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Universidade Independente de Angola

Faculdade de Ciências Sociais


Curso de Licenciatura em Direito

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO


TEMA: Direito Internacional Público e Direito Internacional
Privado

Discente: Filomena Maria Moicas


Sala: 20
Turma: 3UN
Turno: Noite

Docente: Albano Pedro

LUANDA/2023

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Universidade Independente de Angola
Faculdade de Ciências Sociais
Curso de Licenciatura em Direito

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO


TEMA: Direito Internacional Público e Direito Internacional
Privado

Trabalho de Investigação Científica


apresentado ao Professor Albano Pedro como
parte dos requisitos para aprovação na cadeira
de Direito Internacional Privado no Curso de
Licenciatura em Direito da Universidade
Independente de Angola.

Discente: Filomena Maria Moicas


Sala: 20
Turma: 3UN
Turno: Noite

Docente: Albano Pedro

LUANDA/2023

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AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus, por ao longo deste processo às vezes complicado e


desgastante, nos ter feito ver o caminho, até nos momentos em que pensamos em desistir a
boa mão do altíssimo esteve sempre comigo.
Não posso deixar de agradecer a esta universidade por ser um espaço que me privilegia
o conhecimento e onde todas as ideias são bem recebidas.
Agradeço também de forma especial ao meu impulsionador que muito ajudou para a
realização deste trabalho Professor Albano, com todo o carinho e apreço que tenho por si,
agradeço por tudo.
Aos meus pais, devo a vida e todas as oportunidades que nela tivemos e que espero um
dia poder-vos retribuir.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho, mormente, ao professor Albano Pedro, que me auxiliou na


germinação das ideias e durante todo o processo de desenvolvimento deste presente trabalho.
Dedico a todos os colegas, que contribuíram directamente e indirectamente, para
realização do meu trabalho! A todos que mesmo não fazendo parte da cadeia de ensino
ajudaram-me indirectamente a alcançar os objectivos preconizados pelo grupo para a
realização deste trabalho, dedico de igual modo. Dedico aos meus amigos e por último e não
menos importante, a minha família, que sem sobras de dúvidas, não mede esforços quando o
quesito é o meu crescimento a nível académico.
Este trabalho é dedicado especialmente a vocês, o meu muito obrigada à todos.

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EPÍGRAFE

“Quando vou a um país, não examino se há boas leis, mas se as que lá existem são
executadas, pois boas leis há por toda parte”.

Montesquieu

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Lista de Abreviações

Art- Artigo
C.C- Código Civil

Ccom- Código Comercial

CF- Conferir
CRA- Constituição da República de Angola
DIPR- Direito Internacional Privado
DIPU- Direito Internacional Público
DIP- Direito Internacional Público/ Privado

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INTRODUÇÃO

A elaboração deste trabalho é baseado num tema que é de suma relevância no contexto
actual e moderno social, sobre o Direito Internacional Privado e o Direito Internacional
Público, a existência de uma pluralidade de Estados soberanos, e correspondendo a cada um
deles um sistema jurídico, pode concluir-se pela existência de uma pluralidade de sistema
jurídicos estaduais. Desta feita, facilmente surgem divergências nas soluções avançadas para
muitos problemas jurídicos, cabendo determinar qual a solução que deverá ser aplicada,
quando em causa está um problema que envolve mais que um sistema jurídico podendo ser
do âmbito privado ou público.
Para BERNARDO SORDI, demonstra que, para além das palavras (ius publicum e ius
privatum), os significados e os imaginários envolvendo a dicotomia são profundamente
dependentes dos seus contextos culturais, são sempre contingentes (Hespanha, 2012, p. 13)
Bernardo Sordi evidencia e explica a profunda relatividade histórica dos termos. Diferentes
temporalidades e localidades, riqueza e diversidade deste jogo de palavras.
Ao longo desse grande percurso, o autor constata que a dicotomia público e privado,
apesar de remeter a uma distinção muito antiga, na conhecida definição de Ulpiano, assentada
no Corpus luris Civilis, tem a sua força e consagração na modernidade jurídica. Público e
privado são termos muito antigos, mas também novíssimos.
A descontinuidade essencial entre o direito romano (antigo) e a dimensão jurídica
moderna é muito bem observada pelo autor: O historiador do direito explica que é apenas no

