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GCC-1049 Geografia da

Saúde:Teoria, Método e
Aplicação
Hantavírus: Aspectos básicos
Diego Dal Pozzolo dos Santos
• INTRODUÇÃO
O hantavírus é um arbovírus da família Bunyaviridae e gênero
Hantavirus, que compreende vírus envelopados, esféricos, medindo de
80 a 120 nm de diâmetro e contendo RNA de fita simples como material
genético. Tem distribuição mundial e é responsável por duas síndromes
distintas: a febre hemorrágica com síndrome renal (FHSR) e a síndrome
cardiopulmonar por hantavírus (SCPH). Anualmente, são estimados
cerca de 100.000 a 200.000 novos casos de hantavirose no mundo.
Das diferentes espécies de Hantavirus, quatro causam febre
hemorrágica com síndrome renal (FHSR) e cerca de duas dezenas
causam a síndrome cardiopulmonar por hantavírus (SCPH). Cada uma
das espécies infecta roedores específicos que constituem seus
reservatórios naturais, e a denominação dos agentes deriva da região
da qual foram descritos pela primeira vez. As chamadas espécies do
velho mundo (Hantaan, Seoul, Dobrava e Puumala) são encontradas na
Europa e Ásia e estão associadas à FHSR, cuja ocorrência foi
inicialmente relatada na Coréia e na Rússia. A febre hemorrágica da
Coréia acometeu inicialmente soldados das Nações Unidas durante a
Guerra da Coréia, nos anos 50 .
O vírus foi isolado pela primeira vez na década de 70, de um
roedor silvestre capturado às margens do Rio Han, inspirando o nome
do vírus Hantaan ou Hantavirus. Os hantavírus das espécies Sin
Nombre, Bayon, Blackwater Creek Canal, Juquitiba, Araraquara,
Castelo dos Sonhos, Andes e Laguna Negra são encontrados nas
Américas e estão associados à síndrome pulmonar. Este grupo foi
descrito pela primeira vez na região do Novo México – EUA, em 1993,
quando ocorreu a epidemia pelo vírus. Nos EUA, a incidência do vírus
Sin Nombre é de 0,02/100.000 habitantes.
Casos de Incidência por País de Variedades de Hantaviroses . http://cmr.asm.org/content/23/2/412/F3.expansion.html

• Cases of Incidence per Country of Varying Hantavirus Diseases.


