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Com esses recortes, o filme não apenas aponta as calamidades que ocorrem
na Ilha das Flores, mas também as estendem ao Brasil, o que já é sugerido
desde o início com a execução da protofonia de "O Guarani", do maestro
Carlos Gomes, tema da Voz do Brasil, o programa de rádio governamental
que contempla os ocorridos da — diga-se de passagem, vergonhosa —
política nacional. De fato, a mesma música anteriormente mencionada,
quando distorcida ao som da guitarra, remete de certa forma a Jimmy
Hendrix em Woodstock, e estende o protesto ao mundo inteiro, como numa
denúncia das misérias que assolam a humanidade.
O curta termina então como uma manifestação velada contra as políticas
que há tempos conduzem populações aos lixões, que põem seres humanos
abaixo de porcos. Termina em desabafo, com um discurso sobre liberdade,
"palavra que o sonho humano alimenta que não há ninguém que explique, e
ninguém que não entenda".
Esse lixão, ironicamente, é denominado de "Ilha das Flores". O problema é que, depois da
coleta seletiva, que indicou o que poderia ser aproveitado pelos suínos, outros seres humanos
passam a disputar as sobras que ao lixão pertencia. No documentário, muitas informações
foram apresentadas através de uma linguagem científica com a intenção de “igualar” o ser
humano por meio de descrições que denotam a raça humana. Em contrapartida, mostra o
desigual tratamento dado aos “iguais” seres humanos, colocando-os inferiores aos porcos.
A pobreza sempre existiu e a história comprova isso, e há parâmetros que acreditam que ela
sempre existirá. Opondo-se os antigos conceitos que tinham como “natural” a causa da
pobreza, ou seja, resultado da determinação “divina”, os pensadores reiteram que a pobreza é
tão somente o resultado da desigualdade social. Exemplo influente sobre esse vértice de
pensamento, Karl Marx aponta os efeitos da contradição entre o capitalismo e a classe
trabalhadora, afirmando que a exclusão e a desigualdade são frutos do nosso sistema
econômico. Daí a afirmação no início do curta da não existência de Deus.
Uma observação relevante, porém, é que em "Ilha das Flores" é posto em pauta a discussão a
respeito da pobreza, da fome e da exclusão social. Observando a data em que o curta-
metragem foi produzido, fica explicitamente claro que o contexto brasileiro atual e o do final da
década de 1980 não mudaram significativamente, demonstrando que apesar dos avanços nas
mais diversas áreas, a situação social continua apresentando disparidades enormes, abismos
que interferem drasticamente no processo de formação de cidadãos e, concomitantemente, de
uma sociedade menos contraditória.