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II.5.13 Artigo ClimaCom 2016
II.5.13 Artigo ClimaCom 2016
Desaparecimento
Desaparecimento
Platão eternizou no mito de Atlântida, em Crítias, a LABJOR - UNICAMP
utópica civilização, criada por semideuses, de uma Prédio V da Reitoria - Piso 3
terra abundante e próspera, que se perde em sua CEP 13083-970
ambição sem limites e enfrenta, assim, a fúria de Email: climacom@unicamp.br
seus criadores e sua consequente extinção. Matriz do Fones: (19) 3521-2584 / 3521-2585 /
pensamento ocidental, o filósofo fala da inclinação das 3521-2586 / 3521-2588
nossas sociedades à corrupção e à própria danação. O
mito nos persegue por milênios e, de tão atual, é hoje DIRETOR CHEFE DE REDAÇÃO:
quase tangível: estamos diante de mudanças profundas Prof. Dr. Carlos Vogt
e, muito provavelmente, irreversíveis.
EDITORAS:
Nos últimos duzentos anos, a interferência das Profa. Dra. Susana Dias
ações do homem no planeta provocou mudanças tão Profa. Dra. Carolina Cantarino
intensas e extensas que destacam este curto período
de tempo sobre o fundo de bilhões de anos de sua EDITORA EXECUTIVA:
história e evolução. Vidas e paisagens se modificaram, Ana Godoy
quando não foram extintas, desaparecendo para
REPÓRTERES:
sempre. É nesse sentido que se discute nomear esta
Janaína Quitério (bolsista CNPq) Meghie
época “Antropoceno”, período em que as ações
Rodrigues (bolsista CNPq)
humanas sobre a Terra deixaram marcas indeléveis,
Michele Gonçalves (bolsista Fapesp)
que nos precipitam hoje para a iminência de um
futuro esfacelado. A projeção do futuro da Terra,
DESIGNER:
frente às mudanças climáticas, nos levou a retomar
Fernanda Pestana (bolsista CNPq)
um tema intrínseco ao imaginário da humanidade: o
desaparecimento. Como a consciência de que vivemos
PRODUÇÃO AUDIOVISUAL:
em uma era de mudanças intensas pode nos afetar?
Cristiane Delfina (bolsista CNPq)
Nesta edição, falaremos da luta que se trava entre
nossa força destruidora e o medo da perdição. O WEB-DESIGNER:
esforço humano pelo fazer durar, preservar, recriar Thiago La Torre (bolsista CNPq)
um futuro em que tudo que conhecemos dá lugar ao
desconhecido, uma não existência, ou uma existência
distinta. Provocador dos desaparecimentos, é o próprio
homem, afinal, o único com condições culturais de
criar, de inventar “ambientes artificiais” para que
esse desaparecimento não seja definitivo. Mas como
podemos compreender e agir sobre aquilo que vemos
desaparecer? Tal força criativa pede repensar, não
mais em soluções, mas em perguntas que ajudem a
organizar o problema. E que perguntas nos devemos
fazer?
Carlos Vogt
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Carta de
Apresentação
Catástrofe, crise, desaparecimento, extinção, ameaça, medos, riscos, descrença, colapso, desastres.
Com a intensificação da ocorrência de eventos extremos e alterações climáticas, vivemos a disseminação
de enunciados niilistas marcados pelo fim e pela vontade de nada, trazendo novo fôlego para o velho
catastrofismo. Proliferam distopias em torno de uma ausência de futuro à qual estaríamos condenados.
