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Análise da Rigidez Rotacional de Fundações Estaqueadas de Torres Eólicas

George Magalhães Maranhão1


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George Maranhão Engenharia e Consultoria Estrutural S/S Ltda / projetos@georgemaranhao.com.br

Resumo

Neste trabalho, foi feita uma análise da rigidez rotacional de uma fundação profunda (com
estacas) que suporta uma torre eólica, onde é levado em consideração o solo, a rigidez das
estacas e a rigidez do bloco de fundação (elemento de transição entre a torre e as estacas). As
torres eólicas estão sujeitas a fortes cargas dinâmicas. De acordo com isso, as propriedades
dinâmicas do sistema estrutural (fundação, torre e aerogerador) são críticas. Com isso, os
fabricantes definem um valor mínimo para a rigidez rotacional, que deve ser respeitado no
desenvolvimento do projeto da fundação para assegurar que todo o sistema da torre eólica terá
a frequência natural dentro dos valores assumidos no projeto da torre. O objetivo deste
trabalho é definir a importância da rigidez do bloco dentro da avaliação da rigidez rotacional
da fundação (solo, estaca e bloco). Para isso serão feitas análises dinâmicas do sistema da
torre eólica, com várias hipóteses.

Figura 1 – Sistema estrutural da Torre Eólica (fundação, torre e aerogerador).

Palavras-chave
rigidez rotacional; dinâmica: fundações; torres eólicas; aerogeradores
Introdução

Nos últimos anos no Brasil vem se desenvolvendo, de forma exponencial, a energia eólica.
Isso pode ser visto tanto no desenvolvimento de aerogeradores mais potentes (> 5 MW),
como no aumento da altura das torres que receberão estes aerogeradores. Porém, percebe-se
um descompasso nesse avanço no que se refere à análise estrutural das fundações dessas
torres. A escassez bibliográfica e de diretrizes normativas sobre o assunto, particularmente
quando se trata das fundações das torres eólicas, pode levar a diferentes interpretações na
análise e dimensionamento dessas estruturas.

Vários são os critérios a serem seguidos no desenvolvimento de um projeto de fundação para


torres eólicas (rigidez, resistência, estabilidade, recalques aceitáveis, durabilidade, economia,
etc.). Dentre todos os critérios exigidos, um é particularmente cobrado pelos fabricantes dos
aerogeradores, a rigidez rotacional da fundação. Um valor mínimo é definido nas
especificações do fabricante, o qual deve ser seguido para manter a frequência natural do
sistema estrutural da torre eólica a uma adequada distância da frequência excitadora
(aerogerador).

Neste trabalho é analisado o comportamento do bloco de uma fundação estaqueada quanto à


sua rigidez, avaliando a frequência natural do sistema estrutural diante de vários cenários,
onde será avaliada a importância da consideração da rigidez do bloco.

Rigidez Rotacional da Fundação

A primeira preocupação no desenvolvimento do projeto de uma torre está relacionada aos


seus aspectos dinâmicos, para isso é importante conhecer as frequências naturais do sistema
estrutural (fundação, torre e aerogerador), matendo-as a uma distância segura das frequências
de excitação (aerogerador).

Uma maneira de identificar os pontos de correspondência entre as frequências naturais e a


excitação a partir do aerogerador é utilizando o diagrama de Campbell. Um diagrama de
Campbell ilustra as frequências naturais mais importantes do sistema estrutural da torre,
juntamente com as linhas correspondentes às frequências de excitação do aerogerador,
especificamente a frequência de excitação de rotação do rotor (1P) e a frequência de
passagem das pás (3P). Os pontos de intersecção indicam as situações que devem ser evitadas.
Utilizando um diagrama de Campbell, adaptado de MANWELL et al. (2009), para um
sistema estrutural de uma torre com um aerogerador de três pás (ver Figura 2). Como pode ser
visto, pode haver um número de diferentes frequências a considerar. Algumas vezes a
frequência de excitação está perto da frequência natural, não podendo ser completamente
evitada. Tal situação é comum ocorrer durante a inicialização ou desligamento do
aerogerador.
Figura 2 – Exemplo de um Diagrama de Campbell para um aerogerador (adaptado
MANWELL et al., 2009)

