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Português-Língua PACC2012
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Obs.: Pode ser utilizada uma das duas ortografias, sendo importante ser coerente
com a que for escolhida.
Neste momento historico, para que o nosso pais possa afirmar-se no contexto
de uma Europa alargada a vinte cinco estados, é indespensável prescrutar o futuro e
antecipar os problemas que à tanto tempo os aflige em diversas árias. Sem mêdo de
enfrentar questões politicamente incomodas. Nessa prespectiva, não podemos ser
pusilanimes: é preciso actuar-mos a cada instante, analizando as causas do nosso
atrazo e combatendo sem quaisqueres receios os multiplos desiquilibrios que ainda se
verificam em numerosos sectores da sociedade portuguesa. Só assim venceremos com
exito as dificuldades presentes e os desafios do futuro.
1
TEXTO
Esperança gramatical
Quando o leitor pensava que já tinha ouvido tudo acerca da crise, de repente
fica a saber que, gramaticalmente, é muito difícil que Portugal vá à falência. E,
enquanto for gramaticalmente impossível, eu acredito. Justifico esta ideia com a
seguinte teoria fascinante: normalmente, considera-se que o verbo falir é defectivo.
Significa isto que lhe faltam algumas pessoas, designadamente a primeira, a segunda e
a terceira do singular, e a terceira do plural do presente do indicativo, e todas as do
presente do conjuntivo. Não se diz «eu falo», «tu fales», nem «ele fale». Não se diz
«eles falem». Todos os modos e tempos verbais do verbo falir se admitem, com
excepção de quatro pessoas do presente do indicativo e todo o presente do
conjuntivo. Em que medida é que isto são boas notícias? O facto de o verbo falir ser
defectivo faz com que, no presente, nenhum português possa falir. Não é possível falir,
presentemente, em Portugal. «Eu falo» é uma declaração ilegítima. Podemos aventar a
hipótese de vir a falir, porque «eu falirei» é uma forma aceitável do verbo falir. E quem
já tiver falido não tem salvação, porque também é perfeitamente legítimo afirmar «eu
fali». Mas ninguém pode dizer que, neste momento, «fale».
Acaba por ser justo que o verbo falir registe estas falências na conjugação.
Justo e útil, sobretudo em tempos de crise. Basta que os portugueses vivam no
presente – que, além do mais, é dos melhores tempos para se viver – para que não
«falam» (outra conjugação impossível). Não deixa de ser misterioso que a língua
portuguesa permita que, no passado, se possa ter falido, e até que se possa vir a falir,
no futuro, ao mesmo tempo que inviabiliza que se «fala», no presente. Se eu nunca
«falo», como posso ter falido? Se ninguém «fale», porquê antever que alguém falirá?
Talvez a explicação esteja nos negócios de import/export. Nas outras línguas, é
possível falir no presente, pelo que os portugueses que têm negócios com estrangeiros
podem ver-se na iminência de falir. Mas basta que os portugueses não falem (do verbo
falar, não do verbo falir) acerca de negócios com estrangeiros para que não «falam»
(do verbo falir, não do verbo falar). Eu tenho esse cuidado, e por isso não falo (do
verbo falir e do verbo falar).
Bem sei que o Prof. Rodrigo Sá Nogueira, assim como outros linguistas, se
opõe a que o verbo falir seja considerado defectivo. Mas essa é uma posição que tem
de se considerar antipatriótica. É altura de a gramática se submeter à economia. Tudo
o resto já se submeteu.
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Grupo II – Explicação do sentido de dois enunciados: (70 pontos)
1. «Acaba por ser justo que o verbo falir registe estas falências na conjugação. Justo e útil,
sobretudo em tempos de crise. Basta que os portugueses vivam no presente – que, além do
mais, é dos melhores tempos para se viver – para que não «falam» (outra conjugação
impossível).» (35 pontos)
2. «Bem sei que o Prof. Rodrigo Sá Nogueira, assim como outros linguistas, se opõe a que o
verbo falir seja considerado defectivo. Mas essa é uma posição que tem de se considerar
antipatriótica. É altura de a gramática se submeter à economia. Tudo o resto já se
submeteu.» (35 pontos)
3
SÚMULA
Histórico; país; vinte e cinco; indispensável; perscrutar; há tanto tempo; nos; afligem;
áreas; medo; incómodas; perspectiva; pusilânimes; actuarmos; analisando; atraso;
quaisquer; múltiplos; desequilíbrios; êxito.
1. «Acaba por ser justo que o verbo falir registe estas falências na conjugação. Justo e útil,
sobretudo em tempos de crise. Basta que os portugueses vivam no presente – que, além do
mais, é dos melhores tempos para se viver – para que não «falam» (outra conjugação
impossível).» (35 pontos)
É justo e útil que o verbo falir seja defe(c)tivo, ou seja, apresente falências na sua
conjugação, na língua portuguesa, já que o país e os portugueses estão em tempos de
crise. Portugal, tal como a Europa, está vivendo a falência do estado, das empresas,
das famílias e a falência individual, ou seja, a falência do sistema político, económico e
social. Logo, o autor ironiza que, como o verbo falir é defe(c)tivo no presente do
indicativo e do conjuntivo, só vivendo no presente se consegue escapar à falência.
2. «Bem sei que o Prof. Rodrigo Sá Nogueira, assim como outros linguistas, se opõe a que o
verbo falir seja considerado defectivo. Mas essa é uma posição que tem de se considerar
antipatriótica. É altura de a gramática se submeter à economia. Tudo o resto já se
submeteu.» (35 pontos)
Não querer que o verbo falir seja defe(c)tivo é uma posição antipatriótica, porque, se
deixasse de sê-lo, a própria gramática corroboraria o estado de falência do país. Mas,
como já tudo se submeteu às leis do mercado e da economia, não admiraria que a
gramática sofresse também uma adaptação à realidade que todos nós estamos a viver.
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Grupo III – Reda(c)ção de um texto expositivo/argumentativo (80 pontos):
PLANO GERAL
PROPOSTA DE REDACÇÃO
Em primeiro lugar, a arte humorística de Ricardo Araújo Pereira emana do seu registo
paródico, oscilando entre a caricatura, o nonsense e o humor corrosivo, como ilustra a
passagem da sua crónica “Esperança gramatical”, alusiva aos escândalos políticos e financeiros
da a(c)tualidade nacional: «Mas basta que os portugueses não falem (do verbo falar, não do
verbo falir) acerca de negócios com estrangeiros para que não «falam» (do verbo falir, não do
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verbo falar). Eu tenho esse cuidado, e por isso não falo (do verbo falir e do verbo falar)». O
rasgo ironizante e o espírito satírico que caracterizam Ricardo Araújo Pereira configuram-se
como uma voz que expressa um ponto de vista esclarecido para instruir uma dialé(c)tica
subversiva. Por isso, o seu sentido de humor não constitui apenas uma irreprimível
manifestação individual, mas também uma estratégia discursiva de alcance cole(c)tivo, que
visa despertar a consciência crítica do público.