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Profissional do
Advogado:
Teoria e Prática
Formação CE2023/2024
Moura Santos
Advogado e formador do Conselho Regional de
Lisboa da Ordem dos Advogados
(mourasantos-6649l@advogados.OA.pt)
Bibliografia
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Índice
Siglas e Abreviaturas 4
Agradecimento 7
1. A deontologia profissional 8
2. O advogado 9
3. A advocacia como actividade de interesse público e de utilidade social 14
4. A deontologia na vertente dos direitos profissionais 15
5. O direito de protesto 18
6. O princípio da integridade 18
7. O dever de isenção 19
8. O princípio da confiança 22
9. O princípio da independência 25
10. As fontes da deontologia profissional 27
3
28. As incompatibilidades e os impedimentos 161
29. O conflito de interesses 170
30. Os honorários 184
31. Valores, documentos e fundos dos clientes 195
32. Os deveres de reserva, cooperação, lealdade, urbanidade e solidariedade no
relacionamento do ADV com a Ordem, Tribunais, os Clientes e os Colegas
196
33. A publicidade 206
34. A discussão pública de processos pendentes 213
35. A acção, responsabilidade e tramitação do processo disciplinar 223
36. A responsabilidade civil profissional do advogado 233
37. A previdência dos advogados 241
4
Siglas e Abreviaturas
5
RJAAS – Regime jurídico dos Actos de Advogados e Solicitadores, Lei nº 10/2024
de 19-01
RLH – Regulamento dos Laudos dos Honorários
STJ – Supremo Tribunal de Justiça
TRC – Tribunal da Relação de Coimbra
TRE – Tribunal da Relação de Évora
TRG – Tribunal da Relação de Guimarães
TRL – Tribunal da Relação de Lisboa
TRP – Tribunal da Relação do Porto
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Agradecimento:
“São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses
guardaram no fundo da alma a força que verdadeiramente me anima e que mais
desejaria transmitir-lhes: a de não se conformarem”.
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1. A Deontologia Profissional
“Há inconvenientes da vida em que o silêncio ou o abandono são mais cruéis que
a própria vida. Nesses momentos, o Advogado convertido numa sombra de
lealdade e de companhia, desempenha uma das mais subtis e espirituais facetas
da sua missão sempre eminentemente humanista.”
Martinez Val, in El Abogado, Alma y Figura de la toga
8
existem cerca de 16 vezes mais advogados do que juízes num universo de 100 mil
habitantes.
A Deontologia é um código de conduta ética profissional (conjunto de normas
jurídicas) que regulam a conduta do ADV no acesso e exercício da profissão junto
da sociedade e também o seu comportamento cívico e público.
2. O Advogado
“Onde reina a força, o direito não tem lugar”.
(provérbio popular)
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Giuseppe Agnelli (1921-2003), o famoso milionário patrão da FIAT, não obstante
se ter destacado mundialmente como um poderoso empresário do ramo automóvel,
gostava de ser apelidado de “L´Avvocato”, apesar de apenas ter sido licenciado em
direito, nunca tendo exercido advocacia.
Foi com o Decreto 15:344 de 12-04-1928 (Estatuto Judiciário) que o ADV começou
a identificar-se com uma cédula profissional.
No dia 1 de novembro de 1923, inscreveu-se no Conselho Distrital de Lisboa da
Ordem dos Advogados a Dr.ª Regina Quintanilha, primeira advogada portuguesa.
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as garantias de defesa. E a primeira garantia de uma defesa é precisamente a de
que os cidadãos sejam representados competentemente por um advogado, que
efectivamente os defenda, em vez de ajudar à sua condenação.
Pelo contrário, ao Ministério Público compete exercer a acção penal orientada pelo
princípio da legalidade, sendo para esse efeito que apresenta a acusação. Mas o
Ministério Público é composto por magistrados, que têm o dever de inclusivamente
propor a absolvição dos arguidos se não houver provas de que praticaram o crime.
É por isso que vemos com grande apreensão a recente notícia de que foram dadas
instruções a magistrados para que não pedissem a absolvição dos arguidos nos
processos mediáticos, como se o facto de um processo ser mediático justificasse
uma alteração do comportamento processual de um magistrado perante as provas
produzidas em julgamento.
Só que a função dos magistrados é diferente da dos advogados e a estes compete
defender o seu constituinte, independente do juízo que a opinião pública faz dele.
Já houve muitos processos em que o arguido estava condenado na comunicação
social e na opinião pública e foi depois absolvido em tribunal, porque teve um
advogado que o soube defender. Recordemos o dramático caso de Asia Bibi, a
mulher cristã condenada à morte no Paquistão porque tinha bebido água de uma
fonte reservada a muçulmanos, o que foi considerado um acto de blasfémia, que
suscitou indignação geral. Essa mulher passou oito anos no corredor da morte e só
foi libertada no início deste ano porque o seu advogado Saif-ul-Malook, muçulmano,
conseguiu reverter a sua condenação com fundamento na insuficiência de provas.
É essa a função nobre do advogado: lutar pela justiça e defender o seu cliente,
mesmo quando uma turba pretende a sua condenação.
É preciso, por isso, que todos respeitem o trabalho dos advogados em defesa dos
seus constituintes, independentemente da avaliação que a opinião pública faça dos
factos pelos quais os visados são acusados. Ninguém está livre de um dia ter
qualquer problema judicial e, nessa altura, quererá seguramente ter um advogado
que o defenda eficazmente em tribunal”.
Jornal I, 03/12/2019
https://ionline.sapo.pt/artigo/678892/-a-funcao-dos-advogados?seccao=Opiniao_i
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Mas com o passar do tempo os advogados passaram a criar ‘necessidades’.
A inventar formas de se tornarem necessários em todos os assuntos.
E agora para tudo é preciso um advogado: para fazer um contrato, para tratar de
um negócio, para levantar um processo disciplinar, para negociar um
despedimento, para tratar de um divórcio, para fazer uma partilha, para reivindicar
uma herança, para meter um requerimento, para fazer uma queixa, para discutir a
tutela de um cão, etc., etc., etc.
Do mesmo modo, não acredito que a juíza da ‘viúva Rosa’ acredite na sua
inocência. A tese de que foram uns angolanos a matar o marido roça o patético. O
seu fingimento a colar papeis nas paredes dando o marido como desaparecido,
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quando já sabia que ele estava morto, é suficientemente eloquente para mostrar o
seu caráter e a sua culpabilidade.
Também não acredito que a advogada que defendeu a mulher que matou a mãe
adotiva acreditasse na sua inocência; ou que os advogados dos energúmenos que
foram a Alcochete acreditem na inocência dos seus clientes; ou que os advogados
de Sócrates achem que ele é inocente.
Cabe na cabeça de alguém que um indivíduo, por muito amigo que seja de outro,
lhe passe para as mãos centenas de milhares de euros sem qualquer documento
comprovativo? E que a mãe de Sócrates tivesse um milhão de contos fechado num
«enorme cofre» e lhe desse aos 10 mil euros para ele ir de férias (numa altura em
que ela própria vivia com dificuldades)? E que ele fosse para férias com 10 mil
euros em notas nos bolsos? Alguém pode acreditar nesta história?
Julgo que estes advogados, e outros, estão a fazer um mau papel. Em vez de
contribuírem para se fazer melhor justiça, estão a tentar que não se faça justiça.
Estão a desacreditar-se.
Mas pedirem a absolvição de réus que são obviamente culpados, isso é que não
faz sentido.
13
https://dre.pt/dre/detalhe/acordao-supremo-tribunal-justica/15-2016-105322293
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exercício da profissão, coloca a discussão de saber se constitui a melhor forma de
defesa dos interesses e direitos fundamentais dos cidadãos, ou se atenta contra a
essência da advocacia.
A defesa não pode ser assegurada por qualquer um. Não é meramente técnica e
burocrata; é de causas e tem um carácter humanista. É independente.
Logo, o estatuto tem de garantir a competência técnico-ciêntifica, independência,
honorabilidade, dignidade e responsabilidade profissional (por exp. na questão dos
honorários).
A essencialidade social do Advogado é evidente na necessidade de intervenção de
Advogado em praticamente todas as causas cíveis (artigos 32º e 60º do Código de
Processo Civil) e, como defensor do arguido, em todos os processos criminais
(artigos 61º, nº 1, al. d), 62º e 64º do Código de Processo Penal), bem como na
jurisdição administrativa. Cfr. ainda o art. 32º da CRP.
O ADV exerce essa função social enquanto representante dos cidadãos junto da
administração da justiça e da administração pública.
Quando actuam sem o acompanhamento e aconselhamento do advogado, os
cidadãos cometem erros e sofrem os prejuízos inerentes, quando não mesmo a
perda da causa, que normalmente não incorreriam se tivessem sido aconselhados
do ponto de vista jurídico.
Um processo judicial desenrola-se em obediência a normas jurídicas. Daí decorre
a exigência de representação dos cidadãos por pessoa idónea legalmente
habilitada no conhecimento do direito – por via de regra o advogado – que possa
agir com zelo na defesa dos interesses do seu representado.
15
- o direito de protesto (art. 80º), caso contrário: Juiz não permite que o ADV faça
um requerimento para o ofender (art. 150º CPC);
- art. 184º (direito de reunião nas salas dos tribunais);
- direito à renúncia ao mandato;
- Ver ainda o conteúdo informativo constante do verso da cédula profissional do
ADV
O ADV pode requerer a intervenção da OA para defesa dos seus direitos ou dos
legítimos interesses da classe, como por exemplo, a dignidade da advocacia (arts.
71º e 5º).
16
qualquer violação dos Direitos e Prerrogativas da profissão, pois só uma Advocacia
atenta, unida e interventiva poderá defender devidamente a Dignidade da profissão.
17
João Massano
Presidente”
5. O Direito de Protesto
6. O Princípio da Integridade
18
Como refere António Arnaut (EOA Anotado, pág. 89, nota 5), “A conduta do ADV
pode afectar a sua dignidade profissional, quando for publicamente desprimorosa,
desonrosa ou lesiva da classe”.
Ver art. 88º - dever de integridade/comportamento público.
A actuação do ADV em cumprimento das regras éticas-sociais, prestigia o próprio
e a profissão.
O ADV não é um super-homem e como ser humano tem as suas próprias
fragilidades.
Contudo, a seriedade do ADV é, sem dúvida, a par da sua competência técnica-
profissional, um elemento essencial para poder ser respeitado e procurado pela
comunidade e fazer assentar a relação com o cliente na base da confiança.
O contrário representa o descrédito da pessoa, da classe e da justiça perante os
cidadãos.
(exemplos: advogado assassino, alcoólico, burlão, chantagista, arruaceiro, etc.),
que trazem a conduta desonrosa do ADV fora do exercício da profissão para o
campo da falta disciplinar, como já se referiu.
A advocacia livre, porque praticada em concorrência, encerra em si um perigo: se
não existirem regras de conduta colectivamente assumidas, pode pôr em causa a
profissão. O ADV existe para servir a justiça e para isso tem de haver regras.
“O ADV serve a justiça. Se não, é um mercenário.” (António Arnaut).
O ADV que se vende por dinheiro e para isso desvaloriza a sua consciência
Veja-se o art. 90º, nº 2, al. b), inserido no elenco dos deveres para com a
comunidade e que visa proteger o dever de integridade (art. 88º).
Os tribunais e quaisquer autoridades devem dar conhecimento do ADV à OA de
todos os factos suscetíveis de constituir infração disciplinar praticados por
advogados: arts. 121º e 150º, nº 4 CPC, por força do sistema colegial da advocacia
que vigora em Portugal.
O nosso Estatuto contempla um processo especial administrativo de averiguação
de inidoneidade para o exercício da profissão (arts. 177º a 179º e 188º), sempre
que estiver em causa o dever de integridade ou probidade a que se refere o art.
88º.
7. O Dever de Isenção
O ADV tem de ser isento a par da sua integridade, que deve acompanhar a
assunção plena do patrocínio técnico-jurídico, por forma a assegurar a confiança
necessária dos cidadãos no funcionamento da justiça.
Exemplos da isenção do ADV: arts. 81º, 110º, nº 2, ou ser testemunha do colega
que patrocina a parte contrária para prova da obstaculização pelo juiz do exercício
do direito de protesto.
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Decorre também do dever de isenção a proibição de falar com as testemunhas de
forma a distorcer a prova e alterar a verdade dos factos.
A independência e a liberdade do ADV são essenciais para a defesa dos direitos
humanos – arts. 81º, nº 1 e 90º, nº 1 – liberdades e garantias dos cidadãos – pelo
que está a sua actividade subordinada a normas imperativas e éticas (arts. 83º, nº
1, 88º, 89º, 97º, 106º e 110º, nº 2).
“Em contrapartida das prerrogativas concedidas, a lei impõe aos advogados não
apenas uma adequada idoneidade científica e técnica, mas também deontológica,
que se encontra devidamente regulada. Vale isto por dizer que as prerrogativas
conferidas têm como reverso exigências de disciplina profissional imposta e
controlada por razões de interesse geral”, Santos, Filipe Matias, in “O Advogado
interno (in-house lawyer): estatuto e particularidades do segredo profissional, in
Estudos sobre Law Enforcement, Compliance e Direito Penal, Almedina, 2018, pág.
181.”
Por isso a Deontologia é um ramo de direito profissional autónomo, com normas
tipificadas e não um simples regulamento de deveres, sendo uma lei emanada da
AR (art. 165º, nº 1, al. s) CRP) e as correspondentes infrações dão origem a um
processo disciplinar, que é da competência exclusiva do OA. Essas normas
jurídicas estão explanadas, designada e principalmente nos arts. 66º 60º e 88º a
113º.
A responsabilidade disciplinar do ADV (art. 115º e segs.) é um imperativo da tutela
do interesse público prosseguido.
O ADV é o intermediário entre os cidadãos e a função jurisdicional do Estado,
evitando conflitos extrajudicialmente (cfr. art. 100º, nº 1, al. c) ou representando o
seu patrocinado em juízo, com competência e com consciência ética e integridade.
O advogado tem, assim, um papel importante na paz e equilíbrio social.
O ADV faz a ponte entre o cliente e a Justiça, bem como a administração pública.
Não deve fazer entre aquele e o mundo criminal.
Daí decorre que o respeito pela função social do ADV é uma condição essencial
para a garantia do estado de direito democrático (por isso o consagrado no art. 208º
CRP, sendo que a Justiça é uma das áreas de soberania do Estado.
Se os tribunais são o garante de um Estado de Direito, o advogado desempenha
um papel essencial para esse desiderato, sendo considerado constitucionalmente
como elemento essencial à administração da justiça (art. 208º). É um elemento
coadjuvante da função da soberania da Justiça que compete ao Estado.
Contudo, o ADV não faz parte do aparelho judiciário, mas do sistema judicial, isto
é, os Advogados fazem parte dos Tribunais enquanto órgãos de soberania, sendo
necessários ao seu funcionamento (cfr. arts. 12º e 13º da LOSJ).
“Fazemos parte da identidade de um Estado de Direito são e seguro. Por isso,
reiteramos a importância do papel do Advogado enquanto operador judiciário e
agente da Justiça, o qual é determinante para os cidadãos e, por conseguinte, para
toda a sociedade!” – Comunicado do CRL de 18-01-2021.
Para isso o ADV tem de ser sério, ter autoridade moral (exp. do ADV que emite
cheques sem provisão: choca a comunidade; que se embriaga publica e
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frequentemente: não se pode esquecer que a nossa actividade é normalmente
exercida nos tribunais e outros locais públicos. Estamos assim sujeitos ao juízo
crítico dos demais intervenientes na lide. O ADV não perde a sua qualidade à mesa
do restaurante.
Assim, os actos da vida privada do ADV em princípio só a ele dizem respeito: só
podem desencadear um processo disciplinar se constituírem um comportamento
público que implique desconsideração, lese a profissão e a Ordem (ver art. 88º, nº
1), sob pena de se pôr em causa o direito constitucional à protecção da intimidade
da vida privada ou o direito ao livre desenvolvimento da personalidade (art. 26º
CRP).
Também daí decorrem os deveres de urbanidade e o de correção (arts. 95º e 110º),
que são o contraponto do direito consagrado no art. 69º.
A defesa da Advocacia faz-se pela valorização da profissão e da imagem do
Advogado. Cabe ao próprio ADV a responsabilidade de dar o melhor contributo
para melhorar a reputação e dignidade da classe.
No dia a dia, o ADV encontra obstáculos no exercício da sua missão.
A dicotomia interesse dos cidadãos versus ideais da justiça que são o leitmotiv da
profissão nem sempre se harmoniza entre si, colocando o ADV numa situação
dilemática.
Por um lado, está mandato para defender o cliente, a sua causa. Não pode actuar
contra este; por outro, está subordinado a normas imperativas e éticas arts. 88º, nº
1, 60º, 97º, 106º e 110º, nº 2. Nesse dilema tem especial acuidade o princípio da
independência do ADV de que se abordará mais tarde.
Acresce que o ADV enfrenta a má vontade por parte de alguns funcionários e
magistrados.
O ADV não deve ser visto como um empecilho, pois não pode ser cego, mudo nem
surdo.
Afastar o ADV (através da desjudicialização, entendida como a criação de
instrumentos e formas de resolução de conflitos não jurisdicional em que os
cidadãos estão desacompanhados de técnicos de direito, podendo aqueles ficar
fragilizados na resolução do conflito e que é justificada por razões de combate à
morosidade e à elevada pendência processual) traz sempre prejuízos para o
cidadão e para a própria justiça, menorizando-o.
É, pois, necessária uma mudança de mentalidades (exp.: juiz que folheia o
processo ou conversa com o colega alheio ao que o ADV, naquele momento, alega)
e, como forma de não diminuir os direitos das partes, garantir que o recurso a
sistemas alternativos de resolução de conflitos possibilite a presença obrigatória de
Advogado ou Solicitador.
No entanto, existe outro problema na Justiça, que tem a ver com as custas judiciais
(taxas de justiça, perícias, etc.), que é aquilo que o cidadão e as empresas pagam
quando recorrem aos serviços dos tribunais do Estado e que é exorbitante.
Exceptuando as situações de apoio judiciário, verifica-se que é a classe média a
mais atingida por esses custos.
21
Tito Arantes Fontes, in:
https://www.publico.pt/2023/01/29/economia/entrevista/falacia-dizerse-existe-
justica-administrativa-portugal-2036507
“Por exemplo, as custas de um processo em torno dos 300 mil euros, para quem o
perde com um recurso, ascendem a cerca de 10 mil euros, mais honorários dos
advogados. O valor a pagar pode ultrapassar os 25 mil euros. As pessoas
assustam-se e desistem de meter processos na Justiça, nem procuram advogados.
Se o valor for de 500 mil ou de um milhão, as custas judiciais pulam para 20 mil ou
para 50 mil, isto sem honorários de advogados, e as PME não aguentam.”
8. O Princípio da Confiança
É uma matéria que deve ser complementada com a que será aflorada adiante a
propósito da relação entre ADV e cliente.
Voltamos à pergunta atrás formulada: de que esperamos do advogado? A
confiança.
A confiança, por um lado, nasce da autoridade que lhe advém do conhecimento
técnico (arts. 81º nº 1, 98º nº 2 e 100º, nº1, al. b).
Por outro, o de estar vinculado à deontologia (por exemplo, respeitar o segredo
profissional) sendo que o exercício da profissão está regulamentado em função da
confiança (arts. 97º e 98º).
A integridade do ADV (art. 88º) é essencial para assentar a relação de confiança
(por exemplo na fixação dos honorários, na prestação atempada do dever de
informação ao cliente, em não o iludir quanto às possibilidades reais de vencimento
da causa, etc.).
Sem essas qualidades do ADV não há confiança.
Acresce que só pode existir confiança se a honorabilidade, a honestidade e a
integridade do ADV existirem perante o cliente.
Para além de virtudes profissionais, são obrigações profissionais (cfr. também o art.
2.2. CDAE).
A confiança ou se tem, ou não se tem.
O ADV não é apenas um defensor de causas, pleiteando-as; é também um
conselheiro e confidente do cliente.
Decorre do art. 97º que o ADV não pode agir como agente encoberto, no âmbito da
investigação criminal (ver Parecer do CDL, consulta nº 29/2009, em que se
pretendia ver esclarecida a seguinte questão: Em que circunstâncias, e sob que
regras, um advogado no exercício da sua actividade profissional pode actuar em
concertação com as autoridades judiciárias, desempenhando o papel de agente
“encoberto”, em processo pendente onde está formalmente constituído
mandatário?).
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A confiança é, por conseguinte, indissociável do dever de integridade, que proíbe
uma actuação oposta aos compromissos do ADV para com o Direito e a Justiça
(art. 88º): exp.: proposta desonesta do cliente ao ADV que vai contra o Direito e a
Justiça (defender um sequestro praticado pelo cliente – se o ADV aceita, está a
violar esse dever, bem como os deveres para a com a comunidade (art. 90º, nº 1 e
2, als. a), c) e d).
A confiança é também o suporte essencial do segredo profissional (ponto 2.3.1. do
CDAE).
A confiança começa na livre escolha do mandatário – arts. 97º, 98º, nº 1, 67º, nº 2
e 90º, nº 2, al. h), estando vedado ao ADV a aceitação do patrocínio quando este
não tenha sido pessoal e livremente mandatado pelo seu cliente, nomeadamente
para evitar a angariação de clientela.
Obviamente que essa regra sofre a excepção no tocante ao regime das nomeações
de advogados oficiosos, decorrentes do instituto do acesso ao direito.
Correspectivamente, o advogado tem o direito de escolher livremente os seus
clientes, com base na confiança que deve existir entre aquele e estes, não sendo o
escritório de advogado um estabelecimento comercial de contacto directo com o
público.
Ao aceitar um patrocínio, estão cumulativamente a desempenhar um papel
essencial na administração da justiça e na realização do interesse público (arts. 88º
e 90º).
O ADV deve manter uma relação pessoal com o cliente, tendo em vista garantir,
nomeadamente, os deveres deontológicos de informação, acompanhamento e
tratamento do caso com zelo e diligência, aconselhamento e harmonização do
conflito (art. 100º).
Mais vale um mau acordo do que uma boa demanda, diz o provérbio popular.
O Advogado deve aconselhar o cliente não só para facilitar como para procurar que
as partes se componham, aconselhando-lhe prudência e moderação, acalmando-
lhe os seus ódios e paixões.
É livremente revogável o mandato (arts. 1170º CC e 47º CPC), mas já não a
renúncia ao mesmo por parte do ADV, que só o poderá fazer com um motivo
justificado (art. 100º, nº 1, al. e).
Artigo 1170.º
(Revogabilidade do mandato)
1. O mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante
convenção em contrário ou renúncia ao direito de revogação.
2. (…)
Ao passo que o ADV só pode renunciar ao mandato quando exista motivo
justificado (art. 100º, al. e) face ao interesse público da profissão.
O mandato forense é um contrato típico, com especificidades, como o limite à
publicidade, à discussão das questões pendentes, proibição da angariação de
23
clientela, o regime de impedimentos e incompatibilidades, a proteção do segredo
profissional, regras sobre honorários, obrigatoriedade de inscrição na AO, deveres
para com a comunidade, etc.
24
assunto, desde que o primeiro advogado o consinta, por desígnio próprio ou a
solicitação do cliente.
Se o cliente consultar outro causídico sem o consentimento expresso do advogado
constituído, pode entender-se como quebra da confiança e violação da convenção
jurídica estabelecida entre ambos, motivo de cessação justificada do patrocínio.
Sempre que aparecer um cliente a solicitar uma segunda opinião, o advogado deve
perguntar-lhe primeiro se a consulta se realiza com o consentimento expresso do
advogado constituído.
Na falta desse consentimento, deve o advogado abster-se de intervir, excepto se
aceitar tomar conta do assunto em substituição do anterior colega, caso em que
deve primeiramente cessar a relação jurídica constituída e lançar mão do disposto
no art. 107.º, n.º 2 do EOA.
O advogado que der uma segunda opinião consentida deve proceder com a maior
correcção e urbanidade, abstendo-se de qualquer ataque pessoal, alusão
deprimente ou crítica desprimorosa, de fundo ou de forma relativamente ao colega
titular do assunto – arts. 90.º, 106.º e 107.º, n.º1, a) do EOA. 1.”
9. A Independência do Advogado
“A advocacia é a mais bela profissão do mundo.”
Voltaire
Art. 89º:
O advogado deve agir de forma livre de qualquer pressão, designadamente do seu
cliente.
25
Quanto a este deve defender os legítimos interesses, mas sem prejuízo das normas
legais e deontológicas que regem a sua actividade profissional – art. 92º, nº 2 EOA.
Os advogados mais antigos costumam dizer que o principal adversário do ADV é o
cliente. Sem querer generalizar, é um facto que muitas vezes deparamos com
atitudes de ingratidão e de má índole da parte deles. Se o desfecho da sua causa
lhe fôr favorável, o ADV é elevado aos píncaros. Mas se tal não acontece, mesmo
por razões alheias à actuação do ADV, arriscamo-nos a ouvir que este foi
“comprado” pela parte contrária, ou agiu, em qualquer caso, contra os interesses
do cliente e por isso foi prejudicado.
Existem clientes que parecem fazer da litigância modo de vida, mesmo contra os
seus advogados. O Conselho de Deontologia de Lisboa tem situações em que uma
mesma pessoa apresenta compulsivamente participações contra vários
advogados, chegando a haver quem o fez 43 vezes (!) contra outros tantos
advogados.
O ADV confronta-se igualmente com a falta de pagamento dos seus honorários e
despesas por parte de alguns desses clientes.
O ADV deve obediência à lei (art. 90º) é um servidor da justiça, tendo deveres para
com a comunidade (exp. não aceitar patrocínios de causas que considere injustas
(art. 90º nº 2 a) e b) ou de não entorpecer a descoberta da a verdade, proibição da
quota litis (art. 106º), goza de autonomia técnica (art. 76º nº 1) e pode exercer o
direito de protesto (art. 80º).
A independência e a liberdade do ADV perante qualquer entidade pública ou
privada são essenciais para a defesa dos direitos humanos – art 81º, nº 1 –
liberdades e garantias dos cidadãos.
A liberdade de expressão e de actuação no exercício do patrocínio e do mandato
forense é um instrumento dessa mesma independência do advogado (art. 110º, nº
2 e 150º, nº 2 CPC e 326º CPP) e que decorrem das imunidades necessárias ao
exercício eficaz do mandato, constitucionalmente consagradas.
A actividade do ADV não pode reger-se por princípios de subordinação ou de
vinculação hierárquica nem por deveres de obediência, que possam coarctar a
liberdade e independência no momento de tomar decisões e na forma de actuar
(artigo 81º n.º 2). O exercício da advocacia será, então, incompatível com
actividades ou funções que possam coarctar a independência do Advogado.
A independência é diferente da imparcialidade – característica que não é do
advogado, pois defende a causa do cliente – mas o ADV deve exigir correcção por
parte do cliente, sendo isento (art. 97º, nº 2).
Deve ser independente perante o cliente, magistrados, colegas, etc., actuando
sempre segundo a sua consciência e os valores éticos da sociedade.
Daí resulta a confiança do cliente e da comunidade.
O Advogado não o é do cliente, mas dos interesses legítimos do cliente.
26
Veja-se também, como corolário do princípio da independência, o estatuído nos
arts. 66º, nº 3, 69º, 73º, 81º, nº 2 e 4, 100, nº 1, al. a), c) e d), pontos 2.1. e 1.2. do
CDAE e arts. 12º, nº 3 e 13º, nº 1 e 2 da LOSJ.
Cfr. as hipóteses de exame: 18-12-2015, 30-10-2020;09.06.2022
Onde está corporizado esse acervo de normas que o interesse público e utilidade
social da profissão justificam?
https://www.ministeriopublico.pt/iframe/constituicao-da-republica-portuguesa
Acerca dos limites dessas imunidades, veja-se o Ac. do TRE de 22/02/2012, in:
http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/55cf452f705839c
d80257de10056f76a?OpenDocument
2) Lei da Organização do Sistema Judiciário (L. 62/2013 de 26-08):
https://www.pgdlisbOA.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1974&tabela=leis
Art. 12º:
1 – O patrocínio forense por advogado constitui um elemento essencial na
administração da justiça e é admissível em qualquer processo, não podendo ser
impedido perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou
privada (no art. 88º EOA diz-se “indispensável”).
27
competentes, cabendo-lhes, sem prejuízo do disposto nas leis do processo, praticar
os atos próprios previstos na lei, nomeadamente exercer o mandato forense e a
consulta jurídica.
3 – No exercício da sua atividade, os advogados devem agir com total
independência e autonomia técnica e de forma isenta e responsável, encontrando-
se apenas vinculados a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias
da profissão.
Artigo 13.º
Imunidade do mandato conferido a advogados
Artigo 14.º
28
se apenas vinculados a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias
da profissão.
3 – A lei assegura aos solicitadores as condições adequadas e necessárias ao
exercício independente do mandato que lhes seja confiado.
Artigo 16.º
Artigo 17.º
Instalações para uso da Ordem dos Advogados e da Ordem dos Solicitadores e
dos Agentes de Execução
3) EOA (Lei 145/2016, alterada pela Lei nº 6/2024 de 19 de janeiro) – arts. 88º a
113º (a parte deontológica por excelência) e arts. 66º a 80º;
Contém, nomeadamente, princípios gerais, os deveres para com a comunidade, o
segredo profissional, a discussão publica de questões profissionais pendentes, a
publicidade, os deveres de urbanidade e lealdade para com os clientes, o tribunal
e os advogados.
O EOA assenta estruturalmente na relação do ADV com o cliente.
29
5) CDAE (consagra o princípio da dupla deontologia – ver. art. 207º EOA e 1.3 e
2.4 do CDAE):
Data de 28-10-1988, tendo sofrido alterações em 1998, 2002 e 2006.
Foi integrado na ordem jurídica nacional pela Deliberação nº 2511/2007 da OA.
6) Lei de acesso ao Direito e aos tribunais n.º 34/2004, de 29-07 ((normas que
impedem o A de aceitar o mandato formal do assistido, por excepção ao princípio
consagrado no art. 98º, nº 1 EOA) alterada pela Lei n.º 47/2007, de 28-08:
https://www.pgdlisbOA.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=80&tabela=leis
&so_miolo=
Decorre do disposto no citado art. 20º CRP.
Artigo 3.º
[...]
2 – O Estado garante uma adequada compensação aos profissionais forenses
que participem no sistema de acesso ao direito e aos tribunais.
3 – É vedado aos profissionais forenses que prestem serviços no âmbito do
acesso ao direito em qualquer das suas modalidades auferir, com base neles,
remuneração diversa da que tiverem direito nos termos da presente lei e da
portaria referida no n.º 2 do artigo 45.º
Artigo 42º:
30
1 - O advogado nomeado defensor pode pedir dispensa de patrocínio, invocando
fundamento que considere justo, em requerimento dirigido à Ordem dos
Advogados.
2 - A Ordem dos Advogados aprecia e delibera sobre o pedido de dispensa de
patrocínio no prazo de cinco dias.
3 - Enquanto não for substituído, o defensor nomeado para um acto mantém-se
para os actos subsequentes do processo.
4 - Pode, em caso de urgência, ser nomeado outro defensor ao arguido, nos termos
da portaria referida no n.º 2 do artigo 45.º
Artigo 43.º:
[...]
2 – O defensor nomeado não pode, no mesmo processo, aceitar mandato do
mesmo arguido.
Em novembro de 20221 foi divulgado que o Estado paga em média 389 euros aos
advogados oficiosos.
O valor encontra-se ligeiramente abaixo da média europeia, de acordo com o
Relatório da Justiça 2015-2020.
O número de apoios judiciários por 100.000 habitantes é de 1503.
Neste momento, os advogados nomeados são pagos por uma tabela que remonta
a 2004 e que nunca foi actualizada.
https://jornaleconomico.pt/noticias/estado-portugues-paga-em-media-389-euros-
aos-advogados-oficiosos-810892
31
(por exp. as reuniões entre advogados devem realizar-se no escritório do mais
antigo inscrito na OA).
8) Lei dos Actos próprios dos Advogados (Lei 10/2024 de 19 de janeiro que
revogou a Lei nº 49/2004 de 24-08): ver ponto 18; e os arts. 66º a 69º EOA.
10) Art. 326º CPP (que deve ser articulado com o art. 110º, nº 1 EOA):
Conduta dos advogados e defensores
11) Art. 150º CPC (que deve ser articulado com o art. 110º, nº 1 EOA):
32
circunstanciado do facto à Ordem dos Advogados, para efeitos disciplinares, ou ao
respetivo superior hierárquico.
14) Lei n.º 53/2015, de 11-06, que estabelece o regime jurídico da constituição
e funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a
associações públicas profissionais (LSP).
15) Lei n.º 64/2023 de 20-11 que veio alterar a referida LSP.
Artigo 52.º-A
Constituição de sociedades multidisciplinares de profissionais
Podem ser constituídas sociedades multidisciplinares de profissionais para exercí-
cio de profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente
com outras profissões organizadas ou não em associações públicas profissionais,
quando, cumulativamente:
a) Garantam, estatutária e funcionalmente, o cumprimento dos regimes de incom-
patibilidades e impedimentos aplicáveis;
b) Garantam procedimentos e mecanismos destinados a identificar, evitar, gerir,
acompanhar e divulgar a ocorrência de conflitos de interesses, designadamente
entre os interesses dos seus clientes e os interesses dos seus sócios, titulares dos
órgãos da sociedade, trabalhadores e prestadores de serviços;
c) Os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público
sejam profissionais qualificados;
33
d) Garantam a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a
observância, incluindo pelos sócios, dos deveres deontológicos aplicáveis a cada
atividade profissional desenvolvida e em conformidade com a lei;
e) Disponham de um sistema interno de salvaguarda do sigilo profissional;
f) Garantam uma função permanente de controlo de risco com competência para
implementar a política e os procedimentos de gestão de riscos de incompatibilida-
des, impedimentos, conflitos de interesses, a independência técnica e a proteção
de informação de clientes e de salvaguarda do sigilo profissional.
Artigo 52.º-E
Deveres
1 - Todos aqueles que exerçam funções na sociedade multidisciplinar de profissio-
nais encontram-se vinculados a deveres de lealdade, de confidencialidade, de sigilo
profissional e de prevenção de conflitos de interesses, bem como aos deveres de-
ontológicos que correspondam ao exercício de cada profissão organizada em as-
sociação pública cuja atividade integre o objeto da respetiva sociedade, e sujeitos
à jurisdição e regime disciplinares da respetiva associação pública profissional.
2 - O disposto no número anterior não obsta à partilha, entre aqueles, das informa-
ções necessárias à organização do trabalho e à realização de atos profissionais no
interesse dos clientes.
Mas o ADV não precisa alcançar um resultado específico, pois a natureza do seu
serviço limita-se à necessidade de usar todos os meios razoáveis ao seu alcance
para fornecer o serviço.
Por exemplo, um advogado que representa um cliente num determinado caso, deve
tomar todos os meios razoáveis para o ganhar, mas não tem que garantir que
vença.
34
Face ao grau de grande qualificação técnica e à complexidade da função, a
prestação de serviços é organizada pelo prestador, em escritório individual ou
partilhado, o que difere do regime de contrato de trabalho.
A advocacia é uma actividade intelectual exercida com independência, baseada na
relação de confiança profissional e pessoal com o cliente, em que há liberdade de
escolha por parte deste e está sujeita a deveres específicos mediante
regulamentação de acesso por uma associação públicADV Nisso reside a essência
da actividade liberal do advogado.
Elementos exclusivos da profissão forense:
- lealdade processual, porque pressupõe a existência de partes - arts. 108º, 112º
d) para com os juízes, clientes, colegas, árbitros, peritos, solicitadores e 3ºs)
cumprir as obrigações legais, não sendo falso, actuar com honra, decência e
verdade, não omitir informações.
E normas costumeiras (ver anotação A. Arnaut, nota 3, pág. 130).
O ADV cumpre os seus compromissos, é recto, com honra e decência, não deve
ser falso, nem omitir informações e mesmo com a inscrição suspensa, em que
continua sujeito à jurisdição disciplinar - art. 114º nº 3 EOA (ver anotação ao
respectivo artigo in A. Arnaut, ob.cit.).
- dever de urbanidade – art. 95º;
- dever de probidade – art. 88º;
- consciência moral – actuar na prática de acordo com a consciência.
Compete-lhe de forma exclusiva, com as excepções previstas na lei, o patrocínio
das partes (art. 66º, nº 3). Daí decorre a obrigação de constituição de mandatário
na maioria dos processos judiciais, em que o mandante não pode praticar os actos
(só o mandatário), ao contrário do contrato tipo do mandato. Mas goza de
autonomia técnica não tem que actuar necessariamente segundo as instruções do
mandante (art. 110º, nº 1 EOA e 1161º CC). É independente.
O mandatário é obrigado:
a) A praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do
mandante;
35
O ADV pela actuação dialéctica que dá ao contraditório, participa na decisão
judicial, é um impulsionador do processo e um fiscal da lei e da sua defesa
(mediante a reclamação e o recurso).
O interesse público assim o justifica.
Por isso a OA é uma associação de direito público e o advogado está obrigado a
estar inscrito nela: arts. 66º, 88º, nº 1 e 2 EOA e 14º LOSJ, ver pág. 8.
Excepções:
➢ ADV Honorário (art. 70º, nº 2 EOA);
➢ Magistrados, em causa própria, do cônjuge ou descendentes – decorre de
normas dos próprios estatutos profissionais.
A “alma da toga” expressa bens jurídicos, éticos e sociais que, desde que
assumidos com honra, fazem falta à nossa vida quotidiana e à nossa relação com
os outros; o da toga do advogado, como a que ou está incita – ou deveria estar –
em todos aqueles que têm o dever de cultivar a justa autoridade democrática. Sabe-
se quanto, hoje, estão desvalorizados, entre nós, os símbolos que foram outrora,
os faróis das civilizações mais civilizadas.
António Vilar
A Beca para os magistrados, a capa para os oficiais de justiça e a toga preta para
os advogados e solicitadores são obrigatórias nas salas de audiências de
julgamento e outras diligências, formais (“em que os advogados pleiteiem
oralmente”) ou cerimoniais.
Cumprem, pela paramentação, protocolo e liturgia a que estão associadas, uma
função simbólica e cerimonialística, sendo uma imagem de marca da identidade
judiciária.
A razão da sua existência prende-se com o princípio da igualdade, uma vez que
todos os intérpretes, perante a justiça, têm os mesmos direitos, independentemente
da sua condição económica ou profissional e por isso se vestem de forma idêntica
para esses actos.
Essas vestes conferem, perante o cidadão comum, uma imagem de dignidade,
solenidade e respeitabilidade, aos actos praticados e seus intervenientes.
A toga surge no século XIX, após as revoluções liberais, quando a profissão ganha
independência e estatuto próprio, com a “Novíssima Reforma Judiciária de 1841”,
artigos 8º, 10º, 31º, 33º, 58º, 75º, 88º e 112º, Portaria do Ministério da Justiça, de
11 de fevereiro de 1843.
36
É um bem cultural, portador de carga afectiva para um advogado que se preze.
Procedimentos hoje em desuso e não já obrigatórios, como os advogados falarem
em juízo, usando a expressão “com a devida vénia” ao juiz (que significa que o
advogado fazia uma ligeira mesura de cabeça ao juiz e de seguida lhe pedia a
palavra) e alegarem de pé, correspondiam a uma solenização e protocolo dos actos
judiciais, segundo a tradição tribunícia das alegações romanas, que emprestavam
aos advogados do período clássico a exibição de dotes oratórios e em que os juízes
conduzem os actos.
Foi em setembro de 1926, através do Decreto 12:334, que se instituiu a
obrigatoriedade de uso da toga.
O Advogado tem direito a tribuna própria na sala de audiências e o Estatuto
Judiciário de 1944 veio conferir-lhe o direito de alegar sentado (actual art. 72º).
