Você está na página 1de 26

ORIGEM, HISTÓRIA E CULTURA CANÁBICA NO MUNDO

E NO BRASIL

1
NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresá-


rios, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-
Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo ser-
viços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de co-
nhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação
no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.
Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos
que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino,
de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

2
Sumário
ORIGEM, HISTÓRIA E CULTURA CANÁBICA NO MUNDO E NO BRASIL1

NOSSA HISTÓRIA ...................................................................................... 2

1. INTRODUÇÃO.................................................................................... 4

1.1 Origem e trajetória..................................................................................... 4

1.1.1 Origens da palavra ................................................................................. 9

1.1.2 Origem da planta ...................................................................................10

1.1.3 Origem dos usos ...................................................................................11

1.1.4 Uso medicinal ........................................................................................11

2. ASPECTOS LEGAIS: O USO MEDICINAL NO BRASIL E NO MUNDO


13

2.1 As primeiras proibições no Brasil.................................................................16

2.2 Políticas praticadas e Políticas alternativas .................................................18

3. A ATUAL SITUAÇÃO LEGAL DA MACONHA NO BRASIL E


EXEMPLOS INTERNACIONAIS ...........................................................................20

3.1 A Lei de Drogas e suas implicações ............................................................20

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS: .................................................24

3
1. INTRODUÇÃO

1.1 Origem e trajetória

O termo droga é utilizado na medicina moderna para referir-se indiscrimina-


damente a substâncias que provocam reações orgânicas no corpo (não necessari-
amente boas ou ruins). Infelizmente, o sentido popular emprestado à palavra é sig-
nificativamente pejorativo.
Cannabis spp. é a denominação científica moderna, de origem latina, utili-
zada para referir-se a uma espécie vegetal cujo registro mais antigo remonta a sua
origem asiática e que convive com a humanidade há milênios.
Existem inúmeros outros termos registrados para referir-se à planta, alguns deles
foram cunhados há milhares de anos e por diferentes sociedades: bhang ou bangah
(do sânscrito), kaneh bosem (do hebraico), maconha/pito de pango/cânhamo (da
linguagem popular brasileira).
No Mundo Ocidental, a Cannabis já era de conhecimento de Demócrito e de
Galeno (esse último um dos fundadores da medicina científica), que mencionaram
seu uso no vinho resinado – uma mistura feita entre vinho, cânhamo e mirra. (ES-
COHOTADO, 2002, p. 72).
Ao longo da história, essa planta já foi utilizada para fazer tecido, comida,
combustível e remédio, tudo isso há milhares de anos, antes de se tornar uma das
drogas mais conhecidas e utilizadas pelos homens.
De certo modo, esses diversos usos foram possíveis porque, na prática,
existem diferentes variedades de Cannabis:

• Cannabis sativa: é a mais difundida, possui caule pouco ramificado, folhas


finas e pode chegar a 6 metros de altura.

• Cannabis indica: cresce cerca de 1 metro, possui folhas mais largas que a
C. sativa e foi bastante utilizada como remédio na medicina antiga.

4
• Cânhamo: possui folhas e caules mais fibrosos e, por isso, é usada para
produzir tecidos, cordas, redes de pesca, entre outros.

Vestígios encontrados em túmulos muito antigos apontam a China como um


dos primeiros lugares do mundo a usar essa planta. Os chineses manipulavam o
cânhamo para fabricar tecidos, redes de pescas e cordas 6 mil anos atrás. Suas
sementes também eram um dos principais grãos utilizados na alimentação da
China antiga.
Aos poucos, a planta da maconha se espalhou por toda a Ásia e foi integrada
a práticas religiosas, pois, para algumas religiões, ela facilitava a concentração e a
conexão com o sagrado. Outras religiões, como o hinduísmo, acreditavam que exis-
tia um guardião vivendo dentro das folhas.
Além do uso religioso, os homens antigos também descobriram os benefí-
cios medicinais da Cannabis e a utilizavam para tratar muitas doenças: os frutos, a
raiz e as folhas eram frequentemente utilizados na medicina antiga para tratar reu-
matismos, ansiedade, bronquite e asma. Ainda na Ásia, alguns grupos também a
usavam como dopante.

Figura: 01

Indícios históricos apontam que a maconha foi levada para a África por co-
merciantes árabes que tinham o costume de fumá-la. Uma vez na África, também
foi bastante utilizada como dopante, remédio e em rituais religiosos.

5
A Cannabis chegou à Europa por volta dos séculos XVI-XVII. Ali, o cânhamo
ganhou uma importância significativa na pro-dução de cordas, redes, tecidos e pa-
pel. Essa produção foi importante, pois grande parte das velas das caravelas utili-
zadas nas grandes navegações e “descobrimentos” foi produzida com as fibras do
cânhamo. Além disso, os europeus também utilizavam a maconha como remédio
para tratar dores nas juntas, hemorragias, cólicas, diarreias, queimaduras e até
mesmo alguns tumores. Já as sementes da maconha eram trituradas a fim de pro-
duzir um tipo de óleo para acender lamparinas, as quais, por sua vez, ao iluminar a
escuridão da noite, facilitavam a vida dos homens e mulheres da época.
A maconha, possivelmente, foi trazida para o continente americano a partir
de 1500, no processo das grandes navegações e “descobrimentos”. Uma vez na
América, ela foi levada para lugares que hoje são conhecidos como Uruguai, Ca-
nadá, Chile, México e Brasil.
A seguir, citamos alguns deles:
• Trazida por comerciantes que vendiam pessoas escravizadas e outras mer-
cadorias.
• Trazida por marinheiros que a usavam como dopante ou medicamento.
• Trazida como empreendimento comercial da Coroa portuguesa com o ob-
jetivo de produzir matéria-prima para fabricar tecidos e cordas.
Uma vez no Brasil, a planta da maconha também foi utilizada para diferentes
finalidades, como em outros lugares do mundo.
No final do período conhecido como Brasil Colônia, a Coroa portuguesa in-
centivou o plantio do cânhamo a fim de investir na fabricação de tecidos, cordas e
barbantes em geral. Uma das primeiras lavouras foi estabelecida em 1780 em
Santa Catarina, quando imigrantes europeus receberam sementes dessa planta.
No entanto, essa primeira tentativa não deu certo. Ainda assim, a Coroa não desis-
tiu da ideia, e, pouco tempo depois, transferiu o projeto da produção de cânhamo
para o Rio Grande do Sul. Lá foi criada uma fazenda de nome Real Feitoria do
Linho Cânhamo. Nesse lugar, o cânhamo foi produzido por cerca de quarenta anos
(de 1783 a 1820).
Tempos mais tarde, na primeira metade do século XX, empresários brasilei-
ros também investiram em fábricas para produzir tecidos a partir da fibra do câ-
nhamo. O objetivo dessas fábricas era produzir sacarias para embalar produtos

