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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do

advogado

VALORIZAÇÃO DA ADVOCACIA: DIREITOS E PRERROGATIVAS DO


ADVOGADO
Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo | vol. 21/2008 | p. 94 - 126 | Jan - Jun
/ 2008
DTR\2008\111

Elias Farah
Conselheiro do IASP.

Área do Direito: Fundamentos do Direito


Resumo: Valorização da advocacia. Relevância da defesa dos direitos e das prerrogativas
do advogado. Fator indispensável para o fortalecimento do Estado de Direito, para a
segurança jurídica do cidadão e garantia da sociedade na defesa dos seus direitos, no
resguardo dos seus princípios de liberdade e ordem legal. Relevância do sigilo
profissional e inviolabilidade do escritório e documentos do advogado. Faculdade de livre
acesso a locais e documentos para defesa do cliente. Direito do desagravo público do
advogado ofendido. Direito do advogado de recusa a depor como testemunha sobre fato
relacionado ao cliente. Imunidade judiciária assegurada, nos limites da lei. Garantia do
advogado de prisão especial quando preso.

Palavras-chave: Palavra-chave: Direitos e prerrogativas do advogado - Previsão legal


pelo Estatuto da OAB e pelo Código de Ética e Disciplina da OAB - Fator assecuratório do
Estado de Direito e da democracia - Garantia da segurança jurídica do cidadão -
Condição de eficiência da prestação jurisdicional
Abstract: Making legal services more valuable. Importance of the protection of the rights
and prerogatives of the attorney. Indispensable factor to strengthen the rule of law, to
legally protect citizens and to secure the protection of society's rights, including its
principles of liberty and legal order. Importance of professional secrecy and inviolability
of the law firm and of the documents of the attorney. Possibility of free access to places
and documents for the defense of the client. Right of the offended attorney to seek
public legal redress. Right of the attorney to refuse to be a witness in connection with a
fact related to the client. Legal immunity secured within the limits of law. Right of the
attorney to special prison if arrested.

Keywords: Rights and prerogatives of the attorney - Legal provisions set forth by the
Brazilian Bar Association�s Charter and the Brazilian Bar Association�s Code of Ethics
and Discipline - Securing factor of the rule of law and of the democracy - Legal
protection of citizens - Efficiency condition of the relief
Sumário:

1. Defesa iminente dos direitos e das prerrogativas - 2. Conceituação dos direitos e das
prerrogativas - 3. Direitos e prerrogativas do advogado como garantia da igualdade
perante a lei - 4. Direitos e prerrogativas que ajudam a preservar o estado de direito - 5.
Declaração Universal dos Direitos Humanos - 6. Direito de ser assistido por um defensor
da sua escolha - 7. Direitos e prerrogativas e o atual estatuto - 8. Advocacia e o princípio
da legalidade - 9. Três pilares dos povos civilizados - 10. Independência profissional na
advocacia - 11. Direitos e prerrogativas sem privilégios - 12. Preservar a moralidade do
Judiciário - 13. Defesa da segurança jurídica da pessoa - 14. Os direitos e as
prerrogativas e o sacrifício ético - 15. Direitos e prerrogativas como direitos-deveres -
16. O imprescindível respeito recíproco - 17. Imunidade e desacato - 18. Direitos e
deveres perante o regulamento - 19. Advocacia: mais deveres do que direitos - 20. A
defesa dos direitos e prerrogativas - 21. Os direitos e prerrogativas do advogado e a
consciência da ética profissional - 22. Judiciário e advocacia entrelaçados pelo destino
histórico - 23. Na defesa das prerrogativas do advogado - 24. Prerrogativas e contínuo
aperfeiçoamento - 25. Advogados humanistas e tecnocratas - 26. Prerrogativas em face
da improbidade advocatícia - 27. A prerrogativa da imunidade judiciária e os seus limites
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advogado

- 28. Prerrogativas e direitos em fase da Justiça, morosa e cara - 29. Liberdade e


independência de advogado - 30. Justo conceito de privilégio - 31. Desconforto como
desrespeito aos direitos e às prerrogativas - 32. Criminalização da violação dos direitos e
das prerrogativas - 33. Vocação humanista da advocacia - 34. Prerrogativas e a eterna
vigilância - 35. Capacitação do servidor do Judiciário - 36. Direitos assegurados em face
das normas regimentais - 37. O direito de exigir respeito à urbanidade - 38. O dever
recíproco de urbanidade - 39. Cidadão sem defesa, cidadania ameaçada - 40.
Inviolabilidade do local e dos meios de trabalho - 41. Repúdio às invasões de escritórios
de advocacia - 42. A inviolabilidade do advogado - 43. Sigilo profissional - 44. Invasão
de escritórios de advogados - 45. A prerrogativa de poder reclamar do juiz - 46. Relação
do advogado com os magistrados - 47. O juiz é sempre obrigado a respeitar o advogado
- 48. A liberdade de comunicação com magistrado - 49. Despachos judiciais e o respeito
às prerrogativas - 50. Deontologia na linguagem do juiz: advertência oportuna - 51.
Acesso a autos com documentos de difícil reparação - 52. Carga rápida de autos judiciais
- 53. Direito a exame de processos e documentos - 54. A bacharelice fruto da
mercantilização do ensino do direito - 55. Justiça do Trabalho e prerrogativas - 56.
Garantia de comunicação do advogado com o cliente preso - 57. Prisão do advogado e a
adequação de suas acomodações - 58. Sustentação oral após o voto do relator - 59.
Sustentação oral nos julgamentos - 60. Vista de autos e aqueles impunemente
surrupiados - 61. Direitos e prerrogativas nas CPI do Congresso - 62. Diversidade de
especialidades e a célere evolução - 63. Integração em sociedades de advogados - 64.
Direito ou dever de recusa de patrocínio profissional - 65. O direito assegurado de
retirada do recinto - 66. Símbolos oficiais da OAB - 67. Os direitos e as prerrogativas na
arbitragem - 68. Defensoria Pública da União - 69. Advocacia Geral da União: deveres,
proibições e impedimentos - 70. Defensor Público e os honorários advocatícios - 71.
Sanção inconstitucional na inadimplência - 72. A cognominada "Lista Negra" da OAB-SP -
73. A "lista dos inimigos" e a previsão legal - 74. A OAB na defesa dos direitos e
prerrogativas - 75. Órgãos judiciários e locais públicos. Direito de ingresso - 76.
Desagravo público do advogado - 77. O advogado, o consumidor e a ética - 78.
Prerrogativas no processo penal - 79. Prerrogativas parlamentares e privilégios - 80.
Advogados, licitação para contratar - 81. A fé Pública dos atos e manifestações do
advogado - 82. Direitos e prerrogativas ameaçados - 83. Nem todos fazem jus às
prerrogativas e direitos - 84. Valorização da advocacia é o objetivo destas reflexões

1. Defesa iminente dos direitos e das prerrogativas

As liberdades públicas constitucionais têm como expressivos exemplos os direitos e as


prerrogativas profissionais dos advogados. Protegê-los equivale à mais relevante
fortaleza contra o abuso do poder dos que o representam ou fazem da prepotência o
meio de agir ou legislar. A defesa dos direitos e das prerrogativas profissionais é, pois,
do profundo interesse da cidadania, antes de ser do interesse específico dos advogados.
Há um lento e visível processo de degradação dos direitos e das prerrogativas
profissionais quando escritórios são invadidos, telefones grampeados, comunicações
interceptadas, advogados presos, divulgação pública de advogados supostamente
envolvidos, impedimento a advogados no contato com clientes presos, prisões em salas
impróprias ao arrepio da lei, advogados desrespeitados em audiências televisionadas de
CPIs, enfim um modus operandi temerário em nome do combate à criminalidade.

2. Conceituação dos direitos e das prerrogativas

Os direitos e as prerrogativas são condições ou requisitos, convenientes e benéficos,


assegurados, pela ordem jurídica, aos bacharéis em direito, inscritos na OAB, como
prestadores de serviços profissionais, de caráter público, de relevante interesse da
sociedade, para reivindicar e assegurar, com independência e liberdade, o cumprimento
da lei ou colaborar para que os atos ou fatos sejam cumpridos, nas áreas administrativas
ou judiciárias, dentro da ordem. Prerrogativas não são privilégios no sentido de regalias,
vantagens discriminatórias ou elitistas. Constituem, sim, valores sem as quais a atuação
do advogado não lograria atingir os seus objetivos. É da natureza das divergências de
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interesses um potencial de litigiosidade. Os conflitos legais a serem dirimidos entre as


partes muito dependem dos direitos e das prerrogativas asseguradas aos seus
respectivos patronos, para o acesso livre e amplo junto aos órgãos públicos e privados,
para o deslinde, dentro dos princípios lícitos e ilícitos das demandas, em nome do
interesse da própria sociedade.

3. Direitos e prerrogativas do advogado como garantia da igualdade perante a lei

A prestação jurisdicional sempre foi um serviço público em descompasso com a dinâmica


da evolução social e tecnológica. Será sempre assim se o Poder Judiciário não tiver
autonomia financeira e gestão administrativa especializada. O mal é muito antigo e
endêmico. Nabuco de Araújo já advertia, em 1843: "Ou organizais a Justiça Pública,
verdadeira, real, completa ou legitimais a vindita popular. Não tendes, pois, escolha.
Mas, como? Olhai para a sociedade: o que vedes? Um longo hábito de impunidade!" Na
cena política, logo após, ingressava o imortal Ruy Barbosa, para insistir no tema: "Só há
uma influência se sabe capaz de atuar quase uniformemente sobre todas as índoles mais
elevadas às mais incultas: o aspecto da igualdade jurídica entre os grandes e pequenos,
entre humildes e potentados". Violados, pois, os direitos e prerrogativas advocatícios,
certamente tanto mais difícil será atingir a decantada igualdade de todos perante a lei. A
morosidade da prestação jurisdicional é um espantalho para advogado. A desesperança
afeta a todos que buscam a defesa dos seus direitos. É um inatingível sonho dos
humildes. É preciso perseverar, sem trégua, na defesa da advocacia.

4. Direitos e prerrogativas que ajudam a preservar o estado de direito

A garantia dos direitos e das prerrogativas do advogado pertence àquela categoria de


fenômeno político e social, inerente ao aprendizado da democracia e dos povos que
optaram por viver num Estado de Direito. Os advogados compõem um exército
desarmado, o maior de todos, que guarda os baluartes da legalidade e faz operar-se o
Poder Judiciário. As únicas armas disponíveis são os direitos e as prerrogativas, que lhes
garantem a liberdade e a independência de atuação. São armas intangíveis, em cujo
manejo passam a vida a se adestrar, sem as quais, porém, se cerceadas ou violadas,
implicará um retrocesso nas conquistas da civilização. Os direitos e as prerrogativas dos
advogados tanto já se revelaram úteis e necessários na conquista e manutenção da
ordem social e legal, que o conjunto dos seus valores começa a se enraizar na
consciência e na cultura social, de todas as nações civilizadas.

5. Declaração Universal dos Direitos Humanos

Nenhuma sociedade pode dispensar os serviços do advogado pelo quanto ele representa
para a segurança do cidadão ou para a estabilidade das instituições. Este relevante
munus público, que somente pode ser exercido com direitos e prerrogativas especiais,
vai ao encontro das recomendações da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Dispõem os artigos VIII a XI, em síntese, que "toda pessoa tem direito de receber dos
tribunais nacionais competentes recurso efetivo para os atos que violem os direitos
fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela Constituição ou pela lei". "Toda pessoa
acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente, até que a sua
culpa tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe
tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa".

6. Direito de ser assistido por um defensor da sua escolha

O Brasil ratificou (25.09.1992) a "Convenção Americana de Direitos Humanos" (Pacto de


San José da Costa Rica), cujo art. 8.º dispõe sobre as "garantias judiciais". Todas elas
fazem subentender e pressupor a presença obrigatória do advogado, sob o manto de
seus direitos e prerrogativas. Ressalte-se aquele pelo qual "toda pessoa terá o direito de
ser ouvida com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou
tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus
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advogado

direitos e obrigações de caráter civil trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza". A


Convenção prevê, dentre outras garantias, "a concessão ao acusado de tempo e de
meios necessários à preparação de sua defesa"; o de ser "assistido por um defensor de
sua escolha"; do direito de defesa e de inquirir testemunhas ou peritos; o direito de
recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior; devendo ser público o processo penal,
salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça.

