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GEOGRAFIA POLÍTICA E SOCIAL DE

ANGOLA

VICENTE PACA
TEMA 1: Introdução à Geografia Política e Social de Angola

1.1 Contextualização histórica e geográfica de Angola

 Enquadramento Geográfico de Angola.

A Angola é um país localizado na região da África Central, situado no litoral oeste do


continente. Sua capital é a cidade de Luanda. O território angolano possui uma área de
1.246.700 km², sendo assim o 7º maior país em extensão de África. Limitado de seguinte
forma:
Divide-se em 18 províncias, sendo uma delas Cabinda, que constitui um enclave (exclave1)
situado na costa, na fronteira do Congo com a República Democrática do Congo. O clima
tropical é predominante em Angola. Há, entretanto, uma diferença significativa entre as
condições climáticas ao norte e ao sul, região essa próxima ao deserto do Namibe, e também
ao longo da costa, que dispõe de clima semiárido.

Em geral, o clima de Angola é caracterizado por duas estações bem definidas: quente e
húmida; fria e seca (cacimbo). A temperatura anual média varia entre 19 °C e 26 °C, a
depender da localidade, enquanto o volume acumulado de chuvas é de 1800 mm nas áreas
mais setentrionais e de 300 mm ao sul e no litoral, especialmente na faixa que se estende do
sul até a capital.

O relevo da Angola é formado por depressões relativas e absolutas, uma estreita planície
costeira que se eleva a leste para uma sequência de escarpas, as quais representam a borda
ocidental de uma extensa área formada por planaltos que caracteriza os terrenos do interior. A
elevação média do relevo angolano é de 1.112 metros.

Além disso, o relevo, as correntes marítimas e as áreas de alta pressão influenciam


directamente nas características climáticas do país. A vegetação é formada por florestas
tropicais, savanas e áreas desérticas. O país possui uma fauna composta por grandes espécies
africanas, como zebras, girafas, leões e leopardos.

No âmbito dos recursos hidrográficos, o rio Cuanza (Kwanza) é o maior curso d’água
exclusivamente angolano e um dos principais em termos de abastecimento. Ele percorre 960
km desde a sua nascente, na região central do país, até a foz, localizada em Luanda. Outros
importantes rios que banham Angola são: Cunene; Okavango; Zambezi."

 Breve síntese histórica até à independência

Os primeiros habitantes da região, que agora é designada por Angola, têm origem na tribo dos
caçadores-colectores Pré-Bantus.2 O povo Bantu chegou à região, vindo de Norte, no século
XII, obrigando a uma migração dos Khoisan para Sul (Abrantes, 2005, p.16).

Com a descoberta do rio Zaire, em 1482, por Diogo Cão e a posterior exploração da costa de
Angola, os portugueses foram-se instalando progressivamente na região e, excepto um
1
"Exclave" é uma parte de um país ou território que está separada do restante do país ou território a que
pertence. Isso significa que um exclave está fisicamente separado do país principal a que pertence, podendo estar
localizado em uma área remota ou separada por fronteiras de outros países.
2
Khoisan, Pigmeus, Cuissis, e Cuepes.
período de tempo compreendido entre 1641-48, em que Angola foi tomada pelos holandeses
(Barata, 1997, p. 24), esteve sob domínio português, até à independência do país em 11 de
Novembro de 1975 (Teixeira, 2004).

Muito embora os portugueses tenham falhado naquilo que era o seu intento inicial, a
descoberta de ouro e outros metais preciosos, descobriram em alternativa, uma excelente
fonte de escravos para alimentar a sua colonização do Brasil. A colonização portuguesa em
Angola começa verdadeiramente em 1575, com a fundação de Luanda (Selvagem, 2006).
Após várias tentativas, as tropas portuguesas finalmente conseguem conquistar o reino
Mbundu em 1902, quando o planalto do Bié foi tomado e a colonização branca chegou às
terras altas angolanas (Rebelo, 2006).

O desenvolvimento e modernização de Angola acontecem verdadeiramente após a segunda


Guerra Mundial, com resultados muito significativos nas décadas de 60 e 70 (Rela, 2005,
pp.30-34). Em 1951 a designação de colónia passa a província ultramarina (Afonso, 2000).

