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ISSN 2317-3793 Volume 12 Número 1 (2023)

COMPORTAMENTO PÓS-CONSUMO: UMA ANÁLISE DOS FATORES


DETERMINANTES DO ARREPENDIMENTO

POST-CONSUMER BEHAVIOR: AN ANALYSIS OF THE DETERMINING FACTORS


OF REPENTANCE
Islaine Isis Nunes Brito1
Almiralva Ferraz Gomes 2
Gardênia Tereza Jardim Pereira3

RESUMO
O ato de consumir é intrínseco a cada ser humano. Com ele, os indivíduos buscam satisfazer as suas necessidades, bem como
os seus desejos. Porém, em algumas ocasiões, ocorrem insatisfações e até arrependimentos referentes aos itens adquiridos e
o seu posterior consumo. Tais sentimentos negativos podem ser motivados pelas compras por impulso e/ou sem necessidade.
Os conceitos de insatisfação e arrependimento se confundem, mas não se sobrepõem, assim, são distintos. Tomando como
base os tipos de arrependimentos nomeados e descritos por Nicolao (2002), este artigo buscou analisar os fatores
determinantes do arrependimento do consumidor, após a realização de uma compra. De natureza empírica e do tipo descritivo-
exploratório, adotou-se o levantamento como técnica de pesquisa. Foram coletados dados em campo, através de 186
questionários válidos, que foram distribuídos em meio físico e eletrônico a potenciais consumidores, por meio de
acessibilidade. Os dados coletados receberam tratamento quantitativo. Os resultados revelaram a presença da insatisfação e
do arrependimento no processo de pós-consumo. Boa parte dos indivíduos que participou da presente pesquisa experimentou,
em algum momento da vida, sentimentos negativos após o ato de consumo, quando ultrapassaram a etapa da compra
propriamente dita e cruzaram a linha do consumo do produto ou serviço. O estudo revelou que o público pesquisado se
enquadra nos quatro tipos de arrependimentos elencados por Nicolao (2002). Por fim, verificou-se a necessidade de estudos
mais aprofundados acerca do tema, inclusive considerando a interferência de heurísticas que afetam o subconsciente humano
e interferem, consideravelmente, no processo decisório.
Palavras-Chave: Arrependimento. Insatisfação. Pós-consumo. Processo decisório.

ABSTRACT
The act of consuming is intrinsic to every human being. With it, individuals seek to satisfy their needs, as well as their desires.
However, on some occasions, there are dissatisfactions and even regrets regarding the items purchased and their subsequent
consumption. Such negative feelings can be motivated by impulse purchases and/or without future needs. The concepts of
dissatisfaction and regret are confused, but do not overlap, thus remaining distinct. Based on the types of regrets named and
described by Nicolao (2002), this article sought to analyze the determinants of consumer regret after making a purchase.
Empirical and descriptive-exploratory, the survey was adopted as a research technique. Field data were collected through 186
valid questionnaires, which were distributed in physical and electronic media to potential consumers, through accessibility.
The collected data received quantitative treatment. The results revealed the presence of dissatisfaction and regret in the post-
consumption process. A good part of the individuals who participated in this research experienced, at some point in their
lives, negative feelings after the act of consumption, when the purchase step itself is crossed and the product consumption
line is crossed. The study revealed that the public surveyed falls into the four types of regrets listed by Nicolao (2002). Finally,
there was a need for more in-depth studies on the topic, including considering the interference of heuristics that affect the
human subconscious and considerably interfere in the decision-making process.
Keywords: Post-consumption. Repentance. Satisfaction. Decision making. Dissatisfaction.

1
Graduanda em Administração pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Av. Pará, nº 128. Bairro Ibirapuera.
Vitória da Conquista - BA. isis.britto93@gmail.com - (77) 9 8832-2253.
2
Doutora em Administração (UFLA). Professora Titular do Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Área: Administração. Rua Macário Novais Figueira, nº 11. Bairro Candeias.
Vitória da Conquista - BA. almiralva@gmail.com - (77) 9 8822-2551.
3
Graduada em Administração e Turismo. Mestre em Cultura e Turismo (UESC). Professora substituta na Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia e da UniFTC. Quinta avenida, nº 690 Condomínio Cidade das Flores. Bairro Boa Vista.
Vitória da Conquista - BA. gardeniapereira@uesb.edu.br – (77) 9 9166-9208.
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INTRODUÇÃO

O mundo em que vivemos e conhecemos, hodiernamente, é dominado pelo sistema capitalista e


