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TITO

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Original en inglês:

New Testament Commentary: Titus

Author: William Hendriksen

TRADUTOR: CARLOS BIAGINI

Baker Book House

Grand Rapids, Michigan, 1957

Tito (William Hendriksen)

CONTEÚDO

ABREVIATURAS

INTRODUÇÃO

I. Por que deveríamos estudá-las?

II. Quem escreveu as Pastorais?

III. A Quem Foram Dirigidas?

IV. Qual é seu Pano de Fundo Histórico e seu Propósito?

TITO 1 - NA VIDA CONGREGACIONAL

Tt 1:1:1–4 - Cabeçalho e saudação.


Tt 1:5–9 - É preciso nomear anciãos de boas qualidades em todas
as

cidades.

Tt 1:10–16 - Razão: Creta não tem falta de pessoas de má


reputação

que precisam ser repreendidas com toda seriedade.

Síntese de Tito 1

TITO 2 - NA VIDA FAMILIAR E INDIVIDUAL

Tt 2:1–10 - Todas as classes de indivíduos que compõem o círculo

familiar deveriam conduzir-se de tal maneira que por

sua conduta adornem a doutrina de Deus, seu Salvador.

Tt 2: 11–15 - Razão: A graça de Deus manifestou-se a todos para

santificação e para esperar com alegria a aparição

gloriosa de nosso grande Deus e Salvador, Jesus

Cristo.

Síntese de Tito 2

Tito (William Hendriksen)

TITO 3 – NA VIDA SOCIAL (ISTO É, PÚBLICA)

Tt 3:1-8 - Os crentes devem obedecer às autoridades. Devem ser

amáveis com todos os homens, uma vez que foi a


bondade de Deus nosso Salvador, não nossas obras, o

que nos trouxe a salvação.

Tt 3:9–11 - Por outro lado, é preciso descartar as questões néscias

e os homens facciosos que se negam a prestar atenção

às admoestações.

Tt 3:12–15 - Instruções finais com relação a viajantes pela causa

do reino (Ártemas ou Tíquico, Tito, Zenas, Apolo) e

a crentes cretenses em geral. Saudações.

Síntese de Tito 3

BIBLIOGRAFIA

Tito (William Hendriksen)

ABREVIATURAS

A. Abreviaturas de libros

A.H.W.B. Atlas histórico Westminster de la Biblia

A.R.V. American Standard Revised Version

A.V. Authorized Version (King James)

BJ Biblia de Jerusalén.

CI Sagrada Biblia. F. Cantera y Manuel Iglesias. Madrid: BAC, 1975

C.N.T. W. Hendriksen, Comentario al Nuevo Testamento Gram. N.T.


A.T. Robertson, Grammar of the Greek New Testament in the Light
of Historical Research

I.S.B.E. International Standard Bible Encyclopedia L.N.T. Thayer’s


Greek‐ English Lexicon of the New Testament M.M. The Vocabulary
of the Greek New Testament Illustrated from the papyri and Other
Non‐ Literary Sources, by James Hope Moulton and George Milligan
(edición impresa en Grand Rapids, 1952)

NC Sagrada Biblia. E. Nacar y A. Colunga. Madrid: BAC, 1965

N.N. Novum Testamentum Graece, editado por D. Eberhard Nestle y


D. Erwin Nestle R.S.V. Revised Standard Version

RV60 La Santa Biblia. C de Reina (1569) y C de Valera (1602).

Revisión de 1960. SBU. VM Santa Biblia: Versión moderna.

Sociedades bíblicas en América latina

W.D.B. Westminster Dictionary of the Bible

B. Abreviaturas de de revistas

EQ Evangelical Quarterly

JBL Journal of Biblical Literature

Tito (William Hendriksen)

JthS Journal of Theological Studies

GthT Gereformeerd Theologisch Tijdschrift

WthJ Westminster Theological Journal

ZNTW Zeitschrift für die Nuetestamentliche Wissenschaft


Tito (William Hendriksen)

INTRODUÇÃO ÀS EPÍSTOLAS PASTORAIS

I. POR QUE DEVERÍAMOS ESTUDÁ-LAS?

É necessário estudar inteiramente as Epístolas Pastorais pelas


seguintes razões:

(1) Porque arrojam muita luz sobre o importante problema da


administração eclesiástica. Contêm estas cartas algumas instruções
a respeito do culto público que nós faríamos bem em levar em
conta? Que qualidades deve possuir um homem com o fim de ser
um bom pastor?

Um ancião digno? Um diácono consciencioso? Até que ponto


deveriam participar as mulheres na obra da igreja? Sobre quem
descansa a responsabilidade primária de prover para os
necessitados? Como deve tratar o ministro os varões de idade
avançada que necessitam conselho pastoral? às anciãs? aos
jovens? às jovens?

(2) Porque põem ênfase na sã doutrina. É verdade que não importa


o que uma pessoa cria enquanto for sincera no que crê? É a Bíblia
“a Palavra de Deus” tal como está apresentada, ou simplesmente se
transforma na Palavra de Deus quando te “toca”? Como se deve
enfrentar os hereges? É possível prestar muita atenção a seus
erros?

(3) Porque exigem uma vida consagrada. É possível que uma


pessoa seja “doutrinariamente sã” mas “corrompida em prática”?
Devem ser disciplinados os homens maus? Com quanta prontidão?
Com que propósito em mente?

(4) Porque respondem a pergunta: “Têm valor os credos? ” Creu a


igreja, no período de transição, na formulação de credos, nas
declarações concisas e em outros meios de transmitir a verdade do
evangelho aos interessados e à juventude? Existiam hinos? Está em
harmonia com o ensino das Pastorais o slogan “Credos não, Cristo
sim”?

Tito (William Hendriksen)

(5) Porque nos contam a respeito das atividades finais na vida do


grande apóstolo Paulo. Dá o livro de Atos um relato completo de
todas as suas viagens? Houve realmente dois encarceramentos em
Roma?

(6) Porque são uma valiosa fonte para a compreensão da história da


igreja no terceiro quarto do primeiro século d. C. (Veja-se M. C.

Tenney, Nuestro Nuevo Testamento, p. 383ss).

(7) Porque nestas epístolas, tanto como nas demais, Deus nos fala.

II. QUEM ESCREVEU AS PASTORAIS?

A expressão “epístolas pastorais”, como um título comum para 1

Timóteo, 2 Timóteo e Tito, data da primeira parte do século dezoito.


1

Agora, estas cartas certamente dão importantes instruções a


pastores. No entanto, o título não é exato. Timóteo e Tito não eram
“pastores” no sentido geral e atual da palavra. Não eram ministros
de uma congregação local, mas antes, vigários apostólicos,
enviados especiais ou comissionados do apóstolo Paulo, enviados
por ele para cumprir missões específicas.

Eles foram incumbidos de tarefas específicas, conforme exigido na


época. A tarefa deles era cumprir seu ministério espiritual aqui ou
ali, levando a cabo a obra o que se tinha iniciado, para logo informar
ao apóstolo seus atuações e realizações. Marcião, nos meados do
segundo século, rejeitou estas três cartas. Tertuliano afirma: “No
entanto, estou surpreso que enquanto ele (Marcião) aceitou esta
carta (Filemom) que fora dirigida a um só homem, tenha rejeitado as
duas epístolas a Timóteo e a dirigida a Tito, as quais tratam de
disciplina eclesiástica” ( Contra Marcião V. xxi). Agora, era natural
que um homem como Marcião, que pregava o ascetismo mais
estrito, negava a legalidade do casamento e estabeleceu rígidas
regras para o jejum, rejeitasse as Epístolas Pastorais 1 P. Anton
chamou sua obra “Exegetische Abhandlung der Pastoralbriefe”. Ele
sugeriu a expressão primeiro em 1726.

Tito (William Hendriksen)

em que se condena o ascetismo (1Tm 4:3, 4; Tt 1:14, 15). Um


herege não gosta de um escrito em que direta ou indiretamente se
condena sua heresia ou alguma semelhante.

No século dezenove (1807, para ser mais preciso) F. Schleirmacher


negou que Paulo fosse o autor de 1 Timóteo. F. C. Baur em sua
obra sobre as Epístolas Pastorais (Stuttgart e Tübingen, 1835)
defendeu a posição de que não é congruente aceitar 2 Timóteo e
Tito e rejeitar 1

Timóteo. As três deviam ser consideradas como literatura


pseudepigráfica. Muitos discípulos entusiastas — a Escola do
Tübingen

— acolheram este ponto de vista. Atualmente esta posição é aceita


por muitos, embora alguns tenham adotado pontos de vista um tanto
mais conservadores (veja-se p. 24).

Pode-se sustentar de forma certa que nesta atitude negativa os


críticos são tão objetivos como pretendem sê-lo? É possível que a
maneira como estas três pequenas joias tratam de “alguns dos mais
queridos lemas da mente moderna” 2 tenha algo que ver com a
forma decidida em que negam que Paulo seja o autor? As Epístolas
Pastorais põem uma ênfase especial em assuntos tais como a
realidade e importância dos ofícios eclesiásticos (1Tm 3; Tt 1), a
inspiração da palavra escrita (2Tm 3:16), a necessidade de manter a
pureza doutrinária (1Tm 4:1–6; 2Tm 3:14; 4:3; Tt 2:1), a realidade da
ressurreição (2Tm 2:18), e a exigência divina de que a fé se torne
manifestamente militante (2Tm 4:2, 7, 8).

Agora, quer se tenha manifestado nisso um preconceito subjetivo ou


não, ao examinar os fatos, uma conclusão fica iniludivelmente clara:
os críticos não puderam provar sua tese que afirma que Paulo não
pôde ter escrito as Pastorais.

Os argumentos dos críticos podem ser resumidos da seguinte


maneira:3

2 Cf. Edmund K. Simpson, “A autenticidade e autoria das Epístolas


Pastorais”, EQ 12 (1940), 311.

3 Quem quer que leia a seguinte literatura — uma seleção feita


dentre centenas de livros e artigos sobre este tema — terá tanto os
argumentos dos críticos como as respostas daqueles que sustentam
o

Tito (William Hendriksen)

(1) Quanto a vocabulário, as três epístolas são muito semelhantes


entre si, mas são inteiramente diferentes das outras dez epístolas
tradicionalmente atribuídas a Paulo, ou seja, Romanos, 1 Coríntios,
2

Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1


Tessalonicenses, 2 Tessalonicenses e Filemom. 4

Sob esta divisão geral são enfatizados os seguintes pontos, alguns


por certos críticos e outros por outro:
a. A grande similitude no vocabulário das três pastorais.

b. Contraste entre o vocabulário das Pastorais e o das outras dez


epístolas.

Às vezes quase pareceria que um simples olhar aos famosos


diagramas de Harrison (em seu livro The Problem of the Pastoral
Epistles, Oxford, 1921) seria suficiente para convencer a alguns que
Paulo não poderia ter escrito 1 Timóteo, 2 Timóteo e Tito. O número
de palavras novas por página de texto grego que o autor introduz
nestas três cartas, não está totalmente fora de proporção com
relação à quantidade muito menos de palavras novas por página
usadas por Paulo nas outras dez epístolas? Se o apóstolo escreveu
as dez, é possível que tenha escrito as Pastorais?

Além disso, não assinalam para um autor diferente de Paulo


expressões como as seguintes: “guarda o que te foi confiado” τὴν

παραθήκην φύλαξον (1Ti. 6:20; 2Ti. 1:12, 14); “seguir doutrina” (uma
forma de παρακολουθέω, com τῇ διδασκαλίᾳ, 1Ti. 4:6; 2Ti. 3:10);

“falatórios profanos” (βέβηλοι κενοφωνίας 1Tm 6:20; 2Tm 2:16);

“homem de Deus” (ἄνθρωπος θεοῦ, 1Tm 6:11; 2Tm 3:17)?

E, por outro lado, não é verdade que muitas palavras que se usam
repetidas vezes nas dez não aparecem nas três: “fazer injustiça”
(ἀδικέω, que na Versão Almeida também se traduz “pecar”,
“ofender”, “fazer ponto de vista tradicional com referência ao autor
das Pastorais. Reconhecemos nossa dívida a todos os que seguem:
(veja-se a lista em páginas seguintes).

4 Veja-se, por exemplo, E. F. Scott, Literature of the New Testament,


Nova York, 1932, p. 193.

Também do mesmo autor, The Pastoral Epistles (en The Moffatt


Commentary), p. xxi.
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mal”), “sangue” (αἷμα), “incircuncisão (ἀκροβυστία), “obras da lei”

(ἔργα νόμου), etc.? Burton Scott Easton assinala que o verdadeiro


Paulo usa a palavra “Espírito” 80 vezes; o autor das Pastorais, só 3
vezes.

c. A presença nas Pastorais de famílias de palavras inteiramente


novas ou grandemente expandidas.

Não é verdade que as Pastorais apresentam pela primeira vez ou


com ramificações sem paralelos, não somente muitas palavras
particulares, mas famílias completas de palavras? Para dar somente
um exemplo: a família de compostos que se centraliza em torno da
ideia comum do ensino ou a didática:

As seguintes não aparecem nas dez:

διδακτικός apto para ensinar, 1Tm 3:2, 2Tm 2:24

νομοδιδάσκαλος doutor da lei, 1Tm 1:7

καλοδιδάσκαλος mestre do bem, Tt 2:3

ἑτεροδιδασκαλεῖν ensinar outra coisa, ensinar diferente doutrina,


1Tm 1:3; 6:3

Aparecem também em dois ou três das dez:

διδάσκαλος mestre, 1Tm 2:7; 2Tm 1:11; 4:3

διδασκαλία ensino, que aparece com grande frequência nas


Pastorais em sentido ativo e passivo

( doutrina)
διδαχή doutrina, 2Tm 4:2; ensino, Tt 1:9

Aparece também em seis das dez:

διδάσκω ensinar, 1Tm 2:12; 4:11; 6:2; 2Tm 2:2; Tt 1:11.

d. A ausência de famílias de palavras paulinas.

É o inverso ao anterior.

e. O fato de que várias palavras que se encontram em 1 Timóteo, 2

Timóteo e Tito, mas não nas dez, aparecem no vocabulário dos Pais
Apostólicos, e o fato complementar de que uma alta percentagem
de palavras verdadeiramente paulinas não aparecem nas três,
tampouco

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aparece no vocabulário dos Pais Apostólicos. Alega-se que isso


indica que as Pastorais correspondem a princípios do segundo
século.

Neste contexto geralmente destaca-se que durante o segundo


século houve um renascimento da dicção clássica. Sustenta-se que
isso explica a presença de um número considerável de palavras
clássicas nestas cartas.

f. O uso frequente de palavras e expressões latinas. Diz-se que isto


indica que o autor das Pastorais não pôde ter sido Paulo, mas devia
ser alguém que vivia em Roma ou perto de Roma. Ou, se esta
conclusão não se expressa com tantas palavras, o argumento dos
latinismos que ocorrem nas Pastorais pelo menos encontra-se na
lista das causas do cepticismo a respeito.

g. O sentido completamente diferente que se dá nas Pastorais às


palavras que são comuns a elas e às dez.
Exemplos: fé, usa-se objetivamente nas Pastorais = o que se crê, a
verdadeira religião; mas Paulo a usa no sentido de confiança
subjetiva.

tomar, usada em 1Tm 3:16 para a ascensão de Cristo, mas em Ef


6:13, 16 para “tomar” as armas espirituais.

letra, usado em sentido desfavorável por Paulo, mas letras (


escrituras, RA) em sentido favorável em 2Tm 3:15 = as sagradas
escrituras.

h. Finalmente, o fato de que não somente as “pedras” diferem das


usadas por Paulo, mas também “a mescla e a areia” (partículas de
transição e inferência, que aumentam nas dez, mas são escassas
nas Pastorais).

Não é difícil demonstrar que o valor deste argumento e de suas


ramificações foi excessivamente superestimado.

No que respeita a “a.”, até certo ponto a verdade é exatamente o


contrário. Das palavras novas ( novas no sentido que não aparecem
nas dez) muito poucas encontram-se em as três em conjunto;
somente nove de um total de 306! Daí que, se a falta de similitude
em vocabulário é prova de que o autor é outro, terei que concluir de
que há um autor diferente para cada epístola pastoral. 1 Timóteo
tem 127 palavras

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novas; 2 Timóteo outras 81, e Tito outras 45. Em conjunto, 1


Timóteo e 2 Timóteo têm somente 17; 1 Timóteo e Tito somente 20;
2 Timóteo e Tito somente 7; as três em conjunto, somente 9. (No
entanto, tanto o vocabulário como o estilo, tomados em conjunto,
apontam para um só autor.)
Com relação a “b.”, o fato é que pouco mais de um quarto do
vocabulário total da Epístola de Paulo aos Romanos é “novo” no
sentido que não se usa nas outras nove epístolas. A percentagem
de palavras novas, em proporção ao total do vocabulário empregado
em 2 Timóteo (palavras que não aparecem nas dez), é apenas
superior ao de Romanos.

O mesmo vale para Tito. Em 1 Timóteo por volta de um terço das


palavras são novas. Certamente, com base nestes fatos, a tese dos
críticos, ou seja, que Paulo não pôde ter escrito as Pastorais, fica
insustentável. 5

Em cada epístola Paulo usa as palavras (inspiradas pelo Espírito)


que necessita para expressar seus pensamentos (inspirados pelo
Espírito) a respeito do tema específico que está considerando. Por
esta razão não é surpreendente que certas palavras, encontradas
nas dez, faltem nas três. Por exemplo, tomemos as primeiras três
palavras mencionadas pelo Harrison em sua lista da p. 31, as
tomando na ordem que aparecem. A primeira é ἀδικέω: fazer mal,
fazer injustiça. A segunda é αἷμα: sangue. A terceira é ἀκποβυστία:
incircuncisão. Agora, todo o tema da justiça, obtida pelo pecador
pelo sangue de Cristo e não por ritos tais como a circuncisão,
corresponde a epístolas tais como 5 Proporção de palavras novas
com relação ao total do vocabulário, dada pelo Michaelis e
Greydanus: Romanos: 261:993 = 26.3%

2 Timóteo: 114:413 = 27.6%

Tito: 81:293 = 27.6%

1 Timóteo: 173:529 = 32.7%

Veja-se Michaelis, o artigo citado, p. 73; Greydanus, obra citada, p.


210. Isto harmoniza com as cifras dadas por Harrison, op. cit. p.
140. Bouma, Kommentaar op het Nieuwe Testament, p. 54, enfatiza
o fato de que das 582 palavras que aparecem nas dez mas não nas
pastorais, não menos de 469 se acham em somente uma epístola; e
que, portanto, estas 469 faltam nas outras nove bem como nas
Pastorais.

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Romanos, Gálatas e em alguma medida a 1 Coríntios. Por isso, é


nestas epístolas que nós devemos buscar estas palavras e outras
semelhantes.

Mas, naturalmente, Paulo não precisava expor em detalhe a


Timóteo e Tito, seus amigos íntimos e colaboradores na obra, a
doutrina da justificação pela fé! Daí que seja completamente natural
que estas três palavras não apareçam aqui, embora a própria
doutrina não esteja completamente ausente; veja-se Tito 3:5–7. O
mesmo vale para as demais palavras dadas por Harrison nas pp. 31
e 32 de seu livro. A ausência de nenhuma delas é estranha nas
Pastorais, embora se veja mais claramente porque não deve achar-
se num caso que em outros. Ainda mais, se devemos negar que
Paulo seja o autor das Pastorais devido ao fato de que a palavra
“Espírito” aparece somente três vezes, não deveríamos também
rejeitar a paternidade literária paulina de Colossenses, 2
Tessalonicenses e Filemom?

Quanto a “c.” e “d.”, é uma faca de dois fios, porque também se


poderia dizer que a presença de famílias inteiras de palavras aqui
nas Pastorais como nas dez, aponta para um mesmo autor. Pode-se
explicar facilmente que a palavra básica em torno da qual se
desenvolveu a família de palavras não seja a mesma nas diferentes
epístolas: nas cartas a Timóteo e Tito, que tinham necessidade
específica de bom conselho com relação à sua tarefa específica de
comunicar instrução, de maneira nenhuma surpreende que a família
de palavras se desenvolva em torno da ideia de ensino.

Além disso, pode-se demonstrar que se a presença ou a ausência


de certas palavras e famílias de palavras é decisiva na
determinação do autor, não seria fácil para os críticos defender a
posição de que Paulo é autor das dez, porque na lista que Harrison
dá, de 41 palavras que aparecem em cinco epístolas paulinas, mas
não nas Pastorais ( op. cit. , p.

31), somente uma palavra das primeiras 22 aparece em 2

Tessalonicenses. Naturalmente, alguns estariam bem dispostos de


desfazer-se de 2 Tessalonicenses também!

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Quanto a “e.”, nosso conhecimento do verdadeiro vocabulário que


se usava durante a segunda metade do primeiro século d.C., em
comparação com o da primeira metade do segundo século d. C., é
muito escasso para servir como critério fidedigno. Com quanta
frequência ocorreu que palavras consideradas de tempo posterior
de repente aparecem em escritos recém-descobertos e que são de
uma data muita anterior? A ideia de que o uso de palavras
“clássicas” é indício de um autor do segundo século d.C. é dar por
concedido o que se deve provar.

Por que deve parecer irrazoável supor que o próprio Paulo tenha
escrito as Pastorais, e que tenha obtido seu conhecimento de
vocabulário

“clássico” de sua própria leitura e de tê-lo ouvido? Não tinha sido


estudante em sua juventude? Não contemplava o currículo de
Gamaliel nada quanto à literatura antiga e contemporânea? Não é
verdade que o Paulo que aprendemos a conhecer através das dez
epístolas deve ter tido um conhecimento extenso (direto ou indireto)
de autores gregos, de modo que podia citar a Menandro (1Co 15:33)
e Arato (At 17:28)? É

absurdo considerar a possibilidade de que durante seu longo


primeiro encarceramento (e segundo alguns, talvez durante seu
segundo encarceramento, cf. 2Tm 4:13) o apóstolo tenha
acrescentado seu conhecimento, fazendo incursões de vez em
quando na literatura extra-canônica? De qualquer maneira, sabemos
que algumas palavras que não se usam em outros lugares do Novo
Testamento, mas que são usadas pelo autor das Pastorais e por
escritores do segundo século d.C., foram também usadas por
contemporâneos dos apóstolos. Quem se atreverá a sustentar que
muitas outras palavras poderiam não ter sido de uso comum em
tempo tão antiga quanto o primeiro século d.C. ou ainda antes? 6

A similitude de vocabulário que se nota ao comparar as Pastorais


com os escritos cristãos do segundo século d.C. não significa 6
Veja-se W. Lock, op. cit., p. xxix, e especialmente E. K. Simpson,
The Pastoral Epistles, pp. 16–18; 103, 104.

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necessariamente que quem quer que tenha escrito 1 Timóteo, 2


Timóteo e Tito tenha florescido nos dias dos pais apostólicos e dos
apologistas.

Também poderia significar que os autores cristãos do segundo


século tinham lido, estudado e, em certa medida, copiado e
parafraseado a Paulo.

Quanto a “f.”, o uso frequente de palavras e expressões derivadas


do latim, é um argumento que pende de um fio muito fraco. Os
críticos podem assinalar somente duas palavras latinas e não mais,
nas três pastorais, ou seja:

μεμβράνα (latim membrana), pergaminho, 2Tm 4:13; φελόνης

latim paenula), na mesma passagem, e que foi interpretada como


capa (RA), coberta para livros, maleta. Mas também aparecem
palavras latinas nas epístolas que até os críticos atribuem a Paulo:
θριαμβεύω, levar em triunfo (cf. latim triumphus), 2Co 2:14; Cl 2:15;
μάκελλον, açougue (latim macellum), 1Co 10:25; e πραιτώριον,
guarda pretoriana (latim praetorium), Fp 1:13. Além disso, em seu
Evangelho e Atos, Lucas, que tinha sido companheiro de Paulo e
que segundo 2Tm 4:11

estava novamente com ele durante o segundo encarceramento do


apóstolo, usa quase a metade de um total de umas 30 palavras
latinas que se usam no Novo Testamento. Se o companheiro
frequente de Paulo pode usar palavras latinas, por que não pode
Paulo fazer o mesmo?

É verdade que também se ouvem ecos do latim em expressões


como as seguintes:

δεσπότης ( dominus), 1Tm 6:1, 2; 2Tm 2:21; Tt 2:9, amo, senhor


δίλογος ( bilinguis em um de seus significados), 1Tm 3:8, doblez
ἑδραίωμα ( firmamentum), 1Tm 3:15, baluarte, apoio, fundamento
εὑσέβεια ( pietas), 1Tm 2:2; 4:7, 8, piedade, reverência, devoção,
vida pia, religião

ματαιολογία ( vaniloquium), 1Tm 1:6, vã palavrório οἱ ἡμέτεροι (


nostri). Tt 3:14, os nossos, nossa gente πρόσκλισις ( inclinatio), 1Tm
5:21, inclinação, parcialidade πρόκριμα ( praeiudicium), 1Tm 5:21,
preconceito

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σεμνότης ( gravitas), 1Tm 2:2; 3:4; Tt 2:7, honestidade, seriedade,


dignidade, respeitabilidade, gravidade

χάριν ἔχειν ( gratiam habere), 1Tm 1:12, dar graças Mas, neste
contexto, observe-se o seguinte:

1. Também se encontram em outros escritos do Novo Testamento7

palavras e frases que fazem lembrar expressões paralelas em latim.


2. Já durante o primeiro século d.C. o grego e o latim tinham
alcançado uma posição de intercâmbio e de tradução de um ao
outro idioma.

3. O que pudesse parecer uma expressão copiada, pode bem ser


somente o resultado de um desenvolvimento paralelo de cognatos.

Além disso, mesmo quando reconhecido um considerável grau de


influência do latim sobre o grego das Pastorais, provaria isto de
algum modo que Paulo não pôde tê-las escrito? Não é inteiramente
natural que o homem que tinha chegado à metrópole do mundo,
onde muito recentemente tinha passado não menos de dois anos,
um homem, além disso, que era altamente suscetível às influências
do meio ambiente e que estava desejoso de fazer tudo a todos os
homens, começasse a fazer um uso mais completo da dicção
“romana” e de sua fraseologia que o que até então o fez? Neste
ponto o argumento dos críticos parece derrubar-se completamente.

Com relação a “g.”, estas ilustrações se desvanecem prontamente


ao examinar-se com mais detenção. Assim, alega-se que Paulo usa
a palavra fé em sentido subjetivo (confiança em Deus e em suas
promessas), mas que o autor das Pastorais a usa no sentido
objetivo (credo, corpo de doutrina). Mas, para começar pelas
Pastorais, a expressão “a fé e o amor que é em Cristo Jesus” (1Tm
1:14) indica o exercício destas virtudes.

“Permanecer em fé, amor e santificação” (veja-se 1Tm 2:15)


também ilustra o uso subjetivo. E quando o autor ensina que alguém
recebe a 7 Veja-se Gram. N.T., p. 109.

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“salvação pela fé que é em Cristo Jesus”, todos imediatamente


entendem que ele está falando da atitude de confiança no Redentor
e do exercício dela (portanto, novamente em sentido subjetivo). Cf.
1Tm 3:13; 6:11, 12
e 2Tm 1:13; 3:10; 4:7. E quanto às dez epístolas, o autor delas nem
sempre usa a palavra em sentido subjetivo. Assim, em Gl 1:23 fala
de

“pregar a fé”. Em Gl 6:10 usa a expressão “os da família da fé”. Em


Fp 1:27: “combatendo unânimes pela fé do evangelho”, temos outro
excelente exemplo de uso objetivo. Além disso, não é totalmente
surpreendente que nas Pastorais, Paulo, sendo um homem que está
prestes a partir desta vida, esteja preocupado com a preservação da

“verdade”, e, consequentemente, empregue frequentemente a


palavra

“fé” neste sentido objetivo (1Tm 1:19; 3:9; 4:1; 5:8; 6:10; 2Tm 3:8; Tt
1:13).

A respeito de outros exemplos que se supõe demonstram que


quando o autor das três usa uma palavra paulina o faz com um
sentido completamente diferente, demonstrando assim que o
apóstolo não pôde ter escrito as três, não é totalmente claro por que
um autor não poderia usar o mesmo verbo grego no sentido de
“tomar” as armas espirituais e no de “recebido acima” ao referir-se a
Jesus e Sua ascensão. De forma semelhante, o fato de que a
expressão “a letra”, no singular, seja usada em certo sentido, mas a
palavra “letras” ( escrituras), plural, em sentido diferente, não é
estranho. Muitos idiomas contêm expressões desta natureza: por
exemplo, é muito necessário tomar ar puro (no singular), mas não é
aconselhável “ir aos ares” * (plural). E, não é verdade que nas
epístolas que até os críticos atribuem a Paulo, as palavras “carne” e
“lei”

se usam em mais de um sentido, assim como o autor do quarto


evangelho usa a palavra “mundo” em vários sentidos?

Finalmente, quanto a “h.”, nos discursos expositivos ou


argumentativos — pense-se especialmente em Romanos, 1 e 2
Coríntios, Gálatas — podemos esperar naturalmente um uso muito
mais extenso de
* Ir aos ares = exasperar-se; ir pelos ares = ser destruído por
explosão – Aurélio, verbete “ares”.

Tito (William Hendriksen)

18

partículas de transição e inferência que num manual de


advertências e instruções para “pastores”. Nesta buscamos e
encontramos o modo imperativo.

Em resumo, estamos diante de Paulo, “já ancião” (denominação que


se dá já em Fm 9), escrevendo uma carta. Usa um homem de idade
avançada o mesmo vocabulário de um jovem? Apesar das
vigorosas negações, não é possível que a idade e a experiência de
estar na prisão, seja recente no passado ou no momento de
escrever, tenha algo que ver com o vocabulário, com a gramática,
ou com ambos?

O autor das Pastorais está escrevendo a colaboradores muito


íntimos, comissionados por ele mesmo. Hoje em dia, quando o
ministro de uma congregação grande dá conselho ao seu ajudante,
com quem tem um relacionamento amistoso, emprega o estilo
oratório do púlpito que usa nos domingos?

Ao escrever aos seus ajudantes, o autor os aconselha sobre a forma


de organizar a igreja, o que classe de anciãos devem ser
designados, o que se deve fazer com os hereges, etc. Temas desta
natureza, requerem o vocabulário que alguém usaria ao expor
diante da congregação a doutrina da “justificação pela fé”
(Romanos) ou da unidade de todos os crentes em Cristo” (Efésios)?
N. J. D. White, op. cit. , pp. 63, 65, 66, dá razão de algumas
palavras novas que aparecem nas Pastorais demonstrando que sua
presença é completamente natural em cartas que condenam as
heresias. Essas expressões as põe sob o cabeçalho

“Fraseologia polêmica referente a ensinos falsos”. Um exemplo é


“conversas profanas”.

Em conclusão, gostaríamos de perguntar aos críticos: No começo


de sua carreira como escritor, foi entregue ao apóstolo uma lista de
palavras com a exigência de que, não importa quais fossem as
circunstâncias suas ou de seus leitores, e sem importar o propósito
da epístola ou do tema que fosse escrever, usasse invariavelmente
essas palavras, e somente essas, e além disso, distribuí-las em
igual proporção em todas as suas cartas, como os lunares num traje
ou vestido de lunares? Em volume

Tito (William Hendriksen)

19

real, físico, a herança literária que Paulo nos legou não é de modo
algum imponente: somente 138 páginas pequenas no texto grego de
N. N. (para as dez epístolas). Temos direito a supor que o que está
escrito nestas 138

páginas (reduzidas a 63 páginas em português em RA) contém todo


o vocabulário e a sintaxe de Paulo, de modo que qualquer desvio
(em palavras ou gramática) que um encontra nas Pastorais
demonstra que estas devem ser atribuídas a outro autor? Tem
alguém o direito de aplicar aos escritos de Paulo um critério que,
aplicado a Milton, Shelley e Carlyle, despojá-los-ia de grande parte
de sua obra?

O argumento baseado no vocabulário e na gramática não conduz a


parte alguma. Até o mais zeloso defensor da autenticidade das
Pastorais reconhecerá com prontidão que há uma notável diferença
em vocabulário, quando se comparam as três com as dez, assim
como há uma variação considerável quando cada uma das três se
compara com uma ou com as outras duas. É inteiramente possível
que as explicações que foram dadas — tais como, a idade de Paulo
e seu encarceramento (passado ou presente), o caráter dos leitores,
os temas abrangidos, o propósito — não sejam razão suficiente para
estas diferenças. Também podem ter afetado outros fatores, por
exemplo, o rápido avanço e desenvolvimento da igreja como uma
nova entidade, crescente, mutável e vigorosa, e a necessidade de
criar uma nova fraseologia. Expressões tais como “guardar o
depósito”, “seguir a doutrina” e “homem de Deus”

são consideradas como pertencentes a esta categoria por White.


Podemos supor que aqui Paulo está usando fraseologia que ouve
ao redor dele.

Além disso sugeriu-se que em certa medida o “secretário” ou os

“secretários” podiam ter influenciado no produto final. Sobre isso,


veja-se nota 193 no final do capítulo 2 de Tito.

No entanto, cabe assinalar isso: o dever de provar fica inteiramente


sobre os críticos negativos. Não é o crente conservador que
pretende que o vocabulário e a gramática demonstram que Paulo foi
o autor; são os críticos que proclamam em voz alta que o
vocabulário e a gramática indicam que Paulo não pôde ter sido o
autor. Os críticos literários dos

Tito (William Hendriksen)

20

primeiros séculos, que estavam bem conscientes das peculiaridades


gramaticais e do estilo, e portanto puderam pôr em dúvida que
Paulo fosse o autor de Hebreus, jamais tiveram dificuldades com as
Pastorais.

O crítico moderno fracassou completamente em sua intenção de


demonstrar sequer que uma só palavra do total do vocabulário das
Pastorais não tenha sido escrita por Paulo. Tratei isto em detalhe
em conexão com o vocabulário do segundo capítulo de Tito. Veja-se
nota 193.

(2) O estilo das Pastorais delata sua falsa origem.


Ao falar de estilo, alguns usam a palavra em certo sentido que se
aproxima de “vocabulário”, “dicção”. Isto já se discutiu. No entanto,
outros dão uma conotação mais ampla e sob esta divisão discutem
o que o autor das Pastorais diz e em especial como o diz, o caráter
geral de seus pensamentos e particularmente o modo como os
expressa. Aqui tomaremos a palavra neste sentido mais amplo.

Em um assunto estão de acordo os críticos, ou seja, na afirmação


que o estilo das Pastorais indica em direção oposta a Paulo. Mas
quando se expõe a pergunta “por quê?”, as respostas se dividem e
se tornam contraditórias, alguns afirmando que o próprio estilo é
totalmente não paulino: outros, que em tantos pontos faz lembrar a
Paulo, que deve ter havido um falsificador, um imitador consciente.
Deve ter uma cópia das epístolas genuínas de Paulo diante de si.
Destas, ele copiou uma e outra frase, agindo como se fosse Paulo.

Desta confusão no campo dos críticos há somente uma forma


segura de retirar-se gracioso, isto é, com um exame imparcial dos
próprios fatos. Estes indicam a Paulo como autor. Observe-se os
seguintes:

Nestas breves cartas encontramos o mesmo tipo de pessoa que se


revela nas dez. O que aqui se reflete é o caráter de Paulo, bem
como, por exemplo, em 1 Tessalonicenses e 2 Tessalonicenses.
Veja-se C.N.T.

sobre 1 e 2 Tessalonicenses, p. 22. O autor das Pastorais está


profundamente interessado nas pessoas às quais se dirige, isto é,
em

Tito (William Hendriksen)

21

Timóteo e Tito, demonstrando um cálido afeto por eles (1Tm 1:2;


5:23; 6:11, 12; 2Tm 1:2, 5, 6, 7; 2:1, 2, 15, 16; 4:1, 2, 15; Tt 1:4). Faz
deles partícipes de suas experiências e gosta de elogiar qualquer
coisa boa que vê neles (1Tm 1:8; 3:10–15; 4:5–8; Tt 1:4). Atribui à
graça de Deus qualquer bem que haja em si ou nas pessoas a
quem se dirige (1Tm 1:12–17; 4:14; 2Tm 1:6, 7, 13, 14; 2:1). Mostra
um tato maravilhoso em seus conselhos (1Tm 1:18; 4:6, 11–16; 5:1;
6:11–16; 2Tm 1:2–7; Tt 1:4; 2:7). Trata uma por uma as matérias de
especial preocupação para Timóteo e Tito (evidentes a todo aquele
que leia estas três breves cartas de começo a fim). Está ansioso
para vê-los (2Tm 1:4; 4:9, 11; Tt 3:12).

Além disso, é afeiçoado à figura chamada lítotes, isto é, afirmação


de algo negando o oposto. Pode ser considerada uma espécie de
proposição em que se diz menos que o que realmente há. Assim,
em vez de dizer que está orgulhoso de pregar a Cristo, declara que
“não se envergonha” dAquele em quem creu (2Tm 1:12; cf. 1:8, 16).
De forma semelhante declara que a Palavra de Deus “não está
presa” (2Tm 2:9) e que Deus é Aquele que “não mente” (Tt 1:2). Isto
lembra poderosamente a Paulo, o homem que declarou ser cidadão
de “uma cidade não insignificante” (At 21:39); que “não foi rebelde” à
visão celestial (At 26:19); que “não se envergonha do evangelho”
(Rm 1:16); que sua visita aos tessalonicenses “não foi infrutífera”
(1Ts 2:1); que sua exortação

“não procedeu de erro” (1Ts 2:3); que “não quer que os leitores
estejam ignorantes” (1Ts 4:13); e lhes diz: “não vos canseis de fazer
o bem” (2Ts 3:13).

Ele gosta das enumerações. Assim, agrupa as virtudes ou vícios,


fazendo listas deles em forma de série (1Tm 3:1–12; 6:4, 5; 2Tm
3:2–5; 3:10–11; Tt 3:3). Isto é exatamente o que Paulo faz nas
demais epístolas (veja-se Rm 1:29–32; 2Co 12:20; Gl 5:19–23).

Não é relutante introduzir aqui ou ali um “jogo de palavras”. Assim


admoesta o rico a pôr sua esperança nAquele que dá ricamente
(“em grande quantidade”, NTLH, 1Tm 6:17). Põe em contraste os
“amigos dos prazeres” com os “amigos de Deus” (2Tm 3:4). Informa-
nos que um

Tito (William Hendriksen)


22

dos propósitos das escrituras inspiradas é que “o homem de Deus


seja perfeito, perfeitamente preparado (ou completo, completamente
equipado) para toda boa obra” (2Tm 3:17, passagem em que RA, ao
traduzir perde o jogo intencional de palavras). Admoesta a Timóteo
que ao pregar a Palavra “insta a tempo e fora de tempo” [2Tm 4:2,
TB].

