Metamorfoses Da EP

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45º Encontro Anual da Anpocs

GT - Movimentos Sociais: Protesto e Participação

As metamorfoses da esfera pública ou


a nova mudança estrutural

Ricardo Fabrino Mendonça (UFMG/INCT-DD/Margem)


Camilo de Oliveira Aggio (UFMG/INCT-DD/Margem)
1. Introdução1

Mudança Estrutural da Esfera Pública (MEEP) é obra canônica prestes a completar 60


anos. Ao analisar, historicamente, a ascensão e a ruína de uma arena discursiva que teria se
tornado essencial à legitimação das decisões políticas, Habermas não só deu precisão à noção
de esfera pública como a dotou de densidade filosófica, sociológica e histórica para entender
a política moderna.
A obra gerou debate, revisões e muitos desdobramentos. Em alguma medida, o termo
perdeu centralidade em certos desenvolvimentos da obra Habermasiana para voltar forte e
repaginado após a tradução do livro para o inglês (o que só aconteceu em 1989). Nesse
contexto, adquiriu renovada centralidade na discussão sobre democracia, alimentando o
nascimento da abordagem deliberacionista e atraindo a ira não apenas de institucionalistas mais
ortodoxos como de agonistas e democratas da diferença.
Apesar das críticas e das inflexões ulteriores, o livro nunca perdeu seu charme, pela
sistematicidade, amplitude, densidade e elegância do argumento. Com o passar dos anos, não
foram poucos os autores e autoras a refletir sobre as mudanças continuadas da esfera pública,
sendo que o surgimento e a popularização da internet mostraram-se particularmente
importantes para essa agenda de pesquisa (Batsenkova, 2019; Bennett, Pfetsch, 2018;
Schlesinger, 2020; Stewart, Hartmann, 2020). Na mesma linha, a expansão das mídias digitais,
a lógica de aplicativos, a plataformização da web e a popularização dos smart phones renderam
relevantes veios de estudos para se compreender as configurações da esfera pública hodierna.
Temas como polarização, dinâmica das bolhas, anonimato, discursos de ódio e desinformação
tornaram-se relevantes para estudar os rumos do debate público no século XXI (Wooley,
Howard, 2019; Gomes, 2014).
Ainda parece haver, contudo, uma lacuna na tentativa de compreensão de mudanças mais
estruturais dos rumos da esfera pública. É como se a discussão contemporânea em torno do
conceito se resumisse frequentemente ao mapeamento de práticas e dilemas que marcam o
choque público de discursos na atualidade. No livro de Habermas, entretanto, a descrição do
fenômeno é informada por um profundo interesse nos fatores que teriam viabilizado o declínio
da esfera pública. Habermas discute um panorama amplo de mudanças econômicas,
comunicacionais, sociais e políticas que afetariam a esfera pública por atravessar alguns de

1
Este artigo foi produzido no âmbito do projeto “A democracia deliberativa em face da crise da democracia:
contribuições, dilemas e trilhas”, financiado pelo CNPq (processos 423218/2018-2 e 305813/2017-0) e pela
Capes (88887.370393/2019-00). Também somos gratos à Fapemig (CSA - PPM-00284-17) e à Fulbright.
seus elementos mais básicos, como a separação entre público e privado, os processos de
subjetivação e a possibilidade de se confrontar posições distintas.
Este artigo pretende retornar ao clássico habermasiano para abordar um conjunto de
fatores que, hoje, permitiriam dizer de uma nova mudança estrutural da esfera pública. O texto
se divide em duas partes. A primeira delas recoloca o argumento do clássico de 1962,
enfocando particularmente os fatores aos quais Habermas presta atenção para falar de ascensão
e declínio da Esfera Pública. Interessa-nos aí, aos moldes do trabalho de Bernard Manin que
dá título a este artigo, depurar um conjunto de eixos que permitem compreender as alterações
entre uma fase e outra, e que são entendidos como essenciais para se delinear uma mudança
estrutural. A segunda parte se volta para o que entendemos ser uma nova metamorfose
estrutural, mobilizando os mesmos eixos identificados ao longo de MEEP para compreender a
transformação mais recente.

2. Mudança Estrutural da Esfera Pública

O livro de Habermas (2003) dispensa apresentações detalhadas. Há farta e qualificada