6
alimentícios, como farinha e café. Tais fábricas existiram nos estados de Pernam-
buco, São Paulo, Rio de Janeiro e Maranhão. O próprio estado de São Paulo, por
meio do Instituto Agronômico de Campinas, plantava lavouras de cânhamo para
fazer experiências com essa cultura agrícola.
Não existem muitos registros do uso da maconha como medicamento du-
rante o período do Brasil Colônia, mas registros históricos indicam que o uso medi-
cinal da Cannabis esteve bastante presente no Brasil Império (1822-1889). De
acordo com o conhecimento popular, ela abria o apetite e combatia dores em geral.
Além disso, no período entre 1860 a 1920, os cigarros Grimault, feitos com Canna-
bis indica, eram empregados para tratar problemas respiratórios, insônia, asma,
bronquite, tuberculose, tosse nervosa e catarro. Na prática, os “cigarros índios”
nada mais eram do que cigarros de maconha importados da França e depois re-
vendidos nas farmácias e comércios de todo o Brasil. Os jornais da época faziam
propaganda desse remédio. A figura a seguir mostra uma delas, publicada no jornal
Diário de Pernambuco em 1869.
A maconha também esteve presente em algumas religiões praticadas no
Brasil. No início do século XX, por exemplo, era utilizada no candomblé (uma reli-
gião de matriz africana). Já a partir de 1970, foi utilizada por alguns grupos do Santo
Daime (uma religião brasileira que usa plantas como forma de se conectar com o
sagrado). Nesse contexto, ela era conhecida como Santa Maria.
Já o hábito de fumar a maconha pode ter sido introduzido no Brasil por afri-
canos escravizados, já que esse era um costume bem comum em alguns lugares
da Ásia e da África. Com o passar do tempo, esse costume se espalhou entre as
camadas mais pobres da sociedade. O documentário Dirijo (2008), disponível gra-
tuitamente na internet, conta um pouco sobre a tradição de fumar maconha entre
os povos indígenas e caboclos da Amazônia antes de ser proibida.
O Brasil foi um dos primeiros lugares do mundo a proibir o uso da maconha
como dopante. A primeira lei, feita pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro em
1930, proibia o uso do “pito de pango”, um dos nomes maconha. Comerciantes que
descumprissem essa lei seriam multados, e os escravos desobedientes pegariam
três dias de cadeia. De certo modo, a criação dessa lei mostra que o governo bus-
cava eliminar certos hábitos sociais dos escravos e das pessoas pobres.

7
Apesar dessa primeira proibição ter ficado restrita a alguns lugares e a de-
terminados grupos sociais, a maconha foi se tornando um assunto permanente en-
tre as autoridades públicas. Aos poucos, a ideia de que a maconha era uma droga
extremamente perigosa e que, portanto, deveria ser proibida ganhou força.
Na década de 1930, surgiu uma onda proibicionista muito forte nos Estados
Unidos que se alastrou por quase todos os países do mundo. O Brasil, que já rea-
lizava campanhas contra a maconha e seus usuários, aproveitou o momento inter-
nacional e criou uma série de leis proibindo os usos da Cannabis.
Em 1932, o Decreto n. 20.930 proibiu o uso da Cannabis indica.
Em 1938, o Decreto-Lei n. 891 proibiu a Cannabis sativa.
Na prática, por trás do discurso de que a maconha era uma droga extrema-
mente perigosa havia muita desinformação e preconceitos. Ela se tornou coisa de
pessoas perigosas e “vagabundas”. Pouco a pouco, por conta dessas proibições,
todos aqueles que faziam algum uso da Cannabis foram enquadrados pela lei como
criminosos.
Em vários lugares do mundo, o uso dopante vem sendo legalizado ou des-
criminalizado (deixando de ser crime). Países como Portugal, Uruguai, Canadá e
alguns estados dos Estados Unidos já permitem esse uso.
A Europa e a Ásia, ainda que com uma legislação mais rígida, permitem a
produção do cânhamo para fins industriais. Além da produção de tecidos, papel e
combustíveis, atualmente há pesquisas sobre a possibilidade de utilizar o cânhamo
na criação de plásticos biodegradáveis.
Em relação à produção de medicamentos, as plantas da maconha vêm
sendo estudadas pela indústria farmacêutica para a busca de tratamento contra
doenças como a epilepsia, por exemplo. Na onda dessa mudança, um fato emble-
mático é que a empresa canadense Tilray, que produz maconha medicinal, come-
çou a negociar suas ações em Wall Street (na bolsa de valores de Nova York) em
julho de 2018.
De um ponto de vista em que os interesses, as crenças e os valores de cada
época devem ser levados em conta, os diferentes usos da maconha revelam um
pouco sobre o modo como a humanidade se relacionou e vem se relacionado com
o meio em que vive. Desde que foi domesticada pelo homem, cerca de 6 mil anos
atrás, a maconha foi em grande parte usada na alimentação, nas viagens, na pro-

