epístolas. Nem uma só vez a usa para
referir-se a anjos, mas sempre para os redimidos (veja-se Rm 1:7;
8:27; 12:13; 15:25, 26, 31; 16:2, 15; 1Co 1:2; 6:1, 2; 14:33, etc.).
Nem 1Ts 3:13 é uma exceção à regra; veja-se C.N.T. sobre esta
passagem.

Esta herança “dos santos” é ao mesmo tempo a herança “na luz”.

Esta é “a luz do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus


Cristo”

(2Co 4:6). É “o amor de Deus derramado em nossos corações pelo


Espírito Santo” (Rm 5:5); “a paz de Deus que ultrapassa todo
entendimento” (Fp 4:7); a “alegria inefável e cheia de glória” (1Pe
1:8).

42 No idioma holandês a ideia básica do verbo pode-se expressar


muito adequadamente pelo verbo verwaardigen (dignar-se dar).

Colossenses (William Hendriksen)

85

O fato de que na Escritura a palavra luz efetivamente se usa para


expressar de uma forma metafórica todas essas ideias e muitas
mais, está claro pelas seguintes passagens, em cada uma das quais
a palavra luz é usada num contexto que a interpreta:

A palavra luz usa-se em conexão com:


(1) santidade, ser santificado (At 20:32; 26:18, 23). Estas passagens
são de especial importância, uma vez que aparecem em declarações
pertencentes a Paulo.

(2) a revelação divina: verdade, e penetração nessa revelação:


conhecimento (Sl 36:9; 2Co 4:4, 6).

(3) amor (1Jo 2:9, 10).

(4) glória (Is 60:1–3).

(5) paz, prosperidade, liberdade, alegria (Sl 97:11; Is 9:1–7).

Pelo fato de que o próprio Deus em seu próprio ser é santidade,


onisciência, amor, glória, etc., e pelo fato de que Ele é para Seu povo
a fonte de todas as graças que mencionamos acima nos pontos (1)
ao (5), Ele é luz em Si mesmo. “Deus é luz, e nele não há treva
nenhuma” (1Jo 1:5). Jesus disse: “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8:12).
Como tal Deus é em Cristo a salvação de Seu povo. A luz e a
salvação são, portanto, sinônimos (Sl 27:1; Is 49:6). O mesmo
acontece com a luz e a graça ou o favor divino (Sl 44:3).

O contrário à luz são as trevas, as quais, por conseguinte, são o


símbolo de Satanás e seus anjos; portanto, são também o símbolo
do pecado, da desobediência, rebelião, ignorância, cegueira,
falsidade, ódio, ira, vergonha, luta, carência, escravidão e tristeza,
como o mostram várias das passagens que citamos acima, sob (1)
ao (5), e muitos outros também.

Portanto, o que o apóstolo está afirmando aqui em Cl 1:12 é que o


Pai de seu amado Filho Jesus Cristo — e por conseguinte, nosso Pai
também — em virtude de Sua graça soberana, fez os colossenses
dignos de e competentes a participar da herança dos santos no reino
da salvação

Colossenses (William Hendriksen)

86
plena e livre. Não é difícil responder a seguinte pergunta: “este reino
é presente ou futuro?” Em princípio os colossenses já estão nele. Já
foram

“transferidos ao reino do Filho do seu amor” (Cl 1:13; cf. Ef 2:13). A


possessão plena, no entanto, pertence ao futuro. É “a esperança que
está reservada nos céus para vós” (Cl 1:5). Do Senhor receberão a
recompensa, ou seja, a herança (Cl 3:24). Cf. Ef 1:18; Fp 3:20, 21; e
cf.

Heb. 3:7–4:11. 43 Paulo ora — porque deve lembrar-se que isso


ainda é parte de sua oração — que os colossenses possam
constante e alegremente dar graças a Deus por tudo isso.

13, 14. Os versículos 13 e 14 resumem a obra divina da redenção.

Os detalhes da mesma seguem nos versículos 15–23. Isto nos


lembra o livro de Romanos, onde Rm 1:16, 17 resume o que se
descreve com grandes detalhes em Rm 1:18–8:39.

O coração de Paulo estava em seu escrito. Nunca escreveu no


abstrato quando falava das grandes bênçãos que os crentes têm em
Cristo. Sempre esteve profundamente consciente do fato de que
sobre ele também, apesar de ser completamente indigno, o Pai tinha
derramado estes favores. Portanto, não nos deve estranhar que, ao
ser afetado profundamente pelo que estava escrevendo, tenha
mudado a expressão de “vós” a nós”: “quem vos fez …” (v. 12); “e
quem nos resgatou …” (v.

13). Note-se, além disso, como todas as ideias principais dos


versículos 12–14 — trevas, luz, herança, perdão de pecados44 —
aparecem também em At 26:18, 23, passagem que narra a
experiência própria de Paulo e que prediz também a experiência dos
gentios a quem era agora enviado. De modo que, ao descrever a
graça outorgada aos colossenses, a ele mesmo e a seus associados
(sim, e a todos os pecadores redimidos), o apóstolo ecoa das
próprias palavras que o Salvador usou para dirigir-se a ele, que era
“Saulo”, o grande e terrível perseguidor:
43 A interpretação que Lenski dá a esta passagem não faz justiça à
referência futurista de Cl 1:12.

44 Note-se ainda _ξουσίας em At 26:18 e aqui em Cl 1:13.

Colossenses (William Hendriksen)

87

“Eu sou Jesus, a quem tu persegues. Mas levanta-te e firma-te sobre


teus pés, porque por isto te apareci … livrando-te do povo e dos
gentios, para os quais eu te envio, para lhes abrires os olhos e os
converteres das trevas para a luz e da potestade [ou, jurisdição] de
Satanás para Deus, a fim de que recebam eles remissão de pecados
e herança entre os que são santificados pela fé em mim” (At 26:15b–
18).

Por isso, pois, Paulo escreve: e quem nos resgatou45. O Pai nos
atraiu até ele, nos libertando de nossa miserável condição. O verbo
resgatou do presente contexto, implica tanto a escuridão e miséria
totalmente irreparável, na qual, ao estar apartados da misericórdia de
Deus, “nós” (os colossenses, Paulo, etc.) estivemos andando
tateando, como também o glorioso mas árduo trabalho redentor que
era necessário para nos libertar do estado desventurado em que nos
encontrávamos. O

Pai nos resgatou mediante o envio de seu Filho, quem se fez homem
(Cl 1:22; 2:9; cf. Gl 1:15, 16; 4:4, 5), com o propósito de:

a. morrer por nossos pecados na cruz (Cl 1:22; 2:14; cf. Gl 2:20;
6:14), e

b. ressuscitar e subir ao céu, de onde derrama Seu Espírito dentro


de nossos corações (Cl 3:1; cf. 2Ts 2:13; Jo 16:7), para que nós,
tendo sido chamados (Cl 1:6, 7; cf. Gl 1:15, 16; Fp 3:14), fôssemos
“vivificados”

(Cl 2:13; cf. Ef 2:1–5; Jo 3:3; At 16:14), e aceitássemos a Cristo


Jesus como nosso Senhor mediante um ato de conversão genuína, e
fôssemos então batizados (Cl 2:6, 12; cf. At 9:1–19).

45 No original a frase “quem vos fez odôneos” (v. 12) é um


modificativo participial, mas a frase “que nos resgatou”, etc. (v. 13) é
uma claúsula relativa. Isto lhe dá à ideia um certo grau de
independência, de maneira que não está unida tão estreitamente ao
que precede. A oração começou a misturar-se com uma descrição
da generosidade do Pai (v. 13) e com um resumo da obra redentiva
que foi consumada por meio do Filho (vv. 13b, 14).

Colossenses (William Hendriksen)

88

Todo este processo se inclui nas palavras, “resgatou-nos”, 46 e isto


do domínio das trevas, a esfera na qual Satanás exerce a
jurisdição que usurpou (Mt 4:8–11; Lc 22:52, 53; cf. At 26:18),
dominando sobre os corações, as vidas e as atividades dos homens,
como também sobre todos

“os poderes do ar” e “as hostes espirituais de maldade nos lugares


celestiais” (Ef 2:2; 6:12). (Para o significado de luz e trevas veja-se
acima sobre o v. 12) Éramos escravos impotentes sem esperança,
acorrentados na prisão de Satanás por nossos pecados … até que
veio o Conquistador para nos resgatar (cf. 2Co 2:14). Deus nos
resgatou em Cristo e nos trasladou ao reino do Filho de seu
amor. Tirou-nos do escuro e lúgubre reino dos ideais falsos e
imaginários para nos introduzir na terra banhada pelo sol do
conhecimento claro e a expectação realista; tirou-nos da atordoante
esfera dos desejos pervertidos e os apetites egoístas para o bem-
aventurado reino dos anelos santos e as gloriosas abnegações; tirou-
nos da miserável masmorra de cadeias intoleráveis e agudos
lamentos ao palácio de uma liberdade gloriosa e de belas canções.

“De servidão, noite e dor

Venho, Jesus, venho, Jesus;

A liberdade, distração, luz e amor


Venho, Jesus, a Ti.

De minha pobreza e enfermidade

A tua saúde e prosperidade,

A ti com toda minha grande maldade.

Venho, Jesus, a Ti.

Já da tumba e de seu terror

Venho, Jesus, venho, Jesus;

46 Argumenta-se às vezes que pelo fato de que _ρρύσατο é um


aoristo, a referência que faz deve ser então a um ato definido.
Baseados nesta hipótese, alguns comentadores creem que a
expressão “nos resgatou” só se refere à morte de Cristo na cruz;
outros, unicamente à conversão e ao batismo. No entanto, o aoristo
não tem necesariamamente que referir-se a um só ato. Pelo
contrário, o aoristo serve para resumir, uma vez que considera tudo o
que aconteceu como um só ato. Cf. C.N.T. sobre Jo 2:20.

Colossenses (William Hendriksen)

89

Ao Teu lar de luz e amor

Venho, Jesus, a Ti.

De minha inquietação e falta de paz,

Ao Teu redil e doce distração;

Ao céu donde poderei ver Tua face

Venho, Jesus, a ti”.

(W.T. Sleeper)
É provável que esta sobressalente expressão figurada fora uma que
os destinatários — tanto gentios como judeus — entendessem
facilmente. Eles sabiam que os governantes terrestres às vezes
trasladavam ao povo conquistado de uma terra a outra (2Rs 15:29;
17:3–

6; 18:13; 24:14–16; 25:11; 2Cr 36:20; Jr 52:30; Dn 1:1–4; Ez 1:1; cf.

Introdução, II. A cidade de Colossos, C). Da mesma forma, também

“nós” fomos trasladados, e isto não da liberdade à escravidão, mas


da escravidão à liberdade. Portanto, permaneçamos firmes nesta
liberdade.

Não vamos pensar que nossa libertação é tão somente de um


caráter parcial, ou que por meio de ritos místicos, penosas
cerimônias, culto a anjos ou qualquer outro meio (tanto nesse então
como agora) devemos obter lentamente nossa saída do pecado à
santidade. Fomos libertados uma vez por todas. Não fomos
trasladados das trevas a uma espécie de semi-trevas, mas da
escuridão lúgubre à “luz maravilhosa” (1Pe 2:9). Já estamos neste
momento dentro “do reino do Filho do seu (do Pai) amor”. 47 Aqui
temos o que poderia verdadeiramente chamar-se

“escatologia realizada”. Nesta vida presente já estamos em princípio


47 Neste ponto devemos ser cuidadosos para não sobrecarregar a
exegese com distinções desnecessárias; por exemplo, temos a
opinião que afirma que “o reino do Filho” pertence ao presente, mas
o “de Deus” ao futuro. Veja-se O. Cullmann, Königsherrschaft Christi
und Kirche im N.T. Em contraste com esse ponto de vista, que se
baseia muito sobre 1Co 15:23ss., Karl L. Schmidt afirma
corretamente que é impossível falar do reino de Cristo sem falar ao
mesmo tempo sobre o reino de Deus (artigo sobre βασιλεία, em Th.
W.N.T., vol. I, p. 582). Um exame cuidadoso de passagens como Ef
5:5; Ap 12:10, como também uma comparação entre Rm 14:17 e Jo
18:36 e 1Co 4:20 mostrará que não se pode fazer nenhuma distinção
aguda onde quer que se usem estas duas ideias ou seus sinônimos.
Certamente, o reino de Deus é eterno, mas também o é o reino do
Filho (Lc 1:33; Hb 1:8; 2Pe 1:11).

Colossenses (William Hendriksen)

90

participando da glória prometida. Deus já começou uma boa obra em


nós, e no que respeita ao futuro cada um de nós pode testificar: “Tua
obra em meu coração terá de ti a perfeição” (Sl 138:8; Fp 1:6).

“Nós” recebemos o Espírito Santo. E o ‘penhor” (primeira quota e


objeto) de nossa herança (Ef 1:14; cf. 2Co 1:22; 5:5) consiste em sua
presença habitando em nós. É a garantia de uma glória vindoura que
é ainda muito maior. Isto se depreende também do fato de que
Cristo, que mereceu esta glória para nós, é “o Filho do amor do Pai”.
Ele é tanto o objeto do Seu amor (Is 42:1; Sl 2:7; Pv 8:30; Mt 3:17;
17:5; Lc 3:22) como a manifestação pessoal deste (Jo 1:18; 14:9;
17:26). Como, pois, o Pai não nos dará “juntamente com ele” todas
as coisas livremente? (Rm 8:32). Fomos trasladados ao reino do
Filho do amor de Deus, em quem temos nossa redenção, isto é,
nosso libertação como resultado do pagamento de um resgate.
Assim como de acordo com a antiga lei de Israel, a vida que estava
condenada e destinada à morte podia ser libertada por um preço (Êx
21:30), da mesma forma também nossa vida, perdida por causa do
pecado, foi resgatada pelo derramamento do sangue de Cristo (Ef
1:7). 48 Também podemos acrescentar a observação de A.

Deissmann: «Quando alguém escutava a palavra grega λύτρον,


preço do 48 Apesar de que em conformidade com a evidência textual
de mais peso, as palavras “por seu sangue” (cf. Ef 1:7) não devem
ser incluídas no texto de Cl 1:14, a ideia não pode ser excluída. É

verdade que Büchsel nega que a ideia do pagamento de um resgate


esteja presente em sequer alguma referência biblica sobre a
redenção (artigo sobre _πολύτρωσις, no Th. W.N.T., vol. IV, pp. 354–
359).
No entanto, a evidência está claramente a favor da opinião oposta.
Mt 20:28 e Mc 10:45 demonstram claramente que Cristo veio para
dar sua vida em resgate por muitos. E as palavras “mediante a
redenção que está em Cristo Jesus” (Rm 3:24) indicam claramente
(à luz do versículo que segue imediatamente) o pagamento de um
resgate feito com sangue. A mesma ideia se expressa, não só em Ef
1:7, que já mencionamos, mas também em Hb 9:15 (cf. v. 12). É
verdade que, devido a uma mudança semântica, a palavra tem uma
conotação muito mais geral (como libertação, emancipação,
exoneração, restauração, omitindo a ideia de uma libertação “pelo
pagamento de um resgate”) em Lc 21:28; Rm 8:23; 1Co 1:30; Ef
1:14; 4:30; Heb. 11:35. No entanto, não é honesto fazer
generalizações com base nisso. Cada passagem deve ser estudada
em seu próprio contexto específico. Vez após vez Paulo faz ênfase
na ideia de que nosso Senhor pagou um preço enorme para obter
redenção para o Seu povo. De modo que Cl 1:14 deve ser explicado
à luz de passagens como 1Co 6:10; 7:23; Gl 3:13; 4:5; 1 Ti. 2:6.
Outras passagens pertinentes são Sl 49:8; Mt 20:28; Mc 10:45; Jo
1:29; 3:17; 1Pe 1:18, 19; Ap 5:6, 9, 12; 7:14; 12:11.

Colossenses (William Hendriksen)

91

resgate (na qual está baseada a palavra _πολύτρωσις, redenção,


resgate ou libertação pelo pagamento de um preço) … era coisa
natural que pensasse no dinheiro que comprava a emancipação dos
escravos”.

Portanto, “nele”, isto é, mediante nossa união espiritual com Ele (Cl
3:1–3), temos redenção plena e livre. Por conseguinte, esta
redenção é emancipação da maldição (Gl 3:13), e particularmente da
escravidão ao pecado (Jo 8:34; Rm 7:14; 1Co 7:23), uma libertação
que resulta numa verdadeira liberdade (Jo 8:36; Gl 5:1). Pelo
pagamento que Cristo fez do resgate e mediante nossa fé nEle,
obtivemos do Pai o perdão ou remissão (cf. Sl 103:12) de nossos
pecados. As cadeias que nos tinham apanhados foram quebradas.
Embora só aqui e em Ef 1:7 (perdão de …
transgressões) o apóstolo usa esta expressão “perdão de pecados”
(a qual aparece com muita frequência no Novo Testamento), 49 e
embora Paulo geralmente nos transmite uma ideia semelhante por
palavras e frases que pertencem à família da “justificação pela fé”,
contudo ele conhecia bem a ideia do perdão dos pecados, como se
pode ver por Rm 4:7; 2Co 5:19; e em Colossenses por Cl 2:13 e
3:13. De fato, em Colossenses a ideia do perdão até é enfatizada.
Veja-se a nota 131.

A justificação e a remissão são inseparáveis. Assim também são a


redenção e a remissão, embora às vezes isto foi negado. Assim,
Irineu em sua obra Contra heresias I.xxi.2, escrita perto de 182–188
d.C., fala-nos a respeito de certos hereges de seus dias, que
ensinavam que nesta vida a salvação era realizada em duas etapas,
que são as seguintes: a. A remissão de pecados no batismo, que foi
instituído pelo Jesus visível e humano;

b. A redenção numa etapa subsequente, mediante o Cristo divino,


Aquele que desceu sobre Jesus. Nesta segunda etapa, a pessoa a
quem já se tinha perdoado seus pecados, alcançava a perfeição e a
plenitude.

49 Veja-se Mt 26:28; Mc 1:4; Lc 1:77; 3:3; 24:47; At 2:38; 5:31; 10:43;


13:38. Cf. para uma referência mais completa E. Percy, Die Probleme
der Kolosser und Epheserbriefe, pp. 85, 86. Também B.B.

Warfield, The Person and Work of Christ, pp. 429ss., e E.K. Simpson,
Words Worth Weighing in the Greek New Testament, p. 8ss.

Colossenses (William Hendriksen)

92

É possível, considerando passagens como Cl 2:9, 10; 4:12, que os


mestres do erro já estivessem disseminando em Colossos este
conceito ou um semelhante. Seja como for, o apóstolo escreveu
estas palavras em virtude do Espírito Santo, que conhece todas as
coisas mesmo antes que aconteçam, e que, portanto, pode dar
advertências que sejam aplicáveis tanto no futuro como no presente.
Suas palavras indicam claramente que quando um pecador é tirado
da potestade das trevas e trasladado ao reino de luz, ele deve ser
considerado como tendo sido redimido, e que esta redenção implica
o perdão dos pecados.

3. A PREEMINÊNCIA DO FILHO - CL 1:15–20

Os versículos 15–20 formam uma unidade. Se esta passagem não é


uma joia literária composta pelo próprio apóstolo, provavelmente foi
um hino ou outro testemunho de estrutura mais ou menos fixa
pertencente à igreja primitiva, e adotado por Paulo para colocá-la
aqui com ou sem alteração, conforme ao que fosse mais apropriado
para satisfazer as necessidades da igreja de Colossos. Seja como
for, a passagem é uma unidade, e por isso a colocamos aqui em sua
totalidade. E pelo fato de que consiste em duas partes, colocamo-las
em colunas paralelas. 50

A relação que há entre o tema e seus duas divisões é como segue. A


preeminência do Filho se mostra:

A. Na criação (vv. 15–17) B. Na redenção (vv. 18–20) 15 o qual é a


imagem do Deus invisível, 18 E ele é a cabeça do corpo, o
primogênito de toda criatura a igreja; o qual é o princípio, o 16
Porque nele foram criadas todas as primogênito dos mortos, para
que coisas nos céus e na terra, o visível em todas as coisas ele
possa 50 Para enfatizar a semelhança ou a correspondência que a
coluna A tem com a coluna B, com frequência a seção B é colocada
como se começasse em 18b. Desta forma A. e B. começariam com
as palavras “o qual”. Por outro lado, no que se refere ao conteúdo, a
seção B deve começar como está impressa acima, quer dizer, com o
v. 18a, o qual certamente é parte da preeminência de Cristo no reino
da redenção.

Colossenses (William Hendriksen)

93
e o invisível, sejam tronos ou domínios ou ter a preeminência.

principados ou autoridades, todas as coisas 19 Porque nele aprouve


(a Deus) ter por meio dele e para ele foram criadas; habitado toda a
plenitude, 17 E ele é antes que todas as coisas, e todas 20 E por
meio dele reconciliar todas as coisas encontram nele seu coesão. as
coisas consigo mesmo, havendo feito a paz mediante o sangue de
sua

cruz, por meio dele, sejam as coisas

que estão sobre a terra, ou as coisas

que estão no céu.

Estas linhas são muito sobressalentes e solenes. Note-se os


seguintes pontos de correspondência que há entre A. e B.: A. B.

(1) “o qual” no versículo 15 18

(2) “o primogênito” no versículo 15 18

(3) “Porque nele” no versículo 16 19

(4) “nos céus e na terra” no versículo 16cf. 20

Não só aparecem as mesmas expressões em ambas as colunas,


mas aparecem na mesma sequência! Temos aqui um paralelismo
definido de ideia e forma. A glória de Cristo na criação é igualada por
Sua majestade na redenção. Também há outros detalhes que são
parecidos; por exemplo, a expressão “todas as coisas” aparece
quatro vezes nos versículos 15–17 e duas vezes nos versículos 18–
20. E as palavras “por meio dele” do versículo 16 se repetem duas
vezes no versículo 20.

A respeito da origem e natureza destas linhas imponentes, solenes e


cuidadosamente balançadas, existem duas opiniões principais. Veja-
se, no entanto, a nota. 51
51 A. Várias Teorias

(1) Os versículos 12–20 devem ser considerados como parte de


alguma liturgia cristã primitiva referente ao batismo, que faz uso de
um hino de origem gnóstico nos versículos 15–20. Ernst Käsemann,
“Eine urchristliche Taufliturgie”, Festschrift Rudolf Bultmann zum 65.
Geburtstag überreicht (1949), pp. 133–148.

Colossenses (William Hendriksen)

94

(2) Cl 1:15–20 é parte de uma liturgia eucarística. G. Bornkamm,


Theol. Blätter, 1942, p. 61.

(3) Cl 1:13–29 mostra um culto cristão primitivo. Há aqui um modelo


definido que distribui as cláusulas de acordo com um esquema
numérico de 3–7, 3–7. Ernst Lohmeyer, en Meyer Commentary (8ª.
edição 1930).

(4) Cl 1:15–20 é um dos hinos cristãos mais antigos. Paulo incluiu


este hino em sua carta aos colossenses. O.A. Piper, “The Savior’s
Eternal Work; An Exegesis of Col. 1:9–29”, Int 3 (1949), pp.

286–298.

(5) A passagem é uma confissão cristológica composta por Paulo.


Esta é a opinião à qual finalmente chegou Martin Dibelius. Veja-se o
seu comentário, An die Kolosser, Epheser, an Philemon, em
Lietzmann’s Handbuch zum Neuen Testament, 3ª. edição revisada
por H. Greeven, 1953. Ernst Percy também era da opinião de que
Paulo escreveu estas linhas. Para prová-lo ele recorre à similaridade
de estilo; cf. Cl 1:16 com 1Co 3:21; 12:13; e Gl 3:26–28. Veja-se sua
bem conhecida obra Die Probleme der Kolosser und Epheserbrief, p.
65.

(6) Estas linhas contêm formas tradicionais de pregação, períodos


judaicos e uma fórmula estoica de onipotência. Assim Eduard
Norden, Agnostos Theos, 1913.
(7) Estas linhas devem sua origem à literatura judaica de sabedoria
(Pv 8:22–31; Eclesiástico 1:4; 43:26). H. Windisch, “Die göttliche
Weisheit der Juden und die paulinische Christologie”, em Neutest.

Studien für Heinrici, 1914, pp. 220–234. Muito parecida com esta é a
opinião de C.F. Burney, que estas linhas podem ser uma meditação
sobre Pv 8:22 em conexão com Gn 1:1; veja-se seu artigo,

“Christ as the ARXH of the creation”, JTS xxvii (1925, 1926), pp.
160ss. Outro ponto de vista semelhante é que a passagem de Cl
1:15–20 foi composta “pelo próprio Paulo, embora possivelmente
com palavras tiradas em parte de algum hino helênico à Sabedoria
ou Palavra de Deus”. C.F.D.

Moule, The Epistle of Paul the Apostle to the Colossians and to


Philemon, p. 61.

(8) Estas linhas contêm um antigo hino cristão de louvor a Cristo,


aumentado com as palavras “e ele é a cabeça do corpo, a igreja”. A
passagem deve ser considerada como uma composição não paulina.
C. Masson, Comm.du NT, vol. X. Eliminando certas palavras, este
autor produz um paralelismo que se adere a regras estritas e
definidas.

(9) Qualquer um que seja a origem desta seção, revela um padrão


estilístico definido, uma distribuição em estrofes. Mas como era esse
arranjo em estrofes? Tem havido diversas tentativas para reconstruir
o modelo original. À parte dos fatos por Käsemann, Lohmeyer,
Norden e Masson (veja-se acima para as obras referidas), também
estão as de P. Benoit, La Sainte Bible traduite en francais sous la
direccion de l’Ecole Biblique de Jérusalem; G. Schille, “Liturgisches
Gut im Epheserbrief” (tese doutoral, Gotinga, 1952); C. Maurer, “Die
Begründung der Herrschaft Christi über die Mächte nach Kolosser 1,
15–20”, Wort un Dienst, Jahrbuch der Theologischen Schule Bethel,
n.F. IV (1955), pp.

79–93; e, último em ordem mas não em importância, J.M. Robinson,


“A Formal Analysis of Colossians 1:15–20”, JBL, Vol. LXXVI, Part IV
(dezembro de 1957), pp. 270–288.

(10) Embora o estilo formal e a correspondência que há entre Cl


1:15–18a e 18b–20 dão a estas linhas um aspecto brilhante e solene,
estas coisas não provam se, por um lado, estamos tratando aqui com
um hino ou outra forma de unidade litúrgica, ou se, pela outra, temos
aqui um exemplo da pregação de Paulo sobre a glória de Cristo. Só
depois de uma considerável reconstrução do texto podemos obter
um hino unificado. H. Ridderbos, Aan De Kolossenzen, no
Commentaar op het Nieuwe Testament, p. 151. No entanto, ele
definidamente favorece a distribuição de Cl 1:15–20 em duas partes
e não em quatro partes.

Colossenses (William Hendriksen)

95

A primeira destas duas teorias aceitáveis é esta: O próprio Paulo


compôs e ditou estas linhas. Aqueles que favorecem este ponto de
vista, geralmente acrescentam que Cl 1:15–20 não é um hino.

A segunda é esta: a passagem é um hino anterior a Paulo ou um dito


ou testemunho cedo, bem conhecido. Paulo, tendo aprendido este
“hino”

ou “dito” que tinha chegado a ser muito querido para ele, o tornou
parte de sua carta, quer não o tenha acrescentado ou alterado em
nada ou que lhe tenha feita algumas pequenas mudanças para que
se acomodasse a seu propósito.

Em favor da primeira alternativa propuseram-se os seguintes


argumentos:

(1) Só depois de uma considerável reconstrução baseada em


conjeturas é possível encontrar nestas linhas o metro quantitativo
reconhecível que alguém esperaria num hino.

(2) Era natural que Paulo, uma pessoa altamente emocional e


escrevendo a respeito de um tema excelso (a preeminência de
Cristo), se expressasse de uma forma tão solene. E pelo fato de que
muitas B. Avaliação

Várias destas teorias estão abertas a sérias objeções. Deste modo,


numa carta que combate o gnosticismo incipiente, dificilmente
esperaremos encontrar nela a incorporação de um hino gnóstico.

Novamente, embora todas as coisas fossem criadas em e por e para


Cristo, e embora todas as coisas encontrem nEle seu coesão, isto
não faz com que seja necessário ver influências estoicas nestas
ideias.

E quanto à possível influência da literatura de sabedoria, se é que


houvesse alguma influência, só estaria na forma de expressão, mas
não diretamente no conteúdo. No máximo, seria algo à margem, que
afetaria a forma mais que a essência. Além disso, a personificação
poética da sabedoria na literatura de sabedoria não se refere
diretamente ao Filho do próprio Deus, a quem Paulo tem em mente
em primeiro plano em Colossenses. Y quanto àquelas teorias que,
sem nenhum apoio textual, omitem totalmente ou reordenam
palavras, frases e até linhas completas, com o propósito de obter um
esquema preciso de estrofes, em que tudo esteja perfeitamente
equilibrado, tenho a dizer que as rejeito totalmente. O simples fato de
que muitas delas foram postas à prova, disputando cada uma ser
melhor que as demais, ficam todas condenadas. Também é muito
subjetivo afirmar que aqui nos encontramos com alguma liturgia
batismal ou eucarística. Só aqueles que colocam aqui semelhantes
liturgias são os que as “encontram”.

A verdadeira razão de Cl 1:15–20 está à mão. A razão está na


própria pessoa de Cristo, Aquele que existiu desde toda a
eternidade, encarnou-Se, cumpriu Seu assombroso ministério
terrestre, sofreu e morreu substitutivamente, ergueu-Se da tumba,
subiu aos céus e enviou Seu Espírito da direita de Deus, onde
atualmente está sentado.

Colossenses (William Hendriksen)


96

passagens do Antigo Testamento, tão familiares a Paulo, louvavam a


majestade do Senhor usando uma fraseologia formada por
paralelismos (Sl 93; 96; 103; 121; 136; 145–150; etc.), o apóstolo,
guiado pelo Espírito, poderia quase naturalmente expressar-se numa
linguagem semelhante ao exibir a majestade de Cristo.

(3) Nesta passagem não há nada que possa considerar-se alheio ao


tema principal de Paulo em Colossenses.

(4) O Paulo de 1 Coríntios e Gálatas escreve de uma forma


semelhante. Veja-se a nota 51, A.5 acima.

Aqueles que não estão de acordo com esta teoria poderiam

responder da seguinte maneira:

A respeito do ponto (1). Pode-se afirmar que cada hino possui um


metro quantitativo reconhecível?

Quanto ao ponto (2). Poderia alguém que escreve espontaneamente


no estilo fluido e livre de uma carta, compor uma passagem que está
formado de duas partes que contêm, não só as mesmas frases, mas
também ainda as mesmas frases dispostas na mesma sequência?

Com relação a (3). O ponto é legítimo, mas não está em conflito com
nenhuma das duas teorias.

Pelo que toca a (4). No máximo, as passagens que Percy cita só


proveem uma prova parcial, porque não contêm um paralelo
verdadeiro e estilístico ao que temos em Cl 1:15–20.

Agora, embora afinal a primeira teoria pudesse ser a correta, no


entanto parece haver argumentos muito mais sólidos em favor da

segunda. Note-se o que vem a seguir:


(1) A igreja primitiva não só tinha seus salmos do Antigo Testamento,
mas também outros hinos. Cf. 1Co 14:26. Paulo amava os

“salmos e hinos e canções espirituais”.

Não se afirma isto claramente em Cl 3:16?

Acaso não se ilustra vividamente em 1Tm 3:16?

E não foi claramente motivado por Jo 3:16?

Colossenses (William Hendriksen)

97

A igreja primitiva também teve suas “frases fiéis” (1Tm 1:15; 3:1; 4:8,
9; 2Tm 2:11–13; Tt 3:4–8). Todos essas frases, testemunhos,
confissões e canções passaram de boca em boca e de coração a
coração, até que se cravaram no próprio coração da comunidade,
todos os temores, esperanças, lutas e alegria dos crentes eram
expressos por eles.

Portanto, não seria estranho, que Paulo estivesse citando aqui em Cl


1:15–20 (seja de forma exata ou com alguma palavra adicional de
aplicação) um dito ou hino que tinha chegado a ter um lugar
proeminente na vida da igreja.

Note-se, além disso, que Cl 1:15–20 dá testemunho da grandeza de


Cristo, que é o mesmo tema de 1Tm 3:16. Como já se indicou, com
toda probabilidade essa passagem também era um hino. Neste
contexto, poderia ser de alguma importância que uma geração
depois da morte de Paulo, Plínio o Jovem, ao descrever os cristãos
de seus dias ao imperador Trajano, afirme: «Além disso, eles
afirmaram que a soma total de sua culpa ou erro era que tinham por
costume reunir-se num dia fixo antes que amanhecesse, quando
cantavam em versos alternados um hino a Cristo como se fosse
Deus …» ( Letters X.xcvi).
(2) O pronome relativo “o qual” (vv. 15, 18, especialmente o último),
“não é obviamente natural” (C.F.D. Moule, op. cit. , p. 62). Tem todo o
aspecto de ter sido tirado de um hino em que deve ter estado
precedido por palavras tais como “damos graças a nosso glorioso
Senhor Jesus”. O hino citado em 1Tm 3:16 parece pressupor
também um antecedente semelhante. Veja-se C.N.T. sobre 1 e 2
Timóteo e Tito, pp.

157–159.

(3) A natureza cuidadosamente construída de Cl 1:15–20, as


correspondências de paralelo concernentes a suas duas partes, a
repetição de palavras e frases na mesma sequência que se
manifestam em ambas as seções, tudo isto é mais natural num hino
que numa carta de estilo fluido e livre.

Colossenses (William Hendriksen)

98

Antes que tratemos de fazer um estudo das partes separadamente,


devemos considerar a passagem em sua totalidade. Os seguintes
pontos devem destacar-se:

(1) A passagem indica pelo menos o seguinte, ou seja, que tão


somente tendo transcorrido trinta anos desde que Jesus sofresse
uma vergonhosa morte na cruz, já Lhe eram atribuídas honras
divinas. Sua preeminência na criação e na redenção, Sua exaltação
sobre toda criatura, estava sendo proclamada pelo apóstolo. No
entanto, se a passagem for a citação de uma fonte mais anterior (o
que é totalmente possível), isso significaria que o reconhecimento de
Jesus como Deus é um fato que ainda antedata a Paulo! Veja-se Jo
20:28; cf. Jo 1:1–18.

(2) Ao insistir tão fortemente na grandeza de Cristo, esta passagem


dá a entender que Ele é capaz de outorgar aos colossenses as
coisas que Paulo pediu para eles em sua bela oração (vv. 9–14).
Esta é a conexão que existe entre a oração e o “hino” ou
testemunho. Semelhante segurança era necessária, uma vez que o
apóstolo tinha pedido nada menos que um conhecimento claro da
vontade de Deus, toda sabedoria e entendimento espiritual,
frutificação em toda boa obra, e toda força de tal maneira que
pudessem exercer todo tipo de paciência e longanimidade.

(3) Cl 1:15–20 descreve um Cristo que tem em Sua mão e que


abrange com Seu amante coração tanto o reino da criação como o
da redenção. Aquele que é “o primogênito de toda criação” também é
“o primogênito dos mortos”. Aquele que morreu na cruz conhece pelo
nome a estrela mais distante. Não só a conhece, mas também a
dirige. Muito melhor: Ele a controla de tal forma que servirá para o
proveito de Seu povo (Rm 8:28). As assim chamadas “leis da
natureza” não têm uma existência independente. São a expressão de
Sua vontade. E é possível falar de leis porque Ele se deleita na
ordem e não na confusão. Aquele que em resposta à oração pode
outorgar a segurança da salvação também é capaz de conceder
chuva em resposta à oração!

Colossenses (William Hendriksen)

99

A aplicação que podemos fazer desta verdade para hoje pode ser
vista facilmente. Pelo fato de que o Cristo do Calvário governa os
céus e a terra para proveito de Seu reino e para a glória do Seu
nome (controlando o mal para que disso saia o bem), então
nenhuma automatização, nem bomba, nem ameaça comunista, nem
depressão, nem desequilíbrio econômico, nem acidente fatal, nem o
declínio gradual da força mental, nem alucinações produzidas por
uma desordem nervosa, nem nenhum invasor extraterrestre (sobre
aqueles que alguns têm pesadelos!) poderá jamais triunfar para nos
separar de Seu amor (Rm 8:35, 38). Aquele que nos diz como ir ao
céu e que certamente nos leva até ele, também sabe como partem
os céus; Ele faz com que eles levem a cabo sua missão e que se
dirijam ao lugar destinado por Ele, porque nEle, por meio dEle e para
Ele foram criadas todas as coisas e nEle
“encontram sua coesão”.

(4) Contra os hereges que ameaçavam a igreja de Colossos e que


proclamavam a insuficiência de Cristo, esta passagem exalta sua
plena suficiência para a salvação. Esta salvação não só inclui o ser
salvo da ira de Deus, da sentença condenatória e do castigo eterno,
mas também o ser regenerado e fortalecido, de maneira que se
possa estar capacitado para expulsar de si sua natureza antiga com
seus muitos vícios (Cl 3:5–9) e vestir-se com a nova natureza com
suas muitas virtudes (Cl 3:1–3, 12–

17). Aquele que leva o Seu povo à glória é Cristo o todo-suficiente,


Ele e somente Ele os leva. De modo que o apóstolo, até neste
grandiosa passagem (Cl 1:15–20), realmente está tratando com as
implicações práticas da fé em Cristo. Em contraste com esta fé, os
conceitos dos mestres do erro desaparecem sem valor.

(5) A passagem também ensina claramente que a atividade

redentora de Cristo abrange todo o universo. Deus Se agradou em


reconciliar consigo todas as coisas em Cristo. Veja-se sobre 1:20.

Agora nos voltaremos à primeira das duas partes em que está


dividida esta seção, versículos 15–20, e ao fazê-lo notaremos nela a
preeminência do Filho.

Colossenses (William Hendriksen)

100

A. Na criação - Cl 1:15-17

15. Paulo escreve, o qual é a imagem do Deus invisível. Isto nos


lembra a passagem de Gn 1:27, que relata que o homem foi criado à
imagem de Deus. E como tal, o homem recebeu domínio sobre o
resto da criação. É muito significativo que o Salmo 8 (no qual
descreve este domínio com algum detalhe) seja interpretado pelo
escritor da Epístola aos Hebreus como referindo-se ao Messias (Hb
2:5–9). Mas embora esta referência à criação do homem como
imagem de Deus e,

consequentemente, ao seu domínio, bem poderia ter estado no pano


de fundo, no entanto não faz plena justiça à ideia que Colossenses
comunica referente ao Filho. O homem, apesar de ser a imagem de
Deus, não é Deus. Mas o Filho, como a imagem do Deus invisível, é,
primeiro que tudo, o próprio Deus. “Nele habita corporalmente a
plenitude da deidade” (Cl 2:9; cf. Rm 9:5). “No estão escondidos
todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2:3).
Segundo, como imagem do Deus invisível, o Filho é Deus revelado.
Esta identificação do Filho com o próprio Deus, sendo o Filho a
imagem de Deus ou Deus manifestado, não é uma novidade para os
escritos de Paulo. O apóstolo também chamou Cristo “a imagem de
Deus” numa das cartas aos coríntios, escrita vários anos antes que
esta (2Co 4:4). Com isto deve comparar-se também a descrição que
o apóstolo faz de seu Senhor em Filipenses (uma carta escrita
provavelmente pouco depois de Colossenses), ou seja,

“existindo na forma de Deus” (veja-se C.N.T. sobre Fp 2:6). Temos


aqui em Cl 1:15 o mesmo ensino que encontramos em Heb. 1:3,
onde o Filho é chamado “o resplendor da glória de Deus e a mesma
impressão de sua substância”. O apóstolo João expressa a mesma
ideia numa linguagem diferente: “No princípio era o Verbo, e o Verbo
estava face a face com Deus, e o Verbo era Deus … ninguém viu
jamais o próprio Deus. O

Deus unigênito, que descansa no seio do Pai, o deu a conhecer” (Jo


1:1, 18). Cf. também Jo 10:30, 38; 14:9; Ap 3:14. O Deus invisível
fez-se

Colossenses (William Hendriksen)

101

visível no Filho de tal forma que o homem pode ver Aquele que é
invisível (cf. 1Tm 1:17; 6:16).
Agora, se o Filho é a própria imagem do Deus invisível, e se este
Deus existe de eternidade à eternidade, daí segue-se que também o
Filho deve ser eternamente a imagem de Deus. Pelo que no que
respeita à Sua deidade, não pode ser parte da categoria de tempo e
espaço. Não pode ser uma mera criatura, mas deve estar numa
classe à parte por Si mesmo, isto é, elevado grandemente acima de
toda criatura. Por conseguinte, o apóstolo continua dizendo, o
primogênito de toda criatura, 52 isto é, Aquele a quem pertence o
direito e a dignidade de primogênito com relação a toda criatura. Que
a frase “o primogênito de toda criatura” não pode significar que o
próprio Filho também é uma criatura (o primeiro de uma longa linha),
estabelece-se claramente no versículo 16. Ele é anterior a, diferente
de, e exaltado muito acima de toda criatura. Como o primogênito, Ele
é o herdeiro e governante de tudo. Ponha a atenção no Sl 89:27:
“Fá-lo-ei, por isso, meu primogênito, o mais elevado entre os reis da
terra”. Cf. Êx 4:22; Jr 31:9.

A mesma ideia se expressa em Hb 1:2, 2: “Deus … tem nos falado


em seu Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, e por
quem fez o universo”.

16. A interpretação que acabamos de dar, coloca o versículo 15 em


harmonia com o versículo 16, o que outra vez enfatiza a
preeminência de Cristo acima de toda criatura. E isto, enfatizemos
novamente, era afinal o tema principal de Paulo contra os mestres do
erro, que estavam causando distúrbios na igreja de Colossos. Lemos
então:

Porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, o


visível e o invisível, sejam tronos ou domínios ou principados
ou autoridades, todas as coisas foram criadas através dele e
para ele.

52 Quer a traduzíssemos “de toda criação” (cf. Rm 8:22) ou “de toda


criatura” (cf. Rm 8:39), é pouca a diferença que resulta de πάσης
κτίσεως. A favor “de toda criatura” está a ausência (aqui em Cl 1:15)
do artigo no original. Se o sentido fosse “toda criação” esperar-se-ia
encontrar o artigo com a palavra πάσης.
Colossenses (William Hendriksen)

102

Todas as coisas — sem fazer diferença entre si são materiais ou


espirituais — foram criadas nEle, isto é, em relação ao Filho, o
primogênito. Assim como duas muralhas (e os tijolos nestas
muralhas) acomodam-se com relação à pedra angular, da qual
obtêm seu ângulo de direção, assim também todas as coisas foram
originalmente criadas com relação a Cristo. Ele é seu ponto de
referência. Além disso, elas devem seu firme estado (“foram
criadas”) a Ele, quer dizer, por meio dEle, como o agente da criação,
e tendo em vista a Ele ou para Ele, como o objetivo da criação.
Todas as criaturas, sem nenhuma exceção (seja a que for), devem
contribuir para Lhe dar glória e servir a Seus propósitos. No entanto,
não é Deus o Pai — ou pelo menos o triúno Deus — , antes, que o
Filho, para quem tudo foi trazido à existência? E passagens como
Rm 11:36; 1Co 10:31 e Ef 4:6, não estão apontando na mesma
direção?

Contudo, deve ter-se em mente que a ênfase que o apóstolo quer


dar nesta carta é que também o Filho é plenamente divino. Nele
habita corporalmente toda a plenitude da deidade (Cl 2:9). Portanto,
é totalmente razoável que afirme que o Filho não só é aquele a quem
todas as coisas devem sua origem, como o agente divino da criação,
mas também é o fim de sua existência. Ele é o Senhor Soberano de
todas as criaturas. Portanto, não há nenhuma razão justificada para
confiar em, buscar a ajuda de, ou adorar a qualquer criatura, embora
esta criatura seja um anjo. Não importa quão exaltados sejam os
anjos, eles também são criaturas, e, como tais, sujeitos a Cristo. A
região à qual eles ou qualquer outra criatura pertencem não faz
nenhuma diferença, não importa se tal região é o céu ou a terra, ou
um lugar intermediário. Note-se a forma quiástica ou cruzada em que
se expressa o pensamento:

“Porque nele foram criadas todas as coisas”

Colossenses (William Hendriksen)

103

Aqui claramente as criaturas visíveis são aquelas consideradas como


habitando na terra; as invisíveis como estando no céu.

Paulo está pensando especificamente nos tronos ou domínios ou


principados ou autoridades. Os mestres do erro falavam com
frequência destes seres angélicos. O apóstolo não nega sua
existência (Ef 1:21, 22).

Tampouco nega que são capazes de exercer certa influência para


bem, se não terem caído (veja-se C.N.T. sobre 1Tm 5:21), ou para
mal, se tiverem caído (Ef 6:12). Antes, a ideia do apóstolo é esta: os
anjos não têm nenhum poder à parte de Cristo. De fato, separados
dEle nem sequer poderiam existir. Não são mais que criaturas. Em e
por si mesmos nada podem contribuir para a salvação ou perfeição
dos colossenses. A única coisa que podem fazer é prestar serviço, e
isto sempre em sujeição a Cristo e por seu poder. Os anjos bons
nada podem acrescentar à plenitude e os recursos que os crentes
têm em Cristo. Por outro lado, os anjos maus não podem separá-los
de Seu amor (Rm 8:35–39). De fato, estes sinistros poderes foram
vencidos fundamentalmente por sua morte (Cl 2:15). Eles estão
aproximando-se ao dia em que até sua habilidade para danificar o
universo de Deus e os corações e as vidas dos que habitam na terra
será suprimida uma vez por todas (1Co 15:24, 25).

A enumeração “tronos ou domínios ou principados ou autoridades”

não significa necessariamente que Paulo está ordenando os anjos


em quatro grupos diferentes, quer em escala ascendente ou
descendente quanto à eminência, como se existissem estas quatro
classes rigorosamente diferenciadas. Não obstante, é possível que
tronos e domínios devam ser considerados como espíritos do trono,
quer dizer, espíritos que habitam numa proximidade imediata ao
trono de Deus (cf.

os querubins, Ap 4:6). Baseados nesta hipótese, os principados e


autoridades, os que em geral são mencionados juntos (Cl 1:16; 2:10,
15; Ef 1:21; 3:10; 1Co 15:24), poderiam ser espíritos de uma posição
inferior. Mas seja como for, o que Paulo está dizendo é isto: «Estes
seres angélicos, sobre os quais os falsos mestres estão fazendo
tanto alarde, ponham o nome que quiserem (Ef 1:21; Fp 2:9, 10), são
meras criaturas,

Colossenses (William Hendriksen)

104

e tendo sido criados por e para Cristo, estão sujeitos a Ele”.

Naturalmente, a inferência é esta: quanto à salvação, vós deveríeis


esperar tudo dEle, somente dEle sozinho, e não dEle e os anjos! 53

17. Agora, se todas as coisas foram criadas por Ele e para Ele (v.

16), isto confirma que Ele é anterior a todas as coisas criadas no


tempo.

De fato, «jamais houve um tempo em que Ele não existiu». Ele «foi
gerado do Pai antes que todos os séculos» (Credo de Niceia). Em
conformidade com isso, o hino continua: E ele é antes que todas as
coisas.

Por conseguinte, Ele é o precursor. A doutrina da preexistência de


Cristo se ensina ou se depreende de passagens como Jo 1:1; 8:58;
17:5; 2Co 8:9; Fp 2:6; Ap 22:13. Ele é, na verdade, o Alfa e o
Ômega, o primeiro e o último, o princípio e o fim. E por sua vez esta
prioridade quanto ao tempo sugere uma preeminência e majestade
com relação a todas as criaturas: E todas as coisas encontram
nele seu coesão. Aqui está sendo defendida a posição central de
Cristo contra aqueles que a rejeitam.
Aquele em relação a quem, por meio de quem e para quem todas as
coisas foram criadas, sustenta todas as coisas. A unidade, ordem e
adaptação evidentes em toda a natureza e história podem rastrear-
se até chegar ao Sustentador ou apoio de todas as coisas (cf. Hb
1:1–3).

Todas as coisas encontram sua coesão; quer dizer, continuam e se


mantêm juntas. 54

53 Quanto a estes tronos, domínios, etc. cf. Enoque eslavo 20:1;


Testamento de Levi 3 ( Ante-Nicene Fathers, vol. VIII, p. 13); e em
Th. W.N.T. os seguintes artigos: Schmitz, θρόνος, III, pp. 160–167,
especialmente p. 167; Michel, κυριότης, III, p. 1096; Delling, _ρχή, I,
pp. 477–488, especialmente pp.

481–483; e Foerster, _ξουσία, II, pp. 559–571, especialmente pp.


568–571.

54 O verbo συνίστημι (junto com o qual também se usam συνιστάνω


e συωιστάω) significa (transitivo): coloco ou faço estar juntos, agrupo
ou junto, levo alguém a outra pessoa; e portanto, apresento uma
pessoa diante de outra, elogio ou recomendo uma pessoa (Rm 16:1)
ou coisa. A palavra às vezes é usada em certo sentido favorável
quando leva a ideia de recomendar — como na passagem tão
conhecida de Rm 5:8 — às vezes num tom desfavorável (tanto para
o sentido favorável como para o desfavorável, veja-se 2Co 10:8,
onde o verbo aparece duas vezes). Aqui em Cl 1:17 o verbo é usado
como intransitivo. A forma que aqui toma é de 3ª. pessoa singular,
perf. at. indic. Cf.

para seu uso intransitivo: Lc 9:32 ( estavam com) e 2Pe 3:5 (


durando ou consistindo de). Cf. no L.N.T.

(A. and G.), p. 798.

Colossenses (William Hendriksen)

105
Por conseguinte, há unidade e propósito na natureza e na história. O

mundo não é um caos, mas um κόσμος, quer dizer, um todo

harmoniosamente organizado. É um universo ordenado, um sistema.

Isto, na verdade, nem sempre está na superfície. A natureza parece


ser sem ordem nem harmonia. No entanto, se olharmos mais de
perto, logo veremos que nos transmite um plano básico. Em todas as
partes existe a adaptação. Para que possam continuar existindo,
certas plantas necessitam certo tipo de insetos definidos. Estes
insetos estão presentes e construídos tão maravilhosamente que
podem realizar sua função. O urso polar pode viver onde há gelo e
neve. É protegido de escorregar-se no gelo porque tem pele até na
sola de suas patas. A mandioca é uma planta que pode viver onde
faz muito calor, num árido deserto, e tudo isso porque, não só tem
raízes que se cravam profundamente na terra em busca de água,
mas também possui folhas formadas de tal maneira que a
evaporação é muito lenta. Nossos pulmões estão adaptados ao ar
que respiramos, e nossos olhos à luz que vemos. Em todo lugar há
coesão.

Isso também é verdade quanto aos acontecimentos que diariamente


são produzidos na história. Aqui também, as coisas não são como
parecem ser. Com frequência pareceria que prepondera a confusão.
Não está à vista nenhuma a mão que guia todo o processo. Pelo
contrário, ouvimos gritos de guerra e gemidos de angústia. Além
disso, os periódicos estão cheios de relatos sobre roubos,
homicídios, assaltos e antagonismo racial. Se compararmos o
mecanismo da criação a uma máquina, poderíamos dizer que os
dentes de sua engrenagem não estão engrenando. Certamente, virá
o dia no vasto futuro, em que tudo será harmonia: “O lobo habitará
com o cordeiro, e o leopardo com o cabrito se deitará; o bezerro e o
leão e a besta doméstica andarão juntos, e uma criança os
pastoreará … Não farão mal nem dano algum em todo meu santo
monte; porque a terra estará cheia do conhecimento do Senhor,
como as águas cobrem o mar” (Is 11:6–9). Mas esse tempo ainda
não chegou. Agora tudo é caos. Mas é assim realmente? Não
deveríamos comparar nosso mundo a um tecido, cujas formas
inferiores não mostram

Colossenses (William Hendriksen)

106

um modelo inteligível, mas que suas partes superiores revelam


beleza e desígnio? Ou a um aeroporto internacional? Embora os
aviões, indo e vindo constantemente, aturdem-nos pensando que em
qualquer momento pode-se produzir uma colisão, contudo realmente
não precisamos reter a respiração, uma vez que o homem da torre
de controle dirige cada um para que separe ou aterrisse. Assim
também, todas as criaturas encontram sua coesão em todos os seus
movimentos ao longo da história. E aquilo que as mantém unidas
não é o acaso ou o destino cego ou as leis da natureza nem sequer
“as nove esferas ou globos” do Sonho de Cipião. Pelo contrário,
“todas as coisas encontram nele sua coesão”.

O Filho do amor de Deus é quem tem em Suas poderosas mãos as


rédeas do universo e não lhes permite nem por um momento que
escapem de seu punho (cf. Ap 4 e 5). E embora o homem carnal
considere isso como um falatório piedoso, o homem de fé a proclama
junto com o escritor inspirado de Hebreus. “Mas agora ainda não
vemos todas as coisas sujeitas a ele. Mas contemplamos a … Jesus,
coroado de glória e de honra” (Hb 2:9). O crente sabe que embora o
governo de Cristo não tenha sido ainda estabelecido em cada
coração humano, contudo Seu governo soberano é uma realidade
até no tempo presente (Rm 8:28; cf.

C.N.T. sobre Fp 1:12). E lá sobre o mar de cristal, a igreja triunfante


louvará e glorificará para sempre a Deus pelas Suas poderosas
obras e pelos Seus caminhos (Ap 15:1–4).

Resumindo, o hino nos ensinou que com relação a todas as

criaturas, Cristo é o primogênito (v. 15), o ponto de referência, o


agente, fim (v. 16), precursor e sustentador — governante (v. 17).
Colossenses (William Hendriksen)

107

B. Na redenção - Cl 1:18-20

18. A seção que mostra a preeminência do Filho na esfera da criação


terminou. Aqui, no versículo 18, começa o parágrafo que descreve
sua idêntica soberania na esfera da redenção. Lemos, pois: E ele é a
cabeça do corpo, a igreja. Esta expressão é uma novidade nas
cartas de Paulo, quer pensemos que pertence originalmente a ele ou
que foi tomada aqui de algum hino ou dito familiar. Não se encontra
em nenhuma parte das epístolas mais anteriores, tais como Gálatas,
1e2

Tessalonicenses, 1 e 2 Coríntios ou Romanos. Não obstante, seria


indiscreto por isso dizer que Paulo não pôde ter sido o autor ou
confirmador da ideia de que Cristo é, com efeito, a cabeça do corpo,
ou seja, da igreja. Certamente, nas primeiras cartas o apóstolo não
escreveu a respeito de Cristo como a cabeça da igreja, mas acerca
da igreja como o corpo de Cristo (Rm 12:5; 1Co 12:12–31,
especialmente v. 27). Seu propósito era mostrar que no único corpo
havia muitos membros (“pés”,

“mãos”, “orelhas”, “olhos”); em outras palavras, que naquele


organismo da igreja haviam muitas funções e dons distribuídos entre
um bom número de membros, e que cada “membro” devia usar estes
dons para o benefício do corpo inteiro. O apóstolo não declarou
especificamente, nesse então) que a cabeça deste corpo era Cristo.
Este não foi o ponto em questão nas primeiras cartas. No entanto,
como já vimos, a verdade que devia ser sublinhada em Colossos era
claramente a da supremacia ou preeminência de Cristo. É por isso
que em Colossenses, antes que nas epístolas anteriores, este
aspecto particular da doutrina é enfatizado.

Não obstante, não se pode manter com certeza que a proposição


“Cristo é a cabeça da igreja” tenha sido absolutamente estranha ao
pensamento de Paulo antes do tempo em que escreveu as epístolas
do cativeiro. Não se supõe que um corpo deve ter uma cabeça?

Além disso, não escreveu o apóstolo, “ser Cristo a cabeça de todo


homem” (1Co 11:3)? Agora, se Cristo é a cabeça de todo homem na
igreja não é também a cabeça da igreja?

Colossenses (William Hendriksen)

108

Como cabeça de Sua igreja, Cristo lhe dá vida e crescimento (Cl


2:19; cf. Ef 4:15, 16). Ele é sua cabeça orgânica. Como sua cabeça
também exerce autoridade sobre a igreja; na verdade, sobre a
totalidade da criação, para o benefício da igreja (Ef 1:20–23). Ele é
sua cabeça governante. É duvidoso que esteja totalmente ausente
alguma destas duas ideias quando a Cristo é chamado cabeça da
igreja, apesar de que algumas vezes, conforme o indicar o contexto,
uma delas receba a ênfase. Numa passagem como Ef 5:23, 24
ambas as ideias ( crescimento e direção) são destacadas.

Agora, se o Filho de Deus é a cabeça orgânica e governante da


igreja, então a igreja não depende de forma alguma de nenhuma
criatura, anjo ou o que seja. Esta é uma implicação clara contra os
mestres do erro. Não recebe a igreja tanto seu crescimento como
sua direção de seu Senhor vivo? Não é fortalecida pelo Seu poder e
governada pela Sua palavra e Espírito? Portanto, não é verdade que
em Cristo tem tudo o que necessita, e que sem Ele nada pode fazer?
Cf. Jo 15:5, 7.