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final do antigo regime, com o surgimento e desenvolvimento dos Estados Modernos, com as
revoluções, revoltas e reformas do final do século XVIII, que a antiga distinção começa a
assumir a estrutura de uma grande dicotomia conformadora de todo o direito, a (..) summa
divisio dell'intero ordine giurídico, incarnando computamente il modello ottocentesco, i suoi
esiti statualistici e codicistici, il suo tipico equilibrio tra empire e propriété, tra la sovranità
dello Stato e i diritti del soggetto individuale (Sordi, 2020, p. 07).
O Estado soberano é uma invenção moderna, a ordem jurídica medieval se caracteriza,
notadamente, por um "vazio político relativo", "um direito sem Estado" (Grossi, 1996, pp.
267-284) 3. As condições ainda não são favoráveis ao aparecimento de uma forma muito
específica de compreender o direito como a observada na França pós-revolucionária. Nesse
mundo medieval, nessa sociedade de poderes fragmentados, do pluralismo jurídico e da
lurisdictio (Costa, 2002) como atesta Sordi (2020), não há esta bipartição dicotômica público
e privado como um elemento estruturante de toda a dimensão jurídica. Ainda que a distinção
não tenha passado despercebida por parte dos juristas medievais, atentos às fontes romanas,
não existe propriamente um direito público, em termos contemporâneos, autônomo e
destacado no ordenamento em oposição ao direito privado. Outras distinções são mais
comuns, ius divinum / ius humanum; ius civile / ius canonicum; ius commune / iura própria.
A grande dicotomia direito público e direito privado ganha dignidade teórica e
filosófica fornecida especialmente por Kant, em 1797, em "Princípios metafísicos da doutrina
do direito". Além disso, encontra elementos importantes, embora não exclusivos, de sua base
jurídica no pensamento de Savigny, em 1840, com "Sistema de direito romano actual", que
retoma a antiga distinção de Ulpiano entre ius publicum e ius privatum, mas atribui conteúdos
modernos novíssimos. A dicotomia se torna estrutural, a grande chave de compreensão de
todo o ordenamento jurídico, e permite "distinguere Stato e società, a contrapporre individuo
e potere, a circoscrive-re un ambito di 'sociabilità che ruota intorno agli interessi individuali
e si distende quindi nelle conseguenti relazioni intersoggettive." (Sordi, p. 98).
Na esfera privada, tem-se a tutela da propriedade (consagrada como direito
praticamente absoluto), a tematização e promessa da liberdade e da igualdade formal, assim
como o progressivo reconhecimento da autonomia e independência do sujeito individual.
Observa-se a pretensão da sociedade civil de distinguir-se do Estado. De um lado a
sociedade, do outro o Estado. Os interesses tutelados são os privados, individuais. Os grandes
códigos privados do século XIX, individualistas e proprietários, são compreendidos como
uma espécie de "Constituição da vida dos privados". Seus pilares fundamentais são a

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propriedade, a família e o contrato. O Código Civil francês de 1804 é o grande exemplo
disso. O "código símbolo" ou a "forma código (Cappellini, 2000), constituindo pretensamente
"a concretização da volonté générale" (Hespanha, 2002, p. 402), torna-se o modelo ideal de
direito, ou melhor, não há direito e direitos que estejam para além dos monumentos
legislativos codificados (Cazzetta, 2012, p.ix)1.
Na esfera pública, em linhas muito gerais, o objeto da regulamentação é o Estado, agora
uma pessoa jurídica, e a sua estrutura administrativa. Comando, autoridade e império são as
preocupações principais. Assiste-se à formação do direito público. O interesse tutelado é o
público ou, em certa medida, o interesse supostamente de toda a sociedade e não o individual
dos particulares. No século XIX, de um lado o Estado, do outro o indivíduo sujeito de direito.

1 Conforme explica Giovanni Cazzetta, no "inizio dell'Ottocento il Codice civile di Napoleone si propose come nuova forma di ordine del
giuridico e come progetto di programmazione statale di una società presentata come lo specchio delle certezze e delle speranze della
borghesia at potere." (Cazzetta. Giovanni. Codice civile e identità giuridica nazionale: percorsi e appunti per una storia dele codificazioni
moderne. Torino: G. Giappi-chelli Editore, 2012, p.ix).

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1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1. Direito Internacional Privado
O Direito Internacional Privado (DIPr) consiste em uma disciplina jurídica que se
debruça sobre a regência – tanto normativa quanto de julgamento e implementação de
decisões – de factos sociais praticados pelos indivíduos que se relacionam com mais de uma
comunidade humana, também denominados factos transnacionais. Esses factos sociais são
multiconectados ou plurilocalizados, podendo ser regulados por mais de um ordenamento
jurídico.

Ou seja, o Direito Internacional Privado regula, na sua maioria, situações jurídicas


privadas. No entanto, adoptando a terminologia utilizada pelo Professor Lima Pinheiro, pode
dizer se que o Direito Internacional Privado regula, sim, situações transnacionais (pois que há
situações por este reguladas que não se reconduzem, directamente, a direito privado). Desta
forma, são situações transnacionais todas as que colocam em problema a determinação do
Direito aplicável e que devam ser resolvidas pelo Direito Internacional Privado.

Cabe ao Direito Internacional Privado (DIPr) regrar justamente essa potencialidade de


aplicação espacial de mais de um ordenamento jurídico, evitando sobreposição (disputa
normativa) ou omissão (ausência de normas), bem como fixar a jurisdição em litígios
contendo vínculos com mais de um ordenamento jurídico (os chamados elementos de
estraneidade), e ainda regular a cooperação jurídica internacional por meio do
reconhecimento e da execução de decisões estrangeiras referentes a fatos transnacionais.

1.1.1. Desenvolvimento histórico


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Para sistematizar o estudo das fases históricas do Direito Internacional Privado, adotou-
se a divisão em quatro fases: A fase precursora (Antiguidade à Idade Média europeia); A
fase iniciadora (final da Idade Média europeia até o início do século XIX); A fase clássica
(século XIX até meados do século XX) e a fase contemporânea (meados do século XX ao
presente). 4

A fase precursora é composta por normas que tratam esparsamente da coordenação da


aplicação de normas jurídicas de origens territoriais distintas. Para vários autores, inclusive,
tal coordenação é tida como inexistente na Antiguidade, uma vez que não havia
reconhecimento de direitos de outras comunidades: o estrangeiro, inclusive, poderia ser
reduzido à condição de escravo.5 Por outro lado, há alguns autores que sustentam existir,
mesmo na Antiguidade, fragmentos normativos que respeitavam o direito dos estrangeiros, o
que seria demonstrativo de origem primária do Direito Internacional Privado (DIPr).6