8
dução têxtil, na religião, entre outras atividades humanas. Apenas no início do sé-
culo XX é que ela foi proibida, em parte por interesses políticos e econômicos desse
período. Com o passar do tempo, esses interesses vêm se modificando, o que, de
certa forma, abre caminho para uma revisão do papel da maconha na vida dos
homens.
De fato, embora tenha sido tornada uma droga ilícita no século passado,
anteriormente, a maconha era não somente legalizada, como consistia num rele-
vante insumo econômico na Europa, utilizado desde os tempos do paleolítico. Es-
crita com as mesmas sete letras, a palavra maconha é um anagrama de cânhamo,
matéria-prima de grande importância no Renascimento. Gutenberg utilizou papel
de cânhamo para produzir as 135 primeiras Bíblias impressas do mundo, locali-
zando-se um desses exemplares no acervo da Biblioteca Nacional, na Cinelândia,
Rio de Janeiro.
Desde a antiguidade, gregos e os romanos usaram velas e cordas de câ-
nhamo nos navios. No século XV, cultivado nas regiões de Bordéus e da Bretanha,
na França, em Portugal e na África, o cânhamo era destinado à confecção de cor-
das, cabos, velas e material de vedação dos barcos, que inundavam com frequên-
cia em longas navegações.
O produto obtido de suas fibras, dotado de rigidez e elasticidade, proporcio-
nava às caravelas uma enorme velocidade. Incluindo velame, cordas e outros ma-
teriais, havia 80 toneladas de cânhamo no barco comandado por Cristóvão Co-
lombo, em 1496 (Robinson, 1999). O cultivo de cânhamo em terras lusas tornou-se
massivo à época das Grandes Descobertas, pois fornecia o material das embarca-
ções portuguesas. Decreto do rei D. João V, de 1656, comprova que o incentivo à
produção de maconha era uma política de Estado.

1.1.1 Origens da palavra

A planta Cannabis sativa e seus derivados estão registrados na língua por-


tuguesa há séculos, seja como cânhamo (desde o século XV), seja como maconha
(desde o século XVII).
A primeira versão surgiu como um derivado do latim cannăbis (linho ou câ-
nhamo), e a segunda, como um dos resultados do tráfico negreiro, entrou para o

9
português com a chegada dos africanos de língua quimbundo, sendo oriunda de
ma'kaña.
Apesar da origem distinta dessas duas palavras, ligadas conceitualmente,
Carlini observou que, de modo curioso, a palavra maconha é um anagrama de câ-
nhamo.
Diante da origem gramatical e da diferenciação semântica que cânhamo e
maconha adquiriram ao longo dos últimos três séculos, proponho aqui o uso de
cannabis para designar a planta em seu uso psicoativo, exclusivamente. Certa-
mente alguém continuará a produzir cânhamo como fibra têxtil, e usuários, trafican-
tes e a polícia continuarão correndo atrás da maconha. Todavia, para evitar impre-
cisões e usos léxicos indevidos, e como derivação por via erudita, cannabis serve
melhor para o uso científico e acadêmico, ao menos na área das ciências da saúde.

1.1.2 Origem da planta

Figura: 02

Cannabis designa um gênero de plantas angiospermas com três subespé-


cies (ou variedades): C. sativa, C. indica e C. ruderalis (está originária da Ásia Cen-
tral), que contêm mais de cem canabinoides já identificados.

10
O cânhamo chegou à América em 1492, com Cristóvão Colombo, uma vez
que as velas e o cordame de suas naus eram feitos desse material. Da mesma
forma, chegou ao Brasil em 1500, com a frota de Pedro Álvares Cabral. Todavia,
sementes para serem cultivadas alegadamente como fonte de fibra, segundo do-
cumentos históricos, foram levadas ao Chile pelos espanhóis em 15455 e trazidas
para o Brasil pelos escravos africanos no século XVII.

1.1.3 Origem dos usos

De acordo com registros arqueológicos e históricos, o uso da planta Canna-


bis sativa e seus derivados está bem-documentado como fonte de fibra têxtil para
a confecção sobretudo de cordas, cabos navais e tecidos há cerca de 12 mil anos.
Em comparação, há documentação do uso do álcool há cerca de 8 mil anos, do
ópio, há cerca de 6 mil anos, e da coca e de alucinógenos há cerca de 3 mil anos.
Note-se que o álcool e o ópio são processados e manufaturados, ao passo que a
cannabis, a coca e as plantas alucinógenas são consumidas in natura (ingeridas,
fumadas ou mascadas).