“Cristo, encontro todo em Ti,

E não necessito mais”

(Carlos Wesley, em “Carinhoso Salvador”)

E poderia haver alguma ilustração melhor sobre a relação que Cristo


tem com Sua igreja que a ideia que está atrás desta figura, ou seja, a
relação que guarda a cabeça humana com o corpo? O
desenvolvimento do conhecimento científico confirmou a adequação
da figura que a igreja primitiva e Paulo usaram. Num indivíduo
humano, o corpo deve, em grande medida, à cabeça sua vida
vigorosa e seu crescimento (a relação orgânica). Da glândula
pituitária (a hipófise), que é abrigada numa pequena cavidade na
base do crânio, vem o hormônio do crescimento (e outros hormônios
mais). Sabe-se que esta hormônio está intimamente relacionado à
saúde e o crescimento dos tecidos conectivos, cartilagens e ossos.

Colossenses (William Hendriksen)

109

Consideremos também as demais funções da cabeça, as que se


relacionam em grande medida à direção. Na cabeça estão
localizados principalmente os órgãos dos sentidos especiais. O
cérebro recebe estímulos do mundo exterior (indiretamente) e do
interior do corpo. O

cérebro organiza e interpreta estes estímulos. O cérebro pensa.


Também reage, voluntária e involuntariamente. Desta forma, guia e
dirige as ações do indivíduo. Entre outras coisas, no cérebro estão
localizadas as áreas que controlam as várias partes do corpo. O
cerebelo foi chamado

“o coordenador e harmonizador dos movimentos musculares”. A


medula oblonga [ou bulbo] controla ações como pestanejar, espirrar,
tossir, mastigar, mamar, engolir, etc. Deste lugar também o centro
cardíaco regula a velocidade das palpitações do coração, enquanto o
centro respiratório se encarrega da atividade que têm os órgãos
respiratórios.

Assim, pois, quando o triúno Deus criou o corpo humano com sua
cabeça orgânica e diretriz, construiu-a de tal forma que pudesse
servir como um símbolo excelente da cabeça orgânica e diretriz da
igreja, ou seja, o Senhor Jesus Cristo.
Falando deste último, o “hino” continua dizendo, o qual é o
princípio, o primogênito dos mortos. Por meio de Sua
ressurreição ( para nunca mais morrer), Cristo colocou o fundamento
daquela vida santificada e dessa esperança e certeza na qual se
regozijam os seus (Cl 3:1–17; 1Pe 1:3ss.). Sua ressurreição é
também o começo, princípio ou causa da gloriosa ressurreição física
da qual desfrutarão. Portanto, a afirmação “porque eu vivo, vós
também vivereis” (Jo 14:19) é certa de qualquer ponto de vista. Ele é
o precursor, Ele tem as chaves da morte e do Hades. Tem autoridade
sobre a vida e a morte (Rm 8:29; 1Co 15:20; Hb 2:14, 15; Ap 1:5).
Ele é quem “por um lado, derrotou completamente a morte, e por
outro, trouxe à luz a vida e a incorruptibilidade por meio do
evangelho” (2Tm 1:10). Tudo isso é certo para que em todas as
coisas ele possa ter a preeminência. É lógico que Aquele que é
primogênito, ponto de referência, agente, meta, precursor e
sustentador (governador) na esfera da criação (vv. 15–17); e que
também é cabeça do corpo,

Colossenses (William Hendriksen)

110

princípio e primogênito dos mortos no reino da redenção (v. 18),


tenha o direito ao título “Aquele que tem a preeminência — a
soberania divina

— em todas as coisas, isto é, entre todas as criaturas”.

19. Note-se, no entanto, as palavras, “para que … ele possa ter”.

Estas palavras nos mostram que esta elevada honra, que é


possessão do Filho, foi um assunto de desígnio, do beneplácito do
Pai. Portanto, o texto continua, Porque nele aprouve (a Deus) ter
habitado toda a plenitude. 55

Este deleite que o Pai encontra no Filho era manifesto mesmo


durante a antiga dispensação, sim, mesmo antes da fundação do
mundo (Sl 2:7, 8; Jo 17:5; Ef 1:9). Vez após vez manifestou-se
durante o período em que Cristo permaneceu no mundo (Mt 3:17;
17:5; Jo 12:28).

55 Com a maioria dos tradutores, tanto antigos como modernos,


coloco a “Deus” ou ao “Pai” (o qual se subentende) como sujeito do
verbo aprouve. As razões são as seguintes: (1) Em outra linha
poética (Lc 2:14) o substantivo da mesma raiz, ou seja, boa vontade,
significa

“boa vontade da parte de Deus” (o qual se subentende). Cf. também


Fp 2:13, onde “boa vontade”

significa “sua (de Deus) boa vontade”. Também Ef 1:5 refere-se


claramente à boa vontade do “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo”.

(2) Afinal, suprir mentalmente a palavra “Deus” ou “o Pai” não é algo


que cause muita dificuldade uma vez que no contexto precedente
fez-se referência ao Pai em conexão com o Filho (veja-se os vv.

12, 13, 15). No versículo 13 Jesus é chamado “o Filho de seu amor”,


e este Filho é descrito no v. 15

como “a imagem do Deus invisível”.

A outra possibilidade (apoiada por Abbott, Lenski, C.F.D. Moule,


Ridderbos), a saber, a de traduzir “porque agradou à plenitude
habitar nele” (ou algo semelhante) é gramaticalmente possível.

Resisto a adotar esta tradução pelas seguintes razões:

(1) Em nenhuma parte do Novo Testamento Paulo personifica a


plenitude desta forma. Temos direito de lhe atribuir a Paulo — ou à
igreja antiga, se é que Paulo está citando um hino — o estilo de
Clemente de Alexandria ou de Irineu?

(2) Quase não seria correto sustentar que em Cl 1:19 (se adotarmos
a tradução alterna) temos exatamente a mesma construção que a
que se registra em Cl 2:9, quer dizer, que tanto em Cl 1:19
como em Cl 2:9 a plenitude é o sujeito de uma forma do verbo
habitar ou habitar. Antes, acontece o contrário, pois quando Cl 1:19
se traduz “porque agradou à plenitude habitar nele”, o substantivo
plenitude não é diretamente o sujeito de habitar, mas de agradou.
Desta forma, então, se atribui à plenitude um caráter pessoal muito
mais definido. Por isso, pois, qualquer argumento que se tire de Cl
2:9 estará em direção oposta, uma vez que em Cl 2:9 a plenitude é,
na verdade, sujeito de uma das formas do verbo morar ou habitar, de
la misma forma que en Col. 1:19 (siempre que se traduzca,

“porque nele aprouve a Deus ter residido toda a plenitude”). Neste


caso o substantivo πλήρωμα é o sujeito do infinitivo κατοικ_σαι.

Colossenses (William Hendriksen)

111

Com efeito, aprouve a Deus que em Seu Filho habitasse toda a


plenitude.

Os poderes e atributos da deidade não se repartiriam entre uma


multidão de anjos. A supremacia ou soberania divina, seja em parte
ou como um todo, não seria entregue a eles. Pelo contrário, em
conformidade com o beneplácito de Deus, desde toda a eternidade a
plenitude da divindade, a plenitude da essência e glória de Deus (a
qual é a fonte de graça e glória para os crentes), reside no Filho do
seu amor, nEle somente, não nEle e nos anjos. Habita nAquele a
quem servimos como nosso exaltado mediador, e essa plenitude se
manifesta tanto na criação como na redenção.

Passagens explicativas:

Jo 1:16 “Porque de sua plenitude recebemos graça sobre graça”.

Cl 2:3, “em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e


da ciência”.

Cl 2:9, “Porque nele reside corporalmente toda a plenitude56 da


deidade”.
56 Muito tem-se escrito a respeito do termo plenitude (πλήρωμα). O
significado da palavra deve ser determinado pelo contexto em cada
caso separadamente. De acordo com esta regra poderemos
reconhecer os vários matizes de significado que a seguir
colocaremos, cada um dentro de seu próprio marco. Os seguintes
significadas resultantes merecem nossa atenção: Mt 9:16 e Mc 2:21:
o emplastro que tampa a ruptura de um vestido.

Mc 6:43 e 8:20: cestos cheios.

Jo 1:16: a infinita plenitude da qual os crentes recebem graça sobre


graça.

Rm 11:12: o número total dos judeus escolhidos (cf. Rm 11:2, 5).

Rm 11:25: o número total dos gentios escolhidos.

Rm 13:10: o amor como o cumprimento da lei; isto é, considera-se o


amor como aquilo que satisfaz completamente os requisitos da lei.

Rm 15:29: a soma total ou a abundância de bênçãos comunicadas


por Cristo.

1Co 10:26 (numa citação do Sl 24:1; LXX 23:1): a soma total ou


abundância de coisas que a terra produz.

Gl 4:4: a quantidade total de tempo para a primeira vinda de Cristo,


conforme estava predeterminado no plano de Deus e em
conformidade com a necessidade imperativa que esta vinda satisfez,
a esperança messiânica que cumpriu e a oportunidade sem par que
proveu.

Ef 1:10: a plenitude dos tempos, a nova dispensação.

Ef 1:23 (muito controvertido). Entre as muitas interpretações que há


encontram-se estas três: (1) a igreja como aquilo que Cristo
completa.

Colossenses (William Hendriksen)


112

(2) a igreja como aquilo que completa a Cristo, estando Ele mesmo
incompleto sem ela, assim como o noivo o está sem a noiva.

(3) Cristo como a plenitude de Deus, aquele que o cheia tudo.

Uma discussão mais detalhada pertence ao Comentário sobre


Efésios.

Ef 3:19 e 4:13: o fruto total da obra de Cristo, o qual é comunicado


por Deus aos crentes; a maturidade espiritual que Deus quer;
maturidade espiritual.

Cl 1:19 e 2:9: a plenitude da essência e glória divinas, consideradas


como a fonte de intermináveis bênçãos para os crentes.

É muito provável que seja certa a teoria que afirma que o uso
frequente que Paulo faz do termo (embora não o próprio termo)
deveu-se, ao menos em parte, a que o usavam os falsos mestres. O

substantivo plenitude aparece não menos de seis vezes nos dez


capítulos de Efésios e Colossenses, quase a mesma quantidade de
vezes que aparece nos setenta e sete capítulos das epístolas
restantes.

Além disso, há um forte contraste entre o número de vezes que o


verbo encher, completar, cumprir ocorre em Colossenses, Efésios e
Filipenses (as epístolas do cativeiro mais intimamente relacionadas)
com as poucas vezes que aparece em outras epístolas. Não
colocaria Paulo em sua carta esta parte do

«hino» devido precisamente a que continha a palavra plenitude em


conexão com Cristo? E não estaria, talvez, procurando dizer, «a
plenitude de Deus (e por conseguinte a verdadeira fonte da plenitude
de Seu povo) sobre a qual tanto falavam os mestres do erro,
encontra-se em Cristo, e nele só»? Apesar de que não podemos
estar totalmente seguros, devemos admitir a possibilidade de que
esta foi uma das razões pela qual Paulo cita estas linhas aqui ao
combater a heresia de Colossos. Lightfoot crê que os judaizantes
essênios tiraram a palavra plenitude e seus derivados de uma fonte a
Palestina, e que provavelmente esteja representando a raiz hebraica
ml’ (cuja tradução na LXX é precisamente essa) e como também a
raiz aramaica da mesma origem, como parece indicá-lo a Peshito.

Neste contexto, devemos mencionar três fatos adicionais:

(1) Quanto ao termo πλήρωμα em si mesmo, nem Paulo nem os


escritores dos antigos hinos dependiam dos falsos mestres para
obter tal Palavra. Os primeiros cristãos estiveram empapados da
terminologia do Antigo Testamento, no qual vez após vez é usado o
termo plenitude; veja-se como exemplos Sl 24:1 (LXX 23:1); 50:12
(LXX 49:12); 89:11 (LXX 88:12); 96:11 (LXX 95:11); 98:7

(LXX 97:7). (Até esse ponto posso concordar com E. Percy, op.cit. ,
p. 76ss.).

(2) A teoria que afirma que a frequência com que aparece o termo
em Efésios e Colossenses tem algo a ver com o fato de que era
usada pelos falsos mestres, de maneira nenhuma é uma indicação
de que já tão cedo tinha o sentido que foi dado nas elaboradas
especulações do gnosticismo do segundo século.

(3) Pelo fato de que o significado de uma palavra depende do uso


que lhe é dado num dado contexto, uma longa argumentação quanto
ao problema de que se πλήρωμα basicamente significa aquilo que é
cheio ou aquilo que enche não tem realmente proveito algum.

Para uma discussão adicional do tema, veja-se:

J.B. Lightfoot, op. cit. , pp. 257–273; J.A. Robinson, “The Church as
the Fulfilment of the Christ: a Note on Ephesians 1:23”, Exp, 5th
series, 7 (1898), pp. 241–259; C.F.D. Moule, op. cit. , pp. 164–169; y
Delling, Th. W.N.T. vol. VI, pp. 297–304.

Colossenses (William Hendriksen)

113
20. Agora, tanto em Cl 2:9, 10 como aqui em Cl 1:19, 20 menciona-
se a plenitude que habita em Cristo com fins práticos. É uma fonte de
bênçãos. Portanto, aqui em Cl 1:19, 20 somos informados que a
Deus o Pai lhe aprouve ou Se deleitou que no Filho do seu amor
habitasse toda a plenitude, E por meio dele reconciliar todas as
coisas consigo mesmo, 57

fazendo a paz mediante o sangue de sua cruz; por meio dele, 58


sejam as coisas que estão sobre a terra, ou as coisas que estão
nos céus. Não só foram criadas todas as coisas “por meio dele”, isto
é, por meio do Filho do amor de Deus (v. 16), mas também todas as
coisas (em certo sentido que logo explicaremos) foram reconciliadas
“por meio dele” (v. 20). Em ambos os casos o todas as coisas tem o
mesmo significado: todas as criaturas sem nenhuma exceção:

«Sussurra um nome, ó tão precioso, ao longo das nuvens,

esse nome cobre o céu e a terra em grande harmonia».

Isto se aproxima de uma tradução literal das primeiras linhas de um


hino holandês:

“Daar ruist langs de wolken een lieflijke naam,

Die hemel en aarde verenigt te zaam”.

Alguns objetaram estas linhas por razões teológicas. 59

57 ε_ς α_τόν deve ser escrevido (ou lhe dar o sentido de) ε_ς α_τόν.
Paulo tinha o costume de dizer que a reconciliação era a Deus (Rm
5:10 duas vezes; 2Co 5:18, 19, 20). O fato de que nestas passagens
(como também em uma sem significado teológico 1Co 7:11) use-se o
verbo καταλλάσσω

ao que corresponde o substantivo καταλλαγή (Rm 5:11; 11:15; 2Co


5:18, 19), enquanto em Cl 1:20, 21 e Ef 2:16 (e em nenhuma outra
parte do Novo Testamento) é usado o verbo composto
_ποκαταλλάσσω, não danifica em nada este argumento. Além disso,
o sujeito tácito do v. 19 é Deus o Pai (veja-se a nota 55 acima).
58 A frase “por meio dele” que aqui se repete, embora não apareça
em alguns manuscritos importantes, provavelmente é genuína. Pode
considerar-se como uma repetição que busca dar ênfase à ideia.

Talvez foi omitida em alguns tantos precisamente por ser uma


repetição.

59 Pode esta ser a razão por que a tradução tão excelente (em
outros aspectos) e tão popular do Rev.

W. Kuipers (segundo se registra no hino Nº. 199 do The New


Christian Hymnal) tem o seguinte texto:

“Escuto no ar, sob a abóbada celeste,

As doces notas do nome mais resplandecente e verdadeiro”?

Obviamente, esta não é a tradução correta das linhas em holandês,


embora provavelmente em inglês sejam poesia excelente.

Colossenses (William Hendriksen)

114

Pessoalmente, não vejo razão para rejeitar a ideia expressa neste


poema. Teríamos que rejeitar também Cl 1:20! Tudo é assunto de
interpretação. É verdade que neste momento o céu e a terra não
estão unidos, e jamais serão unidos no sentido de que todos os
seres racionais da totalidade do universo se estão submetendo agora
com alegria de coração, ou que algum dia no futuro alegremente se
submeterão ao governo de Deus em Cristo. Esta interpretação
universalista de Cl 1:20 é contrária às Escrituras (Sl 1; Dn 12:2; Mt
7:13, 14; 25:46; Jo 5:28, 29; Fp 3:18–21; 2Ts. 1:3–10; e uma
multidão de passagens mais).

Provavelmente Orígenes foi o primeiro cristão universalista. Em sua


jovem obra De Principiis sugere esta ideia de uma restauração
universal e final para todos. Em seus escritos seguintes parece
implicá-lo aqui e ali, embora obscureça a ideia ao sugerir uma
constante sucessão de quedas e restaurações. Não obstante, teve
muitos seguidores, entre os quais alguns se expressaram de forma
muito mais direta. Faz algum tempo um pastor disse à sua
congregação,

“No final todos serão salvos. Tenho esperanças até para o diabo”.

O verdadeiro significado de Cl 1:20 é provavelmente o seguinte: O

pecado arruinou o universo. Destruiu a harmonia que havia entre


uma criatura e outra, e também a que havia entre todas as criaturas
e seu Deus. No entanto, pelo sangue da cruz (cf. Ef 2:11–18) o
pecado, em princípio, foi vencido. As demandas da lei foram
satisfeitas e sua maldição foi sofrida (Rm 3:25; Gl 3:13). Por
conseguinte, a harmonia foi restaurada. Por meio de Cristo e Sua
cruz o universo é devolvido ou restaurado à sua adequada relação
com Deus, no sentido de que Cristo foi exaltado à direita do Pai
como recompensa de Sua obediência. Dessa posição de autoridade
e poder governa todo o universo para o proveito de Sua igreja e a
glória de Deus. Esta interpretação coloca a presente passagem em
harmonia com as outras passagens afins, escritos também durante
este mesmo cativeiro. Note-se que a expressão “as coisas que estão
sobre a terra ou as coisas que estão nos céus” (ou alguma muito

Colossenses (William Hendriksen)

115

semelhante) não só aparece aqui em Cl 1:20, mas também em Ef


1:10 e Fp 2:10.

Existe, naturalmente, uma diferença na maneira como as diversas


criaturas se submetem ao governo de Cristo e são “reconciliadas
com Deus”. Aqueles que são e permanecem corrompidos, sejam
homens ou anjos, submetem-se amarga e involuntariamente. No
caso deles, a paz (quer dizer, a harmonia) é imposta, não recebida
de boa vontade. Mas não só seus maus propósitos estão sendo
constantemente controlados para que deles se produza o bem, mas
também eles mesmos, estes seres corrompidos, foram, em princípio,
despojados de seu poder (Cl 2:15).

São postos sob sujeição (1Co 15:24–28; cf. Ef 1:10, 22), e “o Deus
de paz esmagará a Satanás debaixo de vossos pés” (Rm 16:20). Por
outro lado, os anjos bons se submetem alegre e ansiosamente. O
mesmo acontece com os homens redimidos. Este grupo inclui aos
membros da igreja de Colossos até onde são verdadeiros crentes,
pensamento ao que Paulo dá expressão nos seguintes versículos.

4. O AMOR RECONCILIADOR DO FILHO PARA OS


COLOSSENSES E O

DEVER QUE DELE SE DEPREENDE, CONTINUAR NA FÉ - CL


1:21–23

21, 22a. E vós, que uma vez fostes afastados e hostis em


disposição, como o mostravam vossas más obras, ele em seu
corpo de carne, através de sua morte, vos reconciliou. 60

60 Em conexão com o pronome pessoal no acusativo, que no


original está no começo do v. 21, a saber _μ_ς ( vós), e com relação
à forma verbal (se é que há uma), com a qual está conectado este
pronome, seja como objeto direto ou outra forma, as possibilidades
que requerem atenção são as seguintes: (1) Que este pronome é
modificado no v. 22 pelo particípio _παλλαγέντες (pas. aor. nom. pl.).
Pelo que, então, traduziríamos, “e vós, que uma vez fostes estranhos
e hostis … mas que agora tendo sido reconciliados …”

Objeções: a. Nesse caso teria sido mais natural um particípio no


acusativo que em nominativo. b.

O apoio textual para esta leitura não tem muito peso (D G it Ir). c. No
entanto ficaria a pergunta: do que forma verbal são objetos diretos o
pronome e seu particípio modificativo? Pelo fato de que essa
pergunta surge de novo em conexão com o ponto (2) é omitida aqui.

Colossenses (William Hendriksen)


116

(2) Que este pronome é o objeto direto do infinitivo aoristo


παραστ_σαι del v. 22. Pelo qual, a tradução seria então, “para vos
apresentar”. A oração que começou no v. 9 continua neste caso até o
final do v. 23. O v. 22a (νυν_ … θανάτου) é um parêntese na oração.
Portanto, temos “porque nele aprouve (a Deus) ter residido toda a
plenitude, e por meio dele reconciliar todas as coisas consigo mesmo
… e vós, que uma vez fostes estranhos e hostis em disposição,
como o mostravam vossas más obras (mas agora fostes
reconciliados em seu corpo de carne mediante sua morte), para vos
apresentar santos, sem mancha e irrepreensíveis diante de si
mesmo …” É evidente que aqui o primeiro vós (aquele que está ao
princípio do v. 21) repete-se no v. 22 para desenredar a construção.
Também é claro que o verbo que indica a obra de reconciliação e
que é incluído dentro do parêntese é _ποκατηλλάγητε: fostes
reconciliados (ind. pas. aor. 2 pes. pl.).

Objeções: a. É improvável que uma oração que já é bastante longa


(vv. 9–20) tenha sido alongada ainda mais mediante a adição de três
versículos adicionais, b. Já se demonstrou que os vv. 15–20

formam uma unidade literária, provavelmente um antigo hino, uma


unidade à qual não pertencem os vv. 21–23.

c. A ideia principal dos vv. 15–20, ou seja, a preeminência de Cristo


na criação e na redenção, não continua nos vv. 21–23. A atenção é
mudada agora à participação que os colossenses têm nesta
redenção e à responsabilidade que este fato coloca sobre eles.

(3) Que este pronome é o objeto direto do infinitivo aoristo


_ποκαταλλάξαι do v. 20. Portanto, a tradução seria, “para vos
reconciliar”. A oração termina neste caso no final do v. 21. Portanto,
temos,

“… porque nele aprouve (a Deus) ter residido toda a plenitude, e por


meio dele reconciliar todas as coisas consigo mesmo … sejam as
coisas que estão sobre a terra ou as coisas que estão nos céus, e
(reconciliar) a vós, que uma vez fostes alienados e hostis em
disposição, como o mostravam vossas más obras”.

Objeções: veja-se a letra b. e c. sob o ponto (2) acima; e em certa


medida a letra a. Moule, op. cit. , p. 72, está certo quando afirma que
esta reconstrução faz do v. 21 “um pensamento posterior bastante
torpe em relação ao v. 20”.

(4) Que o pronome não está conectado com nenhuma forma verbal,
mas sim foi deixado como suspenso. O que o apóstolo quis dizer foi
“e ele vos reconciliou”, mas nunca chegou a terminar a ideia (ou, não
chegou a “ditá-la”). Em lugar disso, usou um indicativo passivo
aoristo, “fostes reconciliados” (_ποκατηλλάγητε), v. 22.

A favor desta teoria foram apresentados os seguintes argumentos: a.


Não é uma raridade em Paulo que antes de ter expresso
completamente uma ideia, já tenha sua mente repleta com outra.
Paulo tênia uma mente muito prolífera e rica.

b. A leitura “fostes reconciliados” tem mais apoio textual P46 B 33


Efraim.

c. É muito mais fácil explicar por que é que “ele vos reconciliou” (o
qual eliminaria o anacoluto) tomou o lugar de “fostes reconciliados”,
que vice versa.

Estes argumentos são excelentes.

(5) Que o pronome no acusativo é tão somente o objeto direto do


verbo _ποκατήλλαξεν, reconciliou (ind. at. aor. 3ª. pes. s.).

Fundamento desta afirmação:

a. Esta leitura está apoiada pela maioria dos manuscritos e versões.


— No entanto, poderia fazer-se a pergunta sobre se tal evidência
não deveria ser mais de peso que de números.

Colossenses (William Hendriksen)


117

O apóstolo agora testifica com alegria que os colossenses também


foram feitos recipientes deste maravilhoso dom da reconciliação,
uma reconciliação que para os homens cujos corações receberam a
Cristo tem um significado muito mais precioso e belo que para o
mundo em geral.

Paulo lembra aos colossenses a grande mudança que ocorreu em


suas vidas, para que esta lembrança faça com que a simples ideia
de voltar à sua antiga maneira de vida (cf. Cl 3:7) seja-lhes terrível. O
significado é:

“estivestes separados de Cristo, alienados da comunidade de Israel,


e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem
Deus no mundo … muito longe … tendo o entendimento
entenebrecido, alienados da vida de Deus” (Ef 2:12, 13; 4:18). Este
estado de alienação, no entanto, não era simplesmente devido à
ignorância ou inocência. Não existem pagãos inocentes! Pelo
contrário, eles eram estranhos e hostis em disposição. Era sua
própria culpa que tinham estado e haviam permanecido por muito
tempo “muito longe”, porque eles efetivamente odiavam a Deus; e
quando Deus, através da consciência e a revelação na natureza,
deu-Se a conhecer em certa medida, eles em sua hostilidade

“suprimiram a verdade pela injustiça” (Rm 1:18–23). Semelhante


hostilidade humana indesculpável (a qual é por natureza a condição
do pecador) merece a ira de Deus (Rm 1:18; Cl 3:6). Portanto, os
pecadores b. Esta leitura dissolve o problema gramatical. Já não
haveria nenhuma ruptura na sequência gramatical. — Este
argumento tem pouco peso, uma vez que ainda fica em pé a objeção
(4) c. Por isso, a possibilidade Nº. (5) só pareceria ser uma solução
para procurar tornar as coisas mais fáceis, algo que cortaria o nó
górdio.

c. Em Ef 2:1 aparece um pronome no acusativo (_μ_ς) bastante


semelhante (“e vós que estáveis mortos por causa de vossos delitos
e pecados”); este pronome também é deixado como supendido, mas
é “resgatado” depois pelo aor. indic. ativo “deu vida juntamente com
Cristo”, v. 5. Se Paulo usou em Efésios um indicativo ativo por que
não pode ocorrer o mesmo em Colossenses? — Este argumento
provavelmente tem algum valor.

Conclusão

Devemos escolher entre o ponto (4) ou o (5). Em ambos os casos


Paulo diz ou tentou dizer, “ele vos reconciliou”. Devido a isto,
provavelmente seria correto deixar no texto a leitura mais comum, a
qual evita o anacoluto, apesar de que não dissolve o problema
mencionado em (4) b. e c. Por conseguinte, devemos dar por
sentado que seria inteiramente possível basear totalmente a
tradução no ponto (4), e reter assim o anacoluto.

Colossenses (William Hendriksen)

118

são por natureza “filhos da ira” (Ef 2:3). Além disso, a disposição
interior de aversão a Deus e de antipatia à voz da consciência que
primeiro tinha caracterizado os colossenses, também se tinha
manifestado a si mesma em obras perversas, obras como as que se
enumeram bem especificamente em Cl 3:5–9.

Mas agora tudo isso era coisa do passado, pelo menos basicamente.

Por meio do sangue do Filho do amor de Deus foi feita a paz. Ele,
quer dizer, o Filho do amor de Deus, 61 em Seu corpo de carne
(essa foi a esfera da reconciliação), e por meio de Sua morte (esse
foi o instrumento), fez com que os colossenses voltassem a uma
correta relação com Deus. Quando se fala de uma volta, não se quer
dizer com isso que houve um tempo há muitos, muitos anos, em que
os colossenses foram cristãos, mas o sentido é que para eles a
implantação da paz entre o coração paternal de Deus e a alma do
pecador foi um voltar outra vez ao estado de retidão em que Deus
tinha criado o homem no princípio.
(Naturalmente que a graça introduz o pecador resgatado a uma
condição que é muitíssimo melhor que a que havia antes da Queda).
Pela graça soberana de Deus, o filho pródigo volta ao seu lar do qual
tinha sido banido ou afastado (veja-se o v. 21; também Lc 15:11–24).
Esse é o significado da reconciliação. Deus é reconciliado com o
pecador e o pecador com Deus mediante a morte expiatória de
Cristo. «O Deus reconciliado justifica o pecador que aceita a
reconciliação, e de tal maneira opera em seu coração mediante o
Espírito Santo que o pecador também ponha de lado sua perversa
separação de Deus, e assim participe dos frutos da expiação perfeita
de Cristo”. 62

Note-se mais uma vez a expressão “em seu corpo de carne”, um


hebraísmo que significa o corpo humano de Cristo, e por extensão, o
total de sua existência física aqui na terra, na qual satisfez as
demandas 61 O modificativo “em seu corpo de carne através de sua
morte” mostra claramente que o sujeito da oração (vv. 21–23) não é
Deus (como o sustenta Lightfoot), mas Cristo. Assim também F.W.
Beare, op. cit. , p. 175, e Lenski, op. cit. , p. 70, muito enfaticamente.

62 L. Berkhof, Teología sistemática, p. 443 (edição T.E.L.L. 1969).

Colossenses (William Hendriksen)

119

da lei e levou seu castigo. (Cf. Lc 22:19; 1Co 11:27; Heb. 10:10; 1Pe
2:24) É provável que aqui se esteja fazendo um contraste entre
“corpo de carne” 63 e “corpo, a igreja” do versículo 18. Deve
acrescentar-se, no entanto, que o Espírito Santo, quem inspirou
Colossenses (como também o resto da Escritura), previu o tempo em
que os docetas ensinariam que Cristo apareceu aos homens num
corpo espiritual, e pelo fato de que ele não tinha um corpo físico, só
pareceu sofrer e morrer numa cruz. Cl 1:22

pronuncia o “desmentido” a essa teoria.


22b. Agora se passa a declarar o propósito da obra reconciliadora do
Filho, na forma que ela afetou os colossenses: para vos apresentar
santos e sem mancha e irrepreensíveis diante de si mesmo. 64
Note-se bem: santos, isto é, limpos de todo pecado e separados
totalmente para Deus e seu serviço; sem mancha: sem nenhum
defeito (Fp 2:15), como um sacrifício perfeito; e irrepreensíveis: sem
defeito absolutamente (1Tm 3:10; Tt 1:6, 7).

A apresentação da qual aqui se fala deve entender-se como


definidamente escatológica, a saber, como referindo-se à grande
consumação, quando Cristo voltar sobre as nuvens em glória. Isto se
depreende da cláusula condicional “se, na verdade, continuam na fé
…”

É reconfortante saber que não só os apóstolos olharam para frente


com uma alegria antecipada ao tempo em que apresentariam o fruto
da graça de Deus e da obra deles (sendo colaboradores de Deus
1Co 3:9), como uma virgem pura a Cristo, o noivo (2Co 11:2; Fp
1:10; 2:16; 1Ts 2:19, 63 Sobre o significado da palavra carne, veja-se
C.N.T. sobre Fp 1:22, nota 55.

64 A relação que a frase “diante dele” tem com o sujeito da oração


(veja-se a nota 61 de acima) e a semelhança que Cl 1:22b tem com
Ef 5:27, leva-me à conclusão de que “diante dele” significa (ou pode
escrever-se) “diante de si mesmo” (isto é, diante do Filho do amor de
Deus), da mesma forma que no v. 20 (veja-se a nota 57 de acima) as
palavras “com ele” significam “consigo mesmo” (isto é, com Deus).
Em conexão com isso, notemos que enquanto Paulo costuma afirmar
que a reconciliação é a Deus, no entanto, a apresentação às vezes é
descrita como feita a Cristo (Ef 5:27; 2Co 11:2) e outras vezes como
feita a Deus (Rm 14:10); e algumas vezes não indica claramente a
quem os crentes são apresentados (Cl 1:28; 2Co 4:14). É evidente
que em vista de passagens como Jo 14:9 e 1Jo 2:23, existe pouca
diferença se Cristo apresenta Seus filhos diante de Si mesmo ou a
Deus. Na verdade, não pode fazer uma coisa sem fazer a outra.

Colossenses (William Hendriksen)


120

20; 1Jo 2:28), mas também o próprio Cristo o faz (Ef 5:27). Também
a Ele são aplicáveis as palavras de Sf 3:17, “alegrar-se-á sobre ti
com alegria, calará de amor, se regozijará sobre ti com cânticos”.
Esta gloriosa apresentação é mencionada aqui como sendo o
propósito da reconciliação.

23. Agora, em conexão com esta gloriosa apresentação (que se


efetuará na vinda do Senhor), há uma condição que deve cumprir-se.

Portanto, Paulo continua: se, na verdade, continuais na fé,


cimentados e firmes … O cuidado divino pressupõe sempre a
perseverança por parte do homem. A perseverança prova o caráter
genuíno da fé, e, portanto, é indispensável para a salvação.
Certamente, ninguém pode continuar na fé em virtude de sua própria
força (Jo 15:5). Necessitamos a graça capacitadora de Deus do
princípio ao fim (Fp 2:12, 13). No entanto, isto não anula a
responsabilidade e atividade humanas. Sim, atividade, um esforço
contínuo, perseverante e enérgico (Hb 12:14). Não obstante,
devemos notar que esta é precisamente a atividade da fé (cf. 1Tm
2:15), não uma fé em nós mesmos, mas em Deus. Desta forma eles
estarão

“cimentados e firmes”, isto é, firmemente estabelecidos sobre o solo


e único fundamento, o fundamento dos apóstolos (por seu
testemunho).

Cristo é a pedra angular deste fundamento (1Co 3:11; Ef 2:20; Ap


21:14, 19, 20). A cláusula condicional continua: e não sois movidos
da esperança que se deriva do evangelho que ouvistes. O perigo
ameaçava; e era de um caráter duplo, como já o indicamos (veja-se
Introdução, III B; IV A). Portanto, estas palavras levam consigo a
ideia de que o apóstolo está advertindo aos colossenses de voltar
outra vez ao seu estado anterior com todos os seus vícios que
destroem a alma (Cl 3:5–11) e da “solução”
recomendada pelos que não queriam reconhecer a Jesus Cristo
como o Salvador completo e todo-suficiente. Não deixem que lhes
tirem ou que os apartem da esperança — expectação ardente,
completa confiança, espera vigilante — da qual fala o evangelho e
que o evangelho origina, esse evangelho que os colossenses
“tinham ouvido”, isto é, que não só o tinham ouvido, mas também o
tinham obedecido. Veja-se acima sobre Cl

Colossenses (William Hendriksen)

121

1:6–8. Além disso, esse evangelho não era destinado somente para
um grupo seleto — os mestres do erro que estavam em Colossos
bem poderiam ter pensado que eles eram um grupo exclusivo —
nem estava limitado a alguma região particular; pelo contrário, era o
evangelho, o qual, em obediência ao mandamento do Senhor (Mt
28:19; especialmente Mc 16:15), foi pregado entre toda criatura
debaixo do céu.

O evangelho não conhece fronteiras, sejam raciais, nacionais ou


regionais. Sempre será o evangelho “para todo aquele que crê”.
Tendo chegado a Roma, de onde se estava escrevendo esta
epístola, tinha invadido todo centro de população grande do mundo
que nesse então se conhecia. Há mais sobre este tema no v. 6. Com
profunda emoção e gratidão humilde, o apóstolo conclui esta seção
unindo-a ao parágrafo seguinte pelas palavras: e do qual eu, Paulo,
fui feito ministro. A verdadeira profundidade destas palavras só
podem entender-se à luz de passagens tais como 1Co 15:9; Ef 3:8 e
1Tm 1:15–17. Um ministro65 do evangelho é aquele que conhece o
evangelho, que foi salvo pelo Cristo do evangelho e que com alegria
proclama a outros o evangelho. Deste modo, serve à causa do
evangelho.

5. A PARTICIPAÇÃO DO APÓSTOLO EM PREGAR “O


MISTÉRIO”, ISTO É,

“CRISTO EM VÓS, A ESPERANÇA DA GLÓRIA” - CL 1:24-29


24a. O apóstolo faz uma ampliação da alusão pessoal que começou
no versículo 23: Agora me regozijo em meio de meus
padecimentos por vós. A palavra agora provavelmente refere-se ao
fato de que nesse momento Paulo não está fazendo uma viagem
missionária nem tampouco ministrando por sua presença aos
colossenses, como espera fazê-lo mais adiante (Fm 22), mas está
passando por todo tipo de sofrimentos e penalidades — note-se o
plural “meus padecimentos” —

65 É óbvio que a palavra διάκονος não se usa aqui em seu sentido


técnico de diácono. Para o uso desta palavra, veja-se C.N.T. sobre
1Tm 3:13 e 4:6.

Colossenses (William Hendriksen)

122

próprios de seu presente encarceramento (Cl 4:10, 18; Ef 3:1; 4:1;


Fm 1, 9, 23). Mas em vez de queixar-se ele se regozija, porque, não
confirmam seu apostolado todos estes sofrimentos? Lembremos At
9:16! Porventura não há outras razões que fazem com que seja um
grande privilégio o sofrer por Cristo? Veja-se C.N.T. sobre Fp 1:29,
30. E não fortalecerá a fé dos colossenses (e de fato a de todos os
crentes em todo lugar) o saber de sua perseverança em meio de
muitas adversidades? Paulo tem, pois, todo o direito de dizer “meus
padecimentos por vós”. Cf. sobre Cl 2:1.

24b. O aspecto positivo que tem o suportar os padecimentos, quer


dizer, o fato de que esse santificante ato de levar a cruz será de
bênção para a igreja, ressalta significativamente nas muito discutidas
palavras que se seguem, ou seja, e o que falta das aflições de
Cristo, eu, em seu lugar, supro-o em minha carne, por seu
corpo, que é a igreja.

O que faz com que Paulo escreva como o faz é sua estreita conexão
com Cristo. Ele está meditando nos sofrimentos que o Salvador
suportou quando esteve aqui na terra. Paulo sabe que ele mesmo,
em sua transitória existência terrena, está (em certo sentido que
explicaremos) enchendo ou suprindo o que falta dos sofrimentos de
Cristo. O apóstolo está sofrendo estas adversidades no lugar de
Cristo, uma vez que o próprio Jesus já não está mais aqui para
suportá-las. Não que Paulo esteja efetuando tudo isso por si mesmo,
mas ele está contribuindo com sua parte. Outros crentes contribuem
com a parte que lhes corresponde.

Paulo também está convencido do fato de que seus padecimentos


são para o benefício do glorioso corpo de Cristo, a igreja (veja-se
acima sobre o v. 18). Ele está consciente de que a igreja será
confirmada na fé graças a que ele suporta pacientemente e brinda
claro testemunho em seus padecimentos.

No parágrafo anterior estabeleci claramente o que considero minha


opinião sobre esta passagem, ou seja, que o apóstolo efetivamente
está afirmando que ele, como um entre muitos, está em certo sentido
suprindo o que falta das aflições que Cristo suportou estando neste
mundo. Percy, op.cit. , p. 130, afirma que esta é «a única
interpretação possível». E

Colossenses (William Hendriksen)

123

Ridderbos escreve: «Nossa conclusão não pode ser outra que esta,
que a expressão as aflições de Cristo apontam ao sofrimento
histórico de Cristo» ( op.cit. , p. 158).

Assume-se que isso não significa que faltava algo no valor expiatório
do sacrifício de Cristo. A expressão não quer dizer que as boas
obras, os sofrimentos do purgatório, a fiel assistência à missa, o
pagamento de indulgências, ou qualquer dos assim chamados
méritos podem ou devem ser acrescentados aos méritos de nosso
Senhor. Entre as muitas passagens que refutariam essa teoria estão
Cl 2:14; Jo 19:30; Hb 10:11–14; e 1Jo 1:9. No entanto, não temos o
direito de mudar o significado claro da gramática e o contexto de
uma passagem, procurando assim favorecer o protestantismo em
sua luta com o catolicismo romano. Devemos ter em mente que
apesar de Cristo ter prestado uma completa satisfação a Deus por
meio das aflições que sofreu (de tal forma que Paulo pode gloriar-se
em nada que não seja a cruz, Gl 6:14), contudo os inimigos de Cristo
não ficaram satisfeitos!

Odiaram a Jesus com um ódio insaciável, e desejavam acrescentar


ainda mais aflições. Mas, pelo fato de que Ele já não está
fisicamente presente no mundo, suas setas, destinadas
especialmente a Ele, cravam-se em Seus seguidores. Neste sentido
é que todo verdadeiro crente está sofrendo em Seu lugar (segundo o
ponto de vista de seus inimigos) o que falta das aflições que Jesus
sofreu. As aflições de Cristo transbordam para nós. Esta
interpretação está apoiada pelas seguintes passagens:

“Se ao pai de família chamaram Belzebu, quanto mais aos de sua


casa?” (Mt 10:25).

“E sereis aborrecidos de todos por causa do meu nome” (Mc 13:13).

“Se o mundo vos aborrece, sabei que me aborreceu antes que a vós.
… Mas tudo isso vos farão por causa de meu nome, porque não
conhecem que me enviou” (Jo 15:18–21).

“Saulo, Saulo, por que me persegues?… Eu sou Jesus, a quem tu


persegues” (At 9:4, 5).

“As aflições de Cristo aumentam até nós” (2Co 1:5).

Colossenses (William Hendriksen)

124

“… levando no corpo sempre por todas as partes a morte de Jesus”

(2Co 4:10).

“Trago em meu corpo as marcas do Senhor Jesus” (Gl 6:17).


“… para conhecê-lo … e a participação de seus padecimentos” (Fp
3:10).

“E quando viu o dragão que tinha sido lançado à terra, perseguiu a


mulher que tinha dado à luz o filho varão” (Ap 12:13). 66

66 A.

Esta interpretação também está apoiada pelas razões muito mais


técnicas, que a seguir apresentaremos:

(1) Faz justiça ao significado da preposição _ντί. Não existe


nenhuma razão ou desculpa para tomar este prefixo em composição,
como é usado aqui, em qualquer outro sentido que não seja o de
substituição, como creio tê-lo provado em minha tese de doutorado:
“The Meaning of the Preposition _ντί in the New Testament”, pp. 76–
77, Princeton Seminary, 1948. Potio expôs o assunto muito
acertadamente, “porque não só diz: cheio, mas cheio em lugar de;
isto é, no lugar do mestre e professor, eu, o servo e discípulo”, etc.
(Amfil. 121). Veja-se o comentário de Lightfoot sobre isso na p. 165
de seu Comentário.

(2) Está em harmonia com o significado da expressão encher (ou,


suprir) as deficiências (ou, o que falta), conforme ao uso que o Novo
Testamento lhe dá em todo lugar: 1Co 16:17; Fp 2:30 (veja-se C.N.T.
sobre esta passagem). Em ambas as citações usa-se _ναπληρόω. O
composto duplo, _νταναπληρόω, só aparece aqui em Cl 1:24. Outro
composto duplo, προσαναπληρόω (2Co 9:12; 11:9), também brinda
seu apoio à interpretação que temos dado.

(3) Atribui ao genitivo το_ χριστο_ um significado muito mais natural,


ou seja, “as aflições suportadas por Cristo”. O contexto mostra
claramente que se está aludindo à humilhação que experimentou o
Jesus histórico durante seu ministério e morte aqui na terra. Veja-se
os vv. 20 e 22, onde se fala de o sangue da cruz e da morte de
Jesus.

B.
Por conseguinte, devem rejeitá-las seguintes teorias:

(1) Que a expiação vicária de Cristo deve suplementar-se com boas


obras, etc., como se seus méritos não fossem suficientes.

Resposta. Isto já foi refutado pelo texto de Heb. 10:11–14, etc.

(2) Que a expressão as aflições de Cristo assinala aos sofrimentos


que “o Cristo místico”, “a comunidade messiânica” ou “o Cristo
corporativo” suporta e deve suportar ao longo de toda esta
dispensação até o fim do mundo. Seguindo esta linha de
interpretação, embora com cautela, está Moule, em seu comentário
tão útil e interessante, op.cit. , p. 76.

Resposta. Esta teoria viola o ponto A. (3) de acima.

(3) Que as aflições de Cristo são as que Cristo coloca sobre Paulo,
etc.

Respuesta. Esta viola también A. (3), arriba.

(4) (Este punto está estrechamente relacionado con el No. (2),


aunque no son idénticos) Que las aflicciones de Cristo son las que el
mediador exaltado está sufriendo en los cielos. El Cristo que resucitó
y ascendió a los cielos sufre en sus miembros, en su cuerpo. A
causa de la unidad intima que

Colossenses (William Hendriksen)

125

25. Paulo indicou que seus padecimentos são para o benefício da


igreja. Agora continua, da qual eu fui feito ministro conforme à
administração de Deus que foi dada em beneficio vosso.
Acossados por homens que estavam procurando desviá-los, os
colossenses deviam conservar em mente que Paulo, que agora lhes
fala e a quem indiretamente lhe deviam seu conhecimento da
salvação, era seu administrador nomeado divinamente. O ofício de
“administrador das riquezas espirituais” tinha encomendado a ele e a
seus ajudantes (1Co 4:1, 2; 9:17; 1Tm 1:4; Tt 1:7). E isto, diz Paulo,
em beneficio vosso. No caso deles, isto era verdade em certo sentido
muito especial, uma vez que tinham sido ganhos dos gentios (Cl
1:27; 3:5–11), e Paulo foi enviado especialmente (não
exclusivamente) aos gentios (At 13:47; 22:21; Rm 11:13; 15:16; Gl
2:8, 9; Ef 3:1, 2, 8; 1Tm 2:7; 2Tm 4:17).

Além disso, a administração de Deus lhe tinha sido dada, para dar à
existe entre el Cristo exaltado y su iglesia, se puede decir que los
sufrimientos de ella pueden ser llamados “las aflicciones de Cristo”.
Asi Juan Calvino en su Comentario; y también Agustín y Lutero.

A.S. Peake saca una conclusión similar, op.cit. , pp. 514–515.

Resposta. Isto viola nuevamento o ponto A. (3) de cima.

(5) Que o que foi traduzido “o que falta das aflições de Cristo” deve
interpretar-se como “as partes restantes das aflições de Cristo”.
Assim Lenski, op. cit. , p. 73. Este autor também as chama
simplesmente “o resto”. Embora na p. 72 não vacila em usar a
expressão “o que falta”, com tudo na p.

74 rejeita chamar a estas partes restantes “deficiências” ou “o que


falta”. Devo dar honra à memória deste homem por sua posição
teológica, a qual, sem dúvida, levou-o a rejeitar estas palavras, mas
não posso estar de acordo com ele neste ponto.

Resposta. O Novo Testamento usa a palavra _στέρημα no sentido de


(no singular) necessidade; falta; o que se necessita falta ou está
ausente (veja-se Lc 21:4; 1Co 16:17; 2Co 8:13, 14; 9:12; 11:9; Fp
2:30; 1 Ts. 3:10, e assim o plural também aqui em Cl 1:24). A
interpretação o resto, quando se afirma que isto não quer dizer falta
ou deficiência, dificilmente se poderia conciliar com o verbo suprir
(literalmente encher, ou como se disséssemos completar com). Se o
substantivo usado aqui no original significasse o resto, e não falta,
apareceria (plural) então em passagens como Mt 14:20; Mc 6:43;
8:8, 19, 20; Lc 9:17; Jo 6:12, 13. Mas não ocorre nessas passagens.
Além dos comentários mencionados na Bibliografia, veja-se Ernst
Percy, op.cit. , pp. 128–134; Delling, Th.W.N.T., vol. VI, p. 305; P.J.
Gloag, “The Complement of Christ’s Afflictions”, Exp, first series, 7
(1878), pp. 224–236; W.R.G. Moir, “Col. 1:24”, ET, 42 (1930–1931),
pp. 479–480; Josef Schmid, “Kol. 1, 24”, BibZ, 21 (1933), pp. 330–
344; e a tese de Jacob Kremer, Was an den Leiden Christi noch
mangelt. Eine interpretationsgeschichtliche und exegetische
Untersuchung zu Kol. 1, 24b (em Bonner, Biblische Beiträge), 1956.

Colossenses (William Hendriksen)

126

palavra de Deus todo o seu alcance, isto é, para proclamar a


Cristo em toda sua gloriosa plenitude a todos os homens, sem
importar a raça, nacionalidade ou posição social.

26, 27. Esta palavra de Deus se centraliza em Cristo, que é o


glorioso mistério de Deus. Portanto, o apóstolo continua, o mistério
oculto por idades e gerações, mas manifestado agora a seus
santos. Paulo usa o termo “mistério”, mas não o usa como se
estivesse indicando um ensino, rito ou cerimônia secreta que tenha
algo que ver com a religião, mas escondida das massas e revelada
só a um grupo exclusivo; naquele tempo o termo era usado neste
sentido (geralmente no plural: mistérios) fora dos círculos
verdadeiramente cristãos. Em contraste com isso, na literatura
paulina um mistério67 é uma pessoa ou verdade que tivesse
permanecido desconhecida se Deus não a tivesse revelado. Diz-se
que esse mistério foi revelado em seu sentido pleno só quando seu
significado é transferido à realidade histórica. O mistério de que fala
aqui o apóstolo (Cl 1:26, 27), tinha estado oculto; isto é, por idades e
gerações (lit. “das idades e das gerações”) não se tinha realizado
historicamente. Na verdade, o mistério estava presente no plano de
Deus e na profecia, mas não o estava na realidade. Não obstante,
agora, quer dizer, na presente era, que começou com a encarnação
e ainda mais especificamente com a proclamação do evangelho aos
gentios, foi manifestado a seus santos, isto é, à totalidade da igreja
da nova dispensação, sem excetuar ninguém. Ali estava para que
todos o vissem!

Querendo descrever mais amplamente o que tem em mente, Paulo


continua: a quem Deus quis dar a conhecer quais (são) as
riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo
em vós, a esperança de glória. Por conseguinte, o mistério é o
próprio Cristo, assim como em 67 A palavra mistério aparece 28
vezes em todo o Novo Testamento: 3 vezes nos Evangelhos (Mt
13:11; Mc 4:11; Lc 8:10); 4 vezes no Apocalipse (10:7; 17:5; também
em 1:20 e 17:7, mas em certo sentido diferente ao usado por Paulo;
provavelmente significa “significado simbólico”); e 21 vezes nas
cartas de Paulo (Rm 11:25; 16:25; 1Co 2:7; 4:1; 13:2; 14:2; 15:51; Ef
1:9; 3:3; 3:4; 3:9; 5:32; 6:19; Cl 1:26; 1:27; 2:2; 4:3; 1Tm 3:9; 3:16;
2Ts 2:7). Veja-se a nota sobre μνστήριον em L.N.T. (A.

and G.), e a grande quantidade de literatura que ali se menciona.

Colossenses (William Hendriksen)

127

1Tm 3:16; cf. Ef 3:3, 4, 9. O mistério é Cristo em todas as Suas


gloriosas riquezas realmente habitando nos corações e vidas dos
gentios por meio de Seu Espírito. Isto não se viu em todas as épocas
passadas, mas agora cada filho de Deus (“santo”) pode dar
testemunho disso. Os colossenses mesmos eram um prova.
Certamente, até durante a antiga dispensação houve predições que,
com clareza cada vez maior, predisseram que os gentios um dia
chegariam a ser parte do povo de Deus (Gn 22:18; 26:4; 28:14;
49:10; Sl 72:8; 87; Is 54:2, 3; 60:1–3; Mq.

4:1, 2; Ml. 1:11, por mencionar umas quantas citações); mas não era
do agrado de Deus que estas predições fossem levadas a cabo até a
presente era messiânica. “Cristo em vós, a esperança da glória”
devia esperar até este tempo. “Cristo em vós” significa Cristo em vós,
gentios, e isto sobre uma base de perfeita igualdade com Israel, a
“parede intermediária de separação” tendo sido removida
completamente (Ef 2:14).

Cristo em vós, a esperança de glória, é um tema sobre a


ressurreição68

1. Seu significado

Aqui se proclama a Cristo em vós como a esperança ou base sólida


para estar à expectativa quanto à futura glória escatológica. O
conteúdo desta glória estabelece-se no contexto: “a herança dos
santos na luz” (v.

12), aquela “apresentação” da noiva a seu noivo (vv. 22, 28); cf. Cl
3:4, 24; Rm 5:2; 8:18–23; 1Co 15; Fp 3:20, 21; 1Ts 2:19; 3:13; 4:13–
17; 2Ts 1:10; 2Tm 1:12; 4:8; Tt 2:13. Embora o apóstolo inclua o
estado intermediário neste conceito de glória (2Co 5:1–8; Fp 1:21,
23), seu horizonte era a segunda vinda de Cristo e a felicidade
eterna.

68 Cf. G. Matheson, “The Pauline Argument for a Future State”, Exp.


first series, 9 (1879), pp. 264–

284.

Colossenses (William Hendriksen)

128

2. Esperanças que defraudam

Em todas as épocas os homens procuraram estabelecer suas

próprias bases para crer na imortalidade e até num estado futuro de


perfeição.

a. Alguns raciocinam a partir da premissa do desejo não alcançado.


Desejamos ver uma paisagem perfeita. E ao parar numa colina,
parece-nos que vemos uma; mas quando descemos ao vale e vemos
seus troncos podres e seus frutos decompostos, nossas ilusões vêm
abaixo. Mas apesar de tudo, nosso desejo persiste. Isto garante
realização no futuro.

b. Outros derivam seu prova da desatendida voz da consciência.

Uma voz me diz constantemente dentro de mim: “Deves fazer isto ou


aquilo”. Contudo, ninguém obedeceu completamente a este
imperativo categórico. Não é esta demanda inexorável a predição de
um estado futuro de estrita obediência, um estado de perfeição?

c. Também se toma um argumento do caráter permanente do eu


dentro de si. Eu como pessoa sobrevivi a uma linha uniforme de
etapas sucessivas de existência. Fui um embrião. Quando essa
etapa cessou, meu eu persistiu. Depois nasci e cheguei a ser um
bebê. Também sobrevivi a essa etapa. E da mesma forma, depois de
minha infância cheguei a ser um jovem e depois um homem de meia-
idade, etc.

Consequentemente, da mesma forma que sobrevivi a cada uma


destas etapas, não poderia porventura sobreviver à última, ou seja, a
morte física, e me elevar até uma imortalidade bendita e gloriosa?

Só se necessita um momento de reflexão para demonstrar quão


fraco são estes tipos de raciocínio em qualquer de suas formas. O
anelo persistente pelo ideal no reino da beleza, a demanda interior a
obedecer a lei, junto com a impossibilidade de obedecê-la
plenamente aqui e agora, e os constantes saltos do eu de uma etapa
biológica a outra, tudo isso não garante a imortalidade, muito menos
a perfeição numa vida futura. E no que respeita ao último argumento,
até um cão, em proporção à sua esfera

Colossenses (William Hendriksen)

129
de vida, passa através de e sobrevive a várias etapas, e no entanto
nem por isso alcançará a imortalidade.

3. Cristo … a esperança da glória

Agora, em contraste com todas estas razões falíveis, Paulo anuncia


a Cristo como a única base para estar à expectativa, não só da
imortalidade, mas também de uma glória escatológica futura. Além
disso, a evidência que Cristo deu ao mundo referente a um estado
de perfeição não descansa só em suas palavras e atos, mas em si
mesmo.

Nosso anelo persistente pelo ideal no reino da verdadeira beleza


espiritual é uma realidade nele. E porque sua alma é bela, de seus
lábios saem palavras cheias de graça e beleza.

“Os prados são limpos,

Ainda mais imaculados são os bosques,

embelezados com a viçosa veste da primavera:

Jesus é mais limpo, Jesus é mais puro,

Ele faz com que o coração triste cante”.

Crusader’s Hymn

Quanto à persistente demanda da consciência, Ele é o único que a


satisfez em todo respeito. Ele pôde dizer: “Quem de vós me
repreende de pecado?” (Jo 8:46).

“O esforço de meu coração é fraco,

E frio o mais ardente dos meus pensamentos;

Mas quando te vejo como Tu és,

então Te louvo como devo fazê-lo”.


John Newton

E por último, quanto a sobreviver a última etapa desta vida terrena,


Ele fez justamente isso! A ressurreição é proclamada em todas as
nações,

Colossenses (William Hendriksen)

130

“Aleluia, Cristo ressuscitou”. No tempo de Paulo havia testemunhas


de fato havia muitas delas — que O viram vivo depois da


ressurreição (1Co 15:6). E não era o próprio apóstolo uma
testemunha? (1Co 15:8).

“A morte dominou

Cristo, meu Cristo;

O seu poder venceu

Cristo, o Senhor.

Cristo a tumba venceu.

E com grande poder ressuscitou;

De sepulcro e morte Cristo é vencedor,

Vive para sempre nosso Salvador;

Glória a Deus! Glória Deus!

