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RESENHA

VYGOTSKY: APRENDIZADO E DESENVOLVIMENTO, UM PROCESSO


SÓCIO-HISTÓRICO

por

MARTA KOHL DE OLIVEIRA

DISCENTES: PEDRO HUGO CADINHA DESITER AMANCIO e SÉRGIO


GONÇALVES BRITO.

Esta obra integra a série “Pensamento e Ação no Magistério”, a qual


reúne as contribuições teóricas e práticas necessárias a todos os educadores
que desejam modificar a aplicação de métodos pedagógicos, objetivando
sempre o desenvolvimento de cada um.

Nesse sentido, a autora Marta Kohl de Oliveira utiliza o livro do judeu


russo Lev Semenovich Vygotsky: “Aprendizado e desenvolvimento, um processo
sócio-histórico”, onde aborda especialmente a importância da linguagem,
evolução e aprendizado na constituição do ser humano, sem deixar de lado
aspectos biológicos e culturais do funcionamento psicológico.

Para iniciar a exposição de suas ideias, a autora nos convida a


embarcar no contexto sócio-histórico vivido por Vygotsky, a saber Pós-
Revolução Russa. A tentativa de reunir em um mesmo modelo explicativo tanto
os mecanismos cerebrais subjacentes ao funcionamento psicológico, quanto o
desenvolvimento do indivíduo e da espécie humana ao longo de um processo
histórico, eram objetivos fundamentais do russo teórico.

Seu pensamento, apesar de aflorar numa época de crises, guerras e


caos mundial, estavam à frente de todo o cenário em que vivia, motivo pelo qual
tornaram-se de extrema contemporaneidade.
Indo ao encontro das ideias de Vygotsky, Marta Kohl de Oliveira
aborda a necessidade da interdisciplinaridade entre as ciências, de modo que,
nos dias atuais, o processo de conhecimento do ser humano está cada vez mais
integrado com outras áreas sociocognitivas vividas por cada um mediante
realidades diferentes.

A discussão do pensamento de Vygotsky na área da educação e da


psicologia, nos remete a uma reflexão sobre a relação entre ele e Jean Piaget,
biólogo e psicólogo suíço, considerado um dos mais importantes pensadores do
século XX, defensor também da abordagem interdisciplinar para a investigação
da epistemologia.

Ao longo da obra, a aurora Marta Kohl ressalta pontos convergentes


e divergentes dos pensamentos dos teóricos supracitados, trazendo sua relação
pertinente a cada tema abordado, segundo sua análise.

Para isso, no primeiro capítulo “História pessoal e história intelectual”,


Marta aborda o processo educacional vivido por Vygotsky, onde o russo, nascido
em 17 de novembro de 1986 na cidade de Orsha, próximo a Mesk, capital de
Belarus, extinta União Soviética, interessou-se desde cedo sobre o estudo e
reflexão em várias áreas de conhecimento, dentre as quais a ciência pedológica
(ciência aplicada ao estudo da criança e seu processo de evolução frente à
aspectos biológicos, psicológicos e antropológicos) fazia parte.

Nesse contexto, o autor considerava a disciplina em comento como


sendo o pilar do desenvolvimento humano, sem deixar de lado o próprio
processo de conhecimento vivido pelo ser humano, dando ênfase na recusa em
reduzir a dinâmica da complexidade psicológica a estudos específicos,
abraçando, deste modo, a ideologia da interdisciplinaridade epistemológica.

Segundo a autora Marta Kohl de Oliveira, devido a formação


acadêmica de Semenovish, que perpassa pela conclusão no curso de Direito na
Universidade de Moscou, cursos de História, Filosofia e até mesmo Medicina,
concluída parte em Moscou e parte em Kharkov, as obras produzidas pelo russo,
como por exemplo, em temas relacionados a deficiência, linguagem, psicologia,
educação e questões teóricas e metodológicas relacionadas às ciências
humanas, sua produção escrita não chegou a construir um sistema explicativo
completo e articulado, do qual pudéssemos extrair uma “teoria vygotskiana”.

Devido ao vasto conhecimento do teórico, denominava a época em


que vivia como sendo de “cataclismas geológicos na psicologia”, expressão
usada em umas das cartas que escrevera a cinco de seus discípulos e
colaboradores, Bozhocich, Levina, Morozova, Slavina e Zaporozhec, por volta
de 1929.

O grupo comandado por Vygotsky, buscavam elaborar uma


abordagem alternativa que possibilitasse uma síntese entre a psicologia natural
(que procurava explicar processos elementares sensoriais e reflexos a partir do
corpo humano) e a psicologia mental (que descrevia as propriedades dos
processos psicológicos superiores a partir do estudo da mente, consciência e
espírito).

Para Semenovich, não basta apenas a síntese de dois elementos


mediante a soma ou justaposição de duas ideias, faz-se mister a emergência de
algo novo, uma ideia nunca vista anteriormente. Assim sendo, através dos
estudos de Vygotsky, a psicologia tornou-se valioso instrumento para a
compreensão do homem, adotando, por ora, a junção antes vistas como
dicotômicas entre corpo e mente, no processo biológico e social do ser humano.