1.1.4 Uso medicinal

Figura: 03

11
A cannabis é usada como medicamento, para diversas afecções e diferentes
problemas de saúde, há mais de 10 mil anos. Um tratado chinês de plantas medi-
cinais de 2.800 a.C., atribuído a Shen Nong,13 incluía a cannabis entre outros 365
medicamentos de origem vegetal, e o famoso Papiro de Ebers (1550 a.C.) reco-
mendava o uso de emplastros de cannabis para combater inflamações. Todavia,
atualmente, sua eficácia é contestada de forma vigorosa e quase generalizada.
Uma das dificuldades para se determinar a real dimensão de sua eficácia
decorre da proibição, inclusive, de pesquisa clínica sobre sua eficácia e segurança,
a qual, quando não impedida totalmente, é tão desencorajada, malvista e dificultada
pela maioria dos órgãos financiadores de pesquisa, que raros são os pesquisadores
que se dispõem a enfrentar essas barreiras. Outra dificuldade é que, tendo a can-
nabis uma composição tão complexa, as avaliações de sua eficácia, em geral, mes-
clam estudos dos efeitos da planta integral (ora fumada, ora ingerida ou, ainda,
vaporizada e inalada ou em adesivos transdérmicos) com estudos dos efeitos de
alguns de seus derivados isolados ou em combinações diversas (particularmente o
tetraidrocanabinol [THC] e o canabidiol [CBD]). Os proponentes e os defensores da
“cannabis medicinal” insistem que esse rótulo designa apenas o uso da planta in-
tegral, ingerida ou vaporizada e aspirada, uma vez que suas virtudes terapêuticas
decorrem do equilíbrio natural de sua composição e não de um ou outro de seus
componentes.
Historicamente, as indicações médicas mais comuns da cannabis incluíam
dores e convulsões, tendo sua indicação como analgésico sido suplantada do ácido
acetilsalicílico após sua síntese química em 1899, apesar da recente evidência de
que a cannabis é até 30 vezes mais analgésica do que a Aspirina.
Hoje, apesar de variada resistência, órgãos reguladores de diversos países,
com base em evidências científicas, reconhecem o uso da cannabis para o trata-
mento de náusea e vômitos (sobretudo no curso de quimioterapia), anorexia (parti-
cularmente em portadores do vírus da imunodeficiência humana [HIV]/da síndrome
da imunodeficiência adquirida [aids]), dores crônicas e neuropáticas, espasmos
musculares (na esclerose múltipla), formas graves de epilepsia e glaucoma.

12
2. ASPECTOS LEGAIS: O USO MEDICINAL NO BRA-
SIL E NO MUNDO

Figura: 04

A aceitação da Cannabis sativa L. no mundo tem crescido de forma acele-


rada. Nos Estados Unidos, em 1937, foi criminalizado o uso da planta ocorrendo
queda no seu consumo, mas nas últimas décadas ocorreram mudanças legais sig-
nificativas. No âmbito estadual, a Cannabis sativa L. é legalizada para fins médicos
em 47 estados e para uso recreativo em 11 deles. No entanto, existe um controle
rígidos sobre posse, fabricação, distribuição e dispensação da planta ou de produ-
tos associados.
O desenvolvimento de produtos derivados de Cannabis sativa L. enfrentou
muitos desafios, no entanto, em 25 de junho de 2018, o FDA (Food and Drug Ad-
ministration) aprovou o Epidiolex, um produto contendo canabidiol altamente purifi-
cado, para o tratamento de convulsões associadas a síndrome de Dravet e sín-
drome de Lennox-Gastaut. Acredita-se que o sucesso do Epidiolex trouxe um in-
centivo para produção de outros medicamentos derivados da planta, aumentando
assim as opções de tratamento para pacientes com epilepsia.

13
Na Europa, produtos desenvolvidos com Cannabis sativa L. são legalizados
com limitações. Os produtos vendidos para uso adulto não devem ultrapassar 0.2%
de THC, sendo determinado que apenas agricultores poderiam exceder este limite
à 0.6%. Foi estabelecido como crime quaisquer produtos vendidos em comércios
locais em que o limiar de THC seja igual ou superior a 0.5%. Embora haja esse
controle governamental, na Itália, produtos de uso terapêutico contendo Cannabis
sativa L. podem ser prescritos desde 1998 e desde 2007 reconhecem o THC como
substância de potencial uso terapêutico.
Em 18 de dezembro de 2014, a Itália iniciou o cultivo de Cannabis sativa L.
nacional, através do ministério da saúde. A produção é feita de acordo com as Boas
Práticas de Fabricação da União Europeia (EU-GMP).
Em 14 de dezembro de 2016, o medicamento FM2 que é constituído de 5 a
8% de THC e de 7 a 12% de CBD, desenvolvido pela Military Pharmaceutical Che-
mical Works (Florença) passou a ser disponível para prescrição médica. Em 2017,
o Senado europeu aprovou Decreto-Lei S. 2947 que em seu artigo 1º garante todas
as normas de utilização da planta em seu território, incluindo permissão para pes-
quisas científicas, técnicas de produção e garantia de acesso da população aos
produtos.
No Brasil, a criminalização do uso da Cannabis teve início com o Decreto n°
20.930 de 11 de janeiro de 1932, onde se determinou que a Cannabis indica era
uma substância entorpecente, mas, ainda assim era permitido (art. 26 do presente
decreto) que indivíduos portassem pequenas quantidades sob responsabilidade te-
rapêutica.
Após esse marco entrou em vigor a Lei n° 891, de 25 de novembro de 1938,
que fiscalizava e proibia o uso de entorpecentes no Brasil, entretanto, ainda era
permitido o uso terapêutico através da aprovação da Comissão Nacional de Fisca-
lização de Entorpecentes. Porém, em 1988, com a Constituição Federal, no art. 5°
e inciso XLIII, o tráfico de drogas enquadrou-se como crime hediondo, sendo per-
manentemente proibido o uso da planta.
A defesa da legalização da maconha teve início com a disseminação do uso
medicinal, servindo como argumento principal para a conhecida “marcha da maco-
nha”.