literatura acadêmica discutindo os pormenores da obra (Calhoun, 1992; Gomes, 2008; Maia,
2007; Cardon, 2012; Fraser, 1992; Pinzani, 2009; Costa, 1995; Avritzer, 2004; Lubenow, 2015;
Oliveira, 2010; Dahlberg, 2005; Perlatto, 2015). Assim, não nos deteremos em cada passo do
argumento, optando por um sobrevoo mais simples e voltado a retomar alguns fatores que
atravessam as metamorfoses observadas entre os séculos XVII e XIX.
O percurso habermasiano começa com a ascensão da esfera pública na Europa dos
séculos XVII e XVIII. A troca pública de argumentos entre iguais a perpassar jornais, salões e
cafés foi entendida por Habermas como uma instituição central da modernidade. Operando
uma mediação entre Estado e mercado, a esfera pública viabilizava, em tese, um adensamento
argumentativo para a construção de uma opinião pública qualificada e a legitimação de
decisões políticas. Essa arena abstrata de comunicação, apesar da aparente simplicidade, não
é, todavia, uma criação banal. Habermas evidencia que placas tectônicas políticas e sociais
precisaram se mover para que ela se tornasse imaginável.
Destaca-se, em primeiro lugar, uma série de mudanças no campo da economia política e
que levam à distinção entre público e privado, como conceitos com alguma autonomia. Tais
mudanças são abrangentes e incluem transformações na estruturação da economia, em que a
noção do mercado mediando interesses em competição ganha terreno e institui a própria ideia
de sujeitos com interesses particulares. Interesses esses que embasam perspectivas distintas e
visões de mundo conflitantes, que buscam influenciar tomadores de decisão.
Com isso, salienta-se uma segunda mudança chave, que tem a ver com a transformação
política de uma ideia de soberania que migra da voluntas do soberano para uma ideia de
vontade racionalizada que precisa se justificar perante os outros. A consolidação da esfera
pública está, assim, calcada em um nascente liberalismo político que projeta uma comunidade
(excludente) de iguais e a própria ideia de um poder político exercido em nome da coletividade
e dependente do assentimento dessa coletividade. Habermas pontua que a burguesia,
diferentemente de outros grupos históricos, controla o poder político sem tomá-lo, por meio de
um processo de racionalização das decisões políticas calcado na argumentação e na
publicidade.
Um terceiro elemento fundamental na ascensão da esfera pública burguesa é a existência
de sujeitos críticos, capazes de pensar individualmente. A invenção da impressão e a difusão
dos romances lidos individualmente teriam tido aí papel fundamental ao permitir interpretações
individualizadas. Vale lembrar que a própria reforma protestante propunha um contato direto
entre sujeitos e Deus, apregoando a possibilidade da leitura individualizada da Bíblia e não por
meio da mediação sacerdotal. Habermas também nota mudanças na arquitetura (pelo menos
das casas burguesas), com a separação mais clara entre o espaço privado dos quartos e
banheiros e as salas para encontros e contatos com outras pessoas. Aqui, também, notam-se
não apenas marcações que distinguem público e privado, mas também a concretização de uma
ideia de que a intimidade do privado é fundamental para que haja choque público de visões e
argumentos.
O quarto fator trabalhado por Habermas em MEEP que nos interessa destacar aqui é uma
mudança no ecossistema comunicacional. A consolidação de uma imprensa opinativa de ampla
circulação teria sido essencial para criar uma infraestrutura discursiva que permitiu o fluxo de
visões privadas sobre questões de interesse público. Como porta-vozes de visões de mundo
singulares, eles possibilitaram que debates ocorram tanto por meio do confronto de artigos e
periódicos, como na apropriação que indivíduos críticos fazem deles em discussões orais
travadas em espaços de caráter mais público.
Em MEEP, o século XIX e o início do século XX seriam palco de mudanças estruturais
que geraram uma metamorfose profunda na esfera pública. Em linhas muito gerais, Habermas
aponta que as condições de intercâmbio argumentativo racional e legitimador teriam sido
minadas e que a esfera pública teria sido esvaziada de seu potencial crítico, tornando-se apenas
vitrine de visibilidade para aclamação de interesses privados. Teriam contribuído para esta
mudança muitos fatores, interessando-nos focar nos mesmos eixos supraexplorados. Adotando
uma estratégia argumentativa especular, inverteremos a ordem dos fatores que apresentamos
para abordar a ascensão.
Habermas assinala que o jornalismo passou por mudanças muito significativas a partir
do século XIX, deixando de ser uma tribuna para a vocalização de visões particulares sobre
questões de interesse público para se transformar em produto de empresas que visam ao lucro.
Com isso, a própria dimensão crítica do debate público teria dado lugar a uma lógica de
divulgação de interesses privados com fins mercadológicos. Nas palavras de Habermas, (2003,
p. 207):
Está rebentado o campo de ressonância de uma camada culta, criada para usar
publicamente a razão, o público fragmentado em minorias de especialistas que não
pensam publicamente e uma grande massa de consumidores por meio da
comunicação pública de massa. Com isso, perdeu-se sobretudo a forma de
comunicação específica de um público.

Paralelamente à erosão do tirocínio público midiático, e vinculado a ele, Habermas


(2003) identifica uma mudança social, ligada à massificação de indivíduos, cada vez menos
capazes do exercício da crítica. Na linha da primeira geração de Frankfurt, Habermas vê, no
gozo cotidiano e imediato do entretenimento fragmentado da comunicação de massa, um
elemento estruturador de uma massa dessingularizada e destituída de pensamento crítico
autônomo.
Nesse cenário, a própria política teria se reconfigurado, deixando de operar com o
princípio normativo de uma racionalização pública legitimatória e se refeudalizando por
construir decisões privadas para mera aclamação pública. Nessa política, a publicidade
kantiana, estruturadora de virtudes, teria dado lugar a uma publicidade-propaganda que
alimenta a conformação da massa. Nesse império das relações públicas (nos termos de
Habermas), a comunicação seria instrumento coercitivo de persuasão para viabilizar interesses
privados sem maiores preocupações com uma dimensão pública. Nessa linha, Habermas (2003,
p. 239) identifica um enfraquecimento do parlamento, que teria sido “degradado a uma
assembleia de facções”. Não mais haveria esclarecimento recíproco e representação de visões
privadas concernentes à coletividade, mas publicização de interesses privado-particulares. A
opinião pública seria fabricada, surgindo a importância de se trabalhá-la, para a melhor
implantação desses interesses.
O último fator a ser aqui abordado é a interpenetração entre público e privado gerado por
desdobramentos do avanço do Estado social-democrata e de políticas sociais. Habermas aponta
uma crescente autonomização administrativa do Estado além de uma ocupação da esfera
pública por interesses particulares, em busca de ratificação coletiva e prestígio. “A esfera
pública política do Estado da social-democracia [...] [e]nquanto configuração decadente da
esfera pública burguesa, dá espaço a uma publicidade demonstrativa e manipulativa
desenvolvida por sobre as cabeças do público aí intermediado.” (Habermas, 2003, p. 270).
Haveria um antagonismo estruturalmente insuperável de interesses, limitando as possibilidades
de construção racional da legitimidade política voltada ao interesse público.
De forma muito sintética, assim, é possível mapear o argumento de MEEP como a
apresentação de duas grandes metamorfoses atravessadas por quatro fatores. Tal como nas
metamorfoses do governo representativo estudadas por Manin, é possível identificar alguns
eixos para olhar historicamente para a esfera pública, havendo uma primeira configuração (que
consiste no próprio surgimento da esfera pública) e uma metamorfose, que Habermas (2003)
entende, em um primeiro momento, como a ruína da esfera pública. O quadro abaixo sintetiza
esses dois momentos a partir dos quatro fatores abordados.