Já a fase que inicia é chamada de fase estatutária (séc. XII - fins do séc. XVIII e início
do séc. XIX), pois é baseada no estudo dos vocábulos das leis e costumes locais (os
“estatutos”). No Baixa Idade Média europeia, o crescente comércio entre as diferentes regiões
e a importância cada vez maior dos diferentes direitos locais em contraponto à frágil unidade
do Sacro Império Romano-Germânico financiaram várias Escolas de estudiosos da
interpretação dos estatutos, que eram regras legais ou costumeiras das cidades, que
regulavam os mais diversos campos jurídicos. Tais Escolas visavam contrariar a unidade
forçada pretendida pelo Sacro Império (e pelo Papado), sem gerar insegurança jurídica aos
comerciantes, o que resultou em discussão dos limites espaciais de cada direito local, até hoje
um dos temas essenciais do DIPr. Nessa linha, o crescente comércio e a fragmentação prática
do Sacro Império Romano-Germânico incentivaram os juristas a buscar adaptar o Código
Justiniano por comentários, influenciados por normas locais. A figura central dessa época é
Bártolo de Sassoferrato (1314-1357), que logrou avançar no estudo da codificação romana
associada aos estatutos das cidades do norte da Itália.

No séc. XIX, consolidou-se o direito internacional privado renovado e diferente da


visão estatutária graças à introdução do método indireto multilateral (ou bilateral), baseado na
localização da lei da sede (ou centro) da relação jurídica transnacional, com base
essencialmente nos estudos de Savigny.2 Tal método indireto multilateral consiste na
identificação a priori do direito por meio da localização do centro ou sede de cada relação

2 SAVIGNY, Friedrich Carl von. Sistema do direito romano atual.

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jurídica transnacional. É também chamado de método conflitual, uma vez que resolveria o
“conflito” aparente entre ordenamentos, indicando aquele que seria o mais adequado a reger o
fato transnacional. Conta com três elementos: O conceito de “relação jurídica”, que é
determinado pela inserção dos fatos transnacionais em amplas categorias jurídicas; A “sede”
ou centro da relação jurídica; E a “localização” da sede da relação jurídica em um
ordenamento jurídico nacional. O primeiro elemento exige que seja feita a classificação
jurídica dos fatos transnacionais em categorias normativas, como “obrigações”, “bens
imóveis”, “capacidade jurídica”, entre outras. O segundo elemento consiste na investigação
de dados objetivos da relação jurídica, resultando na fixação, consensual, de sua sede. A
natureza da relação jurídica seria decisiva para a declaração da sua sede, que seria única e
rígida. O terceiro elemento é a consequência da fixação da categoria jurídica e da
identificação de sua sede, o que vem a ser o uso do ordenamento material do lugar da sede
para reger o facto transnacional.

Todavia, o desenvolvimento da matéria no próprio século XIX resultou na adoção de


leis locais de DIPr que fragmentaram a disciplina em um conjunto de normas nacionais. Esse
DIPr com forte influência das leis nacionais – em especial da grande codificação civil – pode
ser denominado de DIPr particularista, nacionalista ou individualista, pois é fundado em
normas nacionais que regulam a escolha da lei e a determinação da jurisdição sobre os fatos
transnacionais.

Podem ser identificadas, ao menos, duas gerações de codificações nacionais de DIPr: a


primeira geração corresponde ao movimento particularista do século XIX, que tem como
expressões maiores o Código Civil francês de 1804, o Código Civil italiano de 1865 e o
Código Civil alemão de 1896; 3 A segunda geração contempla os esforços nacionais de
codificação do DIPr a partir de 1960, abrangendo, até 2012, 94 novas legislações, adotadas
em 84 estados distintos.4 Com isso, o método indireto multilateral não logrou obter o
consenso normativo sobre os critérios de localização da lei de regência, não gerando a
harmonia internacional pretendida.

Por isso, no final do séc. XIX, surgiram movimentos a favor da celebração de tratados
de Direito Internacional Privado, os quais se esforçaram por tornar a disciplina em um ramo

3 VALLADÃO, Haroldo. Le droit international privé des états américains, p. 12.


4 SYMENONIDES, Symeon C. Codifying choice of law around the world, pp. 2-4.

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especializado do Direito Internacional Público. Já no séc. XX, surgiram movimentos a favor
de um DIPr voltado a resultados materiais, nos quais a escolha da lei que deveria regular o
facto transnacional dependeria de critérios de justiça material.

1.2.1. Valores do Direito Internacional Privado

O Direito Internacional Privado tem, por objecto, situações jurídicas privadas


internacionais. Como visto, são fundamentalmente três os problemas a que este pretende dar
resposta: determinar o Direito aplicável, determinar o tribunal competente e determinar as
condições a que o reconhecimento de sentenças estrangeiras em Portugal está subordinado.
Para nos ajudar a responder a estas questões, é fundamental conhecermos dos valores do
Direito Internacional Privado. Através destes, é-nos facilitada a tarefa de interpretação no
âmbito do DIP, para além de se tornarem mais claros os objectivos deste ramo do Direito e a
integração de lacunas com que nos possamos deparar. O primeiro dos valores a que se deve
fazer referência é o da salvaguarda da dignidade da pessoa humana. Este é um princípio
fundamental, também inscrito na nossa Constituição, e do qual decorre o reconhecimento da
personalidade jurídica e o reconhecimento dos direitos de personalidade a todos os seres
humanos.

