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Implementação de Fábrica de Software em Instituto Federais

e Universidades: Uma Proposta de Trabalho na Educação


Superior
Pedro Henrique P. Ricardo1 , Pedro Henrique T. Pinto2

1
Cefet/RJ - Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca
Campus Nova Friburgo - Bacharelado em Sistemas de Informação

Resumo. O artigo aborda a implementação de um modelo de Fábrica de Soft-


ware em Instituições de Ensino Superior no Brasil como um componente do
projeto pedagógico, servindo como um ambiente para experiências nas áreas
de ensino, pesquisa e extensão acadêmica. Serão explorados aspectos rela-
cionados à prática educacional nessas fábricas, visando entender seu impacto
na formação dos alunos e na disseminação do conhecimento na área de Engen-
haria de Software, Sistemas de Informação e nos demais cursos de Computação.

1. Introdução
A atividade docente em nı́vel de graduação frequentemente enfrenta desafios significa-
tivos no que diz respeito à persuasão dos alunos quanto à relevância e necessidade dos
conhecimentos apresentados nas disciplinas. Essa dificuldade é exacerbada pela visão
fragmentada dos discentes em relação à interdisciplinaridade, o que compromete a com-
preensão dos vı́nculos entre os conceitos abordados em sala de aula e, por conseguinte, a
prática da docência enfrenta obstáculos adicionais.
Diversas metodologias têm sido objeto de discussão e avaliação no intuito de pro-
mover melhorias na gestão do processo de desenvolvimento de software. É notável que
algumas dessas abordagens apontam para a adaptação de modelos originários da gestão
da manufatura, considerando as particularidades do setor de software e reconhecendo as
semelhanças substanciais entre ambos os domı́nios.
Nesse contexto, destacam-se as Fábricas de Software, que se configuram como
plantas de desenvolvimento de aplicativos inspiradas nos princı́pios das plantas industri-
ais, incluindo o reaproveitamento de componentes e a divisão do processo produtivo em
etapas bem definidas. Essas Fábricas de Software têm se revelado uma solução eficaz para
o fornecimento de produtos com qualidade e competitividade de preço, além de contribuir
para o desenvolvimento de mão de obra especializada. Não surpreende, portanto, que esse
modelo de desenvolvimento de software tenha ganhado destaque no cenário brasileiro,
com a instalação de numerosos parques de produção de alta capacidade no paı́s.
Além das empresas especializadas, a crescente demanda por profissionais qualifi-
cados e a necessidade de proporcionar experiências práticas aos alunos de cursos de tec-
nologia deram origem a uma nova modalidade de empreendimento: a Fábrica de Software
Acadêmica. Essas entidades utilizam os recursos disponı́veis no ambiente acadêmico,
como laboratórios, alunos e professores, para estabelecer unidades de produção voltadas
ao desenvolvimento de software.
A Fábrica de Software Acadêmica não só oferece aos alunos a oportunidade de
colocar em prática os conhecimentos adquiridos em sala de aula, mas também desem-
penha um papel fundamental no acompanhamento e na formação dos estudantes. Por
meio dessa estrutura, é possı́vel certificar-se de que os conceitos teóricos são aplicados de
maneira efetiva na solução de problemas reais, ao mesmo tempo em que se identificam
possı́veis lacunas na formação dos futuros profissionais. Assim, a Fábrica de Software
Acadêmica contribui para manter a coesão entre o projeto pedagógico do curso e as ne-
cessidades do mercado, assegurando a formação de profissionais qualificados e prontos
para enfrentar os desafios da indústria de tecnologia da informação.

2. Motivação
O Brasil ocupava a oitava posição no ranking do Mercado Mundial de Software e
Serviços, conforme indicado pelo estudo publicado em 2014 pela ABES (Associação
Brasileira das Empresas de Software) e o IDC (International Data Corporation). Nesse
contexto, o mercado brasileiro representava 3‰ do mercado mundial e 47,4‰ da América
Latina, com uma tendência de crescimento dessa participação, conforme apontado no
mesmo estudo. Além dos esforços individuais dos profissionais envolvidos, é imperativo
que as empresas, órgãos governamentais e instituições de ensino superior colaborem para
estabelecer mecanismos que promovam o crescimento contı́nuo da indústria de software
e a conduzam a patamares ainda mais elevados.
Um estudo comparativo entre as fábricas de software acadêmicas nacionais pode
revelar aspectos significativos a serem considerados na implementação de novas fábricas.
No entanto, durante a pesquisa realizada, não foi possı́vel identificar estudos similares
nas bases de dados de artigos consultadas. Portanto, a análise proposta permitirá que as
instituições de ensino superior se beneficiem de um estudo comparativo detalhado, o qual
destacará elementos essenciais para facilitar a implementação de fábricas de software em
seus ambientes acadêmicos.