http://cmr.asm.org/content/23/2/412/F3.expansion.html
EUA 1993-2007

• Hantavirus Pulmonary Syndrome Cases as Reported by States in the US (March


2007) http://naturalunseenhazards.wordpress.com/2010/08/24/hantavirus-
reports-from-california-2-with-1-fatality-and-washington/
BRA 1993-2006
• PATOGENIA
A SCPH apresenta-se no hospedeiro suscetível, ou seja, no
homem, como uma doença febril aguda, caracterizada pelo
grave
comprometimento cardiovascular e respiratório. Os sintomas
iniciais são
febre, dor de cabeça, no corpo e na região abdominal,
sintomas estes
pouco específicos, que dificultam o diagnóstico da hantavirose
na sua
fase inicial. O doente pode ainda apresentar calafrios, diarréia
e malestar.
No decorrer dos dias, surgem dificuldades respiratórias. Ao
exame físico, o paciente pode apresentar taquicardia e dores
nas costas; na ausculta torácica, pode apresentar estertores. O
período
de incubação estimado para essa síndrome é de até 33 dias,
com média
de aproximadamente 15 dias.
TRANSMISSÃO
A transmissão do vírus ocorre principalmente por meio da inalação
de aerossóis formados pelas secreções (urina, fezes e saliva) de
roedores infectados, podendo também ocorrer através de mordidas e
arranhaduras desses animais. Outras formas menos comuns de
transmissão incluem a mordedura de roedores, a ingestão de
alimentos contaminados com fezes ou urina desses animais e, mais
raramente, através de mãos contaminadas levadas à boca.
A transmissão pode ocorrer em qualquer local
infestado por roedores, como paióis de fazenda,
galpões para armazenamento de grãos, porões ou
sótãos de casas velhas ou abandonadas e habitações
humanas em geral, construídas ao lado de
ambientes silvestres ou locais propícios à
multiplicação de roedores.
A aquisição da infecção costuma ocorrer durante
procedimentos que permitem a aerossolização de
partículas virais presentes no ambiente, tais como
limpeza de pisos contendo excretas de roedores,
demolições de construções rurais com alto índice de
infestação por esses mamíferos ou durante a
limpeza de garagens silos, paióis,
pocilgas,galinheiros.
As hantavirose têm sido também considerada
doença de caráter profissional. Determinados
grupos têm maior probabilidade de ser acometidos
por essas enfermidades, tais como: fazendeiros,
engenheiros agrônomos, veterinários, geólogos,
trabalhadores da construção civil e biólogos.
Geralmente jovens e considerados bastante
saudáveis.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico da infecção por hantavírus baseia-se
fundamentalmente na realização de testes sorológicos. A
prova sorológica mais utilizada é a imunoenzimática
(ELISA), que separa anticorpos das classes IgM e IgG; o
ELISA – IgM é apresentado no formato de captura para
evitar reações cruzadas.
Outros testes sorológicos disponíveis incluem a
imunofluorescência indireta, neutralização, hemaglutinação
passiva e western-blot. Um ensaio western-blot, usando
antígenos recombinantes e conjugados isotípicos
específicos para diferenciar anticorpos IgM e IgG, fo
idesenvolvido recentemente para diagnóstico da SCPH, e
os resultados obtidos com esse novo teste concordam com
os testes imunoenzimáticos. Estes exames foram muito
aperfeiçoados nos anos 80/90 em função do HIV/AIDS Fonte: cdc.gov
No Brasil, a captura de roedores sem a presença e
orientação de profissionais habilitados pelos serviços
de referência da Secretaria de Vigilância em
Saúde/MS e sem o uso de equipamentos de proteção
adequados não deve ser praticada. Além disso, a
erradicação de reservatórios naturais do vírus é
impraticável; em hipótese nenhuma
deverá ser utilizado raticida em áreas silvestres. A Akodon Montesis
captura de roedores silvestres para pesquisa requer
autorização prévia do IBAMA (Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis)
A hantavirose é uma doença de notificação
compulsória e de investigação obrigatória. Para a
notificação dos casos suspeitos, utiliza-se a ficha de
investigação para hantavirose – SINAN. A ela são
Necromys Iasirus
anexadas cópias do laudo da radiografia do tórax e
do hemograma, devendo a ficha ser enviada para a
Supervisão de Controle de Zoonoses / DVE, após a
investigação preliminar do caso. Também é
recomendada a busca ativa de novos casos junto aos
familiares e/ou pessoas que tenham realizado as
atividades consideradas de risco junto com o
paciente. Oligorizoma Nigripes
PREVENÇÃO E CONTROLE
A prevenção das hantaviroses baseia-se na implementação de
medidas que impeçam o contato do homem com os roedores
e suas excretas. O controle ambiental desses reservatórios
naturais do vírus não é prático e pode levar ao desequilíbrio
ecológico.
Entretanto, a eliminação dos animais no peridomicílio e
domicílio deve ser realizada de forma estratégica e contínua.
• As construções rurais para habitação humana e para
deposição de grãos e rações não devem conter locais que
permitam a entrada de roedores e, adicionalmente, devem
ser distribuídos raticidas nesses locais.
• uso de equipamentos de proteção individual (máscaras com
filtro N95(PFF-2), óculos, botas e vestimenta que cubra
principalmente os membros inferiores).
• Manter os locais ventilando durante pelo menos 30
minutos antes da entrada em locais fechados e evitar
realizar atividades que possam gerar aerossóis, mesmo em
ambientes bem ventilados, também é importante.
O Cenário
• Anos 2000 Estímulos a produção de
biocombustíveis (Guerra ao Terror, Questões
Ambientalistas, qualidade de combustíveis, novas
tecnologias como o Motor Flex,crescimento da
frota...)
• Grandes alterações na paisagem paulista nos
últimos anos, em sua cobertura e em particular em
seu uso agrícola, associada à intensificação das
lavouras de cana, somadas a aspectos climáticos
sazonais regionais, trazem novas perturbações a um
sistema em que conviviam roedores e humanos.
• Este estudo foi desenvolvido nas microrregiões de
Ribeirão Preto e São Carlos, Estado de São Paulo,
que corresponde a 22 municípios: Ribeirão Preto,
Sertãozinho, Pontal, Serrana, Jardinópolis,
Cravinhos, Barrinha, Santa Rita do Passa Quatro,
Santa Rosa do Viterbo, Brodowski, Pradópolis, São
Simão, Luís Antônio, Serra Azul, Dumont,
Guatapará, Descalvado, Dourado, Ibaté, Analândia,
Ribeirão Bonito e São Carlos, dos quais 10
notificaram casos de Hantavirose.
Incidência de hantavírus entre 1993 e 2012 nos 645
municípios do Estado de São Paulo, e delimitação do cerrado
(em laranja) e da mata atlântica (em verde) no Estado.