O Senhor ressuscitou”

Robert Lowry

4. Objeção
Mas admitindo o fato de que Cristo na verdade satisfaz o desejo pela
beleza, pela perfeição espiritual e moral, e pela sobrevivência final,
não seria, antes, uma exceção à regra, uma interrupção na raça de
Adão?

Como poderá Sua suficiência preencher minha insuficiência? Como


poderá Ele ser verdadeiramente a base sólida para a esperança de
uma bênção futura para toda a igreja, e particularmente, segundo o
contexto presente, a esperança de glória dos gentios?
5. Resposta à objeção

Cristo em vós, a esperança da glória.

“Este Cristo está habitando (e isto não de forma passiva, mas com
poder eficaz) em vós através de Seu Espírito”, diz Paulo. Portanto:
“Se o Espírito daquele que levantou dos mortos a Jesus habita em
vós, aquele que levantou dos mortos a Cristo Jesus vivificará
também os vossos corpos mortais por seu Espírito que habita em
vós” (Rm 8:11).

Colossenses (William Hendriksen)

131

28, 29. Em conexão com “Cristo em vós, a esperança da glória”,


Paulo continua, a quem proclamamos, admoestando a todo
homem e ensinando a todo homem em toda sabedoria. Seja
Paulo, Timóteo, etc., os que proclamam o evangelho (cf. 1Co 9:14), o
testemunho de Deus (1Co 2:1), ou como se lhe queira chamar, em
todo caso sempre estarão proclamando o próprio Cristo (assim
também Fp 1:17). Esta proclamação toma a forma de admoestação e
ensino. O apóstolo esteve levando a cabo esta bendita tarefa antes
de seu encarceramento, mas até agora que está em cadeias faz uso
de toda oportunidade que se lhe apresenta, tanto em pessoa (At
28:30, 31; Fp 1:12–14) como por carta, para fazer conhecer por toda
parte as riquezas presentes e futuras que os crentes possuem em
seu Senhor e Salvador. E assim também o fazem seus
colaboradores. Paulo sempre estava enfatizando a necessidade de
um trabalho pastoral. Para ele, admoestar significava prevenir,
estimular, e animar. De fato ele até rogaria às pessoas reconciliar-se
com Deus (2Co 5:20). E às vezes ainda derramou lágrimas (cf. At
20:19, 31; 2Co 2:4; Fp 3:18). Veja-se C.N.T. sobre Fp 3:18. Sua
pregação sobre Cristo era uma maravilhosa combinação do
verdadeiro evangelho junto com uma apresentação mais eficaz. Ele
pôde escrever aos
tessalonicenses: “Mas fomos amáveis em meio de vós, como quando
uma ama acaricia a seus próprios filhos: assim, estando ternamente
desejosos de vós, com agrado compartilhamos convosco não só o
evangelho de Deus, mas também nossas próprias almas, porque
chegastes a ser-nos muito amados … sabeis como, da forma como
um pai (trata) com seus próprios filhos, (assim fomos) admoestando
a cada um de vós, e confortando e testificando a fim de que vivêsseis
vidas dignas de Deus, que vos chamou ao seu próprio reino e glória”.

Neste contexto deve ser enfatizado que entre a admoestação e o


ensino de Paulo não existia nenhum abismo profundo. Para ele a
doutrina abstrata não existia; nem tampouco a ética cristã, flutuando
no ar. Pelo contrário, o ensino de Paulo era comunicado para
admoestar, e sua admoestação estava cimentada em seu ensino.
Por conseguinte, o

Colossenses (William Hendriksen)

132

apóstolo jamais pregou um Cristo que era salvador mas não


exemplo, nem tampouco um Cristo que era exemplo mas não
salvador. Na verdade, para Paulo o cristianismo era uma vida, mas
uma vida baseada numa doutrina. E para aqueles — e só para eles!
— que aceitam a Cristo (em virtude da graça soberana de Deus)
como Salvador, Senhor e capacitador, Ele é também exemplo para
eles.

É assombrosa a frequência com que Paulo une sua admoestação


com seu ensino concernente à pessoa e obra de Cristo. Só bastarão
uns poucos exemplos:

Referência Admoestação, em síntese Vínculo ao ensino


aproxima da obra e pessoa de Cristo

Rm 15:2, 3 agradar ao próximo “porque nem mesmo Cristo se


agradou a si mesmo”.
Rm 15:7 Dar as boas-vindas sincera “como também Cristo vos deu
as uns aos outros. (Receber boas-vindas (recebeu-vos)”.

uns aos outros).

2Co 8:7–9 aumentar na graça de dar “Porque já conheceis a graça


de nosso ao necessitado Senhor Jesus Cristo, que por amor a vós se
fez pobre, sendo rico, para

que vós com sua pobreza fôsseis

enriquecidos”.

Ef 5:2 Andar em amor “como também Cristo nos amou, e se


entregou a si mesmo por nós”.

Fp 2:3–8 ser humildes e não egocêntricos “este sentir que houve


também em Cristo Jesus, o qual … se despojou a si mesmo,

tomando forma de servo ... se humilhou

a si mesmo fazendo obediente até

a morte, e morte de cruz”.

Cl 3:13 perdoar “da maneira como Cristo vos perdoou”

Colossenses (William Hendriksen)

133

E devido ao fato de que esta proclamação de Cristo mediante a


admoestação (ou como o indica o significado literal da palavra: a
ação de colocar na mente das pessoas) e o ensino é sempre
cristocêntrico, é evidentemente teocêntrico também, para que assim,
através de Cristo, a glória seja para o Deus triúno por toda a
eternidade (Rm 11:36; 1Co 8:6; 10:31; Cl 3:17). Além disso, está
sendo realizado em toda sabedoria, isto é, de uma maneira
verdadeiramente prática, porque os embaixadores de Deus,
sujeitando-se completamente à vontade de Deus, usam os melhores
meios para alcançar o fim mais elevado, o que é descrito por Paulo
nestas palavras: a fim de apresentar a todo homem perfeito69 em
Cristo; “em Cristo” naturalmente, quer dizer, unidos a Ele na forma
mais íntima possível, numa união efetuada pelo Espírito Santo e
conservada viva mediante o exercício de uma fé que não só é dada
por Deus, mas também em todo momento é sustentada por Ele em
cada uma de suas expressões. Na verdade, quando toda culpa tiver
sido imputada a Cristo e todo corrupção tirada por seu Espírito, a
igreja será então perfeita, e deste modo apresentada a Deus no dia
da consumação de todas as coisas.

Veja-se também acima no v. 22b, onde se discute o mesmo tema.


Note-se, no entanto, que enquanto no lugar que acabamos de
mencionar (v.

22b) e em Ef 5:27 a tarefa e a honra de apresentar os crentes é


atribuída a Cristo, e enquanto em 2Co 4:14 a Deus o Pai, aqui em Cl
1:28 atribuída ao próprio Paulo e a seus colaboradores. Cf. Fp 2:16;
1Ts 2:19. Agora, falando a respeito de si mesmo, Paulo continua,
para o qual trabalho, isto é, trabalha assiduamente até o cansaço e
esgotamento. Cf. Gl 4:11; Fp 2:16; 1Tm 4:10. Leia-se 2Co 11:24–33
e acrescente-se depois 2Co 6:4–10 com 2Tm 4:7, 8; então se verá o
que significava ser um missionário nesses dias, sobretudo o
missionário, Paulo! Isso implicava uma batalha decidida contra
Satanás e suas hostes.

69 Ou amadurecido, que alcançou seu crescimento pleno, completo.


Para uma discussão completa, veja-se C.N.T. sobre Fp 3:15, nota
156.

Colossenses (William Hendriksen)

134

Paulo soube o que significava lutar contra o fanatismo que havia


entre os tessalonicenses; contra as disputas, a fornicação e os
litígios entre os coríntios; e agora, como se seu encarceramento não
lhe causasse muitos problemas, o duplo perigo de vícios e heresia
que havia entre os colossenses. Veja-se Cl 2; 3:1–17. Quantos
conflitos por fora e quantos temores por dentro! Não obstante,
movido pelo amor que Cristo lhe tinha, está disposto, e até ansioso,
a dar tudo pela causa do evangelho, e isto não só para ser um
instrumento nas mãos de Deus para resgatar as almas do inferno,
senão para aperfeiçoá-las, para assim poder apresentá-

las a Deus perfeitas em alma e corpo no grande dia. Para poder


descrever mais adequadamente o que está implicado nesta obra ou
trabalho fatigante, Paulo acrescenta a palavra lutando. Veja-se as
notas 70 e 71.

Essas lutas incluíam o orar fervorosamente ( lutando em oração Cl


4:12, 13; cf. Rm 15:30), o atender ao que Deus diz, o planejar

cuidadosamente, o escrever cartas, o dirigir — até da prisão! — o


programa missionário, o desafiar a Satanás, o proclamar oficialmente
o evangelho (quando quer que se possa), o dar testemunho pessoal,
e o viver uma vida cristã exemplar, até em meio de grandes pressões
e tribulações.

Com frequência se tem perguntado: «Como foi possível a um homem


(e um homem com um espinho na carne), mesmo com a ajuda de
seus colaboradores, fazer tanto?» A resposta está nas próprias
palavras de Paulo: (lutando) em virtude de seu poder que opera
poderosamente em mim. 70 Dia a dia, sim, e até momento a
momento o Espírito capacitador de Cristo operava dentro de toda a
pessoa de Paulo, comunicando força ao seu corpo e alma. Além
disso, às vezes até houve sinais e prodígios muito especiais na
carreira missionária do apóstolo (Rm 15:19; 2Co 70 Literalmente,
“lutando por meio de (ou, conforme a) sua energia, a qual opera
energicamente dentro de mim com poder”. A palavra lutando é um
termo do atletismo. Desta palavra se deriva também a palavra
portuguesa agonizando ou agonizar. O particípio _γωνιζόμενος
projeta-se a si mesmo no substantivo _γ_να de Cl 2:1. É melhor
tomar o particípio influir ou operar com energia como voz média,
assim como em Gl 5:6, “a fé que opera mediante o amor”. Por último,
a palavra dinamite deriva-se da palavra poder.

Colossenses (William Hendriksen)

135

12:12). Portanto, disto se depreende que o apóstolo atribui toda a


glória e a honra a seu Cristo que jamais falha. Cf. Fp 2:12, 13; 4:13.

Resumo de Colossenses 1

Epafras, encarregado do cuidado espiritual dos colossenses, está


visitando Paulo, o prisioneiro, em Roma. Entregou a Paulo um
relatório completo das condições existentes na igreja de Colossos e
seu duplo perigo: a. voltar novamente para os vícios pagãos, e b.
Procurar, por obedecer o conselho dos falsos mestres, complementar
sua fé em Cristo recorrendo aos remédios de feitura humana contra
os desejos de dar rédea solta à carnalidade. Também informou a
Paulo da fidelidade a Cristo que caracteriza a congregação como um
todo. Tendo o coração cheio de genuíno amor pelos colossenses, o
prisioneiro decide escrever-lhes uma carta. Nesta carta ele usa uma
abordagem positiva, coisa que o caracteriza, e depois de uma
saudação cristocêntrica, diz aos destinatários que ele dá graças a
Deus continuamente pela fé que eles têm em Cristo Jesus e por seu
amor para todos os santos, os quais (a fé e o amor) são fortalecidos
pela esperança reservada para eles nos céus, isto é, a herança dos
santos na luz. Na verdade, essa perspectiva intensifica a fé no
Doador e o amor para com todos os companheiros que também
recebem a herança.

A esperança de obter esta herança está firmemente baseada no


evangelho que está conquistando o mundo e que também fez com
que sua presença seja sentida entre os colossenses através do
ministério do sempre fiel Epafras.

Animado pelas respostas a orações anteriores, Paulo está orando


constantemente para que Deus multiplique Suas bênçãos sobre os
colossenses, de maneira que, mesmo quando estejam vivendo entre
aqueles cujas doutrinas os desviariam do caminho reto, possam ter
uma compreensão cada vez mais clara da vontade de Deus, o que
resultará em vidas espiritualmente frutíferas em todo sentido, que
aumentarão em

Colossenses (William Hendriksen)

136

evidências de uma sincera e humilde gratidão a Deus. Que sempre


tenham presente que foi Deus que os tirou do domínio das trevas e
os trasladou ao reino do Filho do seu amor.

Por meio de um testemunho retumbante — talvez está citando um


hino — o apóstolo anuncia a Cristo como o todo-suficiente Salvador,
soberano em ambos os reinos: a criação e a redenção. Portanto, os
colossenses não devem colocar sua confiança em nada que não seja
Cristo, uma vez que à parte dEle nenhuma criatura pode ter força
alguma quer para ajudar ou para fazer mal. Por Cristo o universo é
restaurado à sua própria relação com Deus, porque desde seu lugar
à direita do Pai Cristo governa o universo inteiro para beneficio da
igreja e a glória de Deus. Aquele que morreu na cruz para salvar
pecadores tem em suas mãos a estrela mais distante.

Se os colossenses se mantiverem apegados ao evangelho que


proclama o Cristo soberano e todo-suficiente, que os resgatou de
sua ímpia vida anterior, não cairão outra vez. Pelo contrário, este
mesmo Cristo um dia os apresentará santos, sem mancha e
irrepreensíveis diante de Si mesmo. Paulo teve o privilégio de chegar
a ser ministro deste glorioso evangelho.

É por causa de sua lealdade a esse evangelho que agora está


prisioneiro em Roma, suprindo em sua carne o que falta das aflições
de Cristo. Sim, as aflições que Cristo suportou transbordavam até
enchê-lo.
No entanto, regozija-se na administração que Deus lhe tinha dado; e
ele tem como propósito, com a graça de Deus, dar à palavra de Deus
todo seu alcance, o mistério que esteve escondido por muito tempo,
mas que agora é revelado, o qual é “Cristo em vós, a esperança da
glória”. O fato de que algum dia Cristo viveria nos corações e vidas
dos gentios através de Seu Espírito era algo predito faz muito tempo,
mas que agora tinha chegado a ser uma realidade. O simples fato de
que Cristo habitará em seus corações era por si mesmo uma
garantia da glória futura. Em conexão com o Cristo, que habita nos
corações, Paulo termina o capítulo dizendo: “a quem proclamamos,
admoestando a todo homem e

Colossenses (William Hendriksen)

137

ensinando a todo homem em toda sabedoria, a fim de apresentar a


todo homem perfeito em Cristo, para o qual trabalho, lutando em
virtude de seu poder que opera poderosamente em mim”.

Colossenses (William Hendriksen)

138

COLOSSENSES 2

Tema: Cristo, o preeminente, o único e todo-suficiente Salvador I.


Este único e todo-suficiente Salvador é o objeto da fé dos crentes,
capítulos 1 e 2

B. Esta verdade se expõe agora, não só positivamente, mas também


tanto positiva como negativamente, capítulo 2, e como em contraste
com a “heresia colossense” com suas:

1. ADVERTÊNCIAS CONTRA FILOSOFIAS ILUSÓRIAS - CL 2:1–


10

1. É mais que evidente que Cl 2:1 é uma continuação da ideia


expressa em Cl 1:29. Paulo estava escrevendo uma carta e não
quatro

“capítulos”. De modo que a continuação de seu argumento é este:


Porque quero que saibais; o “porque” introduz a prova da
afirmação que fez no versículo precedente. A frase “quero que
saibais”, que aparece neste lugar e em 1Co 11:3 tem o mesmo
significado de outra que aparece em Fp 1:12, escrita no original com
palavras diferentes. Outra expressão que tem um significado
semelhante é, “não quero (ou, não queremos) que ignoreis” (Rm
1:13; 11:25; 1Co 10:1; 12:1; 2Co 1:8; 1Ts 4:13). O

apóstolo usa este tipo de expressão para sublinhar a importância do


tema que está abordando. Considera, pois, que a heresia de
Colossos (que procederá a refutar) é um perigo muito sério, e devido
a isso continua: quão grande luta sustento por vós71 e pelos de
Laodiceia, e por todos os que não viram meu rosto na carne.
Não se precisa repetir qual era a natureza desta luta (veja-se sobre
Cl 1:29, acima). O que Paulo quer dizer é: «Porque, para provar o
que lhes acabo de dizer, quero que 71 A tradução da RA: “quão
grande luta venho mantendo por vós”, embora não literal, mostra a
íntima conexão que há entre Cl 1:29 (RC: “combatendo segundo a
sua eficácia”) e Cl 2:1. No original, Paulo usa duas palavras que vêm
da mesma raiz, que bem poderiam traduzir-se agonizando (Cl 1:29) e
agonia (Cl 2:1). Veja-se a nota 70.

Colossenses (William Hendriksen)

139

saibais quão grande luta sustento por vós, colossenses, e também


pelos de Laodiceia, e por todos os que, bem como vocês, jamais me
viram».

Com toda probabilidade, a frase “e por todos os que” inclui os


membros da igreja de Hierápolis (veja-se Cl 4:13). Já vimos que
(veja-se a Introdução II A) estas três cidades estavam tão perto uma
da outra que se um perigo espiritual ameaçava uma, era quase
inevitável que afetasse também às outras duas, embora não fosse na
mesma intensidade. 72

Existem dois conceitos errôneos que se deve evitar:

(1) O ponto de vista apoiado por muitos, que o apóstolo afirma


tacitamente de que jamais esteve em Colossos.

Resposta: Não se deve confundir a igreja com a cidade. Deve


sempre ter-se em mente que quando Paulo viajou a Éfeso em sua
terceira viagem missionária, ainda não havia igreja que visitar em
Colossos.

Quanto à pergunta “Esteve Paulo alguma vez em Colossos?”, veja-


se a Introdução II A; III A. Como eu vejo as coisas, a situação deve
ter sido mais ou menos assim:

Paulo tomou a rota normal em sua viagem a Éfeso, esta rota


chegava a Éfeso via Colossos. De modo que passou por Colossos, e
até poderia ter-se alojado uma noite ali. Quer o tenha feito ou não,
não o sabemos. Mas sabemos que seu propósito era confirmar as
igrejas já estabelecidas e chegar a Éfeso, e não fundar novas igrejas
no caminho ao seu destino. Durante sua longa estadia em Éfeso,
muitas pessoas das regiões adjacentes chegaram para ouvi-lo (At
19:10). Também chegou gente das três cidades entre todos os que
vieram a ele, e um deles foi Epafras, da cidade de Colossos (cf. Cl
4:12). Depois de sua conversão, todas estas pessoas — entre eles
Epafras — levaram as boas novas de salvação a suas respectivas
cidades. Deste modo se fundaram igrejas.

Falando em termos gerais, Paulo pôde dizer que aquelas igrejas


nunca o tinham visto.

72 É evidente que aqui (Cl 2:1), como também em At 4:6 e Ap 18:17,


a palavra _σοι inclui aos mencionados anteriormente. Este _σοι
reflete-se no α_τ_ν do v. 2 e até no _μ_ς do v. 4.

Colossenses (William Hendriksen)


140

(2) A ideia de que o apóstolo era um verdadeiro estranho para cada


um dos membros das três igrejas.

Resposta: Quase todos os expositores — até aqueles que sustentam


o ponto de vista Nº. (1), que já refutamos — têm muito cuidado de
deixar claro que, na verdade, Paulo conhecia realmente alguns dos
membros da igreja de Colossos, e talvez também alguns dos que
pertenciam às outras igrejas do vale do Lico. Quanto aos conhecidos
e amigos de Paulo em ou da cidade de Colossos, veja-se sobre Cl
4:12, 17; Fm 1, 2.

Portanto, a ideia principal de Cl 2:1 é que Paulo, tendo recebido uma


ampla informação (por meio de Epafras e talvez outros mais)
referente às condições prevalecentes nas igrejas do vale do Lico,
deseja que a totalidade da congregação — também a grande maioria
que não o conhecia — saiba quanto os ama e quão grande é sua
preocupação por eles quando são ameaçados por perigos
espirituais.

Agora, não só no capítulo 1 mas também no capítulo 2 o apóstolo


está proclamando a Cristo como o único e todo-suficiente Salvador e
objeto da fé dos crentes.

Além disso, em ambos os capítulos a nota predominante é positiva:


Cristo é apresentado em toda Sua majestade e riquezas como a
fonte de quantas coisas possam os crentes necessitar, e
especialmente como o objeto da confiança e adoração deles. Não
obstante, existe uma marcada diferença entre estes dois capítulos.
Enquanto no capítulo 1 o aspecto negativo (quer dizer, a refutação
do erro) só se pressupõe tacitamente, no capítulo 2 se expressa
claramente (veja-se os vv. 4, 8, 16, 18, 20–23), e também se dão
fortes advertências. No entanto, como já o expressamos, aqui
também se proclama a Cristo (veja-se vv. 2, 3, 6, 7, 9–15).

Agora, embora a heresia seja uma só, o apóstolo a aborda desde


quatro pontos de vista (cf. Introdução III B). Não obstante, estas
quatro divisões não são compartimentos herméticos. Existe uma
semelhança, como veremos à medida que formos expondo cada
uma das passagens.

Colossenses (William Hendriksen)

141

2, 3. O propósito da luta que Paulo sustenta é: para que sejam


fortalecidos seus corações. O coração de toda atividade pastoral é
ser um instrumento nas mãos de Deus para tomar os corações
daqueles que foram confiados ao nosso cuidado e levá-los até o
coração de Cristo. E a razão é esta: Uma vez que o coração de uma
pessoa foi ganho totalmente e confirmado na graça, então a pessoa
em sua totalidade chegou a ser o objeto do maravilhoso poder
transformador de Deus, e isto se deve a que o coração é o fulcro dos
sentimentos e a fé, como também a causa principal ou manancial
das palavras e ações (Rm 10:10; cf. Mt 12:34; 15:19; 22:37; Jo 14:1).
É o centro ou núcleo do ser do homem, a parte mais profunda de
toda a personalidade humana. “Dele emana a vida” (Pv 4:23). “O
homem olha o que está diante de seus olhos, mas o Senhor olha o
coração” (1Sm 16:7). Estes corações devem ser fortalecidos73

para rebater o ataque dos falsos mestres. E como a união faz a


força, o apóstolo continua: sendo unidos fortemente uns com os
outros74 em amor.

Paulo não fala de conhecimento, na verdade tampouco de presunção


(veja-se Cl 2:18), mas de amor mútuo como “o vínculo perfeito” (Cl
3:14). Este amor procede diretamente do coração de Deus em Cristo
e conduz a ele, porque Deus é amor (1Jo 4:8). Agora, quando os
crentes, unidos fortemente em amor, são confrontados com o perigo
dos erros e mentiras, eles devem orar juntos sobre o problema e
discuti-lo um com outro à luz da revelação especial de Deus (cf. Ef
3:17–19), e isto para 73 O significado básico do verbo παρακαλέω é
chamo a meu lado; e por isso, cito (cf. At 28:20). Mas uma pessoa
pode ser citada com diferentes propósitos. Por isso, a palavra tem
uma grande variedade de significados que se derivam de seu sentido
primário, e o significado exato de cada caso deverá ser determinado
pelo contexto. Quando se usa, como aqui em Cl 2:2, com corações,
a melhor tradução seria fortalecer, animar (aqui na voz passiva; mas
em Cl 4:8; Ef 6:22; 2Ts 2:17 aparece em voz ativa).

Cf. também Fp 2:1: “Portanto, se (há) algum estímulo (ou


consolação) em Cristo”.

74 O significado básico do verbo συμβιβάζω é faço que se juntem;


trago, mantenho, ligo, soldo juntos, uno (Ef 4:16, literalmente; aqui
em Cl 2:2 figuradamente). É fácil notar como o significado primário
produziu outros significados derivados: ensino (assim usa-se na lXX;
por exemplo, Is 40:13, 14:

“quem lhe ensinou?” citado em 1Co 2:16), demonstro (cf. At 9:22),


dou como certo (cf. AT 6:10).

Colossenses (William Hendriksen)

142

todas as riquezas de um entendimento certo. 75 A meta que


sempre se deve seguir é chegar a um entendimento ou
discernimento (cf. Cl 1:9; cf.

1Co 1:19; Ef 3:4; 2Tm 2:7) das coisas espirituais que seja completo,
abundante e proveitoso, que implica a capacidade para distinguir
entre a verdade e o erro. Paulo define esta meta ainda mais
claramente, dizendo: para um conhecimento claro do mistério de
Deus, ou seja, Cristo. Já explicamos em Cl 1:27 em que sentido
Cristo é o mistério de Deus. Cf.

C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, pp. 157–162, onde dou uma


explicação de 1Tm 3:16. Este mistério, que se revela
progressivamente aos crentes que se amam, está acima de toda
compreensão humana (Rm 11:33–36; 1Co 2:6–16), e, portanto,
neste sentido é também um mistério divino e glorioso: “o mistério de
Deus, ou seja, Cristo”, em quem estão escondidos todos os
tesouros da sabedoria e do conhecimento. Os colossenses não
necessitam nem devem buscar outra fonte de felicidade e santidade
fora de Cristo. Jactam-se os falsos mestres de sua sabedoria e
conhecimento? Gloriam-se nos anjos? Nem homem nem anjo, nem
nenhuma outra criatura tem algo a oferecer que não possa ser
achado em Cristo num grau imensamente superior e numa essência
incomparavelmente superior. NEle estão escondidos todos os
tesouros da sabedoria e do conhecimento, como o “tesouro
escondido” do qual Jesus falou na parábola (Mt 13:44; cf. Pv 2:4);
com efeito, escondidos, mas para ser desenterrados e não para
permanecer escondidos. 76 É

75 Literalmente, “todas as riquezas da certeza do entendimento”.


Certeza é o significado da palavra πληροφορία que harmoniza
plenamente com todas as passagens em que a palavra aparece
(além de Cl 2:2 também 1Ts 1:5; Hb 6:11; 10:22).

76 A palavra grega que traduzimos escondidos (pl.) é _πόκρυφος, da


qual se derivam nossas palavras apócrifos ou apócrifo. De acordo
com Josefo ( Guerra judáica II.viii.7), o principiante, antes de ser
admitido para participar de todos os privilégios da seita dos essênios,
“devia fazer tremendos juramentos … de não ocultar nada dos
membros da seita e não relatar nenhum de seus sgcredos a outros,
mesmo se fosse torturado até a morte … e da mesma forma guardar
cuidadosamente os livros da seita e os nomes dos anjos”. Irineu (
Contra as heresias I.xx.1) informa-nos que os marcocitas

“aduziram um sem-número de escritos apócrifos e espúreos, que


eles mesmos forjaram”. E Clemente de Alexandria ( Stromata ou
Miscelânea 1.15), afirma, “aqueles que seguem a heresia de Pródico
se jactam de possuir os livros secretos deste homem”. Os falsos
mestres que tinham incomodado aos colossenses com suas
perigosas doutrinas, similarmente poderiam haver-se jactado de seus
escritos

Colossenses (William Hendriksen)

143
evidente que o apóstolo tem também em mente este fim prático aqui
em Colossenses; isto se vê nos versículos 9 e 10. Portanto, o que o
apóstolo quer dizer é que «em Cristo se guardam todos estes
tesouros. Portanto, venham e descubram-nos e enriqueçam-se com
eles».

Paulo diz, “tesouros da sabedoria e do conhecimento”, o que é muito


melhor que “tesouros de sabedoria”, frase que podemos ler em outra
parte (Eclesiástico 1:25). Em conformidade com sua natureza divina,
Cristo sabe todas as coisas. E este conhecimento, sendo divino, é
onisciente, direto, simples, imutável e eterno. Pedro o louvou,
quando disse: “Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que sinto
afeto por ti”

(Jo 21:17). Portanto, a onisciência de Cristo é um grande consolo


para o crente, e é, por meio de Sua revelação nas Escrituras, um
banco do qual pode retirar para si todo consolo.

Mas em Cristo o conhecimento jamais está separado da sabedoria,


como com frequência acontece entre os homens. Agora, podemos
definir a sabedoria como a habilidade de aplicar o conhecimento em
situações concretas, de tal forma que tiremos o proveito mais amplo.
A sabedoria usa os meios mais efetivos para alcançar a meta mais
alta. No Antigo Testamento a obra da criação é atribuída à sabedoria
de Deus (Sl 104:24; Jr 10:12). Jó 28:23ss., e Pv 8:22ss. personificam
a sabedoria com a qual Deus criou todas as coisas. O Novo
Testamento exalta a sabedoria de Deus revelada na estultícia da
cruz (1Co 1:18–25), revelada na igreja (Ef 3:10) e manifestada
também na obra da providência de Deus para o bem de Israel e dos
gentios (Rm 11:33).

secretos e escondidos. Lightfoot declara, “Deste modo, a palavra


apócrifos era, em primeiro termo, um título honorável, o qual era
usado pelos hereges mesmos para qualificar suas doutrinas
esotéricas e seus livros secretos; mas dado o caráter geral destas
obras, o termo, como foi usado por escritores ortodoxos, chegou a
ter o significado de falso, espúreo” ( op.cit. , p. 174).
Por conseguinte, é possível, embora não se possa provar, que
quando o apóstolo menciona (Cl 2:3) os tesouros escondidos de
Cristo e dá a entender que se oferecem livremente a todos aqueles
que O

aceitem pela fé (veja-se Cl 2:9, 10), está fazendo um contraste entre


estes verdadeiros e inesgotáveis tesouros e os segredos
imprestáveis dos falsos mestres, um contraste entre esta glória
escondida e o encobrimento praticado pelos hereges.

Colossenses (William Hendriksen)

144

Neste ponto é muito necessário que nos guardemos de cair num


erro. A palavra sabedoria é usada em Colossenses com três sentidos
diferentes: (a) a sabedoria dada a Paulo e a seus colaboradores e
também a todos os crentes em geral (Cl 1:9, 28; 3:16; 4:5); (b) a
pretendida sabedoria dos falsos mestres (Cl 2:23); e (c) a sabedoria
divina que habita em Cristo eternamente (Cl 2:3). Estas três não
devem ser confundidas. Às vezes se iguala a sabedoria divina (como
a que aqui se menciona, Cl 2:3), quanto à sua essência, com a
sabedoria humana, como se a primeira fosse tão somente uma
edição aumentada da segunda. De modo que, por exemplo, somos
informados a respeito desta passagem (Cl 2:3), que enquanto o «
conhecimento é um termo aplicado à compreensão das verdades, a
sabedoria acrescenta o poder de raciocinar sobre elas e traçar a
relação que têm entre si» (Lightfoot, op.cit. , p. 174).

Mas embora tudo isto fosse totalmente válido quando falamos sobre
a sabedoria humana, no entanto a sabedoria que se atribui a Cristo é
muito mais que a simples habilidade de raciocinar e traçar. A
sabedoria arquetípica difere da sabedoria cópia: o modelo divino e a
cópia humana jamais poderão ser idênticos, e a razão é que Deus é
Deus, e aqui estamos tratando com Cristo como Deus (veja-se Cl
2:9). A sabedoria divina projeta, planeja e dirige de uma forma
imensamente superior à sabedoria humana, uma vez que é original e
criativa. Pode realizar o que nenhuma sabedoria em todo o universo
pode fazer. Pode harmonizar o que parecesse irreconciliável. Uns
poucos exemplos ilustrarão o que quero dizer:

(1) Em Sua sabedoria, Deus reconcilia os judeus e os gentios, e


reconcilia ambos Consigo mesmo, obtendo este grande milagre por
meio da coisa mais inverossímil, a cruz, que era uma escândalo para
os judeus e para os gentios estultícia! (1 Cor. 1:22–25; Ef 2:13, 14).

(2) Em Sua sabedoria satisfaz as demandas de Sua justiça, que


pede a morte do pecador, e as demandas de Seu amor, que pede a
salvação do pecador. A lei e o evangelho se unem na cruz (Rm 3:19–
24; 5:8, 12, 13; 16:27; cf. Sl 85:10).

Colossenses (William Hendriksen)

145

(3) Em sua sabedoria (a qual Paulo louva), a rejeição do Israel


segundo a carne resulta, mediante vários elos, na salvação de “todo
Israel”: “por sua queda vem a salvação aos gentios, para provocá-los
a ciúme … para que pela misericórdia mostrada a vós (gentios), eles
(Israel) também obtenham agora misericórdia”. Paulo termina
dizendo,

“Ó profundidade da riquezas e da sabedoria e do conhecimento de


Deus”, etc. 77

De modo que em Cristo estão escondidos, para o proveito dos


crentes, todos os tesouros deste conhecimento onisciente e desta
sublime e criativa sabedoria.

4, 5. Em conexão com os vv. 1–3, embora é mais provável que seja


em conexão com tudo o que foi dito em Cl 1:3–2:3, Paulo continua:
Digo isto para que ninguém vos engane com raciocínios
persuasivos. Não devem mudar fatos demonstrados (quanto à
plenitude que há em Cristo) por raciocínios enganosos. Cf. 1Co. 2:4.
O original não apoia a ideia daqueles que pensam que Paulo tem em
mente uma pessoa em particular quando coloca esta advertência.
Sem dúvida, havia muitos falsos mestres. Portanto, é como se Paulo
dissesse: «quando alguém ou alguns vierem a vós com argumentos
atrativos, não vos deixeis desviar por esse indivíduo e seus discursos
sutis”. E continua: Porque, embora eu esteja ausente na carne, no
entanto estou convosco em espírito. Em conexão com esta
declaração, note-se:

(1) A comunhão de todos os crentes em Cristo. Esta íntima


comunhão de amor foi sentida profundamente na igreja primitiva
(veja-se C.N.T. sobre Fp 1:5).

(2) A força com que Paulo sente esta comunhão com aqueles que
em sua maior parte não o tinham visto, e que, portanto, ele não
conhecia pessoalmente. É razoável pensar que Epafras tinha
entregue ao apóstolo 77 Na página 36 de meu livrinho, And So All
Israel Shall Be Saved, dei o que considero a interpretação correta de
Rm 11:26a e de seu contexto.

Colossenses (William Hendriksen)

146

um relatório bastante gráfico de como era a igreja de Colossos (cf. Cl


1:7, 8; 4:12, 13).

(3) O elemento que se acrescenta a esta comunhão. Paulo quer


expressar muito mais que simplesmente «em minha imaginação
posso vos contemplar neste momento, meus amigos. É como se
estivesse convosco». Na verdade, isto estava incluído, mas havia
mais que isso, ou seja, “estou convosco em coração e espírito, estou
convosco para vos ajudar e me regozijar convosco, assim como o
indica esta carta e como Tíquico e Onésimo vos contarão” (Cl 4:7–9).
Prova: Note-se como o apóstolo, usando uma linguagem muito
semelhante, faz-se valer na congregação de Corinto, tomando uma
parte real num assunto de disciplina, mesmo quando não estava
presente corporalmente (1Co 5:3–

5); e também, note-se quão afetuosamente faz com que sua


presença espiritual seja sentida na igreja de Tessalônica (1Ts 2:17
“separados de vista, mas não de coração”).

Em sua maior parte, o relatório que Epafras entregou a Paulo era


favorável. Embora de maneira nenhuma tinha minimizado os perigos
que ameaçavam a igreja, não obstante tinha sido muito cuidadoso de
deixar bem claro que em geral os colossenses não se tinham movido
de seu fundamento. Entre eles havia um amor genuíno (Cl 1:8), e
agora nos inteiramos que também tinham uma boa ordem (quer
dizer, não se tinha produzido nenhum cisma, nem tinha faltado uma
disciplina e conduta ordenada) e uma fé pura e decidida; por isso o
apóstolo pode dizer: me regozijando de ver vossa boa ordem e a
firmeza de vossa fé em Cristo. 78

6, 7. Em íntima relação com a afirmação precedente, Paulo


acrescenta: Portanto, assim como aceitastes a Cristo Jesus o
Senhor, (assim também) continuai vivendo nele. A forma
quiástica ou cruzada que se acha na estrutura gramatical grega
desta oração — com os verbos aceitastes e continuai vivendo, um no
princípio e o outro no final da 78 Concordo com muitos comentaristas
na opinião de que não há nenhuma boa razão para aceitar a
sugestão de Lightfoot, sobre que Paulo está usando aqui uma
metáfora militar: “vossa formação ordenada e falange compacta”. O
contexto não requer esta interpretação.

Colossenses (William Hendriksen)

147

oração; e as referências a Cristo (refiro-me às palavras Cristo Jesus


o Senhor e nele) colocadas no meio da oração; note além disso a
posição enfática de “nele” — mostra que toda a ênfase recai na
necessidade de aderir-se fortemente a Cristo Jesus o Senhor (cf. Ef
3:11; Fp 2:11) como àquele que é todo-suficiente, como ao Senhor
cujos mandamentos devem ser obedecidos e em cuja palavra deve-
se confiar. A ideia é:

«Colossenses, não se desviem; façam com que sua vida (seu


“caminhar”
ou conduta) continue em harmonia com o fato de que aceitaram a
Cristo Jesus o Senhor como sua tradição. Abraçaram a Ele com uma
fé viva, assim como lhes foi ensinado» (veja-se o v. 7; cf. Ef 4:20). A
palavra aceitastes usa-se aqui em seu sentido técnico: receber de
outro por transmissão (cf. 1Co 11:23; 15:1, 3; Gl 1:9, 12; Fp 4:9; 1Ts
2:13; 4:1; 2Ts 3:6), estendendo a linha de transmissão de Deus a
Paulo (direta e indiretamente), deste a Epafras, até chegar aos
colossenses. 79

Paulo nos mostra agora o que significa viver em Cristo (isto é, numa
união vital com ele), e o faz por meio de quatro particípios
(“enraizados”, “edificados”, “sendo confirmados”, “aumentando”); o
primeiro é um perfeito passivo e os três restantes estão no presente:
enraizados e sendo edificados nele e sendo confirmados na fé,
segundo vos ensinou, aumentando em ações de graças. O
sentido destas palavras é:

«Tendo sido fortemente implantados em Cristo (como por exemplo,


em Seu amor. Ef 3:17), como Aquele que é a fonte inesgotável e
todo-poderosa de vossa salvação plena e livre, e continuando nesse
estado, aproveitem, então, toda oportunidade de ser elevados cada
vez mais alto, 79 No Novo Testamento mencionam-se três classes
de tradição: (a) A lei oral judia. Josefo disse: “Os fariseus
transmitiram por herança de seus pais uma grande quantidade de
observâncias que não estão escritas na lei de Moisés” ( Antiq.
XIII.x.6). Jesus reflete sobre estes mandamentos feitos por homens
em Mc 7:8, 9; (b) “a tradição dos homens” (Cl 2:8; veja-se sobre esse
versículo); e (c) o verdadeiro evangelho dado por Deus, tal como foi
ensinado por Cristo e Seus apóstolos, e chamado às vezes a

“tradição apostólica”. A referência em Cl 2:6 refere-se ao ponto (c).

Colossenses (William Hendriksen)

148

como um edifício que cresce andar após andar, 80 e aproveitem


também toda oportunidade de ser estabelecidos ainda mais
firmemente na atividade da fé, 81 e toda oportunidade de aumentar
em ações de graças, assim como lhes ensinou Epafras» (Cl 1:7;
4:12, 13; cf. Cl 4:2). Vemos, pois, que o círculo é fechado pela
gratidão, pois as bênçãos que descem até nossos corações e vidas
voltam ao Doador delas na forma de uma interminável e espontânea
adoração cheia de amor. Além disso, semelhante gratidão
acrescenta o sentido de obrigação (Sl 116:12–14), de tal forma que
aqueles que aumentam nestas graças de maneira nenhuma se
sentirão alentados a abandonar a abundância que têm em Cristo
Jesus o Senhor, para seguir o ensino e os conselhos dos falsos
mestres.

Atentemos bem ao fato de que Paulo não ora para que os

colossenses comecem a dar graças, mas antes, pede que o oceano


de sua gratidão possa constantemente transbordar seu perímetro.
Paulo não estava satisfeito com nada que não fosse perfeito.
Portanto, agrada-lhe muito usar a palavra transbordar, superabundar
(Rm 3:7; 5:15; 15:13; 1Co 8:8; 14:12; 15:58; dez vezes em 2Co; Fp
1:9, 26; 4:12, 18; 1Ts 3:12; 4:1, 10). Cf. C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e
Tito, p. 89.

8–10. Existe uma estreita relação entre os versículos 6 e 7, por um


lado, e os versículos 8–10, por outro. O que foi declarado
positivamente nos vv. 6, 7, ou seja, “continuai vivendo em Cristo
Jesus o Senhor”, é afirmado negativamente nos vv. 8–10, sendo o
sentido destes versículos, como segue: « Não permitam que se os
desviem do caminho correto por meio de ensinos que não estão
conforme Cristo, porque Ele suprirá todas as suas necessidades,
pelo fato de que nEle reside corporalmente toda a 80 A combinação
planta e edifício encontra-se também em Jr 24:6 e Ef 4:15, 16. É
correto que digamos que aqui há uma mescla de metáforas? Não é
um caso em que um metáfora segue a outra rapidamente? Não
posso ver nenhuma confusão aqui.

81 Tomo τ_ πίστει como um dativo de referência e não (como afirma


Lightfoot) como um dativo instrumental. Além disso, em contraste
com Lenski, creio que esta fé deve ser tomada em certo sentido
subjetivo, embora aqui (como em Cl 1:23) haja uma conexão muito
estreita entre esta atividade da fé e seu objeto, como o indica a
oração que segue (“segundo vos ensinou”).

Colossenses (William Hendriksen)

149

plenitude da deidade, e devido ao fato de que Ele é o Governador de


todas as coisas». Portanto, o que aqui temos é uma repetição,
embora seja uma forma um pouco diferente, da afirmação que fez o
apóstolo no versículo 4: “Digo isto, para que ninguém vos engane
com raciocínios persuasivos”. Está claro, então, que em toda essa
seção (vv. 1–10), Paulo está sublinhando que ele está
profundamente preocupado com os falsos mestres, uma vez que
suas teorias especulativas, apresentadas habilmente, poderiam
minar a confiança que tinham os colossenses em Cristo como seu
salvador completo. A este sistema subversivo de conceitos e ideias
morais, regulamentos e regras, ele o chama “filosofia e vãs
sutilezas”. E para descrevê-lo usa palavras como “tradição dos
homens” e “rudimentos do mundo”.

No entanto, existe outra interpretação destes versículos, que difere


incisivamente da que apresentamos no parágrafo anterior à maneira
de resumem. Esta interpretação afirma que o apóstolo coloca Cristo
em contraposição “os espíritos elementares do universo” (a frase que
pusemos entre aspas pertence à tradução que a R.S.V. faz do grego,
mas tanto a A.V. como a A.R.V. traduzem a mesma frase grega por
“os rudimentos do mundo”, v. 8). Para um comentário sobre esta
interpretação que, com o respeito que merece a erudição daqueles
que a apoiam, não posso aceitar, veja-se a nota 83 no final do
capítulo.

Por conseguinte, prossigamos com o que o apóstolo vem dizendo:


Estai alertas, para que não haja alguém que vos leve cativos
como despojo por meio de sua filosofia e vãs sutilezas. Aqueles
que foram resgatados do domínio das trevas e transpassados ao
reino do Filho do amor de Deus (veja-se Cl 1:13), não devem deixar
levar como despojo depois de um saque, e chegar assim a ser
escravos novamente (cf. Gl 5:1).

Levados cativos pela “filosofia” de alguém! Como Josefo o


demonstrou, naquele tempo qualquer sistema elaborado de
pensamento e/ou moral era chamado filosofia (cf. nossa expressão
“filosofia moral”, quando não se faz ênfase no aspecto científico).
Josefo afirma: «Há três tipos de filosofia entre os judeus. Os
seguidores da primeira escola são

Colossenses (William Hendriksen)

150

chamados fariseus; os da segunda, saduceus; e os da terceira,


essênios»

( Guerra judaica II.viii.2). Quando se tem em mente que o sistema de


erro que Paulo combate aqui tinha muitos aspectos pertencentes à
seita dos essênios, a importância desta citação de Josefo torna-se
evidente.

Filo também usa termos como «filosofia segundo Moisés» e «filosofia


judaica», quando fala sobre a religião hebraica. Paulo está
prevenindo a seus irmãos contra esse tipo de filosofia, que não é
mais que vãs sutilezas. É algo vazio e fútil. É ilusória, porque
enquanto promete grandes coisas àquelas que obedecem suas
ordenanças, realmente não pode cumprir o que promete (veja-se
sobre o v. 23). Paulo continua: segundo a tradição dos homens
(veja-se a nota 79, acima). Esta não era a tradição apostólica,
tampouco formava parte da corrente principal do pensamento do
judaísmo, embora tivesse algo em comum com o judaísmo e adotava
alguns de seus princípios. Antes, era uma mescla de cristianismo,
cerimonialismo judaico, ascetismo e culto aos anjos, como o indicam
os versículos 11–23. Era uma filosofia segundo os rudimentos do
mundo. A palavra “rudimentos” significa elementos, sejam do reino
físico ou do espiritual. O original grego usa o termo stoicheia, que
indica elementos ou unidades que compõem uma fileira ou série de
coisas, tais como as figuras (1, 2, 3, etc.) de uma coluna, ou as letras
do alfabeto (A, B, C, etc.); desta forma, é usado para referir-se aos
elementos básicos que constituem este universo (cf. 2Pe 3:10, 12).
Os antigos algumas vezes falavam da terra, do ar, do fogo e da água
como elementos. Deste significado se depreendeu facilmente outro,
ou seja, rudimentos ou noções preliminares; e, portanto, ensino
elementar (Hb 5:12). Nós falamos de “gramática elementar”,
“elementos da matemática”, etc. A expressão “rudimentos do mundo”
também aparece em Gl 4:3 (cf. Gl 4:9). Admite-se que esta é uma
passagem muito difícil de interpretar, que prova a exatidão de 2Pe
3:15, 16. É verdade, na verdade, que “nosso amado irmão Paulo”
algumas vezes escreveu algumas coisas “difíceis de entender”. Não
obstante, há uma coisa que sempre devemos ter em mente, ou seja,
que em Gálatas e Colossenses estamos tratando dos

Colossenses (William Hendriksen)

151

rudimentos do mundo, modificativo que não aparece em Hebreus e 2

Pedro. Agora, em harmonia com o contexto imediato (que fala da

“tradição dos homens”) provavelmente se deveria tomar o termo


mundo (kosmos) de Cl 2:8 em seu sentido ético (como com
frequência ocorre nas epístolas de Paulo), que indica, então, “a
humanidade separada da vida de Deus”. Estes são rudimentos de
homens mundanos. São rudimentos mundanos. Com toda
probabilidade, a interpretação que estamos dando ao modificativo de
mundo é válida também para Gálatas (cf. Gl 4:9, “fracos e pobres
rudimentos”). Portanto, à luz dos contextos (Gl 4:3 e 4:9), devemos
considerar seriamente o ponto de vista que considera a expressão
“rudimentos do mundo” como significando: ensino elementar sobre
preceitos, regulamentos e cerimônias pelos quais, antes que Cristo
se tornasse homem, o povo (tanto judeus como gentios) buscava e
procurava alcançar por seus próprios esforços a salvação. Com a
vinda de Cristo e o trabalho de Seus apóstolos, esta tendência e
ensino pecaminoso e indecente continuava, mas agora patrocinada
por judaizantes entusiastas, os quais procuravam combinar em seu
ensino a fé em Cristo e a confiança nas ordenanças farisaicas
mosaicas. Agora, este mesmo perigo de confiar em ordenanças que
suplementem a fé em Cristo se afirmou em Colossos (veja-se Cl
2:11–23), embora de uma forma um pouco diferente e mais
complicada. Assim como não é necessário nem correto negar que
estas regulamentações incluíam o culto aos anjos (veja-se os vv. 15
e 18), da mesma forma também devemos lembrar que o vocábulo
rudimentos não significa necessariamente anjos, mas aponta ao
falso ensino que aqui se condena.

Chega a ser evidente, então, que quando se dá à palavra rudimentos


o significado de ensino elementar (aqui em Cl 2:8 e 2:20), não é
correto descartar imediatamente este significado como se
definitivamente estivesse em desacordo com a maneira como o Novo
Testamento usa a palavra em outros lugares.

Agora, se somente se poderia ver as implicações da fé num Cristo


que é imensamente glorioso e todo-suficiente, então morreriam estes

Colossenses (William Hendriksen)

152

rudimentos, como o v. 20 o indica claramente. De modo que, todas


essa ideias toscas a respeito de regulações e ordenanças sobre
coisas como a circuncisão, festas, comidas e bebidas, culto aos
anjos, etc. serão descartadas, como meios totalmente inúteis para
alcançar a salvação em toda sua plenitude. É evidente que os
rudimentos mencionados em Gálatas e aqueles contra os quais o
apóstolo fala aqui em Colossenses pelo menos tinham uma coisa em
comum, ou seja, ambos eram “fracos e pobres” (Gl 3:9). Esta filosofia
é definitivamente “do mundo”, como necessariamente deve ser todo
sistema que não quer dar a Cristo toda a honra. É fútil e ilusória, e
não segundo Cristo. Inclina-se a afastar os homens de Cristo, e
procura debilitar sua fé nEle como o todo-suficiente salvador. Não
está em harmonia com a plenitude que os crentes têm nEle.
Portanto, Paulo afirma: porque nele reside corporalmente toda a
plenitude da deidade. Para a interpretação de toda esta cláusula
(menos o advérbio “corporalmente”), veja-se acima sobre Cl 1:19.
Quando o apóstolo descreve a Cristo desta maneira, tem em mente
Sua deidade, e não apenas a Sua divindade. Paulo se refere à
completa igualdade de essência que tem o Filho com o Pai e o
Espírito Santo, refere-se a que o Filho é consubstancial com o Pai e
o Espírito e não apenas semelhante. 82

82 Note-se a grande diferença que pode criar uma só letra: (1)


θεότης (palavra que se usa aqui em Cl 2:9 e que não aparece em
nenhuma outra parte do Novo Testamento) significa deidade; pelo
contrário θειότης (usada em Rm 1:20 e em nenhum outro lugar mais
do Novo Testamento) indica divindade. Cf. alemão: Gottheit und
Göttlichkeit; holandês: godheid em goddelijkheid. A diferença que
existe entre estas duas palavras foi expressa belamente por E.K.

Simpson: “A mão da onipotência é vista nas inumeráveis órbitas que


adornam com lentejoulas os céus e na maravilhosa ajuda mútua que
todas as coisas podem experimentar em nosso comparativamente
pequeno globo terrestre; mas no Filho contemplamos o rosto de
Deus ao descoberto, a imagem e transcrição expressas de seu
mesmo ser” ( Words Worth Weighing in the Greek New Testament).
Cf.

R.C. Trench, Synonyms of the New Testament, par.ii.

(2) _μοούσιος, segundo a declaração do Credo de Niceia, significa


da mesma substância ou essência, que faz ao Filho consubstancial
com o Pai, enquanto o termo mais fraco de _μοιούσιος, aquele que
os arianos preferem, só significa semelhante em substância ou
essência. Embora parecesse uma diferença corriqueira — só uma
letra! — no entanto, não é nada menos que a diferença entre

Colossenses (William Hendriksen)

153
Está afirmando que a plenitude da deidade reside em Cristo, isto é,
corporalmente.

Este advérbio recebeu muitas interpretações diferentes, tais como,


pessoalmente, essencialmente, universalmente (de uma forma que
abrange ou afeta a totalidade do universo), eclesiasticamente (de
uma forma que afeta a toda a igreja), antitipicamente,
verdadeiramente, etc.

Agora, todas estas teorias poderiam ser refutadas sem maior


argumentação, uma vez que não concordam com o contexto
imediato, porque dão ao advérbio um significado que não concorda
com a cláusula principal, porque atribuem a este advérbio mais
significado que aquele que tem, e também porque perdem de vista o
propósito principal que o apóstolo tem em mente ao escrever como o
faz.

No entanto, existem duas teorias que merecem mais atenção que tão
somente as mencionar:

A. O ponto de vista de Lightfoot ( op. cit. , pp. 182, 183), etc.

Segundo ele, corporalmente significa “com uma manifestação


corporal”, isto é, “como coroada pela encarnação”. Expositores de
renome adotaram este atrativo ponto de vista. Recorrem a
argumentos como o da importância que Paulo atribui à encarnação
(Gl 4:4), ao possível paralelo que encontramos em Jo 1:1, 14, e à
referência que Hb 10:5 faz ao corpo de Cristo (“mas corpo me
preparaste”), etc.

Objeções:

(1) Paulo está usando um verbo no tempo presente. Paulo não está
dizendo que o Verbo fez-se carne, mas que a plenitude da deidade
habita ou está habitando em Cristo. E certamente este habitar não
começou com a encarnação. Antes, é uma habitação eterna. Moule,
que favorece o ponto de vista de Lightfoot, no entanto, afirma
corretamente: «A objeção declarar que Jesus é Deus e dizer que é
um homem, um homem muito divino, na verdade, mas homem em
todo caso. Não era este o lema dos hereges, “Houve um tempo em
que ele não era”?

Colossenses (William Hendriksen)

154

principal contra a ideia de tomar σωματικ_ς (o advérbio) neste


sentido, quer dizer, como fazendo ênfase no fato de que a deidade
realmente se encarnou, está no tempo presente de κατοικε_ (“está
habitando”), o que não se pode tratar tão facilmente como se se
estivesse referindo a um acontecimento histórico do passado (como
Jo 1:14, σάρξ _γένετο (fez-se carne)” ( op. cit. , p. 93). Esse é
exatamente o ponto!

(2) Lightfoot argui que a cláusula principal (“porque nele habita toda a
plenitude da deidade”) refere-se ao Cristo pré-encarnado (“a Palavra
eterna, na qual habita a plenitude desde toda a eternidade”), mas
que o advérbio (“corporalmente”) que modifica esta cláusula refere-
se à encarnação. Isto é contraditório.

(3) Se interpretarmos o advérbio “corporalmente” de uma forma literal


(deixando que este advérbio realmente modifique, de uma forma
natural, a cláusula principal com seu verbo “habita” ou “reside”), não
se levantaria a objeção de que o Filho de Deus não é tão
dependente de um corpo físico (ou até da natureza humana) como
para que a deidade não possa habitar nele se não tem um?

Não é de admirar, que muito poucos escritores da antiguidade


adotassem esta interpretação, e que ainda hoje seja amplamente
rejeitada pelos eruditos, salvo exceções muito especiais.

B. O ponto de vista do Percy ( op. cit. , p. 77), e, em sua maior parte,


também o de Ridderbos ( op. cit. , pp. 176–178).

Ambos interpretam o advérbio como significando «de uma forma


concentrada, como se fosse visível e tangível». A fé pode ver
claramente que a plenitude da deidade habita em Cristo da
eternidade até a eternidade, tendo sido demonstrado este fato visível
e tangivelmente mediante as obras de criação e redenção
executadas por Cristo. A fé pode ver, então, que a totalidade da
essência e glória de Deus está concentrada em Cristo como num
corpo. Neste sentido é que se pode dizer que a plenitude da deidade
está incorporada, manifestada concretamente, realizada plenamente,
nEle. Isto não é mais que dizer em

Colossenses (William Hendriksen)

155

outras palavras que Ele é de eternidade a eternidade “a imagem do


Deus invisível” (veja-se Cl 1:15).

Creio que esta interpretação dá ao texto seu verdadeiro significado,


significado que além disso está em harmonia com o contexto, tanto
precedente como subsequente. Portanto, pelo fato de que toda a
plenitude da própria essência de Deus está concentrada em Cristo,
não existe nada que justifique nenhuma necessidade de buscar em
outro lugar ajuda, salvação ou perfeição espiritual. Portanto, o
apóstolo acrescenta imediatamente: e nele vós alcançastes
plenitude; isto é, em Cristo vós possuís a fonte da qual flui a
corrente de bênçãos que pode satisfazer qualquer necessidade que
tenhais, seja nesta vida ou na vindoura.

Portanto, permanecei nEle (Jo 15:4, 7, 9), e continuareis


experimentando que “de sua plenitude todos recebemos graça sobre
graça” (Jo 1:16; cf.

Ef 4:13). A igreja que permanece numa união vital com Cristo até o
extremo máximo da capacidade humana, recebe amor, paz, alegria,
longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, humildade,
moderação (Gl 5:22), sim, e toda graça cristã. Cristo é a fonte que
nunca falha. Por que, então, colossenses, cometeis a estupidez de
cavar para vós cisternas rotas, que não podem reter a água (Jr
2:13)? Por que confiar na circuncisão, sendo que já fostes
sepultados com Cristo no batismo (vv.
11–14)? Quão néscio é recorrer aos principados e autoridades,
quando nEle chegastes à plenitude, quer dizer, naquele que é a
cabeça de todo principado e autoridade (cf. v. 15). Para o
significado dos termos

“principado” e “autoridade”, veja-se sobre Cl 1:16. Ele é sua cabeça,


não no sentido pleno no qual é a cabeça da igreja (veja-se sobre Cl
1:18), a qual é Seu corpo, mas no sentido de que Ele é o governador
supremo de todas as coisas (Cl 1:16; cf. Ef 1:22), de modo que à
parte dEle os anjos bons não podem ajudar, e devido a Ele o mal não
pode ferir os crentes.

