Você está na página 1de 15

EAE 0305 – Contabilidade Social

Aula 5 – Contabilidade Nacional e


Macroeconomia: revisitando Keynes
(item 2.6 do programa)

Profª. Leda Paulani


2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Foi a partir da teoria macroeconômica, que nasceu com a publicação da
Teoria Geral de Keynes em 1936, que foram envidados os esforços para a
criação de um sistema a partir do qual se pudesse observar a evolução dos
agregados econômicos. Assim, foi da macroeconomia que se chegou às
contas nacionais.
• Vamos mostrar de que maneira as contas nacionais denunciam as relações
sistêmicas (derivadas da teoria keynesiana) que lhes deram origem.
• Para se contrapor à teoria (neo)clássica então dominante, que era incapaz
de explicar um nível de desemprego tal como o que se passou a ver a partir
de 1929 na Europa, Keynes não apenas questionou relações de causa e
efeito tomadas como líquidas e certas até então, mas:
a) apontou relações distintas,
b) forjou novos conceitos (como os de incerteza e preferência pela liquidez)
c) revelou identidades
• As identidades assim reveladas foram de fundamental importância para
definir os princípios e embasar teoricamente o sistema de contas nacionais.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
Tomemos a conta de produção considerando uma economia fechada
e sem governo.

Conta do Produto - economia H – ano X


Débito Crédito
a1. salários C. consumo pessoal
a2. lucros D. variação de estoques
a3. aluguéis E. formação bruta de capital fixo
a4. juros
A. renda ou produto nacional líquido
(A = a1 + a2 + a3 + a4)
B. Depreciação
(B = b1 + b2 + b3 + b4)
Renda ou Produto Bruto Dispêndio Bruto
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes

• A identidade macroeconômica básica está representada nessa


conta, assim como as três óticas de mensuração do produto.
• O lado esquerdo da conta (lado do débito) nos mostra que, nessa
economia H, ainda fechada e sem governo, a renda bruta gerada
no ano X (ou seja, o somatório dos rendimentos pagos a fatores de
produção) é resultado do valor adicionado bruto ou produto bruto
produzido por essa economia nesse ano.
• O lado direito da conta (lado do crédito), traz a despesa bruta, ou
dispêndio bruto. Se considerarmos que a formação bruta de
capital fixo (FBKF), somada à variação de estoques (ΔE), constitui o
investimento bruto (I) ocorrido nessa economia no referido ano,
teremos então que o dispêndio bruto mostra-se igual à somatória
das despesas de consumo (C) com as despesas de investimento (I).
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• O equilíbrio interno da conta, por sua vez, vai garantir que o
produto/renda bruto é igual ao dispêndio bruto. Se chamarmos o
primeiro termo de Y, podemos escrever:
(1) Y ≡ C + I

Isto posto, veremos, a partir de agora, porque a Ótica do Dispêndio é


também chamada de Ótica da Demanda.
• Segundo Keynes, existe uma relação de causa e efeito entre a
Despesa e o Produto, ou seja, o produto será tanto maior quanto
maior for a demanda da economia por bens e serviços.
• O tamanho que Y alcança em cada período é uma função do
comportamento da Demanda Agregada, ou seja, do
comportamento da demanda total por bens de consumo (C) e da
demanda total (ou bruta) por bens de investimento (I).
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Assim, para entender por que uma economia, num
determinado período, alcança, por exemplo, um valor de Y
inferior ao que seria possível, deixando ociosos meios de
produção e força de trabalho, é preciso entender o
comportamento de C e o comportamento de I, ou seja, quais
são os seus determinantes.
• Segundo Keynes, o principal fator a determinar o
comportamento de C é justamente a renda, ou seja, Y.
Podemos escrever então:
(2) C = f (Y)
• Keynes afirma também que a relação que existe entre Y e C
é direta, ou seja, quanto maior Y, maior C.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Mas ele observa que, dado um aumento na renda, o aumento
no consumo é menos que proporcional àquele, e denomina
essa relação de lei psicológica do consumo. Isto acontece
porque a propensão marginal a consumir (c) é menor do que 1.
• Existe também uma pequena parcela do consumo que não
depende da renda, o consumo autônomo (Ca). Com isso
podemos reescrever (1) da seguinte forma:
(3) Y = Ca + cY + I, sendo 0<c<1.
• Quanto ao Investimento, Keynes constatou que ele depende
de variáveis extremamente sujeitas a flutuações devido às
sempre presentes incertezas em relação ao futuro. Essas
variáveis são a taxa de juros (r) e a eficiência marginal do
capital (EMgK). Então
(4) I= f(r, EMgK)
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Tomando a equação (3) temos:
Y(1-c) = Ca + I e (5) Y = 1/(1-c) (Ca + I)
• O termo 1/(1-c) é conhecido como multiplicador
keynesiano ou multiplicador de gastos.