Nessas condições, o projetista da torre, por desconhecer as características do solo no qual será
implantada a torre e, conseqüentemente, do tipo de fundação a ser adotada, define uma rigidez
rotacional mínima para a fundação (bloco, estaca e solo) a ser cumprida, de modo que sejam
atendidas as frequências naturais do sistema estrutural, assumidas no projeto da torre.

Dentro desse contexto, o projetista estrutural, juntamente com o projetista geotécnico, tem a
responsabilidade de atender a esse requisito (rigidez rotacional mínima) no desenvolvimento
do projeto da fundação. Na definição da rigidez rotacional de uma fundação estaqueada,
objeto de estudo do presente trabalho, são dependentes: a rigidez do solo e a rigidez dos
elementos estruturais (estacas e bloco).

Para o projeto dos blocos de fundação, a literatura e alguns códigos normativos procuram
fazer uma distinção entre blocos flexíveis e rígidos, com o principal objetivo de definir as
hipóteses de dimensionamento (modelo de vigas ou placas para blocos flexíveis e o modelo
de bielas e tirantes para blocos rígidos). Os blocos são considerados rígidos quando é
respeitada a Equação 1, em seguida:

h ≥ a/β (1)

Onde "a" é a distância entre a face do pilar (torre) e a estaca mais afastada, “h” é a altura do
bloco (ver Figura 3) e β é um coeficiente, divergindo conforme a literatura ou o código
normativo. Na norma espanhola EHE-08 (2010) β é igual a 2, mesmo valor de MONTOYA et
al. (2002). Na norma brasileira NBR 6118:2014 (2014) é 1,5.
Figura 3 – Dimensões no bloco para classificação quanto à sua rigidez.

Modelo Numérico

A estrutura foi analisada no "software" SAP2000 (1995) pelo método numérico dos elementos
finitos. Foram utilizados elementos de três e quatro nós do tipo casca (shell) para modelar o
bloco e elementos de barra (frame) para modelar a torre. O diâmetro do bloco é 16,99m, com
o centro das estacas distribuídas no círculo de diâmetro de 15,54m. O pedestal possui altura
de 2,50m e diâmetro de 9,44m. A parte inclinada tem uma variação de altura de 0,70m a
2,00m. O bloco está apoiado sobre 36 estacas. A torre, com altura de 100m, está fixada no
pedestal, sendo o diâmetro externo variando de 7,70m na cota 0m a 3,70m na cota 100m, com
paredes de espessura de 18,5cm (Figura 4a).

A parte inclinada foi discretizada em 12 círculos concêntricos com a altura dos elementos
definida pela espessura média entre círculos (Figura 4b), e a torre foi discretizada em 10
elementos de barra com 10m (Figura 4c). Como condições de contorno, foram adicionadas
molas lineares no centro de cada uma das 36 estacas. A rigidez de mola (coeficiente de reação
vertical) adotada é igual a 3000 kN/cm. Para a análise modal foi definida uma massa de 200
ton no topo da torre (cota 100m), representando a massa da nacele e das pás do aerogerador.
No núcleo do bloco, para manter um comportamento rígido, foram adotados elementos
constraints nos nós internos ao círculo de diâmetro φ744cm (considerado o eixo das paredes
da torre). Esse artifício tem o objetivo de simular o aumento de rigidez proporcionado pela
ligação da torre ao bloco de fundação.

O concreto utilizado para o bloco foi o C30, com módulo de elasticidade secante Ecs = 27
GPa, para a torre o C50, com Ecs = 37 GPa. O coeficiente de Poisson adotado foi 0,2 e o peso
específico adotado para o concreto foi 25 kN/m3.
(4a) (4b) (4c)

Figura 4 – Sistema estrutural da Torre Eólica (4a), modelo do bloco (4b) e o modelo do
sistema com o bloco e a torre (4c).

