Você está na página 1de 25

CALHETA/Praia

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA FILOSOFIA

SUMÁRIO: A dimensão ético-política - Análise e


compreensão da experiência convivencial
• Orientamos e avaliamos as nossas ações em função de normas e regras que julgamos ser, a
maior parte das vezes, corretas. Não está certo mentir, não deves roubar, deves respeitar
os outros são regras que nos indicam precisamente o que está correto ou incorreto fazer e
nos ajudam a avaliar se uma ação é boa ou má. Por exemplo, todos concordamos que não
está certo alguém fazer a sua higiene oral no meio de uma reunião de trabalho.

• Assim, também entendemos como incorreto o facto de um agente da autoridade agredir


violentamente um idoso indefeso.
• Há desde logo uma diferença notória entre os dois
exemplos apresentados: interpretamos o primeiro caso
como tratando-se de um comportamento socialmente
incorreto, mas não imoral;
• O segundo caso é claramente repudiante, quer
analisemos em termos culturais, quer em termos
morais, portanto é socialmente incorreto e imoral. De
um ponto de vista moral, no primeiro caso, o facto
apresentado não é susceptivel de ser avaliado como
bom ou mau, justo ou injusto; ao contrário, ao segundo
atribuímos valor moral (negativo) – isto é, trata-se de
um acto mau ou injusto.
• Com efeito, ao refletir sobre a moral, não nos interessa
perceber por que é que alguém decide fazer a sua
higiene oral no meio de uma reunião de trabalho. Pelo
contrário, será nosso objetivo compreender por que é
que é incorreto usar de violência contra um ser humano
indefeso, ou se há alguma razão para respeitar os
outros seja que circunstância for.
• Não deve confundir-se a moralidade com os hábitos
ou costumes culturais, o agir moral com outras formas
de comportamento humano. Assim, também
distinguir-se as normas morais de outro tipo de
normas sociais.
O que são normas morais?

• As normas morais são regras de comportamento


adotadas em sociedade que visam perseguir valores
como os de bem, justiça, dignidade, liberdade e que
permitem aos indivíduos distinguir uma boa ação de uma
má ação.
• Há casos em que as normas morais coincidem com outro
tipo de normas vigentes na sociedade: não roubar é uma
norma simultaneamente moral e jurídica, uma vez que a lei
assume o roubo como um crime.

• Por exemplo, em certos países onde a pena de morte é legal,


o acto de aceitar e defender pode equivaler a uma norma
jurídica, mas não corresponderá, com efeito a uma norma
moral.
Analisemos a seguinte situação:

• Paulo é agente da Policia Nacional. Numa ronda


nocturna por um dos bairros da Cidade da Praia, assiste
à agressão de um idoso sem abrigo por parte de um
colega. Deve Paulo denunciar o seu colega de
profissão? Deve interferir e evitar a continuação do
espancamento?
• Seja qual for a decisão de Paulo, ela implicará o
reconhecimento de normas morais que lhe ensinaram:
deves respeitar a dignidade de qualquer ser humano, agir
com justiça, zelar pelo bem-estar de todos os cidadãos. Mas
isto não basta.

• É preciso que Paulo tenha a intenção de, em consciência e


com responsabilidade, cumprir ou não cumprir essas regras.
Mesmo sabendo da existência e correção daquelas normas,
só Paulo pode decidir, na prática, acatar ou não as normas
morais.
• Agir moralmente não se resume ao cumprimento das normas

morais, implica ainda a forma intencional da ação. É na medida em

que somos livres que podemos escolher o que devemos ou não

fazer e afirmar-nos como seres morais (liberdade moral). Essa

escolha é guiada pelas regras morais, mas depende da intenção do

agente que, livre e autonomamente, escolhe realizar dada ação.


• As normas morais não se impõem absoluta e
incondicionalmente; não retiram a liberdade nem a
responsabilidade ao agente. Por outro lado, embora constituam
guias orientadoras da ação, não permitem resolver todas as
situações dilemáticas morais que nos colocam perante a
exigência de uma reflexão que torne claro o raciocínio
deliberativo e que permita justificar a moralidade das nossas
ações. É a este nível que a filosofia moral ou ética pretende dar
o seu contributo.
A distinção entre ética e moral

• Etimologicamente, ética provém do grego (ethos, isto é, costume,

maneira de proceder, de se comportar, carácter); moral provém do

latim (mores, que significa hábitos ou costumes).


•  Moral: conjunto de princípios, valores (como o bem e o mal) e normas (sob
a forma de deveres) que orientam as acções humanas no que diz respeito às
relações entre as pessoas. Em cada sociedade há uma moral colectiva que é
inicialmente aceite pelos membros antes mesmo de qualquer reflexão sobre
o seu significado, a sua importância e a sua necessidade.
• A moral tem assim um carácter social, visto que decorre da sociedade e
responde às suas necessidades. É marcada por normas, obrigações,
interdições e penalizações sociais. Mas cada pessoa só assume plenamente
uma dada norma moral se estiver convencido da sua justeza, só assim ela
adquire uma dimensão pessoal. Cada pessoa elabora, no decorrer da sua
vida, de um modo mais ou menos autónomo, uma moral própria, que pode
ou não coincidir com a moral colectiva na qual foi educado.
• Ética: disciplina filosófica que estuda a moral. É uma reflexão
filosófica sobre os fundamentos da moral. O seu objetivo é
compreender a moral com vista à fundamentação última do
agir humano. A ética é actualmente dividida em três partes
fundamentais: a)Ética Descritiva – descreve os fenómenos
morais; b) Ética Normativa – procura a justificação racional
da moral; c) Meta-ética – reflecte sobre a própria ética.
ÉTICA NORMATIVA METAÉTICA ÉTICA DESCRITIVA

Procura encontrar os Procura descobrir a origem, a Analisa casos particulares


princípios morais natureza e o significado dos como o aborto, a
fundamentais que princípios éticos. eutanásia, o tratamento
orientam a conduta Estuda conceitos e os juízos das minorias étnicas, a
humana, e que permitem morais. guerra nuclear, entre
distinguir as ações outros, na tentativa de
correctas das incorretas. indicar soluções possíveis
para esses problemas.