Nesse interim, a autora traz à baila três ideias vistas como pilares
básicos do pensamento do judeu russo Lev Semenovich, aos quais passo a
transcrever:

I - “As funções psicológicas têm o suporte biológico pois são


produtos da atividade cerebral”;

II - “O funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações


sociais entre o indivíduo e o mundo exterior, as quais desenvolvem-
se num processo histórico”;

III - “A relação homem/mundo é uma relação medida por sistemas


simbólicos”.
Concordando fortemente com a teoria formulada por Vangotsky, a
autora, através da própria reflexão, cita o cérebro como fonte material para o
funcionamento biológico, conquanto, não delimita-se a somente expressões
químicas ou funções fixas e imutáveis. Para ela, o órgão integra um sistema
aberto de plasticidade, cuja estrutura e modos de funcionamento são moldados
através da história e desenvolvimento individual.

Para além, Oliveira aprofunda-se nos tópicos II e III da teoria de


Semenovich, frisando o desenvolvimento sócio-histórico do homem a partir de
sua interação com a cultura pertencente ao local de seu nascimento, bem como
utiliza-se da ferramenta chamada “mediação”, abordada no capítulo 2 “A
mediação simbólica”, no que passaremos a apreciar.

Para compreendermos o conceito de mediação, segundo a autora,


devemos entender o que são processo elementares e processos superiores.
Processo elementares, são oriundos da psicologia natural expressados através
reações materiais exteriorizadas pelo indivíduo, sem necessariamente ter um
agente mediando o controle de tais ações.

Um exemplo básico, segundo Marta, é a movimentação involuntária


da cabeça na direção de um som forte.

Já os chamados processos superiores, frutos da psicologia metal


(psicologia essa priorizada pelos estudos de Vygotsky), há a chamada mediação
das ações humanas. Tal instituto caracteriza-se pela intervenção de uma
vontade/consciência entre ação e reação.

Agora, a relação entre indivíduo e sociedade não está ao império de


atos automáticos, sobretudo, tem caráter consciencial, mesmo com a
intervenção de terceiros mediadores, como por exemplo, quando alguém fala
para você não colocar sua mão no fogo, pois pode queimar-se.

Vygotsky, trabalha, então, com a noção de que a relação do homem


com o mundo não é uma relação direta, mas, fundamentalmente, uma relação
mediada através de funções psicológicas superiores. Nesse sentido, o russo
distinguiu dois elementos mediadores: os instrumentos e os signos.
Os instrumentos, segundo o autor, têm claras ligações com os
postulados marxistas, uma vez que o próprio trabalho humano, ação
transformadora do homem, une a natureza, seus recursos e a criatividade do ser
para criar objetos ou tecnologias que o ajudarão a interagir com a sociedade.

Tratando-se dos chamados signos, segundo o teórico-russo, tem a


mesma finalidade que os instrumentos, entretanto, não estão concretamente
expostos no mundo real.

Através dos signos mediadores, ou instrumentos psicológicos,


servirão de auxílio para lembrar, comparar coisas, relatar, escolher e etc. Como
exemplo, temos o signo da placa “proibido estacionar”, onde, pela leitura e
interpretação deste sinal o indivíduo poderá recordar-se de que no local não é
permitido estacionar veículos.

Para provar que o auxílio de signos poderia aumentar a capacidade


cognitiva dos indivíduos, Vygotsky junto aos seus colaboradores, propuseram
um experimento mental para crianças entre quatro e cinco anos de idade.

Na primeira fase do experimento de signos mediadores, havia um


conjunto de figuras e a cada figura correspondia a tecla de um teclado. Quando
uma figura era mostrada à criança, a tecla correspondente deveria ser
pressionada, contudo, os menores tinham dificuldade na memorização das
figuras expostas.

Já na segunda fase, com auxílio de signos nas teclas (uma faca para
lembrar do pão ou um trenó para lembrar do cavalo), o desenvolvimento foi
notável, de modo que as crianças passaram a memorizar e associar as figuras
muito mais rápido, em detrimento do que ocorrera na primeira fase.

Aqui, segundo o próprio autor, a idade para a fruição de determinados


objetos mediadores é de suma importância, tendo em vista a capacidade
neurológica de crianças em determinado período de tempo, não conseguirem
associar os instrumentos psicológicos para a captação de memórias. Em
contrapartida, adultos, em certos casos, também não precisarão desses
instrumentos para associarem determinadas situações ou memórias, pois sua
capacidade cognitiva evoluiu e tais objetos mediadores já estão compreendidos
mediante um “processo de internalização”.

Pela percepção da autora Marta Kohl, através da teoria da mediação


de Vygotsky, o processo de internalização de símbolos quando já memorizados
pelo ser humano, ajudam no processo de entendimento coletivo de informações
compartilhadas. À página 36, Marta cita, à título de exemplo, a história de alguém
contando a outra pessoa de quando fora andar a cavalo.

Através do “símbolo cavalo” o interlocutor e o ouvinte poderão


compreender do que se trata, pois o processo de internalização está completo.
Com isso, não é preciso, propriamente dito, que o animal esteja presente durante
a conversa.

Outro ponto muito importante abordado por Lev Semenovich no


processo de desenvolvimento do indivíduo, é o conceito de cultura a qual não
restringe-se à sua semântica. Para o autor, cultura é a própria realidade vivida
pelo homem, alimentando-se de experiências como o caminhar por alguma rua,
ou, até mesmo, a perda de um ente querido.

Deste modo, quando a cultura é internalizada pelo individuo mediante


um processo em que as atividades externas e as funções interpessoais
transformam-se em atividades intrapsicológicas, o ser humano poderá
expressar-se com o auxílio de signos ou símbolos compartilhados na
sociedade/cultura a qual faz parte.