norteado pelo consumo. Conforme a sociedade foi evoluindo, fez-se necessário criar algo mais complexo
e estável para controlar as relações comerciais. Em outras palavras, à medida em que o mundo foi se
desenvolvendo e se modernizando, houve o surgimento do capitalismo que, por sua vez, tornou-se
gradativamente mais global até que se chegasse à concepção de globalização que experimentamos hoje.
Com a necessidade de vender mais e ganhar espaço em mercados globalizados, as empresas se
atentaram à prática das técnicas de marketing. Segundo Faria (2009), o marketing tornou-se, inclusive,
uma das áreas da Administração mais relacionadas ao advento da era da globalização. Criado com o
intuito de auxiliar as organizações, na função ininterrupta de acumular cada vez mais capital, o marketing
sofreu evoluções no decorrer dos anos. Conforme o seu desenvolvimento vem se consumando no
mercado, os olhos de seus profissionais, responsáveis pela tarefa de promover o produto/serviço, mudam
de direção. O foco dos esforços em prol dessa impulsão perpassou pelo produto, pelo cliente, pela
geração de valor para a empresa e vem sondando o meio tecnológico, alastrando-se no mundo digital.
Um dos pontos em que os estudiosos do marketing centralizam seus esforços é o cliente. Eles
estudam suas necessidades e desejos e até provocam a criação de novos sentimentos internalizados nos
potenciais fregueses para estimular o consumo. Porém, o processo decisório desse consumidor nem
sempre é afetado pelas pressões impostas pelo mercado. Existe um passo a passo a ser seguido na hora
da compra que pode ser influenciado por gatilhos mentais de ordem psicológica. A decisão de compra
começa, em tese, pelo reconhecimento da necessidade, busca de informação, avaliação de alternativas
pré-compra, compra, consumo, avaliação pós-consumo e, por fim, descarte (BLACKWELL; MINARDI;
ENGEL, 2005 apud ENDO; ROQUE, 2017). No entanto, uma das fases de compra que recebe menos
atenção nos estudos é o pós-consumo, quando o indivíduo supera todas as fases da decisão de compra e
encontra-se no estágio de julgamento da aquisição.
O cliente desenvolve um relacionamento com o produto e/ou marca, que geram percepções
posteriores que determinarão sua próxima prática. Tais concepções têm caráter positivo, quando o cliente
se sente contemplado com o desempenho do produto/serviço e, por conseguinte, tende a se sentir
satisfeito e fiel à marca, ou negativo, quando o cliente se decepciona com a performance do item
comprado e se vê arrependido e/ou insatisfeito com a marca.
Este artigo objetiva analisar os fatores determinantes do arrependimento do consumidor, após a
realização de uma compra. Para tanto, após a introdução, o artigo revisa a literatura que trata de processo
decisório e comportamento do consumidor, bem como discorre sobre estudos que abordam o
arrependimento e a insatisfação. Após a apresentação dos procedimentos metodológicos adotados para
o desenvolvimento da pesquisa, analisam-se os dados coletados em campo à luz do referencial teórico.
Por fim, o artigo conclui com suas considerações finais a respeito da pesquisa.
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PROCESSO DECISÓRIO

O processo de tomada de decisões está presente cotidianamente na vida das pessoas. Tais
escolhas variam desde as mais simples e corriqueiras às mais complexas, como a escolha da carreira
profissional. No entanto, essas decisões são essenciais ao comportamento humano. A palavra decisão é
de origem latina. O prefixo “de” significa parar, interromper e o sufixo “cisão” significa cortar, ou seja,
“parar de cortar” ou “deixar fluir”, o que, em síntese, expressa a eliminação das opções restantes e a
escolha mais satisfatória no momento (GOMES, 2002). De acordo com Andrade e Amboni (2010, p.
201), “a tomada de decisão envolve a seleção de um curso de ação dentre duas ou mais alternativas, a
fim de se alcançar uma solução para um dado problema”. A opção escolhida pode, além de resolver o
problema, alavancar uma oportunidade.
O indivíduo desenvolve a habilidade de resolver seus problemas com base em decisões
fundamentadas em combinações de desejos, necessidades, crenças e diversos outros valores cognitivos.
Segundo Angelo e Luppe (2010), tomada de decisão se refere ao processo completo da escolha de um
curso de ação. Assim, o julgamento que é realizado no processo e na tomada de decisão, propriamente
dito, envolve fatores cognitivos pelos quais o indivíduo é capaz de reunir, estimar e eleger a possibilidade
que melhor se encaixa dentre as opções disponíveis (STERNBERG, 2010). Para melhor estruturar as
decisões, Kotler e Armstrong (1995) identificaram uma sequência de cinco etapas: (1) o reconhecimento
do problema; (2) a busca de informações; (3) a avaliação das alternativas; (4) a decisão de compra e; (5)
o comportamento pós-compra.
A primeira etapa, reconhecimento do problema, origina-se a partir da identificação de uma
necessidade ou um problema a ser solucionado e quando há o estímulo do meio externo, exercido por
esforços de marketing ou por fatores sociais e culturais. A segunda etapa é a busca por informações que
se caracteriza pelo esforço do consumidor em agrupar o máximo possível de informações necessárias
para realizar a escolha. A terceira fase, avaliação das alternativas, ocorre quando há o julgamento das
opções e a eleição da melhor alternativa possível diante de determinada situação. A quarta fase, decisão
de compra, acontece quando, a partir da análise dos fatores levantados anteriormente, a intenção de
compra pode ser consumada ou alterada, porém, a compra é efetivada e há, então, o consumo do produto.
A última, mas não menos importante, é a fase do comportamento pós-compra, na qual há o consumo do
produto/serviço, bem como o julgamento das expectativas empregadas sobre o bem (KOTLER;
ARMSTRONG, 1995; LAS CASAS, 2008). É nessa etapa que o consumidor decidirá se o produto
alcançou suas expectativas, despertando-lhe o sentimento de satisfação, ou se foi capaz de ativar o
comportamento de arrependimento, considerando a escolha feita diante das opções preteridas.
Considerando tais etapas e baseando-se na racionalidade, em uma sociedade conduzida por
valores capitalistas, o indivíduo ultrapassa a barreira do ser social e atinge o patamar de consumidor.
Esse consumidor apresenta comportamentos distintos de um ser que vive em comunidade, passa a tomar
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decisões visando a opção que agrega maior valor esperado e usa, acima de tudo, a ferramenta da razão.
“Uma vez que a palavra razão dificilmente poderia ser posta de lado, por força de seu caráter central na
vida humana, a sociedade moderna tornou-a compatível com sua estrutura normativa” (GUERREIRO
RAMOS, 1989, p. 3). Porém, estudiosos defendem a ideia de que os indivíduos possuem a racionalidade
limitada. De acordo com Fernandes (2010), os primeiros estudos sobre a temática foram realizados por
Hebert Simon, na década de 1940, que defendeu a limitação cognitiva. Fernandes (2010), a partir do
ponto de vista de Simon, comparou as preocupações retratadas pelas racionalidades limitada e
substantiva. A última atenta-se para o melhor desempenho possível, a melhor execução da meta
estabelecida, atingindo a excelência em sua atuação. A primeira é metódica, atenta-se aos processos para
encontrar ações acertadas, considerando também a meta estabelecida, o objetivo, as propriedades do
aprendizado e de apuração e as limitações do agente da decisão.

COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR

Compreender a fundo o significado do comportamento do consumidor é um processo que exige


calma e persistência, além de uma dose de detalhismo. Os conceitos mais adotados nas pesquisas
perpassam dos mais simples aos mais complexos. De acordo com Ferreira e Carvalho (2010), o
comportamento do consumidor é o estudo de como pessoas, comunidades e instituições procuram
satisfazer suas necessidades e desejos, por meio da seleção, compra, uso e descarte de bens, serviços,
ideias ou experiências. Embora o comportamento do consumidor seja “uma atividade mental e física
realizada por consumidores domésticos e comerciais, que resulta em decisões e ações de comprar, pagar
e usar produtos” (FERREIRA; CARVALHO, 2010, p. 145), tal definição suscinta requer um estudo
complexo para se atingir algum resultado.

Comportamento do consumidor é uma matéria interdisciplinar de marketing que lida com


diversas áreas do conhecimento, como Economia, Psicologia, Antropologia, Sociologia e
Comunicação. O objetivo é estudar as influências e as características do comprador [...] O
processo de entendimento do consumidor não é uma tarefa fácil para os administradores. Os
clientes são as pessoas que sofrem muitas influências, todas ao mesmo tempo. Procurar estudá-
las fica muito difícil, pois enquanto se conhece um lado, o outro está mudando (LAS CASAS,
2008, p. 181).

Para Las Casas (2008), o comportamento do consumidor é, então, instável. Ademais, não é
possível uma definição dogmática acerca do assunto. Tal oscilação resulta numa maior dificuldade de se
estudar os hábitos dos atuais e potenciais clientes de uma determinada empresa. Além das características
e influências do e no comportamento do consumidor, estudos têm voltado sua atenção para a
conscientização que se desenvolve nos consumidores atuais, que não gastam mais seus recursos -
financeiros, tempo e esforços - de qualquer maneira. Na Era da Informação, sua captura tornou-se mais
acessível e instantânea, graças à disseminação da internet, que possibilitou maior agilidade e
conhecimento anterior à decisão de compra. Segundo Marquetto (2015, p. 25), “o consumidor do século
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XXI é mais consciente do seu papel como agente transformador da qualidade das relações de consumo
e como influenciador no comportamento de empresas e instituições”.
Conforme Frazão e Kepler (2013 apud MARQUETTO, 2015), o consumidor mudou
consideravelmente após o advento da internet e das transações online. Antes, os vendedores tinham que
conquistar seus clientes e entregar as informações relativas aos produtos, agora, o moderno consumidor
tem acesso à informação, tem autonomia e revolucionou a maneira de comprar e fazer negócios. Como
consequência dessa nova Era, o poder de barganha dos clientes, proposto por Michael Porter (2004), ao
descrever as cinco forças2 capazes de gerar vantagem competitiva, faz parte da realidade das negociações
contemporâneas. Porém, desenvolver estudos a respeito dessa temática não é tarefa fácil. Os
profissionais de Administração precisam buscar conhecimento nos demais campos de estudo e unir
forças para produzir conteúdos relevantes e efetivos.
Já que o comportamento do consumidor é mutável e ele se mostra cada vez mais exigente, a
presente investigação ganha importância e depara-se com lacunas na produção científica que tratem da
orientação para o valor, que considerem a relação custo e benefício e a facilidade de se buscar
informações precisas e confiáveis para subsidiar o processo decisório.

PÓS-CONSUMO E ARREPENDIMENTO

O comportamento pós-compra ou pós-consumo é tão relevante quanto a compra propriamente


dita. É nessa fase do processo de decisão que o consumidor manifesta as reações de satisfação ou
arrependimento à marca. O profissional de marketing deve ficar atento às reações resultantes da compra,
pois delas dependem a fidelização ou o boca a boca negativo acerca do produto escolhido. A imagem da
empresa perante os demais consumidores pode então ser impactada, desencadeando uma reação em
cadeia de cunho positivo ou negativo.
Após a aquisição do bem, os consumidores tendem a atravessar um período de dúvida: a decisão
tomada foi realmente a melhor dentre as opções disponíveis? Assim, esse momento de indecisão é
chamado de dissonância cognitiva, ou seja, um estado desagradável que tenciona dois pensamentos
opostos. De acordo com Festinger (1957 apud NICOLAO, 2002) e Cobra (2003), após a compra, duas
cognições se encontram em dissonância: a ideia da possível assertividade na decisão tomada de fato e a
ideia de que a opção selecionada pode não ter sido a melhor.
Para Assmar, Jablonski e Rodrigues (2009), há uma diferença entre conflito e dissonância. O
primeiro ocorre na fase da pré-compra, na qual há uma avaliação das opções sem nenhuma
predisposição. Ademais, ocorre de forma objetiva. Já a segunda acontece na fase posterior à decisão e