Para o bloco em estudo, o valor do coeficiente β vale 1,57, sendo considerado rígido pela
norma espanhola EHE-08 (2010) e flexível pela norma brasileira NBR 6118:2014 (2014).
Diante da divergência, não será levado em conta esse critério na definição da rigidez do
bloco.

Com o modelo definido, algumas situações serão analisadas. A Tabela 1, em seguida,


apresenta um resumo destas situações.

Tabela 1 - Hipóteses nos vários cenários analisados.

MODELO INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA RIGIDEZ DO BLOCO

A1 rigidez da mola: 3000 kN/cm elemento constraints na torre (1)

A2(2) rigidez da mola: 3000 kN/cm elemento constraints na torre (1)

B rigidez da mola: 3000 kN/cm elemento constraints em todo o bloco (3)

C rigidez da mola: 3E10 kN/cm (4) elemento constraints em todo o bloco (3)

retirada do bloco no modelo, sendo adotada a condição de contorno de engaste


D (5)
perfeito para a torre.

(1) Utilização dos elementos constraints nos nós internos ao círculo de diâmetro φ744cm, no núcleo do
bloco.
(2) Mesmas condições do MODELO A1, sendo que a rigidez à flexão de todos os elementos de casca do
bloco foi reduzida à metade.

(3) Utilização dos elementos constraints em todos os nós do bloco, simulando um comportamento de corpo
rígido.

(4) O aumento da rigidez da mola tem como objetivo idealizar a indeformabilidade do apoio, que,
juntamente com os elementos de constraints em todos os nós do bloco, simulam a condição de contorno de
"engaste perfeito".

(5) Condição criada apenas para servir de comparativo ao MODELO C.

A Figura 5, em seguida, resume todos os modelos analisados.

Figura 5 – Modelos estruturais analisados.


Resultados

A Figura 6, em seguida, apresenta alguns modos de vibração para os MODELOS A1 (Figuras


6a, 6b e 6c) e B (Figuras 6d, 6e e 6f), todos associados à deformação da torre à flexão.

modo 1 modo 3 modo 5 modo 1 modo 3 modo 5


(6a) (6b) (6c) (6d) (6e) (6f)

Figura 6 – Modos de vibração do modelo estrutural A1 (6a, 6b e 6c) e B (6d, 6e e 6f).

A Tabela 2 apresenta os valores da frequência para os 6 primeiros modos de vibração do


sistema estrutural da torre, para os todos os modelos.

Tabela 2 - Valores da frequência para os 6 primeiros modos de vibração.


MODO MODELO A1 MODELO A2 MODELO B MODELO C MODELO D

1 0,3711 Hz 0,3670 Hz 0,3754 Hz 0,3893 Hz 0,3893 Hz

2 0,3711 Hz 0,3670 Hz 0,3754 Hz 0,3893 Hz 0,3893 Hz

3 2,0045 Hz 1,9800 Hz 2,0310 Hz 2,1292 Hz 2,1300 Hz

4 2,0045 Hz 1,9800 Hz 2,0310 Hz 2,1292 Hz 2,1300 Hz

5 5,4180 Hz 5,3675 Hz 5,4748 Hz 5,7384 Hz 5,7453 Hz

6 5,4180 Hz 5,3675 Hz 5,4748 Hz 5,7384 Hz 5,7453 Hz

A Tabela 3 mostra os resultados da rigidez rotacional para os modelos, conforme as


deformações (Figuras 7, 8 e 9). O momento fletor aplicado foi de 62.284 kN.m.

Tabela 3 - Valores da Rigidez Rotacional (Kθ) para os modelos.


MODELO A1 MODELO A2 MODELO B MODELO C MODELO D

Kθ(1) 246 GN.m/rad 197 GN.m/rad 327 GN.m/rad ∞ ∞

(1) Rigidez Rotacional.