14
Em 1998, através da Portaria n° 344 SVS/MS, em seu art. 2°, estabeleceu-
se que medicamentos que precisassem de controle especial precisariam da autori-
zação da Secretaria de Vigilância Sanitária do Brasil para transportar, produzir, ma-
nipular e/ou exportar. Nesse mesmo documento ficou prescrito que estariam proi-
bidas quaisquer manipulações de medicamentos contendo THC.
Com compostos ativos da cannabis, tiveram uma nova realocação na legis-
lação brasileira a partir da RDC nº 03, de janeiro de 2015, que atualizou o anexo 1
da Portaria SVS/MS nº 344. Com essa nova publicação, o CBD foi incluído na Lista
C1 (lista das outras substâncias sujeitas à controle especial), entretanto, essa atu-
alização não retirou o THC da Lista F2 (lista das substâncias proscritas), com isso,
os pacientes só poderiam importar medicamentos apenas à base de CBD o que
gerou um problema, já que, medicamentos à base da Cannabis sativa L. são pro-
duzidos através da associação de vários canabinoides incluindo o THC.
Através da RDC nº 17, de 6 de maio de 2015, definiram-se os critérios e
procedimentos para importação de medicamentos à base de canabidiol para uso
próprio por intermédio de prescrição de um profissional legalmente habilitado. Po-
rém, se fez necessário que o THC fosse retirado da lista de substâncias proscritas.
Dessa forma, o Ministério Público Federal atualizou a Ação Civil Pública n°
0090670-16.2014.4.01.3400 que obrigava a União e a Agência Nacional de Vigi-
lância Sanitária (ANVISA) a retirar o THC da lista de substâncias proscritas para
inclui-lo a lista de substâncias psicotrópicas sujeitas a uso sob notificação.
Após a devida implementação à decisão Judicial, a ANVISA proferiu a Re-
solução da Diretoria Colegiada – RDC n° 66, de 18 de março de 2016, que conce-
deu, de forma interina, a permissão para importação de medicamentos derivados
da planta.
Em 2017, a ANVISA liberou a comercialização de um medicamento derivado
de Cannabis sativa L. no Brasil, denominado Mevatyl, que é composto de 27 mg/mL
de THC + 25 mg/mL de CBD, administrado por via oral e indicado para espastici-
dades graves.
Associado aos primeiros passos dados em 2015, em 3 de dezembro de
2019, a ANVISA concedeu autorização para a venda de medicamentos à base de
maconha em farmácias comerciais com prescrição médica e perante assinatura do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que elenca riscos e benefícios do
tratamento, além de numerar regras para a prescrição de acordo com o teor de

15
THC presente, isto é, medicamentos com teor abaixo de 0.2% de THC devem ser
prescritos sob receituário tipo B, com numeração concedida pela Vigilância Sanitá-
ria Local e renovação em até sessenta dias. Para medicamentos com teores acima
de 0.2% só poderão ser prescritos a pacientes terminais ou àqueles que não pos-
suem meios alternativos de terapêutica, através de receituário do tipo A, fornecido
pela Vigilância Sanitária local.
É notório que o Brasil tem percorrido um longo caminho para autorizar
mesmo que de forma parcial a liberação de medicamentos à base de Cannabis.
Existe uma constante busca por elucidar as características farmacológicas da
planta a fim de credibilizar seu uso medicinal. O professor e psicofarmacologista
Elisaldo Carlini (in memorian) da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
dedicou boa parte de sua carreira ao estudo medicinal da maconha, e lutou pela
criação da Agência Brasileira de Cannabis Medicinal com a finalidade de realizar a
regulamentação e cultivo da planta para fins terapêuticos e informar a população
sobre os riscos e benefícios da mesma.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) trabalha atualmente com
três possibilidades regulatórias: a importação excepcional de produtos derivados
de Cannabis por pessoa física; a autorização sanitária de produtos Cannabis e o
registro como medicamento.
Atualmente, em 2023, de acordo com diretor da Anvisa, Alex Campos, estão
regularizados para uso no Brasil um medicamento específico e mais 26 produtos
derivados da Cannabis.

2.1 As primeiras proibições no Brasil

Embora o Brasil tenha seguido como linha auxiliar do sistema internacional


de combate às drogas, o movimento proibicionista da espécie vegetal data de 1830,
quando a Câmara Municipal do Rio de Janeiro decidiu editar a norma que proibia a
venda e o uso do pito de pango (outro nome para Cannabis), cuja pena era de três
dias de prisão e multa.
Registros históricos também apontam que seguiram o mesmo caminho as
cidades de Caxias (em 1846), São Luís (em 1866), Santos (em 1870) e Campinas
(em 1876), porém permanece pouco aclarado se essas leis realmente surtiram

16
efeito a ponto de terem sido aplicadas. (BEWLEY-TAYLOR; BLICKMAN; JELSMA,
2014, p. 10).
A legislação mais marcante para o intenso combate às drogas (e particular-
mente à Cannabis) que se instalou no Brasil nasceu em pleno Regime Militar,
quando o presidente Costa e Silva editou o Decreto-Lei nº 385, de 26 de dezembro
de 1968. Esta legislação mencionada alterou a redação anterior, editada na dita-
dura varguista, do artigo 281, do Código Penal de 1940, para passar a equiparar
traficante a usuário e estabelecer penas idênticas a ambos.
Em sequência e ainda sob o Regime, foi editada a Lei sobre a matéria, Lei
nº 5.726, de 29 de outubro de 1971, que dispôs sobre as “medidas preventivas e
repressivas ao tráfico e ao uso de substâncias entorpecentes (...)”. Nela ficou ex-
pressamente previsto que o cânhamo (Cannabis Sativa) seria considerado proibido
e passível de repressão penal em todo o território nacional (art. 4º, I).
Outra alteração digna de nota foi a que modificou a redação do artigo 281
para acrescer a ele o §5º. Neste dispositivo, ficou previsto que, para fins de respon-
sabilização criminal, o ilícito penal antes restrito ao usuário recreativo e ao trafi-
cante, passaria também a prever profissional da saúde que prescrevesse a planta
para fins terapêuticos. (A Lei citada acima já foi revogada).
Posteriormente, no final da década de 1980, já na transição do Regime para
a redemocratização, a equiparação entre usuário e traficante foi abandonada e dei-
xou de ser aplicada pelos Tribunais. Dentre as legislações seguintes, a última – a
Lei nº 11.343/2006 – manteve a diferenciação de apenamento entre as condutas
previstas.
O proibicionismo e as reformas na legislação criminal não alcançaram o ob-
jetivo pretendido e foram insuficientes para proteger o bem jurídico que se propunha
tutelar. Hoje, o Brasil amarga o índice de quase um terço da massa carcerária de
pessoas condenadas a penas privativas de liberdade por conta de crimes relacio-
nados ao tráfico de drogas. A realidade ainda aponta para uma tendência de au-
mento.
Infelizmente é a prejuízo da humanidade, a história recente da planta medi-
cinal Cannabis se confundiu com a história do preconceito e a sua proibição. A
evolução da medicina ocidental – que hoje volta a reconhecer a efetividade tera-
pêutica dos compostos canabinoides – escancara o erro fatal que foi a Guerra às