7. Direitos e prerrogativas e o atual estatuto

O atual estatuto da OAB de 1994 veio adequar os conceitos advocatícios à sua atual
dinâmica democrática e melhor emoldurar o capítulo do art. 133 da CF/88 (LGL\1988\3).
Entre 1931, data do velho Regulamento da OAB, e o atual estatuto, a advocacia foi
submetida a notáveis e radicais transformações. Novos direitos e prerrogativas,
privativos do advogado, foram assegurados, como o de exercer a consultoria, assessoria
e direção jurídica (preventiva e extrajudicial) e a representação perante a Administração
Pública, assim como o de visar, como condição de validade, os atos e contratos
constitutivos de pessoas jurídicas. Foram definidos e assegurados, com implicações às
empresas, a relação entre advogados-empregados, nos setores privados e públicos, e
sobre honorários advocatícios, envolvendo as sociedades de advogados. Os honorários
de sucumbência passaram a pertencer exclusivamente ao advogado e foi-lhes dado o
caráter de natureza alimentar para os efeitos jurídicos.

8. Advocacia e o princípio da legalidade

O princípio da legalidade, contido no art. 5.º, XXXV, da CF/88 (LGL\1988\3) ("a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito") é uma das colunas
mestras do Estado de Direito. O direito cívico da ação judicial, que concita o Judiciário a
intervir, é a missão e a bandeira da advocacia. A toda violação de um direito responde
uma ação correlativa, operada pelo advogado. A essência da norma do inciso XXXV é
cobrar do Estado-Juiz o efetivo entendimento sobre as matérias de defesa das partes. A
postulação da tutela jurisdicional, preventiva ou reparatória, de um direito individual,
coletivo ou difuso, depende sempre, pois, da presença do advogado. A responsabilidade
do advogado, em face do princípio da legalidade, pacífico nos tribunais, é que ele deve
ser entendido, não só em relação à conformação do ato com a lei, mas, também, com a
ética, com a moral administrativa e com o interesse coletivo. Esta enorme missão do
advogado, nem sempre assim compreendida, é que faz da advocacia um sacerdócio da
qual nenhuma sociedade pode prescindir.

9. Três pilares dos povos civilizados

Existe na OAB uma "Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas", empenhada em


manter ativa a preocupação de uma ação continuada para a valorização da advocacia. A
finalidade é elaborar o mapeamento da situação de seccionais e de subseccionais,
envolvendo todas as autoridades atuantes no campo das atividades advocatícias, e
formar a consciência de que não há advocacia sem direitos e prerrogativas assegurados;
e sem advocacia, obviamente, não haverá Judiciário. Historicamente se constata que as
violências aos direitos e às prerrogativas profissionais do advogado se excedem quando
surgem os ímpetos do autoritarismo estatal. É próprio dele repudiar as normas e os
princípios que impõem o respeito aos limites das leis e a aplicação do direito.
Autoritarismo e advocacia haverão de estar sempre em conflito. Sociedade organizada,
Estado de Direito e advocacia, em amplo sentido, são três pilares básicos que sustentam
os povos civilizados.

10. Independência profissional na advocacia

O advogado, como regra, nunca deve partir do pressuposto de ser o detentor da


verdade. Ele atua na busca da possível inteireza dela. Esta missão, quase sacerdotal,
somente será factível mantida a sua independência, e nela incluídas as virtudes do sigilo,
da confidencialidade e da imunidade judiciária. O advogado não há de ser mero
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advogado

instrumento de direitos constitucionais e processuais, nem ser confundido com seus


constituintes, titulares do direito de defesa e do devido processo legal. Assim como a
ordem pública exige que o ilícito seja sancionado, assim também a ordem jurídica exige
que o delituoso não seja, além do justo e do desnecessário, vítima da vingança, da
violência e da ira da sociedade. Para tudo existe e deve sempre existir limites legais,
cuja régua há o advogado de bem conhecê-la.

11. Direitos e prerrogativas sem privilégios

Os direitos e prerrogativas não são privilégios, de inspiração corporativa; são


instrumentos de trabalho em favor indireto do cidadão e da sociedade. A competitividade
e a obstinação exigíveis, em regra, na atuação da advocacia, não seriam possíveis sem a
garantia dos direitos e das prerrogativas. O dever de veracidade no processo, ao qual o
advogado está sempre comprometido, sofre freqüentes atentados por profissionais sem
escrúpulos. Tais fatos, entretanto, não devem esmorecer a intransigência do advogado
na defesa dos seus direitos e prerrogativas. A advocacia é a única profissão referida na
Constituição. Considerada indispensável à administração da justiça, e ser inviolável por
seus atos e manifestações, foram-lhe assegurados direitos e prerrogativas. O Estatuto
bem identifica a advocacia ao conceituar que o advogado presta serviço público e exerce
função social. Tanto que é imposto ao Estado a obrigação de prestar assistência jurídica
integral e gratuita.

12. Preservar a moralidade do Judiciário

Os advogados vêm sendo surpreendidos - mormente os mais conservadores - com a


infiltração do crime organizado no Judiciário, inclusive nas instâncias mais altas, com a
cumplicidade de magistrados, policiais, advogados e Ministério Público. A garantia e o
respeito aos direitos e às prerrogativas dos advogados estão na razão direta do grau de
moralidade dos que atuam na defesa e no cumprimento da lei. Quem não cumpre os
deveres da ética e da probidade dos serviços públicos está propenso a violentar
naturalmente os direitos e as prerrogativas de quem quer que seja! Dentre os que
fiscalizam os serviços judiciários, os policiais e do Ministério Público - os advogados são,
por natureza e função, os mais eficientes e interessados. Os advogados devem, pois,
com denodo e independência, contribuir para as investigações e denúncia dos servidores
que prevaricam e denigrem a dignidade do Judiciário, a inidoneidade da polícia, a
vulnerabilidade do Ministério Público. Só assim os advogados fortalecem o direito para
que sejam respeitados os seus direitos e prerrogativas.

13. Defesa da segurança jurídica da pessoa

Pelo advogado, seja magistrado, promotor público, delegado, político, passam sempre as
grandes reformas da sociedade. Existe um imperativo histórico de que a todos,
indistintamente, cumpre, do modo ou forma possíveis, contribuir, ativa ou passivamente,
para a preservação e fortalecimento da ordem legal e desenvolvimento, em todas as
direções, da cultura e do sentimento cívico-político. Sabe-se que daí é que advém a
defesa da dignidade da pessoa e a sua segurança jurídica. A responsabilidade do
advogado é tamanha, com destaque para a indispensabilidade na administração da
justiça, que o exercício da advocacia deve ter assegurados, como princípio básico, os
direitos e as prerrogativas, na sua integridade. Muitos, mormente os leigos, ousam
contestá-los, acoimando-os de privilégios corporativos. Não logram compreender que se
trata de escudos que guarnecem este notável exército de soldados anônimos da
advocacia.

14. Os direitos e as prerrogativas e o sacrifício ético

A consciência dos valores éticos e morais deve estar na persistente pregação que se
principia na escola de direito e se renova, a cada dia, na vida do advogado, fora ou
dentro do Fórum e de todos os que optarem por eles na defesa da lei e da ordem social.
Os valores éticos, que dão à advocacia a grandeza de um sacerdócio, vêm padecendo
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advogado

hoje de inescondível crise. Defendê-los tem sido sacrificante porque numerosas escolas,
em todo o país, se tornaram investimentos essencialmente econômicos e lucrativos e
não mais uma fonte de cultura. O estágio desta insensibilidade a preceitos das honras
profissionais e culturais vem gerando um temerário sentimento, que Ruy Barbosa
qualificava como a da vergonha, num mundo de prevaricações, de sentir-se honesto.
Saturado o mercado advocatício, a competição passa a inspirar-se no egoísmo e na
covardia moral, generalizando a opção pelos atalhos transversais das facilitações
acomodatícias do descaminho ético-profissional.

15. Direitos e prerrogativas como direitos-deveres

Um superior interesse social e político determina que certas profissões, como a


advocacia, estejam ao abrigo de direitos e de prerrogativas. Em sendo, para o
advogado, um direito-dever, por exercer múnus público, cumpre a OAB reagir, judicial
ou extrajudicialmente, contra a violação a quaisquer dos direitos ou prerrogativas. O
Estatuto da OAB (LGL\1994\58) os prevê nos arts. 6.º e 7.º, dispondo no § 5.º do art.
6.º o dever de o Conselho competente promover o desagravo público do ofendido, sem
prejuízo da responsabilidade criminal do impostor. O Regulamento Geral do Estatuto da
OAB (LGL\1994\58) dispõe, nos arts. 15 a 17, sobre a defesa judicial dos direitos e das
prerrogativas, e invoca como necessidade "prevenir ou restaurar o império do Estatuto
da OAB (LGL\1994\58), em sua plenitude, inclusive mediante representação
administrativa. Se a violação do direito ou prerrogativa ocorrer no exercício advocatício,
é facultado à OAB integrar a defesa como assistente no inquérito ou processo, em que
seja indiciado, acusado ou ofendido o inscrito".

16. O imprescindível respeito recíproco

O art. 6.º do Estatuto da OAB (LGL\1994\58) ressalta não existir hierarquia e


subordinação entre os figurantes da prestação jurisdicional. O relacionamento deve,
portanto, ser, entre eles, independente, harmônico, respeitoso e digno. A formação
cultural brasileira ascendeu historicamente a magistratura a um patamar de tamanha
grandeza que descamba, às vezes, a escusados ímpetos de prepotência. Tais excessos,
comuns na imaturidade, desestabilizam o equilíbrio funcional imprescindível à
administração da justiça e fere o direito isonômico, constitucionalmente assegurado.
Esta reciprocidade de urbanidade se estende a todos os agentes públicos e serventuários
da Justiça. O desrespeito ou a violação dos direitos e prerrogativas do exercício
advocatício decorrem de um velado inconformismo, dos que os interpretam e repelem,
por tê-los como desmerecidos privilégios. Esta odiosidade latente pode advir da
ignorância ou da incompreensão da relevância das razões por que existem direitos e
prerrogativas do advogado.

17. Imunidade e desacato

A imunidade é a que assegura o princípio da libertas convinciandi. Isto é, não devem ser
criminalizadas as manifestações, palavras e atos tidos como ofensivos, porém
necessários nos procedimentos advocatícios. Trata-se de princípio já consagrado no art.
142, II, do CP (LGL\1940\2), no que concerne à injúria ou difamação punível. Em face
do dever de todos - advogados, Juízes e Ministério Público - tratarem-se com recíproco
respeito, a imunidade profissional não exclui as sanções éticas e disciplinares. Estas só
podem se aplicadas pelos órgãos competentes da OAB, observadas as normas do EOAB
(LGL\1994\58) e do CED. O desacato ocorre se a ofensa é dirigida a funcionário público
em exercício, de modo pessoal, direto e presente, doloso, provocando humilhação e
desprestígio (art. 331 do CP (LGL\1940\2)). O desacato envolve, na sua configuração,
componentes sutis e predominantemente subjetivas. E já foi objeto de decisão ação
direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Os temas imunidades e
desacato foram objetos de ampla referência no nosso livro Caminhos tortuosos da
advocacia (Ed. LTr).