No âmbito do Direito Internacional Privado, é através deste princípio que se reconhece


aos estrangeiros, em território nacional, a susceptibilidade de serem titulares de direito. Essa
realidade encontra-se, desde logo, no art 14º CC. Para além desta, outras são as
consequências, no âmbito deste ramo do Direito, do princípio em causa: desde logo, basta ver
que as matérias usualmente incluídas no estatuto pessoal das pessoas singulares (capacidade,
relações familiares e sucessórias, etc.) são submetidas à lei pessoal, que entre nós é a lei da
nacionalidade (art 31º CC). Outro princípio fundamental do Direito Internacional Privado é o
da autonomia privada: reconhece-se a possibilidade de os interessados escolherem a lei
aplicável a certas relações privadas internacionais em que intervêm (veja-se, por exemplo, o
art 41º CC). Este valor fundamental do DIP permite acautelar a segurança jurídica, ao mesmo
tempo que garante aos interessados uma certa liberdade nas regulações das situações jurídicas
em que intervêm.

O terceiro valor fundamental a ter em consideração é a tutela da confiança, que se


traduz na salvaguarda das expectativas legítimas das pessoas no seio de situações jurídicas.

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No âmbito do Direito Internacional Privado, este princípio é da maior relevância: as situações
privadas internacionais, por estarem por natureza ligadas a mais que uma ordem jurídica,
geram certas incertezas quanto ao regime jurídico aplicável. Desta feita, urge aplicar o regime
jurídico que melhor acautelar as expectativas legitimamente criadas. É por essa razão, aliás,
que admitimos a aplicação pelos tribunais portugueses de legislação estrangeira, sendo
também por isso que reconhecemos eficácia à lei estrangeira em território nacional. Há,
porém, outras manifestações deste princípio. Desde logo, o evitar que uma situação jurídica
válida e eficazmente constituída em determinado Estado, com o qual tem uma conexão
estreita, não seja reconhecida nas demais ordens jurídicas em que é invocada. Acerca desta
matéria, o art 31º, nº 2 CC.
Também os próprios institutos do reenvio e da devolução (arts 17º e seguintes CC) são
manifestações deste princípio de tutela da confiança, a juntar ao tal reconhecimento das
sentenças estrangeiras em Angola (arts 978º e ss CPC). Cumpre também referir o princípio da
igualdade perante a lei – há um tratamento igual que é dado a causas iguais, a situações
iguais. Este é um verdadeiro corolário da justiça, que tem também projecções específicas no
ramo do Direito Internacional Privado. Desde logo, pode acontecer que, para questões
emergentes de uma mesma situação privada internacional, se considerem competentes os
tribunais de dois Estados diferentes.
Nesse caso, importa evitar que seja possível ao autor propor a acção consoante o Estado
que lhe dá maiores benefícios, por forma a manipular o desfecho da acção – importa evitar o
chamado forum shopping. No fundo, importa assegurar, no mínimo, que a mesma questão é
julgada por aplicação da mesma lei – só assim se consegue igualdade no plano do Direito
Internacional Privado. Essa necessidade é conseguida por via das regras de conflitos,
consagradas em cada Estado. Para além destes valores, podemos ainda identificar valores
sociais no âmbito do Direito Internacional Privado – desde logo, há uma importância dada à
protecção da parte mais fraca na relação jurídica.
Pode ainda falar-se na eficácia económica como valor social do DIP. A mesma reflete
se, por exemplo, na lógica de aplicar a lei que mais favoreça uma regulação eficiente do
ponto de vista económico de certas situações jurídicas. Essa será, por exemplo, uma
regulação que permita a redução dos custos das transacções. É nessa lógica que assenta, por
exemplo, o art 4º, nº 2 do Regulamento Roma I, que manda aplicar “a lei do país do devedor
da prestação característica”. A prestação característica, por sua vez, será a que permite
reconduzir o contrato a um dos tipos legais ou sociais (no contrato de compra e venda é o
vendedor, no contrato de empreitada o empreiteiro, etc). Concluindo, é possível perceber que

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os grandes pilares do Direito Internacional Privado são valores que já conhecemos de outras
disciplinas jurídicas. Diferente é, tão simplesmente, a concretização dos mesmos. Os valores
fundamentais analisados (dignidade da pessoa humana, autonomia privada, tutela da
confiança, princípio da igualdade, protecção da parte mais fraca e salvaguarda da eficiência
económica) são valores comuns a outros ramos do Direito. No entanto, o modo como os
mesmos são atingidos na prática é diferente.

1.1.3. Fontes do Direito Internacional Privado

Questão relevante é também a das fontes do Direito Internacional Privado. Até meados
do século passado, o DIP decorria sobretudo de jurisprudência. Havia poucas normas
atinentes a esta matéria, à volta das quais a jurisprudência e a doutrina faziam uma construção
que servia de base à resolução dos problemas que surgiam na vida prática. Depois disso,
surge a tendência para codificar este ramo do Direito, elaborando-se leis e códigos nos quais
se definiam os princípios e as regras orientadoras do mesmo. Nos últimos anos, contudo, a
tendência tem sido a contrária – o DIP é hoje muito regulado por via de legislação
extravagante. Paralelamente, pôde observar-se uma tendência de internacionalização das
fontes do Direito Internacional Privado, essencialmente por via da Conferência de Haia e pela
assinatura do Tratado de Amesterdão. Relativamente às principais fontes do DIP, estas
podem desde logo dividir-se entre fontes internas e fontes comunitárias. Nas fontes
internacionais destacam-se as convenções internacionais, que começaram a surgir no final
do século XIX, associadas à Conferência de Haia, à Organização das Nações Unidas, à
Comissão Internacional do Estado Civil, à Comunidade Europeia, etc.