\
A expressão “alma da toga” relaciona-se, assim, com a missão de interesse
público e a função social que a profissão, na sua globalidade, prossegue.
Artigo 1.º
Trajo profissional
O trajo profissional do advogado e do advogado estagiário compõe-se da toga e do
barrete.
Artigo 2.º
Toga
37
A toga, de cor preta, terá a forma do modelo publicado em anexo, que é parte
integrante do presente Regulamento.
Artigo 3.º
Barrete
O barrete é também preto, de formato octogonal, com 11 centímetros de altura e
uma cercadura de veludo, de 3 centímetros, sobreposta de outra de cetim
carmesim, de 1 centímetro, ambas na base da copa, tudo conforme o modelo
publicado em anexo.
Artigo 4.º
Uso do trajo
É obrigatório para o advogado e para o advogado estagiário, quando pleiteiem
oralmente, o uso da toga, e facultativo, o do barrete.
Artigo 5.º
Dever de zelo
É dever do advogado e do advogado estagiário, sob pena de procedimento
disciplinar, zelar pela completa compostura e asseio do trajo profissional.
Artigo 6.º
Insígnia
1 – A insígnia é constituída pela medalha da Ordem dos Advogados em que se
destaca:
a) A conhecida representação gráfica das tábuas da lei, de esmalte branco com
letras douradas, sobre a cruz de Cristo – símbolo do sacrifício – de esmalte
encarnado e branco, a significar o dever de obediência aos princípios da moral e
da lei;
b) Os dizeres de «Ordem dos Advogados Portugueses», «Bastonário»,
«Presidente do Conselho Superior», «Presidente do Conselho Distrital», «Conselho
Superior», «Conselho Geral», «Presidente do Conselho de Deontologia»,
«Conselho Distrital», «Conselho de Deontologia» e «Delegação», conforme a
categoria dos membros da Ordem, com relação a estes cargos.
2 – A medalha será de esmalte encarnado com dizeres dourados, em campo
dourado, para o Bastonário, o Presidente do Conselho Superior, os membros do
Conselho Superior, os membros do Conselho Geral e para os presidentes dos
conselhos distritais; em campo prateado, para os presidentes dos conselhos de
deontologia, os membros dos conselhos distritais e os membros dos conselhos de
deontologia; e em campo de cobre polido para os restantes membros da Ordem.
3 – Para suspender a medalha usará o Bastonário, sobre o peito, um colar dourado,
formado daquelas tábuas da lei, de esmalte branco com letras douradas; e os
restantes membros da Ordem, uma fita vermelha de 6 centímetros de largura.
Artigo 7.º
Uso da insígnia
É facultativo o uso da insígnia.
Artigo 8.º
Uso da medalha
O advogado poderá usar a medalha correspondente ao cargo mais elevado que
tenha desempenhado na Ordem.(…)
38
Para um conhecimento aprofundado da história dos trajes judiciários, ver
http://www.trl.mj.pt/PDF/Trajes.pdf
Após ter concluído os seus estudos em Direito, assumiu funções como magistrado
eclesiástico, lutando pelas causas da verdade e da equidade, com fidelidade à
oração e ao trabalho. Foi Juiz Episcopal na cidade de Rennes, capital do Ducado
da Bretanha, e depois em Tréguier, perto da sua terra natal. Cabia-lhe julgar todo
o tipo de litígios, processos matrimoniais, contratos e heranças (excepto processos
crime).
Paralelamente à sua acção como magistrado, Yves pôs a sua sabedoria e riqueza
ao serviço dos numerosos pobres, inaugurando verdadeiramente um serviço de
assistência judiciária e assim se transformando também em advogado dos fracos,
dos miseráveis, dos órfãos e das viúvas, a quem passou a defender nos tribunais
seculares da Bretanha e até no Parlamento em Paris e suportando do seu próprio
bolso as causas daqueles.
A sua imagem é representada com uma bolsa na mão direita por todo o dinheiro
que ofertou aos pobres, e um papel enrolado na outra, por causa de seu ofício de
advogado e magistrado. Outra representação do Santo é entre um homem rico e
um pobre.
Foi canonizado pelo Papa Clemente VI em 1347, quarenta e quatro anos após a
sua morte, ocorrida em 19 de maio de 1303, com 50 anos de idade, e o seu culto
39
alastrou-se rapidamente da Bretanha a toda a Europa. Sepultado na Catedral de
Tréguier e declarado santo patrono da Bretanha, era já no Século XVI
particularmente venerado na França, na Alemanha e em Portugal.
Em maio de 2003, o Papa João Paulo II, proferiu uma mensagem no VII centenário
do nascimento de Santo Ivo. Dessa mensagem, retira-se que os valores propostos
por Santo Ivo conservam uma actualidade surpreendente: a Europa dos direitos
humanos deve prevalecer no fundamento das leis positivas.
O dia 19 de maio, data da sua morte, ficou para sempre assinalado em muitos
países como o Dia do Advogado, sendo comemorado com a realização de diversas
cerimónias oficiais, por ser um bom exemplo e um modelo a seguir para todos os
que procuram honrar a nobre profissão de advogado.
Na sua pedra tumular está escrito: “Santo Ivo era bretão; era advogado mas não
ladrão; coisa admirável para o povo”.
Daí que se entenda que o instituto do apoio judiciário e do acesso ao direito é uma
consagração decorrente dos ensinamentos de Santo Ivo no que se refere à
necessidade de protecção económica e de assistência jurídica dos pobres.
A OA não é um sindicato.
É uma pessoa colectiva de direito público sob a forma de associação pública de
entidades privadas (advogados e sociedades de advogados) e pertence à
administração autónoma do Estado (administração mediata ou indirecta) que confia
nos próprios interessados a regulação da actividade, o seu acesso e o seu
exercício.
40
Enquanto associação pública profissional, tem um estatuto constitucional, pelo que
é de exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização
do Governo, conforme os artigos 165.º n.º 1 alínea s) e 267.º n.º 3 da CRP.
O governo não tem poder de orientação. Apenas tutela a legalidade das decisões
dos seus órgãos e actos administrativos praticados no exercício dos poderes
públicos (ver art. 14º da LOSJ).
Recurso hierárquico (art. 6º). O Contencioso é através dos tribunais administrativos,
nos termos gerais de direito.
Não há recurso jurisdicional para os Tribunais Administrativos dos actos que
tenham por objecto a dispensa do segredo profissional (mas cabe recurso para o
Bastonário), pois isso seria permitir a devassa do segredo que se quer guardar,
dada a natureza pública do processo judicial; e do laudo sobre os honorários, que
é um parecer ou juízo técnico, opinativo, de discricionariedade técnica, elaborado
por um órgão colegial de natureza consultiva, logo não sindicável pelos tribunais.
Não é um acto definitivo e executório passível de recurso contencioso.
Atento o interesse público da profissão, todas as entidades públicas, autoridades
judiciárias e policiais devem colaboração à OA (art. 8º).
Arts. 121º, 184º, 116º CPP e 150º, nº 4 CPC – decorrem do interesse público da
profissão.
41
A colegialidade é facultativa e o conteúdo do exercício da profissão – desde a
inscrição dos ADV até à competência disciplinar sobre eles – acha-se confiado aos
juízes.
Sacrifica-se o principio da independência (autonomia na disciplina do exercício da
profissão) e prevalece a liberdade de associação.
Breve história
A Ordem dos Advogados, criada pelo Decreto n.º 11 715, de 12 de Junho de 1926,
remonta à primeira metade do séc. XIX, tendo origem na Associação dos
Advogados de Lisboa, cujos Estatutos foram aprovados em 1838.
Após vários projectos não concretizados, deve-se ao Ministro da Justiça, Prof.
Doutor Manuel Rodrigues, o impulso decisivo que conduziu à criação da Ordem
dos Advogados Portugueses.
O Ministro da Justiça encarregou a organização da Ordem ao Presidente da
Associação dos Advogados de Lisboa, Dr. Vicente Rodrigues Monteiro, que viria a
ser o seu primeiro Bastonário, no triénio de 1927-1929.
O Decreto n.º 13.809, de 22 de junho de 1927, que aprovou o Estatuto Judiciário,
no art. 42.º das suas disposições transitórias integrou no âmbito deste o regime
legal estatutário da Ordem dos Advogados Portugueses com assento no seu
CAPÍTULO II – Da Ordem dos Advogados (arts. 704º a 781.º).
42
Ordem dos Advogados que, em 1960, passou a integrar também os Solicitadores,
designando-se, desde 1978, Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores.
Na comemoração do XXV aniversário da fundação, em 1951, a Ordem dos
Advogados foi condecorada, em sessão solene presidida pelo Presidente da
República, com o Grande Oficialato da Ordem de São Tiago de Espada.
Por deliberação do Conselho Geral, de 10 de Novembro de 1989, foi instituída a
Medalha de Ouro da Ordem dos Advogados, e atribuída aos Presidentes da
República Dr. Mário Soares e Dr. Jorge Sampaio; aos Bastonários Prof. Doutor
Adelino da Palma Carlos e Dr. Angelo d’Almeida Ribeiro, aos advogados Dr.
Salgado Zenha, Dr. Francisco Sá Carneiro, Dr. Roberto António Busato, ao Dr.
Cezar Britto, aos Profs. Doutores Jorge de Figueiredo Dias, Germano Marques da
Silva, Jorge Miranda, J.J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, ao Tribunal
Constitucional e às Dras. Leonor Beleza e Isabel Moreira.
A 19 de Maio de 1992 comemorou-se, pela primeira vez, o Dia do Advogado, Dia
de Santo Ivo, com a presença do Presidente da República que, na ocasião,
distinguiu a Ordem dos Advogados com o título de Membro Honorário da Ordem
da Liberdade.
Por deliberação do Conselho Geral, de 16 de Abril de 2004, foi criada a Medalha
de Honra da Ordem dos Advogados, atribuída pela primeira vez ao Presidente
do Conseil des Barreaux de l’Union Européenne, Hans Jurgen Hellwig.
O Estatuto da Ordem dos Advogados regulamenta os mais importantes aspectos
relacionados com a organização e funcionamento da Instituição representativa dos
Licenciados em Direito que exercem a Advocacia e estabelece o quadro
deontológico do exercício da actividade.
A existência de um código deontológico constitui uma garantia para a sociedade,
uma vez que comporta em si mesmo o mecanismo adequado para o fazer cumprir
e respeitar por parte dos seus membros.
O Estatuto actualmente em vigor foi aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9 de
setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 6/2024 de 19 de janeiro.
A Ordem dos Advogados é uma associação pública independente dos órgãos do
Estado, sendo livre e autónoma nas suas regras – art. 14º da LOSJ.
In https://portal.OA.pt/cidadaos/o-que-e-a-ordem/resumo-historico/
43
“A função das ordens profissionais
As Ordens Profissionais são associações profissionais de direito público e de
reconhecida autonomia pela Constituição da República Portuguesa, criadas com o
objetivo de promover a autorregulação e a descentralização administrativa, com
respeito pelos princípios da harmonização e da transparência.
Este regime veio estabelecer um quadro legal harmonizador que define os aspetos
relacionados com a criação de novas associações profissionais e que estabelece
as regras gerais de organização e funcionamento de todas as associações públicas
profissionais, respeitando os direitos fundamentais constitucionalmente
consagrados.
In https://www.cnop.pt/sobre/funcoes/
44
Em suma, as APP são cridas em respeito aos princípios constitucionais da
necessidade e da proporcionalidade, devem representar e defender a profissão,
apostar na formação e informação dos seus associados, regular o acesso, o
exercício e a disciplina da profissão.
Lei n.º 12/2023, de 28 de março: alterou a Lei 2/2013 de 10-01, que estabelece o
regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas
profissionais,.
Artigo 2.º
Associações públicas profissionais
45
Para efeitos da presente lei, consideram-se associações públicas profissionais as
entidades públicas de estrutura associativa representativas de profissões que
devam ser sujeitas, cumulativamente, ao controlo do respetivo acesso e exercício,
à elaboração de normas técnicas e de princípios e regras deontológicos específicos
e a um regime disciplinar autónomo, por imperativo de tutela do interesse público
prosseguido.
Artigo 3.º
Constituição
a) Visar a tutela de um interesse público de especial relevo que o Estado não possa
assegurar diretamente;
2 – (…)
Artigo 4.º
2 – Em tudo o que não estiver regulado na presente lei e na respetiva lei de criação,
bem como nos seus estatutos, são subsidiariamente aplicáveis às associações
públicas profissionais:
Nos termos do EOA a “Ordem dos Advogados é representada em juízo e fora dele
pelo bastonário, pelos presidentes dos conselhos regionais e pelos presidentes das
delegações ou pelos delegados, conforme se trate, respetivamente, de atribuições
do conselho geral, dos conselhos regionais ou das delegações.” - Art. 9º do EOA
O projecto de lei de alterações à LAPP, aprovado na AR e declarado constitucional
pelo TC, no que aos órgãos se refere, prevê a criação de um órgão (conselho) de
supervisão que vai assumir funções de verdadeira auto-regulação genérica,
incluindo o “controlo da legalidade”, integra pessoas que, na sua maioria, não
pertencem à respectiva associação profissional, embora a solução legal final tenha
consagrado que são democraticamente eleitos pelos respectivos associados.
O Conselho de Supervisão, que zela pela legalidade da actividade e execre
poderes de controlo e regulação da profissão, será composto por 40% de
representantes da profissão, 40% oriundos da academia da área e não inscritos na
ordem e 20% cooptados, também externos à ordem e que sejam personalidades
de reconhecido mérito (art. 15º-A, nº 3 da LAPP).
A integração de personalidades de reconhecido mérito e de fora da profissão,
sobretudo quando os seus órgãos exercem funções disciplinares ou avaliam os
jovens profissionais no acesso à profissão visa dar maior transparência e isenção
nas funções das associações públicas profissionais;
Existem também funções de natureza disciplinar, de avaliação de final de estágio
ou até de provedor do Destinatário dos Serviços (os cidadãos) que passam a ser
atribuídas a pessoas que não estão inscritas na respectiva associação profissional,
com competência para recorrer em matéria disciplinar e impugnar os regulamentos
das Ordens. Na prática, o provedor dos advogados pode ser um nutricionista ou um
professor de matemática.
Os órgãos disciplinares, de uma forma geral, serão compostos também por
personalidades de reconhecido mérito com conhecimento e experiência relevantes
para a actividade, que não sejam membros da ordem profissional.
48
Os juízes do TC defenderam que “carece de fundamento constitucional um ‘direito
à auto-regulação de classe’”, em resposta à principal dúvida do Presidente da
República e das próprias ordens. Lembram que Vital Moreira defende a integração
de membros externos à luz do princípio da democraticidade e que há, noutros
países, associações públicas de profissionais com órgãos exclusivamente
compostos por “leigos”. “No balanço entre interesses representativos de classe e
realização do interesse público, é lícito ao legislador democrático oferecer maior
peso a este último”, lê-se no acórdão.
Actualmente, a lei em vigôr, com as alterações introduzidas pela LAPP e Lei nº
6/2024, dispõe o seguinte:
49
• O Conselho Superior – arts. 42º a 44º.
É o supremo órgão jurisdicional da Ordem dos Advogados. Tem competência para
julgar os recursos das decisões dos Conselhos de Deontologia em matéria
disciplinar e para dar laudo sobre os honorários a pedido dos tribunais, dos
advogados ou dos seus constituintes e o de se pronunciar sobre propostas
legislativas.
De entre os seus 22 membros, 9 são personalidades de reconhecido mérito com
conhecimentos e experiência relevantes para a advocacia, não podendo ser
advogados inscritos na OA., sendo o presidente e os vice-presidentes são sempre
advogados (art. 42º e al. e) do nº 2 do art. 15º da Lei 12/2013).
Reúne em secções.
• O Conselho Geral – arts. 45º a 47º.
É presidido pelo Bastonário.
Reúne em plenário.
É, por excelência, o órgão executivo, a nível nacional, que exerce poderes de
direcção e gestão.
Cabe-lhe ainda a elaboração de propostas de diversos regulamentos, previstos na.
Al. h) do nº 1 do art. 46º.
• O Conselho de Supervisão – arts. 47º-A a C. Dá acolhimento ao disposto
nos art. 15º, nº 2, al. c) e 15º-A da Lei nº 12/2013 (LAPP) que reforçou os seus
poderes. sendo um órgão inovador na estrutura orgânica da OA.
É o órgão responsável por zelar pela legalidade da actividade exercida pelos órgãos
da OA. e exerce poderes de controlo, nomeadamente em matéria de regulação do
exercício da profissão.
Tem como missão genérica determinar as regras dos estágios profissionais, intervir
na criação de especialidades, avaliar o exercício do poder disciplinar e fixar
algumas taxas.
Cabe-lhe, em concreto e designadamente, a aprovação de regulamentos de
estágio, das especialidades (mediante parecer com carácter vinculativo), do
provedor dos destinatários dos serviços, da remuneração dos membros dos órgãos
que lhe sejam submetidos por outros órgãos, sem prejuízo da competência da
Assembleia Geral nessa matéria (art. 33º, nº 2, al. d).
Compete-lhe a verificação da não sobreposição das matérias a lecionar no período
formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final com as matérias ou unidades
curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica,
nos termos da primeira parte do n.º 5 do artigo 8.º, após parecer vinculativo da
Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, a emitir no prazo de 120
dias a contar do pedido, bem como acompanhar regularmente a atividade do órgão
disciplinar, designadamente através da apreciação anual do respetivo relatório de
atividades e da emissão de recomendações genéricas sobre os seus
procedimentos e a actividade formativa da associação pública profissional, em
especial a realização dos estágios de acesso à profissão, e a atividade de
reconhecimento de competências obtidas no estrangeiro, designadamente, através
50
da apreciação anual do respetivo relatório de atividades e da emissão de
recomendações genéricas sobre os seus procedimentos.
Tem ainda competência para decidir acerca do pedido de renúncia ao cargo e
suspensão temporária do exercício de funções (art. 16º).
Propõe ao bastonário o nome do provedor dos destinatários dos serviços.
É eleito através do sistema de representação proporcional (art. 47º-A, nº 4).
51
É, por inerência, membro do conselho de supervisão, sem direito a voto (art. 47º-
A, nº 7).
• Os Colégios de Especialidade, quando existam.
52
A hierarquia protocolar dos titulares dos órgãos da OA é a seguinte: (art. 9º, nº 4)
a) O Bastonário;
b) O Presidente do Conselho Superior;
c) O Presidente do Conselho de Supervisão;
d) O Presidente do Conselho Fiscal;
e) O Provedor dos Destinatários dos Serviços;
f) Os membros do conselho superior, do conselho geral, do conselho de
supervisão e do conselho fiscal;
g) Os Presidentes dos Conselhos Regionais e dos Conselhos de Deontologia;
h) Os membros dos conselhos regionais e dos conselhos de deontologia;
i) Os Presidentes das Delegações e dos Delegados.
O referendo (art. 26º decorre do art. 21º da LAPP), podendo ter carácter vinculativo
ou meramente consultivo.
A 26.03.2021, a Assembleia Geral de Advogados aprovou a realização de um
referendo vinculativo para decidir a previdência: ou manter a atual Caixa de
Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) ou mudar para o regime geral
da Segurança Social, alterando-se a redacção do art. 4º EOA.
A sua execução compete ao bastonário (art. 40º, nº1, al. f).
O regime electivo está previsto no arts. 10º a 14º, sendo que o EOA/2024 introduziu
a possibilidade de serem eleitos ou designados para os órgãos da OA s ujeitos não
advogados com inscrição em vigor, para além dos Revisores Oficiais de Contas
que integrarem o Conselho Fiscal, que já existia. (art. 11º, nº 1).
O voto por correspondência foi eliminado, podendo ser exercido pessoalmente por
meios electrónicos (art. 14º, nº 2).
A remuneração de cargos, para além da prevista para o cargo de bastonário,
quando em dedicação exclusiva e para o agora criado provedor dos destinatários
dos serviços, passou a ser possível nos demais órgãos em função do volume de
trabalho, nos termos do regulamento a aprovar pelo conselho de supervisão,
mediante proposta do conselho geral aprovada e assembleia geral (art. 15º, nº 2).
Finalmente, cumpre destacar o dever de exercício de cargos e prossecução dos
fins da OA (art. 91º, al. b) e de diligência assiduidade no desempenho de funções
(art. 17º, nº 1).
53
Desmarest
Quem te manda a ti, sapateiro, tocar rabecão?
Enquadramento legal:
Lei nº 10/2024 de 19 de Janeiro;
Lei nº 12/2023 de 28.03, art. 30º, nº 4;
Arts. 66º a 68º do EOA.
O que existia antes? O disposto nos arts. 53º e 56º do DL. 84/84, primeiro Esta-
tuto da OA e que foram revogados pela Lei 49/2004.
Artigo 53.º
(Do exercício da advocacia em território nacional)
1 - Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados
podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou
entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão e, designadamente, exercer o
mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada.
2 - O exercício da consulta jurídica por licenciados em Direito que sejam funcionários públicos
ou que a exerçam em regime de trabalho subordinado não obriga à inscrição na Ordem dos
Advogados.
3 - Exceptuam-se do disposto no n.º 1 os solicitadores inscritos na respectiva câmara, nos
termos e condições constantes do seu estatuto próprio.
4 - Os docentes das faculdades de Direito que se limitem a dar pareceres jurídicos escritos não
se consideram em exercício da advocacia e não são, por isso, obrigados a inscrever-se na
Ordem dos Advogados.
5 - Não pode denominar-se advogado quem como tal não estiver inscrito, salvo os advogados
honorários, desde que seguidamente à denominação de advogado façam a indicação dessa
qualidade.
Artigo 56.º
(Escritório de procuradoria ou de consulta jurídica)
1 - É proibido o funcionamento de escritório de procuradoria, designadamente judi-
cial, administrativo, fiscal e laboral, e de escritórios que prestem, de forma regular
e remunerada, consulta jurídica a terceiros, ainda que, em qualquer dos casos, sob
a direcção efectiva de pessoa habilitada a exercer o mandato judicial.
2 - Não se consideram abrangidos pela proibição os gabinetes formados exclusiva-
mente por advogados ou por solicitadores e as sociedades de advogados.
54
3 - A violação da proibição estabelecida sujeita as pessoas que dirijam o escritório,
os advogados ou solicitadores que nele trabalhem e os que facultem consciente-
mente o respectivo local à pena prevista no n.º 2.º do artigo 400.º do Código Penal
e determina o encerramento do escritório pela autoridade policial, a requerimento
do respectivo conselho distrital da Ordem dos Advogados.
4 - Da decisão do conselho distrital que determine o encerramento cabe recurso,
com efeito suspensivo, para o conselho superior da Ordem dos Advogados.
5 - Para efeito da aplicação da pena cominada no n.º 2.º do artigo 400.º do Código
Penal, o procedimento criminal é instaurado pelo ministério público, a requerimento
do conselho distrital que houver proferido a decisão.
6 - Não ficam abrangidos pela proibição do n.º 1 os serviços de contencioso e con-
sulta jurídica mantidos pelos sindicatos, associações patronais ou outras associa-
ções legalmente constituídas, sem fim lucrativo e de reconhecido interesse público,
destinados a facilitar a defesa, mesmo judicial, exclusivamente dos interesses legi-
timamente associados.
55
São actos próprios dos advogados e dos solicitadores aqueles que só podem ser
prestados a terceiros, respectivamente por:
advogados, advogados-estagiários ou solicitadores (em prática isolada ou integra-
dos em escritório ou gabinete composto exclusivamente por advogados, advoga-
dos-estagiários e solicitadores) e por sociedades de advogados.
Quanto aos advogados estagiários, face às limitações do seu exercício, decor-
rentes do art. 196º EOA e das normas processuais, tem-se entendido que a viola-
ção dessas normas constitui um exercício irregular e não um exercício ilegal de
profissão, gerador de responsabilidade civil e não penal.
Os AE só podem praticar consulta jurídica e os actos da competência dos solicita-
dores, sendo que os demais actos só quando acompanhados pelos patronos ou
quando a lei processual o permita (arts. 40º, 42º e 58º do CPC).
Iremos aflorar as implicações desta Lei só quanto aos ADV e aos AE, deixando de
parte a situação dos Solicitadores.
Contudo, importa só realçar a incompatibilidade decorrente da prática cumulativa
de ambas as profissões (advogados e solicitadores) salvo nos casos previstos no
art. 85º EOA.
Os actos de simples procuradoria conexos com os actos de mandato judicial, re-
presentação e assistência, podem ser praticados por ADV e AE desde que não se
lhes dedique habitualmente, para não constituir concorrência desleal aos solicita-
dores (Ver Orlando Guedes da Costa, ob. citada).
A prática dessas actos está reservada só aos licenciados em Direito (em Portugal
ou no estrangeiro) com inscrição em vigor na OA, o que decorre do modelo de
advocacia colegiada entre nós instituído – art. 1º, nº 1 da LAPAS e actual art. 2º do
Regime Jurídico dos Atos de Advogados e Solicitadores.
Consagra-se, assim, o princípio da exclusividade para a prática de actos pp. da
advocacia, sendo que só podem ser inscritos os advogados estagiários e advoga-
dos, o que exclui à partida e desde logo os que tenham a inscrição suspensa (art.
186º e 199º).
Os actos próprios dos advogados, de acordo com o regime da LAPAS (entretanto
revogada pela Lei 10/2024 de 19 de janeiro) são:
Art. 5º a) consulta jurídica;
b) o exercício do mandato forense;
56
d) O exercício do mandato no âmbito de reclamação ou impugnação de actos
administrativos ou tributários.
Art. 9º - Todos aqueles que resultem do exercício do direito dos cidadãos a fazer-
se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio
judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
57
Processo Civil) e, como defensor do arguido, em todos os processos criminais (ar-
tigos 61º, nº1, al. d), 62º e 64º do Código de Processo Penal), bem como na juris-
dição administrativa.
Não esquecer os casos de constituição obrigatória de advogado, que resulta do
interesse público da boa administração da justiça, sendo que às partes falta sere-
nidade e conhecimentos técnicos necessários à boa condução da causa.
O que interessava com este normativo, que define o sentido e o alcance dos actos
próprios dos advogados e dos solicitadores, era desde logo sancionar a prática
ilegal da advocacia e de solicitadoria, por exigência da dignidade e interesse público
da profissão e para barrar a concorrência desleal que essa prática configura.
Assim, o que o legislador pretendeu foi afastar o risco que acarreta para a realiza-
ção da justiça a permissão do exercício da advocacia e da prática de certos actos
próprios desta profissão por quem não apresente aquela qualidade e idoneidade
(habilitação/capacitação) para o exercício da profissão e para a prática de certos
actos, como tem sido infelizmente uma prática diária por parte de quem não tem
competência quer legal quer profissional.
Casos exemplificativos e conhecidos de procuradoria ilícita: os praticados por agên-
cias funerárias, empresas de contabilidade e consultoria, de sobre-endividamento,
condomínios, agências imobiliárias e burlões em geral e de cobrança de créditos
em particular (matéria diferente da negociação – o Ac. TRL 18-09-2015.
Ver também o caso do “Rei das penhoras” in Comunicado | CDAPA - Ordem dos
Advogados (OA.pt)
• Excepções:
Desde logo, funciona a excepção prevista no art. 200º, nº 5 EOA para a consulta
jurídica (juristas de reconhecido mérito, mestres e doutores em direito, desde que
inscritos na OA) e também para os pareceres escritos dos docentes das faculdades
de direito – nº 2 e 3 do art. 1º da LAPAS, sendo que estes últimos não têm que
estar inscritos na OA.
58
As causas para o agravamento deste fenómeno prendem-se essencialmente com
a perceção errónea de que os procuradores ilícitos são mais económicos e efica-
zes que um advogado ou solicitador e de que certos actos são de resolução fácil,
não necessitando aconselhamento jurídico profissional.
A lei também excluiu deste universo de actos ilícitos todos os atos praticados pelos
representantes legais, pelos empregados, pelos funcionários ou agentes de pes-
soas singulares ou coletivas, públicas ou privadas, enquanto nessa qualidade, não
os considerando como actos praticados no interesse de terceiros, e como tal não
sendo actos próprios de Advogados.
Esta regra é válida excepto tratando-se de atividade de cobrança de dívidas, caso
em que os actos praticados pelos funcionários de pessoa que tenha como principal
atividade a cobrança de dívidas são considerados praticados no interesse de ter-
ceiros, passando assim estes funcionários a responder por actos ilícitos de procu-
radoria mesmo que a empresa empregadora seja a detentora dos créditos a recu-
perar, muitas vezes adquiridos em negócio simulado (cfr. nº 7 e 8 do art. 1º da
LAPAS).
Um empregado de um privado não está a trabalhar para um terceiro (cfr. nº 8 do
art. 1º) não tendo que se inscrever na OA. O mesmo acontece com o chamado
advogado de empresa, que presta consulta apenas em benefício desta.
Decorre do nº 7 do art. 1º que os notários, os solicitadores de execução, os admi-
nistradores de insolvência, Rocs e Tocs, nomeadamente, podem dar consulta jurí-
dica no quadro das suas actividades definidas pelo seu estatuto.
No Código do Notariado no seu art.º 1.º, n.º 1 confere-se a possibilidade de o No-
tário prestar assessoria às partes na expressão da sua vontade negocial para efei-
tos de conferir forma legal e fé pública aos atos jurídicos extrajudiciais. Ou seja, o
Notário pode prestar assessoria às partes desde que a mesma se prenda com a
prática do ato notarial, cuja autenticação se pretende (cfr. a esse propósito o Co-
municado do CRL de 16-11-2020 sobre a consulta prestada por Notários para es-
clarecimento “de dúvidas jurídicas”.
Estão também excluídos desta regra os sindicatos e as associações patronais,
desde que os atos praticados o sejam para defesa exclusiva dos interesses comuns
em causa e que estes sejam individualmente exercidos por advogado ou advogado
estagiário, e ainda as entidades sem fins lucrativos que requeiram o estatuto de
utilidade pública, desde que cumpram alguns outros requisitos.
O Estado, enquanto pessoa colectiva de direito publico, sem prejuízo de poder ser
representado pelo Ministério Público, poderão ser representados por licenciados
em direito com funções de apoio jurídico, ficando vinculados às obrigações dos
deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da
outra parte – art. 11º, nº 1 e 2 do CPTA.
A Fazenda Pública é defendida nos tribunais tributários por representantes seus
(funcionários superiores licenciados em direito).
Também os magistrados, em causa própria, do cônjuge ou descendentes podem
praticar tais actos, como decorre das normas dos seus próprios estatutos (arts. 19º
59
e 91º do Estatuto do Magistrados Judiciais e dos Magistrados do Ministério Público,
respectivamente). Tal já não acontece no caso de serem, eles próprios, arguidos
em processo penal.
• O crime de procuradoria ilícita:
A LAPAS veio também tipificar o crime específico de procuradoria ilícita (art. 7º)
punível até 1 ano de prisão ou multa até 120 dias que se aplica a quem não está
inscrito na OA ou, estando-o, tem a sua inscrição suspensa ou cancelada.
Esse crime é semi-público pois, para além do lesado, são titulares do direito de
queixa a Ordem dos Advogados e a Ordem dos Solicitadores, tendo também legi-
timidade para se constituírem assistentes no procedimento criminal.
Deve ser relacionado com o de usurpação de funções (art. 358º CP), que é um
crime público e que se afigura ser mais exigente no preenchimento dos seus ele-
mentos constitutivos típicos.
Veja-se, a título de exemplo, o Ac. do TRE de 14-06-2005 in
http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/f20cd7f9caf56f89
80257de100574827?OpenDocument
“Dando de barato, que as arguidas praticassem alguns actos próprios de advoga-
dos e solicitadores (procuradoria ilícita [1] ) o certo é que não está suficientemente
indiciada que, mesmo de forma implícita, se fizessem passar por advogadas ou
solicitadoras, ou que tivessem habilitações para tal.
Não consta que as arguidas tivessem agido convencendo as pessoas que tinham
condições legais para praticar a profissão ou os actos e que tenham agido delibe-
rada, livre e conscientemente, cientes da ilicitude de tal conduta.
Ora, um dos fundamentos do despacho de não pronúncia pelo juiz de instrução é
a insuficiência dos indícios da verificação dos pressupostos fácticos de que de-
pende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança (art. 308 n.º
1, do CPP).
Assim, conclui-se conclui-se que o recurso não pode deixar de naufragar, pela dita
impossibilidade de se alcançar a reclamada pronúncia das arguidas.
DECISÃO:
[1] É procurador ilícito aquele, não sendo advogado, nem solicitador, que presta
serviços a particulares na área dos registos predial e comercial, requer a legaliza-
60
ção de prédios, a constituição de sociedades e suas alterações, intervém em pro-
cessos de partilhas de heranças, redige contratos de arrendamento, de trespasse,
de trabalho, de promessa de compra e venda, entre outros.”
Ac. do TRC de 19-02-2020:
IV – Por isso que, e pese embora de acordo com a Lei da Nacionalidade não seja
obrigatória a constituição de advogado para apresentar a declaração da sua atri-
buição ou efetuar o preenchimento de declaração com os dados pertinentes do
requerente, estando em causa a utilização, pelo arguido, de pelo menos 11 procu-
rações, de outros tantos cidadãos brasileiros, emitidas a seu favor, por ele apre-
sentadas perante a mesma Conservatória do registo Civil, para representá-los no
processo de atribuição da nacionalidade portuguesa, verificam-se os pressupostos
da procuradoria ilícita, impondo-se, por isso, a procedência do recurso.
Assim, no caso relativo à prática ilícita de atos próprios da advocacia, também po-
deremos estar perante tal crime de procuradoria ilícita, crime que se encontra numa
relação de especialidade (concurso aparente) com o de usurpação de funções
quando estas funções dizem respeito ao exercício da advocacia.
A legitimidade da OA para se constituir assistente decorre do entendimento de ser
a instituição legalmente competente para defender a profissão e, simultaneamente,
garantir as boas práticas no interesse dos cidadãos.
Decorre também por se entender está coberta pela alínea a) do n.º 1, do artigo 68.º
do Código de Processo Penal, havendo que ter em conta a ressalva de lei especial
que consta desse n.º 1 desse artigo: (“além das pessoas e entidades a quem leis
especiais conferirem esse direito”).
61
Também do art. 49.º do Regime das Associações Públicas Profissionais (Lei n.º
2/2013, de 10 de janeiro) decorre a legitimidade das associações públicas profis-
sionais (entre as quais se conta a Ordem dos Advogados) para intervirem como
assistentes em processos penais relacionados com o exercício da profissão que
representam. E é isso que sucede no caso em apreço, relativo ao exercício da ad-
vocacia.
Por outro lado, a Ordem dos Advogados também tem legitimidade ex vi de outra lei
especial (o n.º 4 do artigo 7.º da Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto) para se constituir
assistente em caso de eventual prática de crime de procuradoria ilícita, p. e p. pelo
n.º 1 desse mesmo artigo.
Assim, ainda que a jurisprudência não reconheça a legitimidade da Ordem dos Ad-
vogados para se constituir assistente quanto ao crime de usurpação de funções, p.
e p. pelo artigo 358.º, b), do Código Penal, sempre se verificará tal legitimidade
quanto ao crime de procuradoria ilícita, crime que, estando em causa a prática de
atos próprios do exercício da advocacia, está numa relação de especialidade (con-
curso aparente) com tal crime de usurpação de funções.
Pode ver-se, neste sentido, o acórdão da Relação de Évora de 4 de junho de 2019,
proc. n.º 599/09.6TAOLH-B.E1 (acessível em www.dgsi.pt).
No entanto e quanto ao pagamento de custas judiciais, a jurisprudência vai no ca-
minho de considerar que, no caso da Ordem dos Advogados, integra-se, nas suas
atribuições, a de colaborar na administração da justiça (art.º, 3º, al. a), do EOA).
Contudo, mesmo aí será mera colaboradora, não lhe cabendo, legal ou estatutari-
amente, a defesa direta e imediata de interesses difusos, mas sim de direitos cole-
tivos.
Deve considerar-se que a Ordem dos Advogados atua diretamente na defesa de
uma classe profissional (os advogados) e do cumprimento de uma sanção por ele
própria imposta. Ainda que possa afirmar-se que está simultaneamente (ainda que
de forma indireta) a defender a boa administração da justiça, o que a lei exige é
que atue exclusivamente para defesa daqueles direitos fundamentais dos cidadãos
ou de interesses difusos relacionados com aquelas áreas e que essa atribuição
(exclusiva) lhe seja atribuída pelo seu estatuto ou por lei que legitime a sua inter-
venção. Essa “lei que legitime a sua intervenção” não se confunde com a lei que
lhe atribui a legitimidade para se constituir como assistente, mas que lhe permita
intervir na defesa de interesses difusos.
Desse modo, não deve a Ordem dos Advogados ser declarada isenta de custas,
nomeadamente pela constituição de assistente.
Cfr. nesse sentido o Ac. do TRP de 25-11-2020.
No seio da OA funciona a Comissão de Defesa dos Actos Próprios dos Advogados
(CDAPA) que tem como objetivo definir, incentivar e coordenar a nível nacional a
ação de divulgação dos atos próprios dos Advogados, de prevenção e combate à
procuradoria ilícita e de promoção da Advocacia preventiva.
62
Para combater a violação ilícita da actividade de advocacia, foi criada a Secção de
Procuradoria Ilícita junto dos C. Regionais (cfr. o art. 54º, nº 1, al. u) e o respectivo
Regulamento nº 441/2011).
Segundo dados da OA, só o Conselho Regional de Lisboa tem actualmente 326
processos pendentes, na secção de procuradoria ilícita, nos quais, em 90% dos
casos, os visados são empresas de consultadoria, de gestão de condomínios, de
cobrança de dívidas, gabinetes de contabilidade, TOCS, sociedades de mediação
imobiliária e advogados com inscrição suspensa e ou cancelada.
Para se ter uma ideia, só nos primeiros quatro meses de 2022, foram recepciona-
das 118 participações que levaram à instauração de 104 processos de procuradoria
ilícita e averiguação preliminar.
63
doria ilícita, não constituindo uma sanção acessória, sendo o pedido de encerra-
mento um ato da competência exclusiva da Ordem, mais propriamente dos Conse-
lhos Regionais, em razão do interesse público que prossegue a instituição.
64
esse tipo de “apoio de amiga”, perante terceiros, o que não deixa de ser crime, mas
apenas de falsas declarações como atrás referimos.
Estes factos em nada se relacionam com o exercício da advocacia; as imputadas
condutas não se mostram minimamente atinentes ao exercício pelo Advogado das
suas funções profissionais, não traduzem a prática de qualquer acto próprio do ad-
vogado, pelo que não se pode sustentar, de modo algum, a indiciação pelos crimes
de procuradoria ilícita e de usurpação de funções. Não se vislumbra nenhum ele-
mento que se relacione directa ou indirectamente com o exercício de funções pro-
fissionais do Advogado, em particular com o exercício de funções de representação
do mandante (em juízo ou em negociações) ou de aconselhamento jurídico. Nem
tão pouco existe, qualquer elemento factual, que demonstre o exercício de funções
de representação forense ou negocial.”
a) Mandato forense
A definição do mandato forense é mais ampla no art. 67º, pelo que se deve entender
como acto próprio da profissão o que desta Lei consta, ou seja o mandato judicial
conferido para ser exercido em qualquer tribunal, incluindo os tribunais ou comis-
sões arbitrais e os julgados de paz – cfr. FSM, ob. citada, em anotação a este pre-
ceito. Mas o uso da expressão do legislador “sem prejuízo” não parece excluir essa
amplitude.
O mandato forense traduz-se num mandato judicial conferido para ser exercido em
qualquer tribunal, incluindo os tribunais ou comissões arbitrais e os julgados de paz
e acompanhar e representar os interesses de terceiros, em todos os tribunais e
também junto da administração pública e fiscal, cartórios, conservatórias autar-
quias, repartições, entidades privadas e praticar actos notariais (reconhecimentos
presenciais e por semelhança, certificar, autenticar.