Além dos papéis fundamentais dos símbolos e instrumentos, entra em


cena o “Pensamento e Linguagem”, tópico do capítulo 3 da obra, permitindo ao
leitor a captação do saber emanado por Semenovich à luz de Marta Kohl de
Oliveira.

Para o russo, a linguagem representa o sistema simbólico básico de


todos os grupos humanos, tendo em seu corpo duas funções principais:
intercambio social e pensamento generalizante.

Tratando-se da primeira função, a linguagem no intercambio social


serve para a expressão, compreensão e assimilação da realidade interna e
externa. Mediante a necessidade de comunicação com outros indivíduos, a
sociedade cria determinados sistemas de linguagem compartilhado, facilitando,
assim, a exteriorização de ideias coletivas.

É com a maturação do intercambio social que determinado conceito


de ideai poderá ser entendido por todos àqueles que compartilham do sistema
de linguagem, gerando, deste modo, o pensamento generalizante. Tomemos,
como exemplo, a palavra “cachorro”. Somente após a internalização da ideia e
símbolo do animal por todos os integrantes de determinada sociedade, é que
poderão, mais tarde, utilizar o pensamento generalizante para criar outros
conceitos advindos da “ideia cachorro”, como distingui-lo de outros animais e
objetos.

Evidentemente, segundo Vygotsky, há sempre o desenvolvimento do


pensamento e da linguagem, de modo que, por exemplo, certas espécies de
animais utilizam as chamadas fases pré-verbais ou pré-intelectuais para
expressarem suas ações intencionais.

Os chimpanzés pegam varas ou sobem em caixotes para alcançar


seu alimento, bem como emitem certos tipos de sons para obtenção de
determinados fins.

Para a autora, as fases pré-verbais ou intelectuais estão nesse


estágio pois não há ainda a função de signo, isto é, a comunicação entre eles
funciona como meio de expressão emocional e difusa com os outros animais,
mas não indicam, necessariamente, significados específicos compreendidos por
um interlocutor que compartilhe de um sistema de signos.

Esse processo também acontece com crianças até os dois anos de


idade, onde, antes disso, o bebê utiliza sons, risos e gestos para expressar o
que está pensando ou sentindo. Somente com a chegada de determinada fase
evolutiva, o indivíduo desenvolve a capacidade de aprender o sistema de
linguagem, tornando sua comunicação menos gestual e mais verbal.

É importante ressaltar que, segundo Vygotsky, o surgimento dessa


possibilidade não elimina a presença da linguagem sem pensamento (linguagem
puramente emocional), da mesma forma que não aniquila por completo o
pensamento sem linguagem (linguagem prática, racional)
A grande liga que une o intercambio social e o pensamento
generalizante para a formação do pensamento verbal, é a compreensão do
significado das palavras, segundo o teórico:

“O significado de uma palavra representa um amálgama tão


estreito do pensamento e da linguagem, que fica difícil dizer se se
trata de um fenômeno da fala ou de um fenômeno do pensamento.
Uma palavra sem significado é um som vazio; o significado,
portanto, é um critério da ‘palavra’, seu componente indispensável.
Pareceria então, que o significado poderia ser como um fenômeno
da fala. Mas, do ponto de vista da psicologia, o significado de cada
palavra é uma generalização de um conceito E como as
generalizações e os conceitos são inegavelmente atos de
pensamento, podemos considerar o significado como um
fenômeno do pensamento.”

Pelo pensamento de Marta, o significado das palavras muda ao


decorrer da evolução histórica do indivíduo/sociedade, principalmente no que
tange ao desenvolvimento socio neural das crianças. Segundo a autora, o
homem, nos seus anos iniciais de aprendizagem das palavras, pode assimilar,
por exemplo, o conceito da palavra “lua” com objetos luminosos, como abajur,
lustres e postes, pois através destes signos, confundirá a real essência da
palavra, associando tudo aquilo que brilha a noite com o corpo celeste.

É a partir dessa concepção que entre o papel do educador, para que,


de forma consciente, possa direcionar a criança a alcançar o mesmo significado
original das palavras compartilhadas de forma consensual pela cultura em que
vive, segundo Marta Kahl.

Nesse aspecto, Marta também cita a importância da distinção entre


significado, como já abordado e o “sentido da palavra”, conforme aborda
Vygotsky.
Sentido, segundo os autores supracitados, refere-se ao contexto ao
qual a palavra é aplicada. Não mais trata-se de um processo de aprendizado da
criança para adquirir o conhecimento real das palavras, mas sim, quando este
processo já está solidificado no interior de cada indivíduo que o sentido deverá
ser estudado de acordo com cada realidade de quem usufrui do pensamento
verbal.

A palavra “carro”, por exemplo, tem o significado de “veículo de quatro


rodas, movido a combustível, utilizado para o transporte de pessoas”. Já o
sentido da palavra “carro”, todavia, variará de acordo com o conhecimento e
experiencia de cada pessoa (cultura pessoal).

Para Vygotsky, o processo de internalização da cultura nas fases


iniciais do desenvolvimento psíquico da criança, chama-se “O discurso interior e
a fala egocêntrica”. Segundo o teórico, num primeiro momento, a criança se porta
de acordo com o pensamento verbal expressado por determinada sociedade,
como se fosse um robô, obedecendo ordens de seu criador.