1.1.4. AS REGRAS DE CONFLITOS (As regras de conflitos: previsão e


estatuição; modalidades)

Desde logo, então, importa entender o que são estas normas de conflito, e por que são
essas constituídas. A regra de conflitos é constituída, como as demais, por uma previsão e por
uma estatuição. A previsão da regra de conflitos é a situação da vida que ela visa, situação
essa que terá de característico a circunstância de ser uma situação plurilocalizada. Já a

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estatuição da regra de conflitos, por seu turno, traduz-se naquilo a que chamamos de conexão,
no sentido em que atribui competência a certa lei para regular determinada categoria de
questões suscitadas pela situação privada internacional em apreço. A estatuição, note-se,
difere do elemento de conexão, sendo esse aquele através do qual as regras de conflito nos
apontam para as leis aplicáveis. Ainda que tudo isto pareça simples, geram-se problemas
relevantes. Desde logo, cumpre saber: como podemos nós delimitar a previsão?
Na maioria dos casos, essa delimitação é feita por via de conceitos técnico-jurídicos,
que ou nos indicam uma certa categoria de situações (p.e. arts 41º e 46º CC) ou nos indicam
uma certa categoria de questões jurídicas especiais (p.e. arts 36º e 49º CC). Estes últimos são
casos em que a regra de conflitos é mais restrita, abrangendo apenas questões parciais. Já no
que toca à estatuição da norma de conflitos, a mesma pode assumir várias modalidades:
Regras de conflitos unilaterais – são aquelas que apenas nos dizem quando se
aplicam as normas materiais do direito do Estado do foro. Estas limitam-se a delimitar o
âmbito de aplicação espacial das normas jurídicas desse ordenamento em específico.
Exemplo deste tipo de regras de conflitos é o art 8º CT, que apenas nos diz quando aplicar a
lei portuguesa (e não quando aplicar a lei estrangeira);
Regras de conflitos bilaterais – são aquelas em que tanto se remete para a lei do foro
como para lei estrangeira, correspondendo à maioria das regras de conflitos vigentes no nosso
ordenamento jurídico. Qualquer situação jurídica lhe é subsumível, pois a norma nos indicará
sempre qual a lei aplicável, seja essa a lei portuguesa ou a lei estrangeira. É exemplo deste
tipo de regras o art 25º CC, do que decorre que as matérias aí enunciadas são tratadas pela lei
pessoal dos respectivos sujeitos. Ora, a lei pessoal, diz o art 31º CC, é a lei da nacionalidade,
que poderá ser, lá está, a lei portuguesa ou a lei estrangeira.
Regras bilaterais imperfeitas – são regras que tanto remetem para a lei do foro como
para uma lei estrangeira, mas que só se reportam a uma certa categoria de situações jurídicas,
normalmente situações que têm de certa forma conexão com o direito do estado do foro. Por
exemplo, o art 51º CC é regra especial perante o art 50º, estabelecendo-lhe alguns desvios.
No art 51º, não é contemplada a possibilidade do casamento entre estrangeiros no estrangeiro,
pelo que a regra em causa é uma regra bilateral imperfeita: a mesma só contempla as
situações em que há uma certa ligação à nossa ordem jurídica. O Professor Dário Moura
Vicente entende que podemos analisar esta questão do ponto de vista da integração de

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lacunas, dizendo que poderá ser aplicável analogicamente uma outra regra 5 , suprindo assim a
imperfeição da regra bilateral.

1.2. Direito Internacional Público

A denominação “Direito Internacional” surgiu em 1780, através de um britânico

chamado Jeremy Bentham em sua obra “An Introduction to the Priciples of Moral and

Legislation”. Posteriormente, o termo “público” foi incluído, manifestando o interesse

primário da matéria e distinguindo-o do Direito Internacional Privado, cujo objeto é definir

qual a ordem jurídica, nacional ou estrangeira, aplicável aos conflitos de leis no espaço em

relações privadas com conexão internacional.

Todavia, desde os tempos mais remotos, quando os povos começaram a se relacionar

uns com os outros, normas de caráter internacional pautaram as relações entre os seus

integrantes. Logo, é impossível apontarmos que há um só marco de quando iniciou o Direito

Internacional em si. O que chamamos de moderno Direito Internacional, entretanto, surgiu a

partir de meados do século XVII, em 1648, com os tratados assinados no acontecimento

histórico conhecido como Paz de Vestfália.

Sendo o Direito, por definição, elemento que une membros de uma sociedade em torno

de um conjunto de valores em comum. Ele irá refletir as ideias e preocupações da sociedade

em que o pera.

Com o Direito Internacional isso se dá na medida em que cuida das grandes

preocupações da humanidade, como segurança climática, manutenção da paz, crimes

transnacionais, comércio internacional, etc.

5 Por exemplo, e neste caso: um estrangeiro que case num país diferente do da sua nacionalidade, que não seja o nosso próprio país,
poderá casar de acordo com a lei da nacionalidade se o fizer nas condições que aqui estão previstas.

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Para Celso D. de Albuquerque Mello:

“A cada sociedade corresponde um determinado sistema jurídico. À sociedade internacional

corresponde, portanto, o Direito Internacional.”

Assim, ainda que sejam consideravelmente diferentes as ordens jurídicas interna e

internacional, é inegável a presença de um arcabouço jurídico que rege a vida e as relações

internacionais. A esse conjunto de normas jurídicas (princípios e regras) denominamos Direito

Internacional.

Durante um longo período entendeu-se que a sociedade internacional era composta

apenas por Estados, em um contexto que o Direito Internacional era o conjunto de regras que

determinava os respectivos direitos e deveres dos Estados em suas mútuas relações.