Mas o mandato forense está sujeito ao princípio de livre escolha do ADV pelo cli-
ente (art. 67º, nº 2). Decorre do princípio da confiança – art. 97º, nº 1 e também do
princípio da não angariação de clientela – art. 90º, nº 2, al. h).
b) Consulta jurídica
65
Actividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação
de normas jurídicas mediante a solicitação de terceiros.
E também pode ser prestada no caso dos pareceres jurídicos por docentes das
faculdades de direito– arts. 2º e 3º da LAPAS.
Ao aceitar-se tal, esquece-se que esses actos abrangem a prática de actos de con-
sulta jurídica, procuradoria e contencioso.
• Contra-ordenações – art. 8º
O regime contra-ordenacional consagrado na LAPAS destina-se a sancionar a prá-
tica de promoção, divulgação e publicidade dos actos de procuradoria ilícita, muitas
vezes camufladas e sob a capa de actos altruístas mas com intuito de ocupar es-
paço de intervenção profissional com carácter lucrativo e mediante angariação de
clientela.
A circunstância da aplicação de coimas pelas suas consequências patrimoniais,
também pode ter efeitos dissuasores da prática da procuradoria ilícita.
67
Ver o DL. 433/82/ de 27 de outubro – Da contra-ordenação e da coima em geral.
http://www.OA.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_ar-
tigo.aspx?sidc=31634&idc=8351&idsc=21852&ida=131003
Cfr. o art. 27º, nº 4 da LAPP, entretanto alterado pela Lei nº 12/2023 de 30 de março
e o art. nº 10º, nº 1, al. c) da Lei nº 6/2024 de 19 de janeiro fundamentada na
necessidade de cumprir com as recomendações nacionais e internacionais
e por se revelar essencial para o cumprimento de uma das reformas com
maior relevo no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Esta reforma
das profissões reguladas já vinha sendo reclamada pela Comissão
Europeia, pela OCDE e pela Autoridade da Concorrência.
Mas isso não significa que os solicitadores possam constituir uma sociedade de
advogados, que é exclusiva dos ADV inscritos na OA; podem partilhar gabinetes
ou escritórios e integrar sociedades multidisciplinares.
A prática cumulativa advogado-solicitador é proibida, salvo nos casos previstos no
art. 85º EOA.
Nos escritórios comuns, com a entrada, o gabinete do ADV deve ser uma divisão
autónoma (em causa o segredo de justiça e o princípio da não angariação de
clientela).
Reflexão a fazer: o caso do escritório em open space.
Contudo, o projecto de lei relativo às ordens profissionais que altera questões como
as condições de acesso a algumas profissões, introduz estágios profissionais
remunerados e cria uma entidade externa para fiscalizar os profissionais, acabou
mesmo por ser aprovado pelo Parlamento a 22-12-2022.
A 1 de fevereiro de 2023 o Presidente da República pediu a fiscalização preventiva
da constitucionalidade desse diploma por considerar que algumas das suas normas
poderiam ferir os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da auto-
regulação, como sejam: a inclusão de personalidades externas às ordens
68
profissionais em maior proporção do que internas na avaliação de estágios
profissionais, nos órgãos disciplinar e de supervisão e como provedor, assim como
a incompatibilidade de funções de dirigente na ordem e na função pública.
Por decisão tornada pública em 27 de fevereiro, o TC não considerou
desrespeitados quaisquer princípios ou normas constitucionais, não se
pronunciando consequentemente no sentido da inconstitucionalidade de nenhuma
das disposições fiscalizadas.
Nessa sequência, veio a ser publicada a Lei nº 12/2023 de 28 de março e a Lei
10/2024 de 19 de janeiro (art. 10º), permitindo a existência de sociedades
multidisciplinares que integrem advogados, bem como a alteração ao EOA de 2005,
com a Lei nº 6/2024 (art. 212º-A).
• Responsabilidade civil pelos danos causados (art. 11º da LAPAS):
reforçada pela inversão da presunção de culpa que cabe aos presumíveis autores
da procuradoria ilícita e pela legitimidade conferida à OA para propor as
competentes acções judiciais.
Tribunal da Relação do Porto, Acórdão de 30 Nov. 2016, Processo 31/13
USURPAÇÃO DE FUNÇÕES. CRIME CONTINUADO. O número de crimes de-
termina-se pelo número de tipos de crime efetivamente cometidos ou pelo nú-
mero de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.
No caso em apreço, o arguido não agiu no quadro da solicitação de uma mesma
situação exterior que diminua consideravelmente a sua culpa. Com efeito, o ar-
guido, estando suspensa a sua inscrição como advogado na Ordem dos Advo-
gados, arrogou-se perante terceiros como tal, intervindo em processo judicial na
qualidade de mandatário forense, assim como interveio em diligência judicial, de-
pois de ter sido expulso da Ordem. Ora, considerando que a simples circunstân-
cia de o agente ter sido bem sucedido da primeira vez não pode representar uma
circunstância exterior que diminua consideravelmente a sua culpa, pela que a
prática de vários atos forenses configura diversas resoluções criminosas, nome-
adamente a prática de três crimes de usurpação de funções. INDEMNIZAÇÃO
CÍVEL. A legitimidade da Ordem do Advogados e do assistente para intentarem
ações de responsabilidade civil, tendo em vista o ressarcimento de danos decor-
rentes da lesão de interesses públicos, é aplicável apenas ao crime de procura-
doria ilícita. Ora, tendo em conta que a responsabilidade civil conexa com a res-
ponsabilidade criminal diz respeito somente a direitos e interesses juridicamente
protegidos que possam ser individualizados, tal legitimidade não aplicável analo-
gicamente ao crime de usurpação de funções.
69
Os advogados são competentes para o reconhecimento de assinaturas, a certifica-
ção de cópias de documentos, a autenticação de documentos particulares e o re-
conhecimento presencial de assinaturas em escritos particulares.
A lei portuguesa reduziu a exigência da escritura pública a um muito reduzido nú-
mero de atos notariais.
Desde a constituição de sociedades comerciais, à cessão de quotas, à compra e
venda de imóveis, passando pela partilha ou pela constituição de hipotecas, todos
os atos podem ser formalizados perante os advogados, os quais podem processar
imediatamente os respetivos registos.
Tem interesse o Parecer de 19-10-2006 de que foi relator o Prof. Luis Menezes
Leitão visando esclarecer o âmbito e as formalidades destes actos.
Processo nº E-13/06
PARECER
Artigo 38º
Extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação
e tradução de documentos
70
referida no número anterior não se aplica à prática dos actos previstos nos
Decretos-Leis nºs 237/2001, de 30 de Agosto, e 28/2000, de 13 de Março.
71
Em relação à certificação de fotocópias ela abrange a conferência de fotocópias,
prevista no art. 171º-A do Código do Notariado, mas não os certificados, referidos
nos arts. 161º e ss. CN, nem as certidões extraídas dos instrumentos, registos e
documentos arquivados nos cartórios. Efectivamente, aos advogados não foram
atribuídas as competências notariais previstas nas alíneas d) e e), nem a da
primeira parte da alínea g) do art. 4º CN, pelo que não podem certificar factos que
tenham verificado, nem passar certidões de documentos em relação a um arquivo
que organizem, uma vez que a lei não lhes atribuiu essas funções notariais. Através
da certificação de fotocópias, os advogados conferem às mesmas a mesma força
probatória resultante do documento original.
72
fazendo menção no documento a que respeitam, sempre que a liquidação deva
preceder a transmissão (1).
Já em relação às procurações, nos termos do art. 116º, nº1, CN as mesmas podem
ser lavradas por instrumento público, documento escrito e assinado pelo
representado com reconhecimento de letra e assinatura ou por documento
autenticado. Assim, os advogados podem validar procurações através do
reconhecimento de letra e de assinatura ou da autenticação do documento por
termo, uma vez que essas competências lhes foram atribuídas. Apenas não podem
lavrar procurações por instrumento público, dado que esta é uma competência
estritamente notarial. Consequentemente, não poderão os advogados validar
procurações conferidas também no interesse do procurador ou de terceiro, uma vez
que estas devem ser necessariamente lavradas por instrumento público, cujo
original é necessariamente arquivado no cartório notarial (art. 116º, nº 2, CN).
Notas:
1- Neste sentido, cfr. PEDRO MORÃO CORREIA, “Da obrigação de cooperação e
fiscalização dos advogados relativamente ao pagamento de IMT”, em Boletim da
Ordem dos Advogados nº 43 (Setembro-Outubro 2006), pp. 24-27.
73
notariais.
74
a fase complementar do estágio e no âmbito da sua actividade, os advogados
estagiários têm copiosamente efectuado actos relativos à certificação de
conformidade de fotocópias com os documentos originais que lhe sejam
apresentados, diversos tipos de reconhecimentos e autenticações de documentos.
Ora, caso seja acolhida a apreciação normativa acima referenciada, toda esta
actividade será posta em causa, lançando-se na treva os inúmeros actos de
reconhecimento, certificação e autenticação já praticados por advogados
estagiários, ficando estes, no futuro, (ainda mais) limitados no espectro da sua
intervenção.
2. Sendo certo que o n.º 1 do artigo 2.º do Código do Notariado determina que o
órgão próprio da função notarial é o notário, a verdade é que o artigo 3.º do mesmo
diploma legal estabelece algumas excepções a tal princípio, consagrando a alínea
d) deste preceito que “excepcionalmente, desempenham funções notariais: (…) d)
As entidades a quem a lei atribua, em relação a certos actos, a competência dos
notários”. Ora, actuando no domínio da autenticação, certificação e do
reconhecimento de assinaturas em documentos, o Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de
29 de Março, no seu artigo 38.º, preceitua o seguinte:
“1 – Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de
comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de
Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores
podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por
semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar,
traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial.
2 – Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas
entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma
força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção
notarial.
3 – Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas
câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em
sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados
são definidos por portaria do Ministro da Justiça (…)”.
A regra normativa em causa é um passo no sentido da simplificação, no nosso
ordenamento jurídico, do regime dos reconhecimentos de assinaturas e
autenticação e tradução de documentos, pela via da atribuição, nomeadamente,
aos advogados e aos solicitadores, as competências notariais supra melhor
identificadas.
É certo que o n.º 1 da disposição legal transcrita não se refere expressamente aos
advogados estagiários. Não obstante, haverá que reflectir sobre se não deverão os
mesmos, desde que estejam já na segunda fase do estágio e actuem sob
orientação do respectivo patrono, considerar-se incluídos naquela previsão e ter
competência para praticar tais actos.
A matéria em apreço subsume-se a uma questão de carácter profissional relativa
ao exercício da advocacia, pelo que não pode ser encarada sem a devida
ponderação dos princípios, regras, usos e praxes que fluem dos preceitos
constantes do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante “EOA”) e
correspectivo universo normativo. Assim, cumpre invocar aqui a alínea a) do n.º 1
do artigo 189.º do EOA, nos termos da qual, estando o advogado estagiário na
indicada fase do estágio – ou seja, tendo sido aprovado nas provas de aferição e
75
obtido a respectiva cédula de advogado estagiário – e actuando sob a orientação
do patrono, pode o mesmo praticar todos os actos da competência dos
solicitadores.
Note-se que o actual EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro,
precede no tempo a publicação do sobredito Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de
Março, pelo que, aquando da redacção do artigo 38.º deste segundo diploma, o
legislador insofismavelmente teria conhecimento de que todos os actos da
profissão de solicitador podem ser exercidos por advogado estagiário. Não
obstante, não optou por excluir expressamente o advogado estagiário dessa
competência.
Em face do exposto, salvo melhor opinião, não podemos sufragar o entendimento
proferido pela Relação de Coimbra, no seu acórdão de 27 de Maio de 2014,
considerando antes que a alínea a) do n.º 1 do artigo 189º do EOA – nos termos do
qual, uma vez obtida a cédula profissional como advogado estagiário, este pode,
autonomamente, mas sempre sob orientação do patrono, praticar (…) todos os
actos da competência dos solicitadores –, em conjugação com o disposto no n.º 1
do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, permite aos advogados-estagiários
reconhecer assinaturas, autenticar documentos particulares e certificar traduções.
76
Também na doutrina assim se pronunciou Edgar Valles, in Actos Notariais do
Advogado, 5ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, pp. 55/56.
Igualmente na jurisprudência, o próprio Tribunal da Relação de Coimbra, em
acórdão ulterior proferido em 3 de Junho de 2014, no âmbito do processo n.º
4790/11.7TBLRADVC1 (in www.dgsi.pt), apoiou essa compreensão:
Embora o n.º 1 da disposição legal transcrita [o artigo 38º do Decreto-Lei n.º 76-
A/2006] se não refira expressamente aos advogados estagiários, devem os
mesmos, desde que estejam já na segunda fase do estágio e actuem sob
orientação do patrono, considerar-se incluídos na previsão, pois que, nos termos
do artº 189º, nº 1, al. a) do Estatuto da Ordem dos Advogados, estando na indicada
fase do estágio e actuando sob a referida orientação, podem praticar todos os actos
da competência dos solicitadores e a estes é ali feita explícita menção”.
O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados (OA) vai avançar com
um processo de crime de procuradoria ilícita contra a seguradora Fidelidade. Esta
tomada de posição surge após a Fidelidade ter disponibilizado um serviço de apoio
jurídico gratuito para ajudar mais de 1,6 milhão de clientes a compreenderem e im-
plementarem as medidas decorrentes do estado de emergência em vigor.
78
a) Uma campanha pública de combate à procuradoria ilícita, com vista à criação
e fortalecimento dos mecanismos de prevenção da prática do crime e do sentimento
de confiança no papel do Advogado, com enfoque, designadamente, no benefício
e necessidade de uma advocacia preventiva;
b) Um plano de formação estratégico envolvendo os serviços públicos e outras
Ordens Profissionais, a publicação periódica de artigos reforçando a importância
da advocacia na comunidade e a prática solidária e concertada dos Advogados;
c) Apresentação de queixas-crime por violação da lei;
d) Instauração de processos com vista ao encerramento dos gabinetes ilegais;
e) Articulação e criação de procedimentos céleres com as entidades que colaboram
com a Ordem nesta matéria, nomeadamente a Direcção Geral do Consumidor e o
Ministério Público.
7. Deve tornar-se obrigatória a aposição de uma vinheta jurídica, física ou eletrónica
nos actos cuja prática a lei reserva aos Advogados.
8. A aposição de uma vinheta jurídica é condição de eficácia do acto próprio de
Advogado.
9. A Ordem dos Advogados deve pugnar no sentido de serem instituídos parques
de estacionamento exclusivos e gratuitos destinados a Advogados.
10. A nota de despesas e honorários emitida por Advogado deve passar a constituir
título executivo.
11. Deve ser concedida isenção de taxas de justiça ao Advogado quando este seja
demandado em acções de responsabilidade civil no exercício da profissão.
12. Deve ser pugnado pela revogação do nº 8 do art.º 1º da Lei dos Actos Próprios
dos Advogados, proibindo cidadãos e empresas de se fazerem representar por
terceiros que não sejam advogados.
13. O artigo 48º, nº 1, alínea d), do Código do Registo Comercial e o artigo 10º,
alínea b), do Regulamento do Registo Comercial devem ser alterados no sentido
de ficar vedada a inclusão no objecto social de sociedade comercial actividades
consideradas como actos próprios de Advogados, devendo o registo ser recusado
quando ocorra violação da Lei nº 49/2004, consagrando-se a sua nulidade em caso
de realização.
14. A Ordem dos Advogados deve propor a alteração das leis de processo no
sentido de não ser permitido o exercício do patrocínio judicial por outros
profissionais, como é o caso dos licenciados em Direito com funções de apoio
jurídico no âmbito do contencioso administrativo, dos contabilistas certificados no
âmbito do processo tributário e do Ministério Público no âmbito das acções
emergentes de contrato individual de trabalho.
15. A Ordem dos Advogados deve propor uma alteração legislativa no sentido de
nos processos de divórcio por mútuo consentimento passar a ser exigida a
representação das partes por Advogado.
79
16. A Ordem dos Advogados deve pugnar pela actualização das tabelas dos
honorários do sistema de acesso ao direito e aos tribunais (SADT).
17. A Ordem dos Advogados deve pugnar pelo retorno das competências que
foram atribuídas aos designados “balcões”.
18. Importa que a Ordem dos Advogados tome uma clara e inequívoca posição
de firmeza junto do Poder Político, no sentido de se repor a legalidade, no que se
reporta às empresas de cobrança.
19. A Ordem dos Advogados deve exercer o direito de resposta sempre que os
Advogados sejam alvo de comentários depreciativos em órgãos de comunicação
social.
20. Não é de admitir nos escritórios de Advogados, a prestação de serviços, de
forma directa ou indirecta, por juristas não inscritos na Ordem dos Advogados ou
cuja inscrição se encontre suspensa, a menos que seja delimitada com rigor a
fronteira dos actos que estes últimos podem praticar.
21. A Ordem dos Advogados deve pugnar pela:
80
advogados, como é o caso da gestão de conhecimento, análise de documentos,
redação de contratos, análise de contenciosos e preparação de peças processuais.
https://observador.pt/opiniao/poderao-robos-substituir-advogados-como-a-
inteligencia-artificial-transformara-a-advocacia-e-o-direito/
81
Normas como as arts. 1º, nº 1, 3, 8, 9, 10 e 11, 2º, 3º, 4º, nº 1, 5º nº 1, 3 e 5º, 7º,
nº 3, 8º, 9, 10º, 11º nº 1 e 3, 12º nº 2 e 4 da LAPAS foram transpostas para o RJAAS,
algumas com alterações de pormenor.
A consulta jurídica passa a poder ser praticada por notários, agentes de execução
e profissionais licenciados em direito (juristas), mas sem a devida habilitação pro-
fissional da Ordem dos Advogados – cfr. art. 7º;
Para poderem prestar consulta jurídica, estas entidades ficam obrigadas a celebrar
e manter um seguro de responsabilidade civil profissional;
A elaboração de contratos pode ser entregue a pessoas com licenciatura, mas não
necessariamente advogados – cfr. art. 8º;
A remissão nessa alínea para a Lei nº 53/2015, que estabelece o regime jurídico
da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais que estejam su-
jeitas a associações públicas profissionais, não pode fazer esquecer as alterações
resultantes à mesma pela Lei nº 64/2023.
Relativamente à consulta jurídica, a nova redação do art. 7º, com o título “Exercí-
cio da consulta jurídica por outras entidades” prevê inovatoriamente que:
82
1 – Sem prejuízo do estabelecido no artigo anterior, podem ainda exercer a ativi-
dade de consulta jurídica:
b) Os licenciados em direito.
c) Os licenciados em direito.
83
quanto a todos os elementos de que tenham conhecimento em função das respeti-
vas atividades.
84
3 – Para efeitos do n.º 1, a sociedade deve indicar um advogado ou solicitador com
inscrição em vigor na Ordem dos Advogados ou na Ordem dos Solicitadores e dos
Agentes de Execução, responsável pela supervisão da atividade da sociedade, o
qual deve garantir, em toda a organização, a observância das regras legais, o res-
peito pelos deveres de sigilo, a identificação de potenciais conflitos de interesses e
a atuação de modo a evitar o risco da respetiva ocorrência.
5 – Para efeitos do número anterior, o código de conduta deve ainda ter em consi-
deração as normas penais referentes aos crimes contra a liberdade pessoal, bem
como a referência às sanções criminais associadas à prática daqueles ilícitos.
85
O art. 6º sob a epígrafe “Escritório de procuradoria ou de consulta jurídica”,
surge com uma nova redação de forma a integrar as sociedades multidisciplinares
que integrem advogados e ou solicitadores, nos termos da Lei n.º 53/2015, de 11
de junho, a quem é permitido o funcionamento de escritório ou de gabinete, consti-
tuído sob qualquer forma jurídica, que preste a terceiros serviços que compreen-
dam, ainda que isolada ou marginalmente, a prática de atos próprios exclusivos dos
advogados. e
(al. d): Não são abrangidos pelo disposto nos números anteriores os sindicatos e
as associações patronais, desde que os atos sejam praticados individualmente por
advogado, ou solicitador e para defesa exclusiva dos interesses comuns em causa.
86
sendo a confidencialidade essencial para que aquela exista – é sobretudo por esta
razão que a lei prevê a existência do sigilo profissional.
No que diz respeito aos padres da Igreja Católica, o teor das confissões por parte
dos fiéis jamais pode ser revelado. O sigilo é absoluto e inviolável. O padre, sob
pena de poder excomungado, é obrigado a manter a confidencialidade sobre tudo
o que lhe for transmitido durante as confissões dos fiéis. Isto porque o sigilo está
consagrado no direito canónico. Daí se compreenda o que dispõe o nº 5 do art.
135º CPP.
Nele radica também a confiança (o ADV é integro, honesto e leal) - cfr. ponto 2.3.1.
do CDAE
Para além de dever ser tecnicamente preparado, está sujeito ao exercício regulado
e tutelado em função do interesse público e função social da profissão (defesa os
direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, harmonização de
conflitos e pacificação social) sendo o sigilo essencial para a boa administração da
justiça.
Desse modo, entende-se para os efeitos previstos no art. 120º, que a desistência
da participação por violação do segredo profissional não extingue a
responsabilidade disciplinar, por a falta imputada afetar a dignidade do advogado
visado, o prestígio da Ordem dos Advogados ou da profissão.
Face ao interesse público da defesa do segredo profissional, compete ao Estado
garantir as imunidades necessárias ao advogado para esse fim (cfr. ponto 2.3.1. do
CDAE, artigo 13º da LOSJ - Lei nº 62/2013 e 76º EOA).
Efectivamente, o dever de sigilo dos advogados, está conexamente consagrado
como uma das dimensões constitucionais do patrocínio forense, considerado como
“um elemento essencial à administração da justiça” (cf. art.º 208.º da CRP) sendo
que o direito fundamental e constitucional de acesso ao direito (cf. art.º 20.º da
CRP) implica, para além do mais, o correspondente patrocínio judiciário, com a
particular relação de confiança entre o advogado e o seu cliente, a defesa da
dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus
representantes.
A razão de ser do dever de guardar segredo profissional por parte dos advogados
é, por um lado, a confiança e a lealdade entre advogado e cliente e, por outro, a
dignidade da advocacia. Assim, ao lado do interesse privado do cliente, existe o
interesse público na confiança do advogado e na sua função social.
87
“O interesse público é o interesse que se relaciona com a conservação e
desenvolvimento da sociedade política e da satisfação das suas necessidades.
Ora, o sigilo, enquanto salvaguarda de uma esfera de privacidade na relação entre
o cliente e o Advogado surge edificado sobre o pilar da necessidade de paz social
e de Justiça, cuja indispensabilidade é prosseguida pelo Advogado, enquanto
técnico do direito, defensor da boa aplicação das leis e do aperfeiçoamento do
sistema jurídico. Aliás, a importância - senão mesmo essencialidade - social do
Advogado é evidente, logo ao nível contencioso, na necessidade de intervenção de
Advogado em praticamente todas as causas cíveis (artigos 32º e 60º do Código de
Processo Civil) e, como defensor do arguido, em todos os processos criminais
(artigos 61º /1 d), 62º e 64º do Código de Processo Penal), já para não aludirmos a
jurisdições especiais, como é o caso da administrativa.
88
quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar
e a desempenhar a representação ou o serviço” – cfr. o nº 2 do art. 92º.
Em Portugal, já a Reforma Judiciária de 1837, consagrava legalmente o respeito
pelo segredo profissional, estabelecendo no artigo 114º que “os advogados,
confessores e médicos, depondo não podem ser obrigados a revelar segredos, em
razão das suas profissões”.
Por conseguinte, o segredo profissional não é um direito, mas uma obrigação legal
do advogado e que perdura mesmo que o ADV tenha a sua inscrição cancelada,
devendo-se nessa circunstância respeitar o formalismo do nº 4 do art. 92º EOA,
embora o ADV não possa ser sancionado disciplinarmente (art. 114º, nº 3 do citado
diploma legal). Mas se dúvidas houvesse sobre essa questão, caberia ao Conselho
Geral resolver essa questão (art. 10º do RDSP).
Tem carácter social ou de ordem pública e não contratual. Não se insere, assim, no
âmbito dos direitos/deveres disponíveis do cliente e do advogado.
89
Existe submissão a sigilo quando um advogado toma conhecimento pelo seu cliente
de negociações malogradas – alínea a).
Existe submissão a sigilo quando um advogado toma conhecimento pelo anterior
advogado do seu cliente – por instruções deste - de negociações malogradas –
alínea a).
Existe submissão a sigilo quando um advogado toma conhecimento de
negociações malogradas atravéz de colegas de escritório – alínea c).
E entendemos que existe submissão a sigilo quando um advogado toma
conhecimento de negociações malogradas mesmo que seja por terceiros e aquelas
não sejam de conhecimento público.
Nunca é demais recordar que o elenco das alíneas a) a f) do artigo 87º é meramente
indicativo e que a regra é a da sujeição a sigilo a todos os factos cujo conhecimento
pelo advogado lhe advenha do exercício das suas funções. E só não estarão
sujeitos se, por natureza, os factos não sejam em si sigilosos.”
O ADV não é uma simples testemunha, que normalmente não pode ser. Participa
na administração da justiça e não é um mero auxiliar da justiça. No entanto, essa
revelação pode vir a ser pedida pelo tribunal e o Presidente do C. Regional poderá
dar autorização.
Contudo, vários autores e a jurisprudência entendem que quando esteja em causa
a defesa de terceiros e não do Advogado ou seu (antigo) cliente, deve ser indeferido
o pedido de levantamento.
Ex.: acção judicial de cobrança de honorários: o ADV não pode ser testemunha do
outro colega, pois não é do seu interesse, nem do cliente. Mas pode (deve) pedir a
necessária dispensa num quadro em que esteja quebrada a relação de confiança
com o cliente e intente ele próprio essa acção contra o seu ex-cliente.
A razão de ser do dever de guardar segredo profissional por parte dos advogados
é, por um lado, a confiança e a lealdade entre advogado e cliente e, por outro, a
dignidade da função social da advocacia. Assim, ao lado do interesse privado do
cliente, existe o interesse público na confiança do advogado e na sua função.
Segundo António Arnaud in “Iniciação à Advocacia”, pág. 66, o fundamento ético-
jurídico do sigilo profissional de advogado radica no princípio da confiança e na
natureza social da função forense.
A obrigação de segredo transcende, por consequência, a mera relação contratual,
assumindo-se como princípio de ordem pública e representando uma obrigação do
advogado não apenas para com o seu constituinte, mas também para com a própria
classe, a Ordem dos Advogados e a comunidade em geral.
90
O Ac. da Relação de Évora de 18-03-2020, decidiu que deve ordenar-se o
levantamento do sigilo profissional do Sr. Advogado quando, estando demonstrado
que a prestação do depoimento não viola de forma insuportável direitos
fundamentais da ADV ou do Sr. Advogado, em contraposição ao direito
fundamental que o R. tem de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva,
como é garantido pelos artigos 18.º, nº 2 e 20.º da CRP e quando é claramente
preponderante o interesse na prossecução do interesse público da administração
da justiça e da descoberta da verdade.
https://www.direitoemdiADVpt/search/show/56335cc5e1829bb68f9f985103995353
05aba82fda0c0bcf203b697bcf2a0167
No mesmo sentido, veja-se o Ac. do STJ de 05/04/2018 em que decidiu o
levantamento do segredo profissional de dois advogados num caso em que se
investiga um crime de abuso de poder por parte de um Procurador da República.
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/B92D5A2A8F2412A3802582CF003AF19E
91
O pedido de dispensa do sigilo tem de ser prévio à divulgação dos factos sigilosos.
E se já foram revelados os factos, se deixaram de ser estar em “segredo”, já não
fará sentido vir, a posteriori, pedir a dispensa para provar factos que não podiam
ter sido revelados sem autorização prévia.
O ADV, nesse caso, praticou um acto gerador de responsabilidade civil (art. 483º
CC), criminal (art. 195º CP) e disciplinar (art. 115º EOA).
Ainda que o ADV seja dispensado do dever de não revelar factos a coberto pelo
segredo profissional, a verdade é que pode ainda assim manter o segredo quanto
aos mesmos nos termos do nº 6 do art. 92º, em obediência ao princípio de
independência e da reserva do advogado.
O ADV é o juiz da sua própria consciência.
Relativamente às pessoas referidas no nº 7 do art. 92º (colaboradores dos
advogados) veja-se o decidido nos Ac. do TRL de 24/11/2020 in
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/bb02c66ef7540c7
b8025863a004dc96b?OpenDocument
Já se entendeu inclusivamente que este sigilo se estende aos próprios funcionários
do organismo profissional que disciplina a atividade de advogado – cf. Acórdão da
Relação de Guimarães de 8/3/2018, Proc. n.º 3764/15.3T8BRG-ADVG1, disponível
em www.dgsi.pt.
Como resulta do disposto pelo art.º 417º, n.º 4 do Código de Processo Civil, supra-
citado, o segredo profissional não é absoluto, podendo ser dispensado através do
incidente processual de quebra do segredo profissional, nos termos das
disposições citadas, por força do princípio da prevalência do interesse
preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do
depoimento para a descoberta da verdade.
Assim, verifica-se que nesta matéria estão em causa dois interesses públicos
essenciais na administração da Justiça; por um lado o princípio da confiança no
advogado e na sua função e por outro o princípio da cooperação de todos para a
descoberta da verdade, sendo necessário em cada caso concreto fazer a correcta
ponderação das circunstâncias a fim de verificar qual o princípio preponderante em
cada situação.
O disposto no art. 135º CPP constitui uma excepção ao estatuído neste preceito
estatutário.
Os actos jurídicos praticados pelo ADV em representação do cliente, por exemplo,
as cartas que se destinam à interpelação para o cumprimento de obrigação,
consagrada em contrato ou estipulada na lei, por exemplo, de denúncia do contrato
de arrendamento, de aumento da renda, de interpelação para a outorga da escritura
de compra e venda, etc., não estão sujeitos ao segredo profissional.
92
Excluem-se também do âmbito do sigilo os factos notórios ou do domínio público,
os que se destinam a ser invocados ou alegados em defesa do cliente, os
constantes de documento autêntico e os que estiverem provados em juízo.
A nota de honorários, se discriminada ao pormenor a actividade desenvolvida, pode
envolver a divulgação de factos concretos sujeitos ao segredo profissional, na
medida em que os factos nela contidos são do conhecimento do ADV no exercício
da profissão.
Todas as informações trocadas entre o cliente e o seu advogado, devem manter-
se em sigilo profissional, sempre, e em absoluto, mesmo quando este é autorizado
pelo cliente/constituinte a quebrá-lo.
Contudo, no que diz respeito a situações de prevenção e repressão de crimes de
branqueamento de capitais e financiamento de atos de terrorismo, como se verá
mais à frente, a lei obriga os advogados, em certas circunstâncias, a deveres de
identificação, colaboração e comunicação às autoridades competentes, que podem
conduzir à revelação de informações transmitidas por clientes.
Em casos considerados como extremos, o pacto de sigilo pode ser quebrado. No
caso dos advogados, não basta que o cliente/constituinte autorize que os seus
dados pessoais sejam revelados – é preciso uma autorização prévia por parte do
Presidente do Conselho Regional (arts. 55º, nº1, al. m) e 92º, nº 4), que garantirá a
absoluta necessidade da desvinculação do segredo para a defesa da dignidade,
direito e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus
representantes.
94
tenha caráter confidencial, deve exprimir claramente tal intenção – n.º 1 do art.º
113º do E.O.A.
1 – Podem recusar-se a depor como testemunhas, salvo nas ações que tenham
como objeto verificar o nascimento ou o óbito dos filhos:
(…)
96
provocar deste modo prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, é punido com pena de
prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias.
97
processo/procedimento prévio de averiguações. O que não é compaginável com a
natureza e urgência de tais pedidos sendo, antes, obstaculizador da emissão de
decisões em tempo útil, e dificultador da apreciação e decisão final.
98
no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa
do dever de sigilo invocado.
PARTE I
LIVRO III – Da prova
TÍTULO II – Dos meios de prova
CAPÍTULO I – Da prova testemunhal
Artigo 135.º - Segredo profissional
3 – O tribunal superior àquele onde o incidente tiver sido suscitado, ou, no caso de
o incidente ter sido suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o pleno das
secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do
segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da
prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a
imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do
crime e a necessidade de protecção de bens jurídicos. A intervenção é suscitada
pelo juiz, oficiosamente ou a requerimento.
99
ser recusado. Mas se se tratar do Ministério Público, a decisão que ordena o
depoimento deve caber ao Juiz, que na fase de inquérito será o Juiz de Instrução
Criminal. Se a autoridade judiciária concluir pela viabilidade, prescinde do
depoimento ou, tratando-se de tribunal, requer a tribunal superior que o ordene,
usando, para isso, o processo regulado no n.º 3. No entendimento da
jurisprudência, esta última possibilidade radica no facto de tribunal poder considerar
que a escusa é viável e legítima mas que, ainda assim, atento o caso concreto,
deve ser prestado o depoimento. Nesta hipótese, o depoimento deve ser ordenado
por tribunal superior. Sempre que, de algum modo, surjam dúvida acerca da
legitimidade do segredo profissional invocado pelo Advogado, a autoridade
judiciária em causa deve ouvir a Ordem dos Advogados. Ora, não serão,
certamente, raros os casos em que surja divergências entre o entendimento
perfilhado pela Ordem dos Advogados e a visão do Tribunal.” (Catarina Luisa Pires,
Deontologia Profissional).
100
à ausência de qualquer interesse público supra profissional a acautelar e a lei é
clara na atribuição à OA de competência decisória exclusiva.
2 - Mas se existe um interesse público a acautelar o incidente próprio para fazer
operar um juízo valorativo supra profissional sobre a quebra de sigilo profissional
dos advogados é da exclusiva competência dos Tribunais que forem material e
territorialmente competentes. Ou seja, a ponderação dos valores a fazer no âmbito
do artigo 135º - quebra do segredo – está muito para além das competências da
Ordem dos Advogados.
3 -As decisões da OA obtidas no âmbito decisório do artigo 92º do EOA que forem
juntas aos autos não têm valor decisório no processo judicial, sem prejuízo de a
sua fundamentação poder ter valor argumentativo.
4 - O parecer emitido pela OA nos termos do artigo 135º do C.P.P. não tem valor
vinculativo já que isso seria a negação do papel dos tribunais.”
101
Atente-se que o art. 92º, nº 4 fala de “prévia autorização”. Antes falava de “prévia
consulta” (Estatuto Judiciário).
Só por motivos ponderosos deve deixar de ser seguido o parecer (por ex. erro
notório). Mesmo considerando-se que é um simples parecer, deve aplicar-se
analogicamente o art. 163º, nº 1 do CPP.
2 - Na mesma pena incorre quem prestar auxílio a outra pessoa com a intenção ou
com a consciência de total ou parcialmente, impedir, frustrar ou iludir execução de
pena ou de medida de segurança que lhe tenha sido aplicada.
102
3 - A pena a que o agente venha a ser condenado, nos termos dos números
anteriores, não pode ser superior à prevista na lei para o facto cometido pela pessoa
em benefício da qual se actuou.
4 - A tentativa é punível.
103
balança da ponderação com a violação do segredo: tudo dependerá da gravidade
dos crimes a perseguir.”
“…A eventual prática de ilícitos criminais por parte do próprio mandatário nunca
poderá considerar-se compreendida no exercício das funções profissionais de um
advogado, sendo violadora, para além do mais, do dever deontológico de agir de
forma a defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento
das normas legais deontológicas.
Não pode fazer-se apelo ao sigilo profissional para encobrir a eventual prática de
actos ilícitos, de natureza criminal, por parte do mandatário, pois que, não
constituindo acto próprio da advocacia, se mostra excluída da esfera de protecção
da norma em causa… (actualmente o art. 92º da Lei nº 145/2015, 09-09)”. (Ac. do
Tribunal da Relação de Lisboa de 02/23/2017).
Nestes termos, os factos denunciados e em investigação dizem unicamente
respeito à eventual prática de ilícitos criminais por parte do próprio mandatário, que
nunca poderá considerar-se compreendida no exercício das funções profissionais
de um advogado, sendo violadora do dever deontológico de agir de forma a
defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento das
104
normas legais e deontológicas. Assim, o depoimento do advogado não resulta na
violação do sigilo profissional.
“I - O princípio que rege a decisão a proferir, de determinação da prestação de
depoimento com quebra do segredo profissional ou do indeferimento do pedido, é
o da prevalência do interesse preponderante, que se aferirá, nomeadamente, por
reporte à imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, à
gravidade do crime e à necessidade de protecção de bens jurídicos.
II - Nem sempre o interesse do Estado em realizar a justiça penal, com observância
de todos os princípios jurídico-constitucionais que o integram, prevalece.
“Finalmente, e supondo ser verdade que o conteúdo da carta enviada à ANSR fosse
da exclusiva responsabilidade da advogada do arguido na altura, então a prestação
de depoimento sobre a questão sempre poderia redundar em desfavor da
advogada.” (Ac. Rel. Coimbra, 22-11-2017)
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/3dbfefa35836881
8802581e800372159?OpenDocument
105
- Tribunal Constitucional- Ac. 293/2021 de 13-05-2021- Pº 664/2019:
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20210293.html
106
Os mecanismos da sua dispensa ou quebra são objecto de regulamentação legal:
Ao abrigo do disposto no art. 92.º, nº 4, do EOA, o advogado pode requerer a
dispensa do segredo profissional, quando a revelação do facto sigiloso é
absolutamente necessária para a defesa da sua dignidade, direitos e interesses
legítimos ou da dignidade, direitos e interesses do seu cliente;
Por via do incidente do art. 135.º do C.P. Penal (também aplicável aos processos
de natureza cível ex vi do disposto no art. 417.º, nº 4, do C.P. Civil), pode ser
imposto ao advogado a quebra de sigilo, quando em causa esteja a descoberta da
verdade material tendo em vista a defesa de valores, direitos e interesses
preponderantes.
Nenhum segmento das normas legais citadas reveste qualquer tecnicidade (salvo
técnica jurídica) que tenha determinado ao julgador a necessidade de formular a
norma contida no nº 4 do art. 135.º do C.P. Penal no propósito de conceder ao juiz
(a quem compete interpretar e aplicar a lei com total independência), a faculdade
de, previamente à decisão, pedir uma opinião (parecer) à Ordem dos Advogados
sobre o sentido da mesma
Servirão estas considerações apenas para dizer que a pronúncia da Ordem dos
Advogados ao abrigo do disposto no nº 4 do art. 135.º do C.P. Penal não pode ser
reduzida à condição de um mero parecer, destinado a auxiliar o julgador na
percepção e apreciação da realidade fáctica difícil de captar mediante os
conhecimentos de que normalmente o juiz está apetrechado, como expressamente
é declarado no acórdão em apreço.
O segredo profissional é um dever imposto ao advogado por uma lei da república
(Lei nº 145/2015 de 9 de Setembro de 2015), sendo que o nº 5 do art. 92.º dessa
lei comina claramente que “os atos praticados pelo advogado com violação de
segredo profissional não podem fazer prova em juízo”.
Desse dever decorre o direito do advogado se remeter ao silêncio sempre que
interpelado no sentido da revelação de factos advindos ao conhecimento por via do
exercício da sua profissão. Subjacente à imposição legal desse dever está a
garantia de um valor fundamental, transversal ao complexo das relações que o
advogado estabelece no exercício da sua profissão: o valor da confiança!
Confiança daquele que depositando no conhecimento do advogado determinado
facto, o faz na legítima expectativa de o mesmo ser mantido sob sigilo, ressalvadas
as hipóteses legais em que a sua quebra pode ocorrer.
À Ordem dos Advogados, no âmbito das suas atribuições, compete:
(i) defender os direitos e as garantias dos cidadãos,
(ii) promover o respeito pelos valores e princípios deontológicos,
(iii) defender os interesses, direitos e prerrogativas dos seus membros - vd artº 3º
do EOA.