 = 1/(1 – c)

• O multiplicador () indica a magnitude do


aumento da renda em decorrência, por exemplo,
de um aumento de I.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Suponhamos para a economia H um c = 0,9. Nesse caso
teremos:
•  = 1/1-0,9, portanto  = 10.
• Isto significa que, na economia H, se ocorrer, por exemplo,
um aumento autônomo do I da ordem de $1 mihão, o
impacto desse aumento sobre o nível de renda será de $10
milhões. Evidentemente o efeito multiplicador dos gastos
será tanto maior quanto maior for a propensão marginal a
consumidor. Se c = a 0,8, por exemplo,  = 5.
• Como compreender intuitivamente o significado de ?
• Keynes afirmou que o multiplicador significa apenas que a
quantidade de bens de consumo que compensa aos
empresários produzir depende da quantidade de bens de
investimento que eles decidam produzir.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Supondo que a variável Ca tende a ser estável, o que acontece
com Y depende diretamente daquilo que acontece com I, que
é, como vimos, uma variável sujeita a imensas oscilações.
• Assim, nos momentos em que I não cresce, ou cresce
negativamente, isto provoca um efeito depressivo sobre o
nível de renda e produto, que é magnificado pelo efeito
multiplicador.
• Assim, mesmo dispondo de fatores de produção para operar
num nível mais elevado, a economia permanece operando
num nível insuficiente para empregar toda a força de trabalho
e toda a capacidade instalada.
• Mas nenhum elemento desse raciocínio altera a identidade
entre produto e renda. O que ele permite é identificar os
determinantes do nível de produto e renda no qual opera a
economia. Retomemos a conta do produto.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
Conta do Produto (ou Conta PIB)
débito crédito
salários consumo pessoal (C)

aluguéis consumo do governo (G)

juros variação de estoques (i1)

lucros form. Bruta capital fixo (i2) i 1 + i2 = I


(5) PIB = Y = C + I + G + (X-M)
outras receitas correntes exportações de bens e serviços (X)
líquidas do governo não fatores
depreciação importações de bens e serviços
não fatores (- M)

impostos indiretos líquidos


de subsídios
renda enviada ao exterior menos
rendarecebida do exterior

Dispêndio (Demanda) associado ao


Produto Bruto (PIB)
Produto Bruto
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• A expressão 5, que é a expressão 1 ampliada, permite que
percebamos que o nível de produto e renda em que opera a
economia não depende só do Investimento (I), mas também
dos gastos do governo (G) e das exportações líquidas (X-M).
• Valem para essas variáveis as mesmas relações antes
estabelecidas para I. Assim um efeito multiplicador vai também
atuar sobre possíveis aumentos seja nos gastos do governo,
seja nas exportações líquidas.
• Assim um aumento nos gastos do governo ou nas exportações
eleva o nível de produto, enquanto que um aumento nas
importações produz o efeito contrário.
• A expressão 5 mostra-nos ainda a importância que foi atribuída
ao governo por conta das considerações de Keynes quanto aos
determinantes do nível de renda.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Se um aumento no nível de renda pode provir de uma
elevação em G, então cabe ao governo um importante papel.
• Nos momentos em que o investimento insista em se manter
deprimido e em que os estímulos vindos de fora não sejam
suficientes para evitar o desemprego, só o governo tem
condição de retirar a economia de tal situação.
• Aumentando seus gastos, ele promoverá uma elevação no
nível de renda que poderá inclusive reverter as expectativas
pessimistas quanto ao futuro e assim recuperar, em curto
espaço de tempo, o próprio investimento.
• A partir de Keynes o governo passou a ter também a
responsabilidade por aquilo que se costumou denominar de
controle da demanda efetiva.
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes
• Tais considerações, bem como o novo papel que ganha
o governo a partir delas, deram origem, no mundo
acadêmico, ao que se chamou consenso keynesiano.
• Na economia real, o pensamento keynesiano
influenciou muito o funcionamento prático do
capitalismo até o início dos anos 1970.
• A partir daí muita coisa mudou.
• No mundo acadêmico, o consenso keynesiano foi
rompido pelo advento da teoria das expectativas
racionais, que deu nova vida aos pressupostos que
Keynes atacara e recuperou a primazia da teoria
ortodoxa (neoclássica).
2.6 Contabilidade Nacional e
Macroeconomia: revisitando Keynes

• No mundo real, a combinação de inflação com desemprego


levou a uma onda de contestações quanto à pertinência do
papel do Estado como regulador da demanda efetiva e pôs
em destaque as políticas associadas àquilo que se costuma
chamar neoliberalismo (estado mínimo, rígido controle dos
gastos públicos, privatizações, desregulamentação e
abertura econômica, entre outros).
• O sistema de contas nacionais pouco ou nada foi abalado
por essa reviravolta.
• Isso comprova que as identidades que a teoria keynesiana
revelou são aquilo que seu nome diz “identidades”, não
sendo por si só indicadoras de relações de causalidade
entre as variáveis que as constituem.

Você também pode gostar