Figura 7 – Deformação (U3 = 0,9432mm) do nó distante 372cm do centro (φ


φ744cm) para
o MODELO A1.
Figura 8 – Deformação (U3 = 1,1785mm) do nó distante 372cm do centro (φ
φ744cm)
para o MODELO A2.

Figura 9 – Deformação (U3 = 0,708mm) do nó distante 372cm do centro (φ


φ744cm) para o
MODELO B.

Conclusões

Para o entendimento da análise modal dos modelos, apresentaremos algumas diferenças


percentuais. Essa avaliação será concentrada no 1º modo de vibração. Quando comparamos o
modelo A1 (0,3711 Hz) com o modelo B (0,3754 Hz), a diferença é de 1,15%. Fazendo o
mesmo entre o modelo A2 (0,3670 Hz) e o modelo B (0,3754 Hz), a diferença encontrada é
de 2,24%. Conforme já colocado, o modelo A2 foi idealizado nas mesmas condições do A1,
sendo que a rigidez à flexão de todos os elementos de casca do bloco foi reduzida à metade.
Tais diferenças mostram a insignificância da consideração da rigidez do bloco na análise
modal do sistema estrutural de uma torre eólica. Na DNV/Risφ (2002), uma diretriz de
orientação para projetistas, elaborado pelas empresas dinamarquesas Det Norske Veritas e
Risφ National Laboratory, é dito que a frequência natural de uma torre será reduzida de 0 a
5%, quando no modelo do bloco é considerada a rigidez real em substituição à consideração
como corpo rígido, deixando claro que essas diferenças são conhecidas e aceitas. Tais
divergências são absorvidas quando se torna obrigatório que as frequências excitadoras e
naturais estejam suficientemente afastadas, como prevê a NBR 6118:2014 (2014), que
assegura um comportamento satisfatório quando esse afastamento é de 20%.

Quando se analisa as diferenças percentuais das rigidezes rotacionais, tem-se uma diferença
de 24,77% entre o modelo A1 (246 GN.m/rad) e B (327 GN.m/rad). A análise feita somente
sobre essa ótica é falsa, podendo inviabilizar a fundação. Enquanto a análise modal reflete
uma influência muito pequena da rigidez do bloco.
O cálculo da rigidez rotacional para fundações como as apresentadas neste trabalho (bloco
apoiado por uma coroa circular estaqueada), quando a idealização do bloco se faz como corpo
rígido, poderá ser feita de forma analítica pela Equação 2, em seguida:

Kθ = 0,5 . (kest . r . n)
2
(2)

Onde "kest" é coeficiente de reação vertical da estaca, "r" é o raio de locação das estacas e "n"
o número de estacas. Para a fundação estudada, tem-se kest = 3000 kN/m, r = 7,77m e n=36,
resultando numa rigidez rotacional Kθ = 326 GN.m/rad, valor muito próximo do MODELO B,
situação onde está idealizado o bloco como corpo rígido.

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118:2014 - Projeto de estruturas de


concreto - Procedimento. 2014.
DNV/Risφ. Guidelines for design of wind turbines, 2nd Edition. DNV/Risφ Publication. 2002.
INSTRUCCIÓN DE HORMIGÓN ESTRUCTURAL. EHE-08. Comisión Permanente del Hormigón,
4ª Edición. Ministerio de Fomento (Centro de Pulicacciones). Madrid. 2010.
GRÜNBERG, J.; GÖHLMANN, J. Concrete structures for wind turbines. Ernst & Sohn. 2011.
MANWELL, J. F.; MCGOWAN, J. G.; ROGERS, A. L. Wind energy explained : theory, design,
and application, 2nd Edition. John Wiley & Sons Ltd. 2009.
MONTOYA, P. J.; MESEGUER, A. G.; CABRÉ, F. M. Hormingón Armado, 14ª Edición. Gustavo
Gili.. 2002.
SAP2000, Structural Analysis Program. Computers and Structures, Inc. University Ave. Berkeley,
California, 1995.

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