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PSICOLOGIA

EXISTENCIALISTA

JEAN-PAUL SARTRE

Prof. Dra. Eliane Regina Pereira


O EXISTENCIALISMO

 O Existencialismo já foi moda nos anos posteriores ao pós-


guerra devido ao fato de sua filosofia valorizar a vida e a
construção constante de novas possibilidades para a
sociedade e para os sujeitos.

 Retirado o ufanismo proclamado por certa geração em


relação ao Existencialismo, ficou a seriedade
epistemológica. Ao abordar em termos não metafísicos a
problemática do conhecimento.
O Existencialismo Moderno
 Mas, afinal, de que Existencialismo
estamos falando?
 Estamos falando do chamado
Existencialismo Moderno,
consolidado por Jean-Paul Sartre
entre os anos 1930 e 1970.
JEAN-PAUL SARTRE
 Órfão de pai desde os dois anos, Sartre sofreu as primeiras
influências por parte de sua mãe e de seu avô Charles
Schweitzer, que o iniciou na literatura clássica desde cedo.
Fez seus estudos secundários em Paris. Nessa época
despertou seu interesse pela Filosofia, influenciado pela
obra de Henri Bergson. Em 1924 ingressou na École
Normale Supérieure, onde conheceu, em 1929, Simone de
Beauvoir que se tornaria sua companheira e colaboradora
até o fim de sua vida. Sartre e Beauvoir não formavam um
casal comum de acordo com padrões da época. Ambos
possuíam amantes e partilhavam confidências sobre suas
relações com outros parceiros. Este modo de vida violava
os valores da tradicional sociedade francesa, que se
escandalizou com essa relação.
SARTRE e as raízes do Existencialismo

 Este filósofo francês, que nasceu em 1905 e morreu em 1980,


foi um intelectual bastante rigoroso: leu e discutiu os autores
fundamentais de sua época, referências nas áreas da filosofia,
epistemologia, psicologia.