Mais adiante, tal processo abre espaço para a fala egocêntrica, onde
o ser humano começa a pensar por si mesmo, deliberando quais são as
melhores palavras, ações e pensamentos a serem tomados no dia a dia. Ou seja,
o processo começa de “fora para dentro”.

Em contrapartida, Piaget, em resposta ao livro “Pensamento e


Linguagem” de autoria de Semenovish, acredita ser o contrário. Segundo Piaget,
quando do processo de internalização da linguagem cultural, a função da fala
egocêntrica é exatamente oposta àquela proposta por Vygotsky, onde seria uma
transição entre estados mentais individuais não verbais, de um lado, e o discurso
socializado e o pensamento lógico de outro, levando-se a crer que o aprendizado
perpassa por uma trajetória de “dentro para fora”.

Apesar de seu vasto conhecimento, segundo a autora Marta Kohl, o


russo teórico não chegou a desenvolver uma teoria completa sobre o
desenvolvimento humano, chamado pelos psicólogos de “abordagens
genéticas”. Aqui, é de suma importância buscar o real sentido da palavra
“genética”:
“A expressão “genética”, neste caso, não se refere a genes, não
tendo relação nenhuma com a biologia que estuda a transmissão
dos caracteres hereditários. Refere-se, isto sim, à gênese – origem
e processo de formação. Essa distensão é extremamente
importante: uma abordagem genética em psicologia não é uma
abordagem centrada na transmissão hereditária de características
psicológicas, mas no processo de construção dos fenômenos
psicológicos ao longo do desenvolvimento humano”.

Entretanto, como cita a autora, a preocupação de Vygotsky nas


questões relacionadas ao desenvolvimento humano, permitiram ao cientista a
formulação de ideias ligadas ao aprendizado do ser, principalmente no que diz
respeito a sua evolução nos primeiros anos de vida.

Segundo ele, o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento,


tratando-se de um aspecto necessário e universal do processo de
desenvolvimento das funções psicológicas, culturalmente organizada e
especificamente humanas. Evidentemente, Semenovich não deixou de lado
pontos pertinentes à evolução biológica do cérebro. Entretanto, diferentemente
da psicologia oriunda dos anos de 1910, o filósofo une aspectos físicos e metais
no processo sociocognitivo humano.

A concepção de que é o aprendizado que possibilita o despertar de


processos internos do indivíduo, ligando seu desenvolvimento com ambiente
sociocultural, é explicada no tópico da obra em “O conceito de zona de
desenvolvimento proximal”.

Para entendermos tal tópico, segundo Vygotsky, é de suma


importância fixarmos o entendimento acerca sobre o chamado “nível de
desenvolvimento”.

O nível de desenvolvimento são parâmetros e metodologias aplicadas


pelo cientista educador ao avaliar até onde determinado individuo,
principalmente crianças, conseguem realizar as tarefas a eles/elas impostas.
Não obstante, a atividade, sobretudo, deverá ser executada sem a ajuda de
terceiros, pois isso influenciaria no resultado final da pesquisa.

Para além, o russo teórico faz uso do desenvolvimento real, ou seja,


aquele conhecimento já alcançado pelo indivíduo, e o desenvolvimento
potencial, isto é, sua capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de adultos
ou de companheiros mais capazes.

No ramo do desenvolvimento potencial, Semenovich ressalta uma


questão importante para sua teoria: a capacidade de absorver conhecimentos
através da observação de certas tarefas executadas por terceiros, somente pode
ser adquirida em certo grau de evolução. É a partir dessa capacidade que o ser
humano começa a ter relações sociais, podendo alcançar novos patamares de
evolução mediante a observação.

Com os dois conceitos em mente, a autora Marta Kohl, indo ao


encontro das ideias de Vygotsky, explica a teoria do desenvolvimento proximal
elaborada pelo cientista. A postulação da existência dos níveis reais e potenciais,
define a zona de desenvolvimento proximal como a distância entre o nível de
desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução
independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial,
determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou
em colaboração com companheiros capazes.

Por isso, segundo a autora, Vygotsky foi de suma importância para a


aplicação da teoria do desenvolvimento proximal nas escolas contemporâneas.
Mediante os estudos do filósofo, teórico e cientista, o papel do educador está
bem delineado no sentido de avaliar o conhecimento de cada aluno
(desenvolvimento real), e aplicar métodos para que o indivíduo alcance outros
patamares de evolução (desenvolvimento proximal)

Entretanto, segundo Semenovich, a aplicação da teoria proximal não


deverá ter o auxílio do autoritarismo ou ser uma pedagogia diretiva. Tampouco,
devemos aplicar o pensamento de Piaget que propõe a espontaneidade do
desenvolvimento da criança, deixando-a livre para buscar conhecimentos.
Evidentemente, segundo a autora, o conhecimento proximal não
precisa, necessariamente, ser adquirido somente no ambiente escolar. Qualquer
modalidade de interação social, quando integrada num contexto realmente
voltado para a promoção do aprendizado e do desenvolvimento, poderia ser
utilizado, portanto, de forma produtiva na evolução humana.

Tratando-se, por ora, no que diz respeito a “Evolução da escrita na


criança”, Marta explica que Vygotsky tem uma abordagem genérica pertinente
ao tema. O teórico preocupa-se com o processo de aquisição da escrita o qual
inicia-se muito antes da entrada da criança na escola e se estende por muitos
anos, sendo necessário o estudo da chamada “pré-história da linguagem e
escrita”, ou seja, o desenvolvimento da criança antes de ser submetida a
processos deliberados de alfabetização.