3. A nova metamorfose da esfera pública

Apesar de todo o debate em torno de MEEP e das várias críticas e atualizações do


conceito (Habermas, 1992; 1997), ainda são raras discussões mais amplas e estruturadas sobre
a hipótese de uma nova metamorfose da esfera pública (Stewart e Hartmann, 2020; Celikates,
2016; Keane, 1995). Houve e há muita discussão sobre os impactos da internet sobre a esfera
pública (Gerhards e Schäfer, 2009; Dean, 2003; Dahlgren, 2005; Papacharissi, 2002; Gimmler,
2001; Maia 2008; Dahlberg, 1998; Ferree et al, 2002; Gomes, 2014; Schafer, 2015; Mendonça
e Amaral, 2016; Mendonça, Sampaio e Barros, 2016; Chambers e Gastil, 2021), mas persiste
a relativa lacuna de uma visão mais estruturada e focada nas implicações de outros fatores
sociais e econômicos sobre as configurações contemporâneas da esfera pública.
Neste artigo, buscamos insinuar alguns passos na direção desta complexa agenda
explorando o que entendemos como uma “nova” metamorfose, que levaria a uma terceira
configuração da esfera pública. A palavra nova está entre aspas na frase anterior porque
entendemos que esta mudança não é recente e nem foi abrupta, mas, tal como as metamorfoses
anteriores, foi decantada ao longo de décadas a partir do cruzamento de vários fatores.
Por razões que detalharemos abaixo, é possível argumentar a existência de uma nova
mudança estrutural da esfera pública a partir do último quartil do século XX, quando um
conjunto de transformações tem início. A crise do petróleo, o avanço do neoliberalismo real, a
queda da União Soviética e a valorização da sociedade civil na terceira onda de democratização
confluem no sentido de enfraquecimento do papel do Estado e de valorização da agência
individual. A partir dos anos 1990, a democratização do acesso à internet com o
desenvolvimento da world wide web é precursora do cenário de abundância comunicativa do
século XXI, com a dinâmica frenética das redes sociais digitais, a plataformização da web e a
popularização de smart phones e da lógica dos aplicativos. A aposta na customização e as reais
possibilidades de práticas e comunicações mais individualizadas afetaram significativamente
a própria ideia do público que atravessava a esfera pública. Há, assim, não apenas uma
intensificação de certas tendências da metamorfose anterior, mas alterações estruturais em
como se processam as trocas discursivas em público.
Nas subseções abaixo, abordamos cada um dos quatro eixos que mobilizamos para
entender as duas primeiras configurações da esfera pública tal como discutidas por Habermas.
Embora esse procedimento feche alguns veios alternativos de argumentação, com a inclusão
de outros fatores, entendemos que a sistematicidade didática por ele possibilitada é benéfica
para a estruturação mais clara de nossa visão.

3.1. Economia política: a ascensão do neoliberaslismo


Habermas publicou MEEP em 1962, momento de auge do Welfare State e da era de
ouro do capitalismo. As preocupações do final da obra com a sobreposição entre público e
privado no Estado social-democrata dizem de um cenário estruturalmente diferente daquele
que começaria a despontar pouco mais de uma década mais tarde. Com a ineficácia de soluções
keynesianas diante da estagflação gerada pela crise do petróleo nos anos 1970, o que se viu foi
uma guinada que revitalizou o ideário neoliberal em gestação desde os anos 1940. Apregoando
políticas de desregulamentação, de privatização, de restabelecimento das taxas “naturais” de
desemprego, de taxação regressiva e de combate aos sindicatos, o neoliberalismo se difundiu
por contextos tão distintos como o Chile, os EUA, a Inglaterra, a Nova Zelândia, a Dinamarca
e o Peru (Anderson, 1996). Na prática, essas experiências (dentre tantas outras) foram muito
diferentes, embora se atravessem por um objetivo político: o combate ao coletivismo e a defesa
do indivíduo como instância central da política e da economia (Biebricher, 2019; Brown,
2019).
É preciso lembrar aqui que o momento de implementação dessas ideias é justamente a
década de 1980, quando a centralidade do Estado é questionada por várias frentes, seja na
abertura do leste europeu ou na redemocratização da América Latina. Ainda que o Estado tenha
sido protagonista na implementação do neoliberalismo, ao realizar reformas radicais e
impopulares em contextos como o Chile de Pinochet (Klein, 2007), o discurso é muito centrado
no indivíduo e nas suas capacidades. Isso fortaleceu toda uma dinâmica não só anti-Estado,
mas também anti-sociedade (Brown, 2019), que se beneficiou de discursos emancipatórios para
reduzir capacidades socioestatais, naquilo que Dagnino (2002) chamou de confluência
perversa.
No que diz respeito às fronteiras entre público e privado, este contexto é profundamente
distinto do de meados do século XX. É como se a própria ideia de público perdesse potência
normativa diante do império do privado. Recrudesce, inclusive a centralidade da privatização
do cuidado (Fraser, 2016; Biroli, 2020) diante de um discurso da austeridade que debilita a
capacidade e a possibilidade de agência do Estado (Offe, 2013). Se, na esfera pública