2
As Cinco forças de Porter, conhecidas no campo da Administração, incluem os concorrentes, os produtos substitutos, os
novos entrantes, o poder de barganha dos fornecedores e dos clientes. Nesse caso, o poder de barganha dos clientes se
evidencializa por lhes dar autonomia, no momento da negociação. Assim, é permitido maior poder de escolha e decisão.
Ninguém antes se apossou tanto dessa força, quanto os novos consumidores (PORTER, 2004).
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há a supervalorização dos elementos que agregam valor à escolha realizada. Nessa etapa, o indivíduo
ainda rejeita o que for veiculado a favor da opção preterida. Para se ver livre do pensamento dissonante,
o consumidor procura informações que o faz confirmar ou rejeitar sua decisão. Uma vez que tem aversão
de confirmar sua má escolha, sentindo-se estúpido perante os outros, aceita apenas informações que
afirmam a alternativa eleita, capturando razões para reforçar sua decisão.
As expectativas atribuídas ao ato de comprar são acumuladas à medida que se adquire
informações acerca do objeto ou serviço em questão. Tais referências são fornecidas pelos próprios
vendedores, por parentes ou amigos e ainda por meio de outras fontes de busca. Quando o processo de
decisão chega ao fim, inicia-se o momento de avaliação: o desempenho percebido corresponde às
perspectivas pré-estabelecidas? De que forma? Conforme Kotller e Armstrong (1995, p. 110), “se o
produto não atender às expectativas, o consumidor ficará desapontado; se satisfazer as expectativas ele
ficará satisfeito; se exceder as expectativas ele ficará encantado”.
Existem alguns estudos, presentes nos campos da Administração e da Psicologia, que retratam
os comportamentos variantes da experiência pós-compra (NICOLAO, 2002; INMAN; ZEELENBERG,
2002; GILOVICH; MEDVEC; KAHNEMAN, 1998; LELAND, 1998; GILOVICH, T.; MEDVEC,
1995). Dentro do grupo de reações possivelmente desempenhadas pelos clientes, estão a satisfação, a
insatisfação e o arrependimento. Portanto, em consequência desses sentimentos, pode-se ocorrer
comportamentos de lealdade à marca, elogios, recomendações, ou ainda, reclamação, boca a boca
negativo e o abandono de produtos veiculados àquela empresa.
A satisfação costuma ser o centro das atenções no que diz respeito aos estudos acerca da etapa
pós-compra. Porém, não existe apenas uma possibilidade de reação após a experimentação de um bem
ou serviço. Pouco se discute o sentimento de arrependimento. As investigações restringem-se à
satisfação e à insatisfação do cliente. Há poucos estudos acerca do tema, o que reforça a importância da
presente pesquisa.
Há diferenças entre arrependimento e insatisfação. De acordo com Nicolao (2002), o instrumento
que leva o consumidor à frustração em relação a sua escolha, constituindo a insatisfação, aponta
referenciais internos, uma vez que são fundamentados nas expectativas depositadas pelo sujeito em
relação à compra. Já no que diz respeito ao arrependimento, o referencial é externo, pois analisa o
desempenho dos outros produtos que compõem a lista das opções preteridas. Portanto, conforme a
(in)satisfação limita-se no julgamento do produto utilizado, o arrependimento volta-se ao processo
decisório do produto em questão (NICOLAO, 2002).
De acordo com Oliver (1997), o arrependimento é definido como um evento que acontece quando
há chance de que alguma coisa mais favorável pudesse ter ocorrido. É possível, ainda, que o comprador
esteja satisfeito, pois o resultado de sua compra supre suas necessidades, porém, arrependido por não ter
realizado uma escolha que teria um desempenho diferenciado.
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Tal pesar pode ser considerado uma emoção racionalizada, pois houve um julgamento para se
chegar a conclusão desse constructo. Assim, aspectos cognitivos e afetivos são dispostos nesse processo.
Os aspectos cognitivos do arrependimento envolvem, resumidamente, um estado psicológico induzido,
em que há comparação entre o desempenho dos produtos escolhidos e preteridos, ou ainda, entre o
desempenho do produto adquirido e a possível performance experimentada, no caso de a escolha ter sido
outra. Nesse momento, o sujeito não obtém a informação e não sabe se outro produto lhe agradaria, pois
apenas imagina tal possibilidade, por isso, “[...] o mecanismo cognitivo que nos permite fazer essas
comparações entre o desempenho de uma opção escolhida e os possíveis desempenhos de outras opções
chama-se pensamento contrafatual” (NICOLAO, 2002, p. 4, grifo do autor). Tal pensamento compara
o fato propriamente dito com a possibilidade de uma outra opção, ou seja, confronta a compra realizada
com a imaginação do provável desempenho de um produto preterido. Ademais, “além da reflexão sobre
o que poderia ter acontecido, pensamentos contrafatuais podem gerar fantasias sobre o que poderá
acontecer no futuro” (NICOLAO, 2002, p. 4).
Nicolao (2002) se debruçou sobre o constructo do arrependimento, analisou os sentimentos
relacionados a seus diferentes tipos e, assim, pôde classificá-lo em quatro categorias: (1) arrependimento
sem alternativas; (2) arrependimento sem alternativas e disparado pela insatisfação; (3) arrependimento
com alternativa e com insatisfação e; (4) arrependimento com alternativa e com satisfação. Além disso,
baseou-se em um par de grupo condicionais: a ausência, ou não, de alternativas no ato da compra e a
incidência de satisfação ou insatisfação.
O primeiro tipo é o arrependimento sem alternativas, que se refere às compras por impulso. Nesse
caso, o único caminho possível seria deixar de realizar a compra, sem a opção de troca do produto. Aqui,
o desempenho do bem adquirido não influencia o desapontamento e se torna irrelevante. O que possui
um peso maior é a decisão de compra especificamente. Os motivos que levam esse tipo de consumidor
a se arrepender são a culpa por uma ação errônea, auto recriminando-se, e a aquisição de algo que não
necessitava naquele momento.
O segundo tipo recebe o nome de arrependimento sem alternativas e é disparado pela insatisfação.
Esse é uma derivação do primeiro caso. Aqui, a performance do produto já se encontra em análise,
alcançando um nível inferior ao previsto e atingindo a insatisfação. Com tal desagrado, o cliente
demonstra um comportamento de troca e reclamação do produto. Além disso, ele se sente lesado e no
direito de dividir a culpa de sua má decisão com o fornecedor.
Já o terceiro tipo classifica-se em arrependimento com alternativa e com insatisfação. Nesse caso,
o consumidor se decide entre as opções disponíveis e, mesmo assim, convive com a insatisfação. Ou
seja, constata que o funcionamento do produto adquirido está abaixo das expectativas alimentadas antes
da compra e que outras alternativas poderiam ter desempenho melhor. Assim, o julgamento pós-compra
é tomado pela insatisfação. Em relação a distribuição de responsabilidade, o sujeito a atribui ao provedor
do produto, deslocando a culpa para um fator externo, enumerando o mau atendimento e colocando em
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xeque a qualidade do serviço. Por conseguinte, a viabilidade da realização de reclamações e