Aqui novamente se pensa inevitavelmente em Paulo e sua afeição


ao mesmo estilo característico. É Paulo quem, conhecedor do fato
de que o nome judeu (cf. Judá) significa “que Ele ( Deus) seja
louvado”, escreve,

“mas sim é judeu … o louvor daquele que não vem dos homens,
mas de Deus” (Rm 2:29). Também é Paulo que se vale do fato de
que o nome de um escravo fugitivo seja Onésimo, que significa útil,
proveitoso, benéfico: “Rogo-te por meu filho Onésimo … o qual em
outro tempo foi inútil ( não proveitoso), mas agora a ti e a mim nos é
útil ( proveitoso)”.

Além disso, a Paulo gosta dos “compostos breves” (E. K. Simpson).

Com frequência escolhe palavras que estão compostas por várias


palavras (às vezes uma ou mais preposições com um verbo). Assim,
ele é quem diz que o Espírito Santo nos ajuda em nossa fraqueza.
Agora, esta palavra ajudar originalmente significa ele toma
(λαμβάνεται, junto com (σύν) uma pessoa, quer seja em frente
dessa pessoa ou tomando seu lugar, de modo que leva a carga em
vez (ἀντί) dessa pessoa. O verbo completo é συναντιλαμβάνεται. 8

Aqui também as Pastorais são parecidas com as dez, com


compostos tais como καταστρηνιάσωσιν (impulsionadas por seus
desejos, 1Tm 5:11), διαπαρατριβαί (disputas mútuos ou fricções
incessantes, 1Tm 6:5), εὑμετάδοτοι (disposto a compartilhar com
outros, generoso, 1Tm 6:18), θεόπνευστος (inspirado por Deus, 2Tm
3:16), e αὑτοκατάκριτος (condenado por seu próprio juízo, Tt 3:11).
É bem conhecido o amor de Paulo pelas frases em aposto — veja-
se por exemplo, Rm 12:1 “que vos apresenteis em sacrifício vivo …
(que é) 8 Discuti este verbo em minha dissertação doutoral: “O
significado da preposição anti no Novo Testamento”, pp. 83, 84.

Tito (William Hendriksen)

23

o vosso culto racional” — e pode ser ilustrado por várias passagens


das dez epístolas. Casos semelhantes de aposto ocorrem através
das Pastorais. Veja-se, por exemplo, 1Tm 1:17; 3:15, 16; 4:10, 14;
6:14, 15; 2Tm 1:2; 2:1; Tt 1:1, 10; 2:14.

O surto repentino de doxologias, característico encontrado ao


estudar as dez (veja-se Rm 9:5; 11:36; 16:27; Ef 1:3ss.; 3:20),
aparece mais uma vez nas Pastorais (1Tm 1:17; 6:15, 16; 2Tm 4:18;
e cf. outros casos de estilo elevado — “quase doxologias” — em
1Tm 3:16; Tt 2:13, 14).

A expressão de sua indignidade pessoal (Ef 3:8; 1Co 15:9) aparece


em 1Tm 1:13; a fraseologia “se não … como …?” (1Co 14:6, 7, 9)
encontra-se também em 1Tm 3:5; além disso, quem senão o Paulo
que conhecemos das dez epístolas poderia ter escrito essa linha
intensamente pessoal e exuberante: “pelejei a bom combate, acabei
a carreira, guardei a fé”, etc. (2Tm 4:7, 8)?

Um olhar às frases de pastorais que Harrison sublinhou (para indicar


que também se encontram nas dez) acrescenta à acumulação de
evidência em favor de Paulo como autor, embora não fosse a
intenção de Harrison apoiar essa conclusão.

O argumento segundo o qual Paulo não pôde ter escrito as


Pastorais porque o estilo de certas passagens nas dez não é
característico de 1

Timóteo, 2 Timóteo, e Tito prova muito ou não prova nada. Existe


algum escritor notável que sempre, em todas as circunstâncias, em
todas as épocas de sua vida, e sem importar aos quais escreve ou
sobre o que tema escreve, empregue o mesmo estilo sem variação?

Naturalmente, reconhecemos que há um notável contraste entre as


orações de estrutura longa e complicada de passagens como Ef
1:3–14; Fp 2:5–8, por um lado, e as muitas admoestações breves e
cheias de conteúdo das Pastorais, por outro. Mas, é justa esta
comparação? As orações longas não estão completamente
ausentes das Pastorais (veja-se 1Tm 1:5–7; 1:8–11; 1:18–20; 2:5–7;
etc.). As declarações breves aumentam nas dez.

Tito (William Hendriksen)

24

Tampouco é justo comparar o tom exuberante de certos parágrafos


nas dez com o modo de expressão mais calmo e prosaico que
caracteriza grande parte do material das Pastorais. Não se deveria
comparar 1Tm 2:8–15 com o vigoroso clímax de Romanos 8, mas
com uma passagem mais ou menos semelhante: 1Co 11:1–16.
Tampouco se deveria pôr Tt 3:9–14 ao lado de 1 Coríntios 13, mas
junto a 1Ts 5:12–22 para comparação. Se as variações no estilo
demonstram a mão de outro autor, o autor de 1 Coríntios 13 não
pode ter escrito a epístola a Filemom, e o autor de Romanos 8 não
poderia ter escrito sequer Romanos 13!

Além disso, não é inteiramente natural que o homem que estava


bem entrado em anos ao escrever as Pastorais, agora, quando a
carreira chega ao seu final, empregue um estilo mais reservado?
Surpreende-nos que com frequência nas pastorais notemos que
esse rude ardor e fogoso vigor dos primeiros anos tenha
desaparecido?

Ao comparar as Pastorais com aquelas seções das dez que formam


a base de uma comparação legítima, fica claro — como foi
observado por numerosos exemplos — que seu estilo é
caracteristicamente paulino. Na verdade, tão notavelmente paulino é
o estilo destas três breves cartas, que vários críticos estão dispostos
a fazer uma concessão. Admitem que em um e outro lugar encontra-
se material verdadeiramente paulino; por exemplo, as notas
pessoais que se encontram em 2Tm 4:6–22. Nesse parágrafo, ele
pede a Timóteo que venha antes do inverno e traga a

“capa” do prisioneiro e os livros, especialmente os pergaminhos.


Demas é representado como um renegado, Lucas como leal. Há um
breve esboço de sua “primeira defesa”. Saudações pessoais são
dadas a vários indivíduos. Uma passagem semelhante é Tt 3:12.

Embora alguns críticos (especialmente alguns dos primeiros)


tenham sido tão ousados para considerar que essas notas pessoais
são obra de um ardiloso falsificador (que procurou dar cor e
verossimilhança ao seu hábil produto literário, e que inventou
situações irreais — mas de aparência real — com o fim de obter seu
objetivo, enquanto ao mesmo

Tito (William Hendriksen)

25

tempo mostrava um profundo respeito pela verdade), esta solução


não encontrou uma aceitação geral.

É objetável desde muitos ângulos. É dificilmente provável que um


falsificador usasse tantos nomes pessoais. Além disso, teria se visto
apressado em fazer com que seus nota de toque pessoal tivessem
um aspecto tão real e vívido. Certamente não teria falado num tom
tão desfavorável de Demas (2Tm 4:10), que em nenhuma outra
parte é descrito por Paulo como um desertor, um homem que se
tinha apaixonado por mundo (cf. Cl 4:14; Fm 24).

Mas, é melhor a alternativa proposta por outros críticos negativos?

Essa alternativa converte o autor das Pastorais num armador de


quebra-cabeças que tomou certas passagens verdadeiramente
paulinas, acomodou-as em sua própria composição, e desse modo
criou a impressão de que Paulo era o autor de tudo.
Mas esta teoria não explica como é que os passos do material
genuíno ao falsificado é feito de forma tão suave. Como se tem
observado, poderia esperar-se que se notassem as costuras! Além
disso, não é estranho que da correspondência original entre o
grande apóstolo e seus associados tenham ficado somente umas
poucas notas pessoais genuínas? Em resumo, a teoria é vulnerável
em diversos aspectos, e atualmente é rejeitada por muitos dos
mesmos críticos negativos. Albert Schweitzer, como era de esperar,
nega que Paulo seja autor das Pastorais, assinala que os repetidas
tentativas de descobrir nelas “as curtas notas escritas por Paulo”
são “vãs”. 9

No entanto, a verdadeira alternativa à teoria de “tesoura e a cola” ou


do “quebra-cabeças” dos críticos, não é negar completamente que
Paulo foi autor, mas sim, de acordo com os dados apresentados, a
aceitação de Paulo como o autor de todo o conteúdo. O argumento
do estilo, quando 9 A. Schweitzer, The Mysticism of Paul the
Apostle, versión inglesa de William Montgomery, Nova York, 1931, p.
42.

Tito (William Hendriksen)

26

se leva em conta todos os fatos, aponta somente um sentido, ou


seja, que Paulo é o autor das Pastorais.

(3) A teologia não é a de Paulo. A cruz já não ocupa o centro. Há


uma ênfase indevida nas boas obras.

Causa assombro que ainda se use este argumento. Qualquer leitor


da Bíblia RA que estude cuidadosamente as Pastorais do princípio
ao fim e que esteja familiarizado com a doutrina de Paulo como se
apresenta nas outras dez epístolas, pode responder facilmente aos
críticos neste ponto.

Naturalmente, é verdade que nas Pastorais não há uma exposição


detalhada da doutrina da salvação pela fé em Cristo, sem as obras
da lei.

No entanto, essa doutrina se declara de forma inequívoca em mais


de uma passagem, e se dá por sentado no todo.

A verdade é que a doutrina que se ensina nas Pastorais e que se


pressupõe é claramente a mesma que se sustentou nas dez: Os
redimido foram escolhidos desde a eternidade. Eles são chamados
de eleitos (2Tm 2:10; cf. Ef 1:4; 1Ts 1:4).

A salvação deles deve-se à graça de Deus em Cristo, e não às


obras humanas (1Tm 1:14; 2Tm 1:9; Tt 3:5; cf. Gl 2:16; Rm 3:21–
24).

Cristo é Deus (Tt 2:13; cf. Rm 9:5; Fp 2:6; Cl 2:9).

Ele é mediador entre Deus e o homem, sendo o próprio Senhor


Jesus Cristo um homem (1Tm 2:5; cf. Rm 9:5; 1Co 8:4, 6).

Seu propósito ao vir ao mundo e assumir a humanidade foi salvar


pecadores, dos quais Paulo se considera o primeiro (1Tm 1:15; cf.
2Co 8:9; 1Co 15:9; Ef 3:8).

Os homens são salvos pela fé neste Mediador divino e humano,


Jesus Cristo (2Tm 1:12; cf. Rm 1:17; Ef 2:8).

Esta fé implica a união mística com Cristo: morrer com Ele, viver
com Ele; sofrer com Ele; reinar com Ele (2Tm 2:11, 12; cf. Rm 6:8;
8:17).

As boas obras são necessárias (1Tm 2:10; 6:11, 18; 2Tm 2:22;
3:17), e devem considerar-se como fruto da graça de Deus
(portanto,

Tito (William Hendriksen)

27
fruto da fé) que opera no crente (Tt 2:11–14; 3:4–8; cf. Gl 5:22–24;
Ef 2:10).

A glória de Deus é o propósito principal do homem (1Tm 6:16; 2Tm


4:18; cf. Rm 11:36; 16:27).

Em tudo isso, onde está o contraste em doutrina, contraste


supostamente tão marcante e definido que o autor das dez não
poderia ter sido autor das três? Quando na literatura, até na recente,
ainda se defende uma posição tão completamente insustentável e
não se proporciona evidência de nenhum tipo, você se sente levado
a perguntar, “é a alta crítica verdadeiramente científica?”

Deus, em Sua providência, de forma muito apropriada cuidou para


que nas três epístolas finais de Paulo se enfatize o fruto (boas
obras) da fé, uma vez que nas cartas precedentes se apresentou a
natureza da fé e a necessidade dela em contraste com as obras da
lei. Primeira é a árvore; logo vem o fruto.

(4) As Pastorais atacam o gnosticismo do segundo século,


especialmente o marcionismo. Agora, Marcião foi expulso da igreja
de Roma no ano 144 d. C. Portanto, as Pastorais devem ter sido
escritas ao redor dessa data, isto é, não antes do segundo quarto do
segundo século.

Isso demonstra que Paulo não pode ter sido seu autor.

Para dar apoio ao ponto de vista de que quem quer que tenha
escrito as Pastorais aqui está combatendo o ponto de vista dos
gnósticos do segundo século, geralmente se enfatiza os seguintes
pontos: (a) As “genealogias” (1Tm 1:4; Tt 3:9) são os “éons”, que
emanam do seio de Deus, dos gnósticos do segundo século.

(b) As “fábulas” (Tt 1:14) ou “mitos” representam especulações


gnósticas do segundo século.

(c) As práticas ascéticas contra as quais o autor faz uma


advertência ao condenar os pontos de vista daqueles que proíbem o
casamento e impõem a abstinência de alimentos (1Tm 4:3)
assinalam a Marcião, que praticou o mais estrito dos ascetismos,
rebelando-se contra o casamento, a carne e o vinho.

Tito (William Hendriksen)

28

(d) A negação da ressurreição corporal (2Tm 2:18) era uma


característica do dualismo gnóstico do segundo século.

(e) As afirmações que toda a Escritura é inspirada e útil (2Tm 3:16),


e que há um só Deus (1Tm 2:5) não podem deixar de lembrar a
Marcião, que rejeitava todos os livros do Antigo Testamento e
estabelecia uma aguda antítese entre o Jeová puramente justo do
Antigo Testamento e o Deus da graça do Novo Testamento (e. d., da
edição mutilada do N. T. feita por Marcião).

(f) A aparição “do próprio título do livro de Marcião” ( Antítese=

“contradições”, RA) em 1Tm 6:20, confirma o argumento.


Certamente quem menciona o título da obra de um autor que
floresceu no segundo século não pode ter sido Paulo que morreu no
primeiro século.

Na verdade, é muito estranho que alguns ainda estejam repetindo


este argumento de seis pontos que com tanta frequência foi
refutado, quer seja como em todo ou em parte, como se tivessem
pelo menos um considerável elemento de valor. A resposta é clara e
simples: Com relação a (a): As “genealogias”, à luz de todo o
contexto, são claramente judaicas em natureza. Vêm imediatamente
á mente as que se encontram no livro do Gênesis (cf. também
Crônicas). No Livro de Jubileus abundam as especulações que
adornam nomes e histórias do Antigo Testamento. Os judeus eram
mestres consumados na arte da eisegese (introduzir os
pensamentos e sentimentos do leitor na passagem; oposto a
exegese: extrair o sentido que o autor lhe deu). Agora, Marcião
mesmo não discute os éons. Não se deve confundir seu ensino com
a de Valentim. Mas em nenhum lugar da literatura gnóstica usa-se a
palavra

“genealogia” como sinônimo de eón.

Com relação a (b): As “fábulas” ou “mitos” definitivamente são


chamadas judaicas (Tt 1:14). Portanto, simplesmente não é justo
igualá-

las com as extravagâncias do gnosticismo do segundo século.

Com relação a (c): Os críticos parecem esquecer que o apóstolo


Paulo advertiu contra tendências ascéticas semelhantes em Cl
2:16–23.

Tito (William Hendriksen)

29

Então, devemos concluir que Colossenses também pertence ao


segundo século?

Além disso, poderíamos admitir prazerosamente que 1Tm 4:3

adverte contra o gnosticismo ascético, tal como o de Marcião. Mas


isso não prova que o autor era contemporâneo de Marcião. Aqui não
há nada que esteja contra o fato de que um autor do primeiro
século, ou seja, Paulo, pôde, sob a direção do Espírito, predizer o
desenvolvimento de um erro no segundo século que, de forma
incipiente, já existia em seu próprio tempo.

Com relação a (d): A negação da ressurreição do corpo «é tão


antiga quanto as colinas». Manifestou-se em formas diferentes. Às
vezes a ideia da ressurreição do corpo foi franca e diretamente
rejeitada. Em outras ocasiões, a rejeição era por implicação, como
em nosso tempo: atribuía-se um sentido espiritual à palavra
ressurreição. Por exemplo, isto o faziam os hereges descritos em
2Tm 2:18. Em todo caso, à vista do longo argumento de Paulo em 1
Coríntios 15 contra os que diziam: “Não há ressurreição dos
mortos”, é evidente que a afirmação: “a ressurreição já se efetuou”
(2Tm 2:18) não prova o que os críticos estão tentando de provar.
Não prova que Paulo não escreveu as Pastorais.

Com relação a (e): As passagens a que se faz referência deveriam


ser lidas à luz de seus próprios contextos específicos. Então, fica
claro que quando o autor está falando de um Deus, não está
contrastando um Deus do Novo Testamento com um “demiurgo” do
Antigo Testamento.

Tampouco está pondo o Antigo Testamento numa relação antitética


com o Novo quando usa a expressão “toda a Escritura”. Está
contrastando o uso incorreto com o uso correto das Escrituras. Se
for feito uso correto das Escrituras de modo que se permaneça em
seu claro ensino, a conclusão iniludível será que “toda a Escritura é
inspirada por Deus e útil”.

Finalmente, com relação a (f): Se tiver algum valor, equivaleria ao


seguinte silogismo:

Tito (William Hendriksen)

30

Premissa maior: O autor das Pastorais faz uso da palavra

“antítese”.

Premissa menor: Marcião, herege do segundo século, também faz


uso da palavra “antítese”, no título de um

livro que ele escreveu.

Conclusão: Portanto, o autor das Pastorais deve ter conhecido o


livro de Marcião.

De forma semelhante poderia dizer-se:


Premissa maior: O autor do livro do Gênesis escreve sobre o
Paraíso, o rio, a árvore da vida, a serpente.

Premissa menor: O apóstolo João, autor de fins do primeiro século


d.C., emprega as mesmas palavras em

seu livro do Apocalipse.

Conclusão: Portanto, o autor do livro do Gênesis deve ter lido


Apocalipse.

Agora, quem quer que leia 1Tm 6:20 com a mente livre de
preconceitos e à luz de toda a epístola, facilmente chegará à
conclusão de que ao falar de “antítese”, o que o autor está
pensando não é no contraste que Marcião fazia entre o cristianismo
e o judaísmo, mas nas opiniões conflitivas daqueles que
especulavam com as genealogias judias. Na verdade, trata-se de
uma pura coincidência verbal entre uma palavra usada por um autor
e um título usado por outro, e não se pode empregar como
argumento convincente para determinar o autor.

Além do dito em resposta ao argumento dos críticos, note-se o


seguinte:

Cada vez mais, é hoje reconhecido que o gnosticismo não surgiu de


repente no segundo século, mas se originou muito antes na história.

Além disso, não é um sistema organicamente unificado, mas um


sincretismo ou acréscimo, ao qual contribuíram não apenas a
filosofia platônica, mas também o misticismo oriental, o judaísmo
cabalístico e o cristianismo. Portanto, embora seja verdade que a
heresia condenada

Tito (William Hendriksen)

31
pelas Pastorais tinha certos aspectos em comum com o gnosticismo
do segundo século, isto de maneira nenhuma as identifica como
uma só.

O erro contra o qual advertem as Pastorais é presente (1Tm 1:3–7,


19; 4:7; 6:4, 5, 9, 10, 17; 2Tm 2:16–18; Tt 1:10–16; 3:9) e ao mesmo
tempo futuro (1Tm 4:1–3; 2Tm 3:1–9) — tomados em conjunto
abrangem toda a nova dispensação até a vinda de Cristo —; é, ao
mesmo tempo, principalmente doutrinário (1Tm 4) e principalmente
moral (2Tm 3); produz-se dentro e fora das portas.

No entanto, um fato é muito evidente, ou seja, que no principal o


erro que aqui se condena tem que ver com a lei do Antigo
Testamento e sua interpretação (veja-se 1Tm 1:7; cf. 6:4, 5; 2Tm
4:4; Tt 1:14; 3:9).

Nisso está a ênfase. E foi exatamente esta lei com a qual nada teve
que ver o gnosticismo do segundo século. Portanto, nada há aqui
que impulsione a alguém a buscar um autor do segundo século. Ao
contrário, tudo aponta ao primeiro século e ao tempo e a época de
Paulo.

Pelas razões indicadas, não é surpreendente que mesmo entre


críticos os autores mais cuidadosos já não mencionem «o
argumento baseado na heresia que aqui se condena». Parece que
gostariam de esquecer que foi usado de maneira séria para negar
que Paulo é o autor das Pastorais.

(5) As Pastorais revelam um marcado progresso na organização


eclesiástica, muito mais que no tempo de Paulo. Em seu tempo
ainda não existia um ministério oficial. Por outro lado, no tempo em
que as Pastorais foram escritas, havia uma organização complexa,
com pessoal assalariado cujos requisitos se regulamentaram.

Um crítico o denomina «o principal argumento» que demonstra que


Paulo não pôde ter escrito as Pastorais. Alguns procuram “reforçá-
lo”
afirmando que o início da organização piramidal é evidente pelo fato
de que as Pastorais reconhecem somente um “bispo” (1Tm 3:1, 2;
Tt 1:7), e falam de vários “presbíteros” ou “anciãos” (Tt 1:5) que
evidentemente estavam servindo sob sua direção.

Tito (William Hendriksen)

32

No entanto, outros críticos evitam escrupulosamente a referência a


este argumento em qualquer de suas formas. Aparentemente
também neste caso queriam esquecer que alguém o elaborou. E, na
verdade, entre os muitos argumentos pobres que se apresentaram
em defesa da teoria de que Paulo não pôde ter escrito as Pastorais,
este é um dos piores. Os fatos são os seguintes:

(a) Toda a concepção de que o ofício eclesiástico (comissão divina


que implicava autoridade sobre vida e doutrina) foi surgindo com o
passar do tempo está errônea. É simplesmente incorreto dizer que
no princípio só havia liderança espontânea baseada somente nos
dons espirituais, e que num tempo posterior isto deu lugar aos
ofícios eletivos.

Veja-se C.N.T. sobre o Evangelho de João, vol. II, pp. 461, 462.

Naturalmente, é verdade que os ofícios extraordinários foram


gradualmente dando lugar aos comuns. As Pastorais são os últimos
escritos de Paulo. Portanto, não é surpreendente que o ofício
“comum”

de “inspetor” (bispo) ou “ancião” aqui se torne proeminente.

(b) A noção de que no tempo de Paulo não havia ainda um


ministério oficial está em conflito com os fatos mencionados nas
Escrituras. Jerusalém tinha seus diáconos (homens que “serviam as
mesas”) muito antes que Paulo empreendesse suas viagens
missionárias (At 6:1–6). Desde seus primeiros tempos a igreja tinha
anciãos (At 11:30), ofício que em certo sentido foi uma prolongação
natural da instituição de anciãos no Israel antigo. Já em sua primeira
viagem missionária Paulo tinha constituído “anciãos em cada igreja”
(Hch.

14:23). Indicou-se que numa das primeiras cartas escritas por Paulo
se menciona definidamente “os que trabalham entre vós, e vos
presidem no Senhor, e vos admoestam” (veja-se C.N.T. sobre 1Ts
5:12, 13). Ao voltar de sua terceira viagem missionária, Paulo “fez
chamar os anciãos da igreja” (de Éfeso ou de Éfeso e seus
arredores). São caracterizados como bispos sobre o rebanho, a
igreja “de Deus, a qual ele comprou com o seu próprio sangue” (At
20:17, 28). Numa epístola escrita da prisão são mencionados
“bispos e diáconos” (Fp 1:1).

Tito (William Hendriksen)

33

Agora, baseados em tudo isso, certamente não deveria causar


surpresa que nas epístolas que o apóstolo escreveu pouco antes de
sua morte seja bem conhecido o ofício de “bispo” ou “ancião”.
Também é muito natural que Paulo, prestes a partir da esfera
terrestre, especifique certos requisitos e normas para o ofício, de
modo que a igreja possa proteger-se dos ataques do erro, tanto
doutrinário quanto moral.

(c) Nas Pastorais as expressões “ancião” (ou “presbítero”) e “bispo”

são sinônimas, como o demonstra Tt 1:5–7 (cf. 1Tm 3:1–7; Fp 1:1;


1Pe 5:1, 2). Veja-se o comentário sobre essa passagem.

(d) O sistema de governo episcopal, em que o bispo tem autoridade


sobre os presbíteros, parece ter surgido durante um escuro período
de transição: o fim do primeiro século e o princípio do segundo.
Surge passo a passo e se torna evidente pela primeira vez nas
epístolas de Inácio de Antioquia (que sofreu o martírio
aproximadamente no ano 110
d.C.), onde aparece como um episcopado congregacional (não
diocesano). 10 Agora este mesmo fato indica que as Pastorais, em
que o

“bispo” é simplesmente outro nome para o “ancião” ou “presbítero”,


correspondem ao primeiro século e não ao segundo.

(6) Uma vez que Paulo não foi posto em liberdade de seu primeiro e
único encarceramento em Roma, mas foi morto, e uma vez que o
livro de Atos, que conta a história de sua vida desde que perseguia
a igreja até o fim de seu encarceramento, não deixa lugar para as
viagens que estão implícitas nas Pastorais, Paulo não pôde ter
escrito estas epístolas.

J. Moffatt declara atrevidamente que na verdade Paulo não saiu de


seu encarceramento. 11 Este ponto de vista foi defendido por muitos
antes e depois dele.

Agora, se isto fosse correto, os críticos teriam ganho seu


argumento, porque é verdade que as Pastorais implicam uma
quantidade 10 Veja-se um resumo de todo o argumento a respeito
do surgimento do episcopado em P. Schaff, History of the Christian
Church, Nueva York, 1924, Vol. 2, pp. 132–148.

11 Veja-se sua Introduction to the Literature of the New Testament,


terceira edição, 1918, p. 417.

Tito (William Hendriksen)

34

de viagens que não podem enquadrar-se nos itinerários de Paulo


que se relatam no livro de Atos, e, para os quais na verdade não se
pode achar lugar no espaço da vida do apóstolo que cobre Atos. O
seguinte esclarecerá isto:

No que respeita a 1 Timóteo, o autor lembra Timóteo que lhe


ordenou ficar em Éfeso enquanto ele se dirigia a noroeste de Éfeso
a Macedônia (1Tm 1:3). Também informa a Timóteo que ele (o
autor) espera ir logo vê-lo (1Tm 3:14).

Agora, segundo Atos, em sua primeira viagem missionária Paulo


não passou a Europa (para a Macedônia). Na segunda viagem: na
viagem de ida o Espírito Santo o proibiu de falar a palavra na Ásia
(At 16:6); portanto, não esteve em Éfeso; e na viagem de volta foi de
Corinto para o oriente a Éfeso, logo para o sudeste, via Cesareia a
Antioquia (At 18:18–23). Na terceira viagem, na ida, Paulo realizou
uma poderosa tarefa em Éfeso (At 19). Continuou ali longo tempo
(três anos, At 20:31) e também cruzou depois para a Macedônia (At
20:1). Mas desta vez Timóteo não foi deixado em Éfeso, mas foi a
Macedônia e Corinto (At 19:21, 22; 1Co 4:17; 16:10), e logo esteve
de volta a Macedônia junto a Paulo (2Co 1:1). Logo vai com Paulo a
Corinto, volta com ele a Macedônia, espera-o em Trôade, e
provavelmente está com ele em Jerusalém (Rm 16:21; At 20:3–5;
1Co 16:3). Finalmente, em sua viagem a Roma, Éfeso ficou a longa
distância ao norte. Chegando a Roma seguiram dois anos de
encarceramento. E o livro de Atos termina com o relato desse
acontecimento. É claro que neste relato do livro de Atos não há
lugar para a viagem que supõe 1 Timóteo.

Com relação a Tito a situação é semelhante. Segundo esta Epístola


Pastoral, o escritor deixou Tito em Creta para completar a
organização das igrejas nessa ilha (Tt 1:5). Agora lhe ordena que se
reúna com ele em Nicópolis (em Épiro na costa oriental do mar
Jônico), onde espera passar o inverno (Tt 3:12).

Mas, segundo Atos, em nenhuma das três viagens missionárias


Paulo se aproximou de Creta. E na viagem a Roma, embora ele e
Lucas

Tito (William Hendriksen)

35

navegassem “a sota-vento de Creta”, e chegassem a Bons Portos, o


apóstolo é apresentado como um prisioneiro, que não desenvolve
atividade de evangelização de nenhuma espécie na ilha e que não
podia dizer nada sobre o lugar onde esperava passar o inverno ou
onde desejava encontrar a Tito (veja-se At 27:7–15).

E, finalmente, 2 Timóteo descreve um prisioneiro (em Roma, cf.

2Tm 1:17), considerado “malfeitor” (2Tm 2:9), na véspera de sua


execução. Humanamente falando, as perspectivas são muito tristes
(mas veja-se 2Tm 4:7, 8). Somente depois de buscá-lo
diligentemente, pôde Onesíforo encontrá-lo (2Tm 1:16, 17). Em
nenhuma parte é vista sua libertação. Quase todos o abandonaram.
Somente Lucas está com ele (2Tm 1:15; 4:10, 11). Chegou (ou está
prestes a chegar) o momento de sua partida do cenário terrestre
(2Tm 4:6, 18).

Em agudo contraste com isso, a descrição do encarceramento


romano que se relata em Atos e nas epístolas de Paulo da prisão
(com relação a isso certamente não entram neste quadro os
encarceramentos prévios) termina com esperança (cf. p. 34f). O
apóstolo vive numa casa alugada a seus gastos, e tem esperanças
de ser posto em liberdade em suma (At 28:30; Fp 1:25, 26; 2:24; Fm
22).

A conclusão é iniludível: se Paulo escreveu as Pastorais, deve ter


sido posto em liberdade do encarceramento romano relatado em
Atos.

Deve ter feito mais viagem e teve que ter sido preso mais uma vez.

Por longo tempo os críticos (intimidados pelo prestígio do Moffatt?)


ou negaram a historicidade de sua libertação ou pelo menos se
declararam ignorantes a respeito. No entanto, mais recentemente
parece ter-se iniciado o retorno à posição conservadora. Numa
edição da revista Journal of Biblical Literature, L. P. Pherigo alega
enfaticamente em favor da posição de que Paulo foi posto em
liberdade do encarceramento relatado em Atos e que trabalhou uns
poucos anos mais. 12
12 L. Pherigo, “Paul’s Life After the Close of Acts”, JBL LXX
(Diciembre, 1951), 277–284. Cf. a dissertação doutoral de N. G.
Veldhoen, “Het Proces van den Apostel Paulus”, Leiden, 1924. E
veja-se GThT, vol. 55, No. 2, 3 (1955), pp. 60, 61.

Tito (William Hendriksen)

36

Agora, qualquer um que estiver disposto a examinar a evidência,


perceberá que os argumentos contra a posição de que Paulo foi
posto em liberdade são muito fracas. Por exemplo, o argumento que
afirma que se Paulo tivesse sido posto em liberdade o autor de Atos
o teria anotado —

como se Atos fosse a biografia de Paulo! — deve enfrentar o contra


argumento, «se não tivesse sido posto em liberdade, Lucas
certamente o teria indicado assim, porque a nota favorável com que
termina seu relato fez com que os leitores esperassem sua
libertação» (At 28:30, 31). E não tem apoio a conclusão de que
Paulo jamais voltou para Éfeso e, portanto, não pôde ter escrito 1Tm
1:3, inferência que se deriva da declaração do apóstolo aos anciãos
efésios, isto é, “Eu sei que todos vós, em cujo meio passei pregando
o reino, não vereis mais o meu rosto” (At 20:25, cf. v.

38). Nessa passagem de Atos o apóstolo não disse: «Eu sei que
nunca voltarei para Éfeso», mas que não voltaria a reassumir
pessoalmente a tarefa de fazer excursões pela Ásia Menor, de
confirmar as igrejas e de ir de lugar em lugar, pregando o evangelho
do reino e, desse modo, não voltaria a ver os crentes de todos os
lugares onde tinha estado. Paulo nem sequer disse: «Eu sei que
nenhum de vós, anciãos que estais em Éfeso, verá novamente meu
rosto», mas sim: “Eu sei que todos vós, em cujo meio passei
pregando o reino, não vereis mais o meu rosto”. O

apóstolo estava se dirigindo aos anciãos como representantes das


igrejas da Ásia Menor. Com estas palavras não excluía a
possibilidade de uma breve visita a Éfeso. O que fica excluído é algo
comparável com a atividade diária de obra do reino na região de
Éfeso durante três anos (veja-se o contexto, At 20:31). 13

Os argumentos seguintes são em favor da posição tradicional (e que


consideramos correta) de que Paulo na verdade foi posto em
liberdade de seu primeiro encarceramento romano, fez algumas
outras viagens, em uma das quais escreveu 1 Timóteo e Tito, foi
tomado preso pela segunda 13 Assim também F. W. Gosheide em
seus comentários sobre esta passagem em Korte Verklaring.

Para uma solução diferente do problema de At 20:25, veja-se R. C.


H. Lenski, Interpretation of the Acts, pp. 843, 844.

Tito (William Hendriksen)

37

vez, encarceramento no final do qual escreveu 2Timoteo e logo foi


executado:

a. O livro de Atos faz com que o leitor espere a libertação de Paulo,


e poderia até implicar sua libertação.

Lucas constantemente enfatiza a relativa justiça, e às vezes as


qualidades de amizade e cooperação das autoridades romanas.
Resgatado pelo tribuno militar das mãos da turba assassina em
Jerusalém, permite-se a Paulo defender-se, primeiro diante do povo
e logo diante do concílio judaico (At 21:31–23:9). Mais uma vez é
resgatado pelo tribuno, desta vez das mãos de fariseus e saduceus
que disputam entre si (At 23:10); e ainda uma terceira vez, agora de
uma banda de mais de quarenta judeus ligados por um voto. É
trasladado a Cesareia. Cláudio Lísias escreve uma carta em seu
favor (At 23:12–35), dirigida ao governador Félix.

Este também permite que Paulo se defenda, mas, desejando fazer


um favor aos judeus, deixa-o na prisão. Quando Festo sucede Félix,
o apóstolo apela a César. Festo diz ao rei Agripa que Paulo nada fez
para que seja digno de morte, e lhe permite fazer sua defesa diante
do rei. No barco, rumo a Roma, o apóstolo é tratado humanamente
pelo centurião Júlio (At 27:3), que depois também lhe salva a vida
(At 27:43). Depois da tormenta e o naufrágio, tendo sido acolhidos
hospitaleiramente pelo chefe da ilha de Malta (At 28:7), e logo
depois de haver coberto a etapa final da viagem, chega a Roma,
onde lhe é permitido viver à parte, custodiado por um soldado (At
28:16). Embora se trate de um prisioneiro que espera seu juízo, é-
lhe concedida uma considerável liberdade pessoal assim como a
oportunidade de pregar o evangelho (At 20:30, 31).

Certamente a noção de que fosse então condenado e executado


desafina completamente com todo o relato precedente. Na verdade,
até se sugeriu (veja-se o artigo do Pherigo antes mencionado) que a
expressão

“permaneceu dois anos inteiros” numa casa alugada (ou “a seus


gastos”) poderia ter um sentido legal, isto é, que esperou os dois
anos inteiros (limite estabelecido pela lei?) durante os quais os
acusadores tinham a oportunidade de insistir com suas acusações.
Ao não aparecer nenhuma

Tito (William Hendriksen)

38

(é uma indicação nesse sentido At 28:21?) o juízo terminou por falta


de méritos, e Paulo foi posto em liberdade, cumprido o requisito
legal dos dois anos. Não se estabeleceu se esta interpretação é
correta. O

argumento principal é este: os capítulos finais de Atos sugerem uma


libertação e não uma execução.

b. As epístolas de Paulo escritas da prisão mostram que ele


esperava ser posto em liberdade (Fp 1:25–27; 2:24; Fm 22).

c. O próprio fato de que as Epístolas Pastorais, que pressupõem


viagens que requerem a libertação e um segundo encarceramento,
tenham sobrevivido e tenham sido aceitas pela igreja primitiva como
autênticas e inspiradas, parece apontar em direção de uma firme e
antiga tradição ao afeto.

d. Até muito antes do encarceramento em Roma que aparece em


Atos, o apóstolo tinha acariciado o desejo de ir a Espanha (Rm
15:24, 28).

e. Que foi posto em liberdade, foi a Espanha, depois foi encarcerado


pela segunda vez e, tendo dado testemunho diante das autoridades,
foi executado, é na verdade a interpretação mais natural da muito
discutida passagem de Clemente de Roma, que escrevendo na
última década do primeiro século d.C. desde Roma, o centro do
império, aos coríntios, admoestando-os a pôr fim a suas lutas
geradas pelo ciúme, diz:

“Paulo … tendo ensinado a justiça a todo mundo, e tendo alcançado


até os limites do ocidente, e tendo dado testemunho diante dos
governadores, deixou este mundo e foi levado ao Lugar Santo,
tendo deixado um exemplo sobressalente de paciência” (Primeira
Epístola de Clemente aos Coríntios, V. vii).

A expressão “os limites do ocidente”, especialmente quando usada


por alguém que escreve desde Roma, o coração e centro do
império, refere-se naturalmente ao extremo ocidental da Europa. 14

14 Assim Heródoto, no século 5 a.C., descreveu aos celtas como a


nação ocidental. Teodoreto, no século 5 d.C., fala dos povos da
Espanha, Gália e Bretanha como “os que habitam nos limites do
ocidente”. O uso de Estrabão é semelhante. Veja-se o artigo do
Pherigo, mencionado antes; também

Tito (William Hendriksen)

39

De forma semelhante, o fragmento muratório menciona a viagem de


Paulo a Espanha, 15 E o grande historiador da igreja, Eusébio,
declara significativamente:

“Também Lucas, que nos entregou por escrito os Atos dos


Apóstolos, levou seu relato ao seu fim, declarando que Paulo
passou dois anos inteiros em Roma em liberdade, e que pregava a
palavra de Deus sem impedimento. A tradição sustenta que o
apóstolo, tendo se defendido, voltou a ser enviado em seu ministério
de pregação, e ao voltar pela segunda vez à mesma cidade, sofreu
o martírio sob Nero.

Enquanto era tido na prisão, compôs a segunda epístola a Timóteo,


significando ao mesmo tempo que já tinha ocorrido sua primeira
defesa e que seu martírio estava perto” ( História Eclesiástica II. xxii.
1, 2). A tradição posterior aceita um segundo encarceramento em
Roma (Crisóstomo, Jerônimo, Teodoro de Mopsuéstia, etc.).

Como resultado, ficou claro que o assim chamado argumento

“histórico” contra a possibilidade de que Paulo escrevesse as


Pastorais não tem mais substância que a que outros têm. Será
preciso encontrar melhores razões, se se deve anular o peso da
tradição.