17
Drogas, tanto no Brasil como nos países que seguiram essa histeria. Essa perse-
guição ao acesso dos enfermos à terapia canábica foi uma violação perpetrada
contra a vida daqueles que precisam do tratamento que a planta proporciona.

2.2 Políticas praticadas e Políticas alternativas

Segundo a Plataforma Brasileira de Políticas de Drogas (2018), há muitos


anos convivemos com políticas de drogas orientadas pelo tabu e pelo moralismo.
Comportamentos considerados desviantes ou anormais têm sido proibidos e crimi-
nalizados e essa é razão para a manutenção da proibição de determinadas drogas,
como a maconha, em detrimento de outras, como o álcool.
As decisões políticas de nossos representantes e de gestores de políticas
públicas devem levar em conta as melhores evidências científicas disponíveis e não
é razoável fazer política pública com base apenas em certezas morais. Em 1º de
janeiro de 2023 a política sobre drogas no Brasil passa a ser competência dos Mi-
nistérios da Justiça e Segurança Pública e do Ministério da Saúde.
A Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas (SENAPRED)
deixa de existir.
As políticas repressivas combatem a oferta de drogas visando reduziram o
consumo. Este raciocínio possui dois problemas econômicos: primeiro, considerar
preço uma variável de impacto para o consumidor e depois, acreditar que é a oferta
de drogas que gera sua demanda. As políticas focadas em atacar a oferta descon-
sideram que a formação de preços em um mercado tão específico leva em consi-
deração os custos agregados de todo o processo produtivo e de distribuição.
Não apenas aos custos monetários da produção em si, mas também os da
logística do tráfico, os gastos com propina e os custos relacionados aos riscos da
atividade. Além dos custos impostos aos usuários através da dificuldade de acesso.
Mankiw (2004) mostrou o comportamento do mercado de drogas a um aumento da
pressão policial à oferta de drogas. Oferta e demanda são as duas forças que ga-
rantem o funcionamento de um mercado, determinando preços e a quantidade de
produtos oferecidos.
Em sua demonstração, exibido no gráfico a diante, um aumento da pressão
policial leva a curva de oferta a se desloca para a esquerda de O para O’ fazendo

18
o preço da droga em questão aumentar de P0 para P1 e a quantidade ofertada
sofrer uma leve redução de Q0 para Q1.

Figura: 05
Oferta e demanda das drogas dado aumento da pressão policial

O impasse está ao avaliar a redução na oferta quando confrontada com o


aumento de preço. As drogas são bens inelásticos, ou seja, a resposta a quantidade
demandada é pouco sensível a elevação nos preços.
Em função da inelasticidade preço da demanda (BECKER, MURPHY E
GROSSMAN, 2004), o consumidor irá comprar drogas independente do aumento
nos preços, fazendo com que o aumento da receita gerada, mesmo havendo uma
redução da quantidade, tenha um impacto social negativo. Dada a repressão, a
inelasticidade preço da demanda das drogas fortalece financeiramente o narcotrá-
fico. Já que, o aumento da receita do tráfico de drogas, mesmo com a redução das
quantidades vendidas, torna-se um atrativo à entrada de ofertantes que, por sua
vez, terão que competir com outros já preexistentes. O que acarreta em conflitos
por território de tráfico.
Sendo assim, as políticas de repressão mostram-se paradoxais, pois mesmo
que o objetivo seja enfraquecer o narcotráfico e o mercado de drogas, terminam,
dada as características específicas deste mercado, gerando um fortalecimento do
mesmo. Se o objetivo das políticas forem a redução do consumo de entorpecentes
o que deve ser levado em consideração é a demanda.

19
As drogas não devem ser tratadas como um tabu, a informação acerca de
seus usos e feitos devem ser disseminadas de forma verídica e os usuários e de-
pendentes devem ter acesso a atendimento e cuidados profissionais.
Segundo a Associação Internacional de Redução de Danos (IHRA) (2010),
redução de danos é um conjunto de políticas e práticas cujo objetivo é reduzir os
danos associados ao uso de drogas psicoativas em pessoas que não podem ou
não querem parar de usar drogas. Focando na prevenção aos danos, ao invés da
prevenção do uso de drogas. Redução de danos complementa outras medidas que
visam diminuir o consumo de drogas como um todo.
É baseada na compreensão de que muitas pessoas em todo mundo seguem
usando drogas apesar dos esforços empreendidos para prevenir o início ou o con-
sumo contínuo de drogas, assim, como aceita o fato de que muitas pessoas não
conseguem ou não querem parar de usar drogas, mas o acesso a um tratamento
adequado é fundamental (IHRA, 2010).