Para entendermos do que se trata o assunto supracitado,


Semenovich, com o auxílio de sua colaboradora Lúcia, desenvolveu um estudo
experimental com crianças que não sabiam escrever.

Em determinado momento, os cientistas pediam para que as crianças


replicassem no papel uma frase oral. Entretanto, e propositalmente, a frase era
longa, contando com alguns detalhes. Através da observação da escrita
exteriorizada pelas crianças, os pesquisadores puderam perceber que a
chamada fase pré-histórica da linguagem, assemelhava-se com a escrita adulta,
contendo símbolos aos quais os examinados poderiam memorizar o que fora
dito.

Como o processo de simbiose entre escrita, símbolo e significado


ainda não está completo nessa fase, muitas das vezes ao pedirem que as
crianças falassem a frase explanada pelos cientistas, não conseguiam, pois os
símbolos no papel não continham uma ligação direta com o significado real da
frase.

Contudo, o processo de aprendizagem é sempre contínuo e duradora.


Segundo Marta, atualmente, o percurso da pré-história da linguagem é mais
difícil de ser observado em crianças urbanas de grupos culturais escolarizados,
tendo vista a comparação com sujeitos estudados por Lúcia e Vygotsky no
experimento em questão.
O argumento da autora é que as crianças submetidas ao experimento,
ingressam mais cedo nas escolas, são alfabetizadas mais cedo e vivem em um
meio onde a presença da língua escrita interfere antes e fortemente no processo
de desenvolvimento da criança, como é no caso do sistema russo de linguagem.

Devido ao anseio de Vygotsky em estudar e compreender a função e


estrutura dos processos psicológicos superiores, o cientista deu total atenção a
temas clássicos da psicologia, como a percepção, atenção e memória.

No que tange à percepção, devido ao seu sistema complexo no


desempenho do desenvolvimento humano, Semenovich estabelece como base
para a compressão deste ramo, a mediação simbólica e a origem sociocultural
dos processos psicológicos superiores, sem, por óbvio, deixar de lado a
influência dos órgãos sensoriais.

Ao longo do desenvolvimento humano, a percepção de sons, odores,


temperaturas, pressões, profundidades e da própria luz, vão ganhando novos
significados para cada indivíduo, de modo que, através de suas experiencias
socioculturais, a sensação, por exemplo, de determinada comida, pode levar
quem a experimenta a lembranças mais intrínsecas de sua mente, não
causando, por outro lado, o mesmo efeito a quem nunca viveu aquela realidade.

Em relação a atenção, esta, far-se-á, quase como a percepção. A


atenção, em primeira instância, é dotada de estímulos simbólicos diversos,
principalmente no começo da vida. Com o decorrer do desenvolvimento
neurológico, o indivíduo pode “selecionar” o tipo de atenção que o ajudará a
evoluir. Se não houvesse tal seletividade, assim explica Marta, a quantidade de
informações seria tão grande e desordenada que tornaria impossível uma ação
organizada.

Continuando, ressalta a autora, que a atenção involuntária, aquela à


qual não há um agente consciente intervindo na própria ação do indivíduo, pode
ser dotada de significados adquiridos de forma consciente:

“Quando escutamos nosso próprio nome, por exemplo, reagimos


imediatamente, focalizando nossa atenção de forma não
deliberada. Isto é, o nome próprio, pode ser carregado de
significado que indica a referência a um indivíduo particular,
provocando uma reação semelhante àquela despertada por
estímulos repentinos, como uma porta batendo, por exemplo.
Todavia, o ouvinte do próprio nome adquiriu de forma consciente
que seu significado está ligado intrinsicamente à sua identidade”.

Tratando-se da memória, Vygotsky trabalha também com a


importância da transformação dessa função psicológica ao longo do
desenvolvimento e com poderosa influência dos significados e da linguagem.

Segundo o teórico, faz-se mister a distinção entre “memoria natural”


e “memoria mediada por signos”. A memória natural assemelha-se à memória
existente nos outros animais, onde seu registro não ocorre de forma voluntaria.
Conquanto, nada impede que seu conhecimento seja usado em situações
posteriores.

No que tange à memória mediada por instrumentos, apesar de


também poder ter sua fonte em experiencias involuntárias, o ser humano pode
usufruir de instrumentos para alcançar determinado objetivo, ou apenas lembrar-
se de outros assuntos ou situações, como por exemplo, o uso de calendários,
agendas ou lista de compras.

O desenvolvimento da espécie humana, para Vygotsky, está baseado


no aprendizado e que, inevitavelmente, sempre envolve a interferência direta ou
indireta de outros indivíduos, mediante a construção pessoal da experiência e
dos significados.

Indo para o deslinde do livro no capítulo 5, “O biológico e o cultural:


os desdobramentos do pensamento de Vygotsky”, a autora Marta Kahl aborda
os seguintes tópicos:

I – O funcionamento cerebral como suporte biológico do


funcionamento psicológico;
II – A influência da cultura no desenvolvimento cognitivo dos
indivíduos, e;

III – A atividade do homem no mundo, inserida num sistema de


relações sociais, como principal foco de interesse dos estudos da
psicologia.

