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ESTUDOS DA PRODUÇÃO LITERÁRIA

BAIANA

Profa. Ana Carolina Cruz de Souza

Aula 2
O que é baianidade?

“[...] uma expressão frequentemente usada para definir


características do “modus vivendi” dos baianos, mais
especificamente, dos que nascem em Salvador e no
Recôncavo da Bahia.” (FIGUEIREDO, p. 2)
Identidade histórica
• Literatura colonial
• Literatura dos cronistas
• Manifestação nativista
• Olhar cristão e eurocêntrico
(FIGUEIREDO, p. 4)
Identidade cosmopolita – urbana e litorânea

• Salvador: cidade-síntese da identidade baiana


• Representação da cultura afro-baiana (costumes,
religiosidade, culinária, musicalidade, etc)
• Pautada na cultura popular
• “Bahia valorada pela natureza exuberante, um local idílico
e dentro de uma miríade de sensações de prazeres e
gozos.” (FIGUEIREDO, p. 5)
• “[...] contraponto ao Brasil industrializado e modernizante”
(FIGUEIREDO, p. 5)
A identidade sertaneja

• Forte marca de construção de identidade local e por que


não dizer nacional na contramão da identidade brasileira
forjada pelos modernistas do eixo Rio-São Paulo na
década de XX.
• Um dos símbolos da nação.
• Marcada por “um discurso edênico e telúrico”
(FIGUEIREDO, p. 2)
A identidade sertaneja
Sertão: espaço outro, em tudo diferente do Recôncavo: no seu modo de
vida, na sua economia, nos seus códigos culturais. Sertão bruto,
despojado, sem os estardalhaços do litoral; lugar de nobreza verdadeira,
de homens ásperos e rudes como a própria vegetação. A própria
imagem do sertão como coração, lugar amoroso, maternal e de
pulsação da vida, indica uma forma de representar com sinal positivo,
destoando assim das recorrentes associações de sertão com seca,
miséria, cangaço, messianismo. Esquivando-se de fórmulas
deterministas (embora às vezes escorregando nelas, pois é uma obra de
transição), tencionando a relação homem-natureza, faz um lugarsertão
emergir como região humana, como espaço de relações
biopsicossociais, território de práticas e representações da vida e da
realidade do mundo. O sertão é assim exibido como lugar de cultura e
sabedoria, o que traduz um deslocamento de certas associações entre
miséria material e pobreza cultural, muito comum no imaginário
euclidiano e posteriormente no romance de 30. (SOARES apud
Elegia para Manuel Bandeira
Estou tão longe da terra e tão perto do céu,
quando venho de subir esta serra tão alta ...

Serra de São José das ltapororocas,


afogada no céu, quando a noite se despe
e crucificado no sol se o dia gargalha.
Estou no recanto da terra onde as mãos de mil virgens
tecem céus de corolas para o meu acalanto.
Perdi completamente a melancolia da cidade
e não tenho tristeza nos olhos
e espalho vibrações da minha força na paisagem.

Os bois escavam o chão para sentir o aroma da terra,


e é como se arranhassem um seio verde, moreno.
Manuel Bandeira, a súbida da serra é um plágio da vida.
Poeta, me dê esta mão tão magra acostumada a bater nas teclas
da desumanizada máquina fria
e venha ver a vida da paisagem
onde o sol faz cócegas nos pulmões que passam
e enche a alma de gritos da madrugada.
Não desprezo os montes escalvados
tal o meu romântico homônimo de Guerra Junqueiro
Bebo leite aromático do candeial em flor
e sorvo a volúpia da manhã na cavalgada.
Visto os couros do vaqueiro
e na corrida do cavalo sinto o chão pequeno para a galopada.

Aqui come-se carne cheia de sangue, cheirando a sol.


Não desprezo os montes escalvados
tal o meu romântico homônimo de Guerra Junqueiro
Bebo leite aromático do candeial em flor
e sorvo a volúpia da manhã na cavalgada.
Visto os couros do vaqueiro
e na corrida do cavalo sinto o chão pequeno para a galopada.