Embora fosse professado que Angola era uma sociedade multi-racial de igualdades, a verdade
é que a maioria dos africanos continuava a sofrer com a repressão conduzindo à fundação, em
1962, um grupo de refugiados no Zaire liderados por Holden Roberto, a Frente Nacional de
Libertação de Angola (FNLA). Mantendo as suas bases de apoio no Zaire, desencadearam
uma guerra de guerrilha em Angola, desenvolvendo contactos com nações, Ocidentais e
Comunistas e obtendo o apoio da Organização da Unidade Africana. Os movimentos de
libertação de Angola eram compostos também por outros dois movimentos de guerrilha. Um
de influência Marxista, Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), fundado em
1956, com o seu quartel-general na Zâmbia. O terceiro, a União para a Independência Total
de Angola (UNITA), fundado em 1966, sob a liderança de Jonas Savimbi. Portugal viu-se
forçado a manter mais de 50.000 efectivos militares no Teatro de Angola no início dos anos
70. (Barata, 1997)

Em 1971 a UNITA aceitou um estatuto secreto de colaboração com o comando português da


Zona Militar Leste (ZML), a “Operação Madeira”, através da qual ajudou as Forças Armadas
Portuguesas no combate aos outros dois movimentos, cujas bases foram erradicadas da ZML
e cuja actividade de guerrilha passou a depender de bases no exterior, no Zaire e na Zâmbia
(Alves, 1998).
Em Abril de 1974, um movimento das forças armadas derrubou o regime ditatorial
português e marcou o início da Terceira República (Saraiva, 2003). Nesse mesmo ano, o
novo governo português proclamava tréguas com os movimentos de libertação. Contudo a
situação no território apresentava-se extremamente complicada, devido ao elevadíssimo
número de portugueses e outros europeus aí residentes (estimados em mais de 500.000),
pela continuação dos combates entre os movimentos de libertação e pelo desejo dos
cabindenses em se tornarem não só independentes como separados de Angola (Alves,
1998).

No dia 10 de Novembro de 1975, o Governador-Geral de Angola, em nome do Governo


Português, anuncia a independência de Angola, transferindo a soberania de Portugal, para
o “Povo Angolano”, a partir de 11 de Novembro de 1975 (James, 2004).

1.2 Exploração da diversidade étnica, cultural e linguística;

Em termos gerais e sistemáticos, as etnias angolanas actuais, escreve José Redinha,


«dispostas segundo uma ordem cronológica das mais antigas para as mais recentes,
apresentamos o quadro seguinte:

 Grupo Étnico Hotentote-Bosquímano (Não-Negro e não-Banto);


 Grupo Étnico Vátua ou pré-Bantu;
 Grupo Étnico Banto;

Em relação ao Grupo Étnico Banto, Redinha chama a nossa atenção para o facto ser, «por
grande diferença, a etnia demograficamente mais importante, e que a sua distribuição
territorial abrange a totalidade da Província. Apresenta também em relação aos Koisan e
aos Vátua, um estágio cultural mais avançado. [...] Por motivo da grande extensão
geográfica que dominam, das influências de meios variados e de certas diferenças de
expressão antropológica que lhes correspondem, a etnologia, apoiando-se, aliás, em
distinções estabelecidas pelas suas próprias comunidades autóctones entre si, estabeleceu
para os Bantos Angolanos as subdivisões étnicas seguintes:

 Grupo Etnolinguístico Bacongo (Kikongu ou Kongu)


 Grupo Etnolinguístico Quimbundo (Kimbundu ou Tymbundu)
 Grupo Etnolinguístico Lunda-Quioco (Lunda-Kioco ou Lunda-Tshokwe)
 Grupo Etnolinguístico Umbundo (ou Ovimbundu)
 Grupo Etnolinguístico Ganguela (ou Ngangela)
 Grupo Etnolinguístico Nhaneca-Humbe (ou Nyaneka-Lumkumbi)
 Grupo Etnolinguístico Ambó (ou Vaambo também designado Xikwanyama)
 Grupo Etnolinguístico Herero (ou Tjiherero)
 Grupo Etnolinguístico Xindonga (ou Oshindonga)

Segundo Luansi (2003), após a independência em Angola, foi proclamada a democracia


popular com fins políticos e objectivando cimentar a unidade e a consciência nacional.
Contudo, ao longo dos anos, com o marxismo leninismo, acentuou-se a crise identitária
presente no país. Isto porque as liberdades fundamentais foram limitadas e a diversidade
social e cultural foi negada institucionalmente. A crise identitária, acrescida da acção de
forças exógenas, esteve na origem da guerra civil, que provocou inúmeros movimentos
migratórios internos e externos.