18. Direitos e deveres perante o regulamento


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advogado

O Regulamento Geral do EOAB (LGL\1994\58) dispõe sobre exigências para a atividade


da advocacia em geral, como: I - o visto em atos constitutivos de pessoas jurídicas,
como condição para registro nos órgãos competentes, deve resultar de serviço da sua
autoria; II - o advogado não pode ser do mesmo tempo, na justiça, patrono e preposto
do empregador ou cliente; III - o advogado, sem inscrição na OAB, que praticar
advocacia, incorrerá no crime de exercício ilegal da profissão; IV - advogado de
sociedade não registrável na OAB não pode prestar serviço de assessoria e consultoria
jurídica; V - o advogado ao renunciar ao mandato deve notificar o cliente mediante carta
com aviso de recepção, dando do ato ciência ao Juízo; VI - a diretoria ou gerência
jurídica de empresa pública, privada ou paraestatal, inclusive financeira é privativa do
advogado; VII - o advogado não está impedido de advogar se participar dos órgãos
públicos referidos na função de representante da classe dos advogados e VIII - enquanto
durar a investidura estão impedidos de exercer a advocacia perante os órgãos em que
atuam.

19. Advocacia: mais deveres do que direitos

A diciologia é a ciência que estuda os direitos do advogado. A natureza dos serviços


advocatícios, envolvendo públicos, indica que nessa missão o advogado tem, em
freqüentes situações, mais deveres do que direitos. As honrarias deferidas antigamente
aos advogados se converteram em encargos e deveres. A Lei das Contravenções Penais
(LGL\1941\7) adverte, no art. 47, sobre a contravenção do exercício ilegal da profissão,
assim considerado quem "exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a
exerce sem preencher as condições a que por lei está subordinado a seu exercício". O
Estatuto anterior, no art. 128, "Das penalidades", dispunha sobre a incidência do
advogado neste ilícito. Para que o advogado possa reivindicar, com altivez e amparo
moral, que lhe respeitem os direitos e as prerrogativas, cumpre-lhe observar, da sua
parte, justa fidelidade nos seus deveres.

20. A defesa dos direitos e prerrogativas

A OAB intervém, na defesa do advogado, quando lhe é negada a prerrogativa. A


intervenção independe da vontade do advogado aviltado - o objetivo da reação da OAB é
a defesa das prerrogativas. A parcela preponderante dos atentados perpetrados contra
os direitos e prerrogativas dos advogados, e que se lhes converteram em processos
criminais, provieram de determinações emocionais de promotores, delegados e juízes.
Depois, quase sempre, os Tribunais relevam a causa, inocentam o acusado e arquivam o
processo. Ficam, porém, as machucaduras e as cicatrizes do autoritarismo e da
prepotência. A severidade da disposição do art. 6.º do EOAB (LGL\1994\58) - de que
"não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do
Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito", tem sido
desrespeitada com freqüência. Sabe-se que a OAB mantém uma lista de autoridades
que, ainda na excitação do poder do cargo, pisoteavam direitos ou prerrogativas de
advogados. A listagem mantém os escolhidos num purgatório, para que depois, ao
buscarem a inscrição na OAB, serem submetidos ao "juízo final".

21. Os direitos e prerrogativas do advogado e a consciência da ética profissional

A consciência que o advogado forma dos princípios e normas de ética profissional muito
lhe facilita o exercício da advocacia. Este autor desenvolveu, décadas atrás, amplo
empenho junto às faculdades de direito, concitando-as à introdução no currículo escolar
o ensino obrigatório da ética profissional. A idéia teve sucesso e hoje até o "Exame de
Ordem" questiona a matéria. Couture advertia que a "advocacia como ética é um
constante exercício da virtude". O Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP, Seção
Deontológica, tem feito meritória pregação pela mídia, dos seus ilustrativos pareceres.
As invocações do advogado na defesa dos seus direitos e prerrogativas estão
intimamente comprometidas com a observância dos princípios éticos e disciplinares.
Aquele que os desconhece ou não os respeita decai naturalmente do direito de
invocá-los em sua defesa. A ética profissional se relaciona, de alguma forma, com a
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

tecnologia de cada profissão.

22. Judiciário e advocacia entrelaçados pelo destino histórico

Os advogados são a sustentação e a força do Poder Judiciário. Se ele é o organismo


vivo, imprescindível à manutenção da ordem legal e da paz social, os advogados são-lhe
a seiva revitalizadora, que lhe sustenta a existência e o impulsiona na direção do seu
destino histórico, político e social. Ministros, magistrados, promotores e advogados,
visceralmente entrelaçados, ao abrigo de justos direitos e prerrogativas, buscam, afinal,
na mesma direção, a prevalência da lei e do direito. O advogado não é, pois, mero
auxiliar da justiça. Ele é dela parte visceralmente insubstituível. Esse é o sentido e o
espírito do art. 133 da CF/88 (LGL\1988\3). Acelerar a solução judicial ou extrajudicial
dos conflitos é por isso do impostergável interesse da sociedade e do advogado. Norma
legal impõe ao candidato à magistratura que comprove o exercício da advocacia no
mínimo por três anos. Uma das finalidades é dotar o magistrado de sensibilidade mais
acurada aos problemas operacionais da advocacia, dentre os quais a conveniência de
respeitar-lhe os direitos e prerrogativas.

23. Na defesa das prerrogativas do advogado

O Conselho Federal da OAB publicou, em 2004, o quinto volume, organizado pelo


diligente criminalista Paulo Sérgio Leite Fernandes, denominado Na defesa das
prerrogativas do advogado. A obra contém numerosos habeas corpus impetrados contra
agressões a direitos e prerrogativas do advogado, mormente na área criminal. Esta
elogiável iniciativa muito contribui para elevar a voz da OAB na defesa da sociedade civil.
As demandas judiciais terão melhor prestação jurisdicional se os seus patronos puderem
observar a advertência do art. 31 do EOAB (LGL\1994\58): "O advogado deve proceder
de forma que se torne merecedor do respeito". As causas não têm para os advogados
dimensões ou valores, mas direitos a serem assegurados e justiça a ser proclamada. Os
juristas, na construção da sociedade, são os responsáveis pela ordenação jurídica e
adequação das normas aos fatos sociais. Se a civilização tecnocrata persistir na omissão
perante tais valores humanistas, a tendência será o embrutecimento dos homens, a
amoralização dos costumes e a inevitável violação dos direitos e das liberdades
individuais.

24. Prerrogativas e contínuo aperfeiçoamento

Estamos vivendo um momento turbulento, com danosas conseqüências, em face da


crescente mercantilice do ensino do direito, que vem inspirando facilidades dos cursos
baratos, mais lucrativos, embora profissionalmente degradantes. A utilização plena e
eficaz dos direitos e das prerrogativas do advogado, considerado um técnico
especializado, está também dependente do contínuo aperfeiçoamento profissional. A
reciclagem técnico-profissional e metodológica; a preservação da respeitabilidade da sua
capacidade técnica; a consolidação do seu efetivo engajamento na problemática social; o
afastamento dos maus advogados, em prol da boa reputação da classe; a cristalização
do sentimento do direito e a sua conscientização de que é responsável, por serviços
relevantes, considerados de elevado interesse público - devem constituir preocupações
dos responsáveis pela formação do advogado.

25. Advogados humanistas e tecnocratas

Os direitos do advogado, dispostos nos vinte incisos do art. 7.º do Estatuto da OAB
(LGL\1994\58), não são exaustivos, mas exemplificativos. Somem-se a eles outros
reconhecidos como imprescindíveis ou convenientes para que o advogado possa cumprir
o seu mandato. Há um conflito de gerações entre os advogados formados na cultura dos
princípios humanistas, que estuda em livros, e os formados na moderna tecnocracia, que
estuda mediante botões de computador. O advogado está hoje dragado por uma
estrutura marginalizante de mercaturas e de proletarização. As civilizações se dividem
entre as que tiveram a sua grandeza com os direitos e a felicidade dos homens
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

colocados como centro de todas as preocupações e as que construíram um progresso


tecnicista avassalador, em que a eficiência dos avanços tecnológicos passaram a ser os
móveis de todos os atos políticos e sociais. O Judiciário está se modernizando
tecnologicamente, mas, nem por isso, a justiça está podendo ser distribuída com
eqüidade devida e desejada.

26. Prerrogativas em face da improbidade advocatícia

A salvaguarda dos direitos e das prerrogativas do advogado tanto será efetiva e justa
quanto o advogado puder demonstrar lisura ética nos seus procedimentos. Existem
advogados que colaboram na estruturação e proteção de organizações que primam por
transitar nos atalhos das leis e se dedicam à engenharia jurídica de negociatas. A
conivência do advogado com o crime o fará decair da credibilidade, rompendo a proteção
dos seus direitos e prerrogativas. Advogados há que tentam blindar a desonestidade
profissional com a invocação de direitos e prerrogativas. Confundem prerrogativas "nos
limites da lei" (art. 133, da CF/88 (LGL\1988\3)), com privilégios de efeitos
incontroláveis. Entra aí a necessária e rigorosa intervenção do Tribunal de Ética e
Disciplina, para castigar os pecados e separar, com eqüidade, o joio do trigo, ou retirar
do cesto as maçãs podres. Há uma verdade eloqüente impossível de negar: não se há de
dar garantia a direitos e prerrogativas aos maus advogados que não o merecem, ou que
delas se utilizam a serviço da ilicitude.

27. A prerrogativa da imunidade judiciária e os seus limites

O EOAB (LGL\1994\58) dispõe no art. 7.º, § 2.º, um aspecto polêmico: "o advogado tem
imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis
qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora
dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que
cometer". A ADIn 1.127-8 cassou a eficácia da expressão "desacato". O art. 2.º, § 3.º do
EOAB (LGL\1994\58), já dispõe que "no exercício da profissão, o advogado é inviolável
por seus atos e manifestações, nos limites da lei". A imunidade aqui se refere
essencialmente à imunidade criminal, se for caracterizada a injúria e a difamação, na
forma oral ou escrita, em qualquer processo ou em documento trazido aos autos. A
imputabilidade do advogado não ocorrerá se o fizer com autorização, por escrito, e
responsabilidade do constituinte. A absolvição do advogado pelos excessos imputáveis,
que configurem injúria ou difamação, não impede que seja punido pela OAB por
infringência ética.

28. Prerrogativas e direitos em fase da Justiça, morosa e cara

A atividade advocatícia forense pressupõe, na forma da lei, que a prestação jurisdicional


se efetive dentro de um preço justo e compatível. A justiça morosa e cara implica
violação de um direito do advogado, que é a obtenção de uma solução para o seu
problema. Dela, à evidência, como regra, vem a condição de auferir a compensação do
seu trabalho. O denodado empenho da legislação especial em prol da celeridade
processual tem se inutilizado porque a execução dos novos instrumentos contínua como
atribuição de servidores moldados e viciados na lentidão corrosiva dos pleitos judiciais.
Esta morosidade parece estar incorporada à realidade histórica do Poder Judiciário. Os
responsáveis por ela já têm assegurado o seu sustento, com benefícios da vitaliciedade e
irredutibilidade dos vencimentos. Pouco lhes importa que isto equivalha à violação dos
direitos do advogado; ou que os seus efeitos transmudem o êxito nas demandas em
"Vitória Pirro"; ou que, ao final, o tempo torne os vencidos mais beneficiados do que os
vencedores. A sabedoria popular já diz que a Justiça tardia é sinônimo de denegação de
justiça.

29. Liberdade e independência de advogado

A advocacia é exercida no interesse do direito e da justiça. As causas não têm para os


advogados dimensões ou valores, mas direitos a serem assegurados e justiça a ser
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

proclamada. A liberdade e a independência - só possíveis com direitos e prerrogativas -


são, pois, as bases da advocacia. O advogado deve obediência apenas à sua consciência
e às normas éticas, dentro da liberdade moral, de pensamento e de expressão.
Predomina entre as violações dos direitos e prerrogativas os atos cometidos por abuso
de autoridade ou de poder. A Lei 4.898/1965 veio regular os direitos de representação e
o processo de responsabilidade civil e penal contra autoridade que, no exercício de sua
função, cometam abusos. A omissão de resistência ou a indiferença do povo em face
contra o mal do abuso de autoridade ou do desvio de poder se tornou quase uma
postura nacional acomodatícia. Uma espécie de anestesia da indignação. E desta, por
isso, decaiu, sem perceber, do direito de reclamar.