Colossenses (William Hendriksen)

156

Parece que o apóstolo queria dar ênfase a esta última ideia (veja-se
mais abaixo sobre o v. 15). 83

83 Na literatura sobre astrologia stoicheia (“rudimentos”) usa-se


frequentemente para referir-se aos espíritos elementares (ou, astrais)
ou seres elementares. Muitos sustentam que esse deve ser seu
significado aqui em Cl 2:8. Alguns tradutores adotaram este ponto de
vista: R.S.V., N.E.B., Moffatt, etc. Entre os muitos comentaristas que
favorecem esta tradução estão F.W. Beare, The Epistle to the
Colossians (em The Interpreters’ Bible, Vol. XI), pp. 191–193:
“divindades astrais que controlam os mundos e desta forma são os
donos do destino dos homens”; F. F. Bruce, Commentary on the
Epistle to the Colossians (em The New International Commentary on
the New Testament) pp. 228–232:

“governadores das esferas planetárias”; A. S. Peake, The Epistle to


the Colossians (em The Expositor’s Bible, Vol. III), pp. 521–524:
“espiritus astrais”; E.F. Scott, The Epistles of Paul to the Colossians,
to Philemon, and to the Ephesians (em The Moffatt Commentary), pp.
41–43: “agências pessoais, seres angélicos”; e cf. E. Percy, Die
Probleme der Kolosser- und Epheserbrief, pp. 156–167:
“seres espirituais que guardam uma relação com os elementos da
natureza”.

A seguir apresentarei os argumentos que se esgrimiram a favor


destas traduções, em uma ou outra forma; apresentá-los-ei junto
com minhas objeções:

(1) Existe muita evidência a respeito do uso muito extenso da palavra


neste sentido.

Resposta. “Quanto ao sentido seres elementares, a evidência à parte


do que se poderia deduzir dos contextos nos quais aparece a palavra
no Novo Testamento, é posterior ao período do clássico e, em todos
os casos determináveis, posterior ao Novo Testamento, e pertence a
escritos do tipo astrológico”

(C.F.D. Moule, The Epistle of Paul the Apostle to the Colossians and
to Philemon, en Cambridge Greek Testament Commentary, p. 91).
Novamente, “Portanto, aparentemente não há evidência definida que
στοιχε_ον signifique ‘espírito’, ‘anjo’ ou ‘demônio’, antes da qual
encontramos no Test.

Sal., a qual em seu presente estado é pós-cristã, e possivelmente


não mais antiga que o terceiro ou quarto século” (E. de Witt Burton, A
critical and exegetical commentary on the Epistle to the Gálatians,
pp. 510–518.)

Além disso, se este é o significado da palavra nos escritos de Paulo,


como é que nunca usa o termo em suas listas de anjos? (1 Cor.
15:24; Cl 1:16; 2:10, 15; Ef 1:21; 3:10).

(2) Quando o apóstolo diz, “segundo os stoicheia do mundo e não


segundo Cristo”, é evidente que pensa em Cristo como uma pessoa.
Portanto, a lógica nos força a tomar os stoicheia, os quais se opõem
a Cristo, como seres pessoais também.

Resposta. Se seguirmos esse tipo de raciocínio, as tradições


também são pessoas, uma vez que guardam a mesma relação para
com Cristo que a dos stoicheia. Observe: “segundo a tradição dos
homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo”.

(3) Em Gl 4:3, 9 estes stoicheia são associados, se é que não se


identificam, com os poderes angélicos. Agora, se isto é verdade
quanto a Gálatas, por que não pode ser verdade quanto a
Colossenses?

Resposta. O recurso a Gálatas não se pode justificar. Gl 4:10,


considerada como uma interpretação de Gl 4:9, indica que Paulo
está pensando no ensino rudimentar referente a observâncias. Além
disso, seria razoável crer que Paulo em Gl 4:3, 9 (note-se como se
inclui a si mesmo no v. 3) está afirmando que antes de sua
conversão ele, o fariseu, tinha sido escravo de fracos e pobres anjos
que controlam os corpos celestiais e a terra, a água, o fogo, etc.? Era
Paulo animista antes de sua conversão? Seria,

Colossenses (William Hendriksen)

157

talvez, um politeísta cheio de temor e espanto por causa dos


espiritus astrais que, segundo se supunha, tiranizavam a
humanidade no período de sua minoria?

(4) Mas Paulo menciona aos anjos em Gl 3:19: “a lei foi ordenada por
meio de anjos”. Não é verdade, então, que quando Cristo veio, estes
anjos apareceram como seus competidores procurando manter a lei,
e que Paulo agora está advertindo de não colocar-se novamente em
escravidão a estes anjos? Embora Paulo não estava advertindo
contra os espíritos astrais do paganismo, não poderia ter estado
advertindo contra os anjos mediadores da lei pertencentes ao
judaísmo?

Resposta. A ideia de que Paulo considera a observância da lei como


uma escravidão a anjos está desprovida da mais mínima evidência.
Paulo jamais faz os anjos responsáveis da ideia da salvação pelas
obras da lei. Ele mantém que a lei como tal não é um impedimento à
obra de Cristo, mas pelo contrário é santa e boa. E em Gl 3:19
representa claramente os anjos como acrescentando esplendor à lei.
Paulo não peleja com esses anjos. Pelo contrário, ele os favorece.

Além das obras já citadas, cf. H. N. Ridderbos, The Epistle of Paul to


the Churches of Galatia (en The New International Commentary on
The New Testament), pp. 152–154, 161; e H. Fransen, “Enkele
Opmerkingen over de exegese van Kol. 2:8 en 9”, GTT (1952), pp.
65–89.

Não admira, pois, que muitos comentaristas (embora provavelmente


ainda uma minoria) recusem adotar esta tradução, e interpretam
stoicheia como significando instrução rudimentar: Clemente de
Alexandria, escrevendo pelo ano 200 d.C., e claramente baseando
sua interpretação no contexto, afirma que Paulo chama
figurativamente à filosofia grega stoicheia deste mundo ( Stromata
VI.viii).

Tertuliano, contemporâneo de Clemente, e outra vez em perfeita


consonância com o contexto, escreve que Paulo advertiu aos
colossenses de que estivessem em guarda contra palavras e filosofia
sutis, sendo um engano vão, segundo os stoicheia do mundo,
“entendendo por isso, não a estrutura mundana do céu e a terra, mas
sim o ensino mundano, e a tradição dos homens muito sutis em sua
forma de falar e em sua filosofia” ( Contra Marción V.xix).

Mais próximo dos nossos dias, C. R. Erdman chama a estes


stoicheia “as normas cerimoniais dos judeus” ( Las epístolas a los
colosenses y a Filemón, pp. 69, 70, edición T.E.L.L., 1976); J. B.

Lightfoot chama-as “instrução rudimentar” Saint Paul’s Epistles to the


Colossians and to Philemon, pp. 178–181); C. F. D. Moule define-as
como “ensino elementar — ensinada por ritualistas judeus ou pagãos
… contrária à liberdade do Espírito” ( op.cit. , p. 92); Herman
Ridderbos, como “conhecimento elementar” e como “os princípios
básicos do mundo pecaminoso da humanidade” ( Aan De
Kolossenzen, em Commentaar op het Nieuwe Testament, p. 171); e
A. T. Robertson como “os argumentos enganosos dos filósofos
gnósticos com todos seus eónes y reglas de vida” ( Word Pictures in
the New Testament, Vol. IV, p. 491).

Entre todas as objeções que se levantaram contra esta interpretação,


duas são, talvez, as mais sobressalentes. Coloco-as junto com
minha resposta:

(1) Cl 2:8 implica um forte contraste entre os stoicheia e Cristo. Mas


quando estes stoicheia interpretam-se como significando instrução
rudimentar quanto a regras, ordenanças e observâncias, o contraste
desaparece. Percy diz, “Além disso, sobretudo existe esta
consideração, que a expressão τ_

στοιχε_α το_ κόσμου segundo Cl 2:8, 10 (como também segundo Gl


4:3, 9), tem que ver com algo que é absolutamente oposto a Cristo,
uma ideia que não satisfaz o significado de princípios religiosos
básicos, que como tais são ‘os fundamentos permanentes de toda
religião’, e que por isso retêm sua validez mesmo quando se
alcançou uma etapa mais avançada” ( op.cit. , p. 157).

Colossenses (William Hendriksen)

158

Com o propósito de mostrar a conexão que os vv. 11–17 guardam


com o que o precede de forma imediata, a seguir colocaremos outra
vez os versículos 9 e 10 que já explicamos.

2. ADVERTÊNCIAS CONTRA O CERIMONIALISMO JUDAICO -

CL 2:11-17

Nos versículos 1–10 as advertências contra a heresia de Colossos


foi expressa em termos gerais. No entanto, com o versículo 11, justo
na metade da cláusula, começa a tomar uma forma específica. Agora
aprendemos que o erro que estava sendo propagado em Colossos
tinha um caráter basicamente judaico. Por razões que não podemos
definir exatamente, se bem que se poderia inferir do contexto, e por
advertências semelhantes que encontramos em outras epístolas,
podemos afirmar que os falsos mestres estavam recomendando com
muito entusiasmo tais coisas como a circuncisão, um apego rígido a
uma dieta restringida, e a celebração de festas e sábados. Este
breve resumo faz dos versículos 11–

Resposta. Há, na verdade, um forte contraste nesta passagem,


devido ao fato de que são rudimentos do mundo, o mundo afastado
de Cristo, em cuja esfera tinham vivido os colossenses.

Quando a pessoa se volta a Cristo, estes rudimentos não se retêm.


Pelo contrário, somos informados explicitamente que os crentes
morreram para eles (Cl 2:20).

(2) A interpretação instrução rudimentar referente a regulamentos e


ordenanças não se conforma ao contexto. Percy, tendo primeiro
assinalado que os stoicheia têm em si mesmo nenhum outro
significado que elemento, rudimento, continua dizendo, “quando se
referem aos conhecimentos elementares, este significado deve surgir
do contexto, o que não acontece no presente caso” ( op.cit. , p.

157).

Resposta. Toda vez que Colossenses usa a palavra stoicheia, é


justamente o contexto imediato que, pelo uso dos termos sinônimos,
filosofia, vãs sutilezas, a tradição dos homens (v. 8), ordenanças,
preceitos e doutrinas de homens (v. 20 e 22), parece estabelecer a
idoneidade desta interpretação.

Clemente de Alexandria e Tertuliano dão uma explicação


basicamente correta. E não fala bem da objetividade da R.S.V.,
tradução que em outros respeitos é excelente, o fato de que não
considere a tradução instrução rudimentar (ou outra semelhante)
digna pelo menos de uma nota à margem (contraste-a N.E.B.). Se a
R.S.V. tivesse retido a leitura da A.V. (“rudimentos”) e se tivesse
deixado as elucidações aos comentários em lugar de impor seus
“espíritos elementares do universo” sobre um confiante público leitor,
esse proceder teria sido muito mais louvável, e ainda mais quando
em sua folha de apresentação colocou as palavras “sendo a versão
publicada em 1611 d.C.”, etc.

Colossenses (William Hendriksen)

159

17 uma só unidade de pensamento. Não obstante, a expressão


muda de um estilo claramente fluido e didático, que chega até o final
do versículo 15, a um estilo mais vigoroso, direto e exortatório, que
começa no versículo 16, e continua assim até o final da carta, com
muito poucas exceções (a mais longa encontramos em Cl 4:7–14). O
que faz com que Cl 2:11–17 seja uma unidade é o assunto que trata,
ou seja, a advertência contra o judaísmo. Mas nem mesmo esta
matéria é totalmente homogênea. A heresia que o apóstolo combate
era uma desconcertante mescla de crenças do judaísmo e do
paganismo, propagadas por homens que provavelmente faziam
passar por cristãos; sim, e por cristãos melhores que o resto. Como
já o mencionamos (Introdução II C), era precisamente o tipo de
sincretismo que alguém esperaria encontrar em Colossos, parte
judaica e parte pagã. Não admira que Paulo, que conhece todo o
quadro perfeitamente, mova-se facilmente de um elemento da
heresia de Colossos a outro elemento, e depois volte ao primeiro.
Por isso, pois, também nos vv. 11–17 notaremos que em meio das
advertências contra o judaísmo, o apóstolo aborda brevemente
alguns assuntos que tratará mais adiante, ou seja, a relação com os
anjos (v. 15) e o ascetismo (v. 16). No entanto, não o faz de uma
forma desconexa ou desordenada, mas em tal forma que os
versículos 11–17 formam uma unidade na qual cada cláusula leva a
seguinte de uma forma natural e orgânica, como o indicaremos.

11, 12. Falando, então, a respeito de Cristo, “a cabeça de todo


principado e autoridade”, Paulo continua: em quem também vós
fostes circuncidados. A ideia que Paulo quer comunicar poderia
parafrasear-se da seguinte maneira: Colossenses, não permitais que
estes falsos mestres vos enganem como se vós precisásseis ser
circuncidados literalmente (cf.
At 15:1; Gl 5:2, 3) para poder vencer o desejo de dar rédea solta aos
desejos da carne (Cl 2:23) ou para poder alcançar a salvação plena
(Cl 2:9, 10). Já fostes circuncidados! Sim, fostes circuncidados com
uma circuncisão que excede em muito o rito que tanto recomendam
os mestres do erro. Vós fostes circuncidados com uma circuncisão
efetuada

Colossenses (William Hendriksen)

160

sem mãos, mediante o despojamento do corpo de carne na


circuncisão de Cristo.

Note-se a seguir as diferenças que provam a grande superioridade


da circuncisão que os colossenses receberam:

Vossa circuncisão foi: a outra foi: (1) a obra do Espírito Santo


(“efetuada (1) uma operação das mãos sem mãos”) (cirurgia menor!)
(2) interior, no coração (ver Rm 2:28, 29; (2) exterior e também
C.N.T. sobre Fp 3:2, 3)

(3) um tirar e expulsar (note-se o duplo (3) tirar o excesso de


prepúcio prefixo em _πεκδύσει) a totalidade de vossa

natureza pecaminosa (“corpo da carne”),

para ser depois progressivamente realizada

em seu aspecto de santificação.

(4) cristã (“a circuncisão de Cristo”, isto é, (4) dada a Abraão e a


Moisés.

a circuncisão que vos pertence

por estar unidos a Cristo)


O apóstolo acrescenta outra característica mais sobre a circuncisão
que os colossenses tinham recebido: tendo sido sepultados com
ele em vosso batismo, no qual também fostes levantados com
ele. Significado: (1) Cristo sofreu, morreu e foi sepultado em vosso
lugar e para vosso beneficio. Ele carregou a culpa e o castigo da lei
por vós. Ele tomou sobre Si a maldição que descansava sobre vós
(Gl 3:13). Quando pela graça soberana de Deus recebestes a Cristo
como vosso Salvador e Senhor, recebestes também a segurança de
que vosso ser anterior, tão detestável e carregado de culpa como
era, foi sepultado com Ele, e que o estado que tínheis com relação à
lei mudou do de objetos de condenação a recipientes de justificação
(Rm 8:1–4; 5:1). Por conseguinte, não só fostes sepultados com Ele,
mas também fostes ressuscitados com Ele.

(2) Cristo conseguiu para vós a obra do Espírito Santo mediante toda
Sua obra de humilhação, incluindo Sua sepultura (Jo 16:7). De modo
que não só lhes pertence a justificação, mas também a

Colossenses (William Hendriksen)

161

santificação, quer dizer, uma renovação espiritual que se produz


gradualmente. O Espírito semeou em vossos corações a semente da
nova vida (Jo 3:3, 5). “morrestes, e a vossa vida está escondida com
Cristo em Deus” (Cl 3:3). Portanto, também neste sentido fostes
sepultados com Ele e ressuscitados com Ele.

Mas qual é a razão pela qual Paulo conecta “em vosso batismo”

com este ter sido sepultado e ressuscitado com Cristo? Não o faz
porque atribua algum poder mágico ao batismo. Veja-se 1Co 1:14–
17; cf. 1Pe 3:21. É evidente que Paulo exclui definitivamente desta
passagem a ideia de que o batismo, em virtude do próprio ato e
independente da condição do coração daqueles que ouviram e
professaram crer no evangelho, tem alguma virtude espiritual.
Por isso, pois, acrescenta cuidadosamente: mediante a fé no poder
84

eficaz de Deus, que o levantou dos mortos. O homem que ouve o


evangelho deve entregar seu coração ao Deus Todo-Poderoso, que
levantou Cristo dos mortos com Seu poder eficaz. Também deve crer
que o poder espiritual que procede do Salvador ressuscitado (Fp
3:10), derramará sobre ele tudo o que necessita para seu corpo e
alma, para esta vida e por toda a eternidade.

Qual é, então, o significado da frase “em vosso batismo”? É

evidente que Paulo está exaltando o batismo ao longo de todo este


parágrafo, e ao mesmo tempo mostra sua desaprovação sobre a
continuação do rito da circuncisão, se for estimado como necessário
ou conectado com a salvação. 85 De modo que se depreende
claramente de 84 Genitivo objetivo depois de πίστεως, como em Rm
3:22, 26; Gl 3:22; Ef 3:12; Fp 3:9; e 2Ts 2:13.

85 Paulo usa uma linguagem definida e forte para descartar a


circuncisão: Gl 5:2; Fp 3:2. Em Colossenses opõe-se a este rito para
crentes dos gentios nesta nova dispensação. Em certo sentido
religioso, a circuncisão era, na verdade, uma bênção na antiga
dispensação. Para uma pessoa que vivia nessa era, o receber o sinal
da entrada na aliança não era algo mau em si mesmo, certamente.
Pelo contrário, era uma bênção se se considerasse como o sinal e
selo da justiça da fé (Rm 4:11). No entanto, jamais devia considerar-
se como se fora em e por si mesmo um meio de graça ou algo
indispensável para a salvação. É lógico que com o derramamento do
sangue de Cristo no Calvário, estes sinais e selos sangrentos (a
circuncisão e o sacrifício do cordeiro pascal) tinham chegado ao seu
cumprimento, e ficaram anulados. Por conseguinte, o grave erro
destes falsos mestres era duplo: a.

Colossenses (William Hendriksen)

162
suas palavras que o batismo tomou o lugar da circuncisão. 86
Portanto, o que se afirma com relação à circuncisão em Rm 4:11,
sobre o que é um sinal e selo, vale também para o batismo. No
contexto desta epístola, o batismo é sinal e selo de ter sido sepultado
com Cristo e de ter sido ressuscitado com Ele. E, por conseguinte,
um sinal e selo de nossa união com Cristo, de nossa entrada à Sua
aliança e de nossa incorporação ao corpo de Cristo, a igreja (1Co
12:13). O sinal do batismo ilustra o poder que o sangue e o Espírito
de Cristo têm para nos purificar. Esta representação tão gráfica é de
um valor imenso (cf. Jó 42:5, 6). O selo certifica e garante a
operação desta atividade de amor e graça nas vidas de todos
aqueles que abraçaram a Cristo pela fé. O batismo, então, revela-
nos um Deus que com ternura mostra uma atitude condescendente
para com as fraquezas de Seu povo: suas dúvidas e temores. (Cf.
Hb 6:17; o mesmo se aplica ao sacramento da Santa Ceia, Lc
22:19). Na procurar impor este rito obsoleto sobre crentes gentios; b.
a ideia de que a circuncisão era em e por si mesma um meio de
graça, dando aos que se submetiam a ela uma bênção que a “mera”
fé em Cristo jamais lhe daria. O erro era, portanto, negar o caráter
todo-suficiente de Cristo! Veja-se mais sobre isso nos vv. 16 e 17.

No entanto, toda esta discussão se move dentro dos valores morais


e espirituais. Nada tem que ver com o valor físico ou com o valor que
tem para nossa saúde em qualquer época. S. I. McMillen, doutor em
medicina, em seu interessante livro, None of These Diseases
(publicado pela Fleming H.

Revell Co.) expressa o alto valor que tem a circuncisão para nossa
saúde, especialmente como uma medida preventiva do câncer
cervical (pp. 19–21). Suas observações e estatísticas são muito
interestantes e instrutivas. Mas esse é o lado físico do assunto.
Paulo discute o lado moral e espiritual.

86 Estou falando aqui de uma clara inferência. O contraste superficial


desta passagem é entre a circuncisão literal e a circuncisão sem
mãos, quer dizer, a circuncisão do coração, como já o explicamos.
Mas também é evidente que isto implica outra coisa, ou seja, “pelo
fato de que o batismo tomou o lugar da circuncisão (Cl 2:11–13), as
crianças devem ser batizados como herdeiros do reino de Deus e de
sua aliança” ( Form for the Baptism of Infants no Psalter Hymnal of
the Christian Reformed Church, Grand Rapids, Mich., 1959, p. 86).
Quando Deus fez sua aliança com Abraão, as crianças foram
incluídas (Gn 17:1–14). Esta aliança, em seus aspectos espirituais,
foi continuado na nova dispensação (At 2:38, 39; Rm 4:9–12; Gl 3:7,
8, 29). Portanto, as crianças ainda estão incluídos e ainda devem
receber o sinal, que na presente dispensação é o batismo, como
Paulo afirma claramente em Cl 2:11, 12. Certamente, Deus não é
menos generoso agora que o que foi na antiga dispensação!

Mais evidência que sustenta esta posição pode ser encontrada em


Mc 10:14–16; Lc 18:15–17; At 16:15, 33; 1 Cor. 1:16.

Colossenses (William Hendriksen)

163

verdade, Noé não desprezou o arco-íris (Gn 9:12–17). E aqueles que


estão felizmente casados não menosprezam seus anéis de noivos.

Por conseguinte, o significado de Cl 2:11, 12 é como segue (em


resumo): «Vós, os crentes, não tendes necessidade de uma
circuncisão externa. recebestes uma circuncisão muitíssimo melhor,
a do coração e a vida. Esta circuncisão é vossa em virtude da união
com Cristo. Quando ele foi sepultado, vós — isto é, vossa vida
anterior, vosso iníquo ser —

fostes sepultados com Ele. Quando Ele foi ressuscitado, vós — como
novas criaturas — fostes ressuscitados com Ele. Na experiência do
batismo recebestes o sinal e selo desta maravilhosa transformação
efetuada pelo Espírito”. 87

13. No espírito do otimismo cristão e de júbilo, Paulo continua: E a


vós, que estáveis mortos pelos delitos e pela incircuncisão da
vossa carne, vos deu vida juntamente com ele. Deus, em Sua
grande misericórdia, teve compaixão tanto dos gentios como do povo
da antiga aliança. “E a vós”
significa, «e a vós que antes éreis gentios, e como tais mortos moral
e espiritualmente, e isto não só por causa de vossos delitos
individuais 87 Esta discussão não seria completa se nada fosse dito
com relação ao modo do batismo, uma vez que os imersionistas se
baseiam especialmente em passagens como estas para fundamentar
sua pretensão de que o único batismo que vale é o batismo por
imersão. Nas palavras “tendo sido sepultados com ele em vosso
batismo”, eles veem um respaldo para a imersão na água; e nas
palavras “no qual também fostes levantados com ele” acham um
fundamento sólido para a imersão da água. Não obstante, com todo
amor e respeito por nossos irmãos em Cristo, atrevo-me a dizer que,
em conexão com o batismo, a Escritura também usa outras
expressões que, se continuamos baseando-nos neste tipo de
raciocínio, também teriam que considerar-se como expressões que
indicam o modo do batismo. Se ser sepultado com Cristo (Cl 2:11,
12; Rm 6:4) significa que o batismo deve ser por imersão, por que a
expressão ser crucificado com Cristo (Rm 6:6) não significa que o
batismo deve ser por crucificação, e ser plantado juntamente com ele
(Rm 6:5, assim no original, também a A.V.) não indica que deve ser
por implantação, e reestir-se de Cristo (Gl 3:27), não deveria ensinar
que deve ser por vestir-se? Segundo eu vejo as coisas, John Murray
está certo quando diz: “Quando todas as expressões de Paulo são
consideradas, podemos percever que não podemos ir à sepultura
com Cristo como a uma amostra do modo do batismo mais do
poderíamos ir à crucificação com Ele. E pelo fato de que esta última
expressão não indica o modo do batismo, não existe argumento
válido que apoie que a sepultura o faz.

A realidade é que há muitos aspectos que têm que ver com nossa
união com Cristo. E é arbitrário selecionar só um aspecto e encontrar
em sua linguagem a essência do modo do batismo ( Christian
Baptism, p. 31).

Colossenses (William Hendriksen)

164
contra a santa lei de Deus, mas também e basicamente por causa de
vosso estado diante de Deus». Este estado descreve aqui como “a
incircuncisão da vossa carne”, isto é, «vosso estado judicial de culpa;
e portanto, vossa condição de pecado, impotência, e portanto, uma
condição sem esperança alguma».

Sendo filhos da ira, sua incircuncisão física ou literal simbolizava sua


incircuncisão moral e espiritual. As palavras a vós voltam a repetir-se
no original em “vos deu vida” (lit. “a vós vos fez viver”) para efeitos de
ênfase. É como se Paulo estivesse dizendo: «Refleti nisso! e
continuai meditando em que Deus derramou tão grande graça sobre
vós, sim mesmo sobre vós que estáveis tão profundamente caídos,
tão perdidos sem nenhuma esperança, tão completamente
corrompidos em estado e condição”. Cf. Ef 2:1, 5. A origem
predominantemente gentílica desta igreja também se manifesta
claramente por passagens tais como Cl 1:21, 22, 27; 3:5–7
(passagens semelhantes em Ef 1:13; 2:1–3; 2:11, 13, 17, 22; 3:1, 2;
4:17, etc.). Mas o próprio Deus que levantou Cristo dos mortos,
nesse mesmo ato vivificou também os colossenses.

Por meio de uma colocação ordenada de alguns particípios

modificativos, o apóstolo nos mostra nos versículos 13, 14 e 15 tudo


o que está implicado neste fazendo viver do qual fala. Inclui: (1) que
nos é dado perdão: «tendo nos perdoado todos os nossos delitos»
(v. 13).

(2) cancelar um escrito: «tendo cancelado o documento escrito à


mão que estava contra nós» (v. 14).

(3) desarmar os espíritos: «e tendo despojado aos principados e


autoridades de seu poder» (v. 15).

A primeira coisa que é preciso fazer na obra de salvação é remover a


culpa de nossos pecados. Devido a isso, quando Paulo descreve a
maneira como fomos feitos vivos juntamente com Cristo, começa
dizendo: tendo nos perdoado todos os delitos. Note-se a notável
transição do vós ao nós. Porque se é verdade que “todos (judeus e
gentios) pecaram e estão destituídos da glória de Deus” (Rm 3:23),
então todos

Colossenses (William Hendriksen)

165

igualmente precisam ser perdoados. E uma vez que Paulo se


considerava

“o primeiro de todos os pecadores” (1Tm 1:15), era-lhe impossível


escrever a respeito de um tema como este sem ser comovido
profundamente em sua própria alma, uma vez que tinha
experimentado o que Deus fez por ele ao resgatá-lo de uma perdição
inevitável.

Perdão

1. Por que se enfatiza?

Devemos prestar especial atenção ao fato de que o apóstolo fala do


perdão em cada um dos primeiros três capítulos de Colossenses.
Não haveria alguma razão especial para isso? Lembremos que esta
carta seria lida em voz alta na igreja de Colossos reunida como
congregação, sim, à mesma igreja que se reunia na casa de
Filemom. E Filemom era o senhor de Onésimo, e Filemom devia
perdoar àquele que fugiu mas que agora estava voltando! É como se
eu estou presente no momento que se lê esta carta, e como se
escuto da boca de quem lê estas preciosas palavras:

“O Pai nos resgatou do domínio das trevas e nos trasladou ao reino


do Filho do seu amor, em quem temos nossa redenção, o perdão de
nossos pecados.… E a vós, que estáveis mortos pelos delitos e pela
incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, nos
tendo perdoado todos os delitos.… Revesti-vos, pois, como
escolhidos de Deus, santos e amados, de um coração de
misericórdia, de benignidade, de humildade, de mansidão, de
longanimidade, suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos uns
aos outros se alguém tiver queixa contra outro. Da maneira como o
Senhor vos perdoou, assim também fazei-o vós (quer dizer, perdoai
dessa forma)” (Cl 1:13, 14; 2:13; 3:12, 13). De modo que é como se
pudesse ouvir o Espírito Santo sussurrar no coração do hóspede da
congregação nessa casa, “Filemom, se o Senhor fez tudo isto para ti,
não deverias tu perdoar a Onésimo com alegria de coração, e aceitá-
lo como um amado irmão?”

Colossenses (William Hendriksen)

166

Mas certamente que estas palavras não eram só para Filemom, mas
se dirigiam a toda a congregação, e de fato — como Paulo nos
lembra, dizendo “tendo nos perdoado todos os delitos” — a todos os
crentes, tanto daquele então como de agora.

2. Quais são suas características?

A evidência demonstra que este perdão é:

a. gratuito. A palavra que se usa no original põe de relevo este fato


(χαρίξομαι, “perdoar gratuita e generosamente”; cf. χάρις, “graça”, ver
sobre Cl 3:13 a nota 132). O homem não pode consegui-lo por
méritos próprios (Rm 3:24; Tt 3:4–7). Pelo contrário, é a preciosa
dádiva de Deus em Cristo. Não é esta a razão pela qual o pecador
deve chegar a ser como uma criança para recebê-lo? Cf. Mt 18:1–3.
Conta-se a história de um homem que, estando no mercado, pôs à
vista do público algumas moedas de ouro de mais ou menos 10
dólares cada uma. Junto ao montão de moedas tão valiosas colocou
um letreiro que dizia: “leve uma totalmente grátis”. Muitas pessoas
passaram ao longo de todo o dia naquele lugar, mas riam e diziam:
“A quem crê que vai enganar”. Pouco antes de fechar o mercado,
uma criança viu o letreiro, estendeu a mão e tomou uma moeda!

b. generoso. Quando Deus concede alguma coisa ou quando


perdoa, não apenas tira de Suas riquezas, mas dá ou perdoa
conforme Suas riquezas (Ef 1:7). Seu amor perdoador superabunda
(Rm 5:20). Cf.
Is 1:18; Sl 103:12.

c. um perdão que Deus está ansioso para conceder. Deus “roga”

aos homens que se reconciliem com Ele, “não imputando aos


homens as suas transgressões” (2Co 5:19, 20). Cf. Sl 86:5.

d. certo. Quando Paulo recebeu sua missão da parte do Senhor, foi


enviado aos gentios “para lhes abrires os olhos e os converteres das
trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus, a fim de que
recebam eles remissão de pecados ...” Quando Festo deu a
conhecer suas dúvidas sobre a visão celestial de Paulo e sobre sua
missão, o apóstolo

Colossenses (William Hendriksen)

167

respondeu, dizendo: “Não estou louco, ó excelentíssimo Festo! Pelo


contrário, digo palavras de verdade e de bom senso” (At 26:16-18,
25).

Cf. Sl 89:30-35.

e. fundamental. Quando um pecador é resgatado do domínio das


trevas e trasladado ao reino do Filho do amor de Deus, a primeira
coisa que recebe é o perdão dos seus pecados. A limpeza moral e
espiritual (“santificação”) vem depois (Cl 1:13, 14, 22). De modo que
também aqui em Cl 2:13, a primeira bênção que se menciona em
conexão com a verificação de um pecador morto em delitos, é o
perdão. Cf. Rm 3:24.

Note-se como em Romanos 5 faz-se ênfase na justificação, seguido


por uma ênfase sobre a santificação, em Romanos 6. Vemos, pois,
que o mais básico e fundamental é «como um pecador pode chegar
a ser justo diante de Deus».

3. Como recebemos o perdão?


Por qual caminho guia Deus os Seus filhos rumo à possessão e o
desfrute pleno desta bênção fundamental?

a. Deve haver um pesar genuíno pelos pecados (uma tristeza


operada por Deus, 2Co 7:10). Cf. Mc 1:4.

b. Deve haver um desejo ardente por abandonar o pecado. Aqueles


que, em virtude da graça de Deus, estão ansiosos de fazer morrer
sua natureza pecaminosa (Cl 3:5-11) são perdoados (Cl 3:13). Cf. Pv
28:13.

Quando a mestra da escola dominical perguntou à classe “O que


significa arrepender-se?”, um garotinho respondeu, “Arrepender-se
significa estar o suficientemente triste pelo pecado para deixar o mal
que alguém está fazendo”.

c. Deve haver uma predisposição para perdoar a outros (Cl 3:13; Ef


4:32). Cf. Mt 6:14, 15.

14. Mas ao nos dar vida (veja-se v. 13) em Sua misericórdia, Deus
não apenas nos perdoou nossos delitos contra Sua santa lei, mas
ainda cancelou a própria lei, considerada em seu caráter de escrito
que

Colossenses (William Hendriksen)

168

demanda e pronuncia sobre nós maldição, aquela lei que por seus
muitos requisitos e estipulações nos condenava. Por meio do
sacrifício vicário de Seu Filho, Deus ab-rogou a lei como um meio de
salvação e como uma maldição que pendia sobre nossas cabeças.
Paulo afirma: tendo cancelado o documento escrito à mão que
estava contra nós, o qual por meio de suas demandas 88
testificava contra89 nós. Este manuscrito ou documento escrito à
mão é evidentemente a lei (cf. Ef 2:15). 90 Em certo 88 O original
produziu várias interpretações, e é difícil. A dificuldade se centraliza
em duas frases: κατά ἡμῶν e το_ς δόγμασιν. Se κατά ἡμῶν
traduz-se “contra nós” e το_ς δόγμασιν constrói-se com
“escrito à mão”, o resultado podria ser uma traducci6n asa que se lhe
pode acusar de ser tautológica:

“o manuscrito com suas ordenanças que estava contra nós, que nos
era contrário" (cf. a tradução bem semelhante na RA e RC). J. A. T.
Robinson esquiva a dificuldade, afirmando que κατά ἡμῶν

significa “em nosso nome” ( The Body, p. 43 n.). Mas é difícil


encontrar apoio para semelhante tradução. E. Percy ( op. cit. , pp.
88, 89), seguido por Ridderbos ( op. cit. , 186, 187), constrói το_ς

δόγμασιν com a cláusula seguinte: o que resulta em: “o manuscrito


que era contra nós, o qual por meio de suas ordenanças testificava
contra nós”. Eu adoto esta tradução em substância. Bruce ( op.

cit. , p. 237) apresenta sua objeção da seguinte maneira: “é antes,


torpe construir το_ς δόγμασιν com a cláusula adjetival que segue,
até com os paralelos que «Percy» aduz”. Não se pode negar, no
entanto, que existem esses casos paralelos, não só apresentados
por Percy ( op. cit. , p. 88, nota 43), mas também por Gram. N.T. Bl.-
Debr., seção 475,1. Embora possa ser considerado como algo
excepcional o fato de que se coloque um modificativo antes da
claúsula relativa à qual pertence, contudo não é tão excepcional,
como o indica a evidência que Percy e Bl.-Debr. apresentam. Além
disso, acaso não há, afinal, uma boa razão para que o modificativo
tenha essa impedido? Não é verdade que em contraste com os
falsos mestres com seu delírio por ordenanças e mais ordenanças, o
apóstolo deseja enfatizar a ideia de que precisamente por causa
dessas ordenanças era que a lei tinha vindo a ser nosso adversário,
que constantemente testificava contra nós como transgressores? Se
isto se tiver em mente, a ordem das palavras não nos será estranha.

89 _πεναντίον, na qual _ντί tem um sentido adversativo. Em Hb


10:27 το_ς _πεναντίους σιγνιφιψα os adversários. Também na LXX,
este composto com _ντί equivale ao hebraico ‘oyebh (inimigo) e car
(adversário, antagonista). Quando se está sem Cristo, a lei converte-
se no adversário do pecador, e traz testemunho contra ele.
90 É verdade que χειρόγραφον, que tem como significado básico
manuscrito, e portanto tem um sentido geral de qualquer documento,
frequentemente usa-se no sentido técnico de nota promissória, ou
certificado de obrigação. Veja-se A. Deissman, Light from the Ancient
East, pp. 331, 332. Se se tomar a palavra neste último sentido, “o
povo judeu poderia ser considerado como tendo assinado um
contrato no momento que se comprometeram sob maldição a
observar todos os preceitos da lei” (Dt 27:14–26; cf. Ex. 24:3). Assim
Lightfoot ( op. cit. , p. 187). Mas pelo fato de que o apóstolo fala de
um manuscrito que testificava contra nós, e ele está escrevendo
evidentemente a cristãos dentre os gentios, devemos encontrar a
forma que este significado técnico pode servir também para os
gentios.

Lightfoot oferece como uma solução “o assentimento moral da


consciência, que é como se se assinasse e selasse a obrigação”.
Muitos comentaristas seguem esta interpretação, em uma ou outra

Colossenses (William Hendriksen)

169

sentido essa lei era um adversário, um acusador de transgressores.

Confrontava os homens com a dura sentença: “Maldito todo aquele


que não permanecer em todas as coisas escritas no livro da lei, para
fazê-las”

(Gl 3:10; cf. Dt 27:26). Além disso, a lei também continha


muitíssimas regras cerimoniais e prescrições quanto a abstinências,
festas, comidas, ofertas, etc. Pelo fato de que nunca ninguém pôde
guardar a lei, seja em seu aspecto moral ou cerimonial, ela por muito
tempo reteve sua missão de acusadora. Mas com a vinda de Cristo,
que nasceu para morrer, uma grande mudança aconteceu. Paulo diz,
então, aos colossenses, acossados como estavam pelos falsos
mestres que procuravam a todo custo impor sobre eles as
cerimônias do judaísmo (mais outras inventadas por eles), que
«Deus ab-rogou91 completamente esse documento com todas suas
demandas legais». Como foi possível isso? Paulo responde: e o
tirou do meio ao cravá-lo na cruz. Deus anulou a lei, quando Seu
Filho satisfez completamente sua demanda de perfeita obediência,
levou sua maldição, e cumpriu suas sombras, tipos e cerimônias. A
lei foi cravada com Cristo na cruz. Morreu quando Ele morreu. E por
causa da natureza vicária do sacrifício de Cristo, os crentes já não
estão debaixo da lei, mas debaixo da graça (Rm 6:14; 7:4, 6; Gl
2:19). Isto não quer dizer que a lei moral tenha perdido seu
significado para o crente. Não pode significar que agora deve deixar
de amar a Deus acima de todas as coisas e o próximo como a si
mesmo. Pelo contrário, a lei de Deus tem uma validez eterna (Rm
13:8, 9; Gl 5:14). O crente encontra nela seu máximo prazer. O

forma. É uma teoria muito atrativa e se presta maravilhosamente


para um sermão. No entanto, é muito difícil de fazê-la harmonizar
com o contexto presente, o qual tem em consideração um
documento que contém regras e ordenanças. Além disso, na
passagem claramente paralela (Ef 2:15), o que foi ab-rogado pela
cruz não é “um certificado de dívida com nossa assinatura nele” mas
sim “a lei dos mandamentos com seus requisitos”. Portanto, estou de
acordo com Beare, quando afirma ( op. cit. , p.

198): “Isso representa simplesmente a lei como um código escrito”.


Cf. também Gl 3:13 “Cristo nos redimiu da maldição da lei”; e Rm 7:6
“mas agora fomos absolvidos da lei”.

91 A expressão sinônima “tirou-a do meio”, que significa “ab-rogou-a


totalmente”, indica-nos que não se deve fazer ênfase no significado
literal de _ξαλείφω. Aqui não se menciona o lavamento literal de uma
assinatura ou de uma admissão de dívida, mas sim a completa
destruição da lei, considerada como um código de regras e
ordenanças.

Colossenses (William Hendriksen)

170
crente a obedece em gratidão pela salvação que já recebeu como
uma dádiva da graça soberana de Deus. Mas foi libertado da lei
como um código de regras e prescrições, como um meio de obter a
salvação eterna, e como uma maldição que ameaça destruí-lo.

15. Aqui temos o último dos três atos importantes, pelos quais Deus
concede a Seus filhos a alegria da salvação (veja-se sobre o v. 13).
Estes três atos são: (1) o perdão de pecados, (2) a anulação da lei
(no sentido que explicamos), e agora (3) o desarmamento dos
principados e autoridades. Paulo diz: e tendo despojado os
principados e autoridades de seu poder, exibiu-os publicamente
para sua vergonha ao triunfar sobre eles nele. 92 Estes
“principados e autoridades” são seres angélicos (veja-se sobre Cl
1:16), os quais são descritos aqui (Cl 2:15) como resistindo a Deus.
Não sabemos claramente o por quê Paulo os menciona nesta
conexão. No entanto, é possível que a afirmação que se acaba de
fazer a respeito da anulação da lei como nossa acusadora
impessoal, tenha levado a apóstolo a referir-se a acusadores
pessoais, quer dizer, a anjos maus. 93 Na verdade, essa seria uma
transição muito natural. E também nos traz à mente o argumento de
Paulo em Romanos capítulo 8. Ali também, tendo assinalado que as
demandas da lei foram satisfeitas (Rm 8:1–4), o apóstolo pergunta
no v. 33, “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus?”, e no
v. 34 “Quem os condenará?” Poderia afirmar alguém que Paulo,
como bom conhecedor do Antigo Testamento, não está pensando
também em Satanás como um dos acusadores? (Jó 1:9–11; Zc 3:1–
5; Ap 12:10). Pelas passagens citadas, podemos ver que a ideia de
Satanás como o arquiacusador, é decididamente bíblica.

Naturalmente, a obra de Satanás e suas hostes, em sua intenção de


destruir os crentes, vai muito além da simples acusação. A baixeza
destas hordas de maldade se manifesta especialmente em que
primeiro 92 Note-se a estrutura simétrica dos vv. 14 e 15; nestes dois
versículos o verbo principal aparece entre dois particípios
modificativos.

93 Ridderbos rejeita esta ideia por não estar apoiada pelo contexto (
op. cit. , p. 189). Eu, no entanto, deixaria lugar para esta
possibilidade, pelas razões que dou no comentário.

Colossenses (William Hendriksen)

171

procuram fazer os homens caírem no pecado, e então, tendo tido


êxito em seu sinistro intento, acusam-nos diante de Deus, acusando-
os dos mesmos pecados que eles, estes espíritos demoníacos,
provocaram.

Agora, no meio desta terrível luta (cf. Ef 6:12), os colossenses


recebem uma palavra de alento. É como se Paulo lhes dissesse: não
deveis estar temerosos destas hostes da maldade, porque em
princípio a batalha já foi ganha. E foi ganha para vós. O próprio Deus
desarmou94

estes principados e autoridades. Porventura não nos resgatou do


domínio das trevas? (Cl 1:13). Não é Seu Filho a cabeça de todo
principado e autoridade? (Cl 2:10). Não é verdade que os
principados e autoridades (como também os tronos e domínios) não
são mais que meras criaturas, criadas por Ele, através dEle e para
Ele? (Cl 1:16). Portanto, devem lembrar que, por meio desse mesmo
Filho, Deus despojou esses principados e autoridades de seu poder.
Desarmou-os totalmente. Não triunfou Cristo sobre todos eles na
tentação do deserto? (Mt 4:1–11).

Porventura não atou ao homem forte? (Mt 12:29), e não o


demonstrou expulsando demônios vez após vez? Não viu cair a
Satanás como um raio do céu? (Lc 10:18). Quando Satanás e suas
hostes fizeram sentir do Getsêmani até o Gólgota (Lc 22:3, 53; Sl
22:12, 16), não privou Cristo, por meio de Sua morte vicária, a
Satanás de toda aparência de fundamento legal sobre o qual basear
suas acusações? Não foi expulso o acusador dos irmãos, e isto não
só pela morte de Cristo como nosso 94 Nisto concordo com
Ridderbos, em contraposição com Lightfoot e outros. Veja-se a
extensa argumentação que Lightfoot dá para mostrar que
_πεκδυσάμενος deve ser traduzido como um verdadeiro verbo na
voz média, de tal forma que o sentido seria que Cristo despojou-se a
si mesmo dos poderes do mal “os quais se agarraram de sua
humanidade como uma túnica de Neso ( op. cit. , p.

190).

Em oposição a este ideia, note-se:

(1) Que no Novo Testamento a voz média é usada ocasionalmente


onde se espera a voz ativa.

Veja-se Gram. N.T. Bl.-Debr. parágrafo 316.

(2) Que em Ef 6:11, 14; 1Ts 5:8 o verbo _νδύω usa-se na voz média
com o significado de ponho-me uma armadura. Portanto, aqui em Cl
2:15 _πεκδυσάμενος (voz média), pode significar perfeitamente
desarmar.

(3) O sujeito desta oração ainda é Deus. É difícil pensar em Deus


como despojando-se dos anjos maus como se estes estuviésen
pegos a ele como uma vestimenta.

Colossenses (William Hendriksen)

172

substituto, mas também por Sua triunfante ressurreição, ascensão e


coroação? (Ap 12:10; Ef 1:20–23). Não é certo, então, que mediante
estes grandiosos atos redentivos, Deus exibiu publicamente estes
poderes malignos para sua vergonha, levando-os como cativos
acorrentados em seu desfile militar de triunfo? 95 Sim, em e através
do Filho do seu amor, o Cristo triunfante, Deus venceu Satanás e
todas as suas hostes. E esta vitória é vossa vida e vossa alegria.
Tudo o que necessitais está em Cristo.

16, 17. Paulo continua falando agora em consonância com o que


veio dizendo a respeito da argumentação persuasiva (Cl 2:3), a
filosofia, as vãs sutilezas, as tradições dos homens e os rudimentos
do mundo (Cl 2:8), que caracterizavam o pensamento e a
propaganda destes falsos mestres, e as demandas da lei (Cl 2:14),
às quais tinham agregado seus próprios preceitos. De modo que diz:
Portanto, não permitais que sejais julgados em assuntos de
comida ou bebida, ou quanto a uma festa ou lua nova ou
sábado.…

O aspecto judaico da heresia de Colossos pode ser visto aqui


claramente. Não obstante, também é evidente que este erro ia além
de ser uma mescla de religião judaica e cristianismo (o qual é
chamado judaísmo), uma vez que os falsos mestres de Colossos não
só julgavam os irmãos sobre assuntos de comida, mas também em
coisas de bebida, apesar de que com relação ao último o Antigo
Testamento continha muito poucas proibições (Lv 10:9; Nm 6:3; Jz
13:4, 7, 14), embora seja desnecessário dizer que a falta de
moderação se condena vigorosamente (Is 5:11, 12; Am 6:6; Pv 20:1).
Quanto à comida, parece que os falsos mestres tinham colocado
suas próprias regulações acima das leis que o Antigo Testamento
tinha dado sobre animais limpos e imundos (cf. Lv 11). Também
tinham procurado impor certas restrições em conexão com algumas
festas — pensemos na Páscoa, no Pentecostes, na Festa dos
Tabernáculos, e outras mais talvez (cf. Lv 23) — sobre novilúnios (cf.

95 Cf. Ef 4:8, e para uma aplicação favorável da metáfora, veja-se


2Co 2:14.

Colossenses (William Hendriksen)

173

Nm 10:10; 28:11), e o sábado (cf. Êx 20:8–11; 31:14–16). Por tudo


isso, então, vislumbrava-se uma tendência acentuadamente
ascética. O

propósito principal que os falsos mestres tinham ao pôr tanta ênfase


em todos esses regulamentos, era convencer os colossenses que,
para alcançar a salvação, era preciso e era imprescindível guardar
estritamente todas essas prescrições; e se não para a salvação
como tal, pelo menos para a plenitude, a perfeição na salvação (veja-
se sobre os vv. 9, 10). Paulo passa a sentar uma forte advertência
contra esta implícita negação do caráter todo-suficiente de Cristo, e o
faz dizendo: coisas que — até em seu legítimo contexto, ou seja, o
Antigo Testamento

— só eram uma sombra daquelas que haviam de vir, mas o


objeto que arroja a sombra encontra-se em Cristo. 96

Por que ter como indispensável o submeter-se a preceitos sobre


comida, quando Aquele que foi anunciado pelo maná de Israel nos
oferece Ele mesmo como o Pão da vida? (Jo 6:35, 48). Como se
pode considerar a Páscoa (cf. Êx 12) como uma observância
necessária para a perfeição espiritual, se “nossa páscoa, que é
Cristo, já foi sacrificado por nós”? (1Co 5:7). Que justificação haveria
para impor aos que se convertem do mundo gentílico a observância
do sábado judaico, quando Aquele que traz o descanso eterno exorta
a todos a irem a Ele? (Mt 96 Com base na tradução “mas o corpo é
Cristo, alguns opinam que o significado é, “mas é o corpo de Cristo
(a igreja) que deve julgar em todos esses assuntos”. Mas é evidente
que as palavras σκιά

(sombra) e σ_μα ( corpo ou objeto) formam uma unidade, e introduzir


a igreja neste ponto é totalmente arbitrário. Além disso, a leitura do
original é: τ_ δ_ σ_μα το_ χριστο_, que literalmente significa “…

mas o corpo (ou: o objeto) … de Cristo”, o que provavelmente


significa “… mas o objeto encontra-se em Cristo”.

A tradução, “mas a substância (ou a realidade) é Cristo”, é muito


popular. E não falta muito de ser correta. Não obstante, me parece
que, devido à íntima conexão que há entre σκία e σ_μα (as quais são
contrapartes), Paulo está pensando em uma sombra e num objeto
que faz a sombra. O contraste verdadeiro que o apóstolo está
fazendo, não é precisamente entre o irreal e o real — tanto as
ordenanças do Antigo Testamento referente a estes assuntos, como
as coisas mesmas, eram bastante reais — mas antes, entre aquilo
que era passageiro, e que portanto devia ser tirado, e aquilo que era
permanente. A sombra veio antes que o objeto que a fez: a lei com
suas regulações quanto a comidas, festas, etc., prefigurou a
salvação em Cristo. Por que permanecer aderido à sombra se o
objeto que a fez atracou já?

Colossenses (William Hendriksen)

174

11:28, 29; cf. Hb 4:8, 14). Certamente, uma sombra que é jogada por
uma pessoa que se aproxima, poderia ser de valor. Por exemplo, é
possível que alguém esteja esperando ansiosamente uma pessoa,
mas acontece que está parado de tal forma que, ao aproximar-se a
pessoa, por um momento só se vê sua sombra. Mas essa sombra
não só garante que o visitante está para chegar, mas também ainda
provê um esboço parcial que o descreve. Assim também, os
preceitos do Antigo Testamento tinham servido para um bom
propósito. Mas agora que Cristo e a salvação nEle chegaram, podem
continuar sendo úteis aquelas sombras?

Embora não fosse mau que os judeus, acostumados a todas essas


coisas desde a infância, observassem (por um período de transição)
esses costumes como simples costumes, sem relacioná-las
absolutamente com a salvação, contudo era totalmente errôneo
atribuir-lhes um valor que não tinham e procurar impô-las sobre os
gentios. E se isto era assim com relação às prescrições do Antigo
Testamento, seria muito mais quanto a prescrições de fabricação
humana e de caráter ascético, as quais eram impostas,
acrescentadas e, às vezes, ainda colocadas em lugar da lei de Deus.
Deste modo, então, estava-se negando a toda-suficiência e
preeminência de Cristo. E este, afinal, era o erro principal.

3. ADVERTÊNCIAS CONTRA O CULTO AOS ANJOS - CL 2:18-19

18. Paulo aborda agora o problema do culto aos anjos, que era uma
das características da heresia colossense. Paulo escreve: Ninguém
vos desqualifique. 97 Que nenhum ritualista venha com palavras
como,
«Colossenses, vós estais fora da carreira ou contenda, porque não
guardais minhas regras e preceitos. Sois uns ineptos e indignos». E

97 A palavra καταβραβεύετω é afim etimologicamente com βραβεύς,


quer dizer, juiz, árbitro. Embora o verbo é raro, e no Novo
Testamento só aparece aqui (veja-se, no entanto, Cl 3:15 onde se
encontra o verbo simples βραβεύω), não há razão para que nos
separemos de seu significado etimológico: fazer uma decisão como
árbitro contra alguém, ditar um veredito desfavorável sobre uma
pessoa, declarar (a alguém) desqualificado. Assim também R.S.V.,
N.E.V., e Moule.

Colossenses (William Hendriksen)

175

especialmente, não vos sintais inferiores quando esse tipo (além de


estar dando tanta importância àquelas restrições, tais como as que
têm que ver com a comida, bebida, etc.) procure vos envergonhar
fazendo um forte contraste entre vós e ele. Não lhe permitais que vos
desqualifique por meio de deleitar-se98 na humildade.… Agora, a
humildade sincera é, na verdade, uma virtude maravilhosa (cf. Cl
3:12, e veja-se C.N.T. sobre Fp 2:3), mas a humildade da qual se
jactavam estes falsos mestres não era mais que uma tênue máscara
que cobria uma soberba incurável, como se pode ver claramente
pelo que diz o versículo 23. Paulo continua, e (deleitando-se também
em) o culto aos anjos. Surge a pergunta: Qual é a relação entre a
humildade e o culto aos anjos? Não se dá a resposta. É

possível que a sugestão que mais de um comentarista deu seja


correta, ou seja, que o falso mestre procurava dar a impressão de
que se considerava a si mesmo muito insignificante para achegar-se
a Deus diretamente e, portanto, procurava pôr-se em contato com a
deidade através da mediação de anjos, aos quais prestava culto,
uma vez que os anjos estavam dispostos a servi-lo desta forma, ou
talvez para que se sentissem obrigados a ajudá-lo.
Existe muito desacordo entre os comentaristas quanto às palavras
que traduzimos culto aos anjos. Outros preferem traduzir: “piedade
angélica” ou “culto praticado por anjos”. Mas o fato de que nesta
epístola Paulo faz uma ênfase constante sobre a preeminência de
Cristo acima de todas as criaturas, incluindo os anjos (Cl 1:16, 17,
20; 2:9, 15), e que ele diz “dos anjos”, tudo isso pareceria indicar que
está combatendo o culto aos anjos. Mas há mais, uma vez que existe
evidência que tende a apoiar a teoria de que na região geral de
Colossos praticava-se o culto aos anjos. Não condena o Espírito
Santo, através de João, o discípulo que Jesus amava, fortemente o
culto aos anjos? Veja-se Ap 19:10; 22:8, 9. E João, não usou Éfeso,
uma cidade que estava a só 98 Para o significado de θέλων _ν cf.
1Sm 18:22 (LXX), “o rei se deleita em ti”. Cf. também 1Rs 10:9; Sl
112:1 (LXX 111:1).

Colossenses (William Hendriksen)

176

uns cento e sessenta quilômetros a oeste de Colossos como sua


base por uma boa parte de seu ministério? Além disso, como já
observamos na nota 76, os essênios, cujas doutrinas se semelham
em algo à doutrina atacada aqui (embora os falsos mestres de
Colossos podiam não ter sido essênios), puseram como requisito
para ser admitido como membro em plena comunhão, que
guardassem o seguinte juramento: «Guardar cuidadosamente … os
nomes dos anjos». O Sínodo de Laodiceia — uma das três cidades
do vale do Lico; veja-se a Introdução II A — declarou o seguinte no
ano 363 d.C.: «É pecado um cristão abandonar a igreja de Deus e
apartar-se para invocar os anjos» (Cânon XXV). Um século depois,
Teodoreto, ao comentar precisamente esta passagem da Escritura
(Cl 2:18), declara: «O mal que o apóstolo Paulo denuncia, continuou
por longo tempo na Frígia e Pisídia». Irineu, ele mesmo oriundo da
Ásia Menor, mas um grande viajante, em sua obra Contra as
Heresias (182–

188 d.C.), dá a entender claramente que o culto aos anjos estava


bastante espalhado no campo dos emissários do erro e que a igreja
primitiva permaneceu firme contra esta pratica ímpia, ao dizer: «Ela
(a saber, a igreja) tampouco leva a cabo nada por meio de
invocações aos anjos, ou por encantamentos, ou por qualquer outra
arte ímpia; pelo contrário, ela dirige suas orações ao Senhor que
criou todas as coisas … e invocando o nome de nosso Senhor Jesus
Cristo, teve por costume fazer milagres para o bem da humanidade,
em vez de guiar os homens ao erro» (II.xxxii.5).

Sabe-se que Miguel, um dos líderes das hostes celestiais, era


adorado extensamente na Ásia Menor, e que também seu culto
durou muitos séculos. Por exemplo, numa data tão avançada como
739 d.C., o lugar de uma grande vitória sobre os sarracenos foi
dedicado a ele. As inscrições encontradas na Galácia também
incluem seu culto. E foram atribuídos a ele milagres de cura. 99

Por tudo isso, pois, parece que a tradução “culto aos anjos” é
correta. Para a teoria que afirma que estes anjos eram “espíritos
astrais”

99 Cf. W.M. Ramsay, The Church in the Roman Empire, pp. 447–
480.

Colossenses (William Hendriksen)

177

ou “governadores das esferas planetárias”, veja-se a nota 83 acima.


E

para o ensino de Paulo com relação aos anjos, veja-se sobre Cl 1:16,
17; 2:15, e também C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, pp. 208–209.