disseminação de boca a boca negativo se torna mais presente, pois esse consumidor visa difamar o autor
de seu arrependimento, isentando-se de toda a culpa.
E, por último, o quarto tipo identificado por Nicolao (2002) é o arrependimento com alternativa
e com satisfação. Esse é o caso em que os consumidores se sentem satisfeitos com a escolha realizada
dentre as alternativas elencadas. Tal satisfação ocorre quando a expectativa, em relação ao produto, é
atingida ou até superada, mesmo existindo opções rejeitadas que possuam melhor performance. Porém,
o arrependimento não sai de cena. Mesmo estando satisfeito, ilustra um comportamento pós-compra
negativo. Contudo, a atribuição de responsabilidade, nesse caso, não se direciona ao meio externo
habitado pelo fornecedor, uma vez que foi julgado cumpridor de seu papel no mercado capitalista,
dificultando a propagação de reclamações e boca a boca negativo.
Diante da classificação realizada por Nicolao (2002), pode-se encontrar um campo aberto para
estudar e aprofundar os conhecimentos acerca do arrependimento, pois deve-se evidenciar “o papel
fundamental da responsabilidade no arrependimento e seus reflexos nos comportamentos pós-compra”
(NICOLAO, 2002, p. 10). Ademais, são escassos os estudos nesse campo de suma importância às
organizações, uma vez que são os consumidores que desempenham importante papel na movimentação
do mercado e, quanto mais satisfeitos estiverem, maior será a evolução do modelo de consumo.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Visto que “A pesquisa empírica é aquela voltada sobretudo para a face experimental e observável
dos fenômenos. É aquela que manipula dados, fatos concretos. Procura traduzir os resultados em
dimensões mensuráveis. [...]” (DEMO, 1985, p. 25), este estudo é de natureza empírica, uma vez que
houve coleta de dados em campo, não obstante a pesquisa bibliográfica realizada. A pesquisa de campo,
portanto, coletou dados, por intermédio de uma amostragem por acessibilidade, e os analisou à luz do
referencial teórico adotado para nortear o estudo.
Quanto aos objetivos, a pesquisa é do tipo descritivo-exploratória. A primeira se caracteriza pela
descrição da particularidade da amostra ou do fenômeno a ser estudado (GIL, 1989). A segunda é
baseada em investigações empíricas com o objetivo de reconhecer problemas a serem estudados,
podendo desenvolver suposições, ampliar o conhecimento do pesquisador acerca do assunto ou
transformar e elucidar concepções. De caráter descritivo e exploratório, a investigação descreveu e
estudou o comportamento de consumidores bem como os processos decisórios de compra de potenciais
consumidores.
A técnica de pesquisa adotada foi o survey ou levantamento, visto que se utilizaram questionários
para conhecer as práticas comportamentais pós-compra e as preferências do grupo analisado. Conforme
Gil (1989), há vantagens e desvantagens no uso dessa técnica. Dentre as vantagens, estão o conhecimento
126

direto da realidade, considerando as opiniões e crenças dos entrevistados; a economia e rapidez na coleta
dos dados e sua quantificação mediante análise estatística. Compondo a lista de desvantagens,
encontram-se a ênfase na percepção dos indivíduos, uma vez que são subjetivos e pode distorcer os fatos;
o alcance de pouca profundidade de informações e; a limitação da apreensão do processo de mudança,
visto que a informação coletada é imóvel e não indica possíveis alterações.
Tendo em vista que não se conhecia com exatidão a população da pesquisa, optou-se pela amostra
não probabilística e o critério de acessibilidade. Tal tipo de amostragem requer a seleção dos indivíduos,
considerando o acesso e a disponibilidade para participar. Esse tipo de amostra é realizado,
principalmente, em pesquisas exploratórias. Deste modo, 190 questionários foram respondidos, sendo
que 33 foram aplicados presencialmente e 157 através do Google Formulários. Desse total, quatro foram
desqualificados porque estavam preenchidos de maneira errônea. Portanto, o resultado aqui apresentado
refere-se a 186 questionários dirigidos a potenciais consumidores.
Para tanto, a presente pesquisa optou pelo questionário, uma vez que se formulou um instrumento
com 13 questões fechadas para se traçar o perfil socioeconômico dos respondentes, identificar os fatores
que os levaram a realizar compras, explicar o processo de decisão de compra e as consequências da
tomada de decisão, além de conhecer o comportamento pós-compra.
Tendo em vista a técnica de levantamento ou survey utilizada no desenvolvimento desta pesquisa,
o tratamento de dados utilizado foi quantitativo, pois “os processos estatísticos permitem obter, de
conjuntos complexos, representações simples e constatar se essas verificações simplificadas têm relações
entre si” (LAKATOS; MARCONI, 2003, p. 108). Os dados da pesquisa foram então “analisados por
meio ferramental estatístico para a obtenção das informações desejadas, devendo-se, para tanto,
considerar o tipo de análise estatística aplicável às variáveis em estudo (FREITAS et al., 2000, p. 109).
Deste modo, os dados empíricos receberam tratamento quantitativo, por meio do cruzamento dos dados
com o auxílio do software SPSS e Microsoft Excel.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Com o intuito de analisar os fatores determinantes do arrependimento do consumidor, após a


realização de uma compra, verificou-se antes que o perfil dos consumidores que já experimentaram a
satisfação e/ou o arrependimento após a aquisição de algo, da presente pesquisa, foi predominantemente
de mulheres jovens, que recebem entre um e três salários mínimos e trabalham e estudam
concomitantemente.
As empresas costumam exaltar as experiências satisfatórias de seus clientes, para que sirvam
de parâmetro para atração de potenciais consumidores e perpetuação da boa imagem da organização.
Porém, o outro lado da moeda quase nunca é lembrado: o arrependimento. O consumidor arrependido
tende a difamar a imagem da empresa disparando comentários insatisfatórios e colocando em xeque a
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qualidade dos produtos/serviços. De acordo com este estudo, 94,1% dos consumidores entrevistados
alegaram já terem experimentado o sentimento de arrependimento em alguma compra realizada durante
sua experiência de consumo. A Tabela 1 revela que o motivo principal que corrobora para tal sentimento
se dá quando o produto/serviço adquirido se mantém abaixo das expectativas (32,3%). Conforme Kotller
e Armstrong (1995), o consumidor se sente decepcionado caso o item adquirido ou serviço contratado
não atinja suas expectativas. Logo em seguida, vem a frustração de fechar um negócio que não respeitou
as especificações apresentadas no ato da compra (17,7%) e, em terceiro lugar, a não prestação de um
serviço de acordo com o anunciado (16,1%), conforme pode ser observado na Tabela 1.