 Esse seu interesse pela psicologia o coloca nos trilhos da


fenomenologia. Inicialmente, com a tradução do tratado de
psicopatologia fenomenológica de Jaspers, no qual encontrou,
entre outras, a noção de compreensão. Depois, seu encontro
com Husserl e outros autores fenomenológicos. Além destes,
Sartre terá como fundamentos de sua teoria tanto o
Existencialismo de Kierkegaard, quanto o Materialismo
Histórico-Dialético de Karl Marx.
O Método Fenomenológico
 Fenomenologia é uma filosofia surgida no final do século XIX, inaugurada com Edmund
Husserl (1859-1938), que buscou se opor ao pensamento especulativo da filosofia
metafísica dominante até então. O fenomenólogo criticava também as ciências por se
reduzirem a um mero empirismo, ou seja, a uma descrição de fatos sucessivos sem o
questionamento da essência desses fatos.
 Portanto, era necessário uma “filosofia de rigor”. Para realizar essa nova perspectiva
filosófica, Husserl propõe um método de investigação, que deve ter como ponto de
partida a “volta às coisas mesmas”, seria, de início, então, voltar aos fenômenos,
descrevê-los na suas diversas aparições, pois eles nada ocultam: são a revelação daquilo
que é sua essência.
 Pautado nessa concepção Husserl proporá uma nova noção de consciência, não mais
como uma estrutura fechada, mas como abertura para os fenômenos, ou seja, como
intencionalidade.
 No entanto, na continuidade das concepções de Husserl para o método fenomenológico,
para o que proporá a realização de uma sequência de reduções – no alcance das
reduções, Husserl afirma que a essência dos fenômenos se encontra na “consciência
transcendental”, concepção que põe “entre parênteses” a realidade externa e remete a
fenomenologia a um subjetivismo sem recurso. É bem por isso que Sartre, irá construir
sua crítica à Husserl, até o momento em que precipitará sua ruptura com tais ideias.
Sartre, portanto, em torno de 1939, passa a centrar seus estudos na obra de Heidegger,
outro fenomenológo. Vai incorporando, um após outro, conceitos heideggerianos
fundamentais como “ser-no-mundo”, “nada”, “temporalidade”.
A Concepção Existencialista
 A filosofia existencialista foi fundada pelo filósofo dinamarquês Sören
Kierkegaard (1813-1855) no início do século XIX.
 Kierkegaard considerava um equívoco primordial o fato das filosofias ignorarem a
existência concreta, ignorar os indivíduos em sua subjetividade, fazendo de sua
filosofia uma oposição, que clamava como ponto de sustentação a subjetividade ou
a existência concreta, daí sua filosofia chamar-se de “existencialismo”.
 Entre suas acepções está a de que “existir é opção”, “existir é escolher-se”, ou seja,
o que dá sentido à existência é o indivíduo não poder fugir das escolhas e, ao
realizá-las, escolher seu ser. Este conceito desdobra-se na famosa máxima do
existencialismo: “a existência precede a essência”. Este aspecto fundamental da
existência humana é definido como “liberdade”: o homem não pode deixar de
escolher e ao realizar opções define sua realidade individual e humana.
 Estes aspectos do existencialismo terão grande influência em Sartre, na palestra do
francês intitulada “O Existencialismo é um Humanismo”. No entanto, Sartre
realizará uma crítica ao subjetivismo em que acaba retido o fundador dessa
filosofia. Kierkegaard acaba não realizando o salto necessário para compreender
esta singularidade não como mera subjetividade, mas sim como produto e
produtora das relações sociais. Dessa forma, acaba postulando uma subjetividade
“em-si-mesmada”, permanecendo dentro da lógica idealista que ele tanto criticara.
O Materialismo Histórico-Dialético
 O materialismo histórico-dialético foi concebido por Karl
Marx (1818-1883), juntamente com Frederic Engels (1820-
1895), em pleno século XIX. Crítico do materialismo
ingênuo, propõe uma concepção materialista sustentada na
história e na análise dos meios de produção e da luta de
classes como motor dessa história.
 Portanto, o materialismo histórico-dialético fornece as bases
para uma antropologia que rompe com o reducionismo das
concepções subjetivistas – que concebem o homem como um
ente sustentado “em si mesmo” - colocando-o,
definitivamente no terreno da história e da cultura.
 Essa concepção antropológica aproxima a psicologia
existencialista, em alguns aspectos, da psicologia de
orientação marxista de Vygostski, Luria, Leontiev.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 O homem - ser-no-mundo.
 Não existe mundo sem homem nem homem sem mundo. O mundo só se
constitui, se organiza, através do homem. Se não existisse o homem
teríamos, somente, a realidade bruta, indiferenciada. Só há mundo porque
o homem transcende aquilo que está “dado” e estabelece significações,
ordenamentos; organiza, assim, a realidade, tornando-a humana. Da
mesma forma, o homem só se humaniza por estar inserido em um mundo
que lhe possibilita contornos existenciais. Não existe nenhum indivíduo
que não esteja situado em um certo local, em um dado tempo, em uma
certa sociedade.
 É que no existencialismo sartriano o subjetivo é um momento do processo
objetivo. A subjetividade não é uma entidade em si, ela é um processo
dialético de apropriação da objetividade, de interiorização da
exterioridade. A subjetividade só existe enquanto subjetividade
objetivada.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 A condição para a ocorrência desse fenômeno é o fato de o homem ser,
inelutavelmente, corpo/consciência. O corpo é seu primeiro contato com
o mundo, a consciência é sua condição, inevitável, de estabelecer
relações. A relação com a materialidade que nos cerca é a primeira
condição de existência de alguém. Todos nascemos inseridos em uma
dada sociedade, em um momento histórico, incluídos em um conjunto de
relações sociais, que nos remetem, necessariamente, às condições
materiais em que estamos inseridos.

 O corpo é a perpétua condição de possibilidade da psique. Todos os


fenômenos da psique são psicofísicos.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 A temporalidade é outra relação fundamental do homem com
o mundo. As coisas, o em-si, não são temporais.
 A temporalidade é uma estrutura organizada nos três
elementos do tempo: passado, presente, futuro.
 A dimensão psicológica caracteriza-se por ser resultante da
síntese das três dimensões da temporalidade. Assim, sou meu
passado (que é o que é) e meu futuro (que não é ainda)
enquanto presença no mundo. A dinâmica temporal
desenvolve-se como processo de totalização perpétua da
minha experiência nessas três dimensões. O meu cotidiano
sustenta-se em antecipações (futuro) e recordações (passado).
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 É importante ressaltar uma noção que é central na psicologia de
Sartre: o projeto. Ele se caracteriza por essa busca do sujeito
em realizar o seu ser, já que o homem está sempre indo em
direção ao seu futuro. Não existe indivíduo sem projeto. O
projeto é realizado pelo desejo de ser. O desejo de ser é o
“combustível” da dinâmica psicológica.

 O desejo não é um atributo inconsciente; nem mesmo é


inacessível; não é uma força que move o homem sem que ele o
saiba, quando seria, então, definido por um saber que não se
sabe; também não se reduz a ser da ordem da sexualidade, daí
projetando-se a outras esferas. Não! O desejo de ser é
constituído pelo homem na sua práxis cotidiana; realiza-se em
cada experiência relacional, emocional, intelectual, etc; define o
homem na justa medida em que o homem se define.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves

 Relação Eu/Outro - A existência do outro é fato incontestável e me


atinge em meu âmago, na justa medida em que o outro é o mediador
indispensável entre mim e mim mesmo. Sabemos que é necessário
reconhecer o outro como outro para que eu me reconheça como eu.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 Sujeitos e Grupos - Os sujeitos nunca estão isolados, mesmo uma pessoa sozinha está
sempre inserida em uma rede de relações humanas, seja para se alimentar ou para
pensar seu mundo, enfim, para ser.