Com a ajuda de colaboradores para entender o desenvolvimento


humano, Semenovich obteve grande influência do neuropsicólogo Alexander
Romanovich Luria. Deste modo, como explica Marta, além do estudo da
psicologia superior como fonte do desenvolvimento humano, Vygotsky deu
atenção também ao funcionamento neurológico cerebral, visto como um sistema
aberto e que está em constante interação com o meio ao qual está inserido,
transformando sua própria estrutura e mecanismos de funcionamento.

Não obstante, ressalta importante ponto do processo de evolução de


todos os seres com relação ao órgão cerebral, seja da espécie homo sapiens
sapiens ou de qualquer outra. Nenhum ser nasce com o sistema neurológico
completo, o que permite sua adaptação às adversidades da vida.

Interessante reflexão acerca do funcionamento cerebral e sua


capacidade metamorfósica, é a flexibilidade para alcançar determinado objetivo.
Na execução da respiração, se o principal grupo muscular que funciona durante
esse processo parar de atuar, os músculos da laringe são mobilizados e o animal
ou a pessoa começa a engolir o ar, que então chega aos alvéolos pulmonares
por uma rota completamente diferente.

Sobre o a estrutura básica do cérebro, em seu livro “Fundamentos da


Neuropsicologia”, Luria divide o órgão em três unidades de funcionamento
cerebral. A primeira trata sobre o estado de vigília do ser humano ao qual o
cérebro desempenha a maior parte de suas funções, objetivando, também
através do sistema nervoso central, a averiguação de estados comportamentais,
como por exemplo a sensação de fome, frio sede e etc.

No que diz respeito a segunda unidade, sua tarefa é o recebimento,


análise e armazenamento de informações. Mediante o auxílio do sistema
sensorial, como a visão, audição, tato, olfato e paladar, o cérebro capta todos os
dados que lhe chegam, filtrando-os pelas vias da percepção, memória e atenção,
como já abordado no livro.

A terceira unidade postulada por Luria é a unidade para programação,


regulação e controle da atividade. Nas palavras do neuropsicológico, assim
aborda o tema:

“A atividade consciente do homem apensas começa com a


obtenção de informações e sua elaboração, terminando com a
formação das intenções do respectivo programa de ação e com a
realização desse programa em atos exteriores ou interiores. Para
isso é necessário um aparelho especial, capaz de criar e manter as
necessárias intenções, elaborar programas de ação a elas
correspondentes, realizá-los nos devidos atos e, o que é de suma
importância, acompanhar as ações em curso, comparando o efeito
da ação exercida com as intenções iniciais.”

Luria enfatiza que os sistemas supracitados sempre trabalham juntos


e estão presentes em todos os indivíduos da espécie humana, sobre o qual se
constituirão mecanismos específicos, carregados de conteúdo cultural.

Através de seus estudos, Romanovish percebeu que o sistema


cerebral desenvolve-se com o auxílio da evolução psicológica, ao passo que,
nos anos iniciais, a atenção do comportamento humano é voltada para atividades
elementares, como por exemplo a captação de todos os estímulos exteriores.

Ao transcorrer do tempo, o processo de mediação simbólica e o


pensamento abstrato e generalizante, tornado possível com a linguagem,
passam a ser mais centrais nos processos psicológicos do ser humano.

Com esse pensamento, as lesões em determinadas áreas do cérebro


podem causar problemas completamente diferentes, estando diretamente ligado
com o estágio psicológico do indivíduo.
Luria também realizou pesquisas sobre a influência da cultura no
desenvolvimento neuropsicológico. Seu objeto de estudos teve como referência
alguns moradores de vilarejos e áreas rurais de uma região remota e pouco
desenvolvida da Ásia Central. Tal região (Uzbequistão e Quirquistão) tinha sua
economia estagnada, alto grau de analfabetismo, predominância da religião
mulçumana e do trabalho rural em propriedades individuais e isoladas.

Todavia, a região passava por um processo de evolução estrutural,


com a implementação de escolas, criação de fazendas coletivas e mecanização
da agricultura.

Segundo Luria, o cenário estava propício para a observação do


desenvolvimento intelectual provocado por mudanças tão significativas na
realidade daquela localidade.

Sua metodologia de pesquisa consistia em longas entrevistas nas


quais eram apresentadas tarefas (nomeação e agrupamento de cores, figuras
geométricas e respostas a ilusões visuais, entre outras formas) para serem
resolvidas pelo entrevistado, bem como provocava os cidadãos daquela
localidade com novas perguntas para obter, de um mesmo indivíduo, outras
reflexões e possibilidades de raciocínio.

Através de seu trabalho, o pesquisador constatou que pessoas


escolarizadas e que trabalhavam em grupo, exibiam um pensamento mais
sofisticado do que os analfabetos e camponeses que laboravam individualmente.

Baseado nas proposições teóricas de Vygotsky, Luria identificou dois


modos básicos de pensamento: o modo gráfico-funcional e o modo categorial.
Sobre o modo gráfico-funcional, sua característica consiste na avaliação dos
objetos de estudo proposto pelo neurocientista mediante a categorização das
figuras geométricas através de experiencias pessoais vividas pelos avaliados.

Por exemplo, quanto ao grupo não escolarizado, quando


apresentados à figura geométrica de um quadrado, associavam sua simbologia
a uma gaiola ou gaveta de alimentação para a gaiola, pois eram os objetos de
referência que associavam ao quadrado.
Já o modo de pensamento chamado categorial, consiste na
classificação, por exemplo, de objetos geométricos sem necessariamente
estarem ligados a uma experiencia pessoal. Os indivíduos escolarizados
conseguiam agrupar as figuras geométricas em classes, como ocorre nos
tempos atuais com o estudo deste ramo matemático.