Já se disse bastante para indicar a inadequação dos argumentos


dos críticos. Supondo que as Pastorais foram as últimas epístolas
de Paulo, escritas depois de seu primeiro encarceramento em
Roma, com um propósito completamente diferente do das outras
dez epístolas, fica determinado o principal problema, pelo menos em
grande medida.

De acordo com a informação proporcionada pelas próprias


Epístolas, o autor era:

Lightfoot, St. Clement of Rome, Londres, 1869, pp. 49, 50. Cf. E. G.
Kraeling, Rand McNally Bible Atlas, Nova York, Chicago, San
Francisco, 1956, p. 462.
15 O latim está corrompido: lucas obtime theofile comprimdit (em
vez de: Lucas optimo Theophilo comprehendit) quia sub praesentia
eius singula gerebantur sicuti et semote (semota) passione petri
(Petri) evidenter declarat sed et profec tione pauli (Pauli) ad urbe ad
spania (Spaniam) proficiscenti (proficisentis); isto é, “Lucas as relata
para o excelentíssimo Teófilo por que em sua presença ocorreram
os fatos particulares, como o declara claramente ao omitir a paixão
de Pedro assim como a partida de Paulo quando este foi da cidade
a Espanha”. “A cidade” é Roma, naturalmente.

Tito (William Hendriksen)

40

(1) Um homem chamado “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo” (1Tm


1:1; 2Tm 1:1), ou “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo”
(Tt 1:1). Assim vemos que estas três cartas identificam seu autor,
em contraste com Hebreus que não menciona o nome de seu autor.
A este respeito, as três são como as dez.

(2) Não somente o autor dá seu nome; também dá uma descrição


de si. Esta descrição concorda com o que encontramos em Atos e
nas dez a respeito de Paulo:

a. O “Paulo” de ambas as era blasfemo e perseguidor da igreja


(1Tm 1:12–17; cf. At 8:3; 9:1, 2; 22:4, 5; 26:9–11; 1Co 15:9).

b. Convertido, foi designado divinamente para ser pregador e


apóstolo (1Tm 1:1, 11; 2:7; 2Tm 1:1, 11; Tt 1:1; cf. At 9:15; 22:14,
15; 26:16–18; 2Co 12:12; Gl 1:1; 2:7).

c. Sofreu muito em defesa da verdade, por exemplo, em sua viagem


por Antioquia, Icônio e Listra (2Tm 1:12, 13; 3:10, 11; cf. At 14; 2Co
11; 1Ts 1:6; 2:2).

(3) Este homem escreve três cartas, que com variações menores,
são em estrutura semelhantes às dez epístolas paulinas. Sobre a
natureza do plano epistolar de Paulo, veja-se C.N.T. sobre 1 e 2
Tessalonicenses, p.

20. Como um exemplo, tomemos 2 Timóteo. Aqui encontramos: a. A


menção do nome e o ofício do autor (2Tm 1:1).

b. A designação da pessoa a qual se dirige a carta (2Tm 1:2a), com


uma breve descrição da pessoa.

c. Saudação inicial (2Tm 1:2b).

d. A ação de graças, que se íntima no corpo da carta (2Tm 1:3ss).

e. Saudação final, que no presente caso é , antes, detalhada (2Tm


4:19–21).

f. A bênção.

Mesmo em detalhes menores como em “e” (a presença ou ausência


de palavras de saudação no final da carta) estas três epístolas são
parecidas em suas variações ao que se encontra nas outras dez.
Assim

Tito (William Hendriksen)

41

Timóteo tem uma bênção final (1Tm 6:21b: “A graça seja contigo”) e
não uma saudação. Isto lembra a Gálatas (Gl 6:18). Em 2 Timóteo
menciona-se um por um os que se quer lembrar, e se dão vários
nomes (Gl 4:19–21). Isto se assemelha ao que se acha no final de
Romanos (capítulo 16) e de 1 Coríntios (1Co 16:19–21). Em Tito, a
saudação final é muito geral (Tt 3:15: “Todos os que estão comigo te
saúdam”). Poderia comparar-se isto com 2 Coríntios (2Co 13:13).

(4) Estas três cartas apontam a uma mesma relação entre o autor e
o destinatário (Timóteo e Tito) que a conhecida através das cartas
usualmente atribuídas a Paulo e (no caso de Timóteo) do livro de
Atos.
Era a relação de alguém que escreve com autoridade a quem
reconhece sua autoridade, a de “pai” espiritual a “filho” espiritual, de
amigo a amigo (implicando afeto e confiança).

Com relação a isso, sobre a relação de Paulo com Timóteo deveria


comparar-se 1Tm 1:2; 2Tm 1:2 com 1Co 4:17; 16:10; Fp 2:19–23; Cl
1:1; 1Ts 3:2; e Fm 1; e sobre sua relação com Tito deveria
comparar-se Tt 1:4 com 2Co 2:13; 7:6, 13; e 8:17, 23.

(5) Estas três cartas mencionam por nome a certos indivíduos a


quem, por outras fontes, aprendemos a reconhecer como
companheiros e colaboradores de Paulo. Ver o comentário sobre 2
Timóteo 4 e Tito 3.

(6) Revelam um autor, cujo cálido interesse nas igrejas que


estabeleceu, cujo estilo, e cuja teologia apontam diretamente para
Paulo, como se demonstrou (veja-se pp. 20–27).

O testemunho da igreja primitiva está em harmonia com a conclusão


que foi derivada das três epístolas mesmas.

Assim Eusébio, fazendo uma completa investigação da literatura


que tinha ao seu alcance, declara: «Mas claramente evidentes e
simples são as quatorze (epístolas) de Paulo; no entanto, não temos
direito de ignorar que alguns põem em dúvida a (epístola) aos
Hebreus” ( História Eclesiástica, III. iii.4,5). Obviamente Eusébio, ao
escrever no princípio do quarto século, sabia que toda a igreja
ortodoxa aceitava as Pastorais como obra escrita por Paulo. Já
observamos que faz menção específica

Tito (William Hendriksen)

42

de 2 Timóteo como composição do grande apóstolo “enquanto era


retido na prisão”, ao ter vindo pela segunda vez à mesma cidade (
História Eclesiástica II. xxii. 1,2; y cf. III. ii). A atitude negativa de uns
poucos hereges (Basílides e Marcião) com relação às três, e de
Taciano e alguns outros que tinham um modo de pensar semelhante
com relação a 1 e 2

Timóteo se deveu, provavelmente, ao fato de que o ensino destes


homens estava longe de harmonizar com o ensino das Pastorais.
Pelo menos, essa é a explicação dada por Tertuliano, Clemente e
Jerônimo. Certamente, a opinião de uns poucos hereges não deve
ser posta acima do juízo de toda a igreja.

De Eusébio podemos retroceder a Orígenes (floresceu entre 210–

250), que cita muitíssimas passagens das Pastorais (por exemplo,


em sua obra Contra Celso: 1Tm 2:1, 2; 3:15, 16; 4:1–5, 10; 5:17, 18;
6:20; 2Tm 1:3, 10; 2:5; 3:6–8; 4:7, 11, 15, 20, 21; Tt 1:9, 10, 12; 3:6,
10, 11), e as atribui a Paulo: «Além disso, Paulo, que depois chegou
ele mesmo a ser um apóstolo de Jesus, diz em sua epístola a
Timóteo: Esta é uma afirmação fiel, que Jesus Cristo veio ao mundo
para salvar pecadores, dos quais sou o primeiro” (citando 1Tm 3:15,
Contra Celso I. lxiii).

De Orígenes podemos ir ainda mais atrás, a seu mestre, Clemente


de Alexandria (floresceu de 190–200). Este cita a passagem com
referência à “falsamente chamada ciência” (1Tm 6:20, 21),
atribuindo esta passagem ao “apóstolo” ( Stromata II. xi). Também
cita a predição de que “nos últimos tempos alguns apostatarão da
fé” (1Tm 4:1, 3), referindo-a ao “bendito Paulo” ( Stromata III. vi).
Uma olhada ao Índice de Textos das obras de Clemente (por
exemplo, em The Ante‐ Nicene Fathers, reimpressão em inglês de
1951, Grand Rapids, Mich., vol. II) e a leitura destas passagens no
original ou até numa boa tradução basta para provar que nas obras
deste pai da igreja há numerosas referências

— e citações diretas — às Pastorais, consideradas como obra


escrita pelo apóstolo Paulo.

Quase ao mesmo tempo, Tertuliano (floresceu de 193–216), no


breve espaço de umas poucas linhas, cita várias passagens de 1 e
2
Tito (William Hendriksen)

43

Timóteo (1Tm 6:20; 2Tm 1:14; 1Tm 1:18; 6:13; 2Tm 2:2, em
Prescription Against Heretics, XXV), declarando definidamente que

«Paulo dirigiu esta expressão a Timóteo». Já vimos que vê Marcião


com maus olhos pela rejeição das Pastorais ( Contra Marcião V. xxi).

Irineu precedeu por uns poucos anos a Clemente de Alexandria e a


Tertuliano, mas ainda foi contemporâneo deles por longo tempo.

Começa sua obra Contra as Heresias (ao redor de 182–188) com


uma citação de 1Tm 1:4 (a passagem sobre as “genealogias
intermináveis”

que não edificam), a qual definitivamente atribui ao apóstolo (veja-se


o Prefácio da já mencionada obra de Irineu). Na mesma obra cita ou
alude a várias outras passagens, por exemplo, 1Tm 1:9 (IV. xvi.3);
2:5 (V.

xvii.1); 3:15 (III. i.1); 4:2 (II. xxi.2), e não somente da primeira mas
também da segunda epístola a Timóteo (2Tm 2:23; cf. Contra as
Heresias, IV. Prefácio, 3), e de Tito (Tt 3:10; cf. op. cit. , I. xvi.3).
Note-se especialmente que na última passagem Irineu declara que é
Paulo que nos ordena apartar-nos dos que prestam atenção a
fábulas.

Agora, quando Irineu atribui as Pastorais ao “apóstolo”, isto é, a

“Paulo”, sua palavra deveria ter um peso considerável. Tinha viajado


extensamente e estava intimamente relacionado com quase toda a
igreja de seu tempo, e tinha sido discípulo de um discípulo
(Policarpo) de um dos apóstolos (João).

O Fragmento do Muratori (ao redor de 180–200), síntese dos livros


do Novo Testamento, declara que o «bendito Paulo … escreve …
produto do amor e o afeto, uma a Filemom, uma a Tito e duas a
Timóteo

… que a honorável estima da igreja universal considera sagradas na


regulação da disciplina eclesiástica».

Entre os escritores ortodoxos que floresceram em um ou outro


momento durante o período compreendido entre os anos 90 e 180,
encontramos para o final dessa era a Teófilo de Antioquia que se
refere à

«água e lavamento da regeneração» (A Autólico II. xvi), que se pode


considerar uma fusão de Ef 5:26 e Tt 3:5. Cita definitivamente 1Tm
2:2:

«para que vivamos quieta e descansadamente» ( op. cit. , III. xiv).

Tito (William Hendriksen)

44

Atenágoras — chamado às vezes “o filósofo cristão do Ágora


ateniense” (cf. seu nome Aten‐ ágora) — , era um ateniense do qual
diz-se que passeando um dia chegou ao mercado onde se estavam
zombando dos cristãos e, então, movido pela curiosidade, começou
a ler as Escrituras com o fim das refutar. Diz-se que se converteu no
processo de estudar as Escrituras com este fim. Contemporâneo de
Teófilo, descreve a Deus como “luz inacessível” ( Defesa dos
cristãos XVI). Isto certamente nos lembra 1Tm 6:16.

Justino Mártir, escrevendo entre 155 e 161, demonstra conhecer as


Pastorais. É verdade que nem todas as semelhanças aparentes
entre certas passagens de seus escritos e as Pastorais têm valor de
evidência.

Assim, por exemplo, a expressão “este próprio Cristo … o Juiz de


todos os vivos e os mortos” ( Diálogo com Trifo CXVIII), que embora
lembra a um 2Tm 4:1 (“Jesus Cristo, que julgará os vivos e os
mortos”), do qual, na verdade, poderia ter-se derivado, era
provavelmente uma “palavra fiel” que se tinha popularizado numa
das primeiras etapas da fé cristã (cf.

At 10:42; 1Pe 4:5; cf. Mt 25:31–46; Jo 5:25–29; 2Co 5:10), de modo


que nela não se pode basear argumento algum para demonstrar
que Justino conhecia as Pastorais. No entanto, sua referência à
«bondade de Deus e seu amor para com os homens» — note-se a
filantropia de Deus — é quase seguro que a tirou de Tt 3:4 (“Mas
quando se manifestou a bondade de Deus … e seu amor para com
os homens”).

Também, quando chegamos a Policarpo (que escreve

provavelmente em algum momento entre 100 e 135), sentimos que


pisamos terreno firme. O fato de que conhecia as Pastorais e as
citava parece ser indiscutível. Julgue o leitor por si mesmo:

Tito (William Hendriksen)

45

POLICARPO AS PASTORAIS

( Aos Filipenses)

“Mas o princípio de todos os males “Porque raiz de todos os males é


o é o amor ao dinheiro” (IV). amor ao dinheiro” (1Tm 6:10).

“Portanto, sabendo que nada “Porque nada havemos trazido a este


mundo, e trouxemos para o mundo e que nada sem dúvida nada
poderemos tirar” (1Tm 6:7).

podemos levar dele, vistamo-nos

com a armadura de justiça” (IV).

“Deste modo os diáconos devem ser “Os diáconos deste modo


devem ser … sem doblez, Sem doblez, não amantes do dinheiro,
não dados a muito vinho, não ambiciosos de temperantes em tudo
…” (V). lucros desonestos” (1Tm 3:8).

“Reinaremos com ele, se, na verdade, “Se sofrermos, também


reinaremos temos fé” (V). com ele (2Tm 2:12).

“Porque não amaram este mundo” (IX). “Porque Demas me


desamparou, amando este mundo” (2Tm 4:10).

“Que o Senhor lhes conceda verdadeiro “… se por acaso talvez


Deus lhes conceda arrependimento” (XI Lat.). que se arrepientan”
(2Ti. 2:25).

“Ora também pelos governantes, “Exorto acima de tudo, a que se


façam petições, os potentados e pelos orações, petições e ações de
graças por príncipes …” (XII Lat.). todos os homens, pelos reis e por
todos os que estão em eminência” (1Tm 2:1, 2).

Aqui é claro que um autor está usando as palavras do outro,


variando um pouco a linguagem de acordo com a necessidade. É o
mais natural chegar à conclusão de que quando um autor diz:
“Demas …

amando este mundo”, e o outro refere-se a pessoas que “não


amaram este mundo”, é o segundo escritor que está usando
expressões do primeiro e não o contrário. Além disso, se o
discípulo, Irineu, atribuiu as Pastorais a

Tito (William Hendriksen)

46

Paulo, como demonstramos, não é provável que o mestre,


Policarpo, também o fizesse?

Inácio (não posterior a 110), ao exortar Policarpo a agradar ao que o


chamou para soldado ( A Policarpo VI), imediatamente faz vir à
mente 2Tm 2:4. (Outras supostas semelhanças são menos
convincentes).

Devido ao seu caráter conflitivo, passamos por alto umas poucas


alusões prováveis às Pastorais na Epístola de Barnabé, e passamos
a considerar, finalmente, a Clemente de Roma (90–100). As
similitudes mais claras são as seguintes:

CLEMENTE DE Roma AS PASTORAIS

( Aos Coríntios)

“Estáveis dispostos para toda “Lembra-lhes … que estejam prontos


para toda boa obra” (II). boa obra” (Tt 3:1).

“… os que com limpa consciência “Dou graças a Deus, ao qual sirvo


desde meus servem a seu excelente nome” (XLV). maiores com
limpa consciência” (2Tm 1:3).

Ao resumir todo o argumento a respeito do autor, podemos agora


dizer sem temor o seguinte:

(1) Os argumentos dos críticos negativos foram examinados em


detalhe e foram achados em falta; isto é, os críticos não puderam
demonstrar que Paulo não pôde ter escrito as Pastorais.

(2) De acordo com a evidência das próprias epístolas o autor não foi
outro senão o apóstolo Paulo.

(3) Dentro da igreja ortodoxa há uma tradição uniforme que atribui


as Pastorais ao apóstolo Paulo. Esta tradição pode seguir-se desde
Eusébio no começo do quarto século, para trás até Irineu e o
Fragmento do Muratori a fins do segundo século. Além disso, as
Pastorais encontram-se incluídas não somente nesta lista (de
Muratori), mas em todas as listas antigas de epístolas paulinas, e
também em todos os manuscritos e versões que chegaram até nós.

Tito (William Hendriksen)


47

(4) Até no período compreendido entre 90 e 180 d. C. achamos


clara evidência de que 1 e 2 Timóteo e Tito já existiam, eram tidas
em alta estima como palavra mesma de Deus, e se as citava com
frequência de forma direta ou em paráfrase. É verdade que estes
primeiras testemunhas não mencionam a Paulo pelo nome como o
autor. É , antes, característico deles não mencionar os autores dos
livros do Novo Testamento. Eles e seus leitores viviam tão perto do
tempo dos apóstolos que isto não se considerava necessário.

O próprio fato de que no tempo das testemunhas mais antigas —

Teófilo de Antioquia, Atenágoras, Justino Mártir, Policarpo, Inácio e


Clemente de Roma — as Pastorais tivessem alcançado alta fama e
ampla circulação demonstra que a data de sua origem deve
retroceder a um período anterior por muitos anos. Daí que toda a
evidência histórica aponte a Paulo como a pessoa que, durante o
período 63–67 d. C., foi em sentido real o autor responsável por
estas três pequenas joias da verdade inspirada.

III. A QUEM FORAM DIRIGIDAS?

É natural passar do remetente aos destinatários: Timóteo e Tito.

Timóteo ou Timotheus era uma pessoa muito notável. Seu nome


significa “honrar ou adorar a deus”, originalmente um nome pagão
muito comum, 16 que era adotado por judeus e cristãos com
mudança de referência, isto é, a seu Deus. Seu caráter era uma
mescla de afeto e fidelidade apesar de seu natural acanhamento.
Paulo amava a Timóteo e admirava seus sobressalentes aspectos
de personalidade.

Quanto ao caráter afetuoso de Timóteo, é sobre ele que o apóstolo


escreveu estas comovedoras palavras: “Espero no Senhor vos
enviar logo a Timóteo, para que eu também esteja de bom ânimo ao
saber de vosso estado; pois a nenhum tenho do mesmo ânimo, e
que tão sinceramente se 16 Cf. A. Sizoo, Uit De Wereld van het
Nieuwe Testament, p. 190.

Tito (William Hendriksen)

48

interesse por vós. Porque todos buscam o que é seu, não o que é
de Cristo Jesus. Mas já conheceis os méritos dele, que como (um)
filho (serve) a (seu) pai serviu comigo no evangelho” (Fp 2:19–22).

Verdadeiramente, Timóteo era o “amado filho” do apóstolo (2Tm


1:2).

Quanto à sua invariável fidelidade e decidida disposição de


sacrificar qualquer coisa que parecia ser de interesse pessoal
imediato pela causa do evangelho, isto se torna evidente não
apenas pela passagem citada, mas também pelo fato de que
nenhum dos companheiros de Paulo é mencionado com tanta
frequência e como estando com ele tão constantemente como
Timóteo. No último capítulo escrito da prisão, o grande apóstolo
escreve: “Procura vir logo ver-me …

Procura vir antes do inverno” (2Tm 4:9, 21). Paulo sabia que podia
contar com Timóteo, assim como sabia que podia fazê-lo com Lucas
(2Tm 4:11).

Esta confiabilidade também fica claro pelo fato de que apesar de


sua juventude — era mais novo que Paulo em vários anos (cf. 1Tm
4:12; 2Tm 2:22) —, sua natural reserva e acanhamento (1Co 16:10;
2Tm 1:7), e suas “frequentes enfermidades” (1Tm 5:23), estava
disposto a deixar seu lar para acompanhar apóstolo em perigosas
viagens missionárias, a ser enviado em comissões difíceis e até
perigosas, e a continuar sendo até o fim um servo digno de Jesus
Cristo (Rm 16:21; cf. o comentário sobre 1Ts 3:2).

Timóteo é mencionado pela primeira vez em At 16:1, passagem da


qual poderia inferir-se com probabilidade que era habitante de Listra
(cf.

At 20:4). Procedia de um “casamento misto”: um pai grego pagão e


uma devota mãe judia, Eunice (At 16:1; 2Tm 1:5). Desde sua
infância tinha sido instruído nas Sagradas Escrituras do Antigo
Testamento (2Tm 3:15). Com toda probabilidade, em sua primeira
viagem missionária (ao redor do ano 47 d.C.), Paulo tinha sido o
meio para a conversão de Timóteo, assim que desde esse dia podia
chamá-lo “filho” (espiritual) de Paulo (1Co 4:17; 1Tm 1:2; 2Tm 1:2).
Por isso, não é estranho ler que estava familiarizado com as
perseguições e sofrimentos que os

Tito (William Hendriksen)

49

missionários tinham experimentado em sua primeira viagem (2Tm


3:11), isto é, antes que Timóteo se tivesse unido à obra ativa de
Paulo. Embora Paulo fosse o pai espiritual de Timóteo, não é
totalmente improvável que a avó Loide e a mãe Eunice, cuja
conversão ao cristianismo precedeu a de Timóteo (2Tm 1:5),
tenham cooperado muito efetivamente a que chegasse a ocorrer
este feliz acontecimento.

Quando, na segunda viagem missionária, Paulo e Silas chegaram a


Derbe e Listra, Timóteo respondeu favoravelmente à petição do
apóstolo de unir-se ao grupo nas tarefas missionárias. Isto deve ter
ocorrido ao redor do ano 51. Por At 16:2 sabemos que “davam bom
testemunho dele” as pessoas de sua comunidade. Uma vez que era
bem sabido que o pai de Timóteo era grego, de modo que a
influência do jovem entre os judeus pudesse ter-se visto reduzida a
zero a menos que se fizesse algo que demonstrasse publicamente
sua devoção às Sagradas Escrituras do povo da aliança, foi
circuncidado (At 16:3). Neste tempo, provavelmente tenha ocorrido
outro acontecimento importante: Timóteo foi ordenado pelos anciãos
da igreja local (que tinha sido estabelecida e organizada na primeira
viagem) para sua nova tarefa, participando o próprio Paulo na
solene “imposição das mãos” (At 14:23; e veja-se comentário sobre
1Tm 1:18; 4:14; 2Tm 1:6).

Depois Timóteo passou a Europa com os demais missionários,


tendo-se unido Lucas ao grupo. Já declaramos nossas razões para
crer que embora Lucas ficasse em Filipos (contraste o “nós” de At
16:11, 13

com o “eles” de At 17:1), Timóteo seguiu viagem com Paulo e Silas


a Tessalônica (ou pelo menos se reuniu muito em breve com eles
ali; veja-se C.N.T. sobre 1 e 2 Tessalonicenses, p. 5). Também os
ajudou no seguinte lugar ao que atracaram, isto é, Bereia, onde ele
e Silas foram deixados com o fim de dar ajuda espiritual à igreja
recém-nascida, enquanto o próprio Paulo, acompanhado por alguns
de seus amigos, dirigia-se à costa chegando finalmente a Atenas (At
17:10–15). Agindo a pedido de Paulo, Timóteo deixou Bereia e se
reuniu com o apóstolo enquanto este ainda estava em Atenas (1Ts
3:1, 2). Foi enviado de volta

Tito (William Hendriksen)

50

a Tessalônica com o fim de fortalecer e incentivar os irmãos (veja-se


C.N.T. sobre 1Ts 3:1, 2). Depois que Paulo partiu de Atenas e
começou a obra em Corinto, Silas e Timóteo “vieram da Macedônia”
para reunir-se com o apóstolo (At 18:1, 5; veja-se comentário sobre
1Ts 3:6).

Em Corinto, Timóteo realizou seus trabalhos missionários com Paulo


e Silas. Por esta razão (e porque era conhecido em Tessalônica)
seu nome se associa com o deles no cabeçalho das duas epístolas
aos Tessalonicenses, enviadas de Corinto (veja-se o comentário
sobre 1Ts 1:1; 2Ts 1:1).

Na terceira viagem missionária (53/54–57/58 d.C), Timóteo está com


o apóstolo durante o extenso ministério deste em Éfeso. Daqui é
enviado a Macedônia e a Corinto (At 19:21, 22; 1Co 4:17; 16:10).
Como Timóteo foi — a saber, a Corinto via Macedônia — Paulo
esperava que seu colaborador chegasse a Corinto depois que 1
Coríntios tivesse chegado a seus destinatários.

Quando Paulo chega a Macedônia, Timóteo reuniu-se com ele,


como é evidente do fato de que se associa seu nome com o do
apóstolo na epístola que agora envia aos Coríntios (2Co 1:1).
Também é claro que este ajudante e sócio acompanha o apóstolo a
Corinto (Rm 16:21), e que junto com outros está com Paulo quando
volta a Macedônia (At 20:3, 4), e o está esperando em Trôade (At
20:5). Provavelmente esteve também com o apóstolo em Jerusalém
(1Co 16:3).

Por um pouco perdemos Timóteo de vista, mas durante o primeiro


encarceramento de Paulo em Roma os dois estão em íntimo contato
novamente, como é evidente por Fp 1:1; Cl 1:1; Fm 1. Quando o
apóstolo espera ser posto em liberdade no futuro próximo (Fp 2:24),
diz aos filipenses que espera logo enviar-lhes Timóteo (Fp 2:19).

Novamente há um vazio na informação que recebemos. A seguinte


oportunidade em que ouvimos dele, Timóteo está em Éfeso, onde
Paulo se reuniu com ele. Ao partir, o apóstolo pede a Timóteo que
fique em seu lugar (1Tm 1:3). Enquanto estava ali, Timóteo recebe
um dia a carta que agora chamamos 1 Timóteo.

Tito (William Hendriksen)

51

Passam muitos meses, durante os quais nada se ouve com


referência a Timóteo. Logo chega outra carta, na qual Paulo,
escrevendo de Roma como prisioneiro que espera a morte, exorta o
seu amigo a fazer todo o possível por ir vê-lo antes do inverno (2Tm
4:9, 21). Não há um relato que diga se os dois chegaram realmente
a ver-se de novo. (A enigmática declaração a respeito de Timóteo
em Hb 13:23 não pode ser discutida aqui). Pode tomar-se por
concedido que Timóteo procurou ver o apóstolo. Está de acordo
com todo seu caráter. Embora seja vacilante e reservado, seu amor
por Paulo e, mais ainda, pelo Senhor Jesus Cristo e Sua causa,
sempre triunfavam enfim. Talvez se estremecesse por um momento
(cf. 1Co 16:10), mas nunca se nega. É um caráter o seu que é digno
de admiração. A dinâmica agressividade do apóstolo Paulo encontra
uma verdadeira contrapartida em seu acanhamento próprio. Não é
surpreendente que Paulo e Timóteo fossem amigos!

Timóteo e Tito têm em comum a inamovível lealdade à causa do


evangelho, a disposição de ser enviados em comissões difíceis e
um alto conceito e respeito por seu amigo e superior, Paulo. No
entanto, num aspecto ambos diferem. Tito é mais líder; Timóteo é
um seguidor. Tito é o tipo de homem que pode não só receber
ordens mas também pode proceder segundo seu próprio critério
(2Co 8:16, 17). Timóteo necessita que o aguilhoem um pouco (2Tm
1:6), embora aqui a ênfase está posta num pouco” e não em
“aguilhoem”. Tito é um homem de recursos próprios, um homem
com iniciativa numa boa causa. Pode ver-se nele algo da
agressividade de Paulo. Timóteo é cooperador, um homem que
mostra este espírito mesmo quando tal cooperação exige fazer
coisas que vão contra seu natural acanhamento. Esta é a maneira
como estes dois personagens são exibidos na Galeria de Arte das
Sagradas Escrituras.

Agora, no que respeita a Tito, seu nome não aparece no livro de


Atos, mas em outros lugares do Novo Testamento encontra-se treze
vezes: duas em Gálatas (Gl 2:1; 2:3), uma em 2 Timóteo (2Tm
4:10), uma vez em Tito (Tt 1:4), e não menos de nove vezes em
2Corintios (2Co 2:13; 7:6; 7:13; 7:14; 8:6; 8:16; 8:23; 12:18; e de
novo em 2Co

Tito (William Hendriksen)

52

12:18). No entanto, a primeira referência tácita a Tito encontra-se no


livro de Atos, embora ali não se menciona seu nome. Comparando
At 15:2 (“alguns outros”) com Gl 2:1, 3 (“levando também comigo a
Tito”
… “até Tito, que estava comigo”) aprendemos que depois da
primeira viagem missionária, Paulo e Barnabé foram enviados a
Jerusalém para ajudar a igreja a chegar a uma conclusão a respeito
de se os cristãos gentios deviam circuncidar-se, foram
acompanhados por “alguns outros”, entre os quais estava “Tito”.
Com toda probabilidade, Tito era um dos convertidos por meio do
apóstolo, que o chama “verdadeiro filho na fé comum” (Tt 1:4).
Alguns opinam que seu lar estava em Antioquia da Síria e que se
tinha convertido durante a especialmente abençoada campanha de
evangelização realizada por Paulo e Barnabé nesse lugar (At 11:19–
26; cf. At 14:26; 15:2; Gl 2:1, 3), mas esta é só uma conjetura
plausível.

Logo, Tito se torna uma pessoa de grande importância para o


progresso do evangelho. É levado diante “dos apóstolos e anciãos”
a Jerusalém como um caso de ensaio, um claro desafio aos
judaizantes.

Tito é grego (Gl 2:3) e ambos os pais são gregos (em contraste com
Timóteo, cuja mãe era judia). Naturalmente o partido judaizante de
Jerusalém exige que seja circuncidado. Mas Paulo não acede a
submeter-se nem por um momento (Gl 2:5), e a questão em
discussão fica decidida em favor da livre admissão dos gentios na
igreja, com base na pura fé em Cristo, sem que lhes seja exigido
guardar a lei judaica (At 15:13–29). A importância desta vitória para
a liberdade cristã e para o progresso do cristianismo dificilmente
poderá superestimar-se.

Nada mais se ouve de Tito até a terceira viagem missionária de


Paulo (data provável 53/54–57/58). Durante esta viagem o fiel
ajudante de Paulo é enviado a Corinto em mais de uma ocasião,
embora os comentaristas difiram a respeito de se foi enviado duas
ou três vezes. 17

17 Este não é o lugar adequado para discutir a questão em detalhe.


Compreende a exegese de passagens tais como 2Co 2:4; 8:6, 10.

Tito (William Hendriksen)


53

Provavelmente a mais singela reconstrução de suas viagens é


também a melhor. Suporei que na terceira viagem missionária Tito
fez somente duas viagens a Corinto, uma de Éfeso (foi o portador
de 1 Coríntios?) e uma da Macedônia, quando levou 2 Coríntios a
seus destinatários.

Voltando agora para a primeira viagem (Éfeso a Corinto), foi Tito que
recebeu o encargo de realizar a delicada e difícil tarefa de
solucionar

“a situação coríntia” (rivalidade de partidos, fornicação, etc.; veja-se


1Co 1:11; 5:6; 16:17). É verdade que sua chegada a Corinto parece
ter sido seguida quase imediatamente pela de Timóteo, mas nada
se informa com relação ao que este tenha feito na cidade. No
entanto, diz-se aos coríntios que quando chegar Timóteo olhem que
esteja entre eles “com tranquilidade” (1Co 16:10). Quanto a Tito, o
apóstolo tinha esperado encontrar seu emissário de volta em
Trôade. Quando Paulo não o encontrou ali, não teve repouso em
seu espírito. Assim que partiu de Trôade e entrou na Europa
(Macedônia, 2Co 2:13). Seu espírito foi confortado e seu coração
cheio de alegria quando não só encontrou a Tito, mas também ouviu
de seus lábios um relatório que em conjunto era favorável (2Co 7:6,
13, 14).

A missão que Tito tinha sido chamado a cumprir tinha sido bem-
sucedida numa medida considerável. Parece que em Corinto tinha
agido sobre o princípio de que a melhor maneira de vencer o mal é
com o bem.

Assim que, enquanto esteve ali, tinha começado a pôr em ação


novamente a obra de coleta de recursos para os santos
necessitados de Jerusalém. Esta importante obra, que tinha sido
iniciada vários meses antes (2Co 8:10), estava se atrasando. Tito,
com o dinamismo que o caracterizava, tinha lhe dado novos
impulsos.
Como já se indicou, o relatório que Tito trouxe não era totalmente
favorável. Os inimigos de Paulo não tinham tomado em boa forma a
repreensão que tinham recebido. Atacaram o apostolado de Paulo,
e o acusaram de volúvel porque tinha mudado os planos de viagem
(2Co 1:15–24); que tinha mostrado um valor jactancioso que vigiava
uma covardia oculta; e que mesmo quando pregava o evangelho
sem

Tito (William Hendriksen)

54

remuneração, seus motivos não eram puros. De acordo com isto, da


Macedônia (Filipos?) Paulo agora escreve 2 Coríntios a qual é
levada por Tito (o mesmo que levou a seus destinatários 1
Coríntios?). Era o homem adequado para tratar uma situação difícil.
Ao mesmo tempo, poderia completar a obra de reunir recursos para
os pobres de Jerusalém.

Desta vez Tito é acompanhado por outros dois, um dos quais era
um destacado pregador (2Co 8:16–24). Tito, fiel a seu caráter,
estava desejoso de ir nesta missão (2Co 8:16, 17). Nele não se
descobrem vacilações.

Segue um longo intervalo (talvez de mais ou menos 56 d.C. a


aproximadamente 63 d.C.) durante o qual nada sabemos de Tito. A
seguinte menção de seu nome é quando está a cargo de uma igreja
em Creta (ou de um grupo de igrejas). Posto em liberdade de seu
primeiro encarceramento em Roma e de viagem de direção ao
oriente, Paulo o deixou ali com o fim de que levasse a cabo o
mandato descrito em Tt 1:5

(veja-se nessa passagem). Encontraremos Tito novamente (veja-se


pontos 2, 5, 6 e 10, pp. 48–50).

Uma comparação entre 1Tm 4:12 (“Ninguém tenha em pouco tua


juventude”) e Tt 2:15 (“Exorta e repreende com toda autoridade.
Ninguém te menospreze”) pareceria indicar que Tito era mais velho
que Timóteo. Amava os coríntios, amava o seu Senhor. Amava a
obra do Senhor, e dava ampla evidência disso na forma espontânea
em que assumiu sua tarefa em Corinto. Incentivava o mesmo
espírito que Paulo, e seguia de perto suas pisadas (2Co 12:18). Era
original, prudente, valente, leal, um amigo íntimo e de confiança do
grande apóstolo, o verdadeiro representante deste na causa de
Cristo.

Tito (William Hendriksen)

55

IV. QUAL É SEU PANO DE FUNDO HISTÓRICO E SEU


PROPÓSITO?

Estabeleceu-se (veja-se pp. 31–36) que toda a evidência histórica


aponta na direção de que Paulo foi libertado de seu primeiro
encarceramento em Roma. Onde foi imediatamente depois de ser
posto em liberdade? Simplesmente não o sabemos com nenhum
grau de certeza. Naturalmente, as Pastorais implicam uma série de
viagens, mas estes são somente “elos” que podem ser unidos de
muitas maneiras diferentes. Foi Paulo, enfim, a Espanha? Foi de
Roma a Filipos e daí a Éfeso, como sustentam alguns ou foi o
contrário (Roma-Éfeso-Filipos), como sustentam outros. Quando
viajou a Espanha? Pediu Timóteo permissão a Paulo para sair de
Éfeso, permissão que foi negado? Se for assim, onde estava o
apóstolo quando lhe chegou esta petição? Estava em algum lugar
viajando da Espanha a Macedônia, como alguns têm suposto? Ou,
e isto me parece preferível, devemos descartar a ideia de uma
petição procedente de Timóteo, e devemos talvez pôr Paulo em
Éfeso com Timóteo, quando pede ao jovem que fique em seu posto,
enquanto o apóstolo segue viagem a Europa? Pode-se facilmente
fazer mais perguntas como estas. Entre as muitas combinações
possíveis, o seguinte esquema é tão bom como qualquer um. Tem a
vantagem de sugerir uma linha natural de viagem. Veja-se um bom
mapa bíblico do mundo romano do tempo de Paulo (sugiro
A.H.W.B., lâmina XV); também é excelente o mapa da edição de
Dezembro de 1956 de The National Geographic Magazine, o mapa
que leva o título “Terras da Bíblia na atualidade”. No entanto,
enfatizo que não há nenhuma segurança:

1. Imediatamente depois de sua soltura, Paulo envia Timóteo a


Filipos com esta boa notícia (Fp 2:19–23). Não pode ser muito
desacertada a data 63 d.C. Depois do 19 aos 24 de julho do ano 64

(incêndio de Roma) a libertação teria sido muito improvável.

2. O próprio Paulo começa sua viagem em direção à Ásia Menor, e


ao passar por Creta com esse destino, deixa Tito na ilha a fim de

Tito (William Hendriksen)

56

completar a organização da igreja (ou as igrejas) que tinham sido


estabelecidas ali (cf. At 2:11; Tt 1:5).

3. O apóstolo chega a Éfeso, viaja até chegar a Colossos como se o


tinha proposto (Fm 22) e volta a Éfeso.

4. Aqui se reúne com ele Timóteo que traz notícias da congregação


de Filipos (veja-se 1). Ao partir, Paulo pede a Timóteo que fique em
Éfeso, o que era necessário para seu ministério (1Tm 1:3, 4).

5. O próprio Paulo vai a Macedônia, como tinha planejado (Fp 2:24;


1Tm 1:3). Espera voltar a Éfeso em breve, mas antes espera que
sua ausência seja prolongada (1Tm 3:14, 15). Da Macedônia
(Filipos?) escreve duas epístolas que se parecem muito entre si: 1
Timóteo e Tito.

Em sua epístola a Tito pede a este amado irmão que o encontre em


Nicópolis (Tt 3:12).

6. Conforme o planejado, o apóstolo viaja a Nicópolis (em Épiro),


situado na costa oriental do mar Jônico. Ali passa o inverno (Tt 3:12)
e Tito se reúne com ele.
7. Paulo viaja a Espanha (Rm 15:24); segundo alguns “levando Tito
consigo”, mas não há indicação alguma nesse sentido. Se Paulo foi
a Espanha nessa ocasião, a pura possibilidade de que Tito fosse
com ele, é algo que se deve conceder. A respeito de Tito não há
nada definido até que chegamos a 2Tm 4:10 (veja-se número 10).