Que regras e que Como fundamentar os Que argumentos morais se


princípios devo adoptar princípios adotados? De onde podem apresentar em favor
vêm? De alguma entidade da interrupção voluntária da
para saber o que é certo superior? De Deus? O que é que gravidez? E do fornecimento
ou errado? os torna bons príncipios? O que de armas a países em guerra?
é o bem? O que é a justiça?
• Enquanto a moral remete para a diversidade de normas e de
juízos morais de carácter prescritivo, a ética procura abstrair
dessa diversidade para perceber por que o ser humano se
comporta em termos morais ou, por outras palavras, quais
são as razões que o levam a adoptar princípios e normas
morais. Assim, a moral proporciona uma espécie de “receita”
para aplicar a casos concretos, uma resposta à pergunta o
que devo fazer? – em determinada situação, segundo
determinado contexto social.
A ética, por sua vez, como já tínhamos dito, propõe-se
compreender a moral com vista à fundamentação
última do agir humano. Os seus objetivos não se
colocam ao nível da resposta à questão o que devo
fazer? - nesta ou naquela situação concreta,
procurando antes o sentido fundamental da moral na
vida do homem.
Atividades
• 1 – A partir de alguns exemplos, defina norma moral.
• 2 – Explique, com base num exemplo, a relação existente entre as
normas morais e a intencionalidade do agente.
• 3- Distinga ética de moral.
• 4 – Identifique as áreas da reflexão ética que se debruçam sobre as
seguintes matérias:
• - os conceitos de bem, justiça, liberdade;
• - a validade das ações e sua conformidade com as normas morais;
• - a eutanásia;
• - os direitos dos animais
A dimensão pessoal da ética
o si mesmo e o outro – a pessoa como sujeito moral
• O ser humano é um ser dotado de razão e capaz de realizar
ações voluntárias, conscientes e intencionais. Só nessa condição
se pode falar de um ser moral, de uma pessoa capaz de optar
por uma de várias alternativas, de acordo com o que lhe dita a
sua consciência.
• Não julgamos como imorais os actos realizados pelos animais
em nome da sua sobrevivência, nem os comportamentos
inadequados de um deficiente mental que não tem consciência
do bem e do mal. Agir moralmente é agir de forma livre,
intencional e consciente.
• Assim, o sujeito moral é uma pessoa enquanto é um ser singular,
livre, responsável, com dignidade e abertura. Nestas condições, as
suas ações podem ser julgadas como morais ou imorais e o sujeito
pode ou não ser responsabilizado.
Suponha que vivia a situação que a seguir descrevemos
• Sílvia gostaria muito de assistir ao concerto da sua banda preferida mas não
pode ir porque os pais não lhe dão dinheiro. Por mero acaso, no hall de
entrada do seu prédio, onde tem bastante vizinhos, encontra uma carteira,
provavelmente pertencente a um deles. De facto, quando abriu a carteira,
descobriu todos os documentos de identificação do seu dono e ainda 100
euros em dinheiro.

• O dono da carteira era um dos seus vizinhos mais ricos e mais antipáticos.
Sílvia hesita entre entregar a carteira ao seu vizinho e poupar-lhe a angústia de
a ter perdido, bem como o incómodo de tratar de todos os documentos, ou
ficar com a carteira e os 100 euros que lhe permitirão assitir ao tão desejado
concerto.
• É bem possível que já tenha vivido uma situação destas.
Se não viveu, não será difícil colocar-se no lugar de Sílvia
e decidir o que fazer com a carteira.
• Apesar de sílvia querer muito ir ao concerto, a sua
consciência não lhe permite ficar com a carteira e todo o
seu conteúdo. Assim, entrega-lo será a opção que lhe
permitirá ficar de “consciência tranquila”.
• Não entregar a carteira e todo o seu conteúdo pode
satisfazer momentaneamente a sua vontade, mas
produzirá um certo desconforto, uma certa sensação de
“consciência pesada”.
• Na verdade, quer o sentimento de tranquilidade quer
o de remorso ou inquietação são o resultado daquilo
que dita a nossa consciência moral, ou seja, a nossa
voz interior ou juíz que nos alerta, censura, sanciona,
reprime e diz sim ou não. Se agirmos de acordo com
ela, sentimos uma certa paz e tranquilidade;

• Se pelo contrário, não tivermos em conta, sentimos


inquietação, desconforto e até arrependimento ou
remorso.
• Não obstante, essa consciência não é inata, isto é, não
nasce connosco. Por isso mesmo, a criança de tenra
idade ainda não a desenvolveu, e nesse sentido, os
seus comportamentos indisciplinados não podem ser
classificados como morais ou imorais. Uma criança
poderia ficar com a carteira sem ficar de “consciência
pesada”, porque apenas entenderia como um novo
brinquedo.
• A consciência moral vai-se adquirindo e desenvolvendo à
medida que a criança vai interiorizando as noções de bem e
de mal, as normas de comportamento, primeiro por medo
de castigo ou punição, e depois por livre adesão, gradual aos
princípios morais entretanto interiorizados. É então que
adquire uma verdadeira autonomia.

Você também pode gostar