Outro dado interessante, foi que o pensamento proximal só


conseguiria ser desenvolvido se o indivíduo estivesse inserido nos meios
escolares ou na sua transição, de modo que a ideia do pensamento categorial
pudesse ser estimulada.

Sobre os processos de modernização no trabalho, caracterizavam-se


pelo planejamento de ações coletivas e a tomada de decisões que
ultrapassassem as necessidades e motivações individuais. Nesse grupo, os
trabalhadores deixavam de lado a própria subsistência particular para
trabalharem para aquilo que é previsível, geral e compartilhado.

Marta, cita também em sua obra, a contribuição de Michael Cole, um


dos principais estudiosos contemporâneos das relações entre cultura e
pensamento. Para ele, a estrutura de pensamento depende da estrutura dos
tipos de atividades dominantes em diferentes culturas.

“O pensamento prático vai predominar em sociedades


caracterizadas pela manipulação prática de objetos e que, formas
mais abstratas de atividade teórica em sociedades tecnológicas
vão induzir a pensamentos mais abstratos.”

Entretanto, a autora discorda quanto à utilidade da aplicação de


teorias de desenvolvimento em estudos comparativos de culturas. Segundo a
escritora, aquilo que Luria interpreta como a aquisição de novos modos de
pensamento, sua concepção perfaz um campo distinto do neuropsicólogo, onde
a aplicação de modos previamente disponíveis aos problemas particulares e
contextos do discurso representados pela situação experimental, é que
possibilitarão o desenvolvimento humano.
Juntamente com Luria, a escritora cita também a “Teoria da
Atividade”, produzida por Alexei Nikolaevich Leontiev, um dos colaboradores de
Vygotsky, para a construção de uma nova psicologia na Rússia pós-
revolucionária.

Durante o processo de ontogênese de cada indivíduo, segundo


Leontiev, as relações sociais e de vida social aliadas ao desenvolvimento do
trabalho, proporcionam a evolução das funções psicológicas superiores, dando
espaço a atividades conscientes, elevada ao alcance de objetivos formulados
por cada ser humano, sem deixar de lado a interação constante entre psiquismo
e as condições concretas da existência do homem.

Marta destaca um paralelo entre a “Teoria da Atividade” de Leontiev


e noção de “Sistemas Funcionais” da neuropsicologia de Luria. Em ambas as
teorias, o objetivo formulado pelo homem pode ser alcançado por diferentes
meios. O funcionamento do ser humano não pode, dessa forma, ser
compreendido sem referência ao contexto em que ocorre.

Nos capítulos finais, mais especificamente na parte da conclusão, a


autora frisa, novamente, o aspecto cultural frente à sua internalização no
indivíduo, como papel fundamental no desenvolvimento da psicologia humana.
Assim como Vygotsky, Marta concorda com o argumento de que o homem
biológico transforma-se no homem social pelo processo da intro e
interpsicologia.

Apesar de ser grande seguidora de Semenovich, mais uma vez, a


autora volta no ponto relacionado a inexistência de uma “teoria vygotskiana” e
sua implicância na formulação concreta do pensamento pedagógico como
método bem delineado para ser aplicado na docência.

Nesse contexto, faz grande crítica ao sistema brasileiro


contemporâneo, onde os educadores tentam aplicar somente uma teoria, ou a
vista como a melhor. Entretanto, segundo Oliveira, quanto mais for o
conhecimento teórico e prático do professor, melhor será sua atuação em sala
de aula, pois, deste modo, poderá abordar temas diferentes com muito mais
propriedade intelectual, visando sempre o aprendizado dos alunos.
Frisa também o inoportuno embate ao qual os educadores alimentam
entre Piaget e Vygotsky, como se fosse uma luta cognitiva para se buscar o
melhor teórico e sua teoria.

Apesar desse cenário, a autora toca em importante ponto que junta a


ideologia dos teóricos supracitados e que podem ajudar a alavancar o ensino no
país: ambos utilizam a metodologia qualitativa, buscando captar mecanismos
psicológicos em processos, e não resultados simplesmente estatísticos. Sem
prejuízo, os pesquisadores são interacionistas, postulando a importância da
relação entre indivíduo e ambiente na construção dos processos psicológicos.

Finalizando sua obra, Marta dá total importância a “Teoria Proximal”


de Vygotsky, como sendo um dos pilares para o entendimento e estímulo do
desenvolvimento humano, colocando também em destaque o papel do
mediador, sejam os membros da família, professores e até mesmo a própria
sociedade.

VISÃO CRÍTICA

Após leitura e reflexão de importante contribuição da autora Marta


Kohl de Oliveira pertinente à presente obra, bem como sua causa Lev
Semenovich Vygotsky, há alguns pontos interessante a serem retratados neste
espaço de aprendizado:

1 – Segundo o russo teórico Vygotsky, ao tratar sobre o tema “A


mediação simbólica”, no capítulo 2, mais especificamente no que diz respeito ao
uso de instrumentos simbólicos, apesar de terem sua origem na psique humana
exteriorizada mediante símbolos concretos, como já citado o uso de listas de
compras ou placas de sinalização de trânsito para que a memória, percepção e
atenção sejam ativadas, a criação de tais instrumentos e símbolos, pertencem à
natureza de causa e efeito recíprocos.

