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LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO
Mas quando Barthes, pelo facto de eu usar um casaco gem e ,comunicação são sinónimos. Não têm razão, pois
de tweed de cor castanho seco, conclui que estou a Íepre- postulam que o mesmo finr implica os mesmos meios: os
sentar para mim e para os outros a comédia do gentleman- mesmos tipos de unidades G os mesmos tipos de combina-
-fanner anglomaníaco (ou outra coisa qualquer), interpreta ções destas unid.ades entre si; o que seria preciso de-
um indício ou talvez um sintoma como um slnal (rarm monstrar, para cada caso particular-o que com certeza
sinal, diz Prieto, é um facto qrre foi artiÍicialnrente pro- está longe de ser a realidade.
duzido para servir de indício»). O uso deste casaco pode Cada vez que há comunicação, quer dizer, mensagem,
ter, com efeito, as mais diÍerentes motivações: ou poÍque a linguística cstrutural e funcional propõe uma análise
quero andar como toda a gente por puro conforrnismo; segundo a qual os.diferentes tipos de comunicação podem
ou então foi um presente, que não escolhi; ou ainda poÍque ser classificados consoante o tipo de mensagens e das
era o último ou o único casaco com a minha medida que unidades com as quais se constroem estas mensagens.
havia na loja; ou era a minha cor preferida, independente- Cabe à Semlologls descrevê-las uma a uma. Eric Buyssens
mente da rqoda; ou finalmente ainda porque quero andar (1943) propôs as grandes linhas de uma tal classificação
à moda, etc. Barthes certamente detecta indícios preciosos segundo um critério que, ainda hoje, é o mais satisfa-
para constituir urua psicologia social, ou uma psicanálise, tório.
mesmo paÍa uma psicopatologia do vestuário. Mas não
o vemos de maneira nenhuma entregar-se a esses longos l. _.-
Primeiro haveria os melos de comunlcação, a-sis-
inquéritos sociológicos de motivação, por exemplo, que temáticos, quer dizer, para os quais não é possível definir
seriam os únicos que possibilitariam a interpretação desses uni«lades ou Íegras estáveis de construção, de mensagem
indícios, e estabelecer em que medida é que são realmente para mensagenr. Para um anúncio publicitário, por exemplo,
utilizados como sinais ou signos vestimentares. O facto podemos descortinar as regras psicológicas (jogar com a
de thes chamar signos, e de thes aplicar, de fora, conceitos atracção do nu feminino), ou das ÍegÍas estéticas (calcular
ünguísticos não aumenta a vatidade da interpretação. cuidadosamente a repaúição dos volumes e das cores),
ou das regras tipográficas (escolha dos caracteres e dos
espaços, etc.), mas não das unitlades e das regras selnio-
lógicas próprias, reutilizáveis de mensagem para mensagem.
Cada anúncio constitui provàvelmente o seu próprio código,
LINGUAGEM E CO]VIIINICAÇÃO
INTRODUÇÃO À LINGUISTICA
partir de Saussure, que o signo é arbitrário; o que quer üa. Corre-se assim o risco de postular que há una intenção
dizer, não que cada locutor o pode empregar ou mesmo de comunicação em casos em que essa intençao esta
inventálo à sua vontade, mas que a relação entre o seu ausente. Também não sabemos se os biólogos não se
significante e o seu significado é puramente (totalmente) arriscam a desorientar-nos e a desorientarem_se a si pró_
contingente e convencional, sem qualquer apelo natural prios quando nos falam do ácido desoxirribonucleico cãmo
analógico de um ou outro. No sinal do código da estrada emissor rle uma «linguagem» que envia «mensagens» ao
que indica urna curya, subsiste ainda um aspecto de sím- citoplasma, mensagens estas que são ordens provenientes
bolo; mas naquele que prescreve uma paÍagem obriga- de um «código» cujas «letras» (ou fonemas?) são quatro
tória, o triângulo com o vértice para baixo é um sinal bases azotadas que servem para a construção de vinte
totalmente arbitrário quanto à forma, tendo em conta o
çalavras» (quer dizer, vinte ácidos aminados) cujas combi_
que significa. O mesmo acontece com a cruz vercle das naçôes produzem «frases» (quer dizer proteínas) que trans_
farmácias, com a bandeira amarela na parte superior do portam a «infotmação» genética. Em vez dos termos ün_
ultinro vagão de unr comboio que assinala um desdobra- guísticos que aqui paÍecem não ser mais que metáforas,
mento, etc. O mesmo se passa com as unidades signifi- graças às quais não raro se diz e acredita que «existe algo
cantes rlas línguas naturais: a prova dq que não há qualquer de escrito no coração da matéria», seria prudente falar,
relação intrínseca, natural e simbólica, entre o animal a apenas, em termos de transmissão (e nem sequer de co-
que chamamos o trx)rco e o conceito ou significarlo corre- municação). As mesmas utilizações metafóricas permitiriam
lativo, e o seu nome cm português, é que noutros sítio-q o também, sem dúüda, com pouco engenho, descrever toda
poÍco se chama maiale, pig, Schwein, Khanzir, choiros,etc. a circulação ferroviária em termos de ünguíst ca estrutuÍal,
sem benefício teórico para a ünguística ou paÍa o funcio-
6. Buyssens distingue poÍ fim os sistemas de comu-
nicação- directos, como a forma oral da linguagem humana
namento dos caminhos de ferro.
poÍ exemplo, dos sistemas substitutlvos que transcodiÍicam
ünicamente as unidades formais dos primeiros num segundo
coMUNtcAçÃO OU COMUNHÃO OU ESTTMULAÇÃO?
sistema de unidades: todos os escritos, o morse, o braille,
o código marítimo dos sinais de braços, a linguagem ges-
tual dos surdos-mudos são (e só) sistemas de comunicação É preciso dizer o mesmo da pintura, da escultura, da
música, e do próprio cinema, ou de todas es formas de espec_
substitutivos.
táculo. Antes de falar da sua linguagem ou de dissertar
sobre o vocabulário de Braque, ou a sintaxe de Rir:rs§_
coMUNrcAçÃO OA TRANSMTSSÃO ? -Korsakof, etc., será bom explorar cuidadosamente a natu_
reza da comunicação que se estabelece há comu_
Concebemos que os linguistas Íeprovem e desaconselhem nicação - se é oqueque
entre o errissor (ou a mensagem, é dife_
o uso imoderado e a friori da. palavra linguagem para rente) e o- receptor, para cada caso. podemos desde já reflec_
descrever fenórrenos, sem una investigação científica pré- tir sobre este simpres probiema: diferentemente dai línguas
INTRODUÇÃO À LINGUÍSTICA
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