3. Fábrica de Software
Observa-se uma tendência, já identificada pela indústria de Tecnologia da Informação, que
aponta para a convergência progressiva de muitas metodologias de desenvolvimento de
software com abordagens similares às adotadas na gestão da produção manufatureira. Não
obstante, certos autores, como Armour e Miller (2000), sustentam a perspectiva de que o
software não constitui propriamente um produto, mas sim um meio de armazenamento de
conhecimento. Consequentemente, argumentam que seu desenvolvimento não equivale à
produção de um bem tangı́vel, mas sim à aquisição de conhecimento.
Em paralelo a esta evolução, o mercado consumidor de Tecnologia da Informação
se torna cada vez mais exigente, especialmente no que concerne aos aspectos de produ-
tividade, custo e qualidade. Neste cenário, as empresas do setor têm buscado remodelar
suas operações, visando um modelo capaz de atender eficazmente a essas demandas.
Dentro dessa dinâmica, emerge o conceito de ”Fábrica de Software”, que importa
para o contexto do desenvolvimento de aplicativos conceitos e metodologias análogas aos
processos de produção fabril convencionais. Isso se traduz na utilização de componentes
com atributos semelhantes e padrões de qualidade equiparáveis.
A proposta da Fábrica de Software abarca uma variedade de atividades, desde o
desenvolvimento de soluções e a prestação de serviços de consultoria até a elaboração de
cursos em diversas áreas da computação e a oferta de serviços de certificação em ativi-
dades relacionadas à área. Todas essas operações são conduzidas por alunos matriculados
no curso de Bacharelado em Sistemas de Informação, sempre sob a supervisão de um
docente designado como coordenador do projeto.
A essência dessa iniciativa reside em proporcionar aos estudantes um ambiente
que lhes permita vivenciar os processos inerentes ao desenvolvimento de software. Dessa
forma, a Fábrica visa antecipar o contato dos alunos com as atividades que caracterizarão
sua futura vida profissional. O primeiro desafio enfrentado consistiu em sensibilizar a co-
munidade local quanto à utilidade da Fábrica de Software como ferramenta para o desen-
volvimento de soluções tecnológicas. Para o êxito da proposta, revelou-se fundamental a
disponibilização de um espaço fı́sico no qual os alunos pudessem se reunir e desempenhar
suas atividades com eficácia.
Assim como nas organizações fabris concebidas por Taylor, Fayol e Ford no
século XX, nas fábricas de software também há uma busca incessante pela qualidade,
produtividade e eficiência custo-efetiva, o que naturalmente implica na adoção de diver-
sos paradigmas encontrados no processo fabril tradicional, refletindo-se no cotidiano das
operações de uma fábrica de software. Analogamente ao processo de manufatura em lin-
has de montagem, os padrões contemporâneos de desenvolvimento de software, tais como
a Programação Orientada a Objetos (POO), estabelecem que os softwares sejam compos-
tos por módulos ou componentes menores que são integrados para a formação do produto
final, permitindo assim que partes individuais possam ser desenvolvidas de forma inde-
pendente. Consequentemente, os projetos de software podem ser concebidos em termos
estruturais, viabilizando a participação de múltiplos programadores, internos ou tercei-
rizados, onde cada um recebe solicitações para novos processos e produz componentes
com caracterı́sticas definidas e especı́ficas, atendendo a nı́veis de qualidade previamente
estabelecidos, e permitindo que esses módulos ou componentes sejam posteriormente
reutilizados em outras soluções, em um processo conhecido como reaproveitamento de
código.
O êxito de uma Fábrica de Software é intrinsecamente relacionado à adoção de
processos de desenvolvimento que facilitem a definição e a distribuição de tarefas, a
atribuição de responsabilidades para as diversas etapas do ciclo de vida do software, a
comunicação eficaz tanto com o cliente quanto entre os membros da equipe, a previsão
de demanda, a implementação de mecanismos de controle e melhoria contı́nua dos pro-
cessos, a gestão do conhecimento e dos recursos humanos, bem como a utilização de
bibliotecas para reutilização de código e componentes.
A participação dos alunos do curso de Bacharelado em Sistemas de Informação
(BSI) nas atividades da Fábrica de Software é uma condição indispensável para que esse
ambiente alcance seus objetivos formativos. Como delineado nos parágrafos anteriores,
toda solução desenvolvida na Fábrica é concebida sob a forma de um projeto, e vinculada
a cada projeto estão os alunos. Após a aprovação de um projeto para ser desenvolvido na
Fábrica de Software, o coordenador determina a quantidade de vagas disponı́veis para a
participação dos alunos no projeto. A seleção dos alunos é realizada pelos membros do
colegiado da Fábrica de Software em colaboração com o coordenador do projeto.
Table 1. Evolução do conceito de Fábrica de Software