O incidente de quebra do segredo profissional, ao abrigo do disposto no art. 135.º
do C.P. Penal, visa a obtenção de um meio de prova que contende, ou pode
contender, com valores, deveres, direitos e garantias que, no âmbito das suas
atribuições, compete à Ordem dos Advogados zelar e defender.
107
Tem assim a Ordem dos Advogados uma legitimidade própria para se pronunciar
quando em causa possam estar os deveres cujo cumprimento deve zelar, direitos
e garantias cujo respeito deve defender. O legislador consignou-a obrigatoriamente
no nº 4 do art. 135.º do C.P. Penal.
Nesta pronúncia, marcará a Ordem dos Advogados a sua posição, não com
considerações de ordem técnica, mas com considerações de ordem valorativa, com
as quais dirá
(i) se os valores, direitos e interesses que se pretendem defender com a quebra
do sigilo justificam o sacrifício daqueles que se pretendem salvaguardar com a
imposição legal do dever de o guardar;
(ii) (ii) se o facto sigiloso é essencial para a descoberta da verdade material na
defesa de interesses preponderantes,
(iii) (iii) se o depoimento do advogado ou o documento em seu poder, é
imprescindível para a comprovação do facto. Não sendo a Ordem dos Advogados
chamada a pronunciar-se, é preterida uma formalidade legal que forçosamente
inquina a validade do meio de prova que por via do incidente do levantamento de
sigilo foi obtido.
A Ordem dos Advogados tem interesse na preservação do segredo profissional do
advogado, como interesse tem qualquer cidadão. Mas por ter esse interesse e um
dever especial na sua preservação, não significa (nem é verdade) que, nas
pronúncias que tem proferido ao abrigo da citada norma de direito processual,
manifeste sempre a sua oposição no sentido da manutenção do sigilo. Mas, quando
a manifesta, fá-lo com fundamento.
Os Senhores Magistrados subscritores do douto acórdão não quiseram ouvir a
Ordem dos Advogados. Terá então a Ordem dos Advogados de se fazer ouvir.”
Conselho Regional do PortoRelator Domingos Ferreira
Setembro de 2016
No mesmo sentido (contra o citado aresto) vai o Ac. da Relação do Porto de 06-05-
2019, ao decidir que:
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/4129df267f05812
580258407004c51f7?OpenDocument
PARECER DO CRLISBOA
Consulta Nº 32/2013
Assunto:
108
Incidente processual de quebra do sigilo profissional – Artigo 135º do Código de
Processo Penal e Artigo 87º do EOA.
Questão
109
valores superiores ao dever de sigilo. Ou seja, o Advogado pode ser solicitado a
quebrar o segredo por haver valores conflituantes de dignidade superior ao dever
de sigilo, mas essa ponderação é já da competência do tribunal superior – no caso
o Tribunal da Relação de - – àquele onde o incidente tiver sido suscitado.
E, nos termos das disposições conjugadas dos n.ºs 3 e 4 do artigo 135º do CPP, o
depoimento com quebra do sigilo profissional é ordenado (ou não) pelo tribunal
superior, depois de, nessa sede, ser ouvida a Ordem dos Advogados, – in casu, o
Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados.
O que significa que, com rigor, a pronúncia quanto à existência de um interesse
superior aos interesses protegidos pelo dever de sigilo – que é o que,
efectivamente, está em causa no caso vertente –, deveria ter-nos sido solicitada
pelo Tribunal de Relação de - e não pelo Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal.
Sem prejuízo do que antecede, não deixaremos de emitir a solicitada pronúncia, o
que faremos de seguida.
Nunca é de mais referir o carácter fundamental e verdadeiramente basilar que a
obrigação de segredo profissional reveste para o exercício da Advocacia.
Mas não só.
Trata-se de dever de primordial importância para o reconhecimento da plenitude de
um Estado do Direito Democrático como consagrado no artigo 2º da Constituição
da República Portuguesa.
É que o Estado de Direito Democrático não só exige um poder judicial
independente, como também tem ainda subjacente o exercício de uma Advocacia
livre, independente e responsável. Advocacia que, para ser exercida desta forma,
terá necessariamente de, nas relações estabelecidas entre os Advogados e os seus
clientes, assentar num elevadíssimo grau de confiança.
Contudo, exorbitando o estrito âmbito da relação Advogado – cliente, o segredo
profissional é um valor exigido pela própria ordem social e vertido em forma de lei
no Estatuto da Ordem dos Advogados em vigor (Lei n.º 15/2005, 26 de Janeiro).
E isto porque o sigilo tem frequentemente outros destinatários ou beneficiários para
além do cliente no âmbito dos serviços a este prestados, devendo o Advogado ser,
nas suas múltiplas relações sociais e profissionais, merecedor de confiança e
isenção. Não apenas o Advogado individualmente considerado, como profissional
liberal que é, mas como membro de uma classe profissional.
Por isso, convirá realçar de forma plenamente convicta que estamos perante um
dever com carácter social ou de ordem pública e não de natureza meramente
contratual.
Mais do que um dever do próprio profissional, “o sigilo é um dever de toda a classe,
é condição da plena dignidade do Advogado bem como da Advocacia”[1].
Mas, tal não significa que o dever de guardar sigilo seja absoluto, porquanto existem
casos em que se justificará, em homenagem a valores de superior dignidade, o
levantamento da obrigação de guardar sigilo profissional. Se tal não acontecesse,
em situações obviamente excepcionais, elementares princípios de Justiça
correriam o risco de ser postergados.
Assim, e para o efeito, estabelece a lei dois mecanismos que se diferenciam desde
logo a propósito do sujeito que tem legitimidade para impulsionar o levantamento
do segredo profissional:
A dispensa de sigilo profissional, a qual é solicitada pelo Advogado vinculado a
esse dever ao Presidente do Conselho Distrital competente, sendo concedida, caso
se verifiquem preenchidos os requisitos exigidos pelo n.º 4 do artigo 87º do Estatuto
da Ordem dos Advogados;
110
O incidente processual de quebra de sigilo profissional (previsto no artigo 135º do
Código de Processo Penal[2]), tendo legitimidade para o desencadear qualquer das
partes em juízo ou a autoridade judiciária.
A decisão da quebra de sigilo é tomada, com prévia audição da Ordem dos
Advogados, que recairá, inevitavelmente sobre o preenchimento, ou não, das
condições de que depende a quebra do sigilo profissional. O mesmo é dizer, sobre
a ponderação acerca da existência de um interesse superior aos interesses que se
visa proteger com o dever de sigilo profissional.
Em suma, para que se possa concluir pela existência de um interesse
preponderante haverá que verificar, em concreto e tal como o pedido de quebra se
encontrar fundamentado, se o depoimento do Advogado com quebra do sigilo se
reveste de absoluta necessidade, isto é, de imprescindibilidade, o meio de prova
sujeito a sigilo tem de ser indispensável (ou seja, imprescindível, e não meramente
útil) face ao objectivo de prova visado; de essencialidade, o meio de prova sujeito
a sigilo tem de ser absolutamente determinante; e de exclusividade, pressupondo
este requisito a inexistência de qualquer outro meio de prova que não o depoimento
do obrigado ao sigilo.
Desde logo, no caso concreto, não são enunciados de forma concreta e precisa os
factos a que o depoimento da Senhora Advogada A é pretendido, apenas se
referindo que o depoimento é pretendido “no que toca aos factos exarados na
queixa apresentada por X ”.
Por outro lado, para que seja quebrado o dever de sigilo profissional, será, a nosso
ver, sempre exigível uma situação de total excepcionalidade e de absoluta
necessidade da audição do Advogado em causa sobre os factos de que tomou
conhecimento no exercício da profissão.
O que não se manifesta de forma nenhuma na fundamentação – rectius, na
escassez de fundamentação – em que assenta o incidente de quebra de sigilo
profissional deduzido e ora sob análise.
Assim, e tal como se encontra recortado o pedido de audição da Ordem dos
Advogados, nada nos permitirá concluir pela existência de um interesse
preponderante ao do tutelado pelo dever sigilo e que seja susceptível de impor o
sacrifício deste dever. E tal deve-se unica e exclusivamente à ausência da
concretização dos elementos fácticos que permitam essa ponderação.
Pelo exposto, concluímos, no caso vertente, que não estão reunidas as condições
de que depende a prestação de depoimento, com quebra de sigilo profissional, por
parte da Senhora Advogada Dr. A, no âmbito do Inquérito pendente na - Secção do
Departamento de Investigação e Acção Penal - , sob o n.º -.
Notifique-se.
Lisboa, 17 de Outubro de 2013.
Sandra Barroso
111
O Vogal do Conselho Distrital de Lisboa
(por delegação de poderes de 20 de Janeiro de 2011)
Paulo de Sá e Cunha
--------------------------------------------------------------------------------
112
Relativamente a pedidos de dispensa de segredo profissional formulados em anos
anteriores, e cuja apreciação e tramitação se prolongou para 2019, foram
emitidas 101 decisões finais. Também no que concerne a pedidos com origem
em anos anteriores, foram objeto de arquivamento 58 pedidos, ao abrigo do
artigo 132º do CPADV
113
Diligências artigo 75º no ano de 2019 do CRL:
No âmbito do previsto no artigo 75º sobre “imposição de selos, arrolamentos e
buscas em escritórios ou sociedades de advogados” foi solicitada a indicação
de representante do Conselho Regional de Lisboa para o acompanhamento de
24 diligências.
Tais diligências correspondem aos seguintes actos: Penhoras 6
Buscas 18
Aberturas de Suportes Documentais 2
Não obstante a indicação de representante, todas as penhoras foram declaradas
sem efeito por motivo superveniente.
Hipóteses de exame: 02-12-2015 e 21-07-2017.
https://eco.sapo.pt/especiais/in-house-um-pe-no-direito-e-outro-no-negocio/
114
É atribuição estatutária da Ordem dos Advogados defender o Estado de Direito e
os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, bem como assegurar o respeito
pelo sigilo profissional e pela relação de confiança existente entre cliente e
Advogado/a, pelo que, confirmando-se os factos que chegaram ao seu
conhecimento, os mesmos estão revestidos de uma enorme gravidade.
Deste modo e sem prejuízo do apuramento dos factos e dos trâmites legais a seguir
pelos/as Senhores/as Advogados/as no processo em causa, desde já
manifestamos a preocupação pelo ocorrido e garantimos que casos como este
merecerão sempre a nossa atenção e reação.
115
“A ex-eurodeputada socialista Ana Gomes veio afirmar publicamente que algumas
sociedades de advogados são “verdadeiras associações criminosas” por
participarem em esquemas de transferências de capital para contas offshores. Esta
declaração foi dada no comentário na SIC Notícias, no domingo passado.
“Alguns escritórios de advogados portugueses – e mais uma vez, eu faço a
ressalva, não são todos os advogados (…) -, que são verdadeiras, eu diria, quase
associações criminosas”, referiu a antiga eurodeputada. Esta afirmação veio no
seguimento das revelações feitas pelo consórcio internacional que expôs o ‘Luanda
Leaks’.
Face a esta declaração, Daniel Proença de Carvalho já se pronunciou
publicamente. Para o advogado, Ana Gomes tem “muitas” dificuldades com a
“verdade”, “rigor” e “isenção”. Daniel Proença de Carvalho, foi o orador convidado
do debate inserido no âmbito do ciclo de conferências “Fim de Tarde na Sedes”,
promovido pela SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social.
“Essa afirmação feita dessa forma genérica, que é evidente que não corresponde
à mínima realidade, e é feita de uma forma muito ligeira, para não dizer leviana,
como em muitos casos”, referiu Daniel Proença de Carvalho.
Para o antigo presidente da Uría Menéndez-Proença de Carvalho “sempre que se
opina e se comenta, com falta de rigor, com pouco respeito pela verdade,
procurando generalizações e procurando fazer acusações infundadas ou apenas
com base em perceções muito subjetivas, corre-se o risco de contribuir para o
populismo”.
Proença de Carvalho referiu ainda, em contexto ‘Luanda Leaks’, que os advogados
e sociedades portuguesas têm nos dias de hoje critérios de “rigor” e de
“cumprimento” das normas. “O escritório onde eu trabalhei tem padrões da maior
exigência e do maior respeito por regras deontológicas e éticas”, concluiu.
Em janeiro, depois de conhecido o Luanda Leaks, Jorge Brito Pereira, advogado
de anos de Isabel dos Santos, renunciou ao cargo de chairman na Nos, e saiu do
escritório de advogados Uría Menendéz – Proença de Carvalho, onde era sócio.
Atualmente, tem atividade suspensa.
Durante o debate, Proença de Carvalho falou ainda de Rui Pinto, o denunciante do
Football Leaks, Luanda Leaks. “Sou absolutamente contra a utilização de provas
obtidas de forma criminosa. No dia em que isso fosse possível, as polícias podiam
perfeitamente utilizar um bandido qualquer para entrar em minha casa, arrombar o
cofre e tirar os documentos dos meus clientes”, disse.
“Qual é a diferença entre arrombar uma casa e roubar os documentos e entrar no
correio eletrónico e fazer a mesma coisa? É exatamente igual”, vincou o ex-jurista.
“Isso é uma coisa, outra é os polícias investigarem de acordo com os meios que a
lei lhes proporciona. Porque se abrirmos a porta a soluções deste tipo, acabou o
Estado de Direito, é o caos e é a inexistência dos direitos fundamentais das
pessoas”.
In Advocatus, 18-02-2020
https://eco.sapo.pt/2020/02/18/ana-gomes-diz-que-escritorios-ao-verdadeiras-
associacoes-criminosas-proenca-de-carvalho-responde/
https://www.pordatADVpt/Portugal/Advogados+total+e+por+sexo-245
116
defender o Estado de direito e não se envolverem em qualquer atividade criminosa.
Tal exige que os advogados estejam permanentemente cientes da possibilidade de
criminosos procurarem fazer uma utilização indevida da profissão de advogado na
prossecução de atividades de branqueamento de capitais e financiamento do
terrorismo.
A questão primacial que se coloca nesta temática da prevenção e combate ao
branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, é se os deveres de
comunicação e de colaboração a que o advogado está obrigado desvirtuam a
profissão, no que toca aos seus princípios estruturantes, nomeadamente o do
segredo profissional e o do princípio da confiança na relação advogado-cliente,
colocando-se em conflito com as regras deontológicas do EOA.
A obrigação de guardar segredo profissional visa garantir o interesse público,
nomeadamente a administração da justiça e a defesa dos interesses dos clientes.
Como refere Carlos Pinto de Abreu: “Deste modo não é possível que “(…) haja
confiança de um cliente sabendo ele que, caso tenha, de facto praticado ou venha
a praticar um crime, o seu próprio Advogado não tem direito, mas sim o dever de o
denunciar” (“A Lei n.º 101/2001 de 25 de agosto, designada por Regime Jurídico
das Acções Encobertas para Fins de Prevenção Criminal”, Ordem dos Advogados
– Conselho Regional de Lisboa, “Legislação Profissional – Estatuto da Ordem dos
Advogados Anotado, 1ª Edição, 2017).
A introdução dos Advogados no rol de sujeitos ao dever de comunicação das
operações suspeitas de financiamento do terrorismo e branqueamento de capitais
advém de 2004 (Lei nº 11/2004 de 27 de março) devido ao facto de o bem jurídico
protegido pela incriminação do crime de branqueamento de capitais ser a
realização da justiça.
Os crimes de branqueamento de capitais, bem como o financiamento do terrorismo,
fazem movimentar elevados montantes de dinheiro todos os anos. Na realidade, os
montantes correspondentes aos lucros, ou tão somente ao cash-flow, das
modernas associações criminosas são tão absurdamente elevados que se estima
corresponderem a um montante equivalente a 3.6% por cento do PIB mundial, isto
é, a 1.6 triliões de dólares americanos por ano, segundo um estudo realizado em
2009 (Dissertação de Beatriz Barbosa, A nova lei de branqueamento de capitais e
os deveres do Advogado).
- Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto (regula o Regime da Prevenção do
Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo (BC/FT). Os deveres
profissionais dela decorrentes entraram em vigor aos 17-09-2017. Foi alterada pela
Lei nº 58/2020 de 31-08;
- Directiva (EU) 2018/843, de 30-05-2018, relativa à prevenção da utilização do
sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento
do terrorismo.
http://datADVeuropADVeu/eli/dir/2018/843/oj;
- Regulamento da Ordem dos Advogados sobre a prevenção e combate ao
branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo (Deliberação 822/2020
de 21-08). Entrou em vigôr aos 11-09-2020.
117
https://portal.OA.pt/media/131680/deliberacao-822-2020-21-08-2020-
regulamento-prevencao-branqueamento-capitais.pdf
118
Com a comunicação do Advogado, o Bastonário aprecia o expediente à luz do
segredo profissional e presta a informação ao DCIAP e UIF da PJ, em ofício por si
assinado.
O Advogado também será notificado por ofício assinado pelo Bastonário, com o
despacho que lhe mereceu a comunicação e a data em que foi transmitida.
O dever de conservação previsto na al. f) do art. 11º e art. 51º estatui que os
Advogados devem guardar toda a documentação que lhes tenha sido confiado pelo
período mínimo de sete anos.
A 24.11.2021, foi publicada a Lei n.º 78/2021 que consagra o regime de prevenção
e combate à actividade financeira não autorizada e protecção dos consumidores.
O artigo 4º desta Lei determina o “dever de consulta de conservadores, notários,
solicitadores, advogados, oficiais de registo ou câmaras de comércio e indústria e
reporte ao Banco de Portugal”, tendo iniciado a sua vigência no dia 1 de março de
2022.
Na sequência deste regime, os notários, solicitadores e advogados devem
comunicar eletronicamente ao Banco de Portugal a informação sobre as escrituras
públicas, documentos particulares autenticados ou documentos com assinatura por
si reconhecida em que intervenham e que se reconduzam aos tipos referidos nas
alíneas do n.º 1 do artigo 4º, com excepção daqueles em que actuem por conta de
entidades autorizadas pelos supervisores financeiros, nos termos do nº 5 do artigo
4º da mencionada Lei.
Passa a existir o dever de menção especial nos contratos de mútuo civil de valor
superior a €2500,00.
Impõe-se ao ADV o dever de colaborar com o Banco de Portugal na fiscalização da
actividade financeira não autorizada.
Contudo, o artigo 4º, nº 4, dessa Lei prevê que “o disposto nos n.ºs 1 e 3 não é
aplicável sempre que advogados e solicitadores atuem no decurso da apreciação
da situação jurídica de cliente ou no âmbito da defesa ou representação desse
cliente em processos judiciais ou a respeito de processos judiciais, mesmo quando
se trate de conselhos prestados quanto à forma de instaurar ou evitar tais
processos, independentemente de essas informações serem recebidas ou obtidas
antes, durante ou depois do processo”.
https://portal.OA.pt/comunicacao/comunicados/2021/comunicado-do-bastonario-
lei-n%C2%BA-782021-de-24-de-novembro/
- Art.208º CRP;
- Artigos do EOA com interesse para esta temática: 90º, nº 2, als. c) d) e e) - deveres
para com a comunidade; 92º nº 1 e nº1, al. a) - obrigação de segredo profissional -
; art. 88º (dever de integridade) e 97º (princípio da confiança).
119
“1 - Para efeitos do disposto nos números seguintes, consideram-se vantagens os
bens provenientes da prática, sob qualquer forma de comparticipação, dos factos
ilícitos típicos de lenocínio, abuso sexual de crianças ou de menores dependentes,
extorsão, tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, tráfico de armas,
tráfico de órgãos ou tecidos humanos, tráfico de espécies protegidas, fraude fiscal,
tráfico de influência, corrupção e demais infrações referidas no n.º 1 do artigo 1.º
da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, e dos factos ilícitos típicos puníveis com pena
de prisão de duração mínima superior a 6 meses ou de duração máxima superior a
5 anos, assim como os bens que com eles se obtenham.
2 - Quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão
ou transferência de vantagens, obtidas por si ou por terceiro, direta ou
indiretamente, com o fim de dissimular a sua origem ilícita, ou de evitar que o autor
ou participante dessas infrações seja criminalmente perseguido ou submetido a
uma reação criminal, é punido com pena de prisão de 2 a 12 anos.”
120
Sem que se esqueçam, obviamente, os objectivos da realização da justiça; da
protecção da democracia, da salvaguarda das próprias estruturas do Estado e do
inconfessado, mas manifesto interesse deste no confisco dos lucros do crime”.
121
contribuições e entradas de qualquer tipo e ainda a prestação de serviços a essas
entidades (v. quadro II);
- Operações de alienação e aquisição de direitos sobre praticantes de actividades
desportivas profissionais;
- Outras operações financeiras ou imobiliárias em representação ou em assistência
do cliente.
Assim, e a título meramente exemplificativo:
Se o cliente precisar de abrir uma conta bancária para si ou para a sua empresa, o
Advogado deve aplicar o Regulamento.
Se o cliente precisar da assistência do Advogado sobre a celebração de um
contrato de promessa de compra e venda de um imóvel, deve aplicar-se o
Regulamento.
Se o Advogado elaborar, a pedido do cliente, uma minuta de contrato de promessa
de compra e venda de um imóvel, deve aplicar o Regulamento.
O Advogado que trabalhe habitualmente com mediadoras imobiliárias e com
entidades bancárias terá interesse em facultar os formulários ao intermediário e
deverá verificar a comprovação dos elementos.
Em qualquer desses casos, não constitui violação do segredo profissional, pois o
advogado age, não como advogado, mas:
1. como mero consultor económico ou fiscal, fora da previsão dos serviços conexos
com o aconselhamento, o patrocínio ou a defesa;
2. como mero responsável ou, melhor, titular de órgão de administração ou de
gestão de sociedade, designadamente representante de off-shore; ou
3. como mero empresário ou cidadão, não está, nem pode estar, abrangido por tal
isenção do dever de denúncia das operações suspeitas.
Por conseguinte, os Advogados não ficam sujeitos aos específicos deveres que
visam a prevenção do branqueamento e o financiamento do terrorismo
(BCFT) quando a informação suspeita é obtida através da prática dos actos
previstos no artigo 79.º da Lei do BC/FT e 4º do Regulamento, ou seja, nas
situações em que:
1. Obtenham informações no contexto da avaliação da situação jurídica do cliente
ou no âmbito da consulta jurídica, incluindo o aconselhamento relativo à maneira
de propor ou evitar um processo, e
2. Exerçam a sua missão de defesa ou representação do cliente num processo
judicial ou a respeito de um processo judicial, isto quer as informações sejam
obtidas antes, durante ou depois do processo.
Ou seja, enquanto o advogado age como tal, enquanto pratica actos próprios da
advocacia, tal como estão definidos na Lei nº 49/2004, de 24 de Agosto, não está
obrigado ao dever de comunicação ou de denúncia, nem sequer ao Bastonário.
122
No entanto, esses actos próprios da advocacia têm um limite que é o de não
consistirem em actos de auxílio, facilitação conversão ou transformação de
vantagens e de ocultação ou dissimulação de actos ilícitos praticados a montante.
SUBSECÇÃO II
Profissões jurídicas
Artigo 79.º
123
2 - Fora das situações previstas no número anterior, os advogados e os
solicitadores:
Contra este regime, são várias as vozes que se erguem, alertando para o facto de
se estar a pôr e causa os princípios estruturantes da advocacia como o do segredo
profissional e o da confiança.
Invoca-se que os poderes do Estado não podem nunca estender-se ilimitada e
abusivamente ao ponto de exigirem a violação do sigilo profissional e a quebra da
confiança do cidadão no seu advogado - seja ele mandatado ou oficioso, patrono
ou defensor ou simples consulente ou confidente - sob pena de infracção à garantia
legal inamovível contra as tentações securitárias e policiais de se obter confissão
por interposta pessoa e de violação do direito à intimidade, mas sobretudo sob pena
de se negar ao cidadão a livre, real e efectiva possibilidade de se fazer aconselhar,
de se defender e de se representar em juízo.
124
policiais ou judiciais; só ao bastonário compete, em cada caso concreto e nos
termos estatutários, decidir se se quebra ou não o sagrado dever de sigilo
profissional. Há que esclarecer a opinião pública e também os advogados inscritos
na Ordem dos Advogados, de que não compete aos advogados, em cada caso
concreto, aquilatar e decidir se devem ou não denunciar os casos de suspeita de
branqueamento de capitais que venham ao seu conhecimento no âmbito da sua
profissão. Essa competência de denúncia é exclusiva do seu bastonário, tal como
o é em todos os casos de quebra ou dispensa de sigilo profissional. A Lei n.°
11/2004, de 27 de Março, ao transpor a directiva do Parlamento Europeu e do
Conselho relativa à prevenção de utilização do sistema financeiro para efeitos de
branqueamento de capitais, respeitou o dever de sigilo dos profissionais dos
advogados. E assim é porque assim tem de ser. As normas do Estatuto da Ordem
dos Advogados que dispõem sobre segredo profissional são normas de interesse
público; a Ordem dos Advogados é um órgão da administração mediata do Estado;
a Ordem dos Advogados, através do seu bastonário, ao decidir ou não decidir pela
quebra do sigilo, exerce uma função de interesse público, sendo o seu parecer
vinculante erga omnes, inclusive para todas as instâncias judiciais.
Assim, quer nas situações concretas de suspeita de branqueamento quer em todas
as restantes situações concretas de conflitos de deveres ou interesses, ao
advogado o que se exige é o silêncio; o advogado deve silenciar-se sobre factos
que estejam a coberto do segredo profissional; o advogado tem o direito a recusar-
se a revelá-los perante quaisquer autoridades. Não há, pois, em qualquer
circunstância, conflitos de deveres em que o advogado tenha de analisar e/ou
decidir qual deles deve prevalecer.
Reconhecemos que o ataque ao novo crime do século XXI a corrupção, a lavagem
de dinheiro e a fraude e a evasão fiscais – é a condição de sucesso de
desenvolvimento, prosperidade e sobrevivência do regime democrático, devendo
por isso constituir uma prioridade. Mas é às instâncias policiais e judiciais que
compete dar-lhes prioridade através de mecanismos e de procedimentos com
respeito integral pelos princípios estruturantes do Estado de direito democrático.
Por assim ser, em outras situações similares, na prevenção do crime, o VIII
Congresso das Nações Unidas estabeleceu no ponto 22 dos princípios básicos
relativos à profissão de advogados que os “Governos devem reconhecer e respeitar
a confidencialidade de todas as comunicações e consultas feitas entre os
advogados e os seus clientes no âmbito das suas relações profissionais”.
• Comunicado
125
constitucionais que tratam do papel do Advogado na administração da Justiça, dos
seus direitos e prerrogativas, colidem, em nosso entender, com a legislação ora
transpostADV Levanta-se, por isso, o problema da conformidade das directivas com
o texto constitucional e, também, dos próprios Tratados, com os quais essas
directivas têm de se conformar, com a nossa Lei Fundamental.
A Ordem dos Advogados é uma associação de direito público que se não limita a
representar os seus associados, mas que estatutariamente pugna pela defesa do
Estado de Direito e seu aperfeiçoamento. Para além de outros deveres estatutários,
a legislação aprovada é um sério ataque ao dever de sigilo dos Advogados, timbre
da nossa profissão, verdadeira pedra angular sobre a qual se ergue todo o nosso
edifício deontológico. Donde, forçar os Advogados a serem uma espécie de
denunciantes (whistleblowers), em relação aos seus Clientes, em dadas
transacções, é afectar esse capital inestimável e que garante um Estado de Direito,
qual seja a possibilidade de alguém poder confiar totalmente no ou na Advogada
que escolhe.
De facto, o sigilo profissional dos Advogados não tem preço. Apenas dignidade!
Guilherme Figueiredo
Bastonário
126
“1. Da Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do
Terrorismo (Lei de Combate ao Branqueamento), não obstante a salvaguarda
prevista no seu art.º 79.º que exime os Advogados de revelar informações obtidas
no âmbito da consulta jurídica e no exercício do patrocínio judiciário, poderão
resultar para estes profissionais deveres de colaborar com autoridades judiciárias
e outras em situações não abrangidas pela referida cláusula de salvaguarda,
devendo o Bastonário e o Conselho Geral, em conjugação de esforços e intentos
com os Conselhos Regionais, ouvidos o Conselho Superior e os Conselhos de
Deontologia:
a) Diligenciar junto do Ministério da Justiça no sentido de excluir os Advogados do
dever de comunicação sistemática de operações em que intervenham em
representação dos seus clientes que vierem a constar do elenco da portaria
governamental a aprovar pelo Ministério da Justiça ao abrigo do art.º 45.º, n.º 1 da
Lei de Combate ao Branqueamento;
b) Identificar claramente as situações em que os Advogados estejam obrigados a
comunicar ao Bastonário as suas suspeitas sobre a proveniência ilícita de certos
fundos ou outros bens ou a suspeita de se destinarem ao financiamento do
terrorismo, ao abrigo do dever de revelar previsto no art.º 43.º da Lei de Combate
ao Branqueamento;
127
https://www.publico.pt/2020/01/30/sociedade/noticia/advogados-quase-nao-
reportam-suspeitas-lavagem-dinheiro-1902218
O ex-bastonário, Luis Meneses Leitão, que tomou posse aos 14-01-2020 recebeu,
logo então e num só mês, três comunicações relativas a operações suspeitas, que
remeteu à Procuradoria-Geral da República.
Ver aqui:
https://eco.sapo.pt/2020/02/19/ordem-dos-advogados-recebeu-tres-
comunicacoes-de-branqueamento-num-so-mes/
Regime legal:
https://portal.OA.pt/advogados/sociedades-de-advogados/
Enquadramento legal:
a) O Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.º 145/2015, de 9 de
setembro, alterado pela Lei n.º 6/2024, de 19 de janeiro, que revogou os arts. 213.º
a 222.º e estatuiu a regra constante do art. 212º-A, bem como a constante do art.
5º, nº 1;
128
b) A Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que estabelece o regime jurídico da
constituição e funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas
a associações públicas profissionais (abreviadamente identificada por LSP);
c) A Lei nº 64/2023 de 20 de novembro, que altera a referida Lei nº 5372025;
c) A Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação,
organização e funcionamento das associações públicas profissionais
(abreviadamente identificada por LAPP), alterada pela Lei 12/2023 de 28.03; e
d) Regulamento das Quotas das Sociedades de Advogados – Regulamento n.º
512/2018, de 6 de agosto foi revogado.
129
- As sociedades estão sujeitas aos princípios e deveres deontológicos do EOA, que
devem igualmente ser observados nas relações internas entre sócios e associados
- artigo 18º da LSP.
- Sociedades de responsabilidade limitada e ilimitada: nº 5 do art. 212-A, devendo
a respetiva firma demonstrar o tipo de responsabilidade adotado pela sociedade,
terminando com o aditamento «RI» ou «RL», para além de ter de indicar a
sigla «SP», por estar sujeita ao regime jurídico da constituição das sociedades de
profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais, aprovado
pela Lei n.º 53/2015, de 11 de junho. Deste modo, a firma das sociedades de
advogados deverá terminar com os aditamentos «…, SP, RI» ou «…, SP, RL»,
consoante seja adotada a modalidade de responsabilidade ilimitada ou limitada.
Em ambas situações e ao abrigo do disposto nos artigos 4.º e 19.º da Lei n.º
53/2015, de 11 de junho, o contrato de sociedade deverá conter as
seguintes menções:
— A identificação dos sócios, designadamente pela indicação do nome,
naturalidade, estado civil (se casado nome do cônjuge e regime de bens),
residência, domicílio profissional e o número de cédula profissional dos sócios;
— A firma da sociedade;
— A sede social;
— O objeto social;
— O montante do capital social, a natureza e o valor das participações que o
representam e os respetivos titulares;
— A administração e a forma de obrigar.
130
- Vide ainda Gustavo Sampaio, Os Facilitadores, Esfera dos Livros, Lisboa, 2014.
131
não estejam inscritas nas respetivas ordens. Para avançar com esta medida, seria
necessário alterar os estatutos de 12 ordens profissionais, incluindo a dos
advogados.
O regulador considera que, desta forma, seria possível obter economias de escala,
reduzir os custos operacionais e assegurar uma maior customização, qualidade e
diversidade, juntamente com preços mais competitivos, em benefício dos
consumidores. Os casos de Inglaterra e Espanha, países onde já são permitidas
sociedades multidisciplinares, são apontados pela AdC como exemplos a estudar.
A AdC defende ainda que é necessário abolir as normas que restringem a
propriedade e a gestão das sociedades de profissionais, de maneira a permitir a
compra e venda destas firmas, bem como a sua administração por pessoas que
não estejam inscritas nas respetivas ordens. Para avançar com esta medida, seria
necessário alterar os estatutos de 12 ordens profissionais, incluindo a dos
advogados.
A questão da multidisciplinaridade e da liberalização tem dividido a classe dos
advogados, havendo quem considere que vai contra os princípios da profissão.
“O exercício da advocacia em estruturas multidisciplinares fere de morte a
dignidade da profissão e põe em causa o cumprimento de deveres deontológicos a
que o advogado está vinculado na prática profissional para protecção do segredo
profissional, proibição de publicidade, proibição de advogar contra o direito
constituído ou o direito de recusar causas injustas”, disse ao Jornal Económico
António Jaime Martins, presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos
Advogados, na semana passada.
Outros advogados, porém, consideram que a multidisciplinaridade é fundamental
para responder às necessidades dos clientes, ao permitir uma oferta de serviços
transversal e multidisciplinar. A seu lado têm as consultoras, que querem poder
oferecer serviços jurídicos aos seus clientes.
Contornando a proibição da multidisciplinaridade, várias destas entidades têm já
parcerias com escritórios de advogados independentes que, por essa via, prestam
serviços aos seus clientes. Se a multidisciplinaridade se tornar uma realidade, as
‘Big Four’ (PwC, Deloitte, EY e KPMG) e outras consultoras poderão comprar
sociedades de advogados ou criar equipas jurídicas próprias, facturando esses
serviços directamente aos clientes.”
In Jornal Económico, 17-12-2019,
https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/oe2020-governo-quer-acabar-com-limites-
ao-acesso-as-profissoes-reguladas-526323
132
exemplo, a preservação do segredo profissional, retira-se uma garantia
fundamental aos cidadãos e põe-se em causa uma das imunidades dos advogados,
indispensável ao patrocínio forense.
O projecto de lei relativo às ordens profissionais que altera questões como as
condições de acesso a algumas profissões, introduz estágios profissionais
remunerados e cria uma entidade externa para fiscalizar os profissionais, acabou
mesmo por ser aprovado pelo Parlamento aos 22-12-2022.
A 1 de fevereiro de 2023 o Presidente da República pediu a fiscalização preventiva
da constitucionalidade desse diploma por considerar que algumas das suas normas
poderiam ferir os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da auto-
regulação, como sejam: a inclusão de personalidades externas às ordens
profissionais em maior proporção do que internas na avaliação de estágios
profissionais, nos órgãos disciplinar e de supervisão e como provedor, assim como
a incompatibilidade de funções de dirigente na ordem e na função pública.
Por decisão tornada pública em 27 de fevereiro, o TC não considerou
desrespeitados quaisquer princípios ou normas constitucionais, não se
pronunciando consequentemente no sentido da inconstitucionalidade de nenhuma
das disposições fiscalizadas.
Aos 28.03.2023 foi publicada a Lei nº 12/2023, que altera a Lei nº 2/2013 de 10 de
janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento
das associações públicas profissionais, e à Lei nº 53/2015 de 11 de junho, que
estabelece o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades de
profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.
Visou-se e no que ao tema interessa, garantir a liberdade de acesso e de exercício
da profissão, ao estabelecer-se, sem excepção, que as ordens profissionais não
podem, por qualquer meio, estabelecer restrições à liberdade de acesso e de exer-
cício da profissão, além daquelas que já resultam da lei ou respetivos estatutos das
ordens, que foram reduzidas, e na salvaguarda de outros interesses constitucional-
mente protegidos, mediante a proibição de atividades reservadas.
As atividades profissionais só poderão ser reservadas aos membros das ordens
quando tal resulte expressamente de lei, fundada em razões de interesse público
constitucionalmente protegido, segundo critérios de adequação, necessidade e pro-
porcionalidade.
A Lei n.º 64/2023 de 20-11 veio alterar a referida Lei n.º 53/2015.
“Será que o dever de sigilo do advogado é compaginável, numa mesma sociedade
profissional, com o dever de informação de um auditor ou revisor de contas? Será
que um advogado que seja eventualmente suspenso ou expulso pela justiça
disciplinar da sua Ordem, pode arrumar a toga e continuar na sociedade
multidisciplinar a outro qualquer título? Será que o dever de independência do
advogado pode conviver com a natureza subordinada de outras profissões?
Quantas “Chinese Walls” se irão agora inventar para disfarçar, ou atenuar, os riscos
de conflito de interesses? E será que o advogado, em reunião de sócios da
133
hipotética multidisciplinar, conseguirá impor aos seus sócios, não advogados, a
proibição da quota litis?
É normal que alguns advogados pensem que a multidisciplinariedade lhes trará
clientela acrescida, pois a capacidade de angariação e fixação de clientes parece
teoricamente maior. Mas os clientes são mesmo atraídos por uma sociedade
profissional indefinida e especialista de coisa nenhuma?
No quarto crescente e na lua cheia da minha vida profissional dediquei o tempo que
me sobrou da prática de advocacia a construir uma sociedade de advogados e a
estudar dezenas de outras experiências.
Nessa experiência avassaladora tive a sorte de trabalhar e conhecer
reputadíssimas sociedades de advogados em Portugal, e no estrangeiro. Nenhuma
delas era, ou pretendia ser, uma sociedade multidisciplinar. Todas me
impressionaram de forma inesquecível.
Conheci algumas (poucas) sociedades multidisciplinares que ofereciam também
serviços de advocacia. Não fixei o nome de qualquer uma delas”.
Miguel Castelo Branco, Advogado, 27-05-2013 in
https://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/colunistas/manuel-castelo-
branco/detalhe/profissoes_reunidas_sa
“Será que as sociedades de advogados portuguesas querem apostar na
multidisciplinaridade? E que posição deve ter a OA? À Advocatus os especialistas
mostram-se divididos.
Advogados, consultores, auditores, solicitadores e notários juntos na mesma
sociedade? Atualmente não é possível, mas o Governo deixou uma porta aberta
para a integração de novas profissões nas firmas de advogados. Nas “grandes
opções do plano” definidas para 2020, o Governo deixa em aberto a possibilidade
de criação de sociedades multidisciplinares.
Também estabeleceu como uma das prioridades, para os próximos três anos, a
eliminação de práticas que limitem ou dificultem o acesso às profissões
autorreguladas, como a dos advogados, notários e/ou solicitadores.
Enquanto que para Fernando Antas da Cunha, managing partner da Antas da
Cunha ECIJA, este passo pode ser um bom início, para outros advogados não é
tão linear.
“Não me parece que essa liberalização possa incluir os advogados, na medida em
que estes servem um interesse público fundamental, no exercício da Justiça. A
liberalização da advocacia só poderia trazer o caos e seria em prejuízo da justiça”,
explica José Luís Moreira da Silva, sócio da SRS Advogados.
Também José António Barreiros considera a solução do Governo “perigosa” uma
vez que “fomenta a concorrência entre profissões”.
Em países europeus como Alemanha, Espanha, Bélgica e Suíça, as sociedades
multidisciplinares são admitidas sem restrições. No caso da Finlândia, Dinamarca
ou Suécia, existe apenas uma condicionante: não pode envolver partilha de lucros.
“O que sei é que, ciclicamente, somos contagiados por desejos de copiar o que
vem de fora, de mais moderno, “o último grito de Paris” de forma bacoca, sem juízo
crítico e ponderação”, considera José ADV Nogueira, da RSN Advogados.