8. Tendo voltado da Espanha, Paulo segue com destino à Ásia


Menor (veja-se 5), e deixa Trófimo doente em Mileto, ao sul de
Éfeso (2Tm 4:20). Encontrou-se o apóstolo novamente com
Timóteo, e se produziu a separação com lágrimas (2Tm 1:4) nesta
oportunidade ou muito pouco depois?

9. Em Trôade visita Carpo, em cuja casa deixa a capa (2Tm 4:13).

Ele se dirige a Roma via Corinto, onde fica Erasto (2Tm 4:20). Volta
a ser detido. (Não se sabe onde ocorreu — Trôade, Corinto, Roma
ou outro lugar.). Reina o cruel Nero. É o monstro que assassinou o
seu meio-irmão, a sua própria mãe, a sua esposa (Otávia), a seu
tutor (Sêneca), e muitos outros. Quando incendiou Roma no ano 64,
o povo

Tito (William Hendriksen)

57

acusou Nero de ter colocado fogo à cidade. Ele procurou desviar de


si a atenção e culpou os cristãos. O carnaval de sangue que se
seguiu foi terrível.

10. De acordo com isso, ao voltar da Espanha, Paulo já não


desfrutou da proteção política. Seu segundo encarceramento é
severo e breve (2Tm 1:16, 17; 2:9). Somente Lucas está com ele.
Demas o desamparou, amando este mundo e foi para Tessalônica.
Crescente foi para Galácia ou para Gália (Gaul), Tito para Dalmácia
(veja-se comentário sobre 2Tm 4:10, 11). Ao rogar a Timóteo que vá
logo, pede que leve consigo Marcos. Estes detalhes encontram-se
em 2 Timóteo, a carta que foi escrita quando a morte já estava
fitando o apóstolo nos olhos (2Tm 4:6–11). É condenado à morte e o
decapitam na Via Óstia, quase cinco quilômetros fora da capital.
Não sabemos se Timóteo e Marcos chegaram a Roma antes da
morte do apóstolo.

Voltemos agora aos números 4 e 5. Em Éfeso os judaizantes


estavam espalhando suas estranhas doutrinas, pondo grande
ênfase em coisas tais como as genealogias intermináveis e as
fábulas profanas e de velhas, e a pretensão de doutores da lei (1Tm
1:4, 7: 4:7). Segundo vários intérpretes — e poderiam ter razão —
estes seguidores do erro também supunham que a matéria era má,
ou pelo menos, o assento do mal, e portanto, reconheciam uma
ressurreição só espiritual (2Tm 2:18).

Logo também proibiriam o casamento e o uso de certos alimentos


(1Tm 4:3). Já mostramos que os erros condenados eram em parte
presentes, em parte futuros, e em parte presentes e futuros (veja-se
p. 28ss.).

Além disso, ao advogar a favor de uma ética e doutrina falsas, estes


sinistros mestres (e talvez outros com eles) parecem ter feito
necessário que Paulo estabelecesse algumas regras claras acerca
da conduta apropriada no culto público (veja-se especialmente o
capítulo 2). As damas também necessitavam instrução especial com
relação a este ponto.

A situação era muito grave. Isto fica claro quando se leva em conta
dois fatos adicionais: a. de passagens tais como 1Tm 1:6, 20; 3:3, 6;

Tito (William Hendriksen)

58

5:17–25 poderia assumir-se provavelmente que membros


proeminentes da igreja — incluindo alguns com “complexo de
superioridade” (pessoas

“inchadas”) — estavam entre os seguidores do erro; e b. o próprio


Timóteo, como vimos, era por natureza uma pessoa de disposição
muito diferente. Parece ter sido uma pessoa com “complexo de
inferioridade”.

Era realmente difícil que tal homem pudesse fazer frente a tal
situação.

Por isso, ao redor do ano 63, Paulo, recentemente afastado de


Éfeso onde tinha deixado a Timóteo, e estando agora na Macedônia
(1Tm 1:3), diz a Timóteo como administrar os assuntos da igreja.
Especificamente, escreve com o fim de: (1) Fortalecer o espírito de
Timóteo, lembrando-lhe o “dom” que tinha recebido (veja-se
comentário sobre 1Tm 4:14), sua “boa profissão” (veja-se
comentário sobre 1Tm 6:12), e o depósito que lhe foi encomendado
(veja-se comentário sobre 1Tm 6:20).

(2) Comunicar orientação no crítico conflito contra os erros


destruidores da alma que se estavam difundindo na igreja de Éfeso,
e exortar a Timóteo a continuar na “sã doutrina” (1Tm 1:3–11; 1:18–
20; cap. 4; cap. 6). Tal orientação seria absolutamente mais
necessária se a ausência do apóstolo se prolongava (veja-se
comentário sobre 1Tm 3:14, 15). Em conexão com esta batalha
contra a difusão do erro, enfatiza a importância da organização
adequada: eleição do tipo adequado de líderes (especialmente
anciãos e diáconos), e de admoestá-los se se extraviam (cap. 3;
cap. 5).

(3) Dar ordens para a conduta apropriada no culto público (veja-se


comentário sobre o cap. 2).

Voltando mais uma vez ao ponto 5, notamos que Paulo, agora na


Macedônia (Filipos?), também escreve a Tito, a quem tinha deixado
em Creta e a quem deseja ver em Nicópolis. A reputação dos
cretenses não era boa. A necessidade de uma santificação total na
vida congregacional, individual, familiar e pública devia ser
enfatizada aqui mais que em qualquer outro lugar. Os anciãos que
iam ser nomeados deviam ser
“irrepreensíveis” (Tt 1:5, 6). Era necessário tapar a boca de
indivíduos contumazes, faladores de vaidades e enganadores (Tt
1:10). Era preciso

Tito (William Hendriksen)

59

ensinar as pessoas (especialmente aos membros da igreja!) que


deviam abster-se dos desejos mundanos e viver sóbria, justa e
piedosamente no mundo atual, esperando a gloriosa manifestação
do Redentor (Tt 2:11–

14). Na vida pública, eles deviam ser obedientes às autoridades e


conduzir-se corretamente com todos (Tt 3:1, 2). Os causadores de
divisões que não se arrependessem deviam ser disciplinados (Tt
3:10).

Por outro lado, os obreiros do evangelho que eram sinceros (como


Zenas e Apolo), cujo itinerário poderia incluir Creta, e que
provavelmente levavam a carta de Paulo a Tito, deviam receber todo
tipo de ajuda (Tt 3:13).

Como resultado, a carta a Tito foi escrita com este tríplice propósito:

(1) Pedir a Tito que fosse ver Paulo em Nicópolis, tão logo algum
substituto assumisse o cargo da obra em Creta (Tt 3:12).

(2) Encaminhar a Zenas, intérprete da lei, e a Apolo, o evangelista


eloquente (Tt 3:13).

(3) Dar instruções para a promoção do espírito de santificação nas


relações congregacionais, individuais, familiares e sociais.

Destes três propósitos enunciados, o último é aquele que cobre o


maior campo.

Quando deixamos 1 Timóteo e Tito e nos voltamos a 2 Timóteo,


imediatamente notamos que toda a atmosfera mudou. Quando
escreveu 1

Timóteo e Tito, o apóstolo era um homem livre que podia fazer


planos de viagens. Quando escreve 2 Timóteo, é um prisioneiro que
enfrenta a morte. Creta (Tt 1:5), Éfeso (1Tm 1:3), Macedônia (1Tm
1:3; cf. Fp 2:24), e Nicópolis (Tt 3:12) são os lugares mencionados
pelo nome em 1

Timóteo e Tito (em conjunto), e formam uma rota que se pode traçar
no mapa. Embora ninguém saiba se o apóstolo realmente passou
por esses lugares nessa ordem, todos terão que reconhecer que
esta linha de viagem é natural. Mileto (2Tm 4:20), Trôade (2Tm
4:13), Corinto (2Tm 4:20; cf. Rm 16:23), são os lugares que Paulo
visitou na viagem — ou as viagens — que 2 Timóteo pressupõe, até
que chegou a Roma e ao

Tito (William Hendriksen)

60

encarceramento final (cf. 2Tm 1:8; 4:6). Aqui também, se é correta a


ordem em que colocamos estas estações, a rota é lógica. Portanto,
é natural supor que a viagem a Espanha ocorreu entre estes duas
viagens, isto é, entre a rota suposta em 1 Timóteo e Tito, por um
lado, e a que provavelmente indica 2 Timóteo, por outro. 18

Pela razão dada, é provavelmente incorreto dizer que Tt 3:12 e 2Tm


4:21 se referem ao mesmo “inverno”, e logo fixar segundo isso a
data de Tito pondo-a o mais perto possível de 2 Timóteo. Deve-se
lembrar que o apóstolo fez planos definidos quanto ao lugar onde
ele, como um homem livre, passaria o inverno a que se refere Tt
3:12 (isto é, Nicópolis).

Nenhum desses planos era possível quanto ao lugar onde Paulo, o


prisioneiro, passaria o “inverno” a que se refere 2Tm 4:21. Estes
dois invernos não são o mesmo. Quando se escreve 2 Timóteo, todo
o quadro mudou. Veja-se a situação descrita sob o ponto 10 (p. 49f).
Este é o inverno do ano 65, 66 ou 67. É o último inverno de Paulo
sobre a terra. O

grande apóstolo, escrevendo da prisão na metrópole do mundo, e


duvidando que seu ajudante possa chegar a Roma antes de sua
morte, admoesta a Timóteo a que, o que quer que seja que ocorra,
deve apegar-se à sã doutrina e deve defendê-la incessantemente
contra todo adversário.

Embora 2 Timóteo não declare onde estava Timóteo quando foi


escrita, no entanto há várias passagens que apontam para Éfeso.
Assim Paulo diz a Timóteo que sabe que “todos os que estão na
Ásia” o abandonaram (2Tm 1:15). Se a pessoa a quem se dirige
estava em Éfeso, que estava na “Ásia”, é compreensível que devia
saber desta situação. Da mesma maneira, Paulo escreve que
Timóteo “sabe melhor” que o apóstolo, ou “sabe muito bem”, os
serviços que Onesíforo prestou, e dá por concedido que Timóteo
“em Éfeso” (1Tm 1:18). pode levar as saudações de Paulo à família
deste “doador de proveito” (1Tm 4:19). Há outra referência a Éfeso
em 4:12: “Enviei Tíquico a Éfeso”. Além disso, 18 Cf. R. C. H.
Lenski, op. cit., pp. 473–480.

Tito (William Hendriksen)

61

se Timóteo está vivendo em Éfeso, não lhe será muito difícil levar a
capa que Paulo deixou “em Trôade em casa de Carpo” (1Tm 4:13).
Não nos surpreenderia de maneira nenhuma encontrar Priscila (ou
Prisca) e Áquila (1Tm 4:19) de volta em Éfeso (embora o lugar não
se mencione).

onde tinham vivido anteriormente (At 18:18, 19, 24, 26; cf. 1Co
16:19).

É verdade que depois de sua estadia em Éfeso tinham voltado para


Roma (Rm 16:3), mas não é estranho que havendo uma furiosa
perseguição em Roma tenham abandonado novamente a capital.
Anteriormente e por razões semelhantes, eles se retiraram da Itália
(At 18:2).

Um ponto adicional da evidência circunstancial que vincula Timóteo


com Éfeso ao ser escrita esta carta é a natureza da heresia que
aqui se condena (veja-se o comentário sobre 2Tm 2:14–18). Até
certo ponto parece-se com a que se denuncia em 1 Timóteo (dirigida
a Timóteo enquanto estava em Éfeso, 1Tm 1:3).

Então, poderíamos supor que Timóteo ainda não se tinha retirado


de Éfeso, onde estavam em seu apogeu o erro e a perseguição dos
crentes (1Tm 1:8; 2:3, 12, 14–18, 23; 3:8, 12).

Como resultado, o propósito de Paulo ao escrever 2 Timóteo pode-


se resumir como segue:

(1) Pedir a Timóteo que vá a Roma quanto for possível à vista da


iminente partida do apóstolo desta vida (1Tm 4:9, 21; cf. 4:6–8).

(2) Admoestá-lo a que persista na sã doutrina, defendendo-a contra


todo erro e suportando penalidades como bom soldado.

O segundo ponto é característico de toda a carta.

Tito (William Hendriksen)

62

TITO 1

NA VIDA CONGREGACIONAL

ESBOÇO DO CAPÍTULO 1

Tema: O apóstolo Paulo, escrevendo a Tito, dá-lhe instruções para a


promoção do espírito de santificação

Na vida congregacional
Tt 1:1–4 Cabeçalho e saudação.

Tt 1:5–9 É preciso nomear anciãos de boas qualidades em todas as


cidades.

Tt 1:10–16 Razão: Creta não tem falta de pessoas de má reputação


que precisam ser repreendidas com toda seriedade.

TT 1:1:1–4 - CABEÇALHO E SAUDAÇÃO.

1. Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo para o bem


de (a) fé dos escolhidos de Deus e de (seu) reconhecimento da
verdade que é segundo a piedade.

Estas são as palavras iniciais de uma extensa saudação. Nas


epístolas de Paulo somente dois são mais longas. À maneira de
comparação, note-se a lista seguinte que, ordenada de forma
ascendente, indica o número de palavras de cada saudação no
original: 1 Tessalonicenses 19

2 Tessalonicenses 27

Colossenses 28

Efésios 28 (ou 30)

2 Timóteo 29

Filipenses 32

1 Timóteo 32

2 Coríntios 41

Tito (William Hendriksen)

63

Filemom 41
1 Coríntios 55

Tito 65

Gálatas 75

Romanos 93

Esta saudação (vv. 1–4) parece-se a de Romanos mais que


qualquer outra. Tanto aqui como em Romanos Paulo se chama a si
mesmo servo e apóstolo (cf. 2Pe 1:1), e fala de uma promessa
agora cumprida.

Além disso, como em Romanos e em várias outras epístolas, atribui


a graça e paz (não “graça, misericórdia e paz” como em 1 e 2
Timóteo) à mesma dupla fonte, embora varie a forma de expressão.

Aqui, como em outras epístolas (especialmente nas saudações


extensas) a saudação está em harmonia com o caráter e propósito
da epístola. Assim, não é surpreendente que em Tito, que enfatiza a
ideia de que a sã doutrina vai de mãos dadas com a vida de
santificação e a realização de boas obras, a saudação mesma já
mencione a piedade (“a verdade que é segundo a piedade”), e em
contraste com o caráter mentiroso dos cretenses (Tt 1:12) faz
menção de Deus que nunca mente.

Paulo é servo de Deus19 (“servo” também em Rm 1:1; Fp 1:1; cf.

Tg 1:1; 2Pe 1:1, mas note-se variações nos modificativos), e


recebeu sua comissão de autoridade diretamente de Jesus Cristo, e
portanto é seu apóstolo.

O serviço e o apostolado são exercidos “para o bem de” (esse


parece ser o significado de κατά aqui; cf. Jo 2:6; 2Co 11:21) a fé dos
19 Os tradutores e comentaristas nunca poderão, provavelmente,
pôr-se de acordo com relação à pergunta se δοῦλος, como se usa
aqui e em passagens semelhantes, deve traduzir-se escravo ou
servo.
Em favor de escravo está o fato de que o Senhor de Paulo o
comprou, por isso o possui, e que o apóstolo é completamente
dependente de seu Senhor, relação da qual está plenamente
consciente. Por outro lado, esta mesma tradução choca a nossos
ouvidos porque a palavra “escravo” geralmente traz à nossa mente
a ideia de serviço involuntário e tratamento áspero. Portanto,
pareceria que se a eleição for entre escravo e servo, a tradução
servo merece a preferência aqui. Cf. C.N.T. sobre João 15:15, nota
184. No entanto, é preciso lembrar que, como ocorre
frequentemente, nenhuma tradução pode dar numa palavra o pleno
e rico sentido do original.

Tito (William Hendriksen)

64

escolhidos de Deus e de (seu) reconhecimento da verdade que é


segundo a piedade; isto é, realizam-se com o fim de fomentar ou
promover a confiança dos escolhidos de Deus nEle, e seu
reconhecimento ou confissão com alegro da verdade redentora que
se centraliza nele; verdade que, em agudo contraste com as
extravagâncias dos falsos mestres, concorda com (ou aqui também
“é em interesse de”,

“promove”) a piedade, a vida de virtude cristã, o espírito de


verdadeira consagração. 20

2. Agora, tudo o que até aqui se disse — o serviço e apostolado de


Paulo no interesse da fé dos escolhidos de Deus e de seu
conhecimento da verdade que é segundo a piedade — descansa na
esperança de vida eterna, a qual Deus, que não minta,
prometeu antes dos tempos eternos. 21

20 Diversos conceitos deste versículo foram discutidos mais


completamente em outros lugares. Sobre a ideia de apostolado,
veja-se comentário sobre 1Tm 1:1. Sobre a ideia de eleição veja-se
C.N.T. sobre 1Ts 1:4. Para a expressão “Jesus Cristo”, veja-se
comentário sobre 1Tm 1:1; cf. C.N.T. sobre 1Ts 1:1.
E para piedade veja-se comentário sobre 1Tm 2:2; 3:16; 4:7, 8; 6:3,
5, 6, 11; e 2Tm 3:5.

21 Modifica realmente a todo o versículo a expressão “na esperança


de vida eterna”? Em outras palavras, considera-se aqui a esperança
como uma causa fortificante do ministério apostólico de Paulo e da
completa devoção dos escolhidos a Deus? Este pareceria ser o
ponto de vista mais natural.

Também harmoniza com o ensino de Paulo em outros lugares:


Assim, com relação a a. a esperança considerada como um
estímulo na realização de sua própria tarefa (e a de Timóteo), diz:
“Porque com este fim trabalhamos e lutamos, porque pusemos
nossa esperança no Deus vivo” (veja-se comentário sobre 1Tm
4:10).

E com relação a b. a esperança considerada como um incentivo


para a vida santa do crente em geral, a passagem Tt 2:11–14 é
muito claro. (Outras passagens que provam a. ou b. ou ambos, são
os seguintes: 1 Ti. 1:16; 6:19; 2Tm 1:12; 2:5, 11, 12; 4:1, 7, 8, 18;
logo também At 26:6, 7; Rm 4:18; 8:20; 1Co 9:10; 15:58; 1Ts 1:3, 9,
10; 2:12; 4:13.) Certamente, se até Jesus “pela alegria posto diante
dele” sofreu a cruz (Hb 12:2), os crentes têm direito a considerar sua
futura salvação como um incentivo legítimo (embora não o único)
para uma vida de serviço consagrado aqui embaixo.

Mas vários comentaristas aceitam somente a. no que respeita a esta


passagem. Interpretam-no como segue:

O ministério e apostolado de Paulo são: (1) “para o bem da fé dos


escolhidos de Deus”, etc., e (2) “baseados na esperança de vida
eterna, a qual”, etc.

As frases (1) e (2) consideram-se como modificativos coordenados


de “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo”.

Embora este ponto de vista possa ser correto, pareceria estar


exposto às seguintes objeções, tornando-o menos provável:
Tito (William Hendriksen)

65

Esta (além de 2Tm 1:9 e Ef 1:4, cf. Rm 8:29, 30; 1Co 2:7; 2Ts 2:13;
e veja-se C.N.T. sobre 1Ts 1:4. 22).

3. O v. 3 é realmente um parêntese: — mas a seu devido tempo


revelou sua palavra pela proclamação que por ordem de Deus
nosso Salvador foi encomendada —.

Desde a eternidade Deus prometeu vida eterna, mas “a seu devido


tempo” (usada aqui como em 1Tm 2:6; 6:15; veja-se em 1 Timóteo,
notas 104* e 105**; cf. Gl 4:4) revelou-a. No entanto, estritamente
falando, o que foi revelado aos habitantes da terra não foi a vida
eterna mesma em sua gloriosa fase celestial (como poderia sê-lo?),
mas sim a palavra de Deus quanto a ela. Daqui a mudança de “vida
eterna” no v. 2, a “sua palavra” no v. 3. Na forma de (ou: por meio
de) as boas novas que Paulo proclamava e que por ordem de Deus
nosso Salvador” (veja-se Em primeiro lugar, nesse caso, não seria
(2) introduzida mais naturalmente por alguma partícula
especificativa?

Em segundo lugar, concebido assim estreitamente, não é o


antecedente da expressão “(baseado) na esperança” muito remoto?

Em terceiro lugar, quando as palavras que precedem imediatamente


esta expressão mencionam outras coisas (progresso na fé,
reconhecimento da verdade, o exercício da piedade) que segundo o
ensino uniforme de Paulo também são estimuladas por esta
esperança viva, como se mostrou, o que boa razão há para dizer
que somente o ministério apostólico de Paulo está baseado nela?

Outros pontos de vista da construção são até menos satisfatórios.

22 As objeções que se apresentaram contra esta explicação são as


seguintes: (1) Não se pode dizer com exatidão que a vida eterna foi
prometida desde a eternidade. Esta objeção já foi respondida.
(2) Quem neste contexto pensa no decreto eterno de Deus vê-se
forçado a concluir que Deus deu a promessa antes da eternidade.

Resposta: De maneira nenhuma; foi dada “antes dos tempos


eternos”, isto é, “desde a eternidade”.

(3) O verbo prometeu está no tempo aoristo (voz média). Por isso,
deve referir-se a um só acontecimento, provavelmente à promessa
de Gn 3:15.

Resposta: Não é verdade que o aoristo se refira necessariamente a


somente um acontecimento.

Antes, sua função é resumir, dar uma “visão em cápsula”. Mas ainda
se se refere a apenas um acontecimento, esse acontecimento
poderia ser a (humanamente concebida) promessa de Deus na
aliança da redenção.

* 104 Ou, “em seu próprio tempo”. Cf. nota 105.

** 105 O original tem o plural “tempos”, aqui como também em 1Tm


2:6; Tt 1:3. No entanto, provavelmente este seja um plural idiomático
que deve ser traduzido no singular. Cf. quanto a este uso, Jr 5:26
(27:26 LXX); cf. o plural de χρόνος como aparece em Lc 20:9; 23:8.

Tito (William Hendriksen)

66

comentário sobre 1Tm 1:1) tinha-lhe sido encomendada (veja-se


sobre 1Tm 1:11–13), esta palavra ou mensagem de Deus com
relação a Cristo e seu dom de graça agora se fez manifesto.

Esta declaração parentética está em completa harmonia com todo o


ensino paulina. Esse ensino pode ser resumido da maneira
seguinte: A salvação plena em Cristo para o judeu e o gentio,
considerados como iguais, uma salvação baseada somente nos
méritos de Cristo e recebida pela fé:
a. Foi objetivamente dada e prometida desde a eternidade (1Co 2:7;
Ef 1:4; 2 Ts. 2:13; 2Tm 1:9; Tt 1:2);

b. Estava escondida — isto é, a mensagem ao respeito estava


oculto — nas eras precedentes e dos olhos de gerações anteriores
(Rm 16:25; Ef 3:5, 6, 9; Cl 1:26a); escondida, isto é, no sentido de
não haver-se proclamado plenamente, nem de haver-se realizado
plenamente, nem de havê-la entendido plenamente o homem da
antiga dispensação, mesmo quando lhe tinha anunciado (Gn 3:15;
12:3; cf. Gl 3:8; Is 60; 61; Jl 2:28, 29; Am 9:11, 12; Mi. 4:12; Ml. 1:11;
além disso, Sl 72:8–11, 17; 87);

c. Agora foi plenamente manifestado — isto é, a mensagem que se


refere a ela foi completamente manifestado — por meio da
proclamação universal do evangelho (veja-se comentário sobre 2Tm
1:10, 11; cf. Rm 16:26; Ef 3:3–9; Cl 1:26b–29). Quanto a
“proclamação” ou “pregação”

(literalmente: a ação executada pelo arauto, “kerygma”) veja-se


sobre 2Tm 4:2.

O fato glorioso de que a proclamação das boas novas a respeito da


vida eterna se tivesse confiante realmente a um tão indigno como
Paulo, feito que fazia com que o coração do apóstolo transbordasse
de gratidão, explica esta interrupção na continuidade da oração.

4. A Tito (meu) filho genuíno em termos de (a) comum fé; graça


e paz de Deus (o) Pai e Cristo nosso Salvador.

As palavras aqui dirigidas a Tito se parecem estreitamente às de


2Tm 1:2 e ainda mais às de 1Tm 1:2. Note-se como aqui também se

Tito (William Hendriksen)

67

unem em bela harmonia a autoridade apostólica (Tt 1:1) e o terno


amor (“meu filho genuíno”).
Tito era filho de Paulo porque devia sua vida espiritual ao apóstolo
como um meio nas mãos de Deus, mesmo quando não se nos
revelam o tempo, lugar e circunstâncias de sua conversão (veja-se
p. 46). A designação “filho” é feliz, porque combina duas ideias: “Eu
te gerei”, e

“me és muito querido”. Além Tito era filho genuíno, natural (não
adotado), não um bastardo, não um crente nominal. Paulo se
considera pai de Tito, não em sentido físico mas em termos da
comum fé”, isto é, com relação à fé comum a Paulo e a Tito. A frase
“em fé” (“genuíno meu filho em fé”) em 1Tm 1:2 tem virtualmente o
mesmo sentido.

Provavelmente seja melhor tomar aqui fé no sentido subjetivo, um


conhecimento verdadeiro de Deus e de suas promessas reveladas
no evangelho e uma confiança sincera nele e em seu amor redentor
centrado em Cristo.

Sobre este genuíno filho o apóstolo agora dá sua bênção de graça e


paz (cf. “graça, misericórdia e paz” em 1Tm 1:2 e em 2Tm 1:2).
Graça é o favor operado no coração de seu filho da parte de Deus
sem que medeie mérito alguém. É seu cristocêntrico amor
perdoador e fortalecedor. Paz é a consciência do filho de ter sido
reconciliado com Deus por meio de Cristo. Graça é a fonte, e paz é
a corrente que flui desta fonte (cf. Rm 5:1).

Esta graça e paz têm sua origem em Deus o Pai, e foram obtidas
para o crente pelos méritos de Cristo Jesus. Eles dois são a fonte
única de graça e paz (a preposição de não se repete). Embora em
todas as outras saudações de Paulo (Rm 1:7; 1Co 1:3; 2Co 1:2;
etc., incluindo as pastorais: 1Tm 1:2; 2Tm 1:2) Cristo é chamado
Senhor, aqui se lhe chama “nosso Salvador”. Quanto ao significado
desta palavra Salvador, que em Tito aparece tão frequentemente
como em todas as outras epístolas paulinas em conjunto (seis
vezes: Tt 1:3, 4; 2:10, 13; 3:4, 6), e nesta carta usa-se tanto com
referência a Deus” como a “Cristo”, veja-se comentário sobre 1Tm
4:10. Aqui em Tt 1:4 a palavra usa-se em seu
Tito (William Hendriksen)

68

pleno sentido redentor. Cristo Jesus é quem nos resgata do maior


dos males e outorga aos resgatados o maior dos bens. Quanto ao
sentido de salvação, veja-se comentário sobre 1Tm 1:15.

À vista da grande similitude entre Tito 1:4 e 1Tm 1:2, veja o leitor as
explicações de 1Tm 1:2 para uma discussão mais detalhada. Além
disso, veja-se C.N.T. sobre 1Ts 1:1.

TT 1:5–9 - É PRECISO NOMEAR ANCIÃOS DE BOAS


QUALIDADES EM

TODAS AS CIDADES.

5. Para que possa prosperar a vida congregacional nas diversas


cidades de Creta, é necessário nomear anciãos de muito bons
antecedentes: Por esta razão te deixei em Creta, para que
pusesse ordem nas coisas que faltava fazer, ou seja, para que
nomeasse anciãos em cada cidade, da maneira que te mandei.

Evidentemente, em algum viaje por mar, Paulo e Tito tinham estado


juntos em Creta. Tinham proclamado o evangelho, reuniram-se
pequenos grupos de discípulos e tinham buscado lugares de
reunião, mas não se tinha efetuado nenhuma organização oficial, ou
se se tinha iniciado algo nesse sentido, estava longe de haver-se
formalizado.

Se for correta a conjetura de que a estadia temporal em Creta


ocorreu imediatamente depois da libertação de Paulo do primeiro
encarceramento em Roma, apresentaram-se os seguintes
problemas nesse tempo:

a. Depois de uma longa ausência de seus amigos, o apóstolo estava


ansioso de ver os rostos conhecidos de antes e voltar a visitar as
igrejas previamente estabelecidas. Isto é compreensível, porque ele
era intensamente humano, uma pessoa de coração ardente. Além
disso, amava a seu Senhor e anelava promover a boa causa em
toda forma possível. Além disso, fez o que poderiam considerar-se
promessas de prontas visita (Fm 22; Fp 1:25, 26). Como resultado,
uma longa

Tito (William Hendriksen)

69

permanência em Creta para o próprio Paulo estava fora de toda


consideração.

b. No entanto, a organização das igrejas em Creta estava longe de


ser um assunto terminado e o pressa indevido na designação de
homens para os postos diretores era contrário aos princípios de
Paulo (1Tm 3:6; 5:22).

A solução era: Paulo devia seguir o caminho e Tito devia ficar, ser
deixado (cf. 2Tm 4:13, 20) na ilha para pôr em ordem as coisas que
faltava fazer, ou seja (κατά, usada aqui nesse sentido), estabelecer
presbíteros. O apóstolo, que gosta de enfatizar o fato de que Deus
não deixa inconclusa sua obra de graça (Fp 1:6; 1Ts 5:23), é um
verdadeiro imitador de Deus também a este respeito; porque Paulo
também aborrece os assuntos inconclusos (veja-se 1Tm 1:3 e 1Ts
3:10 a respeito de diferentes aplicações deste mesmo princípio). E
com relação a Tito, a gente quase poderia afirmar que nenhuma
tarefa lhe era muito difícil para deixar de tentar o nenhum desafio
muito formidável como para não enfrentá-lo, em dependência da
fortaleza e a sabedoria divina (veja-se pp. 45, 48).

O texto implica que o apóstolo tinha dado ordens quanto a como


(ὡς, = abreviatura de da maneira que) deviam ser nomeados os
anciãos.

Isto se refere aos requerimentos para o cargo que se devem levar


em conta ao nomear homens para o ancianato. Uma vez que os
versículos que se seguem se referem somente aos anciãos (embora
seja claro por 1

Timóteo 3 que era a convicção de Paulo que, pelo menos no curso


do tempo, uma igreja também necessita diáconos) podemos supor
que o apóstolo quer dizer que quando a obra que se deve realizar
resulte muito pesada para os anciãos, deveriam nomear-se de
forma semelhante os diáconos necessários (cf. At 6:1–6).

Com efeito, aqui se reafirmam as instruções quanto aos requisitos


para o cargo de presbítero ou ancião. Tinham sido dados de forma
oral enquanto Paulo e Tito estavam juntos em Creta, e agora os
reitera por escrito: “Por esta razão (antecipatório τούτου χάριν,
seguido de ἵνα,

Tito (William Hendriksen)

70

como em Ef 3:1, 14–16) deixei-te em Creta, para que … nomeasse


anciãos em cada cidade” (“completamente”, de onde, “cidade por
cidade”). Quanto à prática, veja-se At 14:23, e quanto ao uso da
preposição neste sentido, veja-se Lc 8:1; At 10:23.

Possíveis razões para repetir por escrito uma ordem dada


previamente de forma oral:

(a) Para o benefício de Tito, a fim de lhe ajudar a lembrar os


detalhes;

(b) Para confirmação de sua autoridade em caso que alguém a


objetasse;

(c) Para a posteridade.

Embora Paulo diz: “para que nomeasse (tu)”, de maneira nenhuma


exclui a cooperação responsável da congregação afetada (veja-se
At 1:15–26; 6:1–6; note-se o mesmo verbo em At 6:3).
6–9. A lista de requisitos para os anciãos ou presbíteros se introduz
com as palavras: “se é …” Temos aqui outro caso de expressão
abreviada (veja-se C.N.T. sobre Jo 5:31). Aqui, como em 1Tm 5:10,
não é difícil pôr as palavras que estão implícitas. O sentido
requerido pelo contexto é: “Se alguém for irrepreensível, etc.…,
pode ser nomeado”, ou como o traduzi: Uma pessoa (pode ser
nomeada) se for, etc.

Os requisitos que se dão formam três grupos:

(1) A pessoa que vai ocupar um cargo tão importante deve possuir
uma alta reputação merecida e, se é casado (que será geralmente a
situação), deve ser um bom homem com relação a sua família (v. 6).

(2) Não deve ser o tipo de pessoa que para agradar-se a si mesmo
perdeu o interesse nas demais pessoas (salvo para as injuriar!) e
que, se vê-se metido numa disputa, está sempre disposto a chegar
aos punhos. é dada uma lista de características negativas:
qualidades que o bispo não deve ter (v. 7).

(3) Todas suas ações devem dar evidência do fato de que em obra e
em doutrina deseja ser uma bênção a outros. é dada uma lista de
características positivas: qualidades que o bispo deve ter (vv. 8, 9).

Tito (William Hendriksen)

71

Os três grupos de requisitos correspondem a pessoas que por sua


idade e dignidade são anciãos e por sua tarefa são inspetores ou
bispos.

Embora seja verdade que o texto diz “o bispo” no singular, o faz em


sentido genérico, representando com um membro a toda a classe
considerada do ponto de vista de uma característica definida (veja-
se C.N.T. sobre 1Ts 1:9, nota 41). se poderia parafrasear o sentido
da seguinte maneira: “Porque qualquer bispo, em razão do próprio
fato que deveria viver à altura de seu cargo de bispo e porquanto
deve administrar a casa de Deus (sendo mordomo de Deus; veja-se
comentário sobre 1Tm 1:4; cf. 1Co 4:1; 1Pe 4:10), deve ser
irrepreensível”, etc. Que para o autor das pastorais as palavras
ancião e bispo indicam a mesma pessoa, também se deduz do fato
que essencialmente os mesmos requisitos dados para um ancião
aqui em Tt 1:5, 6 — que seja irrepreensível, marido de uma só
mulher, filhos de bom testemunho — aparecem na lista com
referência ao bispo em 1 Ti. 3:2, 4. A ideia hierárquica—os vários
“sacerdotes” e suas “paróquias”, superados em categoria e
governados por um “bispo” e sua “diocese” — é algo estranho às
pastorais.

Para evitar uma duplicação desnecessária e ao mesmo tempo


mostrar a relação entre as duas listas , antes, semelhantes de
requisitos (Tito 1 e 1 Timóteo 3), dou a explicação dos vv. 6–9 na
forma de uma tábua. Quando o requisito estipulado já foi tratado em
outro lugar ( particularmente em 1 Tito 3) o leitor deve buscar a
explicação mais completa que pode achar-se ali.

A coluna 1 contém a lista de requisitos dos anciãos ou bispos como


se encontram em Tt 1. A coluna 2 dá uma breve explicação do
sentido de cada um desses requisitos. A coluna 3 dá uma lista dos
requisitos da lista de Tito 1 que tem paralelo (de forma exata ou por
meio de um sinônimo) na lista de requisitos do bispo de 1 Timóteo 3.
A coluna 4, similarmente, mostra os paralelos na lista de requisitos
para diáconos em 1 Timóteo 3.

E a coluna 5 dá uma lista dos antônimos de quatro requisitos para


bispos que não encontra paralelo em 1 Timóteo 3. Estes antônimos
aparecem na

Tito (William Hendriksen)

72

lista de 2Tm 3 sobre os aspectos da gente que vive nos “últimos


dias”
(veja-se explicação de 2Tm 3:1–5).

123

Tito 1 –

Significado

1 Timóteo 3 1 Timóteo 3 2 Timóteo 3

Anciãos

Bispos

Diáconos

irrepreensível

livre de faltas

cf. irrepreensível irrepreensível

(particularmente

(v. 2)

(v. 10)

com relação aos

pontos que se

mencionarão nos

vv. 6–9)
marido de uma fiel na relação

marido de uma

marido de uma

só mulher

matrimonial

mulher (v. 2)

mulher (v. 12)

que tenha filhos que tenha filhos que cf. que governe cf. que
governe

crentes (que) não participem da fé de bem sua casa, bem a seus

(estejam)

seus pais e que com verdadeira

filhos e a sua

acusados de

adornem essa fé dignidade

família (v. 12)

dissolução nem com uma conduta

mantendo a seus

de contumácia.

piedosa. Não se filhos em

deve nomear ancião sujeição, etc. (vv.


a um homem cujos

4, 5)

filhos ainda são

pagãos ou se

comportam como

tais. Cf. Ef 5:18

Obispos

Porque o bispo,

(explicação de

contraste--se

como

“autocomplacente”)

cf. “amantes de

administrador

que não seja

si” (v. 2)

de Deus, deve ser indulgente consigo

sem defeito (isto mesmo ao ponto de

já foi explicado), mostrar arrogância


autocomplacente

para os demais (cf.

2Tm 3:2 e 2Pe 2:10)

não colérico

não dado aos estalos cf. não brigão,

de ira

não contencioso

(v. 3)

não (um que é) não bebedor de não dado ao não dados a dado ao
vinho

vinho, bom para vinho

muito vinho (v.

levantar o côvado, (v. 3)

8)

ou bêbado

Tito (William Hendriksen)

73

não dado a

não desejoso de usar não brigão (v. 3)

golpes

os punhos, não
belicoso

não ambicioso de que não seja

não afeiçoado ao não ambiciosos

lucros desonestos

defraudador, ladrão, dinheiro (v. 3)

de lucro

simonita (cf. Tt

vergonhoso (v.

1:11; além disso cf.

8)

1Pe 5:2 advérbio)

mas hospitaleiro

“amor a

hospitaleiro (v.
forasteiros”; aqui, 2)

especialmente,

disposto a amparar

e a dar alojamento a

crentes

desamparados,

viajantes ou crentes

perseguidos (cf. 1Pe

4:9)

amante do bem

que ame a bondade, contraste-se

cf.

virtuoso, disposto a

“aborrecedores

fazer o que

do bem” (v. 3)

beneficia a outros

sóbrio ou sensível de mente sã,

sóbrio (v. 2)
discreto, cordato

(cf. Tt 2:2, 5)

justo

que cumpre seu

dever para com o

homem

piedoso

(ou que cumpre seu contraste--se

“santo”)

dever para com

cf. “ímpios” ou

Deus (cf. 1Tm 2:8)

“profanos” (v. 2)

dono de si

que possua a

contraste-se

cf.

fortaleza moral para


“intemperantes”

refrear ou dominar

(v. 3)

as inclinações e

impulsos

pecaminosos de si

mesmo (Cf. Gn 39:

7–9; 50:15–21)

que se apegue à apegar-se e aplicar-

cf. que guarde

palavra fiel que se à sagrada

o mistério de a fé

Tito (William Hendriksen)

74

está em

tradição que está em

com uma

harmonia com a harmonia com a sã

consciência pura

doutrina
doutrina, isto é, com

(v. 9)

a doutrina que por

sua vez, está

baseada na

Escritura.

para que possa Com o fim de que apto para ensinar incentivar (a

todo bispo por meio (v. 2)

outros) por meio de seu sã ensino

de seu sã ensino e possa inclinar o

refutar a quem o coração e a vontade

contradizem

à alegria do serviço

ao Senhor, e a

denunciar os erros

daqueles que se

rebelam; isto é,

resistir a estes

oponentes, se fosse

possível trazê-los
para o

reconhecimento de

seu erro e ao

arrependimento;

pelo menos

convencer a quão

crentes estes

adversários estão

errados. Nem todos

os bispos ou anciãos

estão chamados a

realizar esta tarefa

(veja-se comentário

sobre 1Tm 5:17),

mas todos devem

ser capazes de

realizá-la.