30. Justo conceito de privilégio

Privilégio é uma forma de subtração de certas pessoas de imposições comuns ou gerais


ou da competência jurisdicional do Estado, como no caso dos diplomatas. O conceito de
privilégio tem aplicação peculiar no Estado: aquele assegurado aos profissionais do
Judiciário ou da advocacia, por desempenharem funções de reconhecido relevo e
evidente interesse público. Privilégios têm interpretações diferentes entre os povos e
suas tradições nacionais. Na Espanha luta-se por ampliá-las; na França gerou uma
revolução e são considerados status abusivos; na Inglaterra são valores tradicionais,
restaurados e preservados; no Brasil são dotes desfigurados e lucrativos, porém
negociáveis. O privilégio advocatício, como são vistos, com distorção, as prerrogativas,
tem implicações com a imunidade. Elas são necessárias concessões, ou razão da
conveniência de certas profissões ou pessoas jurídicas ou morais de se resguardarem
contra interferência espúria, no cumprimento das suas obrigações ou incumbências.

31. Desconforto como desrespeito aos direitos e às prerrogativas

O desconforto causado aos advogados pela precariedade dos equipamentos cartorários e


ofícios da Justiça é uma das formas de desrespeito aos direitos e às prerrogativas.
Aglomerações constrangedoras, atendimentos grosseiros, indiferentes à função, à idade,
à categoria das pessoas, misturam assuntos relevantes, urgentes, prioritários com os
supérfluos. No ROMS 5.728-MG no Superior Tribunal de Justiça, a relatora Laurita Vaz
(2ª T.) bem retrata o drama: "Restrição ao acesso na parte interna do Cartório, desde
que o atendimento no balcão propicie condições dignas no exercício da profissão. Lei
8.906/94, I - observadas peculiaridades do caso em exame, o que de fato há de ser
delimitado é o acesso injustificado do advogado no interior das serventias judiciais,
quando os préstimos oferecidos no balcão são deveras eficientes e hábeis a propiciar ao
causídico comodidade ao desenvolvimento de sua profissão. Na hipótese examinada,
diminuto guichê de atendimento não propicia o pleno exercício da atividade do
profissional liberal do direito. II - As prerrogativas do advogado há de ser respeitadas
nos limites traçados na lei. III - Recurso provido."

32. Criminalização da violação dos direitos e das prerrogativas

A OAB Federal vem se empenhando para a aprovação no Congresso Nacional do Projeto


de Lei (5.762/2005), por julgar "imprescindível criminalizar a ação que atenta contra a
defesa do cidadão". Um art. 7.º-A do EOAB (LGL\1994\58) passaria a ter a seguinte
redação: "Violar direito ou prerrogativa do advogado, impedindo ou limitando sua
atuação profissional. Pena: detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, sem prejuízo da
pena correspondente à violência se houver". O presidente Cezar Britto, no Jornal do
Advogado, ressalta que "a defesa, validade e respeito às prerrogativas profissionais não
são em favor dos advogados, mas, sobretudo, em defesa do direito da sociedade de se
defender. Isso na compreensão de que a cidadania e prerrogativas são palavras
sinônimas e devem, sempre, andar juntos". A pena prevista poderá ser aumentada de
1/6 (um sexto) "se do fato resultar prejuízo ao interesse patrocinado pelo advogado".

33. Vocação humanista da advocacia

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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

A tecnologia vem influindo na forma da prestação dos serviços advocatícios, mormente


em razão da velocidade das comunicações. Os advogados tendem a se reunir em
sociedades para conquistar e capitalizar mais clientela, multiplicar experiências e reduzir
o custo operacional. Esta influência pode, no entanto, submeter e dilapidar a vocação
humanista e pessoal com que precisa continuar a ser exercida. Predominam ainda as
sociedades de advogados, em 97%, com número de até cinco sócios. O temeroso risco
passa a se acirrar quando o número de advogados e sociedades de advogados atingir
proporções incompatíveis com o índice demográfico das respectivas regiões. Os serviços
advocatícios não devem se massificar e perder a sua identidade de serviço humanista.
Uma competição concorrencial desenfreada converte as sociedades de advogados em
entidades mercantis. Os critérios publicitários fazem-se agressivos e antiéticos, capazes
progressivamente de torná-las sociedades anônimas, com sócios ocultos não advogados,
com quotas negociáveis no mercado e fazendo do lucro, sem conteúdo moral, e o seu
objetivo prioritário.

34. Prerrogativas e a eterna vigilância

O Estatuto da OAB (LGL\1994\58) foi alvo de um Encontro Nacional de Advogados em


2004, quando do seu décimo aniversário. Foram temas centrais os direitos e as
prerrogativas. Na voz de aplaudidos juristas de vários rincões, foram feitas clamorosas
denúncias sobre violações dos direitos dos advogados. Os advogados foram conclamados
a exigir a efetiva proteção institucional dos direitos e das prerrogativas, porque eles
repercutem também na defesa da sociedade e da ordem democrática. Uma justa
inquietação se instalou na OAB quando, logo após o Encontro, o país assistia à profusão
de medidas policiais, com a invasão de escritórios de advocacia, interceptações
telefônicas de advogados e clientes, agravada com a devassa da intimidade da vida
privada, da imagem e direitos da personalidade. E por mais que sejam ilícitas tais
provas, têm sido administradas, ao arrepio do art. 5.º, LVI, da CF/88 (LGL\1988\3) que
os legitimam. O CNJ vem recomendando cautela na expedição de mandados judiciais,
sejam de busca e apreensão, sejam os de prisão.

35. Capacitação do servidor do Judiciário

O respeito aos direitos e às prerrogativas do advogado devido pelo servidor da Justiça,


ou pela polícia, ou pelos órgãos administrativos do Poder Público, em geral, depende
também da adequada compreensão que dele tenham os responsáveis. Há uma
conveniência funcional, porque a reciprocidade no respeito induz a cooperação útil. A
educação sistemática do servidor ou a escolha do servidor mais capaz gera um indireto
aperfeiçoamento da instrumentalidade do processo, racionalizando a eficiência da
jurisdição. Informa o Corregedor-Geral do TJSP o desenvolvimento de eventos para
reciclagem intelectual dos servidores, visando à melhor percepção utilitária dos diretores
de cartórios, por videoconferência, com atenção especial para novas normas de
execução processual e conciliações em geral. O Poder Judiciário sempre padeceu dos
males da incapacidade de recursos financeiros para dinamizar a sua operacionalidade, da
indisposição de profissionalizar a sua administração ou gestão técnico-estrutural e a
indiferença na análise das habilitações dos servidores arregimentados. O
Corregedor-Geral do TJSP está no caminho certo, embora seja muito longa e árdua a
caminhada.

36. Direitos assegurados em face das normas regimentais

O art. 7.º, X e XI, do EOAB (LGL\1994\58), dispõe sobre direitos de poder o advogado
intervir, nos julgamentos em qualquer Juízo ou Tribunal, para esclarecer equívoco ou
dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no
julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas. "Ou
reclamar verbalmente ou por escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade,
contra inobservância de preceito de lei, regulamento ou regimento". Tais direitos sofrem,
na prática, limitações, às vezes, em termos arbitrários, pelos tribunais e até em seus
regimentos internos. Algumas ao arrepio das normas de processo estabelecidas e
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

asseguradas, em detrimento da conveniente prestação jurisdicional. A Constituição (art.


96, I, a) dispõe que compete aos tribunais a elaboração de seus regimentos internos,
mas fixa que "(...) com observância das normas de processo e das garantias processuais
das partes...". Tais direitos, a serem cumpridos com moderação, são inerentes ao direito
de vigilância do advogado.

37. O direito de exigir respeito à urbanidade

É direito do advogado receber "tratamento compatível com a dignidade da advocacia, e


condições adequadas a seu desempenho", (art. 6.º do Estatuto da OAB (LGL\1994\58)).
O Código de Ética e Disciplina recomenda ao advogado que exija "igual tratamento e
zelando pelas prerrogativas a que tem direito", assim como lhe é imposto, "lhaneza,
emprego de linguagem escorreita e polida, esmero e disciplina na execução dos
serviços" (arts. 44 e 45 do CED). Não basta que iguais recomendações estejam inseridas
nos estatutos da Magistratura, do Ministério Público e de outros órgãos. A observância
delas deve ser exigida pelos advogados de quem esteja obrigado a respeitá-las. Os
direitos e as prerrogativas advocatícias são, por natureza, virtudes profissionais
suscetíveis de fácil vulneração. As reações pessoais, de juízes e advogados estão
regidas, quase sempre, pela formação social, familiar e vocacional de cada um.
Impõe-se, pois, por direito e conveniência, que a OAB mantenha-se vigilante na defesa
intransigente dos direitos e das prerrogativas.

38. O dever recíproco de urbanidade

A prerrogativa do art. 7.º, VIII, do EOAB (LGL\1994\58), que assegura a liberdade de o


advogado "dirigir-se diretamente ao magistrado nas salas e gabinetes de trabalho",
impõe-lhe o dever pertinente de tratar o magistrado "com respeito, discrição e
independência", como recomenda o art. 44 do Código de Ética e Disciplina da OAB, no
capítulo "Do dever de urbanidade". Este tema foi objeto de nossas reflexões, publicadas
na Revista do IASP. Este aspecto do relacionamento pessoal do advogado-magistrado,
advogado-delegado, advogado-promotor público é das mais sensíveis. Resulta amiúde
em dissabores a ambas as partes, porque remexem ou remoem vaidades, preconceitos,
autoritarismo, represálias, de difícil controle. Diversas regras infrutíferas são
engendradas com o propósito de satisfazer "gregos e troianos". A admoestação do art.
45 do CED de que se impõe ao advogado clareza, emprego de linguagem escorreita e
polida, esmero e disciplina na execução dos prejuízos", nem sempre pode ser acolhida -
porque, como é freqüente - costuma faltar reciprocidade.

39. Cidadão sem defesa, cidadania ameaçada

"Se o advogado não pode atuar com independência e liberdade, o que está em risco é a
democracia e a cidadania", escreveu, com acerto, Roberto Busato, Presidente da OAB
Federal ( Folha de S.Paulo, 22.09.2004). Os compromissos que o advogado assume
ultrapassam aqueles corporativos; estariam investidos de uma espécie de mandato
público, selado com princípios éticos. A OAB Federal lançou uma campanha sob o lema
"Cidadão sem defesa, cidadania ameaçada". A premissa fundamental, inspirada nos arts.
6.º e 7.º do EOAB (LGL\1994\58), era a de que, ao estipular os direitos dos advogados,
implica estar protegido, na verdade, a Justiça e o jurisdicionado. Quando se fala na
defesa da liberdade e da cidadania, independentemente da pessoa envolvida, significa
que todos devem ter o benefício da presunção da inocência, ao contraditório e ao devido
processo legal.

40. Inviolabilidade do local e dos meios de trabalho

A dinâmica da tecnologia ampliou e diversificou os instrumentos e locais de trabalho do


advogado. Entre eles, se incluem a residência onde trabalhe, a sala privativa na sede do
cliente, as redes de comunicações para trabalho a distância. A residência é considerada
pelo art. 5.º, XI, da CF/88 (LGL\1988\3) como "o asilo inviolável do indivíduo". A
proteção à inviolabilidade da "correspondência e das comunicações telefônicas" estão ao
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

amparo do art. 5.º, XII, da CF/88 (LGL\1988\3). Excepcionam-se os casos de


"investigação criminal ou instrução processual penal", ou no caso de "estado de defesa e
do estado de sítio", de que fala o art. 136 da CF/88 (LGL\1988\3). O efeito penal da
quebra da inviolabilidade está previsto no art. 151 e seus incisos do CP (LGL\1940\2).
Daí porque o art. 133 da CF/88 (LGL\1988\3) dispõe quais direitos devem ser exercidos
nos "limites da lei". A relevância destes temas está em que, sem tais garantias, o cliente
reluta em fornecer dados imprescindíveis à defesa dos seus próprios direitos.