Porém, com a evolução da sociedade internacional, em especial no último século,

outros atores passaram a influenciar sua dinâmica, como as organizações internacionais,

ONGs, empresas transnacionais e até mesmo os indivíduos.

Como consequência, a conceituação do DIP também se modificou ao longo do tempo,

como observamos da definição trazida pelo Prof. Valério Mazzuoli:

“O Direito Internacional pode ser conceituado como o conjunto de princípios e regras jurídicos

(costumeiras e convencionais) que disciplinam e regem a atuação e a conduta da sociedade

internacional (formada pelos Estados, pelas organizações internacionais e também pelos

indivíduos), visando alcançar as metas comuns da humanidade e, em última análise, a paz, a

segurança e a estabilidade das relações internacionais”.

Percebe-se então que o Direito Internacional Público passa a tutelar não só os vínculos

estabelecidos entre Estados e organizações internacionais – como antigamente -, mas também

uma ampla gama de questões de interesse direto de outros atores sociais, como os indivíduos.

1.2.1. Objectivo do DIPU

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O objecto do Direito Internacional atual, portanto, é brilhantemente sintetizado pelo

prof. Alberto do Amaral Júnior em seguinte trecho:

Desde as suas origens, o Direito Internacional Público cumpre duas funções básicas:

reduzir a anarquia por meio de normas de conduta que permitam o estabelecimento de relações

ordenadas entre os Estados soberanos e satisfazer as necessidades e interesses dos membros da

comunidade internacional.

Assim, em acordo com a tradição e a contemporaneidade, podemos resumir que o

Direito Internacional Público é um factor de organização da sociedade que possui como

objetos/missões principais:

● Redução da anarquia nas relações internacionais e delimitação das competências de


seus membros;
● Regulação da cooperação internacional;
● Tutela adicional a bens jurídicos aos quais a sociedade internacional.

Desse modo, podemos afirmar que o Direito Internacional se ocupa de questões, as

quais, em virtude de sua amplitude e complexidade, não podem ser enfrentadas de modo

isolado por nenhum Estado, sendo imperiosa a convivência em cooperação entre todos os

membros de dada sociedade internacional, ficando a cargo do DIP a regulação de temas sob

este âmbito de interesse.

1.2.3. Fundamentos de Direito Internacional Público

Quando se fala em fundamentos de DIPU, questiona-se em que se apoia a validade do

ordenamento jurídico internacional. A preocupação está em explicar o porquê de sua

obrigatoriedade a partir da avaliação do valor intrínseco das normas, isto é, o que faz com que

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elas sejam vinculantes para a sociedade internacional. O assunto é pauta de diversos debates

históricos, concentrados especialmente em torno de duas teorias: a voluntarista e a

objectivista.

● Doutrina voluntarista (subjectivista): Tem como seu elemento central que o


fundamento está na vontade dos sujeitos de Direito Internacional. Assim, a ordem
jurídica internacional seria obrigatória, pois, uma vez que os Estados manifestaram
livremente sua vontade, teriam a ela de se submeter. É chamada também de corrente
positivista. A partir dessa doutrina foram desenvolvidas diversas teorias:
● Teoria da auto-limitação do Estado, desenvolvida por Geor Jellinek (1851/1911) :

Aduz que o Estado, por ser soberano, pode se auto-determinar politicamente e se auto

obrigar juridicamente. Portanto, sua submissão à comunidade internacional é ato

particular de vontade que limita intencionalmente sua soberania.

● Teoria da vontade comum ou colectiva, por Heinrich Triepel (1868/1946): Prevê

que o DIP se fundamenta na vontade colectiva e unânime dos Estados, que se

manifesta por meio de tratados-lei ou costumes.

● Teoria do consentimento das nações, formulada por Hall e Oppenheim: Para eles,

um Estado respeita o DIP porque é a vontade da maioria dos Estados. Um

consentimento mútuo, portanto, seria revelado na vontade majoritária dos Estados.

● Teoria da delegação do direito interno, por Max Wenzel (1879/1946): Entende

que a obrigatoriedade estaria na constituição de cada Estado, em sua própria

legislação ou direito interno. Ela nega a existência do DIP.

● Doutrina Objectivista: Entende que existem princípios e normas superiores à


vontade dos Estados, ou seja, que possuem grau de importância tão elevado a ponto
de que seu cumprimento, por si só, depende do regular funcionamento da sociedade
internacional. A partir de tal doutrina também foram desenvolvidas algumas
importantes teorias:

20
● Teoria do direito natural (jusnaturalismo): Teve diversos atores ao longo da

história, como Santo Agostinho, Samuel Puffendorf, etc.

● Teoria da norma-base (1881/1973): Desenvolvida por Kelsen, que entendia que a

ordem jurídica é uma superposição de normas, em que a validade de uma inferior

deriva da que lhe é superior. A norma hipotética é a pedra angular de todo o

ordenamento. O DIP se fundamentaria nessa norma também, pois para tal teoria não

existe distinção entre a norma jurídica interna e externa.

● Teorias sociológicas do Direito: Tendo como representantes Leon Duguit e Georges

Scelle. Para eles, o Direito não seria produto da vontade humana, mas uma

necessidade advinda de fatores sociais, e teria como fundamento a solidariedade ou

interdependência entre os homens.

● Teoria do “pacta sunt servanda”: Formulada por Dionísio Anzilotti, para quem o

DIP encontra-se alicerçado no princípio que estabelece a obrigação de as partes

respeitarem e cumprirem o que foi contratado.