Tito (William Hendriksen)

75

TT 1:10–16 - RAZÃO: CRETA NÃO TEM FALTA DE PESSOAS DE



REPUTAÇÃO QUE PRECISAM SER REPREENDIDAS COM TODA

SERIEDADE.

10. Agora se declara por que são necessários homens tão


altamente qualificados para o trabalho espiritual em Creta, de forma
muito especial:

Porque há muitos homens insubordinados, faladores de


vaidades e enganadores, especialmente os do partido da
circuncisão.

Este grupo (vv. 10–14a) é semelhante ao mencionado em 1Tm 1:3–

11; note-se as similitudes:

Tito 1 1 Timóteo 1

insubordinados (v. 10) desobedientes (v. 9) faladores de vaidades (v.


10) alguns indivíduos … se voltaram para as palavras vãs (v. 6)

sempre enganadores (v. 12) mentirosos (v. 10) para que possam ser
sãos na opõe-se à sã doutrina (v. 10); cf. 6:3

fé (v. 13)

dedicam-se aos mitos judaicos não se dediquem a mitos e


genealogias (v. 14) intermináveis (v. 4); cf. 4:7a Estes homens
encontram-se em Creta em número alarmante (“muitos homens
insubordinados”; contraste-se com “alguns indivíduos”

em 1Tm 1:3). Isto poderia haver-se devido ao fato de que as faltas


peculiares deles estavam em harmonia com o caráter nacional dos
cretenses e que estavam sob a poderosa influência de rabinos
judeus ( intrometidos, vv. 14b–16). São insubordinados; isto é,
desobedientes à

Tito (William Hendriksen)


76

Palavra de Deus. Também são faladores de vaidades, sem nenhum


propósito útil, com fábulas fictícias sobre Adão, Moisés, Elias e
outros, e com seus desavenças legalistas (cf. 1Tm 1:6); e são
enganadores de mentes fracas (veja-se M.M., p. 675).
Especialmente “os do partido da circuncisão”, isto é, membros da
igreja que são judeus (cf. At 10:45; Gl 2:12), pertencem à classe dos
faladores de vaidades e enganadores.

Provavelmente consideravam sua circuncisão como uma marca de


suprema excelência, que lhes dava o direito de ser ouvidos e tidos
em estima por outros.

11. Mas Paulo, discrepando agudamente com a opinião que eles


têm a respeito de si mesmos, diz com relação a eles e também com
relação ao resto dos faladores de vaidades e enganadores: cujas
bocas é preciso tampar, uma vez que (são) tais que confundem
a famílias inteiras ao ensinar, por amor de lucro vergonhoso, o
que não é próprio.

Ao dizer a Tito o que deveria fazer com tais pessoas, Paulo usa um
verbo raro (veja-se M.M., p. 246) que tem como seu sentido primário

“tampar a boca por meio de uma rédea, uma focinheira ou uma


mordaça”. Então, aos enganadores não há que tolerá-los mas sim
silenciá-los, e isto deve fazer por meio de Tito e pelos anciãos,
como parece indicar o contexto (vv. 5–9).

Nesta passagem não se diz como é preciso silenciá-los. No entanto,


veja-se comentário sobre 1Tm 1:3, 4; 1:20; 4:7; 2Tm 2:16, 21, 23;
4:2; Tt 1:13b; 3:10. Ao princípio era preciso admoestar com ternura
ao errado a fim de ganhá-lo para a verdade. Se recusa, deve ser
repreendido severamente dizendo que desista de seu erro. A
pessoa que persiste em seus maus caminhos deve ser rejeitada
pela igreja e disciplinada. Talvez terei que empregar a medida
extrema da excomunhão a fim de salvaguardar a igreja e para
conduzir ao pecador ao arrependimento. Na igreja de Deus não
existe a “liberdade de falar enganosamente”. Razão: seria muito
perigoso. Os mestres de falsas doutrinas “confundem (cf. Jo 1:15) a
famílias inteiras” fazendo apartar-se da verdade (veja-se comentário
sobre 2 Ti. 3:6). Fazem isto ensinando o que não é próprio,

Tito (William Hendriksen)

77

isto é, “mitos judaicos e mandamentos de homens” (veja-se


comentário sobre v. 14). E o propósito deles é adquirir lucro
vergonhoso, lucro que é vergonhosa porque os homens que a
buscam estão ansiosos de enriquecer-se até às custas da queda de
outros. São completamente egoístas, desejando somente dinheiro e
prestígio (cf. 1Tm 3:3, 8; 6:5; Tt 1:7; e sobre o tema de remuneração
para a obra espiritual, veja-se C.N.T.

sobre 1Ts 2:9).

12. Estes membros de igreja de origem judaica, do tipo farisaico e


tingidos com incipiente gnosticismo, que às vezes conduz à uma
vida licenciosa e outras vezes a formas de ascetismo (veja-se
comentário sobre 1Tm 4:3, 4), eram cretenses — havia muitos
judeus em Creta (cf.

At 2:11)—, e além de ser influenciados por judeus incrédulos (veja-


se comentário sobre 14b–16), tinham absorvido as piores
características de seus compatriotas não judeus. Isto não tinha sido
algo difícil, porque o judeu e o cretense tinham algo em comum: o
emprego de artimanhas ou enganos para uma vantagem egoísta
caracterizava a ambos (cf. Jo 1:47

com Tt 1:12). Um judeu honesto ou um cretense honesto parece ter


sido uma exceção. E certamente a combinação judeu - cretense não
era muito feliz.

Quanto aos cretenses, condenavam-se “por sua própria boca”. Diz


Paulo: Um deles, seu próprio profeta, fez a declaração: Os
cretenses (são) sempre enganadores, más bestas, ventres
ociosos.

Seu próprio profeta , quereria jactar-se de seus compatriotas diante


de outros que condená-los. No entanto, condená-los é exatamente o
que seu próprio profeta fez. Clemente de Alexandria ( Estromata, I.
xiv. 59) e Jerônimo atribuem a devastadora caracterização a um
poeta e reformador cuja data se localiza entre 630 e 500 a.C. Seu
nome era Epimênides, nativo de Cnossos, perto de Heraklion (=
Candia) na costa norte de Creta, onde ainda hoje a gente pode
visitar o museu que contém os extraordinários tesouros da era
minoica. Num hino “A Zeus”, Calímaco (mais ou menos 300–240
a.C.) tinha citado as primeiras palavras: “Os cretenses (são) sempre
enganadores”. A pergunta se Paulo tinha lido ou

Tito (William Hendriksen)

78

não a Epimênides realmente, nem todos dão a mesma resposta.


Alguns sustentam que, uma vez que a citação é realmente um
provérbio, poderia ter sido derivado por Paulo de uma tradição oral
extensamente difundida.

Outros creem que não é necessário confinar o conhecimento obtido


por leitura da parte de Paulo a limites tão estreitos. 23

Agora, os antigos consideravam Epimênides um profeta, “um


homem divinamente inspirado” (segundo Platão), “um homem
querido pelos deuses” (segundo Plutarco). Paulo não quer dizer que
o reformador cretense seja realmente um profeta no sentido bíblico.
Quer dizer, “um homem que por eles e outros era considerado
profeta, um porta-voz dos deuses”. Com referência a assim
chamada atividade profética de Epimênides, Platão ( Leis I. 642 D y
E) escreveu o seguinte:

“Esse homem divinamente inspirado, Epimênides … nasceu em


Creta, e dez anos antes da guerra persa, segundo o oráculo do
deus, foi a Atenas …; e quando os atenienses se viram cheios de
temor por causa das forças expedicionárias dos persas, fez esta
profecia: Não virão por dez anos, e quando vierem, se voltarão sem
ter obtido o que esperavam (obter), e tendo sofrido mais dores que
os que terão infligido”.

Muitos consideravam Epimênides como um dos “sete sábios” do


mundo antigo. Estes sete eram: Bias de Priene, Cleóbulo de Lindos,
Pítaco de Mitilene, Quilon de Esparta, Sólon de Atenas, Tales de
Mileto e Epimênides de Creta, ou Periandro de Corinto, ou Anajarsis
o cita (veja-se Plutarco, Vidas, Sólon XII. 4–6; cf. Clemente de
Alexandria, Estromata I. xiv).

Foi este Epimênides que, segundo Diógenes Laércio, aconselhou os


atenienses a fazerem sacrifícios “ao deus mais conveniente”,
conselho que pôde ter levado à edificação do famoso altar “ao deus
desconhecido”, que proporcionou a Paulo o ponto de partida para a
proclamação do Deus vivo (At 17:23).

23 Cf. R. Stob, Christianity and Classical Civilization, Grand Rapids,


1950, pp. 61, 62 e A.T.

Robertson, “Paul the Apostle”, em I.S.B.E. especialmente IV, 3.

Tito (William Hendriksen)

79

A citação de Epimênides aqui em Tt 1:12 é uma linha formada por


seis pés (verso hexâmetro), ritmo baseado em sílabas longas e
curtas do grego.

A representação dos cretenses como enganadores ou mentirosos


pode ter surgido de sua pretensão de ter em sua ilha a tumba de
Zeus.

Mas a reputação dos cretenses de ser mentirosos a fim de obter fins


egoístas (note-se o contexto, v. 11) estava tão amplamente
difundida que deu origem ao substantivo “cretismo”, que significa
“conduta cretense”, isto é, “mentir” (Plutarco, Aemilius 26); e ao
verbo “cretensiar” ou “falar como cretense”, que significava “dizer
mentiras”, “enganar” (exemplo, Políbio VIII. 19). Cf. “corintianizar”,
que significa “viver de forma imoral como um coríntio”.

A expressão “bestas brutas” descreve o caráter selvagem e cruel


dos cretenses dos dias de Epimênides e do tempo de Paulo e Tito.

Costumavam lançar a todos fora de seu caminho com um empurrão


a fim de obter uma vantagem pessoal. Alguns veem neste epíteto
descritivo uma alusão ao mitológico Minotauro cretense, metade
touro, metade homem, a quem Minos escondeu no labirinto de
Creta, onde até ser morto por Teseu, devorava jovens e donzelas
atenienses que lhe eram enviados a cada 9 anos como tributo.

“Ventres ociosos” assinala os cretenses como glutões, preguiçosos


e ávidos por sexo.

Então, os cretenses são falsários, egoístas e amantes dos prazeres.

Agora, alguns escritores consideram que a ação de Paulo ao citar


este veredito devastador com com relação ao caráter dos cretenses
é singularmente falta de tato, uma mancha sobre o bom nome de
toda uma população. No entanto, o caráter dos cretenses se exibia
por si mesmo de forma tão clara que a confirmação do severo juízo
vem de todas as direções e não está limitado a um só século. O
leitor pode ver isto por si mesmo. Além do substantivo “cretismo” =
mentira, e do verbo

“cretensiar” = enganar, dizer mentiras (estes derivados de Creta não

Tito (William Hendriksen)

80

existem em castelhano, referem-se a palavras gregas usadas na


literatura antiga), temos os seguintes testemunhos (as datas são
aproximadas): Políbio, historiador grego (203–120 a.C.):

“Com efeito, o amor ao lucro desonesto e a cobiça preponderam a


tal ponto, que de todos os homens, os cretenses são os únicos em
cuja estimativa o não obter lucro é sempre uma desgraça” ( The
Histories VI.

46).

Cícero, orador romano, estadista e filósofo (106–43 a.C.):

“Na verdade, os princípios morais dos homens são tão divergentes


que os cretenses … consideram que os assaltos nos caminhos (ou

“banditismo”) são algo honorável” ( República III. ix. 15).

Lívio, historiador romano (59 a.C.–17 d.C.):

“Os cretenses seguiram Perseu com a esperança de receber


dinheiro” (XLIV. xlvi).

Plutarco, ensaísta e biógrafo grego (46–120 d.C.):

“De seus soldados, os cretenses (somente) seguiram-no, não por ter


uma disposição favorável (para ele), mas sim porque tinham tão
fervente devoção a suas riquezas como as abelhas a suas colmeias.
Porque levava transbordantes tesouros, e tinha entregue, para que
se distribuíram entre os cretenses, taças e vasilhas e outros
utensílios de ouro e prata, avaliados em cinquenta talentos” (
Aemilius Paulus XXIII. 4).

Werner Keller, The Bible as History, Nova York, 1956, pp. 172, 173,
assinala que os antigos cretenses eram “bebedores poderosos” e
apresenta uma interessante evidencia arqueológica, o fato de que
se encontrassem grandes quantidades de taças vinhateiras e para
cerveja, estas providas de filtros, nas colônias filisteias, aqueles que,
segundo as Escrituras (Am 9:7), vieram de Caftor, isto é, Creta.
13 e 14. Não surpreende, então, que Paulo diga; Este testemunho
é verdadeiro. As ações dos cretenses demonstravam tão
claramente sua mendacidade e cobiça que Paulo não pode fazer
outra coisa que confirmar o juízo expresso no hexâmetro de
Epimênides.

Tito (William Hendriksen)

81

Tem-se tentado demonstrar que o veredito de Epimênides e de


Paulo é realmente uma contradição em si mesmo. Isto se faz por
meio do seguinte sofisma:

“Epimênides, um cretense, disse que os cretenses sempre mentem.

Portanto, o mesmo deveu mentir quando disse isto. Portanto, não é


verdade que os cretenses sempre mentem. Ou (pior ainda):
Portanto, os cretenses não mentem. Mas, se os cretenses não
mentir, então Epimênides, um cretense, teve que dizer a verdade.
Mas então, ele também, sendo um cretense, mentiu quando disse
que os cretenses sempre mentem”. E assim nos encontramos de
novo no ponto de partida.

Mas certamente tudo o que Paulo quis dizer era que Creta era
notável por seus muitos mentirosos constantes. Sua declaração
deixa suficiente lugar para as seguintes proposições:

a. Mesmo os cretenses mentirosos às vezes dizem a verdade.

b. Alguns cretenses não são tão mentirosos.

c. Este cretense em particular, ou seja, Epimênides, disse a verdade


quando disse que os cretenses, de modo geral, eram mentirosos
constantes.

Portanto, repreende-os severamente para que possam ser sãos


na fé.
Os propagadores do erro e os que os ouvem devem ser
repreendidos (cf.

2Tm 4:2) severamente (cf. 2Co 13:10), de forma decisiva, e isto não
somente pelos anciãos (veja-se comentário sobre o v. 9) mas
também por Tito mesmo, para que possam ser (isto é, possam
chegar a ser) o que ao presente não são, sãos (cf. 1Tm 1:10) em
sua posição com relação à verdade revelada em Cristo.

Paulo continua: em vez de dedicar-se aos mitos judaicos e a


mandamentos de homens que se apartam da verdade.

A fim de escapar do impacto da lei de Deus, os propagandistas do


erro se estavam dedicando (veja-se comentário sobre 1Tm 1:4) a
“mitos judaicos”, isto é, a contos fantásticos sobre antepassados; e
a

“mandamentos de homens”, isto é, a ordenanças produzidas por


homens.

Também estas eram, provavelmente, em grande parte judaicas em

Tito (William Hendriksen)

82

caráter. Na medida que podiam, diziam que estavam baseadas na


lei de Deus. No entanto, na verdade, obscureciam a intenção e o
sentido da lei.

Cf. Mateus 5:43; 15:3, 6, 9; Marcos 7:1–23; Lucas 6:1–11 e veja-se


C.N.T. sobre João 5:1–18.

Portanto, os enganadores cretenses se ocupavam com ilustrações


talmúdicas e decisões suscetíveis de caráter legal para as quais se
sustentava a pretensão das haver derivado da lei. Os mandamentos
que eles elogiavam e procuravam pô-los em vigor sobre outros, na
verdade eram mandamentos de “homens que se apartam da
verdade”. Estes

“homens” se referem aos judeus, particularmente a rabinos e


escribas judeus. A situação, pois, é a seguinte:

Os crentes firmes da ilha de Creta se relacionavam diariamente com


membros da igreja que não estavam tão firmes mas que estavam
dispostos a emprestar ouvidos enganadores judaizantes de falar
altissonante, tingidos de gnosticismo. Por sua vez, estes falsos
mestres estavam sob a influência de homens que estavam
completamente fora da igreja, por exemplo, judeus, propagandistas
farisaicos que rejeitavam completamente a Cristo, dando as costas
à verdade redentora de Deus revelada em seu Filho.

15. A natureza — pelo menos em parte — da doutrina subversiva


que literalmente estava sendo vendida (ensinada por falsos mestres
com o fim de obter “um lucro vergonhoso”) em Creta, sugerem-na as
palavras do v. 15. Os enganadores, que por sua vez estavam sendo
enganados por enganadores intrometidos, isto é, pelos judeus,
negavam isto: Todas as coisas (são) puras para os que são
puros; mas para os imundos e incrédulos nada (é) puro; pelo
contrário, imundas estão mesmo suas mentes e suas
consciências. 24

24 De acordo com a maioria dos comentaristas eu também


considero que o provérbio “Todas as coisas (são) puras para os que
são puros” é parte do ensino de Paulo. Ou foi cunhado por ele
mesmo ou tinha sido formulado por outros (talvez o próprio Jesus
Cristo; cf. Lc 11:38–41) e logo adotado por Paulo e citado contra a
diferenciação judaica entre “puro” e “impuro”.

Tito (William Hendriksen)

83

Os falsos mestres da igreja de Creta estavam tratando de reconciliar


a servidão judaica (o cerimonialismo) com a liberdade cristã. Muitos
deles, sem dúvida, tinham sido ensinados da infância na religião das
sombras, e lhes resultava difícil entender que com a vinda e morte
do Senhor estas sombras tinham desaparecido. Influenciados, como
estavam, pelos judeus impenitentes de fora da igreja, atribuíam um
certo grau de valor salvador (um valor que nem sequer a lei mesma
ensinava) às ordenanças cerimoniais — e ainda mais aos
refinamentos farisaicos destas ordenanças — a respeito do que era
“limpo” e o que era “imundo”

com relação a produtos alimentícios, móveis ou utensílios, corpo


humano, etc. Consideravam a pureza como um atributo não da
mente e consciência do homem mas sim das coisas materiais.
Como se mostrou em conexão com 1Tm 4:3, provavelmente se
viram também fortalecidos neste erro pelo dualismo pagão que
considerava a matéria como pecaminosa em si mesma. Mas a
principal influencia sinistra aqui em Creta parecia vir dos judeus.

Jesus tinha combatido este erro de forma vigorosa. Tinha dito: “Não
o que entra na boca contamina ao homem; mas o que sai da boca,
isso contamina ao homem, porque de dentro, do coração do homem
saem os maus pensamentos” (veja-se Mt 15:11, 15–20; Mc 7:14–22;
Lc 11:38–41

e cf. Pv 4:23). A igreja primitiva tinha seguido o caminho que Cristo


lhe tinha assinalado (como está implícito em At 10:9–16; 11:1–18;
15:20).

Em suas epístolas, Paulo também tinha defendido uniformemente a


tese de que nada é “imunda em si” (Rm 14:14, 20; cf. 1Co 6:12;
10:23; Gl 2:11–21; Cl 2:16–23), e que é a disposição do coração e o
propósito da Outros intérpretes (por exemplo, J. Van Dijk,
Paraphrase Heilige Schrift, Timotheus, Titus en Philemon, p. 68)
consideram-no como um dito dos falsos mestres, sendo desculpa de
seus ensinos e conduta imorais.

Mas esse ponto de vista não reconhece o fato de que estes


propagadores do erro eram principalmente “da circuncisão” (v. 10),
pessoas que estimavam muito a Halachá judaica (v. 14; cf.
também v. 16 e 3:9). Era muito mais provável que seus regra morais
tivessem a tendência à rigidez que à liberalidade (veja-se 1Tm 4:3;
cf. Cl 2:21). Além disso, se Rm 14:14, 20 e 1Tm 4:4, 5 contêm
ensino paulino positiva, por que não Tt 1:15?

Tito (William Hendriksen)

84

mente o que faz com que uma coisa seja limpa ou imunda (Rm
14:23; 1Co 10:31). Em Romanos e 1 Coríntios aplica-se esta regra
básica numa direção (comer sem considerar o irmão fraco é
pecaminoso); aqui se aplica em outra direção (comer com uma
mente incrédula ou com consciência contaminada é imundo).

“Todas as coisas (são) puras para os que são puros; mas para os
imundos e incrédulos nada (é) puro”. A expressão “todas as coisas”
a explica melhor o próprio Paulo. Equivale a “toda criação de Deus”
(1Tm 5:5), isto é, tudo o que Deus criou para seu consumo como
alimento.

Não é a coisa impura o que faz com que o homem seja impuro,
como erroneamente sustentavam os judeus (veja-se C.N.T. sobre Jo
18:28), mas sim são os homens impuros os que fazem com que
tudo o que é puro seja impuro, verdade já esboçada em Ag 2:13.

Os homens puros são os que foram purificados de sua culpa pelo


sangue de Cristo e, tendo sido regenerados pelo Espírito Santo,
estão sendo purificados constantemente pelo mesmo Espírito da
contaminação de seus pecados (veja-se comentário sobre Tt 3:5;
logo, Mt 5:8; Jo 3:3, 5; 1Co 6:11; Ef 1:7; 5:26, 27; 1 Jo 1:7, 9; cf.
C.N.T. sobre Jo 13:10; 15:3).

Estes são os que não rejeitam o que Deus criou como bons
alimentos, mas sim “participam deles com ação de graças” (veja-se
comentário sobre 1Tm 4:3, 4).
Por outro lado, aqueles que está contaminados, sujos, ou imundos,
isto é, os judeus, e tendo rejeitado a Cristo são ao mesmo tempo
incrédulos, contaminaram, como resultado, todos os puros dons de
Deus.

Mesmo suas mentes, os órgãos que refletem sobre as coisas


espirituais e guiam a vontade, e suas consciências, isto é, seu ser
moral no ato de julgar suas ações, estão contaminadas — e a
menos que intervenha a graça de Deus, permanecem nesse estado;
note-se o indicativo perfeito passivo. (Quanto ao conceito de
consciência veja-se comentário sobre 1Tm 1:5). Isto é evidenciado
pelo fato de que seus juízos morais estão pervertidos e não chegam
a um arrependimento que os leve a piedade.

Tito (William Hendriksen)

85

16. Continua a descrição de “homens que se apartam da verdade”,


descrição iniciada no v. 14b. Então, referindo-se aos judeus
(particularmente aos líderes farisaicos que embora forasteiros
estavam exercendo uma influência sinistra sobre os falsos líderes
da igreja de Creta), Paulo acrescenta: A Deus professam
conhecer. Como seus antepassados remotos (Dt 6:4), assim
também estes judeus proclamam diante de todos os que queiram
ouvi-los, que conhecem único Deus verdadeiro como seu Deus
(veja-se C.N.T. sobre Jo 8:54, 55; e cf. Rm 2:17). “Conhecemo-lo”,
declaram; e querem dizer, “com um conhecimento intuitivo e direto”
(note-se o verbo usado no original).

Agora, é verdade que Deus se revelou a seus antepassados de uma


forma muito especial, como a nenhuma outra nação (Sl 96:5; 115;
135; 147:19, 20; Amós 3:2; Rm 3:1, 2; 9:1–5); mas em vez de
compreender que uma maior oportunidade implica uma maior
responsabilidade, especialmente com os que não conhecem a Deus
(cf. Gl 4:8; 1Ts 4:5), eles se haviam posto jactanciosos e tinham
rejeitado completamente ao Messias. Por isso, Paulo pode afirmar
que estes judeus professam conhecer a Deus, mas por suas ações
o negam. Suas ações desmentem sua profissão de fé. (O verbo
negar, embora não aparece nas primeiras epístolas de Paulo,
encontra-se repetidas vezes nas pastorais; veja-se comentário
sobre 1Tm 5:8; 2Tm 2:12, 13; 3:5; Tt 2:12.) Para um relato vívido
das ações dos dirigentes judeus em que Paulo está pensando
principalmente, veja-se Mt 23. Estas ações podem-se resumir em
duas palavras: hipocrisia e rejeição de Cristo. Eles seguem
rejeitando-o ao influenciar erroneamente aos falsos mestres de
Creta.

Agora se declara a razão pela qual cometem estas más ações:


porque são abomináveis e desobedientes, inabilitados para
toda obra boa.

Fazem o que fazem devido ao que são em sua natureza interna.


Não surpreende que Paulo caracterize a quem são “imundos em
sua mente e em sua consciência” (veja-se comentário sobre o v. 15)
como que são abomináveis, detestáveis, ou desprezíveis aos olhos
de Deus.

Novamente, são abomináveis porque, apesar de ser tão dados a


defender

Tito (William Hendriksen)

86

regras e regulamentos de confecção humana (cf. Is 1:12–15; Jr


6:20; Am 5:21–23; Mt 23:23–33; Lc 18:11, 12) — Ou diremos ,
antes,, devido a este mesmo feito? —, são desobedientes à santa
lei de Deus. Por isso, em vez de ser “homens de Deus
completamente equipados para toda obra boa” (veja-se comentário
sobre 2Tm 3:17; cf. 2Tm 2:21), são exatamente o contrário:
“inabilitados para toda boa obra” (depois de provados, rejeitados
como indignos), completamente incapazes de realizar qualquer obra
que proceda da fé, feita de acordo com a lei de Deus, e que redunde
para sua glória.

Í
SÍNTESE DE TITO 1

Ver o esboço no início deste capítulo.

Ao dirigir esta carta a Tito, apresentado aqui por Paulo como filho
genuíno na comum fé, o apóstolo apresenta-se como servo de Deus
e apóstolo de Jesus Cristo. Declara que cumpre este ministério para
promover a fé dos escolhidos de Deus e o conhecimento da verdade
que harmoniza com (ou: promove) a vida de devoção cristã.
Considera seu apostolado e a devoção deles como baseados na
esperança de vida eterna. É essa esperança a qual incentiva a
Paulo e aos crentes em geral a ser fiéis a seu chamado. O Deus
que, em contraste com os cretenses, nunca engana a ninguém,
prometeu vida eterna antes que começasse o processo dos tempos
sem fim; isto é, ele fez a promessa desde a eternidade. A seu
devido tempo começou-se a proclamar plena e autoritativamente, na
pregação ( querigma, proclamação) de Paulo, sua palavra com
relação a esta grande salvação, mensagem que tinha sido
encomendado a Paulo.

Paulo pronuncia a bênção de saudação a Tito: “graça e paz de Deus


o Pai e Cristo Jesus nosso Salvador”.

Foi no interesse de promover o espírito de santificação na vida da


congregação que Paulo tinha deixado a Tito na ilha de Creta. Tendo
este propósito presente, lembra-se agora a Tito por escrito a ordem
que lhe

Tito (William Hendriksen)

87

tinha sido dada anteriormente de forma oral, isto é, que devia


corrigir o que faltava fazer e nomear anciãos em cada cidade. Os
requisitos para o cargo de ancião estão resumidos nas pp. 388–394.

Que a ideia da santificação na vida congregacional é dominante na


mente do apóstolo enquanto escreve este capítulo, vê-se
claramente pela razão que dá, mostrando por que se necessitam de
forma muito especial nas igrejas de Creta homens tão altamente
qualificados para o cargo de ancião. Fala de falsos mestres no seio
da igreja, homens insubordinados, faladores de vaidades,
enganadores, interessados em lucros desonestos ou vergonhosos;
descreve aos cretenses como sempre enganadores, bestas brutas,
ventres ociosos”; e fala de certa classe de judeus a quem ele
descreve como “homens que viraram as costas para a verdade”, e
estão “contaminados em sua mente e sua consciência”. Como
resultado, é uma necessidade imperiosa ter uma liderança sábia e
uma disciplina salvadora, a fim de que a santificação substitua a
imundícia.

Os seguintes são artigos interessantes sobre Creta: “Greece, The


Birthplace of Science and Free Speech” [Grécia, berço da ciência e
do discurso livre], em Everyday Life in Ancient Times, publicado por
The National Geographic Society, Washington, D.C., 1953,
especialmente pp. 189, 191, 202, 203; e “Greece, Cradle of Western
Civilization”

[Creta, berço da civilização ocidental], em The National Geographic,


Noviembre de 1953, pp. 693–706. Ver também E. G. Kraeling, op.
cit. , p. 463.

Tito (William Hendriksen)

88

TITO 2

NA VIDA FAMILIAR E INDIVIDUAL

ESBOÇO DO CAPÍTULO 2

Tema: O apóstolo Paulo, escrevendo a Tito, dá-lhe instruções para a


promoção do espírito de santificação

Na vida familiar e individual


Tt 2:1–10 Todas as classes de indivíduos que compõem o círculo
familiar deveriam conduzir-se de tal maneira que por

sua conduta adornem a doutrina de Deus, seu Salvador.

Tt 2:11–15 Razão: A graça de Deus manifestou-se a todos para


santificação e para esperar com alegria a aparição

gloriosa de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo.

TT 2:1–10 - TODAS AS CLASSES DE INDIVÍDUOS QUE


COMPÕEM O

CÍRCULO FAMILIAR DEVERIAM CONDUZIR-SE DE TAL


MANEIRA QUE POR

SUA CONDUTA ADORNEM A DOUTRINA DE DEUS, SEU


SALVADOR.

1. Foram dadas instruções para a promoção do espírito de


santificação na vida congregacional. Paulo solicitou a Tito para que
completasse a organização das diversas igrejas da ilha, para que,
por meio da obra de anciãos verdadeiramente consagrados, fosse
silenciada a voz das pessoas que por meio de suas falsas doutrinas
e práticas estavam contaminando as igrejas, e para que pudesse
florescer a vida congregacional. Essa foi a substância do capítulo 1.

Agora, no capítulo 2, Paulo concentra a atenção de Tito sobre a vida


familiar e individual. Dá mandamentos relativos à conduta adequada
de cinco classes de indivíduos: anciãos, anciãs, casadas jovens,
homens jovens (Tito deve dar o exemplo) e escravos. A ênfase
sobre a família é evidente especialmente nos vv. 4 e 5: “de modo
que possam ensinar às

Tito (William Hendriksen)

89
mulheres mais jovens a ser amantes com seus maridos e a que
amem a seus filhos”, etc.

Quanto ao ensino de Paulo com relação à família cristã, cf. 1Tm


5:1–8; logo, Gl 3:28; Ef 5:22–6:4; Cl 3:18–21. Sobre os escravos e
seus senhores, considerados membros da família, cf. 1Tm 6:1, 2;
logo, Ef 6:5–9; Cl 3:22–4:1; Filemom. 25

Uma vez que Tito é o homem que deve entregar as instruções de


Paulo com relação aos cinco grupos, o apóstolo começa
escrevendo: Mas quanto a ti, fala o que está de acordo com a sã
doutrina. Note-se a palavra de contraste, “Mas quanto a ti”. Cf. um
contraste semelhante em 1Tm 6:11; 2 Ti. 3:10, 14; 4:5. A vida de
Tito e seu ensino devem marcar um agudo contraste com a dos
inimigos “imundos e incrédulos” da fé que estavam causando tanto
machuco em Creta (como se viu no capítulo 1).

A estes propagandistas do erro não só é preciso repreendê-los


severamente (Tt 1:13), mas sim o mal é deve ser vencido com o
bem. Os anciãos devem cumprir o dever contra os mestres da falsa
religião (capítulo 1), mas não somente os anciãos, mas sim o
próprio Tito deve dar o exemplo. Mesmo em suas conversações
diárias informais deve

“falar” o que se conforma à sã doutrina. Note-se o verbo “falar” ou,


literalmente, “conversar” (λάλει) que indica um falar informal.

Agora, falar “o que está de acordo com (ou “é adequado a”, cf. 1Tm
2:10; Ef 5:3) a sã doutrina” certamente significa que, como o autor a
concebe, a doutrina e a vida devem harmonizar. Esta é a chave de
tudo o que vem a seguir nos vv. 2–10. Portanto, a posição que
alguns defendem, ou seja, que a moralidade aqui pedida em
nenhum sentido é especificamente cristã, está em conflito com a
declaração de Paulo.

Naturalmente, é verdade que mesmo fora da igreja se dão alguns


dos aspectos de caráter aqui mencionados — por exemplo, ser
temperado, ou sóbrio, dono de si ou com domínio próprio — em
listas de requisitos 25 Para um belo resumo do ensino bíblico com
relação ao lar cristão, poderia consultar-se (além de diversas obras
sobre ética, artigos em encilopedias, e tratados especiais) os
excelentes esboços temáticos no índice de New Chain Reference
Bible de Thompson, pp. 62–66, artigo “Home”.

Tito (William Hendriksen)

90

morais que devem cumprir as pessoas que ocupam certas posições


de importância na vida: o filósofo estoico, o general, etc. 26 Mesmo
o incrédulo tem “alguma consideração pela virtude e a boa conduta
exterior”, verdade que não pode negar-se jamais (veja-se
comentário sobre 1Tm 3:7, e Cânones de Dort, terceiro capítulos e
quarto, art. 4; note-se, no entanto, a limitação no resto do artigo).
Mas quando nesta carta mencionam-se estas mesmas qualidades
(ou em 1 Ti. 3), não se podem separar de seu contexto, nem devem
ser dissociadas do sentido geral dos ensinos das Escrituras.

Não se pode separar Tito 2:1, 2 de Tito 2:12, 13. O contraste


aparece claramente tão logo se formula a pergunta: “Qual é a fonte
destas virtudes, como se originam, de acordo com o que norma tem
que julgar-se sua manifestação, e com o que propósito devem-se
usar?”

Logo, as qualidades que se mencionam nos versículos seguintes


são especificamente cristãs neste sentido, que supõem a obra da
poderosa graça de Deus no coração, são motivadas pelo exemplo
de Cristo, medem-se pela santa lei de Deus, e sua meta é a glória
de Deus.

2. A primeira regra refere-se aos “homens anciãos”. 27 Paulo diz,


que os homens anciãos sejam temperantes, dignos, donos de
si, sãos na fé, a.

no amor, (e) na perseveranç


Os que penteiam cãs devem ter as mesmas características morais
que anciãos e diáconos. Tito deve exortá-los (no v. 2 provavelmente
26 Veja-se listas em p. 201 de The Pastoral Epistles de Burton Scott
Easton, Nova York, 1947.

27 Tito tem a sequência: homens de idade, mulheres de idade,


mulheres jovens, homens (mais) jovens, o que é um arranjo
quiástico. 1Tm 5:1, 2 tem literalmente: homem (mais) velho, homens
(mais) jovens, mulheres (mais) velhas, mulheres (mais) jovens.
Note-se que três das expressões da lista de Tito diferem de seus
equivalentes na lista de Timóteo. “Homem de idade” (πρεσβύτης, cf.
Fm 9) não pode apontar ao ancião-governante da igreja, mas a
palavra que em 1Tm 5:1 só quer dizer “homem mais velho”
(πρεσβύτερος) em outros lugares das Pastorais tem o sentido de
“ancião governantes”

(1Tm 5:17, 19; Tt 1:5). “Mulher de idade” (πρεσβῦτις) é o feminino


de πρεσβύτης (que por sua vez é a forma prosaica de πρέσβυς),
mas “mulher mais velha” é o adjetivo comparativo usado como
substantivo. Por último, “moça” é o adjetivo jovem com terminação
feminina usado como adjetivo, mas “mulher mais jovem” é o
comparativo desse mesmo adjetivo. Não obstante, como já
observamos em conexão com 1Tm 5:1, às vezes a ideia
comparativa perde-se.

Tito (William Hendriksen)

91

esteja implícito o verbo do v. 6) a que sejam temperantes ou sóbrios,


isto é, moderados com relação ao uso do vinho (veja-se v. 3) e em
todos os seus gostos e hábitos (cf. 1Tm 3:2, 11). Também devem
ser dignos, isto é, sérios, veneráveis, graves, respeitáveis (cf. 1Tm
3:5, 8, 11); donos de si ou com domínio próprio, isto é, homens de
juízo amadurecido e que saibam refrear-se (c. Tt 1:8; logo 1Tm 3:2);
e sãos (veja-se comentário sobre o v. 1; especialmente nota 193);
não mórbidos (cf. 1Tm 6:4; logo, Rm 14:1), mas sim cheios de
saúde e que comuniquem saúde: que em toda direção difundam
saúde moral e espiritual (cf. Tt 1:9, 13; logo, 1Tm 1:10; 6:3; 2Tm
1:13; 4:3).

Esta cura deve manifestar-se com relação à fé, ao amor e à

perseverança. Talvez aqui o artigo seja melhor traduzido com o


possessivo sua … seu … sua. sua fé, para ser sã, não deve ser
indiferente nem misturada com erro (cf. Tt 1:14). Seu amor não deve
degenerar em sentimentalismo nem deve esfriar-se (Mt 24:12; Ap
2:4). E sua perseverança não deve ser substituída pela
pusilanimidade por um lado, nem pela obstinação pela outra.

Em sua atitude para Deus, os anciãos devem mostrar que são sãos
na fé. Devem descansar completamente nele e na verdade
revelada. Em sua atitude para o próximo devem demonstrar um
amor são. E em sua atitude para as provas amargas, devem revelar
uma paciência ou firmeza sã (para um estudo desta palavra, veja-se
C.N.T. sobre 1Ts 5:14, nota 108; 2Ts 1:4 e 3:5).

3. Aos quatro requisitos para os homens anciãos, somam-se agora


quatro requisitos semelhantes para as mulheres avançadas em
idade: (exorta a) as anciãs, igualmente, (a serem) reverentes em
seu comportamento, não caluniadoras, e não escravizadas de
muito vinho, mestras daquilo que é excelente.

Em toda sua presença (portanto, não somente em seu vestido, 1Tm


2:9) assim como em seu comportamento, as mulheres maiores
devem ser reverentes, conduzindo-se sempre como servas de Deus
no templo,

Tito (William Hendriksen)

92

porque isso são! Cf. Ap 1:6. O tema da vida destas anciãs (assim
como o de todos os membros da família cristã) deve ser sempre:
Senhor meu Deus, enche minha vida,
Em todas suas partes, com louvor,

Para que todo meu ser proclame

Teu ser e teus caminhos.

Louvor não apenas dos lábios,

Nem ainda louvor só do coração,

Mas uma vida feita

Toda de louvor.