41. Repúdio às invasões de escritórios de advocacia

As invasões de escritórios passaram a ser alvos do repúdio da OAB, que as considerou


de extrema violência. A abusividade escancarada das invasões impôs que o Ministro da
Justiça, o criminalista Márcio Thomas Bastos, baixasse as Portarias 1.287 e 1.288
(01.07.2007), respectivamente sobre as diligências realizadas em escritórios de
advocacia e instruções genéricas para a execução das ordens. A Anamatra se opôs a tais
portarias. Projeto de lei do Dep. José Mentor (n. 5383/2005), entre outros, objetiva que
o Cap. III, do Título IX, do Dec.-lei 8.848/40, passe vigorar sob o título "Do crime de
violação de direitos e de prerrogativas do advogado". E o art. 344-A, passe a ter a
redação seguinte: "Violar direitos ou prerrogativas do advogado, impedindo sua atuação
profissional. Parágrafo único: A pena será aumentada de um sexto até à metade se do
fato resultar prejuízo ao interesse do patrocinado". Constitui a justificativa o exercer o
advogado atividade indispensável à administração da justiça e prestar serviço público e
social.

42. A inviolabilidade do advogado

Entre as prerrogativas do advogado se destaca, pela extrema relevância, a


inviolabilidade dos seus atos e manifestações e de seu escritório ou local de trabalho,
arquivos, correspondências e comunicações (art. 2.º, § 3.º, e art. 7.º, II e XIX, do CED).
Constituem fatores componentes da garantia constitucional (art. 5.º, XIII, da CF/88
(LGL\1988\3)), a liberdade do exercício profissional e a imunidade judiciária, dentro do
espírito que inspirou o art. 133 da CF/88 (LGL\1988\3). Tal prerrogativa visa a proteger
o advogado para que profícua seja a sua atuação, mas visa ainda mais, a proteger o
cidadão, seu constituinte, do qual se fez confidente e com o qual tem, por natureza, um
pacto de fidelidade.

43. Sigilo profissional

O sigilo profissional está entre os direitos da personalidade. A proteção do sigilo ou do


segredo é mais em prol do constituinte do que do advogado. O sigilo é do mesmo tempo
um direito e um dever e se estende às diversas profissões liberais. É de ordem pública e
do interesse geral. O sigilo devido pelo advogado, em relação do cliente, é perpétuo,
imposto pela ética e por lei. Ao advogado é, pois, facultado recusar-se a depor como
testemunha sobre fato advindo da relação profissional com o cliente. Previsões legais
sobre sigilo profissional estão no art. 229 do CC/2002 (LGL\2002\400), art. 347 do CPC
(LGL\1973\5), art. 154 do CP (LGL\1940\2) e art. 207 do CPP (LGL\1941\8). Excetua-se
o caso em que o próprio advogado é acusado de prática de crime. O sigilo profissional do
advogado tem sofrido algumas agressões, de várias formas, como invasões de escritório
e interceptações de comunicações. A OAB deve se antepor com rigor a tais fatos, já que
a independência e o prestígio da categoria muito dependem da certeza dessas garantias.

44. Invasão de escritórios de advogados

Os escritórios de advocacia foram invadidos pela Polícia Federal para cumprimento de


mandados de busca e apreensão. Ocorreram excessos pela violação do sigilo
profissional, garantidos por lei, do advogado e de seus clientes. A classe dos advogados
se rebelou, por várias formas, contra essa violência, cometida contra um direito
consagrado na lei e nas tradições que envolvem a advocacia. As autoridades judiciárias e
políticas, que determinaram a violência, cumpridas ao arrepio do respeito devido à
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

advocacia, invocam razões de Estado para o cumprimento dos excessos. A defesa do


Estado e dos seus superiores interesses não pode estar absolutamente acima de
quaisquer outros, sobretudo quando estejam a arranhar os elevados princípios das
liberdades individuais. Dentre elas se destaca o da inviolabilidade da advocacia garantida
pela Constituição e tida como essencial ao Estado Democrático de Direito. Existem, de
fato, escritórios ou auditores indignos dos direitos e das prerrogativas asseguradas, por
se especializarem em desbastar atalhos para contornar as leis e auferir vantagens nem
sempre lícitas. Um dia, entretanto, nesses escritórios, como previsível, a " casa cai". E aí
o excesso oficial encontra uma justificativa indesejada.

45. A prerrogativa de poder reclamar do juiz

No Conselho Federal da OAB foi proposta a obrigatoriedade do conhecimento dos direitos


e das prerrogativas do advogado nos concursos para a Magistratura, Ministério Público e
outras carreiras jurídicas. A finalidade é tornar permanente a campanha de valorização
profissional da advocacia. O STJ (5ª T.) no HC 73.649-RS, trancou ação penal contra
advogado sob o argumento de que reclamar de juiz é direito e prerrogativa do
advogado. O causídico se recusou a participar de audiência irregularmente presidida por
secretário da Juíza. O fato foi levado ao conhecimento da Corregedoria e vazou para a
imprensa. O Ministério Público denunciou o fato e o advogado viu-se condenado a um
ano e 15 dias de detenção e multa. O STJ reconheceu a "anomalia procedimental".
Admitiu como verídica a versão do fato, mas que não houvera ofensa moral à Juíza.
Prosseguiu o acórdão: "Não constitui difamação a reclamação dirigida por advogado, no
exercício do seu mister, ao órgão correcional sobre eventuais irregularidades cometidos
no âmbito do Poder Judiciário, porquanto amparada pela imunidade assegurada pela Lei
8.906/94, art. 7.º, § 2.º."

46. Relação do advogado com os magistrados

O princípio básico está previsto no EOAB (LGL\1994\58), art. 6.º, pelo qual "não há
hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério
Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos". Isto decorre
de ser devido "ao advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a
dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho". A relação, pois,
entre advogado e magistrado, em qualquer momento, deve ser livre, harmônica,
reciprocamente respeitosa, dentro de regras legais e com a ética natural da boa
convivência, respeitada sempre as prioridades dos assuntos e interesses, próprios e de
terceiros. O magistrado que desrespeitar tais recomendações legais e funcionais está,
também, sujeito à punição disciplinar dos órgãos competentes, por configurar o
procedimento um abuso de autoridade.

47. O juiz é sempre obrigado a respeitar o advogado

O Pedido de Providência 1.465, formulado ao Conselho Nacional de Justiça, por Juiz do


Rio Grande do Norte, recebeu a resposta abaixo, pertinente ao tema, que melhor se
explica. "1. Não pode o magistrado reservar período durante o expediente forense para
dedicar-se com exclusividade, em seu gabinete de trabalho, à prolação de despachos,
decisões e sentenças, omitindo-se de receber profissional advogado quando procurado
para tratar de assunto relacionado a interesse do cliente. A condicionante de só atender
ao advogado quando se tratar de medida que reclama providência urgente apenas pode
ser invocada pelo juiz em situação excepcional, fora do horário normal de funcionamento
do foro e já estar limitada pelo Juízo de conveniência do Escrivão ou Diretor de
Secretaria, máxime em uma Vara criminal, onde o bem jurídico maior da liberdade está
em discussão. 2. O magistrado é sempre obrigado a receber advogados em seu gabinete
de trabalho, a qualquer momento durante o expediente forense, independentemente da
urgência do assunto, e independentemente de estar em meio à elaboração de qualquer
despacho, decisão ou sentença, ou mesmo em meio a uma reunião de trabalho. Essa
obrigação se constitui em um dever funcional previsto na Loman e a sua não
observância poderá implicar em responsabilização administrativa."
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

48. A liberdade de comunicação com magistrado

Este é o aspecto dos mais questionados. A receptividade do magistrado procurado pelo


advogado costuma refletir as virtudes da sua formação pessoal. O fator índole ou humor
natural o condiciona ou a ser amável e compreensivo ou a ser avesso à cordialidade. O
desequilíbrio emocional existe em magistrados e advogados. Na postura dos atos
rotineiros se percebe os excessos de que são capazes: os Juízes arrogantes que
dificultam o contato com advogados; os Juízes que se incomodam por sentir-se
prejudicados no desempenho do seu ofício e, de outro lado, de advogados, sem bom
senso e perspicácia, afoitos na solução do seu problema, que não titubeiam em
perturbar o juiz no momento inoportuno, às vezes afogado na perplexidade de um
julgamento. Serventuários zelosos cerceiam os contatos necessários do advogado com o
magistrado, ao desamparo da lei. A receptividade do magistrado também se liga a
preconceitos arraigados de cada um, no zelo da imagem e da autoridade. Isto é, há um
inconsciente temor de que o contato pessoal com o advogado suscite suspeição da sua
probidade ou da sua imparcialidade funcional.

49. Despachos judiciais e o respeito às prerrogativas

Corregedor Geral da Justiça acolheu reclamação da AASP ( Boletim 2564) e determinou


que o resumo das decisões contenha elementos necessários ao completo entendimento
do seu teor. Esta exigência já consta das Normas de Serviços do CG, no item 51 e
subitens, seção III, cap. II do Tomo I. O advogado tem o direito de receber a prestação
jurisdicional com segurança e explicitação. Uma decisão iníqua pode arruinar a
dignidade, o patrimônio ou a liberdade de uma pessoa. O rigor dos prazos judiciais, a
exigência do formalismo nos julgamentos, a justa compreensão das publicações dos atos
processuais esbarram, entretanto, na discrepância da forma relaxada, inconveniente ou
de garranchos ilegíveis com que às vezes os despachos são lavrados, sob diversos
aspectos: na grafia, na desordem linear, na disposição na folha, na aspereza dos traços,
na concisão embaraçosa. Tal incompatível critério de comunicar-se com os advogados
equivale a um gesto de desrespeito e, em alguns, de certa insolência. Configura um
desequilíbrio na reciprocidade da deferência que se devem juízes e advogados. A
concisão, o laconismo, o sintetismo dos despachos se equiparam a um comodismo que
contrasta com o vigor formal exigido do advogado nos atos processuais.

50. Deontologia na linguagem do juiz: advertência oportuna

No estudo do culto magistrado Sidnei Agostinho Benetti (Deontologia na linguagem do


juiz, coletânea Curso de deontologia da magistratura, Saraiva, 1992, cap. 9: "A
apresentação gráfica"), o autor reproduz a recomendação do saudoso Des. Acácio
Rebouças, quando Presidente e Corregedor do TJSP, feitas por circulares reservadas
(1976). Nela advertia o autor ao Juiz para não lavrar atos do processo: "a) em má
linguagem ou linguagem sofisticada; b) com má caligrafia ou má ortografia; c) sobre fita
mecanográfica exausta; d) com abreviaturas e com expressões ininteligíveis, ou de
entendimento em âmbito restrito; e) em papel de qualidade inferior, ou sem espessura
suficiente para evitar a transparência; f) sem espaço duplo, na escrita mecanizada, ou
com entrelaçamento de caracteres na manuscrita." Outra circular advertia sobre "a
intemperança de linguagem, quando a não vivacidade, por vezes, imprime aos atos
judiciais, com a publicidade que lhe é inerente, feição agressiva, ou enseja sejam eles
recebidos como tal, transformando-os em instrumento de vexame e agravos para esta
ou aquela pessoa".

51. Acesso a autos com documentos de difícil reparação

Entre as restrições ao exame e retirada de autos está aquela referida aos que
contenham documentos de difícil reparação ou comprovada importância histórica. Tal
restrição há de estar expressamente determinada pelo juiz. São exemplos os mapas e
escrituras originais ou os títulos executivos juntados no original; uma confissão ou
declaração de pessoa falecida. A restrição à retirada de autos pode ocorrer de offício pela
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

autoridade ou a requerimento da parte. O despacho proibitório da retirada dos autos há


de preexistir ao requerimento do interessado, ou proferido em requerimento de
advogado desprovido de procuração hábil. O assunto, com várias facetas, está versado
no art. 86 do RISTF (LGL\1980\17), no art. 96 do RISTJ (LGL\1989\44), ou no art. 40 do
CPC (LGL\1973\5).