Tabela 1: Motivos que despertam o arrependimento


MOTIVOS QTDE. %
O produto não atingiu minhas expectativas 60 32,3%
As especificações do produto (tamanho, numeração, cor, etc.) não foram condizentes
33 17,7%
com as apresentadas no ato da compra
O serviço não foi prestado como foi anunciado no momento da transação 30 16,1%
O desempenho do produto não foi condizente com o especificado no ato da compra 27 14,5%
O desempenho da outra opção de compra poderia ter sido melhor (produto preterido) 14 7,5%
O produto veio danificado 12 6,5%
Não respondentes 10 5,4%
TOTAL 186 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo (2019).

É possível verificar, no Gráfico 1, que 70,5% dos informantes julgam que seja improvável ou
muito improvável a recompra de um produto/serviço de uma marca/loja que os incitaram a conhecer a
experiência do arrependimento. Assim, são lembradas, nas futuras compras, as experiências positivas,
pois, de um modo geral, a maioria que passa pelo arrependimento procura evitar a repetição da
experiência. Tais dados estão de acordo com as classificações de arrependimento de Nicolao (2002),
pois dois deles levam o consumidor arrependido a difamar a imagem da empresa que o decepcionou com
o baixo desempenho do item comprado, bem como atribuir a culpa da má decisão ao fornecedor,
disseminando o boca a boca negativo.

Gráfico 1: Probabilidade de recompra na/da mesma loja/marca

Fonte: Pesquisa de campo (2019).


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Considerando o conceito de dissonância cognitiva que Nicolao (2002) apresenta como um estágio
de indecisão entre constatar que uma decisão foi certa ou errada, nesta pesquisa, foi possível identificar
que 38,7% dos consumidores arrependidos permanecem nesse estágio por algum tempo (Tabela 2), pois
se encontram em dúvida quanto à escolha feita. Ou seja, como ressalta Festinger (1957 apud NICOLAO,
2002) e Cobra (2003), após a compra, duas cognições se encontram em dissonância: a ideia da possível
assertividade na decisão tomada de fato e a ideia de que a opção selecionada pode não ter sido a melhor.
Nicolao (2002) ainda cita que o indivíduo busca informações que reafirmam a sua decisão como a melhor
possível, para assim, evitar que se reconheça como culpado, porém, nesse caso, a hipótese foi refutada
e o consumidor se viu arrependido.
Ao serem questionados se teriam tomado outra decisão, caso tivessem pensado melhor, 39,8%
concordaram totalmente com tal afirmativa. Por isso, 48,9% confirmam que se sentiriam mais felizes se
tivessem tomado uma decisão diferente. Sendo assim, o ato de recompra do item não é considerado para
47,3% da amostra que não recomendariam o produto para terceiros, conforme pode ser observado na
Tabela 2.

Tabela 2: Grau de concordância do arrependimento


Discordo Discordo Concordo Concordo
Afirmativas Indiferente
Totalmente Parcialmente Parcialmente Totalmente

Tenho dúvidas quanto a


12,4% 12,4% 14,5% 38,7% 22,0%
escolha feita

Acredito que tomei a melhor


decisão possível, com as
9,1% 24,2% 15,1% 29,6% 22,0%
informações disponíveis
naquele momento

Teria tomado outra decisão se


7,0% 13,4% 10,8% 29,0% 39,8%
tivesse pensado melhor

Me sentiria mais feliz se tivesse


4,3% 9,7% 9,1% 28,0% 48,9%
tomado uma decisão diferente

Acredito que cometi um erro de


julgamento ao escolher o 4,3% 7,0% 15,1% 31,2% 42,5%
produto/serviço

Acredito que estava cometendo


um erro ao tomar tal decisão, 5,9% 14,5% 18,3% 35,5% 25,8%
após o ato da compra

Não indicaria esse


produto/serviço para meus 5,9% 8,1% 16,1% 22,6% 47,3%
amigos e/ou familiares

Se tivesse que escolher, no


futuro, compraria esse 47,3% 17,2% 15,6% 11,3% 8,6%
produto/serviço novamente

Me sinto chateado(a) em ter


5,4% 10,2% 16,1% 23,7% 44,6%
comprado esse produto/serviço

Sinto raiva de ter escolhido


9,7% 9,7% 29,6% 25,8% 25,3%
esse produto/serviço
129

Me sinto frustrado(a) pela


decisão de comprar esse 9,7% 12,9% 19,4% 26,9% 31,2%
produto/serviço

Estou insatisfeito(a) com o


4,8% 7,5% 13,4% 31,2% 43,0%
produto/serviço

No momento da compra, me
senti inseguro(a) em relação a 15,6% 14,0% 25,8% 32,3% 12,4%
minha escolha

Me sinto arrependido, pois a


compra foi realizada por 25,8% 14,0% 17,2% 23,7% 19,4%
impulso

Me sinto o único culpado(a)


por essa sensação de 26,9% 19,4% 14,5% 24,7% 14,5%
arrependimento

Atribuo a culpa ao fornecedor


por essa sensação de 14,0% 16,1% 19,4% 29,0% 21,5%
arrependimento
Fonte: Pesquisa de campo (2019).