A sensação de que “não há saída”, por vezes, coloca-nos diante da impotência do pensamento para
avaliar situações que se tornaram impensáveis em relação ao modo com o qual estamos habituados
a lidar com o tempo, o humano, a natureza, o corpo, o espaço, a cultura, a tecnologia, a política… A
contemporaneidade lança-nos o desafio do enfrentamento da extinção de espécies animais e vegetais,
da erosão do solo, da elevação do nível da água, das modificações extremas de ambientes e paisagens,
do colapso dos recursos hídricos, mas também e, conjuntamente, do desaparecimento, erosão e colapso
das existências singulares, humanas e não humanas, aí implicadas, problematizando os modos de pensar
a preservação e a conservação, a gestão pública, e as reinvindicações por visibilidade e justiça que nos
chegam de todas as partes. Diante de tantos desaparecimentos afirma-se a urgência ética, estética e
política da criação de outros pensamentos, narrativas, conceitos, imagens, práticas, ações, fabulações,
ficções-científicas, especulações… Como podemos fazer aparecer outros modos de existência nas situações
de contingência? A partir de quais lógicas de funcionamento a comunicação, as ciências, as tecnologias, a
filosofia e as artes têm feito aparecer os desaparecimentos em seus bancos de dados, coleções, museus,
patrimônios, catálogos, acervos, inventários, pesquisas e escritas? Diante da obsessão contemporânea
com a criação de arquivos e seus movimentos de coleta, identificação, codificação e documentação,
como fazer durar o acontecimento? Como tornar possível a extração de forças de vida dos arquivos? Para
dar corpo e consistência a outros modos de dizer, escrever, ver e escutar o “Desaparecimento”, tema
desta terceira edição da revista ClimaCom Cultura Científica – Pesquisa, Jornalismo e Arte, apresentamos
duas entrevistas, com a filósofa belga Isabelle Stengers e o filósofo e sociólogo francês Bruno Latour,
e uma série instigante de produções artísticas e de artigos de pesquisadores brasileiros e também da
Austrália, Catalunha e Colômbia que põem em jogo as multidimensões do desaparecimento implicadas
nas mudanças climáticas. Não se trata apenas do que desaparece nesse complexo e mutante cenário,
mas de como o pensamento e a sensibilidade tomam para si o desaparecimento para fazer dele a ocasião
de incontáveis e surpreendentes aparições.
Ana godoy, Carolina Cantarino e Susana Dias
A revista ClimaCom Cultura Científica - pesquisa, jornalismo e arte é uma produção dos projetos de
pesquisa abaixo:
“Mudanças climáticas em experimentos interativos: comunicação e cultura científica” (CNPq - Processo
No. 458257/2013-3)
“A dimensão humana das mudanças climáticas em experimentações interativas” (Faepex-Unicamp,
Processo No. 534/14). Conta com o apoio do CNPq e MCTI
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SUMÁRIO
A revista ClimaCom Cultura Científica – pesquisa, jornalismo e arte lança, a cada dossiê quadrimestral,
uma chamada para artigos e resenhas de pesquisadores que desenvolvem estudos relacionados ao
tema proposto para a edição. Trata-se de uma revista interdisciplinar e são aceitas contribuições de
pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento, bem como estágios de formação. Os artigos e
resenhas podem ser submetidos em português, espanhol e inglês e são avaliadas por peer review.
ARTIGOS
Notas sobre um “dizer humano” – fragmentos e reverberações na/da política dos afetos
Antônio Carlos Queiroz Filho
Pág.10
O Astro do Tempo e o fim da Era: a crise ecológica e a arte de assuntar entre os quilombolas do Alto Sertão da
Bahia
Suzane de Alencar Vieira
Pág.18
Produçãodeconhecimentossobreoclima.Processoshistóricosdeexclusão/apropriaçãodesabereseterritórios
de mulheres e povos indígenas[1]
Astrid Ulloa
Pág.36
Mudanças climáticas e a cosmovisão Ashaninka
Erika Mesquita
Pág.56
O Estado sem território: o desaparecimento do território em razão da mudança climática
Mariano J. Aznar Gómez
Pág.64
Museus e um mundo comum: mudanças climáticas, cosmopolíticas e prática museológica
Ben Dibley
Pág.84
Declínio de polinizadores e mudanças climáticas
Valdir Lamim-Guedes
Pág.98
Ensaio sobre a luta da Natureza contra o desaparecimento
Carlos Junior Gontijo Rosa, Valdir Lamim-Guedes
Pág.104
RESENHAS
Ensaio sobre a luta da Natureza contra o desaparecimento
Pesquisa
Guilherme Alves de Lima Nicésio
Pág.116
ClimaCom Cultura Científica - pesquisa, jornalismo e arte Ι Vol. 03 - Ano 02 / Agosto de 2015 / ISSN 2359-4705
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ENSAIO SOBRE A LUTA DA NATUREZA CONTRA ... ARTIGOS
ARTIGOS As questões do embate entre o espaço do humano desejo (consciente ou não) de compreensão da
e do divino no mundo remetem às mitologias, experiência. Assim, a lógica poética, ao admitir
Ensaio sobre a luta da Natureza especialmente à grega, em se tratando da
cultura ocidental. O espaço-tempo mitológico
a fantasia e a imaginação, reúne as percepções
imagético-sensorial (sentir o mundo) e intelectiva
contra o desaparecimento retorna a um mundo em que as fronteiras entre
humano e divino são tênues e mutáveis. Assim,
todo conhecimento adquirido pelo homem alarga