Louvor nas palavras comuns que eu falar,

Nos olhares e tons da vida comum,

Na mesa ao conversar

Com meus entes queridos;

Suportando o erro, a repreensão ou a perda,

Com doçura e firme decisão,

Amando e abençoando os que odeiam,

Retribuindo o mal com o bem.

(Horatius Bonar, 1866)

Note-se que se combinam “não caluniadoras” (sobre o qual veja-se


1 Ti. 3:11) e “não escravizadas de muito vinho”. Com frequência o
beber vinho e a intriga maliciosa vão juntos (quanto a beber vinho
ver as observações feitas sobre 1Tm 3:8 e sobre 1Tm 5:23). Então,
as anciãs devem ser temperadas, bem como os anciãos. Não
devem deixar-se escravizar-se a (quanto a este uso figurado, cf. Rm
6:18, 22; 1Co 9:19; Gl 4:3) muito vinho. Pelo contrário, por seu
exemplo de piedade devem ser “mestras do que é excelente” (cf.
1Pe 3:1, 2).

Tito (William Hendriksen)

93

4 e 5. Tal “ensino pelo exemplo” tem como um de seus propósitos o

“ensino” das mulheres mais jovens que estão casadas. Por isso
Paulo continua: de modo que possam ensinar às mulheres mais
jovens a ser: a. amarem seus marido (ou amantes de seus
maridos) e a b. amarem seus filhos (amantes de seus filhos), a
serem c. autocontroladas,

d. castas,

e. trabalhadoras,

f. amáveis,

g. sujeitas ao seu próprio marido.

A gente entende imediatamente que ninguém — nem sequer Tito —

está melhor preparado para ensinar às mulheres jovens que uma


mulher anciã, experimentada. Note-se a ênfase sobre o amor. A
mulher cristã jovem deve ser ensinada a amar o seu marido e a
amar seus filhos. Não foi o amor o que a salvou? Veja-se Jo 3:16.
Este amor, vindo do céu, sendo derramado no coração, deve “fluir”
para outros; e certamente entre aqueles “outros” devem ocupar o
lugar proeminente seu marido e seus próprios filhos. Além disso, a
virtude cristã do domínio próprio,

“proprietárias de si”, — a mesma virtude que se exige não somente


dos bispos (Tt 1:8; logo 1Tm 3:2) mas também dos anciãos em geral
(v. 2) e que está implícito no que se exige às anciãs (v. 3) — é um
requisito imprescindível para toda esposa e mãe cristã prática. As
mulheres mais jovens devem evitar escrupulosamente toda
imoralidade de pensamento, palavra e ação. Além disso, devem
concentrar a atenção em suas próprias famílias. Por isso, não
somente devem ser castas, mas também trabalhadoras (veja-se
comentário sobre 1Tm 2:10 e especialmente sobre 1Tm 5:13). As
duas virtudes encontram-se obviamente relacionadas. Agora,
enquanto desenvolvem suas tarefas na família, estas mulheres
jovens devem tomar cuidado com não pôr-se irritáveis ou cruéis
devido à tensão constante dos afazeres domésticos. Devem orar
pedindo graça para seguir sendo amáveis, e isto não somente com
os

Tito (William Hendriksen)

94

maridos e filhos, mas também com os escravos. 28 Além disso, para


que as mulheres cristãs não comecem a pensar que a igualdade em
posição espiritual diante de Deus e a grande liberdade que agora
lhes pertence como crentes (Gl 3:28) autoriza-as para esquecer a
ordenança divina de criação a respeito de sua relação com o marido
(Gn 3:16), Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, acrescenta que
devem estar “sujeitas a seus maridos” (cf. comentário sobre 1Tm
2:11–15, e cf. Rm 7:2; 1Co 7:4; 14:34, 35; Ef 5:22–24, 33; Cl 3:18;
1Pe 3:1–6). Certamente à luz de Gn 24:67; Ef 5:22–33; Cl 3:19; 1Pe
3:7, quando o marido também é crente, isto não é uma carga. E
quando não o é, então fazê-lo “para o Senhor” faz com que a carga
seja passível.

Agora se acrescenta uma frase que indica propósito, que


provavelmente qualifica não somente o último requisito, mas sim os
sete: para que a palavra de Deus não seja vituperada. Veja-se
comentário sobre 1Tm 6:1. Este é linguagem caracteristicamente
paulino; cf. Rm 2:24. Por sua vez, ele o tirou do Antigo Testamento
(Is 52:5). Uma má conduta da parte das mulheres jovens facilmente
conduziria a que se fizessem observações caluniosas com relação
ao evangelho. Não somente os gregos julgam uma doutrina por
seus efeitos práticos na vida cotidiana (Crisóstomo), mas também o
mundo em geral.
Se as mães jovens, que professam ser cristãs, manifestassem falta
de amor por seus maridos e por seus filhos, falta de sensatez, de
pureza, de apego ao lar, de bondade e submissão, fariam que a
mensagem de salvação fosse desprezado pelos de fora. Além disso,
deve-se ter em mente, que quando Paulo diz “para que a palavra de
Deus não seja vituperada”, quer dizer, “para que a palavra de Deus
seja honrada”. Isto 28 É possível aceitar uma pontuação diferente,
de modo que em vez de traduzir “trabalhadoras, amáveis”, teríamos
que traduzir (com a Bouma e outros): “boas trabalhadoras no lar”.
Mas a primeira tradução está mais em sintonia com toda a lista de
requisitos. Note-se que nenhum dos quatro precedentes tem um
modificativo; cada um é uma só palavra (no grego): amantes-com-
seus-maridos (uma só palavra), amem-a-seus-hijos (novamente
uma só palavra no original), proprietária de si (uma só palavra),
castas.

Tito (William Hendriksen)

95

também, como se notou anteriormente, é um modo tipicamente


paulino de falar (veja-se pp. 14, 15).

6. A admoestação que se deve passar aos mais jovens” das


diversas congregações é breve, mas em sua brevidade mesma
inclui tudo: Igualmente, exorta aos (mais) jovens a que exerçam
o domínio próprio em todo sentido. 29 O fato de que esta
admoestação é breve faz com que seja totalmente provável que a
frase “em todo sentido” corresponda aqui e não deva unir-se com o
v. 7. Portanto, em todo sentido, quer a atenção se dirija rumo à
moral ou a doutrina, os jovens devem pôr-se sob a disciplina do
evangelho, e devem guardar-se contra os desvios quer seja
provenientes das más inclinações de sua própria natureza
pecaminosa ou pelas opiniões e costumes que prevalecem no
mundo pagão que os rodeia. Não devem jamais pôr suas próprias
conclusões, sentimentos ou ambições acima da vontade de Deus
(cf. Rm 12:3; cf. 2Co 10:5). Devem aprender a dominar-se a si
mesmos. O verbo traduzido “exerçam o domínio próprio” vem da
mesma raiz do adjetivo traduzido “sensatos”.

Logo, aqui se exorta aos jovens a que exerçam a mesma virtude


que se exige do supervisor (Tt 1:8; cf. 1Tm 3:2), dos homens
anciãos (Tt 2:2), das casadas jovens (v. 4) e, por implicação, das
anciãs (v. 3).

7 e 8. Pelo fato de que Tito, embora não tão jovem como Timóteo
(veja-se p. 48), ainda deve contar-se entre os “mais jovens”, é lógico
que Paulo lhe exija que seja um exemplo para o grupo mencionado
no versículo precedente. Paulo diz: demonstrando tu mesmo um
modelo de boas obras; em teu ensino (mostrando)
incorruptibilidade, dignidade; que (você) falar (seja) são, não
censurável.

29 Em que limite de idade está pensando o apóstolo quando se


refere a estes “mais jovens”? Está pensando somente nos menores
de quarenta? (Veja-se comentário sobre 1Tm 4:12 e 2Tm 2:22). Mas
então, se “anciãos” forem os de mais de sessenta, ficaria um grande
grupo — entre os 40 e os 60 anos

— para os quais não haveria exortação alguma. Por isso, “(mais)


jovens” poderia indicar aqui aos menores de 60; ou também poderia
rebaixar o limite de idade que separa as duas classes — “anciãos”

e “(mais) jovens” — por exemplo, a 50 anos. Veja-se Irineu Contra


as Heresias, II.xxii, 5; também Jo 8:56, 57.

Tito (William Hendriksen)

96

Uma admoestação semelhante dirigiu-se a Timóteo. Ele também


tinha recebido uma admoestação para que fora o modelo dos
crentes (em palavra, conduta, amor, fé e pureza). A palavra modelo,
também, é exatamente a mesma; portanto, veja-se comentário
sobre 1Tm 4:12 (cf.
2Ts 3:9; Fp 3:17). Note-se a bela coordenação: Tito deve a.
admoestar aos mais jovens (v. 6), e b. dar-lhes um bom exemplo (vv.
7 e 8).

Preceito e exemplo andam de mãos dadas. O preceito só não tem


força, porque com frequência “onde o preceito falha, o exemplo tem
êxito”. 30

Os mais jovens das diversas congregações confiantes aos cuidados


de Tito deviam poder ver em seu líder o que realmente são as boas
obras.

Note-se a ênfase constante das pastorais nestas obras nobres ou


boas obras. Não poderia considerar-se isto uma reação, da parte de
Paulo, diante da desfiguração e abuso de sua doutrina de “salvação
pela graça”?

Tito deve, em seu ensino, mostrar incorruptibilidade. Deve dar a


instrução de forma tão clara e valente na bem equilibrada verdade
do evangelho que se faça evidente a todos que ele não foi nem
pode ser infectado com as mentiras e distorções dos adversários.
Além disso, a atitude e o modo em que apresenta seu ensino deve
ser de dignidade e seriedade. Seu ensino mais formal não somente
deve estar caracterizada pela pureza do conteúdo e seriedade de
método, mas sim tudo seu falar (sua palavra quando quer e onde
quer que fale), seja pronunciada na forma de um sermão, uma lição,
uma mensagem de consolação ou mesmo como uma conversação
cotidiana comum, deve ser sã e não censurável, isto é, não sujeito a
uma rejeição justa (cf. sinônimo em 1Tm 6:4).

Agora, o resultado ou propósito que se quer obter com essa conduta


é: de modo que (ou: com o fim de que) quem está na oposição
se envergonhe, não tendo nenhum mal que dizer de nós. A
respeito da 30 “Porque caso contrário a doutrina terá pouca
autoridade, se seu poder e majestade não brilha na vida do bispo,
como num espelho. Paulo deseja, pois, que o mestre seja um
modelo que seus estudantes possam copiar” (Calvino, Comentario a
las Epístolas Pastorales, Grand Rapids, MI: TELL, pp. 362–
363.

Tito (William Hendriksen)

97

expressão “na oposição” ou “do (lado) oposto” — a elipse é obscura


note-se que era o centurião que “se pôs de frente” ou “diante de”
Jesus na cruz (Mc 15:39). Lemos de ventos contrários (Mt 14:24; Mc
6:48; At 27:4). Na passagem que estamos considerando o composto
com ἀντί usa-se em sentido metafórico; a oposição aqui adquire o
caráter de hostilidade (cf. At 26:9; 28:17; 1Ts 2:15). Aquele que está
na oposição é o adversário espiritual (cf. 1Tm 5:14; 2Tm 2:25). A
referência é especialmente a qualquer dos propagadores do erro de
Creta, descritos em Tt 1:10–16.

Agora quando o oponente começa a notar que seu plano oculto e


ruim de espalhar murmurações maliciosas sobre Tito, ou que a
apresentação de cargos formais contra ele fracassa, devido à
conduta irreprochável do representante de Paulo, que refuta
completamente as insinuações e acusações que se dirigiam contra
ele, este inimigo da verdade será envergonhado (como em 2Ts 3:14;
1Co 4:14). Parecerá um néscio ao não ter “nenhum mal que dizer
sobre” … aqui esperaríamos que a expressão seguinte fora “de ti”
(Tito), mas realmente é “de nós”, porque o antagonismo não está
dirigido contra Tito como um indivíduo isolado, mas sim contra ele
como discípulo de Cristo; por isso realmente contra Cristo e todos
seus mensageiros.

9 e 10. Os escravos também pertenciam à família. Em sua primeira


epístola a Timóteo, o apóstolo distingue entre escravos que têm
senhores crentes e os que não os têm (1Tm 6:1, 2). Aqui em Tito
não se faz a distinção. É preciso transmitir o mandamento a todos
quão escravos ouvem o evangelho; sem dúvida, especialmente a
todos os escravos crentes. Paulo diz: (Exorta) aos escravos a
serem submissos em tudo a seus senhores, que estejam
desejosos de (os) agradar, não retrucando, não defraudando,
mas evidenciando a máxima fidelidade.

Para uma discussão da questão da escravidão no tempo de Paulo,


veja-se comentário sobre 1Tm 6:1, 2. Se todos os senhores e
escravos tivessem tomado a peito as inspiradas palavras de Paulo a
respeito da escravidão, esta instituição tivesse chegado a seu fim
sem banhos de

Tito (William Hendriksen)

98

sangue. Uma olhada superficial à passagem que agora discutimos


poderia fazer com que um pensasse que o autor quase não poderia
chamar-se justo para com o escravo, negligenciando o assinalar a
igualdade do escravo e o senhor diante de Deus, e aparentemente
absolvendo os pecados do senhor. Mas esta inferência seria
errônea, porque negligencia os atos importantes: a. Tt 2:9, 10
contém somente parte do ensino de Paulo com relação à relação
escravo/senhor (cf. Ef 5:8, 9; Cl 3:25; 4:1; Fm 16); e b. mesmo aqui,
na passagem de Tito, o contexto imediatamente seguinte (note-se
particularmente o v. 11) enfatiza a completa igualdade de todos os
crentes, escravos ou livres, do ponto de vista da graça redentora.

O verbo ou do v. 6 está novamente implícito; por isso “exorta ou


admoesta os escravos”. Os três pontos a respeito dos quais é
preciso admoestar aos escravos são:

(1) Comportamento.

Os escravos devem satisfazer os desejos de seu senhor, e isto “em


tudo” (cf. Cl 3:22; logo, Ef 5:24). Da manhã até a noite e em toda
categoria de trabalho o escravo deve sujeitar-se a seu senhor.
Quase não é necessário acrescentar que esta frase “em tudo” não
deve ser tomada em sentido absoluto, como se o apóstolo quisesse
dizer que mesmo quando o senhor lhe pedisse dizer uma mentira ou
roubar, cometer adultério ou homicídio, o escravo deveria obedecer.
A frase que indica propósito no final do v. 10 implica uma restrição,
porque certamente ao aceitar a comissão de um pecado o escravo
não poderia jamais estar em condições de “adornar a doutrina de
Deus nosso Salvador”. Cf. At 4:19; 5:29; Ef 5:21. 31

31 Portanto, não vejo necessidade de adotar o ponto de vista de


Bouma e outros, de que ἀγαθήν (v. 10, o melhor texto) é uma
palavra limitante e deve ser traduzida “com relação ao que é bom”.
Mais natural parece ser a construção que deu lugar à tradução
encontrada na RC e V.M.: “mostrando toda boa lealdade
(fidelidade)”. Poderia considerer-se o original como uma expressão
idiomática para dizer: “mostrando fidelidade ao máximo”. Cf. o
original em Tt 3:2; 2Tm 4:14.

Tito (William Hendriksen)

99

(2) Disposição.

Não basta o cumprimento externo da vontade do mestre. Também


se proíbem o resmungar e a queixa oculta. Uma disposição mal-
humorada jamais conseguiu ganhar uma alma para Cristo. Então, os
escravos devem estar desejosos de agradar, ter boa disposição.
Este adjetivo é tipicamente paulino: em outros lugares o usa não
menos de sete vezes, enquanto no resto do Novo Testamento
aparece somente uma vez (Hb 13:21). E mesmo se acrescentarmos
a esta única ocorrência o número de vezes que Hebreus emprega o
verbo cognato e o advérbio (a justiça exige que façamos esta
adição), a razão da frequência ainda é de 7 a 5 (e se a referência
em Tito for incluída, 8 a 5) em favor de Paulo.

O aspecto negativo de ter a disposição de agradar é não retrucar.

Este composto de ἀντί aparece nove vezes no Novo Testamento: Lc


2:34; 20:27; Jo 19:12; At 13:45 28:19; 28:22; Rm 10:21; Tt 1:9; 2:9.
O
substantivo cognato aparece em quatro passagens: Hb 6:16; 7:7;
12:3 e Jd 11. Embora o sentido básico é o de responder, com
frequência leva o matiz de desobediência ativa, resistência, rebelião,
insistência. Veja-se por exemplo, Rm 10:21; Hb 12:3; Jd 11.
Provavelmente tenha aqui também o mesmo matiz. Interpretadas
deste modo, as duas expressões formam um par que se
complementa: “desejosos de agradar” e disposição “não rebelde”.

(3) Confiabilidade.

Quando o senhor dava volta as costas, com frequência se cometiam


pequenos furtos. A defraudação ou roubo, pelo qual o escravo retém
(cf.

o uso do verbo em At 5:2, 3) ou retira (separa para si) secretamente


uma parte do que pertence a seu senhor, não se deve desculpar
dizendo: “O

senhor me deve muito mais que isto, porque me tirou a liberdade e


me está roubando as forças e os talentos, sem uma adequada
compensação”.

O escravo deve dar amostras de “suprema fidelidade” (ou que é


digno de confiança, Rm 3:3b; cf. 1Tm 5:12; logo, Gl 5:22).

Tito (William Hendriksen)

100

Ora, a razão para a demanda de que os escravos mostrem um


comportamento submisso, uma disposição de agradar, e suprema
confiabilidade é esta: de modo que em todo sentido adornem a
doutrina de Deus nosso Salvador. 32 Uma vida santificada, que
deixa bem à vista 32 Devido às muitas palavras ou expressões que
aparecem uma só vez — hapax legomena — o capítulo 2 de Tito
está entre as porções das pastorais nas quais os críticos se
concentram com o fim de provar que Paulo não pôde em nenhum
sentido ter sido seu autor. Mas, apoiam os fatos esta conclusão?
Estou convencido que não. uma lista longa de tais palavras pode
parecer impressionante, mas na análise final não é somente o
número de tais palavras o que conta, mas sim sua natureza.

Por meio do resumo que segue, eu desejo mostrar que cada palavra
deste capítulo é de tal natureza ou caráter, que ninguém tem direito
a dizer: “Paulo não pôde tê-lo escrito”. O vocabulário de Tito 2

pode resumir-se da seguinte maneira:

(1) Muitas das palavras usadas neste capítulo são mais ou menos
comuns no idioma grego ou pelo menos no grego koinê.
Certamente, nenhum argumento contra a paternidade paulina da
epístola pode ser baseado nelas.

(2) Logo, entre as palavras restantes, existem aquelas que em


outros lugares do Novo Testamento somente Paulo as emprega.
Como podem elas demonstrar que Paulo não pôde ter escrito as
Pastorais?

(3) Além disso, há as que em outros lugares são usadas somente


pelo companheiro frequente e íntimo amigo de Paulo, Lucas, ou só
por Lucas e por Paulo. Delas tampouco se pode derivar argumento
algum contra a paternidade literária de Paulo, como é óbvio.

(4) Entre las palabras que en el Nuevo Testamento aparecen


solamente aquí en el segundo capítulo de Tito o solamente en las
Pastorales, hay las que se sabe han sido usadas por otros autores
que vivían en el tiempo de Pablo o muy cerca de él. ¿Cómo se
puede argumentar que Pablo no podría haber usado las palabras
que oía alrededor suyo? O, algunas de las palabras eran familiares
para Pablo porque las había encontrado en la LXX.

(5) Também há palavras que, embora apareçam somente uma vez


ou muito poucas vezes nas Pastorais e em nenhum outro lugar do
Novo Testamento, são cognatos muito próximos de palavras usadas
por Paulo e Lucas ou por este somente. Agora, se um autor tiver
escrito “belamente”, é impossível que escreva “belo” também?
Nesta mesma conexão há palavras que embora apareçam
unicamente aqui seguem um padrão tipicamente paulino.
Suponhamos que um autor, João González, em obras que por
reconhecimento geral se atribuem a ele, esteve usando uma série
de expressões em que usa como componente básico a palavra
neve, por exemplo, “floco de neve”, “água neve”, “flor de neve”,
“tormenta de neve”, etc.

Agora, num escrito de duvidosa paternidade literária (atribuído por


alguns a ele) aparece a expressão

“bola de neve”. Seria razoável dizer em tal caso “João González não
pôde ter escrito este, livro, porque a expressão bola de neve não
aparece em nenhum de seus produtos literários reconhecidos como
tais”? Não seria mais razoável dizer: “Certamente é possível que
João González tenha escrito este livro, porque é muito dado às
combinações que contêm a palavra neve”?

Análise das palavras que aparecem em Tito cap. 2

A. Palavras de uso mais ou menos comum

Todas as palavras do v. 1 pertencem a esta classe. Palavras tais


como “Mas”, “tu”, “falar” e “a”

são, naturalmente, muito comuns.

Tito (William Hendriksen)

101

Quanto a ser são”, também é uma expressão que de maneira


nenhuma está limitada às Pastorais.

Lucas e João também a usam. No entanto, deu-se muita


importância aos três argumentos seguintes: (1) Nas Pastorais usa-
se esta palavra em certo sentido imaterial; em outros escritos em
certo sentido puramente físico.
(2) Nas Pastorais tem um sentido filosófico. Significa “de acordo
com a razão”. É nesse sentido que o ensino ou a doutrina de um
deve ser “sã”. Por isso, Paulo não pôde ter escrito as Pastorais,
porque declarou que seu evangelho não está baseado na razão
humana, mas sim é “loucura” para o mundo (1Co 2:6, 14). Um autor
desconhecido tomou palavras e conceitos da literatura helenística
de seu tempo. (Veja-se M. Dibelius, Die Pastoralbriefe, segunda
edição, Tübingen, 1931, p. 14.) (3) Esta palavra é usada com
grande frequência nas Pastorais.

Mas contraposto a este tríplice argumento contra a paternidade


literária de Paulo, está o seguinte: Em resposta a (1). Veja-se Pv
13:13 (LXX). Aqui “ser são” não se pode restringir ao físico do
homem.

Em resposta a (2). Nas Pastorais “ser são” não é um antônimo de


“ser irracional”, mas sim de “ser moral e espiritualmente pervertido”,
como se vê mais claramente em Tt 1:12, 13. Naturalmente, é
verdade que o intelecto do homem também está escurecido quando
resiste à vontade de Deus.

Em resposta a (3). A frequência com que se usa certa palavra não


prova necessariamente uma diferença de autor. Simplesmente
prova um diferença em tema e situação geral. É realmente
impossível imaginar a Paulo, já ancião, profundamente preocupado
sobre se a igreja vai continuar sendo leal à “sã” doutrina?

A palavra final do v. 1, “doutrina”, também é bem comum. Mateus e


Marcos a usam. Também Paulo em Rm 12:7; 15:4; Ef 4:14 e Cl
2:22.

Por isso, nada pode basear-se em nenhuma das palavras do


versículo 1 contra Paulo como autor das Pastorais. O mesmo é
válido com relação às “palavras mais ou menos comuns” que se
usam no resto do capítulo. Seria um desperdício de tempo prestar
mais atenção às palavras desta classe neste breve resumo.
B. Palavras que em outros lugares do Novo Testamento aparecem
somente nas epístolas de Paulo.

Assim “dignos” ou “honoráveis”, à parte de seu uso em Tt 2:2 e 1Tm


3:8, no Novo Testamento aparece somente em Fp 4:8; “aparição” (Tt
2:13; cf. 1Tm 6:14; 2Tm 1:10; 4:1, 8) aparece unicamente em 2Ts
2:8; e a palavra traduzida “autoridade” (Tt 2:15; cf. 1:3; 1Tm 1:1)
encontra-se somente em Rm 16:26; 1Co 7:6, 25; 2Co 8:8, embora o
verbo cognato apareça também em Marcos, Lucas e Atos.

Estas palavras parecem apontar para Paulo e não em direção


oposta.

C. Palavras que em outros lugares do Novo Testamento encontram-


se apenas em Lucas ou somente em Paulo e Lucas.

A palavra “anciãos” (Tt 2:2) encontra-se somente em Fm 9 e em Lc


1:18; “defraudar” ou “furtar”

(Tt 2:10) aparece apenas em At 5:2, 3; “aparecido” (Tt 2:11; cf. 3:4)
encontra-se apenas em Lc 1:79; e

“trazendo salvação” (Tt 2:11) aparece apenas em Ef 6:17; Lc 2:30;


3:6; At 28:28, embora nestes vários casos é nosso como
substantivo, “salvação”.

Interessante, embora não totalmente confinada a Paulo e Lucas, é


também a palavra “esperando”

(veja-se comentário sobre o v. 13). Denuncia a influência de Lucas o


sentido em que aqui se usa?

Este grupo de palavras não oferece nada em apoio à teoria de que


Paulo não pôde ter escrito as Pastorais.

Tito (William Hendriksen)

102
D. Palavras que no Novo Testamento não aparecem em outro lugar
à parte das Pastorais, mas que aparecem em fontes anteriores ou
contemporâneas.

O v. 3 contém a palavra “comportamento”. Aparece também em


Josefo, Jewish Antiquities XV.vii.5. Faz menção do alegado
comportamento intrépido do Mariamne, a esposa de Herodes o
Grande. Foi uma das causas que a levaram a morte por ordem de
seu cruel marido. Plutarco (46–120

d.C.) também usa a palavra.

No v. 7 usa-se a palavra “incorruptibilidade” ou “incorrupção”. “Sem


mácula”, “pureza” seria outra boa tradução. Em Et 2:2 (LXX)
encontra-se o adjetivo cognato no sentido de pura ou casta:

“Busquem para o rei jovens virgens ( castas), de bom parecer”.

O v. 14 tem a expressão “povo próprio”. Aqui περιουσιος é do verbo


περίειμι estar sobre e acima; de onde, ser deixado sobre. Indica o
que fica para um; por exemplo, depois que se pagou o preço; por
isso aplica-se a tudo aquilo que alguém pode chamar “próprio”. A
expressão é uma citação que aparece repetidas vezes na LXX (Êx
19:5; 23:22; Dt 7:6; 14:2; 26:18). Em Dt 7:6 o original hebraico sobre
o qual se baseia a LXX tem ‘am s egullah, peculiar tesouro”. Como
essa passagem demonstra, o termo indica que Israel é “possessão
especial” de Jeová, seu “santo povo”, porque o escolheu. Esse ato
da graça divina levantou Israel acima de todas as demais nações.

Naturalmente, Paulo estava bem familiarizado com a LXX. Por isso,


esta citação (cf. Ef 1:14; logo 1Pe 2:9) não oferece grande
problema.

E. Palavras que no Novo Testamento não aparecem em outro lugar


à parte das Pastorais, mas que seguem um padrão paulino na
formação de palavras.
Quase todas as palavras que se seguem poderiam ter sido incluídas
sob D. Mas, além de ser comuns no mundo de fala grega daquele
tempo, como ou eram a maioria delas, seguem um padrão de
formação nitidamente paulino, como se demonstrará:

O v. 3 contém a palavra “anciãs” (πρεσβῦτις). Mas esta é somente o


feminino de πρεσβύτης. Cf.

nota 196. Esta forma feminina não só se encontra também em 4


Macabeus 16:14 (LXX) e em diversas outras fontes anteriores e
posteriores, mas sim o próprio Paulo usou o masculino em Fm 9 (cf.
Tt 2:2).

O mesmo versículo (Tt 2:3) também contém a palavra ἰεροπρεπής


“como é próprio para quem estão empregados no serviço do templo”
(ou em serviço sagrado); de onde, reverente, piedosa. Esta palavra
encontra-se na emocionante história dos macabeus da mãe e seus
sete filhos que foram martirizados por sua lealdade a Jeová. Em
conexão com a morte do filho mais velho, lemos: “E tendo dito isto,
o piedoso jovem morreu” ( 4 Macabeus 9:25; cf. 11:20; cf. Josefo,
Jewish Antiquities XI.viii.5). Embora as duas expressões não
tenham exatamente o mesmo sentido, a de Tito (“como convém aos
que são empregados no serviço do templo”) e a de Ef 5:3 (“como
convém aos santos”, e cf. 1Co 11:13) têm o suficiente em comum
como para que não se possa dizer que o autor da segunda não
pôde ter sido também autor da primeira.

Voltando mais uma vez ao v. 3 encontramos a palavra


καλοδιδάσκαλος “mestra do que é excelente”. Agora, era
precisamente Paulo quem era afeiçoado a tais compostos, e não
estiveram limitados a nenhum período particular de sua vida como
autor. Veja-se p. 22f. Assim que, por que não podia aquele que
escreveu em 2Ts 3:13 “praticantees do que é excelente” também
escrever “mestras do que é excelente”?

O v. 4 contém o verbo σωφρονίζω, moderar, refrear, sossegar;


então, como aqui, “ensinar”. Foi Xenofonte (430–355 a.C.), quem
usando como ilustração o adestramento de cavalos, disse: “O temor
aos lançadores os refreia” ( The Tyrant X). No Novo Testamento o
verbo encontra-se somente aqui. E

Tito (William Hendriksen)

103

o cognato περιφρονέω também aparece unicamente no v. 15. Outra


palavra da mesma raiz, que também aparece uma só vez no Novo
Testamento, é σωφρόνως “com domínio próprio”, “sobriedade”

(v. 12). Poderia acrescentar que o adjetivo cognato “sóbrio”


encontra-se somente em 1Tm 3:2; Tt 1:8; 2:2, 5 e que o substantivo
cognato “domínio próprio” encontra-se somente em 2 Ti. 1:7.

Mas, significa isto que Paulo não pôde ter escrito as Pastorais? Pelo
contrário, encontro que a metade das palavras que aparecem em
listas separadas no léxico, e baseadas na raiz φρήν isto é, coração,
mente, pensamento, aparecem numa ou mais das dez epístolas
usualmente atribuídas a Paulo.

O apóstolo era muito afeiçoado às palavras formadas com base em


esta raiz (veja-se por exemplo, as passagens seguintes no original:
Rm 2:4; 2:20; 8:6; 12:3; 1Co 10:15; 13:11; 14:20; 2Co 2:2; 11:1, 23;
Gl 6:3; Ef 1:8 e Fp 2:3). É lógico crer que um autor que em Rm 12:3
usou a palavra ὑπερφρονέω e que em Fp 2:3–5 usa φρονέω e
ταπεινοφροσύνη não podia usar περιφρονέω em Tt 2:15? Quanto à
última, Plutarco descreve a Fabla como que às vezes está
obviamente desdenhando ser convincente ( Vidas paralelas. Teseu
I). A palavra também se encontra em 4 Macabeus 6:9; 14:1 (LXX).
Mas muito antes disto. Tucídides já a usava.

O versículo 4 também contém a expressão φίλανδρος καί


φιλότεκνος aqui plural, “amantes com seus maridos e que amem a
seus filhos”. Plutarco usou ambas as palavras no sentido aqui
indicado. E
veja-se Deissmann, Light From the Ancient East, p. 315. Agora, as
Pastorais contêm muitos compostos baseados em φιλ e entre eles
há vários que não se encontram em outro lugar no Novo Testamento
(φιλήδονος, φιλόθεος, φιλανδρος, φιλότεκνος, φιλάγαθος,
ἀφιλάγαθος, φιλαργυρία, e φίλαυτος. Mas este uso de palavras
baseadas em φιλ parece também ter sido característica de Paulo e
de Lucas. Por exemplo, Paulo em suas demais epístolas, é o único
autor do Novo Testamento que usa as seguintes: φιλόνεικος,
φιλοσοφία, φιλόστοργος, e φιλοτιμέομαι; enquanto seu bom amigo e
frequente companheiro, Lucas, é o único autor do Novo Testamento
em cujos escritos encontramos φιλανθρώπως, φιλονεικία,
φιλόσοφος, e φιλοφρόνως.

Certamente é pouco convincente dizer que Paulo não pôde ter


escrito as Pastorais porque contêm muitos compostos baseados na
raiz φιλ-.

O v. 5 contém o substantivo οἰκουργός, trabalhadora no lar.


(Considerarei esta como a melhor leitura, uma vez que parece ser a
qual concorda melhor com o contexto.) Agora, é esta realmente uma
palavra alheia a Paulo, que demonstra que Paulo não pôde ter
escrito as Pastorais? (Podemos, sem temor, permitir que o autor
médico do segundo século que também a usou descanse em paz.)
Era precisamente Paulo que gostava da formação de palavras com
ἐργ- quer seja usando-as livremente onde quer que as encontrasse
ou talvez cunhando-as ele mesmo. Quanto a compostos com ἐργ-
nos escritos de Paulo, examine-se no original as seguintes
referências (cada uma indica uma forma diferente): At 14:17 (Paulo
está falando); Rm 4:15; 15:16; 16:3; 1Co 3:9; 2Co 1:11; 12:16; 2Ts
3:11.

Certamente parece uma posição indefensável manter que o único


escritor no Novo Testamento que usou πανοῦργος (2Co 12:16) não
poderia ter escrito οἰκουργός. Lucas também gostava dos
compostos com ἐργ. I Lucas e Paulo eram amigos!

Igualmente, o v. 8 apresenta o único caso no Novo Testamento da


palavra ἀκατάγνωστος não censurável, irreprochável. A palavra
aparece no sentido de não condenado ou inocente em 2

Macabeus 4:47 (LXX): “O (o rei) absolveu de todos seus crimes a


Menelau, autor de toda maldade, e condenou à morte àqueles
desventurados, que, se diante dos citas tivessem tido que defender
sua causa, teriam sido dados por inocentes” (N.C.). Mas, por que
teria que ser impossível que o mesmo

Tito (William Hendriksen)

104

todos os frutos da graça transformadora — obediência, alegria,


integridade, etc. — que resplandece como muitas pedras preciosas,
é um adorno à doutrina de Deus nosso Salvador” (veja-se
comentário sobre 1Tm 1:1), a fé cristã. Deveria fazer com que os
senhores exclamem: “Se a doutrina cristã fizer isto mesmo nos
escravos, deve ser maravilhosa”.

autor que em Gl 2:11 empregou o verbo καταγινώσκω use a palavra


ἀκατάγνωστος em Tt 2:8? É uma palavra alheia a Paulo? De
maneira nenhuma!

Um raciocínio semelhante é válido com relação a outras palavras


que em seu uso neotestamentário aparecem somente aqui em Tito 2
e nas outras Pastorais; palavras tais como temperantes ou sóbrios
(Tt 2:2; cf. 1Tm 3:2, 11); piedade (Tt 2:12, 2Tm 3:12); e dignidade ou
seriedade (Tt 2:7; cf. 1Tm 2:2; 3:4). Deseja alguém realmente
sustentar que um autor que escreveu ímpio (Rm 4:5; 5:6) e
impiedade (Rm 1:18; 11:26) não poderia ter escrito piedade? O que
um que escribó digno ou honorável (Fp 4:8) não poderia ter usado
dignidade? E que quem escreveu despertai à sobriedade ( vigiai,
1Co 15:34) não poderia ter escrito sóbrio ou temperante?

CONCLUSÃO: Quando todas as palavras do segundo capítulo de


Tito foram examinadas devidamente, chega-se a esta clara
conclusão: não há uma só que Paulo não poderia ter escrito.
Note-se também que aqui, em Tito 2, há vários conceitos que,
embora também se encontram em vários outros lugares do Novo
Testamento, são tratados mais plenamente por Paulo nas dez
epístolas que por qualquer outro escritor do Novo Testamento.
Refiro a conceitos tais como os daqui em Tito 2

que estão assinalados pelas palavras: a. boas (ou excelentes,


admiráveis) obras (Tt 2:7, 14; cf. 3:8; 1Tm 3:1; 5:10, 25; 6:18), com
a qual alguém deveria comparar a expressão boa obra (Tt 1:16; 3:1;
cf.

1Tm 2:10; 5:10; 2Tm 2:21; 3:17); b. graça (Tt 2:11, etc.); e c. o aqui
e agora ou a era presente (Tt 2:12, em distinção da era futura ou
vindoura).

É verdade que às vezes se encontra um sinônimo também ou em


vez da palavra usada em epístolas anteriores. Assim, nas pastorais
encontramos obras nobres (cf. Mc 14:6) e boas obras, enquanto nas
epístolas anteriores encontramos somente a última expressão. Mas
certamente não é admissível assentar sobre uma base tão fraca
como esta a afirmação de que Paulo não pôde ter sido o autor
responsável pelas Pastorais. Por que seria impossível supor que,
uma vez que ambas as expressões eram comuns, ao escrever
extensamente sobre o tema como o faz aqui nas Pastorais, ou o
autor prefere variar na terminologia, ou que aqui ou ali o “secretário”
está usando seu próprio vocabulário com a plena aprovação de
Paulo? Até neste caso, o autor real e responsável pode bem ser
Paulo.

Quando a tudo isto somam-se as diversas características do estilo


paulino de Tito 2, às quais chamei a atenção no próprio comentário,
ficará evidente que a responsabilidade de apresentar provas recai
completamente sobre quem rejeita a paternidade literária de Paulo.

Tito (William Hendriksen)

105
TT 2: 11–15 - RAZÃO: A GRAÇA DE DEUS MANIFESTOU-SE A
TODOS

PARA SANTIFICAÇÃO E PARA ESPERAR COM ALEGRIA A


APARIÇÃO

GLORIOSA DE NOSSO GRANDE DEUS E SALVADOR, JESUS


CRISTO.

11–14. A graça de Deus, considerada como a razão pela qual todo


membro da família cristã pode e deve viver uma vida cristã, é o
tema de uma das passagens mais ricos da Sagrada Escritura.
Notem-se os quatro pensamentos principais:

1. v. 11 A graça de Deus em Cristo é a grande ação penetrante, que


dissipa as trevas trazendo salvação a todos.

Paulo diz: porque a graça de Deus apareceu, trazendo salvação


a todos os homens.

A graça de Deus é seu favor ativo em outorgar o maior dos dons


aos que merecem o maior castigo (sobre o conceito graça veja-se
um estudo de vocabulário no C.N.T. sobre 1Ts 1:1). Esta graça
penetrou em nossas trevas morais e espirituais. Ela “apareceu”. O
verbo usado no original está relacionado com o substantivo epifania,
isto é, manifestação ou aparecimento (por exemplo, do sol ao
amanhecer). A graça de Deus repentinamente tinha surgido sobre
os que estavam em trevas e em sombra de morte (cf. Ml. 4:2; Lc
1:79; At 27:20; e Tt 3:4). Levantou-se quando nasceu Jesus, quando
de seus lábios saíam palavras de vida e de beleza, quando curava
os doentes, purificava leprosos, jogava fora demônios, ressuscitava
mortos, sofria pelos pecados dos homens e quando pôs sua vida
pelas ovelhas para voltar o a tomar a manhã da ressurreição. Assim
a graça derramou sobre o mundo a santa luz de Cristo e afastou a
noite escura do pecado. O sol da justiça tinha saído

“com cura em suas asas”. A graça de Deus tinha aparecido com


“salvação (σωτήριος) para todos os homens”. Em todas as partes,
no Novo Testamento em que esta palavra aparece, precedida pelo
artigo, e usada como substantivo, significa salvação (Lc 2:30; 3:6; At
28:28; Ef

Tito (William Hendriksen)

106

6:17), no sentido espiritual da palavra. Por isso, também aqui em Tt


2:11, o sentido é: A graça de Deus fez sua aparição “trazendo
salvação”.