Insistimos na ideia de que Angola é resultado da reunião de grupos étnicos e culturais


distintos que passaram a compartilhar um mesmo território. Por determinação do domínio
colonial, eles tornaram-se integrantes da “Nação Angolana”. Consequentemente, a
identidade angolana é resultado desse processo de aglutinação imposta. Sendo assim,
destacamos que o sucesso de qualquer acção que vise à construção efectiva do Estado-
Nação depende da capacidade de dialogar com essa diversidade étnica que persiste.

Neste contexto, pode-se afirmar que, embora as fronteiras herdadas na colonização sejam
respeitadas no quadro das convenções internacionais, no cotidiano, elas se tornam
relativas. O fato de separarem os povos e de não respeitarem os Estados pré-coloniais
formados pelas diversas nações étnicas faz com que elas sejam muitas vezes
desconsideradas. Ainda que tenha havido algumas transformações, os grupos étnicos
mantém uma organização social, cultural e política específica, que não se encaixa nos
limites impostos.

 Caso de Cunene

Localizado na região sul de Angola, Cunene é habitado pelos Ambo, grupo Bantu, que é
formado pelos subgrupos Vale, Cafima, Kwanyama, Kwamatwi, Dombondola e
Cuangar. Na memória coletiva, evidencia-se a constituição desses grupos como sendo
decorrente dos feitos do último rei Kwanyama, o célebre Mandume, que enfrentou os
militares portugueses na primeira década do século XX, na defesa de seu território.
Membros dessa etnia têm demonstrado pouca motivação para participar da construção
de uma unidade nacional. Fiéis à configuração social própria de sua cultura, eles rejeitam
a delimitação espacial imposta desde o período colonial. Essa rejeição é mais evidente em
relação à fronteira de Angola com a Namíbia. A etnia Kwanyama, por exemplo, está
localizada nos dois países. Freqüentemente, os membros desse grupo atravessam a
fronteira com o objetivo de visitar os parentes, de procurar trabalho e de adquirir bens e
recursos oferecidos em um dos lados. Em recusa a uma pertença única, alguns jovens têm
renunciado à aquisição de documentos que informem uma nacionalidade tais como o
bilhete de identidade.

O Cunene não é a única província a apresentar essa disposição. Atualmente, em variados


espaços do país são vivenciados conflitos. Nesse sentido, Angola ainda está a caminho da
paz, da reconciliação nacional, do respeito à vida e, principalmente, da construção de uma
unidade nacional que integre a diversidade étnica3.

3
Embora oficialmente a guerra civil tenha terminado no ano de 2002, ainda hoje, na província de Cabinda há
conflitos armados. Isto, porque os moradores dessa província recusam a pertença à nação angolana, pois se
sentem lesados pela exploração de petróleo e descontentes com a ausência de políticas públicas que atendam as
suas necessidades.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LUANSI, Lukonde. Angola: Movimentos migratórios e Estados precoloniais – Identidade


nacional e autonomia regional. In: International Symposium Angola on the Move:
Transport Routes, Communication and History. Berlin, 2003.

SILVA, Armindo Mário Gomes da (2007). Potencial Hidrico em Angola [em linha].
[Luanda] : [Referência de 29 de Dezembro de 2008]. Disponível na Internet em:
<http://www.aprh.pt/8silusba/pdf/11h00%20Gomes%20Silva%20Minas%20Gerais%20
27-11.pdf>.

SANTOS, Rafael dos (2005) - África do Sul e África Austral:Relações regionais,


descolonização e Guerra Fria (1960-1989) [em linha]. Porto Alegre: [s.i.], 2005.
Disponível na Internet em:
<http://www4.fapa.com.br/monographia/artigos/1edicao/artigo2.pdf>.

VILAR, António & Associados (2009). Guia de Negócios em Angola. Lisboa :


Vidaeconómica, 2009. ISBN - 978-972-788-291-5.

RELA, José Manuel Zenha (2005). Angola - O Futuro já Começou. Luanda : Editorial
Nzila, 2005. IBSN: 972-8950-34-9.

ALVES, Ana Cristina, PEREIRA, Ana Isabel, FERREIRA, Catarina, et al (1998). Guia do
Mundo. Lisboa : Trinova, 1998. ISBN: 927-9338-16-7.

BARATA, Manuel Freire Thelmudo et al (1997). Resenha Histórico-Militar das


Campanhas de África (1961-74). Lisboa : Estado-Maior do Exército, 1997.

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