3. A ATUAL SITUAÇÃO LEGAL DA MACONHA NO


BRASIL E EXEMPLOS INTERNACIONAIS

3.1 A Lei de Drogas e suas implicações

Movimentos pró-legalização, como as Marchas da Maconha, estão se forta-


lecendo e promovendo avanços no debate acerca da regulamentação e legalização
da maconha no país. As reivindicações, além de pedirem mudanças na Lei de Dro-
gas e na política de repressão, adotadas pelos países orientados pela ONU (OR-
GANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS), pleiteiam a legalização para fins recreativos
de todas as drogas, o apoio a pesquisa acerca das capacidades medicinais da can-
nabis, o auto cultivo e o uso religioso.
A Marcha da Maconha (Global Marijuana March) surgiu nos EUA nos anos
1990 e ocorre anualmente em mais de 300 cidades no mundo. No Brasil, está pre-
sente em quase 40 municípios (MELO, 2018). Diante de um grande número de
decisões judiciais proibindo a marcha da maconha em diversos estados do país,
em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou a Marcha da Maconha em todo

20
o país por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.274 (SUPREMO TRIBU-
NAL FEDERAL, 2012).
A maconha de cultivo clandestino alimentou uma das indústrias mais lucra-
tivas do mundo no século 20 na América Latina. À medida que a legalização foi
aprovada em alguns países nos últimos anos, contudo, o produto tem virado um
negócio muito menos atraente na região.
México, Colômbia e, anos depois, países como o Paraguai abrigaram vastas
indústrias de produção ilícita de maconha, amplamente conhecidas tanto por sua
violência quanto por seus lucros.
Neste século 21, seguindo o exemplo inicial do Uruguai, que legalizou o cul-
tivo em 2013, várias nações latino-americanas deram o passo para promover uma
gradual legalização do setor.
Atualmente, há diversas iniciativas tramitando no Congresso Nacional que
dispõem sobre a comercialização da Cannabis com fins medicinais. Entre elas, o
PL 399/2015, que altera o art. 2º da Lei 11.343, de 2006, para viabilizar a comerci-
alização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta
Cannabis Sativa em sua formulação. Outro PL, o 5295/2019, dispõe sobre a Can-
nabis medicinal e o cânhamo industrial e dá outras providências. Já o PL 89/2023,
institui a Política Nacional de Fornecimento Gratuito de Medicamentos Formulados
de Derivado Vegetal à Base de Canabidiol, em associação com outras substâncias
canabinoides, incluindo o tetrahidrocanabinol, nas unidades de saúde públicas e
privadas conveniadas ao SUS.
Em âmbito estadual, os entes federativos também têm se movimentado. Em
abril, o governo de Sergipe sancionou a Lei nº 9.178/2023, que institui a Política
Estadual de Cannabis para fins terapêuticos, medicinais, veterinários e científicos.
Em janeiro de 2023, o estado de São Paulo instituiu, por meio da Lei 17.618/2023,
a política estadual de fornecimento gratuito de medicamentos formulados de deri-
vado vegetal à base de canabidiol, em associação com outras substâncias canabi-
noides, incluindo o tetrahidrocanabidiol, nas unidades de saúde pública estaduais
e privadas conveniadas ao SUS.
Para fazer uso de tratamento médico com canabinoides no país é necessário
a prescrição de um médico e autorização da Anvisa, que apenas regulamenta óleos
importados. Os mercados não oficiais são onde óleos de cannabis são feitos arte-

21
sanalmente por pacientes, familiares de pacientes ou por associações. Não é pos-
sível, no entanto, saber a concentração de canabinoides nesses óleos. Isso dificulta
a terapia e avaliação médica, por outro lado, os custos desses óleos são baixos em
relação aos importados, na maioria das vezes inviabilizam o tratamento de pacien-
tes que não tem condições de arcar com os custos da importação (APEPI, 2014).
Em janeiro de 2017, a Anvisa aprovou o registro do medicamento Mevatyl® impor-
tado do Reino Unido (BEAUFOUR IPSEN FARMACÊUTICA LTDA, 2017) com te-
traidrocanabinol (THC), 27 mg/mL + canabidiol (CBD), 25 mg/mL. Na forma farma-
cêutica solução oral (spray) que é indicado para o tratamento sintomático da es-
pasticidade moderada a grave relacionada à esclerose múltipla.
É o primeiro medicamento registrado no país à base de cannabis (ANVISA,
2017). Na Lista E, a Lista de plantas proscritas que podem originar substâncias
entorpecentes e/ou psicotrópicas, a Cannabis sativa L. ocupa o primeiro lugar. Fi-
cam proibidas a importação, a exportação, o comércio, a manipulação e o uso da
planta e de suas substâncias, sendo permitida, excepcionalmente, a importação de
produtos que possuam as substâncias canabidiol e/ou tetrahidrocannabinol (THC),
quando realizada por pessoa física, para uso próprio, para tratamento de saúde,
mediante prescrição médica (ANVISA, 1998). E, por fim, na Lista F2, a Lista de
substâncias psicotrópicas, ocupa a 96ª posição o tetrahidrocannabinol (THC) (AN-
VISA, 1998).
Na Lei nº 11.343 de 23 de agosto de 2006, em seu Art. 1º esta Lei institui o
Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas
para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e depen-
dentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e
ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.
Art. 2º Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como
o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais
possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese de autorização
legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das
Nações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas
de uso estritamente ritualístico-religioso.
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer
consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

22
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal,
semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade
de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.
§ 2º Para determinar se a droga se destinava a consumo pessoal, o juiz
atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condi-
ções em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem
como à conduta e aos antecedentes do agente.
Quanto ao art. 28, a interpretação deste, no que se refere a diferenciação
entre usuário e traficante, abre espaço para que os responsáveis por implementar,
a façam de forma preconceituosa e até racista. A interpretação desta lei em um
país desigual como o Brasil deixa a população negra, pobre e periférica mais vul-
nerável a ser entendida como traficantes e não usuários.
O artigo 33 da Lei de Drogas caracteriza como crime importar, exportar, re-
meter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em
depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a con-
sumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desa-
cordo com determinação legal ou regulamentar. A pena é de 5 (cinco) a 15 (quinze)
anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-
multa (BRASIL, 2006).