A visão moderna, por sua vez, tende a conciliar as doutrinas voluntarista e objetivista,

como se observa através de uma série de atos neste sentido. A Convenção de Viena, de 1969,

por exemplo, consagrou a regra do pacta sunt servanda, mas ao mesmo tempo reconheceu a

existência de normas imperativas de direito internacional geral da qual nenhuma derrogação é

possível, a não ser por normas de igual natureza. São as chamadas normas jus cogens, que

não podem ser violadas por nenhum tratado internacional, sob pena de nulidade.

1.2.4. Fontes de Direito Internacional Público

Para o direito, fonte é aquilo que o produz, são os motivos que levam ao aparecimento

da norma jurídica, podendo ser materiais ou formais.

● Convenções Internacionais ou Tratados: São acordos formais, realizados por


Estados e organizações internacionais para regular o tratamento de temas de interesse

21
comum. Ainda que existam desde a Antiguidade, começaram a firmar-se como fonte
por excelência de Direito Internacional apenas a partir da Paz de Vestfália,
substituindo paulatinamente o costume como fonte mais empregada no Direito
Internacional. Possuem diversas terminologias sinônimas, sendo essas as mais
comuns.
● Costume Internacional: Os costumes internacionais são o conjunto de normas
consagradas pela prática reiterada ao longo do tempo nas relações internacionais, que,
para o senso geral, tornam-se obrigatórios. Apesar da moderna tendência de
codificação dos costumes e normas internacionais, essa fonte é de grande relevância
para o DIPU porque não existe ainda um centro integrado de produção de normas
jurídicas que atue em nível mundial e por estabelecer um corpo de regras
universalmente aplicáveis.
● Princípios Gerais do Direito: Os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas
nações civilizadas, são fontes do DIP obrigatórias para todos os Estados. São
conceitos, entendimentos, pressupostos jurídicos (codificados) que alicerçam as
normas de convivência entre os Estados e as organizações internacionais.Esses
princípios também são adotados no âmbito interno, ou seja, também regulam as
relações entre os cidadãos e norteiam o ordenamento jurídico de cada país.

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969) elenca os princípios

estabelecidos internacionalmente e de adopção obrigatória pelos Estados em seu art. 53:

● Não Agressão;
● Solução Pacífica dos Litígios entre Estados;
● Autodeterminação dos povos;
● Boa-fé no Cumprimento das Obrigações Internacionais;
● Não Intervenção Nos Assuntos Internos dos Estados;
● Cooperação Internacional;
● Pacta Sunt Servanda.

1.2.5. Sujeitos de Direito Internacional Público

22
De acordo com Francisco Rezek, para que alguém seja qualificado como pessoa

jurídica de direito internacional, é necessário que essa pessoa possa agir no plano

internacional. Isso significa poder ser titular de direitos e deveres internacionais e possuir

capacidade de defender seus direitos por meio de ações internacionais. Pessoas jurídicas de

direito internacional, segundo essa visão, seriam os Estados Soberanos e as organizações

internacionais. Contudo, a crescente complexidade das relações internacionais tem

ocasionado importante transformação na sociedade internacional.

● O Estado: Ente composto por um território onde vive uma comunidade humana
(povo) governada por um poder soberano (governo soberano) e cujo aparecimento
não depende da anuência de outros membros da sociedade internacional. Logo,
afirma-se que os Estados têm personalidade internacional originária (o surgimento do
DIP está estreitamente vinculado à consolidação do Estado).
● Organizações Internacionais: Trata-se da criação de entidades capazes de articular
os esforços dos Estados, dirigidos a atingir certos objetivos (esquemas de
cooperação). São entidades criadas e compostas por estados por meio de tratado
(personalidade jurídica própria), possuindo, portanto, personalidade internacional
derivada. Como exemplos, podemos citar a ONU, a OTAN, o Banco Mundial, etc.
● Indivíduo: Durante muito tempo, a doutrina não conferia ao indivíduo o caráter de
sujeito de DI. Partia-se da premissa de que a sociedade internacional era meramente
interestatal. Entretanto, a doutrina vem paulatinamente rendendo-se à evidência de
que o indivíduo age na sociedade internacional. Sua personalidade internacional ainda
é contestada. Contudo, não se pode negar que há um significativo rol de normas
internacionais que aludem diretamente a direitos e obrigações dos indivíduos.
● Organizações sem fins lucrativos: São entidades privadas sem fins lucrativos que
atuam em áreas de interesse público, promovendo a aplicação de normas
internacionais em vários campos. Algumas participam de organizações internacionais
como observadoras. Podem recorrer a determinados foros internacionais em defesa de
direitos ou interesses vinculados a suas respectivas áreas de atuação. As ONGs não

23
possuem personalidade jurídica de direito internacional, com exceção da Cruz
Vermelha.
● Empresas: Actualmente começa-se a admitir a personalidade jurídica das empresas,
sobretudo as transnacionais. Isto porque as empresas sujeitam-se e beneficiam-se
diretamente de normas internacionais, através da adoção de padrões mínimos e da
participação no comércio internacional. Em casos específicos têm acesso inclusive a
mecanismos internacionais de solução de controvérsias, como o MERCOSUL.
● Santa Sé e Estado da Cidade do Vaticano: Santa Sé e o Vaticano são dois entes
distintos, que têm em comum o vínculo com a Igreja Católica Romana e a
controvérsia em relação à personalidade jurídica internacional de ambos.
● Blocos Regionais: São esquemas criados por tratados entre Estados para promover a
integração de suas economias e sociedades. Ex.: União Europeia, o Mercosul, Área de
Livre Comércio da América do Norte (NAFTA). A personalidade jurídica dos blocos
é conferida por meio dos tratados, ou seja, depende dos interesses de seus integrantes.
É possível que nem todos os blocos regionais sejam sujeitos de DIP.