134
Estatutariamente impossível, a integração de novas profissões nas sociedades
pode colocar em causa as regras deontológicas dos advogados, segundo o sócio
da SRS Advogados. “A única forma de tal poder não acontecer seria criar uma
separação clara das várias profissões no interior da sociedade, o que implicaria
uma divisão que punha em causa a sua integração, pois teriam de continuar a atuar
de forma autónoma”, acrescenta.
A multidisciplinaridade nas sociedades teria de passar por um reequacionamento
do Estatuto da Ordem, que segundo José António Barreiros, está “historicamente
gizado numa lógica de prática individual e carece de uma profunda revisão face aos
problemas contemporâneos”.
Ainda assim, Fernando Antas da Cunha acredita ser possível a convivência de
várias especialidades sem colocar em causa deveres específicos. “Se analisarmos
o dia-a-dia de uma sociedade de advogados, constatamos que nos relacionamos
com as mais diversas profissões e, muitas vezes, temos de partilhar informação
sensível, o que acaba por acontecer ficando as partes protegidas a partir da
assinatura de um acordo de confidencialidade”, notADV
Uma coisa é assegurada por todos, novas profissões irão influenciar a prática
individual. Seja através do contacto com realidades, valores, processos ou até
metodologias diferentes, a multidisciplinaridade traz à advocacia uma nova forma
de pensar e ver o resultado.
O managing partner da Antas da Cunha ECIJA exemplifica a integração de
programadores como uma vantagem para as sociedades, uma vez que “os
advogados não dominam a linguagem informática o que torna muito difícil a
interação e comunicação com o “cliente”.
135
“Os clientes teriam a desvantagem de deixar de ter um advogado e passar a ter um
conjunto de profissionais que tratariam de vários assuntos”, nota José Luís Moreira
da Silva. O sócio da SRS Advogados acrescenta que a única maneira de diminuir
o impacto negativo seria através da manutenção da autonomia na advocacia ou a
“liderança no apoio ao cliente”.
Obtenção de melhores resultados, serviços e integrados, análises e soluções
globais são alguns dos aspetos que, por outro lado, José António Barreiros
considera que beneficiariam o cliente.
“Os clientes, de uma forma geral, gostam do conceito “one stop shop”. A
proximidade e a cultura de uma organização enquanto fator de retenção é algo
absolutamente crítico. Neste contexto, se conseguirmos oferecer serviços
multidisciplinares, tal será uma enorme vantagem para os clientes em geral”,
explica Fernando Antas da Cunha.
Sociedades de profissionais
136
sociedades civis ou assumir qualquer forma jurídica admissível por lei para o
exercício de atividades comerciais.
137
O mesmo regime de exclusividade foi consagrado pelo DL 229/2004, de 10 de
Dezembro (artigo 5º), que veio “completar a flexibilizar o regime jurídico dessas
mesmas sociedades”, salvaguardando-se o “princípio da natureza não mercantil”,
para “permitir uma concorrência sã e equilibrada entre os profissionais dos diversos
Estados” da União Europeia, como se lê no preâmbulo.
A função social da advocacia não se alterou desde então ao ponto de provocar uma
rotura dos valores que constituem a “alma da toga”. São estes valores que justificam
a consagração estatutária das restrições previstas no referido nº 4 do art.º 27 da
LAPP.
A advocacia desempenha uma relevante função social de interesse público, tanto
como colaboradora indispensável na administração da justiça, como ainda como
defensora, por definição, do Estado de Direito e dos direitos, liberdades e garantias
do cidadão, como decorre das atribuições estatutárias da OA (cfr. designadamente
o art.º 3º do actual e do projecto do novo Estatuto). Por esta razão, todas as
entidades públicas, autoridades judiciárias e policiais lhe devem colaboração (artigo
8º EOA).
Os advogados são os únicos profissionais que têm, estatutariamente, “deveres para
com a comunidade”, de entre os quais avulta “defender os direitos, liberdades e
garantias”, “pugnar pela boa aplicação das leis” e “colaborar no acesso ao direito”
(artigo 85º do actual e do projecto de Estatutos).
O “acesso ao direito e aos tribunais”, assim como o “patrocínio judiciário” estão
garantidos no artigo 20- nºs 1 e 2 da CRP e são assegurados exclusivamente pelos
advogados. O advogado desempenha ainda um papel relevante para além do
exercício do mandato forense, quando, no recato do seu gabinete, dirime ou previne
litígios, assumindo-se, na feliz expressão do Professor António Castanheira Neves,
como “mediador da convivência ética”, agente do equilíbrio e da paz social.
A função ético-social da advocacia é que justifica certas incompatibilidades ou
impedimentos para o exercício profissional, a fim de manter a isenção,
independência e dignidade (art. 76º e ss. EOA).
Em reforço do relevante interesse público da advocacia cabe lembrar as exigências
legais e deontológicas de integridade, dignidade, probidade e independência
consagradas nos artigos 83º e 84º e o apertado regime de segredo profissional e
de fixação de honorários, previsto nos artigos 87º, 100º e 101º do EOA.
A Ordem dos Advogados congrega uma classe de “alta e escrupulosa probidade”,
como se escreveu no preâmbulo do decreto fundador, de 1926. Por isso foi sempre
considerada “uma pessoa colectiva de direito público”.
É nesta lógica de interesse público que foi constitucionalizado o patrocínio forense
e garantidas aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato,
“como elemento essencial à administração de justiça” (artigo 208 da CRP). Essas
imunidades, decorrentes de “razões imperiosas de interesse público”, para usar a
formulação do citado nº 4 do art.º 27 da Lei 2/2013, estão hoje previstas,
designadamente, no art.º 144 da Lei 52/2008, de 28 de Agosto (Lei de Organização
e Funcionamento dos Tribunais Judiciais).
As próprias Nações Unidas preocuparam-se em declarar os “Princípios Básicos
Relativos à Função de Advogados”, que considera os advogados “como agentes
138
essenciais à administração da justiça” (ponto 12) garantindo-lhes “imunidade civil,
penal por todas as declarações pertinentes, feitas de boa fé por escrito ou em
alegações orais”(ponto 20).
Este regime de não sancionamento por quaisquer expressões ou imputações
indispensáveis à defesa da causa está aliás consagrado no art.º 154-2 do C. Proc.
Civil.
O perfil do advogado e a especificidade da profissão forense, acima esboçados,
caracterizam a advocacia como actividade de relevante interesse social, como uma
missão de interesse público, para os efeitos do regime do nº 4 do art.º 27 da Lei nº
2/2013.
Acresce que o advogado está dotado de autoridade pública, visto ter competência
para actos reservados a notários, como reconhecimentos, autenticações e
certificações de documentos (DL 76-A/2006, de 29 de Março e DL 8/2007, de 17
de Janeiro), podendo ainda, entre outros actos negociais, formalizar a transmissão
de bens imóveis e celebrar a maioria dos contratos regulados no Código das
Sociedades Comerciais (DL 116/2008, de 4 de Julho).
Eloquente é constatar que já antes destas competências, que implicam a natureza
pública daqueles actos, o insigne Prof. Doutor Jorge Figueiredo Dias entendia que
o advogado exerce “uma função pública de administração da Justiça e é, por
conseguinte, um elemento dessa administração” (Direito Processual Penal, I,
página 471). Parece, assim, suficientemente demonstrado que o EOA e, se se
quiser, o Estatuto Profissional do Advogado podem e devem estabelecer as
restrições previstas no nº 4 do artigo 27º da LAPP relativamente à possibilidade de
constituição de sociedade de advogados em conjunto com outras profissões ou
actividades. Se a lei permite essas restrições, é estulto que não sejam acolhidas
pelos futuro(s) Estatuto(s), mantendo-se as Sociedades de Advogados
exclusivamente reservadas a Advogados, pelas razões históricas e jurídico-
deontológicas que foram resumidamente expostas. O V Congresso da Ordem (Maio
de 2000) considerou incompatível o exercício da advocacia com qualquer tipo de
associação com outros profissionais, designadamente sob a forma de sociedades
multidisciplinares.
O VII Congresso da OA (Figueira da Foz, Novembro de 2011) reiterou esta posição.
E não se vê qualquer vantagem de as Sociedades de Advogados poderem integrar
outras profissões. Se for necessário obter, por exemplo, o parecer de um psicólogo
ou economista sobre um caso concreto, poderá fazer-se como até aqui, solicitando
tal parecer quando se justifique.
A apertada deontologia a que o Advogado está adstrito não se compadece com a
presença de estranhos e com a partilha de informações de natureza confidencial.
A integração de elementos alheios à função, tenderia a abastardá-la, quiçá a
perverter o cerne ético-social da advocacia e a transformá-la numa actividade de
tipo mercantil, como de resto já foi tentado e energicamente rechaçado! Quem não
se lembra do DL 156/2005, de 15 de Setembro, que alargou a obrigação da
existência e disponibilização de um livro de reclamações, como acontece nas
actividades comerciais, sujeitas à inspecção da ASAE?
Repare-se, ainda, nestes três pormenores, diria antes “pormaiores”: - A inclusão de
pessoas estranhas à OA e à administração da justiça nas Sociedades de
139
Advogados vem constituir um nefasto expediente que permite admitir no seu seio
advogados suspensos ou expulsos por grave violação dos seus deveres
deontológicos. – Com a LAPP onde fica a lei dos actos próprios de Advogado (Lei
n.º 49/2004, de 24 de Agosto)? – Para quem defenda a multidisciplinaridade será
que faz sentido restringi-la a entes societários?
Porque não pode, então, um colectivo de advogados, que se tenha agrupado para
partilhar despesas, albergar outros profissionais no seu exercício? Constitui-se,
segundo creio, uma injustificada desigualdade relativa.
Em conclusão:
1º A admissão de estranhos à Advocacia nas sociedades de advogados é
altamente lesiva dos princípios ético-sociais que a inspiram, e perigosa por permitir
o exercício indirecto da profissão a pessoas não habilitadas, suspensas ou
expulsas da Ordem pela prática de graves faltas disciplinares.
2º A experiência mostra que a promiscuidade funcional com pessoas com
formação e vivência diferentes pode afectar o núcleo vital da deontologia
profissional dos advogados, a independência, a ausência de conflito de interesses
e o segredo profissional.
3º Ao prever restrições à inclusão de pessoas estranhas nas sociedades de
advogados, a LAPP quis, na sua letra e no seu espírito, preservar a “autoridade
pública” da Advocacia e reforçar as “razões imperiosas de interesse público” ligadas
à sua “missão”.
4º A Ordem dos Advogados tem competências estatutárias que a tornam uma
Instituição revestida de autoridade e com uma missão de relevante interesse
público, e os seus membros agentes e defensores desses interesses, o primeiro
dos quais é a defesa do Estado de Direito e colaborar na administração da justiça.”
140
A Universidade ensina e a vida forma. A teoria sem prática é como um veículo
sem rodas: existe mas não circula.
António Arnaut
Enquadramento legal:
141
A expressão consagrada legalmente “advogado estagiário” veio substituir a
anterior, denominada “candidato à advocacia”, adoptada pelo Estatuto Judiciário de
1928.
Segundo dados da OA inscrevem-se mais de 1.000 estagiários todos os anos,
sendo que no ano de 2022 esse número foi de 1844.
É um período de iniciação e de integração no mundo da advocacia que lhe permita
enfrentar o dia-a-dia com a confiança necessária o exercício da profissão.
Um bom estágio depende do estagiário que, com humildade, deve mostrar
receptividade a absorver conhecimentos práticos e teóricos, com disciplina, rigor e
sentido de responsabilidade, mas também do patrono, a quem se pede
disponibilidade e capacidade para ensinar, orientar e acompanhar o estagiário. Não
raro aquele distribui-lhe tarefas menos desafiantes, como tirar fotocópias ou servir
cafés, esquecendo-se do seu dever consignado no art. 91º, al. f), olvidando este
seu dever estatutário.
Mas também é proporcionado ao AE trabalhar sobre inúmeras temáticas, o que lhe
permite enriquecer a sua formação e fazer uma apreciação global dos mais
diversos temas de direito processual e substantivo.
O ideal é que o estágio seja fisicamente junto do patrono e demais colaboradores
(e também naturalmente dos clientes) de forma a colocar as suas dúvidas e partilhar
ideias junto deles e sentir a pressão do trabalho.
O AE perceberá rapidamente que a advocacia é altamente competitiva exigente;
com os pés bens assentes na terra, tem de se preocupar em investir no seu
currículo, trabalhar para a especialização, realizar o mestrado e pós-graduações,
desenvolver as suas competências, valorizando-se. Em suma, dar o seu melhor e
numa perspectiva de médio e longo prazo.
Num processo de crescimento, não há que ter receio de falhar. O AE, como
qualquer profissional responsável e sério, deve desafiar-se permanentemente.
A renovação, além de desejável, é sempre necessária e natural.
O AE tem a sua actividade profissional tutelada pelo seu patrono, o que significa
que o patrono é o responsável pelos actos que o seu advogado-estagiário pratique,
devendo orientar, dirigir e sindicar a sua atuação.
A nova lei das Ordens Profissionais (Lei 12/2023 de 28-03) veio consagrar, no
essencial e no que se refere ao estágio, os seguintes princípios:
- Serão apenas permitidos quando não façam parte integrante do curso que
confere a respetiva habilitação académica;
- Não poderão incluir matérias ou unidades curriculares que já tenham feito parte
do referido curso;
- Presume-se que implicam a prestação de trabalho, pelo que serão obrigatoria-
mente remunerados;
- O período de estágio não poderá superar, em regra, os 12 meses;
142
- A avaliação final ficará a cargo de um júri independente que deve integrar mem-
bros exteriores à Ordem.
Concretamente, veio introduzir os estágios profissionais remunerados, sempre que
impliquem a prestação de trabalho (art. 8º, nº 8 e art. 195º, nº 7e 8, que se presume
EOA) e a redução do estágio a um máximo de 12 meses (art. 8º, nº 2, al. a) e art.
195º, nº 2 EOA.
https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/211059785/details/maximized
No ano de 2023, um estagiário tem de pagar, só no acto da inscrição, 700€, a que
acrescem mais 300€ a pagar até cinco dias antes do termo da primeira fase do
estágio e ainda mais 500€, a pagar até 30 dias antes da data designada para a
realização da prova escrita e da de agregação (que dita o final do estágio). Ou seja:
do início ao fim do estágio, no espaço de ano e meio, um jovem licenciado tem de
pagar 2.000€. Além da inscrição, o estagiário ainda tem de pagar 15 euros por mês,
de quotas à OA.
Acresce a esse valor o custo da toga e seguros obrigatórios.
A única contribuição que estão isentos de pagar, enquanto realizam o estágio, é a
para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores.
Com o novo regime legal, as taxas aplicáveis ao estágio são fixadas segundo
critérios de adequação, necessidade e proporcionalidade e estão previstas na
tabele de emolumentos e preço devidos pela emissão de documentos e prática de
actos no âmbito dos serviços da OA (art. 194º-A).
A remuneração e a formação do estagiário serão definidas por regulamento
elaborado pelo conselho geral e aprovado pelo conselho de supervisão, o qual
produz efeitos após homologação pelo membro do Governo responsável pela área
da justiça (art. 192º, nº 1, al. e) e 195º, nº 12).
Essa remuneração será calculada em valor não inferior à remuneração mínima
mensal garantida acrescida de 25% (art. 195º, nº 7).
A questão da incumbência da remuneração do estágio (art. 192º, nº 1, al. e) levanta
actualmente sérias preocupações no seio da OA, porquanto nem todos os patronos
terão possibilidades económicas de o fazer, sem apoios do Estado.
A avaliação final do estágio profissional será feita por um júri independente, que
integra entre os seus membros, em proporção não inferior a um terço, personalida-
des de “reconhecido mérito”, externas à atividade profissional de advocacia, a no-
mear pelo conselho geral, ouvidos os conselhos regionais (art. 195º, nº 10).
143
c) os actos previstos nos arts. 40º, 42º e 58º CPC.
144
Atente-se, a esse respeito o disposto no art. 192º, nº 1 e 5.
Orlando Guedes da Costa, ob. cit., considera ser ilegal a exclusão do AE no âmbito
do apoio judiciário do patrocínio oficioso, ob. cit. para que se remete (cfr. mais
adiante o parecer de Vital Moreira, em sentido contrário).
Patrocínio judiciário
Artigo 40.º CPC:
145
Constituição obrigatória de advogado
Artigo 58.º
Patrocínio judiciário obrigatório
(Vide inventários, injunções de qualquer valor, salvo quando haja oposição e aos
casos a que se refere o art. 629º, nº 2 CPC).
146
Consta-se, assim, que o legislador não concedeu ao AE autonomia para atuar por
si só nos processos judiciais de maior relevância atento o seu valor e/ou
complexidade.
“Nenhum sentido faz que os estagiários, que ainda não cumpriram o tirocínio
previsto para o acesso à profissão, e podem nem o fazer, abandonando o estágio
ou reprovando no exame de acesso à advocacia, possam legitimar com a sua
presença por exemplo a prisão preventiva de alguém ou a sua condenação em
processo penal, sem terem o saber, a autoridade e a independência que só um
advogado pode ter e que a Constituição reconhece.” – Vital Moreira, parecer pedido
pela Ordem dos Advogados, a propósito da controvérsia suscitada.
https://www.OA.pt/ci/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=67944&idc=128
218&idsc=128804&ida=68079
147
Veja-se a este respeito o Ac. do Tribunal Constitucional nº 741/2020:
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20200741.html
Enquadramento legal:
- Arts. 71º, 81º, 88º, nº 1, 89º, 90º, nº 1 e nº 2, als. a) e b), 97º, nº 2 e 5º, nº 2 e 3;
- Ponto 2.1. do CDAE; e
- Arts. 28º, nº 2 e 30º, nº 2 da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro (LAPP);
- Art. 12º da LOSJ;
- Arts. 12º, 14º a 22º, 116º, 127º e 129º do CT;
- Arts. 1132º e 1154º CC
A Advocacia hoje já não é maioritariamente liberal, individualmente e em prática
isolada, com a sua tripla característica de ser intelectual, independente e
desinteressada.
148
É necessário garantir que o dever de obediência não leva o advogado interno a
exercer contra o direito, a patrocinar causas injustas ou a promover diligências
prejudiciais à correta aplicação de lei ou a descoberta da verdade (cfr. art. 90º).
149
Outra é o profissional com elevado grau de instrução, como seja o médico, o
engenheiro ou o advogado, que detêm conhecimentos técnicos próprios.
A partir dessa altura, existe uma autonomia própria do trabalhador, coincidente com
a autonomia técnica.
A autonomia técnica é agir de acordo com as exigências das legis artis e os
conhecimentos jurídicos existentes, de acordo com o dever objectivo de cuidado,
pois a sua obrigação é de meios, sem interferência do cliente, sempre com
liberdade de independência na condução dos seus trabalhos (cfr. arts. 116º do
Código de Trabalho e 12º, nº 3 da LOSJ).
Daí advém que o empregador já não diz como deve fazer, mas apenas determina
o local, o horário de trabalho, que são elementos externos à prestação do trabalho.
A autonomia técnica é distinta de subordinação jurídica e a autonomia técnica não
determina que não há subordinação jurídica.
Assim, a prestação por advogado da actividade profissional de advocacia tem
características híbridas, umas próprias do contrato de trabalho, outra da prestação
de serviços.
O trabalho produzido é controlado e revisto pelos advogados titulares do escritório,
a quem cabe a última palavra. Logo, se está dependente da orientação e
supervisão de outros advogados, é uma actividade juridicamente subordinada.
O salário fixo é outro exemplo de subordinação jurídica.
A precariedade da profissão surge com os falsos prestadores de serviços,
advogados alegadamente independentes.
Um período de férias, justificação de faltas ao (trabalho) por motivo de assistência
à família, e gozo de licenças para efeitos de maternidade e casamento, decorrem
dos direitos laborais.
Artigo 12.º Presunção de contrato de trabalho
1 – Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a
pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se
verifiquem algumas das seguintes características: a) A actividade seja realizada em
local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado; b) Os equipamentos
e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade; c) O
prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação,
determinadas pelo beneficiário da mesma; d) Seja paga, com determinada
periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da
mesma; e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia
na estrutura orgânica da empresa.
2 – Constitui contra-ordenação muito grave imputável ao empregador a prestação
de actividade, por forma aparentemente autónoma, em condições características
de contrato de trabalho, que possa causar prejuízo ao trabalhador ou ao Estado.
3 – Em caso de reincidência, é aplicada a sanção acessória de privação do direito
a subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, por período até
dois anos. 4 – Pelo pagamento da coima, são solidariamente responsáveis o
empregador, as sociedades que com este se encontrem em relações de
150
participações recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como o gerente,
administrador ou director, nas condições a que se referem o artigo 334.º e o n.º 2
do artigo 335.º SECÇÃO
Artigo 14.º Liberdade de expressão e de opinião:
É reconhecida, no âmbito da empresa, a liberdade de expressão e de divulgação
do pensamento e opinião, com respeito dos direitos de personalidade do
trabalhador e do empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam,
e do normal funcionamento da empresa.
Artigo 15.º Integridade física e moral
O empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e o trabalhador
gozam do direito à respectiva integridade física e moral.
Artigo 16.º Reserva da intimidade da vida privada
1 – O empregador e o trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da
contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade
da vida privada.
2 – O direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso, quer
a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes,
nomeadamente relacionados com a vida familiar, afectiva e sexual, com o estado
de saúde e com as convicções políticas e religiosas.
151
i) Explorar, com fim lucrativo, cantina, refeitório, economato ou outro
estabelecimento directamente relacionado com o trabalho, para fornecimento de
bens ou prestação de serviços aos seus trabalhadores;
j) Fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com
o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade. 2 –
Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
152
funcionamento do escritório, sem que, pese embora, houvesse qualquer
estipulação horária para a prestação do trabalho por parte da A, laborando com os
instrumentos e no(s) escritório(s) dos RR. Ademais, não eram conhecidos clientes
próprios à ADV, sendo que esta recebias as retribuições pagas pelos RR. contra
emissão do respetivo «recibo verde».
No que concerne a funções desempenhadas, a ADV no exercício da sua atividade
realizava, análise e elaboração de contratos, as mais das vezes através de minutas
já existentes no escritório, com redação, supressão ou aditamento de cláusulas,
conforme as circunstâncias particulares dos contraentes; o estudo, análise e
elaboração de pareceres jurídicos e documentos vários, designadamente de
correspondência ou consulta de clientes do escritório; redação de trabalhos em
inglês ou tradução/retroversão (inglês/português/inglês) se necessário; o estudo e
análise das legislações portuguesa e angolana, com vista à realização dos mesmos
trabalhos; intervenção em diligências judiciais a coberto de mandato forense
conferido, pelo menos através de dois substabelecimentos dos RR. e de uma
procuração conferida ao R. B e à ADV, em representação de clientes do escritório;
intervenção em repartições públicas em representação de clientes do escritório;
elaboração de notas/registos, descrevendo os trabalhos efetuados e tempos gastos
na sua execução com vista ao apuramento de honorários a cobrar aos clientes do
escritório, com redação em inglês; arquivamento dos trabalhos em pastas próprias,
e contactava com clientes do escritório, se necessário.
Em face de esta situação fática, e entendendo a ADV que estava a desempenhar
as suas funções, com toda a sua autonomia técnico-científica, mas a coberto de
um contrato de trabalho, demandou judicialmente a Sociedade e Sócios para quem
prestava a sua atividade, no sentido de obter justa compensação por, de entre o
mais, aquilo que considerava ter sido um despedimento ilícito. Naturalmente que,
como não poderia deixar de ser, vieram os RR., contestar a presente ação referindo
que o convénio firmado com a ADV se não tratava de um contrato de trabalho, mas
sim de um contrato de prestação de serviços.
A ação improcedeu ao nível da 1.ª instância. Irresignada, a ADV promoveu o
competente recurso, apelando para esta Relação que assim, decidiu: «Pelo
exposto se acorda em julgar procedente a apelação e em consequência em: -
revogar a sentença e em sua substituição declarar a existência de uma relação
laboral entre a ADV e os RR., bem como a ilicitude do despedimento decretado em
10/1/2000 e, consequentemente, -condenar solidariamente os RR. a pagar à ADV
a quantia já liquidada de 16.782,27 € a título de indemnização por antiguidade e
férias vencidas em 1/1/2000 e subsídios de férias e de Natal do período de Abril de
1997 a 2000, bem como a que se liquidar em execução de sentença, relativa às
retribuições relativas ao período de 7/8/2000 até esta data, incluindo as férias,
subsídio de férias e de Natal, mormente os proporcionais ao tempo de vigência do
contrato no ano da cessação, deduzidos os rendimentos do trabalho 39 por
actividade iniciada após o despedimento, tudo acrescido de juros de mora à taxa
supletiva legal, desde a data de vencimento de cada prestação, até integral
pagamento.»
Apreciado e decidido que está o referido dissídio, e tendo em conta que é o único
desta natureza que se conhece, o mesmo tem o mérito de evidenciar que, em sede
concreta, em determinadas circunstâncias, a relação jurídica estabelecida entre
uma Sociedade de Advogados e um Advogado é de natureza laboral. É certo que,
153
o baluarte da justiça há-de, em casos tais, pender ou para o contrato de trabalho
ou para o contrato de prestação de serviços. Assim foi precisamente no caso em
análise, pois que a questão fulcral e principal que cumpria apreciar e decidir era
pois, subsumir esta relação ao campo do direito civil ou ao campo do direito laboral.
Venceu, a tutela laboral. E venceu com inteira razão, pois que donde soube
precisamente concluir que, não obstante existirem diversos elementos que
permitem a distinção do contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços,
é o elemento da subordinação jurídica por oposição à autonomia que permite, com
elevado grau de certeza, razoabilidade e fiabilidade, distinguir, em concreto, um
convénio de outro.
Os juízes deste Tribunal, consideraram o presente caso, como de naturezas
híbridas, porquanto, situando-se numa zona cinzenta, de fronteira, nebulosa, seria
possível descortinar caraterísticas próprias do contrato de trabalho e do contrato de
prestação de serviços, entendendo que a atividade qual a ADV prestava
consultadoria à Sociedade se inseria no âmbito do contrato de prestação de
serviços, e que, o facto de se verificar expressamente, tendo em conta a matéria
factual fixada e apurada, a dependência económica da A, poderia conduzir à
constatação de que estaríamos diante de um contrato de trabalho, mas, certo é que
a dependência económica pode igualmente existir no âmbito do contrato de
prestação de serviços, designadamente, no âmbito do contrato de avença
E é precisamente, o facto de o contrato outorgado e firmado com a ADV revestir
características híbridas que levou estes Sábios Juízes a referir que,
preferencialmente, seria de existir um regime jurídico especial apto a subsumir e
integrar estas situações, pois que, não ignoraram que a sua incorporação no regime
laboral poderá não ser a mais adequada. Contudo, em face de elementos como a
retribuição certa, muito embora a mesma também possa existir no contrato de
prestação de serviços, assim como no que se refere ao local de prestação de
atividade, e ainda pelo facto de a ADV apenas gozar férias em período previamente
acordados com os demais RR., a que acrescem os indícios externos da emissão
do «recibo verde» por parte da ADV, e do seu regime fiscal e de segurança social,
dificilmente se poderia sufragar que tal relação seria alheia ao direito laboral, na
justa medida em que abundavam indícios e elementos que infirmavam a alegada
autonomia que a ADV possuía.
Destarte, foi a presente relação classificada de laboral, mas não sem antes o
coletivo de juízes referir que «o puro e simples enquadramento no regime jurídico-
laboral poderá não ser o mais indicado.», acrescentado que, «O caso vertente é
um exemplo dessa nova realidade que, na ausência daquela desejada regulação,
terá de ser solucionada à luz do direito existente.» Esta decisão, além de pioneira,
teve o mérito de se pronunciar sobre a inexistência de um concreto e especial
regime jurídico que seja de aplicar à relação jurídica estabelecida entre os
Advogados Associados e as Sociedade de advogados. Uma década volvida, o
legislador continua quedo, sem que, além do mais, se conheçam novos casos que
se apresentem a juízo (Bruno António Alves Tomás Pires Advogados Associados e
Sociedades de Advogados: O Vínculo Laboral).”
154
a) Tiago Rodrigues Bastos e outros, A Relação Jurídica entre os Associados e as
Sociedades de Advogados – artigo disponível em
http://www.OA.pt/Conteúdos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?idc=31559&idsc=30347
&ida =31131:
https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/37363/1/ulfd136458_tese.pdf´
A subordinação jurídica deve ser abordada do prisma laboral e à luz dos princípios
deontológicos de isenção e independência do ADV
155
fundamentais da profissão, em particular, reproduz o que já constava do antigo art.
73º, nº 2 e 3 do EOA, que foi revogado pela Lei nº 6/2024 e espelha a preocupação
de preservar a independência e isenção do ADV
É uma norma de natureza pública, que não pode ser derrogada, nem pela vontade
comum das partes, nem pela superioridade económica de uma em detrimento da
outra.
É uma importante garantia dos valores da advocacia.
O antigo art. 73º EOA atribuia ao Conselho Geral da OA a competência exclusiva
para apreciação do contrato de trabalho em concreto, no que se refere à sua
conformidade com os referidos princípios deontológicos, face a eventuais abusos
da entidade patronal – nº 6
Ou seja, o monopólio de interpretação e aplicação do direito pelos tribunais sofria
uma excepção, pois embora a OA seja uma entidade não jurisdicional, face à sua
natureza de interesse público entendia-se ser a única entidade que estava
habilitada a decidir especificamente a questão.
Com a sua revogação, essa competência passa a ser dos tribunais.
156
Em França, o assalariado não pode ter clientela própria. Dá a César o que é de
César.
Em Itália o advogado assalariado não pode ser inscrito como advogado, por face à
subordinação, se encontrar numa situação de incompatibilidade.
O que desejamos para Portugal: sujeitos altamente qualificados, detentores de
habilitações superiores, que executam a sua função em termos manifestamente
precários sem a mais básica garantia de estabilidade? Será esta a
definição/caraterização de «advogado associado» doravante? A funcionalização da
advocacia?
Torna-se necessária uma relação laboral especial, como por exemplo, a aprovada
e regulamentada em Espanha? Isso não constitui qualquer novidade no regime
jurídico português, pois existem várias profissões às quais o legislador reconhece
a especialidade: o trabalho doméstico, a profissão de porteiros de prédios urbanos,
o trabalho no domicílio, as profissionais de espetáculos, a trabalho a bordo das
embarcações de pesca, a trabalho aéreo e o regime jurídico do praticante
desportivo e contrato de formação desportiva.
O VI Congresso da OA realizado em Vilamoura, em 2005, aprovou uma
recomendação (nº 40) no sentido da proibição da subordinação jurídica.
Contudo, sejamos realistas, e voltemos ao conceito de liberdade com que iniciámos
este estudo, agora com Alberto Luís:
“O legislador “garante-lhe o céu”, mas enquanto vigorar o princípio da confiança na
relação empregador-assalariado, o assalariado efectivamente dispõe de uma única
liberdade, a única que não é um mito: a liberdade de se ir embora.”
(Comunicação ao I Encontro Nacional de Advogados de Empresa, “Sobre os
juristas de empresa”, de 23-11-2002).
157
Quem tenha um problema sério nos olhos, procura um oftalmologista e não um
médico de clínica geral.
158
consagrada (art. 47º CRP – liberdade do trabalho e do exercício da profissão) e art.
69º.
De resto, com a hipotética obrigatoriedade da especialidade haveria a tendência
para escolher apenas as áreas mais rentáveis em termos monetários.
O art. 70º, nº 3 consagrou o direito, que vem na sequência do disposto nos arts. 3º,
al. d), 46º, nº 1, al. g) e 91º, al. i).
No art. 3º do Regulamento exige-se mais de 10 anos de exercício da profissão e
idêntico período do exercício da especialidade a que se candidatam, um currículo
relevante para a área da especialidade (exige-se a prática ao longo do tempo).
Para isso, é importante que o advogado se procure posicionar como referência
sobre a matéria escolhida, seja ministrando aulas em tal segmento, seja
concedendo entrevistas sobre o tema, seja com a produção de livros e artigos, por
exemplo. Não é demais lembrar que é preciso estar pronto para a real hipótese de
surgir uma situação de extrema necessidade, em que será procurado o melhor
profissional recomendado para o assunto, que independentemente do valor dos
honorários que será cobrado, será contratado para o caso.
O pedido é formulado ao Conselho Geral.
Deixou de existir um Colégio de Especialidades, que efectuava uma prova oral ao
candidato, em que os seus membros eram advogados com o título de especialistas.
O nº 2 do art. 9º fala num Júri da Especialidade, que pode integrar também
advogados de reconhecida competência e prática na área da especialidade da
candidatura.
Aumentou-se o número de especialidades para 15, tendo o Direito Marítimo sido o
último a ser reconhecido, em 2016 (ver anexo do Regulamento anterior à
consagração da referida especialidade de Direito Marítimo).
Desde 2005 foram atribuídos apenas cerca de 100 títulos de ADV especialista,
sendo o Direito Fiscal a área com maior número (cerca de 40), seguido do Direito
Administrativo com 24 e do Direito do Trabalho com 19. Depois o Direito Financeiro,
Direito da Propriedade Intelectual, Direito Europeu e da Concorrência e o Direito
Constitucional.
O regime das Especialidades surgiu por impulso do Bastonário de José Miguel
Júdice. Despois de um fluxo de pedidos de reconhecimento das especialidades, a
adesão a este regime tem sido lenta.
Especialidades actualmente reconhecidas, no Estatuto e no anexo do respectivo
Regulamento:
Direito Administrativo;
Direito Fiscal;
Direito do Trabalho;
Direito Bancário e Financeiro;
Direito Europeu;
Direito da Propriedade Intelectual, Industrial e da Concorrência;
Direito Constitucional;
Direito Criminal;
159
Direito Societário;
Direito da Família e Menores;
Direito do Consumo;
Direito do Ambiente;
Direito da Igualdade de Género;
Direito da Saúde e Bioética; e
Direito Marítimo.
O diploma regulamentar continua também a exigir a revalidação a cada 5 anos (art.
4º, nº 2).
Poderão haver no futuro outras e novas especialidades, alargando-se assim o
elenco de ramos do direito relativamente aos quais é possível obter o título de
advogado especialista, como a do Advogado Aduaneiro, Aeronáutico, Agrário,
Arbitragem, Autoral, Comércio Internacional, Contratos Comerciais, Desportivo,
Direito das Águas, Eleitoral, Energia, Insolvência e Recuperação Judicial, Fusões
e Aquisições, Imobiliário, Importação e Exportação, Infraestrutura, Internacional,
Internet e e-Commerce, Mercado de Capitais, Mineração, Operações Financeiras,
Petróleo e Gás, Segurança Social, Project Finance, Reestruturação, Seguros,
Sucessões, Contratações Públicas e Telecomunicações.
160
Art. 188º, nº 1, als. a), b) e c): os ADV e AE que se encontram em qualquer das
situações ali mencionadas terão a sua inscrição suspensa ou cancelada (nº 4).
Ver ainda os arts. 177º, 178º e 179º (averiguação de inidoneidade para o exercício
da profissão). A falta de idoneidade moral para o exercício da profissão, que se
prende com o dever de integridade (art. 88º) inibe a inscrição do ADV ou do AE ou
determina o cancelamento daquela se fôr verificada supervenientemente.
a) Considerações gerais:
Contudo, pode haver excepção a essa regra constitucional (art. 81º) face ao
interesse público inerente à função social do advogado, tendo o nosso legislador
consagrado um sistema misto,
Em causa estão os princípios da independência, da isenção e transparência e da
dignidade do ADV, necessários para garantir aquele objectivo, combatendo-se as
“portas giratórias” entre a advocacia e outros interesses, políticos e económicos e
cargos por parte dos advogados.
Ver também o art. 2.5.1. do CDAE:
161
“O Advogado determina a sua actuação exclusivamente dentro dos princípios da
Justiça, de acordo com a sua consciência e em total independência. Não poderá,
por isso, o Advogado, enquanto tal, aceitar situações de dependência ou de
subordinação que possam coarctar a liberdade e independência no momento de
tomar decisões e na forma de actuar (artigo 76º n.º2 do E.O.ADV)” – actualmente
art. 81º, nº2. “O exercício da advocacia será, então, incompatível com aquelas
actividades ou funções que possam coarctar a independência do Advogado.”
Quanto ao princípio da dignidade do ADV: “A advocacia assume-se como uma
actividade nobre, enquanto associada à realização dos mais elevados e essenciais
valores da sociedade. O culto desses valores exige do Advogado uma postura de
grande elevação no plano ético, tanto no plano interno do exercício da profissão,
como na exteriorização da sua vivência social fora da actividade profissional. Por
isso, deve o Advogado “no exercício da profissão e fora dela, considerar-se um
servidor da justiça e do direito e, como tal, mostrar-se digno de honra e das
responsabilidades que lhe são inerentes” (artigo 76º n.º1 do E.O.A.).
Donde que o exercício da advocacia se tenha de considerar incompatível com
aquelas funções, actividades, actuações que de algum modo possam macular a
dignidade da profissão. “O exercício da advocacia é incompatível com qualquer
actividade ou função que diminua … a dignidade da profissão” (artigo 68º do
E.O.A.).
“O exercício da advocacia deve subordinar-se a um princípio de transparência e de
igualdade de oportunidades que permita salvaguardar o recato do exercício
profissional em igualdade e excluir todas as formas de pressão, de influências, de
imposições de autoridade formal ou material que de alguma forma possam
condicionar a livre realização da Justiça. A defesa da independência e da igualdade
do exercício da profissão poderá colocar-se, aqui, em dois planos distintos de
preocupações: de um lado, garantir que ao Advogado não seja dada a possibilidade
de utilizar qualquer eventual autoridade que lhe advenha do exercício de cargos ou
do desempenho de funções – nomeadamente públicas – para influenciar o curso
normal da realização da Justiça; de outro lado, garantir que ao Advogado não seja
dada a possibilidade de aceder à angariação de clientes, à publicitação da sua
actividade, à concorrência desleal pelo facto do exercício de tais cargos ou funções.
162
O ADV não deve, em momento nenhum, depender de qualquer entidade, clientes,
terceiros, do poder político, do poder económico, tribunais, opinião pública, nem
sofrer pressões externas.
Não deve retirar vantagens em relação aos colegas, ou permitir a captação de
clientes – arts. 89º e 90º, nº 2, al. h).
Em termos de dignidade, está em causa a conduta no exercício da profissão, o seu
comportamento público, a sua honra, o decoro e a consideração pública que o ADV
deve merecer (à mulher de César não basta ser séria…) – art. 88º.
A actuação do ADV não pode levantar dúvidas quanto à transparência que a sua
figura deve reflectir.
Concretamente, pretende-se prevenir também a violação do segredo profissional,
o conflito de interesses ou a angariação de clientela.
Só assim existe a confiança.
Sobre os direitos adquiridos, cfr. o art. 86º, que decorre dos princípios das legítimas
expectativas adquiridas, da boa-fé e da não retroactividade dos efeitos da nova lei.
163
de Advogados, enquanto membros do Conselho Superior do Ministério
Público(eleito pela Assembleia da República), defendendo que
“A prossecução de interesses públicos diferenciados, potencialmente díspares e
que se preveja suscitarem, de modo insistente, impedimentos, escusas e
suspeições, contende com o distanciamento e a serenidade necessários ao bom
desempenho de funções nos órgãos do Estado” e que quem acumular as duas
funções “pode ter de mover-se sob critérios antagónicos e conflituantes”.
https://www.publico.pt/2021/02/06/sociedade/noticia/parecer-mp-exercicio-cargo-advogado-
perdido-nove-meses-parlamento-1949558?reloaded&rnd=0.20606668918983528
164
A qualidade de sócio de uma sociedade de contabilidade é incompatível com a
advocacia (parecer do Conselho Geral nº 19/PP/2009-G de 05-10), por
proporcionar a angariação de clientela.