A graça veio para resgatar ao homem do maior mal possível, ou


seja, a maldição de Deus sobre o pecado; e para lhe outorgar o dom
maior possível, isto é, a bênção de Deus para a alma e corpo por
toda a eternidade (quanto a um estudo de vocabulário do conceito
salvação, veja-se comentário sobre 1 Ti. 1:15).

Ela trouxe salvação a “todos os homens”. Para uma explicação


detalhada desta expressão, veja-se comentário sobre 1Tm 2:1. Aqui
em Tt 2:11 o contexto deixa muito claro o significado. Homem ou
mulher, velho ou jovem, rico ou pobre: todos são culpados diante de
Deus, e dentre todos eles Deus reúne seu povo. Anciãos, anciãs,
jovens e senhoritas, e até mesmo escravos (veja-se vv. 1–10)
devem viver vidas consagradas porque a graça manifestou-se
trazendo salvação a todos estes diversos grupos e classes. “Todos”
aqui no v. 11 = “nós” no v. 12.

A graça não passou por alto aos de idade avançada por sua velhice,
nem às mulheres por ser mulheres, nem aos escravos por ser
escravos, etc.

Manifestou-se para todos, sem consideração de idade, sexo ou


posição social. Por isso, nenhum pode derivar, de seu grupo em
particular ou casta a que pertence, uma razão para não viver uma
vida cristã.
2. v. 12 A graça de Deus em Cristo é a sábia mestra As palavras
que conduzem a este pensamento são: ensinando-nos a fim de
que, tendo renunciado à impiedade e às paixões mundanas,
aqui e agora levemos vidas de sobriedade e justiça e piedade.

A graça ensina. Veja-se comentário sobre 1Tm 1:20. O verbo usado


no original vem da mesma raiz do substantivo pedagogo. Um
pedagogo conduz às crianças passo a passo. Assim também a
graça conduz e guia brandamente. Não lança tudo à confusão. Não
alvoroça repentina e violentamente a ordem social. Por exemplo,
não ordena abruptamente aos senhores que deem liberdade a seus
escravos; tampouco ordena sem

Tito (William Hendriksen)

107

sabedoria aos escravos que se rebelem contra seus senhores. Pelo


contrário, gradualmente faz com que os senhores vejam que o
abuso da liberdade de seus semelhantes é um grande mal, e
convence aos escravos que apelar à força e à vingança não é
solução a nenhum problema. A graça prepara ensinando (At 7:22;
22:3), castigando (1Tm 1:20; 2Tm 2:25; logo Lc 23:16, 22; 1 Cor.
11:32; 2 Cor. 6:9; Hb 12:6–11; Ap 3:19), aconselhando, consolando,
animando, exortando, dirigindo, convencendo de pecado,
recompensando, refreando, etc.

O propósito de tudo isso se declara negativamente, e logo,


positivamente (o qual é uma característica do estilo de Paulo).

Negativamente, induz-nos a renunciar ou rejeitar (aqui o verbo tem o


mesmo sentido que em At 3:13; 7:35) a impiedade, a perversidade
(veja-se comentário sobre 2Tm 2:16). Observe a vívida descrição de

“impiedade” em Rm 1:18, 32 (note-se a mesma palavra em Rm


1:18; cf.
11:26). Tal impiedade é idolatria mais imoralidade, ambos os termos
tomados em seu sentido mais completo. Quando entra a graça, o
pecador repudia a impiedade. Este repúdio é um ato definido, uma
decisão a acabar com o que é desagradável a Deus. Ninguém
consegue ir para o céu sendo negligente. A rejeição da impiedade
implica renúncia às paixões mundanas” — desejos pecaminosos
fortes — também. (Veja-se estudo da palavra paixão ou desejo em
conexão com a exegese de 2Tm 2:22.) Segundo o uso bíblico da
palavra, os desejos mundanos ou pecaminosos incluem o seguinte:
o desejo sexual desordenado, o alcoolismo, o desejo excessivo de
posses materiais, a agressividade (portanto, de caráter contencioso,
vaidoso, o desejo de dominar) etc. Em suma, refere-se aos anelos
desordenados de prazeres, poder e posses. Cf.

1Jo 2:16, e sobre Tt 3:3.

Positivamente, a graça nos ensina a fim de que “aqui e agora”

( nesta era presente; veja-se 1Tm 6:17; 2Tm 4:10; logo, Rm 12:2;
1Co 1:20; 2Co 4:4; contrasta-se com a era vindoura em Ef 1:21; cf.
Mc 10:30) possamos levar vidas que mostram uma relação mudada:

Tito (William Hendriksen)

108

a. para consigo mesmo: “sobriedade”, fazer uso adequado dos


desejos e impulsos que não são pecaminosos em si mesmos, e
vencer os que são pecaminosos;

b. para com o próximo: “justiça”, honestidade, integridade nos


procedimentos com os demais; c. para com Deus: “piedade”,
verdadeiro ardor e reverência para único que é objeto de adoração.

3. v. 13 A graça de Deus em Cristo é a preparadora eficaz Nós —


anciãos, anciãs, homens e mulheres jovens, escravos, etc. —
devemos viver uma vida cristã porque pelo poder da graça de Deus
estamos aguardando a esperança bem-aventurada, a aparição
da glória de nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus.

A graça de Deus nos ensina para que possamos viver vidas


consagradas, enquanto estamos aguardando33 a esperança bem-
aventurada. A expressão aguardar ou olhar pacientemente adiante
modifica ao viver, do qual é uma circunstância presente ou
explicação adicional. É “a esperança bem-aventurada” que os
crentes estão aguardando. Esta é uma metonímia para expressar a
realização daquela esperança (isto é, a realização de nosso anelo
mais ardente, expectação confiante e espera paciente).

Encontramos uma metonímia semelhante em Gl 5:5; Cl 1:5 (aos que


alguns intérpretes somariam Hb 6:18).

Esta esperança chama-se bem-aventurada. Comunica bênção,


felicidade, prazer, glória. O adjetivo bem-aventurada usa-se em
conexão com Deus em 1Tm 1:11; 6:15; veja-se comentário sobre
estas passagens.

33 O gerúndio προσδεχόμενοι usa-se aqui em certo sentido no qual


Lucas com frequência (e Paulo nunca em outros lugares) emprega a
palavra (Lc 2:25, 38; 12:36; 23:51). Paulo a usa no sentido de
receber favoravelmente, dar as boas-vindas (Rm 16:2; Fp 2:29;
assim também Lucas em Lc 15:2).

Mas este não é um argumento válido contra a paternidade paulina


das Pastorais ou contra a paternidade de Lucas de Lc 15:2. Lucas e
Paulo eram amigos. Além se o sobrinho de Paulo podia usar a
palavra no sentido de esperar (At 23:21), por que não podia fazê-lo
o próprio Paulo? E, se a isto se respondesse “Mas é Lucas e não o
sobrinho de Paulo o responsável da palavra de At 23:21”, a resposta
a isto seria novamente: “Lucas e Paulo eram amigos!”

Tito (William Hendriksen)

109
Ora, mesmo a possessão de um espírito de esperança e o exercício
da esperança é bem-aventurada, por causa de:

(1) o fundamento imutável da esperança (1Tm 1:1, 2; logo, Rm 5:5;


15:4; Fp 1:20; Hb 6:19; 1P. 1:3, 21);

(2) o glorioso autor da esperança (Rm 15:13; cf. 2Ts 2:16); (3) o
objeto maravilhoso da esperança (vida eterna, salvação, glória: Tt
1:2; 3:7; logo, 1Ts 5:8; logo, Rm 5:2; Cl 1:27);

(4) os preciosos efeitos da esperança (paciência, 1Ts 1:3;

“franqueza ao falar”, 2Co 3:12; e purificação de vida, 1Jo 3:3); (5) e


o caráter eterno da esperança (1Co 13:13).

Então certamente a realização desta esperança será bendita! Veja-


se Dn 12:3; Mt 25:34–40; Rm 8:20b; 1Co 15:51, 52; 1Ts 4:13–18;
2Ts 1:10; Ap 14:14–16; 19:6–9. Com efeito, a certeza de sua
realização comunica força à esperança, e dá como resultado as
graças mencionadas anteriormente em (4).

Ora, a realização da esperança bem-aventurada é “a aparição da


glória”. 34 Note-se as duas aparições. Tinha ocorrido uma (veja-se
comentário sobre o v. 11; cf. 2Tm 1:10). Haverá outra (veja-se C.N.T.

sobre 2Ts 2:8; cf. 1Tm 6:14; 2Tm 4:1, 8). Será a aparição de …
bom, quem? Através da história da interpretação essa pergunta
dividiu a gramáticos e comentaristas. Esperamos a aparição em
glória de uma pessoa ou de duas pessoas?

Os que favorecem o ponto de vista de uma pessoa, apoiam a


tradução: “de nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus” (outro
texto tem “Jesus Cristo”, mas isso não tem importância com relação
ao ponto em discussão). Ora, se esse ponto de vista for o correto,
aqueles que 34 O texto diz literalmente: “a aparição da glória”.
Alguns (por exemplo as versões inglesas, A. V., Berkeley,
Goodspeed) preferem a tradução: “a manifestação gloriosa”. Outros,
por exemplo Lenski e White, impugnam esta tradução. No entanto,
não vejo que seja uma objeção de muito peso. Se a expressão
“mordomo da injustiça” (Lc 16:8) significa “mordomo injusto”, por
que a frase “a aparição da glória” não pode significar “a aparição (ou
manifestação) gloriosa”? Mas se uma pessoa traduz de uma
maneira ou da outra, o sentido resultante é quase o mesmo, ou seja,
“a aparição em glória” (como Weymouth — em inglês — e como
Bouma e outros a interpretam). Cf. Mt 25:31; Mc 13:26; 2Ts 1:10.

Tito (William Hendriksen)

110

aceita a infalibilidade das Escrituras têm nesta passagem um texto


de prova adicional para a deidade de Cristo; e mesmo os que não
aceitam a infalibilidade da Escritura, mas aceitam a tradução quanto
a uma pessoa, devem admitir que o autor das pastorais pelo menos
(embora eles creiam que erroneamente) sustentava que Jesus era
um em essência com Deus o Pai. A tradução unipessoal é
favorecida pela A.R.V. ( margem), Weymouth, Goodspeed, Berkeley
Version, R.S.V. e muitos comentaristas: Van Oosterzee, Bouma,
Lenski, Gealy, Simpson, etc. A.

T. Robertson, o grande gramático do Novo Testamento faz uma


poderosa defesa deste ponto de vista pelo prisma gramatical,
baseando seus argumentos na regra de Granville Sharp.

Entre outros, João Calvino não queria escolher entre a tradução


unipessoal e a bipessoal. No entanto, enfatizava que em qualquer
dos dois casos, o propósito da passagem é afirmar que quando
Cristo se manifeste, se revelará nele a grandeza da glória divina (cf.
Lc 9:26); e que, como resultado, a passagem de maneira nenhuma
apoia aos arianos em sua intenção de demonstrar que o Filho é
menos divino que o Pai.

A teoria bipessoal é representada, com pequenas variantes,


diversas versões inglesas: Wyclif, Tyndale, Cranmer, A.V., A.R.V.,
Moffatt y R.S.V. (margem). Tem sido apoiada por uma longa lista de
comentaristas (entre os que se contam Wette, Huther, White [em
The Expositor’s Bible], E. F. Scott, etc.) e especialmente pelo
gramático G.

B. Winer.

A tradução, então, seria:

“do grande Deus e o (ou “e do”) Salvador Jesus Cristo”.

Winer reconhece que seu respaldo a este ponto de vista não está
baseado tanto na gramática — a qual, como chegou a admitir,
permite a tradução unipessoal — como sobre «a convicção
dogmática derivada dos escritos do apóstolo Paulo, no sentido que
este apóstolo não pode ter chamado a Cristo o grande Deus» (esta
argumentação vê-se em dificuldades para interpretar Rm 9:5; Fp
2:6; Cl 1:15–20; Cl 2:9; etc.).

Mas ele deveria ter notado que mesmo o próprio contexto atribui a
Jesus

Tito (William Hendriksen)

111

(v. 14) funções que no Antigo Testamento se atribuem a Jeová, tais


como os atos de redimir e purificar (2Sm 7:23; Sl 130:8; Os 13:14;
logo Ez 37:23); e que a palavra Salvador em cada um dos três
capítulos de Tito primeiro aplica-se a Deus, e logo a Jesus (Tt 1:3, 4;
2:10, 13; 3:4, 6). Portanto, é evidentemente o propósito do autor
desta epístola (isto é, Paulo) demonstrar que Jesus é
completamente divino, tão plenamente como Jeová ou como o Pai.

Devemos considerar correta a tradução unipessoal. Recebe o apoio


das seguintes considerações:

(1) A menos que haja alguma razão específica em sentido contrário,


a regra sustenta que quando o primeiro de dois substantivos do
mesmo caso e unidos pela conjunção e vai precedido pelo artigo, o
qual não se repete diante do segundo substantivo, ambos se
referem à mesma pessoa.

Quando o artigo se repete diante do segundo substantivo, está se


falando de duas pessoas. Exemplos:

a. O artigo precede ao primeiro de dois substantivos e não se repete


diante do segundo: “o irmão eu e co-participante”. Os dois
substantivos se referem à mesma pessoa, a João, e a expressão é
corretamente traduzida “Eu, João, irmão vosso e companheiro” (Ap
1:9).

b. Dois artigos, um precede a cada substantivo: “Seja para ti como


um gentio e um publicano” (Mt 18:17). Os dois substantivos se
referem a duas pessoas (neste caso, cada uma representa uma
classe).

Ora, segundo esta regra, as discutidas palavras de Tito 2:13 se


referem claramente a uma pessoa, isto é, Cristo Jesus, porque
traduzida palavra por palavra a frase diz:

“do grande Deus e Salvador nosso Cristo Jesus”. O artigo que está
diante do primeiro substantivo não se repete diante do segundo, e
portanto, a expressão deve ser traduzida:

“de nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus”.

Tito (William Hendriksen)

112

Não se pôde encontrar razão válida que possa mostrar que a regra
(Granville Sharp) não se pode aplicar no caso presente. 35 De fato,
reconhece-se geralmente que as palavras que aparecem no final
de 2

Pedro 1:11 no original se referem a uma pessoa e devem traduzir-


se:
“nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo”. Mas, se isso for verdade,
por que não pode ser assim na expressão essencialmente idêntica
em 1Pe 1:1

e aqui em Tt 2:13, e então traduzir: “nosso Deus e Salvador Jesus


Cristo”

(ou “Cristo Jesus”)?

(2) Em nenhuma parte do Novo Testamento se usa a palavra


epifania ( aparição ou manifestação) com relação a mais de uma
pessoa.

Além disso, a pessoa a quem refere-se é sempre Cristo (veja-se 2Ts


2:8; 1Tm 6:14; 2Tm 4:1; 2Tm 4:8; e 1:10, onde a referência é à
primeira vinda).

(3) A fraseologia aqui em Tt 2:13 poderia bem haver-se esboçado


como reação ao tipo de linguagem que com frequência usavam os
pagãos com relação a seus próprios ídolos, aos que consideravam
como

“salvadores”, e particularmente à fraseologia usada em conexão


com o culto aos reis terrestres. Ptolomeu I não foi chamado
“salvador e deus”?

Não se referiam a Antíoco e a Júlio César como “deus manifesto”?


36

Paulo indica que os crentes esperam a aparição de Um que é


realmente Deus e Salvador, sim, “nosso grande (exaltado, glorioso)
Deus e Salvador, ou seja, Cristo Jesus”.

O verdadeiro “ponto” da passagem, em conexão com todo o


precedente, é que nossa alegre expectação da aparição em glória
de 35 Veja-se Gram. N.T., pp. 785–787; também do mesmo autor
(A. T. Robertson). The Minister And His Greek New Testament, Nova
York, 1923, pp. 61–68. Agora, se se pudesse estabelecer que
σώτηρ

não é somente um nome próprio, mas sim além Paulo geralmente


refere a epifania a duas pessoas, teríamos algo paralelo à
expressão “de Deus nosso e Senhor Jesus Cristo” onde apesar de
haver um só artigo a referência é com toda probabilidade a duas
pessoas, e a frase pode-se traduzir “de nosso Deus e do Senhor
Jesus Cristo” (2Ts 1:12). Veja-se C.N.T. sobre 2Ts 1:12, nota 117.
Mas 2Ts 1:12 e Tt 2:13 não são idênticos.

36 Veja-se E. Stauffer, Christ and the Caesars, Filadélfia, 1955


(analisado em WThJ, XVIII, Número 2

(maio de 1956), pp. 171–176. Cf. nota 76.

Tito (William Hendriksen)

113

nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus nos prepara


efetivamente para a vida com ele. Como funciona isso? Primeiro,
porque a Segunda Vinda será tão completamente gloriosa que os
crentes não quererão perdê-las, mas “manifestar-se com ele em
glória” (Cl 3:4). Em segundo lugar, porque a bem-aventurada
expectação enche aos crentes com gratidão, e a gratidão produz
estado de alerta pela graça de Deus.

4. v. 14 A graça de Deus em Cristo é a purificadora que nos purifica


completamente

Nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus cuja aparição em glória


os crentes esperam com tanta esperança e alegria é quem deu-se
a si mesmo por nós a fim de nos redimir de toda injustiça e
purificar para si um povo, propriamente seu, que se deleita em
fazer boas obras.
Quanto ao sentido de “que se deu a si mesmo a fim de nos redimir”,
veja-se comentário sobre 1Tm 2:6, “que se deu em resgate por
todos”.

Quem quer que duvide do caráter necessário, objetivo, voluntário,


expiatório, propiciatório, substitutivo, e eficaz do ato de Cristo, pelo
qual deu-se a si por nós, deveria fazer um estudo diligente e
contextual das seguintes passagens:37

Antigo Testamento Novo Testamento

Gn 2:16, 17 Mt 20:28 1Co 7:23 Hb 9:28

Êx. 12:13 Mt 26:27, 28 2Co 5:18–21 1Pe 1:18, 19

Lv 1:4 Mc 10:45 Gl 1:4 1Pe 2:24

Lv 16:20–22 Lc 22:14–23 Gl 2:20 1Pe 3:18

Lv 17:11 Jo 1:29 Gl 3:13 1Jo 2:2

2Sm 7:23 Jo 6:55 Ef 1:7 1Jo 4:10

Sl 40:6, 7 At 20:28 Ef 2:16 Ap 5:12

Sl 130:8 Rm 3:25 Ef 5:6 Ap 7:14

37 Leia-se também A.A. Hodge, The Atonement, Filadélfia, 1867; e


L. Berkhof, Vicarious Atonement Through Christ, Grand Rapids,
Mich. 1936.

Tito (William Hendriksen)

114

Is 53 Romanos 5 Cl 1:19–23

Zc 13:1 1Co 6:20 Hb 9:22


Ele se deu nada menos que a si mesmo, e isso por nós, isto é, em
nosso favor e em nosso lugar. A contemplação deste pensamento
sublime deveria dar como resultado uma vida dedicada a sua honra.

Além disso, por sua morte expiatória obteve os méritos para que o
Espírito Santo opere em nossos corações. Sem este Espírito nos
resultaria impossível levar uma vida de santificação.

Cristo Se deu a Si mesmo por nós com um propósito duplo: o


primeiro negativo (ver Sl 130:8), e o segundo positivo (ver 2Sm
7:23).

Negativamente, deu-se a si mesmo por nós “para nos redimir”, isto


é, para nos resgatar de um poder maligno. O preço do resgate foi
seu precioso sangue (1Pe 1:18, 19). E o poder do qual nos livra é o
do

“pecado” (veja-se C.N.T. sobre 2Ts 2:3), isto é, a desobediência à


santa lei de Deus, seja qual for a maneira como a desobediência se
manifesta (“toda injustiça”).

Positivamente, Ele Se a Si mesmo por nós “a fim de purificar para si


um povo”, isto é, para nos purificar por meio de seu sangue e seu
Espírito (Ef 5:26; Hb 9:14; 1Jo 1:7, 9), para que, assim purificados,
estejamos em condições de ser um povo, propriamente Seu (ver
nota 193

e cf. Ez 37:23). Anteriormente, Israel era o povo peculiar de Jeová;


agora é a igreja. E como Israel caracterizava-se por ser zeloso
quanto à lei (At 21:20; cf. Gl 1:14), assim agora Cristo purifica a seu
povo com este mesmo propósito em mente, isto é, que seja um
povo próprio com

“zelo pelas boas obras”, obras que procedem da fé, são feitas
segundo a lei de Deus e para sua glória (cf. 1Pe 3:13).

Em resumo, os vv. 11–14 nos ensinam que a razão pela qual todo
membro da família deveria ter uma vida de domínio próprio, justiça e
piedade é que a graça de Deus em Cristo penetrou nossas trevas
morais e espirituais e há trazido salvação a todos os homens; que
esta graça é também nosso grande pedagogo que nos afasta da
impiedade e das

Tito (William Hendriksen)

115

paixões mundanas e nos guia pela senda da santificação; que é o


preparador eficaz que nos faz olhar com ânsias rumo à aparição em
glória de nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus; e finalmente,
que é o purificador total, de modo que, redimidos de toda
desobediência à lei de Deus, passamos a ser o particular tesouro de
Cristo, cheios de zelo pelas obras que são excelentes.

15. Como uma adequada conclusão a todo o capítulo (em certo


sentido a ambos os capítulos) Paulo acrescenta: Segue lhes
falando estas coisas, exortando-os e repreendendo com toda
autoridade.

Tito não deve pôr-se frouxo em seu dever. Deve seguir fazendo o
que esteve fazendo. Deve falar constantemente (veja-se comentário
sobre o v. 1) sobre esta gloriosa vida de santificação como uma
oferta de ação de graças apresentada a Deus por sua maravilhosa
graça em Cristo.

Deve exigir isto às pessoas, fazendo isto quando quer que se


presente a ocasião, admoestando (ver comentário sobre o v. 6) aos
que estão necessitados de admoestação especial, e mesmo
repreendendo (ver comentário sobre Tt 1:9, 13) aos que merecem
uma repreensão. Tudo isto deve fazê-lo “com toda autoridade”, a
autoridade de Cristo a quem representa.

Que ninguém te menospreze. Cf. 1 Ti. 4:12. Tito deve conduzir-se


de tal maneira que ninguém o passe por alto em seus pensamentos;
isto é, que ninguém em seu coração e mente o esqueça ou ignore,
pensando:
“Não importa o que ele disse sobre isto ou sobre aquilo”. Embora
este mandamento foi dirigido diretamente a Tito quem deve tomá-lo
com o coração, também indiretamente o ajudará no cumprimento de
seus deveres, isto é, quando é lida aos diversos presbíteros e
congregações.

SÍNTESE DE TITO 2

Veja-se esboço no princípio do capítulo.

A santificação nas relações mútuas, com ênfase na família cristã, é


o tema deste capítulo. A doutrina e a vida prática devem concordar.
Por

Tito (William Hendriksen)

116

isso, Tito deve exortar aos anciãos que sejam sóbrios, dignos, etc.;
as anciãs que sejam reverentes; que os jovens exerçam o domínio
próprio (e Tito mesmo deve ser o modelo); quão escravos sejam
submissos em seu comportamento, com disposição de agradar e de
uma confiança inquestionável. Além disso, quer que as mulheres
maiores instruam às mais jovens quanto a amar a seus maridos e
seus filhos, a ser sensatas, castas, trabalhadoras, amáveis e
sujeitas a seus maridos. Todas estas diversas classes de pessoas
devem sentir-se motivadas pelo desejo de que a Palavra de Deus
seja honrada, a sã doutrina seja adornada, e os inimigos da verdade
sejam envergonhados.

Nenhum grupo ou classe social deve deixar de ficar sob a influência


santificadora do Espírito Santo. Não apareceu a graça de Deus
trazendo salvação a todos eles? Esta graça é a grande ação
penetrante que invadiu o reino das trevas e há trazido luz, ou seja, a
luz do conhecimento, a santidade, a alegria, e a paz (“salvação”); é
o sábio pedagogo, que nos ensina a crucificar as paixões mundanas
e a viver vidas de piedade cristã; é o preparador eficaz, que indica
rumo à realização de nossa esperança bem-aventurada quando
nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus volte em glória; e o
purificador completo, nos redimindo de toda injustiça e nos
transformando num povo para possessão de Cristo, cheio de zelo
por fazer boas obras. Tito deve falar constantemente desta gloriosa
vida de santificação da parte de todos. Esta vida devesse ser
apresentada a Deus como uma oferta de ação de graças por sua
maravilhosa graça. Então, Tito deve preocupar-se que ninguém o
menospreze nem suas palavras.

Quanto à questão da escravidão e as relações inter-raciais, cf. o


seguinte: Everyday Life in Ancient Times publicado por National
Geographic Magazine, 1953, pp. 175, 302, 303; J. C. Fumas,
Goodbye to Uncle Tom, New York, 1956, especialmente pp. 285–
388; note-se ampla bibliografia; Frank C. J. McGurk, “A Scientist’s
Report on Race Differences”, U.S. News and World Report, 21 de
setembro de 1956; e os artigos pertinentes na revista Life, 3 de
setembro de 1956.

Tito (William Hendriksen)

117

TITO 3

NA VIDA SOCIAL (ISTO É, PÚBLICA)

ESBOÇO DO CAPÍTULO 3

Tema: O apóstolo Paulo, escrevendo a Tito, dá-lhe instruções para a


promoção do espírito de santificação

Na vida social (isto é, pública)

Tt 3:1–8 Os crentes devem obedecer às autoridades. Devem ser


amáveis com todos os homens, uma vez que foi a bondade de Deus
nosso Salvador, não nossas obras, o que nos trouxe a salvação.
Tt 3:9–11 Por outro lado, é preciso descartar as questões néscias e
os homens facciosos que se negam a prestar atenção às
admoestações.

Tt 3:12–15 Instruções finais com relação a viajantes pela causa do


reino (Ártemas ou Tíquico, Tito, Zenas, Apolo) e a crentes cretenses
em geral. Saudações.

TT 3:1–8 - OS CRENTES DEVEM OBEDECER ÀS


AUTORIDADES. DEVEM

SER AMÁVEIS COM TODOS OS HOMENS, UMA VEZ QUE FOI A


BONDADE DE

DEUS NOSSO SALVADOR, NÃO NOSSAS OBRAS, O QUE NOS


TROUXE A SALVAÇÃO.

Às instruções para a promoção do espírito de santificação na vida


congregacional (cap. 1) e na vida familiar e individual (cap. 2) agora
se acrescentam:

Instruções para a promoção do espírito de santificação na vida


pública.

A parte positiva desta seção encontra-se nos vv. 1–8, a parte


negativa nos vv. 9, 10, enquanto os versículos restantes do capítulo
formam uma adequada conclusão a toda a carta. Quanto à parte
positiva (vv. 1–8) note-se:

Tito (William Hendriksen)

118

1. O recordatório: obedecer aos magistrados e ser amáveis com


todos (vv. 1 e 2).

2. A razão: num tempo éramos como os de fora, e se não teria sido


pela soberana bondade do Deus triúno, seríamos como eles ainda
hoje (vv. 3–7).
a. O que éramos num tempo: sem entendimento, etc.

b. A soberana bondade do Pai

c. A obra do Espírito Santo

d. A graça de Jesus Cristo

e. O propósito de tudo isto: vida eterna para nós.

3. A reafirmação: estas coisas devem ser afirmadas com confiança,


porque são excelentes e proveitosas para (toda) pessoa (v. 8).

1 e 2. Lembra-os que se submetam aos governantes e


autoridades, que sejam obedientes, preparados para toda obra
boa, que não difamem a ninguém, que não sejam litigiosos,
mas amáveis, demonstrando toda mansidão para com toda
pessoa.

Embora os crentes, por ter uma mente dirigida para o celestial,


esperam com alegria o dia da gloriosa aparição daquele que os
comprou com seu próprio precioso sangue, não devem esquecer
jamais seu dever na terra. Tito deve lembrar-lhes isso (cf. 2Tm
2:14), a fim de que em todo tempo eles possam ser bons cidadãos e
bons vizinhos.

Quanto à relação do cristão e o estado, cf. comentário sobre 1Tm


2:1–7; cf. Mt 17:24–27; 22:15–22; Rm 13:1–7; 1Pe 2:13–17. A
expressão “Lembra-os que se submetam”, provavelmente implica
que Paulo tinha falado aos cretenses deste importante assunto
quando esteve com Tito na ilha (cf. 2Ts 2:5). Além disso, pelos
escritos do Políbio e do Plutarco, parece que os cretenses estavam
irritados e em efervescência sob o jugo romano. Portanto, é possível
que esta circunstância tivesse algo que ver com a natureza deste
recordatório. Diversos comentaristas assinalaram que enquanto se
ordenou a Timóteo em Éfeso que se preocupasse de ver que os
crentes não deixassem de orar pelos governantes, a Tito lhe diz que
faça lembrar aos cretenses que se
Tito (William Hendriksen)

119

submetam aos governantes. Mas cf. Rm 13:1–7. De qualquer


maneira, a mensagem cristã será falto de efetividade a menos que,
em obediência ao quinto mandamento em seu sentido mais amplo,
os crentes “deem a César o que é de César, e a Deus o que é de
Deus”.

Então, aos que não somente governam na verdade, mas sim como
tais foram investidos de autoridade divina (Rm 13:1) — por isso, “a
governadores e autoridades” — é que os crentes devem, não
somente de forma exterior e em geral submeter-se, mas sim devem
lhes obedecer interiormente, cumprindo com um coração disposto
todos os mandamentos em particular; por exemplo, os que têm que
ver com pagamentos de impostos, o observar uma conduta
ordenada, o mostrar honestidade nos negócios, etc. (A exceção a
que se refere At 5:29 é válida quando quer que as regulações
humanas atropelam a lei de Deus).

Não somente isso, mas quando quer que se apresenta a


necessidade

— pense-se em epidemias, guerras, conflagrações, etc. — os


crentes devem estar dispostos a mostrar seu bom espírito, em
completa cooperação com o governo que os protege. Note-se a
mesma conexão em Rm 13:3. Não somente devem estar
“inteiramente equipados”, mas também “dispostos” e desejosos para
toda obra boa (cf. Tt 3:1 e 2Tm 3:17).

A expressão “preparados para toda boa obra” forma uma ponte


natural entre os deveres que os crentes têm para o governo e os
que têm para seus próximos.

Nos cinco requisitos que seguem, observa-se claramente um


clímax.
É lógico que os crentes não devem difamar a ninguém (veja-se
comentário sobre 1Tm 6:4). Muitos crentes nem sequer
necessitarão este recordatório. O insultar e usar de uma linguagem
abusiva certamente está fora de lugar para qualquer pessoa, e
certamente para os crentes.

Uma exigência mais estrita é a qual requer que o crente não seja
litigioso ou contencioso (cf. 1Tm 3:3). Mas deles se espera mais que
a ausência de um vício. Deve mostrar una-se virtude positiva em
todos os contatos com os de fora da igreja: os cristãos devem ser
amáveis (cf.

Tito (William Hendriksen)

120

1Tm 3:3), isto é, dispostos a ceder o proveito pessoal, desejosos de


ajudar ao necessitado, bondosos para com o fraco, considerados
para os caídos, sempre cheios com o espírito de doce prudência.
Certamente o clímax se alcança com as palavras: “mostrando toda
mansidão para com toda pessoa” (cf. 2Tm 2:25). Note-se o jogo de
palavras, 38 refletido também nas versões A.V. e A.R.V.. Parece que
não é difícil mostrar alguma medida de mansidão com algumas
pessoas. Tampouco o é mostrar toda (isto é completa, total)
mansidão a algumas pessoas, ou certa medida de mansidão a toda
pessoa. Mas mostrar toda mansidão a toda pessoa, mesmo para
todos os cretenses “mentirosos, bestas brutas, ventres ociosos”, era
uma tarefa impossível sem a graça especial de Deus!

3. No entanto, a razão pela qual isto deve ser feito (e pode ser feito)
é declarado na bela passagem que começa com as palavras:
Porque em outro tempo nós também vivíamos sem
entendimento, (éramos) desobedientes, extraviados,
escravizados a paixões e prazeres diversos, vivendo em malícia
e inveja, aborrecíveis e nos odiando uns aos outros.

A reflexão sobre nossa condição anterior faz com que seja mais fácil
ser mansos e bondosos para outros. Note-se: “Porque em outro
tempo nós também estávamos …” Nós significa: Eu, Paulo, que
escreve a carta; tu, Tito, que a recebe; e além disso, todos os
crentes de Creta, e na verdade, todos os crentes em todo lugar.
Paulo também tinha sido escravo do pecado. Naturalmente, tinha
sido “zeloso das tradições”, mas ao mesmo tempo tinha estado
“perseguindo à igreja” (veja-se comentário sobre 1Tm 1:13; logo Gl
1:11–17). Quanto ao que Tito tinha sido, leia-se Gl 2:2, 3. Esta
misericordiosa inclusão de si mesmo é muito eficaz e desperta
aprovação. Faz com que o leitor (Tito) e os ouvintes (os crentes 38
As traduções que vão longe demais em seu afã de “ocidentalizar” o
Novo Testamento perdem de vista o jogo de palavras que há neste
versículo, e então, contrariamente ao original, mas em harmonia
com as versões inglesas A.V. e A.R.V., inserem um jogo de palavras
no versículo seguinte:

“aborrecíveis, e nos aborrecendo uns aos outros”. Em ambos os


casos tratei que reter o sabor do original na tradução.

Tito (William Hendriksen)

121

cretenses quando se lhes leia a carta) sintam que o autor está


pisando no mesmo terreno que eles e os compreende (cf. Tt 1:4;
logo, 1 Ts. 5:9; Ap 1:9). Além disso, o agudo contraste entre o que
os homens eram em seu estado de pecado e o que chegaram a ser
desde que entraram no estado de graça promove a gratidão a Deus;
também produz boa vontade para o próximo que foi feito a imagem
de Deus (o vívido retrato deste contraste é característico de Paulo;
veja-se 1Tm 1:12–17; logo, Rm 6:17–23; 1Co 6:11; Ef 2:2–13; 5:8;
Cl 3:7; e cf. 1Pe 4:3).

Então não nos surpreende que em contraste com as sete virtudes


mencionadas nos vv. 1 e 2, mostrando o que os crentes (cretenses)
deveriam ser, ponha-se um número igualmente vícios (v. 3)
mostrando o que fomos em outro tempo.
Estávamos sem entendimento (“insensatos”, 1Tm 6:9), não somente
ignorantes, mas por natureza realmente incapazes de discernir as
coisas do Espírito (1Co 2:14; cf. Rm 1:21; Ef 4:18).

Desobedientes à autoridade divina e à humana (Tt 1:6, 10; 3:1; logo,


2 Ti. 3:2; Rm 1:21, 30), não prestando atenção à voz da consciência
nem às admoestações dos pais nem às leis dos magistrados civis.

Extraviados (veja-se comentário sobre 2Tm 3:13), induzidos a vagar


longe da verdade, vivendo num mundo afastado da realidade,
imaginando que ser licencioso é ser livre. Embora nos
considerássemos livres, éramos escravos.

Escravizados a várias paixões e prazeres, permitindo que estes


maus desejos tomassem domínio de nossa vida e conduta. (Quanto
a paixões, veja-se comentário sobre 2 Ti. 2:22; 3:6, e quanto a
prazeres, cf.

Lc 8:14; Tg 4:1, 3; 2Pe 2:13). Quando se passa revista ao mundo


sem Cristo o que triste espetáculo apresenta! Eis aqui nós: o glutão
e o bêbado, o avarento e o esbanjador, o impulsivo e o senil, o
amante dos esportes e o ocioso, o farsante e o janota, o sádico e o
violador, o sanguinário e o mulherengo. Cf. Rm 1:18–32; Gl 5:19–21.
Alguns servem a um Senhor, outros a outro, mas por natureza todos
são escravos

Tito (William Hendriksen)

122

dos terríveis impulsos que nunca aprenderam a controlar, e que,


segundo alguns psicólogos modernos, não devessem fazer uma
tentativa muito intenso por reprimi-los.

Vivendo (literalmente “levando”, com uma vida implícito; cf. 1Tm 2:2)
em malícia e inveja. Esta malícia não é uma simples travessura.
Não, é maldade, perversidade, iniquidade; especialmente a
disposição da mente ao mal. Uma de suas manifestações mais
destruidoras da alma é a inveja, um mal que, como está implícito na
etimologia da palavra grega, faz com que a pessoa seja consumida.
Não se falou da inveja como o mal cujo encarniçamento nada pode
apaziguar, “primogênita do inferno”?

Não se alimenta dos vivos, sem cessar até que estão mortos? Não é
caruncho dos ossos? (Pv 14:30). Cf. o que Paulo diz a respeito em
outros lugares (1 Ti. 6:4; logo, Rm 1:29; Gl 5:21; Fp 1:15) e cf. Mt
27:18; Mc 15:10; Tg 4:5; e 1Pe 2:1. Nossa palavra inveja vem do
latim invideo, que significa “olhar contra”, isto é, olhar com má
disposição a outra pessoa devido ao que é ou ao que tem. (O
ciúme, bem se disse, tem medo de perder o que tem; a inveja sente
ódio ao ver que outra pessoa tem algo.

Assim, o Sr. Fulano tem ciúme de sua própria honra, e está invejoso
da superior habilidade do Sr. Sicrano). A inveja foi o que provocou o
assassinato de Abel, lançou a José dentro da cisterna, fez com que
Coré, Datã e Abirão se rebelassem contra Moisés e Arão, fez com
que Saul perseguisse Davi, deu lugar às amargas palavras que o
“irmão mais velho” (na parábola do filho pródigo) dirigiu a seu pai, e
foi o que crucificou a Cristo. O amor não tem inveja (1Co 13:4).

Aborrecíveis, odiosos, repugnantes, ofensivos, asquerosos,


repulsivos. No Novo Testamento a palavra usada no original
aparece somente aqui, mas o judeu Filo (20 a.C.–50 d.C.) também a
usa. O

pecador inconverso provoca aversão por meio de sua atitude para


Deus e para os homens. Por isso:

Odiando-nos mutuamente. Este é o resultado natural quando a


pessoa detestável com toda sua repugnância se vê de algum modo

Tito (William Hendriksen)

123
forçada a viver com outros e a encontrar-se com os demais de cem
maneiras diferentes.