Fonte: (FERNANDES e TEIXEIRA, 2004)

4. Fábricas de Software em Instituições de ensino superior


Neste capı́tulo serão apresentadas as IES analisadas, assim como as informações consol-
idadas a respeito das similaridades e diferenças entre elas no que tange às metodologias
adotadas, objetivos esperados, dificuldades encontradas e resultados obtidos.

4.1. Aspectos bem sucedidos das FSA pesquisadas


Em linhas gerais, as instituições em análise optaram por iniciar as atividades de suas
Fábricas de Software (FSAs) priorizando o atendimento das demandas internas. Esta
escolha, fundamentada na premissa de que tal abordagem permite um aprimoramento dos
processos estabelecidos enquanto se atende a um cliente interno menos exigente e mais
acessı́vel – a própria instituição –, antes de se comprometerem com a prestação de serviços
a clientes externos. Esta estratégia não apenas favorece o aperfeiçoamento dos produtos
e serviços da FSA, mas também contribui para uma melhor aceitação no mercado, visto
que potenciais clientes externos podem observar e avaliar a aplicabilidade e qualidade dos
produtos e serviços já utilizados pela instituição.
Outra tendência notável é a adoção, pelas FSAs, de metodologias de desenvolvi-
mento de software baseadas no método ágil Scrum. Esta escolha segue uma tendência
observada no mercado de Fábricas de Software convencionais.
Apesar das variações nas estruturas internas, contextos e nı́veis de maturidade dos
processos, as instituições analisadas expressam unanimemente uma satisfação relativa
com os resultados obtidos após a implementação de suas respectivas FSAs. Os artigos
examinados e as respostas obtidas indicam, de maneira geral, que as FSAs conseguem
atender às expectativas iniciais das instituições após a fase de implementação, apesar dos
desafios enfrentados durante este processo.

4.2. Motivações para a implementação


A principal motivação apontada pelas Instituições de Ensino Superior (IES) pesquisadas
para a implementação de uma Fábrica de Software é a necessidade de proporcionar
experiência prática aos alunos das disciplinas relacionadas à Engenharia de Software.
Esta necessidade, além de ser prontamente reconhecida pelos professores das disciplinas,
também é uma exigência do Ministério da Educação (MEC) por meio das Diretrizes Cur-
riculares de Cursos da Área de Computação e Informática (CEEInf, 1999). Portanto, as
instituições que oferecem um ambiente de aprendizado prático mais eficaz tendem a ser
melhor avaliadas pelo MEC e a cumprir de forma mais satisfatória a missão de preparar
profissionais qualificados para o mercado de trabalho.
O segundo motivo mais apontado pelas instituições pesquisadas para a
implementação de uma FSA é a possibilidade de atender às demandas internas por soft-
ware provenientes dos diversos setores da instituição. Isso se deve principalmente à ca-
pacidade da FSA de atender a essas demandas com um custo mais baixo em comparação
com o custo de contratação de empresas especializadas. Nas IES que empregam sua FSA
para este fim, as equipes da Fábrica assumem não apenas o desenvolvimento das soluções
sistêmicas, mas também o suporte técnico necessário para garantir o funcionamento ade-
quado dos produtos utilizados. Outro fator que influencia as instituições a adotarem este
modelo é o alto nı́vel de personalização das ferramentas desenvolvidas, uma vez que são
feitas sob medida para atender às necessidades locais, ao contrário das soluções de mer-
cado, que não são totalmente adequadas a essas necessidades, pois são projetadas para
atender a um amplo espectro de clientes com diversas necessidades.
A redução da evasão e da desistência dos alunos é outro fator que leva as IES
a implementar Fábricas de Software, conforme apontado por estudos realizados. As
instituições relatam que ao criar um ambiente interativo para a aplicação dos conheci-
mentos adquiridos no curso, o interesse dos alunos tende a aumentar, diminuindo assim a
taxa de desistência. Vale ressaltar também que este é um fator particularmente importante
em contextos de crise econômica, onde cada aluno é disputado de maneira mais acirrada
pelas IES.
Algumas instituições também expressam preocupação em relação ao desenvolvi-
mento da região onde estão inseridas. Estas IES esperam que ao oferecerem serviços e
produtos de custo reduzido e com qualidade por meio de suas FSA, além de gerarem re-
cursos financeiros a serem revertidos para a própria instituição, possam também melhorar
a produtividade das empresas locais, promovendo assim um ambiente de negócios mais
robusto, onde empregos e riqueza são gerados, atraindo novos habitantes e, consequente-
mente, mais alunos, em um ciclo que beneficia todas as partes envolvidas.
Por meio de suas FSA, algumas instituições buscam promover não apenas a
capacitação adequada de seus alunos, mas também de seus professores, uma vez que estes
desempenham um papel central no acompanhamento e gerenciamento dos projetos em an-
damento na Fábrica. Isso exige que os professores permaneçam atualizados em relação às
práticas de mercado e às novas tecnologias e ferramentas. Algumas instituições incluem
nos custos de suas fábricas investimentos em treinamentos especı́ficos para os docentes
envolvidos, o que também aumenta a satisfação do profissional e, consequentemente, a
retenção de talentos em seu quadro.