1.3. Diferenças entre Direito Internacional Público e Direito Internacional


Privado

Como vimos, Direito Internacional Público é o ramo do direito que tem por objectivo

promover a regulação da sociedade internacional, buscando a convivência pacífica dos

seus membros e a promoção da cooperação internacional com vistas a encontrar soluções

para os problemas comuns da humanidade. Trata-se do ordenamento jurídico da sociedade

internacional, que visa tutelar (proteger) assuntos de interesse internacional.

Por sua vez, o Direito Internacional Privado, é um ramo do direito cujo objectivo é

solucionar os conflitos de leis no espaço em relações de natureza privada que possuem

conexão internacional.

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Logo, ao contrário do que muitos pensam, a resposta para esta pergunta é facilmente

encontrada na leitura de suas definições e aplicações, não sendo o Direito Internacional

Privado, ramo do Direito Internacional Público.

As regras do Direito Internacional público são estabelecidas pelos Estados e

organizações internacionais, por meio de negociações ou de outros processos (fontes de

direito internacional).

As normas de Direito Internacional Privado podem originar-se de fontes de Direito

Internacional Público, como os tratados, mas normalmente são preceitos de Direito interno,

estabelecidos pelos próprios Estados, que assim decidem livremente qual a regra, nacional ou

estrangeira, que se aplicará às relações jurídicas privadas com conexão internacional.

Em síntese, o professor Alberto do Amaral Júnior aduz que:

O direito internacional público e o direito internacional privado teriam assim objetos

próprios e fontes diversas. O primeiro abrange as relações interestatais e os

conflitos entre soberanias, tendo como fonte principal os tratados e as

convenções internacionais. O segundo funda-se na legislação interna dos

Estados; as matérias que lhe dizem respeito versam sobre as relações entre os

sujeitos privados, das quais não participa o Estado na qualidade de ente

soberano. No direito internacional público, a verificação da observância dos

tratados compete aos órgãos internacionais que recebem esta função, ao

passo que o controle de legalidade no direito internacional privado é

atribuído ao Judiciário de cada país.”

Cumpre ressaltar, por fim, que determinadas situações podem ser reguladas por ambas

as matérias, como é o caso de operações comerciais às quais podem ser aplicadas normas de

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DIP estabelecidas pela Organização Mundial de Comércio (OMC), como regras de Direito

Internacional Privado.

CONCLUSÃO

Contudo pude perceber que o tema Direito Internacional Privado e Direito


Internacional Público, é um tema muito transversal que tem incidência desde os indivíduos
pertencentes a países distintos, propriamente dito até aos Estados, regulando relações entre
sujeitos de ordenamentos jurídicos distintos, versando o envolvimento de dois ou mais
ordenamentos jurídicos.

Direito Internacional Público é matéria de enorme importância para o desenvolvimento


das relações internacionais, devendo pautar a conduta de Estados e da sociedade internacional
em diversas áreas, fornecendo referências para o tratamento de temas como a proteção dos
direitos humanos, a proteção do meio ambiente, a protecção do trabalhador, a participação no
comércio exterior
As relações entre países, seja no âmbito político, econômico ou cultural, precisou ser
organizada da forma como vemos hoje, pois com a evolução dos Estados, das indústrias e da
tecnologia, as nações começaram a se aproximar e criar relações mais estreitas, duradouras e

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pacíficas, contribuindo para aperfeiçoar o conceito de para estes dos polos do Direito
Internacional, sendo no âmbito Público e Privado.

Por essa peculiaridade os ramos do saber jurídico autonomizou pela sua importância de
se estudar a forma como os países e indivíduos estrangeiros se relacionam entre si. Para o
Direito Internacional Público a relação jurídica: Trata das relações exteriores entre os atores
internacionais (sociedade internacional), compondo tensões; tendo enquanto fonte, principal
são os tratados e fontes internacionais. Suas regras são: 1) vinculam as relações internacionais
ou internas de incidência internacional; 2) são estabelecidas pelas fontes internacionais; 3)
são normas de aplicação directa, vinculando diretamente os sujeitos.

Diferenciando do Direito cito anteriormente, o Direito Internacional Privado que a


sua relação jurídica versa, sobre o tratamento das relações jurídicas entre os sujeitos privados
com conexão internacional, regulando conflitos de leis no espaço. Sua fonte: legislação
interna dos Estados. Regras: normas indicativas de qual Direito aplicável nas relações entre
os sujeitos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BREGALDA. Gustavo. Direito internacional público & direito internacional privado –


São Paulo: Atlas, 2007.

BREGALDA. Gustavo. Direito internacional. São Paulo: Saraiva, 2009. (Coleção


OAB Nacional).

SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.
VARELLA, Marcelo Dias. Direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 2009.

SAVIGNY, Friedrich Carl von. Sistema do direito romano atual. Trad. por Ciro
Mioranga. Ijuí: Unijuí, 2004.Volume VIII.
SYMENONIDES, Symeon C. Codifying choice of law around the world. New York: Oxford
University Press, 2014.

27
VALLADÃO, Haroldo. Le droit international privé des états américains. Recueil des Cours
de l´Académie de Droit International de la Haye, vol. 81, 1952, pp. 1-115.

https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/503/edicao-1/direito-internacional-privado

https://www.inesul.edu.br/professor/arquivos_alunos/doc_1558818854.pdf

Legislações

Constituição da República de Angola, 2021.


Código Civil Angolano.
Tratados Internacionais e Convenções.

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