refeudalizada de Habermas, argumentos privados eram entendidos como travestidos de
públicos para encenarem um debate ampliado, o neoliberalismo parece minar a própria
dimensão normativa do interesse público, entendido como inexistente, perigoso e autoritário.
O privado é, em si, valorado e pode se apresentar publicamente como tal, dado que a esfera
pública passa a ser entendida como o espaço do confronto entre cidadãos privados sobre seus
interesses privados.
Nesse sentido, nesse plano da economia política, mais do que as fronteiras borradas
entre público e privado, há uma hipertrofia do privado, que só reconhece a centralidade do
público (e do estatal) nos momentos de colapso. É isso o que, de alguma forma, tanto a crise
de 2008 como a pandemia de Covid-19 deixaram claro. A mão invisível do Estado precisa
proteger os interesses privados nos momentos de crise profunda, justamente para que o motor
privado da economia siga se movimentando. As corporações e bancos americanos foram
taxados de “too big to fail” em 2008 e necessitaram de resgate vultoso para impedir um colapso
generalizado. Os clamores por programas de auxílio e investimento em empresas e cidadãos
privados também foram a tônica das ações de muitos países na pandemia (ou, pelo menos, a
demanda por eles) diante da impossibilidade de sobrevivência individualizada. E, mesmo
assim, nesses contextos, as tendências individualizantes e anti-público mostraram sua
eloquência seja nos movimentos anti-vacina, seja na prescrição de mais privatização e
desregulamentação como forma de lidar com as crises. As disputas por vacinas e a geopolítica
pós-pandêmica também evidenciam os limites de qualquer visão não privatista na atualidade.
No contexto de hipotrofia do público viabilizado pelo neoliberalismo, o indivíduo nem
sempre está só, contudo. Se Maffesoli via algum potencial de criação de oposição ao
individualismo no tribalismo da modernidade tardia, entendemo-lo como expressão da mesma
lógica privatista que mina as possibilidades do público. Se se torna impensável e praticamente
impossível um espírito de coletividade mais amplo em torno de interesses públicos e
republicanos, resta agregar-se aos semelhantes em alguma tentativa de segurança, e imposição
sobre outros interesses em competição. Farinha pouca, meu pirão primeiro, diz o velho ditado
brasileiro. O fato de a tribo buscar minar a chance de outros chegarem à gamela não torna a
situação menos individualista e privatizante.
Das perspectivas emancipatórias progressistas ao neoconservadorismo contemporâneo,
nota-se uma tendência contínua, sistemática e supraideológica de juntar-se aos seus, contra os
outros, em sociedades em que a própria ideia do público parece se esvair. Ninguém solta a mão
de ninguém, de um lado, e irmão compra de irmão, de outro, são frases que só fazem sentido
se se qualifica de forma bem delimitada quem é “ninguém” e quem é “irmão”. A própria ideia
de construção de um público, base da possibilidade de esfera pública, vê-se desafiada de forma
muito mais profunda que no Estado social-democrata de que falava Habermas.
Isso ajuda a entender a intensificação do antagonismo nas trocas públicas de discurso e
a configuração de arenas comunicacionais em que é preciso sempre gritar para se fazer ouvido,
não pelos outros, mas pelos seus. Na cacofonia da esfera pública hodierna, cada um fala o que
quer e encontra grupos homofílicos para receber endossos, congratulações e reflexões
semelhantes. Mais do que as bolhas ideológicas que afastariam os indivíduos da exposição ao
contraditório, tem-se a formação de grupos cada vez mais coesos em suas crenças, opiniões e
atitudes que, ainda que expostos ao diferente, criam blindagens resistentes às suas influências.
A lógica de fortalecimento do privado frente à erosão do público também se manifesta
arquitetonicamente. Se Habermas vinculara a ascensão da esfera pública burguesa a uma
separação bem marcada entre público e privado, a arquitetura contemporânea dá sinais
cotidianos de privatização do público (O’Donnel, 1988) por meio de práticas de gentrificação
ou apropriação de áreas comuns (Holston, 2003). Paralelamente, nota-se o fortalecimento da
dinâmica privada de condomínios (Andrés, 2021), o crescente investimento em segurança
(Nixon, 2011) e o progressivo abandono daquilo que é comum e não privatizável. A cidade
neoliberal está fundamentalmente calcada na tensão permanente entre mega-projetos privados
e as redes e dinâmicas informais de ocupação individualizada do solo.
A informalidade flexível das lógicas individuais também é a marca de mudanças
estruturais na arena do trabalho. Diante da drástica redução do número de empregos e da erosão
de direitos fundamentais, processos de uberização e empreendedorismo convocam os
indivíduos a se reinventarem com autonomia. Trata-se de indivíduos responsáveis por si que
não têm com quem mais contar em situações de emergência, dada não apenas a erosão do
público, mas também da própria ideia de um empregador responsável ou de sindicatos que
atuem em nome da coletividade. Esses aspectos nos levam ao próximo eixo de discussão.

