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DIREITO – 1° PERÍODO
RESENHA
Natal-RN
2024
O DIREITO E A JUSTIÇA NO AUTO DA COMPADECIDA
A história se passa no sertão nordestino, e tem forte ligação com a igreja católica,
tendo seu enredo traçado nesse meio. A obra nos mostra sacerdotes católicos
movidos pelo dinheiro que acabam aceitando enterrar um cachorro com base no
rito utilizado para enterrar humanos. Ao desenrolar dessa longa história, o
Cangaceiro Severino de Aracaju chega a cidade com o seu bando e após idas e
vindas acaba matando o padre, o bispo, o sacristão, o padeiro e sua mulher.
João Grilo e Chicó como homens muito espertos, acabam convencendo
Severino a pedir que seu comparsa efetuasse um tiro nele, sob a promessa que
ao tocar uma gaita ele ressuscitaria, o que não ocorre, e após alguns
acontecimentos, o comparsa de Severino acaba matando João Grilo.
Aqui é onde começa a parte da obra que está muito ligada ao direito, o
julgamento dos mortos. Esse julgamento nos lembra muito um tribunal do júri.
Com o diabo sendo o promotor (sobre isso, em uma parte do texto João Grilo
diz: " Foi gente que eu nunca suportei: promotor sacristão, cachorro e soldado
de polícia. Esse aí é uma mistura disso tudo), os mortos o réu, Nossa Senhora
a advogada de defesa e Deus a representação do juiz e do júri.
No começo da cena do julgamento, o demônio trás uma frase que mostra ainda
mais como essa parte está ligada a um tribunal, dizendo: "Calem-se todos.
Chegou a hora da verdade". Verdade essa que deve ser a base de toda justiça.
Ao desenrolar do texto, o "Encourado" (nome dado ao demônio graças a uma
lenda nordestina), começa a citar os pecados cometidos pelos réus e demostra
toda a sua raiva e desejo de levar todos os julgados para o inferno. Em paralelo
a isso, vemos a misericórdia e bondade de Deus, tentando de toda forma achar
motivos para a não condenação dos mortos. Mesmo assim, a situação deles era
bastante complicada e quase sem saída. Até que como última alternativa, João
Grilo recorre a misericórdia e interseção de Nossa Senhora, que segundo ele
nos entende mais pois é "gente como a gente", enquanto Jesus é "gente mas é
Deus ao mesmo tempo". Isso se liga a ideia do tribunal do júri, onde o réu e
julgado por pessoas do povo, assim como ele, o livrando de uma possível visão
enviesada que poderia ter o juiz. Como figura de defesa dos necessitados, a
compadecida tenta de todo modo buscar a piedade do Senhor com eles, neste
contexto o demônio diz: "Grande coisa esse chamego que ela faz para salvar
todo mundo! Termina desmoralizando tudo". Isso também podemos ligar a visão
deturpada que a sociedade por vezes tem dos advogados criminalistas, vistos
como profissionais com o único objetivo de "defender bandidos”. No decorrer do
ensaio, surgem vários termos que nos remete a prática jurídica, como: apelação,
protesto e etc. O julgamento termina com a maioria dos réus indo a pedido de
João para o purgatório, que em termos mundanos seria o equivalente a prisão.
Enquanto João Grilo é mandado de volta a vida, com a premissa de não cometer
os mesmos erros mais, o que seria equivalente a absolvição.
É um livro que nos faz refletir sobre como o direito é mutável a partir do contexto
social, econômico, cultural e espacial onde ele é aplicado. Levando-nos a
lembrar que o direito é uma ciência prática e que está em constante mudança.