Prist P.R et al (2016)


Uso do Solo na Região de estudo dos anos de a) 2003 e b) 2010, classificada com as classes de interesse
para a hantavirose.

Furtado,M.A et al (2013),p.2387
• Com os dados obtidos foram identificados quatro agrupamentos
de municípios, classificados conforme a atividade agrícola e
vegetação (Figura 1). Apenas um agrupamento, ao sul próximo à
Lagoa dos Patos, apresenta cultivo de arroz e vegetação de formação
pioneira. Os demais apresentam atividade agrícola e vegetação
ombrófila mista em áreas de encosta do Planalto e Serra onde ainda
existe uma pequena camada vegetal um pouco preservada.
A atividade agrícola proporciona maior contato com as
viroses e os homens ainda são os mais contaminados por
constituírem a maior parte da mão de obra rural. A diminuição
de áreas naturais e o avanço da agricultura intensiva e
policulturas além de plantações de milho e arroz tem alterado o
habitat dos roedores, disponibilizado alimento em abundância
nos locais de plantio e armazenagem de grãos.
Amazônia Legal
No eixo central da BR-163 (Cuiabá-Santarém) aparecem grandes áreas de expansão de soja até a altura dos municípios
de Sorriso, que atualmente concentra mais de 10% da produção nacional, e Sinop, onde termina a
atividade agrícola em grande escala, enquanto nas áreas de domínio florestal, a norte desse município, à
sensível diminuição do volume de produção associa-se o domínio da rizicultura enquanto cultura ligada à
incorporação de novas áreas à produção. Esta última aparece associada seja à abertura de pasto ou
mesmo, mais recentemente, à implantação de novas culturas comerciais, como a soja, milho e, mais
recentemente, o algodão.
O arco do desmatamento que sobrepõem às áreas de influência das rodovias BR-163
e BR-230 (Transamazônica) que colabora no perfil epidemiológico da hantavirose na região, pois os
desmatamentos eas práticas agrícolas utilizadas nessas áreas alteram o ecossistema a nível local e regional. A
situação ésemelhante nos municípios de Maués e Itacoatiara no Amazonas e nos municípios maranhenses
deAnajatuba, Itapecuru-Mirim e Santa Rita que apresentam perfis peculiares de uso da terra como práticas de
extrativismo e o cultivo do arroz em áreas alagadas.
O mapa com as regiões administrativas (Figura
2) demonstra as áreas mais afetadas pela
hantavirose. Brazlândia, Paranoá, Planaltina e
São Sebastião possuem juntas uma população
de 319.036 habitantes.
Além disso, todos esses territórios
compartilham o mesmo ecossistema que é o
cerrado. Essas regiões administrativas possuem
atividades agrícolas bem diversificadas como o
cultivo de morangos por unidades de
agricultura familiar em Brazlândia até mesmo
agricultura mecanizada em larga escala
desenvolvida em São Sebastião e Planaltina
para a produção de grãos para exportação.
Temos ainda a instalação de assentamentos
agrícolas do INCRA originados de ocupações
do MST.
Outra característica bastante peculiar é a
expansão de áreas periurbanas em direção as
áreas de mata nativa, ocasionando com isso, a
perda de vegetação, pois essas áreas passam
por processos de especulação imobiliária
destinada a criação de condomínios para a
classe média alta e de assentamentos para as
classes de baixa renda.
Essas áreas abrigam inúmeras nascentes de
rios, por isso mesmo constitui um meio
ecológico frágil, por ser de fácil erosão e
contaminação pelo esgoto, resíduos sólidos e
lixo e sendo assim, essas regiões
administrativas apresentam ambientes
favoráveis (expansão urbana, áreas agrícola,
reflorestamento e outros) para os roedores que
são reservatórios do hantavírus.
Ao retratar as formas e a dinâmica de
ocupação da terra no Distrito Federal, o mapa
(Figura 3) mostra os casos plotados de
hantavirose de 2004 a 2008 e as
caracterizações espaciais de áreas aonde
ocorreram esses casos. Com a utilização de
um SIG foi possível determinar 5 categorias
para a confecção desse mapa: água,
agricultura, cerrado, áreas urbanas e
pastagens.
Essa classificação permitiu de maneira
sistematizadao cruzamento dessas
informações com a disseminação da
hantavirose.
Dos 40 LPIs plotados no mapa de Cobertura e
Uso da Terra, 19 (47%) ocorreram em áreas
de pastagens, 10 (25%) em área urbana
(periurbana), 6 (15%) em áreas utilizadas
para a agricultura e 5 (12%) em espaços de
cerrado. Em relação aos LPIs, que
Ocorreram em área urbana, no levantamento
de campo realizado percebe-seque esses
casos aconteceram em áreas periurbanas
próximas aos centros urbanos como o de
Planaltina e São Sebastião.
Outro ponto importante é que grande parte
dos locais prováveis de infecção tiveram sua
ocorrência em áreas com presença de
pastagens. É comum nas pastagens do
Distrito Federal a utilização de capins do
gênero Brachiaria.
O gênero Brachiaria, considerado espécie
exótica importadodo continente africano com
a intenção de suprir as necessidades
agropecuárias e florestais teve papel
extremamente importante no Brasil, pois
viabilizou a pecuária de corte nos solos
ácidos e de baixa fertilidade, predominantes
na região dos cerrados
Top 20
CD_GEOCMI MRG Casos_confirmados 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
53001 Brasilia_DF 43 8 2 11 12 8 1 0 1
51007 Sinop_MT 43 5 3 7 27 1 0 0 0
51004 Parecis_MT 31 9 3 7 7 4 0 0 1
35014 Ribeirao_ Preto_SP 30 3 2 3 7 8 3 0 4
31023 Araxa_MG 29 4 2 3 9 6 1 0 4
15014 Itaituba_PA 28 2 9 8 1 7 1 0 0
51013 Tangara_da_Serra_MT 26 3 9 4 5 2 2 0 1
51003 Colider_MT 22 3 7 5 7 0 0 0 0
52010 Goiania_GO 19 3 5 5 2 3 1 0 0
31020 Patos_de_Minas_MG 19 10 1 1 4 2 0 0 1
31019 Patrocinio_MG 18 3 3 7 1 3 1 0 0
43016 Caxias_do_Sul_RS 17 2 1 8 4 1 1 0 0
42005 Concordia_SC 17 3 3 2 4 0 3 0 2
52007 Anapolis_GO 13 3 2 2 2 3 1 0 0
42002 Chapeco_SC 13 2 1 2 2 4 1 0 1
52012 Ent_Brasilia_GO 13 2 4 1 4 2 0 0 0
42004 Joacaba_SC 13 1 3 3 2 4 0 0 0
41033 Uniao_da_Vitoria _PR 13 2 1 5 3 2 0 0 0
35034 Dracena_SP 12 0 1 3 5 3 0 0 0
42011 Rio_do_Sul_SC 11 1 2 2 3 3 0 0 0