“Assim éramos noutro tempo”, diz Paulo. Por isso, não sejamos
muito duros com pessoas que ainda estão em essa condição, mas
sim nos esforcemos por ganhá-los para Cristo por meio de nossa
conduta piedosa.

4–6. E ajamos assim movidos pela gratidão pelo que recebemos.

Portanto, Paulo continua: Quando, porém, apareceu a bondade de


Deus nosso Salvador e seu amor para com o homem, ele nos
salvou. Que surpreendente contraste! Na verdade, um duplo
contraste. (1) Em contraste com “a desumanidade do homem para
com o homem” descrita no v. 3, retrata-se a benignidade (palavra
usada unicamente por Paulo: Rm 2:4; 3:12; 11:22, etc.) de Deus e
Seu amor pelo homem (cf. At 28:2).

E (2) sobre as trevas infernais de nosso passado (v. 3) aparece


dramaticamente a luz do Pai misericordioso e piedoso que nos
conduziu ao estado presente de graça. (Aqui novamente está
aquela gloriosa epifania mencionada anteriormente; veja-se
comentário sobre Tt 2:11).

Isto, é preciso enfatizá-lo, é mais que um argumento. Na verdade, é


um argumento como já se assinalou. Mas é mais que isso. É o
derramamento (em linguagem proverbial; veja-se comentário sobre
o v.

8) de um coração que está ardendo de amor em correspondência ao


amor de Deus. É preciso ter em mente que Paulo escreve como um
que experimentou em sua própria vida tudo isto. Ele não está ao
lado desta história que escreve, mas sim ele mesmo é parte dela.
Por isso estas palavras da bondade de Deus nosso Salvador e seu
amor para os homens são tão ardentes e ternas como o era o
coração deste mesmo apóstolo, homem que com frequência via-se
chorando, e que uma vez escreveu de forma muito emotiva: “O Filho
de Deus me amou, e se deu a si mesmo
… por mim!” (Gl 2:20).

A expressão “a bondade e seu amor para com o homem” é um só


conceito; por isso o verbo no original está no singular. A expressão
como tal encontra-se também nas obras dos moralistas pagãos,
mas o

Tito (William Hendriksen)

124

conteúdo na forma usada aqui em Tt 3:4 é único. Aqui a “bondade e


amor” não se atribui a algum governador terrestre sobre quem
chovem os louvores dos homens, louvores que dificilmente merece;
aqui se procura a verdadeira benignidade e amor. A expressão amor
para com o homem é uma só palavra, exatamente nossa palavra
“filantropia”. No entanto, uma vez que no uso castelhano atual a
palavra “filantropia” se entende somente com referência a “obras de
beneficência prática”, uma obra da qual os homens são os autores e
os receptores, provavelmente seja melhor conservar a bela tradução
que se encontra em nossas versões castelhanas; porque
certamente, na forma que Paulo usa a palavra, esta combina o amor
em si e seu generoso derramamento sobre a humanidade. Ao reter
a tradução “amor para com o homem” a gente lembra
imediatamente João 3:16, que expressa de forma bela a verdade
que o apóstolo tinha em mente.

Foi a bondade e amor de Deus nosso Salvador (veja-se comentário


sobre 1Tm 1:1; Tt 1:3; 2:10) o que foi em resgate do homem. Foi
ele, Deus o Pai, quem nos salvou, nos resgatando do maior dos
males e nos outorgando a maior das bênçãos (veja-se comentário
sobre 1Tm 1:15).

Ele nos salvou: Paulo, Tito, na verdade a todos os que no curso do


tempo chegaram a receber esta grande bênção.

Ora, a fim de nos predispor completamente a ajudar a outros que


ainda não se salvaram, e evitar que digamos: “Mas eles não
merecem nossa ajuda”, Paulo enfatiza o fato de que nós, por nossa
parte, tampouco merecíamos nossa salvação. Faz isto assinalando
que, negativamente, o Pai nos salvou não em virtude de obras
que nós mesmos tivéssemos realizado em (um estado de)
justiça, e positivamente, mas segundo a sua misericórdia. Tão
forte é a ênfase de Paulo sobre este caráter completamente
soberano (isto é, completamente imerecido por nossa parte) de
nossa salvação, que (como é claro no original; e cf. as traduções da
A.V. e A.R.V.)) faz com que toda esta extensa oração composta
preceda ao verbo salvar. Assim, A.V. diz:

Tito (William Hendriksen)

125

“4. Mas quando se manifestou a bondade de Deus nosso Salvador,


e seu amor para com os homens, 5 não por obras de justiça que
tivéssemos feito, mas segundo sua misericórdia ele nos salvou …”

Quanto à ordem das palavras, essa tradução é correta. A única


objeção que alguns lhe fazem é que, a menos que alguém preste
muita atenção à pontuação, está em perigo de construir
mentalmente a frase composta como se fosse um modificativo do
verbo manifestou, e não do verbo salvou.

“Não em virtude de (quer dizer, como resultado de, com base em; cf.
Gl 2:16) obras que nós mesmos tivéssemos realizado num estado
de justiça”. A implicação é: não houve tais obras. Nem Paulo nem
ninguém mais realizou jamais uma obra tal, porque diante de Deus e
de sua santa lei todos — tanto judeus quanto pagãos — por
natureza estão “debaixo do pecado” (Rm 3:9). Por isso, se os
homens tiverem que ser salvos alguma vez, somente pode ser
“segundo seu (de Deus) misericórdia”.

Note-se, os homens não somente são salvos por ou em virtude ou


com base em Sua misericórdia (na verdade, tudo isso está
implícito), mas segundo Sua misericórdia, sendo a “amplitude da
misericórdia de Deus”
a medida que determina a amplitude de sua salvação (cf. Ef 1:7).
Outras passagens da Escritura que igualmente enfatizam o caráter
completamente soberano da graça de Deus ao salvar o homem são
citadas no C.N.T. sobre João 15:16. 39 A misericórdia de Deus
(sobre a qual ver comentário sobre 1Tm 1:2) é Sua bondade e
compaixão para com os que estão em necessidade ou em angústia.

O meio empregado para nos salvar é indicado por um modificativo


adicional do verbo salvou, ou seja, pela lavagem da regeneração e
renovação proveniente do Espírito Santo. Note-se “pela lavagem”

(λουτρόν, -οῦ), não “por meio de lavatório ou fonte para lavagem”. A


39 Cf. Edwin H. Palmer, The Five Points of Calvinism, publicado
pela Sociedade de Homens da Igreja Cristã Reformada, 422 E.
Exchange St., Spring Lake, Mich., especialmente pp. 21–33.

Tito (William Hendriksen)

126

lavagem a que se refere é completamente espiritual. É o da


regeneração e renovação, consideradas como um só conceito.

A expressão regeneração aplicada a indivíduos aparece somente


nesta passagem do Novo Testamento (Mt 19:28 tem referência à
regeneração cósmica). Literalmente significa novo nascimento, o ser
nascido de novo ( palin = outra vez, mais genesia = nascimento; de
onde, palin - genesia). Mas embora a palavra apareça somente
desta vez, a ideia se encontra em muitas outras passagens (Jo 1:13;
3:3, 5–8; 1Pe 1:23; 1Jo 2:29; 3:9; 4:7; 5:1, 4, 18; cf. também 2Co
5:17; Gl 6:15; Ef 2:5; 4:24 e Cl 2:13). Não conheço melhor definição
de regeneração que a dada por L. Berkhof, ou seja: “Regeneração é
o ato de Deus por meio do qual o princípio da nova vida é
implantado no homem, a disposição governante da alma se torna
santa, ficando assegurado o primeiro exercício santo desta nova
disposição”. 40
Esta passagem, em conexão com seu contexto, põe ênfase nos
seguintes detalhes com relação a esta maravilhosa obra de Deus:
(1) É obra do Espírito Santo. Isto é lógico, porque na Escritura é
especialmente a terceira pessoa da Trindade a que se representa
como quem outorga a vida; de onde, também outorga a vida
espiritual. Além disso, é ele, o Espírito Santo, quem toma a iniciativa
na obra de tornar santo o homem.

(2) Precede e origina o processo da renovação. Enquanto esta é


uma atividade que dura toda a vida, a regeneração é um só ato,
uma mudança instantânea.

(3) Afeta a todo o homem. Note-se: “Ele nos salvou”.

(4) É uma mudança radical, de tal modo que aqueles que


anteriormente estava carregados com os sete vícios mencionados
no v. 3, agora são adornados em princípio com as sete virtudes
mencionadas nos vv. 1 e 2.

40 Systematic Theology. Grand Rapids. 1949, p. 469.

Tito (William Hendriksen)

127

A palavra renovação se encontra também em Rm 12:2. Essa


passagem indica que embora esta obra, assim como a regeneração,
atribui-se ao Espírito Santo, existe esta diferença: a regeneração é
uma obra inteiramente de Deus, mas na renovação ou santificação
tomam parte Deus e o homem. Enquanto a regeneração não é
percebida de forma direta pelo homem, e só chega a conhecê-la por
seus efeitos, a renovação exige a rendição consciente e contínua do
homem e de toda sua personalidade à vontade de Deus.

Para a definição cito mais uma vez a L. Berkhof (p. 532 da obra
mencionada em nota 208):
“Santificação é aquela operação graciosa e contínua do Espírito
Santo, pela qual liberta o pecador justificado da corrupção do
pecado, renova toda sua natureza à imagem de Deus e o capacita a
fazer boas obras”.

É claro, por passagens tais como Jo 3:3, 5 e especialmente Ef 5:26

(cf. Hb 10:22), que este “lavamento da regeneração e a renovação”


tem certa relação com o rito do batismo. Sem dúvida, também aqui
em Tt 3:5

há uma referência implícita a este sacramento. No entanto, discutir


aqui esse problema, enquanto comentamos uma passagem em que
a água nem sequer menciona-se, afastar-nos-ia muito de nosso
tema. No entanto, veja-se C.N.T. sobre Jo 3:3, 5.

Ora, com o colocar ainda mais ênfase no fato de que os crentes não
têm razão válida para deixar de cumprir seu dever de ganhar outros
para Cristo por meio de uma conduta piedosa, Paulo acrescenta as
palavras seguintes, com referência à bondade de Deus ao nos
salvar e nos comunicar seu Espírito capacitador: que (ou a quem,
isto é, o Espírito) ele (isto é, Deus o Pai) derramou ricamente
sobre nós por meio de Jesus Cristo nosso Salvador.

Note-se que nesta passagem Deus o Pai, Deus o Espírito e Deus o


Filho se combinam de forma bela.

Deus o Pai não somente dá Seu Filho, mas também derrama Seu
Espírito. A referência é ao Pentecostes (At 2:17, 18, 33).
Organicamente

Tito (William Hendriksen)

128

falando, o Espírito foi derramado sobre a igreja do presente e do


futuro; porque o Espírito, tendo estabelecido Sua morada na igreja,
nunca mais volta a deixá-la.
Por isso, Paulo pode dizer: “a quem derramou ricamente sobre nós”.

O advérbio ricamente indica a transbordante provisão de dons


espirituais que vêm como resultado deste derramamento. Ninguém
tem direito a dizer: “Eu não posso fazer nada no reino de Deus, uma
vez que Deus nada me deu”. A bela frase “por meio de Jesus Cristo
nosso Salvador” indica que este, por meio de seu sacrifício
expiatório e pela oração obteve para seu povo o dom do Espírito
Santo (Jo 14:16; 16:17).

7. Nosso estado anterior, descrito no v. 3, terminou. As bênçãos


descritas nos vv. 4–6 foram recebidas e se seguem recebendo.
Agora se declara seu propósito e resultado: a fim de que, tendo
sido justificados por sua graça, viéssemos a ser herdeiros na
esperança da vida eterna.

O processo de raciocínio que achamos nestes versículos (3–7) é


conhecido ao que estuda as epístolas de Paulo. Note-se as três
etapas: Por natureza éramos filhos da ira — recebemos vida —
agora esperamos, pela fé, os séculos vindouros, quando
receberemos uma glória ainda maior (Ef 2:1–10);

Éramos adoradores de ídolos — agora servimos ao Deus vivo e


verdadeiro — esperamos do céu a vinda do Filho de Deus (1Ts 1:9,
10), e nossa comunhão eterna com ele (1Ts 4:13–18).

Éramos ímpios e governados pelas paixões mundanas — agora


renunciamos a tudo isto e vivemos ima vida de domínio próprio,
justiça e piedade — estamos esperando a realização da bem-
aventurada esperança (Tt 2:11–13).

Tendo recém-mencionado a “Jesus Cristo nosso Salvador”, Paulo,


pensando ainda na graça de Deus em Cristo, continua: “a fim de
que tendo sido justificados por sua graça” (como causa eficaz, que
dá mérito), etc. Note-se o particípio aoristo passivo tendo sido
justificados.

Tito (William Hendriksen)


129

Isto não significa “tendo sido feito retos”. 41 Significa ter sido
declarados justos. A justificação é o ato de Deus o Pai pelo qual
carrega a Cristo nossos pecados, e a justiça de Cristo a imputa a
nós (2Co 5:21). É o contrário de condenação (Rm 8:33, 34). Implica
ser libertado da maldição de Deus porque essa maldição foi posta
sobre Cristo (Gl 3:11–

13). Significa perdão completo e gratuito (Rm 4:6–8). É o dom


gratuito de Deus, o fruto da graça soberana, e de maneira nenhuma
é o resultado da “bondade” ou de realizações humanas (Rm 3:24;
5:5, 8, 9). Traz paz à alma (Rm 5:1), uma paz que ultrapassa todo
entendimento. Cheia o coração com tal gratidão que produz na vida
do crente uma rica colheita de boas obras. Por isso, a justificação e
a santificação, embora sempre diferentes, nunca se separam mas
sim estão na relação mais estreita possível uma com a outra (Rm
6:2; 8:1, 2).

Então, o propósito da obra de Deus ao nos salvar é “que


pudéssemos chegar a ser herdeiros … de vida eterna”; isto é, que
mesmo agora, nesta vida presente, pudéssemos ter como filhos o
direito de esperar a plena possessão daquilo que agora possuímos
somente em princípio. Quando chegar esse dia futuro, nos
regozijaremos na comunhão com Deus mais rica possível (porque
será sem pecado) em Cristo (cf. C.N.T. sobre Jo 3:16; 17:3), ao
calor de seu amor (Jo 5:42) e participando, na medida mais plena
que é possível ao homem, de sua alegria e glória (Jo 17:13). Então,
essa vida difere em essência da “vida”

do incrédulo, e em grau da vida do crente aqui embaixo. Além disso,


é realmente eterna, quer dizer, que nunca acaba. Nós somos agora
os possuidores daquela vida em princípio; e mesmo agora somos os
herdeiros daquela vida como será em sua perfeição, mas somos
herdeiros em esperança, herdeiros que esperam. Mas esta
esperança se verá certamente realizada (Rm 5:5).
8. Refletindo sobre o resumo do evangelho dado nos vv. 4–7, o
apóstolo continua: Fiel (é) esta declaração, e sobre estas coisas
quero que 41 Ver L. Berkhof, Systematic Theology, p. 510.

Tito (William Hendriksen)

130

fales com confiança, para que os que puseram sua fé em Deus


possam aplicar-se com diligência às boas obras.

Este, então (isto é, os vv. 4–7), é o último dos cinco grandes

“frases”. Veja-se comentário sobre 1Tm 1:15 quanto ao sentido da


fórmula introdutória “fiel é a declaração”. É a respeito destas
matérias

— ou seja, a. a bondade do Pai e seu amor ao homem; b. a obra do


Espírito Santo na regeneração e renovação do homem; c. a graça
de Jesus Cristo considerada como a causa eficaz de nossa
justificação; e d. o propósito de tudo isto: que pudéssemos chegar a
ser o que somos hoje, herdeiros em esperança de vida eterna —
que Paulo quer que Tito fale com confiança. Outros falam com
confiança sobre questões frívolas; além disso são assuntos a
respeito dos quais nada sabem (veja-se comentário sobre 1Tm 1:7;
e veja-se sobre o v. 9 abaixo). Então Tito tem que enfatizar os
assuntos dos quais se convenceu firme e justamente, com o
propósito de que aqueles que tem sua fé posta em Deus (note-se o
particípio perfeito, indicando tanto uma ação passada e o resultado
presente permanente) sejam cuidadosos em aplicar-se às boas
obras.

Devem concentrar seu pensamento nessas obras de gratidão,


aplicando-se com diligência a sua realização, e fazendo delas sua
principal preocupação. Estas coisas — isto é, as coisas recém-
mencionadas: a bondade do Pai, a obra do Espírito Santo, etc. —
são excelentes e benéficas para (toda) pessoa. Estas coisas não
somente são excelentes em si mesmas, mas também proveitosas (
úteis, benéficas; ver comentário sobre 1Tm 4:8; 2Tm 3:16; também
no grego clássico e nos papiros).

Além disso, quando se recebe pela fé, beneficiam aos homens em


geral, não a esta ou aquela classe em particular. Trazem vida, luz,
alegria e paz onde antes havia morte, trevas, tristeza e temor.

Tito (William Hendriksen)

131

TT 3:9–11 - POR OUTRO LADO, É PRECISO DESCARTAR AS


QUESTÕES

NÉSCIAS E OS HOMENS FACCIOSOS QUE SE NEGAM A


PRESTAR ATENÇÃO

ÀS ADMOESTAÇÕES.

9. Agora se acrescentam umas poucas instruções negativas: Mas


quanto a investigações néscias, genealogias, disputas e
conflitos acerca da lei, evita-as, porque são sem proveito e
fúteis.

Isto está em forte contraste com o precedente: Tito deve fazer um,
mas deve evitar o outro. A ordem das palavras na oração (o objeto
composto colocado antes do verbo) e a ausência do artigo diante
dos quatro substantivos, são atos que demonstram claramente que
toda a ênfase possível está posta na qualidade e conteúdo do
objeto. O que se deve evitar é exatamente as investigações néscias,
ou seja, investigações na ciência genealógica. É precisamente as
brigas, isto é, os conflitos acerca da lei, o que é preciso evitar. Cf.
comentário sobre Tt 1:9, 10, 14.

Os assuntos em referência foram descritos detalhadamente em


conexão com 1Tm 1:3–7, 19, 20 e 1Tm 6:3–5 (veja-se comentário
sobre essas passagens). Tito deve fugir (cf. 2Tm 2:16) as lendas
judaicas e suas estipulações, as investigações e as contendas a
respeito. Quando vir que se aproximam, deve dar-se volta e fugir.
Deve ver estas coisas e as valorizar no que são verdadeiramente:
sem proveito, fúteis. Que agudo contraste entre todas estas
estultícias inúteis e os assuntos muito úteis sobre os quais Paulo
acaba de falar nos vv. 4–7 (cf. o v. 8). O ministro que faz justiça ao
último não terá tempo para o primeiro.

10 e 11. E, qual deve ser a atitude de Tito para com os membros da


igreja que foram enganados por estes especialistas em sabedoria
genealógica e por estes lutadores em questões legais, que
começam a fazer propaganda para esta causa indigna? Paulo diz:
Depois de uma primeira42 e segunda advertência, não tenhas
nada mais a ver com uma 42 O koinê com frequência substitui o
cardeal pelo ordinal; cf. Mt 28:1; Mc 16:2.

Tito (William Hendriksen)

132

pessoa que cause divisões, sabendo que tal indivíduo está


pervertido e peca, estando condenado por si mesmo.

Paulo fala a respeito de uma pessoa “herege”. Originalmente a


palavra “heresia” (αἵρεσις) significava simplesmente “o que alguém
escolhe para si mesmo”, “uma opinião”. Este significado deu origem
a outro, ou seja, “um conjunto de pessoas que professam certos
princípios ou opiniões definidas”, de onde uma escola ou partido;
por exemplo, o

“partido dos saduceus” (At 5:17), e o “partido dos fariseus” (At 15:5;
cf.

26:5).

Embora em certos contextos este sentido neutro permaneceu por


algum tempo, a palavra começou a usar-se também em certo
sentido desfavorável. Cf. nossa palavra facção. Nesse sentido havia
facções em Corinto (“Eu sou de Paulo”, “eu de Apolo”, etc.). Quando
Tértulo chamou Paulo “cabeça da seita (ou facção) dos nazarenos”,
não estava tratando de elogiá-lo. Cf. também At 24:14 onde Paulo
diz: “segundo o Caminho que eles chamam heresia (ou seita)”. E ver
At 28:22.

Portanto, uma pessoa facciosa é aqui alguém que sem justificação


cria divisões. À luz do contexto, é provável que a tradução “herege”
não estaria muito longe da realidade. De qualquer maneira, a
palavra leva essa direção. A pessoa facciosa na qual está pensando
o apóstolo aceitou a sinistra filosofia dos hereges cretenses que se
especializavam nas investigações néscias e os conflitos acerca da
lei (veja-se comentário sobre o v. 9). Como ficou claro, o erro deles
tocava tanto a doutrina como a vida, como ocorre geralmente.
Naturalmente, é verdade que aqui a palavra usada não deve
restringir-se a um tipo particular de fanático.

Aqui se condena a toda pessoa facciosa.

O apóstolo exige que, chegado o momento oportuno, tal pessoa


seja rejeitada. A expressão “não tenha nada a ver com” deve ser
tomada no sentido de recusar, rejeitar (cf. 1Tm 5:11; 2Tm 2:23).
Parece haver uma referência aqui a Mt 18:15–17. Provavelmente se
indica a exclusão oficial da membresia da igreja. Isto não
surpreende, porque Tito saberá que tal indivíduo (cf. Rm 16:18,
etc.), que não somente causa divisões

Tito (William Hendriksen)

133

mas sim persiste nesta prática depois de repetidas advertências,


“está pervertido” e peca. A palavra traduzida “está pervertido” é
muito descritiva. Tal pessoa não vive nem vê bem. Está mental e
moralmente desviado ou torcido. É pior que o homem excêntrico. Na
verdade vive em pecado. O que faz com que seu pecado seja pior é
o fato de que sabe que está pecando. Se sua consciência ainda não
lhe falou claramente, pelo menos recebeu advertências e isso não
uma, mas sim duas vezes.
Por isso peca “estando condenado por si mesmo”.

Com relação a isso, o requisito é muito importante, ou seja, “depois


de uma primeira e segunda advertência (ou admoestação). Tanto
este substantivo como o verbo relacionado ( advertir, admoestar;
literalmente, pôr na mente) usa-os somente Paulo em outros lugares
(veja-se o substantivo em 1Co 10:11; Ef 6:4; o verbo em At 20:31,
Paulo está falando; Rm 15:14; 1 Cor. 4:14; Cl 1:28; 3:16; 1Ts 5:12,
14; 2Ts 3:15).

O requisito indica que, segundo a ensino paulino, a disciplina


sempre deve brotar do amor, de um desejo de curar, jamais do
desejo de desfazer-se de um indivíduo. Deve-se demonstrar muita
paciência.

mesmo quando o erro é muito atroz e perigoso, como no caso


presente, deve-se fazer todo esforço para procurar ganhar no
errado. Se depois de ter sido admoestado com carinho, o membro
recusa arrepender-se e continua sua má obra no meio da
congregação, a igreja por meio de seus dirigentes e por meio de
toda a congregação deve redobrar seus esforços.

Deve haver uma segunda advertência. Mas se mesmo este remédio


fracassa, deve ser expulso. Mesmo esta medida extrema tem como
propósito a recuperação do pecador. No entanto, este não pode ser
o único propósito. Não se deve perder de vista nunca o bem-estar
da igreja (cf. Mt 12:25) para glória de Deus. Afinal, esse é o objeto
principal da disciplina (cf. C.N.T. sobre 2Ts 3:14, 15).

Tito (William Hendriksen)

134

TT 3:12–15 - INSTRUÇÕES FINAIS COM RELAÇÃO A


VIAJANTES PELA CAUSA DO REINO (ÁRTEMAS OU TÍQUICO,
TITO, ZENAS, APOLO) E A CRENTES CRETENSES EM GERAL.
SAUDAÇÕES.
12. terminou o corpo da carta (Tt 1:1–3:11). Foi escrita por um
amanuense que reproduzia fielmente a mensagem de Paulo,
retendo em todo caso o estilo deste e a maior parte de seu
vocabulário, mas que aqui ou lá faz uso de seu próprio vocabulário,
submetendo finalmente tudo à aprovação do apóstolo? E então,
acrescentou Paulo os versículos 12–15, escrevendo-os “com sua
própria mão”? Veja-se C.N.T. sobre 2Ts 3:17.

Seja como for, o fato é que, como poderia esperar-se, a seção final
está formada quase completamente por palavras que também se
encontram nas Dez (as demais epístolas de Paulo, descontadas as
pastorais). 43

Diz Paulo: Assim que eu tiver te enviado a Ártemas ou a Tíquico,


faze todo o possível por vir te encontrar comigo em Nicópolis,
porque decidi passar o inverno ali.

Neste momento Paulo provavelmente está em algum lugar da


Macedônia. Certamente não está em Nicópolis, embora uma
inscrição (fora do texto) em manuscritos posteriores declara que a
carta a Tito foi enviada desse lugar. Se isto teria sido assim, Paulo
não poderia ter escrito: “decidi passar o inverno ali”.

O apóstolo deseja passar o inverno com Tito. decidiu que Nicópolis


seja o lugar de reunião.

Uma vez que este nome menciona-se sem nenhuma elucidação


adicional, é provável que se refira a mais famosa de todas as
cidades de Vitória, isto é, situada-a no promontório sudoeste de
Épiro na Grécia.

Seu lugar estava uns poucos quilômetros a norte da moderna


Preveza. A antiga cidade de Nicópolis tinha sido fundada e
constituída como uma 43 No entanto, note-se que até nesta
conclusão “obras nobres” substitui as “boas obras” que Paulo
mencionou anteriormente, e que o verbo προίστημι usa-se em certo
sentido que não tem nas Dez.
Mas, como se notou anteriormente, o vocabulário do apóstolo pode
ter mudado algo. Além disso, nem sempre é fácil descobrir o
alcance exato do que Paulo escreveu “com sua própria mão”.

Tito (William Hendriksen)

135

colônia romana como Augusto, em memória de sua vitória sobre


Antônio e Cleópatra na próxima Áccio (31 a.C.).

Nicópolis era sem dúvida, um lugar de reunião adequado, e isto por


uma ou mais de várias razões possíveis, tais como:

Estava localizada mais ou menos no centro: Paulo deveria viajar de


direção sudoeste tanto como Tito deveria viajar para o noroeste.

Consulte um mapa.

Era um belo lugar para hibernar. Além disso, os meses de inverno


não eram adaptados para viagens marítimas (cf. At 27:12; 28:11;
1Co 16:6; e 2Tm 4:21).

Era uma excelente base de operações para atividade missionária


em Dalmácia. Parece que Tito realmente chegou a Nicópolis e
realizou trabalhos de evangelização em Dalmácia, lugar ao que
voltou algum tempo depois (veja-se comentário sobre 2Tm 4:10).

Era bom degrau para alcançar a lugares mais ao ocidente. Tinha


Paulo intenções de ir dali a Espanha quanto tivesse terminado o
inverno?

Mas, embora Tito deve fazer todo o possível (ou fazer “o sumo”, cf.

2Tm 2:15; 4:9, 21; Gl 2:10; Ef 4:3; 1Ts 2:17) por encontrar-se com
Paulo em Nicópolis, Creta não pode ficar sem um bom líder. As
condições eram muito graves para permitir mesmo um curto tempo
de vacância. Tão logo chegue um substituto, Tito pode partir, mas
não antes. Note-se que Paulo não diz: “Os cretenses podem
facilmente cuidar-se solos durante tua ausência”. Compreende que
as igrejas não podem “nacionalizar-se” da noite para o dia.
Enquanto seja necessário ter líderes “de fora”, é preciso
proporcioná-los.

Assim, Paulo vai enviar a Ártemas ou a Tíquico. Ambos os homens


podem ser considerados colaboradores de Paulo e enviados deles,
que realizavam a obra do reino sob sua autoridade e supervisão. O
nome Ártemas provavelmente seja uma abreviatura do Artemidoro,
que significa “dom de Ártemis”, a rainha grega da caça,
correspondente à Diana romana. Não temos mais informação
fidedigna com referência a este homem. O que se sabe de Tíquico
se resumiu em 2Tm 4:12; veja-se

Tito (William Hendriksen)

136

comentário dessa passagem. Seu nome, que significa “fortuito”,


pode relacionar-se com o da deusa grega Tique, isto é, Fortuna
(azar).

Há aqueles que pensam que quando Paulo teve que decidir a quem
enviar a Creta, Ártemas ou Tíquico, comissionou a Ártemas para a
tarefa. Deduzem isto do fato que durante o segundo
encarceramento o apóstolo diz que há comissionado a Tíquico para
ir a Éfeso (2Tm 4:12).

Esta poderia ser uma dedução questionável.

13. Com referência aos portadores da carta, Paulo tem uma palavra
amistosa: Faze tudo o que possas para ajudar em sua viagem ao
Zenas, perito em leis, e a Apolo, a fim de que nada lhes falte.

O que classe de perito em leis era Zenas? Antes de converter-se a


Cristo, tinha sido um expositor da lei de Moisés (“mestre da lei” ou
“escriba”), ou era um jurista ou “advogado” romano com cuja
assistência fazia-se um testamento ou se cercava um juízo? Alguns
preferem o segundo ponto de vista, dando como razão que o
homem dificilmente podia ter sido judeu uma vez que tinha um nome
grego, nome que provavelmente era abreviatura do Zenodoro, que
significa “dom de Zeus”. Mas havia muitos judeus que tinham nomes
gregos. Paulo e Apolo, não eram judeus com nomes gregos?
Outros, “somando dois mais dois” de um modo interessante,
sugerem que Zenas bem como Apolo era judeu, e que estes dois
bons cristãos, que também eram peritos no saber judaico, foram
enviados a Creta a fim de pôr freio à influência daqueles que se
especializavam em fábulas judaicas às custas do verdadeiro
evangelho.

Isto poderia ser assim, mas tudo o que realmente sabemos é que
Zenas, perito em leis em algum sentido, e Apolo, que possivelmente
eram os portadores da carta, iam viajando, e que se ordena a Tito
que faça todo o possível para ajudá-los (ou “encaminhá-los”) a
seguir esta viagem. Qual era seu destino final? Novamente, não o
sabemos. Era preciso dar comida e alojamento a estes homens
enquanto estivessem em Creta, e se lhes devia ajudar em todo
sentido para que, não lhes faltando nada, pudessem continuar suas
viagens.

Tito (William Hendriksen)

137

Apolo é um personagem conhecido. Era judeu, natural de


Alexandria (At 18:24), a famosa cidade universitária e que tinha uma
biblioteca, fundada por Alexandre Magno no ano 332 a.C. Além
disso era orador, poderoso nas Escrituras. Tendo chegado a Éfeso,
onde falou com denodo na sinagoga, Priscila e Áquila lhe tinham
ensinado de forma mais exata o caminho de Deus (At 18:26). Assim
equipado, tinha ido à província da Acaia onde foi de grande bênção
aos crentes e refutou poderosamente aos judeus, e isso
publicamente, demonstrando pelas Escrituras que Jesus era o
Cristo (At 18:27, 28). Depois tinha voltado a Éfeso (1Co 16:12). Era
um bom amigo de Paulo (“Eu plantei, Apolo regou; mas Deus deu o
crescimento”, 1Co 3:6). Podemos estar seguros que tanto Paulo
como Apolo estavam afligidos pelo espírito faccioso da igreja de
Corinto (“Eu sou de Paulo”, “Eu sou de Apolo”, 1Co 1:12).

14. Ora, Tito deve ajudar a estes homens em sua viagem, mas não
deve procurar sobrecarregar-se sozinho com toda a
responsabilidade. Por isso Paulo continua: Além disso, nosso
povo deve aprender a aplicar-se às boas obras nestas ocasiões
de necessidade imperativa, para que não estejam sem fruto.

À luz do contexto imediato o sentido deve ser: Tito, não deixe de


animar o nosso povo, isto é, aos crentes da ilha de Creta, a
cooperar de todo coração em todas estas manifestações de
generosidade. Deveriam seguir aprendendo coisas deste tipo, isto é,
deveriam chegar a ser pessoas experimentadas em fazer o bem (cf.
1Tm 5:4; Fp 4:11), assim como Paulo tinha aprendido a estar
contente com qualquer um que fora o estado em que estivesse. Este
aprendizagem pela prática é a melhor autoeducação que alguém
pudesse desejar.

Então, os crentes cretenses deveriam aprender a “aplicar-se às


boas obras” (veja-se comentário sobre o v. 8; cf. v. 1) “para estas
necessidades imperativas” (assim diz literalmente). Cf. At 20:34;
28:10. Se Paulo estava em Filipos quando escreveu esta carta, não
devia olhar muito longe para assinalar exemplos brilhantes de
homens e mulheres que entendiam o dever e o estavam
aprendendo cada vez melhor (leia-se Fp

Tito (William Hendriksen)

138

2:25; 4:16). O propósito é: “para que não estejam sem fruto” (cf. Mt
7:15; 13:8, 23; Jo 15:8; Gl 5:22). O autor desta epístola compreende
plenamente que embora a graça é a raiz (Tt 3:7; cf. Ef 2:8), as
ações nobres são o fruto (cf. Ef 2:10) da árvore da salvação.
15. A saudação de despedida consiste de três partes: Todos os
que estão comigo te saúdam. Todos os colaboradores que
acompanhavam o (μετά) apóstolo enviam saudações a Tito. Cf: 2Tm
4:21; logo At 20:34.

Saúda aos que nos amam em fé. pede-se a Tito que seja portador
das saudações de Paulo e de seus acompanhantes aos que estão
cheios de afeto por eles na esfera da fé cristã. A graça44 (seja)
com todos vós.

pronuncia-se a bênção sobre todos quão crentes ouçam a leitura


desta carta, pedindo “o favor de Deus em Cristo por aqueles que
não o tem merecido”. Em seu meio (μετά) estará, enchendo seus
corações com paz e alegria. Quanto a detalhes, veja-se C.N.T.
sobre 1Ts 1:1.

44 Isto é, a graça de Deus.

Tito (William Hendriksen)

139

SÍNTESE DE TITO 3

Veja-se o esboço no início do capítulo.

Neste capítulo se enfatiza a santificação nas relações públicas. Os


crentes deveriam ser obedientes às autoridades. Devem ser
bondosos para com todos os homens, uma vez que foi a bondade
de Deus nosso Salvador — não nossas próprias obras! — o que nos
trouxe a salvação.

Para uma síntese dos primeiros oito versículos, veja-se p. 437. Por
outro lado, as investigações insensatas na ciência genealógica e os
conflitos sobre a lei devem ser descartadas, porque são inúteis e
vãs. Os homens facciosos que rejeitam a admoestação devem ser
rejeitados. Tais pessoas estão mental e moralmente torcidos. Além
disso, sabem que estão pecando, porque se sua consciência ainda
não lhes tem feito saber isto, pelo menos foram informados a
respeito pela igreja com base na Palavra.

Por isso, eles pecam contra melhor conhecimento.

Em suas instruções finais, Paulo diz a Tito que proporcionará as


pessoas para encher quão vacante ficará ao partir Tito de Creta.
Enviará a Ártemas ou a Tíquico para substituir a Tito na ilha. Quer
que quanto tenha chegado o substituto, Tito faça todo o possível por
ir vê-lo em Nicópolis, provavelmente a de Épiro, onde o apóstolo
decidiu passar o inverno. Também pede a Tito e aos crentes
cretenses em geral que façam tudo o que possam para ajudar em
sua viagem aos dois amigos cristãos e ajudantes que com toda
probabilidade eram os portadores da carta, ou seja, Zenas, perito
em leis, e Apolo o famoso orador de Alexandria.

Note-se: não somente Tito deve prover para estes homens, mas sim

“nossa gente”, também, deve aprender a aplicar-se às ações nobres


nas ocasiões de imperativa necessidade, para que não estejam sem
fruto.

Todos os colaboradores que estão com Paulo enviam saudações a


Tito, quem, por sua vez, deve dar saudações de Paulo e de seus
acompanhantes aos que estão cheios de cristão afeto por eles. A
carta termina com uma breve bênção: “A graça (seja) com todos
vós”.

Tito (William Hendriksen)

140

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COMENTÁRIO DO NT (H & K)
TITO
CONTEÚDO
Abreviaturas
Introdução
I. Por que deveríamos estudá-las?
II. Quem escreveu as Pastorais?
III. A Quem Foram Dirigidas?
IV. Qual é seu Pano de Fundo Histórico e seu
Propósito?
Tito 1 - Na Vida Congregacional
Tt 1:1:1–4 - Cabeçalho e saudação.
Tt 1:5–9 - É preciso nomear anciãos de boas
qualidades em todas as cidades.
Tt 1:10–16 - Razão: Creta não tem falta de pessoas de
má reputação .
Síntese de Tito 1
Tito 2 - Na vida Social
Tt 2:1–10 - Todas as classes de indivíduos deveriam
conduzir-se bem
Tt 2: 11–15 - A graça de Deus a todos para
santificação e para esperar a Jesus Cristo.
Síntese de Tito 2
Tito 3 - Na vida social (isto é, pública)
Tt 3:1–8 - Os crentes devem obedecer às autoridades.
Tt 3:9–11 - Descartar as questões néscias e os
homens facciosos .
Tt 3:12–15 - Instruções finais com relação a viajantes
pela causa do reino. Saudações.
Síntese de Tito 3
Bibliografia
Table of Contents
COMENTÁRIO DO NT (H & K)
TITO
CONTEÚDO
Abreviaturas
Introdução
I. Por que deveríamos estudá-las?
II. Quem escreveu as Pastorais?
III. A Quem Foram Dirigidas?
IV. Qual é seu Pano de Fundo Histórico e
seu Propósito?
Tito 1 - Na Vida Congregacional
Tt 1:1:1–4 - Cabeçalho e saudação.
Tt 1:5–9 - É preciso nomear anciãos de
boas qualidades em todas as cidades.
Tt 1:10–16 - Razão: Creta não tem falta
de pessoas de má reputação .
Síntese de Tito 1
Tito 2 - Na vida Social
Tt 2:1–10 - Todas as classes de
indivíduos deveriam conduzir-se bem
Tt 2: 11–15 - A graça de Deus a todos
para santificação e para esperar a Jesus
Cristo.
Síntese de Tito 2
Tito 3 - Na vida social (isto é, pública)
Tt 3:1–8 - Os crentes devem obedecer às
autoridades.
Tt 3:9–11 - Descartar as questões
néscias e os homens facciosos .
Tt 3:12–15 - Instruções finais com
relação a viajantes pela causa do reino.
Saudações.
Síntese de Tito 3
Bibliografia

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