23
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

AGÊNCIA, senado notícias, 20 abril de 2023.


ANVISA. Canabidiol e THC: norma permitirá registro de produto. 2016.
ANVISA. PORTARIA/SVS Nº 344, DE 12 DE MAIO DE 1998.
ANVISA. Registrado primeiro medicamento à base de Cannabis sativa.
2017.
ARAUJO, Tarso. Guia sobre drogas para jornalistas. 1ª ed. São Paulo: IB-
CCRIM-PBPD Catalize-SSRC, 2017.
BARROS, A.; PERES, M. Proibição da maconha no Brasil e suas raízes his-
tóricas escravocratas. Revista Periferia, Rio de Janeiro, v. III, n. 2, 2011.
BARROS, André; PERES, Marta. Proibição da maconha no Brasil e suas
raízes históricas escravocratas. Revista Periferia Volume III, Número 2,2011.
BEAUFOUR IPSEN FARMACÊUTICA LTDA. MEVATYL BULA. 2017.
BECKER, MURPHY E GROSSMAN. M. K.; M. AND G. S. Rational Addiction
and the Effect of Price on Consumption, Working Paper, Center for the Study of the
Economy and the State, University of Chicago. 1991.
BERRIDGE, V. Demons: our changing attitudes to alcohol, tobacco, and
drugs. Oxford: Oxford University Press, 2013.
BORGES. O que é encarceramento em massa? Belo Horizonte - MG: Letra-
mento: Justificando, 2018.
BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria
Colegiada nº 17, de 06 de maio de 2015.
BRASIL. Decreto nº 79.388, de 14 de março de 1977.
BRASIL. Lei no 11.343, de 23 de agosto de 2006.
Brizzolla JC, Coutinho C, Amaral CP, Gindri AL. Promoção da saúde e o uso
de plantas medicinais no contexto escolar: um relato de caso. Vivências: Rev Eletr
Ext URI. 2018.
CARTA CAPITAL. Canadá aprova legalização do uso recreativo da maco-
nha. jun. 2018.

24
CARVALHO, J. C de. A emergência da política mundial de drogas: O Brasil
e as primeiras Conferências Internacionais do Ópio. Revista Oficina do Historiador.
EDIPUCRS, Porto Alegre, v. 7, n. 1. 2014.
CLARKE; MERLIN. R.C. & M.D. Cannabis: Evolution and Ethnobotany. Uni-
versity of California Press, Ltd London, England, 2013.
COMISSÃO GLOBAL DE POLÍTICA SOBRE DROGAS. Avanços na reforma
de políticas sobre drogas: uma nova abordagem à descriminalização. 2016.
CONRAD, C. Hemp – O uso medicinal e nutricional da maconha. Rio de
Janeiro: Record. 2001.
CONSULTORIA LEGISLATIVA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Impacto
Econômico da Legalização da Cannabis no Brasil. 2016.
COSTA. Descriminalização ou despenalização do uso e porte de drogas ilí-
citas e o reflexo da divergência sobre a matéria de reincidência. Jusbrasil. 2015.
DRUG POLICY ALLIANCE. From Prohibition to Progress: A Status Report
on Marijuana Legalization. 2018.
DUQUE. Bárbara. O plantio da maconha visto pela ótica social, 2015.
EL PAÍS. Uruguai inicia venda de maconha em farmácias e revoluciona a política
mundial de drogas. 2017.
EL PAIS. Venda de produtos para consumo de maconha ‘sai do armário’.
2016.
ESCOHOTADO, A. História Elementar das Drogas. 1ª ed. Lisboa: Editorial
Anagrama, 2004.
EVANS, Brandon; MCRAVEN, Connor. Cannabis for Dummies: A Complete
and Easy Guide to Cannabis and Cannabinoid. Hawai, EUA. Caregivers Inc.
2017/2018.
FRAGA. Plantios ilícitos no Brasil: notas sobre a violência e o cultivo de can-
nabis no polígono da maconha, Cadernos de Ciências Humanas - Especiaria. v. 9,
n.15, jan./jun., 2006.
FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. História da Maconha no Brasil. 1ª ed. São
Paulo: Três Estrelas, 2015. GIL, A.C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6ª
ed. São Paulo: Atlas, 2008.
GRECO, Luis. Posse de droga, privacidade, autonomia: reflexões a partir da
decisão do Tribunal Constitucional argentino sobre a inconstitucionalidade do tipo

25
penal de posse de droga com a finalidade de próprio consumo. Rbccrim, São Paulo,
v.18, n.87, 2010.
KYVIG; David E. Law, Alcohol, and Order: Perspectives on National Prohibi-
tion Greenwood Press, 1985. MACVAY. Douglas A. 2018.
MANKIW, N. Gregory. Introdução à Economia. São Paulo: Pioneira Thom-
son Learning, 2004.
MELO. Da ilegalidade ao 'maconhaço': O que mudou nos 10 anos da Marcha
da Maconha. 2018.
MILLS, J. H. Science, diplomacy and cannabis: the evidence base and the
international drugs regulatory system 1924-1961. In: COLLINS, J. (Ed.). Governing
the global drug wars. Londres: LSE, 2012.
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Levantamento Nacional de informações peniten-
ciárias (INFOPEN). 2016.
MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Comissão Nacional de Fis-
calização de Entorpecentes. Canabis brasileira (pequenas anotações). Publicação
nº 1. Rio de Janeiro: Eds. Batista de Souza & Cia., 1959.

26

Você também pode gostar