Total :726 casos


Total Top 20: 430 casos
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A hantavirose é uma doença relativamente nova e pouco estudada, além de ser
desconhecida de grande parte da população. Isso faz com que atraia a atenção do poder
público e da comunidade científica, principalmente por se tratar de um problema de
saúde pública.
A síndrome provocada pelo hantavírus é muito perigosa, podendo gerar grande número
de óbitos em pouco tempo. O controle do número de casos de hantavirose é possível, mas
exige grande envolvimento e comprometimento por parte das entidades municipais e
estaduais de saúde e educação, organizando eventos como mutirões, palestras
informativas e entrega de material educativo, de modo a conscientizar e educar as
populações urbana e rural em relação à necessidade de manutenção das condições de
higiene em propriedades rurais e domicílios.
Sendo uma patologia que vem ganhando espaço e afetando a população das diversas
regiões do Brasil e do mundo, mantém-se o desafio à comunidade científica na busca e
obtenção de novas respostas a respeito desse problema de relevância mundial.
O uso do geoprocessamento, é uma dessas metodologias que permitem recuperar dados
sobre o contexto onde se verificam as condições de transmissão de doenças Esse trabalho
tem como objetivo estudar a ecologia da paisagem da hantavirose para compreender os
possíveis fatores ambientais envolvidos na sua ocorrência.
Referências
• Henkes,W & Barcellos, C. Ecologia da paisagem da
hantavirose no Rio Grande do Sul.Revista da Sociedade
Brasileira de Medicina Tropical 37(6) :505-507,nov-dez,2004.
• Körting,K.S et al. Hantavirose : Patologia e registro no
Brasil:VITTALLE, Rio Grande, 20(1): 39-50, 2008
• Santos, J.P et al. A dinâmica do uso da terra e a hantaviróse na
Amazonia Legal-Brasil. Hygeia 8(15): 33 - 43, Dez/2012
• Santos, J.P et al. Uso e ocupação do solo e a disseminação da
hantavirose na região de São Sebastião, Distrito Federal: 2004
– 2008.Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical
44(1):53-57, jan-fev, 2011

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