Paulo continua: apegando-se100 às coisas (visões) que viu. 101

100 As palavras _ _όρακεν _μβατεύων causaram uma quase


interminável discussão. Lightfoot completamente renuncia ao intento
das explicar. Ele afirma: “A combinação é tão tosca e incongruente
que quase não é possível; e deve ter havido uma corrupção no texto
anterior às testemunhas que nos chegaram”. Ao verbo _όρακεν
separa-lhe as letras, saca κεν, e as prefixa ao particípio _μβατεύων,
depois faz uma pequena alteração à palavra a qual se tirou κεν, e
desta forma chega ao seguinte resultado: _ώρ_ (o α_ώπ_)
κενεμβατεύων “caminhando no vazio enquanto está suspenso no ar”,
isto é, “gratificando-se frivolamente em especulações vãs”. J.R.
Harris, em seu artigo

“St. Paul and Aristophanes”, ET 34 (1922, 1923), pp. 151–156, viu


um paralelo entre Cl 2:18 e a linha 225 da obra As nuvens, escrita
por Aristófanes, na qual Sócrates, estando suspenso numa cesto,
quando lhe foi perguntado o que fazia, respondeu: “caminho pelo ar
e contemplo o sol”. Segundo este ponto de vista, Paulo, tendo lido As
nuvens, está ridicularizando aqui aos filosofos de Colossos, como
Aristófanes satirizou a Sócrates.

Bem poderia perguntar-se, no entanto, se essa interpretação e


outras semelhantes (todas baseadas numa emenda do texto) são
necessárias. Afinal, o significado primário de _μβατεύω é me paro
sobre, coloco meu pé sobre (para exemplos deste uso veja-se Liddel
and Scott, Greek-English Lexicon vol. I, p. 539); e portanto, entro em,
aprofundo em, investigo, e deste modo chega a significar apego-me
a.

Veja-se G.G. Findlay, “The Reading and Rendering of Colossians


2:18”, Exp. first series, 11 (1880), pp. 385–398.

W.M. Ramsay, baseando-se numa inscrição do templo do Apolo de


Klaros (datada do segundo século d.C.), traduz Cl 2:18b, 19a como
segue: “apegando-se-se ao que viu (nos mistérios), inutilmente
inchado por sua mente não-espiritual, e sem apegar-se firmemente
da Cabeça”. Veja-se The Teaching of Paul in Terms of the Present
Day, pp. 283ss. Esta explicação do termo é apoiada por M.M., pp.
205, 206, por Bruce op.cit. , pp. 248–250, e também por R.S.V.,
A.R.V. (nota à margem), e The American Standard Bible. E creio que
também está apoiada pelo contexto: o homem que se apega a — e
portanto, jacta-se de (como o expressa a Berkeley Version) — o que
viu, descreve como inutilmente inflado (“inchado”) por sua mente
carnal. Cf. também o vocábulo _μβατεύω em L.N.T.
(A. e G.), p. 253. Ridderbos ( op.cit. , p. 194), por outro lado, favorece
(embora com muita cautela) a tradução: “como um iniciado entrando
no que pretende ter visto”. Este entrando em pode comparar-se com
a tradução metendo-se em da RC 1998. Embora por nenhum
momento nego que Ridderbos possivelmente tenha a razão, pelo
fato de que há evidência definida a favor deste uso da palavra,
considero que a tradução apegando-se a é provavelmente a que está
mais em harmonia com o contexto neste caso, como já foi indicado.

101 A inserção do não (RC 1998 “coisas que não viu”) não está
apoiada no original pela evidência textual de maior peso. É possível
que algum copista que não entendeu que quando Paulo disse
(referindo-se ao falso mestre), “apegando-se-se às coisas que viu”, o
que queria dizer era “nas coisas que ele pretende (ou, crê) ter visto”,
colocou este não em sua cópia, pensando que caso contrário o
ritualista recibiria muito crédito. Mas o modismo que Paulo usa é
muito claro. Podemos comparar a expressão de Paulo, “as coisas
que viu”, com a de Cristo “… para que os que veem sejam cegados”

Colossenses (William Hendriksen)

178

Este indivíduo pretende (talvez até crê) ter visto algo, e se jacta de
sua experiência. Faz dela o assunto mais grandioso. Se alguém se
atrever a contradizê-lo ou a pôr em dúvida suas teorias, responderá:
«Mas eu vi esta e esta outra visão». Ao dizer isso, e ao relatar sua
visão, tomará, naturalmente, um ar de ter uma penetração profunda
de mistérios revelados divinamente. Ele se vangloria do que ele
considera seu conhecimento superior. Esquece-se que “o
conhecimento envaidece, mas o amor edifica” (1Co 8:1). Este
homem, continua Paulo, está inchado sem causa por sua mente
carnal. Note-se o “sem causa”, isto é, apesar de ele estar inchado de
uma exaltada opinião a respeito de si mesmo, a verdade é que não
tem nenhuma boa razão para sentir-se desse modo.

Além disso, sua mente é claramente a mente da carne, a atitude ou


disposição de um coração e mente à parte da graça que regenera.
102

Neste contexto, é importante observar que não é necessário que a


mente esteja “atada às coisas que são apenas materiais” para que
essa mente seja “carnal” ou “da carne”. 103 Pelo contrário, a mente é
carnal quando baseia sua esperança para a salvação em qualquer
coisa que não seja somente Cristo, como o indica claramente o
versículo 19. Não faz nenhuma diferença se o fundamento onde tem
sua esperança colocada seja a força física, a habilidade, as boas
obras, ou, como aqui, visões transcendentais. Tudo é igualmente “a
mente da carne”. Note-se como Paulo desmascara este indivíduo
que pretende deleitar-se na humildade ou auto-humilhação. É como
se dissesse: «Este homem que pretende ser muito humilde, na
verdade é insuportavelmente orgulhoso. Sua mente está inflada com
o sentido de sua própria importância, ao jactar-se das coisas que diz
ter visto”. Contraste esta conduta de mau gosto com (Jo 9:39b), que
significa, “para que aqueles que pretendem ver, e que
constantemente dizem, nós vemos, sejam cegados” (cf. Jo 9:41).

102 Para um sumário dos significados que σάρξ tem nas epístolas
de Paulo, veja-se C.N.T. sobre Fp 1:22, nota 55. O significado g.
corresponde aqui.

103 Assim como (L.N.T. A. e G., p. 547), interpreta erroneamente


esta palavra como se usa em Cl 1:18.

Colossenses (William Hendriksen)

179

relação a visões duvidosas com a sensível reação de Paulo quanto a


visões verdadeiras (2Co 12:1–4).

19. O problema com este indivíduo (um amálgama de visionário,


filósofo, ritualista, adorador de anjos e asceta) é que está apoiando-
se nas coisas que viu … e não agarrado firmemente da Cabeça.
Não se apega a Cristo. Falha ao não notar que Cristo é todo-
suficiente para a salvação, e que todos os tesouros da sabedoria e o
conhecimento estão escondidos nEle (Cl 2:3, 9, 10). Portanto, Paulo
continua: da qual todo o corpo, sustentado e unido pelas juntas e
ligamentos, cresce com um crescimento (que é) de Deus. Não
deveria ser necessário defender a proposição de que quando o
apóstolo, tendo falado de Cristo como da cabeça, agora fala a
respeito de todo o corpo, ele está pensando na igreja. É mais que
evidente que, neste contexto, este é o único significado possível, o
que também se demonstra claramente por passagens como Cl 1:18,
24; 3:15; Ef 1:22, 23; 4:16. 104

A figura básica destas palavras é a do crescimento do corpo


humano. Alguns puseram em dúvida a aptidão da metáfora que
Paulo usa aqui, e isso por duas razões:

Objeção Nº. 1. O apóstolo dá a entender que a cabeça do corpo


humano é a fonte do crescimento. Isto é fisiologia antiga e errônea.

Resposta. Como já se indicou em Cl 1:18, o hormônio que está


intimamente relacionado com o crescimento dos tecidos conectivos e
com o esqueleto, origina-se na glândula pituitária, que se aloja numa
pequena cavidade na base do crânio. E esta é apenas uma das
tantas formas pela qual a cabeça exerce uma influência considerável
sobre o crescimento do corpo.

Objeção Nº. 2. Segundo Paulo, o corpo é «alimentado” (NTLH: “o


alimenta”) pelas juntas e ligamentos. De forma semelhante, Lightfoot
afirma que uma das duas funções das juntas e ligamentos é «suprir
104 É, na verdade, assombroso que Dibelius procure defender a
teoria de que o corpo é aqui o cosmos.

Veja-se sua interpretação da passagem (e também a de Cl 1:18 e


2:10) M. Dibelius-H. Greeven, An die Kolosser, Epheser, An
Philemon, 1953 (em Handbuch zum Neuen Testament).

Colossenses (William Hendriksen)

180
alimento» ( op. cit. , p. 200). Mas agora se sabe que não são as
juntas e ligamentos, mas sim é a corrente sanguínea que leva a
nutrição às diversas células e tecidos do corpo humano. Portanto,
Paulo está errado.

Resposta. A tradução correta é “todo o corpo, sustentado e unido


pelas juntas e ligamentos”. 105 Agora, o fato de que o corpo é, na
verdade, suportado e unido desta forma é algo bem sabido. Não é
refutado nem pela ciência mais moderna que possamos encontrar.
Portanto, em lugar de sugerir que o apóstolo está baseando seu
argumento numa «fisiologia inexata» (Moule, op.cit. , p. 107),
deveríamos perguntar se a tradução segundo a qual as juntas e os
ligamentos «suprem alimento» (ou nutrição) ao corpo, não é uma
«tradução inexata».

Com isso terminamos de falar sobre a figura básica. Agora, quanto à


verdadeira mensagem que o apóstolo deseja comunicar, podemos
dizer que é evidente que a ideia principal, segundo o contexto, é que
toda a igreja deve seu crescimento a Cristo. A igreja não necessita
nem deve buscar outra fonte de poder para vencer o pecado ou para
crescer em conhecimento, virtude e alegria. Como o corpo humano,
quando está devidamente sustentado e unido pelas juntas e os
ligamentos, experimenta um crescimento normal, assim também a
igreja, quando cada um de seus membros sustenta e mantém um
estreito contato um com o outro, prosseguirá, sob o cuidado
alentador de Deus, de graça em graça e de glória em glória (cf. 1Co
12; Ef 4:16).

105 Veja-se L.N.T. (A. e G.), p. 305, o vocábulo _πιχορηγέω, onde se


provê a evidência para o uso da palavra nesse sentido. Cf. C.N.T.
sobre Fp 1:19, nota 50 para o significado do verbo simples.

Colossenses (William Hendriksen)

181

4. ADVERTÊNCIAS CONTRA O ASCETISMO - CL 2:20-23


20–22. Neste parágrafo Paulo condena o programa de austeridade
que os pregadores do erro estavam recomendando. A conexão que
há entre estes versículos e a advertência que se acaba de dar contra
o culto aos anjos (vv. 18, 19) é bastante obscura. Poderia ser, talvez,
que os impostores usassem seus supostos contatos com o mundo
angélico como base para impor-se e impor a outros restrições
ascéticas? É que diziam,

«deve ser certo que por meio da obediência a estes preceitos


podereis vencer a gratificação carnal e obter a plenitude da salvação,
porque um anjo me disse isso numa visão»? Não o sabemos; mas
uma coisa é certa, ou seja, que o apóstolo ensina que o ascetismo,
tanto como o culto aos anjos, causa mais mal que bem. Em lugar de
ser um remédio contra a satisfação dos desejos carnais, a incentiva
e promove.

O apóstolo já advertiu contra os raciocínios persuasivos destes


enganadores (Cl 2:4). Descreveu este tipo de propaganda como
filosofia e vãs sutilezas segundo a tradição dos homens (Cl 2:8). Ele
demonstrou que se até a própria lei de Deus, considerada como um
código de ordenanças e preceitos cerimoniais e como um meio de
salvação, foi cancelada e cravada na cruz, então, certamente, as
instruções de fabricação humana sobre comer, beber, etc., devem
ser descartadas (Cl 2:14, 16). Tais ordenanças e regulamentos
acrescentados e todas as doutrinas que deles se depreendem, não
são mais que conceitos pueris, rudimentos mundanos. Não são mais
que tolices altissonantes, que se caracterizam como mundanas em
origem e natureza. Continuando nesta mesma linha de pensamento,
e dirigindo sua atenção a uma forma extrema deste erro, ou seja, a
abstinência rígida, Paulo continua, dizendo:

20. Se morrestes com Cristo aos rudimentos do mundo, por que,


como se (ainda) estivésseis vivendo no mundo, submetei-vos a
preceitos.

«Se morrestes com Cristo, o que, sem dúvida, aconteceu», uma vez
que fostes sepultados com Ele (veja-se sobre o v. 12, acima) e
ressuscitastes
Colossenses (William Hendriksen)

182

com Ele (v. 12 outra vez; e também Cl 3:1), então rompestes


completamente com toda essa instrução rudimentar que baseia sua
esperança em qualquer coisa à parte de Cristo e a plenitude de
salvação que há nEle. (Para o significado da expressão “rudimentos
do mundo”

veja-se sobre o v. 8; e também a nota 83). Em Gl 2:18–21


encontramos o que poderíamos considerar a explicação mais bela do
significado básico desta passagem. Ali, Paulo fala sobre a edificação
(v. 18). Está construindo pela fé, “a fé que é no Filho de Deus, o qual
me amou e se entregou a si mesmo por mim”. E continua: “não faço
nula a graça de Deus, porque se a justiça «ou: justificação» fosse
pela lei, então Cristo morreu em vão”. E certamente, se o basear a
esperança sobre a lei era contrário ao princípio da salvação somente
com base nos méritos redentivos de Cristo, com maior razão, então,
isto é certo quanto a confiar em ordenanças meramente humanas.
Ao confiar nelas, os colossenses estariam comportando-se como se
ainda estivessem vivendo no mundo, isto é, na esfera de vida que se
encontra separada de Cristo.

Mas Paulo e todos os verdadeiros crentes foram crucificados para o


mundo. Ele mesmo diz: “Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não
ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por quem o mundo foi
crucificado para mim, e eu para o mundo” (Gl 6:14). Portanto, fora
com todos esses pobres e fracos rudimentos, tais como ensinos e
preceitos que separam os corações de Cristo como o único salvador
(cf. Gl 4:9)!

Paulo passa agora a resumir estes preceitos, ridicularizando-os de


forma depreciativa e aguda, para este propósito usa uma linguagem
sentenciosa, cintilante e proverbial: não toques, não proves, não
manuseies. É como se dissesse, não têm por que submeter-se a
toda uma série de “não faças”, como se por meio de acumular
suficientes negativos fossem alguma vez obter um positivo, ou como
se fosse possível obter a vitória sobre o pecado e o progresso na
santificação baseando toda a confiança no impedimento absoluto.
Lightfoot observa,

«algumas “destas proibições” eram sem dúvida uma espécie de


repromulgação da lei mosaica; enquanto outros seriam exageros ou

Colossenses (William Hendriksen)

183

acréscimos de um caráter rigorosamente ascético, como as que


encontramos nos essênios, protótipos destes hereges de Colossos;
por exemplo, o evitar o azeite, o vinho ou a carne, o fugir do contato
com os estranhos ou com inferiores na religião, e outras proibições
mais» ( op.

cit. , p. 203). Naturalmente, que realmente não sabemos exatamente


que ordenanças ascéticas tinha Paulo em mente quando redigiu esta
advertência, nem tampouco sabemos com exatidão qual era seu
pano de fundo. 106 É evidente que nestes breves mandamentos
estão implícitas restrições quanto a comidas e bebidas.

Note-se especialmente “não proves”. Também se deduz a mesma


coisa da afirmação em parêntese do v. 22. Não sabemos se era
proibido o casamento (cf. 1Tm 4:3) também, ou pelo menos se
sujeitava a rigorosas restrições. No entanto, pareceria que as
proibições tinham que ver especialmente com comidas e bebidas,
uma vez que o apóstolo continua da seguinte maneira … (referindo-
se a coisas que têm como fim sua destruição por ser
consumidas), segundo os preceitos e doutrinas de homens? 107
Paulo está sublinhando aqui que é certamente néscio basear a
esperança para obter a vitória sobre o pecado ou a salvação
completa em 106 Qual era realmente a origem e pano de fundo
deste ascetismo? Para uma discussão sobre este tema, veja-se
Introdução III B 2. Não sabemos se os falsos mestres de Colossos
alguma vez foram essênios.
Semelhanças nem sempre indicam identidade ou sequer
descendência.

107 Com a maioria dos tradutores e comentaristas, creio que a


pergunta é: “se com Cristo morrestes aos rudimentos do mundo, por
que, como se (ainda) estivésseis vivendo no mundo, submetei-vos a
preceitos, não toques, não proves, não manuseies, segundo os
preceitos e doutrinas de homens?” (vv.

20, 21, 22b). A cláusula — “referindo-se a coisas que têm como fim a
destruição por ser consumidas”

— (v. 22a), constrói-se como um parêntese dentro da pergunta.


Mostra que as ordenanças (neste caso proibições) têm que ver
principalmente com aquilo que o corpo consome. Portanto, a frase
“segundo os preceitos e doutrinas de homens” (v. 22b) constrói-se
como um modificativo dos vs. 20, 21. Outros, no entanto,
conectariam esta frase com as palavras imediatamente precedentes,
as quais já não seriam um parêntese. O resultado é a seguinte
leitura: “… referindo-se a coisas que estão destinadas à destruição
para serem consumidas, junto com (ou: como acontece também
com) os preceitos e doutrinas de homens”. Tanto as comidas como
os mandamentos humanos estão destinados à destruição. Cf. H.
Ridderbos, op.cit. , p. 197, embora ele acrescente que a conexão é
um pouco solta. A razão pela qual favoreço o ponto de vista mais
amplamente aceito, é que as palavras “para serem consumidas”
dificilmente se poderiam aplicar não somente às comidas, mas
também aos preceitos e doutrinas de homens.

Colossenses (William Hendriksen)

184

qualquer coisa que pertença àquilo que está destinado à destruição


pelo processo normal da natureza. As ordenanças quanto à comida e
bebida (aqui provavelmente tem-se em mente de forma especial a
comida), que têm como fim o melhoramento moral e espiritual do
homem, estão baseados em preceitos e doutrinas puramente
humanos. A cláusula entre parêntese “referindo-se a coisas que têm
como fim sua destruição por ser consumidas” (cf. 1Co 6:13), é
exatamente o mesmo ensino de Jesus que está em Mt 15:17 “Não
compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre e,
depois, é lançado em lugar escuso?” A descrição que se dá destas
ordenanças, como sendo “segundo os preceitos e doutrinas de
homens”, também nos lembra imediatamente outra coisa que Jesus
disse em outro versículo do mesmo capítulo de Mateus, ou seja,
“ensinando (como seus) doutrinas mandamentos de homens” (Mt
15:9), que por sua vez é uma citação de Is 29:13. O propósito
principal de todo este ensino, tanto em Isaías como nas palavras de
Jesus, não apenas é mostrar que as ordenanças de fabricação
humana e as doutrinas que delas se depreendem são inúteis, mas
também mostrar enfaticamente que são pior que inúteis, quer dizer,
são nocivas. Portanto, de acordo com a passagem de Isaías,
pronuncia-se um ai sobre todos aqueles que substituem em lugar do
temor sincero ao Senhor os mandamentos de homens, e no contexto
da passagem de Mateus, Jesus denuncia agudamente os que em
seu tempo invalidavam a palavra de Deus por suas tradições (Mt
15:6).

23. Em inteira consonância com o que acabamos de ver, o apóstolo


conclui esta seção da seguinte maneira: Ordenanças desta classe,
108

embora seja certo que têm reputação109 de sabedoria por causa


de seu 108 Literalmente, tais como, mas a referência é aos
mandamentos e ensino das quais surgem.

109 O significado de λόγος depende do contexto. Aqui parece ter a


ideia de reputação, significado que se relaciona com outro que muito
frequente tem, ou seja, relato.

Colossenses (William Hendriksen)

185
ritual voluntário, 110 humildade e duro trato do corpo, não têm
valor algum (pois só servem) para satisfazer a carne. 111

As palavras “ritual voluntário” referem-se ao culto aos anjos, do qual


Paulo tinha falado no versículo 18, e “humildade” repete novamente
o que já disse no mesmo versículo (v. 18) sobre a fingida auto-
humilhação dos mestres do erro. As palavras “duro trato do corpo” já
foram explicadas nos versículos 20 e 21. A piedade caseira que
exibiam estes devotos tinha causado uma profunda impressão em
alguns. Quão sérios e piedosos pareciam ser estes propagandistas,
e que humildes!

Talvez os colossenses, em sua luta contra os pecados da carne


mencionados em Cl 3:5, 8, 9, poderiam alcançar a vitória moral e 110
O composto _θελοθρησκία chamou-se um termo cristão. Talvez O
próprio Paulo o cunhou. Não se encontra exemplo de seu uso antes
de Paulo. É parecido com _θελοδουλεία, serviço voluntário, mas no
presente contexto, a palavra que Paulo usa provavelmente significa
culto escolhido pela própria pessoa, culto ou rito que a própria
pessoa se impôs, religião inventada pela própria pessoa (portanto,
na verdade, pseudo-religião).

111 Significado: “mas que só servem para agradar a carne”. Lightfoot


(a quem segue Moule) levanta sérias objeções a esta e outras
interpretações adversativas semelhantes. suas objeções principais
são: (1) não há nenhuma indicação de que com πρ_ς πλησμον_ν
κ.τ.λ.; comece uma claúsula adversativa; e (2) faz o apóstolo dizer o
que não poderia ter dito. “Semelhante linguagem anularia seu próprio
objeto por causa de sua extravagância”. Ele traduz a preposição
πρός “rebater”, de tal maneira que a oração chega a ter o seguinte
significado: “todo esse ensino não tem nenhum poder para rebater a
gratificação da carne”.

No entanto, junto com H. Ridderbos ( op.cit. , p. 198) e muitos outros


comentaristas, creio que o sentido adversativo é o correto, e que
aqui temos uma sequência μ_ν … δέ ( tácita). Em apoio desta
tradução e respondendo os argumentos de Lightfoot, apresento as
seguintes razões: (1) Quando o contraste se deduz facilmente do
contexto, μέν não neceista que sempre lhe siga δέ

( expressa). (L.N.T. A. e G., p. 504) cita as vezes em que se omite


esta partícula no Novo Testamento: além de Cl 2:23, também temos
1Co 6:7 e 2Co 12:12. Isto responde à primeira objeção de Lightfoot.

(2) Esta tradução está em harmonia com o que o apóstolo disse no v.


18, onde falou a respeito da mente carnal, isto é, a mente inflada ou
torcida de um orgulho pecaminoso. Portanto, quando se adota a
tradução adversativa, a linguagem do v. 23 não é mais extravagante
que a usado no v. 18. Isto responde ao segundo argumento de
Lightfoot.

(3) É muitíssimo mais natural traduzir a preposição πρός para (a


gratificação da carne); portanto, servindo (para gratificar a carne).

(4) Como já dissemos em conexão com os versículos 20–22, tanto


em Is 29:13 e Mt 15:9 esse ensino inventado pelos homens e os
preceitos que dele surgem descrevem como sendo definidamente
daninhos. Não só não têm poder para rebater a gratificação, mas
também de fato promovem os desejos da carne.

Colossenses (William Hendriksen)

186

espiritual que buscavam por meio de imitar o exemplo destes


homens.

“De maneira nenhuma”, diz Paulo. O descuido do corpo jamais


curará a alma. O corpo é templo do Espírito Santo (1Co 6:19), e
Deus estima tanto o corpo do homem como sua alma. O contraste
que se fazia entre a alma e o corpo, como se o corpo fosse mau e,
portanto, merecedor de castigo, enquanto a alma era divina, tem
sabor de dualismo gnóstico ou helenismo. O culto aos anjos nos traz
à mente o politeísmo. A humildade é definitivamente falsa. A
realidade é que estes mestres do erro eram orgulhosos. Se a pessoa
é enganada por eles e aceita seus conselhos que eram mais que
inúteis, isto adularia o orgulho destes “filósofos”.

Qualquer sistema religioso que não deseja aceitar a Jesus Cristo


como o único e todo-suficiente Salvador é uma gratificação da carne
e uma entrega ao capricho pecaminoso do homem, como se ele
pudesse, mediante suas próprias invenções, aperfeiçoar a imperfeita
(segundo sua opinião, por certo) obra de Cristo. Isto piora o assunto
em lugar de melhorá-lo.

Paulo condena o orgulho pecaminoso vez após vez. Além de Cl 2:18,


23, veja-se Rm 1:21, 22, 30; 12:16; 1Co 8:1; 1Tm 3:6; 6:4. Cf. Tg 4:6;
1Pe 5:5. É o espírito orgulhoso que precede a queda (Pv 16:18). Não
só aqueles que de fato se comportam arrogantemente diante dos
homens (Mt 6:1, 2), nem somente aqueles que se ensoberbecem na
própria presença de Deus (Lc 18:10–12), mas também todos aqueles
que ocultam seu asqueroso orgulho sob uma máscara de humildade,
são abominação ao Senhor (Pv 16:5; cf. 3:5; 16:18; 26:12; 29:23; Sl
101:5b).

Existe o perigo de que os colossenses voltem outra vez à sua antiga


vida carnal? Há uma solução muito superior à oferecida pelos falsos
mestres.

Em harmonia com tudo o que se veio dizendo (veja-se em especial


Cl 1:9–23; 1:27, 28; 2:2, 3, 6–10), esta solução é dada por Paulo no
capítulo 3 de Colossenses.

Colossenses (William Hendriksen)

187

Resumo de Colossenses 2

Paulo concluiu o último parágrafo dizendo “trabalho, lutando em


virtude de seu poder que opera poderosamente em mim”. Num novo
parágrafo, que começa no que agora chamamos capítulo 2, toma
novamente esta ideia de lutar, e escreve: “Porque quero que saibais
quão grande luta sustento por vós”, etc. Está lutando em oração, em
planejar, em ditar esta carta, e talvez em muitas outras formas,
porque está profundamente preocupado a respeito dos perigos que
ameaçavam as igrejas de vale do Lico. Estes perigos não só dizem
respeito ao intelecto; não, concernem ao coração! Paulo escreve:
“luto por todos aqueles que não viram meu rosto na carne … para
que sejam fortalecidos seus corações”. A heresia geralmente é um
assunto que tem que ver com o coração, como acontece também
com a verdadeira pureza de fé.

Compreendendo que os impostores estavam colocando muita ênfase


em coisas como o “conhecimento”, a “filosofia” (abstrata e
mundana!), Paulo põe ênfase no amor. Ele ora e espera
fervorosamente que os colossenses (e as igrejas vizinhas) sejam
“unidos fortemente uns com os outros em amor”. Este tipo de
unidade resulta no orar juntos, discutir os problemas juntos, adorar
juntos, e o resultado de tudo isso será que toda a congregação dos
fiéis obterá um conhecimento claro do mistério de Deus, a saber,
Cristo. Uma vez descoberto este mistério, não se necessitam outras
descobertas. Cristo não pode ser substituído, porque nEle, “estão
escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento”;
escondidos, é verdade, mas para ser revelados a cada crente e para
que cada um possa apropriar-se deles totalmente.

Continuai unidos ao Senhor Cristo Jesus, diz Paulo, da mesma


maneira que há tempo fizestes essa preciosa decisão de aceitá-Lo.
Persisti no que vos foi ensinado, e não permitais que ninguém vos
leve cativos como o despojo de um saque “por meio de sua filosofia
e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os
rudimentos do mundo, e não segundo Cristo”. Guardai-vos desses
“rudimentos mundanos”, aqueles conceitos

Colossenses (William Hendriksen)

188

pueris que homens mundanos promovem. Lembrai que em Cristo


habita a deidade e não só a divindade. Uma vez que Cristo é Deus
em todo o sentido da palavra, é capaz e está ansioso de suprir todas
as vossas necessidades. Ele é mais exaltado que todos os anjos do
céu, e Ele governa cada plano sinistro de Satanás e seus ajudantes.

Não será necessário que vos circuncideis para poder alcançar a


vitória contra o pecado e a plenitude da salvação. Na verdade, já
recebestes uma circuncisão que excede em muito a circuncisão
literal.

Recebestes a circuncisão do coração. Esta circuncisão é vossa em


virtude de vossa união vital com Cristo, tendo sido sepultados com
Ele e ressuscitados com Ele. Recebestes o sinal e selo desta
circuncisão em vosso batismo. Não vos deixeis assustar pela lei de
Moisés e suas muitas ordenanças. Quando Cristo morreu, a lei, com
todas suas ordenanças sobre cerimônias, morreu junto com Ele. Foi
cravada na cruz! Tanto a lei como Satanás perderam toda pretensão
legal sobre vós. Por meio da morte de Cristo na cruz, a lei perdeu
todo poder sobre vós (como meio de salvação), e os principados e
autoridades (anjos) que desejavam acusar-vos, foram expostos
publicamente para vergonha. A mesma regra aplica-se aos
mandamentos quanto a comida, bebidas, festas, luas novas e
sábados. Uma vez que o objeto que projetava sua sombra chegou, é
estúpido desejar continuar agarrando-se da sombra. Os tipos se
cumprem em Cristo.

Não vos deixeis impressionar pelas pessoas que exibem sua


humildade, pretendendo ser muito indignos para apresentar-se a
Deus diretamente, e que, portanto, devem buscar a mediação de
anjos, aos quais adoram e servem. «Não obstante, não é seguro que
esta seja a razão que tivessem para dar culto aos anjos. Só é uma
possibilidade que muitos ofereceram.» Não permitais que estes
pretensiosos vos desqualifiquem, como se vossa maneira de adorar
a Deus (ou Cristo) não fosse correta. Lembrai que em lugar de ser
verdadeiramente humildes, estes impostores estão “inchados por sua
mente carnal”. Não estão

Colossenses (William Hendriksen)

189
“apegando-se à cabeça, da qual todo o corpo, sustentado e unido
pelas juntas e ligamentos, cresce com um crescimento (que é) de
Deus”.

E por último, se com Cristo morrestes para os conceitos pueris do


mundo, por que, então, vos submeteis a ordenanças, “não toques,
não proves, não manuseies”? Esses mandamentos de feitura
humana só têm aparência de sabedoria. Se os obedecerem, crendo
que nessa direção se encontra a vitória sobre o mal e a plenitude da
salvação, chegarão a um estado muito pior do que experimentastes
antes. Estas cerimônias voluntárias só servem para satisfazer ou
gratificar a carne. Este tipo de coisas alimenta o orgulho humano. A
única coisa que conseguem é afastar as pessoas de Cristo e da
plenitude da salvação nEle.

Colossenses (William Hendriksen)

190

COLOSSENSES 3:1-17

Tema: Cristo, o preeminente, o único e todo-suficiente Salvador II.


Este único e todo-suficiente Salvador é a fonte da vida dos crentes, e
assim a verdadeira resposta aos perigos que enfrentam, capítulos 3
e4

A. Esta verdade aplica-se a todos os crentes, Cl 3:1–17

1. OS CRENTES DEVEM SER CONSEQUENTES - CL 3:1–4

1. O ser coerente requer que os crentes vivam de acordo com o fato


de que ressuscitaram com Cristo, que não só é o objeto da fé deles
(capítulos 1 e 2), mas também a fonte de sua vida (capítulos 3 e 4).

Naturalmente, a linha que divide estas duas verdades não é rígida.


Existe uma considerável semelhança. Porém, há uma diferença de
ênfase.
Existe uma íntima conexão entre Colossenses 3 e o que lhe
antecede. As primeiras palavras de Colossenses 3, ou seja, Se,
pois, fostes ressuscitados com Cristo, resume a ideia que já foi
expressa anteriormente em Cl 2:12, 13, “fostes levantados com ele
… vos deu vida juntamente com ele”, e são a contraparte de Cl 2:20,
“Se morrestes com Cristo para os rudimentos do mundo.…” Deve-se
lembrar que os colossenses eram acossados pelo perigo de recair no
paganismo com sua grosseira imoralidade, etc., como se faz
evidente por Cl 2:23 e 3:5ss. A falsa solução de seu problema foi
refutada nos capítulos 1 e 2, em especial no último. Indicou-se que
não existe cura material para um mal espiritual, que maltratar o corpo
jamais curará a alma doente, mas antes, aumentará seu mal, e que
indivíduos gerados de uma maneira celestial não podem ficar
satisfeitos com remédios terrestres. Cristo, e somente Ele, é a
resposta, Cristo em toda a plenitude de Seu amor e poder, como

Colossenses (William Hendriksen)

191

já se indicou nos capítulos 1 e 2, mas que agora se deixa sentado


com muita mais clareza e de forma mais direta (capítulo 3) numa
série de exortações pastorais. De modo que se os colossenses
foram levantados coletivamente quando Cristo foi ressuscitado e com
Ele, na forma explicada anteriormente (veja-se sobre Cl 2:12, 13,
20), por que eles vão buscar a salvação ou a plenitude à parte dEle?
Por que recorrer a cisternas rotas quando a própria fonte está à
mão? A ressurreição de Cristo, seguida por Sua ascensão e
coroação, garante o perdão e provê a pureza. A este Salvador eles
se renderam quando O abraçaram pela fé. O

poder purificador do sangue e do Espírito de Cristo lhes foi colocado


e selado pelo batismo. A provisão da graça se mantém abundante.
Agora mesmo (não precisam esperar até o dia da parousia!) são
ressuscitados com Cristo. Possuem dentro de si mesmos a vida da
ressurreição.
Portanto, devem experimentar o poder da ressurreição de Cristo num
grau cada vez mais alto. Que a união que têm com o Cristo exaltado
transforme sua vida inteira: mente, coração, e vontade (Fp 3:10). De
modo que Paulo lhes exorta, dizendo: buscai as coisas que são de
cima, onde está Cristo. O verbo buscai implica um esforço
perseverante; portanto, a tradução «Estejam buscando
constantemente» não é incorreta.

Além disso, este buscar é mais que um buscar para encontrar. É um


buscar para obter (cf. Mt 6:33; 13:45). Não obstante, a ênfase não
recai sobre a ação de buscar, mas no objeto buscado. Uma tradução
exata seria: «As coisas que estão acima ‘frase colocada em primeiro
lugar para dar ênfase’ estejam constantemente buscando». O buscar
para obter algo é uma atividade comum, mas o buscar para obter os
tesouros devidos não é tão comum, e portanto requer a ênfase. As
coisas que são de cima são os valores espirituais que estão fixados
no coração do Mediador exaltado e em glória, do qual, sem nenhum
dano para Ele, são derramados sobre aqueles que humildemente os
pedem e diligentemente os buscam (Mt 7:7; 1 Cor. 12:11; Ef 1:3; 4:7,
8). Conforme indica o contexto, o apóstolo refere-se a realidades tais
como compaixão, bondade, humildade,

Colossenses (William Hendriksen)

192

mansidão, longanimidade, paciência, o espírito perdoador, e


sobretudo amor (Cl 3:12ss.). Certamente, se os corações dos
crentes estiverem cheios de tais bondades, não haverá espaço para
os desejos da carne.

Portanto, aqui está a verdadeira solução.

Os colossenses podem estar seguros de que seu Cristo exaltado tem


tanto a autoridade como o poder para derramar qualquer graça que
fosse necessária, porque ele está sentado à direita de Deus (Sl
110:1, uma frase que Cristo aplicou a Si mesmo em Mt 22:41–46;
26:64; Mc 12:35–37; 14:61, 62; Lc 20:41–44; 22:66–70), vestido de
majestade e honra.

Esta reconfortante verdade acerca da ascensão de nosso Senhor e


de Sua coroação à direita do Pai como uma fonte de bênçãos para
Seu povo, foi anunciada no Antigo Testamento (Salmo 8, como se
interpreta em Heb. 2:1–8; Sl 68:18, como se explica em Ef 4:7, 8; Sl
110:1, como foi mostrado; Is 53:12). Nosso próprio Senhor se referiu
a ela (às passagens citadas no parágrafo precedente, acrescente-se
Jo 14:1–4; 14:13–18; 16:7; 17:5; 20:17). Desde o princípio foi um dos
temas básicos na pregação da igreja (Lc 24:50–53; At 1:6–11; 2:33–
36; 3:21; 5:30, 31; 7:56; Rm 8:32–34; Ef 1:20–23; 4:7, 8; Fp 2:9–11;
3:20, 21; 1Tm 3:16; Hb 1:1–3; 1:13; 2:1–8; 4:14–16; 8:1, 2; 9:11, 12,
24; 10:12; 1Pe 3:21, 22; Ap 1:12–18; 12:5–12).

Aqueles que buscam obter estas “coisas de acima” não estão


caçando fantasmas, mas estão acumulando preciosos tesouros. Não
são a classe de gente que se esquece de suas obrigações aqui e
agora. Pelo contrário, são muito práticos, porque as graças que
foram enumeradas os capacitam não só a obter vitória sobre vitória
em sua luta contra os desejos de agradar as tendências da carne,
senão para ser de forma veraz

“sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 5:13, 14).

2. De uma forma muito semelhante, Paulo continua: Ponde toda a


vossa atenção nas coisas que são de cima, não nas coisas que
são da

Colossenses (William Hendriksen)

193

terra. 112 Esta exortação é muito prática. Indica que os colossenses


são apressados a refletir em e anelar vivamente113 as coisas que
são de cima, tal como as definimos anteriormente. Agora, um pastor
que queira ajudar a sua congregação em sua luta contra a
imoralidade, não deve pregar uma série de sermões sobre o tema a
imoralidade, descendo aos sujos detalhes. Se o fizer, seus sermões
causarão mais dano que bem. Em vez de afugentar o mal, estará
criando um gosto por ele. O que deve fazer é pregar um sermão
sobre a imoralidade, e toda uma série de pregações sobre a glória
que há em servir a Cristo e a Seu povo.

Este método positivo sobre como vencer o pecado é característico


do ensino de Paulo. Note-se o que vem a seguir:

“Vence o mal com o bem” (Rm 12:21);

“Revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não disponhais para os


desejos da carne” (Rm 13:14);

“Andai no Espírito, e não satisfareis os desejos da carne” (Gl 5:16); e

“Além do mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro … honesto … justo

… puro … amável … de bom nome … mantende-vos pensando


nestas coisas … e o Deus de paz estará convosco” (Fp 4:8, 9).

A mesma verdade é ilustrada em Cl 3:12–17. Esta é a única forma


eficaz de “fazer morrer os membros que estão sobre a terra” (Cl 3:5–
9a), como está claro também por Cl 3:9a, 10.

3. Por conseguinte, o apóstolo continua: porque morrestes e a


vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Os colossenses
estão mortos e sepultados no sentido que já explicamos em Cl 2:11,
12. Já não vivem mais eles, mas é Cristo que vive neles. Estão
mortos para a sua velha natureza e para o mundo governado pelo
pecado. Sua vida atada no feixe dos que vivem com seu Senhor e
Salvador Jesus Cristo (cf. 1Sm 25:29).

Desde a eternidade estavam incluídos nEle (Cl 3:12; cf. Ef 1:4). Da


112 No v. 2 pode-se reter a ordem original das palavras sem
nenhuma dificuldade. No v. 1, por causa do modificativo “onde está
Cristo”, a ênfase do original pode reproduzir-se melhor mediante
itálicos.
113 Para o verbo φρονέω veja-se C.N.T. sobre Fp 3:19; cf. Rm 8:5;
12:16.

Colossenses (William Hendriksen)

194

parte de Deus, no tempo foram implantados em Cristo pelo Espírito


(Jo 3:5; Rm 6:5; 2Co 3:16; Ef 2:22), e como um resultado disso, da
parte deles, foram unidos a Cristo por meio de uma fé viva (Gl 2:20).

Sua nova vida está escondida com Cristo. Está encoberta ao mundo
(1Co 2:14; 1Jo 3:2), e é indestrutível, eterna (Jo 3:16; 10:28; Rm
8:31–

39). E pelo fato de que, quanto à essência, Cristo está no Pai e o Pai
está em Cristo (Jo 1:18; 10:30; 17:21; 1Co 3:23; Cl 1:15), é evidente
que Paulo está totalmente justificado ao dizer: “A vossa vida está
escondida com Cristo em Deus.

4. Embora o mundo jamais será capaz de ver a intimidade da relação


interior que existe entre os crentes e seu Senhor, a expressão
exterior dessa relação interna, a glória, algum dia será evidente a
todos: Quando Cristo (que é) a nossa114 vida se manifestar,
então vós também sereis manifestados com ele em glória.
“Cristo (que é) a nossa vida”.

Estas palavras não podem indicar identidade. Dizer que a nossa vida
é “a extensão” da vida de Cristo é ambíguo. Cristo e nós não somos
o mesmo em essência, como são o Pai e o Filho. No entanto, a vida
de Cristo (e portanto, o próprio Cristo) é a fonte e modelo da nossa
vida. Além disso, através do Espírito Santo e a fé que Ele comunica,
estamos unidos intimamente com Cristo e Ele conosco. Portanto, a
expressão “Cristo a nossa vida” deve ser explicada à luz de outras
frases semelhantes, como as seguintes:

“Porque eu vivo, vós também vivereis” (Jo 14:19);


“(Nós estamos) levando no corpo sempre por todas as partes a
morte de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em
nossos corpos” (2Co 4:10);

“Agradou ao Pai … revelar o seu Filho em mim” (Gl 1:15, 16);

“Cristo vive em mim” (Gl 2:20);

114 Embora a evidência externa a favor de _μ_ν é pelo menos


igualmente forte que a de _μ_ν, não obstante, é possível que a
última seja a correta. Não é raro que Paulo, um escritor
profundamente emocional, e que escreve verdades que ele mesmo
experimentou ou que estima grandemente, mude da segunda pessoa
à primeira (cf. Cl 1:9 com 1:13; 2:13a com 2:13b, e veja-se sobre Fm
6).

Colossenses (William Hendriksen)

195

“Meus filhinhos, com os quais volto a sofrer dores de parto, até Cristo
ser formado em vós” (Gl 4:19);

“Mas nós todos … somos transformados à mesma imagem de glória


em glória, como pelo Senhor, o Espírito (2Co 3:18); e

“Porque para mim o viver (é) Cristo, e o morrer (é) lucro” (Fp 1:21).

Quando, no dia de Sua segunda vinda, dia que só Deus conhece (Mt
24:36; 1Ts 5:1, 2), Cristo a nossa vida, se manifestar, 115 Seus
atributos de majestade e poder sendo exibidos publicamente, então
os colossenses também se manifestarão com Ele (cf. Rm 8:32). Sua
vindicação pública e glória coincidirão com as dEle. Entre as muitas
passagens do Novo Testamento (além de Cl 1:27) que lançam luz
adicional sobre o significado desta glória que os filhos de Deus
desfrutarão com seu Senhor no dia em que serão “como ele” e
“levarão a imagem do celestial”, estão especialmente as seguintes:
Mt 25:31–40; Rm 8:17, 18; 1Co 1:7, 8; Fp 3:20, 21; 1Ts 2:19, 20;
3:13; 4:13–18; 2Ts 1:10; 2Tm 4:7, 8; 1Pe 1:13; 1Jo 2:28; 3:2; Ap
17:14.

115 No Novo Testamento, o verbo φανερόω aparece com bastante


frequência nos escritos de João (Evangelho, Primeira Epístola,
Apocalipse) e nos de Paulo. Para uma classificação de seus
significados no Evangelho de João e a Primeira Epístola, veja-se
C.N.T. sobre Jo 21:1, nota 294. À

parte das vezes que aparece nos escritos de João e Paulo, o verbo
só se encontra nas seguintes passagens do Novo Testamento: Mc
4:22; 16:12, 14; Hb 9:8, 26; 1Pe 1:20; 5:4. Nas cartas de Paulo a
palavra usa-se 22 vezes com os seguintes significados:

a. em conexão com a manifestação da glória nas palavras e feito de


Jesus em sua primeira vinda (2Co 2:14; 1Tm 3:16; 2Tm 1:10), e a
vida de Cristo manifestada nos crentes (2Co 3:3; 4:10, 11).

b. em conexão com a revelação e realização do mistério de Deus na


plenitude dos tempos (Rm 16:26; Cl 1:26; e cf. Tt 1:3 “manifestou sua
palavra”).

c. em conexão com a manifestação da glória de Cristo em sua


segunda vinda (Cl 3:4a), na qual glória participam os crentes (Cl
3:4b), e em qual tempo as obras e os motivos dos homens serão
postos ao descoberto (1Co 4:5; 2Co 5:10).

d. em conexão com os atributos divinos que são dados a conhecer


os homens (Rm 1:19; 3:21).

e. em um sentido mais geral, em conexão com qualquer coisa que


está escondida ou em escuridão e é trazida à luz ou feita visível ou
clara (2Co 5:11; 7:12; 11:6; Ef 5:13 duas vezes; Cl 4:4).

Colossenses (William Hendriksen)

196
2. PORTANTO, DEVEM “FAZER MORRER” E “DEIXAR” OS
ANTIGOS

VÍCIOS - CL 3:5-11

5. Em estreita ligação com o parágrafo precedente, Paulo continua,


Assim que matai vossos116 membros que (estão) sobre a terra.
Note o paradoxo, “morrestes” (v. 3) … “matai vossos membros” (v. 5).
Se julgarmos de forma superficial, poderíamos dizer que o apóstolo
aqui se contradiz a si mesmo. E na verdade, alguns intérpretes
chegaram a essa conclusão. É como se o apóstolo, por um lado,
estivesse dizendo que os colossenses já morreram, e, por outro,
dizendo que devem pôr-se eles mesmos no estado de morte. Como
podem ser certas ambas as coisas ao mesmo tempo? A resposta é
que enquanto os crentes viverem na terra, sua condição e seu
estado não coincidem totalmente. Quanto ao seu estado, agora
mesmo são totalmente perfeitos, sem nenhum pecado, totalmente
justificados. Seu antigo ser está morto e sepultado (Cl 2:11–

13). Agora, é verdade que sua condição está em harmonia com isso,
mas só em princípio. Nas palavras do Catecismo de Heidelberg:
«Inclusive os mais santos, enquanto estiverem nesta vida, não
cumprem mais que um pequeno princípio desta obediência (isto é,
da obediência aos mandamentos de Deus). No entanto, começam a
viver firmemente, não só segundo alguns, mas também segundo
todos os mandamentos de Deus” (Domingo 44, resposta à pergunta
114). O caráter progressivo da santificação é também ensinado por
Paulo (veja-se abaixo sobre o v. 10, e cf. 2Co 3:18; Fp 1:6; 3:12, 13)
e está em harmonia com o resto da Escritura (Sl 84:7; Pv 4:18; Mc
9:24; também está implícito em 1Jo 1:8–

10). Ao passo que quanto à nova vida, os crentes estão tão


intimamente unidos com Cristo que se diz deles que já estão com Ele
no céu (Cl 3:3), contudo a vida antiga ainda é da terra assim como
sobre a terra. Mas não há razão para desesperar-se. A própria
presença da nova vida, a vida “em 116 Embora a leitura sem o _μ_ν
merece a preferência, no entanto o vossos implica-se claramente.
Colossenses (William Hendriksen)

197

Cristo”, capacita os crentes para que pouco a pouco façam morrer


117 os membros que estão sobre a terra.

Quando se pergunta o que quer dizer isso dos membros que devem
ser mortos, a resposta é: imoralidade, impureza, paixão, maus
desejos e avareza, que é idolatria. Mas como podem membros ser
vícios? Alguns expositores pensam que isto é impossível, e sugerem
várias soluções. 118

Não obstante, parece-me que a dificuldade não é tão grande como


alguns fazem com que pareça. João Calvino parece andar por bom
caminho, quando afirma que estes vícios são chamados membros
«devido ao fato de que se aderem tão fortemente a nós». Outra
forma semelhante de 117 A tradução correta é “matai” e não “tende
por mortos”. O mandamento “matai” (Cl 3:5) não tem exatamente o
mesmo significado que “considerai-vos mortos” (Rm 6:11). E o verbo
no passivo νενεκρωμένου de Hb 11:12 (“que estava como morto”; cf.
Rm 4:19) não muda o fato de que em Cl 3:5 usa-se a voz ativa
νεκρώσατε, que significa “matai”; porque, (a) o significado ativo que
aqui se assinala é sinônimo com “ponde de lado” do v. 8, que não é
só um assunto de reflexão mental ou consideração, mas é um
assunto de esforço e empenho voluntário e enérgico; e (b) o
verdadeiro paralelo de Cl 3:5 não é tanto Rm 6:11 como o é Rm 8:13
(“fazeis morrer as obras da carne”), mesmo quando o verbo usado
no original não é o usado aqui em Cl 3:5, mas sim θανατο_τε.
Portanto, não posso concordar com o Bruce ( op. cit. , p. 267),
quando afirma: “ ‘matai’, ou, como poderíamos dizê-

lo, ‘tende por mortos’ ”.

118 Lightfoot ( op. cit. , p. 211) coloca uma forte pontuação (algo
como um ponto e vírgula ou ponto seguido) depois da palavra terra.
De modo que o trata os vícios (“imoralidade, impureza”, etc.) como
“acusativos antecipados, que devem ir regidos por algum verbo como
ponde de lado”. Moule ( op. cit. , p. 116) afirma que “isto pode bem
ser certo”. Mas não há nenhuma necessidade de uma construção tão
forçada. Se Paulo tivesse querido dar a entender o verbo deixai de
lado, com toda probabilidade o teria expresso, tal como o faz em Rm
13:12; Ef 4:22, 25; Cl 3:8.

Igualmente objetável é a solução de Carlos Masson ( Commentaire


de Nouveau Testament, in loc.).

Em completa inconformidade com o contexto, ele toma a palavra


“membros” como referindo-se a

“membros da igreja” e como se estivesse no caso vocativo, de tal


forma que o significado seria, “vós, membros do corpo de Cristo,
deveis, portanto”, etc.

Finalmente, está o ponto de vista de Lenski ( op. cit. , p. 157), quem


crê que as palavras “fornicação

«= imoralidade», impureza”, etc., são “acusativos adverbiais de


especificação”, e que devem, então, traduzir-se, “quanto à
fornicação”, etc. Mas se as palavras são construídas dessa forma, a
tradução se torna desnecessariamente difícil, e a construção carece
de clareza. Além disso, a ideia de que o verbo νεκρώσατε deve
referir-se a uma morte repentina pela qual os membros morrem de
uma só vez, pelo fato de que é um imperativo aoristo, tampouco
pode ser estabelecida. O aoristo nem sempre nem necessariamente
refere-se a um só ato. Em todos seus modos denota um ato ou uma
ideia, que na história real às vezes se estende sobre um longo
período de tempo (cf. Jo 2:20 no original). O aoristo resume!

Colossenses (William Hendriksen)

198

solucionar o problema (uma forma que não torna necessário que


rejeitemos o ponto de vista de Calvino, mas está em harmonia com
ele) seria tomar a palavra membros (= vícios) como um caso de
metonímia (“emprego de um nome por outro”); nesta figura retórica, o
nome da causa ou fonte se substitui por efeito que produz, pelas
consequências que fluem da causa ou pelos frutos ou produtos que
brinda. Por exemplo, em Nm 3:16 (no original) a palavra boca no
hebraico se substitui pelo mandamento que saiu da boca; ou como
no jargão americano, a expressão, “I’ll have none of your lip” (= não
tomarei nada de teu lábio), significa “não tolerarei nenhuma palavra
insolente que saia de teus lábios”. Da mesma forma, o mandamento
“matai, portanto, vossos membros que estão sobre a terra:
imoralidade, impureza”, etc., significa,

«matai, portanto, os efeitos produzidos por e que estão associados


tão intimamente com os membros de vosso corpo; efeitos, produtos
ou obras, tais como: imoralidade, impureza», etc. Portanto, estou de
acordo com o Bruce ( op. cit. , p. 268), quando diz: «Em Rm 7:23
Paulo fala de ‘a lei de pecado que está em meus membros’; aqui ‘em
Cl 3:5’ avança ainda mais, de tal forma que praticamente identifica os
membros dos leitores com os pecados que antes os usavam como
instrumentos. Mas o que realmente tem em mente são as práticas e
atitudes, a serviço dos quais seus leitores puseram toda sua força e
atividade corporal quando estavam em sua vida antiga». Assim
também Ridderbos ( op. cit. , p. 207) afirma: «Os ‘membros’ são
identificados com os pecados cometidos por estes membros e numa
conexão semelhante (Rm 8:13) estes pecados são chamados, ‘as
obras do corpo’».

Na literatura antiga, tanto pagã (moralista) como anti-pagã aparecem


frequentemente listas de vícios como estes. Os recém-descobertos
rolos do Mar Morto também têm essas listas. 119 Nas cartas de
Paulo aparecem nas seguintes passagens: Rm 1:18–32; 1Co 5:9–11;
6:9, 10; Gl 5:19–21; Ef 5:3–6; 1Ts 4:3–7; 1Tm 1:9, 10; 2Tm 3:2–5; Tt
119 Veja-se M. Burrows, The Dead Sea Scrolls, pp. 375, 386, 387.

Colossenses (William Hendriksen)

199
3:3. A diferença que há entre a maneira cristã e a não cristã com
relação a como tratar estes vícios está em que à parte de Cristo e a
plenitude de graça comunicada por Seu Espírito não existe nenhum
poder em todo o universo que possa vencer estes vícios. Cristo, e
somente Ele, supre este poder.

Quanto à ordem que se segue, é óbvio que o v. 5 contém cinco


vícios, assim como o v. 8. Não obstante, é muito duvidoso que o
número cinco tenha aqui um significado especial, e se tiver algum
significado especial, devemos confessar que não sabemos qual será.
120 No entanto, é verdade que a primeira lista enumera vícios que
descrevem o pecador como ele é em si mesmo, enquanto a segunda
o apresenta em sua relação com o seu próximo. Também seria
possível ver na primeira lista um movimento que vai da superfície da
vida até seu centro, e na segunda o contrário. Isto será manifesto à
medida que formos estudando cada um destes detalhes.

Dos cinco vícios mencionados em Cl 3:5, os primeiros quatro


mencionam-se também em 1Ts 4:3–7, e os quatro últimos em Rm
1:24–

29. O primeiro de todos é a imoralidade (“fornicação”; veja-se 1Ts


4:3; cf. Mt 5:32; 15:19; 19:9; Jo 8:41, etc.). Embora a palavra se refira
especialmente às relações sexuais ilícitas, provavelmente inclui todo
tipo de relações ilícitas e clandestinas. A ênfase, no entanto, recai
dentro da esfera sexual, e de forma particular em obras
pecaminosas.

Estas obras pecaminosas brotam de pensamentos pecaminosos, isto


é, de impureza, que é o que se menciona a seguir (Rm 1:24; 1Ts 4:7;
cf.

Mt 15:19; Mc 7:21, etc.). Não obstante, não é necessário limitar a


120 Nem todos concordam. Lenski, por exemplo, vê no número cinco
“a metade da plenitude expressa pelo dez … o cinco também é
secular, estes são vícios” ( op. cit. , pp. 157, 158). Mas mesmo
quando admitamos o ponto que em certos tipos de literatura o
número cinco poderia ter um significado simbólico, é muito duvidoso
se tal significado possa ser atribuído a Colossenses. Além disso,
embora seja verdade que o v. 8 (bem como o v. 5) enumera cinco
vícios, o v. 9 acrescenta outro mais à lista, fazendo com que o total
seja de seis, ou e onze como a soma de ambas as listas. Como
resultado, é muito melhor abster-se de numerologia duvidosa.

Colossenses (William Hendriksen)

200

impureza àquilo que é sujo quanto a pensamentos. As intenções do


coração estão incluídas, sem dúvida (cf. Heb. 4:12).

Que a corrupta disposição do coração e a vontade do homem é a


fonte de seus ímpios pensamentos e obras, é muito claro à luz dos
dois vícios que se mencionam imediatamente, ou seja, paixão e
maus desejos.

Não é fácil distinguir entre estes dois vícios, embora poderia haver
mérito na sugestão de Lightfoot, que o primeiro descreve o vício por
seu lado passivo, o segundo pelo ativo. Quanto à paixão cf. Rm 1:26;
1Ts 4:5 (“paixão de concupiscência”), etc.; para maus desejos, Rm
1:24; 1Ts 4:5, etc. Se acrescenta a palavra maus devido ao fato de
que os desejos em si mesmos não são necessariamente maus. A
palavra usada no original também pode ser usada para desejos
legítimos, como por exemplo, o desejo de Cristo de comer a Páscoa
com Seus discípulos. 121

Mas os maus desejos são a sede desordenada pela satisfação


sexual ou por outras coisas, tais como a adoração de ídolos, posses
materiais, renome, etc. Mas a ênfase neste contexto parece ser as
relações sexuais ilícitas, sem excluir outros ardentes desejos maus.
Deste ardente desejo ímpio procedem todo tipo de pecados.
Portanto, é básico, e assim o considera o próprio Paulo na passagem
de Rm 7:7. É muito interessante notar, neste contexto, que no
Decálogo o pecado de cobiça é mencionado por último (Êx 20:17),
sendo a fonte de todos os outros. Jesus também considerou o
coração lascivo isto é, o coração cheio de maus desejos, como a raiz
da qual saem as obras pecaminosas, uma vez que disse,

“Qualquer que olhar para uma mulher para cobiçá-la, já adulterou


com ela em seu coração” (Mt 5:28).