4.3. Principais dificuldades enfrentadas durante o processo de implementação


A principal dificuldade frequentemente relatada diz respeito à conciliação dos horários
de disponibilidade de cada membro da equipe de desenvolvimento. Tal desafio é decor-
rente da diversidade de horários entre os alunos participantes, incluindo estagiários com
horários fixos e alunos trabalhando remotamente em horários alternativos. Essa flexibili-
dade é uma medida destinada a permitir a participação daqueles que já possuem atividades
remuneradas durante o horário convencional. Para mitigar esse problema, as instituições
estudadas tiveram que adotar ferramentas e procedimentos adequados para o trabalho re-
moto, incluindo soluções para reuniões virtuais e controle de versão dos artefatos produzi-
dos, facilitando assim a distribuição de tarefas entre um maior número de participantes.
A segunda dificuldade mais mencionada envolve a necessidade de adaptar car-
acterı́sticas especı́ficas das metodologias de desenvolvimento adotadas. Isso se deve ao
fato de que essas metodologias, como o Scrum, amplamente utilizado, foram concebidas
para aplicação em equipes compostas por profissionais experientes, com jornadas de tra-
balho extensas e horários fixos, o que não é o caso das equipes formadas por alunos de
graduação. As principais adaptações relatadas dizem respeito à frequência das reuniões
periódicas e à quantidade de documentação gerada em cada projeto. Um exemplo es-
pecı́fico dessa adaptação é a extensão dos perı́odos padrão para os ciclos de desenvolvi-
mento, conhecidos como Sprints, que normalmente são curtos, variando de um a dois dias,
mas que, nas circunstâncias das Faculdades de Software Acadêmicas (FSAs), precisam
ser mais longos, como de uma a duas semanas. No entanto, é importante destacar que isso
não necessariamente implica em um aumento do tempo de desenvolvimento, uma vez que
tal aspecto também depende de outros fatores, como o tamanho das equipes, a solidez da
base de conhecimento da instituição e a capacidade técnica dos membros, incluindo o
gerente de projeto, geralmente um professor em uma FSA.
Devido à significativa participação de alunos de graduação na mão de obra das
FSAs, a rotatividade nas equipes é particularmente alta. Os principais motivos para a
saı́da dos alunos incluem a conclusão do curso e propostas de emprego no mercado. É
relevante ressaltar que, por estarem em formação, os alunos apresentam uma curva de
aprendizado mais ı́ngreme em relação às metodologias e ferramentas adotadas, o que
constitui outra dificuldade mencionada pelas instituições pesquisadas. Para mitigar o im-
pacto desse problema e manter a continuidade das operações da Fábrica de Software,
cumprindo os prazos estabelecidos, as instituições adotam medidas como a organização
de uma base de conhecimento online e acessı́vel mediante identificação, permitindo que
novos membros das equipes se adaptem mais rapidamente à metodologia e aprendam com
as lições ali armazenadas.
Segundo algumas Instituições de Ensino Superior (IES) pesquisadas, fazer esti-
mativas em relação à capacidade de produção de cada equipe de desenvolvimento tem
sido uma tarefa desafiadora, especialmente durante os primeiros projetos da fábrica, dev-
ido à ausência de uma base histórica para previsões de esforço necessário e à alta taxa de
rotatividade entre os membros das equipes, conforme mencionado anteriormente. Essa
dificuldade tende a ser minimizada ao longo do tempo, à medida que as equipes adquirem
experiência, o repositório de artefatos reaproveitáveis cresce e a base de conhecimento
sobre os projetos anteriores possibilita a geração de dados estatı́sticos de desempenho por
tipo de componente criado.