Entretanto, a teoria de causa e efeito clássica (ação e reação) criada


por Newton, não aplica-se ao caso em comento, se não, vejamos o que diz:
“A toda ação há sempre uma reação oposta e de igual intensidade: as ações
mútuas de dois corpos um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas em
sentidos opostos.”

Segundo tal entendimento, apesar do efeito estar inevitavelmente


relacionado à sua causa, sua força não irá voltar-se contra sua origem, pois, se
assim o fosse, elas se anulariam.

A criação de instrumentos (causa) e o uso deles para alguma


finalidade (efeito) são consequências que giram em torno do mesmo ponto de
partida. O homem que introduz no sistema simbólico determinado instrumento
novo, é ao mesmo tempo causa e efeito de sua criação.

2 – Outro ponto interessante de se abordar, constante às fl.42/45, é


sobre a fase pré-verbal e pré-intelectual quando do desenvolvimento da
linguagem e pensamento. À luz dos pensamentos da autora Marta Kahl, a
escritora diz que tais fases quando observados no desenvolvimento do macaco,
constituem-se nesse estágio pois não há ainda a função de signo, isto é, a
comunicação entre eles funciona como meio de expressão emocional e difusa,
mas não indicam, necessariamente, significados específicos compreendidos por
quem os observa.

Entretanto, discordamos, com todo o respeito, do argumento de


Marta, pelos seguintes motivos:

A linguagem animal apesar de ser limitada, muitas das vezes


expressadas com o intuito de alimentação, reprodução ou a defesa do território
a qual pertencem, não estão, necessariamente, no campo da pré-verbalidade ou
pré-intelectualidade.

Acreditamos que a analogia presente no livro, que emprega o termo


“pré”, está em desconformidade com o objetivo final da obra, qual seja o
desenvolvimento (retiramos a parte do “desenvolvimento humano”
propositalmente, o que será abordado a seguir).

O uso indevido da palavra “pré”, evidencia um estágio evolutivo


anterior àquele vivido pelo humano. Quando a autora utiliza essa terminologia
comparando a evolução da linguagem animal com a evolução da linguagem
humana, esquece-se da obra “A Origem das Espécies”, de autoria do cientista
inglês Charles Robert Darwin, onde, apesar de semelhanças biológicas e termos
um descendente em comum com a espécie de primatas antropoides, a evolução
deu-se por caminhos diferentes, cada qual ganhando novas roupagens
materiais, métodos de convício em grupo, utilização de ferramentas e
desenvolvimento verbal e intelectual.

É errôneo usarmos o termo “pré”, para caracterizar o objeto de


pesquisa mediante valores subjetivos vividos pelo observador. O
desenvolvimento, recapitulando as ideias de Darwin, fez-se e faz presentes em
todas as espécies, de modo que, por exemplo, certos tipos de animais como o
Golden Retrievier, apesar de nunca usarem, propriamente dito, a linguagem e
pensamento compartilhado e consentido pela sociedade atual, podem
compreender e “responder” aos comandos a eles atribuídos, mas claro, se forem
estimulados através da Teoria Proximal.

3 – Finalizando oportuno espaço para a reflexão do pensamento,


trazemos uma questão pertinente, e que não fora abordado pela autora: Através
da “Teoria Vygotskiana”, onde seu principal objetivo era explicar o
desenvolvimento psicológico, qual é a origem pela qual crianças já nascem
dotadas de alguma habilidade?

A teoria de Semenovish explica que o desenvolvimento psicológico


acontece mediante um processo pelo qual o indivíduo recebe estímulos através
de signos, instrumentos, símbolos e mediadores, onde, num primeiro momento,
interage pela fala emocional (rir, chorar, sentir fome, dor e etc). Por conseguinte,
ao evoluir seu raciocínio, o ser humano consegue desenvolver a linguagem como
sistema de símbolos e significados, integrando, deste modo, o sistema verbal
comumente usado pela cultura a qual faz parte.

Entretanto, tal teoria não explica a causa pela qual crianças já nascem
com algum tipo de dom, como por exemplo, sabendo tocar instrumentos, falar
outra língua que não seja aquela aprendida ou exercendo habilidades motoras,
entre outras características.

Portanto, parece-nos mais racional a abordagem de dois argumentos


para explicar a problemática:
4.1 - A criança adquiriu o conhecimento através de passagens
genéticas oriundas dos laços consanguíneos grafados no dna de seus genitores,
ou;

4.2 - Admite-se a existência da vida extracorpórea, no sentido de que


o conhecimento humano não é somente adquirido pelos laços materiais, mas,
também, com o desdobramento do sono e a existência de outras realidades as
quais não temos compressão.

Devido à natureza transmutacional da ciência, chegará o dia em que


poderemos compartilhar de todas as respostas, as quais, somente o papel da
educação poderá nos tirar desse pensamento utópico e colocarmo-nos ao
trabalho incessante do conhecer.

BIBLIOGRAFIA

VYGOTSKY, LS. The Psychology of Art. Cambridge, Mass., The M.I.T. Press,
1971;

A Formação Social da Mente. São Paulo, Martins Fontes, 1984;

Et.al. A Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo, Ícone/Edusp,


1988;

Pensamento e Linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1989 (2a edição);

A Origem das Espécies. Charles Robert Darwin. Novembro 1859.

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