Mas embora através de mencionar a paixão e os maus desejos, o


apóstolo chegou até o próprio centro de todo pecado, acrescenta
mais um pecado, o pecado no qual todos os mencionados se
resumem, ou seja, o egoísmo ou a avareza (cf. Rm 1:29, etc.). Todo
pecado é basicamente egoísmo, a adoração de si mesmo em vez de
Deus, a substituição de si 121 Sobre a palavra _πιθυμία veja-se
C.N.T. sobre 2Tm 2:22, nota 147.

Colossenses (William Hendriksen)

201

mesmo em lugar de Cristo como objeto dos afetos e devoção de


alguém (cf. Cl 3:1–3). É por esta razão que Paulo acrescenta: “que é
idolatria”

(cf. Ef 5:5). O jovem que deixa grávida uma senhorita, pode chamar
isso de “amor”, mas está errado. É egoísmo, avareza, pelo menos
em grande proporção. Este jovem deseja “mais do que é adequado”
(veja-se C.N.T.

sobre 1 e 2 Tessalonicenses, pp. 116–118). Mas o apóstolo não está


pensando sobre o jovem em particular, mas antes, do “velho homem”

(veja-se Cl 3:9), quer dizer, da natureza carnal de qualquer homem,


sem importar a idade, da natureza do homem tal como é à parte da
graça salvadora de Deus.

6, 7. Tendo enumerado os vícios que anteriormente caracterizaram


os colossenses e pelos quais ainda eram tentados, o apóstolo
continua, por causa dessas coisas vem a ira de Deus122 (ou: está
vindo). Por meio do que foi chamado “um presente profético” (cf. Jo
4:21; 14:3), Paulo põe ênfase no fato da ira vindoura de Deus (a qual
visitará os que vivem em pecados) é tão certa que é como se já
tivesse vindo. Estes pecados atraem o desagrado de Deus como o
ímã atrai o ferro ou como um alto pára-raios atrai o raio. Sem dúvida,
Paulo faz referência à revelação da ira de Deus no dia do juízo
vindouro (cf. Rm 2:5–11; Ef 5:6; 2Ts 1:8–

10). Calvino observa de uma forma muito apropriada que o


verdadeiro propósito desta profecia sobre a inevitável ira de Deus,
que cairá sobre os pecadores obstinados, é “que sejamos
dissuadidos de pecar”. Portanto, até esta declaração de ira está
cheia de misericórdia!

No entanto, pela graça soberana de Deus, os colossenses

renunciaram em princípio a esta espécie de conduta. Para eles era


coisa do passado. Paulo diz, nas quais também vós andastes
nesse então, quando vivíeis nelas. Note-se, “também vós”, isto é,
«vós, bem como os 122 Embora o apoio textual para acrescentar a
frase “sobre os filhos de desobediência” não seja fraca, o contexto
está contra dar-lhe um lugar no texto. Provavelmente seja uma
interpolação de Ef 5:6. Sua inclusão aqui (Cl 3:6) resulta na tradução
“entre os quais” no começo do v. 7, e à estranha conclusão de que
Paulo está repreendendo os colossenses por ter caminhado entre os
filhos da desobediência, dedução que seria contrária ao seu próprio
ensino (1Co 5:10; cf. Tt 2:12) como também à do Senhor (Jo 17:15;
cf. Mt 5:13, 14).

Colossenses (William Hendriksen)

202

outros pagãos». Viver e andar são figuras quase sinônimas.


Contudo, em certos contextos, como este, há uma diferença.
Caminhar ou andar neste contexto indica a conduta; viver indica a
disposição. Assim também em Gl 5:25: “Se vivemos pelo Espírito,
andemos também pelo Espírito”.
Uma vez que os colossenses chegaram a ser “novas criaturas”, não
estavam mais colocados nos vícios de sua vida passada. Agora se
envergonhavam de sua vida antiga. Tinham sido santificados e
purificados pelo poder do Espírito Santo. Sua vida estava “escondida
com Cristo em Deus” (veja-se acima, o v. 3). Não obstante, como já o
dissemos anteriormente, isto não quer dizer que a vitória foi ganha
totalmente. A carne ainda tem um desejo intenso contra o Espírito, e
o Espírito contra a carne (Gl 5:17; cf. Rm 7:15–24). Portanto, o
mandamento que vem a seguir (vv. 8, 9a) é algo muito apropriado e
oportuno.

8, 9a. Mas, agora, ponde-as todas de lado vós também: ira,


irritação, malícia, calúnia, linguagem obscena de vossa boca.
Não mintais mais uns aos outros. Os vícios anteriores haviam
trazido destruição, não só à vida dos homens considerados como
indivíduos ou separadamente (veja-se sobre o v. 5, acima), mas
também tinham quebrado a relação entre próximos. Isto não deve
continuar. Por conseguinte, ira (latim: ira), isto é, uma indignação
arraigada, quando o coração é como um forno ardente; irritação ou
fúria (latim: furor), isto é, uma explosão turbulenta, como um fogo na
palha; 123 malícia, não só “diabrura”, mas a ímpia inclinação da
mente, a perversidade de disposição que deseja o mal para seu
próximo; calúnia ou difamação; 124 e linguagem obscena de vossa
boca, isto é, linguagem abusiva. Todas essas coisas devem ser 123
Veja-se C. Trench, Synonyms of the New Testament, párr. xxxvii. E
também C.N.T. sobre Jo 3:36.

124 A palavra grega que aqui se usa é blasfêmia. Mas no grego esta
palavra tem um significado muito mais amplo que em português.
Enquanto em português usa-se principalmente para a linguagem
injuriosa a respeito de Deus ou as coisas sagradas, isto é,
irreverência desafiante, no original refere-se a insultos dirigidos
contra Deus ou contra os homens. No presente caso, como o
contexto o indica, a última alternativa é a correta: linguagem injuriosa
e insolente dirigida contra o próximo, insulto, difamação, detração.

Colossenses (William Hendriksen)


203

abandonadas. Note-se aqui o progresso do vício, da ira que se


aninha no coração, através de várias etapas, até a amarga
manifestação dela: calúnia, e linguagem abusiva. A mentira também
deve ser abandonada (cf. 1Tm 2:7). Já não deve estar presente na
vida dos crentes. Todo tipo de hipocrisia e engano foi sempre a
marca dos povos pagãos. Isto é a verdade hoje em dia também. Um
missionário nos contou que em resposta a uma pergunta sobre por
que certa pessoa nova não tinha assistido a uma reunião da semana
como o tinha prometido, a mulher respondeu: “Sinto muito não ter
podido assistir, mas veja, tive que ir ao funeral de minha sogra numa
cidade longe daqui”. Mais tarde o missionário descobriu que a sogra
em questão tinha morrido faz vários anos e que a mulher que tinha
inventado essa desculpa nem sequer tinha estado fora da cidade no
dia de reunião. O missionário acrescentou,

“Dirão qualquer coisa que vier na cabeça, a fim de sair do assunto”.

Paulo os exorta a pôr de lado todos esses pecados, assim como se


descarta ou põe de lado um objeto de vestir gasto ou que já não
serve para a pessoa que o usava. Para o uso literal da expressão
“pôr de lado”

em conexão com vestes, veja-se At 7:58. O apóstolo, bem versado


no Antigo Testamento, sabia que a figura de uma veste era usada
frequentemente nas Sagradas Escrituras para indicar o caráter. Às
vezes refere-se ao caráter que dá glória a Deus, consistindo dos
frutos de graça, tais como, justiça, retidão, alegria, fidelidade (Jó
29:14; Sl 132:9; Is 11:5; 61:10); às vezes ao caráter perverso:
orgulho, violência (Sl 73:6); ou ao resultado desse caráter: vergonha
e desonra (Sl 35:26; 109:29). O

vestido de justiça e salvação é atribuído ao próprio Senhor (Is 59:17).

Portanto, é muito compreensível que Paulo usasse esta maneira


figurada de falar (assim como também outros escritores do Novo
Testamento; veja-se Hb 12:1; Tg 1:21; 1Pe 2:1). A figura está
implícita em Rm 13:12a, 14; Gl 3:27, “de Cristo vos revestistes”; Ef
4:22, 25. Com uma pequena modificação da figura, algumas vezes o
apóstolo fala do dever que o cristão tem de tomar a armadura
espiritual (Rm 13:12b; 2Co 6:7; Ef 6:13–18; e 1Ts 5:8).

Colossenses (William Hendriksen)

204

9b–11. Quando Paulo insistiu que os colossenses deixassem os


vícios que caracterizaram sua vida anterior, ele estava usando um
raciocínio coerente. É como se tivesse dito: «Continuai fazendo na
prática o que já fizeram em princípio». Assim que afirma, uma vez
que vos despistes125 do homem velho com suas práticas, e vos
vestistes do (homem) novo. 126

Como já dissemos (veja-se sobre Cl 2:11, 12), quando os

colossenses foram batizados, tinham renunciado decididamente —

despojar-se de e tirar — “o velho homem” (Rm 6:6; Ef 4:22), isto é, “o


corpo da carne”, sua antiga forma de existência, seu antigo ser
ímpio,

“com suas práticas”, as mesmas práticas enumeradas em Cl 3:5, 8,


9a, e nesse batismo se vestiram do novo homem, Cristo (Gl 3:27),
isto é, a nova natureza que têm os crentes como membros de Cristo.
Pelo qual, que adornem sua profissão de fé feita no batismo com
uma vida agradável a Deus. Que deem morte a (v. 5) e deixem (v. 8)
todos os seus vícios anteriores. Como diz Calvino: «O homem velho
é tudo aquilo que trazemos do ventre de nossa mãe, e tudo o que
somos por natureza. É

chamado velho homem porque primeiro nascemos de Adão, e mais


tarde nascemos de novo através de Cristo». E Thomas Goodwin diz:
«Existem somente dois homens que estão na presença de Deus.
Adão e Jesus Cristo, e estes dois homens têm todos os outros
suspensos de seus cinturões”. Cf. Rm 5:12–21; 1Co 15:22, 45–49.
Deve recalcar-se que só em Cristo (mediante uma união vital com
Ele) é formado este novo homem no crente; também, por causa
disso, 125 Oepke (Th.W.N.T., vol. II, p. 319) e Lightfoot ( op. cit. , pp.
214, 215) dão aos particípios “tirado” e

“vestido” um sentido imperativo. No entanto, (1) nesta mesma carta


(Cl 2:11) o apóstolo mencionou

“o despojamento do corpo da carne” como algo que pertence ao


passado, como um fato consumado; e (2) o contexto imediato (Cl
3:2, 3) parece ser estreitamente paralelo a Cl 3:8, 9. Ambos
significam,

“Fazei isto, porque já fizestes aquilo. Fazei na prática o que já


fizestes no princípio”.

126 Embora seja verdade que o adjetivo νέον, como se usa aqui em
Cl 3:10, basicamente significa novo quanto ao tempo ( novo como
oposto a velho), enquanto καινόν, como se usa em Ef 4:24, assinala
a algo novo quanto à qualidade ( afresco como oposto a gasto), esta
distinção não pode ser enfatizada aqui, uma vez que a ideia de
frescura e vigor que poderia estar ausente do adjetivo νέον, é suprida
pelo particípio _νακαινούμενον.

Colossenses (William Hendriksen)

205

todos aqueles que chegaram a ser novos homens, quer judeus ou


gentios, podem ser chamados, em sua existência corporativa “o novo
homem”

nEle, como o expressa Ef 2:15 “para criar em si mesmo dos dois um


só e novo homem”. Cf. Gl 3:28.

Agora, este novo homem é uma entidade que se desenvolve

progressivamente em cada crente, como Paulo o indica a seguir: o


qual está sendo renovado até um conhecimento pleno. Com uma
linguagem um pouco diferente, em 2Co 4:16 Paulo expressa uma
ideia análoga, mas não inteiramente idêntica: “Portanto, não
desmaiamos, antes (temos confiança de que) embora nosso homem
exterior vá desgastando, não obstante o interior se renova de dia em
dia”. Destas duas passagens podemos ver claramente que a nova
natureza do crente assemelha-se a uma planta em crescimento. É
constantemente renovada pelo Espírito Santo, e aumenta em força
com um fim bem definido em mente. O fato de que o novo homem é
uma realidade que se vai desenvolvendo e que a salvação implica
um progresso, está claro, não só pelas passagens e referências que
já demos na discussão dada acima sobre o v. 5

(começando com 2Co 3:18), mas também pelos que agora


apresentamos, aos quais poderíamos acrescentar muitos mais: 2Co
9:10; 10:15; Ef 2:21; 4:16; Fp 2:12, 13; 1Ts 3:12; 2Ts 1:3; 1Tm 4:15;
2Tm 2:1. Quando se guia um homem através das águas da
salvação, estas primeiro só lhe chegam até os tornozelos, mas ao
progredir lhe chegam até os joelhos, depois até os lombos, e
finalmente são intransitáveis, a menos que seja nadando (cf. Ez
47:3–6). A mesma ideia é dada em Colossenses (Cl 1:9, 10; 2:19).

O novo homem está sendo renovado “até o conhecimento pleno”

(ao qual Ef 4:24 acrescenta “justiça e santidade”). Este conhecimento


supera em muito qualquer “conhecimento” no qual se gloriavam os
falsos mestres que estavam perturbando as igrejas do vale do Lico
(veja-se sobre Cl 2:2, 3, 18). Este conhecimento pleno tem que ver
com o coração e a mente, é experimental e tem como alvo a santa
vontade de Deus (Rm 12:2). Um discernimento real dessa vontade,
em especial com

Colossenses (William Hendriksen)

206

referência à Sua “boa vontade” (Ef 1:5), traz uma grande


recompensa. É
um meio para uma medida muito mais plena e rica da alegria e a paz
da salvação. Um contraste ilustrará o que quero dizer. Embora seja
verdade que as experiências pelas quais uma pessoa passa nesta
vida com relação ao sua próximo, às vezes a levarão a dizer:
«Quanto mais o conheço e entendo suas intenções, menos posso
confiar nele», no reino dos céus prevalece precisamente o contrário,
ou seja, «Quanto mais O

conhecemos — isto é, ao Deus triúno ou a nosso Senhor Jesus


Cristo —

e ao Seu propósito de graça, mais podemos confiar nEle e amá-Lo».

Paulo continua, de acordo com a imagem daquele que o criou. O


padrão ou a medida e o alvo desta renovação é a imagem de Deus,
a semelhança dAquele que criou este novo homem criou o primeiro
Adão segundo a Sua própria imagem (Gn 1:26, 27). No entanto, o
novo homem não é simplesmente a restauração de tudo o que
pertencia ao primeiro homem antes da Queda. (Por mencionar uma
só diferença entre a criação original e a nova: em seu estado de
retidão, Adão não tinha nem sequer uma vaga ideia a respeito do
amor redentor de Deus), antes, “Assim como havemos trazido a
imagem do terrestre, traremos também a imagem do celestial (quer
dizer, Cristo)” (1Co 15:49), em quem Se centraliza todo o amor
redentor de Deus.

Agora, esta gloriosa transformação progressiva à imagem de Deus


não reconhece limites raciais, religiosos, culturais ou sociais. Paulo
afirma: onde não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem
incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre.

Toda intolerância racial, chauvinismo e orgulho social é condenado


aqui. A verdade de que “todos os homens são iguais” na presença de
Deus, recebe aqui sua mais alta expressão, uma vez que é um
escrito divinamente inspirado. Certamente, sempre houve homens
que, por iluminação divina, captaram esta verdade, pelo menos em
parte. Não obstante, a grande maioria dentro de todas as raças a
negou, se não em teoria, pelo menos na prática. Por exemplo, os
assírios, aqueles que cria que seus deuses eram mais poderosos
que os de qualquer outra nação,

Colossenses (William Hendriksen)

207

inclusive o Deus de Israel (2Rs 18:33–35). Havia o judeu, o qual não


conhecia o temor, porque, diferente dos homens de outras nações,
ele possuía o templo (Jr 7:4), e podia dizer, “Temos a Abraão como
nosso pai” (mas veja-se o que Jesus lhes responde, Lc 3:8). Os
edomitas consideravam-se superiores a outros mortais, porque
viviam nas fendas das penhas” (Ob 3). O homem de pele-vermelha
considerava o homem branco como “não assado”, e ao negro como
“queimado”, mas ele estava

“a ponto”, e naturalmente a vila na qual vivia estava exatamente no


centro da superfície da terra; o homem branco, que crê pertencer à
raça

“superior”, tem por seguro que uma maldição especial de Deus


descansa sobre aqueles que não são de sua raça, e é seu privilégio
e dever perpetuar esta maldição mediante a escravidão; e o homem
negro diz que não é o branco mas sim ele quem é “superior” e que
fará valer essa superioridade pela força se for necessário.
Naturalmente que nem todos os membros de todas as raças ou
classes são culpadas deste exclusivismo, mas muitos o são. De
maneira nenhuma são os hindus os únicos que creem no sistema de
castas!

Nos começos da história do Norte a América houve homens

distinguidos que consideravam as colônias de gente branca como o


povo escolhido por Deus, destinado a governar o mundo por causa
de sua extraordinária virtude. Existem alemães que cantam com todo
o coração,

“Deutschland, Deutschland über alles”, e há holandeses que creem


que existe uma aliança especial entre “Deus, os Países Baixos e a
Casa do Orange”. Existe gente evangélica boa, “irmãos e irmãs em
Cristo”, aqueles que crê que até na presente dispensação as
distinções de nacionalidade têm valor diante de Deus (e tudo isto
apesar de Cl 3:11; cf.

Ef 2:14, 18, 19), e que algum dia os judeus governarão todo mundo
de Jerusalém. E há varões que creem que a superioridade está
ligada ao sexo que alguém tenha, e que a mulher “é uma criatura
mais baixa que o varão”.

Agora, Paulo não tem a intenção de anular todas as diferenças


étnicas, culturais ou sociais. Que há, na verdade, diferenças admite-
se

Colossenses (William Hendriksen)

208

abertamente, e de fato, às vezes se enfatiza. Nem todos os membros


do corpo humano têm a mesma função. Assim também no corpo de
Cristo, a igreja (Rm 12:4; 1Co 12:12–31). Todos devem trabalhar
juntos em harmonia. De forma semelhante, nem todos têm as
mesmas

oportunidades e vantagens (Rm 3:1, 2). Que o privilegiado


reconheça as responsabilidades que tem acrescentados (Rm 2:9, 12;
3:12; cf. Am 3:2; Lc 12:47, 48). Portanto, em certa forma não é
verdade que todos os homens são iguais. Mas o são em dois pontos
importantes! Primeiro que tudo, “todos hão pecado, e estão
destituídos da glória de Deus” (Rm 3:23; cf. 2:11; 3:9–18; 5:12, 18).
Segundo, “o próprio Senhor é Senhor de todos, e é rico para com
todos os que lhe invocam” (Rm 10:11, 12).

Aqueles que pela graça soberana de Deus são levados a crer no


Senhor Jesus Cristo são salvos sem importar absolutamente ao que
raça, cultura ou estrato social pertença” (cf. Rm 3:22b, 23, 24; 4:11,
12; 5:18b; 11:32; Gl 3:13, 14; 3:9, 27–29; Ef 2:11–22).
Agora, a passagem em consideração (Cl 3:11) não é o único em que
o apóstolo contrasta certos grupos. Cf. Rm 1:14, e especialmente Gl
3:28. Mas em cada carta o contraste particular que ele faz está em
harmonia com o propósito que tem em mente para essa epístola.
Deste modo, em Gálatas, em harmonia com o pano de fundo e
propósito, as distinções que enumera são raciais e religiosas (“judeu
nem grego”), sociais (“escravo nem livre”) e sexuais (“varão nem
mulher”). Isto nos lembra o que se conta da oração que um judeu
varão elevava todas as manhãs, dando graças ao Senhor e lhe
abençoando porque não lhe fez um “gentio, um escravo, ou uma
mulher!”. Paulo afirma que em Cristo estas distinções, quando se
tomam como sinais da preferência de Deus, estão totalmente fora de
consideração. Na passagem que temos diante de nós, os contrastes
e as razões para colocá-los nesta forma e não em outra, são como
seguem:

Colossenses (William Hendriksen)

209

(1) Raciais e religiosas: “onde não pode haver grego nem judeu,
circuncisão nem incircuncisão”. 127 Isto é dito para neutralizar o
ensino dos cerimonialistas (veja-se acima, sobre Cl 2:11–14).

(2) Culturais: “bárbaro, cita”. Embora estas duas designações se


referem ao supostamente inculto, existe um contraste implícito entre
o culto e o inculto. O “conhecimento” e a “filosofia” são de nenhuma
ajuda para criar dentro do coração “o novo homem”. Não obstante,
era precisamente nestes realizações humanas que os falsos mestres
que estavam perturbando a igreja de Colossos punham toda seu
ênfase. Veja-se sobre Cl 2:4, 8, 18.

(3) Sociais: “escravo, livre”. É como se Paulo estivesse dizendo: «Ó

colossenses, não olhem aos escravos com altivez. Aceitem a


Onésimo como a um dos seus, seu irmão em Cristo. Quanto à
posição que um homem tem diante de Deus, não existe diferença
entre escravo e livre».
A graça atravessa os abismos. Embora os gregos dividissem a
humanidade em dois categorias, gregos e “bárbaros”; e embora os
romanos (depois de conquistar politicamente os gregos, mas
conquistados por estes culturalmente) fizessem um contraste
semelhante entre gregos e romanos por um lado, e os “bárbaros”,
por outro; e apesar de os judeus não convertidos a Cristo, situarem o
grego em contraste com o judeu, a graça não reconhece tais
distinções, uma vez que tanto o gentio como o judeu são
reconciliados um com o outro mediante sua reconciliação com Deus
através da cruz (Ef 2:13).

De forma semelhante, pelo fato de que a única circuncisão que tem


valor diante de Deus é a circuncisão do coração, é lógico que diante
dEle, o assunto de se alguém foi ou não literalmente circuncidado
não tem nenhum significado. Veja-se C.N.T. sobre Fp 3:2, 3.

E pelo fato de que o mundo por sua “sabedoria” não chegou a


conhecer a Deus (1Co 1:21), as distinções culturais tampouco têm
127 Note-se o acerto quiástico das palavras, o que é comum em
Paulo. O primeiro termo, grego, corresponde ao quarto,
incircuncisão; o segundo, judeu, ao terceiro, circuncisão. Veja-se
sobre Fm 5.

Colossenses (William Hendriksen)

210

nenhum valor quanto à posição que um indivíduo tem diante de


Deus. Os títulos acadêmicos não fazem de ninguém um novo
homem. A cultura e a elegância social, embora não devam ser
menosprezados em si mesmo, não são graça salvadora. E, por outro
lado, ser um bárbaro (At 28:4; Rm 1:14; 1Co 14:11 duas vezes), ou
um mero “gago” para os ouvidos do mais sofisticado, não pode, em e
por si mesmo, impedir a ninguém o chegar a ser um novo homem,
não importa se este bárbaro é por reputação da classe mais baixa,
ou seja, um cita.
No século VII a.C., estes citas, selvagens e bélicos nômades
procedentes das estepes nórdicas, inundaram as cidades da
crescente fértil, incluindo a Palestina, e, tendo sido repelidos
posteriormente, tinham deixado uma lembrança de morte e horror.
128 O relato de Heródoto a respeito deles é como segue (em parte):

«Invadiram Ásia depois de ter expulso os cimérios da Europa … e se


tornaram os senhores da Ásia. Dali partiram contra o Egito; e quando
estiveram nessa parte da Síria chamada a Palestina, Psamético, rei
do Egito, encontrou-os no caminho, persuadindo-os por meio de
presentes e orações a não seguir mais adiante … Governaram a
Ásia por vinte e oito anos; e toda a terra foi desolada por sua
violência e arrogância.… A grande maioria deles foram tratados com
atenção e embebedados e, então, foram mortos por Ciáxares e os
medos» (I 103–106). «Beberam o sangue do primeiro inimigo que
matavam numa batalha, e fizeram guardanapos do couro cabeludo e
tigelas para beber do crânio daqueles que matavam. Tinham os
hábitos mais sujos e nunca se lavavam com 128 Lightfoot ( op. cit. ,
p. 219) afirma que “o terror que estes invasores inspiravam
encontrou eco nos profetas”. Então cita Ez 28 (38?) e 39; Jr 1:13ss. e
6:1ss. Outros também identificaram aos citas com

“Gogue e Magogue” de Ez 38 e 39. Josefo declara que “Magogue


instituiu a quem desde ele se chamavam magogitas, mas que os
gregos chamaram citas” (I.vi.1). E veja-se J.F. McCurdy, seu artigo

“Gogue e Magogue” em The New Schaff-Herzog Religious


Encyclopedia, vol. V, pp. 14, 15. No entanto, um estudo exegético
mais cuidadoso de Jeremias e Ezequiel convenceu a muitos
intérpretes que esta identificação é duvidosa. Em Jz 1:27 a LXX
coloca Citópolis como um equivalente de Bete-Seã. (Cf. Judith 3:10;
2 Mac. 12:29). Portanto, usualmente se supõe que uma companhia
de citas, depois de sua invasão da Palestina, estabeleceu-se ali, e
que devido a isso o lugar foi chamado “a cidade dos citas”. Quanto
ao resto, a única referência segura quanto aos citas é esta
passagem, Cl 3:11.

Colossenses (William Hendriksen)


211

água» (IV 64, 65, 75). Cf. Tertuliano, Contra Marcião I.1, «Marcião
nasceu ali, mais imundo que um cita». E Josefo declara: «Os citas
deleitavam-se em matar gente e são pouco melhor que as bestas
selvagens» ( Contra Ápion II. 269). Em 2 Macabeus 4:47, lemos,

«Menelau, o causador de todos os males … condenou à morte


aqueles infelizes que tivessem sido postos em liberdade até se
tivessem declarado diante de um tribunal de citas». Esse «até …
diante de um tribunal de citas» diz muito! Cf. 3 Macabeus 7:5. E
Orígenes ( Contra Celso I.1) fala de «leis citas, ou mais ímpias que
estas, se as houver».

Apesar de tudo isso, embora um homem fosse cita, esse fato por si
não pode impedi-lo de chegar a ser um novo homem. Isto é o que
Paulo está afirmando aqui. Ou, como o expressa Justino Mártir tão
vividamente: «Mas embora um homem seja cita ou persa, se possuir
o conhecimento de Deus e de Seu (de Deus) Cristo, e se guarda os
eternos decretos justos, está circuncidado com a boa e benéfica
circuncisão e é um amigo de Deus, e Deus Se regozija em seus
presentes e ofertas»

( Diálogo com Trifo, Cap. 28).

E por último, quanto ao “escravo, livre”, pelo fato de que “se o Filho
vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (Jo 8:36), nenhuma
escravidão que pertença às relações sociais meramente terrestres
poderá jamais ter alguma importância para a salvação. Para uma
discussão mais extensa sobre a escravidão, veja-se sobre Cl 3:24–
4:1; e também no Comentário a Filemom A Escritura sobre a
escravidão.

Paulo conclui este parágrafo com as palavras, mas Cristo (é) tudo e
em todos. A única coisa que conta é Cristo, como o todo-suficiente
Salvador e Senhor. Sua morada pelo Espírito em todos os crentes de
qualquer pano de fundo racial, religioso, cultural ou social, assegura
a criação e gradual perfeição em todos e em cada um deles de “o
novo homem o qual está sendo renovado até um conhecimento
pleno de acordo com a imagem daquele que o criou”. Deste modo, o
próprio tema

Colossenses (William Hendriksen)

212

de toda a carta, ou seja, “Cristo, o preeminente, o único e todo-


suficiente Salvador” chega ao seu clímax nesta passagem. 129

3. DEVEM “VESTIR-SE” DAS NOVAS VIRTUDES - CL 3:12-17

Assim como a tranquilidade de um lago, refletindo a beleza do sol


nascente, segue à turbulência dos ventos fortes e as ondas
tempestuosas, assim também (em princípio) “a paz de Cristo” (v. 15)
deslocou a inquietação que antes caracterizava os colossenses,
quando viviam à parte de Cristo, como foi descrito no parágrafo
anterior (veja-se especialmente os vv. 5–9). A presente seção é
insuperável pela beleza de seu estilo e pelo chamado direto ao
coração. O mesmo se pode dizer de seu valor prático. Se os
colossenses tão somente vivessem a vida que aqui se descreve de
uma forma tão gráfica e, no entanto, tão simples, seus problemas
seriam solucionados. Naturalmente, somente pela força que Deus
oferece e mediante a confiança completa no poder fortalecedor de
Sua graça soberana e transformadora poderão atender as instruções
dadas. Estas instruções são introduzidas da seguinte forma: 12, 13.
Revesti-vos, pois, como escolhidos de Deus, santos e amados.

O “revesti-vos” é uma repetição do v. 10. E a palavra “pois” significa


(ampliando seu sentido): «pelo fato de que em princípio abraçastes a
Cristo dentro de vossos corações, portanto, sejais na pratica — sim,
completamente — o que professastes ser, e o que eu, Paulo,
realmente creio que começastes a ser». Sejais assim “como
escolhidos de Deus”.

Para um resumo de doze pontos sobre a doutrina da eleição nas


epístolas de Paulo, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Tessalonicenses, pp.
60–61. Note-se especialmente as seguintes afirmações, tomadas
dos pontos 7, 10 e 12:

“A eleição afeta a vida em todas as suas fases, pois não é algo


abstrato.

Embora pertença ao decreto de Deus desde a eternidade, chega a


ser uma 129 A conjunção “e” na frase “Cristo (é) tudo e em todos”
mostra que “ambas partes da frase devem ser levadas em
consideração” (Moule, op. cit. , p. 122). De modo que 1Co 15:28 e Ef
1:23 (“tudo em todos” em ambas as passagens, omitindo o “y”) não
são realmente paralelos a Cl 3:11.

Colossenses (William Hendriksen)

213

força dinâmica nos corações e vidas dos filhos de Deus. Produz


frutos.

Não só é uma eleição para salvação, mas também especificamente


(como um elo na cadeia) uma eleição para serviço. Tem como
propósito final a glória de Deus, e é a obra de Seu deleite” (Ef 1:4–6).

Em aposto à frase “escolhidos de Deus” encontram-se as palavras


“santos e amados”. Como escolhidos de Deus, estas pessoas, tanto
individual como coletivamente e até onde são verdadeiros crentes,
são definidas como “santos”, isto é, “separados” para o Senhor e Sua
obra.

Foram lavados com o sangue de Cristo da culpa de seus pecados, e


estão sendo libertados cada vez mais da corrupção do pecado e
renovados à imagem de Deus (veja-se o v. 10 acima). Além disso,
são “amados”, e isto de forma especial por Deus (1Ts 1:4; cf. 2Ts
2:13).
Deste modo, os qualificativos que com tanta honra se aplicavam
anteriormente ao antigo povo da aliança, Israel (veja-se 1Pe 2:9; e
então Is 5:1; Os 2:23; cf. Rm 9:25), aqui são usados em conexão
com os membros da igreja da nova dispensação. A igreja é o novo
Israel. Paulo continua. (Revesti-vos de) um coração de
compaixão, bondade, humildade, mansidão, longanimidade. É
evidente que estas virtudes se cobrem. Uma pessoa com um
“coração compassivo” também será

“bondosa”. Um que é humilde também será manso, etc. Portanto:

Colossenses (William Hendriksen)

214

A expressão coração de compaixão130 aponta a um sentimento


muito profundo, “um anelar com o profundo afeto de Cristo Jesus”
(Fp 1:8). Quanto à profundidade deste sentimento alguém poderia
pensar na reação de José ao ver benjamim (Gn 43:30) ou ao
revelar-se a seus irmãos (Gn 45:1–4). Outro exemplo seria a terna
relação entre Davi e Jônatas (1Sm 18:1; 20:4, 17).

A próxima qualidade é a bondade. Esta é a bondade de coração que


comunica o Espírito, e que é justamente o oposto da malícia ou
maldade mencionada no v. 8. Os cristãos de antigamente se
recomendavam a outros por sua bondade (2Co 6:6). Deus também
é bondoso (Rm 2:4; cf.

11:22) e somos exortados a ser como Ele a este respeito (Lc 6:35).

Exemplos da bondade humana poderiam ser as mesmas pessoas


que já mencionamos em conexão com “coração de compaixão”.
Para evitar repetições, acrescentemos o bom samaritano da bem
conhecida parábola (Lc 10:25–37), Barnabé (At 4:36, 37; 15:37), e o
próprio apóstolo Paulo (1Ts 2:7–12).
A humildade — uma virtude desprezada pelos pagãos (como já
notamos) — é também uma qualidade que os crentes devem
procurar cada vez mais adquirir. A pessoa que é bondosa para com
os demais, geralmente não tem uma opinião muito alta de si
mesma. Quando cada membro de uma igreja estima a outros como
superiores a ele mesmo, cria-se um ambiente feliz (Fp 2:3).
Naturalmente, também há tal coisa como uma “humildade fingida”
(veja-se sobre Cl 2:18, 23). Um bom exemplo de verdadeira
humildade pode ser o centurião que disse: “Não sou digno de que
entres em minha casa” (Lc 7:6), e o publicano que, na penetrante
parábola, derramou seu coração, dizendo: “Deus, sê propício a mim,
pecador” (Lc 18:13). Não obstante, de acordo com o contexto, aqui
Paulo tem em mente a modéstia na estimativa de si mesmo em
relação ao próximo, especialmente dos irmãos crentes.
Naturalmente, 130 Para uma discussão da palavra usada no
original, veja-se C.N.T. sobre Fp 1:8, nota 39.

Colossenses (William Hendriksen)

215

estas duas — humildade diante de Deus e a mesma disposição para


com os homens — longe de excluir-se uma a outra, são
inseparáveis.

A mansidão, mencionada a seguir, definitivamente não é fraqueza


ou covardia, característica da pessoa que está preparada a ceder
diante de qualquer problema. Antes, é o ser submisso ao ser
provocado, a determinação de sofrer dano antes de infligi-lo. Um
exemplo notável é Moisés (Nm 12:3).

Para a longanimidade, veja-se Cl 1:11. Que exemplo de


longanimidade vemos em Jeremias em seu longo período de
atividade profética. Pensemos também em Oseias, que, em lugar de
repudiar a sua esposa infiel, foi ao lugar da vergonha, redimiu
Gômer com quinze siclos de prata e um ômer e meio de cevada, e
misericordiosamente a restaurou novamente à sua posição de
honra. 131
Continuando: suportando-vos uns aos outros. Exorta os
colossenses a ser indulgentes uns para com os outros em amor (cf.
Ef 4:2). Paulo podia dizer: “padecemos perseguição e a suportamos”
(1Co 4:12). Vem-nos à mente o exemplo de Jó (Tg 5:11). Paulo
acrescenta: e perdoando-vos132 uns aos outros se alguém tiver
queixa contra outro. Da maneira como o Senhor133 perdoou-
vos, assim também fazei-o vós. Para o perdão divino, veja-se
sobre Cl 2:13. Enquanto estava neste mundo, Cristo ensinou aos
Seus discípulos a orar: “Perdoa-nos as nossas dívidas assim como
nós perdoamos aos nossos devedores” (Mt 6:12). E é possível que
a expressão “da maneira que o Senhor vos perdoou, assim também
fazei-131 Isto é certo, naturalmente, se a mulher fornicária for
identificada”, ou seja, a Gômer (Os 1:2, 3) com a adúltera” de Os
3:1–3.

132 Aqui se usa novamente uma das formas do verbo χαρίζομαι


como em Cl 2:13. A palavra enfatiza o caráter total e gratuito do
perdão. O substantivo, _φεσις, que se usa em Cl 1:14 e Ef 1:7 (cf. o
verbo _φίημι, deixar ir, soltar) põe de relevo a ideia de que o pecado
foi completamente removido (cf. Sl 103:12).

133 As variantes textuais deste versículo são “Deus”, “Deus em


Cristo” (provavelmente de Ef 4:32) e

“Cristo”. No entanto, o apoio textual que possui a leitura “o Senhor”


é claramente a mais forte.

Considerando a Cl 1:13, 14 e 2:13 (veja-se a explicação destas


passagens), aqui se faz referência a Deus, em vez de a Cristo,
embora a diferença seja mínima. Quando Deus perdoa, Ele o faz
“em Cristo” (Ef 4:32; cf. Mt 18:35).

Colossenses (William Hendriksen)

216

o vós”, seja um eco consciente da petição que acabamos de citar da


oração do Senhor, mostrando desta maneira que Paulo conhecia
esta oração. Em todo caso, a frase tem o mesmo espírito e
significado. Jesus também tinha ensinado a Pedro a perdoar: “Não
te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mt 18:22),
e acrescentou uma parábola comovedora que termina com estas
palavras: “Assim também meu Pai celeste vos fará, se do íntimo não
perdoardes cada um a seu irmão” (Mt 18:35; cf. Mc 11:25). Além
disso, o Senhor sublinhou estes preceitos com Seu próprio exemplo.
Enquanto estava na cruz, disse:

“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23:34).


Estêvão seguia o exemplo de Cristo, quando, ao ser apedrejado até
a morte, disse,

“Senhor, não lhes imputes este pecado!” (At 7:60).

Este parece ser o momento propício para notar que Paulo está
ligando suas exortações à pessoa e obra de Cristo, como o
indicamos em conexão com Cl 1:28. Veja-se ali as três colunas. As
qualidades que segundo Paulo são a marca do cristão, também são
atribuídas a Cristo.

Sobre o Seu “coração compassivo” e Sua bondade, veja-se Mt 9:36;


14:14; 15:32; 20:34. Sua humildade e mansidão são manifestas em
Mt 11:29; 21:5; Jo 13:1–15; Fp 2:8; Sua longanimidade e paciência
ou tolerância em Mt 17:17; Jo 14:9; 1Pe 2:23; Seu espírito
perdoador em Mt 9:2; Lc 7:47; 23:34. Como resultado, quando um
crente manifesta estas virtudes em sua relação com seu próximo,
podemos dizer que “se revestiu” de Cristo (Rm 13:14). E é
confortante saber que aquele que viu a Cristo viu o Pai (Jo 14:9; cf.
1:18), e aquele que imita a Cristo (1Co 11:1; 1Ts 1:6) também imita
a Deus (Ef 5:1).

14. E como Ef 5:2 claramente indica, isto também é aplicável com


relação ao amor. O apóstolo continua: E sobre todas estas coisas
(revesti-vos de) amor, que é o vínculo da perfeição. Esta
supremacia que tem o amor — note-se o “sobre todas estas coisas”
— é evidente também em 1Co 13:13. O amor encabeça a lista dos
“frutos do Espírito” (Gl 5:22).
Na oração de Paulo pelos filipenses, a primeira coisa que se pede é
“que vosso amor aumente cada vez mais” (Fp 1:9). O amor domina
os escritos

Colossenses (William Hendriksen)

217

de João, onde aparece muitas vezes. Com Pedro também o amor é


supremo (1Pe 4:8). Em quão alta estima o tinha o autor anônimo de
Hebreus é claro por Hb 10:24; 13:1. O amor é o lubrificante que
permite às outras virtudes funcionar brandamente (Gl 5:6, 13). O
que Paulo tem em mente é a dedicação de si mesmo de forma
inteligente e com propósito, o cumprimento tanto da lei como do
evangelho. No contexto presente o que especialmente se tem em
mente é o amor mútuo, amor de uns com os outros dentro da
comunidade cristã, embora seja verdade que este amor excede
estes limites (1Ts 3:12). Esta é a própria essência do amor:
superabundar. Deste amor de um para com o outro, como irmãos e
irmãs no Senhor, falava Cristo quando promulgou Seu “novo
mandamento” (Jo 13:34; 1Ts 4:9). Cf. sobre Cl 1:8.

Agora, este amor chama-se “o vínculo da perfeição”. Isto foi


interpretado como se significasse que o amor é «a graça que liga
todas as outras graças» (Bruce, op. cit. , p. 281). Embora isto
pudesse ser o correto, e daria à expressão um significado razoável,
provavelmente seria melhor interpretá-lo à luz do que o próprio
Paulo disse nesta epístola, ou seja, “sendo unidos fortemente uns
com os outros em amor” (Cl 2:2). O

amor então, é “o vínculo da perfeição” no sentido de que é aquilo


que une aos crentes, fazendo com que avancem rumo ao alvo da
perfeição.

Esta interpretação também está em harmonia com o propósito que o


apóstolo tinha ao escrever esta carta. É como se estivesse dizendo:
«O
que vos fortalecerá e unirá e vos levará até a obtenção do ideal
espiritual, não é o conhecimento ou a filosofia, da qual se jactavam
os falsos mestres, ou a obediência às regras humanas, mas o amor
um para com o outro, que é a resposta espontânea ao amor que
Deus lhes tem. Sobre o significado deste ideal, cf. Cl 1:28.

15. Paulo continua: E que a paz de Cristo, para a qual fostes


chamados num corpo, reine em vossos corações. Esta paz é a
condição de descanso e contentamento no coração daqueles que
sabem que seu Redentor vive. É a convicção de que os pecados
passados foram perdoados, que o presente está sendo dirigido para
bem e que o futuro

Colossenses (William Hendriksen)

218

jamais poderá obter a separação de Cristo e os seus. A respeito de


esta paz, o apóstolo em Fp 4:7 diz: “E a paz de Deus que ultrapassa
todo entendimento guardará vossos corações e pensamentos em
Cristo Jesus”.

É a paz de Cristo porque Cristo ganhou para os crentes, é


derramada por Seu Espírito sobre eles, e é nutrida pelo próprio
Salvador Senhor (Jo 14:27; 16:33; 20:19, 21, 26). E além disso, é
modelado segundo a paz que habita no próprio coração do
Salvador.

Agora, esta paz também tem seu aspecto social, no qual recai a
ênfase na presente passagem (cf. Ef 4:3, 4), como é evidente pela
expressão “para a qual fostes chamados num corpo”. Quando Deus
tira os homens das trevas à luz, eles (segundo Deus os vê) não são
tirados do seu meio ambiente como seixos recolhidos da praia. Ao
contrário, foram chamados como um corpo, pois desde a eternidade
foram considerados como entidade corporativa “em Cristo”. No
tempo foram “chamados” a fim de promover esta unidade espiritual
em todas as formas. Bem, só se pode alcançar este fim se a paz de
Cristo reina134 em cada coração.
Portanto, cada indivíduo deve perguntar-se constantemente: «Terei
paz dentro de mim se fizer isto ou aquilo?» A pessoa deve estar
segura de que está em paz com Deus, porque só então poderá
esperar viver em verdadeira harmonia com seus irmãos (cf. Tg 4:1).

Paulo acrescenta, e sede agradecidos. É digno de nota se quão


frequentemente nesta breve epístola o apóstolo faz menção do
privilégio e o dever de ser agradecido (Cl 1:3, 12; 2:7; 3:15, 16, 17;
4:2). A gratidão contribui à paz e a excelentes relacione públicas.
Quando uma pessoa sente-se ricamente bendita e realmente
valoriza ardente e profundamente os benefícios que recebeu de
Deus, dificilmente invejará as riquezas ou talentos superiores de
outro. De modo que a exortação do apóstolo encaixa
esplendidamente no contexto imediato. A gratidão promove a paz. A
exortação também harmoniza com o contexto mais 134
Basicamente, o significado de βραβευέτω é que seja árbitro. De
modo que é fácil ver como foi que surgiu o significado de que
governe. Cf. sobre Cl 2:18, nota 97.

Colossenses (William Hendriksen)

219

amplo, o qual menciona algumas das bênçãos que os crentes


receberam.

Estão “escondidos com Cristo em Deus”, receberam o perdão de


seus pecados, e diariamente experimentam uma renovação
espiritual. Além disso, o apóstolo está para mencionar mais outras
bênçãos, como a palavra que habita nos corações e os salmos e
hinos e canções espirituais. A ação de graças é apropriada por
todos estes favores.

Embora todos os homens deveriam dar graças, espera-se dos


cristãos que assim o façam. A ingratidão é uma marca do
paganismo (Rm 1:21).
Certamente também era a marca dos medrosos alarmistas que
estavam vexando os destinatários (Cl 2:16–23). Assim que, tendo
sido resgatados do paganismo, os colossenses também devem dar
as costas aos assim chamados “filósofos”. Que estejam cheias de
alegria e que louvem ao Senhor em novidade de espírito todos os
dias. Deste modo serão verdadeira e serenamente benditos e por
sua vez serão bênção para outros.

16. Paulo acaba de dizer: “Que a paz de Cristo reine em vossos


corações”. Mas à primeira vista muito bem poderia um crente
perguntar:

«Mas se eu o fizesse dessa forma, não estaria construindo o edifício


de minha esperança e confiança sobre um fundamento inseguro e
subjetivo?» No entanto, depois de pensar um pouco, ele mesmo
responderia a si mesmo: «De maneira nenhuma, porque eu tenho
paz quando no mais profundo de meu ser eu, pela graça soberana
de Deus, decido viver conforme a objetiva palavra de Cristo».
Portanto, os versículos 15 e 16 não devem ser separados. A paz
chega ao coração pela obediência ao evangelho. De modo que
Paulo continua: Que a palavra de Cristo habite entre135 vós
ricamente. A revelação especial e objetiva que procede de (e tem
que ver com) Cristo — “Cristo como o verbo” — deve governar cada
pensamento, palavra e obra, e até as 135 Ou “em”, seguindo a
maioria das versões em português. Não obstante, o contexto
imediato parecesse favorecer a tradução “entre”. Assim opinam
também Bruce, Ridderbos. Lightfoot favorece

“em”. A diferença não é realmente de importância, uma vez que só


quando a palavra habite nos corações poderá habitar entre os
crentes.

Colossenses (William Hendriksen)

220

intenções e motivações mais profundas de cada membro, e desta


forma influir entre todos eles, e deve fazê-lo ricamente, “dando muito
fruto”

(Jo 15:5). Isto acontecerá se os crentes prestarem atenção à


palavra (Mt 13:9), se a usarem bem (2Tm 2:15), se a guardarem em
seus corações (Sl 119:11), e se a oferecem a outros como a
verdadeira “palavra de vida”

(Fp 2:16). Apesar de que quando o apóstolo escreveu isso, “a


palavra de Cristo” não tinha sido ainda encomendada à página
escrita na forma e na extensão em que hoje a temos, contudo, isto
não anula o fato de que para Paulo e todos os crentes de seu
tempo, como também (de forma mais ampla) para nós: “Toda
escritura (é) inspirada por Deus e útil para ensinar, para repreender,
para corrigir, para instruir em justiça, para que o homem de Deus
esteja equipado, completamente equipado para toda a boa obra”
(veja-se C.N.T. sobre 2Tm 3:16, 17). A continuação lógica é:
ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros136 em toda
sabedoria. 137

Para a explicação destas palavras veja-se sobre Cl 1:28, onde se


expressa a mesma ideia numa oração quase idêntica. As diferenças
são como seguem: (1) em Cl 1:28 o apóstolo narra o que ele,
Timóteo e outros estão fazendo; aqui (em Cl 3:16) admoesta aos
crentes de Colossos a respeito do que eles deveriam estar fazendo.
Em ambos os casos o conteúdo é o mesmo: admoestar e ensinar.
Os crentes, em virtude de seu “ofício” como crentes — que não
esqueçam que estão vestidos com esse ofício! — devem fazer o
que Paulo e seus associados estão fazendo em virtude de seu
ofício, quer dizer, como apóstolo e delegados apostólicos,
respectivamente. Cada pessoa deve fazê-lo de 136 Não “a si
mesmos”. O pronome _αυτούς não só é um pronome reflexivo, mas
também pode ser recíproco. Veja-se L.N.T. (A. e G.), p. 211. Em Cl
1:28 a ideia é parecida: admoestando a todo homem e ensinando a
todo homem, não “ensinando-se a si mesmos”. Cf. Ef 5:19. O
mesmo acontece com Cl 3:13, que à luz do contexto colossense
dificilmente poderia traduzir-se “perdoando-se a si mesmos”. Esta é
minha resposta à afirmação contrária de Lenski ( op. cit. , p. 177),
embora em Col.3:13 ele também traduz o pronome “uns aos outros”.

137 O fato de que em Cl 1:28, numa cláusula quase idêntica, a frase


“em toda sabedoria” modifique

“ensinando e exortando”, para mim significa que aqui deve construir-


se da mesma forma, e não (como Lightfoot) unir-se à cláusula
precedente.

Colossenses (William Hendriksen)

221

acordo com os direitos e obrigações de seu ofício particular. (2) Em


Cl 1:28 o assunto é mais amplo, “todo homem”. Aqui (Cl 3:16) a
ênfase é sobre um ensino e admoestação mútua. E (3) em Cl 1:28 a
frase “em toda sabedoria” coloca-se no final (no grego), mas na
passagem que se dirige aos colossenses (Cl 3:16) a frase está em
primeiro lugar (o original lê: “em toda sabedoria ensinando-vos e
admoestando-vos”, etc.), talvez para o propósito de sublinhar a ideia
comunicada pelo advérbio precedente: “ricamente”, como se
quisesse dizer: «Se a palavra de Cristo deve habitar entre vós
ricamente, então em toda sabedoria deveríeis admoestar-vos e
ensinar-vos uns aos outros”.

Há algo mais que se deve fazer se a palavra de Cristo deve habitar


ricamente entre os colossenses. E é declarado com estas palavras:
(y) cantando a Deus num espírito de agradecimento138 e com
todo vosso coração por meio de salmos, hinos e canções
espirituais. 139

Paulo reconhece a natureza edificante do canto que glorifica a


Deus. Quanto ao significado dos termos salmos, hinos e canções
espirituais (cf. Ef 5:19), uma breve pesquisa mostra rapidamente
que não é fácil fazer uma distinção clara entre estes três. É possível
que aqui os 138 Não se pode saber com segurança se a melhor
leitura é _ν τ_ χάριτι ou _ν χάριτι. Ambas têm forte apoio textual.
Com base em 1Co 10:30, e em harmonia com o contexto imediato
(veja-se os vv. 15 e 17), a interpretação mais provável é
agradecidamente ou num espírito agradecido, em vez de a. “com
graça em vosso coração” RC (1998), ou b. “com encantamento”.

139 Quanto à construção existem duas possibilidades principais: (1)


Construir as palavras “por meio de salmos, hinos e canções
espirituais” com as palavras que o precedem. Neste caso Paulo
estaria dizendo: “ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros
por meio de salmos, hinos e canções espirituais”. Esta construção é
adotada pela RC, A Bíblia das Américas, Moffatt’s New Testament
Translation, Berkeley Version, e os comentaristas Bruce, Lenski,
Lightfoot, etc. (2) Construir a frase com as palavras que seguem
(veja-se minha tradução). Com algumas pequenas variações, esta
alternativa (a qual também está de acordo com a pontuação do
N.N.) é adotada pela RC, B.J., Amplified New Testament, Dutch
Bible (Nieuwe Vertaling), Beare (em The Interpreter’s Bible),
Ridderbos, etc. Concordo com o último autor mencionado, quando
se opõe à teoria (1), dizendo: “a ideia de que este ensino e
exortação mútua deve levar a cabo por meio do canto nos parece
pouco natural” ( op. cit. , p. 222). Devo acrescentar que a passagem
à qual acodem os defensores da teoria (1), a saber, Ef 5:19, não é,
na minha opinião, uma prova suficiente. Uma coisa é dizer que os
crentes devem falar entre eles em cantos, e outra coisa é dizer que
o ensino e a exortação deve ser realizado por meio do canto.

Colossenses (William Hendriksen)

222

significados coincidem em parte. É natural que ao pensar nos


salmos nos venha à mente o saltério do Antigo Testamento, e que
vamos a Lc 20:42; 24:44; At 1:20; 13:33, para apoiar este ponto de
vista. Até aqui não há problema. Mas os expositores de maneira
nenhuma estão de acordo em que este seja também o significado
da palavra salmos em 1Co 14:26

(“quando vos reunis, cada um tem salmo”).


Quanto a hinos, a palavra só aparece aqui (Cl 3:16) e em Ef 5:19

em todo o Novo Testamento. Santo Agostinho declarou em mais de


uma oportunidade que um hino deve possuir três elementos
principais: deve ser cantado; deve ser um louvor; deve ser dirigido a
Deus. Segundo esta definição, um salmo do Antigo Testamento bem
poderia classificar-se como um hino. Deste modo, quando Jesus e
Seus discípulos estavam por deixar o cenáculo para ir ao monte das
Oliveiras: “cantaram hinos” (Mt 26:30; Mc 14:26). E muito sustentam
que o que cantaram foram os salmos 115–118. Segundo At 16:25,
Paulo e Silas cantaram hinos na prisão de Filipos. Não é provável
que alguns, embora nem todos, destes hinos fossem salmos? Cf.
também Hb 2:12. Mas se Agostinho está certo, então há hinos que
não pertencem ao saltério do Antigo Testamento, hinos tais como o
Magnificat de Lc 1:46–55, o Benedictus de Lc 1:68–

79. Parece também que nas cartas de Paulo se incluem alguns


fragmentos de outros hinos do Novo Testamento (Ef 5:14; Cl 1:15–
20; 1Tm 3:16, e outros talvez).

A palavra canção ou ode (no sentido de um poema escrito para ser


cantado), não só aparece em Ef 5:19 e Cl 3:16, mas também em Ap
5:9; 14:3, onde se fala do “cântico novo”, e em Ap 15:3, onde se faz
referência à canção de Moisés, o servo de Deus, e “a canção do
Cordeiro”. Estes não são salmos do Antigo Testamento. Além disso,
uma canção ou ode não é necessariamente uma canção sagrada.
Neste exemplo, na verdade, o sagrado é indicado pela adição do
adjetivo espirituais.

Resumindo, então, pareceria que quando Paulo usa aqui em Cl 3:16

estes três termos, em alguma medida diferenciando entre eles, o


termo

Colossenses (William Hendriksen)

223
salmos refere-se, pelo menos principalmente, ao saltério do Antigo
Testamento; hinos principalmente às canções do Novo Testamento
que louvam a Deus ou a Cristo; e canções espirituais principalmente
a qualquer outro tipo de canção sagrada que aborda temas que não
estão relacionados com o louvor direto a Deus ou a Cristo. 140

O ponto que não se deve passar por alto é este: que estas canções
devem ser cantadas num espírito de agradecimento. As canções
devem brotar de uma forma sincera, erguendo-se do interior dos
corações humildes e agradecidos dos crentes. Tem-se dito que
depois da própria Escritura um bom hinário que contém salmos é a
fonte mais rica de edificação. Suas canções não são somente uma
fonte de alimentação diária para a igreja, mas também servem como
um meio eficaz para expressar a alegria espiritual, a confissão de
pecados, a gratidão e o êxtase. Quer tenham sido cantados no
serviço regular do Dia do Senhor, no culto entre a semana, em
reuniões sociais, em conexão com o culto familiar, numa ocasião
festiva, ou a sós, sempre são um tônico para a alma e promovem a
glória de Deus. E conseguem isso devido ao fato de que centralizam
o interesse na palavra de Cristo que habita dentro, e afastam a
atenção da cacofonia mundana, pela qual as pessoas de normas
morais baixa se estimulam emocionalmente.

A passagem que estamos estudando, com frequência foi usada para


apoiar esta ou aquela teoria sobre o que se deve ou não se deve
cantar nos cultos oficiais. Talvez seja correto afirmar que o assunto
está justificado se a pessoa ficar satisfeita com alguns princípios
gerais; por exemplo: (1) Não devemos esquecer os salmos em
nossos cultos. (2) Quanto aos hinos, no sentido estrito de canções
de louvor, segundo Carlos E. Erdman: «Provavelmente é correto
que a grande maioria deveriam ser ‘hinos’ no sentido estrito da
palavra. Devem dirigir-se a Deus. Há muitos que são subjetivos, por
não dizer sentimentais, e só 140 Cf., Trench, op. cit. , párr. LXXVIII.

Colossenses (William Hendriksen)

224
expressam as experiências e aspirações pessoais que muitas vezes
faltam de realidade” ( op. cit. , p. 97).

Além do mais, seria bom lembrar que Paulo não tem como

propósito estabelecer regras detalhadas quanto à liturgia


eclesiástica. Seu interesse é mostrar aos colossenses e a todos
aqueles que leriam sua carta como poderão crescer na graça e
manifestar devidamente o poder da palavra que habita neles.
Portanto, sua exortação bem pode aplicar-se a qualquer tipo de
reunião cristã, seja no domingo ou durante a semana, seja no
templo ou na casa ou em qualquer lugar. 141

17. Esta bela passagem é resumida e levada a culminação por meio


de um princípio fundamental para a vida e conduta cristãs, ou seja,
E

tudo o que fizerdes seja por palavra ou por ato, (fazei) tudo142
em nome do Senhor Jesus, dando graças a Deus o Pai por meio
dele.