A partir dos dados coletados e demonstrados na Tabela 2, foi possível constatar também que os
consumidores têm dificuldade de diferenciar os sentimentos de arrependimento e insatisfação, uma vez
que concordaram totalmente com ambas as afirmações. De acordo com Nicolao (2002), o instrumento
que leva o consumidor à frustração em relação a sua escolha, constituindo a insatisfação, aponta questões
internas, uma vez que são fundamentadas nas expectativas depositadas pelo sujeito em relação à compra.
Já no que diz respeito ao arrependimento, o referencial é externo, pois analisa o desempenho dos outros
produtos que compõem a lista das opções preteridas. Portanto, conforme a (in)satisfação limita-se no
julgamento do produto utilizado, o arrependimento volta-se ao processo decisório do produto em questão
(NICOLAO, 2002).

Tabela 3: Arrependimento X Insatisfação


“Me sinto arrependido(a) de ter comprados esse produto/serviço” -
“Estou insatisfeito(a) com esse ARREPENDIMENTO
produto/serviço” Concordo Concordo Discordo
Discordo
INSATISFAÇÃO Totalment Parcialment Indiferente Totalment
Parcialmente
e e e
Concordo Totalmente 33,3% 7,0% 0,5% 2,2% 0,0%
Concordo Parcialmente 7,0% 18,3% 3,2% 2,7% 0,0%
Indiferente 1,1% 3,8% 7,0% 1,6% 0,0%
Discordo Parcialmente 0,0% 2,2% 0,5% 3,8% 1,1%
Discordo Totalmente 0,0% 0,0% 0,0% 2,2% 2,7%
Fonte: Pesquisa de campo (2019).

A Tabela 3 apresenta uma contradição nas respostas que ilustra a confusão que os consumidores
fazem quanto ao arrependimento e a insatisfação. Os respondentes foram submetidos a afirmações as
quais deveriam se posicionar quanto ao seu grau de concordância. As frases em questão nesta análise
foram as seguintes: (1) “Estou insatisfeito(a) com esse produto/serviço” e; (2) “Me sinto arrependido(a)
de ter comprados esse produto/serviço”. Um percentual de 33,3% concordou totalmente com ambas as
130

afirmações (Tabela 3), pois se sentiram arrependidos e insatisfeitos, ou seja, tais consumidores deram o
mesmo significado às afirmações propostas. No entanto, Nicolao (2002) considera que nem todo
consumidor insatisfeito é também arrependido, pois o arrependimento está relacionado a variáveis
externas e a insatisfação a variáveis ou elementos internos.
Os dados coletados nesta pesquisa também podem ser relacionados aos quatro tipos de
arrependimento propostos por Nicolao (2002): (1) arrependimento sem alternativas; (2) arrependimento
sem alternativas e disparado pela insatisfação; (3) arrependimento com alternativa e com insatisfação e;
(4) arrependimento com alternativa e com satisfação. Os participantes foram expostos a afirmações
relacionadas a cada um dos tipos de arrependimentos identificados por Nicolao (2002), conforme pode
ser observado na Tabela 4. Deste modo, 36% dos indivíduos enquadraram-se no tipo 1, arrependimento
sem alternativas, cujo comportamento predominante é a compra por impulso que envolve uma decisão
de compra não planejada, na qual o consumidor se deixa levar pelos impulsos psicológicos que o
induzem a realizar compras desnecessárias. De acordo com Nicolao (2002), o arrependimento decorrente
de uma compra por impulso não se origina da insatisfação referente ao desempenho do produto em si,
mas do fato de se ter adquirido algo que não era necessário naquele momento, ou seja, o consumidor
efetuou uma compra sem necessidade, fator indispensável para se iniciar o processo de decisão de
compra que, nesse caso, não foi respeitado.

Tabela 4: Tipos de Arrependimento


QTD
TIPOS %
E.
Comprei por impulso, resultante de uma ação errônea e uma compra sem necessidade 67 36,0
Houve reclamação e/ou troca do produto. Me senti lesado e culpo o fornecedor pela minha
19 10,2
má escolha
O desempenho do produto/serviço pós-compra me deixou insatisfeito. Atribuo a
responsabilidade ao fornecedor (má qualidade do atendimento) e propago 79 42,5
reclamações e boca a boca negativo
O produto atingiu ou superou minhas expectativas, porém ainda houve arrependimento,
embora o fornecedor tenha cumprido seu papel no processo da venda, assim dificulta a 21 11,3
ocorrência de boca a boca negativo
100,
TOTAL 186 0
Fonte: Pesquisa de campo (2019).

O arrependimento sem alternativas e disparado pela insatisfação (Tabela 4) esteve presente em


10,2% dos informantes, apesar de ser uma derivação do primeiro caso. Porém, há uma análise da
performance do produto adquirido. O item comprado, mesmo sem necessidade, desperta uma expectativa
que não é atingida, gerando a insatisfação. Nesse caso, o consumidor se vê lesado e se sente no direito
de dividir a culpa com o fornecedor.
No arrependimento com alternativa e com insatisfação, ocorre a possibilidade de escolha entre
as opções disponíveis e, mesmo assim, o sujeito se percebe insatisfeito após a compra, pois o produto
não atinge suas expectativas anteriores. Nesse caso, a responsabilidade pela experiência ruim é atribuída
a terceiros, especialmente ao mau atendimento dos vendedores. Deste modo, tais consumidores se veem
131