“O constante no artigo 85.º n.º 1 do EOA (Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro),
resultou em profundas alterações no contexto profissional e pessoal de todos
aqueles que cumulavam as profissões de advogado e de agente de execução,
levando-os a escolher apenas uma das atividades profissionais, tendo como pedra
basilar o princípio do interesse público e respetivos princípios deontológicos a ele
inerentes.
Lia Raquel Silva, in “O exercício das profissões de advogado e agente de
execução: Incompatibilidade ou impedimento”.
Foi solicitado o Parecer n.º 67/PP/2011P sobre a possibilidade de partilha de
escritório entre advogado e agente de execução. E neste sentido: “A consulente
exerce a advocacia, em prática isolada, partilhando o seu escritório com uma
advogada, com a qual suporta funcionamento do mesmo. Entretanto, esta
colega inscreveu-se como agente de execução. A consulente esclarece que não
existe qualquer sociedade com a referida agente de execução. (…) Como é
consabido, não são permitidas formas (quaisquer que sejam) de organização
regular entre advogados e profissionais de outras actividades, por porem em risco
princípios ético-deontológicos basilares da advocacia. Tal situação favoreceria a
prática de procuradoria ilícita, (…) colocaria em risco quer a dignidade profissional
e independência do advogado (…) o segredo profissional (…) bem como propiciaria
o aparecimento de situações de conflitos de interesses (…) e angariação de
clientela. (…) Conclusão: É admitido o exercício da advocacia em prática isolada,
de uma advogada que partilha espaços distintos da mesma fracção com outra
advogada que igualmente exerce funções de agente de execução. Contudo, não
devem existir serviços comuns entre ambas, designadamente aparelho de fax.
Existe uma situação de impedimento se, num caso concreto, a consulente for
mandatária de clientes que sejam parte ou tenham interesses em processos
executivos em que a advogada com quem partilha o escritório seja igualmente
agente de execução.”
https://www.OA.pt/upl/%7B90ff74b5-633b-44e2-9ª52-67be35f02146%7D.pdf
E os deputados da República, que não os regionais, que não são órgão de
soberania?
Se o estatuto dos advogados os impede de acumular a advocacia com o exercício
da profissão de agente imobiliário, por exemplo, porque não existem
condicionamentos no que diz respeito ao Parlamento?
Ver arts. 82º, nº 2, al. a) e 83º, nº 4 (que apenas o impede no contencioso
administrativo).
Os argumentos a favor da sua incompatibilidade radicam no facto de estar
vinculado a um partido político, à disciplina partidária e por isso não gozar de
necessária independência e do imperativo da sua consciência pessoal.
Acresce que, ao poder exercer a consulta jurídica ou apresentar projectos-lei sobre
assuntos que lhe são submetidos pelos clientes, em virtude da especial relação
com este, o deputado põe em causa os princípios da isenção e independência no
165
exercício da advocacia e que estão na base das incompatibilidades e
impedimentos.
O interesse privado pode, assim, contaminar o interesse público.
Jornal Expresso, 10-04-2019:
Dos 59 deputados portugueses em regime de não exclusividade, 20 trabalham
como advogados
“Cerca de um quarto dos deputados portugueses (25,6%) acumulam o cargo
político com funções no sector privado, avança o “Diário de Notícias” esta quarta-
feira. Os dados foram fornecidos pela Secretaria-Geral do Parlamento ao
matutino.Das seis bancadas, PSD (39%) e CDS (38%) são as que têm uma maior
proporção de representantes em regime de não exclusividade. No PS, 18% dos
deputados trabalham no sector privado. O PCP, por sua vez, apenas tem um
representante nestas condições.
166
do interesse público do interesse privado, bem como o fim das portas giratórias
para os interesses económicos que parasitam a política.”
O deputado do PSD Álvaro Baptista contestou esta visão, acabando por confirmar
que era mesmo isso que se pretendia: “A maior parte das sociedades de advogados
são pequenas, dependem do sócio para se manterem, e às vezes até do seu
desempenho profissional”, justificou, defendendo que “o desempenho de funções
públicas não deve prejudicar quem vem de outras actividades”.
Pedro Delgado Alves, o coordenador do PS na comissão, justificou a abstenção
que permitiu que a excepção fosse aprovada dizendo que concorda com a ideia de
que a limitação do advogado-deputado “não se repercute na actividade da
sociedade”. O centrista António Carlos Monteiro concordou e acrescentou um
ponto: “Os advogados têm a sua responsabilidade pessoal e quando são titulares
de cargos políticos sabem que estes se sobrepõem ao interesse particular”.
“O cargo de deputado é um serviço, não uma profissão”, defende Guilherme
Figueiredo, ex-bastonário, que critica o facto de a Assembleia da República nunca
ter criado um limite para o número e mandatos dos deputados, ao contrário do que
acontece com outras funções públicas.
“Estarei sempre contra uma incompatibilidade decretada apenas relativamente aos
advogados que são deputados”, declara Guilherme Figueiredo, que, tal como o seu
rival, pensa ser preferível o Parlamento estabelecer com maior detalhe em que
circunstâncias os diferentes profissionais que ascenderam a deputados podem ou
não discutir e votar assuntos a que estão de alguma forma ligados. “Uma
incompatibilidade total implicaria não termos advogados no Parlamento, mantendo
todas as outras profissões – médicos, economistas, arquitectos, etc”, objecta por
seu turno Menezes Leitão. “Devia era haver mais cuidado relativamente aos actos
que eles podem praticar sendo deputados.”
Guilherme Figueiredo dá um exemplo: devia estar vedado aos deputados que estão
na advocacia desencadearem acções contra o Estado.
O Publico, 10/12/2019.
https://www.publico.pt/2019/12/10/sociedade/noticia/pacto-justica-salario-dividem-
candidatos-ordem-advogados-1896759
167
irregularmente a advocacia e incorrer em responsabilidade disciplinar (cfr. arts. 87º
e 121º).
Para além disso, pode estar em causa a instauração de um processo para
averiguação da sua inidoneidade para o exercício da profissão – art. 177º EOA.,
para além da prática de um crime de procuradoria ilícita – art. 11º da Lei 49/2004 e
responsabilidade civil pela irregularidade/falta de mandato – art. 48º CPC.
168
colocado no respectivo tribunal; na hipótese inversa, é o mandatário que está
inibido de exercer o patrocínio.
3. Nos juízos em que haja mais de um juiz ou perante os tribunais superiores, não
pode ser admitido como mandatário judicial o cônjuge ou parente, em linha recta
ou no segundo grau da linha colateral do juiz bem como a pessoa que com ele viva
em economia comum que, por virtude da distribuição, haja de intervir no julgamento
da causa; mas se essa pessoa já tiver requerido ou alegado no processo, na altura
da distribuição, é o juiz que fica impedido de funcionar.
F., ADV e deputado, patrocinam acção contra o Ministério das Obras Públicas,
pedindo que este fosse condenado a restituir uma faixa de terreno que tinha
ocupado por ocasião de uma construção de uma estrada e uma indemnização de
285.000€.
Pode F. assumir o patrocínio?
Não – arts. 81º, nº 2 (princípio geral), 82º, nº 1, al. a) (regra geral), 82º, nº 3 (regra
excepcional), 83º nº 4 (impedimento, fazendo-se a distinção entre
169
incompatibilidades e impedimentos), 87º - irregularidade do patrocínio, 114º e 115º,
cabendo o julgamento ao Conselho de Deontologia, em 1ª instância, com recurso
para o C. Superior.
Enquadramento legal:
170
Arts. 81º, nº 3, 83º, nº 1, 88º, 89º, 92º, 97º e 99º;
Art. 48º CPC – Irregularidade do mandato;
CDAE: 3.2.;
Art. 370º CP;
Lei nº 12/2023, art. 9º, nº 4;
Lei nº 64/2023, arts. 52º-A, al. b) e f) e 52º-E, nº 1
Matéria inserida no capítulo das relações com os clientes, constituindo uma matéria
sensível e que se coloca no dia-a-dia do advogado.
A centralidade do cliente na advocacia pressupõe naturalmente a existência de
deveres especiais por parte do ADV, que tem o ónus de averiguar pela existência
de conflitos de interesses, seja ele originário, ou superveniente.
Este não tem que acompanhar o cliente para toda a vida, mas não deve agir contra
ele, em representação de terceiros em sede da mesma relação jurídica ou em
qualquer outra que lhe seja conexa. Caso contrário, o cliente não se sentiria à
vontade para entregar a verdade da sua causa ao ADV
Importa referir que o que importa é a existência de interesses contrapostos e não o
número de partes.
Sobretudo nos escritórios de advogados que asseguram o patrocínio de muitos
clientes ocorre maior risco de conflito de interesses, o que só por si não constitui
uma irregularidade. O modo como é gerido o conflito pelo escritório, ou pelo
advogado envolvido é que pode constituir um problema.
O conflito de interesses, de acordo com a doutrina, têm um dimensão temporal
podendo ser real, aparente ou potencial, sendo que em qualquer das situações, o
regime legal é idêntico.
Um conflito de interesses real existe sempre que os interesses em jogo colidem
direta e inequivocamente com o interesse público inerente ao exercício da
profissão.
Um conflito de interesses aparente existe quando os interesses concretos
aparentam estar em conflito com o interesse público inerente ao exercício da
profissão.
Um conflito de interesses potencial verifica-se nas situações em que os interesses
privados passados ou futuros patrocinados ou a patrocionar pelo ADV poderão
colidir com o interesse público inerente ao exercício da profissão, tudo em benefício
próprio e/ou de terceiros.
171
A transparência, a dignidade e o decoro, como uma das justificações plausíveis
para a proibição decorrente do conflito de interesses, decorre do propósito social e
profissional de uma classe que pretende ser digna e credível.
O exercício da profissão deve ser livre, independente e adequado à dignidade da
função (arts. 88º e 89º).
Visa-se a salvaguarda da comunidade, do ADV, da sua Ordem e do segredo
profissional, acautelando-se ainda o equilíbrio de interesses dos clientes,
protegendo-os.
É desde logo uma questão de consciência, competindo ao ADV verificar, em
primeira linha, da existência do conflito de interesses, de forma escrupulosa e
casuística, face à relação de confiança estabelecida com o cliente e ao dever de
lealdade para com este.
O conflito de interesse gera uma situação de impedimento (art. 83º nº 1) extensivo
no caso do nº 6 aos restantes colegas (exercício em grupo). Mas nem sempre os
impedimentos têm na sua génese, ou geram conflitos de interesses.
O conflito de interesses tem a ver com os clientes, passados, futuros ou presentes,
que têm interesses em colisão. Desencadeiam qualidades incompatíveis para o
ADV numa mesma questão ou conexa. As incompatibilidades e impedimentos têm
a ver com o ADV, na relação com o cliente ou com o assunto em causa. Além disso,
não é automaticamente extensível aos seus colegas de escritório ou da sociedade.
A aceitação de outro cliente que foi antagonista de um ex-cliente seu, deve respeitar
o decurso de um prazo razoável entre a cessação do mandato com o primeiro
cliente, pois pode levantar questões de lealdade para com este e de desconfiança
pública. Deverá igualmente o ADV tomar em consideração o tipo de assunto em
causa, a duração do seu mandato anterior, a forma como cessou, se se está
perante um cliente habitual (norma costumeira), etc.
Não é aceitável que o ADV aceite o patrocínio de um cliente contra alguém que seja
simultaneamente seu cliente noutra questão. Trata-se de um conflito de interesses
eminentemente subjectivo, que afecta a confiança.
- Art. 99º:
PARECER Nº 9/PP/2018-P, conclusões:
... II – A referida norma funda-se em razões de preservação dos valores da
lealdade, isenção, independência, confiança e mesmo decoro, fundamentais no
exercício da advocacia, tendo ainda como fundamento o risco de quebra do
segredo profissional.
III – O legislador concretizou algumas situações em que o dever de recusa do
patrocínio é imposto, porque, objectivamente, tais situações se apresentam como
potenciadoras desse conflito.
Consagra-se aqui a tese do conflito objectivo.
➢ Art. 99º, nº 1: tem ainda como fundamento o risco de quebra do segredo
profissional (cfr. os nº 4 e 5), o que pode conferir ao cliente vantagens ilegítimas.
172
A “questão” ali aludida pode ser judicial ou extra-judicial, pois abrange para além
do patrocínio judicial (nomeação oficiosa ou mandato) qualquer prestação de
serviços sobre um assunto, problema, negócio, caso ou litígio.
Exemplos: divórcio/inventário (independentemente se no divórcio o patrocínio foi
até final); divorcio por mútuo consentimento em que o ADV representa ambos e
ocorre posterior divergência entre os clientes. Neste caso o ADV deve de imediato
renunciar ao mandato de ambos (ver o nº 4).
Exemplos:
1) ADV que representa vários herdeiros e posteriormente têm conflitos entre si;
2) ADV do réu na acção declarativa e depois constitui-se como ADV do autor
na execução;
3) ADV do empregador no processo disciplinar e do trabalhador no processo
judicial de impugnação da sanção laboral;
4) ADV do insolvente e ao mesmo tempo reclama créditos de honorários e
despesas (ver nº 1 e 2 do art. 99º);
5) O ADV pode patrocinar o filho do executado, de que também é ADV, no
exercício do direito de remição, pois não prejudica o executado (ver nº 2).
6) O ADV pode patrocinar a sociedade comercial em acção contra o sócio (os
sócios não se confundem com a sociedade).
7) ADV que é consultado por ambas as partes sobre o assunto. Não pode vir a
patrocinar qualquer deles, o que representa um prejuízo efectivo se se tratar em
comarcas pequenas. Se o sujeito António fizer uma consulta jurídica com um ADV
para obter aconselhamento preventivo em relação a um potencial litígio com o
sujeito Bernardo e, mais tarde, este último fizer uma consulta jurídica com o mesmo
ADV e pretender que este o represente numa ação judicial contra o António relativa
ao mesmo assunto, o ADV deve recusar esse patrocínio de Bernardo porque já
teve intervenção nessa questão na qualidade de Advogado de António.
8) ADV que foi arguido, testemunha, tradutor, perito, magistrado, mesmo que
renuncie ou substabeleça o mandato, não pode posteriormente patrocinar uma das
partes nesse processo, por já ter intervindo noutra qualidade (cfr. nº 1 do art. 99º).
É uma situação próxima à do impedimento e claramente de ambiguidade.
Por conexão, a que alude o nº 1 do art. 99º, entende-se a “relação evidente entre
várias causas, de modo que a decisão de uma dependa das outras ou que a
decisão de todas dependa da subsistência ou valorização de certos factos”
(Parecer do C. Geral nº E-14/00 de 13-12-2000 e no qual foi relator Carlos Grijó).
173
O ADV advogado é o representante dos cidadãos perante a administração pública
e a justiça, o que implica o reconhecimento pleno do seu papel como confidente.
Exemplo: o cliente António, através dos respetivos administradores, contrata
o ADV para tratar de uma operação de aumento de capital social;
posteriormente, o cliente Bernardo tem uma consulta jurídica com o ADV, na qual
pede a este que o represente numa ação judicial de responsabilidade civil por
cumprimento defeituoso contra o cliente António; ora, pelo menos, enquanto estiver
a executar o contrato com o cliente António, praticando todos os atos necessários
à realização da operação de aumento de capital social, o Advogado não deve
aceitar qualquer patrocínio contra este.
174
➢ nº 5: ADV da autarquia em regime liberal que patrocina cidadão contra a
mesma autarquia por causa do indeferimento de um licenciamento, não tendo
participado nas decisões da autarquia quando esta deliberou sobre o pedido de
licenciamento. Pode fazê-lo. Não gera suspeita pública de que possa influenciar o
assunto.
➢ nº 6: Sempre que o ADV exerça a sua atividade em associação, sob a forma
de sociedade ou não, o regime jurídico deontológico dos Advogados em matéria de
conflito de interesses constante dos números 1 a 5 do art. 92.º aplica-se quer à
associação, por exemplo sociedade de advogados, quer a cada um dos seus
membros.
- Chinese walls e o art. 99º, nº 6.
O chinese walls é um termo comercial que descreve as barreiras de informação
dentro de uma organização que são erguidas para impedir trocas ou comunicação
que possam levar a conflitos de interesse.
O termo faz alusão à Muralha da China – já que o chinese walls seria também uma
espécie de “barreira” interna para garantir que duas áreas diferentes não tenham
nenhum contato. Dessa forma, essa política garante a independência entre setores
que possuem informações privilegiadas com quem trabalha operando no mercado.
Logo, o chinese walls visa, no final das contas, evitar o conflito de interesses entre
clientes, investidores e a própria instituição, preservando o segredo profissional.
Por exemplo, se existissem chinese walls numa sociedade de advogados, as
pessoas do departamento de Direito fiscal não poderiam falar sobre assuntos
profissionais com as pessoas do departamento de Direito societário.
https://www.sunoresearch.com.br/artigos/chinese-wall/?fbclid=IwAR0gDH-
UT5rQ4FdUQ9GWWnJLEYXhOSAZQMUQR65Ekm0xJ4FFgUEhBpEMS8
Contra essa alternativa, veja-se o parecer nº 16/2008 do CDL, onde se refere: “A
proibição de organizações multidisciplinares abrange e não se compadece com as
vulgarmente denominadas “chinese walls”, mediante as quais se admitiria a
parceria de vários profissionais desde que implementadas medidas mínimas de
salvaguarda do segredo profissional, como sejam gabinetes e arquivos próprios de
advogado não partilhados por terceiros, serviços logísticos próprios, etc.
Convém também frisar que, sendo a advocacia uma profissão de interesse público
na qual o Estado tem um papel de regulamentação por via legislativa, a ela
aproveita a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades firmada no
Caso Wouters/Nova que admite a não aplicabilidade de determinadas disposições
em matéria de direito da concorrência. E admite-o em consideração aos valores
superiores da independência, da confidencialidade e da matéria de conflito de
interesses”.
https://www.OA.pt/cd/Conteudos/Pareceres/detalhe_parecer.aspx?sidc=31634&id
c=501&idsc=42945&ida=70140
176
Configura uma situação de conflito de interesses, aplicando-se o nº 6 do art. 99º, a
nomeação para a mesma causa de dois advogados que partilhem o escritório ainda
que não se encontrem numa relação de sociedade (Parecer nº 7/PP/2015 do C.R.
Coimbra).
CONFLITO DE INTERESSES
I—Breve descrição da situação em apreciação.
A sociedade de advogados X solicita parecer a este Conselho Geral sobre a
eventual (im)possibilidade de poder patrocinar em juízo um cliente seu contra outro
seu cliente num conflito de interesses que opõe ambos. Em concreto, pretende a
Requerente saber qual o âmbito de aplicação do n.° 4 do art.° 94.° do E.O.ADV,
colocando as seguintes questões:
1.° — O n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A. pressupõe que os dois ou mais clientes em
conflito de interesses já fossem clientes quando surge esse conflito? Ou também
se aplicará nos casos em que a assumpção da qualidade de cliente pela
contraparte das acções a propor é que é ela própria a causa do conflito?
177
há conflito de interesses, poderá ela continuar a patrocinar qualquer um deles em
questões que não estejam conexionadas com a situação em que há conflito de
interesses?
Com relevo para a decisão destas questões, são relatados pela Requerente os
seguintes factos:
1. A sociedade Requerente, por intermédio de um dos advogados seu sócio, foi
mandatada por dois trabalhadores duma sociedade por quotas que se dedica a
transportes nacionais e internacionais de mercadorias para impugnar o seu
despedimento decidido por essa sociedade com invocação de justa causa.
2. O parecer emitido foi no sentido da viabilidade das acções judiciais de
impugnação de tais despedimentos e tal parecer mantém-se.
5. A relação dos dois constituintes com a sociedade requerente foi sempre feita
através do mesmo advogado que inicialmente os recebeu e analisou as questões
por ele suscitadas.
7. A circunstância da sociedade Requerente ter mandato dos dois clientes que são
partes como autor e ré nas mencionadas acções de despedimento ocorreu porque
houve uma falha no sistema informático que não detectou a pendência no escritório
das questões referentes ao despedimento dos dois motoristas, e que só foi
acidentalmente constatada porque um dos advogados intervenientes se ter referido
aos clientes e questões em causa.
178
O n.° 3 do art.° 94.° do E.O.A dispõe que “O advogado não pode aconselhar,
representar ou agir por conta de dois ou mais clientes, no mesmo assunto ou em
assunto conexo, se existir conflito de interesses desses clientes”.
Por sua vez, o n.° 6 do art.° 94.° do E.O.A.estabelece que “Sempre que o advogado
exerça a sua actividade em associação, sob a forma de sociedade ou não, o
disposto nos números anteriores aplica-se quer à associação quer a cada um dos
seus membros”.
Assim, quando um advogado aceita patrocinar um determinado cliente na resolução
de um litígio, não pode, posteriormente, aceitar o patrocínio de outro cliente que
tenha um interesse conflituante com aquele primeiro na resolução do mesmo litígio.
Este dever impõe-se não só ao advogado que individualmente aceitou o patrocínio
mas também a todos aqueles que com ele exerçam a sua actividade em
associação, seja em forma de sociedade ou noutra (n.° 6 do art.° 94.° E.O.A.).
A violação desse dever para com o cliente constitui infracção disciplinar nos termos
do disposto no art.° 110.° do E.O.A..
É, assim, evidente que a sociedade requerente não podia ter aceite o patrocínio da
segunda cliente (in casu, a sociedade entidade patronal dos seus dois primeiros
clientes).
Contudo, por motivos que a Requerente diz prenderem-se com uma falha no
sistema informático, tal situação acabou por acontecer.
A violação das normas do E.O.A. não terá, por isso, sido consciente e intencional.
O n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A. estabelece que “Se um conflito de interesses surgir
entre dois ou mais clientes, bem como se ocorrer risco de violação do segredo
profissional ou de diminuição da sua independência, o advogado deve cessar de
agir por conta de todos os clientes, no âmbito desse conflito”.
Isto posto, passemos à análise das questões concretas suscitadas pela Requerente
relativamente ao âmbito de aplicação do n.° 4 do art.° 94.° do E.O.ADV
1.°— O n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A. pressupõe que os dois ou mais clientes em
conflito de interesses já fossem clientes quando surge esse conflito? Ou
179
também se aplicará nos casos em que a assumpção da qualidade de cliente
pela contraparte das acções a propor é que é ela própria a causa do conflito?
2.°— A posição da Requerente deverá, num ou noutro caso, ser a de cessar
de agir por conta de qualquer destes clientes no âmbito do caso que é causa
de conflito de interesses?
Entendemos que o n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A. tem como pressuposto que os dois
clientes em conflito de interesses já fossem clientes quando surge o conflito.
Nos casos em que assim não acontece mas em que a assumpção da qualidade de
cliente pela contraparte das acções a propor é ela própria a causa de conflito, é
aplicável o disposto no n.° 3 do mesmo artigo que estatui que “O advogado não
pode aconselhar, representar o agir por conta de dois ou mais clientes, no mesmo
assunto ou em assunto conexo, se existir conflito de interesses desses clientes.”
180
Pelo que, a única solução que garante que não será prejudicado qualquer cliente
nem trairá a confiança de nenhum dos dois é a renúncia a ambos os mandatos.
E isto porque, muito embora se entenda que o primeiro cliente tinha, à partida, uma
precedência relevante relativamente ao segundo cliente, não tendo essa
precedência sido respeitada (em clara violação do E.O.ADV), o segundo cliente não
deixa de merecer também uma tutela da relação de confiança que igualmente
depositou no advogado.
A recusa de patrocínio de ambos os clientes é, assim, a única solução possível para
preservar a relação de confiança que eles depositaram na Requerente.
III — Conclusões:
181
1.ª — O advogado não pode aconselhar, representar ou agir por conta de dois ou
mais clientes, no mesmo assunto ou em assunto conexo, se existir conflito de
interesses desses clientes (art.° 94º, n.° 3 do E.O.ADV).
2.ª — Quando o advogado exercer a sua actividade em associação – sob a forma
de sociedade ou não — a impossibilidade de aconselhar, representar ou agir por
conta de dois ou mais clientes no mesmo assunto ou em assunto conexo (se existir
conflito de interesses desses clientes) impõe-se quer à associação quer a cada um
dos advogados que dela sejam membros (art.°94.°, n.° 6 do E.O.A.).
3.ª — Quando um advogado aceita patrocinar um cliente num determinado litígio,
não pode, posteriormente, aceitar o patrocínio no mesmo litígio de outro cliente que
tenha um interesse conflituante com aquele primeiro.
4.ª — A violação desse dever para com o cliente constitui infracção disciplinar nos
termos do disposto no art.° 110.° do E.O.A.
5.ª — No caso concreto, a Requerente não podia ter aceite o patrocínio da segunda
cliente para a representar no mesmo litígio em que já representava os primeiros
clientes, uma vez que existe um evidente conflito de interesses entre ambos.
6.ª — Não tendo a Requerente recusado o mandato por parte do segundo cliente,
e tendo desse modo, ainda que não judicialmente, aceitado o patrocínio de dois
clientes com interesses conflituantes opostos, terá agora que renunciar aos
mandatos que lhe foram conferidos por ambos os clientes, por força do disposto no
n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A.
8.ª — O n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A. pressupões que os dois clientes em conflito de
interesses já sejam clientes quando surge o conflito.
9.ª — Quando a assumpção da qualidade de cliente pela contraparte das acções a
propor é ela própria a causa de conflito, é aplicável o disposto no n.° 3 do art.° 94.°
do E.O.A.que diz que “O advogado não pode aconselhar, representar o agir por
conta de dois ou mais clientes, no mesmo assunto ou em assunto conexo, se existir
conflito de interesses desses clientes.”; nesse caso, deve ser recusado o patrocínio
de um segundo cliente, em prol do cliente que primeiro conferiu o mandato.
10.ª — No caso concreto, o facto de os dois motoristas serem já clientes antes da
sociedade/entidade patronal adquirir também essa qualidade constituía um
precedente relevante, que implicava para a Requerente a obrigação de recusar o
mandato da segunda cliente/entidade patronal.
11.ª — Ao não o ter feito a Requerente já contactou e aconselhou ambas as partes
em conflito, colhendo das mesmas informações que sempre serão relevantes para
a condução do processo judicial que oporá ambas.
12.ª — Pelo que, a única solução que garante que não será prejudicado qualquer
cliente nem trairá a confiança de nenhum é a renúncia a ambos os mandatos. E
isto porque, muito embora se entenda que o primeiro cliente tinha, à partida, uma
precedência relevante relativamente ao segundo, não tendo essa precedência sido
respeitada, o segundo cliente não deixa de merecer também uma tutela da relação
de confiança que igualmente depositou no advogado.
13.ª — A recusa de patrocínio de ambos os clientes é a única solução possível para
preservar a relação de confiança que eles depositaram na Requerente.
182
14.ª — O n.° 4 do art.° 94.° do E.O.A.dispõe que se surgir um conflito de interesses
entre dois ou mais clientes, bem como se ocorrer risco de violação do segredo
profissional ou de diminuição da sua independência profissional, o advogado deve
cessar de agir por conta de todos os clientes “no âmbito desse conflito”.
15.ª — O E.O.A.restringe a obrigação de cessar o patrocínio de todos os clientes
apenas ao âmbito do conflito que os opõe, e não a outros processos que
eventualmente tenham pendentes.
16.ª — Pelo que, o advogado é livre de, com as limitações que decorrem do art.°
94.° do E.O.ADV, aceitar patrocinar ambos os clientes noutros processos que não
os oponham.
17.ª — No entanto, tendo em conta toda a envolvência do caso concreto e por uma
questão de total transparência, de modo a não gerar qualquer tipo de suspeita
infundada, a prudência impõe que a Requerente não aceite patrocinar qualquer um
dos clientes até que o conflito que opõe ambos esteja definitivamente resolvido.
“Paulo Macedo admite que CGD vai trabalhar com três sociedades de advogados
por causa de incompatibilidades
183
autoridade externa que a Caixa escolheu para levar a cabo uma auditoria aos actos
de gestão então praticados pelas anteriores administrações, entre as quais a que
tão levianamente emprestou milhões a perder literalmente de vista ao cliente da
VdA? Quem, quem foi? Pois, não se riam: foi a VdA, nem mais! É ou não é um
clube de amigos? Dizem que foi por concurso e que a púdica VdA assinou uma
declaração a jurar que não, nunca, jamais, olha como!, tem, teve ou terá nisto
qualquer conflito de interesses. Como se houvesse concurso ou declaração alguma
que pudesse disfarçar o que está para lá de tudo o que é admissível. Como se uma
jura de insuspeitos cavalheiros, ou outro segredo bancário ou de justiça, ou até um
véu islâmico, uma burqa, uma pele de tigre, pudesse disfarçar a indecente nudez
deste rei nu na praça pública!”
30. Os Honorários
O advogado é “aquele que é chamado para defender uma causa, e cumpre o seu dever
com dignidade e competência, buscando mais a realização da justiça do que os
honorários, embora devidos.”
António Arnaut
Enquadramento legal:
Art.1158º CC;
Arts. 103º a 107º; 88º e 89º EOA;
CDAE – 3.3.; 5.7
Regulamento dos Laudos de honorários nº 40/2005, adiante designado por RLH.
184
A questão dos honorários faz parte invariavelmente da trilogia de perguntas que o
cliente faz inicialmente: quanto tempo levará o assunto a ser tratado (I), se vai
ganhar o pleito (II) e o valor dos honorários (III).
São todas de resposta difícil e quanto aos honorários, em concreto, atendendo à
complexidade do assunto e à incerteza sobre a evolução do caso, não é possível,
com um grau de segurança e equidade, sem esquecer a boa-fé que deve imperar
nas relações contratuais, estimar as despesas e os honorários que o processo
judicial, ou as negociações implicarão.
Os Clientes, na maior parte das vezes, nem chegam a aperceber-se da quantidade
enorme de diligências que o advogado realizou (conferências presenciais e
telefónicas com os mandatários das contrapartes, troca de mensagens de correio
electrónico, deslocações às repartições oficiais requisitando certidões ou fotocópias
não certificada, pesquisas de jurisprudência, etc.). A que acresce a preocupação
de identificação e consulta da legislação em vigor, porquanto a mesma é objecto
de constantes alterações.
Segundo Ernesto Oliveira (Vida Mundial, 16.04.1971) este é “momento de que o
advogado, inexplicável e injustificadamente, quase se envergonha” - compreende-
se mercê das numerosas dúvidas que assolam o espírito do advogado, desejoso
de uma bitola que, de forma clara e transparente, não para si, mas para o cliente,
aponte um montante que se afigure o legítimo pagamento do seu trabalho,
ultrapassada que está a perspectiva utópica da “retribuição - reconhecimento” de
João Ulrich, segundo o qual “o desinteresse, o mais absoluto desinteresse é
apanágio essencial da advocacia (…). Os honorários não representam o
pagamento de um serviço, significam a gratidão do cliente.”
185
No tempo do imperador Constantino, ano 325, considerava-se que o labor da
actividade forense não se podia comparar a mero salário, os “advogados” exerciam
o seu múnus gratuitamente – “honorarium dicitur quod non mercendi nomine, sed
honoris causa”.
Ainda hoje os amigos, os parentes (que esperam as borlas) e os pobres fazem isso.
É preferível não cobrar do que apresentar uma conta ridículADV
Com o desenvolvimento da ciência do Direito, submetendo os a demorados estudos
para poderem desempenhar os seus serviços, passou a ser uma profissão
remunerada. Mas com limites na fixação dos honorários.
A Lei de 1351 de D. Afonso IV prescrevia a pena de morte ou de flagelação
conforme o recebimento indevido ultrapassasse ou não o valor de 5 libras.
E quando se passou a cobrar honorários, diminui-los por negociação com o cliente
não fazia sentido e constituía até uma ofensa, pois significava diminuir a honra que
era conferida a este, por o ADV aceitar o caso.
Código Civil
186
concretas de cada caso, uns possam assumir maior relevância que outros, sendo
certo que, segundo a nossa jurisprudência, o tempo gasto pelo advogado e a
dificuldade do assunto, normalmente, são os elementos mais decisivos, já que
reflectem a complexidade da causa e o esforço despendido pelo advogado para
solucionar o problema, devendo ser relegado para um plano secundário o resultado
conseguido.” (Ac. do T. Rel. Guimarães de 23/03/2011).
http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/DB2B7649A0CA4590802578C000396295
187
Ver ponto 3.3.2. do CDAE
É nulo – art. 280º CC:
O ADV litiga por si e pelo seu cliente. Fá-lo perder a sua independência e
clarividência (objectividade) – art. 89º. Envolve o ADV na sorte da acção.
Rege-se pelo princípio do vale tudo, indo mesmo contra a justiça, aumentando a
litigiosidade.
Os honorários, como já se referiu, são o preço do trabalho efectivamente prestado
(art. 105º, nº 1) e não a retribuição do resultado obtido.
O ADV não pode prometer resultados, que não dependem de si.
No tempo do imperador Constantino, ano 325, já era proibida a quota litis.
“Será nullo todo o contracto, que as partes fizerem com os seus advogados ou
procuradores, concedendo-lhes alguma parte do pedido na acção. Os procuradores
ou os advogados que infringirem o que se dispõe n’este artigo, serão inhibidos, por
espaço de um anno, de procurar ou advogar em juízo.
“Acordo, prévio à conclusão da questão, celebrado entre o advogado e o cliente,
(…) pelo qual se convenciona que o direito daquele aos honorários respectivos fica
188
directamente dependente do resultado da causa (em regra, percentualmente
dependente), independentemente do seu desenrolar, (…) sendo que o advogado
nada haverá a título de honorários, se o cliente nada alcançar da sua pretensão,
pois aqueles são uma quota-parte destADV”
A prática do sucess fee (prémio de resultado), criticada por alguns autores por
poder conduzir os advogados a situações do tipo eat as much as you can kill e ser
susceptível de confusão com a proibida quota palmarium (fixação antecipada de
honorários suplementares em função de resultados acrescidos)- segundo alguns
autores - foi consagrada com a alteração do Estatuto em 2005 (Lei nº 15/2015).
Desdobra-se em duas partes.
A primeira parte reproduz a primeira parte do ponto 3.3.3. do CDAE
O valor do assunto não é o mesmo que o resultado.
Na segunda parte, para além dos honorários fixados, de acordo com os critérios
normais do art. 105º, o resultado obtido também é especialmente considerado e
ponderado. Os honorários variam em função deste, que funcionam como elemento
gerador de um extra: a majoração.
A majoração compensa o mérito, constitui um incentivo.
Exemplo: X + 1.000€ caso a acção seja julgada procedente.
X + 10% do valor da acção.
189
Contudo, a majoração não deve ser a parte mais significativa dos honorários. Tem
um carácter complementar.
“É desproporcional, e mesmo contrário ao disposto nos nºs 1 e 2 do art. 101.º do
EOA, fixar previamente honorários ridículos e reservar a “fatia de leão” para a
majoração. Na verdade, sendo proibida a quota litis, seria um negócio celebrado
contra disposição de carácter imperativo facturar os honorários em função dos
outros critérios numa base insignificante e a taxa de sucesso numa percentagem
próxima dos 50% ou superior do resultado obtido. A majoração deverá ser aplicada
em função do resultado obtido, apenas como critério complementar do cálculo de
honorários – Acórdão CDEONTP n.º 239/2005, de 24 de Novembro de 2006.”
Sobre essa questão, António Arnaut, in “Estatuto da Ordem dos Advogados –
Anotado” – 2009 – pág. 126, em nota ao artigo citado, escreve:
“O nº 3 é deontologicamente discutível, constituindo uma grave entorse ou
disformidade da nossa tradição forense.
Deve desdobrar-se em duas partes: a primeira, até à disjuntiva ou, permite
uma quota litis imperfeita ou atípica, pois os honorários não são aferidos por
qualquer dos critérios definidos no art. 100°, traduzindo-se apenas numa
percentagem do “valor do assunto”.
Esta quantificação é mais indecorosa do que a “quota litis” típica, porque na
situação agora legalizada nem sequer há o risco de resultado zero!
A segunda parte admite uma “majoração em função do resultado obtido”, o que é
deontologicamente aceitável, porquanto são considerados os “outros critérios”, nos
quais o resultado obtido é um dos elementos de ponderação.
Em face da natureza anómala do nº 3, este preceito deve ser interpretado, de
acordo, aliás, com a sua própria formulação, no sentido de que apenas se aplica à
“fixação prévia do montante de honorários”, valendo para as situações normais os
critérios enunciados no art. 100º.
Deste modo, e apesar da ampla permissividade do n° 3, inspirado na filosofia
mercantilista dominante, deve considerar-se que continua interdita a
chamada quota palmarium, já proibida pelo Digesto romano.
Trata-se de um misto de quota litis e de fixação prévia de honorários, pois apenas
uma parte destes fica sujeita ao resultado da demanda.
É o que acontece quando se convenciona que os honorários normais serão
acrescidos de uma percentagem do resultado económico obtido.” (sublinhado
nosso).
Em sentido contrário se pronunciam vários autores, entendendo que a regra da
majoração abriu a porta ao “palmario”.
Assim:
- 1ª parte: não há risco de resultado zero: não se atende aos critérios do nº 3 do art.
105º;
- 2ª parte: são atendidos outros critérios.
Não é proporcional ao resultado ou uma percentagem deste, sob pena de se tratar
de uma quota palmarium.
190
• Quota palmarium – uma parte, ou percentagem dos honorários fica sujeita
ao resultado obtido.
Exemplo: acordar que aos honorários normais se acrescente uma percentagem do
resultado obtido. Contra, num caso paralelo, ver parecer nº 3/PP/2021 do CRC in
http://www.OA.pt/cd/Conteudos/Pareceres/detalhe_parecer.aspx?sidc=32346&idc
=1365&idsc=116053&ida=161329
Negociações para venda de um imóvel: 500€ + x do que conseguir a mais. Se não
obter, não recebe essa parte.
É um misto de ajuste prévio e certo dos honorários com a quota litis sobre o
resultado.
A estipulação success fee ou prémio de resultado, no recorte da estipulação
concreta do nº 3 do art. 106º, não pode considerar-se quota palmarium, nem quota
litis (ver o citado Ac. do STJ de 29/09/2009).
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/856ff4335bccd5c
580257640003cd84c
e o Ac. do TRG de 22.03.2011 in
https://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/DB2B7649A0CA4590802578C000396295
É possível que o ADV se pague antecipadamente? Cfr. A. Arnaut, pág. 118, ob. cit.
Não. Mostra desconfiança perante o cliente e também não respeita os princípios
definidos no nº 105º, nº 3.
E se o cliente muda de ADV? O resultado, o tempo gasto inicialmente previsto, etc.,
é diferente.
Mudança de ADV: art. 112º, nº 2 (dever de cooperação).
Como ensina António Arnault “os resultados atendíveis não são apenas os que se
verificaram enquanto o advogado exerceu o mandato, pois abrangem também
aqueles que era razoável - em termos de causalidade adequada – que se
verificassem a final se não tivesse findado o patrocínio”.
Honorários fixados com base no valor hora:
“Acordado o pagamento de honorários à razão de valor/hora, tal refere-se ao
trabalho intelectual complexo que geralmente caracteriza a actividade do
advogado, não se devendo remunerar pelo mesmo valor o trabalho meramente
burocrático”. Ac. do TRE de 09/11/2017, que também estabeleceu que “os
honorários de advogado devem obedecer ao princípio geral da adequação aos
191
serviços prestados, independentemente da ocorrência de um acordo prévio com o
cliente acerca do seu modo de fixação”.
http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/37f550bfa0d2a23
c802581da0042f973?OpenDocument
192
Como direito real de garantia, o ADV terá de propor acção de honorários e dar à
execução os bens e direitos retidos.
Excepção ao direito de retenção: a caução arbitrada pelo C. Regional.
Exemplo do direito de retenção: o livro de Actas de uma sociedade comercial ou de
um condomínio.
Laudo de honorários – arts. 2º e 7º do R.L.H.