5. Fábricas de Software em Institutos Federais


No inı́cio de 2014, o colegiado fez uma avaliação sobre o funcionamento da Fábrica de
Software e chegou à conclusão de que uma parte do conteúdo acadêmico apresentado
em sala não era utilizado na Fábrica, ou era utilizado de forma indevida. Em resumo,
havia a necessidade urgente de corrigir o rumo de alguns projetos. Esta correção tinha por
objetivo principal contribuir no desenvolvimento das tecnologias e conceitos apresentados
em sala durante o desenvolvimento dos projetos na Fábrica de Software.

5.1. Principais dificuldades enfrentadas durante o processo de implementação


A deficiência na documentação dos projetos foi identificada como a principal lacuna
em todos os empreendimentos. Movidas pela urgência de iniciar o processo de de-
senvolvimento, as equipes negligenciaram etapas fundamentais para a modelagem de
qualquer ambiente, resultando no relaxamento ou supressão das etapas que envolviam
a documentação. Entretanto, essa falha foi benéfica, pois ressaltou para todos os partic-
ipantes a importância de investir esforço e tempo nas etapas que envolvem a definição e
produção de documentação. Possivelmente, a negligência na documentação dos projetos
também contribuiu para a falta de comunicação entre os bolsistas envolvidos na Fábrica.
A produção de documentação certamente contribui para o fortalecimento e compartil-
hamento de atividades. No entanto, a falta de experiência em trabalho em equipe por
parte dos alunos bolsistas foi, sem dúvida, a principal razão para a falta de comunicação.
A dificuldade em compreender as funcionalidades a serem desenvolvidas está di-
retamente relacionada à escassa produção de documentação. É inquestionável que docu-
mentos como diagramas de classes, casos de uso e outros, que fazem parte do processo
de análise e desenvolvimento de sistemas, fornecem ferramentas essenciais para o correto
entendimento e interpretação de um ambiente. Portanto, a ausência na produção desses
documentos resulta em dificuldades no entendimento do ambiente a ser modelado e com-
preendido. Além disso, acrescenta-se a falta de experiência das equipes nas entrevistas
com os usuários dos sistemas em desenvolvimento.
Também foi identificado o problema do atraso no cronograma estabelecido para
alguns projetos, decorrente das questões relatadas anteriormente, mas também rela-
cionado à fase de montagem e adequação das equipes que trabalham nos projetos da
Fábrica.
Por fim, alguns problemas foram identificados na adoção dos recursos e boas
práticas das linguagens de programação utilizadas nos projetos. A análise dos códigos
permitiu identificar uma dificuldade por parte dos alunos em aplicar as ferramentas ap-
resentadas em sala. A otimização de código e a busca por um código limpo não eram
os objetivos primordiais do aluno ao desenvolver seu trabalho de codificação. Apesar de
terem conhecimento dos conceitos, ficou evidente que os alunos ainda não conseguiam
identificar o momento adequado para utilizar essas estruturas e conceitos.