3.2. Natureza dos processos de subjetivação e a formação de sujeitos críticos


Em MEEP, Habermas fez toda uma discussão sobre processos de subjetivação, como
explorado anteriormente. A ascensão da esfera pública burguesa dependeu, fundamentalmente,
de condições para que houvesse indivíduos críticos e capazes de trocar argumentos acerca de
questões de interesse público. Foi necessário que houvesse pessoas lendo individualmente,
formulando posições e as expressando publicamente para que a esfera pública surgisse. Da
mesma forma, a refeudalização da esfera pública esteve profundamente marcada por uma
erosão dessa capacidade de crítica e ação autônoma, o que teria fomentado formas de
manipulação. A visibilidade teria passado a ser mobilizada para aclamação, em vez de tirocínio
público.
A nova metamorfose estrutural que propomos aqui não desponta de alguma mudança
fundamental na capacidade crítica. Como o próprio Habermas (1992) reviu posteriormente,
entendemos que essa capacidade nunca deixou de existir, em alguma medida e de alguma forma
(Gomes, 2008). A esfera pública contemporânea está povoada por sujeitos convictos e críticos,
ávidos por expressar suas visões sobre tudo e sobre todos. O que parece ter se enfraquecido,
todavia, é a percepção desses sujeitos como seres sociais e parte de uma coletividade.
Wendy Brown (2015) dedicou um de seus livros mais recentes justamente a esta
problemática. Na visão dela, um dos grandes desafios da política democrática atual é,
justamente, a consolidação de processos de subjetivação que minam as condições de argumento
do demos. Brown (2015, p. 17) parte do mesmo pressuposto de Biebricher (2019) para defender
que o neoliberalismo é, mais que um modelo econômico, uma forma peculiar de razão que
configura todos os aspectos da existência em termos econômicos, o que tem profundas
implicações políticas.
Haveria, assim, uma radicalização da centralidade do Homo oeconomicus, com a
generalização de algumas premissas para a compreensão dos seres humanos. Em primeiro
lugar, os sujeitos são pensados (e se veem) em persistente risco do fracasso. A ideia de
estabilidade, segurança e continuidade é substituída por um contínuo risco de caos a depender
da capacidade de cada indivíduo de lidar com os lances da sorte da vida. Em segundo lugar,
Brown (2015) afirma haver uma definição da desigualdade como uma relação entre capitais
em competição. Há uma naturalização da ideia de que assimetrias existem porque alguns foram
mais capazes e aptos do que outros.
Em terceiro lugar, haveria uma elisão do trabalho e de sua expressão coletiva. Tudo é
capital e cada indivíduo é uma firma; um empreendimento arriscado e em competição com os
outros. O próprio trabalho deixa de ser balizado por algumas regras e direitos conquistados, na
medida em que não é trabalho, mas “colaboração” mediada, frequentemente, por uma
plataforma impessoal. A ideia de classe, que é bastante diferente da de tribo, não faz sentido
neste contexto. Entidades como sindicatos, movimentos sociais e associações são
ressignificadas e profundamente alteradas por um cenário de crescente individualização
(Hartmann e Honneth, 2006; Bennett e Segerberg, 2013; Bimber et al, 2012; Mendonça, 2017).
Nesse sentido, e em quarto lugar, Brown (2015) aponta que desaparecem as bases da
cidadania preocupadas com questões públicas. No cada um por si neoliberal, qualquer
concessão, benefício, direito ou garantia não pode ser interpretado como algo que promove o
interesse comum e a comunidade de iguais. Não há iguais nem comunidade, mas competição
entre capitais. Por isso, e em quinto lugar, ao Estado não pode caber mais do que a promoção
do crescimento econômico e a garantia de alguma competição. Justiça social não está em
questão, porque o social sequer é visto como existente (Brown, 2019). Cada capital humano
deve investir em si e se responsabilizar pelo seu projeto de expansão e sobrevivência (Fraser,
2017).
É esse conjunto de fatores que leva Wendy Brown a apontar o esgarçamento do demos.
O público perde potência normativa, e a defesa do privado pelos privados é entendida não
apenas como prática recorrente, mas como o horizonte normativo a ser perseguido. A esfera
pública é restrita a uma arena de confrontos privados, o que ajuda a entender o vale tudo da
política contemporânea, ou o não respeito às regras informais necessárias à coexistência
(Levitsky e Ziblatt, 2018) A publicidade não exerce o mesmo tipo de constrangimento que o
vislumbrado por Habermas, porque nada mais é do que a explicitação do mundo como ele é.
Dos adversários, não se espera que se constranjam em nome de interesses públicos. A
visibilidade só constrange pelo ataque coordenado de vexação pública. É possível dizer quase
tudo em público, desde que haja endossos entusiasmados e uma ausência de instituições
capazes de estabelecer certas balizas com autoridade (Bennett e Livingston, 2021).
Há, ainda, um segundo fator a impactar processos de subjetivação neste contexto que
gostaríamos de assinalar. Se Habermas (2003) vincula o surgimento de indivíduos críticos à
imprensa e (em MEEP) a massificação acrítica de pessoas à comercialização de meios de
massa, o cenário comunicacional atual é radicalmente distinto. Fragmentação, customização,
velocidade e saturação informacional são alguns dos fatores que atravessam os processos por
meio dos quais sujeitos se fazem sujeitos. Reconhecendo a plasticidade de nossos circuitos
neurais, Nixon (2011) avalia o impacto deste contexto comunicacional no delineamento de um
estado de permanente atenção parcial e insensibilidade ao não imediato. As consequências da
fragmentação customizada na forma como indivíduos percebem a realidade e se posicionam
frente aos outros também é tratada por ampla literatura. O apego afetivo a concepções
endossadas por círculos próximos é uma das marcas da radicalização polarizada da política
contemporânea (Talisse, 2019; Mason, 2018; Achen e Bartels, 2016; Iyengar, Lelkes e Sood,
2012).
Abordaremos com mais vagar, na próxima seção, as características desse contexto
comunicativo, mas chamamos a atenção, aqui, para a reconfiguração das condições em que
processos de subjetivação se estruturam. A esfera pública se vê ocupada por particulares que
são sujeitos críticos e relativamente autônomos (Hartmann e Honneth, 2006), mas que são
muito distintos daqueles descritos por Habermas (2003) nas duas fases mapeadas em MEEP.
Particulares profundamente marcados por lógicas em que a própria ideia mais geral de um
público não parece fazer muito sentido. E em que a velocidade saturada dos acontecimentos
demanda atenção difusa e efêmera a uma avalanche de debates tópicos. Com instituições
enfraquecidas (Bennett e Livingston, 2021) e sem as referências muito precisas de balizas
gerais, o ponto de ancoragem dos indivíduos é fundamentalmente o das identificações afetivas
com a tribo. São essas identificações que oferecem parâmetros, balizas e valores pelos quais
sujeitos se projetam, entendem-se e se digladiam. Em público, como tribos particulares.