Para a expressão “tudo o que fizerdes”, cf. o v. 23 e 1Co 10:31. Em


conexão fazei “tudo em nome do Senhor Jesus”, deve notar-se que
o nome aponta ao próprio Senhor Jesus como Ele Se revelou. 143
“Em nome” significa, portanto, «numa relação vital com Ele», isto é,
em harmonia com Sua vontade revelada, em sujeição à Sua
autoridade e em dependência do Seu poder. A cláusula “dando
graças a Deus o Pai por meio dele” (para o que cf. de forma
especial Ef 5:20; e também Jo 14:6; 15:5b; Rm 1:8; 7:25; 16:27; 1Co
1:20) entende-se à luz do fato de que é com base na expiação do
Filho que os pecadores são aceitos pelo Pai, e que (“juntos com
ele”) recebem toda bênção. Portanto, é totalmente justo e válido que
as graças devem ser dadas ao Pai através dEle.

141 É claro pelas seguintes referências que a igreja antiga deu às


palavras e ensino de Paulo sobre este tema a ampla aplicação da
qual falamos: Clemente de Alexandria, The Instructor II.4; Tertuliano,
Apologia, cap. 39; To his Wife II.8.
142 Duas coisas devemos dizer quanto à sintaxe do original: com
toda probabilidade π_ν deve ser considerado um nominativo
absoluto, substituído mais adiante por πάντα que é um acusativo
que se considera como o objeto direto de um verbo tácito. O verbo
subentendido é ποιε_τε, considerado como um presente imperativo.

143 Para a devida prova, veja-se C.N.T. sobre Fp 2:11, nota 98.

Colossenses (William Hendriksen)

225

Não nos devem escapar os ensinos principais deste último

parágrafo. A meu ver, os princípios são os seguintes:

(1) “Tudo o que fizerdes” é uma expressão muito geral. Em


contraste com as muitas regulações e regras específicas que os
falsos mestres estavam procurando impor sobre os colossenses (Cl
2:16–23), Paulo simplesmente declara um princípio amplo, e permite
aos crentes que o compreendam por si mesmos em perfeita
liberdade. Afinal, o filho de Deus da nova dispensação não está sob
um jugo. Que o Espírito que habita dentro o guie.

(2) O Espírito (e portanto, o crente em quem habita o Espírito) opera


com relação à palavra, isto é, com a revelação (“o nome”) do Senhor
Jesus. O homem é “livre” só quando permanece em Cristo.

Portanto, sempre se deve perguntar: “Que farei Senhor?” (At 22:10).

Que estude a Escritura de forma diligente e com muita oração. É


nesta forma que devemos entender o ponto (1).

(3) Em conexão com cada palavra e obra que realizar, o crente deve
perguntar-se a si mesmo: «Posso dar graças a Deus o Pai por me
haver dado a oportunidade de dizer ou fazer isso?» (Cf. F.F. Bruce,
op. cit. , p.

286).
(4) Deve-se reconhecer alegremente a soberania ou preeminência
que o Senhor Jesus tem com relação a todo o universo e todos os
seus acontecimentos e com o próprio crente. Por isso também o
crente deve fazer tudo “em nome do Senhor Jesus”.

Notamos, pois, que esta passagem termina da mesma forma que a


anterior (Cl 3:11), a saber, com uma lembrança do tema de toda a
epístola: Cristo, o preeminente, o único e todo-suficiente Salvador.

No entanto, para que possam oferecer uma forte oposição às forças


do mal, eles não devem concentrar-se no mal. Que o vício seja
conquistado pela virtude. Que o bem conquiste ao mal. Portanto,
havendo aceito a Cristo como seu Salvador e Senhor, agora devem
tornar-se imitadores dEle, de tal forma que todas as suas
maravilhosas virtudes — um coração compassivo, a bondade, a
humildade, e

Colossenses (William Hendriksen)

226

sobretudo o amor — também sejam vistos neles. Assim eles serão


reunidos numa forte unidade espiritual. Por conseguinte, que a paz
de Cristo habite em seus corações. Que a Sua palavra também
esteja entre eles, para que em toda sabedoria possam exortar-se e
ensinar-se uns aos outros. Que estejam tão cheios de alegria e
gratidão que possam derramar seus corações em júbilo, cantando
não apenas os salmos do

“doce cantor de Israel”, mas também hinos de louvor e outras


canções espirituais.

Resumo de Colossenses 3:1–17

Se os colossenses aceitarem os conselhos que Paulo lhes está


oferecendo aqui, não só ganharão vitória sobre vitória em sua
batalha contra “a carne” (veja-se Cl 2:23; 3:5–9), mas também
poderão viver vidas úteis para a edificação da igreja e o benefício de
seus próximos, tudo para a glória de Deus. Portanto, sejam
coerentes. Tendo sido

“ressuscitados com Cristo”, devem buscar as coisas de cima, não as


que estão sobre a terra, porque suas vidas (e esta parte da epístola
tem que ver com a vida dos crentes) “estão escondidas com Cristo
em Deus”. Foi o céu que lhes deu nascimento, uma vez que
nasceram do alto. Seus nomes estão escritos nos registros do céu.
Seus direitos estão assegurados no céu. Seus interesses estão
sendo promovidos ali.

Portanto, pelo fato de que pertencem ao céu, que suas vidas sejam
governadas de acordo com normas celestiais, que seus
pensamentos e orações subam até lá, e que suas esperanças
anelem até lá. Que tratem de obter para si mesmos aqueles dons
celestiais mencionados nos vv. 12–

17. E pelo fato de que Cristo “neles” é “a esperança da glória” (Cl


1:27), também tem que ser certo que quando Cristo (quem é) “nossa
vida” seja manifestado, então eles também “serão manifestados
com ele em glória”.

Portanto, requer-se um rompimento radical com os vícios passados.

De fato devem “fazer morrer”. Devem «abandoná-los» uma vez por


todas. Pelo fato de que no batismo os colossenses repudiaram

Colossenses (William Hendriksen)

227

publicamente o velho homem com suas práticas pecaminosas e se


vestiram do novo homem, devem, então, continuar na prática o que
já fizeram em princípio. O Criador deste novo homem os capacitará
para obtê-lo. E isto se aplica a todos os crentes verdadeiros. Aqui
desaparecem todas as distinções de classe completamente, porque
Cristo é “tudo e em todos”.
No entanto, para que possam oferecer uma forte oposição às forças
do mal, não devem concentrar-se no mal. Que o vício seja
conquistado pela virtude. Que o bem conquiste ao mal. Portanto,
havendo aceito a Cristo como seu Salvador e Senhor, agora devem
tornar-ser imitadores dEle, de tal forma que todas as suas
maravilhosas virtudes — um coração compassivo, a bondade, a
humildade, e sobretudo o amor —

também sejam vistos neles. Assim eles serão reunidos numa forte
unidade espiritual. Por conseguinte, que a paz de Cristo habite em
seus corações. Que Sua palavra também esteja entre eles, para que
em toda sabedoria possam exortar-se e ensinar-se uns aos outros.
Que estejam tão cheios de alegria e gratidão que possam derramar
seus corações em júbilo, cantando não apenas os salmos do “doce
cantor de Israel”, mas também hinos de louvor e outras canções
espirituais.

Paulo termina este parágrafo, não prescrevendo uma coleção de


regras definidas, mas um só princípio básico (o qual é muito
melhor), “e tudo o que fizerdes, seja por palavra ou por ato, (fazei)
tudo em nome do Senhor Jesus, dando graças a Deus o Pai por
meio dele”. Deste modo, como acontece com frequência nesta
carta, Paulo dirige as mentes e corações dos destinatários ao único
e todo-suficiente Salvador Jesus Cristo, e através deste Mediador
soberano a Deus o Pai.

Colossenses (William Hendriksen)

228

COLOSSENSES 3:18 – 4:1

Tema: Cristo, o preeminente, o único e todo-suficiente Salvador II.


Este único e todo-suficiente Salvador é a fonte da vida dos crentes,
e assim a verdadeira resposta aos perigos que enfrentam, capítulos
3e4

B. Esta verdade aplica-se a grupos especiais, Cl 3:18 – 4:1


1. ESPOSAS E SEUS ESPOSOS - CL 3:18, 19

Aqui começa um novo parágrafo. A verdade sublime mas muito


prática que Cristo é o único e todo-suficiente Salvador e, como tal, a
fonte da vida dos crentes, será agora aplicada a grupos especiais.
Paulo está pensando em grupos domésticos. Portanto, o que aqui
temos é uma espécie de “lista de deveres domésticos”. Agora, é
verdade que até nos escritos de moralistas não-cristãos
encontramos códigos de conduta doméstica. 144 No entanto, a ideia
de que Paulo simplesmente copia esses códigos e que lhes dá uma
mão de verniz de cristianismo, meramente acrescentando “em
Cristo”, é totalmente errada. Entre estas diretivas concisas
apresentadas aqui em Colossenses — e também em Ef 5:22–

6:9; 1Tm 2:8–15; 6:1, 2; Tt 2:1–10; 1Pe 2:12–3:7, e as máximas dos


estoicos e outros filósofos moralistas há, na verdade, uma
semelhança superficial às vezes, mas pelo menos há três diferenças
principais: (1) O cristianismo, como Paulo e outros o proclamam,
supre o poder para realizar o que ordena, sendo esse poder a graça
de Deus que é mencionada em conexão com o mesmo assunto no
final da lista em Tito (Tt 2:1–10, e então o v. 11; cf. Fp 4:13). Todos
as outras filosofias morais, mesmo as melhores delas, só são trens
sem locomotiva.

144 Veja-se Seneca, Epistles XV.2; Th.W.N.T., pp. 949–959; 974–


978; e Stobaeus, Anthologies IV.

Colossenses (William Hendriksen)

229

(2) O cristianismo também apresenta um novo propósito. Esse


propósito não era simplesmente «procurar viver em harmonia com a
natureza», mas “fazei tudo para a glória de Deus” (1Co 10:31), isto
é,

“em nome do Senhor Jesus, dando graças a Deus o Pai por meio
dele”, como se estabelece no contexto de Colossenses (Cl 3:17). A
única forma correta de explicar Cl 3:18–4:1 é à luz de Cl 3:17. E
finalmente: (3) O cristianismo, provindo de Cristo, dá o único modelo
para a conduta que glorifica a Deus da parte dos grupos que aqui se
mencionam, ou seja, esposas e seus esposos, filhos e seus pais,
servos e seus senhores. O próprio Cristo, como o noivo, em Seu
incomparável amor por Sua igreja, Sua noiva, proporciona a norma
para o amor do casamento cristão (Ef 5:25, 32).

Cristo deu a todos o melhor exemplo de submissão paciente em


Sua obediência a seus pais (Lc 2:51), na maravilhosa maneira em
que, em meio das torturas do inferno, proveu para Sua mãe terrestre
(Jo 19:25–

27), e de fato em toda Sua vida de obediência ao Seu Pai celestial,


chegando até a morte em que essa obediência culminou (Fp 2:8).
Esse exemplo era, sem dúvida, destinado aos filhos. Também tem
uma lição para os pais (Lc 15:20–24).

Por último, em Sua voluntária humilhação profunda, que mostrou ao


lavar os pés dos discípulos e por Sua morte na cruz, Ele deu uma
lição objetiva para todos, e certamente para senhores e escravos,
como é claramente indicado em Jo 13:13–17.

18. A primeira admoestação é: Esposas, sede submissas ao


vosso esposo, como convém no Senhor. As sufragistas têm dito
que é positivamente mau usar a palavra “obedecer” no contrato
matrimonial.

Têm afirmado com muita intensidade que o serviço matrimonial em


sua

«forma» atual obriga a noiva a fazer um voto que ela não tem a
intenção de cumprir. Um livro de fórmulas eliminou a palavra
«obedecer» de seu formulário matrimonial. No entanto, tudo isto não
«elimina» Cl 3:18!

Além disso, uma pequena investigação mostrará logo que o que


esta passagem ensina é a doutrina coerente da Escritura referente a
este

Colossenses (William Hendriksen)

230

ponto. Veja-se as seguintes passagens: Gn 3:16; Rm 7:2; 1Co


14:34, 35; Ef 5:22–24, 33; 1Tm 2:11–15; Tt 2:5; 1Pe 3:1–6. E a
razão dada aqui em Cl 3:18 é que tal obediência “convém no
Senhor”, estando em harmonia com Sua vontade revelada na
Escritura. Portanto, uma esposa cristã procurará prazerosamente
regular sua conduta em harmonia com este mandamento. E não
começará a pensar que a igualdade em seu estado espiritual diante
de Deus e a grande liberdade que agora possui como crente (Gl
3:28) dá-lhe o direito de esquecer do fato de que em Sua sabedoria
soberana Deus fez o casal humano de tal forma que é natural para o
esposo guiar, e para a esposa seguir; para ele ser agressivo (no
sentido favorável, naturalmente) e para ela ser receptiva; para ele
criar inventos e para ela usar os instrumentos que ele inventa. A
tendência a seguir foi fixada na própria alma de Eva quando saiu
das mãos de seu Criador. Portanto, qualquer tentativa de mudar
esta ordem é desagradável a Deus. Por que deve incitar-se à
mulher a fazer coisas contrárias à sua natureza? Seu próprio corpo,
longe de preceder ao de Adão na ordem da criação, foi tirado do
corpo de Adão. Seu próprio nome — Ish-sha — derivava-se do
nome dele — Ish (Gn 2:23). Só quando a esposa reconhece esta
distinção básica e age de acordo com ela, pode ela ser uma bênção
para seu esposo, e pode exercer uma influência graciosa, muito
poderosa e benéfica sobre ele, e pode promover não só a felicidade
dele, mas também a sua própria.

Em conexão com este mandamento que as esposas sejam


submissas ao próprio esposo, deve fazer notar o seguinte:

(1) O mandamento não implica que a esposa é inferior ao seu


esposo. Nos círculos não-cristãos esposas (de fato, a mulher em
geral) eram consideradas como seres inferiores. Entre os gregos,
apesar de seu alto grau de cultura, as esposas usualmente não
eram consideradas como iguais nem sequer como companheiras de
seu esposo. Os romanos também consideravam suas esposas
como intrinsecamente inferiores.

Filo, um filósofo judeu que foi grandemente influenciado pela


filosofia

Colossenses (William Hendriksen)

231

grega, considerava as mulheres como egoístas, ciumentas e


hipócritas, e os homens casados já não como livres, e sim como
escravos.

A condição da mulher na comunidade de Qumran, a qual nos deu os


Rolos do Mar Morto, não era invejável. Parece que havia grupos
celibatários e não celibatários na seita de Qumran (Veja-se Miller
Burrows, More Light on the Dead Sea Scrolls, pp. 358, 383). «Uma
das diferenças mais notórias entre a igreja e a seita de Qumran …
era a condição totalmente diferente das mulheres nas duas
comunidades» (o mesmo autor, The Dead Sea Scrolls, p. 333; cf.
pp. 233, 244, 291; e também H. Mulder, De vondsten bij de Dode
Zee, p. 35).

O cristianismo mudou tudo isso (Gl 3:28), e ainda o está mudando


entre aqueles que são guiados a aceitá-lo. 145 Jesus fez algumas
de Suas mais surpreendentes revelações a mulheres (Jo 4:13, 14,
21–26; 11:25, 26; 20:11–18). Sobre a dignidade da mulher nas
epístolas de Paulo, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, pp.
132, 133.

(2) Não é absoluto. Se alguma vez um esposo pedir à sua esposa


que faça algo que em sua consciência (iluminada pela Escritura) ela
sabe que está errado, ela tem o direito e a obrigação de
desobedecer ao seu esposo (At 5:29).
(3) Dá-se num contexto de amor, do qual esposas devem ser o
objeto, uma vez que Paulo continua:

19. Esposos, amai146 a vossa esposa, e não sejais grosseiros


com elas.

O melhor comentário é o do próprio Paulo em Ef 5:25–33. Uma


exposição do conteúdo dessa bela passagem não corresponde aqui,
mas 145 Para informação da condição da mulher por centenas de
anos sob o islã, veja-se S. M. Zwemer, Across the World of Islam,
caps. V y VI, especialmente p. 135. E para sua condição fora da
cristandade em geral, veja-se J. S. Dennis, Christian Missions and
Social Progress (3 volumes), especialmente vol. I, pp. 104–125. É
preciso dar crédito, pelo menos em parte, à influência do
cristianismo pelo progresso mais recente quanto ao estado da
mulher.

146 O verbo usado é uma forma de _γαπάω. Paulo usa φιλέω


somente duas vezes (1Co 16:22; Tt 3:15).

O verbo _γαπάω está desalojando o verbo φιλέω, tomando suas


funções e (pelo menos na presente instância) retendo as suas
próprias. Aqui se fala do amor cristão e pleno, amor que está acima
de tudo o mais. Para a relação que existe entre ambos verbos, veja-
se C.N.T. sobre o Evangelho de João, nota 458.

Colossenses (William Hendriksen)

232

ao comentário sobre Efésios. O amor de um esposo para com sua


esposa é sexual, certamente, mas também ultrapassa o sexual. É
afeto natural, mas também é muito mais que isso. É o amor para
com sua esposa como

“uma irmã no Senhor”. Este amor age como uma influência


moderadora sobre o exercício de autoridade da parte do esposo. É
verdade que a responsabilidade primária quanto à decisão final
sobre algum assunto recai sobre o esposo, mas o método pelo qual
se chegue a essa decisão deixa suficiente espaço para a mútua
deliberação e a persuasão amável, no curso da qual, às vezes as
conclusões tentativas do esposo prevaleçam enfim e outras vezes
as da esposa, tendo o esposo chegado a ver que ela tinha a razão.
Deste modo, havendo-se entregue plenamente ao princípio de que
seu amor para com sua esposa deve ser o reflexo do amor profundo
e sacrificial de Cristo por Sua igreja (Ef 5:25, 32), o esposo
comporta-se para com ela como um homem de entendimento, e
nunca é

“grosseiro” ou “de mau gênio” com ela, mas é considerado para com
ela, 147 honrando-a em todas as formas que puder (1Pe 3:7).
Nesse casamento cada um busca o bem do outro (Pv 31:12; 1Co
7:33, 34), e procura promover o bem-estar do outro, e isto não só
física e culturalmente, mas também, e de fato principalmente, no
sentido espiritual. O esposo deve olhar a sua esposa como a
alguém igual no sentido de que ela é “co-herdeira da graça da vida”
(1Pe 3:7). Cf. Gn 24:67 (o amor de Isaque por Rebeca) e Gn 29:20
(o amor de Jacó por Raquel).

147 Lenski tem razão quando afirma, “Este negativo «não sejais
ásperos com elas» é da ordem de um lítotes: sejais sempre
considerados com elas …” ( op. cit. , p. 182).

Colossenses (William Hendriksen)

233

2. FILHOS E SEUS PAIS - CL 3:20, 21

20. Filhos, obedecei a vossos pais em todas as coisas, porque


isto é agradável no Senhor. 148 Esta admoestação está
totalmente de acordo com passagens como Êx 20:12; 21:15–17; Lv
20:9; Dt 5:16; 21:18; Pv 1:8; 6:20; 30:17; Ml. 1:6; Mt 15:4–6; 19:19;
Mc 7:10–13; 10:19; 18:20; Ef 6:1–3. Um dos vícios do paganismo é
a desobediência aos pais (Rm 1:30). Caracteriza a crescente
maldade “dos últimos tempos” (2Tm 3:2).
O engano destruidor da alma que quer abolir toda autoridade
paterna —

a simples palavra “autoridade” é anátema em alguns círculos


educacionais! — de tal forma que as crianças já não precisam dar
ouvidos à instrução de seu pai ou ao ensino de sua mãe, está em
oposição direta ao claro ensino da Escritura, tanto do Antigo como
do Novo Testamento. Os pais crentes não infligem sobre seus filhos
a crueldade de dizer que eles «podem fazer o que quiserem». De
acordo com a Escritura e com a experiência, as crianças não só são
imaturas, mas também têm uma natureza pecaminosa, e são
incapazes por natureza de escolher o que é bom (Sl 51:5). E por
causa disso a exortação na forma encontrada aqui é muito ampla:
exorta-se aos filhos a obedecer a seus pais “em todas as coisas”,
sempre sujeito à limitação de At 5:29, naturalmente.

Tal obediência é “agradável”. Esta palavra é geralmente modificada


pela palavra “a Deus” ou “ao Senhor” (Rm 12:1; 14:18; 2Co 5:9; Ef
5:10; Fp 4:18; cf. Hb 13:21. Certamente podemos considerar que na
presente passagem este modificativo está sugerido. O fato de que
Deus Se agrada com esta obediência é evidente pelo fato de que
Ele mesmo pronunciou uma bênção sobre ela no Decálogo (Êx
20:12; Dt 5:16), à qual se refere o apóstolo na passagem paralela
(Ef 6:2–3). A obediência aos mandamentos de Deus sempre Lhe é
agradável. O fato de que essa obediência é feita “no Senhor”, isto é,
em comunhão com e dependência 148 A leitura que segue, por
exemplo, a RC (1998), “ao Senhor” tem pouco apoio.

Colossenses (William Hendriksen)

234

dEle, é algo que todo filho pode entender, seja ele jovem ou não, se
de coração pode cantar:

Quando andarmos com Deus,

ouvindo Sua voz,


nosso caminho florido será;

Se acatarmos Sua lei,

Ele será nosso rei,

e com Ele reinaremos lá.

Obedecer e confiar em Jesus

é a regra marcada

para andar na luz.

(J. H. Sammis)

21. Uma das características mais sobressalentes destas breves


exortações é seu caráter recíproco. Ao prescrever as relações
domésticas que dão glória a Deus, Paulo não realça o dever das
esposas às custas do dever dos esposos, o dos filhos às custas do
dos pais, ou o dos escravos às custas do dos senhores. Fora da
revelação especial quase não se vê este equilíbrio. Com frequência
o dever do primeiro membro de cada grupo fica sublinhado, e pouco
ou nada se diz quanto ao segundo membro. Na antiguidade, quando
as coisas iam mal, amontoava-se toda a culpa sobre esposas, filhos,
149 e escravos. Mas Paulo, tendo admoestado aos esposos como
também às esposas, e tendo acabado de lembrar aos filhos de suas
obrigações para com seus pais, com toda imparcialidade se dirige
aos pais também: Pais, 150 não irriteis151 a vossos filhos, para
que não se desanimem.

149 Hoje, em países civilizados a culpa é lançada nos pais! Ou à


sociedade, ao meio ambiente.

Merecem estes toda a culpa?

150 Deve admitir-se a possibilidade de que a palavra “pais”


(πατέρες) inclua tanto o pai como a mãe (cf. Hb 11:23). No entanto,
o fato de que no versículo anterior usa-se a palavra mais usual
(λονε_σιν) para inclui-los ambos, pareceria indicar que na presente
passagem a palavra “pais” indica só aos

Colossenses (William Hendriksen)

235

Os pais devem criar uma atmosfera que fará da obediência algo fácil
e natural, quer dizer, uma atmosfera de amor e confiança. Devem
educar os seus filhos na disciplina e instrução do Senhor (Ef 6:4).
152

Quando os pais são injustos ou muito severos, gera-se um espírito


de resignação cheia de ressentimento no coração de seus filhos. Os
filhos se desalentam porque pensam, “não importa o que eu faça,
sempre está errado”. Não se deve exortá-los sempre, nem deve
haver um constante

“não faças isto” e “não faças aquilo”. Embora não se pode e nem se
deve evitar a admoestação negativa (“não faças”), e embora às
vezes está totalmente correta (note-se o repetido “Não …” do
Decálogo, no ensino de Jesus e nas epístolas de Paulo, incluindo
esta passagem!), a ênfase deve ser no positivo (Rm 12:21). Um
bom pai passa tempo com seus filhos, ensina-os, brinca com eles e
os anima, e por seu exemplo como também por instrução direta e
verbal, ele os guia a Cristo. Embora às vezes seja necessária a vara
da correção, deve ser usada com discrição, uma vez que uma
repreensão sábia é geralmente melhor que cem açoites (Pv 13:24;
23:13, 14; então 17:10). A exortação de Paulo de não irritar os filhos
— ou seja, ser amáveis com eles — é totalmente diferente da dada
por Ben Sira: “Aquele que ama a seu filho açoitá-lo-á sem cessar

… dobra sua cerviz enquanto é jovem, e surra suas costelas quando


é criança” (Eclesiástico 30:1, 12 BJ). Quão amigável e paternal!

varões. Embora a responsabilidade pela educação das crianças


pertença a ambos, pai e mãe, e o pai consultará à mãe, é provável
que aqui se considera o pai como a cabeça da família.
151 O verbo usado é _ρεθιζετε, que significa agitar. A pessoa pode
agitar para bem (2Co 9:2) ou para mal (como aqui em Cl 3:21). No
último caso a ideia resultante é exasperar, amargurar. Na presente
passagem também existe considerável apoio textual para o
sinônimo, παροργίζετε, provocar a ira. Há muito pouca diferença de
significado entre ambas as palavras. Talvez o último verbo foi
enxertado neste texto por analogia com Ef 6:4.

152 Para uma discussão de 15 pontos sobre os Princípios e


métodos de educação em Israel, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo
e Tito, pp. 334–337.

Colossenses (William Hendriksen)

236

3. ESCRAVOS E SEUS SENHORES - CL 3:22 – 4:1

Cf. A Escritura sobre a escravidão no apêndice.

22. Escravos, obedecei em tudo aos que segundo a carne são


vossos senhores.… Em nenhuma parte da Escritura afirma-se que
a escravidão em si mesma é uma ordenança divina, como o
casamento (Gn 2:18, 24), a família (Gn 1:27, 28), o sábado (Gn 2:3),
e o governo humano (Gn 9:6; Rm 13:1). Em e por si mesmo não
agrada ao Senhor que um homem seja o dono de outro. Além disso,
o fato de que Paulo se dirige aos escravos e aos seus senhores
com base em igualdade é significativo e implica sua igualdade
espiritual diante de Deus.

O mundo romano estava cheio de escravos. Calculou-se que só em


Roma num tempo quase a terça parte dos habitantes pertencia a
esta classe social. Tinham chegado a ser escravos por ser
prisioneiros de guerra, ou sentenciados, devedores, sequestrados,
ou por compra, ou por ter nascido de escravos.

Paulo não aconselhou rebelião aberta por escravos contra seus


senhores. Ao contrário, tomou a estrutura social tal como a
encontrou e procurou mudá-la por meios pacíficos. O princípio
paulino pode resumir-se desta forma: «Que o escravo obedeça ao
seu senhor de todo coração, e que o senhor seja bondoso com o
escravo». Assim, a má vontade, desonestidade e preguiça do
escravo seria substituída por serviço alegre, integridade e diligência;
e a crueldade e brutalidade do senhor pela consideração e amor.
Desta forma, uma sociedade nova e gloriosamente transformada
substituiria a antiga.

O material paulino que trata com este problema pode-se encontrar


principalmente em: Ef 6:5–9; Cl 3:22–4:1; 1Tm 6:1, 2; e Tt 2:9, 10.

Pode-se comparar com isso o que Pedro diz em 1Pe 2:18–25.


Destes cinco pequenos parágrafos, só os dois primeiros mencionam
os deveres recíprocos dos escravos e seus senhores. Uma das
razões por que se presta mais atenção aos escravos que aos
senhores poderia bem ser que entre os destinatários havia muitos
mais dos primeiros que dos últimos

Colossenses (William Hendriksen)

237

(veja-se 1Co 1:26). E a razão mais provável de por quê em


Colossenses o apóstolo presta mais atenção a escravos e seus
senhores que a esposas e seus esposos, e filhos e seus pais
combinados, fizemo-lo notar na Introdução IV A 4 (Onésimo e seu
senhor Filemom).

Agora, quando Paulo instrui os escravos a obedecer a seus


senhores

“em tudo”, provavelmente quer dizer, «não só em coisas que lhes


pareçam agradáveis e prazenteiras, mas também nas
desagradáveis e pouco prazenteiras». Ele não poderia ter querido
dizer: «em absolutamente todas as coisas» (veja-se At 5:29). Como
o afirma Paulo em outra parte, mediante essa obediência eles
“adornariam a doutrina de Deus nosso Salvador” (Tt 2:10). A
expressão “os que segundo a carne”

— ou seja, aqueles que de acordo com relações terrenas153 —


“são vossos senhores” dá a entender “vosso verdadeiro senhor está
no céu”, um pensamento que Paulo exporá mais adiante.

Agora, esta obediência deve ser não servindo à vista como os


que querem agradar aos homens, mas com coração sincero,
temendo ao Senhor. Não devem obedecer só «para que o senhor o
veja», por razões egoístas. Em lugar de procurar agradar aos
homens, com o fim de tirar proveito para eles mesmos, devem servir
aos seus senhores terrestres

“com coração sincero” isto é, com uma mente íntegra, ou seja, com
sinceridade e retidão (cf. 1Cr 29:17). Ao fazê-lo assim estarão
mostrando reverência ao Senhor.

23, 24. Tudo o que fizerdes (cf. v. 17), ponde vossa alma no
trabalho (literalmente, “trabalhem com a alma”), como para o
Senhor e não para os homens.… Em espírito, a pessoa deixa de
ser escrava logo que começa a trabalhar para o Senhor, e já não
mais para os homens em primeiro lugar. Como resultado, este era o
conselho mais proveitoso que se podia dar a um escravo. Além
disso, mediante a cooperação sincera com seu senhor, obedecendo
em todas as formas, e fazendo isso enquanto seu 153 Para os
vários significados da palavra carne, veja-se C.N.T. sobre Fp 1:22,
nota 55. Aqui corresponde o significado c.

Colossenses (William Hendriksen)

238

senhor está completamente informado que o serviço era dado por


um cristão, o escravo estaria promovendo a causa e a honra de seu
Senhor. O
senhor começaria a pensar: «Se a religião cristã faz isso pelos
escravos, deve ser maravilhosa». Paulo continua, sabendo que do
Senhor recebereis a recompensa, ou seja, a herança. Embora o
escravo recebesse de seu senhor terrestre muito menos do que
deveria receber, contudo sabe que receberá de seu Senhor celestial
tudo o que foi destinado para ele pela graça de Deus. 154

Embora a salvação seja completamente “pela graça” e


definitivamente não “por obras” (Ef 2:8, 9; Tt 3:5), não obstante, esta
recompensa de vida eterna será dada “segundo as obras” (2Co
5:10; Ap 20:12, 13; também Ec 12:14; 1Co 3:10–15; 4:5; Gl 6:7).
Além disso, a recompensa é “a herança”, provavelmente sugerindo
as seguintes ideias: a. é uma dádiva (uma pessoa não ganha uma
herança), b. é inalienável (1Rs 21:3; Hb 9:15), c. foi legada ao que a
recebe, e assim é sua por direito (cf. Is 1:27); e implica a morte do
testador (Hb 9:16).

Como regra, os escravos não são herdeiros (Gn 15:3; Rm 8:15–17;


Gl 4:7). Mas os escravos aos quais Paulo se refere aqui, sim,
herdam, porque seu senhor é Cristo: (É) o Senhor Cristo (a quem)
vós servis. 155

154 A palavra traduzida recompensa é o acusativo de _νταπόδοσις,


e só aparece aqui em todo o Novo Testamento. Neste caso a
preposição _ντί dá a ideia de devolução completa e total. O
substantivo _νταπόδομα significa retribuição, usada em certo
sentido favorável em Lc 14:12; em certo sentido adverso em Rm
11:9. O verbo da mesma raiz _νταποδίδωμι, que se usa em sentido
favorável (Lc 14:14; Rm 11:35; 1Ts 3:9); e em sentido adverso (Rm
12:19; 2Ts 1:6; Hb 10:30), tem o significado primário de devolver
totalmente algo recebido anteriormente. Veja-se minha tese para o
doutorado,

“The Meaning of the Preposition _ντί in the New Testament”,


Biblioteca do Seminário Princeton, N.J., pp. 83, 84.

155 Alguns preferem traduzir esta frase como imperativa, “servi ao


Senhor Cristo”, dando em razão que, a não ser assim, a palavra
“porque”, que introduz o v. 25, carece de significado. Mas quer a
gente traduza o verbo como imperativo ou indicativo, em ambos os
casos é necessário suprir uma ideia para poder obter uma conexão
lógica razoável. Este é um exemplo de “expressão abreviada”. Veja-
se C.N.T. sobre Jo 5:31. Além disso, a diferença é insignificante,
uma vez que em cada caso Paulo deseja lembrar-lhes a estes
escravos que eles realmente estão servindo não a um senhor
terreno, mas primeiro que tudo e sobretudo a um Senhor celestial, e
de que essa deve ser sua atitude. “Sabendo que”

anterior parece assinalar aqui ao indicativo. Assim também RC


(1998) e B.J.

Colossenses (William Hendriksen)

239

Portanto, que sempre vivam «como sob vigilância» de seu Senhor!


Para a expressão “o Senhor Cristo”, veja-se Rm 16:18. Estas são as
únicas duas vezes que aparece no Novo Testamento. O Senhor
ungido é o padrão do escravo. Que privilégio e honra!

25. Paulo continua: Porque, dando a entender talvez, «devereis


obedecer estas instruções, porque» aquele que faz o mal sofrerá
(as consequências de) o que fez de mal. E não há parcialidade.
Segundo Ridderbos, estas palavras só se referem ao senhor do
escravo. E o significado é que, embora o escravo às vezes tenha
que sofrer alguma injustiça da parte de seu senhor, esse senhor não
ficará impune ( op. cit. , p. 230). Por outro lado, Lenski a limita só ao
escravo, «o mal permanece sobre os ombros do escravo, e o levará
até o juízo». Ele observa que

«não se menciona os senhores senão mais adiante» ( op. cit. , p.


185). A opinião que tem Lightfoot difere de ambos. Ele diz: «É
melhor supor que ambos estão incluídos» ( op. cit. , p. 229). Eu
creio que esta última posição é a melhor. A razão que tenho é que
em Ef 6:8 se expressa uma ideia quase paralela, só que aí se fala
daquele que faz o bem (em lugar do que faz o mal, como em Cl
3:25), num contexto onde definitivamente menciona-se que a
afirmação concerne aos dois, escravo e livre. A oração de Efésios é
como segue: “… sabendo que o bem que cada um fizer, esse
receberá do Senhor, seja servo ou seja livre”. Comentando sobre Cl
3:25, Lightfoot diz: «A advertência surge do caso do escravo, mas
se estende ‘no próximo versículo, Cl 4:1’ ao caso do senhor».

Se o escravo não der ouvidos às admoestações que foram dadas,


colherá o que semeou. Que nenhuma pessoa da igreja de Colossos
pense que pelo fato de que Paulo procedeu tão bondosamente com
Onésimo, também aprovava o que este fez ao seu senhor. A regra é
universal (Gl 6:7). Aplica-se a cada escravo, sem importar quem é.
E ainda se aplica a cada senhor. Com Deus não há parcialidade (Lv
19:15; Ml. 2:9; At

Colossenses (William Hendriksen)

240

10:34; Ef 6:9; Tg 2:1); literalmente, “não recebimento de cara” (daí,

“acepção de pessoas”). 156

4:1. Por meio de uma suave transição, segue a última exortação


desta lista de deveres domésticos: Senhores, 157 dai a vossos
escravos o que é justo e reto, sabendo que vós também tendes
um Senhor no céu.

Traduzido de forma literal, a primeira parte diria «Senhores, aquilo


que é justo e aquilo que é reto, 158 concedam aos escravos». Os
senhores devem lembrar que eles também têm um Senhor. O
centurião elogiado o entendeu assim (Mt 8:5–13, em especial v. 9).
Mas o servo desumano da parábola de Mt 18:23–35 não o
entendeu. Assim que os senhores devem notar que como os
escravos são responsáveis para com eles, por sua vez eles terão
que responder ao Senhor no céu. Se entenderem esta verdade, não
tratarão asperamente os seus escravos. Terão que “deixar as
ameaças” (Ef 6:9), e em lugar disso mostrar a mesma consideração
para com seus escravos que eles esperam receber dAquele que
exerce autoridade sobre eles. Por conseguinte, o que aqui temos é
a aplicação da regra áurea (Mt 7:12) nas relações entre senhor e
escravo.

O resumo das admoestações destinadas a grupos separados


termina mencionando o todo-suficiente, ao preeminente Senhor, “o
Senhor Cristo” (cf. Cl 4:1 com 3:24), porque Ele é a fonte da vida
dos crentes, Aquele que está disposto a capacitar cada crente, a
qualquer grupo que pertença, a viver para a glória de Deus.

156 Moule tem um interessante parágrafo sobre a palavra grega


traduzida parcialidade ( op. cit. , p.

132).

157 No original, os vocativos esposas, esposos, filhos, pais,


escravos, senhores (Cl 3:18–4:1) estão precedidos em cada caso
pelo artigo genérico, um uso bastante comum (Gram. N.T., p. 757).

158 Não é verdade que _σότης sempre deve traduzir-se por aquilo
que é igual ou igualdade. Há casos em que esta palavra usa-se no
sentido de reto em outros autores (veja-se M.M., p. 307). Usada em
conexão com a palavra justiça (ou “aquilo que é justo”), é natural
que tomemos ambas as palavras como sinônimos e usar o modismo
“honesto em tudo” (ou algo semelhante) na tradução.

Colossenses (William Hendriksen)

241

Resumo de Colossenses 3:22 – 4:1

O Cristo todo-suficiente é também a fonte de vida para os grupos


domésticos. Eles também devem obter sua inspiração dEle, uma
vez que é dEle que recebem o poder para fazer o que é próprio e
justo, o propósito de fazer tudo em nome do Senhor, e o modelo de
obediência.
No presente parágrafo diz às esposas que sejam submissas a seu
esposo; aos esposos que amem a sua esposa; depois, que os filhos
obedeçam a seus pais; e que os pais sejam amorosos para com
seus crianças; e finalmente, que os escravos obedeçam a seus
senhores, “não servindo à vista como os que querem agradar aos
homens, mas com coração sincero, temendo ao Senhor”; e que os
senhores façam ao seu escravos o que é justo e reto, lembrando
que eles (os senhores) também têm um Senhor no céu.

Por causa de seu caráter recíproco — admoestações dirigidas não


só às esposas, mas também aos esposos, não só aos filhos, mas
também aos pais, não só aos escravos, mas também aos senhores
— estas exortações são eminentemente justas. Que o conselho
dado em cada caso é justo, evidencia-se claramente por seu
conteúdo. Ordena-se às esposas que façam o que está em
harmonia com a maneira como foram criadas.

Não se diz aos filhos que façam o que quiserem — o que seria
conselho cruel —, mas obedeçam àqueles que mais os amam e que
estão mais qualificados para saber o que é o melhor para eles.
Mostra aos escravos o único caminho para a liberdade verdadeira
espiritual, ou seja, que lembrem em meio de todos os seus trabalhos
que realmente estão trabalhando “para o Senhor”. O mesmo se
aplica às outras classes mencionadas: esposos, pais e senhores.

Estas admoestações foram dirigidas evidentemente a grupos


domésticos de crentes. O que ocorre quando o esposo ou a esposa
ou o senhor não é crente? Qual é a regra em tal caso para o esposo
ou a esposa ou o escravo? A Escritura não nos deixou na escuridão
quanto a

Colossenses (William Hendriksen)

242

esta pergunta. Veja-se At 5:29; 1Co 7:12–16; 1Tm 6:1 (cf. o v. 2); Tt
2:9, 10; 1Pe 2:18–21; 3:1, 2.
Colossenses (William Hendriksen)

243

COLOSSENSES 4:2-18

Tema: Cristo, o preeminente, o único e todo-suficiente Salvador II.


Este único e todo-suficiente Salvador é a fonte da vida dos crentes,
e assim a verdadeira resposta aos perigos que enfrentam, capítulos
3e4

C. Exortações finais, saudações, etc. Cl 4:2–18

1. CHAMADO À ORAÇÃO - CL 4:2–4

2. Devido ao fato de que Paulo está se aproximando ao final da


carta, agora coloca algumas exortações de caráter geral, como em
Cl 3:1–17, pondo ênfase no positivo, cf. Cl 3:12–17. Não é
surpreendente que, tendo falado da palavra (Cl 3:16), agora enfatiza
a importância da

oração, porque a palavra e a oração vão juntas: na primeira o


Senhor nos fala a nós, e na segunda nós nos dirigimos a Ele. Paulo
diz: Perseverai na oração. A oração é a expressão mais importante
da nova vida. Ela é o meio pelo qual podemos obter para nós e para
outros a satisfação das necessidades, tanto físicas como espirituais.
Também é a arma divinamente estabelecida para rebater os
sinistros ataques do diabo e seus anjos, o veículo pelo qual
confessamos nossos pecados, e o instrumento pelo qual as almas
agradecidas expressam sua espontânea adoração diante do trono
de Deus. Por conseguinte, admoesta-se a perseverar na oração. Cf.
At 1:14; Rm 12:12; Ef 6:18. Isto está em harmonia com o ensino de
Jesus, no qual exortava os Seus discípulos a perseverar na oração
e a não desanimar quando não é imediatamente respondida uma
petição (At 18:1–8). Paulo acrescenta, vigiando nela.

Esta exortação a permanecer totalmente acordados na oração nos


lembra Mt 26:41; Mc 14:38; Lc 22:40, 46. Não obstante, nestas
passagens dos

Colossenses (William Hendriksen)

244

Evangelhos a vigília a que se faz referência deve ser tomada muito


mais literalmente, como os contextos respectivos o indicam. O que
Paulo tem em mente é que, enquanto continua em oração, o
adorador deverá ter consciência de certas coisas como: a. suas
próprias necessidades e as da família, a igreja, o país, o mundo, b.
os perigos que ameaçam a comunidade cristã, c. as bênçãos
recebidas e prometidas, e (último em lugar mas não em importância)
d. a vontade de Deus. Cf. At 20:31; 1Co 16:13; 1Ts 5:6; 1Pe 5:8; Ap
3:2, 3. Os antigos cristãos cunharam do verbo grego que expressa a
necessidade de estar vigilante, uma forma de grēgoréō (estou
acordado, permaneço alerta), um de seus nomes favoritos:
Gregório.

Agora, quando a pessoa está profunda e humildemente consciente


das bênçãos recebidas e prometidas, expressará sua gratidão a
Deus. Pelo que, Paulo continua: com ação de graças. Cf. Ef 5:20;
6:18; Fp 4:6; 1Ts 5:18; e cf. acima sobre Cl 3:15, 17. É notável que
Paulo encaixa suas exortações a grupos particulares (Cl 3:18–4:1)
entre duas lembranças a dar graças a Deus (Cl 2:17 e 4:2), como se
quisesse dizer: «Esposas, esposos, filhos, pais, escravos, senhores,
obedecei estas instruções espontaneamente, movidos pela gratidão
por todas as bênçãos que receberam».

Deve ter-se em mente que o homem que escreve estas coisas está
na prisão. No entanto, este prisioneiro pode dar graças a Deus até
por suas cadeias (Fp 1:12–14). Sem dúvida, com base na ideia
expressa tão maravilhosamente em Rm 8:28, o crente pode dar
graças por qualquer coisa que lhe aconteça.

3, 4. Deviam ser incluídas nestas orações as necessidades de Paulo


e seus companheiros. Como resultado, o apóstolo continua, orando
ao mesmo tempo também por nós. 159 Como Daniel antes dele
(Dn 2:18), e provavelmente também Ester (Et 4:6), Paulo sentiu a
necessidade de ser 159 Não é necessário supor um plural literário
ou epistolário aqui, como tampouco em 1Ts 2:18; 3:1.

Veja-se C.N.T. sobre estas passagens.

Colossenses (William Hendriksen)

245

lembrado nas orações. Além disso, também Timóteo (Cl 1:1) e


Epafras (Cl 4:12) deviam ser lembrados, e sem dúvida também os
mencionados em Cl 4:10, 11, 14. Esta não é a única ocasião em que
o apóstolo pede para ser lembrado em oração. Veja-se acima, sobre
Cl 1:9, as colunas paralelas. Veja-se especialmente Ef 6:18–20.
Esta passagem de Efésios deve sempre ter-se em mente na
interpretação de Cl 4:2–4. “Irmãos, orai por nós” (1Ts 5:25) era a
constante petição de Paulo. Quando ele insiste isso com seus
colaboradores e companheiros crentes, tem algo bem definido em
mente. Portanto, afirmando o resultado que se espera da oração, e
usando uma frase idiomática que deve ter sido parte da fala comum
desse então, 160 da mesma forma que hoje é uma metáfora entre
nós, Paulo continua: para que Deus nos abra uma porta para a
mensagem. Uma porta, naquele então como agora, é uma
oportunidade para entrar, um meio de acesso ou abordagem.

No presente contexto significa uma abertura para a palavra ou a


mensagem. Cf. 1Co 16:9; 2Co 2:12; Ap 3:8. Agora, o apóstolo não
queria dizer: Orem para que por meio de meu libertação do cárcere
possa outra vez pregar a mensagem de salvação. De maneira
nenhuma!

O que ele queria era que se abrisse uma porta ali mesmo e agora!

Passagens como At 28:30, 31 mostram que esta não era uma


petição absurda, como se fosse impossível para um prisioneiro ter
uma porta aberta. E se for objetado que esta liberdade que se
pressupõe não continuou necessariamente, e que antes de sua
libertação o apóstolo foi transferido de sua “casa alugada” ao quartel
dos soldados, ou que de alguma outra forma foi colocado sob mais
estrita vigilância, a resposta é que até essa severidade aumentada
não poderia tirar completamente a porta aberta, o que se indica
claramente em Fp 1:12–18. Como se indica ali, de certo ponto de
vista a aparente desvantagem era realmente uma vantagem, uma
vez que as cadeias de Paulo mostraram claramente que sua religião
não era só para quando tudo ia bem, mas era algo muitíssimo 160
A. Deissmann, op.cit. , p. 300, nota 2.

Colossenses (William Hendriksen)

246

mais precioso e real. No entanto, falando humanamente, as


circunstâncias poderiam mudar facilmente. Quando Paulo pediu a
oração, estaria pensando, talvez, numa convocação ao tribunal
romano para uma audiência, provavelmente não a primeira? Está
dizendo, com efeito: «Ó colossenses, orem que quando formos
chamados a prestar contas diante das autoridades, possamos falar
muito livremente e que nossa mensagem possa também penetrar
nos corações dos que ouvirem»? Além disso, o testificar aberta e
claramente diante de todo tipo de auditório e sob todas as
circunstâncias, não é fácil. Assim que, este homem de Deus, que
em certo sentido já tinha uma porta aberta, não é incoerente quando
pede que orem para que possa (a toda hora e em qualquer
circunstância) ter uma porta aberta. Esta explicação também está
em harmonia com a passagem paralela de Ef 6:19, e com a que
vem a seguir imediatamente aqui em Colossenses, ou seja, para
dar a conhecer o mistério referente a Cristo. 161 O conteúdo
deste mistério é o próprio Cristo como a fonte de salvação plena e
gratuita, tanto para gentios como para judeus, já não um segredo
escondido, mas agora (Ó

paradoxo glorioso!) um segredo revelado totalmente, e não só


revelado, mas também plenamente realizado nos corações e vidas
de pessoas de toda classe, condição e nacionalidade. Veja-se mais
sobre Cl 1:26, 27 e sobre Cl 2:2, acima. Paulo continua: por causa
do qual estou na prisão, portanto tenho mais necessidade de ser
lembrado por vós em vossas orações (cf. Cl 1:24). Das muitas
referências em que se indica claramente que os judeus, cheios de
fúria porque Paulo pregava o evangelho a judeus e a gentios sem
fazer distinções, tinham-no acusado diante das autoridades civis (At
18:12, 13; 21:18; 22:21–30; 23:26–30; 24:1–9; 25:1, 2, 6, 7; 26:19–
21, 32), segue-se que Paulo estava sob cadeias e custodiado por
pregar este mistério — e especialmente por sua revelação aos
gentios!

161 Ou simplesmente, “o mistério, ou seja, Cristo”. Veja-se C.N.T.


sobre 1Tm 3:16. Em todo caso, Cristo é o coração e a essência do
mistério.

Colossenses (William Hendriksen)

247

Paulo deseja ser lembrado em oração por duas razões: a. para que
possa continuar proclamando o precioso conteúdo do mistério,
como já se indicou, e b. para que o faça da maneira correta. Quanto
ao ponto b., diz: (orando para que eu possa fazê-lo claro, (e
possa falar) como devo falar. Quando uma boa mensagem é
proclamada de maneira má, pode fazer mais dano que bem. Com
que frequência aqueles que, por ter falhado em levar em conta esta
verdade, e apesar de sua inocência fossem encarcerados ou de
outra forma incomodados, pioraram as coisas tanto para eles como
para a causa que estão defendendo. Quando Paulo pede que orem
por ele para que não caia neste erro, mas que fale como deve fazê-
lo, provavelmente tinha em mente alguns ou todos os seguintes
particulares: a. orem para que possa falar claramente (“para que
possa fazê-lo claro”), b. corajosamente, isto é, sem medo nem
restrições (“dizendo-o tudo”, veja-se Ef 6:19 _ν παρρησί_), c. mas
também com graça (veja-se o contexto, Cl 4:6a), e d. sabiamente,
para que possa saber com exatidão como abordar o assunto
quando for interrogado por grupos ou indivíduos de diferentes
antecedentes: os que me visitam na prisão, soldados que me
custodiam, e as autoridades romanas diante das quais posso ser
convocado.

2. ÊNFASE NUMA CONDUTA SÁBIA E NUM FALAR CHEIO DE


GRAÇA

- CL 4:5–6

5. Agora Paulo lhes admoesta a seguir um modo de vida


semelhante. No espírito dos princípios que o próprio Paulo adotou
para si e em conexão com o que acabava de pedir aos colossenses,
que orassem por ele e seus companheiros (veja-se vs. 3 e 4), diz:
Portai-vos sabiamente para com os de fora. Para o judeu todo
aquele que não era judeu era um “de fora”. E para o cristão, todo
não-cristão é, em certo sentido, um “de fora”. Veja-se 1Co 5:12, 13;
1Ts 4:12; 1Tm 3:7. Nos dias da igreja primitiva, os crentes foram
caluniados por estes “de fora”.

Por exemplo, eram chamados ateus porque não serviam a deuses

Colossenses (William Hendriksen)

248

visíveis, antipatrióticos porque não queimavam incenso diante da


imagem do imperador, e imorais porque, pela necessidade, com
frequência reuniam-se a portas fechadas. Paulo sabia que a melhor
forma de frustrar estas calúnias era que os cristãos se conduzissem,
não só virtuosamente em lugar de iniquamente, mas também
sabiamente em vez de bobamente. Veja-se o apêndice sobre A
Escritura sobre o tato. Como foi nesse então, também o é agora: a
longo prazo a reputação do evangelho dependerá da conduta de
seus seguidores. É como se o apóstolo estivesse dizendo: «Portem-
se sabiamente para com os de fora, sempre lembrando que embora
sejam poucos os homens que leem os rolos sagrados, todos os
homens leem vocês».
Mas tal conduta sábia, que os crentes usam os melhores meios para
atracar ao fim mais elevado, não só serve como uma poderosa arma
contra a difamação e o assassinato do caráter, mas também serve
para algo positivo, ou seja, para ganhar outros para Cristo. Paulo
estava totalmente consciente de que a melhor forma de pregar o
evangelho, de modo que seja aceito, era viver de tal forma que os
pagãos pudessem dizer: «Olhem como se amam uns aos outros, e
apesar de tudo o que dissemos contra eles, ainda nos amam e nos
tratam com carinho, devolvendo bem por mal». É claro que Paulo
tinha este propósito em mente pelo fato de que acrescenta: tirando
o máximo proveito da oportunidade. Se o particípio usado no
original reteve toda sua força etimológica, o apóstolo estaria dizendo
literalmente, «… comprando a oportunidade». O sentido seria,
então, «não vos senteis esperando que a oportunidade se
apresente, mas saí e buscai-a. Sim, adquiri-a». «Comprai todo o
sortido e a existência de oportunidade» (Moule, op. cit. , p. 134).

«Não levem em conta o custo. Vale a pena ganhar uma alma para
Cristo (cf. Pv 11:30; Rm 11:14), e também a própria salvação» (Mt
13:44, 45).

Mas em todo caso, o mínimo significado é: «Aproveitai cada


oportunidade para ser uma bênção para os demais».

Uma ideia que, embora não se expressa aqui, muito bem poderia ter
estado como pano de fundo disso, é: os dias são maus e se apressa
à

Colossenses (William Hendriksen)

249

grande consumação de todas as coisas. “A noite está passando; e o


dia está perto”. Assim que, tirem o máximo proveito da oportunidade
enquanto a têm. Cf. Rm 13:11, 12; 1Co 7:29; Gl 6:9, 10; e
especialmente Ef 5:16.
6. Cf. Cl 3:8, 9, 16. Paulo pediu aos colossenses que orem para que
sua forma de falar seja a melhor (veja-se acima, v. 4). De modo que,
tendo dado um exemplo, por assim dizer, agora os exorta a que eles
também usem cuidadosamente sua língua: Que vossa palavra
sempre seja com graça … Note-se bem, sempre, isto é, tanto ao
dirigir-se a um grupo como a um vizinho, tanto quando conversarem
com um igual como ao responder a alguma autoridade, a ricos e a
pobres igualmente, não só ao proclamar a mensagem de salvação,
mas também ao falar de como está o tempo. Quando a linguagem
cheia de graça for um costume para eles, não usarão uma
linguagem imprópria quando forem confrontados de repente com
uma situação difícil; por exemplo, ao serem convocados a
comparecer diante de um juiz mundano ou ao serem perseguidos
pela fé.

Mas o que é “palavra com graça”? Esta mesma expressão era


usada pelos não-cristãos do tempo de Paulo. No entanto, o que
significava para eles era uma conversação brilhante, um discurso
cheio de observações agudas e hábeis. Mas quando Paulo usa o
termo, refere-se a uma linguagem que é o resultado da obra da
graça de Deus no coração.

Negativamente, tal linguagem não será abusiva (Rm 1:29–32; 2Co.


2:20; Gl 5:19–21, 26; Ef 4:31; Tt 3:2). Tampouco será vingativa. Terá
como modelo o exemplo de Cristo, quem “quando o amaldiçoavam,
não respondia com maldição” (1Pe 2:23). E positivamente, será
veraz e cheia de amor. Talvez a melhor descrição da linguagem
cheia de graça encontra-se nas palavras do próprio Paulo: “Falando
a verdade em amor”

(Ef 4:15), e o melhor exemplo está nas palavras de Jesus: “Pai,


perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23:34).

Uma descrição adicional desta classe de linguagem com graça é:


temperada com sal. Aqueles a quem o Senhor chama “o sal da
terra” (Mt

Colossenses (William Hendriksen)


250

5:13; Mc 9:49, 50; Lc 14:34, 35), não devem ser desanimados ou


insípidos em seu falar. O sal impede a corrupção. É muito difícil crer
que esta ideia não estava na mente de Paulo quando escrevia estas
palavras, uma vez que numa passagem paralela diz: “Nenhuma
palavra

corrompida saia de vossa boca, mas sim a que seja boa para a
edificação, conforme seja a necessidade, a fim de comunicar graça
aos ouvintes” (Ef 4:29). Mas o sal não só tem poderes preservativos,
também tem sabor e tempero. Portanto, a palavra temperada com
sal não é vazia ou insípida, mas tem mérito e estimula a pensar.
Não é uma perda de tempo.

Também, não é uma linguagem que repugna. Atrai e tem encanto


espiritual. Por conseguinte: um cristão é conhecido por sua fala
assim como por sua conduta.

Agora, em suas conversações os cristãos não só devem ter em


mente a ocasião particular que evoca suas observações, mas
também devem estar atentos à pessoa a quem se dirigem. Por isso,
o apóstolo continua: para que saibais como responder a cada
indivíduo. Em outras palavras, devem expressar a palavra
apropriada no tempo apropriado à pessoa apropriada. Isto nos
lembra a passagem de 1Pe 3:15, 16:

“santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando


sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir
razão da esperança que há em vós, fazendo-o, todavia, com
mansidão e temor”. O

Espírito Santo mesmo os ajudará a fazer isto. Assim que não têm
por que temer (Mt 10:19, 20; Mc 13:11). Cristo lhes dará palavra e
sabedoria (Lc 21:14, 15).