 No entanto, nem toda reunião de pessoas significa, necessariamente, um grupo. Desse


modo, a forma mais básica de agregamento humano implica em uma pluralidade de
solidões, quer dizer, as pessoas não se preocupam umas com as outras, não se dirigem
a palavra, nem mesmo se observam. O interesse é, portanto, comum (chegar a algum
lugar), mas não há uma identidade entre as pessoas. SÉRIE.

 O que vai caracterizar um grupo organizado, diferente de uma série é a superação da


solidão. O grupo se organiza em torno de um projeto comum, constituído a partir da
troca entre os projetos individuais. Além disso, estabelece-se uma afetividade, posto
que as pessoas passam a ser importantes umas para as outras. Cada um se torna o
mediador entre o projeto individual do outro e o projeto coletivo, estabelecendo
relações de “reciprocidade”.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 Homem nasce corpo/consciência

 Isto quer dizer que o sujeito concreto nasce com uma dada condição física e
fisiológica, trazida com seu corpo, e com uma dada condição de estabelecer
relação com o mundo, trazida pela consciência. Essas são condições
possibilitadoras de seu ser, mas não são o seu ser.

 Sua essência (quer dizer, aquilo que define a especificidade de seu ser, no
caso do homem, sua personalidade) não está dada, precisará ser
construída. Daí a necessidade de um processo histórico de totalização das
relações do sujeito com o mundo, mediadas pelo social, que constituirão,
assim, os estados, ações e qualidades que, unificados, formarão a
personalidade. Com isso, fica claro que nascemos ninguém e nos tornamos
alguém específico nesse processo de construção constante de nosso ser. Ou
seja, primeiro existimos, estabelecemos relações com o mundo, para então, a
partir daí, nos personalizarmos, nos essencializarmos.

 Temos aqui a sustentação da máxima existencialista para o ser do homem: “a


existência precede a essência”.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 Todo esse processo de mediações, na medida em que a criança vai adquirindo
a capacidade de abstrair, vai sendo apropriado reflexivamente por ela,
constituindo a inteligibilidade ou o “saber de ser” que terá de si mesma. Para
que tomemos posição de si, nos posicionemos enquanto “sujeito” dos nossos
atos, é necessário uma consciência de segundo grau, reflexiva; portanto, é
através da elaboração reflexiva que vamos estabelecendo um entendimento de
como agimos e sentimos, de como pensamos sobre as coisas que nos cercam,
enfim, de quem nós somos. Qualquer pessoa unifica o seu ser, sua
personalidade com amarras reflexivas; é essa inteligibilidade, enquanto
totalização reflexiva de nossas ações, estados e qualidades, que fornece os
vínculos de sustentação da personalidade, de nosso eu psicofísico.
 Como vimos, esse processo, em um primeiro momento, é vivido de forma
alienada, na medida em que o ser da pessoa está na mãos dos outros, pois
uma criança pequena ainda não tem condições lógicas, nem psicológicas de
ter autonomia, pois ainda não tem um eu constituído e as primeiras reflexões
que vai estabelecendo são espontâneas.
Psicologia Existencialista – conceitos chaves
 Mas aos poucos, a ampliação do seu leque de relações, que vai expandindo
pouco a pouco, para além do ambiente familiar ou institucional, dialetizando
os valores e a inteligibilidade social, também, vai contribuindo para a
aquisição da capacidade dela realizar reflexões críticas, elaborações reflexivas
e, com isso, relativizar o processo de mediações até então estabelecido e de,
finalmente, tomar o seu ser em suas mãos. É o momento do chamado
nascimento existencial, que se viabiliza quando a criança “rompe” a placenta
social e nasce para o mundo autônomo. Supera o dever-ser para situar-se no
horizonte do poder-ser, quer dizer, não vive mais seu ser como tarefa, mas
como um conjunto de possibilidades, cuja realização depende dela, bem como
da situação em que estiver inserida.
 Para resumir, pudemos observar que ninguém nasce determinado “a priori”: a
personalidade é resultante de um processo histórico de construção do ser,
realizado através do jogo dialético entre a objetividade (outros, sociedade,
materialidade) e a subjetividade (o sujeito, com suas emoções, seu
imaginário, suas ações, suas qualidades), demonstrando que, no homem, “a
existência precede a essência”.

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