6. Conclusão
Este estudo investigou os aspectos ligados à introdução de Fábricas de Software em
instituições de ensino superior no contexto brasileiro. Por análise documental, ques-
tionários e uma base teórica abrangente, foram identificados os motivos que impulsionam
as instituições de ensino superior a adotar uma Fábrica de Software Acadêmica, bem
como as principais dificuldades enfrentadas e outros aspectos relevantes. O trabalho ap-
resentou uma comparação entre as instituições estudadas, fornecendo percepções para
uma compreensão mais aprofundada do panorama das Fábricas de Software Acadêmicas
no Brasil e orientando futuras instituições de ensino superior que pretendem implementar
projetos semelhantes, destacando os fatores crı́ticos de sucesso e fracasso.
A implementação do projeto de Fábrica de Software Acadêmica na AEDB
(Associação Educacional Dom Bosco) implicou em ajustes na estrutura curricular de al-
gumas disciplinas do curso de Sistemas de Informação. Essas disciplinas passaram a
abordar temas relevantes de maneira mais pragmática, utilizando metodologias ativas e
seguindo as boas práticas atuais do mercado.
Consequentemente, os resultados parciais obtidos pelo projeto na AEDB e os re-
latos das demais instituições de ensino superior pesquisadas indicam que a implementação
de uma Fábrica de Software em um ambiente acadêmico tende a enriquecer a formação
dos alunos dos cursos de tecnologia. Isso ocorre ao proporcionar-lhes a experiência
prática necessária e ao trazer benefı́cios para a comunidade circundante e para a própria
instituição. Além de atender demandas internas e externas, a instituição tende a receber
um reconhecimento aprimorado quanto à qualidade de seus cursos na área de Tecnologia
da Informação.
Ao término do primeiro ano de operação da Fábrica de Software, é evidente sua
capacidade de influenciar tanto na monitorização do processo de ensino-aprendizagem
quanto na qualidade das ferramentas de suporte para o referido processo. Além disso, o
ambiente desempenha um papel catalisador em atividades de pesquisa e extensão, guiadas
pelos projetos conduzidos na própria Fábrica.
A utilização do ambiente para acompanhar a evolução do processo de ensino
em diversas disciplinas do curso foi notória durante a identificação de problemas nos
primeiros projetos. As deficiências nas etapas de documentação dos projetos destacaram
a necessidade de reforçar, com alguns alunos, os conceitos da disciplina de Engenharia
de Software. Em alguns casos, a etapa de documentação foi negligenciada devido a uma
condução inadequada do projeto, o que contribuiu para a geração de outros problemas.
A intervenção do corpo docente, por meio da atuação dos professores responsáveis pela
disciplina, resultou na revisão e aplicação dos conceitos corretos no desenvolvimento dos
projetos. No entanto, mais importante do que a revisão dos conceitos, foi a oportunidade
oferecida aos alunos de vivenciar dois ambientes distintos: um sem a aplicação adequada
das tecnologias e métodos da Engenharia de Software, e outro com a aplicação correta de
todos os conceitos pertinentes à disciplina. A comparação entre os projetos antes e depois
dessa intervenção confirmou a aplicação prática da teoria na solução de problemas reais,
uma oportunidade que só foi possı́vel devido às atividades desenvolvidas na Fábrica de
Software.
Paralelamente, os professores das disciplinas envolvidas direta ou indiretamente
em atividades da Fábrica de Software começaram a utilizar esses exemplos como ferra-
menta de discussão e explanação em sala de aula. A oferta de resultados concretos para
embasar as discussões, tanto de um conjunto de projetos quanto de uma série de tarefas
que envolvem diversas disciplinas do curso de Sistemas de Informação, atua como suporte
no processo de ensino-aprendizagem. A inclusão dos alunos em um ambiente controlado,
onde têm contato com situações do cotidiano de sua futura atividade profissional, repre-
senta um apoio prático à pedagogia.
Por fim, a Fábrica de Software também facilita a concretização de parcerias entre
o IFC e outras instituições de ensino, governamentais ou empresariais. Atualmente, as
atividades da Fábrica resultaram na formalização de parcerias com o Instituto de Trans-
porte e Trânsito de Joinville, a Capitania dos Portos de São Francisco do Sul, o Parque
de Inovação Tecnológica de Joinville e Região, e duas empresas do ramo de desenvolvi-
mento de software. Esse resultado alcançado em um ano de atividade confirma o sucesso
do projeto e empresta qualidade ao processo pedagógico.
[Casemiro José Mota1 2014], [Romanha 2016].

References
Casemiro José Mota1, Eduardo da Silva1, P. C. F. d. O. (2014). A experiência do
ambiente da fábrica de software nas atividades de ensino do curso de sistemas de
informação. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense (IFC)
Câmpus Araquari– Araquari– SC– Brasil.
Romanha, S. D. (2016). Um modelo de fábrica de software em instituições de en-
sino superior. Universidade Estadual Paulista ”Júlio de Mesquita Filho” - Campus
Guaratinguetá.

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