Colossenses (William Hendriksen)


251

3. RECOMENDAÇÃO PARA TÍQUICO E ONÉSIMO, QUE FORAM


ENVIADOS

DE ROMA COM NOTÍCIAS E PALAVRAS DE ALENTO - CL 4:7–9

7, 8. Todos os meus assuntos Tíquico vos informará. Tíquico162


era um dos amigos íntimos de Paulo e um mensageiro muito
valioso. Ele era oriundo da Ásia, e tinha acompanhado o apóstolo
quando, ao finalizar a terceira viagem missionária, este voltava da
Grécia através da Macedônia e logo cruzava a Ásia Menor e daí a
Jerusalém, trazendo a ajuda arrecadada (At 20:4); quer dizer, nessa
viagem Tíquico se adiantou a Paulo no trecho da Macedônia a
Trôade, e o tinha esperado nessa cidade. E agora, uns quatro anos
depois, tendo passado algum tempo com Paulo em Roma durante
seu primeiro cativeiro, tinha sido comissionado por Paulo para levar
até seu destino, não só a Epístola aos Colossenses, como se vê em
Cl 4:7, 8, e a Epístola a Filemom (como o indica uma comparação
entre Cl 4:9 e Fm 1, 8–22), mas também a carta que nos chegou
como a Epístola aos Efésios (veja-se Ef 6:21, 22, que é quase
idêntico com Cl 4:7, 8). A descrição que Paulo faz de Tíquico como
irmão amado e fiel ministro e conservo no Senhor é quase
idêntica à de Epafras (embora não na ordem das palavras). Há uma
identidade essencial. Veja-se, pois, sobre Cl 1:7. As razões pelas
quais se recomenda tão altamente a Tíquico também são muito
semelhantes às dadas no caso de Epafras. É muito razoável que
Tíquico, tendo passado algum tempo com Paulo e sendo um
homem de mente e juízo sãos, seria a pessoa apropriada para
comunicar toda a informação necessária a respeito de Paulo, seus
companheiros e os irmãos crentes de Roma.

Além disso, o papel não era tão abundante e barato como o é hoje,
as circunstâncias nas quais o já “ancião” prisioneiro (veja-se Fm 9)
devia ditar suas cartas não eram totalmente favoráveis, e algumas
coisas são 162 Para o significado do nome veja-se C.N.T. sobre Fp
2:25, nota 116, onde se oferece uma explicação de muitos outros
nomes pessoais. Para mais sobre Tíquico, por exemplo, seu
relacionamento com Paulo depois do primeiro encarceramento do
apóstolo, veja-se C.N.T. sobre Tt 3:12 e sobre 2Tm 4:12.

Colossenses (William Hendriksen)

252

melhores se forem ditas que se forem escritas; assim que, por estas
e outras razões semelhantes, Paulo continua: a quem estou
enviando163 a vós com este preciso objetivo, que saibais
nossas circunstâncias. 164 Mas não só isso, mas também, e para
que fortaleça vossos corações, provavelmente acalmando vossos
temores (cf. Fp 1:12–14), e pela entrega desta carta, e, em geral,
suprindo verbalmente a “atmosfera” de consolação e fortalecimento
espiritual que se baseia nas promessas de Deus.

9. Paulo continua: (Está) acompanhado por Onésimo, fiel e


amado irmão, que é um de vós. Eles vos informarão de todo (o
que aconteceu) aqui.

Não é necessário repetir o que se diz sobre Onésimo na Introdução


IV B e no C.N.T. sobre Filemom (veja-se especialmente vv. 8–22)
neste mesmo livro. Esta enfática recomendação de Onésimo à
igreja inteira era, e não há dúvida de que esse era seu propósito, um
apoio poderoso para o rogo a favor dele, que Paulo dirige a
Filemom, o senhor de Onésimo e membro da igreja de Colossos. É
muito provável que a mesma preservação da carta a Filemom seja,
como o afirmaram muitos comentaristas, uma prova de que a
petição de Paulo teve êxito. Ao chamar Onésimo “o fiel e amado
irmão”, o apóstolo sublinha diante de toda a igreja o v. 16 de sua
carta pessoal a Filemom. Ao permitir que Onésimo esteja ao lado de
Tíquico como um informador a respeito de tudo o que concerne a
Paulo e a igreja em Roma, o apóstolo está dizendo aos
colossenses, incluindo Filemom, que ele considera o homem que
por meio da graça transformadora de Deus agora está vivendo
conforme o significada de seu nome — Onésimo: útil, proveitoso —
totalmente confiável.
163 _πεμψα, aoristo epistolário.

164 Embora a versão, “que ele vossas saiba circunstâncias”, tem o


apoio do manuscrito P46 e outros, deve considerar-se inferior
devido ao contexto (veja-se v. 9b).

Colossenses (William Hendriksen)

253

10 Aristarco, meu companheiro da prisão, vos

saúda; assim também Marcos, o sobrinho de

Barnabé, a respeito do qual recebestes

instruções; se for a vós, recebei-o; 11 e

Jesus, chamado Justo. daqueles que são da

circuncisão, estes são os únicos colaboradores

para o reino de Deus que me foram um

consolo. 12 Epafras, quem é um de vós, 23 Epafras, meu


companheiro de servo de Cristo Jesus, vos saúda, lutando prisão
em Cristo Jesus, vos sempre por vós em suas orações, para que
saúda, 24 (e assim também) possais estar firmes, amadurecidos e
inteiramente Marcos, Aristarco, Demas assegurados em toda a
vontade de Deus. 13 Porque e Lucas, meus colaboradores.

posso testificar dele que ficou com muita

tristeza por vós e por aqueles que estão em

Laodiceia e em Hierápolis. 14 Lucas, o médico

amado, cumprimenta-vos, e assim também Demas.


15 Saudai aos irmãos em Laodiceia, e a Ninfa

e à igreja que está em sua casa.

Cl 4:10–15 Filemom 23, 24

4. SAUDAÇÕES - CL 4:10–15

Esta seção de Colossenses pode ser dividida em duas partes: a. vv.


10–14, nos quais enviam saudações três companheiros de Paulo de
origem judaica — Aristarco, Marcos, e Jesus Justo — e três gentios
de nascimento — Epafras, Lucas e Demas; e

b. v. 15, no qual o apóstolo pede aos colossenses que estendam a


saudação aos “irmãos em Laodiceia, e a Ninfa e à igreja que está
em sua casa”.

Um olhar às colunas paralelas, revelará o seguinte:

(1) Dado principalmente que na passagem de Colossenses Paulo


amplifica quanto a Marcos, àqueles “que são da circuncisão” e a
Epafras, esta passagem é muito mais longa que a outra lista de
saudações em Filemom.

Colossenses (William Hendriksen)

254

(2) Em Colossenses seis homens enviam saudações, mas em

Filemom apenas cinco. Na carta mais breve não se menciona a


Jesus Justo. Não sabemos por que foi omitido seu nome. Também é
diferente a ordem em que estão colocados os nomes. A lista de
Colossenses menciona Aristarco, Marcos, Jesus Justo, Epafras,
Lucas, e Demas nesta sequência. Mas em Filemom a ordem é:
Epafras, Marcos, Aristarco, Demas e Lucas.

Se tomarmos os nomes um por um, na ordem em que são


mencionados em Colossenses, começamos com:

Aristarco

10a. Aristarco, meu companheiro de prisão, vos saúda. O lugar


de nascimento deste homem, ou pelo menos o lugar com o qual é
relacionado principalmente, era Tessalônica. Durante o longo
ministério de Paulo em Éfeso (terceira viagem missionária, viajando
para fora), esteve com o apóstolo, e tendo sido reconhecido pelos
alvoroçadores de Éfeso como um dos companheiros de Paulo, ele,
com outro homem da Macedônia (Gaio) foi agarrado impulsivamente
pelo povo (At 19:20).

Mais adiante, o encontramos outra vez acompanhando a Paulo de


volta desta mesma viagem. De fato no mesmo versículo (At 20:4)
menciona-se a Tíquico, “da Ásia” (veja-se acima, v. 7) e a Aristarco
e Segundo como companheiros de viagem de Paulo. Esta foi a
viagem em que delegados de várias igrejas de origem
predominantemente gentílica, levavam ajuda aos necessitados de
Jerusalém. Encontramos Aristarco outra vez no princípio da Viagem
Perigosa de Paulo (At 27:2). Partiu com Paulo e provavelmente o
acompanhou durante toda a viagem até Roma (Não há nenhuma
evidencia para a ideia de Lightfoot de que Aristarco desembarcasse
em Mira). Agora envia saudações de Roma aos colossenses como a
Filemom.

Um olhar às colunas paralelas acima indica uma característica


notável que requer um pouco de atenção. Em Colossenses Aristarco
é

Colossenses (William Hendriksen)

255

chamado “meu companheiro de prisão”, mas em Filemom não se


acrescenta esta descrição. É chamado junto com outros: “Meu
colaborador” (Fm 1). Ao contrário, em Filemom é Epafras aquele
que é descrito como “meu companheiro de prisão em Cristo Jesus”,
mas em Colossenses, embora se diga muito acerca de Epafras, ele
não é designado especificamente dessa forma. Destas
circunstâncias e do fato de que Aristarco não estava “sob prisão”
quando Paulo como prisioneiro entre outros prisioneiros
empreendeu sua viagem para Roma, e pelo fato de que Epafras
também um pouco mais tarde foi enviado como um homem livre a
Roma, a inferência justificada que se tirou é que quando Paulo
chama companheiros de prisão a Aristarco aqui em Cl 4:10, e a
Epafras em Fm 23, as palavras não devem ser tomadas em certo
sentido estritamente literal. É bem possível que se tivessem
oferecido para compartilhar o encarceramento de Paulo para assisti-
lo em tudo o que fosse possível. Eles devem ter estado alegres de
fazê-lo, uma vez que tanto eles como Paulo eram cativos do cortejo
triunfal de Cristo (2Co 2:14; cf. 10:5). 165

Marcos

10b. Assim também Marcos, o sobrinho de Barnabé.

Marcos, a quem reconhecemos como o escritor do segundo

Evangelho, também estava acompanhando a Paulo em Roma neste


tempo, e como companheiro envia saudações aos colossenses e a
165 O significado básico de συναιχμάλωτος é um captado pela
lança; daí um cativo de guerra, ou simplesmente um cativo ou
preso. Veja-se C.N.T. sobre 2Tm 3:6. Portanto, é correto dizer que
συναιχμάλωτος significa companheiro da prisão. Uma vez que o
apóstolo era prisioneiro no sentido literal da palavra, é difícil crer que
ao falar de “companheiros da prisão” ele estava usando o termo em
certo sentido exclusivamente espiritual, embora deva admitir-se que
não somente em 2Co 2:14

mas também em outros lugares o apóstolo emprega terminologia


militar ao falar do serviço prestado à causa de Cristo (Fp 2:25; Fm 2;
2Tm 2:3). O uso paulino da palavra cativo ou prisioneiro, até ao
empregá-lo em sentido literal, muitas vezes tem alusão espiritual.
Asi, quando se refere a si mesmo como “prisioneiro”, acrescenta “de
Cristo Jesus”. Portanto, podemos supor que também aqui a palavra
“companheiro de prisão” tenha alusão espiritual.

Colossenses (William Hendriksen)

256

Filemom. Agora nos inteiramos que era sobrinho de Barnabé. Esta


pôde ter sido a razão do por quê doze anos antes Barnabé o
tratasse com tanta bondade. Isto ocorreu depois que Marcos, na
primeira viagem missionária de Paulo, tinha desertado de seus
companheiros de mais idade e tinha ido para casa. Por causa deste
ato de deslealdade e covardia, Paulo recusou aceitar a sugestão de
Barnabé, ou seja, de que se desse a Marcos outra oportunidade,
permitindo ir com eles na segunda viagem missionária (At 15:36–
41). Havia um “desacordo grande” entre Paulo e Barnabé sobre este
assunto. Mas agora parece que Marcos tinha mudado. O apóstolo já
não o considera como um risco, mas o recomenda calorosamente, e
até o inclui entre aqueles que foram um consolo para ele (veja-se
sobre o v. 11). Além disso, esta atitude favorável continuou, uma vez
que até na última carta de Paulo que nos chegou o apóstolo diz:

“Marcos, … é-me muito útil para (o) ministério” (2Tm 4:11).

Que meios ou fatores terá usado o Espírito Santo para realizar esta
mudança favorável na vida de João Marcos? Certamente usou um
ou mais dos que a seguir apresentamos:

a. “A bondosa tutela de Barnabé, aquele verdadeiro ‘filho da


consolação’ ”. Não se deveu inteiramente a isso, mas «sem dúvida
em grande medida» (F.F. Bruce, op. cit. , p. 305).

b. A severa disciplina de Paulo, mostrada em sua negativa em levar


Marcos consigo na segunda viagem. Talvez Marcos necessitava
precisamente esta aparente dureza.

c. A influência de Pedro, que chama Marcos “meu filho” (1Pe 5:13).


Uma tradição antiga une estes dois homens. Pedro sabia por
experiência que havia esperança para aqueles que tinham caído
nos pecados de deslealdade e covardia.

O Espírito Santo bem poderia ter usado todos estes fatores e outros
mais para levar a cabo Sua maravilhosa obra na vida e na
consciência

«do homem que voltou».

Paulo continua: a respeito do qual recebestes instruções; se for


a vós, recebei-o.

Colossenses (William Hendriksen)

257

Do que se tratavam essas instruções e quem as tinha dado, não o


sabemos. Ou foi o próprio Paulo (neste caso estaria sublinhando o
que já disse sobre Marcos), ou Barnabé, Pedro, ou alguma outra
pessoa que tinha autoridade, em tal caso o apóstolo apoia as
instruções anteriores. A primeira alternativa parecesse a mais
provável. Em todo caso, nesses momentos Marcos se encontrava
perto de Paulo, e estava também preparado para empreender uma
viagem à Ásia Menor, tendo em seu itinerário Colossos. O apóstolo
requer um caloroso “recebei-o” para ele.

Não há razão para duvidar que Marcos fizesse esta viagem, embora
não haja nenhum relato específico deste fato. Não obstante, existem
duas linhas de evidência que relacionam a Marcos com as igrejas
da região da Ásia Menor nos tempos apostólicos:

a. Sabemos que Pedro estava intimamente associado com as


igrejas desta região, porque escreveu sua primeira epístola a eles
(1Pe 1:1, 2).

Talvez a segunda também? Cf. 2Pe 3:1. E em sua carta se enviam


saudações da parte de Marcos a estas igrejas (1 P. 5:13).
b. Também sabemos que durante o segundo encarceramento de
Paulo em Roma, Marcos estava num lugar onde Timóteo facilmente
o podia encontrar, quem nesse tempo estava com toda
probabilidade trabalhando em Éfeso, província da Ásia”. Veja-se
C.N.T. sobre 1 e 2

Timóteo e Tito, p. 53, 362.

Jesus Justo

11.… e Jesus, chamado Justo, daqueles que são da


circuncisão, estes são os únicos colaboradores para o reino de
Deus que me foram um consolo. 166

166 Embora nem todos esejam de acordo com relação à pontuação


e a construção gramatical corretas do v. 11b, é claro que a palavra
circuncisão não termina a frase. O sentido não é: “Aristarco, Marcos
e Jesus Justo, aqueles que são da circuncisão; estes são os únicos
colaboradores para o reino de Deus”, etc. Paulo não quer negar que
homens como Epafras, Lucas e outros eram também colaboradores
que lhe foram um consolo. A ideia é que dentre aqueles de origem
judaica somente estes três eram os colaboradores que lhe tinham
sido consolo.

Colossenses (William Hendriksen)

258

O nome deste judeu que se tinha convertido é uma combinação do


equivalente grego (Jesus) de Josué ou Yeshua, e um segundo nome
latino (Justus), que significando “o justo” ou “aquele que age
corretamente”, pode ter sido tomado por aqueles que eram de
origem judaica como representando o hebreu Zadoque (1Rs 1:32);
cf. também Zedequias (Jr 1:3, “Jeová é justo” ou “a justiça é de
Jeová”). O mesmo sobrenome latino encontramo-lo em At 1:23,
“José, chamado Barsabás, que tinha por apelido Justo”, um judeu
cristão, e em At 18:7, “Tito Justo”, um romano que tinha sido atraído
até a sinagoga. O nome Justo era muito comum entre os judeus e
não judeus, e era usado como nome ou apelido.

Não temos mais informação autêntica sobre este homem (que não
se menciona em Filemom) que a dada aqui em Cl 4:11. Mas o
pouco que se diz a respeito dele é muito favorável; une-se a outros
para enviar saudações aos crentes da igreja de Colossos. Somos
informados que dos judeus cristãos, as três pessoas que se acabam
de mencionar — ou seja, Aristarco, Marcos, e Jesus Justo —167
eram os únicos colegas de trabalho que tinham sido de consolo para
Paulo — o sentido de “consolo” é aquele que prepondera aqui na
palavra παρηγορία. Para a expressão

“colaboradores”, veja-se sobre Fm 1. Observe-se o modificativo


extraordinário que vem depois de colaboradores: “colaboradores
para o reino de Deus”. Terá modificado Paulo o termo para dar a
entender «Eu deveria ter recebido mais ajuda da parte dos judeus,
especialmente porque eles fazem tanta ênfase no reino»? Além
disso, não tinha pregado 167 A combinação “Aristarco … e Marcos
… e Jesus, chamado Justo” (vv. 10, 11) indica-nos, na minha
opinião, que os três eram cristãos de origem judaica. Embora se
acrescentem alguns modificadores, os três são mencionados ao
mesmo tempo, numa só oração (“assim também … y”).

Portanto, não posso estar de acordo com A.S. Peake, quem, ao


comentar esta passagem no Expositor’s Greek Testament (vol. III, p.
546), diz: “provavelmente não se inclui Aristarco, porque ele era
membro da comissão enviada pelos cristãos gentios com a oferta
para a igreja em Jerusalém”; tampouco com Lenski quem defende a
mesma opinião ainda mais vigorosamente: “(Aristarco) era
tessalonicense, e portanto não judeu”. At 17:1–4 sugere que entre
os convertidos em Tessalônica havia alguns judeus também.

Colossenses (William Hendriksen)

259
“o reino de Deus” entre eles desde o momento de sua chegada a
Roma?

Veja-se At 28:31. Nessa passagem e também aqui em Cl 4:11 o


termo

“reino de Deus” refere-se obviamente ao reino divino como uma


realidade presente. A expressão indica a dispensação da salvação
que em seu estado presente começou com a vinda de Cristo. Deus
está usando Paulo e outros como instrumentos para estabelecer
Seu reinado nos corações dos homens. Cf. sobre Cl 1:13.

Não nos deve escapar que a afirmação do apóstolo com referência


a estes três homens como os únicos colaboradores cristãos judeus
que lhe tinham sido de consolo infere sua profunda desilusão com a
gente de sua própria raça. Paulo estava penosamente consciente do
afastamento entre ele e seu próprio povo (Rm 9:1–5). E não era
insensível ao fato de que os judaizantes (judeus que confessavam a
Jesus, mas que superestimavam a lei) olhavam-no com suspeita (At
15:1, 2, 24; 21:20, 21; Gl 2:12; Fp 3:2). Não é incorreto considerar
Fp 1:14–17; 2:20, 21; 2Tm 4:16 como passagens que arrojam mais
luz sobre os sentimentos do apóstolo a respeito deste assunto.
Quanto apreciaria, então a ajuda de Aristarco, Marcos e Jesus
Justo!

Epafras

12–13. Às saudações de três judeus cristãos, Paulo agora


acrescenta saudações de três cristãos gentios, ou seja, Epafras,
Lucas e Demas. Os versículos 12 e 13 têm que ver com Epafras, o
evangelista de Colossos, Laodiceia e Hierápolis. Até certo ponto já
se deu a interpretação destes versículos. Com relação a este irmão
e a alta estima que tinha Paulo por ele, veja-se Introdução III A 1: cf.
sobre Cl 1:7. Em sua qualidade de

“companheiro de prisão” (Fm 23), já falamos de Epafras em


conexão com Aristarco (veja-se acima sobre o v. 10a). Quanto às
três cidades que se mencionam no v. 13, veja-se a Introdução II e
III. Paulo escreve: Epafras, que é um de vós, servo de Cristo
Jesus, vos saúda. No sentido espiritual Paulo usa a palavra doulos
(servo) só com referência a si

Colossenses (William Hendriksen)

260

mesmo (Rm 1:1; Gl 1:10; Fp 1:1; Tt 1:1), Timóteo (Fp 1:1) e Epafras
(aqui em Cl 4:12). Um servo de Cristo Jesus é alguém que foi
comprado por preço e, portanto, pertence ao seu Senhor, de quem
depende completamente, a quem deve total fidelidade, e a quem
serve com alegria de coração, em novidade de espírito e no desfrute
de perfeita liberdade (Rm 6:18, 22; 7:6), recebendo dEle a gloriosa
recompensa (Cl 3:24).

Todo cristão verdadeiro é em certo sentido tal servo. Veja-se C.N.T.

sobre Fp 1:1 para mais informação sobre este conceito. Epafras


envia suas «melhores lembranças» à igreja de Colossos e a
Filemom.

Paulo continua: lutando sempre por vós em suas orações. Para

“lutando” ou “esforçando-se” em oração, veja-se Rm 15:30, e cf. o


que o apóstolo diz a respeito de si mesmo em Cl 2:1. Epafras fazia
isso com toda seriedade, quando vez após vez invocava o favor de
Deus sobre os colossenses e implorava ao Senhor que os ajudasse
de tal forma que não se desviariam, mas estivessem firmes na
verdadeira fé. Além disso, para que possais estar firmes,
amadurecidos. Para o significado da palavra

“amadurecidos”, veja-se acima sobre Cl 1:28; também C.N.T. sobre


Fp 3:15 (especialmente nota 156).

Quando Paulo especifica mais o objeto ou o resultado contemplado


da oração de Epafras, acrescentando, e inteiramente assegurados
em toda a vontade de Deus, ele está usando o particípio perfeito
“inteiramente assegurados” no sentido do substantivo cognitivo em
Cl 2:2 (veja-se ali).

A ideia que se quer dar é a de um entendimento completo, rico e


satisfatório a respeito de todas as coisas espirituais; um
entendimento que não só penetra a mente, mas também enche o
coração com uma grata certeza. Epafras não quer que estas igrejas
que tanto ama sejam desviadas pelo erro. Devem permanecer fiéis
à sua confissão de fé no todo-suficiente Salvador Jesus Cristo. Por
isso é que ele luta em oração por eles.

E a melhor explicação das palavras que se seguem é justamente


este lutar em oração: Porque posso testificar dele que ficou com
muita tristeza por vós e por aqueles que estão em Laodiceia e
em Hierápolis. Não há

Colossenses (William Hendriksen)

261

dúvida que a heresia de Colossos tinha afetado as três igrejas que


Epafras tinha fundado. Portanto, ele vai ao trono da graça numa
fervente e repetida intercessão por causa do perigo que ameaçava
os irmãos. 168

Lucas

14a. Lucas, o médico amado, vos saúda.

Ao fazer uma comparação com o v. 11 vemos que Lucas era um


cristão dos gentios. A presente passagem nos ensina que nesse
tempo ele estava em Roma, que era médico e uma pessoa de uma
personalidade muito amável, sendo amado pelo Senhor, pelos
crentes em geral e especificamente por Paulo. Lucas chegou a ser o
escritor do terceiro Evangelho. Note-se que tanto ele como Marcos,
o escritor do segundo Evangelho, estavam juntos em Roma. Não
nos surpreende, pois, que, apesar da longa argumentação contrária,
os eruditos conservadores estão chegando cada vez mais à
conclusão de que Lucas usou o Evangelho de Marcos como uma de
suas fontes para escrever o seu. 169

Lucas era uma pessoa notável, sempre fiel a Paulo, ao evangelho e


a seu Senhor. Acompanhou com frequência a Paulo em suas
viagens, como o indica o “nós” de algumas seções de Atos (At
16:10–17; 20:6–

16; 21; 27; 28). Esteve com Paulo em sua segunda viagem
missionária, ou seja, em Trôade e Filipos. É evidente que foi deixado
em Filipos (At 16:17–19). Mas parece que ao terminar a terceira
viagem, uniu-se outra vez a Paulo no mesmo lugar (At 20:6),
acompanhando-o até Jerusalém.

Depois o perdemos de vista por um tempo. Mas de repente aparece


outra 168 Esta explicação harmoniza com o contexto. Outra
interpretação, sugerida por exemplo por E. F.

Scott, The Epistles of Paul to the Colossians, to Philemon and to the


Ephesians, p. 90, relaciona a

“tristeza” de Epafras com o terremoto que sacudiu o vale do Lico no


ano 60 d.C. Veja-se Introdução II B. Segundo esta teoria, Paulo quer
dizer que Epafras esteve muito ocupado em reunir recursos para os
danificados. No entanto, não há dados exatos sobre esse terremoto,
nem com relação a sua data nem sobre sua extensão. Se Paulo
tivesse querido fazer referência ao terremoto, ele teria em termos
mais claros.

169 Cf. Zahn, Einleitung, II, pp. 404ss; H.J. Cadbury, The Style and
Literacy Method of Luke, pp. 73ss; e N.B. Stonehouse, Origins of the
Synoptic Gospels, p. 49.

Colossenses (William Hendriksen)

262
vez, uma vez que é um dos que acompanham a Paulo na longa e
perigosa viagem por mar para Roma (At 27). E agora envia
saudações aos colossenses e a Filemom desde Roma durante o
primeiro cativeiro de Paulo. Mais adiante, o apóstolo, durante seu
segundo e último cativeiro, escreveria estas comovedoras palavras:
“Lucas é o único que está comigo” (2Tm 4:11a). E isto seria seguido
por: “Toma contigo Marcos e traze-o, …”.

Lucas e Paulo tinham muito em comum. Ambos eram homens

educados, homens de cultura. Ambos tinham um grande coração,


eram tolerantes e cheios de simpatia. Ambos foram crentes e
missionários.

Demas

14b.… e assim também Demas.

Sim, Demas também é um colega de trabalho (Fm 24), um dos


colaboradores de Paulo no ministério que deseja ser lembrado à
igreja de Colossos e a Filemom. Paulo ainda não sabe que este
homem algum dia seria um desengano profundo para ele, e que
mais adiante, em seu segundo cativeiro em Roma, escreveria com
relação a este ajudante no ministério do evangelho as seguintes
palavras de dor: “Demas, tendo amado o presente século, me
abandonou e se foi para Tessalônica” (2Tm 4:10). E com essa
trágica declaração Demas desaparece da história sagrada.

15. Tendo terminado a seção na qual seis homens — três de


nascimento judaico e três de nascimento gentio — enviam suas
saudações aos colossenses, o apóstolo pede que também se
entreguem algumas saudações aos crentes vizinhos. Sua petição é:
Saudai aos irmãos em Laodiceia, e a Ninfa e à igreja que está
em sua casa. 170

170 Ou, “e a Ninfo e à igreja que está em sua casa (dele)”. Os


manuscritos variam entre Ninfas (feminino) e Ninfo (masculino), e
alguns têm até “a casa deles”. Este último deve-se provavelmente a
um erro de algum copista. Quanto a isto de sua (feminino) ou seu
(masculino), parece que o primeiro tem mais apoio. Além disso,
seria muito fácil para um copiador mudar o feminino em masculino,
não considerando-o apropriado falar da casa dela”. Parece, pois,
que a versão “e a Ninfas e à igreja que

Colossenses (William Hendriksen)

263

Observe-se que Hierápolis (veja-se sobre o v. 13) já não se


menciona. Simplesmente não sabemos a razão disso. O apóstolo
quer que os destinatários entreguem estes saudações aos irmãos
na vizinha Laodiceia. Para o aspecto geográfico destas três cidades
(Colossos, Laodiceia e Hierápolis), em sua relação de uma com a
outra e em sua relação a Éfeso, e também quanto à sua história,
veja-se a Introdução II A (incluindo mapas 1, 2, 3) e II B. Quanto à
Laodiceia, Paulo envia saudações especiais a Ninfa e à igreja em
sua casa. 171 Terá conhecido a Ninfa pessoalmente? É possível
que um grupo que vivia perto de Laodiceia, mas separado por uma
distância inconveniente dos demais, se reunisse em seu lar para
adorar. Assim se enviam saudações especiais a eles e à irmã que
lhes oferece hospitalidade. Para o conceito de igreja-casa, veja-se
Fm 2.

5. PEDE-SE UM INTERCÂMBIO DE CARTAS - CL 4:16

16. E quando esta carta for lida entre vós. A carta, depois de ter
sido entregue por Tíquico às autoridades eclesiásticas competentes
em Colossos, seria lida à congregação reunida para adorar. Agora,
quando isto tiver acontecido, diz Paulo, procurai que também seja
lida na igreja dos laodicenses. Os irmãos da próxima Laodiceia
não só estariam interessados pela carta que vinha do amado
apóstolo Paulo, mas também seriam beneficiados espiritualmente
por ela. Assim que também devia ser lida em seu meio. Até aqui não
há problemas. Mas agora o apóstolo continua: e que vós leiais
também a de Laodiceia. Uma grande quantidade está em sua
casa” deve ter a preferência. Quanto aos nomes, Ninfas e Ninfo,
veja-se C.N.T. sobre Fp 2:25, nota 116.

171 F.W. Beare, em sua exposição sobre esta passagem (em The
Interpreter’s Bible, vol. 11, p. 239), opina que era a igreja em
Hierápolis que se reunia na casa de Ninfas. Mas, ao considerar o
que lemos em Rm 16:23, escrito de Corinto (veja-se Rm 16:1, 23; cf.
1 Cor. 1:14), e em 1Co 16:19, escrito de Éfeso (1Co 16:8), parece
mais natural que a igreja seja de uma comunidade particular e não
de outro lugar no mapa, quando se mencionam uma igreja numa
casa e o proprietário juntos.

Colossenses (William Hendriksen)

264

de literatura se acumulou ao redor destas poucas palavras. E se tem


feito um sem-número de conjeturas a respeito desta “carta de
Laodiceia”. 172

As principais são as seguintes. Paulo se referiu a:

(1) Uma carta escrita pelos laodicenses.

Segundo a maioria dos defensores desta teoria, a carta dirigia-se ao


próprio apóstolo.

Esta teoria foi defendida fortemente pelo Teodoro de Mopsuéstia


(350–428 d.C.), representante clássico da escola de Antioquia. A
defesa de João Calvino não era menos vigorosa. Calvino afirma:
«Afetados por uma dupla aberração mental estão aqueles que
pensam que foi escrita por Paulo aos laodicenses. Não tenho
dúvidas de que foi uma carta enviada ao apóstolo Paulo, a leitura
cuidadosa da qual poderia trazer proveito aos colossenses, uma vez
que as cidades vizinhas geralmente têm muitas coisas em comum.
Não obstante, alguma pessoa desprezível, não sei quem pode ser,
inventou uma epístola tão insípida que é impossível conceber algo
que seja mais estranho ao espírito de Paulo”. 173
Não há dúvida que Calvino esteve influenciado por seu desejo
veemente de rejeitar a falsa Epístola aos Laodicenses; e talvez por
sua hesitação a aceitar uma epístola paulina “perdida”.

Entre as muitas objeções à teoria número (1), estão as seguintes: a.


Se Paulo tinha em seu poder esta carta, por que pede aos
colossenses que a consigam dos laodicenses?

b. Como soube ele que os laodicenses tinham feito uma cópia de


sua carta antes de enviá-la a Paulo? E no caso de terem feito tal
cópia, como sabia Paulo que eles estariam dispostos a entregá-la
aos colossenses e lhes permitir lê-la na igreja reunida para o culto?

172 Veja-se a lista de teorias que apresenta Lightfoot, op. cit. , p.


274, como também suas observações a respeito.

173 acha-se a afirmação de Calvino em seu Commentarius In


Epistolam Pauli Ad Colosenses ( Corpus Reformatorum, vol. LXXX),
Brunsvigae, 1895. Defende-se o mesmo ponto de vista na nota
marginal que corresponde a Cl 4:16 na Bíblia holandesa, Staten
Bijbel (possuo um exemplar publicado em 1643).

Colossenses (William Hendriksen)

265

c. Por que colocaria Paulo as duas ao mesmo nível: uma carta


escrita por ele mesmo aos colossenses sob a inspiração do Espírito
Santo, e uma comunicação não inspirada enviada a ele pelos
laodicenses?

(2) Uma carta escrita por Paulo desde Laodiceia; talvez Gálatas ou
1 Timóteo ou 1 Tessalonicenses ou 2 Tessalonicenses.

Objeções:

a. Embora Paulo muito bem poderia ter passado por Laodiceia


(veja-se Introdução III A), quer dizer, a caminho para Éfeso (terceira
viagem missionária), o propósito da viagem era confirmar as igrejas
já estabelecidas ao longo da rota da viagem, e chegar depois a
Éfeso para passar algum tempo ali, como o tinha prometido.
Durante a viagem haveria pouco ou nenhum tempo para escrever
cartas.

b. Com toda probabilidade nenhuma das cartas às quais se faz


referência foi escrita desde Laodiceia. Gálatas e 1 e 2
Tessalonicenses parecem ter sido escritas de Corinto (C.N.T. sobre
1 e 2 Tessalonicenses, pp. 23, 24). 1 Timóteo provavelmente se
originou na Macedônia (Filipos talvez?, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2
Timóteo e Tito, pp. 48–51).

(3) Uma carta escrita por Paulo a Filemom.

Segundo esta teoria Filemom vivia em Laodiceia. E pelo fato de que


esta carta chegaria a Colossos via Laodiceia, pode bem ser
chamada

“a carta de Laodiceia”.

Objeção:

Esta teoria já foi discutida com algum detalhe. Veja-se a Introdução


IV B; e também sobre Fm 1, 2. Com toda probabilidade Filemom
não viveu em Laodiceia, mas em Colossos. Por conseguinte, esta
teoria não tem apoio firme.

Colossenses (William Hendriksen)

266

(4) A carta aos laodicenses que hoje se conhece como “A epístola


apócrifa aos laodicenses”. 174

Objeções:

a. Esta carta não é outra coisa senão «uma colcha de retalhos de


frases paulinas trespassadas juntas sem nenhuma conexão definida
nem propósito claro» (Lightfoot).

b. Já Jerônimo estabeleceu que «é rejeitada por todos». O concílio


de Niceia (787 d.C.) advertiu contra ela.

c. É evidente que foi fabricada para satisfazer a curiosidade com


relação a Cl 4:16b.

d. Pelo fato de que uma grande parte desta pequena carta foi
plagiada da Epístola de Paulo aos Filipenses, é evidente que nem
sequer concorda com a situação do vale do Lico.

(5) A Epístola canônica de Paulo aos Efésios.

Esta teoria tem muitos aderentes. Geralmente se conecta com a


opinião que se tem de Efésios como uma “carta circular”, embora
esta última teoria na verdade não depende dela. Segundo esta
interpretação de Cl 4:16b, logo que “Efésios” tenha chegado (em
seu gira pelas igrejas) a Laodiceia, depois de ser lida deve, segundo
o desejo do apóstolo, ser enviada a Colossos e a de “Colossenses”
a Laodiceia.

174 É um breve escrito apócrifo que se acha em alguns manuscritos


da Vulgata. Acha-se depois de Colossenses. Mas antedata a
Vulgata e se encontra em manuscritos latinos antes de Jerônimo. E
até em partes da igreja de fala grega, entre os quarto séculos e
oitavo, com frequência faz-se referência a

“a carta de Paulo aos laodicenses”. justifica-se a conclusão de que


tal epístola existia tanto em grego como em latim; e se em grego,
deve haver-se originado durante a primeira metade do terceiro
século d.C., a mais tardar. Sua autenticidade é defendida por
Gregório, o Grande (sexto século), Aelfric de Cerne (décimo século),
João de Salisbury (décimo segundo século), e muitos outros. acha-
se em várias edições antigas de bíblias em inglês, alemão,
holandês, e outros. “Por mais de nove séculos esta epístola falsa
estava à porta do cânon, sem ser admitida nem categoricamente
excluída. Mas enfim o renascimento de estudos deu um golpe
mortal a esta como a outras pretensões espúrias” (Lightfoot, op. cit. ,
p. 299). Para o texto latino desta falsificação, veja-se Lightfoot, op.
cit. , pp. 287–289; para a reconstrução de Lightfoot do texto grego,
op. cit. , pp. 293, 294; e para duas formas da carta num inglês
antigo, op. cit. , pp. 298, 299.

Colossenses (William Hendriksen)

267

Avaliação:

Não existe prova conclusiva a favor da validez desta teoria. Não é


dada aqui em Colossenses nem em Efésios 1:1. (A discussão desta
última passagem será apropriada no comentário sobre Efésios). Por
outro lado, embora seja só uma teoria, não está exposta às
objeções que contam contra as outras quatro precedentes. Esta
teoria surge de supostos válidos, ou seja, que ambas as cartas (as
mencionadas em Cl 4:16b) foram escritas pelo apóstolo Paulo e
escritas a igrejas. De modo que, de acordo com esta teoria,
“Efésios”, chegando a Colossos desde Laodiceia, chega a ser assim
verdadeiramente a carta “dos laodicenses”.

(6) Uma genuína carta de Paulo dirigida aos laodicenses, mas que
agora está perdida.

Como no caso anterior (veja-se o ponto (5)), quando esta carta


chegar aos colossenses, seria a carta “dos laodicenses”.

Avaliação:

Neste caso também faltam as provas, mas esta teoria também está
livre das objeções mencionadas como válidas contra as quatro
primeiras.

O fato de que esta teoria surge da hipótese de que uma carta escrita
por Paulo possa ter sido “perdida”, no sentido de que não foi
transmitida à posteridade, não se deve ter como uma objeção
válida. Nem todas as cartas de Paulo foram preservadas (veja-se
1Co 5:9). Os que apoiam esta teoria são da opinião de que a razão
pela qual, na providência divina, não foi preservada a carta de Paulo
aos laodicenses poderia ter sido que a parte principal da epístola —
na qual diferia de Colossenses — embora certamente tivesse um
imenso valor para os membros do vale do Lico, não tinha um
significado permanente e universal.

Deve ter-se em mente que Tíquico devia passar por Laodiceia para
poder chegar a Colossos. Certamente usaria o mesmo caminho que
tinha usado Paulo, mas só que agora Tíquico viajou em sentido
inverso (do oeste a leste). Veja-se a Introdução II A, mapa 4. Não
teria sido estranho que, tendo despachado “Efésios” aos anciãos de
Éfeso, e estando em

Colossenses (William Hendriksen)

268

caminho para entregar “Colossenses” às autoridades de Colossos,


não tivesse nenhuma nota de Paulo à igreja de Laodiceia, cidade
pela qual passaria? Ambas as teorias proveem para esta
necessidade. Segundo (5) Tíquico poderia ter dito aos laodicenses:
“a carta de Paulo que deixei em Éfeso logo lhes será enviada.
Depois que a tenham lido, enviem aos colossenses, os quais pelo
contrário lhes enviará a carta que lhes vamos entregar”. Segundo
(6), Tíquico, ao ser recebido pelos laodicenses, entregar-lhes-ia a
carta dirigida especificamente. Provavelmente essa carta continha a
petição de que foi enviada (ou que enviassem uma cópia) aos
colossenses em troca da que foi dirigida a eles.

Às vezes se esgrime contra (6) que Paulo não teria pedido aos
colossenses que levassem suas saudações aos irmãos em
Laodiceia e a Ninfa e à igreja de sua casa (Cl 4:15), se ao mesmo
tempo esteve escrevendo uma carta dirigida especificamente aos
laodicenses. Outros, no entanto, respondem que para um coração
tão cheio de amor e amizade tal coisa não pode ser considerada
como impossível ou não natural.
Além disso, também se esgrimiram objeções contra (5), em
particular contra a teoria da carta circular.

Em algumas ocasiões, no curso da exegese, acontece que uma


resposta precisa é impossível, e a escolha deve ficar entre duas
alternativas, neste caso entre a teoria (5) e a (6).

6. VIGOROSA ADMOESTAÇÃO A ARQUIPO - CL 4:17

17. E dizei a Arquipo. Arquipo era membro da família de Filemom,


que vivia em Colossos, e em cuja casa a igreja costumava reunir-se
para o culto. O apóstolo lhe concede a honra notável de chamá-lo
em Filemom 2, “companheiro de milícia”. Veja-se sobre Fm 1 e 2
neste mesmo volume. Uma vez que provavelmente era o filho de
Filemom e Áfia, não poderia ter sido de muita idade. Talvez o
poderíamos comparar com Timóteo, a quem Paulo escreveu depois
de seu primeiro encarceramento em Roma: “Ninguém tenha em
pouco a tua juventude”

Colossenses (William Hendriksen)

269

(1Tm 4:12). Estas palavras foram dirigidas a Timóteo quando tinha


entre 34 e 39 anos de idade. Veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e
Tito, p. 179.

Agora, o apóstolo tem uma mensagem especial para este

companheiro de armas Arquipo, e o expressa numa linguagem que,


por causa de seu caráter sucinto e imperativo, deve ter parecido
tanto mais direto e inequívoco. Paulo manda que a igreja diga a
Arquipo, atende ao ministério que recebeste no Senhor, para
que o cumpras. Não nos é dito nada mais a respeito deste
“ministério”. Tampouco somos informados por que Arquipo devia ser
admoestado desta forma. Alguns pensaram que a razão era que ele
carecia de prontidão e energia, que sempre tinha uma tendência à
preguiça, pospondo as coisas que necessitavam atenção imediata
ao futuro indefinido (“amanhã”). A objeção a esta teoria é que em tal
caso Paulo dificilmente o teria chamado “companheiro de milícia”

ou literalmente “co- soldado”. Talvez um método mais seguro para


poder chegar a uma resposta à dupla pergunta: a. “Que ministério
era este?” e b. “Por que Paulo escolheu este método para lembrar a
Arquipo sua responsabilidade?”, seja estudar o significado exato da
expressão usada.

Arquipo deve dar atenção ao ministério. Esta palavra é o


equivalente à grega diakonia. Nos escritos de Paulo esta palavra
tem diversos significados. 175 No entanto, o significado espiritual da
palavra é proeminente entre os outros, e este significado indica o
ofício do ministério, e o serviço incluído nesse ofício. Talvez no
presente caso podemos chegar mais perto de uma conclusão
razoável a respeito do 175 Paulo o emprega 22 vezes. Os
tradutores e expositores nem sempre estão de acordo com relação
a seu significado exato e contextual. Assim, em 1Co 12:5 há varia
traduções: serviço, ministração, dispensação, ministério; e assim
também com relação a 2Co 3:7, 8, 9 (duas vezes). É seguro que em
Rm 15:31; 2Co 8:4; 9:1, 12, 13 a palavra significa o sustento ou a
ajuda (para os pobres). Em muitas passagens, à luz do contexto
especifico, a palavra significa o ofício espiritual (de apóstolo ou
evangelista) e/ou sua administração (o ministério). Neste caso
define em termos da diakonia “de reconciliação”, a diakonia “para a
edificação do corpo de Cristo”, ou como sinônimo de uma expressão
como “a obra de evangelista”. Exemplos se acham em Rm 11:13;
12:7; 2Co 4:1; 5:18; 6:3; Ef 4:12; 1Tm 1:12; 2Tm 4:5, 11. Parece que
Cl 4:17 pertence aqui também. Para o significado do verbo afim
veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Timóteo e Tito, p. 155, nota 67; e para o
substantivo afim, o mesmo comentário, p. 149, nota 65.

Colossenses (William Hendriksen)

270

sentido do termo em Cl 4:17. Esta última passagem tem uma


semelhança muito estreita com 2Tm 4:5, como segue:
Cl 4:17b 2Tm 4:5b

“Atende ao ministério que recebeste “Faze a obra de evangelista,


executa ao no Senhor, para que o cumpras”. máximo teu ministério”.

Agora, no caso de Timóteo o “ministério” era “a obra de

evangelista” ou pregador do evangelho (At 21:8; Ef 4:11). Quando


Paulo escreveu estas palavras, Timóteo estaria em Éfeso como um
agente especial de Paulo; Timóteo deve pregar “a palavra, insta,
quer seja oportuno, quer não”. E deve corrigir, repreender, exortar
“com toda a longanimidade e doutrina” (2Tm 4:2).

Alguém devia também estar encarregado do rebanho em Colossos.

Quando a carta aos colossenses foi escrita e quando foi levada ao


seu destino, não podia ser Epafras o pastor das igrejas do vale do
Lico, porque nesse momento estava com Paulo em Roma, de onde
também estava enviando saudações (Cl 4:12). Quem era então? À
vista da surpreendente similaridade que existe entre Cl 4:17 e 2Tm
4:5b, o mais razoável é pensar que o pastor interino não era outro
senão Arquipo.

Além disso, pelo fato de que ele também, bem como Timóteo, era
bastante jovem e um pouco tímido, duvidando se a igreja o
acolheria, um homem sem muita experiência, seu pleno apoio nesta
importante obra, o apóstolo com muito tato ordena à congregação
que o anime ao dizer-lhe mais ou menos assim: «Vai em frente,
estamos contigo e prometemos te ajudar em tudo. O trabalho que
estás procurando desenvolver foi dado pelo Senhor, e o estás
desenvolvendo com o poder que Ele oferece».

Portanto, “atende ao ministério que recebeste no Senhor, para que o


cumpras”. Naturalmente, tudo isso não é mais que uma razoável
conjetura.

Colossenses (William Hendriksen)


271

7. SAUDAÇÃO PESSOAL, RECORDATÓRIO, BÊNÇÃO - CL 4:18

18a. A saudação de minha própria mão, a de Paulo. Era um


costume de Paulo escrever algumas palavras de saudação com sua
própria mão (veja-se 2Ts 3:17; cf. 1Co 16:21). Tinha um duplo
propósito ao fazê-lo assim:

a. Marcar a carta com sua assinatura como uma carta genuína,


como um produto autêntico da mente e coração de Paulo (2Ts 3:17);
b. Dissuadir a propagação de cartas falsificadas (veja-se 2Ts 2:1, 2).

Por isso também se torna evidente que era costume de Paulo ditar
suas cartas (além das referências dadas acima, veja-se Rm 16:22;
Gl 6:11; e veja-se sobre Fm 19).

18b. Lembrai-vos de minhas cadeias. É um sinal da verdadeira


grandeza de Paulo que não se estimava a si mesmo como sendo
muito exaltado para solicitar uma contínua simpatia e intercessão
por ele, um prisioneiro! veja-se Cl 1:9; cf. 4:3.

18c. A graça (seja) convosco. Nesta mesma forma resumida


encontramos a bênção em 1Tm 6:21 (cf. 2Tm 4:22b). Mas embora
curta, é rica em significado, porque a graça é a maior e fundamental
de todas as bênçãos. É o favor de Deus em Cristo para aquele que
não merece, transformando seus corações e vidas e levando-os até
a glória. O

apóstolo, que na saudação desde o princípio falou da graça (e da


paz), agora termina sua carta pronunciando outra vez
autoritativamente esta graça (note-se o artigo; “a graça”) sobre os
crentes em Colossos. 176

176 Alguns manuscritos acrescentam “Amém”, mas esta adição


pode derivar do uso litúrgico ou pode ter sido agregado por um
copista que se lembrava que “Amém” era a palavra com que se
conclui Gálatas e também, segundo alguns manuscritos, Romanos.
Colossenses (William Hendriksen)

272

Ideias de Colossenses 4:2–18

(1) “perseverai na oração”. Algumas vezes a resposta não chega


imediatamente porque ainda não estamos preparados para receber
a bênção; outras vezes porque a bênção ainda não está preparada
para nós.

Além disso, se sempre que orássemos Deus concedesse a petição


imediatamente, apreciaríamos suas bênçãos? (v. 2a).

“… vigiando nela com ação de graças”. Paulo era um prisioneiro


quando escreveu isso.

Quão certas são estas palavras: «As paredes de pedra não fazem
uma prisão, nem barras de ferro uma prisão». (Lovelace)

Desde o seu primeiro cativeiro em Roma o apóstolo escreveu quatro


cartas que nos chegaram até hoje: Colossenses, Filemom, Efésios e
Filipenses. Colossenses superabunda com “ações de graças” (Cl
1:3, 12; 2:7; 3:15, 16, 17; 4:2); Efésios com “graça” (Ef 1:2, 6, 7; 2:5,
7, 8; 4:7, 29; 6:24) e com “glória” (Ef 1:6, 12, 14, 17, 18; 3:13, 16,
21); Filipenses com “alegria” (Fp 1:4, 18, 25; 2:2, 17, 18, 28, 29; 3:1;
4:1, 4, 10); e as quatro com “amor” (veja-se em especial Filemom 1,
5, 7, 9, 16; e cf. v.

12), (v. 2b).

(3) “orando ao mesmo tempo por nós também, para que Deus nos
abra uma porta para a mensagem”. O prisioneiro não ora por uma
porta de escape da prisão, mas por uma porta para a entrada da
mensagem (v.

3).
(4) “… (orando) para que eu possa fazê-lo claro, (e possa falar)
como devo falar”. Não só importa o que dizemos mas também como
o dizemos (cf. Ef 4:15), (v. 4).

(5) “… tirando o máximo proveito da oportunidade” ou «…

comprando a oportunidade». Para alguns o “tempo é dinheiro”. Para


Paulo é a “oportunidade” de conduzir-se sabiamente para com os de
fora (v. 5).

Colossenses (William Hendriksen)

273

(6) “… para que saibais como responder a cada indivíduo”. Não só é


importante o que dizemos e como o dizemos (veja-se Nº. 4, acima),
mas também a quem o dizemos (v. 6).

(7) “Tíquico vos fará saber todos os meus assuntos …” Algumas


coisas são melhores se forem ditas que se forem escritas (vv. 7, 8).

(8) “… Onésimo, fiel e amado irmão”; “Marcos, o sobrinho de


Barnabé … se for a vós, recebei-o”. O irmão A é muito generoso em
sua vontade para perdoar o pecado que o irmão B cometeu contra o
irmão C, mas não está tão ansioso para perdoar o pecado que o
irmão D cometeu contra ele (A). Mas Paulo faz as duas coisas. O
apóstolo perdoa a Onésimo por ter prejudicado a Filemom, mas
também perdoa a Marcos por ter a ele mesmo, isto é, a Paulo (veja-
se At 13:13; 15:38; 2Tm 4:11), (vv. 9, 10).

(9) “daqueles que são da circuncisão, estes são os únicos


colaboradores no reino de Deus que me foram um consolo”. Os
indivíduos mais privilegiados nem sempre são os mais úteis (v. 11).

(10) “Epafras, que é um de vós, servo de Cristo Jesus, vos saúda,


lutando sempre por vós em suas orações para que possais estar
firmes, amadurecidos e inteiramente assegurados em toda a
vontade de Deus”. A marca de um grande líder é estar ansioso por
falar bem de uma pessoa e por reforçar a confiança nela. Paulo fez
isso vez após vez (vv. 12, 13).

(11) “Lucas, o médico amado, vos saúda, e assim também Demas”.

Aqui ambos são mencionados favoravelmente. Mais tarde o


contraste será evidente, e Paulo escreverá: “Demas, tendo amado o
presente século, me abandonou … Somente Lucas está comigo”.
Dois obreiros do reino podem estar trabalhando lado a lado, fazendo
o mesmo trabalho, até onde os homens podem ver. Deus olha os
corações (v. 14; cf. 2Tm 4:1(01,2 1) 1“…). e à igreja que está em
sua casa”. Em certo sentido cada lar deve ser uma casa-igreja (v.
15).

(13) “…procurai que também seja lida na igreja dos laodicenses, e


que vós também leiais a de Laodiceia”. E isto não só porque as
duas

Colossenses (William Hendriksen)

274

cartas eram importantes para ambas as congregações, mas porque


as duas congregações deviam ser importantes uma para com a
outra (v. 16).

(14) “… para que o cumpras”. Toda tarefa dada por Deus deve ser
cumprida (v. 17).

(15) “Lembrai-vos de minhas cadeias”. Um grande homem não é tão


arrogante como para não pedir que lembrem dele em oração (v. 18).

Colossenses (William Hendriksen)

275

BIBLIOGRAFIA

BREVE BIBLIOGRAFIA SOBRE A ESCRAVIDÃO


Além dos artigos sobre a escravidão encontrados nas melhores
enciclopédias, ver também:

J. O. Buswell, Slavery, Segregation, and Scripture, Grand Rapids,


1964. Este livro contém uma boa bibliografia, pp. 93–97.

H. S. Commager y A. Nevins (editores), The Heritage of America,


especialmente as seções 99 (“The Rev. Mr. Walsh Inspects a Slave
Ship”) e 183 (“Thomas Dabney Does the Family Wash”).

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setembro 3, 1956.

Para literatura antiga sobre a escravidão, veja-se a bibliografia no


final de artigo “Slavery” em The New Schaff-Herzog Encyclopaedia
of Religious Knowledge, Vol. X, pp. 449–454.

Colossenses (William Hendriksen)


276

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1929.
Document Outline
COMENTÁRIO DO NT (H & K)
COLOSSENSES
CONTEÚDO
Abreviaturas
Introdução
I. Por que devemos estudar Colossenses e Filemom?
II. A cidade de Colossos
III. A igreja em Colossos
IV. O propósito de Paulo ao escrever Colossenses e
Filemom
V. Lugar e tempo em que foram escritas Colossenses
e Filemom
VI. Paternidade literária de Colossenses e Filemom
Colossenses 1
1. Saudação - Cl 1:1, 2
2. Gratidão e oração - Cl 1:3–14
A. Ação de graças. Cl 1:3–8
B. A oração. Fp 1:9-11
3. Preeminência do Filho - Cl 1:15–20
A. Na criação - Cl 1:15-17
B. Na redenção - Cl 1:18-20
4. Amor reconciliador do Filho - Cl 1:21-23
5. O apóstolo prega “Cristo em vós, a esperança da
glória” - Cl 1:24-29
Resumo de Colossenses 1
Colossenses 2
1. Advertências contra filosofias ilusórias - Cl 2:1–10
2. Advertências contra o cerimonialismo judaico - Cl
2:11-17
3. Advertências contra o culto aos anjos - Cl 2:18-19
4. Advertências contra o ascetismo - Cl 2:20-23
Resumo de Colossenses 2
Colossenses 3:1-17
1. Os crentes devem ser consequentes - Cl 3:1–4
2. Portanto, devem “fazer morrer” e “deixar” os antigos
vícios - Cl 3:5-11
3. Devem “vestir-se” das novas virtudes - Cl 3:12-17
Resumo de Colossenses 3:1–17
Colossenses 3:18 – 4:1
1. Esposas e esposos - Cl 3:18, 19
2. Filhos e pais - Cl 3:20, 21
3. Escravos e senhores - Cl 3:22 – 4:1
Resumo de Colossenses 3:22 – 4:1
Colossenses 4:2-18
1. Chamado à oração - Cl 4:2–4
2. Ênfase numa conduta sábia e num falar cheio de
graça - Cl 4:5–6
3. Recomendação para Tíquico e Onésimo - Cl 4:7–9
4. Saudações - Cl 4:10–15
5. Pede-se um intercâmbio de cartas - Cl 4:16
6. A dmoestação a Arquipo - Cl 4:17
7. Saudação pessoal, recordatório, bênção - Cl 4:18
Bibliografia
Breve bibliografia sobre a escravidão
Bibliografia geral
Table of Contents
COMENTÁRIO DO NT (H & K)
COLOSSENSES
CONTEÚDO
Abreviaturas
Introdução
I. Por que devemos estudar Colossenses
e Filemom?
II. A cidade de Colossos
III. A igreja em Colossos
IV. O propósito de Paulo ao escrever
Colossenses e Filemom
V. Lugar e tempo em que foram escritas
Colossenses e Filemom
VI. Paternidade literária de Colossenses
e Filemom
Colossenses 1
1. Saudação - Cl 1:1, 2
2. Gratidão e oração - Cl 1:3–14
A. Ação de graças. Cl
1:3–8
B. A oração. Fp 1:9-11
3. Preeminência do Filho - Cl 1:15–20
A. Na criação - Cl 1:15-
17
B. Na redenção - Cl
1:18-20
4. Amor reconciliador do Filho - Cl 1:21-
23
5. O apóstolo prega “Cristo em vós, a
esperança da glória” - Cl 1:24-29
Resumo de Colossenses 1
Colossenses 2
1. Advertências contra filosofias ilusórias
- Cl 2:1–10
2. Advertências contra o cerimonialismo
judaico - Cl 2:11-17
3. Advertências contra o culto aos anjos -
Cl 2:18-19
4. Advertências contra o ascetismo - Cl
2:20-23
Resumo de Colossenses 2
Colossenses 3:1-17
1. Os crentes devem ser consequentes -
Cl 3:1–4
2. Portanto, devem “fazer morrer” e
“deixar” os antigos vícios - Cl 3:5-11
3. Devem “vestir-se” das novas virtudes -
Cl 3:12-17
Resumo de Colossenses 3:1–17
Colossenses 3:18 – 4:1
1. Esposas e esposos - Cl 3:18, 19
2. Filhos e pais - Cl 3:20, 21
3. Escravos e senhores - Cl 3:22 – 4:1
Resumo de Colossenses 3:22 – 4:1
Colossenses 4:2-18
1. Chamado à oração - Cl 4:2–4
2. Ênfase numa conduta sábia e num
falar cheio de graça - Cl 4:5–6
3. Recomendação para Tíquico e
Onésimo - Cl 4:7–9
4. Saudações - Cl 4:10–15
5. Pede-se um intercâmbio de cartas - Cl
4:16
6. A dmoestação a Arquipo - Cl 4:17
7. Saudação pessoal, recordatório,
bênção - Cl 4:18
Bibliografia
Breve bibliografia sobre a escravidão
Bibliografia geral

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