3.3. Ecossistema comunicacional


Mencionamos no fim da última subseção que a configuração do ecossistema
comunicacional contemporâneo tem implicações profundas no processo de formação de
subjetividades. Obviamente, contudo, seu impacto sobre a esfera pública é estrutural em vários
sentidos, o que demanda um olhar mais atento sobre essa configuração. Lembremos que a
espinha dorsal de MEEP é justamente a discussão de mudanças na forma como fluxos
comunicacionais circulam socialmente. Se há uma nova metamorfose estrutural, como
defendemos, é preciso abordar esses elementos.
A noção de abundância comunicativa (Keane, 2020) é um designador conceitual com
capacidade de traduzir o atual estágio de relações comunicacionais. A expressão dá conta da
sobreposição intensa e multimodal de signos que circulam com velocidade e são facilmente
resgatáveis e encontráveis. Ela ajuda a pensar o onipresente e disperso consumo de informações
que são mediadas por dispositivos, aplicativos e plataformas digitais com graus variados de
proximidade, contato e conexões – aquilo que alguns pesquisadores têm designado como a
plataformização da vida (Van Dijck, Poell and Waal, 2018). Essa condição, com aspectos
visivelmente estruturais, tem implicações diversas para a esfera pública, impactando a própria
configuração do que é discutido e de como essa discussão acontece. No que se segue,
buscaremos abordar algumas dessas mudanças e suas consequências.
Começamos pelas mudanças relativas à acessibilidade, que sempre foi entendida como
requisito normativo para uma esfera pública inclusiva e, potencialmente, universal. Não há
como negar que o cenário de abundância comunicativa amplia o acesso a palcos discursivos de
formas inimagináveis. Obviamente, muitas assimetrias permanecem e postar algo no oceano
de mensagens não significa ser considerado e fazer parte de um debate mais amplo. Mas o
número de cidadãos e cidadãs, em escala mundial, com acesso a arenas de discussão não
encontra correspondente em nenhum outro período histórico. E se mais gente tem acesso a
arenas discursivas, também há de se destacar que documentos, discursos, dados e informações
também se tornaram, em grande medida mais acessíveis, como bem discute Keane (2013).
Esse tremendo incremento participativo em arenas públicas, mediadas pelas plataformas
digitais, não tem consequências apenas democratizantes, contudo. A incrível ampliação de
acesso e participação não se traduziu, por exemplo e de forma sistemática, em melhorias
epistêmicas na vida social e política das sociedades contemporâneas (Allcott, Gentzkow, 2017;
Benkler, Farris, Roberts, 2018; Lazer et. al., 2018; Chambers, 2021; Bennett e Livingston,
2021). Essa questão não diz respeito a uma frustração de perspectivas idealistas de realização
plena dos requisitos normativos de esfera pública e do alcance final de uma sociedade movida
por troca pública de razões, reciprocidade e cooperação argumentativa. Trata-se do fato de que
uma maior quantidade de participantes nessas arenas públicas tem revelado, na experiência
concreta de engajamento, a ampla tribalização de grupos, rivalidades beligerantes e,
principalmente, isolamentos epistêmicos (Benkler, Faris, Roberts, 2018; D’Ancona, 2018;
Keen, 2007).
A robustez participativa da abundância comunicativa nos tem entregue uma evidente
fragmentação polarizada de discussões, algo que Dominique Wolton (1999) temia ainda no
século XX. Ainda que pesquisas recentes mostrem limites e porosidades das bolhas discursivas
construídas (Cardenal et al., 2019; Dubois, Blank, 2018), há farta literatura debruçada sobre a
tendência de discussões muito mais dispersas e, frequentemente, correndo em paralelo (Mutz,
2006; Lev-On e Manin, 2009; Hindman, 2009) A blindagem entre grupos e a formação de
comunidades epistêmicas tribalizadas confrontam a própria noção de público como uma
condição fundamental para a própria experiência social e política da esfera pública. Em outras
palavras, como defendem Benkler, Faris, Roberts (2018), as experiências contemporâneas de
abundância comunicativa, da quase onipresença de indivíduos e grupos conectados em
plataformas digitais, têm enfraquecido as estruturas modernas fundamentais de sustentação da
vida pública por meio da crescente inviabilização das nossas capacidades de nos
reconhecermos como público.
Isolados em seus grupos, indivíduos confeccionam suas próprias epistemologias, seus
sistemas de crenças e valores que constituem suas identidades sociais, não raras vezes, numa
lógica de afirmação em oposição a outros grupos. Perdem força não apenas as instituições em
que se confiava para mediar conflitos epistêmicos (Bennett e Livingston, 2021), mas também
os próprios parâmetros para julgamentos factuais e morais, como temia Arendt. Nesse contexto
de crise epistêmica, o enfraquecimento das relações fiduciárias do público com instâncias e
instituições de produção de conhecimento, faz com que estas se vejam rivalizadas, cada vez
mais, por “fatos alternativos”, “perspectivas experienciais”, conspiracionismos e
negacionismos científicos sustentados por atores sociais e políticos alçados à condição de
autoridades e especialistas pelas lógicas de distribuição de capital social em redes digitais (Da
Empoli, 2019; Muirhead, Rosenblum, 2019; Mendonça e Bernardes, 2021).
O surgimento e popularização de novas lideranças às quais centenas de milhares de
cidadãos e cidadãs atribuem autoridade sobre determinados temas, assuntos e especialidades
nas plataformas digitais são caracterizadores desse nosso zeitgeist epistemológico. E a
relevância desse fenômeno se torna ainda mais grave na medida em que tais personalidades
passam a se tornar referências e reais influências em instituições responsáveis por decisões que
afetam a coletividade. Trata-se, como defende Andrew Keen (2007), de desdobramentos do
culto ao amadorismo característico das redes digitais.
Além dos paradoxos despertados pela ampliação da acessibilidade, o cenário de
abundância comunicativa é marcado por uma alteração profunda no regime de visibilidade. Se,
por um lado, o modelo tradicional de concentração da comunicação de massa teve a capacidade
de constranger os termos de debates, por outro, teve a capacidade de estabelecer, em alguma
medida, valores e lógicas deontológicas de operação em comum, inclusive no que diz respeito
à seleção de fontes consideradas autorizadas por suas competências e especialidades
reconhecidas institucionalmente. Quando pensamos no atual modelo mais descentralizado,
temos outro cenário em que há um evidente enfraquecimento da unificação de normas, valores
e práticas usadas para distinguir fatos de falsidades. O ecossistema comunicacional que abriga
atualmente esse fluxo intenso e inigualável de presencialidades em arenas de interação social
e política é caracterizado por Andrew Chadwick como um sistema híbrido (2017).
Nele, fluxos de diversas origens, em múltiplas plataformas e variadas formas se
entrecruzam para estruturar uma ambiência de velozes sobreposições e traduções. Há, assim,
um regime de adaptações do já conhecido pelas novas possibilidades recursivas do presente. A
mesma plataforma que permite a um jovem gamer se tornar uma liderança de opinião com
milhões de seguidores é também usada por grande parte do jornalismo tradicional, seja de
televisão, rádio ou impresso, para fazer circular os seus produtos. Há uma infinidade de vias
de conexão que fazem com que diferentes plataformas digitais e veículos de comunicação
estabeleçam complexas relações de alimentação e retroalimentação: do boato do Whatsapp que
ganha reverberação em um telejornal e alimenta as discussões no Twitter, Facebook ou
Instagram e retorna ao ponto de origem ao vídeo que ganha centenas de milhares de
visualizações no Instagram e pauta a manifestação de alguma autoridade pública no Twitter e
alimenta as tretas em grupos de família no Telegram.
Por um lado, esse regime de intensa, e relativamente anárquica, circulação de conteúdos