Aqui come-se carne cheia de sangue, cheirando a sol.


O discurso da blacktude
• Discurso em que “o negro torna-se autor do discurso
artístico e cultural, um discurso contemporâneo com
uma cena que reescreve a cultura afro-baiana com
artefatos culturais em especial um movimento
coletivo com artistas performáticos e que o urbano
periférico se escreve na cena cultural das cidades
em especial, Salvador.” (FIGUEIREDO, p. 3)
• Uma construção de Bahia ainda a margem dos
grandes artefatos culturais, mas, que corresponde a
maior parte do seu Território Identitário Cultural.
(FIGUEIREDO, p. 3)
O discurso da blacktude
• “[...] um coletivo de artistas negros que apresentam um
novo fluxo cultural na capital baiana, vozes periféricas
que buscam de maneira coletiva uma desconstrução da
cena cultural baiana, marcada por exclusões e
silenciamentos”. (FIGUEIREDO, p. 9)
• Experiência compartilhada – Nelson Maca.
• “[...] figura a posição do negro no discurso, deslocando de
objeto a sujeito da oração”. (FIGUEIREDO, p. 9)
Nelson Maca

• É poeta e professor de literatura brasileira. Mora em


Salvador, onde fundou, há 20 anos, o Coletivo Blackitude:
Vozes Negras da Bahia, que, há 10 anos, realiza o Sarau
Bem Black. Lançou o livro de poemas Gramática da Ira.
No segundo semestre de 2019, lança os livros Go Afrika
(poemas) – na Balada Literária e no Sarau da Cooperifa,
durante o mês passado, setembro – e Relatos da Guerra
Preta: Bahia Baixa Estação (contos). Foto: Lucas
Bernardi
The walk talk man
Entrei no shopping pela porta da frente
Lá estava ele como sempre: fechado e bem fardado
Fora dali, lá na área, no baba do pagode outra pessoa
Agora era o homem do rádio transmissor – The Walk Talk Man
Sente mesmo um certo orgulho de si aquele irmão bem colocado
Se encaixa como limo no mármore entre samambaias
e as cascatas
Eu vi quando ele passou um rádio lá tentando se ocultar
nas dobras da parede
E ele se duplica fixo firme múltiplo presente e premente – sentinela
Em cada etapa de meu passeio pelo campo minado de inimigo
Eu prevejo um tiro de morteiro uma bala devidamente perdida
Mas passo ante as vitrines que me espelham de corpo inteiro
de cabeça erguida
Embora eu invadindo aquele espaço mais pareça
o cristão lançando às feras
O terrível contrassenso daquela bela paisagem romana
Algo que se faz bárbaro na ostentação daquele templo ariano
Em cada canto uma câmara oculta enquadrando
classificando
o meu corpo
Pesquisando espreitando esquadrinhando mirando
destacando
me pedindo um sorriso
Não entendia muito bem a causa que envolvia a minha
pessoa
Afinal de contas já acreditei que todos eram irmãos
neste país de miscigenados
Tudo sempre e tanto correria como manda o figurino
Eu realmente acreditava
O culpado maior de minha intranquilidade foi este
mulatinho
Isaías Caminha
A rebeldia de Lima Barreto botou fogo na minha
consciência perdida
Eu também era uma vítima alheia aos atos e sentimentos
sem causa explicada
E me sentia como um estrangeiro naquela que diziam a minha
terra
As plumas os chapéus os ternos os sapatos dos que desfilam
nesta casa de horrores
Parecem povoar de animais vorazes a grande floresta
em que me encontro
Mas esta mata não é ponto de chegada
É passagem no trajeto de nossa permanência
Porque é nosso o mistério de caminhar descalços
sobre as brasas acesas da fogueira de Xangô
E para o coração de cada irmão sempre sério e bem fardado
The Walk Talk Man
Há uma flecha redentora de Oxóssi
e Ossain queimando a erva da memória.
(MACA, Nelson.Gramática da ira, p. 86-87)

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