Tópicos principais: necessidade de emissão de nota de honorários por escrito; o
pressuposto da existência de conflito sobre a nota de honorários; a competência
para emissão de laudo; a natureza do laudo (parecer técnico); a exclusão das
despesas e encargos no âmbito do laudo (art. 4º do RLH).
Apesar do Laudo de Honorários emitido pela Ordem dos Advogados, estar sujeito
ao geral e comum princípio da livre apreciação do tribunal, sendo um facto
instrumental nos termos dos arts. 389º CC e 5º, 591º e 655º, nº 1º, CPC, não pode
negar-se-lhe o valor informativo próprio de qualquer perícia, nem, de todo o modo,
arredar-se o respeito e atenção que deve merecer, dada a especial qualificação de
quem o emite - cfr, o citado Ac. do T. Rel. Guimarães de 22/03/2011 in:
http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/DB2B7649A0CA4590802578C000396295
“Para determinação do seu valor probatório não pode deixar de se tomar em conta
que foi elaborado por profissionais do mesmo ramo de atividade, eleitos pela
assembleia geral da mesma Ordem, o que faz pressupor que possuem elevados
conhecimentos técnicos para aferir, sob o ponto de vista económico, sobre o
montante dos honorários devidos. A credibilidade que merece o laudo de
honorários, só deve ser posta em causa quando ocorram factos suficientemente
fortes que abalem aquela credibilidade.” (Ac. STJ de 15-04-2015).
Se os serviços foram ou não prestados, a prescrição, compensações, falta de
prestação de contas, etc., não são da competência da OA mas dos tribunais.
Há quem entenda que mesmo que haja convenção de honorários, não se exclui a
emissão do laudo, face ao art. 105º, nº 1 e 2, pela necessária adequação dos
honorários pelos serviços efectivamente prestados.
http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/0e8389f4b4d540
40802579ac003a353c?OpenDocument
Ac. de 07-02-2012 da Rel. de Coimbra:
Os honorários poderiam, a coberto da “convenção prévia”, assumir, sem
possibilidade de controlo técnico algum, carácter exorbitante, desproporcionado,
com onerosidade excessiva e sem qualquer correspondência nos serviços
efectivamente prestados.
No mesmo sentido o Ac. do TRL de 20/12/2020:
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/3f1b399d19c0369
a8025865c004fb023?OpenDocument
No caso dos serviços prestados pelo ADV, o seu valor poderá oscilar mediante
diversas condicionantes, tratando-se de um real juízo de proporcionalidade,
determinando que estes valores não podem ser desmesurados nem
193
inibidores, independentemente de qualquer ajuste prévio que tenha existido entre
as partes.
Em sentido contrário, o Ac. Rel. Évora, 08-02-2008:
http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/8f86ec01e26001a
a80258239003caa5f?OpenDocument
Nele se defende que o acordo entre as partes é uma decorrência do princípio da
autonomia privada e do primado da liberdade contratual.
Em reforço dessa posição poderá ainda dizer-se que a redacção dada ao art. 1158º
CC, acima transcrito, não impede o acordo das partes.
Por outro lado, também o art. 105º do EOA não impede a fixação de honorários por
acordo das partes, desde que esse acordo não integre o conceito de quota litis, ou
seja, não fique única e exclusivamente dependente do resultado da questão.
“Não obstante não existir uma hierarquia entre os elementos de ponderação
previstos no art. 100º, nº3 do EOA, há que aceitar que, perante as circunstâncias
concretas de cada caso, uns possam assumir maior relevância que outros, sendo
certo que, segundo a nossa jurisprudência, o tempo gasto pelo advogado e a
dificuldade do assunto, normalmente, são os elementos mais decisivos, já que
reflectem a complexidade da causa e o esforço despendido pelo advogado para
solucionar o problema, devendo ser relegado para um plano secundário o resultado
conseguido.” Ac. do TRG de 22.03.2011, acima citado.
Questão diferente é se o cliente pagou os honorários. Daí decorre que, se pagou,
não há conflito, logo não há lugar à emissão do laudo – art. 7º, nº 1 do R.L.H.
Conta de honorários – art. 5º do R.L.H.
O ADV não é obrigado a apresentar a nota de honorários e despesas, salvo se este
lhe pedir.
O ajuste prévio, desde que reduzido a escrito, dispensa a apresentação da conta
de honorários ao cliente (art. 105º, nº 2)
A apresentação da nota é condição sine qua non para o ADV poder obter a emissão
de laudo (art 7º RLH) e invocar o direito de retenção (art. 754º CC) sobre os valores,
objectos ou documentos do cliente que se encontrem em seu poder (art. 101º, nº
3). Também poderá propor a acção de honorários.
A acção de honorários implica um juízo com uma certa componente de
discricionariedade, à míngua de critérios legais precisos para a sua fixação, já que
para além da ponderação dos requisitos constantes do art. 105º, impõe que se
atenda ao laudo da OA e se considerem critérios de equidade.
Quer na elaboração da acção, na prova a produzir, quer na elaboração da
respectiva Nota (que contém a discriminação dos serviços prestados – art. 105º, nº
2 e art. 3.4 CDAE) deve o ADV acautelar o segredo profissional a que está
vinculado, que é estabelecido, fundamentalmente, no interesse do cliente (art. 92º,
nº 1 e art. 2.3.2 CDAE).
Deve, pois, evitar a referência concreta e detalhada dos serviços prestados.
194
Contudo, a obrigação de segredo profissional também cessa em tudo quanto seja
absolutamente necessário, para a defesa da dignidade, direitos e interesses
legítimos do próprio advogado, mediante prévia autorização do presidente do
conselho regional respectivo, com recurso para o bastonário, nos termos previsto
no respectivo regulamento (art. 92º. nº 4).
Os juros eventualmente devidos pelo atraso no pagamento de honorários, nos
termos gerais, são os civis e não os comerciais, pois a actividade do ADV não é
comercial, mas consiste na prática de actos civis.
Dispõe o artigo 317º, e sua alínea c), do Código Civil que “prescrevem no prazo de
dois anos (...) os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões
liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes”.
Tal previsão reporta-se a prescrições presuntivas, as quais, como referido no artigo
312º do mesmo código, se fundam na presunção do cumprimento, dispensando,
assim, o devedor, da prova deste, prova que poderia ser-lhe difícil, dada a ausência
de quitação.
A presunção de pagamento por parte do devedor faz deslocar o ónus da prova do
não pagamento para o credor (o Advogado).
Existe manifestamente uma contradição entre a norma do art. 19º, nº 2 do RLH e
as dos arts. 6º, nº 1 e 44º, nº 1 EOA, e que levanta a questão que se resume em
saber se do laudo de honorários emitido por uma secção do Conselho Superior
cabe - ou não - recurso hierárquico para o Pleno do Conselho Superior.
No sentido de que prevalece o disposto nos arts. 6º e 44º, veja-se o Ac. do TAF do
Porto de 31/10/2019, in
http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/1b04fb6ff31822
9d802584c6003ba609?OpenDocument
195
Visa evitar compensações do Banco, por falta de provisão ou dívidas, penhora de
bens do ADV, etc.
O Regulamento ainda não foi aprovado.
Não se aplica às provisões para honorários, pois não são despesas. Em caso de
dúvida presume-se que o adiantamento em dinheiro foi a título de provisão para
honorários. – art. 7º, nº 4 do RLH.
196
Corolário do seu papel como participante na administração da justiça (arts. 88º, nº
2 que impõe o dever de retidão e cortesia e 90º).
Em contraponto, tem o direito a tratamento compatível com a dignidade das funções
que exerça (art. 72º, nº 1).
Arts. 95º, 96º, 108º, 110º, 111º, 112º, nº 1, als. a), b) e g).
5 - Das decisões referidas no n.º 1, salvo a de advertência, cabe recurso, com efeito
suspensivo da decisão.
197
6 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o recurso da decisão que retire a
palavra a mandatário judicial ou lhe ordene a saída do local onde o ato se realiza
tem também efeito suspensivo do processo e deve ser processado como urgente.
7 - Para a manutenção da ordem nos atos processuais, pode o tribunal requisitar,
sempre que necessário, o auxílio da força pública, a qual fica submetida, para o
efeito, ao poder de direção do juiz que presidir ao ato.
198
Alberto Luís – Sobre a liberdade de crítica às sentenças judiciais Parecer de 22-10-
2004 do C. Geral:
https://portal.OA.pt/publicacoes/revista-da-ordem-dos-advogados-roa/ano-
2004/ano-64-vol-i-ii-nov-2004/jurisprudencia-dos-conselhos/alberto-luis-sobre-a-
liberdade-de-critica-as-sentencas-judiciais/
Uma vitória póstuma de Kiki Pires de Lima – Opinião de Francisco Teixeira da Mota,
in Público 14-02-2019.
“Joaquim (por todos conhecido como Kiki) Pires de Lima foi um notável advogado
de Cascais que morreu em 26 de Março de 2017. Bem conhecido por todos os que
advogavam na barra dos tribunais, era um adversário temível, inteligente, truculento
e criativo. (Para quem o queira conhecer, aconselho a excelente entrevista de
Anabela Mota Ribeiro (em https://anabelamotaribeiro.pt)
Após o 25 de Abril de 1974, Kiki propôs uma acção defendendo a ilegalidade e
inconstitucionalidade da obrigatoriedade da inscrição na Ordem dos Advogados –
ganhou na 1.ª instância mas veio a perder em recurso.”
http://www.OA.pt/upl/%7Bdbda350c-7e53-44b3-a4d8-14c7ffcac800%7D.pdf
“A primeira condenação de Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos
(TEDH), em 1984, no caso Guincho contra Portugal, por violação do direito à justiça
em tempo razoável, deve-se a Kiki Pires de Lima e, na data da sua morte, tinha
pendente no TEDH uma queixa contra o Estado português por violação da
liberdade de expressão. Neste caso, não era o advogado no processo: era ele
próprio o queixoso e quem o representava era o advogado Ricardo Sá Fernandes.
No dia 1 de Março de 2007, Joaquim Pires de Lima tinha dirigido uma participação
ao Conselho Superior da Magistratura (CSM) visando o juiz num processo,
afirmando que o comportamento do juiz não fora imparcial, tendo favorecido a
empresa ré e o seu sócio gerente, referindo factos concretos que, no seu entender,
revelavam uma conduta “grosseira e parcial”. Para Pires de Lima, era evidente que
havia um conluio entre o juiz em causa e a empresa ré e o seu gerente com o intuito
de os favorecer e prejudicar a sua cliente e por isso mesmo pedia ao CSM a
abertura de um inquérito e de um processo disciplinar contra o juiz dado que, no
seu entender, existiam fortes indícios de corrupção da parte do magistrado em
causa, mais solicitando que se investigasse o património do referido magistrado e,
ainda, com que meios adquirira a casa em que habitava.
No dia 22 de Maio de 2007, o CSM, depois ouvir, em sede de inquérito, o juiz em
causa, considerou não ser necessária qualquer outra diligência e concluiu pela
inexistência de indícios de actuação parcial do magistrado, arquivando o processo.
O juiz visado apresentou, então, em tribunal uma acção civil contra Pires de Lima,
queixando-se que tinha sido atingido na sua dignidade e honra, tanto pessoal como
profissional, e pedindo a condenação no pagamento de uma indemnização de 150
mil euros. Após variadas peripécias processuais, o Supremo Tribunal de Justiça,
em 17 de Abril de 2012, condenou o advogado Pires de Lima a pagar uma
199
indemnização ao juiz no valor de 50 mil euros – o valor que os tribunais atribuem
para indemnizar uma vida humana no caso de um homicídio...
Pires de Lima queixou-se ao TEDH de não ter tido um julgamento equitativo, dado
que nunca lhe tinha sido permitido fazer prova dos factos respeitantes ao juiz que
alegara na sua queixa e, ainda, de ter sido violada a sua liberdade de expressão
ao ver-se condenado pela utilização das expressões duras, até excessivas, mas
que considerara necessárias ao exercício do seu direito, e até dever, de denúncia
exercido no local próprio: o CSM.
Tendo Kiki Pires de Lima morrido durante a pendência da queixa no TEDH, o
Governo português opôs-se a que a queixa pudesse ser prosseguida pelos
irmãos e sobrinhos, tendo em conta que a maioria deles renunciara à herança Da
parte dos familiares foi comunicado ao TEDH que não pretendiam qualquer
indemnização, mas tão-somente que o processo prosseguisse para se determinar
se a condenação do irmão e tio a indemnizar em 50 mil euros o juiz em causa tinha
violado ou não a sua liberdade de expressão. Era uma homenagem que lhe
pretendiam prestar.
E, na passada terça-feira, o TEDH, no caso Pais Pires de Lima v. Portugal, declarou
que Portugal violara a liberdade de expressão de Pires de Lima, embora aceitando
existirem motivos para sancionar as acusações e as expressões duras que
utilizara. Mas a condenação numa indemnização de 50 mil euros era excessiva:
violara não só a sua liberdade de expressão, como era apta a produzir um efeito
dissuasor para todos os advogados, nomeadamente quando estão a defender os
interesses dos seus clientes. Uma vitória para todos os advogados e uma merecida
homenagem a Kiki Pires de Lima.”
200
de apresentar quaisquer indícios de corrupção por parte do juiz. Mas entendeu
também que o montante da indemnização fixada foi excessivo. “Especialmente
porque a acusação não foi feita de forma pública, mas somente numa carta dirigida
ao Conselho Superior da Magistratura”, disseram os juízes de Estrasburgo. Carta
essa, recordam, que era suposto ser confidencial. Por isso, este constrangimento
à liberdade de expressão do advogado revelou-se não ser “necessário numa
sociedade democrática”.
Como representante legal de Joaquim Pires de Lima neste caso, Ricardo Sá
Fernandes recorda que este não foi um advogado qualquer: “Foi pioneiro a
apresentar queixas contra o Estado português no Tribunal Europeu dos Direitos
Humanos” nos primórdios desta instituição.
Mais tarde, depois de a justiça portuguesa o ter condenado neste caso, “viveu os
seus últimos anos de vida amargurado, por não ter forma de pagar esta vultuosa
indemnização”. Acabou por ver parte da sua reforma penhorada
A violação da liberdade de expressão é uma das infracções aos direitos humanos
pelas quais Portugal mais vezes tem sido condenado pelos juízes de Estrasburgo.”
- Art. 4º CDAE
201
A boa relação entre ADV é indispensável para uma boa administração da justiça e
composição do litígio.
Art. 208º CRP – imunidades civil e penal para todas as declarações indispensáveis
à defesa da causa. Aquilo que não excede o razoável em termos de sentimento
social dominante.
O ADV deve evitar ataques pessoais, deprimentes ou descorteses.
O ADV não deve pessoalizar as questões nos Advogados, não implicá-lo no litígio.
As relações profissionais são independentes das pessoais.
Afigura-se também que as injúrias dirigidas a um colega prejudicam o prestígio da
advocacia – art. 91º, al. a).
Num caso em que o ADV seja alvo desse tipo de ataques, deve entrar em contacto
com o Colega que o fez, a fim deste se retratar tanto junto de si, como de quem
presenciou o mesmo, relativamente às afirmações proferidas a seu respeito
(primeira parte da alínea a) do n.º 1 do art.º 112º). Não se retratando, deverá efetuar
a comunicação – nos termos do art.º 96º do E.O.A – da intenção de participar
disciplinarmente do Colega, a ser apresentada no conselho de deontologia da
região na qual este tem o seu domicílio profissional – alínea a) do art.º 58º.
Há que ter ainda em consideração a problemática resultante do ADV actuar em
causa própria, em que a independência e objectividade que é exigível ao ADV tem
tendência a perder-se.
IV - Dever de solidariedade
ADV não existe sem outro ADV, face ao princípio do contraditório consagrado no
nosso sistema processual.
Constitui uma manifestação da dignidade e probidade moral própria para se
manterem com o título de advogados.
O reforço da solidariedade entre os Advogados é uma das atribuições da OA – al.
f) do art. 3º.
Ver ponto 5.1. do CDAE
Deve respeitar e fazer respeitar o ADV pelo cliente e defender o colega em outras
situações de abuso ou ilegalidade (sendo testemunha dele, p. ex.).
202
Arts. 110º, nº 2, 111º e 3º, nº 1, al. f), 112º, nº 2 (mas se o ADV anterior pretende
aproveitar-se disso para cobrar honorários imoderados, não existe esse dever.
Pede o laudo e antes faz esforços junto do cliente para a resolução amigável do
conflito).
Constitui eventualmente uma violação do dever de solidariedade entre os
advogados a situação dos advogados que contribuem para as despesas da O.ADV
e Caixa de Previdência, pagando pontualmente as quotas e contribuições
respectivas e outros que ostensivamente o não fazem.
A solidariedade, entendida em sentido latu constitui um dever essencial do ADV
para com o cliente, do qual decorre o dever de zelo e de lealdade a que também
está vinculado.
VI - Dever de lealdade
203
O dever de lealdade inclui um dever de honestidade, que implica uma obrigação de
abstenção por parte do advogado de qualquer comportamento susceptível de
colocar em crise a relação de confiança que deve pautar as suas relações com as
demais entidades com quem se relaciona, enquanto corolário da boa-fé.
Na comunicação a que faz referência o art. 96º e que é uma emanção do dever de
solidariedade profissional, não deve o ADV subtrair-se aos seus deveres de
correção e urbanidade junto do colega, devendo abster-se de qualquer ataque
pessoal, alusão deprimente ou crítica desprimorosa, de fundo ou de forma – alínea
a) do n.º 1 do art.º 112º.
O dever de lealdade deve ceder, em caso de conflito de deveres, perante o dever
para com o cliente, já que neste assenta todo o pilar da deontologia do advogado
(confiança, segredo profissional).
Exemplos:
- ADV que pede ajuda ao colega da parte contrária, por não ter junto rol
oportunamente e querer invocar o justo impedimento).
- Fazer acordos sabendo que o cliente não irá cumpri-los. É uma deslealdade, uma
actuação ardilosa.
- Não revelar perante o tribunal quaisquer negociações malogradas em que tenha
intervindo ADV, para não influenciar o juiz. Acresce que,
O segredo profissional está também em conexão com a lealdade e confiança
devidas não só ao cliente, como também aos colegas.
- Não aceder ao gabinete do juiz, para o procurar e discutir o processo. Não deve
ingerir, nem procurar influenciar as decisões do Juiz.
- Não faltar à palavra dada ou aos compromissos assumidos.
O ADV que recebe o substabelecimento e não o junta ao processo, nem informa o
colega antecessor da representação do cliente, viola os deveres de solidariedade
e lealdade.
Correlativamente, também e à cautela deve o ADV que substabelece em um outro
colega confirmar que o substabelecimento foi atempadamente junto ao processo,
nomeadamente nas situações em que tal ocorre para uma diligência com data
marcada.
204
Deve relacionar-se, designadamente, com o segredo profissional – art. 92º - que o
limita (cfr. os nº 3 e 4 do citado art. 417º CPC). Assim, a título de exemplo, não deve
o ADV depor como testemunha relativamente a factos abrangidos pelo sigilo.
205
O ADV, como já se referiu a propósitos dos seus direitos profissionais, pode
requerer a intervenção da OA para defesa dos seus direitos ou dos legítimos
interesses da classe, como por exemplo, a dignidade da advocacia (arts. 71º e 5º).
Efectivamente, constitui, também, obrigação da Ordem dos Advogados, enquanto
associação pública representativa dos profissionais que em conformidade com a
normas do EOA e demais legislação aplicável, exercem a advocacia, a salvaguarda
do prestígio e do bom nome da Ordem dos Advogados, da dignidade e do prestígio
profissional de todos os Advogados que condignamente exercem a profissão.
A OA integra desde 2023 no seu seio uma Comissão dos Direitos e Prerrogativas
da Advocacia (CDPA), que visa aproximar a OA “dos problemas reais e quotidianos
dos/as advogados/as, intervindo de forma célere, assertiva e eficaz, na defesa
dos/as mesmos/as, sempre que houver qualquer entrave ao exercício da profissão
(seja nos tribunais, serviços públicos, plataformas informáticas, etc.).
33. A Publicidade
O que não se conhece não existe.
Enquadramento legal:
- Arts. 60º e 61º da CRP;
DL. nº 330/90 de 23.10;
- Arts. 94º, 88º, 89º, 90º, nº 2, al. h), 91º, al. a) e 92º.
- 2.6. CDAE (versão de 2002).
- LAPP – arts. 32º e 33º.
206
Está definida no Código da Publicidade (DL. Nº 330/90, sucessivamente alterado).
As regras estatutárias aplicam-se também às Sociedades – 94º, nº 5.
A CRP determina que a publicidade é disciplinada por lei (n.º 2 do art. 60.º), que os
consumidores têm direito à informação (n.º 1 do art. 60.º) e consagra a liberdade
de iniciativa económica privada (n.º 1 do art. 61.º).
À luz destes princípios constitucionais, não pode o legislador proibir em absoluto a
publicidade.
Aliás desde o Estatuto Judiciário de 1928 ela era permitida, no seu art. 745º, que
contemplava a possibilidade de afixação de uma tabuleta à porta do escritório ou a
publicação de anúncio nos jornais, com a identificação do ADV
Assim, a publicidade na advocacia não está proibida, mas tem limites legais, para
separar a pura comercialização do exercício profissional dos valores tradicionais
com que o público pode aceder à informação do ADV (desde a velhinha tabuleta
colocada debaixo da janela ou à porta, o boca-a-boca dos clientes, etc.) fixando-se
entre elas a solução mais equilibrada.
O art. 94º tem a seguinte estruturação:
- nº 1: regra geral;
- nº 2: a informação objectiva;
- nº 3: os actos lícitos;
- nº 4: os actos ilícitos;
- nº 5: a situação das sociedades de advogados.
207
- Loja da advocacia ou Balcão Único de Advocacia – vulgarização do exercício da
profissão, como se fosse a prestação de quaisquer serviços ou bens, ao arrepio da
exigência da dignidade, usos e costumes e tradição da classe (cfr. Carlos Mateus,
pág. 181).
A advocacia não é uma actividade comercial, tendo uma dignidade própria, o que
é incompatível com aquela.
- Menção de “reconhecimento de assinaturas”, “procurações”, “certificações de
fotocópias”, “autorizações”, “termos de autenticações”, “contratos”, “escrituras”, em
tabuletas, vitrinas de escritório e anúncios: são serviços correntes que decorrem da
lei por se ser advogado e cujo conhecimento do cidadão se presume. Não é
informação objectiva, mas de publicidade. Não é “área preferencial de actividade”
(al. a) do nº 3.
Os websites na internet, nas redes sociais, ou a página do Linkedin, se forem
vocacionadas para atrair clientes, constituem actos de angariação.
Os advogados que organizem colóquios ou conferências relacionadas com a
prática forense – podem fazer a divulgação dessas iniciativas junto de clientes e
não clientes: al. f) do nº 3.
A divulgação do currículo do ADV é importante, pois o cliente pode, legitimamente,
querer saber da sua experiência. Longe vai o tempo em que o currículo tinha uma
só palavra: advogado.
O mesmo se passa com as newsletters escrita ou digital – al. g) do nº 3, mas não
poderá ser enviada a quem não seja cliente ou cliente que não o tenha solicitado,
pois tal consubstancia o uso de publicidade directa não solicitada, com vista à
angariação e fidelização de clientes.
O anúncio sobre um advogado num spot televisivo, ou num painel de um estádio
de futebol é possível?
Cfr. os arts. 2.6. do CDAE e 94º, nº 4, al. e).
Não é tanto um problema de audiência ou de custos, mas de conteúdo da
informação disponibilizada, que deve ser objectiva, verdadeira, digna e com
proporcionalidade de meios.
A dignidade implica moderação, decoro, proporcionalidade e sobriedade de meios.
Não pode ser um convite ou aliciamento à compra de serviços, ou de publicidade
directa não solicitada (cfr. nº 4, al. e do art. 94º).
Dessa forma também se responderá no caso de um anúncio de advogado através
de uma faixa transportada por uma avioneta junto às praias, ou num estádio de
futebol, que atenta contra a dignidade, o decoro, a sobriedade e a
proporcionalidade de meios que são exigidos ao ADV
O ADV pode informar com verdade, objectividade e dignidade (discrição): ser
informativo é diferente de ser persuasivo.
São vários os actos permitidos de publicidade, tal como, por exemplo (cfr. nº 3 do
art. 94º):
208
- a identificação pessoal, académica e curricular do advogado ou da sociedade de
advogados;
- a morada do escritório principal e as moradas de escritórios noutras localidades;
- a denominação, o logótipo ou outro sinal distintivo do escritório; a indicação das
áreas ou matérias jurídicas de exercício preferencial;
- a referência à especialização, nos termos admitidos;
- os cargos exercidos na Ordem dos Advogados;
- a indicação do respectivo sítio na internet;
- a colocação, no exterior do escritório, de uma placa ou tabuleta identificativa da
sua existência, com a menção à área preferencial de actividade;
- a utilização de cartões nos quais se possa colocar informação objectiva;
- a menção da condição de advogado, acompanhada de breve nota curricular, em
anuários profissionais, nacionais ou estrangeiros;
- a intervenção em conferências ou colóquios;
- a publicação de brochuras ou de escritos, circulares e artigos periódicos sobre
temas jurídicos em imprensa especializada ou não;
- a inclusão de fotografia, ilustrações e logótipos adoptados.
209
3 – (….)
Por isso, o simples cartão de visita, anúncio de jornal com o nome, morada e horário
de expediente, bem como a placa ou tabuleta afixada no exterior das instalações
do escritório, em que constem apenas elementos de informação objectiva, como
sejam a identificação da existência de escritório e a eventual especialização do
ADV, não são actos de publicidade e nessa medida não estão sujeitos ao
pagamento de uma taxa camarária, como se um anúncio fosse – nº 2, al. n).
Cfr. os arts. 745º do antigo Estatuto Judiciário e 80º EOA (versão do DL. nº 84/84),
que já assim o permitiam.
A dignidade da profissão e a sua função ético-social (actividade essencial à
administração da justiça), com tutela constitucional – revisão constitucional de 1997
– impõem decoro.
Também o princípio da independência (não agir sob pressão, especialmente do seu
próprio interesse) vai nesse sentido.
Igualmente o princípio da integridade, ao estatuir que o ADV deve ter um
comportamento público profissional adequado à dignidade e responsabilidade da
função que exerce, actuando com moderação, contenção e decoro, estabelece um
limite à publicidade.
A angariação de clientela deve ser procurada pela sua competência e probidade e
não pelo aliciamento de campanhas publicitárias (cfr. art. 90º, nº 2, al. h), baseado
no princípio da livre escolha do advogado e da confiança.
Como refere Maurice Garçon: “A ânsia de publicidade é inimiga do escrúpulo. Não
se deve aceitar uma defesa senão quando é livremente solicitada pelo interessado
e quando este, na escolha, se não tenha determinado por uma publicidade
habilmente dissimulada.”
Os argumentos contrários à publicidade na profissão baseiam-se também no
seguinte:
a) Não se deve enganar o publico (a publicidade é por natureza agressiva ou
propagandística, usando uma linguagem persuasiva, retórica ou promocional,
sendo chamativa, bombástica ou cinematográfica) em que se pretende arrebatar o
homem comum, que não tem conhecimentos jurídicos. Atenta-se contra os
elementos essenciais na escolha de um escritório de advogado, tais como a
credibilidade, confiabilidade, admiração e autoridade técnica sobre o assunto.
– cfr. caso do vídeo das advogadas com escritório na Av. da Liberdade, em Lisboa.
https://www.rtp.pt/noticias/pais/advogadas-promovem-sociedade-em-video-
polemico_v704280 ;
b) Não se deve prejudicar o bom nome da profissão;
c) A publicidade é dispendiosa, o que é uma forma de concorrência desleal
entre colegas, pois só as grandes firmas podem suportar as despesas com a
publicidade. Há que evitar o abuso da posição dominante e proteger a igualdade
de oportunidades.
210
d) Atenta contra a ética profissional (não é uma actividade comercial que visa
essencialmente o lucro) e em que a relação ADV – cliente se funda na livre
confiança, sendo a publicidade um atentado à livre escolha do advogado e ao
segredo profissional.
Veja-se que o próprio termo “honorários” espelha essa tradição. Etimologicamente,
o termo deriva do que dá honra, pois agia-se por honra e idealismo e não por
interesses pecuniários. Na Grécia antiga considerava-se moralmente indigno
receber dinheiro para a defesa. E quando se passou a cobrar honorários, diminui-
los por negociação com o cliente não fazia sentido e constituía até uma ofensa, pois
significava diminuir a honra que era conferida a este, por o ADV aceitar o caso.
A advocacia é um bem de consumo, mas não é uma actividade mercantilista.
Quanto maior fôr a confiança, maior é a publicidade para a obtenção de novos
clientes.
A favor da liberdade de expressão, conta o dever de informação dos clientes sobre
os serviços que podem oferecer os ADV e as normas da concorrência, que é contra
as práticas restritivas à sua liberdade.
Nos EUA, os ADV podem fazer marketing jurídico, abordando directamente os
clientes (embora se estabelecendo prazos para o efeito em casos de morte de
alguém, de sofrimento físico, para se defender das investidas dos ADV – veja-se a
cena inicial do filme O Veredicto, com Paul Newman, em que o ADV, Frank Galvin,
já na fase de decadência da sua carreira, vai ao velório de um pretenso amigo para
poder distribuir o seu cartão profissional à família e acaba por ser expulso do local
quando descoberto – vide cena inicial:
https://www.youtube.com/watch?v=khBjUAo4Pik&ab_channel=MeuTioOscar
Não se pode tratar o cliente como pessoa frágil, facilmente enganável, mas como
adulto consciente e racional. Não se pode fechar a actividade da realidade
envolvente. Faz parte da natureza humana o exaltar das qualidades pessoais e
profissionais e num ambiente de extrema competitividade, é impossível evitar a
mensagem publicitária.
Face à globalização da economia, a sociedade de informação em que vivemos, a
concorrência de sociedades de advogados estrangeiras o crescendo das novas
tecnologias, nomeadamente a Internet, a maior permissividade, no que concerne à
211
publicidade, das correspondentes normas dos estatutos das ordens de advogados
de outros países europeus, faz com que sejam desadequadas as actuais normas
estatutárias sobre a publicidade.
“A actividade profissional do advogado é uma actividade económica exercida
livremente e em concorrência. A proibição genérica de publicidade a essa
actividade representa, pois, uma violação do princípio constitucional da
proporcionalidade.” Bernardo Diniz de Ayala.
A tendência actual é, manifestamente, a favor da publicidade da actividade do ADV,
com vista a promover a sua imagem e a angariar clientes.
O próprio CDAE tem uma redacção sucinta, mas mais permissiva à flexibilização
da publicidade na advocacia que o nosso Estatuto, de que a redacção do nº 2 do
art. 94º, ainda que de forma prolixa, reflecte.
“1. O art.º 94.º do Estatuto da Ordem dos Advogados deve manter a sua actual
redacção, uma vez que se vem revelando uma norma equilibrada e razoável no
tratamento da publicidade na advocacia.
“A advocacia tem por base a confiança e a liberdade. Não terá nem uma nem outra
o advogado que inculcar a prestação dos serviços profissionais. [...] O advogado
serve à justiça, na defesa de interesses privados, excluída toda ideia de comércio
da profissão. Se solicitarmos o serviço do cliente, faltará a este a confiança no
advogado, que não foi livremente escolhido, mas diretamente solicitado. Fica o
cliente com direito de tratar o advogado como subordinado e não como conselheiro.
A dignidade da nossa função exige autoridade e autonomia que não se coadunam
com a captação de clientes”. Ruy de Azevedo Sodré
212
Em Espanha é proibida a publicidade que viole o segredo profissional (por exp.
divulgar os nomes dos clientes, mesmo com a autorização dos clientes), incite ao
litígio, seja dirigida às vítimas e prometa resultados.
Na Itália a publicidade deve ser transparente, verdadeira e correcta, não deve ser
comparativa e não pode ser equívoca, enganosa, depreciativa ou sugestiva.
Em França é proibida a publicidade de folhetos, cartazes, filmes, emissões de rádio
ou televisão, inclua qualquer elemento comparativo ou denegridor, seja enganosa
ou que contenha informações contrárias à lei, inexatas ou falsas sobre a natureza
dos serviços e a sua implementação respeitar os princípios essenciais da profissão.
Na Alemanha a divulgação dos clientes é permitida se autorizada pelo cliente.
Admite-se também a indicação da taxa de sucessos (o que pode ser enganador) e
de volume de negócios (pode ser importante para o cliente), se não forem
enganosas, tal como na indicação da especialização.
Na Suécia remete-se para os requisitos do Código da Publicidade e regula
especificamente a publicidade do advogado nas redes sociais.
No Reino Unido, a publicidade é permitida como em qualquer negócio particular,
com as limitações normais existentes para outras actividades.
Conclui-se que o ADV português está em desvantagem face à maior parte dos
colegas de outras jurisdições, designadamente da União Europeia.
Para mais aprofundamento desta matéria veja-se a Conferência promovida pelo
CRL e realizada em 13-12-2021:
https://www.homepagejuridicADVpt/videos/10254-conferencia-publicidade-na-
advocacia-video
Enquadramento legal:
Arts. 32º, nº 2 da CRP e 88º, 89º, 90º, nº 2, al. a), 92º, 93º, 94º, nº 4, al. a), 97º,
nº1m 100º, nº 1, al. b), 108º, 110º e 112º, nº 1, als. a), c) e d) EOA.
213
influenciar na resolução de um pleito sem ser pelas vias legais ao seu 214ispor, na
proteção do segredo profissional, do segredo de justiça e na não publicidade e
promoção profissional e pessoal.
Na realidade, a regra de ouro do exercício da advocacia é o advogado não se
pronunciar em público ou em privado sobre assuntos profissionais pendentes. A
isso obriga o princípio da integridade consagrado no art. 83.º do EOA, ponto 2.2 do
CDAE e nos arts. 86.º, a), 87.º, n.º 1, 88.º, n.º 1 e 107.º, n.º 1, c) do EOA.
A Advocacia é uma profissão de interesse público, das poucas referenciadas
expressamente no texto Constitucional pelo seu papel na defesa dos direitos,
liberdades e garantias dos cidadãos, sendo o Advogado, consigna a lei,
indispensável à administração da Justiça. Em consonância com esse interesse e
em ordem à sua salvaguarda, esta é uma profissão fortemente regulamentada, com
especial destaque para o Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), Lei da
República. São obrigações profissionais do advogado a honestidade, a probidade,
rectidão, lealdade, cortesia e a sinceridade.
214
dê entrevistas, desvende tácticas ou estratégias, de defesa ou de ataque, em
processo que lhe esteja confiado.
Tal pressão resulta também de uma cada vez maior transparência na proximidade
com o cidadão, na exigência do direito/dever de informação, para já não falar da
sistemática violação do segredo de justiça.
Efectivamente, no caso de processo crime, comentar publicamente factos
constantes do processo que ainda se encontrem a ser investigados estando o
mesmo sujeito a segredo de justiça, poder-se-á estar perante um crime de violação
de segredo de justiça previsto e punido pelo artigo 371.º do Código Penal.
215
Contudo, “as autorizações concedidas ao abrigo do disposto no do art.º 93º, nº 2,
do EOA são balizadas pelo conteúdo do despacho que as concede, o que se
delimita à estrita defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do constituinte,
nos aspetos jurídico-processuais (e por tal, mormente adjetivos) do processo em
consideração. Deste modo, resulta claro que o conteúdo da autorização não
representa uma “autorização em branco” ou genérica e ampla para a discussão
pública de questões de facto ou de direito relacionadas com o processo em causa,
razão pela qual não se pode conceder que os advogados extravasem a objetividade
necessária e resultante do respetivo pedido e do correspondente despacho
habilitante, desresponsabilizando-se por via da referência à prévia autorização.
Deste modo, dá-se ainda nota que a verificação do cumprimento dessas premissas
compete ao foro jurisdicional dos órgãos próprios da Ordem dos Advogados, caso
se considere em que as declarações extravasaram os limites da autorização
concedida, considerando, ainda, caber ao próprio advogado a perceção dos limites
dessa própria e prévia autorização.” – comunicado do CRL de 15-07-2021 a
propósito da entrevista dada pelo advogado do presidente do Benfica, Luis Filipe
Vieira a uma estação de televisão, relacionada com a operação Cartão Vermelho.
“Os advogados também são cidadãos. E como cidadãos têm direito a falar sobre a
“res publica”. A dar a sua opinião e a transmitir as suas ideias. Têm, mais, todo o
direito a discutir as questões jurídicas em termos gerais e abstractos, assim como
as magnas questões atinentes ao exercício da justiça, também em termos gerais e
abstractos. O que não podem é discutir, tomando posição, num ou noutro sentido,
dando opiniões, sobre processos pendentes.” Carlos Pinto de Abreu,
“Comunicação, marketing e imagem aa advocacia” in
https://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/detalhe/comunicacao-marketing-e-
imagem-na-advocacia
Mas como se refere no referido comunicado do CRL de 15-07-2021, “a discussão
pública dos processos judiciais por vários advogados em inúmeros canais da
comunicação social, a maior parte das vezes sem conhecimento dos factos
adjetivos dos mesmos, requer a prudência necessária que, assim não sendo,
devota a advocacia e a defesa dos cidadãos à errónea perceção pública dos
216
processos. A justiça e a defesa dos homens fazem-se nos tribunais e com o recato
que a decência e a honra que todas as pessoas merecem.”
Também nada impede que finda uma causa, se publiquem as respectivas peças
processuais por forma a aprofundamento das leis e instituições públicas, art. 90º,
nº 1) – ver, a título de exemplo, o livro “O Processo Leonor Beleza” do seu advogado
Daniel Proença de Carvalho, com prefácio de Mário Soares, referente ao processo-
crime relacionado com o lote de sangue nº 810536 considerado como responsável
pela contaminação de vários hemofílicos portugueses com o vírus da sida.
Devem sim, e em certos processos com dimensão pública sou de opinião que se o
não fizerem – embora com contenção e sobriedade – não estão sequer a defender
completamente os interesses dos seus clientes, não só porque esses interesses
também são afetados na esfera pública pelas notícias, opiniões e discussão acerca
do caso que os envolve, mas também porque, por muito que não se goste disso ou
se queira fingir que não é assim, o que se passa fora do processo pode afetar o
processo, e várias vezes afeta (sim, afeta). Não vamos a lado nenhum se
continuarmos a suspirar por um mundo que já não existe ou se tivermos tabus ou
ingenuidades sobre a importância da dimensão comunicacional de certos casos e
assuntos de e da justiça.”
Inclusive, tenho um livro sobre temas de processo penal para publicar (logo que
tenha tempo e sossego para o acabar – o que rareia, porque tempo e sossego são
cada vez mais bens escassos e de luxo) onde um dos capítulos versa precisamente
sobre isso e onde proponho uma revisão desse artigo do Estatuto, no sentido do
alargamento da permissão de falar em público. Provocatoriamente, dei a esse
capítulo como título “The silence of the lambs” … E, provocatoriamente também,
uma das coisas que aí digo, e aqui repito, é que em Portugal toda a gente fala, fala,
fala sobre certos processos, e pode fazê-lo, menos aqueles que deles sabem
realmente alguma coisa.
217
Eu tento com empenho não o fazer, recuso quase sempre os convites e as
solicitações. É uma mania minha, que se há-de fazer? Quanto à minha opinião
sobre as falas dos outros, depende. Se for apenas para esclarecer aspectos
jurídicos, teóricos ou práticos, não acho mal, e pode ser útil, sobretudo quando há
muito ruído e/ou muita informação inexacta a circular. Já se for para comentar os
casos em concreto, não acho correcto, e muitas vezes até sai asneira, porque falar
sobre o que não se conhece bem é sempre arriscado. E se for para comentar a
prestação de colegas nos processos, então acho péssimo. Para já não falar nas
implicações deontológicas. Finalmente, quanto às situações em que se fala em
bicos de pés, acho sobretudo muito inestético, pelo menos nos casos em que não
é simplesmente risível.”