oferece possibilidades à esfera pública, visto conectar discussões em diferentes formatos e
arenas. Isso abre brechas de visibilidade que podem afetar a agenda pública. Por outro lado, há
riscos, mais do que materializados, de saturação informacional e da profusão da desinformação.
Desinformação esta que inclui desde o compartilhamento de inverdades em textos que circulam
no Whatsapp até a criação de deep fakes no Tik Tok. Redes orgânicas alimentadas pela
reiteração sistemática da função fática da linguagem, em memes de Bom Dia (Mendonça e
Chagas, 2021), por exemplo, asseguram a existência de vias sempre diversas e capilarizadas
para a divulgação de mensagens, difíceis de serem rastreadas ou interrompidas. Curiosamente,
há uma esfera pública que é, simultaneamente, muito visível e, paradoxalmente, relativamente
invisível. Há um público não público em um sistema comunicacional com engrenagens opacas
e fluxos difusos de difícil rastreio, o que implica um desafio imenso para seu controle social e
regulamentação se comparado com os veículos massivos tradicionais.
Cardon (2012) faz interessante discussão sobre o jogo de luz e sombra da esfera pública
contemporânea. Como não há clareza exata se o que se diz é privado ou público e nem sobre
como definir o que é de interesse público, tem-se um contexto sempre borrado entre a
visibilidade e a invisibilidade em que não somente jornalistas falam de questões de interesse
público, mas anônimos falam sobre anônimos, projetando-os publicamente.
Além da acessibilidade e da visibilidade, o ecossistema de abundância comunicativa traz
transformações profundas à esfera pública em termos de agência. As discussões se processam
não apenas entre humanos, mas são atravessadas por bots que alteram significativamente o
terreno do debate público. Se curtidas e compartilhamentos podem sinalizar adesão a certas
ideias, o impulsionamento automatizado de mensagens enquadra o campo de muitas
discussões, preenchendo-o de afetos intensos antes mesmo que razões sejam intercambiadas
(caso venham a ser). Robôs comentam, interagem, vociferam e elogiam balizando a arena de
discussão e tornando impossível separá-los da discussão. Sistemas automatizados são assim
agentes de fato da esfera pública atual, não só porque dela participam, mas porque afetam
profundamente comportamentos individuais e debates públicos com efeitos sobre a vida
política (Wooley e Howard, 2019).
Ao reconhecer esta questão, referimo-nos, assim, não apenas a perfis automatizados em
mídias digitais. Os algoritmos destas plataformas, em suas constantes e velozes decisões, criam
dependências de trajetória e balizam o debate público, além de estruturarem affordances que
atravessam comportamentos individuais. Parece-nos impossível negar que se trata de um
cenário radicalmente distinto dos dois analisados por Habermas em MEEP. Um cenário em
que o gatekeeping exercido por instituições é distinto daquele feito pela imprensa, por exemplo.
Ele se manifesta de forma menos visível e responsabilizável, sendo, assim, de difícil escrutínio
e questionamento.
Entre as mudanças em termos agência, há de se destacar, ainda, o papel do anonimato no
ecossistema comunicacional contemporâneo. Nos estudos sobre internet, sempre houve quem
sonhasse que o anonimato das redes poderia viabilizar dinâmicas argumentativas em que razões
valeriam pelo seu valor de uso e não pelas características ou posições de quem as profere. Na
prática, o que se viu foi, em grande medida, uma proteção ao que, nos anos 1990, se chamava
de flaming. (Hutchens, Cicchirillo, Hmielowski, 2015) As trocas ríspidas, agressivas e vorazes
das mídias sociais viabilizaram a construção de debates mais inflamados, frequentemente
protegidos pelo anonimato. Para além do comportamento dos anônimos, contudo, constituiu-
se, pouco a pouco, uma gramática que baliza as interações e que é marcada pelo “lacre”, ou
seja, pela capacidade de encerrar a discussão. Vale uma boa tirada, uma ironia fina, um meme
bem colocado ou mesmo um ataque agressivo para encerrar a argumentação e expor as falhas
morais do interlocutor. Vence quem resiste e consegue mais endossos.
Com isso retomamos o tema anteriormente citado da formação de públicos. Públicos
efêmeros e dinâmicos se estruturam com muita velocidade em torno de controvérsias
parcialmente fugazes. Dizemos parcialmente fugazes, porque alguns temas se fazem
recorrentes e costuram vários acontecimentos. As tretas mudam com velocidade e mal
lembramos a desta manhã, mas elas podem costurar discussões mais amplas que mobilizam
argumentos, reflexões e afetos de forma mais continuada. Pense-se nas questões raciais ou nas
idas e vindas da pandemia, por exemplo.
Seria incorreto e inadequado supor inexistência de discussões online ou mesmo a
destituição das mesmas do provimento de razões. A esfera pública não se converteu em vitrine
sem discussão. Há controvérsia, há dúvida, há elaboração argumentativa e muito engajamento
visível a audiências ampliadas (Gomes, 2014). Há, contudo, como vimos, um cenário em que
a discussão não parece fundamentalmente voltada a convencer o interlocutor. Busca-se
convencer (e mobilizar) audiências, por meio do atrito com interlocutores diretos. Procuram-
se argumentos que afetam os interlocutores diretos e as audiências, envolvendo a controvérsia
em uma lógica fundamentalmente adversarial. Mobilizam-se tribos em apoio e em ataque a
certos argumentos, visto que, na esfera pública contemporânea, em que todos falam ao mesmo
tempo, quem não grita, não se faz ouvido.
Por fim, há um último elemento neste eixo que gostaríamos de abordar e que, embora já
tangenciado, merece discussão. Em MEEP, Habermas devota atenção rigorosa às
transformações do jornalismo. Se a imprensa está na base da ascensão da esfera pública
burguesa, as empresas de comunicação produzindo notícias como relações públicas seriam o
alicerce de sua refeudalização. A nova mudança estrutural também foi profundamente marcada
por transformações do jornalismo. Tais transformações possuem várias camadas que envolvem
a crise econômica de veículos de imprensa, a migração para o online, a mudança de padrões e
rotinas com a incorporação de conteúdos produzidos pelo próprio público e a competição com
veículos e blogs pautados por lógicas que não as que guiam o jornalismo.
Merece destaque o surgimento do chamado “jornalismo das fontes” e sua variante
subsequente com lives em várias plataformas e canais de Youtube, em que influenciadores e
autoridades formulam, editam e controlam seus próprios proferimentos. Curiosamente, no
contexto de abundância comunicativa, aquilo que Green (2010) chamou de necessidade de
franqueza na era da espectatorialidade parece se tornar mais raro. Instâncias em que autoridades
são submetidas a uma visibilidade escrutinadora fora de seu controle ainda ocorrem, mas
parecem ter se tornado mais raras. Há chefes de governo que sequer concedem entrevistas ou
participam de coletivas, construindo veios alternativos de expressão.
Na dinâmica atual do jornalismo, por razões fundamentalmente econômicas, pautas e
veículos investigativos também são escassos. Parte significativa dos esforços é dedicada à
checagem de boatos já em circulação, à repercussão de temas de alta visibilidade nas mídias
sociais, à reprodução de declarações e à promoção de polêmicas, inclusive aquelas estimuladas
por títulos, manchetes e chamadas de notícias aparentemente criadas para gerar controvérsias
(por sua imprecisão, confusão ou equivalências questionáveis) e, consequentemente,
visibilidade, cliques (clickbait) e renda para os veículos. O jornalismo se beneficia da treta, por
exemplo, quando organiza os cada vez mais frequentes “debates” com os “dois lados da
questão”. Não importa que “um lado” defenda absurdos, incivilidades e inverdades, porque,
numa esfera pública cada vez mais agonística, a visibilidade não se liga à precisão (Chambers,
2020), mas deriva do conflito. A treta é a alma do negócio.