52. Carga rápida de autos judiciais

A vista dos autos judiciais ou administrativos constitui direito relevante do advogado. A


visão global e segura da demanda é imprescindível e fundamental para a eficiência do
patrocínio profissional. O EOAB (LGL\1994\58) assegura de forma ampla este direito.
Criou-se o sistema de "carga rápida", para a maior dinâmica da atuação advocacia. Em
São Paulo, o Provimento 402/2006, da Corregedoria Geral, introduziu o item 94-A e
subitens 94-A-1, 94-A-2 e 94-A-3, na seção II, cap. II, do tomo I, das Normas de
Serviços. A norma introduzida assegura ao advogado, mesmo na fluência do prazo
comum, vista dos autos pelo prazo de 45 minutos fora do cartório, mediante protocolo,
para obtenção de cópias. A retenção, antes adotada, até abusivamente, da carteira de
identidade do profissional é legalmente proibida. A OAB-SP, através do Dep. Marcelo
Ortiz, está propondo que o art. 40 do CPC (LGL\1973\5) tenha novo inciso, que disponha
sobre o direito de vista dos autos fora de cartório por um período de uma hora. A "carga
rápida", portanto, terá previsão legal.

53. Direito a exame de processos e documentos

O exame de processos e documentos é gravado de sigilo administrativo ou judicial. Está


para o advogado como para o médico estão os exames laboratoriais, radiográficos, o
histórico da moléstia. O diagnóstico seguro da causa depende do direito assegurado ao
advogado do acesso a inquéritos e processos judiciais, findos ou em andamento, e a
documentos, com ou sem procuração, nos órgãos públicos ou judiciários. Este direito
está previsto no art. 7.º, XIII a XVI, do EOAB (LGL\1994\58). Tais dispositivos
abrangem as hipóteses, que se diferenciam, de examinar autos, ter acesso a eles, ter
vista ou poder retirá-los, observados as oportunidades e os prazos legais. Como decidiu
o STF (RE 77.882-PR): "Não pode ficar ao nuto do escrivão, ter o advogado vista dos
autos fora do cartório". A obstrução a este direito é crime. A exigibilidade de procuração
para mero exame dos autos é abusiva. O direito assegurado permite ao advogado
"retirar autos de processos fíndos, mesmo sem procuração, pelo prazo de dez dias".

54. A bacharelice fruto da mercantilização do ensino do direito

A avalanche de cursos jurídicos, incapacitados para a formação conveniente dos


bacharéis, tem sido alvo de severas críticas dos estudiosos. Um exército de advogados
invade anualmente o mercado de trabalho advocatício. A incapacitação profissional e
intelectual se evidencia de várias formas, inclusive pela ignorância ou incompreensão
das normas éticas e disciplinares, assim, como do sentido dos seus próprios direitos e
prerrogativas. Os profissionais, com tais limitações, estão mais propensos aos atropelos
na sua atuação, fora e dentro do Judiciário; isto é, mais susceptíveis de serem vítimas
do desrespeito dos seus direitos e prerrogativas. Não deve bastar a mera ostentação do
título do bacharelado. Impõe-se a contraprestação correspondente à competência
técnico-profissional, demonstrada com postura ética. Os direitos e as prerrogativas não
são dádivas incondicionais, exigíveis a qualquer preço. O advogado deve estar
credenciado em vê-los respeitados, por força do seu prestígio cultural, técnico, ético. A
mercantilização do ensino do direito, transvertido em investimento econômico
especulativo, antes de ser educacional, tem tido parcela de culpa na disseminação dessa
danosa "bacharelice".

55. Justiça do Trabalho e prerrogativas

Advogados trabalhistas reclamam das contrariedades profissionais acarretadas pela falta


de urbanidade na relação entre eles e juízes. Suspeita-se, até, de que a presença do
advogado desagrada o magistrado, por exigir-lhe mais rigor técnico no julgamento, mais
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

eqüidade nos acordos sugeridos ou mais serenidade no exame das pessoas e das
provas. A facultatividade da representação advocatícia nas, do art. 791 da CLT
(LGL\1943\5), teria sido derrogada. A Constituição de 1946, integrando a Justiça do
Trabalho no Judiciário, teria derrogado o art. 791 da CLT (LGL\1943\5). O art. 71, § 3.º,
do Estatuto da OAB (LGL\1994\58) de 1963 e os arts. 1.º, 2.º e 4.º do Estatuto da OAB
(LGL\1994\58) atual, em consonância com o art. 36 do CPC (LGL\1973\5), consagram
que o advogado tem presença obrigatória no Pretório Trabalhista. Finalmente, a Carta
Magna (LGL\1988\3) de 1988, pelo art. 133, elevou a indispensabilidade do advogado no
Judiciário a princípio constitucional. Imperioso, pois, que os direitos e prerrogativas do
advogado sejam também, com a mesma grandeza, respeitados na Justiça do Trabalho.

56. Garantia de comunicação do advogado com o cliente preso

A Constituição tem assegurado, no art. 5.º, LXIII, que "o preso será informado de seus
direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da
família e de advogado". O EOAB (LGL\1994\58) prevê - com base neste princípio
constitucional - dentre os direitos do advogado, previstos no art. 7.º, III - poder
"comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração,
quando estes se acharem presos, detidos, ou recolhidos em estabelecimentos civis ou
militares, ainda que considerados incomunicáveis". Este direito e prerrogativa do
advogado implica também a proteção do prisioneiro. O estabelecimento prisional deve
assegurar ao advogado facilidades para o contato com o preso, com dispositivos dignos
e apropriados, sobretudo para a manutenção do sigilo profissional. Esta liberdade
assegurada de contato com um prisioneiro se estende às suas comunicações telefônicas,
epistolares etc. O STF (RHC 51.778-SP) foi taxativo: "1. O acesso do advogado ao preso
é consubstancial à defesa ampla; e pelo seu respaldo constitucional não pode sofrer
restrição, senão a que for fixada por disposição de lei".

57. Prisão do advogado e a adequação de suas acomodações

O advogado pode ter a prisão decretada quando cometer crime comum, por razões não
relacionadas ao exercício profissional. É-lhe garantido, por sua formação superior, ser
recolhido em sala do Estado Maior, enquanto não transite em julgado a sentença
condenatória. Equivale a dizer, em sala ocupada por oficiais condenados, em quartel
militar, com comodidades compatíveis. Inexistindo a referida sala, o advogado deveria
guardar prisão domiciliar. Tal prerrogativa está prevista no art. 7.º, V, do EOAB
(LGL\1994\58). As salas deveriam ser previamente "reconhecidas" pela OAB. O STF
suspendeu a eficácia desta condição do reconhecimento, pela ADIn 1.127-8. A
jurisprudência se pacificou no sentido de que uma dependência especial de Batalhão
Polícia Militar bastaria para atender a exigência estatutária. A preocupação da OAB é a
de poupar o advogado, por seu grau cultural, de ser submetido a um ambiente
degradante ou humilhante, ou a uma convivência perigosa com presos comum. É
justificável que não se mantenham presos com acentuadas diferenças sociais e culturais,
além do risco, por represália, de atentado à sua integridade moral e física.

58. Sustentação oral após o voto do relator

O EOAB (LGL\1994\58) prevê o direito de sustentação oral do advogado no julgamento


do seu recurso "após o voto do relator". Este direito foi cassado pela ADIn 1.105-7 do
STF, que exige a observância do disposto no seu RISTF (LGL\1980\17), isto é,
sustentação antes do voto do relator. O sistema cassado surgira da "Lei dos Advogados",
n. 2.970, sancionada e publicada em 28.11.1956. Ela alterou o art. 875 do CPC
(LGL\1973\5)/1939, dispondo que "feita a exposição dos fatos e proferido o voto pelo
relator... para a sustentação oral das respectivas conclusões". Já no dia seguinte à
publicação da lei, o STF classificou-a de subversiva. No dia seguinte, 30.11.1956, o STF
julgou a lei inconstitucional. Os Ministros Gallotti e Hahnemann Guimarães acusavam a
decisão de violar a hierarquia das leis, isto é, a impossibilidade de um regimento interno
repelir uma lei processual. Órgãos da classe, como IASP, AASP, Conselho Federal da
OAB, protestaram. A ADIn 1.105-7 passou a significar a reincidência do atentado contra
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

a hierarquia das leis. Desta vez, porém, surpreendentemente, ninguém protestou!

59. Sustentação oral nos julgamentos

A oralidade, mormente processual, passa por uma visível crise, embora a palavra oral ou
escrita seja o mais importante instrumento de trabalho do advogado. A sustentação oral
nos julgamentos nos tribunais constitui um direito relevante do advogado. O EOAB
(LGL\1994\58) assegura nos julgamentos dos tribunais a sustentação após a leitura do
voto do relator, mas este mesmo direito, que o art. 7.º, IX, do EOAB (LGL\1994\58)
instituiu como direito também nos julgamentos judiciais, teve a sua eficácia suspensa
pelo STF - (ADIn 1.105-7). Tudo indica que a sustentação após o voto do relator melhor
atende o princípio do contraditório das teses questionadas e ao amplo direito de defesa,
antecipando, no julgamento final a mais justa verdade da decisão. O Judiciário
assoberbado de hoje mais se interessa pela celeridade na desobstrução da pauta do que
alcançar a justiça desejada e devida. O enfado dos julgadores nas sustentações orais
atenta contra o incontestável direito do advogado de ser ouvido.

60. Vista de autos e aqueles impunemente surrupiados

Os cartórios estão incapacitados para o controle e vigilância do crescente volume de


autos. Nas áreas criminal e administrativas, muitos autos são furtados. Sabe-se de
esquemas criminosos organizados para surrupiar processos. Este autor já teve autos
"extraviados", quando formava "Carta de Adjudicação" de imóvel penhorado. Num
processo, este autor teve falsificada sua assinatura em guia de levantamento e
abocanhado alto valor depositado. Numa Subprefeitura de São Paulo, após a anulação
de multa administrativa ilegal, de propósito extorsivo, o processo "sumiu". Em nenhum
caso o culpado foi identificado. O crime e a impunidade compensaram! O número de
advogados e estagiários elevou-se acima da conveniência. Baixada a qualidade do ensino
jurídico, alheios os advogados das normas éticas - é justificável que o manuseio dos
autos ficou mais vulnerável, a exigir regras mais severas. Advogados idôneos vêm
pagando pela degradação dos princípios éticos de outros maus. A defesa dos direitos e
das prerrogativas vem sofrendo o enfraquecimento das suas justas razões pelos maus
exemplos cometidos por advogados despreparados.

61. Direitos e prerrogativas nas CPI do Congresso

Escrevemos na Revista do IASP (jan.-jun. 2000) artigo sobre a inviolabilidade dos


escritórios de advocacia. Inspirou-o, então, o desnecessário destrato de que foram alvos
advogados atuantes nas CPIs do Congresso Nacional. Foram momentos televisionados
em âmbito nacional e que sensibilizaram os advogados de todo o país. O STF, em
decisão na ocasião, (MS 23.576, Min. Celso de Mello) concluiu: "A Comissão Parlamentar
de inquérito, como qualquer órgão de Estado, não pode, sob pena de grave transgressão
à Constituição e às leis da República, impedir, dificultar ou frustrar o exercício, pelo
advogado, das prerrogativas da Lei 8.906/94". A Portaria 1.288 do MJ veda a busca e a
apreensão de coisas e documentos, quando o advogado estiver praticando "atos
inerentes a exercício regular da atividade profissional do advogado"; ou não possuir a
reação "fundados indícios". Tais condições são, porém, demais vagas e elásticas, sujeitas
à forjação da verdade. A criminalização da violação de direitos e de prerrogativas do
advogado, entretanto, exige cautela, porque pode estimular a criação de privilégios
profissionais odiosos.

62. Diversidade de especialidades e a célere evolução

A advocacia está também submetida à dinâmica social e tecnológica, com a


diversificação das especialidades, que lhe impõem, sem alternativa, a adoção de novos
instrumentos de atuação. A advocacia de antanho consistia de uma sóbria banca, com
advogados solitários, e a limitação das especialidades clássicas de direito civil, de
família, comercial e criminal. Os conflitos jurídicos eram definidos no contencioso ou na
composição, cuja preliminar se limitava a um amparo consultivo. Com a instituição das
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

quase 60 novas especialidades, o advogado se desponta como o profissional mais


requisitado, para manejar os novos instrumentos, voltados à desejada segurança jurídica
do cidadão. A sua sensibilidade aguçada pelo contato com temas legais, sociais,
políticos, humanísticos qualificam-no, com esta visão grande angular, para integrar
órgãos legislativos, administrativos, políticos de todos os níveis jurisdicionais da
conciliação e arbitragem, e dos demais que carecem de uma assistência profícua com
maior discernimento da realidade.