Rui Patrício, sócio da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados,
in
https://eco.sapo.pt/entrevista/a-mediatizacao-tem-um-grande-peso-nos-
processos-e-uma-enorme-serventia/
COMUNICADO
218
Excepcionalmente, em caso de manifesta urgência, o Advogado pode exercer o
direito de resposta, de forma tão restrita quanto possível, no estritamente
necessário à defesa dos direitos e interesses ofendidos, devendo informar, no
prazo de cinco dias úteis, o Presidente do Conselho Distrital competente, das
circunstâncias que determinaram tal conduta e do conteúdo das declarações
proferidas (art.º 88.º, n.º 6). No entanto, o recurso a este procedimento, não
dispensa o Advogado de ter que alegar e justificar o motivo da urgência, o qual se
traduz na circunstância concreta que o terá impedido de solicitar previamente a
autorização necessária.
Pelo que, sempre que os Ilustres Colegas entendam necessário exercer o direito
de resposta, deverão formalizar o pedido de autorização prévia de discussão
pública do assunto profissional confiado, nos termos e para os efeitos do disposto
nos n.ºs 2 e 3 do artigo 88.º do EOA, nele devendo:
Em 7 de Janeiro de 2015.”
219
“O presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, Jaime
Martins, não autorizou a defesa do ex-primeiro-ministro José Sócrates a divulgar
publicamente o recurso da prisão preventiva que deverá ser apresentado na sexta-
feira, nem outras peças processuais. Entretanto, esta terça-feira o Supremo
Tribunal de Justiça recusou apreciar o terceiro pedido de habeas corpus de
Sócrates, tentando fechar a porta a outros pedidos feitos à revelia da defesa do
antigo governante.
O advogado de Sócrates, João Araújo, tentou obter uma autorização genérica por
parte de Jaime Martins para poder falar publicamente sobre este inquérito e divulgar
algumas peças processuais. Mas o presidente do Conselho Distrital de Lisboa
recusou o pedido, por entender que o mesmo colide com as normas deontológicas
da profissão, previstas no Estatuto da Ordem dos Advogados.
Estas determinam que um advogado não deve discutir publicamente questões
profissionais pendentes nos meios de comunicação. A regra visa impedir o
advogado de tentar influenciar decisões, julgando na opinião pública o que compete
aos tribunais. “O julgamento faz-se no tribunal e não é lícito ao advogado tentar
influenciar uma decisão dessa forma extra-processual”, lê-se na
publicação Deontologia Profissional, de Carlos Mateus, formador em cursos de
advogados estagiários. E acrescenta-se: “Usar os meios de comunicação social
para conseguir alcançar objectivos processuais é recorrer a meios desleais de
defesa dos interesses das partes”. Tal significa uma violação do dever de lealdade
previsto no estatuto, que normalmente dá origem a um processo disciplinar.
A única excepção a esta regra é o direito de resposta, justificado para prevenir ou
remediar a ofensa à dignidade, direitos e interesses legítimos do cliente ou do
próprio advogado. Aí, o advogado pode pronunciar-se, desde que previamente
autorizado pelo presidente do conselho distrital competente, neste caso o de
Lisboa. Apenas é dispensada essa autorização se a imagem do cliente ou do
advogado estiver a ser atacada em directo na comunicação social.”
SIC, 25-03.2015:
“O Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados vai abrir um
processo de inquérito a João Araújo, advogado de José Sócrates, disse hoje à
agência Lusa o presidente do Conselho.
Numa reunião plenária realizada na terça-feira, o Conselho de Deontologia de
Lisboa deliberou “determinar (...) a abertura de processos de inquérito a todas as
recentes intervenções e comportamentos públicos de advogados”, lê-se num
comunicado assinado pelo presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa, Rui
Santos.
220
Na mesma nota, Rui Santos afirma que se nos inquéritos determinarem que existe
matéria suficiente para processo disciplinar não hesitará em instaurá-los, conforme
está previsto nos estatutos e na lei.
Na nota, Rui Santos refere ainda que teve conhecimento da reunião de terça-feira
do Conselho de Deontologia de Lisboa, que foi conduzida pela vice-presidente do
Conselho de Deontologia de Lisboa, e que se encontrava agendada desde janeiro.
“Não compactuo com linchamentos públicos”, refere Rui Santos no comunicado,
acrescentando, porém quer “tudo” fará para “honrar os compromissos” com que se
apresentou à classe.
Entre esses compromissos, encontravam-se, e encontram-se, a “defesa pelo
prestígio da advocacia e a crítica a intervenções públicas demasiado frequentes
por parte de advogados sobre processos pendentes sem que tais intervenções
tenham a necessária autorização legalmente prevista por parte do presidente do
Conselho Distrital”.
Rui Santos refere ainda que todas as queixas de “índole disciplinar que evidenciem,
na inerente versão relatada dos factos, indícios de ilícito disciplinar, terão a
tramitação normal própria de um processo disciplinar.
Os comportamentos públicos do advogado de José Sócrates remontam a 16 de
março quando à saída do Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa – que lhe
indeferira um pedido de “habeas corpus” para José Sócrates – disse a uma
jornalista do Correio da Manhã que devia “tomar mais banho” porque cheira mal.”
221
advogados podem falar antes do fim desse prazo e justificar os motivos
posteriormente ao respetivo conselho distrital.
Numa altura em que a justiça está muito mediatizada, Guilherme Figueiredo
apontou a credibilização como um dos problemas fundamentais do setor, tanto mais
que depende muito da “perceção do cidadão”.
“Há coisas que funcionam bem que continuam a ser entendidas como funcionando
mal. A partir do momento em que o cidadão entende que funciona mal, deixa de ter
confiança no sistema e entende que as decisões judiciais não procuram a justiça.
Isto também provoca uma perda de imagem para os profissionais”, referiu. No
entender do antigo presidente do conselho distrital do Porto da OA, para a
credibilização é preciso que os profissionais do judiciário não imputem
responsabilidades uns aos outros.
“É preciso de haver uma convergência de vários pontos e por isso o pacto da justiça
deve partir das profissões do judiciário. É preciso mais informação para os cidadãos
e ainda focalizar o que funciona mal. Temos de ser capazes de situar”, acrescentou.
Questionado sobre o que está a funcionar mal nos tribunais, foi perentório em
apontar a jurisdição administrativa e fiscal e no comércio, observando que nos
tribunais administrativos e fiscais o tempo de realização da justiça “é absolutamente
anormal e vai de quatro a dez anos”.
Guilherme Figueiredo falou ainda da necessidade de os tribunais explicarem e
comunicarem as decisões com o raciocínio com que as fundamenta, para melhor
compreensão dos cidadãos e que utilize uma linguagem que não seja hermética.
“É necessário uma comunicação simples, fácil de perceber e que permita ao
cidadão aderir à decisão e consciencializar aquilo que é a decisão do tribunal do
ponto de vista do comportamento” concluiu.
222
Veja-se também o Parecer do CRL in
https://www.oa.pt/cd/Conteudos/Pareceres/detalhe_parecer.aspx?sidc=46240&idc
=1365&idsc=42945&ida=44470
- Arts. 3º, al. h), 18º, 41º, 44º, 47º-B, nº 1, al. b), 47º-C, 56º, 58º, 59º, 87º, 96º, 120º,
121º, 123º, 126º, 130º, nº 10, 144º a 176º, 177º, 193º, 209º e 213º, nº 5;
- Regulamento Disciplinar nº 668-A/2015;
- Ponto 1.2. - 1 CDAE;
- Art.18º da Lei nº 53/2015 de 11-06, 52º-A e 52-E introduzidos estes dois últimos
pela Lei nº 64/2023 de 20 de novembro;
- Arts. 15º e 18º da LAPP, com as alterações introduzidas pela Lei nº 12/2023 de
28.03;
- Arts. 150º e 166º, nº 2 e 4 CPC.
223
Contudo, há que dizê-lo que neste momento existem advogados a exercer, apesar
de estarem condenados por crimes tão graves como abuso de menores e peculato,
por inércia dos conselhos de deontologia da Ordem.
224
Nesse caso, fica o tribunal incumbido de enviar para a OA a cópia respeitante ao
despacho de acusação ou de pronúncia (art. 116º, nº 2 e 3).
A condenação de advogado em processo criminal é comunicada à Ordem dos
Advogados para efeitos de registo no respetivo processo individual (art. 141º, nº 2),
sendo que a responsabilidade criminal é independente da disciplinar (art. 116º).
Assim, a norma do art 65º CP prende-se com medidas de segurança e não com o
exercício da função disciplinar (cfr. art. 141º, nº 1).
A referência à negligência, a que alude o art. 126º EOA, parece cingir-se às situa-
ções de negligência na condução do processo, entendida como estudo da matéria,
cuidado na elaboração dos articulados, intervenção nas diligências marcadas,
agendamento de prazos, isto é, a hipóteses em que o advogado fez menos do que
aquilo que deveria fazer, por responsabilidade exclusivamente própria.
225
Assim, a violação de princípios gerais e deveres que devam ser representados
como tal e intencionalmente postergados (por ex. o segredo profissional), exigem a
existência de dolo.
Existem três espécies de infracções: leve, grave e muito grave - art. 115º, nº 3,
cujos critérios de escolha estão definidos no art. 131º.
a) Leve, quando o arguido viole de forma pouco intensa os deveres profissionais a
que se encontra adstrito no exercício da advocacia;
b) Grave, quando o arguido viole de forma séria os deveres profissionais a que se
encontra adstrito no exercício da advocacia;
c) Muito grave, quando o arguido viole os deveres profissionais a que está adstrito
no exercício da advocacia, afetando com a sua conduta, de tal forma, a dignidade
e o prestígio profissional, que fique definitivamente inviabilizado o exercício da
advocacia.
226
A participação disciplinar tem de ser apresentada no Conselho de Deontologia
territorialmente competente, sendo que o critério de conexão será normalmente o
domicílio profissional do advogado visado – arts. 57º e 58º, al. a) EOA.
A determinação da competência territorial do Conselho de Deontologia para o
exercício do poder disciplinar em 1ª instância é fixada na data em que é instaurado
o processo disciplinar. Assim, se após a instauração do processo, o ADV mudar o
seu domicílio profissional para outra região, a competência mantém-se.
O procedimento disciplinar é instaurado por decisão dos presidentes dos conselhos
com competência disciplinar ou por deliberação dos respetivos órgãos, com base
em participação dirigida aos órgãos da Ordem dos Advogados por qualquer pessoa
devidamente identificada, nos termos do nº 1 do art. 122º, para o qual remete o art.
123º
O bastonário e os conselhos superior, geral, supervisão, regional e de deontologia
da Ordem dos Advogados podem, independentemente de participação, ordenar a
instauração de procedimento disciplinar - art. 123º, nº 2.
Tem legitimidade para participar à Ordem dos Advogados factos suscetíveis de
constituir infração disciplinar qualquer pessoa direta ou indiretamente afetada por
estes e qualquer órgão da OA.
Podem intervir no processo as pessoas com interesse direto, pessoal e legítimo
relativamente aos factos participados, requerendo e alegando o que tiverem por
conveniente.
O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que
o titular tiver tido conhecimento dos factos.
Sendo vários os titulares do direito de queixa, o prazo conta-se autonomamente
para cada um deles.
A participação deve ser redigida em língua portuguesa, sem necessidade de
formalismos especiais, e deve ser inteligível, com relato concretizado dos factos
suscetíveis de constituírem infração disciplinar, identificação do advogado ou
advogado estagiário visado, e manifestando clara intenção de participação
disciplinar.
A acção disciplinar comporta as seguintes fases:
a) apreciação liminar da participação;
b) processo de inquérito;
c) processo disciplinar;
d) recursos; e por fim a
e) execução das penas.
A fase de apreciação liminar constitui um saneamento prévio do processo com vista
a determinar a viabilidade e regularidade das participações apresentadas.
Aplica-se o processo disciplinar sempre que a determinado advogado ou advogado
estagiário sejam imputados factos devidamente concretizados, suscetíveis de
constituir infração.
227
O processo de inquérito é aplicável quando a participação for da autoria de um
particular ou de entidades estranhas à Ordem dos Advogados e nela não esteja
claramente identificado o advogado ou advogado estagiário visado ou se imponha
a realização de diligências sumárias para esclarecimento ou concretização dos
factos participados.
Compete ao respectivo presidente a conversão de apreciação liminar em processo
de inquérito ou em processo disciplinar, tendo por base o parecer do relator, a quem
o processo, após despacho, é distribuído. Às secções ou, quando estas não
existem, ao presidente do órgão, compete converter o processo de inquérito e
disciplinar, seguindo-se posteriormente o parecer fundamentado do relator.
A desistência da participação extingue a responsabilidade disciplinar, salvo se a
falta imputada afetar a dignidade do advogado visado, o prestígio da Ordem dos
Advogados ou da profissão.
O processo disciplinar regula-se pelos princípios da verdade material, da
cooperação entre os sujeitos processuais e da celeridade, tendo que ser
asseguradas todas as garantias de defesa – art. 145º.
Ao serem ouvidos como testemunhas, os advogados podem prestar depoimento
por escrito, sob juramento, indicando a razão de ciência e fica obrigatoriamente
vinculados ao dever de segredo no que concerne ao objecto do processo.
Os sujeitos processuais têm o ônus de apresentar testemunhas, salvo determinado
pelo relator, ou então requerer, fundamentadamente, a razão da sua notificação
pelo Conselho.
No caso de testemunhas residentes no estrangeiro, pode o Relator determinar o
depoimento por escrito ou a sua inquirição pela autoridade consular da área (cfr.
Regulamento).
A defesa é feita por escrito e apresentada na secretaria do conselho competente,
ou, em alternativa, remetida por correio electrónico com a peça assinada
digitalmente, devendo expor clara e concisamente os factos e as razões que a
fundamentam – art. 157º, nº 1.m
Com a defesa, o arguido deve apresentar o rol de testemunhas, podendo indicar
três testemunhas por cada facto, com o limite máximo de 10 testemunhas, juntar
documentos e requerer quaisquer diligências, que podem ser recusadas, mediante
despacho fundamentado, quando manifestamente impertinentes, dilatórias ou
desnecessárias para o apuramento dos factos e da responsabilidade do arguido.
O arguido deve indicar os factos sobre os quais incide a prova, sendo convidado a
fazê-lo, sob sanção de indeferimento na falta de indicação.
O relator pode permitir que o número de testemunhas referido nos termos do n.º 2
seja acrescido das que considerar necessárias para a descoberta da verdade – art.
157º.
Não havendo lugar a audiência pública (cfr. arts. 140º e 155º, nº 1) e se todos os
membros do conselho ou da secção se considerarem para tanto habilitados, é
votada a deliberação e lavrado e assinado o acórdão.
228
Se algum ou alguns membros se declararem não habilitados a deliberar, o processo
é dado para vista, por cinco dias, a cada membro que a tiver solicitado, findo o que
é novamente presente para julgamento.
Os votos de vencido devem ser fundamentados.
Antes do julgamento, o conselho ou a secção podem ordenar a realização de novas
diligências, a cumprir no prazo que para o efeito estabeleça.
O acórdão final é notificado ao arguido, nos termos do artigo 155.º, ao participante
e ao bastonário – art. 160º.
Havendo audiência pública (arts. 140º, 155º, nº 1 e 161º), o arguido é notificado
das datas para a sua realização, sendo-lhe facultada cópia do relatório final.
O processo disciplinar é tramitado de forma electrónica (art. 149º, nº 5).
No que toca às notificações aos sujeitos e aos intervenientes processuais, salvo lei
em contrário, esta podem ser efectivadas sob qualquer forma documentada, como
a via postal, a telecópia, o correio electrónico (preferencialmente) ou outro meio
idóneo contendo a transmissão de dados – art. 145º
A notificação em forma de edital pode ser divulgada no portal da OA.
Naquilo que não se encontrar estipulado no Regulamento, em termos de
notificações, contagem de prazos, às recusas, escusas e aos impedimentos
aplicam-se as disposições contidas no CPP.
Ao exercício do poder disciplinar da Ordem dos Advogados, em tudo o que não for
contrário ao estabelecido no presente Estatuto e respetivos regulamentos, são
subsidiariamente aplicáveis as normas procedimentais previstas na Lei Geral do
Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho,
designadamente as constantes dos arts. 194º a 223º deste normativo – art. 126º.
Cfr. o seu nº 4, que reflecte uma alteração relevante nessa matéria, pois
anteriormente aplicava-se o regime do Código Penal em matéria substantiva e o do
processo penal, na parte adjectiva.
Quanto à contagem dos prazos, vigora o art. 146º, nº 1 CPP.
Juntamente com o despacho de acusação, o relator pode propor que seja aplicada
ao advogado arguido a medida de suspensão preventiva quando:
a) Haja fundado receio da prática de novas e graves infrações disciplinares ou de
perturbação do decurso do processo;
b) O advogado arguido tenha sido acusado ou pronunciado criminalmente por crime
cometido no exercício da profissão ou por crime a que corresponda pena superior
a três anos de prisão, ou
c) Seja desconhecido o paradeiro do advogado arguido.
A suspensão não pode exceder o período de seis meses e deve ser deliberada por
maioria de dois terços dos membros do conselho onde o processo correr os seus
termos.
229
Excecionalmente e precedendo decisão devidamente fundamentada, o conselho
superior pode, mediante proposta aprovada por dois terços dos membros do órgão
onde o processo correr termos, prorrogar a suspensão por mais seis meses.
O tempo de duração da medida de suspensão preventiva é sempre descontado nas
sanções de suspensão.
Os processos disciplinares com arguido suspenso preventivamente têm caráter
urgente e a sua marcha processual prefere a todos os demais.
O recurso interposto da decisão que aplique a medida de suspensão preventiva
tem subida imediata e efeito devolutivo – art. 154º.
Os atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados no exercício das suas
atribuições admitem os recursos hierárquicos previstos no Estatuto – cfr. arts. 162º
e segs.
O prazo de interposição de recurso é de 15 dias, quando outro não se encontre
especialmente previsto na lei – cfr. arts. 6 e 165º.
Dos atos praticados pelos órgãos da Ordem dos Advogados cabe, ainda, recurso
contencioso para os tribunais administrativos, nos termos gerais de direito – art. 6º
e art. 163º, nº 1 quanto à legitimidade para a sua dedução).
Art. 118º:
O procedimento disciplinar extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a
prática da infração tiver decorrido o prazo de cinco anos, salvo se a infração
disciplinar constituir simultaneamente infração criminal para a qual a lei estabeleça
prescrição sujeita a prazo mais longo, o procedimento disciplinar apenas prescreve
após o decurso deste último prazo.
O prazo de prescrição do procedimento disciplinar corre desde o dia em que o facto
se tiver consumado.
O prazo de prescrição só corre:
a) Nas infrações instantâneas, desde o momento da sua prática;
b) Nas infrações continuadas, desde o dia da prática do último ato;
c) Nas infrações permanentes, desde o dia em que cessar a consumação.
A prescrição do procedimento disciplinar tem sempre lugar quando, desde o seu
início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de
prescrição acrescido de metade.
230
As sanções disciplinares são as seguintes (art. 130º):
a) Advertência;
b) Censura;
c) Multa de quantitativo até ao valor da alçada dos tribunais de comarca;
d) Multa de quantitativo entre o valor da alçada dos tribunais de comarca e o valor
da alçada dos tribunais de Relação ou, no caso de pessoas coletivas, o valor do
triplo da alçada da Relação;
e) Suspensão até 10 anos;
f) Expulsão.
2 - A sanção de advertência é aplicável quando o arguido tenha violado de forma
leve os deveres profissionais no exercício da advocacia e tem por finalidade evitar
a repetição da conduta lesiva.
3 - A sanção de censura consiste num juízo de reprovação pela falta cometida e é
aplicável a condutas que violem os deveres profissionais dos advogados ainda que
de forma leve, mas para as quais, em razão da culpa do arguido, já não seja
bastante a advertência.
4 - A sanção de multa é fixada em quantia certa, em função da gravidade e das
consequências da infração cometida, sendo aplicável a infrações disciplinares
graves.
5 - A sanção de suspensão consiste no afastamento total do exercício da advocacia
durante o período de cumprimento da sanção e é aplicável a infrações disciplinares
graves, que ponham em causa a integridade física das pessoas ou lesem de forma
grave a honra ou o património alheio ou valores equivalentes.
6 - A sanção de expulsão consiste no afastamento total do exercício da advocacia,
sem prejuízo de reabilitação e é aplicável a infrações disciplinares muito graves,
que ponham em causa a integridade física, a vida, ou lesem de forma muito grave
a honra ou o património alheio ou valores equivalentes.
7 - As sanções são sempre registadas e produzem unicamente os efeitos
declarados no presente Estatuto.
8 - Cumulativamente ou não com qualquer das sanções previstas no presente
Estatuto, pode ser imposta a restituição total ou parcial de honorários.
9 - Independentemente da decisão final do processo, pode ser imposta a restituição
de quantias, documentos ou objetos que hajam sido confiados ao advogado.
10 - No caso de profissionais em regime de livre prestação de serviços em território
nacional e de sociedades de advogados, as sanções de suspensão e expulsão
assumem a forma de interdição temporária ou definitiva do exercício da atividade
profissional, respetivamente.
11 - A decisão de aplicação de sanção mais grave do que a de advertência a
advogado que exerça algum cargo nos órgãos da Ordem dos Advogados, quando
não seja passível de recurso, determina a imediata destituição desse cargo.
231
12 - Sempre que a infração resulte da violação de um dever por omissão, o
cumprimento das sanções aplicadas não dispensa o arguido do cumprimento
daquele, se tal ainda for possível.
A suspensão da execução das sanções está regulada no art. 138º, tendo passado
a contemplar a de advertência, com o EOA/2024.
A aplicação de sanção de suspensão de duração superior a dois anos ou de sanção
de expulsão só pode ter lugar mediante deliberação que obtenha a maioria de dois
terços dos votos do conselho ou da secção competente para julgamento, após
audiência pública realizada nos termos do artigo 161.º
Contudo, a sanção de suspensão de duração superior a dois anos e a sanção de
expulsão devem ainda ser ratificadas por deliberação do conselho superior, tomada
em plenário.
A sanção de expulsão só pode ser aplicada às infrações muito graves, não podendo
ter origem no incumprimento pelo advogado do dever de pagar quotas.
O incumprimento pelo advogado do dever de pagar quotas pode dar lugar à
aplicação de sanção disciplinar de suspensão quando se apure que é culposo e se
prolongue por período superior a 12 meses, cessando ou extinguindo-se a sanção
quando ocorra o pagamento voluntário – art. 140º e 91º, al. e) e art. 180º.
As recentes alterações legislativas à LAPP e ao EOA, no que aqui interessa, ao
impor membros não eleitos pelos profissionais de cada Ordem e fora da classe
profissional nos órgãos com competência em matéria disciplinar, irá introduzir
alterações profundas à sua organização interna e ao princípio vigente nas ordens
profissionais, tradicionalmente baseado no respeito dos direitos dos seus membros
à exclusividade o exercício de tais funções ou cargos.
José Luís Moreira da Silva, presidente da Associação das Sociedades de
Advogados em Portugal (ASAP) e sócio da SRS Legal, admite que esta nova lei
“pode pôr em causa as imunidades dos advogados, na medida em que o poder
disciplinar deixa de estar auto-regulado e passa a ser hétero-regulado, por a
maioria dos membros que exercem a função disciplinar dos advogados não são
advogados. Será que isso pode pôr em causa a imunidade dos advogados? Em
abstrato é difícil dizer, penso que só face a casos concretos se poderá ver se as
imunidades previstas na lei para os advogados (principalmente os constantes dos
artigos 66.º e seguintes do Estatuto da Ordem dos Advogados) são violadas –
nesse caso e se o forem há inconstitucionalidade no caso concreto”.
Pelo exposto e numa síntese que se pretende com o essencial, a violação dos
deveres deontológicos implica a responsabilidade disciplinar (art. 115º). As
infracções são sancionáveis pela OA (art. 114º, nº1). A competência para essa
apreciação e julgamento é dos conselhos de deontologia respectivos (art. 56º, al.
a) excepto se o ADV desempenhar ou tiver desempenhado funções nos órgãos
nacionais ou regionais da OA, sendo, nestes casos, a competência do Conselho
Superior (art. 44º, nº 1, al. c) e nº 2, a) e b).
232
“Guerra na Ordem dos Advogados”:
https://www.publico.pt/2022/03/30/sociedade/noticia/guerra-ordem-advogados-
poe-risco-1200-accoes-disciplinares-2000661
Com as alterações introduzidas pelas Lei º 12/2023 à LAPP, foi criado um Provedor
dos Destinatários de Serviços (art. 20º), não eleito e que tem também competência
para recorrer em matéria disciplinar (art. 18º, nº 9, al. b).
De acordo com ao art. 15º, nº 2, al. d) daquele diploma legal, o órgão disciplinar
passa a integrar membros não inscritos na Ordem Profissional, constituídos por
personalidades de reconhecido mérito.
O Conselho Superior, que actualmente integra 22 membros, passará a integrar 9
elementos, sendo que apenas são eleitos pelos advogados, acrescentando-se 3
das Universidades, 1 cooptado, mais o provedor, sendo que o seu presidente tem
que ser estranho à profissão (art. 15º- A).
Enquadramento legal:
- Arts. 81º 88º, 97º, nº 2, 98º, nº 2, 100º, nº1, al. b), 104º, 196º, nº 5, al. b), 210º e
213º, nº 10 a 14;
- Ponto 3.9.2.4 CDAE;
- Lei nº 53/2015;
- Arts. 31º e 38º do Regime Jurídico das APP (Lei 2/2023) e art. 17º Lei nº 53/2015
(Regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais
que estejam sujeitas a associações públicas profissionais);
- Ac. do STJ de 09-07-2015
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/545303800A0920C380258291003087CA.
233
- Ac. do STJ de 14-12-2016,
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e0bb3ab31dd57c
64802580890063cd14?OpenDocument;
Pode tratar-se:
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O Conselho Geral tem adoptado a prática de manter a subscrição do referido
seguro de grupo pelo montante de capital seguro individual de €150.000 (cento e
cinquenta mil euros).
Pelo que, todos(as) os(as) Advogados(as) com inscrição em vigor estão abrangidos
pelo seguro contratado pela Ordem, beneficiando, assim, automaticamente, de um
Seguro Base de Responsabilidade Civil Profissional, com o limite de indemnização
de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), sem necessidade de qualquer tipo
de adesão.
II - O seguro de grupo
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acontece nas apólices de seguro denominadas de ocorrência, que apenas admitem
a indemnização quando o facto causador do dano se verifica na vigência do
contrato de seguro.
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A doutrina jurídica sobre a indemnização pela designada perda de chance, também
conhecida por perda de oportunidades de realizar um ganho ou evitar um prejuízo,
sem que se possa apurar a sua verificação efetiva, terá despontado, implicitamente,
em França, no âmbito de um acórdão proferido pela Cour de Cassation, em
17/07/1889, no qual foi dado provimento a uma pretensão indemnizatória fundada
numa gerada impossibilidade de prosseguir um processo judicial.
Em Portugal, a doutrina da perda de chance não teve, até há poucos anos, um
tratamento alargado, para além de afloramentos genéricos ou muito marginais,
nomeadamente no domínio da responsabilidade médica e dos concursos públicos,
mas recentemente têm sido produzidos estudos e monografias de aprofundamento
dessa temática.
A orientação dominante do Supremo Tribunal de Justiça foi restritiva, em particular,
no domínio da perda de chances processuais fundada em violação dos deveres
profissionais do advogado, ancorando-se na ideia de que “a mera perda
de chance não tem, em geral, virtualidade jurídico-positiva para fundamentar uma
pretensão indemnizatória, por contrariar o princípio da certeza dos danos e as
regras da causalidade adequada”, só podendo ser atendida em situações pontuais
e residuais, como aquelas em que ocorra a perda de um bilhete de lotaria, ou em
que se seja ilicitamente afastado de um concurso, ou no caso de atraso de um
diagnóstico médico que tenha diminuído substancialmente as possibilidades de
cura de um doente”.
Efectivamente, o ordenamento jurídico nacional consagra a doutrina da
causalidade adequada, ou da imputação normativa de um resultado danoso à
conduta reprovável do agente, nos casos em que pela via da prognose póstuma se
possa concluir que tal resultado, segundo a experiência comum, possa ser atribuído
ao agente como coisa sua, produzida por ele (arts. 483º e 563º do CC).
Isso significa que, apesar da eventual omissão ilícita e culposa do advogado,
importa, igualmente, a verificação de um dano e do correspondente nexo de
causalidade entre aquela conduta omissiva e este dano, sendo certo que, como já
se disse, resultando do mandato forense, apenas, uma obrigação de meios para o
advogado, este não tem, necessariamente, de obter vencimento na causa.
Assim, quando não se pode afirmar o nexo de causalidade adequada entre a
omissão ilícita e culposa do advogado e os danos sobrevindos para o cliente, tal
pode conduzir, irremediavelmente, à irresponsabilização total do profissional que
violou os seus deveres para com o cliente.
O que implicaria, em tese, a existência de muitas infracções, sem sanção suficiente,
com a consequente dificuldade de responsabilizar o advogado perante o cliente,
por incumprimento ou cumprimento defeituoso do mandato.
Veja-se este caso concreto: o advogado não interpõe uma acção judicial para tutela
do interesse do seu cliente, fazendo com que o seu direito preculda ou interpõe, ou
aquela é julgada improcedente porque o advogado, por exemplo, prescindiu das
testemunhas, por achar erroneamente que era uma mera questão direito que
estava em jogo.
É consabido que não há possibilidade de saber se o cliente/autor ganharia ou não
a acção “omitida” ou “falhada”, tratando-se, portanto, de uma matéria insusceptível
de ser provada.
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Os autos, para nos basearmos num dos exemplos acima indicados, não fornecem
elementos que permitam assegurar ao cliente, caso o requerimento probatório
fosse considerado e se tivesse produzido prova, que a acção procederia ou
improcederia; aliás, devido à omissão, o cliente nunca o poderia saber, por ser
matéria insuscetível de ser provada.
Ora, para obviar a estas situações que resultariam numa injustiça para o cliente, o
ordenamento jurídico-civil nacional, cada vez mais, através da doutrina e
jurisprudência (Mota Pinto, por exemplo coloca em 2013, o momento de inversão
da orientação jurisprudencial), também tutela o dano conhecido pela “perda de
chance” ou de oportunidade, que ocorre quando uma situação omissiva faz perder
a alguém a sorte ou a «chance» de alcançar uma vantagem ou de evitar um
prejuízo, que privou o autor da «chance» de obter um resultado favorável, isto é,
de conseguir a condenação do réu na acção de indemnização.
São seguramente a partir de 2015 que as posições francamente negativas ou
reticentes quanto à recepção da doutrina da perda de chance foram definitivamente
abandonadas.
Vejam-se os Acórdãos de 30.04.2015, Proc. 338/11.1TBCVL.C1.S1, de
05.05.2015, Proc. 614/06.TVLSB.L1.S1, de 09.07.2015, Proc.
5105/12.2TBXL.L1.S1, de 16.02.2016, Proc. 2368/13.OT2AVR.P1.S1, de
11.01.2017, Proc. 540/13.1T2AVR.P1.S1, de 24.03.2017, Proc. N.º 389/14.
4T8EVR.E1.S1, de 30.11.2017, Proc. 12198/14.6T8LSB.L1.S1, de 05.07.2018,
Proc. 2011/15.2.PNF.P1.S1 e de 17.05.2018, Proc. 236/14.7TBLMG.G1-S1.
A perda de chance ocorre quando uma dada acção ou omissão faz perder a alguém
a sorte ou a «chance» de alcançar um resultado favorável ou de evitar um prejuízo,
como aconteceu.
O advogado, ao não juntar o requerimento probatório, ou prescindir dele, ao não
contestar, ao não exercer a acção em tempo útil, ao não recorrer, etc., pode causar
ao cliente danos que consistem na impossibilidade de demonstrar a versão dos
factos que apresentara, no articulado inicial ou se propunha apresentar se este
tivesse sido deduzido pelo advogado, e, reflexamente, na inviabilidade de fazer
valer, na totalidade ou em parte, o bem-fundado da sua pretensão, deixando, assim,
de receber o quantitativo pecuniário ou outra qualquer vantagem, efeito, resultado,
juridicamente tutelados, a que se tinha proposto quando passou procuração forense
a aquele.
A doutrina da perda de chance ou da perda de oportunidade, propugna, em tese
geral, a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo
causal entre o facto ilícito e o dano final, mas, simplesmente, que as probabilidades
de obtenção de uma vantagem ou de obviar um prejuízo, foram reais, sérias,
consideráveis.
Alguma jurisprudência não valoriza o dano da oportunidade perdida quando ele é
diminuto, ou meramente hopitético.
Assim, deverá ser indemnizada a vítima nos casos em que não se consegue
demonstrar que a perda de uma determinada vantagem é consequência segura do
facto do agente, mas em que, de qualquer modo, há a constatação de que as
probabilidades de que a vítima dispunha de alcançar tal vantagem não eram
desprezíveis, antes se qualificando como sérias e reais.
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É admitida a ressarcibilidade do dano da perda de chance ou de oportunidade, que
pressupõe: a possibilidade real de se alcançar um determinado resultado positivo,
mas de verificação incerta» - Ac. do STJ de 06.03.2014, que aqui se acompanha.
A teoria de perda de chance veio, pois, alterar o principio do “tudo ou nada” da
teoria da causalidade adequada, uma vez que “distribui o risco da incerteza causal
entre as partes envolvidas, isto é, o lesante responde apenas na proporção e na
medida em que foi autor do ilícito, traduzindo uma solução equilibrada que pretende
conformar-se com uma sensibilidade jurídica a que repugna a desoneração do
agente danoso por dificuldades probatórias, mas, também, que não comina a
reparação da totalidade do dano que, eventualmente, não cometeu.” (Ac. do STJ
05.12.2013).
O dano da perda de chance deve ser avaliado, em termos de equidade, pois é
impossível concluir que o autor ou o réu obteriam ganho de causa, total ou parcial,
nos termos do n.° 3 do art.° 556° do Cód. Civil.
E não segundo critérios matemáticos, fixando-se o quantum indemnizatório,
atendendo às probabilidades de o lesado obter o benefício que poderia resultar
da chance perdida, sendo, precisamente, o grau de probabilidade de obtenção da
vantagem (perdida) que será decisivo para a determinação da indemnização.
Uma vez que o dano que se indemniza não é o dano final, mas o dano “avançado”,
constituído pela perda de chance, que é, ainda, um dano certo, embora distinto
daquele, a indemnização fixada deve reflectir essa diferença, cuja expressão é
dada pela repercussão do grau de probabilidade no montante da indemnização a
atribuir ao lesado.
Daí que a reparação da perda de oportunidade deva ser medida em relação
à chance perdida e não pode ser igual à vantagem que se procurava.
Tanto implica, em primeiro lugar, a avaliação do dano final e, em seguida, fixar o
grau de probabilidade de obtenção da vantagem ou de evitamento do prejuízo, em
regra, traduzido num valor percentual que aplicado à avaliação do dano final
corresponde ao valor da indemnização a atribuir pela perda da chance (cit. Ac. do
STJ 05.12.2013).
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- Limite Agregado Anual de Apólice: Ilimitado
- Franquia: €5.000,00 (não oponível a terceiros lesados) e sem possibilidade de
recurso para a segunda instância atento o seu valor.
- Retroactividade: Ilimitada.
- Capital Máximo por Sinistro e Anuidade relativo a Documentos e Dados:
€150.000,00.
- Âmbito Territorial: Todo o Mundo, excluindo E.U.A., Canadá e territórios sob sua
jurisdição.
- Âmbito temporal: Base “claims made”, isto é, a data do sinistro é a data da primeira
reclamação.
Para não se pagar a franquia deste seguro, em caso de sinistro, que é de 5.000€,
é possível optar pela cobertura total dos danos, mediante um prémio adicional,
actualmente de cerca de 150,00€ anuais.
Art. 104º EOA (com a nova redacção introduzida pela Lei nº 6/2024):
A inscrição no papel timbrado da expressão “Responsabilidade Limitada” tem em
vista garantir a eficácia erga omnes do regime adoptado pelo ADV
A probidade e honorabilidade, indispensáveis para que exista uma relação de
confiança pública na respeitabilidade e seriedade do Advogado, exigem deste uma
informação objectiva, verdadeira e digna.
A alusão ao regime adoptado deve ser feita com carácter de regularidade (princípio
da integridade; defesa da verdade, segurança e certeza do comércio jurídico).
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A nível das Sociedades de Advogados há que ter em conta o regime consagrado
no art. 212º-A, nºs 5 a 9 do EOA, com a redacção dada pela mencionada Lei
6/20224.
Cfr.:
https://portal.oa.pt/media/117349/dra-andreia-teixeira-responsabilidade-civil.pdf
- Art. 4º EOA;
- Art. 63º CRP (Segurança social e solidariedade).
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previdência exclusivo – A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores
(CPAS), criada pelo Estado Novo.
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Com efeito, durante toda a sua vida ativa os Beneficiários entregam à CPAS
recursos financeiros, na expectativa e a confiança de que a CPAS faça dos mesmos
uma gestão prudente para que venha a ocorrer, futuramente, o seu retorno,
mediante a concretização dos pagamentos de reforma e de assistência aos
Beneficiários.
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Apesar desta matriz, a CPAS não descura, ainda que de forma residual, a vertente
assistencial, porquanto permite a aplicação de medidas em caso de comprovada
emergência social.
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Hoje há um patamar mínimo de contribuições de cerca de 255 euros mensais
baseado na projecção de um rendimento mínimo de 1.200 euros. Ora, uma maioria
significativa de advogados não ganha sequer esse valor.
Neste momento, é possível a um advogado que aufira cinco mil euros mensais
pagar apenas esses 255 euros.
A taxa de cumprimento dos Beneficiários foi de 79,14% em 2021.
A dívida acumulada de contribuições à CPAS ascendem actualmente a
138.491.555,01€ (dados de 2021), principalmente nos 5º e 6º escalões, sendo certo
que durante anos não foram cobradas coercivamente, o que não robusteceu o seu
património e coloca inclusivamente uma situação de concorrência desleal e
violação do princípio de solidariedade.
É certo que o beneficiário incumpridor não vota nas eleições no âmbito da OA, nem
tem direito aos benefícios da CPAS, mas a recuperação da dívida, embora lenta,
tem vindo a acontecer efectivamente nos últimos anos., havendo em muitos casos
riscos de prescrição.
Os custos com as reformas e subsídios ascenderam em 2021 a 110.944.202,28
Euros.
O montante efectivamente recebido de contribuições em 2021 (97.122.925,66
Euros) foi inferior ao montante de pensões de reforma pagas (103.279.389,53
Euros) e inferior ao montante global de pensões e de subsídios pagos
(110.944.202,28 Euros).
O valor global dos activos financeiros (mobiliários e imobiliários) é de
548.135.203,64 Euros, representando um decréscimo de 739.406,55 Euros face ao
respectivo valor no ano de 2020, reflectindo a necessidade do recurso à
desmobilização deste tipo de investimentos para fazer face a desequilíbrios
operacionais do sistema também causados pelo factor de correcção sobre o
indexante contributivo acima do inicialmente proposto pela Direcção.
Ao não estar integrada na Segurança Social, não beneficia de soluções de recurso
para a sua estabilidade, como, por exemplo, as transferências do Orçamento Geral
do Estado.
Os advogados que querem transitar para o regime geral não podem ignorar que no
regime da SS cada contribuinte desconta não aquilo que entende, mas o que está
estipulado.
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judiciário há vários anos e o valor exagerado das taxas de justiça que inviabiliza o
acesso dos cidadãos à justiça.
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A 2 de Julho de 2021 realizou-se o referendo vinculativo, com os seguintes
resultados:
Que futuro?
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