3.4. Configuração do funcionamento político e papel normativo do debate

A política democrática mudou significativamente desde 1962, assim como as


expectativas e formas de condução do debate público. A crise e a pluralização de formas de
legitimação tradicionais alteraram estruturalmente o funcionamento de sistemas políticos e as
expectativas sobre governança e decisão democrática (Rosanvallon, 2011, Tormey, 2015;
Urbinati, 2019; Bennett e Livingston, 2021). O processo de globalização adquiriu velocidade,
intensidade e profundidade sem precedentes, com consequências significativas na política. Os
limites do arranjo westfaliano tornaram-se evidentes, assinalando a metainjustiça política de
pensar justiça e democracia apenas (ou fundamentalmente) no plano nacional (Fraser, 2008).
Isso levou tanto a tentativas de construção de comunidades políticas transnacionais (Habermas,
2001), como ao backlash nacionalista (Norris e Inglehart, 2019). O progressivo
enfraquecimento prático dos Estados nacionais, diante da debilitação fiscal e da
complexificação transnacional de problemas, alimentou não apenas reações apáticas, mas
irrupções de violência (Offe, 2013). Protestos antissistêmicos (e, frequentemente apresentados
como antipolítica) tornaram-se recorrentes e varreram o globo no século XXI.
Nesse contexto, e depois da expansão da terceira onda democratizante (Huntington,
1994), a própria democracia perdeu potência normativa (Runciman, 2018) e entrou em crise
por diversas razões (Levitsky e Ziblatt, 2018; Mounk, 2019; Przeworsky, 2020; Talisse, 2019;
Mendonça, 2020). A politização radicalizada e pouco tolerante à divergência (Benkler, Faris e
Roberts, 2018) pavimentou a ascensão de lideranças políticas autoritárias, que trabalharam para
a desconstrução de instituições vigentes, como Donald Trump nos EUA, Mateo Salvini na
Itália, Viktor Orbán na Turquia, Jair Bolsonaro no Brasil, Nicolás Maduro, na Venezuela e
Rodrigo Duterte nas Filipinas. A rejeição ao sistema político e a polarização assimétrica
alimentaram os movimentos que embasaram a ascensão dessas lideranças, os quais se
constituem como tribos numa missão de revisão da realidade, contra os contratos fiduciários
forjados na modernidade que permitiram consensos mínimos e a própria constituição de
público. As sinergias entre o bolsonarismo e o trumpismo não são uma mera coincidência.
Ainda que tenha existido, em ambos, uma estratégia bem-sucedida de exploração de fobias
sociais e ressentimentos frente a mudanças culturais em ambos os países nas últimas décadas,
eles foram gestados segundo uma lógica mais perene e longeva do cultivo de narrativas
políticas calcadas na reinvenção da história.
Nesse cenário, a própria estrutura dos debates públicos viu-se afetada. A expectativa do
convencimento e do esclarecimento recíproco parece ter esmaecido e faz pouco sentido imaginar
os contornos da esfera pública burguesa. No entanto, também não seria adequado falar de um
contexto de manipulação geral de uma esfera pública refeudalizada. O debate é, inclusive do
ponto de vida normativo, entendido como essencialmente entrincheirado. A treta catalisa os
antagonismos em um mundo polarizado, no qual vai se tornando cada vez mais custoso tolerar
os adversários e mais fácil reprimi-los. Trata-se de um antagonismo da lacração. Se, como
teorizara Dahl (1997), a democracia depende de que os custos de supressão sejam maiores que
os de tolerância, vemos uma crise vinculada a esta inversão, e uma esfera pública armada
(weaponized) para a desconstrução do lugar em que o outro faz sentido. Importante expor a
interlocutora, evidenciar suas contradições, jogar com sarcasmo e ironia e minar o seu lugar de
fala como sujeito e/ou tribo. As lógicas e affordances das mídias digitais se desenvolvem em
torno dessa forma de fazer política e a alimentam, como bem assinala Gerbaudo (2018).
Obviamente, contudo, esta não é a única face da discussão contemporânea. Os contornos
da política contemporânea, projetaram públicos internacionais e estimularam ações de
transparência e monitoramento, que tornam instituições e atores sistematicamente
escrutináveis (Keane, 2013). Debates transnacionais tornaram-se realidade recorrente, como
evidenciam casos recentes em torno de questões raciais, ambientais e de saúde. A possibilidade
de que ilegalidades e imoralidades sejam expostas é permanente, como ilustram os casos
recentes do vazamento de mensagens trocadas entre procuradores e juiz no caso da Lava-Jato
ou as cenas de uma suposta vacinação clandestina de empresários em Minas Gerais. Na política
entrincheirada e crescentemente transnacionalizada do contemporâneo, tretas pululam em um
fluxo contínuo (e frequentemente efêmero) em torno de imagens, declarações e áudios que
atravessam nossas linhas do tempo. Há debate: conflituoso, rápido, ríspido, frequentemente,
sarcástico e, quase sempre, ruidoso.

4. Considerações finais

Este artigo defendeu uma atualização do argumento de MEEP, com a identificação de


uma mudança estrutural que sucede aquela trabalhada por Habermas. Defendemos que há um
conjunto de mudanças profundas desde quartil final do século XX, que permitem dizer de
uma nova configuração da esfera pública.
Para desenvolver este argumento, iniciamos com um sobrevoo pelo argumento da obra
de 1962. Nele, identificamos quatro eixos que ajudam Habermas a entender a ascensão da
esfera pública burguesa e sua refeudalização: economia política, processos de subjetivação,
ecossistema comunicacional e configuração do funcionamento político e papel normativo do
debate. Na sequência, discutimos como há transformações estruturais nesses quatro eixos a
partir dos anos 1970, delineando sociedades mais privatistas, mais tribalizadas e menos afeitas
a questões públicas. Nelas, a esfera pública parece mais ampla, acessível e marcada pelo
antagonismo e pelo tribalismo epistêmico, estruturando-se em torno da necessidade de
desconstrução do lugar de fala do outro. Trata-se de uma esfera pública que também apresenta
forte dimensão transnacional e que rotinizou, de algum modo, complexas relações entre
humanos e robôs na construção da visibilidade.

Quadro 1
Configurações da esfera pública

Esfera Pública Esfera Pública Esfera Pública Tribalizada


Burguesa Refeudalizada
Economia Política Liberalismo e a distinção Estado social-democrata Neoliberalismo
clara entre público e e a sobreposição entre
privado público e privado.

Processos de Intimidade e privacidade Experiência coletiva da Acentuação da individuação e


subjetivação estruturadoras de sujeitos comunicação de massa esgarçamento do demos.
críticos mina subjetividade
crítica.
Ecossistema Jornais como porta-vozes Jornais como propaganda Fragmentação, Hibridização,
comunicacional de visões privadas sobre de interesses privados, Tribalização. Maior
questões públicas e encenados como se possibilidade de fala, mas
conversações em espaços fossem públicos. limites da escuta. Mudanças na
como salões e cafés. relação entre sujeitos e
máquinas. Atrito.
Desinformação. Jornalismo
edito-rializado, de nicho, com
alterações de forma e rotina.
Configuração do Racionalização da Antagonismo em torno de Crise da democracia e
político e papel do dominação política e interesses privados, competição sem balizas.
debate choque de argumentos parlamento como assem- Antagonismo de lacração.
para legitimação de bleia de facções e Transnacionalização e públicos.
decisões. Publicidade. visibilidade aclamatória.

FONTE – Elaboração dos pesquisadores


O artigo se volta para uma problemática ambiciosa, sendo que, no espaço e no escopo
deste texto, deixa lacunas que mereceriam desenvolvimento de maior fôlego. Seria
interessante, por exemplo, dar espessura contextual à transformação, explicando suas variações
e especificidades em diferentes pontos temporais e geográficos. O neoliberalismo dos anos
1980 é bastante diferente do dos anos 2020, assim como varia enormemente se se compara o
contexto dos Estados Unidos com o do Brasil em um determinado momento. Também seria
rico discutir se a leitura histórica da noção de esfera pública segue fazendo sentido, a despeito
de seu aparente esfacelamento normativo. É possível falar de esfera pública com tantas
ambivalências e sem a idealização de um horizonte normativo tão claro? Qual o lugar do
conceito hoje na teoria democrática? Sem conseguir avançar sobre estes pontos aqui,
apresentamo-los como agendas futuras de interesse. Entendemos o artigo como uma
sinalização modesta sobre a necessidade de se pensar mais sistematicamente as dimensões
econômicas, políticas e sociais que atravessam as configurações da esfera pública
contemporânea. Trata-se de algo que estava na própria base da ideia de esfera pública e que
permanece absolutamente relevante para entender a comunicação política na atualidade.

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