63. Integração em sociedades de advogados

A advocacia adquiriu estatura de uma atividade mais complexa e às vezes, mais


onerosa, quando passou a atuar na forma de sociedades (mais de 8 mil na OAB/SP), e
se envolveu no mecanismo da globalização das relações econômicas e culturais. Há duas
décadas já pressentíamos a desfiguração das sociedades, expostas ao aliciamento de
atividades não advocatícias. Nasceu daí a proposta de o art. 16 do Estatuto dispor sobre
a redação de as sociedades não apresentarem "forma ou características mercantis", ou
realizarem "atividades estranhas à advocacia, que inclua sócio não inscrito como
advogado ou totalmente proibido de advogar". Nos bastidores, advogados estrangeiros,
impedidos de advogar no Brasil, passaram a integrar sociedades de advogados
brasileiros, como "consultores" em direito estrangeiro, ou, à sombra do anonimato,
como azeitadores das engrenagens de negócios rentáveis, alguns nebulosos, ao arrepio
das severas restrições estabelecidas no art. 15 do EOAB (LGL\1994\58). Os advogados
"peixinhos" morreram na praia!

64. Direito ou dever de recusa de patrocínio profissional

Dentre os louváveis direitos do advogado destaca-se aquele que lhe assegura o de


recusar-se ao patrocínio de uma causa ilegal ou temerária. O EOAB (LGL\1994\58)
considera infração disciplinar "advogar contra literal disposição de lei" (art. 34, VI). O
CED, por sua vez, considera dever do advogado "aconselhar o cliente a não ingressar em
aventura judicial" (art. 2.º, par. único, VII). O advogado não deve negar ao cliente
criminalmente acusado a assistência jurídica pleiteada; o seu dever aí é o de
resguardar-lhe o direito de a lei ser aplicada dentro das suas justas limitações. O EOAB
(LGL\1994\58) quer alertar para a infringência consciente e com má-fé do advogado que
busque, com seu patrocínio, proveito indevido ou abusivo. Será escusável, porém, o erro
involuntário ou fruto da inexperiência profissional. A escusabilidade haverá quando
razões convincentes denunciarem a inconstitucionalidade da lei ou da sua injustiça. O
direito de recusar a causa contrária à lei ou de lutar contra a lei injusta muito
engrandece a advocacia. Constitui notável contribuição para o fortalecimento do Estado
de Direito.

65. O direito assegurado de retirada do recinto

O EOAB (LGL\1994\58) dispõe que o advogado pode "retirar-se do recinto onde se


encontre aguardando pregão para ato judicial, após trinta minutos do horário designado
e ao qual ainda não tenha comparecido a autoridade que deva presidir a ele, mediante
comunicação protocolizada em Juízo". O objetivo é garantir o respeito que os advogados
merecem em relação aos seus compromissos profissionais e pessoais. As leis processuais
são rigorosas quanto a prazos, cominando, na perda deles, efeitos até ruinosos, como os
da revelia, da preclusão, da prescrição e da deserção de recursos. Este rigor
determinado por lei não tem sido observado pelos magistrados. Os advogados têm
preferido digerir em silêncio a sua contrariedade pelos atrasos ou morosidade dos
magistrados, invés de desafiá-los com a reprimenda. Esta mesma a que se expõe o
advogado quando ousa a retirar-se do ato judicial. Essa ousadia pode custar uma
represália na decisão, ou o retardamento, em seu prejuízo, no trâmite do feito ou de
algum pedido. A ausência do magistrado há de ser do recinto, porque se presente o
atraso pode ter razões justas. Interesses pessoais de Juízes soem acarretar a
concentração de muitos atos em curto expediente e o conseqüente atraso e
congestionamento na tramitação.
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

66. Símbolos oficiais da OAB

O EOAB (LGL\1994\58) prevê no art. 7.º, XVIII, que constitui direito do advogado "usar
os símbolos privativos da profissão de advogados". São expressões muito vagas. Em
1992, em face do fenômeno publicitário desenvolvido, com suas virtudes e excessos, o
Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP, aprovou nossa proposta da Resolução 2/92,
sobre publicidade do advogado, pioneira no assunto. Dispõe o art. 4.º: "O anúncio, não
deve conter, figuras, desenhos, ou símbolos incompatíveis com a sobriedade da
advocacia, exceto, da balança como símbolo da justiça, sendo proibido o uso do símbolo
oficial da nação e os que sejam utilizados pela Ordem dos Advogados do Brasil". A
distinção entre símbolos dos advogados e símbolos oficiais é relevante para evitar que
sejam utilizados indevidamente, como vinha ocorrendo, com objetivos promocionais e
sem o devido escrúpulo. A aguerrida competição no mercado de trabalho advocatício
contribuiu para estimular a constituição de sociedades de advogados. Toda concorrência
se desenvolve, por natureza, no processo publicitário. Para evitar os excessos, sobretudo
por sua mercantilização, normas éticas e disciplinares são estabelecidas.

67. Os direitos e as prerrogativas na arbitragem

As normas e princípios éticos exigíveis na conduta do advogado são-lhe igualmente


impostos quando ele compõe, na arbitragem, um quadro de árbitros. O advogado está,
pois, também na arbitragem, ao abrigo dos direitos e das prerrogativas legais
estatutárias. Destaque-se o direito do sigilo, da independência técnica, da rigorosa
eqüidistância e imparcialidade. O advogado como árbitro continua fiel ao disposto no art.
3.º do CED, isto é, "ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as
desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para
garantir a igualdade de todos". O advogado é um profissional que convém que integre
quadros de árbitros nos órgãos de arbitragem, porque vale como fator de equilíbrio dos
interesses em conflito. Ele há de melhor aquilatar o cumprimento das formalidades e
garantir a legitimidade e eficácia das sentenças arbitrais. A arbitragem, como moderno
instrumento de pacificação jurídica, deve ter a idoneidade, transparência e a reputação
pela postura ética dos advogados que a compõem.

68. Defensoria Pública da União

A LC 80/1994 organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos


Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados. Está incumbida
de prestar assistência jurídica aos necessitados. Dentre as garantias e prerrogativas
destacam-se a independência funcional, a irredutibilidade de vencimentos e a
estabilidade. Como prerrogativas, a de receber intimação pessoal em qualquer processo,
usufruir de prazo em dobro, não ser preso, senão por ordem judicial escrita, salvo em
flagrante delito; comunicar-se sempre com seus assistidos, ainda que presos e
incomunicáveis; representar a parte sem mandado, salvo se necessário poderes
especiais; ser ouvido como testemunha mediante ajuste prévio com a autoridade
competente; requisitar perante qualquer órgão público informações, verbais ou escritas,
necessárias ao exercício de suas atribuições e ter o mesmo tratamento reservado aos
magistrados.

69. Advocacia Geral da União: deveres, proibições e impedimentos

Os advogados da Advocacia Geral da União sofrem várias limitações, como: I - as


proibições decorrentes do exercício de cargo público; II - não advogar além das
atribuições institucionais; III - vedado divergir de súmula, parecer normativo ou
orientação técnica do Advogado-Geral da União; IV - divulgar manifestações sobre
assunto de suas funções, salvo autorização do Advogado-Geral da União; V - vedação de
interferir, judicial ou administrativamente, em processo em que sejam partes, ou
tenham atuado como advogado ou parte ou envolva interesses de parente consangüíneo
ou afim até 2.º grau, cônjuge ou companheiro; VI - devem dar-se por impedidos quando
tiverem proferido parecer favorável a uma parte adversa em Juízo. O EOAB
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

(LGL\1994\58), no art. 3.º, § 1.º, dispõe que se sujeitam ao seu regime os integrantes
da AGU, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias
e Consultores Jurídicos dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e das respectivas
entidades de administração indireta e fundacional.

70. Defensor Público e os honorários advocatícios

A LC 80/1994 dispõe também (arts. 124 e ss.) sobre os direitos, garantias e


prerrogativas dos membros das Defensorias Públicas dos Estados, estendendo-lhes
aquelas do item anterior. Sobre "as proibições" consta a de não "receber, a qualquer
título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens, ou custas processuais, em
razão de sua profissão". Ocorre que a justiça concede honorários se vencedor o Poder
Público. O EOAB (LGL\1994\58), no art. 23, dispõe que os honorários pertencem ao
advogado, tendo o direito autônomo de executá-los nos próprios autos. O EOAB
(LGL\1994\58) acrescenta, no art. 24, § 3.º, que "é nula qualquer disposição, cláusula,
regulamento, ou convenção, individual ou coletiva que retire do advogado o direito ao
recebimento dos honorários de sucumbência". Este dispositivo foi julgado
inconstitucional pela ADIn 1.794-4 do Plenário do STF em 24.08.2005. O tema parece
complicado!

71. Sanção inconstitucional na inadimplência

O EOAB (LGL\1994\58) dispõe, no art. 34, XXIII, que constitui infração disciplinar
"deixar de pagar as contribuições, multas e preços de serviços devidos à OAB, depois de
regularmente notificado a fazê-lo". O art. 37, § 2.º, inclui tal infração naquela da
suspensão do exercício profissional, que perdurará até que a dívida seja satisfeita. Esta
grave sanção pode acarretar a exclusão do advogado da OAB se assim decidir dois
terços do Conselho Seccional. Em face do princípio constitucional assecuratório da
liberdade profissional, tal sanção tem a eiva de inconstitucional. As referidas sanções
devem ser consideradas como de política administrativa. Os débitos tornam-se, por isso,
sujeitos naturalmente à cobrança judicial. Este já é o entendimento definido pelo STF. A
inconstitucionalidade submete-se ao controle difuso, através de Mandado de Segurança.
Esta sanção estatutária é incompatível com os fundamentos e a estatura moral da OAB,
e conflita com a ordem constitucional estabelecida.

72. A cognominada "Lista Negra" da OAB-SP

O Procurador Geral de Justiça de São Paulo e o presidente da OAB-SP digladiaram em


face da rumorosa "Lista Negra", porque o Procurador cognominou-a de "Fascista". A "
Lista" consiste de uma publicação, no Diário Oficial, dos desagravos e moções de repúdio
contra certas autoridades, que teriam desrespeitado direitos e prerrogativas dos
advogados no exercício da profissão. Os desrespeitos consistiram, entre outros casos, de
grampos e interceptação de comunicações, invasão de escritórios de advocacia,
buscando documentos sigilosos de clientes. O presidente do Conselho Federal da OAB
considerou a afirmativa do Procurador como "bobagens". O presidente da OAB-RJ acusa
o Ministério Público de prática de "arbitrariedade e ilegalidades contra a advocacia;
chancelam operações policiais, alguma delas ao arrepio da lei". Arbitrariedades sempre
existiram, mas, não divulgadas, neutraliza-as um sentimento de imunidade. Publicada a
lista, ou "dando-se nomes aos bois", os culpados se irritaram, porque se viram em
público expostos de "calças curtas".

73. A "lista dos inimigos" e a previsão legal

Em debate público, a Folha de S.Paulo (23.02.2008) abriu a discussão sobre se "a


OAB-SP pode elaborar lista com nomes de supostos violadores de direitos dos
advogados". Embora a expressão "supostos" fosse inadequada, manifestaram-se o
procurador Rodrigo César Rabello Pinho e Luiz Flávio Borges D'Urso, Presidente da OAB.
O procurador insistiu na tese de que a "lista dos inimigos da advocacia é absolutamente
ilegal e inconstitucional". D'Urso, por sua vez, ressaltou que o desagravo é feito em
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

sessão pública, depois encaminhado em representação à Corregedoria respectiva. O


processo e o nome do agravante são publicados no Diário Oficial, tudo dentro das
previsões legais. E conclui D'Urso que "apenas dá publicidade aos desagravados e
moções de repúdio, para evidenciar que as legítimas prerrogativas profissionais dos
advogados não podem mais ser ignorados e constantemente violados, muitas vezes por
desconhecimento das próprias autoridades". Sabe-se que a instituição do desagravo
público tem previsão legal na lei do Estatuto da OAB (LGL\1994\58).