dispostos a disseminar reclamações e boca a boca negativo para difamar o autor do seu arrependimento.
Nessa categoria, houve uma maior concentração de respostas, ou seja, um montante de 42,5% das
respostas obtidas marcou a afirmação que se tratava do arrependimento com alternativa e insatisfação
(Tabela 4). Conclui-se, assim, que boa parte dos participantes desta pesquisa, quando insatisfeitos com
suas escolhas, sente-se à vontade para espalhar sua experiência ruim e evitar que outras pessoas a
conheçam. Além disso, isentam-se de toda a culpa de ter tomado uma decisão desagradável.
O arrependimento com alternativa e com satisfação de Nicolao (2002) acontece quando as
expectativas do consumidor são atingidas ou até superadas. Porém, o arrependimento existe porque ainda
é possível que opções rejeitadas possuam melhor desempenho. A responsabilidade, nesse cenário, não é
do fornecedor, pois ele cumpriu seu papel de venda. A disseminação de reclamações e boca a boca
negativo ficam mais difíceis de serem encontradas, uma vez que o autor da escolha se sente culpado pela
decisão errônea. Nessa categoria, 11,3% dos informantes sentiram-se arrependidos e satisfeitos ao
mesmo tempo (Tabela 4).
Na Tabela 5, é possível observar que, independente do tipo de arrependimento que cada um se
identifica, o motivo mais frequente que os fazem decidir pela compra é a necessidade, sobressaindo-se
sobre quase todos os outros motivos. Os achados têm relação com a Teoria da Hierarquia das
Necessidades de Maslow, que propõe que a medida que cada indivíduo atinge um grau satisfatório passa
imediatamente para o próximo nível da pirâmide, transitando pelos andares de baixo da pirâmide que
abrigam as necessidades de sobrevivência (fisiologia, segurança e social), rumo ao pico, onde se
localizam as necessidades psicológicas (de estima e auto realização). Porém, essa sequência é
questionável, pois as necessidades podem variar a depender do indivíduo, da cultura e/ou sociedade.

Tabela 5: Tipos de Arrependimento X Motivos


TIPOS
Arrependimento
MOTIVOS Arrependiment Arrependimento Arrependimento
sem alternativas
o sem com alternativa e com alternativa e
e disparado pela
alternativas insatisfação com insatisfação com satisfação
Necessidade 5,9% 0,5% 4,8% 1,1%
Necessidade, Atendimento,
2,2% 0,5% 2,2% 0,5%
Preço
Necessidade, Atendimento,
2,2% 0,5% 0,5% 0,0%
Qualidade
Necessidade, Preço, Impulso 2,7% 0,5% 0,5% 0,0%
Necessidade, Preço,
2,2% 0,5% 5,9% 1,1%
Promoções
Necessidade, Preço,
11,3% 3,2% 16,7% 2,2%
Qualidade
Necessidade, Promoções,
1,1% 0,0% 1,1% 0,0%
Impulso
Necessidade, Qualidade,
0,5% 0,5% 1,1% 0,0%
Produtos diferenciados
Necessidade, Qualidade,
0,5% 0,5% 2,2% 0,5%
Promoções
Qualidade 1,1% 0,5% 0,5% 1,1%
Fonte: Pesquisa de campo (2019).
132

Outros motivos citados com frequência, além da necessidade, foram o preço e a qualidade,
formando a tríade dos principais motivos que levam ao consumo. Tal informação pode ser observada na
Tabela 5, em que os números totalizam 33,4% do público desta pesquisa, distribuídos entre os quatro
tipos de arrependimento mencionados por Nicolao (2002). Com isso, o composto mercadológico pode
ser relembrado, uma vez que os 4 P’s (Preço, Produto, Ponto e Promoção) são parte de uma estratégia
de marketing utilizada como fatores determinantes do comportamento do consumidor (KOTLER;
ARMSTRONG, 1995). O planejamento estratégico envolve o ponto bem localizado e as promoções
realizadas, além de preço competitivo e qualidade nos produtos disponíveis no mercado, como
destacaram os consumidores participantes desta pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O consumo é uma das características da sociedade moderna que é marcado pelo atendimento de
necessidades e satisfação de desejos. Porém, os profissionais de marketing se aproveitam dessa situação
e fomentam novas necessidades e desejos no subconsciente dos consumidores que, por sua vez,
desenvolvem, muitas vezes, a prática de compra inconscientemente. Esses esforços externos que afetam
os consumidores, a todo o momento, internalizam-se em sua mente interferindo em sua decisão de
compra. Contudo, no geral, existe uma sequência de acontecimentos que desencadeiam a decisão de
compra, partindo da identificação da necessidade e chegando ao descarte do produto, após o consumo.
Uma vez comprado, o produto adquirido pode levar à satisfação ou ao arrependimento. Tais sentimentos
são desencadeados por influências de vários fatores, de ordem racional e psicológica, que se manifestam
de diferentes maneiras a depender da singularidade de cada indivíduo.
A motivação para o consumo se dá a partir da identificação de uma necessidade adquirida,
primeiro estágio de uma sequência lógica de decisão de compra. Tal processo se desenvolve até o estágio
de pós-consumo, passando pela fase de coleta de informações. Tais conhecimentos básicos incluem a
pesquisa de preço e qualidade, resultando no custo e benefício, aspecto muito valorizado pela amostra
deste estudo. Assim, os motivos que os levam a consumir se resumem à tríade constituída pela
necessidade (34,3%), preço (23,6%) e qualidade (20,0%). Após a finalização do processo decisório e a
efetivação da compra, o consumidor passa ao próximo estágio: a experiência de consumo. Com o produto
em mãos, chega, então, a hora de consumi-lo.
Praticamente todos os participantes já experimentaram o arrependimento (94,1%) em alguma
compra já realizada. Os compradores se decepcionaram principalmente quando o desempenho não
correspondeu à expectativa, mantendo-se abaixo do esperado (32,3%). Outra experiência ressaltada se
refere à decepção de fechar o negócio com base em especificações que não foram correspondidas após
o ato da compra (17,7%) e à qualidade e quantidade insatisfatória de informações (16,1%), no momento
133

da transação. Danos encontrados no produto e desempenho não condizente ao especificado no ato da


compra também foram apontados como razões de arrependimento.
A presente pesquisa verificou que existem lacunas nos estudos do campo da Administração a
respeito da temática investigada e que falta amadurecimento teórico sobre a questão, principalmente, em
se tratando das contribuições que outras áreas do conhecimento, como a Psicologia, Sociologia e
Neurociência, podem dar. Assim, sugere-se que outras pesquisas avancem no sentido de compreender
com maior profundidade as questões que envolvem as experiências e arrependimentos pós-consumo,
sobretudo, as heurísticas que envolvem o processo decisório.

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