74. A OAB na defesa dos direitos e prerrogativas

A OAB tem uma Comissão de Direitos e Prerrogativas, que guarda uma "Lista Negra",
com cerca de duas centenas de nomes. Seriam dos estigmatizados por desrespeito aos
direitos e prerrogativas dos advogados. Esta pecha coloca-os sob o risco de terem
recusada, no futuro, a sua inscrição nos quadros da OAB. Entidades maiores, como a
Anamatra, o MP de SP, a Associação Nacional dos Procuradores da República, ADESP
repudiam a iniciativa. O Conselho Federal da OAB e a Vice-Presidente da Secional de São
Paulo reconhecem o aspecto admoestatório da "Lista Negra". Tem-na, porém, como
"uma advertência clara ao fato de que abusos e desmandos não podem ser tolerados".
Os atingidos pela discriminação da "Lista" alegam serem "vítimas de um dano moral,
além de atentatória das liberdades públicas e dos princípios do Estado de Direito".
Arrogantes malfeitores há que se esquecem da singela advertência popular: "nunca diga
que desta água não beberei!"

75. Órgãos judiciários e locais públicos. Direito de ingresso

Os advogados enfrentam, no exercício profissional, dificuldades impostas pelos entraves


burocráticos e discricionários, considerados como fatores de constrangimento
operacional. O direito de ingresso do advogado em salas de sessões dos tribunais, ou
dependências ou recintos ou de outro serviço público, é ainda desrespeitado por ordens
legalmente questionáveis, ao arrepio do art. 7.º do Estatuto da OAB (LGL\1994\58). A
livre comunicação com magistrados, agentes públicos e serventuários de justiça constitui
direito e prerrogativa fundamental, para observância do princípio constitucional da ampla
defesa do cliente. As prerrogativas estatutárias do livre acesso têm algumas limitações
justificáveis e necessárias à segurança material dos papéis e do sigilo processual.
Inegável que advogados desavisados incorrem em excessos, com que ultrapassam os
limites da boa convivência. Este mal acaba por repercutir negativamente contra todos os
advogados.

76. Desagravo público do advogado

A OAB tem o dever legal de desagravar publicamente o advogado quando ele for
ofendido no exercício da profissão. É um ato simbólico de solidariedade e de repulsa da
classe. Regula-o o Regimento Geral do EOAB (LGL\1994\58). A ofensa há de ser de
natureza exclusivamente profissional, apurada com prudência, aprovado pelo Conselho
competente, com base em parecer de um relator, realizado em sessão especial, ou em
ato de conhecimento público, ciente a ofensor e inscrito o ato nos assentamentos do
advogado ofendido. O local do ato deve ser o que melhor repercuta publicamente. No
desagravo do Conselho Seccional ou de seu membro diretor, em razão de ofensa grave,
comparecerão diretores do Conselho Federal, mormente quando houver repercussão
nacional. Casos há em que se faz cauteloso pedir informações prévias ao ofensor.
Comprovada a ofensa, o desagravo há de realizar-se independentemente da anuência do
ofendido, porque prevalece o interesse superior da defesa dos direitos e das
prerrogativas asseguradas ao advogado. O tempo entre o ato ofensivo e o desagravo
deve ter possível imediatidade, sob pena de esmaecer o efeito reparador a que se
destina.

77. O advogado, o consumidor e a ética

O exercício advocatício está também submetido, em vários aspectos, aos rigores do


Código de Defesa do Consumidor. A liberdade e a independência do exercício profissional
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

está condicionada ao cumprimento fiel dos deveres da habilidade técnico-profissional, da


irrepreensível postura ética, da honestidade intelectual e da vigilância dos interesses
públicos da justiça e do direito. A advocacia culposamente falha e lesiva não atinge os
objetivos desejados, e pode suscitar no constituinte o direito de exigir, sem ônus, se
possível, a repetição da execução do serviço, ou a restituição dos honorários pagos ou o
abatimento proporcional, sem prejuízo do ressarcimento por perdas e danos. Este
instituto jurídico em prol do consumidor constitui grave advertência aos advogados que
negligenciam na qualidade exigível dos serviços, ou estejam desatentos aos resultados
da sua atuação. O seu erro ou falha pode comprometer o patrimônio, bens e valores dos
seus constituintes.

78. Prerrogativas no processo penal

Os advogados criminais reclamam do desrespeito à Carta Magna (LGL\1988\3), quando


são impedidos de conhecer o inquérito policial que envolve o seu constituinte. Trata-se
de procedimento violador dos direitos e das prerrogativas profissionais, e de crime de
abuso de autoridade. O Estatuto da OAB (LGL\1994\58), no art. 7.º, assegura a
prerrogativa do advogado de examinar, em qualquer órgão público, autos do processo
findos ou em andamento, mesmo sem procuração, exceto os guardados do sigilo. Pode
também copiar peça e tomar apontamento, na repartição policial, de autos de flagrantes
e de inquérito, findos ou em andamento. Tais prerrogativas têm sido violadas por grande
número de autoridades, ora por ignorância da lei, ora por natural vocação à
arbitrariedade. O ambiente policial, em todo o mundo, cheira o mofo da venalidade.

79. Prerrogativas parlamentares e privilégios

Os direitos e as prerrogativas advocatícias, utilizados com escrúpulo, não são privilégios.


São condições democráticas do magistério profissional. As prerrogativas parlamentares
são exemplos de que tais regalias se justificam, porque indispensáveis às profissões
pelas quais se busca resolver ou pacificar choques ou conflitos, em que entram as
imperfeições da natureza humana. As prerrogativas equivalem, amiúde, a privilégios,
sem conotação pejorativa. Nas ciências sociais consubstanciam um direito legítimo e
especial, conferido a determinadas classes ou funções, sem as quais não lograriam
cumprir plenamente as suas atribuições. Em regra as prerrogativas ou privilégios
dependem da existência de normas jurídicas - como ocorre na advocacia - que regula o
modo pelo qual o direito e as reivindicações colidentes devem ou podem ser conciliados,
com maior eqüidade. As constituições dos países democráticos possuem disposições
relativas às imunidades parlamentares. Diz-se que a Constituição brasileira é a única que
prestigia o advogado, assegurando-lhe a inviolabilidade dos seus atos e manifestações.

80. Advogados, licitação para contratar

A doutrina predominante considera desrespeitosa às prerrogativas do advogado a


obrigatoriedade de licitação para sua contratação pelo Poder Público. Opinamos
pioneiramente sobre o assunto, quando no Tribunal de Ética e Disciplina da OAB de São
Paulo, no processo E-1062, em 1997, cujo texto integral consta da nossa obra Ética
profissional do advogado (São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003, p. 109). A ementa
dispõe: "Lei 8.666, 21 de junho de 1993, que regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
Constituição Federal (LGL\1988\3), institui normas para licitações e contratos da
Administração Pública. Inexigibilidade de licitação para contratação de advogado para
prestação de serviços de patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas.
Condição de comprovação hábil, em face da natureza singular dos serviços técnicos
necessitados. Trata-se de profissionais ou empresas de notória especialização. Critério
aceitável pela evidente inviolabilidade de competição licitatória. Pressuposto da
existência da necessária moralidade do agente público no ato discriminatório regular na
aferição da justa notoriedade concorrente. Inexistência, na lei mencionada, de criação de
hierarquia qualitativa dentro da categoria dos advogados. Inexistência de infringência
ética na fórmula legal licitatória de contratação de advogados pela Administração
Pública."
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

81. A fé Pública dos atos e manifestações do advogado

O ideal é que o advogado tenha assegurada, entre suas prerrogativas, fé pública nas
manifestações que fizer, ou nos documentos que assinar. O Código Civil (LGL\2002\400)
de 2002 fixou princípio simplificante (arts. 219, 221 e 223), pelo qual as cópias não
autenticadas presumem verdadeiras até que se alegue o contrário. Os advogados
passaram a ter fé pública relativa ao declararem a autenticidade de cópias de
documentos oriundos de processos, mediante a afirmação de que a cópia confere com o
original, com menção minuciosa donde provém. O CPC (LGL\1973\5) dispõe, no art.
364, sobre a força probante dos documentos, ou seja, sobre a fé pública que merecem
os documentos, provenientes do escrivão, tabelião, ou funcionário. O EOAB
(LGL\1994\58) dispõe, no art. 2.º, § 1.º, que "no seu ministério privado, o advogado
presta serviço público e exerce função social"; o § 2.º seguinte diz que os "seus atos
constituem munus público". O Código de Ética e Disciplina assevera que o advogado
subordina "a atividade do seu ministério privado à elevada função pública que exerce". O
ideal é que o advogado seja um profissional que tenha, em elevado grau, a credibilidade
irrestrita dos seus atos e manifestações.

82. Direitos e prerrogativas ameaçados

O presidente da OAB - Seccional de São Paulo, no seu artigo intitulado "Direitos de


defesa corre risco em todo o mundo" ( Folha de S. Paulo, 18.01.2008), denunciou que,
em vários países, tidos como democráticos, vêm sendo violados os direitos e
prerrogativas dos profissionais da advocacia, com a quebra do sigilo profissional e
invasões de escritórios. Trata-se de violências que se incompatibilizam com os princípios
em que se assentam os Estados de Direito. Os constrangimentos contra os direitos e as
prerrogativas dos advogados equivalem a um repúdio de direito constitucional à ampla
defesa e do contraditório, considerados fatores básicos dentre aqueles assecuratórios
das liberdades públicas. Os abusos contra os direitos e as prerrogativas tendem a se
agravar na medida em que sejam tolerados. A OAB tem sido atuante no plano
institucional, no enfrentamento dos excessos cometidos contra o advogado. Tem
promovido, no plano legislativo, a aprovação de projeto de lei sobre a criminalização das
violações dos direitos e das prerrogativas do advogado.

83. Nem todos fazem jus às prerrogativas e direitos

Os direitos e as prerrogativas assegurados aos advogados decorrem do pressuposto de


que os profissionais os estejam preparados técnica, científica e eticamente para o
exercício advocatício. Nem sempre, porém, o pressuposto se configura ou tem
credibilidade. Os "Exames de Ordem" são os termômetros avaliatórios dos fatos. O
despreparo tem tal evidência, que os conceitos tradicionais sobre ser o advogado um
cidadão culto, humanista, arquiteto e defensor das leis, esteio dos governos, padrão de
circunspecção profissional, entraram em declínio degenerativo. Chega-se à conclusão,
com tal diagnóstico, que existe correlação entre os padrões de qualidade de ensino
jurídico, com o grau de consciência ético-moral e da qualidade técnica e científica
atingida. Há, pois, direitos e prerrogativas cuja outorga é temerária a quem não esteja
preparado para usufruí-los. É nesta circunstância que a desejada sagacidade e
habilidades úteis do advogado passam a ser confundida, com ou sem má-fé, pelos maus
formados, como ardil, astúcia ou logro.

84. Valorização da advocacia é o objetivo destas reflexões

A preocupação fundamental destas reflexões, sobre direitos e prerrogativas, é a


premente necessidade da valorização da advocacia e o restabelecimento e preservação
da imagem da advocacia, como profissão honrada e respeitada pelas virtudes inerentes
da probidade, confidencialidade, idoneidade ética e técnica; inspirada nas tradições
humanísticas, com que foram concebidas no Estado de Direito, como salvaguarda das
liberdades e direitos fundamentais da pessoa e sustentáculo do direito e do justo. Todos
somos responsáveis pela manutenção deste sacerdotal propósito, cada um com seu
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Valorização da advocacia: direitos e prerrogativas do
advogado

feitio, verberando, denunciando, combatendo, julgando, punindo e adotada a dignidade


da advocacia e do Judiciário, como permanente prioridade. Constitui necessidade
histórica, como mandamento da cidadania, a conscientização de que o advogado é a
única força organizada e habilitada, capaz de garantir a toda sociedade, nos seus
multiformes aspectos, a segurança jurídica, a ordem e a paz sociais.

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